UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM

BRUNA GRASIELA DA SILVA RONDINELLI

LÁGRIMAS E MITOS: TRADUÇÕES E APROPRIAÇÕES DO MELODRAMA FRANCÊS NO BRASIL (1830-1910)

CAMPINAS, 2017 BRUNA GRASIELA DA SILVA RONDINELLI

LÁGRIMAS E MITOS: TRADUÇÕES E APROPRIAÇÕES DO MELODRAMA FRANCÊS NO BRASIL (1830-1910)

Tese de doutorado apresentada ao Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Doutora em Teoria e História Literária, na área de História e Historiografia Literária.

Orientadora: Profa. Dra. Orna Messer Levin

Este exemplar corresponde à versão final da Tese defendida pela aluna Bruna Grasiela da Silva Rondinelli e orientada pela Profa. Dra. Orna Messer Levin.

CAMPINAS, 2017 Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): FAPESP, 2014/06398-9; CAPES ORCID: http://orcid.org/0000-0003-4921-5961

Ficha catalográfica Universidade Estadual de Campinas Biblioteca do Instituto de Estudos da Linguagem Crisllene Queiroz Custódio - CRB 8/8624

Rondinelli, Bruna Grasiela da Silva, 1985- R668L RonLágrimas e mitos : traduções e apropriações do melodrama francês no Brasil (1830-1910) / Bruna Grasiela da Silva Rondinelli. – Campinas, SP : [s.n.], 2017.

RonOrientador: Orna Messer Levin. RonTese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Estudos da Linguagem.

Ron1. Caetano, João, 1808-1863. 2. Tradução e interpretação. 3. Melodrama. 4. Teatro brasileiro - Séc. XIX - História e crítica. 5. Teatro francês - Brasil - Traduções para o português. 6. Teatro francês - Brasil - Adaptações. I. Levin, Orna Messer,1960-. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Estudos da Linguagem. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Tears and myths : translations and appropriations of the French melodrama in Brazil (1830-1910) Palavras-chave em inglês: Caetano, João, 1808-1863 Translating and interpreting Melodrama Brazilian drama - 19th century - History and criticism French drama - Brazil - Translations into portuguese French drama - Brazil - Adaptations Área de concentração: História e Historiografia Literária Titulação: Doutora em Teoria e História Literária Banca examinadora: Orna Messer Levin [Orientador] Celina Maria Moreira de Mello Jefferson Cano João Roberto Gomes de Faria Michel Robert Jean Riaudel Data de defesa: 24-08-2017 Programa de Pós-Graduação: Teoria e História Literária

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BANCA EXAMINADORA:

Profa. Dra. Orna Messer Levin

Profa. Dra. Celina Maria Moreira de Mello

Prof. Dr. Jefferson Cano

Prof. Dr. João Roberto Gomes de Faria

Prof. Dr. Michel Robert Jean Riaudel

IEL/UNICAMP 2017

Ata da defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no SIGA – Sistema de Gestão Acadêmica.

Ao Duilio Raphael, companheiro eterno.

AGRADECIMENTOS

Mais uma etapa se cumpre em minha vida. Resta-me apenas prestar os agradecimentos a todos aqueles que estiveram presentes ao meu lado e tornaram esta caminhada possível. Agradeço à Profa. Dra. Orna Messer Levin, pela orientação cuidadosa e profissional. Sou grata pelos dez anos de parceria, que contribuiu certamente para o meu amadurecimento como pesquisadora. Muito obrigada por confiar em meu trabalho, pelas portas que me abriu e pelo carinho. Agradeço aos docentes e funcionários do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL/UNICAMP), onde realizei minha formação acadêmica, dos primeiros passos na Graduação ao Doutorado. Entre as salas de aula, a biblioteca, a arcádia e a cantina vivi agradavelmente grande parte dos meus últimos onze anos. Ao Prof. Dr. Jean Claude Yon, da Université de Versailles Saint-Quentin-en- Yvelines, por me acolher durante o estágio de pesquisa na França e por me apresentar aos incríveis acervos e bibliotecas parisienses dedicados às artes do espetáculo. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela concessão da Bolsa de Doutorado no início do projeto de pesquisa. À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pela Bolsa de Doutorado (processo FAPESP número 2014/06398-9) e pela Bolsa de Estágio de Pesquisa no Exterior (processo FAPESP número 2015/13451-6), que me permitiu a realização de pesquisas em e Lisboa. Aos professores que aceitaram participar da banca de defesa: Profa. Dra. Celina Maria Moreira de Mello (UFRJ), Prof. Dr. Jefferson Cano (UNICAMP), Prof. Dr. João Roberto Gomes de Faria (USP), Prof. Dr. Michel Robert Jean Riaudel (Université de Poitiers), Profa. Dra. Daniela Mantarro Callipo (UNESP), Profa. Dra. Márcia Azevedo de Abreu (UNICAMP) e Prof. Dr. Pedro Paulo Garcia Ferreira Catharina (UFRJ). Meu agradecimento especial ao Prof. Dr. Pedro Paulo Catharina e ao Prof. Dr. João Roberto Faria, pelas leituras atentas e contribuições valiosas feitas durante a banca de qualificação. À Profa. Dra. Márcia Abreu, pesquisadora dedicada que sempre me inspirou. Agradeço aos funcionários das bibliotecas e acervos onde realizei pesquisas ao longo do desenvolvimento do projeto. Agradeço à Léonor Delaunay, responsável pela biblioteca da Société d’Histoire du Théâtre (Paris), à Sofia Patrão, da biblioteca do Museu Nacional do Teatro e da Dança (Lisboa), à Vera Lúcia de Almeida, bibliotecária do Real Gabinete Português de Leitura (Rio de Janeiro), e à Mónica Aliseris, da Biblioteca Jenny Klabin Segall (São Paulo). Aos meus pais, Neusa e Valdeci, por entenderem algumas ausências nos almoços de domingo. Agradeço também ao companheirismo de minhas irmãs, Paula e Luciana. Às sobrinhas queridas, Thainá, Thamires e Celina, por sempre me lembrarem que a criança dentro de nós nunca morre. À amiga Danielle Crepaldi Carvalho, pela parceria em trabalhos acadêmicos e pelo ombro amigo consolador e motivador. Espero que tenhamos novas empreitadas pela frente. Aos meus amigos e professores do Teatro Escola Macunaíma, de Campinas, que despertaram o poder criativo adormecido em mim. Agradeço às professoras de francês que me tornaram uma apaixonada pela cultura francófona: Edilene Narezzi, Cristina Nagle, Silvia Mariolani, Lidia Siqueira e Maria Rita Castilho. Merci, Mesdames! Aos colegas do projeto de pesquisa temático “Circulação transatlântica dos impressos – a globalização da cultura no século XIX” (FAPESP), professores, estudantes de iniciação científica, mestrandos e doutorandos que conviveram comigo durante os últimos cinco anos. Todos, sem exceção, sintam-se contemplados em meu agradecimento. Muito obrigada ao Prof. Dr. Atilio Bergamini (UFCE), Prof. Dr. Leandro Thomaz de Almeida, Profa. Dra. Ana Porto e Prof. Dr. Moizeis Sobreira, pelas leituras atentas e generosas, e ao Prof. Dr. Alexandro Paixão (UNICAMP), por dizer as palavras certas que precisava ouvir em um momento delicado da pesquisa. Ao Duilio Raphael, por mergulhar de mãos dadas comigo nesta empreitada, pelas horas a fio me ouvindo recitar os argumentos da tese e as anedotas divertidas sobre a vida dos atores e atrizes. Obrigada por me ajudar a organizar os anexos. Não posso deixar de agradecer por me ensinar que Chi va piano, va sano e va lontano.

“[...] si l’on aime ce théâtre si mal aimé, il ne faut pas seulement se laisser porter par le pathétique de l’histoire.”

(BERTHIER, Patrick. “Introduction”. In: HUGO, Victor. Ruy Blas. Paris: Gallimard, 1997, p. 6).

RESUMO

Esta tese apresenta um estudo sobre o melodrama francês no Brasil, durante o século XIX, que objetivou descrever os processos de introdução, circulação e permanência do gênero nos palcos brasileiros. O primeiro capítulo reconstitui o repertório representado e verifica que não apenas o consagrado artista João Caetano dos Santos (1808-1863) protagonizou as peças, mas também outros primeiros atores e empresários teatrais, tais como Germano Francisco de Oliveira (1820-1885), Florindo Joaquim da Silva (1814-1893) e Joaquim Augusto Ribeiro de Souza (1825-1873). O capítulo seguinte analisa algumas traduções para o português, representadas nos teatros brasileiros, e revela que o processo de tradução e realização cênica do melodrama empreendeu modificações nos textos originais. As condições materiais das companhias e os princípios políticos, religiosos e dos bons costumes, que orientavam a censura do Conservatório Dramático Brasileiro, acomodaram as peças. O terceiro capítulo estuda a circulação do melodrama e demonstra que a mobilidade dos atores-empresários contribuiu para a difusão do gênero nos teatros das províncias do Império. O último capítulo discute o modo pelo qual se deu a permanência do melodrama e constata que as relações de concorrência, estabelecidas entre os artistas, determinaram a sobrevida do gênero no teatro brasileiro. Esta tese conclui que, ao longo do século XIX, os fenômenos específicos da recepção do melodrama no Brasil motivaram as apropriações e a permanência do gênero em nossos palcos.

Palavras-chave: Melodrama; Teatro brasileiro; João Caetano; Tradução; Recepção crítica.

ABSTRACT

This thesis presents a study about French melodrama in Brazil during the 19th century, which aimed to describe the processes of introduction, circulation and permanence of the genre in Brazilian stages. The first chapter reconstructs the repertoire represented and verifies that not only the famous artist João Caetano dos Santos (1808-1863) performed the plays, but also other main actors and theater entrepreneurs such as Germano Francisco de Oliveira (1820- 1885), Florindo Joaquim da Silva (1814-1893) and Joaquim Augusto Ribeiro de Souza (1825- 1873). The following chapter analyzes some translations into Portuguese, represented in the Brazilian theaters, and reveals that the process of translation and scenic realization of the melodrama led to modifications in the original texts. The material conditions of the companies and the political, religious and moral principles that guided the censorship of the Brazilian Dramatic Conservatory, accommodated the pieces. The third chapter studies the circulation of the melodrama and demonstrates that the mobility of actors-entrepreneurs contributed to the diffusion of the genre in the Empire provinces’ theaters. The last chapter discusses the way in which the melodrama permanence occurred and verifies that the competitive relations established among the artists determined the survival of the genre in the Brazilian theater. This thesis concludes that, throughout the 19th century, the specific phenomena of the reception of melodrama in Brazil motivated the appropriations and the genre’s permanence in our stages.

Keywords: Melodrama; Brazilian theater; João Caetano; Translation; Critical reception.

RÉSUMÉ

Cette thèse présente une étude sur le mélodrame français au Brésil, pendant le XIXe siècle, qui a eu pour but décrire les processus d’introduction, circulation et permanence du genre aux théâtres brésiliens. Le premier chapitre reconstitue le répertoire représenté et vérifie que non seulement le consacré artiste João Caetano dos Santos (1808-1863) a joué les pièces, mais aussi autres acteurs et entrepreneurs théâtraux, tels que Germano Francisco de Oliveira (1820- 1885), Florindo Joaquim da Silva (1814-1893) et Joaquim Augusto Ribeiro de Souza (1825- 1873). Le chapitre suivant analyse des traductions représentées aux théâtres brésiliens et révèle que le processus de traduction et mise en scène du mélodrame a entrepris des modifications aux textes originaux. Les conditions matérielles des compagnies et les principes politiques, religieux et moraux, qui ont orienté la censure du Conservatoire Dramatique Brésilien, ont accommodé les pièces. Le troisième chapitre étude la circulation du mélodrame et démontre que la mobilité des acteurs-entrepreneurs a contribué pour la diffusion du genre aux théâtres des provinces au Brésil. Le dernier chapitre analyse la permanence du mélodrame et vérifie que les relations de concurrence, établies parmi les artistes, ont déterminé la survie du genre au théâtre brésilien. Cette thèse conclue qu’au XIXe siècle les phénomènes spécifiques de la réception du mélodrame au Brésil ont motivé les appropriations et la permanence du genre sur nos théâtres.

Mots-Clés : Mélodrame ; Théâtre brésilien ; João Caetano ; Traduction ; Réception critique.

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1: Ludovina Soares da Costa (1802-1868) Figura 2: Percurso de Ludovina Soares nos Teatros Figura 3: Personagem Orosmane da Zaíra, de Voltaire, no Teatro de São João Figura 4: João Caetano dos Santos (1808-1863) Figura 5: Percurso de João Caetano nos Teatros Figura 6: Germano Francisco de Oliveira (1820-1885) Figura 7: Percurso de Germano Francisco nos Teatros Figura 8: Percurso de Florindo Joaquim nos Teatros Figura 9: Joaquim Augusto Ribeiro de Souza (1825-1873) Figura 10: Percurso de Joaquim Augusto nos Teatros Figura 11: José Dias Braga (1846-1910)

LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Repertório Francês da Companhia Portuguesa no Teatro da Praia de D. Manuel (1834-1838) / Teatro de São Januário (1839) Tabela 2: Joseph Bouchardy nos Teatros do Rio de Janeiro Tabela 3: Repertório Francês de Ludovina Soares no Rio de Janeiro (1830-1866) Tabela 4: Victor Ducange nos Teatros do Rio de Janeiro Tabela 5: Victor Hugo nos Teatros do Rio de Janeiro Tabela 6: Alexandre Dumas (pai) nos Teatros do Rio de Janeiro Tabela 7: Repertório Francês de João Caetano no Rio de Janeiro (1835-1862) Tabela 8: Repertório Francês de Germano Francisco no Rio de Janeiro (1837-1871) Tabela 9: Repertório Francês de Florindo Joaquim no Rio de Janeiro (1840-1874) Tabela 10: Repertório Francês de Joaquim Augusto no Rio de Janeiro (1843-1871) Tabela 11: Traduções de Dramas e Melodramas Franceses no Archivo Theatral Tabela 12: Tradutores Portugueses nos Teatros do Rio de Janeiro Tabela 13: Traduções no Brasil Tabela 14: Trechos Suprimidos na Tradução de La Tour de Nesle Tabela 15: Trechos Censurados de La Grâce de Dieu Tabela 16: Supressões na Tradução de La Dame de Saint-Tropez Tabela 17: Expressões Populares e a Tradução Tabela 18: A Tradução Trinta Anos ou a Vida de um Jogador Tabela 19: Repertório Francês de João Caetano nas Províncias (1849-1857) Tabela 20: Repertório Francês de Germano Francisco nas Províncias (1848-1864) Tabela 21: Repertório Francês de Florindo Joaquim no Rio Grande do Sul (1853-1855) Tabela 22: Repertório Francês de Joaquim Augusto nas Províncias (1849-1868) Tabela 23: Repertório Francês de Dias Braga no Rio de Janeiro (1872-1908)

LISTA DE ABREVIATURAS

Teatros de Paris TA : Théâtre Antoine TAC : Théâtre de l’Ambigu-Comique TB : Théâtre Beaumarchais TCE : Théâtre du Château-d’Eau TF/CF : Théâtre Français / Comédie-Française TFD : Théâtre des Folies-Dramatiques TG : Théâtre de la Gaîté TGD : Théâtre du Gymnase-Dramatique TH : Théâtre Historique TI : Théâtre Italien TIC : Théâtre Impérial du Cirque TIR : Théâtre de S. M. l’Impératrice et Reine TL : Théâtre Libre TM : Théâtre du Marais TO : Théâtre de l’Odéon TOC : Théâtre de l’Opéra-Comique TPD : Théâtre du Panorama Dramatique TPR : Théâtre du Palais-Royal TPSA: Théâtre de la Porte-Saint-Antoine TPSM : Théâtre de la Porte-Saint-Martin TR : Théâtre de la Renaissance TRe : Théâtre de la République TV : Théâtre des Variétés TVa : Théâtre du Vaudeville

SUMÁRIO

Introdução O Melodrama e a Historiografia Teatral Brasileira ...... 17

Capítulo 1 Os Repertórios e os Intérpretes ...... 34 1.1 O sopro de vida ...... 35 1.2 O pioneirismo de Ludovina Soares ...... 38 1.3 O repertório de João Caetano ...... 43 1.3.1 Neoclássico e romântico ...... 43 1.3.2 Os melodramas franceses ...... 69 1.3.3 Os melodramas brasileiros ...... 75 1.4 De discípulos a rivais de João Caetano ...... 78 1.4.1 Germano Francisco de Oliveira ...... 78 1.4.2 Florindo Joaquim da Silva ...... 90 1.4.3 Joaquim Augusto Ribeiro de Souza ...... 94

Capítulo 2 Tradução e Realização Cênica ...... 97 2.1 Os melodramas de sucesso ...... 98 2.2 Os textos franceses nos palcos brasileiros ...... 103 2.3 As traduções d’além-mar ...... 105 2.4 As traduções brasileiras ...... 113 2.4.1 A censura do Conservatório Dramático Brasileiro ...... 115 2.4.2 A autocensura do tradutor ...... 125 2.4.3 Construção lexical e semântica ...... 129 2.4.4 Verso e métrica: a tradução de Hernani ...... 131 2.5 A realização cênica ...... 135

Capítulo 3 Circulação e Disputas ...... 142 3.1 A circulação dos atores-empresários ...... 143 3.2 As temporadas de João Caetano nas províncias ...... 144 3.3 Germano Francisco, de ator a empresário teatral e negociante ...... 153 3.4 Florindo Joaquim no Sul do Império ...... 161 3.5 Joaquim Augusto no Sul e em São Paulo ...... 163 3.6 Os artistas brasileiros nos palcos de Lisboa ...... 164 3.6.1 Germano Francisco e A Gargalhada...... 166 3.6.2 João Caetano e A Dama de Saint-Tropez ...... 178

Capítulo 4 Permanência e Renovação ...... 185 4.1 A longa permanência nos palcos ...... 186 4.2 Palcos românticos e realistas ...... 193 4.2.1 Ideias de renovação ...... 199 4.3 A construção de um mito ...... 208 4.4 José Dias Braga, herdeiro do melodrama ...... 215

Conclusões ...... 221

Referências Bibliográficas ...... 229

Anexos Ilustrações ...... 247 Tabelas ...... 259

INTRODUÇÃO

O MELODRAMA E A HISTORIOGRAFIA TEATRAL

BRASILEIRA

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Às vésperas do século XX, Arthur Azevedo noticiou, em crônica de 12 de abril de 1900, publicada no periódico A Notícia, a representação do melodrama Os Seis Degraus do Crime (Les Six Degrés du Crime, Théâtre de l’Ambigu-Comique – TAC, 1831), de Théodore Nézel e Benjamin Antier. De modo bem-humorado, para descrever o repertório de melodramas encenado nas primeiras décadas do século XIX pelo celebrado ator João Caetano dos Santos (1808-1863), falecido há quase quatro décadas, o folhetinista empregou uma série de termos que evocam a morte (“cadáveres esquecidos”, “sono eterno”) e a putrefação (“ossadas carcomidas”, “vermes”).

Metido em casa há muitos dias e noites, subjugado pela influenza, não pude apreciar in anima vile os espetáculos do Variedades, e o único eco, que recebi, da representação dos Seis Degraus do Crime, consta de uma carta que me dirigiu, um velho amador, que viu, pelos modos, o papel de Julio Domaly [Jules Dormilly] interpretado por João Caetano dos Santos. Não sei como no teatro ainda se não convenceram, de uma vez por todas, que lançar mão desses melodramas sexagenários é um recurso negativo. A exumação de semelhantes peças pode interessar apenas aos fluminenses de oitenta anos, que já não vão ao teatro, e o fato de terem sido elas bem representadas outrora, como o não podem ser nos nossos dias, afasta necessariamente um ou outro velhote que porventura resolvesse deixar os seus cômodos. Que diabo! Pois não há aí tantas peças novas, que o Rio de Janeiro não conhece? A grande fornalha de onde saíram aqueles famosos Seis Degraus não trabalha ainda, noite e dia, espalhando pelo mundo inteiro a sua produção incessante? Para que perturbar o sono eterno desses melodramas? Para que procurar nessas exumações extravagantes outra coisa que não sejam ossadas carcomidas? Para que disputar aos vermes esses cadáveres esquecidos? Na literatura do teatro, como em todas as literaturas, só não desaparecem as obras-primas. Durmam em paz os velhos melodramas. Parce sepultis.1

Contemporâneo de Arthur Azevedo, G. de Villette, crítico francês do periódico Le Journal, ao avaliar a reprise em Paris, em 1903, de Les Pirates de la Savane (Théâtre de la Gaîté – TG, 1859), de Auguste Anicet-Bourgeois e Ferdinand Dugué, recorreu a termos semelhantes empregados pelo crítico brasileiro: “O Teatro do Châtelet acaba de exumar um velho drama de grande espetáculo, um desses sombrios mélos que cheiram a pó, e como os amavam nossos pais e avós”.2 A associação do melodrama à ideia de teatro envelhecido e ultrapassado transformou-se em topos nas críticas teatrais fin de siècle. Na época, as correntes modernas

1 AZEVEDO, Arthur. “O Theatro, 12/04/1900”. In: NEVES, Larissa de Oliveira & LEVIN, Orna Messer (Org.). O Theatro: crônicas de Arthur Azevedo. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2009, p. 51-52. Atualizamos a ortografia da crônica. 2 VILLETTE, G. de. La course de Mazeppa. Le Journal, Paris, 9 avr. 1903, p. 7, tradução nossa. No original: “Le théâtre du Châtelet vient d’exhumer un vieux drame à grand spectacle, un de ces sombres mélos qui sentent la poudre, et comme les aimaient nos pères et nos grand-pères.” A partir daqui, todas as traduções que apresentamos de estudos, obras teatrais e textos retirados da imprensa francesa são de nossa autoria, salvo os casos em que indicamos as referências da tradução.

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tentavam suplantar as convenções do antigo drama e do melodrama. Segundo teorização de Peter Szondi, no final do século XIX e início do XX, buscou-se distanciar das categorias formais mais importantes e, até então, cristalizadas do drama, tais como o decurso progressivo da ação dramática e o diálogo.3 As duas crônicas teatrais, de Arthur Azevedo e de G. de Villette, demonstram que, mesmo a contragosto dos críticos da virada do século XIX, desejosos de dramas que tratassem das questões sociais e econômicas inerentes ao contexto moderno e industrial em que viviam, os melodramas continuavam nos palcos, não apenas de Paris, mas também do Rio de Janeiro. As peças, na maioria das vezes de tema histórico, com ações dramáticas que se estruturam por fórmulas consagradas, tais como o reconhecimento, as coincidências e as reviravoltas (os coups de théâtre)4, e por uma mise en scène espetacular, constituída por gestos convencionados, efeitos visuais e sonoros, receberam montagens mesmo após um século do nascimento do gênero no contexto pós-revolucionário francês. Assim ilustra o resgate de Os Seis Degraus do Crime, em 1900, passados sessenta e cinco anos das primeiras representações oferecidas por João Caetano no Teatro Constitucional Fluminense. A crítica de Arthur Azevedo ao espetáculo nos introduz em um problema da historiografia teatral brasileira referente ao melodrama. O problema reside, em parte, na tensão entre o repertório estrangeiro disseminado pelos palcos e o ideal literário de uma dramaturgia nacional que se centrasse na representação da realidade contemporânea da sociedade brasileira, de forma a abarcar sua cor local. Em outra parte, no pressuposto de que o teatro deveria priorizar sua função formativa e civilizadora, ao invés do entretenimento da plateia. As duas questões guiaram os posicionamentos de homens de letras que atuaram ativamente no teatro brasileiro oitocentista, dentre os quais se destacaram Machado de Assis (1839-1908) e José de Alencar (1829-1877), produtores e apoiadores da dramaturgia realista, criada no Teatro Ginásio Dramático, a partir de 1855. As peças realistas prezavam pela composição literária do texto, cujas tramas e personagens cravavam pés em solo brasileiro, o raisonneur exteriorizava o ensinamento moral almejado pelo autor e os atores praticavam uma atuação cênica entendida como natural, sem arroubos ou exageros.

3 Ver SZONDI, Peter. “A crise do drama”. In: Teoria do Drama Moderno (1880-1950). Tradução de Luiz Sérgio Repa. São Paulo: Cosac & Naify, 2001, p. 35-88. 4 O coup de théâtre (golpe de teatro, em português) é uma ação imprevista que muda subitamente o desenrolar do enredo. Foi largamente empregado no drama romântico e no melodrama franceses. (Cf. GOLPE de teatro. In: PAVIS, Patrice. Dicionário de Teatro. Tradução sob a direção de J. Guinsburg e Maria Lúcia Pereira. 3 ed. São Paulo: Perspectiva, 2015, p. 187).

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O nacional e o civilizador, princípios defendidos pelos homens de letras do século XIX, nortearam “a escrita da História do Teatro”5 e orientaram abordagens históricas e críticas nada favoráveis às manifestações do teatro romântico brasileiro, momento em que os palcos da Corte e das províncias foram receptivos às produções de melodramas estrangeiros. Mesmo se o drama fosse produzido em terra nacional, a crítica recaía no modelo literário adotado, que se aproximava do melodrama francês, abordava temas históricos e produzia inverossimilhanças no enredo. O princípio norteador de reconstituição de uma dramaturgia nacional culminou na seleção e na canonização de autores e de peças brasileiras, ao passo que concebeu como nociva a difusão nos palcos de traduções de obras estrangeiras. Para a narrativa histórica do teatro brasileiro, privilegiou-se a inserção da produção do texto dramático nacional, ao passo que se silenciaram os programas dos espetáculos e os textos traduzidos representados. Essa tendência pode ser identificada nas histórias literárias brasileiras de Sílvio Romero e de José Veríssimo, redigidas na virada do século XIX ao XX. Os dois historiadores da literatura se dedicaram ao estudo da produção teatral nacional, porém descolada de suas relações com o repertório estrangeiro que fora representado, preocupados em resgatar autores e obras que se tornariam representativos do momento de fundação da literatura brasileira. Os historiadores buscavam identificar os “chefes de grupos” ou “espíritos diretores”, nas palavras de Sílvio Romero contaminadas pela terminologia do darwinismo. Para esse crítico, fazia-se necessário um “sério processo de seleção”, para que fossem estudados “apenas os mais aptos, os que revelaram qualidades superiores, os que exerceram influxo sobre seus contemporâneos. Do restante da turbamulta é bastante dar os nomes”.6 Assim, suas ponderações sobre o drama do século XIX orbitaram nas produções de Luís Carlos Martins Pena (1815-1848), Joaquim Manuel de Macedo (1820-1882), José de Alencar e Machado de Assis. Compreendemos o movimento de apagamento da produção de certos dramaturgos brasileiros e da encenação de obras estrangeiras, na medida em que se dimensiona o impacto da ideia da eterna decadência do teatro nacional. A ideia, surgida no século XIX com a dramaturgia realista, partilhada por autores como Machado de Assis e José de Alencar, pautava-se no argumento do desvio do teatro nacional de um padrão literário, provocado pela disseminação de traduções de peças estrangeiras, sobretudo, de melodramas e de operetas. Segundo Tania Brandão, o consagrado ensaio “Notícia da atual literatura brasileira. Instinto

5 Cf. GUINSBURG, J. & PATRIOTA, Rosangela. Teatro Brasileiro: ideias de uma história. São Paulo: Perspectiva, 2012, p. 32. 6 ROMERO, Sílvio. História da Literatura Brasileira. Vol. 5. 7 ed. Rio de Janeiro: J. Olympio; Brasília: INL, 1980, p. 1399.

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de nacionalidade”, de Machado de Assis, ilustra a ideia do declínio do teatro nacional nas décadas finais do Oitocentos.7

Não há atualmente teatro brasileiro; nenhuma peça nacional se escreve, raríssima peça nacional se representa. As cenas teatrais deste país viveram sempre de traduções, o que não quer dizer que não admitissem alguma obra nacional quando aparecia. Hoje, que o gosto público tocou o último grau de decadência e perversão, nenhuma esperança teria quem se sentisse com vocação para compor obras severas de arte. [...] E todavia a continuar o teatro, teriam as vocações novas alguns exemplos, não remotos, que muito as haviam de animar. Não falo das comédias do Pena, talento sincero e original, a quem só faltou viver mais para aperfeiçoar-se e empreender obras de maior vulto; nem também das tragédias de Magalhães e dos dramas de Gonçalves Dias, Porto-Alegre e Agrário. Mais recentemente, nestes últimos doze ou quatorze anos, houve tal ou qual movimento. Apareceram então os dramas e comédias do Sr. J. de Alencar, que ocupou o primeiro lugar na nossa escola realista, e cujas obras Demônio Familiar e Mãe são de notável merecimento. Logo em seguida apareceram várias outras composições dignas do aplauso que tiveram, tais como os dramas dos Srs. Pinheiro Guimarães, Quintino Bocaiúva e algum mais; mas nada disso foi adiante. Os autores cedo se enfastiaram da cena, que a pouco e pouco foi decaindo até chegar ao que temos hoje, que é nada.8

O teatro nacional foi dimensionado pelas tradicionais histórias teatrais das primeiras décadas do século XX, salvo raras menções às salas de espetáculos das províncias, como sinônimo das manifestações ocorridas na Corte do Império. Desse modo, essas obras históricas solidificaram uma abordagem seletiva que privilegiou a produção dramática do Rio de Janeiro, o centro que representaria a nação. Essa concepção analítica implicou em um processo de seleção e exclusão, que “remete ao conceito de tempo pouco problematizado, à definição restrita de teatro adotada e ao contorno arbitrário do nacional, este último identificado como brasileiro mecanicamente, mas essencialmente carioca e por vezes também paulista”.9 Processo facilmente verificável quando passamos em revista os capítulos das tradicionais histórias teatrais que se dedicaram ao teatro do século XIX. De O Teatro Brasileiro: alguns apontamentos para a sua história (1904), de Henrique Marinho, ao O Teatro no Brasil (1960), de José Galante de Sousa, passando pela “Evolução do teatro no Brasil” (1922), artigo de Max Fleiuss, História do Teatro Brasileiro (1926), de Carlos Süssekind de Mendonça, O Teatro no Brasil (1936), de Múcio da Paixão, e História do Teatro Brasileiro (1938), de Lafayette Silva10, constatamos que, preocupados em

7 Cf. BRANDÃO, Tania. “As lacunas e as séries: padrões de historiografia nas ‘Histórias do Teatro no Brasil’”. In: MOSTAÇO, Edélcio (Org.). Para uma História Cultural do Teatro. Florianópolis; Jaraguá do Sul: Design Editora, 2010, p. 351-353. 8 ASSIS, Machado de. Notícia da atual literatura brasileira. Instinto de nacionalidade. O Novo Mundo, New York, vol. III, n. 30, 23 mar. 1873, p. 108. 9 BRANDÃO, op. cit., p. 338. 10 MARINHO, Henrique. O Theatro Brasileiro: alguns apontamentos para a sua história. Rio de Janeiro; Paris: H. Garnier, 1904. O artigo de Max Fleiuss foi, originalmente, publicado no Dicionário Histórico, Geográfico e

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apresentar a gênese literária do teatro brasileiro no Romantismo, esses historiadores teatrais priorizaram as obras de autores nacionais que produziram no Rio de Janeiro. As traduções de peças estrangeiras, que alimentaram os palcos brasileiros por todo o século XIX, foram superficialmente mencionadas, o que demonstra que a produção do texto teatral nacional interessou mais aos historiadores que as manifestações da arte da cena. As práticas teatrais nas províncias não foram cenas esquecidas da historiografia brasileira. Os teatros da Bahia, Maranhão, Pará, Rio Grande do Sul e São Paulo foram temas de histórias teatrais específicas a cada província/estado, que vieram à luz no decorrer do século XX.11 Essas obras descentralizaram a história teatral brasileira da capital do Império, ao incluir dados sobre as salas de espetáculos das províncias, demonstrando a existência de conexões entre os palcos brasileiros oitocentistas, graças aos deslocamentos internos dos atores, bailarinos e músicos. Exemplo dessa prática historiográfica é a série O Teatro no Brasil (1972-1986), de Lothar Hessel e Georges Raeders, cujas obras dedicadas ao século XIX trataram dos teatros e autores, do Norte ao Sul do Império. Esses historiadores tiveram a preocupação de narrar informações relativas aos espetáculos nas províncias (título de peças, datas de encenações, companhias atuantes), porém não se debruçaram sobre os textos, sobretudo, as traduções que compuseram os repertórios representados. Para a narrativa da constituição da literatura dramática nacional adotaram-se os parâmetros das escolas literárias, o que verificamos nas tradicionais histórias do teatro brasileiro, como também em grande parte da crítica teatral de meados do século XX. Sobre o período compreendido pelo Romantismo, ou ainda pelo Pré-Romantismo12, um ator, João Caetano, e alguns dramaturgos foram selecionados como os carros-chefes, ao passo que

Etnográfico do Brasil (1922, p. 1532-1550). Posteriormente, foi publicado pela revista de teatro Dionysos (1955, p. 13-51). MENDONÇA, Carlos Süssekind de. História do Teatro Brasileiro. Rio de Janeiro: Mendonça, Machado e C., 1926. PAIXÃO, Múcio da. O Teatro no Brasil. Rio de Janeiro: Moderna, 1936. SILVA, Lafayette. História do Teatro Brasileiro. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Saúde, 1938. SOUSA, José Galante de. O Teatro no Brasil. Tomos I e II. Rio de Janeiro: INL, 1960. 11 BOCCANERA JÚNIOR, Sílio. O Teatro na Bahia: da colônia a república, 1800-1923. Bahia: Imprensa Oficial do Estado, 1924. RUY, Afonso. História do Teatro na Bahia. Salvador: Universidade da Bahia, 1959. JANSEN, José. Teatro no Maranhão: até o fim do século XIX. Rio de Janeiro: Olímpica, 1974. SALLES, Vicente. Épocas do Teatro no Grão-Pará ou Apresentação do Teatro de Época. Belém: UFPA, 1994. FERREIRA, Athos Damasceno. Palco, Salão e Picadeiro em Porto Alegre no Século XIX. Porto Alegre: Editora Globo, 1956. AMARAL, Antonio Barreto do. História dos Velhos Teatros de São Paulo: da Casa da Ópera ao Teatro Municipal. São Paulo: Governo do Estado de São Paulo, 1979. 12 Na obra História do Teatro Brasileiro (1996), Edwaldo Cafezeiro e Carmem Gadelha propuseram a subdivisão dos dramaturgos em pré-românticos ou pós-iluministas (Gonçalves de Magalhães, Araújo Porto- Alegre e Burgain) e românticos (Gonçalves Dias, Macedo, Castro Alves, Álvares de Azevedo e Agrário de Menezes). A produção dramática dos românticos foi classificada como “drama da tirania”. Ver CAFEZEIRO, Edwaldo & GADELHA, Carmem. História do Teatro Brasileiro: um percurso de Anchieta a Nelson Rodrigues. Rio de Janeiro: Editora UFRJ: EDUERJ: FUNARTE, 1996, p. 131-201.

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outros, uma vez que seriam “apenas uma recordação cada dia mais apagada”13, nas palavras de José Veríssimo, figuraram timidamente em segundo plano. Em síntese, Domingos Gonçalves de Magalhães (1811-1882) e sua tragédia Antônio José ou o Poeta e a Inquisição (1838) foram instituídos como o marco do nascimento do teatro brasileiro, ao lado das comédias de Martins Pena, interpretadas como espelhos da sociedade imperial. Leonor de Mendonça (1846), muito provavelmente a única peça de Antônio Gonçalves Dias (1823-1864) montada na época14, foi promulgada como o drama de amor mais bem-sucedido do Romantismo. Em segundo plano, figuram as dramaturgias de Louis Antoine (Luís Antônio) Burgain (1812-1876), Manuel de Araújo Porto-Alegre (1806-1879)15, Antônio Gonçalves Teixeira e Sousa (1812-1861) e Joaquim Norberto de Sousa e Silva (1820-1891), cujos dramas foram avaliados como de menor expressão. Burgain, por ser um francês de nascimento, pode ter suscitado nos historiadores a questão da nacionalidade brasileira, extremamente debatida nas histórias literárias e teatrais no caso do comediógrafo Antônio José da Silva (1705-1739), o Judeu, que nasceu no Brasil e se mudou para Portugal, onde produziu sua obra dramática.16 Quando incluído nas histórias teatrais e nos ensaios sobre o teatro, salvo as considerações positivas de Hessel e Raeders e de Ivete Huppes17, Burgain foi tratado de forma depreciativa como um autor de melodramas. Ao seguir uma cronologia proveniente da História da Literatura, baseada no encadeamento linear de autores e obras nacionais selecionados, um problema conceitual emerge: o teatro é entendido frequentemente enquanto literatura dramática apenas, estudado pelo viés da fundação da literatura nacional e em respeito à hierarquia dos gêneros. Se pensarmos na história do drama forjada no seio desses princípios, três consequências são identificáveis: primeira, o apagamento ou a condenação do repertório de melodramas

13 VERÍSSIMO, José. História da Literatura Brasileira. 5 ed. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1969, p. 255. 14 Vilma Arêas reproduziu a informação presente na introdução de Gonçalves Dias teatro completo (1979), assinada por Marlene de Castro Correia, sobre a alusão de Manuel Bandeira a uma encenação de Leonor de Mendonça, em 1848, em São Luís do Maranhão. (Ver ARÊAS, Vilma. Variações do “amor cortês” em Leonor de Mendonça e em O Casamento de Fígaro. Teresa Revista de Literatura Brasileira, São Paulo, vol. 12 e 13, 2013, p. 229). 15 A obra dramática de Porto-Alegre foi resgatada somente no final do século XX, reunida em dois volumes, publicados em 1988 e 1997. Ver PORTO-ALEGRE, Manuel de Araújo. Teatro Completo de Araújo Porto- Alegre. GUERRA, Renata & CAFEZEIRO, Edwaldo (Org.). 2 Vol. Rio de Janeiro: INACEN: UNIRIO: FUNARTE, 1988-1997. 16 Sobre a questão, ver FARIA, João Roberto. O lugar da dramaturgia nas histórias da literatura brasileira. Sala Preta, São Paulo, vol. 10, 2010, p. 10-11. 17 Ver HESSEL, Lothar & RAEDERS, Georges. O Teatro no Brasil sob D. Pedro II. 1ª Parte. Porto Alegre: UFRGS: IEL, 1979, p. 46-53, e HUPPES, Ivete. Gonçalves de Magalhães e o Teatro do Primeiro Romantismo. Porto Alegre: Movimento; Lajeado: FATES, 1993, p. 154-162.

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franceses disseminados pelos palcos brasileiros durante o Oitocentos; segunda, a valorização da estética realista, que pretendia representar ou problematizar questões da sociedade brasileira; e terceira, a detração das peças, tanto estrangeiras quanto nacionais, tecidas por elementos da poética do melodrama. Podemos acompanhar esse movimento analítico em importantes estudos críticos do século XX. Almeida Prado se debruçou sobre os dramas oitocentistas em ensaios que se tornaram referências para os estudos acadêmicos subsequentes. Com o objetivo de estabelecer a formação da literatura dramática nacional, o crítico concluiu, a partir da noção de sistema literário, concebida por Antonio Candido, que o teatro brasileiro teria integrado no Romantismo, pela primeira vez, autores, atores, obras e público.18 Para Almeida Prado, apesar de a dramaturgia romântica ter iniciado o processo de criação do teatro nacional, a extrema preocupação com a moral e a recorrência ao fantasioso teriam afetado negativamente a produção de autores brasileiros do período.19 Sua abordagem resulta de duas considerações: primeiro, da concepção do teatro do século XIX como parte de um processo, articulado pela ideia de oposição e evolução das escolas literárias (Romantismo versus Classicismo, Realismo versus Romantismo); segundo, o crítico diferencia uma dramaturgia de elevado valor literário – as “melhores peças”20 – de uma dramaturgia menor. A ideia de evolução do teatro brasileiro traz implícito um pressuposto. Se se trata de um processo evolutivo, o início deste, que corresponde ao Romantismo, não representaria ainda o produto final, isto é, uma literatura originalmente nacional. A produção do Romantismo seria uma espécie de pré-dramaturgia nacional, concebida quando os autores estariam testando um modelo que melhor se adequasse às especificidades sociais do país tropical. Essa noção do teatro brasileiro in progress também está presente em Ruggero Jacobbi, que filia o teatro romântico a uma fase artesanal da literatura dramática brasileira, caracterizada por uma “rudimentar e confusa atividade cênica”.21 Contudo, sabemos que a produção nacional foi significativa, como demonstraram os estudos de Ivete Huppes, que

18 Cf. FARIA, João Roberto. “Um tema: a formação do teatro brasileiro”. In: FARIA, João Roberto; ARÊAS, Vilma & AGUIAR, Flávio (Org.). Décio de Almeida Prado: um homem de teatro. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1997, p. 269-270. 19 Ver PRADO, Décio de Almeida. O Drama Romântico Brasileiro. São Paulo: Perspectiva, 1996, p. 187-198. 20 Ibidem, p. 9. 21 JACOBBI, Ruggero. Teatro no Brasil. Tradução de Alessandra Vannucci. São Paulo: Perspectiva, 2012, p. 123.

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listou a produção de autores do denominado primeiro Romantismo, e de Elizabeth Azevedo, que se dedicou aos dramas dos estudantes da Faculdade de Direito, em São Paulo.22 Como toda evolução pressupõe um aperfeiçoamento, a partir da década de 1850, o teatro teria começado a realizar mudanças substanciais, ao filiar-se à estética realista, preocupada em representar a sociedade brasileira contemporânea e seus entraves. O principal exemplo desse fenômeno seria a peça O Demônio Familiar, de Alencar, que trata do tema espinhoso da escravidão no Brasil. Segundo Almeida Prado, tais mudanças teriam se dado no centro literário, isto é, no Rio de Janeiro, ao passo que na “província [...] não tinham acompanhado devidamente a evolução do teatro”.23 No ensaio “O advento do romantismo”, Almeida Prado estudou a presença da dramaturgia francesa no Brasil, no período em que os dramaturgos se empenharam na efetivação do projeto de fundação do teatro nacional.24 A ampla difusão do melodrama francês nos palcos brasileiros e a adoção de sua poética pelos nossos dramaturgos foram interpretadas no seio da noção comparativa de influência, o que levou à compreensão da prática de importação de repertório como nociva ao desenvolvimento da literatura dramática nacional. Segundo Almeida Prado, dois movimentos teatrais teriam coexistido: o dos atores e o dos autores. O primeiro seria “alimentado pela dramaturgia popular estrangeira”, ao passo que o segundo “raramente chegava ao palco”.25 Nota-se uma cesura entre o gosto do público pela fórmula do melodrama e as obras não melodramáticas de dramaturgos nacionais, as quais, quando eram criadas, se criadas, não alcançavam ampla aceitação da plateia. O repertório dos atores, “inclusive os de maior renome como João Caetano”26, seria diretamente determinado pela bilheteria, daí o atendimento ao gosto do público com as montagens recorrentes de melodramas. A bilheteria explicaria não apenas a disseminação de traduções de melodramas franceses, mas também a adoção de elementos do gênero pelos dramaturgos brasileiros, cujas “penas terminavam reconhecendo, mesmo se a contragosto”27, a sua importância.

22 Ver HUPPES, 1993, p. 183-197, e AZEVEDO, Elizabeth R. “O drama”. In: FARIA, João Roberto (Org.). História do Teatro Brasileiro: das origens ao teatro profissional da primeira metade do século XX. Vol. 1. São Paulo: Perspectiva: Edições SESCSP, 2012, p. 94-118. 23 PRADO, 1996, p. 195. 24 Ver Idem. “O advento do romantismo”. In: Teatro de Anchieta a Alencar. São Paulo: Perspectiva, 1993, p. 121-140. 25 Idem, op. cit., p. 189. 26 Ibidem, p. 188. 27 AGUIAR, Flávio (Org.). O Teatro de Inspiração Romântica. São Paulo: Editora SENAC, 1998, p. 8.

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Apesar do sucesso do melodrama nos palcos, a ótica hierarquizante dos gêneros dramáticos orientou as histórias teatrais para a valorização de modalidades filiadas à estética realista. Esse movimento analítico relegou o melodrama a segundo plano, considerado um gênero exagerado e inverossímil, porque fragiliza um dos alicerces da ação, a verossimilhança externa, isto é, a relação com a realidade imediata dos espectadores e a plausibilidade dos fatos encenados. No século XIX, o melodrama já abarcava sentidos associados a uma forma teatral sentimentalista. Daí o progressivo abandono do termo pelos dramaturgos franceses, a partir da década de 1830. Com a diversificação das mídias culturais, a partir do século XX, o melodrama deixou de fazer referência apenas a obras dramáticas, e conotações cada vez mais negativas foram aglutinando-se ao termo, que passou a identificar todo produto cultural (literário, cinematográfico, televisivo) considerado um “divertimento de baixa gama”28, que provocaria a infantilização do público e o reduziria à passividade. De acordo com Peter Brooks, as conotações que a palavra melodrama apresenta em nossos dias encontram-se consolidadas.

As conotações da palavra são provavelmente similares para todos nós. Elas incluem: o gosto por emoções fortes, polarização e esquematização da moral, estados extremos do ser, de situações e de ações; vilania manifesta, perseguição dos bons e recompensa final da virtude; uma expressão exagerada e extravagante; intrigas obscuras, suspense, peripécias de perder o fôlego.29

A historiografia teatral brasileira esteve obstinada a escrever uma história do teatro do século XIX que fizesse evoluir as estéticas dramáticas a par das escolas literárias, do Neoclassicismo ao Romantismo, depois ao Realismo, e assim por diante. Acreditamos que essa perspectiva impediu de verificar a complexa dinâmica da atividade teatral no Brasil, ao desconsiderar elementos da arte da cena, das trupes e da economia dos espetáculos. Impossibilitou também a avaliação da permanência de uma peça no repertório das companhias ou da sua continuidade nos programas exibidos pelos teatros, prejudicando, assim, um estudo mais acurado pelo viés dos palcos.

28 FIX, Florence. Le Mélodrame: la tentation des larmes. Paris: Klincksieck, 2011, p. 11. No original: “divertissement bas de gamme”. 29 BROOKS, Peter. The Melodramatic Imagination: Balzac, Henry James, melodrama and the mode of excess. Londres; New Haven: Yale University Press, 1976, p. 11-12. No original: “The connotations of the word are probably similar for us all. They include: the indulgence of strong emotionalism; moral polarization and schematization; extreme states of being, situations, actions; overt villainy, persecution of the good and final reward of virtue; inflated and extravagant expression; dark plottings, suspense, breathtaking peripety.”

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Florence Naugrette constatou esse mesmo processo em relação aos estudos historiográficos do drama romântico francês. Segundo a autora, a definição do Romantismo atrelada ao drama romântico se revela problemática, uma vez que empreende critérios de seleção restritos a datas artificiais que marcam o início, o auge e o fim de uma escola literária, e que desconsideram os elementos do repertório que permaneceram por meio da ação de artistas, públicos e leitores.30 A noção de evolução das escolas literárias formatou os textos dramáticos de acordo com as características literárias de cada movimento, o que direcionou a uma ilusão de que as peças inseridas em um período seguiriam, estritamente, as regras literárias de determinada escola. Consequentemente, essa ideia silenciou toda uma produção popular, ou o “drama industrial”, na expressão de Sainte-Beuve31, que nutria mais pretensões espetaculares que literárias. Com vistas ao espetáculo, essas obras operaram uma mistura dos gêneros e conferiram aos efeitos visuais e sonoros a importância da palavra escrita e proferida nos diálogos e monólogos. Daí o surgimento de diferentes termos de classificação: do simples drama e melodrama ao drama de grande espetáculo, drame mêlé de chants (drama entremeado de cantos) e drama-vaudeville. Os melodramas – identificaremos assim as produções nascidas nos teatros populares de Paris – passaram a ser melhor conhecidos após os trabalhos pioneiros de Jean-Marie Thomasseau, Anne Ubersfeld, Peter Brooks e Marie-Pierre Le Hir.32 Ao analisarmos os estudos historiográficos do teatro brasileiro fica patente que a história da presença do melodrama francês no período formativo da dramaturgia nacional foi escrita na perspectiva dos palcos da Corte do Império, vislumbrada pela dominação artística e empresarial de João Caetano, a partir de uma abordagem metodológica embasada nas noções de influência e de fonte/modelo e na ideia de evolução das escolas literárias. Assim, esta tese de doutoramento surgiu da necessidade de outros questionamentos que repensassem essa narrativa, tendo em vista as recentes contribuições de estudos do teatro desenvolvidos no seio da História Cultural e o advento de tecnologias da informação, principalmente as bases de dados que facilitaram o acesso aos textos dramáticos, periódicos e manuscritos do século

30 Ver NAUGRETTE, Florence. “La périodisation du romantisme théâtral”. In: MARTIN, Roxane & NORDERA, Marina (Dir.). Les Arts de la Scène à l’Épreuve de l’Histoire. Paris: Honoré Champion, 2011a, p. 145-154. 31 SAINTE-BEUVE, Charles Augustin. Da literatura industrial. Tradução de Jefferson Cano. Remate de Males, Campinas-SP, vol. 29, n. 2, jul.-dez./2009, p. 195. 32 Ver THOMASSEAU, Jean-Marie. Le Mélodrame sur les Scènes Parisiennes, de “Cœlina” (1800) à “L’Auberge des Adrets” (1823). Lille: Service de Reproduction des Thèses de l’Université, 1974, UBERSFELD, Anne. Le Roi et le Bouffon: étude sur le théâtre de Hugo de 1830 à 1839. Paris: Corti, 2001 [1974], BROOKS, 1976, e LE HIR, Marie-Pierre. Le Romantisme aux Enchères: Ducange, Pixerécourt, Hugo. Amsterdam; Philadelphia: John Benjamins Publishing Company, 1992.

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XIX. Essas abordagens e ferramentas imprimiram novo fôlego aos estudos historiográficos do teatro, demonstrando que o enfoque analítico tradicional gerou pontos cegos, ao desprivilegiar os gêneros que não se enquadraram nos padrões de qualidades literárias. Diante dessa problemática, e tendo em vista que o texto dramático é apenas um dos elementos que circundam a atividade teatral, propomos um estudo que manipula elementos da arte da cena (teatros, atores, ensaiadores, dramaturgos, público e críticos), da economia dos espetáculos e da literatura dramática (o texto, os gêneros, a tradução). O projeto de pesquisa foi moldando-se no decorrer da análise dos dados que recolhemos durante a consulta sistemática aos periódicos brasileiros do século XIX. A princípio, o projeto previa a descrição da presença do melodrama francês nos teatros brasileiros, de 1830 a 1855, e a análise do impacto do gênero na dramaturgia de dois autores da época, Martins Pena e Burgain. No entanto, os dados levantados e as traduções de peças francesas que localizamos revelaram dinâmicas do campo teatral ainda não vislumbradas, ou então mal conhecidas, pela historiografia teatral brasileira. A grande quantidade de dados que coletamos iluminaram os processos de introdução e de permanência do melodrama francês nos palcos, permitindo-nos problematizar as cronologias engessadas das escolas literárias e a descrição da presença dessa dramaturgia estrangeira nos termos de influência passiva. Assim, tendo em vista a emergência de novas pistas sobre a tradução e a apropriação cultural do melodrama francês, reorientamos o projeto de pesquisa e decidimos nos dedicar ao estudo mais aprofundado desses dois processos. Ressaltamos, contudo, que se trata mais de uma colaboração para os estudos históricos e culturais da tradução do teatro oitocentista no Brasil que uma teorização sobre a tradução literária de textos dramáticos. Repensamos a presença do melodrama francês no teatro brasileiro oitocentista, a fim de responder à seguinte questão: como o melodrama foi traduzido e apropriado pelos palcos brasileiros? Estudamos os processos de tradução do texto dramático e de sua apropriação no contexto de recepção. Para tanto, levamos em consideração, além de questões formais da escrita teatral, o contexto social no qual as atividades se desenvolveram, os espaços de representação e a recepção crítica. Acreditamos que, apesar das lacunas das fontes, o emprego sistemático destas e o olhar cuidadoso dedicado aos textos traduzidos contribuem para a reavaliação e enriquecimento da história teatral do século XIX. Como sabemos que a mobilidade das companhias contribuiu para a difusão do repertório teatral nos espaços geográficos, buscamos descentralizar a narrativa histórica da figura de João Caetano e dos palcos do Rio de Janeiro, dando voz aos artistas a ele

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contemporâneos que representaram um repertório semelhante. Assim, resgatamos outros atores brasileiros, como Germano Francisco de Oliveira (1820-1885), Florindo Joaquim da Silva (1814-1893) e Joaquim Augusto Ribeiro de Souza (1825-1873), e portugueses, como Victor Porfírio de Borja (?-?), Joaquim José de Barros (?-1844) e Ludovina Soares da Costa (1802-1868). Tendo em vista a dinamicidade das companhias e o número crescente de artistas atuantes nos teatros, principalmente no Rio de Janeiro, nosso estudo centralizou-se em quatro intérpretes brasileiros: João Caetano, Germano Francisco, Florindo Joaquim e Joaquim Augusto. A escolha dessas figuras levou em conta o fato de que foram atores que protagonizaram um repertório em comum de melodramas e aliaram a arte da interpretação nos palcos com a direção de companhias dramáticas. O objetivo foi menos o de traçar a biografia dos atores-empresários que, a partir dos conceitos de trajetória e de concorrência de Bourdieu33, compreender de que modo seus percursos artísticos e empresariais apropriaram-se do repertório de melodramas, em relações amigáveis de trabalho ou em disputas acirradas pela atenção das plateias e pelas subvenções dos governos. Contudo, pouco se sabe sobre Germano Francisco, Florindo Joaquim e Joaquim Augusto. As informações encontram-se em uma biografia redigida no século XIX, em notícias fragmentárias presentes nas histórias teatrais e em referências indiretas em estudos acadêmicos recentes. A única biografia de Germano Francisco foi escrita pelo maranhense Joaquim Serra, publicada em São Luís, em 1862, quando o ator ainda atuava nos palcos.34 Posteriormente, o artista foi retratado pela historiografia teatral do século XX em função das contendas que travou com João Caetano.35 Mais recentemente, a dissertação de Mestrado de Jacqueline Silva Mendes, Crônica do Teatro Ludovicense em Meados do Século XIX (1852- 1867): arte, negócio e entretenimento (2014), lançou luz sobre Germano Francisco, ao

33 Bourdieu trata da noção de trajetória em “A ilusão biográfica”: “[...] o conjunto de relações objetivas que vincularam o agente considerado [...] ao conjunto dos outros agentes envolvidos no mesmo campo e que se defrontaram no mesmo espaço de possíveis”. (BOURDIEU, Pierre. “A ilusão biográfica”. In: Razões Práticas: sobre a teoria da ação. Tradução de Mariza Corrêa. 9 ed. Campinas, SP: Papirus, 2008, p. 82). Sobre a ideia de lutas de concorrência, baseamo-nos nas discussões empreendidas por Bourdieu em As Regras da Arte. Ver BOURDIEU, Pierre. As Regras da Arte: gênese e estrutura do campo literário. Tradução de Maria Lucia Machado. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. 34 Ver SERRA, Joaquim. Biografia do Actor Brasileiro Germano Francisco de Oliveira. São Luís: Tip. do Progresso, 1862. Agradeço à Jacqueline Silva Mendes pela indicação desta obra. 35 Ver PRADO, Décio de Almeida. João Caetano: o ator, o empresário, o repertório. São Paulo: Perspectiva: Editora da Universidade de São Paulo, 1972, p. 140-141.

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apresentar sua relevante importância na atividade teatral da capital do Maranhão durante os anos 1853 a 1855 e em 1862.36 A história teatral de Hessel e Raeders forneceu breves informações sobre a presença de Germano Francisco em Pernambuco e Maranhão, de Florindo Joaquim e de Joaquim Augusto no Rio Grande do Sul.37 Florindo Joaquim foi tratado apenas indiretamente nos estudos de Silvia Cristina Martins de Souza, As Noites do Ginásio (2002), e de Andrea Marzano, Cidade em Cena (2008), que destacaram a iniciativa empresarial do artista no comando de uma companhia que se apresentou no Rio de Janeiro entre 1851 e 1853.38 A presença de Joaquim Augusto como ator, ensaiador e diretor do Teatro Ginásio Dramático, de 1859 a 1862, foi estudada por João Roberto Faria em O Teatro Realista no Brasil: 1855-1865 (1993).39 Elizabeth Azevedo, em Um Palco sob as Arcadas (2000), mencionou a presença desse ator na cena teatral de São Paulo entre as décadas de 1850 e 1860.40 Diante da impossibilidade de revivermos as encenações oferecidas durante o século XIX por João Caetano, Germano Francisco, Florindo Joaquim e Joaquim Augusto, e do fato de que o espetáculo “não se eterniza como possibilidade de contemplação”41, realizamos um exercício de leitura crítica das fontes oitocentistas disponíveis, a fim de construirmos interpretações possíveis sobre a realização cênica dos textos por esses artistas. Tentamos articular a literatura dramática com o movimento analítico proposto por Tania Brandão para o estudo histórico dos artistas do teatro.

Tal não significa uma história de biografias, mas, antes, a elaboração de um quadro de referência básico para o estudo de cada montagem em que este artista (ou conjunto de artistas) esteve envolvido, viabilizando uma história do teatro eminentemente analítica e crítica em que se poderá localizar tanto a ação das individualidades decisivas quanto a poética da cena, do espetáculo.42

36 Ver MENDES, Jacqueline Silva. Crônica do Teatro Ludovicense em Meados do Século XIX (1852-1867): arte, negócio e entretenimento. 195 p. Dissertação (Mestrado em Artes) – Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014, p. 40-62 e 86-95. 37 Ver HESSEL & RAEDERS, 1979, p. 158, 168-172, 209-210 e 223-224. 38 Ver SOUZA, Silvia Cristina Martins de. As Noites do Ginásio: teatro e tensões culturais na Corte (1832-1868). Campinas, SP: Editora da UNICAMP: CECULT, 2002, p. 49-57, e MARZANO, Andrea. Cidade em Cena: o ator Vasques, o teatro e o Rio de Janeiro (1839-1892). Rio de Janeiro: Folha Seca: FAPERJ, 2008, p. 36-37. 39 FARIA, João Roberto. O Teatro Realista no Brasil: 1855-1865. São Paulo: Perspectiva: Editora da Universidade de São Paulo, 1993, p. 136-140. 40 AZEVEDO, Elizabeth R. Um Palco sob as Arcadas: o teatro dos estudantes de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo, no século XIX. São Paulo: Annablume: FAPESP, 2000, p. 38-39. 41 BRANDÃO, Tania. Folhas ao vento: da arte de pesquisar e escrever História do Teatro. Revista da Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo, vol. 67, 2012, p. 100. 42 Idem. Ora, direis ouvir estrelas: historiografia e história do teatro brasileiro. Latin American Theatre Review, vol. 36, n. 1, Fall 2002, p. 87.

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Para o mapeamento do repertório protagonizado pelos quatro artistas no Rio de Janeiro e nas províncias, recolhemos informações nas histórias teatrais, em estudos acadêmicos e, principalmente, nos impressos da época. Cena e imprensa estabeleceram relações cruzadas no século XIX.43 A imprensa diária e as revistas teatrais divulgavam anúncios de espetáculos, crônicas e artigos críticos dos programas teatrais exibidos, comentários espontâneos do público e comunicados de atores. A leitura desses textos ofereceu dados que nos permitiram tecer considerações sobre as circunstâncias de encenação dos melodramas e a recepção crítica aos espetáculos. Fizemos a leitura de periódicos da capital do Império e das províncias disponíveis no acervo da Hemeroteca Digital Brasileira, site mantido pela Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.44 Consultamos também periódicos franceses e dossiês da Collection Auguste Rondel, depositada na Bibliothèque des Arts du Spectacle (BNF – Bibliothèque Nationale de France). Para analisarmos as discussões que o repertório de melodramas franceses desencadeou no Brasil, recorremos aos textos de crítica teatral que avaliaram as montagens dos atores- empresários. Grande parte dos textos críticos de Martins Pena, Gonçalves Dias, Machado de Assis, Alencar e Macedo já se encontra reunida em volumes editados. Ademais, recolhemos textos opinativos anônimos e comentários espontâneos de espectadores, que assinavam sob pseudônimos. Consultamos também os pareceres de censura do Conservatório Dramático Brasileiro referentes ao repertório dos quatro artistas. Esses manuscritos permitiram, igualmente, compreender quais questões as peças suscitaram nos homens de letras brasileiros e o impacto da instituição censora na atividade de tradução da dramaturgia francesa. O recorte temporal adotado não segue a periodização das escolas literárias. Se assim fosse feito, seria indicada uma data artificial, pois o repertório estudado permaneceu nos palcos após o tempo identificado como o fim do Romantismo e o surgimento do Realismo no Teatro Ginásio Dramático, em 1855. A noção do longo século XIX, proposta por Eric Hobsbawm, orientou a periodização que adotamos.45 O estudo se inicia com a introdução mais sistemática dos melodramas franceses nos palcos brasileiros, a partir dos anos 1830;

43 Cf. BARA, Olivier & THÉRENTY, Marie-Ève. Presse et Scène au XIXe Siècle. Relais, réflets, échanges. Médias 19. Disponível em: . Acesso em: 11 nov. 2015. 44 Endereço eletrônico da Hemeroteca Digital Brasileira: . 45 HOBSBAWM, Eric J. A Era das Revoluções, 1789-1848. Tradução de Maria Tereza Teixeira e Marcos Penchel. 32 ed. Rio de Janeiro: Paz & Terra, 2013. HOBSBAWM, Eric J. A Era do Capital, 1848-1875. Tradução de Luciano Costa Neto. 21 ed. Rio de Janeiro: Paz & Terra, 2014. HOBSBAWM, Eric J. A Era dos Impérios, 1875-1914. Tradução de Sieni Maria Campos e Yolanda Steidel de Toledo. 17 ed. Rio de Janeiro: Paz & Terra, 2014.

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passa pela circulação do repertório nos teatros, entre 1840 e 1870; finda-se com a problematização de sua permanência até a primeira década do século XX. O capítulo 1, intitulado “Os Repertórios e os Intérpretes”, apresenta as peças francesas representadas nos teatros do Rio de Janeiro pelos principais intérpretes, notadamente por Ludovina Soares, João Caetano, Germano Francisco, Florindo Joaquim e Joaquim Augusto. Articulamos as trajetórias e os repertórios dos atores com uma reflexão sobre as características dos gêneros (tragédia, drama e melodrama), a partir da problematização da cronologia tradicional da historiografia literária e das classificações engessadas da produção dramática do período. O capítulo 2, “Tradução e Realização Cênica”, propõe análises de traduções de dramas românticos e melodramas franceses encenados no Brasil pelos atores estudados. A partir do cotejo das traduções em português com as edições francesas, assim como da leitura dos pareceres censórios do Conservatório Dramático Brasileiro, das críticas teatrais e dos comentários que levantamos na imprensa da época, interpretamos o processo de tradução tanto a nível do texto quanto de sua mise en scène. O capítulo 3, “Circulação e Disputas”, reconstitui a difusão do repertório de melodramas franceses, comum aos atores apresentados no primeiro capítulo, nas províncias brasileiras, devido à mobilidade desses artistas. Germano Francisco, para conquistar novos espaços nos quais pudesse desenvolver sua carreira de empresário teatral, partiu do Rio de Janeiro, onde os teatros eram dominados pela ação artística e empresarial de João Caetano, rumo às províncias do Norte (Bahia, Pernambuco, Maranhão, Ceará e Pará) e do Sul do Império (Rio Grande do Sul). João Caetano se apresentou em teatros da Bahia, Pernambuco, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Florindo Joaquim, em meados da década de 1850, passou longa temporada em teatros do Sul do Império. Joaquim Augusto representou em teatros do Rio Grande do Sul e da Bahia, porém foi na província de São Paulo onde obteve maiores êxitos como empresário teatral, entre as décadas de 1850 e 1860. Além da circulação interna no Brasil, reconstituímos também as estadias de Germano Francisco, João Caetano e Joaquim Augusto na Europa, os espetáculos nos quais atuaram em Lisboa e as redes de contato que estabeleceram com os homens de letras portugueses. O capítulo 4, “Permanência e Renovação”, problematiza a longa permanência nos palcos brasileiros do repertório de melodramas franceses. Tratamos das relações de coexistência e de conflito que o melodrama estabeleceu com a proposta realista de renovação

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dramática. Por fim, discutimos os resgates de melodramas de sucesso da época de João Caetano, no final do século XIX, pelo ator e empresário teatral José Dias Braga (1846-1910).

* * *

CAPÍTULO 1

OS REPERTÓRIOS E OS INTÉRPRETES

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1.1 O sopro de vida

Félix Pyat publicou, em 1835, um estudo biográfico sobre o ator Bocage (nome artístico de Pierre-Martinien Tousez, 1799-1862), intérprete nos palcos parisienses dos primeiros dramas românticos de Victor Hugo (Marion Delorme, Théâtre de la Porte-Saint- Martin – TPSM, 1831) e de Alexandre Dumas (Antony, TPSM, 1831, La Tour de Nesle, TPSM, 1832, Térésa, Théâtre de l’Opéra-Comique – TOC, 1832, Angèle, TPSM, 1833, e Don Juan de Maraña ou la Chute d’un Ange, TPSM, 1836). Comparou os modos como o autor e o ator se relacionam com a obra dramática. Destituído da glória eterna reservada ao dramaturgo, ao ator caberia a honra efêmera, conquistada quando este daria vida a uma personagem no palco, a poucos passos do público.

O autor pode velar, transpirar, morrer pela sua arte; ele deixa para a posteridade um testemunho escrito que dura tanto quanto a civilização humana. Mas o ator morre, sua obra morre com ele; seu gênio foi efêmero como o som de sua fala. [...] Em compensação, é verdade, o ator vê a glória face a face, e respira o incenso sobre o altar. Diante do público, ele recebe o elogio em primeira mão, saboreia-o e o passa ao poeta, se sobrar.1

De forma semelhante pensava Jules Massenet, admirador dos intérpretes de seus personagens operísticos: “Que alegria inebriante escrever obras, papéis, para artistas que realizarão vosso sonho!”2 Para Massenet, além de dar vida aos personagens, os artistas tornavam reais os sonhos envoltos em uma obra artística pelo seu gênio criador. A partir dos mesmos argumentos, em carta endereçada ao ator Joaquim Augusto, artista que protagonizou o drama Gonzaga ou a Revolução de Minas (1867), Castro Alves dividiu sua obra com o intérprete, pois este fora o responsável por conferir alma ao protagonista.

Agora conversemos sobre o nosso Gonzaga, nosso, sim! Porque ele amanhã será tão seu quanto meu, seu pelo direito da criação artística, meu apenas pelo direito da

1 PYAT, Félix. Artistes contemporains. I. Bocage. Revue de Paris, Paris, vol. 21, 1835, p. 177 apud BARA, Olivier. “Bocage, acteur de la République: fulgurance d’un nouvel héroïsme théâtral en 1830”. In: BARA, Olivier; LOSCO-LENA, Mireille & PELLOIS, Anne (Dir.). Les Héroïsmes de l’Acteur au XIXe Siècle. Lyon: Presses Universitaires de Lyon, 2014, p. 117. No original: “L’auteur peut veiller, suer, mourir à la peine pour son art ; il laisse après lui un témoignage écrit qui dure autant que la civilisation humaine. Mais l’acteur mort, son œuvre est morte avec lui ; son génie a été éphémère comme le son de sa parole. [...] Par compensation, il est vrai, l’acteur voit la gloire face à face, et respire l’encens sur l’autel même. Devant le public, il reçoit la louange de première main, la savoure et la passe au poète, s’il en reste.” 2 MASSENET, Jules. Mes Souvenirs (1848-1912). Paris: L. Lafitte, 1912, p. 178. No original: “[...] quelle joie enivrante d’écrire des ouvrages, des rôles, pour des artistes qui réaliseront votre rêve !” 36

invenção dramática... mais seu ainda porque há de dar-lhe alma, ao passo que eu apenas dei-lhe corpo.3

Os excertos de Pyat e Massenet, na França, e de Castro Alves, no Brasil, revelam que a idealização do escritor romântico como um gênio criador, uma entidade divina que teria “recebido do céu o dom de comover os corações”, que tiraria de seu “gênio todo um mundo poético e encantador”, animando-o “com o sopro” de sua alma, imprimindo em seus sonhos “o selo da realidade”4, deslizou aos grandes atores. Estes eram imbuídos da tarefa de selar o elo entre o dramaturgo, a obra e o público; responsáveis por completar o processo de ilusão teatral, idealizado pelo autor e construído pelos componentes do espetáculo (cenografia, fábula, personagem, mundo representado) que provocam o efeito de real. Ao fazer uso de seu dom artístico, que lhe permitiria imprimir na personagem o sopro de vida, a alma divina, tornando-a viva e acessível ao espectador à sua frente, o ator cumpriria, assim, o seu compromisso com a arte dramática. O ideário romântico concebeu o ator como um gênio celestial, um ser que transcende o terreno, em conexão direta com o mundo espiritual; responsável por transpor sua alma no texto do dramaturgo e expressar fielmente as emoções por ele almejadas. Apesar de o trabalho do ator sempre ter sido associado à arte de dar vida a uma personagem no palco, a ideia romântica se distancia da concepção moderna, surgida no começo do século XX, sobretudo com os estudos de Constantin Stanislavski sobre as técnicas de criação de personagens, que conferiu maior autonomia artística ao ator em relação ao texto e seu autor.

É isso que nós fazemos com a obra do dramaturgo. Fazemos viver aquilo que se oculta sob as palavras; pomos nossos próprios pensamentos nas linhas do autor e estabelecemos as nossas próprias relações com os outros personagens da peça e com as suas condições de vida. Filtramos, através de nós, todo o material que recebemos do autor e do diretor. Elaboramos esse material, completando-o com a nossa própria imaginação.5

3 ALVES, Castro. “Carta ao ator Joaquim Augusto Ribeiro de Souza. 1868”. In: FARIA, João Roberto. Ideias Teatrais: o século XIX no Brasil. São Paulo: Perspectiva: FAPESP, 2001, p. 421. 4 Retiramos esta descrição do escritor do artigo de J. S. publicado na Revue de Paris, em 1844. No original: “Soyez un grand écrivain et un grand poète ; ayez reçu du ciel le don d’émouvoir les cœurs et la puissance créatrice ; que chacune de vos fantaisies revête un corps, s’ébatte au soleil et vive de la vraie vie ; tirez de votre génie tout un monde poétique et charmant ; animez-le du souffle de votre âme ; imprimez à vos rêves le cachet brûlant de la réalité [...]”. (J. S. Revue Dramatique. Revue de Paris, 1844, p. 479. In: Cote 8-RF-40596 – Recueil factice d’art. de presse et programmes sur “Don César de Bazan” de Dumanoir et Dennery, Collection Auguste Rondel, Bibliothèque des Arts du Spectacle, BNF – Richelieu). 5 STANISLAVSKI, Constantin. A Preparação do Ator. Tradução de Pontes de Paula Lima. 29 ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012, p. 82. 37

Se na França, Bocage, Étienne Mélingue (1807-1875) e, sobretudo, Frédérick Lemaître (1800-1876) foram considerados atores ícones, por encarnarem nos palcos os papéis das peças mais emblemáticas da cena romântica, no Brasil, esse posto foi conferido postumamente a João Caetano. Em vida, João Caetano foi frequentemente descrito como um artista que se identificava intrinsicamente com os papéis que representava, como a alma que se conecta a uma personagem idealizada pelas palavras do autor. Usufruiu da reputação de artista inimitável, como asseverou uma crítica teatral publicada na revista fluminense O Álbum Semanal, a 4 de julho de 1852. O folhetinista avaliou o espetáculo que exibira a peça A Dama de Saint-Tropez (La Dame de Saint-Tropez, TPSM, 1844), de Auguste Anicet- Bourgeois e Adolphe Dennery, na qual João Caetano desempenhara o papel do protagonista Jorge Maurício.

O drama que levou à cena foi o intitulado A Dama de S. Tropez, e dizer que nele o artista esteve sublime é asseverar o que todos sabem, e o que todos sempre tem visto; portanto para não cairmos em repetições, limitar-nos-emos apenas anunciar que o ator João Caetano só poderia ser imitado se fosse possível haver um outro João Caetano.6

Almeida Prado demonstrou que a reconstituição da carreira artística e empresarial de atores se configura em uma porta de entrada reveladora para se estudar o repertório dramático.7 Considerando-se, assim, os intérpretes para o estudo do repertório de melodramas franceses no Brasil, aproximamo-nos da definição de arte dramática proposta por Patrice Pavis, que a concebe não somente em sua extensão literária, mas também como uma prática artística relacionada ao ator.

A expressão é frequentemente empregada no sentido bastante genérico de “teatro”, para designar ao mesmo tempo a prática artística (fazer teatro) e o conjunto de peças, textos, literatura dramática que serve de base escrita para a representação ou para a encenação. A arte dramática é portanto um gênero no seio da literatura e uma prática ligada ao jogo do ator que encarna ou mostra uma personagem para um público.8

Não ignoramos que, além de suporte para a expressão artística de autores e atores, o teatro é um espaço de lutas políticas e financeiras. Assim, inserimos na equação três variáveis inerentes ao contexto do teatro brasileiro oitocentista: o comprometimento dos artistas, em maior ou menor grau, com o projeto de fundação de uma dramaturgia nacional, a

6 REVISTA Theatral. O Álbum Semanal, Rio de Janeiro, 4 jul. 1852, p. 2. 7 Ver PRADO, 1972, principalmente os capítulos “As raízes portuguesas” (p. 5-20), “A escalada neoclássica” (p. 21-34), “A liberação romântica” (p. 35-52) e “O triunfo do melodrama” (p. 73-88). 8 ARTE dramática. In: PAVIS, 2015, p. 25. 38

participação do Estado monárquico na atividade dramática, por meio da censura, da concessão de subvenções e da presença da família imperial nas récitas, e a sujeição das companhias dramáticas e salas de espetáculos às regras comerciais e às leis de mercado. Sabemos que a ideia de construção de uma literatura dramática nacional se deu em tensão com o fenômeno de importação da dramaturgia francesa. Em uma época de poderio da produção teatral de Paris, cidade que atuava como “o atelier dramático do mundo inteiro”, cujo repertório exercia “uma dominação comparada a do cinema americano de nossos dias”9, os brasileiros não foram exceções dessa regra. Simultaneamente ao comprometimento de instituir um teatro com cor local, enlaçaram-se pela produção dramática francesa. Em um contexto no qual o teatro estava ligado fortemente ao campo político, as salas de espetáculos, companhias dramáticas e empresários teatrais, subvencionados ou não pela política imperial, foram estabelecendo as estruturas artísticas e financeiras da atividade teatral, enquanto arte dramática a ser fruída e consumida pelos habitantes não apenas do Rio de Janeiro, mas também das principais capitais das províncias. Nessa dinâmica, muito além da criação de personagens nos palcos, o ator assumia diversos papéis, como o de ensaiador, empresário de companhia dramática e tradutor de peças francesas. Reavaliamos a presença do melodrama francês nos palcos brasileiros, a partir do levantamento dos repertórios de intérpretes que também conferiram o sopro de vida a essas peças, com maior destaque a Ludovina Soares, Germano Francisco, Florindo Joaquim e Joaquim Augusto, atores e diretores de trupes que estabeleceram relações de amizade e de rivalidades com o célebre artista João Caetano. A reconstituição extensiva do repertório de melodramas nos palcos do Rio de Janeiro, entre as décadas de 1830 e 1870, impulsiona a discussão que estabelecemos em torno da classificação das obras dramáticas e das variantes e inovações que o gênero melodrama foi adquirindo ao longo do século XIX.

1.2 O pioneirismo de Ludovina Soares

No século XIX, o teatro não era mais reservado apenas aos atores do sexo masculino, como o foi por um longo período na história mundial do teatro. Apreciadas pela beleza e graciosidade em cena, as atrizes davam vida às personagens femininas, e, a depender

9 YON, Jean-Claude. Théâtres Parisiens: un patrimoine du XIXe siècle. Paris: Citadelles & Mazenod, 2013, p. 11. No original: “[...] une domination qui ne peut se comparer qu’à celle du cinéma américain de nos jours. Paris est bien l’usine à rêves, l’atelier dramatique du monde entier.” 39

do grau de dinamismo do jogo cênico que possuíam, criavam também papéis masculinos, a exemplo da atriz portuguesa Ludovina Soares da Costa. Em maio de 1835, no Rio de Janeiro, ela desempenhou o papel de Jules, Conde de Harancour, personagem surda e muda de O Abade de l’Épée ou a Órfã de Bruxelas (L’Abbé de l’Épée, 1799), de Jean Nicolas Bouilly. Ludovina Soares, assim como outras atrizes que pisaram os palcos brasileiros do século XIX, além de atuar como primeira dama, acumulou um segundo ofício relativo ao universo da atividade teatral.10 Ela dirigiu uma companhia dramática, instalada no Teatro da Praia de D. Manuel (posteriormente, em dezembro de 1838, denominado Teatro de São Januário), no Rio de Janeiro, entre os anos de 1834 e 1839. Ao lado de seu esposo, o ator e ensaiador João Evangelista da Costa (?-1840)11, foi responsável por introduzir, mais sistematicamente, a dramaturgia francesa da cena romântica nos palcos da Corte. A atriz aportou no Rio de Janeiro, em 1829, juntamente com outros artistas portugueses, escriturados em Lisboa para se apresentarem no Teatro Imperial de São Pedro de Alcântara (anteriormente denominado Real Teatro de São João e, posteriormente, Teatro Constitucional Fluminense e Teatro de São Pedro de Alcântara).12 A base da trupe era constituída por membros da família de Ludovina Soares: seus irmãos, Teresa Soares, Maria Soares (?-1855) e Manoel Soares (?-1859), e seu esposo, João Evangelista. A companhia dramática era ainda constituída por outros artistas que foram importantes nos palcos brasileiros durante as décadas subsequentes, como as atrizes Gertrudes Angélica da Cunha (1794-1850) e sua filha, Gabriela da Cunha (1821-1882), e o ator Victor Porfírio de Borja. Em 1831, a companhia dramática de Ludovina Soares escriturou João Caetano, um ator promissor, que iniciara a carreira artística no Teatro de Itaboraí, onde encenara a peça

10 Para citar alguns exemplos: a atriz portuguesa Gertrudes Angélica da Cunha foi também dramaturga; Maria Velluti (1827-1891), que se casou com o ator Joaquim Augusto, traduziu peças francesas; Eugênia Câmara (1837-1874) foi autora, tradutora e administrou uma companhia dramática. 11 João Evangelista da Costa teria atuado em teatros de Lisboa antes de aportar no Brasil: Teatro de Buenos Aires, em 1808, Teatro do Salitre, por volta de 1826, e Teatro da Rua dos Condes, em período anterior a sua chegada no Brasil, em 1829. (Cf. BASTOS, Sousa. Carteira do Artista. Lisboa: Antiga Casa Bertrand – José Bastos, 1898, p. 481, e THEATRO de Buenos Ayres e Theatro da Rua dos Condes. In: BASTOS, Sousa. Diccionario do Theatro Portuguez. Lisboa: Imprensa Libanio da Silva, 1908, p. 323 e 360). 12 O Real Teatro de São João, idealizado por D. João VI, foi inaugurado em 1813. Após a Independência, durante o governo de D. Pedro I, pequenas salas de espetáculos, tais como o Teatro do Porphyrio ou Teatro da Rua do Lavradio, o Teatro do Plácido e o Teatrinho do Largo de São Domingos, alegravam as noites na Corte, juntamente com os espetáculos oferecidos pelo Teatro Imperial de São Pedro de Alcântara, nova denominação do Real Teatro de São João. Com o retorno de D. Pedro I a Portugal e a vitória dos liberais, em 1831, o teatro passou a ser designado Teatro Constitucional Fluminense até 1838, quando, definitivamente, foi nomeado Teatro de São Pedro de Alcântara. Após sofrer três incêndios (em 1824, 1851 e 1856) e passar por três reconstruções, a sala de espetáculos foi demolida em 1929. Em seu lugar foi construído o Teatro João Caetano que, atualmente, é de propriedade da Fundação de Artes do Rio de Janeiro (FUNARJ). Sobre a longa história dessa casa de espetáculos, ver DIAS, José da Silva. Teatros do Rio: do século XVIII ao século XX. Rio de Janeiro: FUNARTE, 2012, p. 68-100. 40

O Carpinteiro da Livônia (Le Menuisier de Livonie ou les Illustres Voyageurs, 1805), de Alexandre Duval (pseudônimo de Alexandre Vincent-Pineux). Contudo, após atritos com os artistas portugueses, João Caetano se transferiu para o Teatro Niteroiense13, situado no antigo Caminho do Capitão Mor (hoje Rua XV de Novembro), em Niterói, e lá formou a Companhia Dramática Nacional, composta por atores brasileiros, dentre os quais Estela Sezefreda (1810- 1874), que se tornaria sua esposa. O espetáculo de estreia de sua trupe ocorreu a 2 de dezembro de 1833 com a peça O Príncipe Amante da Liberdade ou a Independência da Escócia, cuja autoria é atualmente desconhecida. A peça já havia sido encenada, em 1822, no Teatro de São João, em espetáculo que celebrou a Independência do Brasil, o que revela a estreita relação que o teatro mantinha com o poder político e como as salas de espetáculos se constituíam em espaços de realização de eventos cívicos.14 Tendo em vista o histórico da peça no Rio de Janeiro, a sua escolha para a estreia da Companhia Dramática Nacional não parece ter sido gratuita, pois, assim, o ator expressava o caráter nacional da companhia que fundara.15 A companhia dramática de Ludovina Soares permaneceu por pouco tempo no Teatro Constitucional Fluminense. Em 1834, o grupo de atores portugueses se instalou no recém-construído Teatro da Praia de D. Manuel, localizado na Rua do Cotovelo, entre a Rua e a Praia de D. Manuel. A sala de espetáculos foi inaugurada a 2 de agosto de 1834, dia do décimo aniversário da Princesa D. Francisca de Bragança, quarta filha de D. Pedro I, em espetáculo que exibiu Misantropia e Arrependimento, muito provavelmente, na tradução livre de Ayres Antonio Teixeira de Aguiar da versão francesa do drama alemão Menschenhass und Reue (1790), de Augustus Frederick Ferdinand von Kotzebue.16

13 O Teatro Niteroiense, de propriedade de José Francisco Furtado de Mendonça, foi construído em Niterói, em 1827. Em julho de 1840, o teatro começou a ser administrado pela Sociedade Filodramática de Niterói que o explorou até 1842, quando a sala de espetáculos foi adquirida por João Caetano e renomeada Teatro de Santa Tereza. Com a morte do ator, em 1863, sua esposa, Estela Sezefreda, devolveu o teatro ao Governo Provincial, rescindindo o contrato de concessão. Posteriormente, a sala de espetáculos passou por diversas administrações e reformas ao longo dos séculos XIX e XX. A última reinauguração do teatro, atualmente denominado Teatro Municipal João Caetano, data de 1995. (Cf. DIAS, 2012, p. 203-212). 14 “[...] SS. MM. II. com sua augusta filha foram ao teatro às 8 horas e meia, com grande acompanhamento. [...] a orquestra principiou a sinfonia; finda esta recitou-se um assaz bem feito Elogio Dramático alusivo ao aniversário natalício de S. M. I., à Independência do Brasil e sua elevação à categoria de Império. Findo o Elogio cantaram de três camarotes contíguos da ordem nobre vários cidadãos conspícuos um novo Hino Nacional [...]. Seguiu-se a representação pela Companhia Portuguesa do drama em três atos Independência da Escócia, traduzido livremente e acomodado ao atual sistema do Império do Brasil, mas cuja execução, ou por mal ensaiada, ou por não estar nas forças da companhia, não satisfez os espectadores, principalmente no terceiro ato no assalto da praça”. (CORREIO do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 16 out. 1822, p. 689). 15 Cf. PRADO, 1993, p. 100-101. 16 Em 26 de setembro de 1838, o Teatro da Praia de D. Manuel recebeu a denominação de Teatro de São Januário, em homenagem à Princesa D. Januária Maria de Bragança, irmã de D. Pedro II. Segundo José Dias, o teatro permaneceu fechado por um período da década de 1840. Entre 1848 e 1850, a companhia dramática de João Caetano ali se apresentou. Em 1862, a sala de espetáculos foi renomeada Teatro Ateneu Dramático, 41

Entre 1834 e 1839, a trupe de Ludovina Soares estreou um rico repertório dramático francês no Teatro da Praia de D. Manuel/Teatro de São Januário. Os artistas portugueses foram decisivos na introdução mais sistemática de traduções inéditas da dramaturgia francesa nos palcos do Rio de Janeiro, tendo em vista que, até então, as representações de obras de autores franceses haviam sido raras. Como averiguamos, da década de 1820 aos primeiros anos de 1830, os programas teatrais exibidos pela principal sala de espetáculos do Rio de Janeiro, o Teatro Imperial de São Pedro de Alcântara/Teatro Constitucional Fluminense, eram constituídos por óperas clássicas italianas, principalmente de Rossini, como L’Italiana in Algeri (1813) e Il Barbiere di Siviglia (1816), e por peças portuguesas, como a tragédia Nova Castro (1803), de João Baptista Gomes Júnior, e as farsas de Antônio Xavier Ferreira de Azevedo (1784-1814), a exemplo de Manuel Mendes, Os Doidos ou o Doido por Amor, O Marido Mandrião, A Parteira Anatômica e O Velho Perseguido. Nessa época, As Minas da Polônia, tradução de Antônio Xavier do melodrama Les Mines de Pologne (TAC, 1803), de Guilbert de Pixerécourt, foi o caso mais bem-sucedido de montagem de uma peça francesa.17 Identificamos, aproximadamente, trinta dramas e melodramas de diferentes autores franceses representados por Ludovina Soares e sua companhia dramática. Os artistas encenaram obras de Louis-Sébastien Mercier, Victor Ducange, Victor Hugo, Anicet- Bourgeois, Pixerécourt e Alexandre Dumas (pai). Essas peças foram criadas em Paris, entre 1780 e 1837, sobretudo no Théâtre de l’Ambigu-Comique e no Théâtre de la Porte-Saint- Martin, localizados no Boulevard du Temple. Um repertório diverso que incluía dramas do final do século XVIII, melodramas clássicos, dramas e melodramas românticos.18 A introdução mais sistemática da dramaturgia francesa nos palcos do Rio de Janeiro se deu em um momento em que a necessidade de renovação do repertório era sentida na cena teatral, que passava a contar, a partir de então, com duas companhias dramáticas concorrentes: a trupe portuguesa, instalada no Teatro da Praia de D. Manuel, e a companhia dramática de João Caetano, que se apresentava no Teatro Constitucional Fluminense/Teatro de São Pedro de Alcântara. Os valores simbólicos conferidos à dramaturgia francesa na época, como as inovações românticas na poética dramática, e o intenso processo de exportação do voltando a se denominar Teatro de São Januário em 1863. O teatro foi demolido em 1868 para a construção da Secretaria de Viação. (Cf. DIAS, 2012, p. 104-106). 17 A tradução As Minas da Polônia foi publicada no periódico de Lisboa Jornal de Comédia e Variedades (1835- 1836), assim como Roberto, Chefe de Ladrões e Santo Antônio Livrando o Pai do Patíbulo, outros dramas de Antônio Xavier. (Cf. ANTONIO Xavier Ferreira d’Azevedo. In: SILVA, Inocêncio Francisco da. Diccionario Bibliographico Portuguez. Tomo primeiro. Lisboa: Imprensa Nacional, 1858, p. 297-298). 18 Ver anexo “Tabela 1 – Repertório Francês da Companhia Portuguesa no Teatro da Praia de D. Manuel (1834- 1838) / Teatro de São Januário (1839)”. 42

repertório, fizeram da produção dos teatros populares parisienses uma fonte atraente de peças inéditas a alimentar os palcos do Rio de Janeiro. O repertório da companhia dramática de Ludovina Soares ganhou novo fôlego com a chegada de Joaquim José de Barros, ator que estivera no Rio de Janeiro, em 1832, e retornava em 1837, “mandado escriturar em Lisboa”19 para a companhia do Teatro da Praia de D. Manuel. Nessa época, Joaquim de Barros, ao lado de Ludovina Soares, representou traduções de melodramas franceses realizadas pela pena de Luís José Baiardo e criou nos palcos os principais papéis da dramaturgia de Joseph Bouchardy. O artista protagonizou, em 1839, Gaspardo, o Pescador ou o Herói Milanês (Gaspard, TAC, 1837), em 1840, O Sineiro de São Paulo (Le Sonneur de Saint-Paul, TG, 1838), em 1841, Cristóvão, o Sueco (Christophe, le Suédois, TAC, 1839) e, em 1843, Paris o Boêmio (Paris le Bohémien, TPSM, 1842).20 Em 1836, o Teatro da Praia de D. Manuel enfrentou dificuldades financeiras que dividiram os artistas em dois grupos: a maioria, liderada por Ludovina Soares e seu esposo, era favorável às decisões judiciais de venda de bens da companhia para liquidar as dívidas; e a minoria, liderada por Victor Porfírio de Borja, rechaçava as medidas impostas. Diante da crise, os espetáculos teatrais, antes frequentes, começaram a rarear. Em 1839, a sala de espetáculos foi renomeada Teatro de São Januário, e os artistas foram incorporados à companhia dramática do Teatro de São Pedro de Alcântara. De volta ao principal teatro do Rio de Janeiro, Ludovina Soares ali permaneceu como primeira atriz entre as décadas de 1840 e 1850, protagonizando as heroínas dos dramas e melodramas da cena romântica, ao lado de diferentes primeiros atores, como Joaquim de Barros, Florindo Joaquim e João Caetano. Na década de 1860, no final de sua carreira artística, fez modestas aparições em espetáculos oferecidos pela companhia de Furtado Coelho, no Teatro Ginásio Dramático, representando as peças A Cigana de Paris (La Bohémienne de Paris, TG, 1844), de Gustave Lemoine e Paul de Kock, e As Mães Arrependidas (Les Mères Repenties, TPSM, 1858), de Félicien Mallefille.21

19 THEATRO da Praia de D. Manuel. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 2 maio 1837, p. 3. 20 Ver anexo “Tabela 2 – Joseph Bouchardy nos Teatros do Rio de Janeiro”. 21 Ver anexos “Figura 1 – Ludovina Soares da Costa (1802-1868)”, “Figura 2 – Percurso de Ludovina Soares nos Teatros” e “Tabela 3 – Repertório Francês de Ludovina Soares no Rio de Janeiro (1830-1866)”. 43

1.3 O repertório de João Caetano

Em 1834, com a desocupação do Teatro Constitucional Fluminense pelos artistas portugueses, João Caetano se transferiu para esse teatro, ali permanecendo até dezembro de 1840, quando a sala de espetáculos já era denominada Teatro de São Pedro de Alcântara. Nesse intervalo de tempo, amadureceu profissionalmente, uma vez que, além de primeiro ator, assumiu as responsabilidades de ensaiador. Para concorrer com a companhia dramática portuguesa, que oferecia com frequência estreias de peças inéditas no Teatro da Praia de D. Manuel, João Caetano se engajou com o projeto de estruturação do repertório dramático da trupe que dirigia. Em 1838, por meio da imprensa, solicitou aos dramaturgos e tradutores “que tiverem dramas originais, ou traduzidos, e quiserem dá-los à companhia com as mesmas condições do costume, hajam de se dirigirem ao escritório do mesmo teatro”.22 João Caetano começou a estruturar seu repertório, constituído por tragédias, dramas românticos e melodramas, gêneros que expõem a fronteira porosa entre as estéticas neoclássica e romântica naquela época.

1.3.1 Neoclássico e romântico

O gênero trágico ocupou papel de destaque no repertório representado por João Caetano. O ator encenou tragédias originais em português e traduções realizadas, principalmente, por João Batista Gomes Júnior e Gonçalves de Magalhães. Do dramaturgo português, montou a Nova Castro (1803) e a tradução de Fayel (1770), tragédia de François Thomas Marie de Baculard d’Arnaud. De Gonçalves de Magalhães, foi o responsável por criar Antônio José ou o Poeta e a Inquisição (1838) e as traduções Oscar, o Filho de Ossian (Oscar, Fils d’Ossian, 1796), de Antoine Vincent Arnault, Aristodemo (1786), de Vincenzo Monti Ferrarese, e Othelo (Othello ou le More de Venise, 1792), na versão de Jean François Ducis. Traduzida por Gonçalves de Magalhães para “comprazer ao insigne ator”23, que pretendia trilhar pelo caminho consagrado do artista trágico francês François-Joseph Talma (1763-1826), Othelo se tornaria uma das peças mais encenadas pelo Talma brasileiro. O texto

22 THEATRO Constitucional Fluminense. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 19 maio 1838, p. 2. 23 MAGALHÃES, Domingos José Gonçalves de. Obras de D. J. G. de Magalhães. Tomo III – Tragédias. Rio de Janeiro: Livraria de B. L. Garnier, 1865, p. 255. 44

encenado não era o original shakespeariano, mas a reelaboração de Ducis, “que corta no texto todas as passagens a seu ver escabrosas, que edulcora e censura sem pudor para satisfazer ao gosto francês, enchendo de melosas em alexandrinos uma peça cuja áspera beleza é feita de violência”.24 Nessa versão, para atender ao modelo da tragédia neoclássica francesa, consideráveis foram as modificações: adoção das unidades clássicas de tempo, espaço e ação; diminuição da quantidade de personagens; alteração dos nomes para melhor adequação da rima (Desdêmona transformou-se em Hédelmonde, Iago, em Pézare, Cássio, em Lorédan etc.); Hédelmonde não é asfixiada pelo mouro, mas golpeada por um punhal. Alterações que conferiram um tratamento “timorato e cauteloso”25 à história de ciúme e vingança de Shakespeare e que ecoou na produção dramatúrgica de Gonçalves de Magalhães, sobretudo em Antonio José ou o Poeta e a Inquisição.26 Contudo, esse espírito cauteloso no tratamento de temas exacerbantes parece não ter sido suficiente ao tradutor brasileiro, que incluiu um monólogo alternativo a Othelo no desfecho, inexistente nos dois finais, um funesto e outro feliz, propostos por Ducis. No monólogo substitutivo, em meio a lamentações de arrependimento, Othelo revela o desejo de matar Pézaro (Iago), declarando-o o algoz de sua dita. Assim, mesmo tendo traduzido a reelaboração de Ducis, na qual Pézaro figura como personagem secundária, Gonçalves de Magalhães demonstra conhecer a obra original de Shakespeare, ao salientar o papel de Pézaro como o provocador do destino trágico de Othelo. Esse reconhecimento se dá, no entanto, a partir de uma roupagem melodramática, que confere a Pézaro o ethos do vilão do melodrama, ao descrevê-lo como um “falsário infernal”, um “monstro” incitador de “tão negra atrocidade”, e que insere nos lábios do mouro a verbalização de seu livre-arbítrio (“Fujam todos de mim. Odeio tudo. / Tudo me causa horror. Só quero a morte”), suavizando a cena do suicídio, ato que feria preceitos religiosos e a sensibilidade moral. A inclusão desse monólogo convida-nos a pensar sobre a atividade de tradução da dramaturgia francesa e sinaliza para o fato de que os textos representados nos palcos brasileiros não eram, necessariamente, versões ipsis litteris dos textos franceses de partida.

OTHELO – Morta! Morta! E sou eu que lhe abro a campa! Oh vítima inocente! Oh dor! Oh fúria! Para sempre arrancai-me a triste vida! Minha mulher... amigos, lamentai-me.

24 HUBERT, Marie-Claude. As Grandes Teorias do Teatro. Tradução de Eduardo Brandão. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2013, p. 197. 25 GOMES, André Luís. Marcas de Nascença: a contribuição de Gonçalves de Magalhães para o teatro brasileiro. São Paulo: Antiqua, 2004, p. 100. 26 Cf. Ibidem, p. 102. 45

(Abraçando o cadáver). Inda este abraço... já te sigo: morro. (Ferindo-se com o punhal).

ADVERTÊNCIA A fala final de Othelo pode, na representação, ser substituída pela seguinte: Morta!... morta!... e sou eu que lhe abro a campa! Oh vítima inocente!... oh ímpio amigo!... Oh mil vezes cruel, brutal Othelo! E pude perpetrar tão feio crime! Que falsário infernal!... que homem! Que monstro! Quem viu jamais tão negra atrocidade? Oh Pézaro, oh algoz de minha dita! Porque não vens a mim? Porque me foges? Com que prazer te retalhara o peito Com este ferro, que roubou-me a esposa! Oh Hedelmonda! Oh vítima de um tigre! Fujam todos de mim. Odeio tudo. Tudo me causa horror. Só quero a morte. (Mata-se).27

Com exceção de Zaíra (Zaïre, Comédie-Française – CF, 1732), de Voltaire, as tragédias representadas por João Caetano eram composições do final do século XVIII e início do XIX, ou seja, pós-racinianas. Essas composições refletem o processo de renovação poética pelo qual a dramaturgia francesa passava, como consequência do período revolucionário e da modificação social do público de teatro, que se alargava para além dos espaços palacianos, demandando uma nova sensibilidade dramática. Assim, as tragédias protagonizadas por João Caetano, tanto as francesas quanto as de Gonçalves de Magalhães, mantêm a estrutura formal da tragédia neoclássica, mas filtram as grandes personagens e os assuntos elevados (paixão, ciúme, vingança) pelo tratamento patético e pela moral religiosa. Desde o início do Setecentos, elementos da tragédia neoclássica, como a mimese e a catarse, passaram a ser debatidos pelos que repensavam a produção de Jean Racine e Pierre Corneille. A partir dos anos 1750, os dramaturgos iluministas, dentre os quais Jean-Jacques Rousseau, Denis Diderot, L.-S. Mercier e Pierre-Augustin de Beaumarchais, investiram no questionamento do caráter excessivamente rígido dos gêneros dramáticos e do predomínio hierárquico da tragédia neoclássica. Esse grupo propôs um teatro que abordasse temas do cotidiano do homem burguês de sua época, tendo em vista uma “poética dramática fundada

27 MAGALHÃES, 1865, p. 361-362. No texto de Ducis: “OTHELLO – Morte! Morte! Et c’est moi qui l’ai mise au tombeau ! (En la regardant.) Douce et tendre victime! O douleur ! O furie ! Pour jamais ! Pour jamais ! Arrachez-moi la vie. Ma femme, mes amis, oh ! Plaignez mes malheurs. (La serrant dans ses bras.) Que je t’embrasse encore ! Je te rejoins ; je meurs. (Il se frappe et meurt auprès d’elle.)” (DUCIS. Othello ou le More de Venise: tragédie en cinq actes. Paris: Michel Lévy Frères, [s.d.], p. 16, Collection Théâtre Contemporain Illustré). 46

sobre uma convicção nova que enuncia que o prazer teatral se forja pela emoção e se conquista pelos olhos”.28 Desse modo, a catarse da tragédia transformou-se no ensino da virtude pela amplificação dos sentimentos. A vocação do drama nascente era “emocionar o espectador para criar nele um estado de receptividade da instrução moral, partindo da ideia que, o homem sendo naturalmente bom, seria favoravelmente influenciado pelo exemplo da virtude”.29 As novas composições, a exemplo de Le Fils Naturel (1757), de Diderot, não se encaixavam na rígida divisão dos gêneros até então descritos – a comédia, que associava ao cômico o tratamento dos vícios de pessoas do povo, e a tragédia, que abordava as paixões de grandes personagens –, o que suscitou debates entre os teóricos, que tentaram defini-las adotando termos, tais como “tragédia doméstica” (“tragédie domestique”), “comédia lacrimosa” (“comédie larmoyante”) e “drama burguês” (“drame bourgeois”). Os dramas tratavam de questões sobre as relações do indivíduo com o Estado (dinheiro, honra, virtude), aproximando-se de assuntos inerentes ao contexto do novo público de teatro que surgia, o homem burguês. Assim, ao invés de abordar o destino trágico de nobres da Antiguidade Clássica ou de figuras míticas, a natureza da mimese foi modificada, e esta passou a imitar relações humanas entre membros do núcleo familiar (pai, mãe, noivos, irmãos). As personagens, no entanto, representavam apenas uma parcela das ordens sociais francesas da época, não se estendendo a caracteres populares, como o lavrador, por exemplo, que apareceriam nos dramas somente no século XIX. Dentre outras inovações, estavam a valorização do ensinamento moral e a preocupação com o texto teatral mais para ser encenado que lido.30 Tendo em vista esse processo de renovação vivenciado pela dramaturgia francesa no final do Setecentos e o modo como os textos eram traduzidos e encenados nos palcos brasileiros, colocamos em nova perspectiva a ideia da retomada neoclássica de João Caetano durante os anos 1830. Em primeiro lugar, nas tragédias encenadas pelo ator há mais da estética sentimental e patética que da pureza das convenções racionais das tragédias do tipo

28 THOMASSEAU, Jean-Marie. Drame et Tragédie. Paris: Hachette, 1995, p. 111. No original: “poétique dramatique fondée sur une certitude nouvelle affirmant que le plaisir théâtral se forge par l’émotion et se prend par les yeux.” 29 NAUGRETTE, Florence. Le devenir des emplois comiques et tragiques dans le théâtre de Hugo. Communication au Groupe Hugo du 31 mars 2001a, Université Paris 7, p. 7-8. Disponível em: . Acesso em: 8 dez. 2015. No original: “la vocation du drame est d’émouvoir le spectateur pour créer chez lui un état de réceptibilité à l’instruction morale, en partant de l’idée que, l’homme étant naturellement bon, il ne peut qu’être favorablement influencé par l’exemple de la vertu.” 30 Cf. THOMASSEAU, op. cit., p. 107-125. 47

raciniana, por exemplo. O patético, aliás, configurou-se como o cerne do repertório do artista, não importando o gênero a que as peças podem ser classificadas, sendo elas tragédias, dramas burgueses setecentistas, dramas românticos ou melodramas. Em segundo lugar, apesar de ter estreado as tragédias no início da carreira, quando manteve relações de amizade com Gonçalves de Magalhães, e ambos pensavam na fundação de um teatro nacional, as peças Antonio José ou o Poeta e a Inquisição e Othelo nunca saíram do repertório de João Caetano, acompanhando-o até a década de 1860, ao lado dos melodramas. Além das reprises, João Caetano ainda estreou uma tragédia inédita no final de sua carreira artística: encenou pela primeira vez, em dezembro de 1861, Cinna, de Corneille, na tradução de Antonio José de Araújo (1807-1869). Isso nos permite afirmar que, durante o período identificado como romantismo pelas historiografias literária e teatral, operaram-se nos palcos brasileiros os fenômenos de convivência e interpenetração das estéticas neoclássica e romântica, de modo não muito diferente do que ocorreu no teatro francês, tanto em termos de produção dramática quanto de realização cênica. Como bem demonstrou Maurizio Malai, a tragédia juste milieu de Casimir Delavigne “forja um código trágico inédito, um código intermediário entre aquele da tragédia clássica tradicional e aquele do drama romântico”.31 Sem abandonar a trama trágica e a versificação clássica, Delavigne adotou em suas tragédias didascálias que descrevem cenas movimentadas com coro, quadros de bailes, cenários e ações espetaculares, comuns ao gosto romântico. A partir do registro trágico, retratou nobres e reis em situações familiares íntimas, como em Les Enfants d’Édouard (Théâtre-Français – TF, 1833), e representou cenas domésticas de personagens de origem social burguesa. Em Louis XI (TF, 1832), cujas cenas mais descrevem o caráter controverso (entre o grotesco e o sublime) do Rei do que fazem avançar a ação, Delavigne abalou o princípio da concentração e do desenvolvimento unitário da intriga trágica. Ao problematizar questões sociais contemporâneas, como a negação das liberdades políticas, religiosas e sentimentais, Delavigne remodelou o antigo gênero de acordo com as novas exigências de sua época.32 O drama romântico, por sua vez, estabeleceu pontos de contato com os códigos clássicos. Segundo Florence Naugrette, o système des emplois de personagens da dramaturgia de Victor Hugo reconfigurou a antiga grade de empregos de personagens clássicas (primeiro e

31 MELAI, Maurizio. Des convergences entre les dramaturgies classique et romantique sous la Restauration et la Monarchie de Juillet: le théâtre tragique de Casimir Delavigne. Revue d’Histoire du Théâtre – L’Autre Théâtre Romantique, Paris, n. 257, jan.-mars/2013, p. 58. No original: “forge un code tragique inédit, un code intermédiaire entre celui de la tragédie classique traditionnelle et celui du drame romantique naissant.” 32 Cf. Ibidem, p. 61-64 e 68. 48

segundo papéis masculinos, primeiro papel feminino, podendo ser uma Rainha ou uma jovem Princesa, Reis, confidentes-criados, pai e mãe nobres). Se a maioria dessas personagens se faz presente na dramaturgia hugoliana, com a exceção dos confidentes, que são dispensados, elas exigiram, entretanto, a readaptação dos atores, pois alçam voos literários e políticos subversivos, que vão além dos tipos classicamente convencionados. Assim é o caso de Ruy Blas, um valete que desempenha o papel de herói trágico, e Doña Sol, a jovem heroína de estirpe nobre que recebe, em seus aposentos, visitas noturnas de seu amante, um bandido procurado pela polícia do Rei.33 Ainda que guardem certas diferenças, os dois gêneros, a tragédia neoclássica renovada por Delavigne e o drama romântico, propõem “soluções formais e cenográficas similares, sublinham as mesmas temáticas e conduzem os mesmos combates ideológicos”.34 Uma vez constatada a interpenetração entre os gêneros, uma problemática atual dos estudos de dramaturgia do período romântico se refere a uma reavaliação dos traços de continuidade entre a tragédia e o drama, e até mesmo entre os dois gêneros e o melodrama, e as influências que exerceram um sobre o outro. A convivência das estéticas, força motriz que desencadeou processos de mistura dos gêneros dramáticos, menos estanques e tão mais porosos a ponto de permitirem zonas de contato, em um contexto de início da industrialização das estruturas de produção e de recepção do teatro, que, contudo, ainda estava submetido ao campo político, conduz-nos a uma reavaliação da descrição cronológica da história do teatro romântico brasileiro. Assim como na França, não se verifica aqui uma sequência evolutiva e uma ruptura drástica de estéticas ou a suplantação de gêneros dramáticos (da tragédia neoclássica ao drama romântico e melodrama, destes ao drama realista). Mesmo a tragédia Zaïre, de Voltaire, em cujo texto pode ser identificado um “eco da escritura raciniana”35, não recebeu no Rio de Janeiro uma montagem que obedecesse ao requinte das convenções neoclássicas. Voyage Autour du Monde (1840), livro de memórias do dramaturgo, viajante, litógrafo e ilustrador Jacques Arago, que visitou o Brasil entre 1817 e 1818, narra a representação da tragédia de Voltaire no Teatro de São João, no Rio de Janeiro. Bem-humorado, ao avaliar a tradução da peça, Jacques Arago revelou que implorara ao defunto filósofo para que perdoasse a “seu sacrílego tradutor!” De sua análise da personagem Orosmane depreendemos que a mise en scène traíra o jogo cênico moderado da tragédia

33 Cf. NAUGRETTE, 2001a, p. 1-25. 34 MELAI, 2013, p. 68. No original: “des solutions formelles et scénographiques similaires, mettent en avant les mêmes thématiques et conduisent les mêmes combats idéologiques.” 35 THOMASSEAU, 1995, p. 125. No original: “écho de l’écriture racinienne.” 49

neoclássica francesa, em favor de uma caracterização exótica e de expressões corporais e vocais enfáticas.

Orosmano está penteado com um chapéu do qual sobressaem vinte e cinco ou trinta plumas de diversas cores, e dois enormes relógios de corrente levam até o meio da coxa monstruosos pingentes que tilintam de modo semelhante ao do molho de chaves da porteira de um convento. Gigantescos braceletes ornam seus braços nervosos, e suíças charmosas e elegantes em formato de vírgula realçam suas têmporas e vêm acariciar os dois cantos de sua boca. O pedaço de tecido que cai sobre seus ombros não é nem um capote nem uma casaca, nem uma túnica, nem uma capa; mas ele contém as quatro espécies de roupa ao mesmo tempo e não pode se descrever em nenhuma língua. É de assustar o pincel mais ousado do caricaturista. Orosmano fala e gesticula. [...] Os nomes de Ésquilo, de Sófocles e de Eurípedes estão sobre a cortina do proscênio; é tudo o que há de Ésquilo, de Sófocles e de Eurípedes no teatro do Rio.36

Ao lado das encenações de Othelo, João Caetano representou por um longo período da carreira o drama setecentista O Novo Desertor Francês, tradução de Le Déserteur (1770), de Mercier, realizada, segundo Almeida Prado, por Antônio Xavier.37 A peça, que havia estreado no Teatro de São João, no Rio de Janeiro, em 1823, e montada pela primeira vez por João Caetano em 1835, acompanhou a trajetória profissional do ator que desempenhou o papel do Capitão Valcour durante três décadas, principalmente em espetáculos de comemoração cívica. Le Déserteur exemplifica as alterações na poética dramática desencadeadas ao longo do século XVIII. Em se tratando da galeria de personagens, a peça de Mercier apresenta figuras do alto escalão de um regimento (um Capitão de estirpe nobre e um Major nascido burguês), como também da classe soldadesca. Inclui um núcleo familiar decomposto, constituído pela viúva Luzère, mãe de Clary, jovem que está prestes a se casar com Durimel, o soldado desertor, que mantém o seu passado nas sombras, trabalhando como caixeiro da senhora Luzère. O elemento patético acompanha os diálogos entre as personagens, conferindo tons fortes aos sentimentos de desespero e angústia. Além disso, são constantes as lágrimas

36 ARAGO, Jacques. Voyage Autour du Monde: souvenirs d’un aveugle (Nouvelle édition revue et augmentée). Paris: H. Roux, 1880, p. 35. No original: “Orosmane est coiffé d’une toque surmontée de vingt-cinq ou trente plumes de diverses couleurs, et deux énormes chaînes de montre promènent jusqu’à mi-cuisse de monstrueuses breloques avec un cliquetis pareil à celui du trousseau de clefs d’une tourière en inspection. De gigantesques bracelets ornent ses bras nerveux, et de charmants et coquets favoris en virgules parent ses tempes et viennent caresser les deux coins de sa bouche. La pièce d’étoffe qui pèse sur ses épaules n’est ni un manteau, ni une casaque, ni une houppelande, ni un carrick ; mais elle tient des quatre espèces de vêtements à la fois et ne peut se décrire dans aucune langue. C’est à effrayer le pinceau le plus oseur du caricaturiste. Orosmane parle et gesticule. [...] Les noms d’Eschyle, de Sophocle et d’Euripide sont sur le rideau d’avant-scène ; c’est tout ce qu’il y a d’Eschyle, de Sophocle et d’Euripide au théâtre de Rio”. Ver anexo “Figura 3 – Personagem Orosmane da Zaíra, de Voltaire, no Teatro de São João”. 37 Ver PRADO, 1993, p. 106. 50

vertidas, os gritos angustiantes e os gestos corporais expressivos das personagens, descritos nas didascálias. Se, de um lado, Le Déserteur se aproxima das inovações dramáticas do Setecentos, de outro, não abandona as regras clássicas. A ação dramática, centrada em temas militares espinhosos – a fidelidade do soldado ao Monarca, em nome do qual lutava, a condenação moral e a pena de morte destinadas aos desertores –, desenrola-se no período de vinte e quatro horas, dentro da casa da senhora Luzère. Todas as ações que têm lugar em espaços públicos são, ao invés de encenadas, narradas, como o fuzilamento de Durimel que ocorre na praça da vila. Esse final, desencadeado pelo erro trágico que o jovem cometera ao desertar de seu regimento, é apresentado como a única saída para que Durimel cumpra honradamente o seu destino, livrando o pai do opróbrio. O drama torna a se distanciar das tragédias neoclássicas, na medida em que confere ao erro e ao final trágico uma abordagem patética, moralizante e patriótica, que trilha pela moral religiosa e monárquica, defendida na peça pelo Major Saint Franc, cujo discurso apregoa “que tudo na terra é ilusão e que somente Deus é realidade” e que um cidadão digno consolida e fortalece “as Colunas do Estado”.38 Acreditamos que, por expressar esses valores, o drama de Mercier foi comumente escolhido por João Caetano para ser representado em espetáculos cívicos, que celebravam as datas de eventos históricos do regime monárquico e natalícios de membros da família imperial. Como comprova o espetáculo oferecido pela sua companhia dramática, a 2 de dezembro de 1836, em comemoração ao aniversário do Príncipe Regente. Após a cerimônia religiosa na Capela Imperial, os trabalhos no Paço e o desfile do Exército e da Guarda Nacional, o príncipe (futuro D. Pedro II), suas irmãs e o Regente, seguidos de nobres damas e cavalheiros, dirigiram-se ao teatro, onde a representação de O Novo Desertor Francês encerrou as festividades.39 O drama foi também representado a 7 de abril de 1837, para celebrar a abdicação de D. Pedro I em 1831: “À noite houve espetáculo, ao qual assistiu S. M. I. e suas augustas irmãs, e depois do Hino Nacional, e dos vivas do costume, a Companhia recitou um Elogio Dramático ao dia Sete de Abril, pondo-se em cena o drama denominado O Novo Desertor Francês”.40 Os anúncios dos programas teatrais que exibiram O Novo Desertor Francês revelam que o texto representado por João Caetano apresentava modificações em relação ao

38 MERCIER, Louis-Sébastien. Le Déserteur: drame en cinq actes et en prose. Paris: Le Jay, 1770, p. 52 e 59. No original: “que tout est illusion sur la terre et que Dieu seul est réalité” e “Colonnes de l’Etat.” 39 Cf. AINDA o dia dois de dezembro. Correio do Imperador ou o Direito de Propriedade, Rio de Janeiro, 9 dez. 1836, p. 4. 40 PHAROL do Império, Rio de Janeiro, 10 abr. 1837, p. 1. 51

original de Mercier, o que nos permite propor a hipótese, que desenvolveremos mais adiante, de que as traduções e as realizações cênicas dos dramas franceses nos palcos brasileiros não eram, necessariamente, versões fiéis aos textos fonte. As mudanças textuais se deram substancialmente na galeria de personagens, a partir do aportuguesamento de nomes (Clary passou a ser nomeada Eugênia, e Durimel, Henrique), da alteração na identidade de gênero do papel da viúva Luzère, que se transformou no velho Eustáquio, da inserção de personagens (Coronel Valcour, pai do Capitão Valcour, Otávio, um negociante, um ajudante do General, um Cabo de esquadra) e da supressão do papel do velho senhor Hoctau. Para a realização cênica da peça, acrescentaram-se performances militares. João Caetano, rememorando sua experiência militar na juventude, inseriu uma manobra de tropas, como divulgou o anúncio do espetáculo de 8 de setembro de 1850, no Teatro de Santa Tereza, em comemoração ao dia da Independência do Brasil: “Este drama será ornado de tropa ensaiada pelo Sr. João Caetano, a qual fará diferentes manobras no ato em que tem de se fuzilar o desertor”.41 O espetáculo, que celebrava uma das datas cívicas mais importantes do Império, motivou João Caetano a colocar soldados em cena, para festejar o poderio militar da recente nação, agradar o Imperador D. Pedro II e lisonjear o regime monárquico, mantenedor de uma subvenção ao ator. A manobra militar criada por João Caetano foi comparada, por um artigo anônimo publicado na imprensa, aos espetáculos do circo olímpico: “esse drama burlesco, cheio de lances inverossímeis ou impossíveis, e de um aparato ridículo, próprio de um circo olímpico, mas não de um grande teatro”. O crítico se mostrou estupefato com a mise en scène, que apresentou no palco um pelotão de cinquenta soldados em evoluções militares e hasteou um “trapo branco em vez do estandarte da sua nação”.42 As impressões desse crítico anônimo vêm a corroborar a ideia de que a montagem de O Novo Desertor Francês por João Caetano objetivou enaltecer símbolos nacionais e reafirmar valores monárquicos e religiosos, sobretudo, porque a personagem desempenhada pelo ator, o Capitão Valcour, defende explicitamente que o soldado virtuoso luta em nome do Monarca, ao qual é fiel e a quem ama. Além disso, em termos da cultura de entretenimento no Rio de Janeiro, oferece-nos um caso que ilustra a concorrência dos circos com as salas de espetáculos, fenômeno mencionado por Vilma Arêas.43 Ao inserir uma manobra militar na mise en scène do drama, João Caetano aproximou-se dos espetáculos circenses, disseminados

41 ESPETÁCULOS. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 7 set. 1850, p. 4. 42 DIÁRIO do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 24 abr. 1858, p. 3. 43 Ver ARÊAS, Vilma Sant’Anna. Na Tapera de Santa Cruz: uma leitura de Martins Pena. São Paulo: Martins Fontes, 1987, p. 24-27. 52

pela Corte na época. Desse modo, o drama incorporou uma cena de grande movimentação, coreografada e sincronizada, semelhante ao que o público assistia nos circos populares. No repertório de João Caetano, o melodrama francês do início do século XIX também conviveu lado a lado da tragédia e do drama setecentista. Em meados da década de 1830, para competir com a companhia de Ludovina Soares, instalada no Teatro da Praia de D. Manuel, que dispunha de traduções de melodramas clássicos franceses, João Caetano se ancorou em uma obra de Pixerécourt, dramaturgo considerado o pai do melodrama. Em três momentos específicos, entre 1836 e 1838, em julho de 1840 e de junho a setembro de 1857, representou o papel de Edwinsk de As Minas da Polônia, na tradução “do insigne e imortal Antônio Xavier de Azevedo”.44 A peça Les Mines de Pologne foi criada em Paris, em 1803, no momento em que o melodrama se definia como gênero dramático. O termo mélodrame apresentou várias acepções no decorrer do século XVIII, antes de designar o novo gênero. No início do Setecentos, na Itália, melodramma designava “um drama inteiramente cantado, quase sinônimo da ópera”.45 Em 1762, Jean-Jacques Rousseau classificou de cena lírica (scène lyrique) sua obra Pygmalion e a definiu como “espécie de melodrama o mais convencionado a sua língua [que] poderia constituir o gênero médio entre a simples declamação e o verdadeiro melodrama do qual jamais alcançará a beleza”.46 Outras peças que utilizavam os mesmos recursos de Pygmalion surgiram e foram classificadas de modo diverso, como cena lírica, duodrama, monodrama ou peça mesclada de música (pièce mêlée de musique). Assim, se no início do século XVIII, melodrama era sinônimo de ópera, após a aparição de Pygmalion passou a identificar as cenas líricas com dois ou três personagens, nas quais a dicção dos atores era sustentada por uma música expressiva que exaltava seus sentimentos. No período da Revolução Francesa, o termo mélodrame foi empregado para designar uma grande variedade de peças, encenadas nos teatros do Boulevard du Temple, nas quais o diálogo apresentava grande importância, ao passo que a música se reduzira a um simples acompanhamento que sublinhava os efeitos dramáticos dos atores em cena.47 No final dos anos 1790, em um contexto de ampla dinâmica de experimentações na escrita das peças, Pixerécourt, Cuvelier e Loaisel-Tréogate “tentaram elaborar uma forma teatral mais

44 THEATRO Constitucional Fluminense. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 6 abr. 1836, p. 2. 45 THOMASSEAU, 1974, p. 38. No original: “un drame entièrement chanté, à peu près synonyme de l’opéra.” 46 ROUSSEAU, Jean-Jacques. Fragments d’Observations sur L’Alceste de M. Gluck apud Ibidem, p. 39. No original: “l’espèce de mélodrame le plus convencionable à sa langue [qui] pourrait constituer le genre moyen entre la simple déclamation et le véritable mélodrame dont il n’atteindra jamais la beauté.” 47 Cf. SALA, Emilio. Mélodrame: définitions et métamorphoses d’un genre quasi-opératique. Revue de Musicologie, tome 84, n. 2, 1998, p. 236. 53

propriamente dramática”.48 As peças desses autores consolidaram as características de um novo gênero – oposição maniqueísta, desfecho feliz, efeitos visuais e sonoros espetaculares –, que ganhou o formato definitivo com Cœlina ou l’Enfant du Mystère (1800), de Pixerécourt.49 Seguindo a classificação proposta por Jean-Marie Thomasseau, o termo melodrama clássico identifica as peças dos dramaturgos franceses Pixerécourt, Caigniez, Cuvelier e Hapdé, produzidas durante as três primeiras décadas do século XIX. Essas peças se constituem em três atos e se caracterizam pela temática da perseguição do herói por um vilão e pelo reconhecimento final, que simboliza o triunfo da virtude e a punição do mal, pela ação da providência divina. A música acompanha diversos momentos do enredo, incluindo o prelúdio, as entradas e as saídas de personagens e o clímax.50 As personagens, divididas entre boas e más, são fixas e apresentam funções precisas.

[…] há o pai nobre que passou por desgraças e que se reencontra reabilitado ou recoroado no último ato, a moça pura, sempre no limite do estupro ou da tortura (às vezes torturada, jamais violada, intacta no final), algumas vezes duplicada em uma personagem materna, virtuosa e desgraçada assim como ela – o justiceiro cavalheiresco, jovem e belo, cuja sorte é esposar no final a moça pura após matar o vilão – o vilão cuja perversidade é total e indesculpável [...] enfim, há o bobo, criado que faz rir pelas suas asneiras e se manifesta como o aliado honesto do justiceiro.51

Os elementos visuais e sonoros e os coups de théâtre eram empregados pelos autores de melodramas como meios para amplificar os efeitos patéticos das peças, emocionar a plateia e garantir a sua atenção. De acordo com Isabelle Moindrot, esses elementos espetaculares, frequentemente interpretados como recursos cênicos que objetivavam ao puro entretenimento, revelam antes uma concepção complexa de espetáculo que comporta a ideologia de valorização das virtudes cívicas e patrióticas.52 Ao propor um imaginário da história da França no qual os bons cidadãos, que cultivavam as virtudes civis, triunfavam diante dos percalços da vida terrena, o melodrama reconciliava a turba recém-saída do

48 THOMASSEAU, 1974, p. 53. No original: “tentèrent d’élaborer une forme théâtrale plus proprement dramatique.” 49 Cf. Ibidem, p. 70. 50 Cf. Idem. Les Mélodramatiques. Saint-Denis: Presses Universitaires de Vincennes: Université Paris 8, 2009, p. 17-18. 51 UBERSFELD, 2001, p. 674. No original: “[…] il y a le père noble qui a subi des malheurs et qui se retrouve réhabilité ou recouronné au dernier acte, la pure jeune fille, toujours à la limite du viol ou de la torture (quelquefois torturée, jamais violée, intacte au dénouement), parfois doublée d’un personnage maternel-ombre, comme elle vertueuse et malheureuse – le redresseur de torts chevaleresque jeune et beau, et dont le sort est d’épouser à la fin la pure jeune fille après avoir tué le traître – le traître dont la méchanceté est totale et sans excuse [...] enfin, il y a le niais, valet qui fait rire par ses balourdises et se manifeste comme l’allié objectif du redresseur de torts.” 52 Cf. MOINDROT, Isabelle (Dir.). “Introduction”. In: Le Spectaculaire dans les Arts de la Scène du Romantisme à la Belle Époque. Paris: CNRS Éditions, 2006, p. 12. 54

período revolucionário, no final do século XVIII, com as instituições políticas e religiosas. Foram exatamente as ideias religiosas que orientaram Pixerécourt, de acordo com o testemunho do próprio autor no prefácio de seu Théâtre Choisi (1841): “Com ideias religiosas e providenciais, com sentimentos morais que me lancei na carreira teatral”.53 Les Mines de Pologne segue a poética convencionada do melodrama clássico e as ideias morais defendidas por Pixerécourt. Em termos formais, estrutura-se em três atos e mantém intactas as unidades clássicas: as ações dramáticas se desenrolam no período de vinte e quatro horas, em um castelo, em Sandomierz, na Polônia. As personagens, tratadas de forma maniqueísta (os bons e os maus), dividem-se socialmente entre nobres (famílias de paladinos poloneses) e criados (homens/mulheres de confiança). O tema se circunscreve na perseguição ao herói, neste caso, um casal virtuoso, Edwinski, o paladino de Rava, e Floreska, sua esposa. Zamoski, o paladino de Sandomierz, é consumido há anos pelo desejo de vingança contra a família de Edwinski, pois sua proposta de casamento com Floreska fora preterida pelo pai da jovem em favor do outro paladino. Enraivecido, decide raptar Floreska e aprisioná-la em seu castelo. A situação agonizante de mãe e filha, mantidas em cativeiro por Zamoski, é amenizada por uma cena festiva com música e balé, um recurso frequente neste tipo de melodrama. Após passar por provações e situações extremas (duelo de espadas, cárcere em uma mina, luta contra os cossacos de Zamoski), que causam reviravoltas na ação dramática, Edwinski resgata finalmente Floreska e a filha do cativeiro. O vilão Zamoski e seu cúmplice, Ragotzi, são presos e aguardam o julgamento de seus crimes pelo Senado. Edwinski, Floreska e a filha reencontram, enfim, a harmonia familiar e retornam para Rava, acompanhados de Polina e Peters, criados fiéis que o ajudaram na empreitada contra a vilania. No Rio de Janeiro, o melodrama clássico francês obteve um período momentâneo de auge, durante os anos de 1834 a 1837, representado no palco do Teatro da Praia de D. Manuel pela companhia dramática de Ludovina Soares. O gênero pouco despertou o interesse de João Caetano, devido, muito provavelmente, à não aceitação ampla da plateia e aos elementos extremamente convencionados das peças, avaliados negativamente pela crítica teatral da época por comprometerem a verossimilhança dos enredos. De fato, José Rufino Rodrigues de Vasconcelos, primeiro secretário e censor do Conservatório Dramático Brasileiro, ao avaliar As Minas da Polônia, em setembro de 1846, apontou especificamente para essa direção crítica, que detrata as convenções do gênero: “As Minas da Polônia é um

53 PIXERÉCOURT, Théâtre Choisi, 1841 apud THOMASSEAU, 2009, p. 29. No original: “C’est avec des idées religieuses et providentielles, c’est avec des sentiments moraux que je me suis lancé dans la carrière du théâtre.” 55

drama mal escrito, recheado de inverossimilhanças e que valia bem ser desterrado da cena moderna”.54 Por outro lado, o modelo de melodrama produzido no período final da Restauração francesa, ou seja, na segunda metade da década de 1820, obteve melhor aceitação junto ao público do Rio de Janeiro. Traduções de obras de Victor Ducange, o dramaturgo mais representativo da época, foram criadas nos palcos pelos atores portugueses e por João Caetano. O “Corneille do bulevar” (“Corneille du boulevard”), como Ducange era conhecido na França, compôs quarenta e seis peças que estrearam entre 1813 e 1831 nos teatros de l’Ambigu-Comique, Gaîté e Porte Saint-Martin, em Paris. Além de dramaturgo, Ducange foi também romancista. Seu romance antimonárquico Valentine (1821) custou-lhe uma condenação de seis meses de prisão, e Thélène ou l’Amour de la Guerre (1822), recebido como bonapartista, obrigou-o a se exilar na Bélgica até 1825.55 Ducange operou inovações na poética do melodrama, ao remodelar a estrutura dramática e torná-la menos convencionada. O dramaturgo modificou a temática central: o tema da perseguição ao herói passou para segundo plano, ao passo que a paixão amorosa se tornou o fio dramático principal, fundamentando o universo da ação. Suprimiu o bobo e conferiu maior mobilidade de ação às personagens femininas, as quais, nos melodramas clássicos, desempenhavam apenas o papel de presas fáceis dos vilões. Adotou a composição em quadros (tableaux) e diminuiu o espaço destinado à música e ao balé.56 Contudo, manteve intacta a retribuição final, já que não perdeu de vista a função moralizante do teatro, sobretudo nos anos que antecederam mais uma revolução na França, as Três Gloriosas, em julho de 1830. No melodrama Trente Ans ou la Vie d’un Joueur, criado no Théâtre de la Porte- Saint-Martin, em Paris, em junho de 1827, Ducange sintetizou suas inovações dramáticas. A peça representa a trajetória de vida de um homem nobre, Georges de Germany, que, motivado pelos ardis de Warner, um amigo mal-intencionado, perde sua herança e o dote da esposa, Amélie, em jogos de azar e festas. Acuado pela polícia e arruinado financeira e moralmente, comete assassinatos e desintegra sua família, levando-a ao opróbrio. Ao tratar da evolução da

54 VASCONCELOS, José Rufino Rodrigues. “Designação de José Rufino Rodrigues de Vasconcelos para o próprio examinar a peça As Minas da Polônia”. In: MELLO, Jacinto Correa de. Diretor de cena da Sociedade Dramática Particular Minerva e Harmonia. Requerimento ao 1º secretário do Conservatório Dramático Brasileiro solicitando exame censório para a peça: As Minas da Polônia. Rio de Janeiro, 5 set. 1846, p. 5. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 04, 045. 55 Cf. MARTIN, Roxane. “Mélodrames et vaudevilles”. In: LAPLACE-CLAVERIE, Hélène; LEDDA, Sylvain & NAUGRETTE, Florence (Dir.). Le Théâtre Français du XIXe Siècle: histoire, textes choisis, mise en scène. Paris: Éditions L’Avant-Scène Théâtre, 2008, p. 520. 56 Cf. LE HIR, 1992, p. 14-32. 56

vida de uma família no período total de trinta anos – entre cada uma das três jornadas, como o dramaturgo nomeou os atos, há um intervalo de tempo de quinze anos –, Ducange rompeu com as unidades clássicas de tempo e espaço. O jornal parisiense Le Globe celebrou essa inovação dramática de Trente Ans ou la Vie d’un Joueur.

Chorai sobre vossas prezadas unidades de tempo e de espaço. Eis elas mais uma vez violadas com estrondo. Chorai também, versejadores trágicos: chegaram ao fim vossas produções compassadas, frias e pálidas. O melodrama mata-as, o melodrama livre e verdadeiro, repleto de vida e energia, tal como o faz o Sr. Ducange, tal o farão nossos jovens autores após ele.57

O suicídio de Georges no final da peça, quando este arrasta o vilão Warner consigo para o interior de uma cabana em chamas, simboliza o sacrifício redentor do protagonista. O suicídio na cena final imprimiu na obra uma carga de pessimismo inexistente no melodrama clássico, que só cogitava a morte do vilão e, mesmo assim, raramente. O recurso da morte seria amplamente explorado pelos dramaturgos franceses somente a partir da década de 1830, sobretudo, pelo drama e melodrama romântico, que, segundo Sylvain Ledda, suplantou a estética dos sentimentos pelos sentidos. A morte moral e patética em Trente Ans ou la Vie d’un Joueur, pelo ineditismo, surpreendeu o público parisiense em 1827, já que este não estava habituado com a morte do protagonista no desenlace de um melodrama.58 Mesmo não tendo sido a única peça de Ducange montada no Rio de Janeiro59, a tradução Trinta Anos ou a Vida de um Jogador foi a mais exibida e a de maior repercussão. O melodrama estreou no Teatro da Praia de D. Manuel, a 7 de agosto de 1835, em espetáculo beneficente60 em favor de um “Escritor Dramático”61 não identificado. O casal da peça foi desempenhado pelo ator João Evangelista da Costa e pela sua esposa, a atriz Ludovina Soares. A estreia na Corte brasileira se deu no mesmo ano em que a peça foi exibida, pela primeira vez, em Lisboa, representada em língua francesa no Teatro da Rua dos Condes62 pela

57 LE GLOBE, Paris, 23 juin 1827 apud GENGEMBRE, Gérard. Le Théâtre Français au XIXe Siècle. Paris: Armand Colin, 1999, p. 194. No original: “Pleurez sur vos chères unités de temps et de lieu. Les voilà encore une fois violées avec éclat. Pleurez aussi, rimeurs tragiques: c’en est fait de vos productions compassées, froides et pâles. Le mélodrame les tue, le mélodrame libre et vrai, plein de vie et d’énergie, tel que le fait M. Ducange, tel le feront nos jeunes auteurs après lui.” 58 Cf. LEDDA, Sylvain. Des Feux dans l’Ombre: la représentation de la mort sur la scène romantique (1827- 1835). Paris: Honoré Champion, 2009, p. 298-299. 59 Ver anexo “Tabela 4 – Victor Ducange nos Teatros do Rio de Janeiro”. 60 Os espetáculos beneficentes foram uma prática comum na atividade teatral brasileira oitocentista. A renda obtida com a venda dos bilhetes do espetáculo era revertida para o beneficiário em questão, que poderia ser um artista (ator, atriz, bailarino, cantor lírico) ou um funcionário do teatro (maquinista, bilheteiro, ponto), uma instituição de caridade ou artística, uma igreja ou irmandade religiosa etc. 61 DIÁRIO do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 3 ago. 1835, p. 4. 62 O Teatro da Rua dos Condes foi construído entre 1756 e 1765. Até a criação do Teatro Nacional D. Maria II, em abril de 1846, a sala de espetáculos concorria com o Teatro do Salitre pela obtenção do status de teatro 57

companhia dramática dirigida por Émile Doux.63 Isso revela que o Rio de Janeiro, em termos de repertório dramático francês, não se encontrava em atraso em relação aos palcos de Lisboa, por exemplo. O melodrama de Ducange obteve recepção crítica e de público muito positiva no Rio de Janeiro, como demonstram os comentários que localizamos na imprensa e a longa permanência da peça nos palcos, com indícios de encenação por João Caetano que datam até 1862. A boa recepção se explica, sobretudo, devido ao ensinamento moral que o enredo explicita e defende. Georges, o jogador, influenciado pela rede de intrigas tecidas pelo vilão, percorre estados progressivos de declínio social e moral. Ele nutre o vício pelo jogo, despende toda sua herança e o dote da esposa, contrai dívidas, pratica roubos e comete assassinatos, atos imorais e criminosos que culminam na ruína financeira e na desintegração de sua família. Consequências previstas na primeira jornada da peça pelas personagens mais velhas, que representam a temperança e as virtudes da nobreza, como o pai de Georges (“GERMANY – O destino do jogador está escrito sobre as portas do inferno. Filho ingrato! Filho já parricida! Será esposo culpado e pai desnaturado; e sua vida se extinguirá na miséria, no sangue e no remorso”64) e o tio de Amélie (“DERMONT – [...] filho ingrato, esposo culpado, pai desnaturado, só lhe resta tornar-se criminoso”).65 Com a degradação financeira, a perda da honra e a situação criminosa para a qual Georges conduz sua família, a morte redentora desse pai pródigo e a possibilidade de harmonia familiar simbolizada pela figura materna, Ducange condena os vícios mundanos que poderiam encaminhar as famílias da pequena nobreza à desintegração. A doutrinação moral – explicitada pelos diálogos e monólogos, sobretudo nas cenas patéticas, e ainda pelas consequências negativas, que provêm de ações condenáveis no âmbito social – demonstra, a partir do exemplo da trajetória de vida da família de Georges, que os pecados eram purgados

nacional. Em seu palco foram montados dramas de sucesso, como as peças apresentadas em francês, de 1835 a 1837, pela companhia dramática dirigida por Émile Doux. A partir de 1852, passou a representar apenas comédias, gênero licenciado ao teatro, até sua demolição em 1882. (Cf. VASCONCELOS, Ana Isabel P. Teixeira de. O Teatro em Lisboa no Tempo de Almeida Garrett. Lisboa: Museu Nacional do Teatro, 2003, p. 25- 29). 63 As informações sobre o repertório encenado pela companhia dramática de Émile Doux, em Lisboa, foram consultadas em SANTOS, Ana Clara. “La pratique de la traduction théâtrale ou les vois de la création dramatique sur la scène portuguaise au XIXe siècle”. In: CICCIA, Marie-Noëlle; HEYRAUD, Ludovic & MAFFRE, Claude (Dir.). Traduction et Lusophonie: trans-actions? Trans-missions? Trans-positions? Montpellier: Presses Universitaires de la Méditerranée, 2007, p. 185-203. Disponível em: . Acesso em: 21 maio 2015. 64 DUCANGE, Victor. Trente Ans ou la Vie d’un Joueur: mélodrame en trois journées. Paris: [s.n.], [s.d], p. 174. No original: “GERMANY – La destinée du joueur est écrite sur les portes de l’enfer. Fils ingrat ! Fils déjà parricide ! Tu seras époux coupable et père dénaturé ; et ta vie s’éteindra dans la misère, le sang et les remords !” 65 Ibidem, p. 179. No original: “DERMONT – [...] fils ingrat, époux coupable, père dénaturé, il ne lui reste plus qu’à devenir criminel.” 58

na terra e que a mãe/esposa moderada e virtuosa era o centro de equilíbrio da família. Esse ensinamento moral, defendido de modo explícito pela tessitura da peça, facilitou a sua aprovação pelo Conservatório Dramático Brasileiro para que pudesse ser representada durante a Quaresma, momento no qual os censores eram mais rígidos na avaliação das obras submetidas. Pinto Cerqueira, censor da instituição, destacou que Trinta Anos ou a Vida de um Jogador continha “uma grande lição de moral”66, adequada para ser levada aos palcos naquele período de resguardo espiritual e comedimento nos assuntos mundanos. O anúncio que divulgou um espetáculo beneficente em favor da Sociedade Amante da Instrução, a ocorrer no Teatro Constitucional Fluminense, em 1836, justificou a escolha de Trinta Anos ou a Vida de um Jogador para compor o programa teatral devido ao ensinamento moral veiculado pela peça. Assim, o espetáculo estaria em sintonia com a função social desempenhada pela Sociedade beneficiada.

Tendo por fim esta respeitável associação, educar, e moralizar os desvalidos jovens brasileiros, era dever escolher para um benefício, cujo produto tem de ser aplicado a favor deles, um drama em o qual só se visse aparecer decência, nas ações, e a moral, nos discursos de todas as suas personagens. A Comissão, pois, está convencida, que, de acordo com a Companhia, fez uma escolha digna da Sociedade e dos protetores da Mocidade Indigente. S. M. I. honrará com sua augusta presença o espetáculo desta noite, por ser liberalíssimo protetor da Sociedade.67

O tema da degradação do homem pelos vícios mundanos também é abordado pelo melodrama Os Seis Degraus do Crime ou o Novo Jogador, de Nézel e Antier. O subtítulo “o Novo Jogador” – inexistente no original francês (apenas Les Six Degrés du Crime) – foi claramente uma estratégia, seja do tradutor, seja do ator João Caetano, para atrair a atenção do público, entusiasmado com o jogador de Ducange. Representado pela primeira vez em 1835, João Caetano encarnaria o papel do protagonista, Jules Dormilly, até o final de sua carreira nos palcos. Jules Dormilly é um jovem nobre que despende a herança para manter os hábitos luxuosos da vida ociosa que leva, regada a bebedeiras com os amigos, bailes e rodadas de jogos de azar. Uma vez esgotados os recursos financeiros, é impelido a seguir os atos criminosos de um grupo de escroques e ladrões. Abandonado pela companheira, a

66 CERQUEIRA, Thomas José Pinto. In: ROMEIRO, José Antônio Thomas. Inspetor de cena do Teatro São Pedro d’Alcântara. Requerimento ao 1º secretário do Conservatório Dramático Brasileiro de solicitação de exame censório para a peça: Trinta anos da vida de um jogador. Rio de Janeiro, 23 abr. 1847, p. 6. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código, I – 08, 06, 015. 67 DIÁRIO do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 23 jun. 1836, p. 4. 59

cantora/cortesã Louise, o jovem nobre, então falido, desprezado e carcomido pelo ciúme, assassina a ex-amante. Jules é preso e condenado ao cadafalso. Assim como no melodrama de Ducange, Les Six Degrés du Crime encena a perdição moral e a condenação social sofrida por um membro da nobreza corrompido pelos vícios e crimes (jogo, ociosidade, roubo, assassinato). Há também na peça de Nézel e Antier a figura do raisonneur68, que representa o discurso moral burguês. O misterioso Michel, que aparece furtivamente entre os atos, orienta Jules a ser comedido, probo e a conquistar pelo trabalho a manutenção financeira e social. À semelhança do coro da tragédia grega, anuncia a Jules e ao público o degrau de perdição no qual a personagem se encontra, em uma escala de um a seis, de acordo com as ações criminosas que comete: “MICHEL – Pois bem, está no quarto degrau”.69 Porém, o tratamento que Nézel e Antier conferem ao tema é mais acentuado, na medida em que, a partir de uma tendência liberal explícita, trata da tensão social entre nobreza e burguesia meses após a Revolução de Julho, que ocorreu em Paris de 27 a 29 de julho de 1830. A peça coloca em choque a nobreza (representada por Jules Dormilly) e a burguesia (encarnada por François, um órfão sem sobrenome de família). Enquanto o ocioso e inescrupuloso Jules se encaminha para o opróbrio e a perda da cabeça no cadafalso – a condenação da personagem é simbólica, remetendo à Revolução de 1789 que, em um primeiro momento, caçou e decapitou nobres –, François ascende socialmente pelo trabalho e recebe uma condecoração do Rei-cidadão (Roi-Citoyen) – maneira como Louis-Philippe ficou conhecido ao assumir o poder após a revolução, instaurando a Monarquia de Julho, governo que durou até 1848. O título, segundo Berthier, criado de François, era tão respeitável quanto “aqueles que nossos duques ou barões decoram o berço de seus filhos, que com muita frequência não herdam o mérito de seu pai”.70 Encenado em 1831, no calor das mudanças políticas, quando os artistas liberais ainda estavam entusiasmados com Louis-Philippe, o melodrama Les Six Degrés du Crime, ao punir o nobre ocioso e o burguês que a ele se vende (neste caso, a cortesã Louise) e recompensar aquele que trabalha arduamente, faz o dinheiro frutificar e mantém o decoro familiar, simboliza a morte política e moral da nobreza e a vitória da burguesia que se

68 Herdeiro do coro das tragédias gregas, o raisonneur é a personagem que representa um posicionamento moral, a partir de suas colocações, podendo refletir ou não o ponto de vista do autor. (Cf. RAISONNEUR. In: PAVIS, 2015, p. 323). 69 N*** [NÉZEL], Théodore & [ANTIER], Benjamin. Les Six Degrés du Crime: mélodrame en trois actes. Paris: J. N. Barba, 1832, p. 45. No original: “MICHEL – C’est bien, vous voilà au quatrième échelon.” 70 Ibidem, p. 53. No original: “ceux dont nos ducs ou barons décorent le berceau de leurs fils, qui trop souvent n’héritent même pas du mérite de leur père.” 60

enriquecia. Contudo, a peça trata menos de uma reivindicação efetiva de direitos sociais aos menos favorecidos que a defesa do argumento burguês fundado no trabalho e no dinheiro como garantias de ascensão social. Assim, este melodrama compartilha com o público dos teatros populares de Paris uma quimera: a proposta de extensão das possibilidades de ascensão social aos menos favorecidos, sem títulos de nobreza nem sobrenomes tradicionais de famílias influentes. Em meio ao crime, violência e morte praticados por nobres, que não estavam mais isentos das leis dos homens, o sonho da ascensão social se abria aos desafortunados do Boulevard du Temple, que poderiam se tornar um parvenu, isto é, um novo rico. Acompanhando os poucos comentários que a montagem de Os Seis Degraus do Crime despertou na imprensa do Rio de Janeiro, em 1835, constatamos que a tensão entre a nobreza e a burguesia francesa não foi o centro da recepção da peça. Esta foi compreendida na esteira do melodrama de Ducange, ou seja, como uma obra dramática que apresenta “o fim principal que é, instruir e divertir, como Os Trinta Anos ou a Vida de um Jogador”.71 O caráter instrutivo da peça foi interpretado genericamente, como um alerta ao homem e sua família, não importando sua condição social, para as consequências nefastas dos vícios mundanos. Isso, muito provavelmente, porque o público nada popular do Teatro Constitucional Fluminense não se reconhecia em tensão com uma ordem social nobre, não passara por conflitos de uma revolução burguesa e com pretensões liberais, contexto específico da plateia dos teatros do Boulevard du Temple, formada majoritariamente por ordens sociais menos favorecidas e proletários. A questão social e política da peça foi ainda abafada pela discussão em torno de suas inovações formais, por ser “escrita contra os preceitos dramáticos, por não ter unidade de ação, tempo e lugar”.72 Assim, Os Seis Degraus do Crime, na sombra de Trinta Anos ou a Vida de um Jogador, foi interpretada como obra moralizante que contribuía para a renovação do repertório apresentado pelos teatros do Rio de Janeiro. Essa foi a avaliação de Justiniano José da Rocha em crônica publicada por O Chronista, em 1836.

No Teatro da Praia de D. Manuel representa-se o Jogador [Trinta Anos ou A Vida de um Jogador]; essa peça, uma das primeiras com que a nova escola encetou sua brilhante carreira, essa peça que em Paris tinha excitado inaudito entusiasmo. E o povo desacostumado de tão veementes agradáveis sensações deu-se pressa de ir ver o novo drama. Suas representações sucediam-se continuamente, e continuamente, em vez de diminuir, aumentava o número de curiosos. A este exemplo o teatro

71 THEATRO Constitucional Fluminense. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 28 out. 1835, p. 3, grifos do autor. 72 Ibidem. 61

constitucional abandonou os fastidiosos amores de Akmet et Rakima; seus cavalos, e canhões, seus Palafox em Saragoça, e outras extravagâncias indignas de serem representadas ante um povo civilizado, e dando-nos os Seis Degraus do Crime, obteve igual, senão maior triunfo.73

Como profetizou Justiniano da Rocha, com as inovações formais e temáticas desses dois melodramas, os palcos do Rio de Janeiro se abriram para a produção romântica, e tão logo esgotariam “todas as riquezas dos Dumas, dos Hugos, todos esses dramas, todas essas tragédias com que a fecundidade de tantos escritores alimenta continuamente os teatros”.74 De fato, em 1836, após as estreias de Trinta Anos ou a Vida de um Jogador e Os Seis Degraus do Crime, Ludovina Soares, no Teatro da Praia de D. Manuel, e João Caetano, no Teatro Constitucional Fluminense, encetaram as primeiras montagens dos dramas românticos de Alexandre Dumas (pai) e de Victor Hugo, e dos melodramas dos dramaturgos prolíficos dos teatros populares de Paris, tais como Adolphe Dennery, Auguste Anicet- Bourgeois e Joseph Bouchardy, entre muitos outros. Porém, a previsão de Justiniano da Rocha só não foi certeira por um detalhe. A presença nos palcos dessa dramaturgia, à exceção das peças de Victor Hugo, não foi circunstancial, mas se estendeu por todo o século XIX. Na França, a dramaturgia romântica alemã e as versões originais das peças de Shakespeare fomentaram discussões teóricas sobre a poética dramática em textos que se tornaram manifestos, como Vie de Shakespeare (1821), de Guizot, Racine e Shakespeare (1822 e 1825), de Stendhal, e, sobretudo, o Prefácio a Cromwell (1827), de Victor Hugo.75 Nesse consagrado prefácio, Victor Hugo desenvolveu uma teoria dos gêneros segundo a qual o drama romântico, ao unir esteticamente o erudito e o popular, o sublime e o grotesco, seria a terceira idade, a moderna, da poesia. O poeta defendeu a liberdade artística e abriu as portas da dramaturgia francesa para a efetivação da mistura dos gêneros, como proposta de descolamento da rigidez neoclássica e das políticas teatrais baseadas no sistema de privilégios, que dividia os teatros em oficiais e privados, definindo os gêneros que cada sala de espetáculos estava autorizada a encenar. Victor Hugo compartilhava de um posicionamento dos românticos franceses que, segundo Celina Moreira de Mello, buscava “novas formas discursivas para constituir uma imagem do artista em diapasão com seu tempo, e legitimar uma identidade moderna”.76

73 ROCHA, Justiniano José da. O Chronista, Rio de Janeiro, 20 abr. 1836, p. 88. 74 Ibidem. 75 Cf. NAUGRETTE, Florence. Le Théâtre Romantique: histoire, écriture, mise en scène. Paris: Éditions du Seuil, 2001b, p. 61-72. 76 MELLO, Celina Maria Moreira de. Ilustração e corpo dramático no romantismo francês. Tropelías. Revista de Teoría de la Literatura Comparada, n. 24, 2015, p. 52. Disponível em: < https://papiro.unizar.es/ojs/index.php/tropelias/article/view/1141/1004>. Acesso em: 18 jan. 2017. 62

Após os combates sangrentos da Revolução de Julho de 1830, também conhecida como As Três Gloriosas, e dos desdobramentos da Monarquia de Julho, regime monárquico de Louis Philippe, a França vivenciou constantes transformações políticas e estéticas que impactaram nas Artes, de modo geral.

A estetização dos valores políticos e sociais liberais e a busca de um caminho para atingir novos leitores [novos espectadores, no caso do teatro] constituem estratégias para fazer do campo da Arte a celebração de um sagrado paradoxalmente profano, às vezes satânico, que propõe uma comunhão das sensibilidades e das mentes, assim como uma comunicação com o além, na esfera das paixões, dos horrores e dos excessos, em um mundo em que a Igreja perdeu o privilégio de impor as narrativas constituintes daquela sociedade.77

Nesse novo contexto, a arte dramática francesa oscilou entre a autonomia e a vinculação com o poder vigente, por meio de práticas de mecenato e de controle (leis que determinavam os privilégios dos teatros, divisão dos teatros em oficiais e privados, censura), subordinada a regras de um crescente processo de industrialização (atendimento ao gosto do público e da crítica teatral, busca de bilheteria). Essas condições desencadearam uma “dramaturgia romântica da desordem”, nos termos de Florence Naugrette, em referência aos fenômenos de fusão dos públicos e da mistura, não apenas dos gêneros – que, apesar de não ser uma invenção dos românticos, intensificou-se nesse período –, mas também de códigos e de valores morais. De fato, a base da dramaturgia romântica provém menos, “como lemos ainda por vezes, de uma hibridação entre a comédia e a tragédia clássicas (gêneros nobres) que de uma hibridação destas últimas com os gêneros ‘bastardos’ resultantes da Revolução”.78 Por gêneros “bastardos”, entenda-se melodrama, vaudeville, ópera-cômica, féerie, pantomima. Assim, o drama romântico “não efetua em 1830 uma revolução estética radicalmente nova. Ele se constitui a partir de outros gêneros já existentes, dos quais retoma um certo número de estruturas, de motivos, combinando frequentemente os inconciliáveis para construir sua estética e ética própria”.79

77 Idem. “Crítica literária, política e revolução estética em L’Artiste (1831-1832)”. In: MELLO, Celina Maria Moreira de & CATHARINA, Pedro Paulo Garcia Ferreira (Org.). Crítica e Movimentos Estéticos: configurações discursivas do campo literário. Rio de Janeiro: 7Letras, 2006, p. 35. 78 NAUGRETTE, Florence. Le mélange des genres dans le théâtre romantique français: une dramaturgie du désordre romantique. Revue Internationale de Philosophie, n. 255, 2011b, p. 31. No original: “comme on le lit encore parfois, d’une hybridation entre elles de la comédie et de la tragédie classiques (genres nobles) que d’une hybridation de ces dernières avec les genres « bâtards » issus de la Révolution.” 79 Idem, 2001a, p. 5-6. No original: “n’effectue pas en 1830 une révolution esthétique radicalement neuve. Il se constitue à partir d’autres genres déjà existant, dont il reprend un certain nombre de structures, de motifs, combinant souvent des inconciliables pour construire son esthétique et éthique propre.” 63

A mistura dos gêneros concretizada no teatro romântico francês e a necessidade de classificações no seio da historiografia literária desembocaram em um problema. A produção dramática séria francesa das décadas de 1830 e 1840 foi dividida entre a tragédia juste milieu à moda de Casimir Delavigne, o drama romântico – gênero que teria florescido a partir de 1830 e encontrado o ocaso, em 1843, com o fracasso de Les Burgraves, de Victor Hugo – e o melodrama romântico – termo proposto por Jean-Marie Thomasseau para identificar uma grande diversidade de obras dramáticas criadas nos teatros populares parisienses, entre 1823 e 1848, e que ocupavam um não-lugar na história da dramaturgia francesa.80 Essa classificação tradicional do teatro romântico, aparentemente nítida e harmônica, tem se revelado insuficiente para atar os fios colocados à mostra pelos recentes estudos interdisciplinares, que trouxeram à tona uma diversificada produção dramática criada nos teatros populares, caracterizada mais pela porosidade entre os gêneros que pelas suas distinções. Para Florence Naugrette, a problemática emerge, primeiro, do termo “drama romântico”, que alia um gênero (o drama) a um movimento estético (o romantismo) “extremamente diverso e variado, compreendendo por vezes tendências e individualidades opostas”.81 Segundo, o termo fez surgir inúmeras confusões, dentre as quais a dificuldade de se delimitar as fronteiras entre o drama e o melodrama, tendo em vista que os dois gêneros se influenciaram reciprocamente e dividiram, a certa altura dos anos 1830, os palcos populares de Paris, como o Théâtre de la Porte-Saint-Martin. Ao que acrescentaríamos o fato de, em meados da década de 1830, o termo melodrama ter caído em desuso pelos autores populares, que passaram a optar pela simples designação de “drama” ou de variantes, como “drame-vaudeville” ou “drame melé de chants”, quando a peça incluía músicas. As detrações que o melodrama vinha sofrendo desde o período da Restauração francesa – devido, sobretudo, ao Traité du Mélodrame (1817), manifesto contrário ao gênero que tinha como um de seus autores Abel Hugo, irmão de Victor Hugo82 – motivaram os dramaturgos a não se filiarem ao termo, mesmo conscientes de que se ancoravam nos principais expedientes dramáticos do gênero. Nos anos iniciais de 1830, as emoções frenéticas substituíram os quadros sentimentais e lacrimejantes do drama do século XVIII e as reconciliações do melodrama

80 Ver THOMASSEAU, Jean-Marie. O Melodrama. Tradução de Claudia Braga e Jacqueline Penjon. São Paulo: Perspectiva, 2005, p. 63-94. 81 NAUGRETTE, 2011b, p. 32. No original: “extrêmement divers et varié, comprenant des tendances et des individualités parfois radicalement opposées.” 82 A. [HUGO, Abel]; A. [MALITOURNE, Armand] & A. [ADER, J.]. Traité du Mélodrame. Paris: Delaunay, 1817. 64

clássico, pondo fim ao apaziguamento final das peças, por privilegiar certa forma de desmesura. O teatro do sentimento se transformou no teatro dos sentidos, as emoções, em ações. Como bem demonstrou Sylvain Ledda, o patético, tanto no drama quanto no melodrama, passou a se fundar sobre a morte visível em cena, que convidava o espectador a participar emocionalmente, diferenciando-se do tratamento decoroso que as formas de violência recebiam pela tragédia neoclássica, não sendo representadas em cena.

A questão parece aprisionada em um círculo vicioso. Se dramas e melodramas usam dos mesmos efeitos, como distingui-los? Por outro lado, onde encontrar uma escola da virtude no teatro se o melodrama abandona a Providência pela morte violenta? Entre 1823 e 1827, o Bulevar do Temple se transformou no Bulevar do Crime. A prática da morte é ali uma realidade cotidiana. Desse modo vemos que a representação da morte se torna, nos anos 1830, objeto de uma viva polêmica que concerne à espinhosa questão dos gêneros e dos repertórios dramáticos. Enquanto o melodrama clássico garantia a vitória dos valores morais sobre o mal, o melodrama romântico introduz em suas intrigas um clima mais inquietante. O problema do realismo social, perceptível desde os anos 1820, acompanha-se de uma visão de mundo pessimista. E a morte injusta, cruel, torna-se um dos pontos mais altos do melodrama, do qual ela modifica as estruturas ideológicas e formais.83

A proposta de se repensar o teatro romântico francês tem permitido iluminar de modo enriquecedor a construção dramática de composições do período, que implodem o marco cronológico tradicional do romantismo e a clássica divisão entre drama e melodrama românticos. Uma corrente atual dos estudos do teatro romântico problematiza as classificações cristalizadas, referentes à cronologia das escolas literárias, que impedem de verificar os fenômenos de cruzamento entre os públicos, os teatros e os gêneros dramáticos. Estudos recentes consideram a importância dos elementos visual e sonoro dos espetáculos, para além das análises tradicionais calcadas na primazia do texto dramático, e trazem à tona uma vasta e pouco conhecida produção dos teatros populares de Paris.84 Diante da nova problemática do campo de estudos do teatro romântico, Florence Naugrette sinalizou para o risco de homogeneização dos autores e de suas obras dramáticas,

83 LEDDA, 2009, p. 269-270. No original: “La question semble enfermée dans un cercle vicieux. Si drames et mélodrames usent des mêmes effets, comment s’y retrouver ? Par ailleurs, où trouver une école de vertu au théâtre si le mélodrame abandonne la Providence pour la mort violente ? Entre 1823 et 1827, le Boulevard du Temple s’est mué en Boulevard du crime. La pratique de la mort y est une réalité quotidienne. Où l’on voit que la représentation de la mort devient, dans les années 1830, l’objet d’une vive polémique qui concerne l’épineuse question des genres et des répertoires dramatiques. Tandis que le mélodrame classique garantissait la victoire des valeurs morales sur le mal, le mélodrame romantique introduit dans ses intrigues un climat plus inquiétant. Le souci de réalisme social, perceptible dès les années 1820, s’accompagne d’une vision du monde pessimiste. Et la mort injuste, cruelle, devient l’un des clous du mélodrame, dont elle modifie les structures idéologiques et formelles.” 84 Destacamos o dossiê de artigos reunidos no número 257 da Revue d’Histoire du Théâtre, intitulado L’Autre Théâtre Romantique. Ver REVUE d’Histoire du Théâtre – L’Autre Théâtre Romantique, Paris, n. 257, jan.- mars/2013. 65

“se estendemos, como o fazemos hoje cada vez mais, o palmo cronológico, estético e ideológico do romantismo a quase todo o primeiro século XIX”. Ou seja, os autores considerados menores, tais como Dennery e Ernest Legouvé, poderiam ser “rapidamente engolidos sob uma identidade extensiva”.85 Acreditamos que as nomenclaturas e os marcos cronológicos se justificam no sentido de permitir a descrição dos movimentos literários em termos de produção (autor- obra). Contudo, tornam-se improdutivos quando engessam as composições dramáticas em juízos de valores literários que dividem obras e autores em maiores ou menores, criando entre eles rupturas e distanciamentos, muitas vezes artificiais, que ignoram um duplo movimento: a mistura dos gêneros e os fenômenos relacionados à realização cênica, elementos centrais na dramaturgia do século XIX. O caminho que se descortina, a nosso ver, aponta para a necessidade de se melhor conhecer os textos dramáticos produzidos pelos autores populares franceses, identificados por Jean-Marie Thomasseau como os melodramas romântico e diversificado, descrever suas estruturas dramáticas e inovações ao longo dos anos, sobretudo, porque foram essas peças que integraram o repertório de sucesso de João Caetano e de outros primeiros atores brasileiros a ele contemporâneos. Sabemos que os dramas românticos emprestaram o essencial das estruturas e motivos do melodrama, como a temática da inocência perseguida e a vilania. Contudo, uma diferença essencial entre ambos pode ser identificada, na medida em que a catarse, claramente atingida pelos entrechos moralizantes do melodrama, é dificultada no drama romântico pela impossibilidade de articulação entre o terror e a piedade, já que o desfecho não justifica e nem reduz as formas de violência representadas em cena. Os heróis, como Hernani e Ruy Blas, de Victor Hugo, e Chatterton, de Vigny, “são sacrificados em vão”, e outros, como Antony, de Dumas (pai), e Lorenzaccio, de Musset, “combinam os empregos antitéticos de herói epônimo e de vilão assassino”.86 O drama romântico mostra “o triunfo do mal, a ausência da Providência, e acaba por retornar contra a própria sociedade a responsabilidade da existência deste mal”.87 Essa representação foi compreendida como politicamente e socialmente subversiva, daí as censuras na França de parte dos dramas de Victor Hugo e de Dumas (pai).

85 NAUGRETTE, 2011b, p. 32. No original: “si l’on étend, comme on le fait aujourd’hui de plus en plus, l’empan chronologique, esthétique et idéologique du romantisme à presque tout le premier dix-neuvième siècle” e “rapidement engouffrés sous une bannière extensible.” 86 Idem. “Morales de l’émotion forte: la catharsis dans le mélodrame et le drame romantique”. In: Littérature et Thérapeutique des Passions. Paris: Hermann, 2011c, p. 139. No original: “sont sacrifiés en pure perte” e “combinent les emplois antithétiques de héros éponyme et de traître assassin.” 87 Idem, op. cit., p. 36. No original: “le triomphe du mal, l’absence de Providence, et finit par retouner contre la société elle-même la responsabilité de l’existence de ce mal.” 66

Ainda que os melodramas pós-Ducange apresentem desfechos antiprovidenciais, como constatou Sylvain Ledda, essas peças não abandonaram totalmente o desenho moral do gênero. Isso permite justificar, em partes, porque Os Seis Degraus do Crime e A Dama de Saint-Tropez, por exemplo, mesmo que representem em cena a morte violenta no desfecho, permaneceram por mais tempo nos palcos brasileiros que os dramas de Victor Hugo. Esses melodramas, apesar de representarem o horror em cena, defendem explicitamente uma moral edificante, que é inexistente, dúbia ou subversiva nos dramas românticos. O Conservatório Dramático Brasileiro, instituição fundada em 1843, no Rio de Janeiro, cujos objetivos eram promover o desenvolvimento da dramaturgia nacional e fiscalizar as peças representadas nos palcos da capital do Império, não foi receptivo ao drama romântico francês. Os censores, responsáveis pela leitura e avaliação das peças submetidas, poderiam aprová-las totalmente, sugerir recomendações de modificações ou reprová-las, proibindo-as de serem montadas, como foi o caso da interdição da representação de Maria Tudor no Teatro de São Pedro de Alcântara, em janeiro de 1844. João Caetano protagonizou os dramas românticos apenas de Victor Hugo e de Dumas (pai). Não encontramos indícios de que tenha montado algum drama de Alfred de Musset ou de Alfred de Vigny. No entanto, isso não parece ter sido uma especificidade do repertório do ator, mas um fenômeno dos palcos brasileiros, pois localizamos somente uma encenação de Chatterton (Théâtre-Français – TF, 1835), de Vigny, que ocorreu a 14 outubro de 1854, no Teatro de Santa Isabel, em Recife, na tradução de Antônio Marques Rodrigues, membro do Conservatório Dramático de Pernambuco. De Victor Hugo, João Caetano protagonizou O Rei se Diverte (Le Roi s’Amuse, Comédie-Française – CF, 1832), em novembro de 1836, e foi também o ensaiador de Hernani ou a Honra Castelhana (Hernani ou l’Honneur Castillan, CF, 1830), em março de 1848, na tradução de Francisco José Pinheiro Guimarães (1809-1857).88 Contudo, os dois dramas não permaneceram nos palcos além do mês de estreia e O Rei se Diverte despertou uma polêmica na imprensa que revela o poder do teatro, na época, para mobilizar debates públicos. O Jornal do Commercio – periódico que desde sua fundação, em 1827, era de propriedade de imigrantes franceses89 – empenhou-se na publicidade da montagem de O Rei se Diverte, exaltando, em artigo crítico, as qualidades dos dramas franceses da nova escola (romântica) e a peça de Victor Hugo que “em nada é inferior aos que até hoje se nos tem

88 Ver anexo “Tabela 5 – Victor Hugo nos Teatros do Rio de Janeiro”. 89 SODRÉ, Nelson Werneck. História da Imprensa no Brasil. 4 ed. Rio de Janeiro: MAUAD, 1999, p. 109-110. 67

apresentado”.90 Nos dias seguintes, correspondências de leitores foram publicadas pelo Diário do Rio de Janeiro, na seção “A pedidos”, com ataques à escola romântica. Os argumentos apontavam, sobretudo, para a falta de ensinamento moral no desfecho de O Rei se Diverte, que a tornaria uma “peça imoral, imperfeita, e enfadonha: imoral, pelas cenas vis de que é recheada; imperfeita, porque nada conclui (o que foi bom); enfadonha pelo péssimo estilo de que usa seu autor”.91 Justiniano da Rocha tomou parte na polêmica, em crítica publicada pela imprensa. Das avaliações ácidas desferidas pela pena do crítico teatral, depreendemos que seus argumentos se fundamentam na constatação de que O Rei se Diverte subvertia os códigos de representação neoclássicos, ao colocar em cena um Rei “sem pejo, sem brio, que desce às tabernas, que se entrega a meretrizes” e comete crimes, sem “proveito da moral pública, sem proveito nem dos reis nem dos povos e só para infamar um nome famoso”.92 Ou seja, Justiniano da Rocha avaliava negativamente o drama por este representar as torpezas de um Rei sem propor um ensinamento moral no desfecho. A ideia da violência gratuita se tornou o argumento principal dos críticos antirromânticos, e também dos censores do Conservatório Dramático Brasileiro. Estes se escandalizaram com a subversão dos valores da representação neoclássica, como a suspensão da catarse e a anulação do ensinamento moral. A ausência desses elementos no drama romântico corroborou para a sua desaprovação, pois, aos olhos dos críticos, sem o efeito moralizante restavam apenas as violências. De acordo com um crítico anônimo do periódico O Despertador, as ações do drama romântico “aos olhos dos espectadores principiam e acabam pelas orgias de sangue, pelos incestos, o parricídio, o envenenamento, a morte violenta em todas as suas variedades, com todo o luxo do horror, sem mescla de piedade”.93 João Caetano não participou da contenda em torno de O Rei se Diverte. Manifestou-se em nota publicada pela imprensa, quatro dias após a estreia, somente para justificar os erros de atuação no espetáculo, devido ao pouco tempo, de apenas sete dias, que a companhia dramática tivera para estudar o texto da peça. O ator esperava que as “faltas que

90 O PROGRESSIVO. Theatro Constitucional Fluminense. Os dramas da nova escola. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 12 nov. 1836, p. 2. 91 J. F. C. M. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 21 nov. 1836, p. 3-4. 92 ROCHA, Justiniano José. Theatro Constitucional Fluminense. O Rei se Diverte. Sete de Abril, Rio de Janeiro, 23 nov. 1836, p. 3. 93 LITERATURA dramática. 2º artigo. Olgiato, drama em 5 atos, pelo Sr. Magalhães. O Despertador, Rio de Janeiro, 16 set. 1839, p. 1. 68

houve na representação deste drama [...] se não poderão notar na segunda”94, porém não pôde corrigi-las, uma vez que O Rei se Diverte não foi mais representado. João Caetano estreou, entre 1836 e 1851, uma série de peças de Dumas (pai): Antony, A Torre de Nesle, A Veneziana (La Vénitienne, TPSM, 1834), Carlos II, Rei da Inglaterra ou o Laird de Dumbiky (Le Laird de Dumbiky, TO, 1843), Carlos VII entre os seus Grandes Vassalos (Charles VII chez ses Grands Vassaux, TO, 1831), Catarina Howard (Catherine Howard, TPSM, 1834), Kean ou Desordem e Gênio (Kean ou Désordre et Génie, TV, 1836), O Cavaleiro da Maison Rouge (Le Chevalier de Maison-Rouge, Épisode du Temps des Girondins, Théâtre Historique – TH, 1847), Paulo Jones (Paul Jones ou Paul le Corsaire, 1838), Ricardo Darlington (Richard Darlington, TPSM, 1831) e Teresa. Porém, não foi o único ator a protagonizar as obras do autor francês no Rio de Janeiro. Os dramas de Dumas (pai) também despertaram o interesse do ator português Joaquim de Barros que, ao lado de Ludovina Soares, realizou a montagem de A Veneziana ou o Bravo, em 1837, e D. João de Maraña ou o Fim de um Dissoluto, em 1838, ambas as peças em traduções assinadas por Luís José Baiardo.95 Os dramas mais licenciosos de Dumas (pai), como Antony e A Torre de Nesle, foram banidos dos palcos pelo Conservatório Dramático Brasileiro. Por outro lado, Kean permaneceu no repertório de João Caetano entre as décadas de 1840 e 1850, sendo representado pelo ator no Rio de Janeiro, como também em sua temporada de espetáculos no Teatro de São João, na Bahia, em 1849. Para a permanência de Kean no repertório de João Caetano pesou o fenômeno de projeção da personagem de Dumas (pai) e de seu criador nos palcos franceses, o ator Frédérick Lemaître, sobre o artista brasileiro. Por mais que João Caetano desejasse ser comparado a Talma, ator trágico francês, seu repertório e jogo de cena se alinharam, essencialmente, aos de Frédérick Lemaître, artista que se consagrou nos teatros populares de Paris, criando as personagens mais emblemáticas dos melodramas da cena romântica. João Caetano também encenou dramas e melodramas representados em Paris pelos atores Bocage (La Tour de Nesle e Antony, de Dumas pai) e Étienne Mélingue (Le Chevalier de Maison Rouge, de Dumas pai, Benvenuto Cellini, de Paul Meurice, e Les Sept Infants de Lara, de Félicien Mallefille). No entanto, com exceção de Les Sept Infants de Lara, as outras peças obtiveram pouca permanência no repertório do artista brasileiro. As obras dramáticas, cujos protagonistas ganharam vida nos palcos pela atuação de Frédérick Lemaître, estão entre os carros-chefes da carreira de João Caetano, como é o caso

94 JORNAL do Commercio, Rio de Janeiro, 18 nov. 1836, p. 3. 95 Ver anexo “Tabela 6 – Alexandre Dumas (pai) nos Teatros do Rio de Janeiro”. 69

de Trinta Anos ou a Vida de um Jogador, D. César de Bazan (TPSM, 1844), de Dennery e Dumanoir, A Dama de Saint-Tropez e Kean.

1.3.2 Os melodramas franceses

Em 1841, demitido do principal teatro subvencionado do Rio de Janeiro, o Teatro de São Pedro de Alcântara, João Caetano se transferiu para o Teatro de São Francisco96, onde desempenhou as funções de primeiro ator e ensaiador: “A direção e escolha dos espetáculos acha-se confiada ao 1º ator, João Caetano dos Santos, o qual caprichará, além de tudo, em vestir as personagens e ornar as cenas conforme as épocas e os costumes”.97 João Caetano enriqueceu sobremaneira o seu repertório dramático para poder concorrer com a companhia dramática que se tornara sua rival. Incorporou ao repertório recentes produções dramáticas dos autores populares de Paris, tais como Anicet-Bourgeois, Dennery, Julien de Mallian, Félix Pyat, entre outros. Estes dramaturgos, muitas vezes também jornalistas e romancistas, reunidos no bulevar médio e popular de Paris, produziram intensamente melodramas, em trabalhos colaborativos, para atender à demanda dos teatros privados.98 Na época, o ingrediente final para a consolidação do sucesso de uma peça nos palcos se encontrava na escolha do primeiro ator que daria vida ao protagonista. Entre as décadas de 1830 e 1840, Frédérick Lemaître, que começou a carreira artística aos quinze anos como ator de pantomimas no Boulevard du Temple, estava no auge de sua carreira artística, requisitado pela maioria dos dramaturgos.99 Os dramaturgos populares estreavam suas composições nos teatros privados do Boulevard du Temple e do Boulevard Saint-Martin, sobretudo no Théâtre de la Gaîté, Théâtre de l’Ambigu-Comique e Théâtre de la Porte-Saint-Martin. Estas salas de espetáculos, fundadas no final do século XVIII, apresentavam repertórios constituídos por gêneros

96 A sala de espetáculos foi projetada, em 1832, pelo arquiteto francês Auguste Henri Victor Grandjean de Montigny para o empresário Jean Victor Chabry, e construída na Rua São Francisco de Paula, depois denominada Rua do Teatro. Em 1855, o Teatro de São Francisco foi arrendado a Joaquim Heleodoro Gomes dos Santos, transformando-se no Teatro Ginásio Dramático. A inauguração ocorreu a 12 de abril de 1855, em espetáculo que exibiu a peça O Primo da Califórnia, de Macedo. Em 1861, o teatro foi arrendado a Joaquim Augusto Ribeiro de Souza. Entre 1867 e 1868, o ator Furtado Coelho passou a ser o administrador do teatro. Em 1884, a sala de espetáculos foi desativada. (Cf. DIAS, 2012, p. 103-104). 97 S. FRANCISCO. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 20 fev. 1841, p. 3. 98 Cf. CHARLE, Christophe. A Gênese da Sociedade do Espetáculo: teatro em Paris, Berlim, Londres e Viena. Tradução de Hildegard Feist. São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 144, 146-147. 99 Cf. BALDICK, Robert. La Vie de Frédérick Lemaître: le lion du boulevard. Traduction de Roger Lhombreaud. Paris: Éditions Denoël, 1961, passim. 70

populares.100 Na parte exterior dos teatros, reinava um ambiente festivo com espetáculos de feira (paradas, pantomimas, arlequinadas, marionetes, panoramas, dioramas)101, assim descrito por Honoré de Balzac em Histoire et Physiologie des Boulevards à Paris:

Oito teatros ali convidam incessantemente seus espectadores. Cinquenta comerciantes livres ali vendem comestíveis e fornecem o alimento ao povo, que dá dois tostões a seu ventre e vinte tostões a seus olhos. É o único lugar de Paris onde se ouvem os gritos de Paris, onde se vê o povo em multidão, e estes farrapos a surpreender um pintor, e estes olhares a atemorizar um proprietário.102

Nomeado o “Frédérick Lemaître brasileiro”, por apresentar “o mesmo temperamento, a mesma índole, os mesmos ímpetos e a mesma fenomenal grandeza”103 do ator francês, João Caetano protagonizou no Rio de Janeiro os melodramas que consagraram esse artista em Paris. Ao representar os mesmos papéis de Frédérick Lemaître, o ator brasileiro construiu sua imagem em simbiose com os caracteres dessas personagens, como o sangue nobre de D. César de Bazan, a coragem do corsário enriquecido Jorge Maurício (herói de A Dama de Saint-Tropez) e o grande talento do artista britânico Kean, que falecera em 1833. Contribuiu para esse fenômeno a descrição do jogo de cena de João Caetano, pelos folhetinistas de sua época, como espelho dos testemunhos das atuações de Frédérick Lemaître nos palcos parisienses, com destaque a uma forma de representação cênica que se ancorava em reminiscências da exaltação trágica aliada à expressividade melodramática. Os relatos que encontramos na imprensa brasileira sobre o desempenho de João Caetano no papel de Jorge Maurício, em A Dama de Saint-Tropez, assemelham-se fortemente aos dos críticos franceses que testemunharam a criação de Frédérick Lemaître em Paris, notadamente na cena seis do quinto ato, na qual a personagem reconhece pelo espelho a verdadeira identidade de seu envenenador: “Na cena, entre outras, quando se administrava-lhe o veneno, ele lançava a seu redor olhares estarrecidos que faziam estremecer todos os espectadores ofegantes. Quem

100 Cf. WILD, Nicole. Dictionnaire des Théâtres Parisiens au XIXe Siècle. Paris: Aux Amateurs de Livres, 1989, p. 34-38, 167-170 e 365-372. 101 Cf. GASCAR, Pierre. Le Boulevard du Crime. Paris: Hachette: Massin, 1980, p. 17. 102 BALZAC, Honoré. Histoire et Physiologie des Boulevards à Paris apud LEDDA, Sylvain. Paris Romantique. Tableaux d’une Ville Disparue. Paris: CNRS Éditions, 2013, p. 100. No original: “Huit théâtres y appellent incessamment leurs spectateurs. Cinquante marchandes en plein-vent y vendent des comestibles et fournissent la nourriture au peuple, qui donne deux sous à son ventre et vingt sous à ses yeux. C’est le seul point de Paris où l’on entende les cris de Paris, où l’on voit le peuple grouillant, et ces guenilles à étonner un peintre, et ces regards à effrayer un propriétaire.” 103 AZEVEDO, Arthur. O País, Rio de Janeiro, 24 ago. 1897, p. 1. Reimpresso em: AZEVEDO, Arthur. João Caetano. SBAT: Revista de Teatro, Rio de Janeiro, n. 322, jul.-ago./1961, p. 25. 71

não viu Frédérick Lemaître no papel de Georges Maurice nada viu, dizem”.104 A referida cena foi também o foco de análise dos folhetinistas teatrais brasileiros, que trataram do desempenho de João Caetano no mesmo papel.

Continuou enfim a representação do drama, no qual o Sr. João Caetano obteve sempre aplausos, pois foram mais que merecidos, porque o insigne artista representou com tal perfeição que seria impossível fazer-se mais. O terceiro e quinto atos foram de uma execução tal que a nosso ver excedeu os limites da perfeição. Julgamos ver o próprio Jorge Maurício na fúria do arrebatante ciúme ao receber a fatal carta (3º ato), ou o terror manifestado em um rosto desfigurado pelos sofrimentos ao ver no espelho a traição de Antônio, ministrando-lhe o veneno, um malvado ambicioso que ele julgava o seu maior amigo. Mas que dizemos, Jorge Maurício não o faria tanto ao vivo. À fé que o Gênio da Arte Dramática derramou sobre o nosso rei da cena nesta noite todas as perfeições que se podem imaginar.105

Os textos dramáticos criados nas salas de espetáculos populares de Paris eram publicados pelas coleções de peças de teatro, tais como Le Magasin Théâtral, La France Dramatique au XIXe Siècle, choix de pièces modernes, Le Musée Dramatique, pièces nouvelles représentées sur les Théâtres de Paris, Théâtre Parisien: pièces nouvelles e Répertoire Dramatique des Auteurs Contemporains. Dentre as coleções teatrais, destaca-se Le Magasin Théâtral, impresso que publicou a maioria dos melodramas franceses produzidos durante a Monarquia de Julho que foram montados no Brasil. Esta coleção, editada em Paris por Marchant e impressa por Dondey-Dupré a partir de 1834, colocava à disposição de um vasto público os textos dramáticos encenados nos teatros parisienses, vendidos a baixo preço.106 A coleção apresentava “uma vinheta gravada em preto e branco na abertura da primeira página de cada peça, antes do título, o nome do autor ou dos autores, a lista das personagens e dos atores e as primeiras indicações cênicas”.107 A vinheta de cabeçalho representava o quadro (tableau) de uma cena-chave da peça, geralmente o clímax da ação dramática.

104 CAZAUBON, Paul. Madame Lafarge au Théâtre, [s.d]. In: Cote 4-RF-40737 – Recueil factice d’articles de presse et programmes sur diverses pièces de Adolphe D’Ennery, premier volume, Collection Auguste Rondel, Bibliothèque des Arts du Spectacle, BNF – Richelieu. No original: “Dans la scène, entre autres, où on lui versait le poison, il jetait autour de lui des regards effarés qui faisaient frissonner tous les spectateurs haletants. Qui n’a pas vu Frédérick Lemaître dans le rôle de Georges Maurice n’a rien vu, paraît-il.” 105 SENTINELA do Teatro. Teatro S. Pedro de Alcântara. Reentrada do Rei da Cena João Caetano dos Santos. Periódico dos Pobres, Rio de Janeiro, 21 nov. 1854, p. 3. 106 Cf. COOPER, Barbara T. Encore un mot sur les publics du Magasin théâtral. Revue d’Histoire du Théâtre, Paris, n. 256, 2012, p. 414. 107 Idem. Les publics du Magasin Théâtral au XIXe siècle. Revue d’Histoire du Théâtre – Le Texte de théâtre et ses publics, Paris, n. 245-246, vol. 1-2, 2010, p. 68. No original: “une vignette gravée en noir et blanc en tête de la première page de chaque pièce, avant le titre, le nom de l’auteur ou des auteurs, la liste des personnages et des acteurs et les premières indications scéniques.” 72

Le Magasin Théâtral se destinava, segundo Barbara T. Cooper, ao público profissional, sobretudo aos diretores das províncias francesas e do estrangeiro, e aos leitores comuns. Assim, a concepção editorial da coleção almejava três objetivos: fornecer, além do texto dramático, as recomendações aos ensaiadores para que estes montassem a peça de acordo com as condições materiais de que dispunham; tornar a peça acessível ao leitor que não pôde ver a encenação no teatro; e oferecer aos que foram assistir à montagem “uma melhor compreensão do espetáculo”.108 As coleções teatrais foram importantes para o processo de difusão do melodrama da Monarquia de Julho no Brasil. Em primeiro lugar, porque duas trupes europeias que visitaram o Rio de Janeiro nos anos 1840 – a companhia francesa dirigida, inicialmente, por Ernest Gervaise, que ofereceu espetáculos de 1840 a 1848109, e a trupe espanhola dirigida pelo ator José de La Puerta, que representou no Teatro de São Pedro de Alcântara, em 1843 – possuíam repertório inspirado pelas coleções teatrais impressas em Paris. Em segundo lugar, porque Le Magasin Théâtral circulava no Rio de Janeiro, como constatamos a partir de anúncios de livreiros que vendiam exemplares desse impresso. Durante os anos 1840, o termo melodrama raramente foi empregado na identificação das peças que estrearam nos teatros populares e que estamparam as páginas de Le Magasin Théâtral. No prefácio de La Pauvre Fille (TPSM, 1838), Anicet-Bourgeois lamentou o ostracismo do termo, substituído pela designação de drama: “O Gaîté, o Ambigu, o Folies-Dramatiques, o Saint-Antoine, até o teatro de M. Dorsay não representam atualmente nada além do drama; o drama está por toda parte”.110 Contudo, apesar do quase desaparecimento do termo melodrama, os principais recursos do gênero (embate entre o bem e o mal, coups de théâtre, reconhecimento e justiça final) continuaram a ser empregados pela maioria dos dramaturgos dos teatros populares de Paris. Nesses teatros, a mistura dos gêneros operou-se de modo intenso, uma vez que a maior das preocupações dos dramaturgos estava na construção do espetáculo. O entrelaçamento dos gêneros originou novas nomenclaturas, como o drama entremeado de cantos, o drama burlesco, o drama-vaudeville e o drama-féerie. Ainda que apresentem filiações diversas aos gêneros dramáticos, esses melodramas produzidos durante a Monarquia de Julho (1830-1848) e o início do Segundo Império (1852-1870) se aproximam em um

108 Ibidem, p. 76. No original: “une meilleure compréhension du spectacle.” 109 Cf. INACIO, Denise Scandarolli. Cenas Esquecidas ou Vaudeville, Ópera-Comique e a Transformação do Teatro no Rio de Janeiro, dos Anos de 1840. 241 p. Tese (Doutorado em História) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2013, p. 59-62. 110 ANICET-BOURGEOIS, Auguste. La Pauvre Fille. Paris: Marchant, 1838, p. [1-2]. 73

ponto: denunciam o crime como consequência, não da ação perversa de um vilão por motivos simples de vingança (como no melodrama clássico), mas de um determinismo social que gera a ação do vilão. Em sua leitura de Antony, de Dumas (pai), Florence Naugrette argumentou que o drama romântico propõe que a sociedade burguesa é criminosa e produz um mal social que, hipocritamente, pretende erradicar.111 Pensamos que o melodrama romântico pretende afirmar esse mesmo discurso, porém o faz de forma branda, a partir de uma moralização final, devedora do melodrama clássico, que oscila entre o conformismo e a denúncia social, sem o tom frenético e direto do drama romântico. Os crimes são superados por um final feliz (happy end), alcançado pela intervenção da ação humana, que concilia as dissonâncias e atenua a tensão dramática (e social). Os recorrentes momentos patéticos e as canções atuam como forma de abrandamento do pessimismo e de amplificação do ensinamento moral. Foram esses melodramas que integraram a maior parte do repertório de João Caetano. No Teatro de São Francisco e no Teatro de São Januário, ao longo da década de 1840, o ator montou melodramas inéditos e incorporou outros que haviam estreado no palco do Teatro de São Pedro de Alcântara. De Félix Pyat, homem de letras defensor de uma República social na França e integrante da Comuna de Paris (1871), João Caetano encenou no Teatro de São Januário, em 1849, O Trapeiro de Paris (Le Chiffonier de Paris, TPSM, 1847), peça que denuncia a condição de exploração vivida pelos trabalhadores franceses, o “povo- escravo”112, sob o regime de Louis-Philippe. Da mesma estirpe de Le Chiffonier de Paris, João Caetano montou, em 1850, Os Mistérios de Paris (Les Mystères de Paris, TPSM, 1844), de Eugène Sue, peça adaptada do romance homônimo do escritor. Porém, os dois melodramas, de maior engajamento com temáticas sociais, não conquistaram longa permanência nos palcos. Assim que estrearam, logo saíram de cartaz. Ao contrário, as peças mais patéticas, como A Dama de Saint-Tropez e A Gargalhada (L’Éclat de Rire, TG, 1840), de Jacques Arago e Alexandre Martin, e as recheadas de cantos foram as que se transformaram nos grandes sucessos do repertório de João Caetano. A ascensão do vaudeville, nos anos 1840, motivou a composição de uma série de melodramas que incluíram coplas, árias e coros entre os diálogos e monólogos. Para

111 NAUGRETTE, 2011b, p. 37. 112 SABATIER, Guy. Le Mélodrame de la République Sociale et le Théâtre de Félix Pyat. Tome I. Paris: L’Harmattan, 1998, p. 313. No original: “peuple-esclave”. 74

Sylvain Ledda, “a contribuição da cena romântica, é precisamente a invenção de novas poéticas a partir do caldeirão que constitui a mistura das categorias e dos gêneros”.113 Tendo em vista o espaço que o vaudeville conquistou na cultura teatral do Rio de Janeiro, pela atuação de artistas franceses que representaram um rico repertório no Teatro de São Januário, de 1840 a 1846, e no Teatro de São Francisco, de 1846 a 1848114, João Caetano introduziu em seu repertório melodramas entremeados de cantos. Protagonizou A Graça de Deus (La Grâce de Dieu, TG, 1841), de Dennery e Gustave Lemoine, e D. César de Bazan, de Dennery e Dumanoir, peças que entremeiam suas cenas com canções e introduzem passagens cômicas que conferem tom burlesco em momentos específicos da ação dramática. Modelo semelhante ao drama burlesco Robert Macaire (TFD, 1834), de Frédérick Lemaître, Antier, Saint-Amand e Paulyanthe, montado por João Caetano em 1846.115 Esse repertório de melodramas de sucesso foi reprisado por João Caetano durante a década de 1850, no Teatro de São Pedro de Alcântara. Em março de 1851, após a demissão do antigo diretor, José Bernardino de Sá, que levara o teatro a uma crise financeira, o ator retomou a direção dessa sala de espetáculos, da qual fora despedido em 1841. Na época, embora passasse a se dedicar mais aos trabalhos como empresário teatral, o retorno de João Caetano ao principal teatro do Rio de Janeiro, onde permaneceu até sua morte, em 1863, foi preponderante na manutenção do melodrama francês nos palcos. Durante a nova estadia no Teatro de São Pedro de Alcântara, João Caetano montou melodramas franceses inéditos no Rio de Janeiro. Contudo, apesar de terem sido criadas nos anos 1850, em Paris, essas peças se estruturavam sob o mesmo denominador comum dos melodramas da década anterior, sem apresentar inovações no esquema literário e cênico. Em se tratando do modelo literário, mesmo que os temas pendessem para questões sociais contemporâneas – como o embate gerado pela convivência e possível mistura entre as ordens sociais (nobreza, burguesia e povo) e a tensão moral ocasionada pelas consequências da pobreza –, o discurso prosseguia atenuante, o tempo da ação dramática continuava a se ancorar no passado histórico recente (sobretudo no período da Revolução de 1789 e da Restauração), recusando-se a fixar a mimese na época coetânea, os efeitos patéticos e os coups de théâtre ainda ditavam o tom das ações dramáticas. Em termos da sociologia dos

113 LEDDA, 2009, p. 179. No original: “l’apport de la scène romantique, c’est justement l’invention de nouvelles poétiques à partir du creuset que constitue le mélange des catégories et des genres.” 114 Sobre a presença dos artistas franceses no Rio de Janeiro, ao longo da década de 1840, ver INACIO, 2013. 115 Sobre a montagem de Robert Macaire por João Caetano, ver CARVALHO, Danielle Crepaldi & RONDINELLI, Bruna Grasiela Silva. “Da Estalagem dos Trampolineiros para o mundo: a saga do adorável vagabundo Robert Macaire”. In: ANTIER, Benjamin; SAINT-AMANT & PAULYANTHE. A Estalagem dos Trampolineiros: melodrama de grande espetáculo em três atos. Tradução, apresentação e notas de Danielle Crepaldi Carvalho e Bruna Grasiela Silva Rondinelli. São Paulo: Editora Penalux, 2015, p. 97-98. 75

espetáculos, eram obras dos dramaturgos dos teatros populares, tais como Dennery, Anicet- Bourgeois e Marc Fournier, representadas, majoritariamente, por Frédérick Lemaître, que chegava então ao final de sua carreira artística. Além das estreias de melodramas franceses inéditos, João Caetano reprisou as peças que o haviam consagrado na década anterior, como A Gargalhada, D. César de Bazan, A Dama de Saint-Tropez, Trinta Anos ou a Vida de um Jogador, Os Seis Degraus do Crime e Os Sete Infantes de Lara (Les Sept Infants de Lara, TPSM, 1836), de Félicien Mallefille. Estes melodramas, juntamente com a tragédia Othelo, transformaram-se nos carros-chefes do repertório de João Caetano, garantindo-lhe boa recepção junto aos espectadores quando subiam aos palcos. Por isso, em récitas especiais, como a que ofereceu no Teatro Lírico Fluminense116, em setembro de 1856, o ator escolheu representar A Dama de Saint-Tropez, já que sua atuação no papel de Jorge Maurício era apreciada e elogiada.117

1.3.3 Os melodramas brasileiros

Mesmo com a predominância do repertório francês, sabemos que João Caetano não ignorou as peças brasileiras. Em 1838, protagonizou a tragédia Antonio José ou o Poeta e a Inquisição, de Gonçalves de Magalhães, e nesse mesmo ano, sua companhia dramática representou a primeira comédia de Martins Pena, O Juiz de Paz da Roça. Estas encenações foram celebradas pelas histórias literárias e teatrais como o marco de fundação de nosso teatro, tendo em vista que as duas peças, de autores e temáticas nacionais, foram montadas nos palcos por atores brasileiros. No entanto, se considerarmos os melodramas brasileiros, escritos na década de 1840 por Martins Pena e Burgain, verificamos que essas peças estrearam nos palcos do Rio de Janeiro não somente pela atuação de João Caetano e de sua companhia dramática. Outros primeiros atores brasileiros também protagonizaram as peças desses autores, como Germano Francisco e Florindo Joaquim. Os artistas portugueses do grupo de Ludovina Soares integraram igualmente os elencos das montagens desses melodramas.

116 Localizado no Campo de Santana, e inaugurado em 25 de março de 1852 como Teatro Provisório, a sala de espetáculos foi construída para oferecer programas líricos, uma vez que o Teatro de São Pedro de Alcântara se encontrava em reconstrução, devido ao incêndio ocorrido em 1851. Em 1854, passou a ser denominado Teatro Lírico Fluminense. Em 1875, foi fechado para as reformas dos jardins do Campo de Santana. Como suas estruturas estavam comprometidas, o teatro foi demolido. (Cf. DIAS, 2012, p. 109-112). 117 Ver anexos “Figura 4 – João Caetano dos Santos (1808-1863)”, “Figura 5 – Percurso de João Caetano nos Teatros” e “Tabela 7 – Repertório Francês de João Caetano no Rio de Janeiro (1835-1862)”. 76

Martins Pena compôs os melodramas Fernando ou o Cinto Acusador, D. João de Lira ou o Repto, Itaminda ou o Guerreiro de Tupã, D. Leonor Teles e Vitiza ou o Nero de Espanha. Apenas a última peça foi representada na época. A estreia de Vitiza ou o Nero de Espanha ocorreu a 21 de setembro de 1845. A peça permaneceu em cartaz entre os meses de setembro e outubro do mesmo ano. A montagem contou com o empenho da direção do Teatro de São Pedro de Alcântara, que se esforçou para preparar uma encenação “com todo o primor e pompa”118 que fizesse jus ao texto dramático de Martins Pena. Para tanto, a representação foi “enriquecida de todo o aparato necessário”119, como figurinos e cenários novos. Não foi possível identificar os artistas participantes da montagem. Certificamo-nos que não poderia ter sido João Caetano, que se encontrava na direção da companhia dramática do Teatro de São Francisco. Muito provavelmente, a representação pode ter contado com as participações de Germano Francisco e Florindo Joaquim, então primeiros atores do Teatro de São Pedro de Alcântara. Os melodramas de Martins Pena foram relegados a segundo plano nos estudos do autor, e considerados de pouca importância para o estabelecimento de sua obra dramática, pois nada teriam agregado ao nome do célebre comediógrafo dos costumes brasileiros, como sugeriu Sábato Magaldi.120 Contudo, verificamos que, a partir da estreia de Vitiza ou o Nero de Espanha, os anúncios teatrais veiculados pela imprensa passaram a divulgar o nome de Martins Pena – “L. C. M. Pena” ou “Sr. Pena” – como dramaturgo e a lhe conferir a autoria das comédias que, anteriormente, haviam sido anunciadas anonimamente. Isso revela o prestígio do gênero melodrama na época e a importância que Vitiza ou o Nero de Espanha desempenhou no processo de afirmação e divulgação da autoria de Martins Pena.121 Em setembro de 1846, para o espetáculo de reabertura do Teatro de São Francisco, que havia sido fechado para obras de reforma, João Caetano escolheu representar, dentre “cinco dramas de diversos autores”122, a peça Amador Bueno ou a Fidelidade Paulistana, de Joaquim Norberto de Sousa e Silva. Em uma de suas críticas teatrais da série “A Semana Lírica”, publicada pelo Jornal do Commercio de 1846 a 1847, Martins Pena

118 THEATRO de S. Pedro de Alcântara. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 20 set. 1845, p. 3. 119 Ibidem. 120 Para Sábato Magaldi, “os cinco dramas completos nada acrescentaram ao nome literário de Martins Pena”. (MAGALDI, Sábato. Panorama do Teatro Brasileiro. 5 ed. São Paulo: Global, 2001, p. 58). 121 Cf. RONDINELLI, Bruna Grasiela da Silva. Martins Pena, o Comediógrafo do Teatro de São Pedro de Alcântara: uma leitura de O Judas em Sábado de Aleluia, Os Irmãos das Almas e O Noviço. 291 p. Dissertação (Mestrado em Teoria e História Literária) – Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2012, p. 61-63. 122 MARTINS PENA, Luís Carlos. Abertura do Theatro de S. Francisco. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 25 set. 1846, Folhetim do Jornal do Commercio, p. 2. 77

tratou da recepção fria que a encenação do melodrama obteve junto ao público. Para o crítico, em termos da escrita dramática, “Amador Bueno tem boas cenas e não é mal conduzido”. O ponto franco da peça estava no assunto histórico de que tratava, um capítulo da história paulistana do século XVII: a recusa do capitão-mor Amador Bueno em aceitar a sua aclamação como Rei em São Paulo, declarando-se fiel à Coroa portuguesa. Tema que, segundo Martins Pena, “nada tem de dramático”.123 Destino diferente encontraram os melodramas de Burgain, que obtiveram maior permanência e foram difundidos nos teatros brasileiros. Nascido em 1812 na região do Havre, na França, Burgain imigrou para o Rio de Janeiro ainda jovem. Desenvolveu uma gama de atividades envolvendo a imprensa, a dramaturgia, o Conservatório Dramático Brasileiro e o ensino da língua francesa.124 Para o teatro compôs dezesseis peças, distribuídas entre os gêneros melodrama, vaudeville e tragédia. Seus melodramas estrearam nos palcos do Rio de Janeiro entre 1837 e 1860 pela atuação de quatro atores principalmente: João Caetano, Florindo Joaquim, Germano Francisco e Ludovina Soares. João Caetano e Florindo Joaquim participaram juntos das montagens de A Última Assembleia dos Condes Livres e de Glória e Infortúnio ou a Morte de Camões, em 1837, no Teatro Constitucional Fluminense. João Caetano protagonizou O Vaticínio, em 1841, no Teatro de São Francisco, e A Casa Maldita ou a Mocidade de D. Afonso VI, em 1853, no Teatro de São Pedro de Alcântara. Florindo Joaquim desempenhou a personagem título de Pedro-Sem, que já teve e agora não tem, em 1845, no Teatro de São Pedro de Alcântara. Germano Francisco e Ludovina Soares participaram do elenco das montagens de O Amor de um Padre ou a Inquisição em Roma no Teatro de São Januário, em 1839, e de Fernandes Vieira ou Pernambuco Libertado no Teatro de São Pedro de Alcântara, em 1843. Germano Francisco protagonizou Luiz de Camões, em 1845, no Teatro de São Pedro de Alcântara, e Mosteiro de Santo Iago, em 1860, no Teatro de São Januário. Ludovina Soares protagonizou ao lado do ator português Miguel Arcanjo Gusmão (1809-1886) o melodrama Três Amores ou o Governador de Braga, em 1848, no Teatro de São Pedro de Alcântara. Quando consideramos os melodramas brasileiros, constatamos que João Caetano não foi o único ator a protagonizar essas peças nos palcos. Ludovina Soares foi importante na representação das personagens femininas dos melodramas de Burgain, ao passo que Germano Francisco e Florindo Joaquim também desempenharam os papéis dos heróis dessas peças. De

123 MARTINS PENA, 25 set. 1846, p. 2. 124 Cf. LUIS Antonio Burgain. In: SILVA, tomo quinto, 1860, p. 215-217, e LUIZ Antonio Burgain. In: BLAKE, Augusto Victorino Alves Sacramento. Diccionario Bibliographico Brazileiro. Vol. 5. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1899, p. 348-351. [Reimpressão de Off-set, Conselho Federal de Cultura, 1970]. 78

fato, os dois atores brasileiros foram grandes concorrentes de João Caetano no protagonismo do melodrama nos palcos.

1.4 De discípulos a rivais de João Caetano

No início do Segundo Reinado, o teatro oferecia uma gama de atividades de trabalho aos indivíduos da camada de trabalhadores livres. Foi um momento de incremento no número de atores que se apresentavam nas salas de espetáculos. Com o aumento da oferta de primeiros atores, que aspiravam a uma carreira de empresários teatrais, de forma semelhante a João Caetano, as disputas por público e financiamento se acentuaram. As rivalidades contribuíram para a expansão das montagens de melodramas franceses, assim como para o estabelecimento de peças de sucesso. Nos anos 1840, a trupe do Teatro de São Pedro de Alcântara contava com alguns atores brasileiros, como Germano Francisco, Florindo Joaquim e Francisco de Paula Dias, e os artistas portugueses que pertenceram ao Teatro da Praia de D. Manuel/Teatro de São Januário, como Ludovina Soares. O Tetro de São Francisco, dirigido por João Caetano de 1841 a 1850, firmava-se como um concorrente dos espetáculos oferecidos pelo grande teatro que se localizava ao lado. Assim, menos que uma exclusividade da companhia dramática de João Caetano, a atividade teatral no Rio de Janeiro contou com outras trupes e primeiros atores. Estes representavam também os melodramas franceses, como é o caso de Germano Francisco. Em início de carreira na década de 1840, o jovem ator despontava entre os artistas do Teatro de São Pedro de Alcântara como protagonista de melodrama, gênero que o acompanhou nos palcos até meados dos anos 1870.

1.4.1 Germano Francisco de Oliveira

Germano Francisco de Oliveira nasceu no Rio de Janeiro, a 28 de maio de 1820, e faleceu na Santa Casa da Misericórdia, na mesma cidade, a 25 de dezembro de 1885. Estudou no Seminário de São Joaquim e se tornou aprendiz em uma oficina de marcenaria. Na juventude, postulou uma vaga nas forças armadas, mas não obteve êxito. Ao lado do interesse pela carreira militar, Germano Francisco demonstrava inclinação pela arte dramática. Seu 79

biógrafo, Joaquim Serra, comentou que o jovem assistia com frequência aos ensaios da companhia do Teatro Imperial de São Pedro de Alcântara.125 Assim como João Caetano, Germano Francisco dedicou a vida como profissional do teatro. Sua presença nos palcos, segundo averiguamos, deu-se até meados da década de 1870. Depois, afastou-se da arte dramática e se tornou médico homeopata, segundo informação de Arthur Azevedo em crônica datada de 1885.

O último papel desempenhado por Germano de Oliveira foi o de médico homeopata, e, que me conste, nenhum outro criou tão a contento do público rio-grandense. Fez- se doutor “In absentia” pela Universidade de Bruxelas, prestou exame de suficiência na Faculdade do Rio de Janeiro [...].126

Germano Francisco estreou na carreira teatral aos 13 anos de idade, no Teatro da Rua dos Arcos127, onde se apresentava a companhia dramática portuguesa de Ludovina Soares que, nesse momento, aguardava a finalização das obras de construção do Teatro da Praia de D. Manuel. Em 1834, antes de se instalar definitivamente no teatro dos artistas portugueses, onde permaneceu até 1840, o jovem ator se apresentou em um dançado no Teatro Constitucional Fluminense: “Germano Francisco de Oliveira dançará o solo inglês”.128 No palco do Teatro da Praia de D. Manuel/Teatro de São Januário, Germano Francisco desempenhou papéis em traduções da dramaturgia francesa. Em 4 de setembro de 1838, ofereceu um espetáculo beneficente que exibiu a peça A Família de um Judeu ou o Preboste de Paris (Le Prévôt de Paris, TG, 1836), de Auguste-Louis-Désiré Boulé e Eugène Cormon, traduzida por Luís Baiardo. Participou da montagem de Alice ou as Duas Mães (Alix ou les Deux Mères, TPSM, 1838), de Charles Desnoyer e Alphonse Brot, em espetáculo ocorrido a 30 de abril de 1839. Tornou-se um ator notório somente após 1841, quando participou da contenda provocada pela demissão de João Caetano do Teatro de São Pedro de Alcântara. Na ocasião, Germano Francisco foi escalado para substituir o ator demitido no papel de Samuel em Os Dois Renegados, drama de Mendes Leal. Ao assumir o papel do protagonista de uma peça que começava a fazer sucesso e obter reprises, Germano Francisco despontou na cena teatral carioca.

125 Cf. SERRA, 1862, p. 3-5. 126 AZEVEDO, Arthur. De Palanque. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 28 dez. 1885, p. 2. 127 Na Rua dos Arcos foi inaugurado, em 1826, o modesto Teatrinho da Rua dos Arcos. Em 22 de agosto de 1834, o teatro foi vendido com todos os seus utensílios pelo leiloeiro Frederico Guilherme. Não ofereceu mais espetáculos a partir de então. (Cf. DIAS, 2012, p. 102-103). 128 DIÁRIO do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 20 nov. 1834, p. 4. 80

No início dos anos 1840, os dramas portugueses passaram a ser montados nos palcos do Rio de Janeiro. Nessa época, os homens de letras em Portugal, comprometidos com o projeto de fundação do teatro nacional sob a liderança de Almeida Garrett, produziram uma série de dramas históricos forjados na poética do drama romântico e do melodrama franceses. Dentre a produção desses dramaturgos portugueses, verificamos que a obra dramática de Mendes Leal foi a mais representada nos palcos brasileiros. Os dramas de Mendes Leal se constituem por um tema histórico, cuja função didática e patriótica é bem marcada, e por um tema amoroso, tratado de forma sentimental. As ações dramáticas se estruturam a partir da poética do melodrama francês. Assim, as peças apresentam uma visão maniqueísta do mundo, dividem as personagens entre boas e más, fazem uso de reviravoltas, do reconhecimento e da justiça final que condena o vício e premia a virtude.

[Mendes Leal] alentado pelo êxito obtido na sua estreia [com Os Dois Renegados], reincidiu com O Homem da Máscara Negra, D. Maria de Alencastre, O Pajem de Aljubarrota e A Pobre das Ruínas [...]. O pendor melodramático e folhetinesco de sua primeira produção exacerba-se nestas, manifestando-se desde os subtítulos apostos aos vários atos (por exemplo, “A Voz do Túmulo” e “Quem pode Salvá-la?” no primeiro dos dramas citados, “Tormenta e Tormentos” e “O Batismo do Sangue”, no último) à intervenção de personagens enigmáticas (designadas por “O Incógnito”, “O Desconhecido”, “O Embuçado”...) cuja verdadeira identidade é revelada em momentos culminantes da ação, e que geralmente – o que corresponde a um dos tópicos mais frequentes da literatura gótica – se supunham defuntas.129

Os Dois Renegados (Teatro da Rua dos Condes, 1839), premiado pelo Conservatório Real de Lisboa, foi o drama de Mendes Leal de maior destaque nos repertórios de João Caetano e de Germano Francisco.130 A peça, cujas ações dramáticas se situam em 1498, apresenta duas linhas principais: o tema amoroso, que trata do casamento entre cristãos e judeus, e o tema histórico, que aborda a perseguição aos judeus em Portugal. Mendes Leal esclareceu, no prefácio da primeira edição de Os Dois Renegados, que as ideias de Victor Hugo, as cenas movimentadas criadas por Dumas (pai) e o sublime em Delavigne foram as fontes de sua inspiração.

As ideias profundas e arrebatadas de Victor Hugo; as ricas e formosas cenas de Dumas; as magnificências e sublimidades de Casimir Delavigne, produziram-me n’alma um sentimento indefinível, um desejo indistinto, que mesmo se quisesse eu não pudera explicá-lo. Houve por muito tempo em mim um pensamento vago e

129 REBELLO, Luiz Francisco. O Teatro Romântico (1838-1869). Lisboa: Bertrand, 1980, p. 56-57. 130 Ver RONDINELLI, Bruna Grasiela Silva. Os Dramas Históricos de Mendes Leal nos Palcos do Rio de Janeiro: notas sobre as encenações e a recepção crítica. Convergência Lusíada, Rio de Janeiro, vol. 32, p. 40-50, 2014. 81

inaplicado, foi pouco a pouco tomando corpo, vestiu as formas da realidade e deste pensamento nascido, apareceu por fim o drama Os dois renegados!131

Apesar de ter pretendido uma aproximação com o drama romântico de Victor Hugo e de Dumas (pai) e com a tragédia juste milieu de Delavigne, Mendes Leal reproduziu os elementos essenciais do melodrama. Entretanto, o “pendor melodramático e folhetinesco”132 de Os Dois Renegados fascinou o público lisboeta na ocasião de sua criação no Teatro da Rua dos Condes. Ana Isabel P. Teixeira de Vasconcelos, ao avaliar o relatório do júri do Conservatório Real de Lisboa, que conferiu um prêmio ao drama de Mendes Leal, constatou que a peça obteve boa recepção junto ao público.

Os Dois Renegados considerado hoje um texto de pendão melodramático, mereceu “o aplauso unânime”, devido não só à “disposição e progresso” do drama, como aos “seus caracteres exaltados e constantes” e, principalmente, às “suas engenhosas peripécias e excelentes desfechos”. O estilo, continua o júri, “fantasmagórico e cheio de expressões coruscantes, ajudou a fasciná-los completamente”.133

Os Dois Renegados se transformou no drama português mais emblemático nos palcos do Rio de Janeiro no início da década de 1840, por estar inserido na primeira polêmica entre João Caetano e Germano Francisco. A contenda foi desencadeada menos pelo teor do drama que por disputas de contrato que feriram as ambições de João Caetano de acumular às funções de primeiro ator e ensaiador, que já desempenhava, a administração do teatro. Esse primeiro embate entre João Caetano e Germano Francisco envolveu questões mais profundas sobre a condição dos profissionais da atividade teatral que uma simples disputa de ego. Reconstituímos a polêmica a partir de textos críticos e de correspondências dos artistas e administradores do teatro publicados pela imprensa na época. O caso demonstrou que as fronteiras entre as categorias de administrador, ensaiador e primeiro ator eram extremamente tênues no teatro brasileiro. As funções do campo teatral não eram especializadas durante o século XIX, assim como as conhecemos atualmente. Segundo Hélène Boisbeau, na França, diretor era o proprietário ou o administrador do teatro; produtor, o responsável pelos projetos artísticos de uma sala de espetáculos específica – no Brasil, acreditamos que essa função era realizada pelo inspetor dramático –; diretor de cena, o encarregado da criação artística de uma companhia

131 LEAL, José da Silva Mendes. Os Dois Renegados. Lisboa: Tipografia da Sociedade Propagadora dos Conhecimentos Úteis, 1839, p. VI. 132 REBELLO, 1980, p. 54. 133 VASCONCELOS, 2003, p. 68. 82

dramática ou de um teatro134 – o que corresponderia ao ensaiador brasileiro. Somente no final do século XIX, houve a especialização das competências das profissões teatrais, devido, principalmente, ao engajamento de André Antoine no Théâtre-Libre e ao surgimento da figura do encenador moderno.135 Como defende Roxane Martin, a produção dramática romântica exigiu maior atenção com a mise en scène e, assim, demandou cada vez mais os trabalhos do diretor de cena, uma vez que os gêneros populares se preocupavam fortemente com a realização cênica. Nesse momento em que a escrita dramática e a mise en scène estreitaram laços, o diretor de cena se tornou essencial para concretizar materialmente no palco as orientações que os dramaturgos registravam nas didascálias: bailados, canções, efeitos visuais, desastres naturais, mudanças de cenários etc.136 No Brasil, as fronteiras entre as competências das categorias de administrador, inspetor dramático, ensaiador e primeiro ator eram profundamente porosas. O primeiro ator desempenhava também as funções de ensaiador e, em alguns casos, o de gestor de teatros e empresário de companhias dramáticas. Como constatamos, os primeiros atores brasileiros João Caetano, Germano Francisco, Florindo Joaquim e Joaquim Augusto cuidaram da mise en scène de peças inéditas que protagonizaram, administraram salas de espetáculos e foram empresários de companhias dramáticas. Na prática, isso quer dizer que, além de atuarem como protagonistas, foram responsáveis por coordenar a escolha das peças a serem encenadas e por submetê-las à censura do Conservatório Dramático Brasileiro; foram tesoureiros de suas empresas dramáticas; e como ensaiadores, ocuparam-se da “arrumação dos móveis e objetos de cena” 137, dos figurinos dos atores, da movimentação cênica e da marcação dos papéis. Em 1838, o Teatro de São Pedro de Alcântara foi arrematado por uma sociedade comercial, dividida entre quarenta acionistas, os quais decidiram, em dezembro de 1840, nomear Luiz Manuel Álvares de Azevedo para ocupar o cargo de diretor da casa de espetáculos, com o ordenado mensal de três contos de réis.138 Ele disputava a vaga com o ator

134 Ver BOISBEAU, Hélène. “Évolution des contours sociologiques et juridiques de la profession (1789-1992)”. In: GOETSCHEL, Pascale & YON, Jean-Claude (Dir.). Directeurs de Théâtre, XIXe-XXe Siècles: histoire d’une profession. Paris: Publications de la Sorbonne, 2008, p. 13. 135 Cf. MENEGHELLO, Sarah. “Paroles de privé, paroles de subventionné, concurrence entre directeurs ou destin partagé?”. In: Ibidem, p. 46. 136 Ver MARTIN, Roxane. L’Émergence de la Notion de Mise en Scène dans le Paysage Théâtral Français (1789-1914). Paris: Classiques Garnier, 2013, p. 51-165. 137 FRAGA, Eudinyr. “Ensaiador”. In: GUINSBURG, J.; FARIA, João Roberto & LIMA, Mariangela Alves de (Orgs.). Dicionário do Teatro Brasileiro: temas, formas e conceitos. São Paulo: Perspectiva: Sesc São Paulo, 2006, p. 127-128. 138 Cf. ELEIÇÃO do atual diretor. Coruja Theatral, Rio de Janeiro, 29 dez. 1840, p. 2. 83

português Joaquim de Barros e com Albino José de Carvalho, que se demitira do cargo meses antes. A eleição provocou uma reviravolta na carreira de João Caetano. A redação do Coruja Theatral, periódico de caráter panfletário que surgiu para defender os interesses do ator, criticou a nomeação do novo diretor, pois acreditava que Luiz de Azevedo desconhecia as regras dramáticas e era um “homem mal-educado, extremamente grosseiro, cheio de ar mefítico, e só habilitado para tratar com animais”.139 De acordo com um artigo publicado pelo segundo número desse jornal, João Caetano estava descontente com o novo regulamento proposto pelo diretor, que feria os direitos já estabelecidos pelos contratos assinados com os artistas da companhia. Até então, João Caetano usufruía de certa autonomia artística e financeira, situação que se desestabilizou com a chegada de Luiz de Azevedo. Devido ao novo regulamento do teatro, João Caetano se desentendeu com o diretor e, pela insubordinação, foi demitido. Em janeiro de 1841, o ator desempregado deu início a uma ação civil contra Luiz de Azevedo, que não apareceu na audiência de reconciliação com o Juiz de Paz. Um artigo anônimo veio à tona na primeira página do Diário do Rio de Janeiro, em 18 de janeiro de 1841. O autor reconhecia o talento artístico de João Caetano, mas acreditava que, devido ao seu “gênio fogoso”140, sempre se indispunha com os diretores. Citou desavenças que o ator teria tido com Gonçalves de Magalhães e Albino J. de Carvalho, outrora diretores do Teatro de São Pedro de Alcântara. Comentou que João Caetano ambicionava o cargo de diretor do teatro e, por isso, descontentara-se com a escolha de Luiz de Azevedo. Para se defender da acusação de que estivera em desarmonia com todos os diretores do Teatro de São Pedro de Alcântara, João Caetano logo fez publicar no Diário do Rio de Janeiro uma série de cartas assinadas por ex-diretores do teatro “que provam plenamente o contrário”.141 Na primeira carta publicada, datada de 21 de janeiro de 1841, Albino J. de Carvalho asseverou que durante a sua direção não tivera problemas com o ator, que “foi assíduo em cumprir com os seus deveres, merecendo as simpatias do público e a minha particular estima por ter sob a minha direção um artista de tão reconhecido mérito”.142

139 Ibidem, p. 1. 140 APÊNDICE. O Teatro S. Pedro. Seu diretor. Luiza de Lignerolles. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 18 jan. 1841, p. 2. 141 SANTOS, João Caetano dos. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 23 jan. 1841, Correspondências, p. 1. 142 CARVALHO, Albino José de. Diário do Rio de Janeiro, 23 jan. 1841, p. 1. 84

A segunda carta impressa era de autoria de José Carlos Mairink, também ex- diretor do Teatro de São Pedro de Alcântara. Assim como Albino J. de Carvalho, o remetente declarou que sob sua direção não tivera “nenhuma desinteligência” com o ator e que sempre fora por ele tratado “com toda a urbanidade e consideração”. Na relação que estabeleceu com o artista reinou “a melhor harmonia”.143 Em seguida, foi divulgado um documento de Francisco José Pinheiro Guimarães, datado de abril de 1840, quando este, então diretor do Teatro de São Pedro de Alcântara, nomeara João Caetano para o cargo de ensaiador do teatro. A cada drama inédito que montasse, o ator recebia a quantia de trinta mil réis. Isso nos permite pensar que havia uma demanda pelo drama e que o ensejo de João Caetano de levar ao palco peças ainda não encenadas teria uma motivação, além de artística, financeira.

Eu, abaixo assinado, diretor e inspetor dramático dos teatros de S. Pedro de Alcântara e de S. Januário, atendendo a todas as qualidades que concorrem na pessoa do 1º ator João Caetano dos Santos, para bem desempenhar o cargo de ensaiador, pois que, além de muita atividade, infatigável zelo e sumo bom gosto, tem dado provas do quanto se esforça por elevar e abrilhantar a cena brasileira, o nomeio ensaiador da companhia dramática, isso é, naquelas peças cujo ensaio eu houver de encarregar-lhe, pois que os teatros tem outro ensaiador, que é o ator Victor Porfírio de Borja, ficando-me porém sempre competindo as distribuições das partes pelos diversos atores, pois que pelo meu lugar, mais ciente devo estar de todas as escrituras e suas cláusulas. [...] enquanto durar a minha administração nos teatros (a salvo qualquer desinteligência imprevista) dar-lhe a quantia de trinta mil réis como gratificação por cada drama novo que subir à cena ensaiado por ele, começando a vencer esta gratificação da nova peça Os Sete Infantes de Lara, que com tantos aplausos e aprovação pública se representou na noite de 20 do corrente. Rio de Janeiro, 22 de abril de 1840. Francisco José Pinheiro Guimarães, diretor e inspetor dramático.144

Com a demissão, os simpatizantes de João Caetano organizaram uma pateada no Teatro de São Pedro de Alcântara, que ocorreu durante o espetáculo de 24 de janeiro de 1841, cujo programa exibiu o drama Os Dois Renegados. O espetáculo escolhido para a manifestação do público não poderia ser outro. João Caetano criara recentemente no palco o papel de Samuel, herói do drama de Mendes Leal, e sua representação da personagem adquirira valor simbólico junto a uma parcela da plateia, que considerava o ator um representante da nacionalidade brasileira a ser defendido publicamente, tendo em vista suas disputas no teatro com o ator e ensaiador português Victor Porfírio de Borja. Para o espetáculo, fora anunciado o ator Germano Francisco para substituir João Caetano no papel principal, o que desagradou ao público. A crônica “A trovoada teatral”, assinada por P. e

143 MAIRINK, José Carlos. Diário do Rio de Janeiro, 23 jan. 1841, p. 1. 144 GUIMARÃES, Francisco José Pinheiro. Diário do Rio de Janeiro, 23 jan. 1841, p. 1. 85

publicada pelo Diário do Rio de Janeiro, a 3 de fevereiro de 1841, narrou os acontecimentos daquela noite.

[...] subiu o pano, apareceu o velho Simeão lendo a bíblia, e o espetáculo continuou tranquilo até o momento em que Samuel cheio de amor por Isabel vinha confiar a Lope da Silva, seu cunhado, o segredo que mais o deleitava. Bate à porta, entra, e apenas Esther sua irmã lhe dirige as fatais palavras – Tarde vens Samuel, rebentou a estrepitosa trovoada – Fora o ator Germano! Venha o ator João Caetano que está em casa pronto para representar! Foram os altos gritos ouvidos por espaço de meia hora no meio da mais violenta pateada. [...] a pateada continua cada vez mais viva, os foras se reproduzem e as moedas de 40 rs. chovem em abundância sobre o tablado onde se achavam mudos e quedos os infelizes e inculpados atores. [...] o alarido continuou, a desordem progrediu. Ordenaram então as autoridades que descesse o pano e se desse por findo o espetáculo [...]. Frustrados assim os seus mais caros desejos, que eram de fazer vir à cena o Talma do Rossio, os admiradores deste gênio entenderam dever vingar-se por qualquer modo: pagou então o pobre lustre as custas, quebrando-lhe uns poucos vidros; as cadeiras sofreram também estrago; e a geral não foi esquecida. Os candeeiros dos corredores igualmente mereceram a pública atenção, e um camaroteiro levou meia dúzia de caçoletas para ficar-lhe o dia impresso na memória.145

Na saída do teatro, após a pateada, 35 simpatizantes de João Caetano se reuniram na Praça da Constituição e assinaram uma petição pela readmissão do ator e a demissão do diretor Luiz de Azevedo. O Juiz de Paz Carlos José de Almeida encaminhou o documento a D. Pedro II, em 25 de janeiro de 1841. No entanto, Limpo de Abreu, Ministro da Justiça na época, indeferiu a petição. João Caetano, em nova carta publicada pelo Diário do Rio de Janeiro dias depois, reforçou o fato de ter sido “arbitrariamente despedido do teatro”.

Quando a sociedade empresária entender que fui despedido sem motivo plausível, e que o diretor não podia fazê-lo sem quebra da minha escritura, não precisará de empenhos para terminar a questão, e eu irei coadjuvar a sua empresa. E enquanto isto se não verificar, aqui mesmo na corte recorrerei à minha arte para adquirir meios de subsistência, a fim de não pesar aos meus amigos, e nem à sociedade. Espero de sua imparcialidade a publicação destas linhas. O seu respeitoso leitor, João Caetano dos Santos.146

Mesmo após a contenda na imprensa, a tentativa de reconciliação diante do Juiz de Paz, a pateada no teatro e a petição, João Caetano não foi readmitido pela direção do Teatro de São Pedro de Alcântara. Alguns artistas desse teatro, como Estela Sezefreda, Florindo Joaquim, Francisco Manuel de Sousa, Maria Cândida de Sousa, José Luís da Silveira e José Romualdo, posicionaram-se a favor da causa de João Caetano e anunciaram seus respectivos desligamentos. Os atores seguiram João Caetano na formação de uma nova

145 P. A trovoada teatral. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 3 fev. 1841, Comunicado, p. 1, grifos do autor. 146 SANTOS, João Caetano dos. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 6 fev. 1841, Correspondência, p. 1. 86

companhia dramática para atuar no Teatro de São Francisco, que se localizava a poucos metros de distância do Teatro de São Pedro de Alcântara. A partir da reconstituição da polêmica travada na imprensa, constatamos que a demissão de João Caetano não foi ocasionada por caprichos do ator. O caso envolveu disputas entre os dois ensaiadores, João Caetano e o português Victor Porfírio de Borja, e entre os artistas e o diretor do teatro, Luiz de Azevedo, que descumpriu a escritura firmada por João Caetano com o diretor precedente. Trata-se, em primeiro lugar, de uma contenda em torno dos direitos dos atores e do valor legal das escrituras, como demonstrou a carta de demissão do ator Francisco Manuel de Sousa.

Se o atual diretor geral dos teatros pode despedir atores, pode deixar de pagar-lhes o ordenado, não poderá também o ator despedir-se do teatro? Se aquele Sr. pode romper contratos e violar as leis do justo, não poderão os atores ter a liberdade de dizer – Não queremos mais sofrer, Sr. Luiz Manuel?147

Em segundo lugar, e não menos importante, pesavam os interesses artísticos e financeiros de João Caetano. Ao perder o cargo de ensaiador do mais importante teatro subvencionado da capital do Império, no qual supervisionava uma parcela dos atores da companhia dramática que a ele estavam submetidos sob escrituração, João Caetano deixaria de receber a gratificação prevista a cada drama inédito que montasse. Assim, Lafayette Silva, ao discorrer sobre a primeira polêmica entre João Caetano e Germano Francisco pelo protagonismo em Os Dois Renegados, desvelou a ponta de um iceberg.148 O episódio da pateada estava inserido em uma contenda de dimensões maiores, envolvendo os direitos e os salários dos atores, as escrituras de trabalho e os interesses artísticos e financeiros de João Caetano. Germano Francisco se beneficiou da polêmica. Até então, havia construído uma carreira artística modesta no Teatro de São Januário. Ao se transformar no substituto de João Caetano no papel de Samuel, passou a atuar como protagonista de outros dramas e melodramas franceses no Teatro de São Pedro de Alcântara. Nos primeiros anos da década de 1840, desempenhou papéis em representações de Catarina Howard, de Dumas (pai), A Torre de Ferrara (La Tour de Ferrare, TG, 1845), de Alboize de Pujol, Charles Lafont e Élie Sauvage, O Filho da Louca (Le Fils de la Folle, TR, 1839), de Frédéric Soulié, e O Ramo de Carvalho (La Branche de Chêne, TAC, 1839), de Charles Desnoyer e Lafont.

147 SOUSA, Francisco Manuel de. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 11 fev. 1841, p. 2, grifos do autor. 148 Ver SILVA, 1938, p. 44. 87

Nessa época, pouco espaço restou aos atores que nutriam ambições empresariais, tendo em vista a dominância da trupe portuguesa e de João Caetano na exploração das salas de espetáculos existentes. Os artistas do grupo de Ludovina Soares permaneceram no Teatro de São Pedro de Alcântara. João Caetano assumiu a direção dos outros teatros disponíveis. Em 1842, um ano após ocupar o Teatro de São Francisco, arrendou o Teatro Niteroiense – rebatizado com o nome de Teatro de Santa Teresa, em homenagem à Imperatriz Teresa Cristina Maria de Bourbon – e, em 1848, assumiu a direção do Teatro de São Januário. Para driblar a falta de oportunidades, Germano Francisco permaneceu no Teatro de São Pedro de Alcântara até 1848, quando deu início a uma carreira de ator-diretor mambembe. Por duas décadas, trabalhou nos principais teatros das províncias brasileiras (Bahia, Pernambuco, Maranhão, Ceará, Pará e Rio Grande do Sul), acumulando as funções de primeiro ator, ensaiador, empresário de companhia dramática, administrador de teatro e tradutor de peças francesas. Ainda que instalado no Norte ou no Sul do Brasil, o artista fazia paragens recorrentes no Rio de Janeiro, ora para contratar atores para sua trupe, ora para explorar alguma sala de espetáculos desocupada. Em 1851, quando dirigia o Teatro de Santa Isabel, em Pernambuco, Germano Francisco passou uma temporada no Rio de Janeiro. Foi acolhido por Florindo Joaquim, antigo companheiro no Teatro de São Pedro de Alcântara. Na ocasião, os dois artistas dividiram o palco do Teatro de São Francisco em reprises dos dramas Os Dois Renegados e A Graça de Deus, títulos de sucesso do repertório de João Caetano. A escolha das peças pelos atores não parece ter sido uma decisão aleatória. Em 1851, Florindo Joaquim dirigia uma companhia dramática que rivalizava com a trupe de João Caetano na montagem do repertório de melodramas. Assim, a representação de peças de sucesso de João Caetano por dois de seus rivais era uma estratégia para atrair o público aos espetáculos. A rivalidade entre esses atores se acentuara na época, como corrobora a polêmica gerada na imprensa do Rio de Janeiro quando, em dezembro de 1851, Germano Francisco foi agraciado com a Ordem da Rosa pelo governo do Império. Simpatizantes de João Caetano protestaram em artigos publicados na seção “A pedidos” dos periódicos. Germano Francisco fez nova paragem no Rio de Janeiro em dezembro de 1857, vindo de Pernambuco. Ao desembarcar no Rio de Janeiro, o ator trazia consigo a reputação de artista atualizado com as recentes ideias teatrais europeias, devido à viagem que fizera a Portugal entre 1855 e 1856. O ator, que viera ao Rio de Janeiro para contratar cantores líricos e artistas dramáticos para sua companhia do Teatro de Santa Isabel, aproveitou a estadia para integrar a trupe de Florindo Joaquim e se apresentar no Teatro de São Januário. 88

Os dois atores dividiram o palco em poucos espetáculos oferecidos ao longo do mês de janeiro de 1858, como na montagem do “drama da atualidade” Pedro (1857), de Mendes Leal. A dupla logo se desfez: Germano Francisco retornou a Pernambuco e Florindo Joaquim se despediu da direção do Teatro de São Januário, escriturando-se novamente na companhia dramática de João Caetano, no Teatro de São Pedro de Alcântara. Em julho de 1858, Germano Francisco retornou ao Rio de Janeiro. Formou com alguns artistas que escriturara em Pernambuco uma companhia dramática para atuar no Teatro de São Januário. O ator passou a investir em espetáculos vespertinos, uma novidade na organização da atividade teatral no Brasil. Os programas dos espetáculos, constituídos especialmente por melodramas franceses e dramas históricos portugueses, eram destinados a um público de caixeiros.149 A presença de Germano Francisco na cena teatral do Rio de Janeiro incomodou a João Caetano. O mal-estar entre os dois artistas se instalou em janeiro de 1859, quando João Caetano passou a representar o drama 29 ou Honra e Glória, de José Romano, criado primeiramente por Germano Francisco no Teatro de São Januário. Além de copiar a peça que estava em cartaz no teatro concorrente, João Caetano escriturou para o Teatro de São Pedro de Alcântara o ator Luiz Carlos Amoedo que pertencia ao Teatro de São Januário, onde desempenhava um dos papéis principais em 29 ou Honra e Glória. A saída de Luiz Amoedo da companhia dramática de Germano Francisco desencadeou uma polêmica na imprensa entre o ator e o empresário.150 Contudo, a rivalidade entre João Caetano e Germano Francisco não se limitou ao drama 29 ou Honra e Glória, como propôs Lafayette Silva. Após os desentendimentos desencadeados pelas duas montagens da peça de José Romano, Germano Francisco retornou a Pernambuco para nova temporada de espetáculos. No final de 1859, desembarcou novamente no Rio de Janeiro, e como o Teatro de São Januário estava ocupado por outra companhia dramática, tentou oferecer espetáculos no Teatro Lírico Fluminense, nos dias em que não houvesse récitas líricas. João Caetano, segundo relato de Germano Francisco, monopolizava a exploração das salas de espetáculos no Rio de Janeiro, era influente nas decisões administrativas e impediu a sua instalação provisória no Teatro Lírico Fluminense.151 Os dois artistas travaram

149 Cf. MARZANO, 2008, p. 43. 150 Ver SILVA, Lafayette. João Caetano (História do Teatro Brasileiro). Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, vol. 166, 1935, p. 524-527. 151 Cf. OLIVEIRA, Germano Francisco de. Respostas às declarações de João Caetano dos Santos. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 12 nov. 1859, p. 2. 89

nova contenda não apenas na imprensa, mas também na justiça. João Caetano processou Germano Francisco por injúria. A sentença foi dada pelo magistrado André Cordeiro de Araújo e Lima a favor de João Caetano. Germano Francisco foi condenado a “quatro meses de prisão por crime de injúria evidente”.152 A sentença foi avaliada como exagerada por diversos artigos anônimos publicados na seção “A pedidos” dos periódicos. Um dos autores, sob o pseudônimo “O Spectator”, denunciou João Caetano como uma figura monopolizadora da arte dramática no Rio de Janeiro, que impedia o estabelecimento de seus rivais nos teatros: “o Sr. Comendador Caetano é incontestavelmente um poder!”153 Tendo em vista o descontentamento generalizado e o exagero na sentença determinada a Germano Francisco, João Caetano desistiu de dar sequência ao processo, alegando que “só queria o efeito moral destas sentenças e não perseguir quem quer que fosse”.154 Germano Francisco conseguiu se instalar no Teatro de São Januário. Em 1860, representou também em espetáculos avulsos no Teatro Ginásio Dramático. Logo, realizou curta temporada no Sul do Império e depois se mudou para o Maranhão, onde dirigiu o Teatro de São Luiz, em 1862. Em seguida, passou longa temporada no Rio Grande do Sul. Retornou ao Rio de Janeiro em 1865 e ofereceu espetáculos no Teatro Lírico Fluminense, onde protagonizou D. César de Bazan. Após nova temporada no Rio Grande do Sul, regressou ao Rio de Janeiro em julho de 1870. No mês de sua chegada, representou D. César de Bazan no Teatro Fênix Dramática, então dirigido pelo ator português Jacinto Heller (1834-1909). Em setembro de 1870, formou uma companhia dramática para se apresentar no Teatro de São Pedro de Alcântara, com artistas contratados nas “províncias de Pernambuco, Bahia e Rio Grande do Sul”.155 Protagonizou o “drama da atualidade” A Pobreza Envergonhada (1858), de Mendes Leal, e A Saloia, composição original de Joana Paula Manso de Noronha. Representou ainda uma série de melodramas franceses, alguns inéditos – como A Noite do Homicídio ou o Ambicioso Político (La Nuit du Meurtre, TAC, 1839), de Albert e Fabrice Labrousse, A Virgem do Mosteiro (La Pauvre Fille), de Anicet-Bourgeois, e O Ultraje (L’Outrage, TPSM, 1859), de Théodore Barrière e Édouard Plouvier – e outros que faziam sucesso nos palcos há décadas – como A Gargalhada, de Arago, Maria Joana, a Mãe

152 DESPREVENIDO. Theatro. A condenação do Sr. Germano. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 2 dez. 1859, p. 2. 153 O SPECTATOR. O Sr. João Caetano dos Santos e os processos por crime de responsabilidade de imprensa. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 30 nov. 1859, p. 2, grifos do autor. 154 QUESTÃO Theatral. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 30 dez. 1859, p. 2. 155 EMPREZA Germano. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 14 ago. 1870, p. 4. 90

do Povo ou a Pobre Mãe (Marie-Jeanne, TPSM, 1845), de Dennery e Mallian, Os Sete Infantes de Lara, de Mallefille, e Trinta Anos ou a Vida de um Jogador, de Ducange.156 O último indício de atuação de Germano Francisco nos palcos data de setembro de 1871, quando encenou O Marinheiro de Saint-Tropez no Teatro Lírico Fluminense, em récita especial que contou com as presenças da Princesa Isabel e de seu esposo, o Conde d’Eu. Em julho de 1872, o artista partiu para a Europa a fim de obter o diploma de doutor em homeopatia, segundo informação de uma notícia publicada pelo periódico Diário de Notícias.157 Diplomado em medicina e habilitado para o exercício da profissão no Império158, Germano Francisco abandonou definitivamente os palcos. No final da década de 1870, estabeleceu-se na cidade de Jaguarão, no Rio Grande do Sul, onde “abriu consultório homeopático”.159

1.4.2 Florindo Joaquim da Silva

Do mesmo modo que a demissão de João Caetano do Teatro de São Pedro de Alcântara, em 1841, possibilitou que Germano Francisco despontasse na atividade teatral do Rio de Janeiro como protagonista de melodramas, a contenda ofereceu ao artista brasileiro Florindo Joaquim os meios para este obter melhor destaque dentro das companhias dramáticas nas quais trabalhou durante os anos 1840. Florindo Joaquim nasceu no Rio de Janeiro, a 6 de junho de 1814, e faleceu na residência de sua irmã, Joaquina Tereza de Jesus, situada na mesma cidade, a 10 de janeiro de 1893. A grande parte de sua vida foi dedicada ao teatro, tanto na criação de personagens nos palcos quanto na direção de companhias dramáticas. Em 1868, empregou-se na Câmara Municipal do Rio de Janeiro como apontador. Em 1874, passou a ocupar o cargo de vigilante da biblioteca da cidade, sendo promovido, em 1892, a 2º oficial.160

156 Ver anexos “Figura 6 – Germano Francisco de Oliveira (1820-1885)”, “Figura 7 – Percurso de Germano Francisco nos Teatros” e “Tabela 8 – Repertório Francês de Germano Francisco no Rio de Janeiro (1837-1871)”. 157 “Retirou-se ontem para a Europa, o velho ator Germano Francisco de Oliveira. Este artista abandonou de vez as lides cênicas e vai à Alemanha doutorar-se em homeopatia”. (DIÁRIO de Notícias, Rio de Janeiro, 4 jul. 1872, p. 2). 158 Cf. Relatório Apresentado a Assembleia Geral na Terceira Sessão da Décima Quinta Legislatura pelo Ministro e Secretário d’Estado dos Negócios do Império Dr. João Alfredo Corrêa de Silveira. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1874, p. 32. 159 DIVERSAS notícias do país. Jornal do Recife, Recife, 28 fev. 1878, p. 1. 160 Cf. REGISTRO Mortuário. A Federação, Porto Alegre, 28 jan. 1893, p. 1. A nomeação de Florindo Joaquim como 2º secretário foi divulgada pela imprensa: “Foram nomeados para a biblioteca municipal: 2º oficial, o auxiliar mais antigo, Florindo Joaquim da Silva [...]”. (GAZETA de Notícias, Rio de Janeiro, 25 mar. 1892, p. 1). 91

Florindo Joaquim estreou no Teatro Constitucional Fluminense, a 19 de março de 1837, no papel de Eugênio do drama em um ato Santo Antônio Livrando o Pai da Forca. Permaneceu no mesmo teatro até 1841, quando se transferiu para a nova companhia dramática de João Caetano no Teatro de São Francisco. A trupe era constituída por antigos atores do Teatro de São Pedro de Alcântara que haviam se posicionado a favor de João Caetano na ocasião de seu desentendimento com Luiz de Azevedo. Florindo Joaquim estava entre os atores que apresentaram seus pedidos de demissões junto ao diretor do Teatro de São Pedro de Alcântara. Na carta de desligamento, revelou que temia o não cumprimento de seu contrato de trabalho, por isso ponderou ser conveniente engajar-se em outra empresa teatral.

Para evitar malignas interpretações à minha despedida dos Teatros de S. Pedro de Alcântara e S. Januário, tenho a declarar que além de outros motivos (que produzirei em tempo competente) tive o de não estar o meu contrato garantido suficientemente, porque sendo ele em tudo semelhante ao de meu colega João Caetano dos Santos, vi que este foi despedido do serviço dos mesmos teatros, e suspensos os seus ordenados, sem que tivesse faltado ao cumprimento das suas obrigações; e não podendo ao ter certeza de que a minha escritura seja respeitada pelo atual diretor, julguei conveniente despedir-me e procurar novo engajamento com outra qualquer empresa, que me segure os meios de subsistência. Espero, Sr. Redator, que estas linhas sejam transcritas na sua interessante folha, e o meu ofício de despedida. Florindo Joaquim da Silva. Rio de Janeiro, 8 de fevereiro de 1841.161

Apresentou-se no Teatro de São Francisco, ao lado de João Caetano, até 1842. Participou de espetáculos que exibiram o melodrama Os Sete Infantes de Lara e a tragédia Hamleto, adaptação de Ducis da peça shakespeariana. Em janeiro de 1843, reintegrou-se à companhia dramática do Teatro de São Pedro de Alcântara, em espetáculo comemorativo ao Dia do Fico, celebrado a 9 de janeiro. O programa exibiu o melodrama em três atos Hariadan Barba-Roxa (Hariadan Barberousse, 1809), de L. A. Lamarque de Saint-Victor e Corse (pseudônimo de Jean-Baptiste Labenette). Contudo, a estadia no Teatro de São Pedro de Alcântara foi curta, pois em maio do mesmo ano anunciou-se na imprensa que o ator retornava à companhia de João Caetano: “O ator empresário João Caetano dos Santos tem a satisfação de anunciar ao respeitável público que reuniu à sua companhia os seus colegas Florindo Joaquim da Silva, João Antônio da Costa e Martinho Correia Vasques”.162 Assim como foi passageira a segunda estadia no Teatro de São Pedro de Alcântara, também o foi no Teatro de São Francisco. Em 1844, Florindo Joaquim regressou ao Teatro de São Pedro de Alcântara, ali permanecendo até 1848. Nessa época, entre as representações de melodramas franceses e portugueses, integrou o elenco da montagem de

161 SILVA, Florindo Joaquim da. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 9 fev. 1841, Correspondência, p. 1. 162 THEATRO. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 6 maio 1843, p. 3. 92

Angelo ou o Tirano de Pádua (Angelo, Tyran de Padoue, TF, 1835), de Victor Hugo, drama representado em setembro de 1845 sem sucesso. Em janeiro de 1849, Florindo Joaquim foi escriturado por João Caetano para se apresentar no Teatro de São Januário, uma tentativa do ator-empresário de revitalizar o teatro que se encontrava esquecido da cena teatral da cidade, por se localizar em uma região portuária, afastada dos bairros onde se concentravam as principais salas de espetáculos. A estreia de Florindo Joaquim se deu com a reprise da tragédia Nova Castro, de Gomes Júnior. João Caetano também participou do espetáculo. Os dois atores dividiram o palco novamente na estreia da peça O Cego, de Joaquim Manuel de Macedo, a 24 de janeiro de 1849. Na montagem, João Caetano desempenhou o papel principal, do cego Paulo, e Florindo Joaquim, o de seu irmão, Henrique.163 O ator não permaneceu por muito tempo na companhia dramática do Teatro de São Januário. Após uma breve temporada em Porto Alegre, em 1849, fez reentrada no Teatro de São Pedro de Alcântara. Porém, descontente com a proposta de João Caetano de lhe pagar apenas um salário para trabalhar nas companhias dramáticas de dois teatros, Florindo Joaquim optou por não se submeter ao contrato oferecido pelo empresário, quando este, em 1851, reassumiu a direção do Teatro de São Pedro de Alcântara.164 Florindo Joaquim decidiu se arriscar como empresário teatral. Organizou uma trupe para se apresentar no Teatro de São Francisco, da qual fizeram parte atores experientes, como Gabriela da Cunha de Vecchy, Joaquim Augusto Ribeiro de Souza, José Candido da Silva e Francisco de Paula Dias, e novatos, como Leonor Orsat, Jesuína Montani e Eduardo José da Graça. A iniciativa do ator sinalizava para uma nova dinâmica de disputas que se moldava entre as companhias dramáticas no Rio de Janeiro. Outrora discípulo e amigo de João Caetano, com quem dividira o palco na montagem do repertório romântico, Florindo Joaquim assumia as rédeas de sua carreira artística e objetivava a independência de sua empresa teatral diante do monopólio do grande ator. Um cronista do periódico A Marmota na Corte, identificado pela inicial C., tratou do cenário de disputas por emprego no campo teatral da época. Os artistas que se reuniram a Florindo Joaquim no Teatro de São Francisco eram aqueles não incorporados pelo “grande teatro” e que buscavam uma alternativa para quebrar o monopólio de João Caetano.

163 Cf. THEATRO de S. Januário. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 22 jan. 1849, Theatros, p. 4. 164 Cf. PRADO, 1972, p. 68. 93

Os artistas uniram-se num só pensamento – formar para o presente e para o futuro um refúgio para aqueles que, não podendo fazer parte do grande teatro, vão ali pedir pão para si e para seus filhos. A sua missão, porém, tem mais alcance; e é: destruir o monopólio da arte dramática que os ameaçava!165

De acordo com os anúncios teatrais publicados pela imprensa do Rio de Janeiro, constatamos que a trupe de Florindo Joaquim começou a oferecer espetáculos em fevereiro de 1851. Em julho do mesmo ano, o ator-diretor foi contemplado pela Câmara dos Deputados com o direito de usufruir dos recursos das loterias, no período de vigência de dois anos.166 Esse foi o tempo de sobrevivência da companhia dramática de Florindo Joaquim, o que demonstra que as subvenções do governo imperial por meio das loterias eram cruciais para a manutenção econômica de uma empresa teatral, que não se manteria apenas com a receita da bilheteria. A companhia dramática do Teatro de São Francisco encenou, essencialmente, traduções de melodramas franceses. Florindo Joaquim, ensaiador e primeiro ator da trupe, protagonizou melodramas inéditos, como Gabrina ou a Coroa Ducal de Parma (Gabrina ou la Chambre du Berceau, TPSM, 1841), de Paul Henri Foucher e Alboize de Pujol, e Pedro Landais ou o Alfaiate Ministro (Pierre Landais, TO, 1843), de Émile Souvestre. Representou também melodramas que já haviam sido montados por João Caetano, como A Graça de Deus, O Marinheiro de Saint-Tropez e Trinta Anos ou a Vida de um Jogador. Com a dissolução de sua companhia dramática, Florindo Joaquim rumou ao Rio Grande do Sul, onde trabalhou, entre 1853 e 1856, nos teatros de Rio Grande, Pelotas e Porto Alegre. Após essa longa temporada no Sul, regressou ao Rio de Janeiro. Assumiu a direção da companhia dramática do Teatro de São Januário, ocupação que exerceu de 1856 a fevereiro de 1858. Nessa época, protagonizou melodramas franceses inéditos, como Bertram, o Marinheiro (Bertram le Matelot, TG, 1847), na tradução de José Joaquim Vieira Souto, e A Marquesa Octavia ou a Irmã do Soldado (Léa ou la Sœur du Soldat, TG, 1847), ambas as peças de Bouchardy. Reprisou obras de sucesso nos palcos, como A Gargalhada e Kean.167 Contudo, não obteve êxito na nova tentativa de se firmar como empresário teatral no Rio de Janeiro. Em abril de 1858, Florindo Joaquim foi escriturado por João Caetano para integrar novamente a companhia dramática do Teatro de São Pedro de Alcântara, onde

165 C. A Marmota na Corte, Rio de Janeiro, 29 abr. 1851, Theatros, p. 1, grifos do autor. 166 “Da 2ª comissão de orçamento concedendo a Florindo Joaquim da Silva, diretor empresário da companhia dramática nacional do Teatro de S. Francisco desta corte, uma loteria anual por espaço de 2 anos, sendo estas extraídas segundo o plano das concedidas ao Teatro de S. Pedro de Alcântara”. (RIO de Janeiro. Câmara dos Srs. Deputados. Ata do dia 2 de julho de 1851. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 3 jul. 1851, p. 2). 167 Ver anexos “Figura 8 – Percurso de Florindo Joaquim nos Teatros” e “Tabela 9 – Repertório Francês de Florindo Joaquim no Rio de Janeiro (1840-1874)”. 94

permaneceu ativo como ator e ensaiador até dezembro de 1873. Os últimos indícios que localizamos da presença de Florindo Joaquim nos palcos se referem a aparições especiais no melodrama Pedro Sem que já teve e agora não tem, de Burgain, a 20 de janeiro de 1883, e na tragédia Nova Castro, de Gomes Júnior, a 6 de maio de 1883, em espetáculos no Teatro de São Pedro de Alcântara. Assim findava a carreira artística longeva de Florindo Joaquim. Sua trajetória no campo teatral oscilou entre a amizade submissa a João Caetano, nos momentos em que foi seu discípulo ou integrou suas companhias dramáticas, e as tentativas malogradas de disputa pelo público e pela subvenção do governo imperial, quando organizou companhias dramáticas próprias que buscaram a autonomia do monopólio exercido pelo grande ator-empresário.

1.4.3 Joaquim Augusto Ribeiro de Souza

Filho de um alfaiate, Joaquim Augusto nasceu no Rio de Janeiro, a 6 de julho de 1825, e faleceu na mesma cidade, a 17 de janeiro de 1873. Recebeu instrução para exercer atividades no comércio. Aos 12 anos de idade empregou-se como caixeiro. Iniciou-se no teatro, em 1841, quando foi contratado por João Caetano para fazer parte de sua nova companhia dramática, instalada no Teatro de São Francisco.168 Logo, em outubro do mesmo ano, desligou-se da trupe, juntamente com Florindo Joaquim. Para se sustentar, realizou trabalhos de pintura para os teatros do Rio de Janeiro. Voltou a fazer parte da companhia dramática do Teatro de São Francisco como contrarregra e ator. Integrou o elenco que representou, em novembro de 1844, o melodrama francês Rita a Espanhola (Rita l’Espagnole, TPSM, 1837), de Desnoyer, Auguste Boulé e Jules Chabot de Bouin. Em março de 1845, partiu para o Rio Grande do Sul com a companhia dramática de Francisco Fructuoso Dias. Retornou ao Rio de Janeiro em 1849. Escriturou-se na companhia dramática do Teatro de São Januário, onde fez reentrada com a representação de Os Dois Renegados, de Mendes Leal. Durante a estadia nesse teatro, encenou A Graça de Deus ao lado de João Caetano, em abril de 1849, e Pedro Sem que já teve e agora não tem, de Burgain, juntamente com Florindo Joaquim, em junho do mesmo ano. Em 1851, passou a fazer parte da companhia dramática de Florindo Joaquim no Teatro de São Francisco, onde desempenhou papéis em melodramas franceses. Após a

168 Cf. SANTOS, F. Quirino dos. Joaquim Augusto Ribeiro de Souza (Ator Brasileiro). Archivo Pittoresco, Lisboa, n. 44, 1863, p. 348-349. 95

tentativa fracassada de Florindo Joaquim de manter uma companhia dramática concorrente a de João Caetano, Joaquim Augusto retornou ao Teatro de São Pedro de Alcântara. Permaneceu nesse teatro de 1852 a 1854, quando o francês Émile Doux ali desempenhava as tarefas de ensaiador. O ator foi despedido do teatro e, a partir de então, empreendeu uma trajetória artística e empresarial autônoma do monopólio de João Caetano. Joaquim Augusto se instalou em São Paulo de meados de 1854 a 1855. Dirigiu uma companhia dramática e representou uma série de melodramas franceses, alguns do repertório de João Caetano, outros que havia encenado nos teatros do Rio de Janeiro. Em dezembro de 1855, partiu para o Rio Grande do Sul, onde permaneceu até 1858. Fez reentrada no Teatro de São Pedro de Alcântara em 1859 e, no mesmo ano, foi incorporado pela companhia dramática do Teatro Ginásio Dramático. Em 1860, assumiu a direção do teatro e organizou a Companhia Sociedade Dramática Nacional. Pela iniciativa empresarial, Joaquim Augusto passou a ser visto como o restaurador do Teatro Ginásio Dramático. Enquanto esteve nessa sala de espetáculos, representou majoritariamente peças realistas de autores franceses, portugueses e brasileiros. Dos autores nacionais, representou Luxo e Vaidade, de Joaquim Manuel de Macedo, Os Mineiros da Desgraça, de Quintino Bocaiúva, História de uma Moça Rica, de Pinheiro Guimarães, e remontou O Demônio Familiar, de José de Alencar.169 Contudo, Joaquim Augusto nunca abandonou os melodramas franceses, representando-os até mesmo no Teatro Ginásio Dramático, como ilustra a montagem de O Pelotiqueiro (L’Escamoteur, TG, 1860), de Dennery e Jules Brésil, em abril de 1861. A peça, de um dos mais prolíficos e bem-sucedidos autores franceses de melodramas, Adolphe Dennery, apresenta uma ação dramática exemplar do gênero. O saltimbanco Beaujolais aceita participar de um plano criminoso de Raoul Darmentières que quer se apoderar da herança de seu tio, o Conde de Varennes. Raoul, ao tomar conhecimento que Hélène, a única herdeira do Conde, não é sua filha biológica, contrata Beaujolais para raptar a jovem. A leitura da carta escrita pela mãe de Hélène ao entregar a filha à família de Varennes revela a Beaujolais que ele é o pai da moça que raptou. Arrependido, Beaujolais devolve Hélène aos pais adotivos e guarda o segredo sobre a verdadeira origem da jovem, permitindo assim que ela se case com o rapaz que ama. A peça trata de uma questão social da época, a manutenção dos valores da família burguesa, a partir da roupagem do melodrama. Os recursos mais importantes do gênero se

169 Cf. FARIA, 1993, p. 139. 96

fazem presentes em L’Escamoteur: orfandade, rapto, roubo de herança, carta reveladora e reconhecimento. A diferença essencial desses melodramas dos anos 1850 em relação ao do início do século XIX, aos moldes de Pixerécourt, reside na inexistência da providência divina. A tomada de decisão consciente de uma personagem reestabelece a harmonia inicial da ação dramática, abalada pelos expedientes criminosos de um vilão. O desenlace do nó da intriga no melodrama de Dennery e Brésil se processa a partir da ponderação de um homem que, ao se descobrir pai, age em prol da manutenção dos valores familiares burgueses. Após novas passagens por São Paulo, entre 1862 e 1868, Joaquim Augusto finalizou a carreira artística no Rio de Janeiro, como ator e ensaiador de melodramas. Em 1870, protagonizou e ensaiou no Teatro de São Pedro de Alcântara, então dirigido pela empresa de Antônio Francisco de Souza Martins, a peça Simão ou o Velho Cabo de Esquadra, primeiramente montada por João Caetano, em 1858, e Os Piratas da Savana, de Anicet- Bourgeois e Ferdinand Dugué. Em 1871, Joaquim Augusto foi ator e ensaiador da companhia dramática de Jacinto Heller, instalada no Teatro Fênix Dramática. Como verificamos, suas últimas aparições nos palcos ocorreram em reprises de O Pelotiqueiro, na tradução do Dr. O. de Araújo.170

* * *

170 Ver anexos “Figura 9 – Joaquim Augusto Ribeiro de Souza (1825-1873)”, “Figura 10 – Percurso de Joaquim Augusto nos Teatros” e “Tabela 10 – Repertório Francês de Joaquim Augusto no Rio de Janeiro (1843-1871)”.

CAPÍTULO 2

TRADUÇÃO E REALIZAÇÃO CÊNICA

98

2.1 Os melodramas de sucesso

Os palcos do Rio de Janeiro foram grandes consumidores da dramaturgia francesa criada nos teatros populares de Paris, como demonstramos a partir da reconstituição dos repertórios dos principais primeiros atores. As peças montadas e publicadas na capital francesa aportavam rapidamente no Brasil, levando poucos anos, ou até mesmo meses, para serem aqui representadas. Assim ilustra o caso do melodrama Catharina la Voisin ou o Dote de 500 Mil Libras (La Voisin, TG, 1841), de e Alboize, criado por Ludovina Soares no Teatro de São Pedro de Alcântara, cinco meses após sua estreia no Théâtre de la Gaîté, em Paris.

Há apenas 5 meses que esta excelente composição de MM. Paul Faucher [sic] e Alboize foi representada pela primeira vez em um dos melhores teatros de Paris. O público, dando-lhe galardão com os seus aplausos, e concorrendo às numerosas repetições despertou o jornalismo, que, avaliando-a conscienciosamente, a colocou na ordem mais distinta, e a recomenda com interesse e entusiasmo. São estes precedentes que determinam a beneficiada a preferir Catharina la Voisin a algum outro drama moderno, por isso que lhe reconhece também superioridade.1

Segundo Christophe Charle, os ingredientes que contribuíram para o sucesso de determinada peça francesa em outros contextos seriam variáveis, conforme a tradução realizada e encenada, “o estado das relações entre a França e o país em questão, o tipo de teatro (oficial, privado, destinado ao público superior ou ao grande público), a imagem literária, social ou política de determinado autor, a personalidade dos atores e atrizes participantes da montagem”.2 De fato, a dinâmica entre os ingredientes referentes ao valor simbólico da dramaturgia (autor e obra) e da atividade teatral francesa (ator, teatro, crítica) foi determinante no processo de introdução dos melodramas nos palcos brasileiros. Como constatamos com o anúncio da estreia de Catharina la Voisin, a montagem da peça se justificava, em primeiro lugar, pelo prestígio conferido ao Théâtre de la Gaîté, sala de espetáculos onde a peça fora representada em Paris. De reputação popularesca na capital francesa, o teatro privado adquiriu ares nobres no Rio de Janeiro, sendo considerado “um dos melhores teatros de Paris”. Em segundo lugar, a peça de Foucher e Alboize recebeu a chancela do público parisiense, que o aplaudira nas frequentes reprises, e da crítica teatral, que o distinguira e recomendava aos espectadores. Assim, com o sucesso legitimado pelas

1 THEATRO. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 23 maio 1842, p. 2. 2 CHARLE, 2012, p. 202. 99

instâncias francesas, Catharina la Voisin foi recebida como uma composição dramática superior, cuja montagem no Rio de Janeiro seria altamente recomendável. O anúncio teatral nada comentou sobre as imagens literárias de Foucher e Alboize. Procedimento recorrente nos reclames divulgados pela imprensa que, raramente, identificavam os autores dos melodramas, e, quando o faziam, o máximo de descrição que forneciam era a associação do nome do dramaturgo a alguma outra obra de sua autoria já encenada no Rio de Janeiro. Exceções são verificáveis quando se tratavam, por exemplo, de Victor Hugo, reconhecido como poeta, de Dumas (pai), pela produção dramática prolífica associada aos romances em folhetim, de Bouchardy, sempre atrelado ao sucesso nos palcos de O Sineiro de São Paulo, e de Ducange, pela imagem de autor cujas peças zelavam pelo ensinamento moral. Essa imagem literária de Ducange foi largamente evocada pela imprensa do Rio de Janeiro quando Trinta Anos ou a Vida de um Jogador passou a fazer sucesso, em 1836. Segundo um anônimo fluminense, sob o pseudônimo “O amante de teatro”, o melodrama de Ducange seria um “curso de moral a que devem os pais a porfia levar suas famílias”, para que seus filhos aprendessem “com o espetáculo das vicissitudes, misérias e crimes a que pode arrastar a paixão do jogo, essa consumidora de tantas fortunas”, e suas filhas se sensibilizassem com “os exemplos mais tocantes de fidelidade, e amor conjugal e materno”.3 O ensinamento moral se estendeu dos palcos à leitura da peça no seio familiar, como faz crer a estratégia adotada pelos livreiros ao anunciarem a venda do texto de Trinta Anos ou a Vida de um Jogador: “Esta grande obra serve também para dar-se a ler às famílias em particular, pela sua moral apreciável”4; “O interesse que causa a leitura desta obra, sua moral, e exemplos de virtude para todas as esposas, merecem ser contemplados ao seio das boas famílias”.5 A grande maioria das peças francesas presentes nos repertórios dos expoentes primeiros atores da cena romântica brasileira, e por eles protagonizadas entre as décadas de 1840 e 1860, foram criadas em Paris pelo afamado ator Frédérick Lemaître. Este conferiu prestígio aos protagonistas que representou, tais como Georges Maurice, personagem principal de La Dame de Saint-Tropez, de Dennery e Anicet-Bourgeois, e D. César de Bazan, herói da obra homônima de Dennery e Dumanoir.

3 O AMANTE de Teatro. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 23 abr. 1836, p. 3. 4 DIÁRIO do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 29 out. 1836, Obras publicadas, p. 2. 5 DIÁRIO do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 16 nov. 1836, Obras publicadas, p. 2. 100

La Dame de Saint-Tropez e D. César de Bazan se caracterizaram, assim como outras peças de sucesso de dramaturgos quase esquecidos em nossos dias, pela larga difusão nos palcos da província francesa, ultrapassando, assim, as fronteiras territoriais e culturais entre a Corte e o interior da França. De acordo com o levantamento que realizamos em periódicos franceses, La Dame de Saint-Tropez, que estreara em novembro de 1844, em Paris, conheceu rápida difusão nos teatros provincianos. Ao longo de 1845, a peça foi protagonizada por Frédérick Lemaître em Lille, Havre, Rouen e Lyon, e em 1848, em Toulouse. Outros atores a montaram, em 1845, em Amiens, Bordeaux, Poitiers, Nantes, Bourges, Niort, Reims, Toulon, Saint-Brieue, Verdun, Lons le Saunier e Caen, e em 1847, em Nîmes. A peça D. César de Bazan, criada no mesmo ano que La Dame de Saint-Tropez por Frédérick Lemaître, obteve trajetória semelhante. A obra esteve na lista de peças que o ator representou em sua excursão pelas cidades francesas, em 1845, como Lille e Havre. Esses dois melodramas exemplificam os fenômenos descritos por Christophe Charle da difusão e da permanência nos palcos do repertório da primeira metade do século XIX. Segundo o autor, o teatro com pretensão literária (de Victor Hugo, Alfred de Musset e Alfred de Vigny) foi acolhido no exterior “com pouco sucesso e, em todo caso, sem nenhuma longevidade. Em compensação, as peças de Scribe, alguns melodramas ou adaptações de Dumas (pai) ainda são representados em Londres, Nova York ou Cristiânia às vésperas do século XX”.6 La Dame de Saint-Tropez e D. César de Bazan ignoraram, assim como os limites Corte-província, as fronteiras territoriais das nações. Logo após as estreias em Paris, muitas vezes ainda no mesmo ano em que subiram ao palco pela primeira vez na capital francesa, as duas peças foram montadas em países da Europa ocidental, tanto em francês quanto em traduções para as línguas nacionais. Desse modo, dramaturgos como Anicet- Bourgeois, Dennery e Dumanoir, “que qualificamos hoje de menores eram grandes o suficiente na época haja vista suas obras traduzidas e encenadas nos confins da Europa”.7 Segundo Robert Baldick, Frédérick Lemaître encenou La Dame de Saint-Tropez no Saint-James Theatre, em Londres, a 17 de fevereiro de 1845, durante a temporada de espetáculos, com duração de um mês, que ofereceu na cidade inglesa. Na época, a peça já havia sido representada nos teatros londrinos com outros títulos: L’Horrible Forfait, La Pitoyable Épouse e Les Empoisonneurs et la Victime. O ator francês representou também D.

6 CHARLE, 2012, p. 340. 7 ROBARDEY-EPPSTEIN, Sylviane. “Situation du théâtre français à Stockholm (1825-1863)”. In: YON, Jean- Claude (Dir.). Le Théâtre Français à l’Étranger au XIXe Siècle. Histoire d’une Suprématie Culturelle. Paris: Nouveau Monde, 2008, p. 428. No original: “que l’on qualifie aujourd’hui de minores étaient suffisamment grands à l’époque pour voir leurs œuvres traduites et jouées aux confins de l’Europe.” 101

César de Bazan, a 24 de fevereiro de 1845, em espetáculo que contou com a presença da Rainha Vitória. Em seu diário, ela comentou que, na semana seguinte, iria ao Saint-James Theatre para ver o ator francês na encenação de Trente Ans ou la Vie d’un Joueur. A essa altura, os londrinos já conheciam D. César de Bazan, pois a obra havia sido montada em inglês, em 1844, no Princess’s Theatre.8 Durante a primeira estadia em Londres, Frédérick Lemaître tentou representar Ruy Blas (TR, 1838), de Victor Hugo, mas a peça foi impedida de subir ao palco sob a justificativa de que chocaria a Rainha. Para o espetáculo de despedida, o ator francês encarnou Robert Macaire em L’Auberge des Adrets (1823), melodrama de Benjamin Antier, Saint-Amant e Paulyanthe. Em janeiro de 1847, retornou ao Saint-James Theatre para nova temporada de espetáculos. Dentre as peças que protagonizou, estava novamente La Dame de Saint-Tropez.9 La Dame de Saint-Tropez e D. César de Bazan também circularam em outras capitais europeias. Conforme averiguamos, Frédérick Lemaître encenou as duas peças em Bruxelas, na Bélgica, em março de 1845. Na Alemanha, elas foram editadas pela coleção Reclams Universal-Bibliothek.10 Em São Petersburgo, na Rússia, D. César de Bazan foi montado pela companhia dramática imperial no teatro francês, o Théâtre Michel11, e em Estocolmo, na Suécia, subiu ao palco em 1844, mesmo ano em que estreou em Paris. Para Sylviane Robardey-Eppstein, “essa difusão imediatamente após a première Francesa dá a medida do interesse pelos dramas históricos provenientes da dramaturgia romântica francesa”.12 Em Lisboa, A Dama de Saint-Tropez, tradução realizada por João Baptista Ferreira (1801-1877), estreou no Teatro da Rua dos Condes, em 1845, com a atriz Emilia das Neves no papel de Hortência, a Dama de Saint-Tropez.13 As versões de D. César de Bazan encenadas nos palcos portugueses, por outro lado, foram diversas. Segundo Sousa Bastos, uma primeira versão, intitulada Rei e Aventureiro, foi montada no Teatro do Salitre, em Lisboa. Em 1845, D. Antonio de Portugal, de Mendes Leal, uma comédia-drama cujo

8 Cf. DON Caesar de Bazan: a drama in three acts. Edited by Epes Sargent. New York: William Taylor & Co.; Baltimore: W. M. Taylor & Co., 1846. 9 Cf. BALDICK, 1961, p. 224-225 e 231. 10 Cf. GIER, Albert. “Le théâtre français au répertoire du Hofburgtheater viennois et dans Reclams Universal- Bibliothek, de 1850 à 1900”. In: YON, 2008, p. 404. 11 Cf. PAVLOVA, Viktoria. “Le théâtre français en Russie: le théâtre impérial Michel et les entreprises françaises”. In: Ibidem, p. 375. 12 ROBARDEY-EPPSTEIN. In: Ibidem, p. 426-427. No original: “Cette diffusion dans l’immédiate foulée de la première Française donne la mesure de l’intérêt pour les drames historiques issus de la dramaturgie romantique française.” 13 Cf. EMILIA das Neves: documentos para a sua biografia, por um dos seus admiradores. Lisboa: Silva Júnior, 1875, p. 28. 102

entrecho e grande parte das cenas se baseariam em D. Cesar de Bazan, subiu ao palco do Teatro da Rua dos Condes.14 A tradução de E. Nascimento Correira, que não conseguimos datar, foi “representada com grande sucesso nos teatros Nacional, S. Carlos, República, Polyteama, Variedades, Rua dos Condes e Apolo de Lisboa, S. João, Baquet e Sá do Porto e no Brasil”.15 No Real Teatro de São João, no Porto, foi representada, em 1858, a tradução para o português da adaptação italiana D. Cesari di Bazan, de Giovanni Peruzzini e música de Antonio Traversari, artistas que transformaram o original francês em um melodrama em quatro atos. Esta adaptação havia sido criada no Real Teatro del Fondo, em Nápoles, em 1856.16 A partir de 1880, a tradução do Conde de Monsaraz (António de Macedo Papança) foi adotada pelo Teatro de D. Maria II, em Lisboa, e ali permaneceu sendo encenada, inclusive na temporada de espetáculos de 1901, pelo ator Augusto Rosa, um dos fundadores da companhia Rosas & Brasão.17 A partir dos exemplos da difusão (na França e na Europa ocidental) de dois melodramas do repertório de Frédérick Lemaître – que se deu pela circulação das coleções teatrais, das traduções e das companhias dramáticas –, concordamos, então, que os palcos brasileiros integraram esse fenômeno de exportação como consumidores da dramaturgia francesa popular. O que nos permite relativizar a culpabilidade que a historiografia tradicional fez recair sobre os atores e o público brasileiros, que teriam aprisionado os programas dos espetáculos a uma dramaturgia de autores menores e de mau gosto. Como também, possibilita repensar a ideia de atraso ou de descompasso de nossos palcos em relação com o que era produzido na capital teatral europeia. Antes, os teatros brasileiros, assim como os de Londres, Lisboa e Estocolmo, por exemplo, foram atraídos pela moda do teatro parisiense que “tem a ver, em primeiro lugar, com um fenômeno global de moda”18, explicado, segundo Christophe Charle, pelo processo intenso de exportação, que decaiu no final do século XIX, e pelo valor simbólico dessa dramaturgia, tendo em vista o fascínio que o teatro parisiense, seus autores e atores exerciam nas outras capitais. O processo de exportação, dimensionado pelo valor simbólico da imagem literária de alguns dramaturgos, pelo prestígio paradoxal dos teatros dos bulevares parisienses e pelo renome internacional de Frédérick Lemaître, pode explicar a ampla aceitação da dramaturgia

14 Cf. BASTOS, 1898, p. 99. 15 DENNERY, Adolphe & DUMANOIR. D. César de Bazan: comédia em 5 atos. Tradução de E. Nascimento Correia. 2 ed. Lisboa: Livraria Popular de Francisco Franco, [s.d.], capa. (Bibliotheca Dramática Popular). 16 Ver PERUZZINI, Giovanni & TRAVERSARI, Antonio. D. Cesari di Bazan: melodramma in quatto atti. Napoli: Tipografia Flautina, 1856, e PERUZZINI, Giovanni & TRAVERSARI, Antonio. D. César de Bazan: melodrama em 4 actos. Porto: Typographia de Antonio José da Silva Teixeira, 1858. 17 Cf. BASTOS, op. cit., p. 62 e 802. 18 CHARLE, 2012, p. 199. 103

popular francesa nos palcos brasileiros e o grande número de títulos disponíveis e montados. Porém, de forma assim isolada, não explica o fenômeno que identificamos de formação de um repertório de sucesso no Brasil, compartilhado pelos principais intérpretes da cena romântica, que obteve longa permanência e larga difusão nos palcos da Corte e das províncias, e que incluiu outros melodramas além das peças de sucesso no velho continente (La Dame de Saint- Tropez e D. César de Bazan), tais como L’Éclat de Rire, de Jacques Arago, La Grâce de Dieu, de Dennery e Lemoine, e Os Seis Degraus do Crime, de Nézel e Antier. Acreditamos que a formação de um repertório de sucesso nos palcos brasileiros se deu por um processo de triagem, com base em critérios de seleção que dizem respeito a ingredientes próprios da dinâmica teatral do contexto de recepção, como a tradução – fator mencionado por Christophe Charle –, a realização cênica e o engendramento de práticas de concorrência entre os atores- empresários, que os motivaram a circular pelos teatros das províncias brasileiras, contribuindo, assim, para a difusão do melodrama.

2.2 Os textos franceses nos palcos brasileiros

Em 1855, a companhia de Germano Francisco apresentava curta temporada de espetáculos no Ceará. A montagem de A Graça de Deus, no palco do Teatro Thaliense, atraiu a atenção de um espectador, que mostrou indignação ao constatar que o texto representado pela trupe não contemplava a integralidade da peça.

Não é drama próprio para o Sr. Germano levar à cena com a companhia que tem, pois sendo esta mui pequena foi necessário uma atriz fazer dois papéis, e dar-se papéis interessantes a atores que só servem para pequenos papéis. O Sr. Germano tem razão em tirar personagens do drama, porque, primeiro, a sua companhia é pequena e só tem duas atrizes. Segundo, por não querer pagar a Sra. D. Josefina, que disseram-me se oferecera de bom grado. Mas, julgo ser uma caçoada ao público, cortar falas, tirar cenas, e enfim anunciar levar à cena A Graça de Deus, e apresentar Fragmentos da Graça de Deus!19

As impressões do espectador cearense nos convidam a tratar de uma problemática em torno do texto dramático representado nos palcos brasileiros. Incorreríamos em grande erro se pensássemos que todas as traduções seriam versões literais ao português dos textos redigidos na língua de Molière. Ou ainda, que as montagens seguiam à risca os diálogos e as didascálias dos originais. Nesse sentido, torna-se inevitável reconhecermos de saída que os

19 O OBSERVADOR. Pedro II, Fortaleza, 9 jun. 1855, Comunicado, p. 3, grifos do autor. 104

textos montados no Brasil se situam em um terreno movediço, uma vez que a arte dramática popular oitocentista se regrava menos por critérios de estilo literário que teatral e não se comprometia totalmente com a fidelidade ao texto original, tanto na tradução quanto na mise en scène. Extremamente dinâmico, o teatro se submetia às leis de mercado, contava com o improviso dos artistas, de acordo com o grau de criatividade e talento desses, e sofria cerceamentos da censura institucional, exercida no Rio de Janeiro pelo Conservatório Dramático Brasileiro, cujos pilares se fundamentavam segundo o regime político monárquico e uma moral católica conservadora. Afinal, quais textos foram representados pelos artistas brasileiros? Para tratarmos da questão, o primeiro fator que se impõe se refere à prática de tradução do texto dramático francês. Tendo em vista as dificuldades de se localizar as versões em português encenadas nos palcos oitocentistas que, em sua grande maioria, estão extintas ou para serem ainda localizadas, problematizamos a prática da tradução a partir dos textos sobreviventes que conseguimos identificar. Estes textos se encontram em volumes publicados ou em forma manuscrita, espalhados por bibliotecas brasileiras e europeias. O segundo condicionante diz respeito à realização cênica das traduções. Diante da impossibilidade de revivermos os espetáculos oferecidos nos teatros brasileiros durante o século XIX, construímos narrativas que tentam reconstituir as circunstâncias das montagens, por meio dos artigos opinativos e folhetins dramáticos dos críticos contemporâneos aos artistas, dos pareceres dos censores do Conservatório Dramático Brasileiro e dos dados que recolhemos na imprensa em anúncios de espetáculos, comunicados de artistas e de espectadores. Desse modo, constatamos que a tradução da dramaturgia francesa, representada nos palcos brasileiros, constituiu-se em uma atividade artística que se deu por meio de dois processos. Primeiro, o trabalho de versão da obra francesa para o português, realizado por um tradutor português ou brasileiro, figura não raras vezes diminuída, ou apagada, sobretudo, durante os anos 1830 a 1840. Traduzir era concebido como um exercício criativo, razoavelmente livre, determinado tanto pelas balizas morais do tradutor, sua autocensura, quanto – caso houvesse a intenção de encenação do texto – por fatores de ordem política que regulavam a atividade teatral, como a instituição de censura. Segundo, a realização cênica poderia efetuar alterações no texto traduzido, a depender das condições materiais e financeiras dos teatros e das trupes, e das pretensões artísticas do primeiro ator ou da primeira atriz que protagonizaria a peça. O trecho do espectador cearense sobre a montagem de A Graça de Deus pela companhia de Germano 105

Francisco ilustra um caso concreto do impacto que a organização da trupe poderia exercer no texto encenado. Como a companhia dramática de Germano Francisco, em turnê na província do Ceará, encontrava-se incompleta, o diretor reestruturou a galeria de personagens da peça para que esta se adequasse ao número de artistas disponíveis para a representação: eliminou personagens, atribuiu dois papéis a um mesmo artista e reservou os protagonistas a atores secundários.

2.3 As traduções d’além-mar

Parte das traduções da dramaturgia francesa representada nos teatros do Rio de Janeiro, durante a primeira metade do século XIX, proveio de Portugal. Acreditamos que a prática foi alimentada, principalmente, pelo processo de escrituração de companhias dramáticas portuguesas, ou de atores individualmente, que representavam esses textos nos teatros de Lisboa ou Porto. Essa prática pode ser verificada pela presença nos palcos das comédias e traduções de Antônio Xavier que, representadas “nos teatros de Lisboa e Porto”, onde receberam “inúmeros aplausos”20, foram montadas por artistas portugueses nos anos 1820, no Teatro de São João/Teatro Imperial de São Pedro de Alcântara, no Rio de Janeiro, e incorporadas por João Caetano a partir da década seguinte. A prática se confirma também pela representação da tradução Frederico II, Rei da Prússia, ou as Duas Últimas Horas de um Condenado, de Luís José Baiardo (1775-?)21, que, após ter estreado em Lisboa, em 1836, em espetáculo beneficente em favor do ator Joaquim José de Barros, foi por ele criada no palco do Teatro da Praia de D. Manuel, no Rio de Janeiro, em 1837. Na época, esse ator português montou no mesmo teatro outras traduções de Baiardo: A Veneziana e Dom João de Maraña ou o Fim de um Dissoluto, dramas de Dumas (pai), e O Mendicante ou o Delator de Si Mesmo, peça cuja autoria desconhecemos.22 O caso de Joaquim de Barros permite propor a hipótese de que pode ter sido recorrente a circulação de cópias manuscritas e de folhetos impressos de traduções pelos artistas portugueses. Além

20 BRAGA, Teófilo. História do Teatro Portuguez: a baixa comédia e a ópera, século XVIII. Porto: Imprensa Portugueza, 1871, p 79. 21 Luís José Baiardo foi dramaturgo e tradutor das companhias dramáticas do Teatro da Rua dos Condes e do Teatro do Salitre, em Lisboa. (Cf. BASTOS, 1898, p. 167, e LUÍS José Baiardo. In: SILVA, tomo V, 1860, p. 299). 22 Além das traduções, os artistas portugueses montaram dois dramas originais de Baiardo: O Marechal, Duque de Villars, na Batalha de Denain ou os Franceses Celebrando a Véspera de S. Luiz Rei da França, em 18 de julho de 1837, no Teatro da Praia de D. Manuel, e Betúlia Sitiada e Triunfante ou a Corajosa Judith, em 11 de março de 1841, no Teatro de São Pedro de Alcântara. 106

de montar essas peças, juntamente com a companhia dramática da atriz Ludovina Soares, esse ator também as comercializava.23 Joaquim de Barros acompanhou, muito provavelmente, as representações da trupe francesa no Teatro da Rua dos Condes, em Lisboa, ensaiada por Émile Doux entre 1835 e 1837. Uma parcela desse repertório foi criada em versões traduzidas, quando Doux, após o retorno dos artistas franceses para o país natal, passou a dirigir os atores portugueses na mesma sala de espetáculos. As traduções foram publicadas mensalmente, a partir de 1838, e coligidas em volumes da coleção lisboeta Archivo Theatral, como é o caso de A Veneziana e Dom João de Maraña (vol. 3, 1840). Segundo Almeida Prado, o Archivo Theatral teria sido a “fonte de boa parte do repertório de João Caetano”.24 De fato, conforme constatamos, dessa coleção teatral o ator brasileiro montou, em 1844, Um Erro ou Remorsos (vol. 2, 1839), tradução do Conde de Farrobo (1801-1869, Joaquim Pedro Quintela, 2º Barão de Quintela, 1º Conde de Farrobo)25, e, em 1846, Magdalena (vol. 7, 1844), tradução de João Baptista Ferreira de Madeleine (TAC, 1843), de Anicet-Bourgeois e Albert. Contudo, ainda que as traduções dessa coleção circulassem no Rio de Janeiro, vendidas por diversos livreiros, não encontramos indícios que confirmassem se os textos encenados por João Caetano, tais como Os Seis Degraus do Crime, A Torre de Nesle, Catarina Howard, Ricardo Darlington, Os Sete Infantes de Lara, Luísa de Lignerolles (Louise de Lignerolles, TF, 1838), de Prosper Dinaux e Ernest Legouvé, e O Aldeão Pervertido ou Quinze Anos de Paris (Le Paysan Perverti ou Quinze Ans de Paris, Théâtre du Gymnase Dramatique – TGD, 1827), de Théaulon de Lambert, seriam as traduções publicadas pelos volumes do Archivo Theatral.26 As incertezas também pairam sobre o repertório francês representado pela companhia de Ludovina Soares no Teatro da Praia de D. Manuel/Teatro de São Januário.

23 Em 1832, Joaquim de Barros anunciou na imprensa a venda de uma série de textos dramáticos: “Joaquim José de Barros, ator do Teatro Constitucional Fluminense, participa ao respeitável público, que ele possui 150 dramas e 70 farsas, algumas destas são ornadas de música, tudo pela maior parte dos melhores autores, Antonio Xavier, João Baptista Gomes Junior, Doutor Soares, Luiz José Baiardo etc. Tendo títulos de compra da maior parte deles, pois os comprou em Lisboa”. (JORNAL do Commercio, Rio de Janeiro, 13 jan. 1832, Vendas, p. 3). 24 PRADO, 1972, p. 81. 25 O Conde de Farrobo foi empresário do Teatro da Rua dos Condes e do Teatro de São Carlos, e construiu, em 1843, um teatro em sua quinta das Laranjeiras, em Lisboa. (Cf. BASTOS, 1898, p. 442-443). 26 Os Seis Degraus do Crime (vol. 5, 1842); A Torre de Nesle (vol. 1, 1838), tradução do Conde de Farrobo, estreou no Teatro da Rua dos Condes, a 8 de junho de 1837; Catarina Howard (vol. 1, 1838), tradução de Inácio Pizarro de Morais Sarmento, estreou no Teatro da Rua dos Condes, a 8 de fevereiro de 1838; Ricardo Darlington (vol. 1, 1838), tradução de João Baptista Ferreira, estreou no Teatro da Rua dos Condes, a 28 de setembro de 1837; Luísa de Lignerolles (vol. 7, 1844); Os Sete Infantes de Lara (vol. 4, 1841); O Aldeão Pervertido ou Quinze Anos de Paris (vol. 4, 1841). Obtivemos essas informações a partir da consulta aos volumes do Archivo Theatral; em SANTOS, 2007, p. 14-16; e do acesso ao banco de dados Tetra Base, do grupo de pesquisa “TETRA (Teatro e Tradução): para uma história da tradução de teatro em Portugal, 1800-2009”, disponível em: . Acesso em: 7 fev. 2017. 107

Acreditamos que o texto de Lucrécia Borgia encenado pela atriz portuguesa não foi a tradução de Baiardo, inserida no Archivo Theatral (vol. 1, 1838), pois este texto foi representado no Teatro da Rua dos Condes, a 12 de setembro de 1837, ao passo que a estreia no Rio de Janeiro ocorrera no ano anterior, em julho de 1836. Não encontramos indícios que confirmassem se o texto de Há Dezesseis Anos ou os Incendiários, encenado por Joaquim de Barros, em maio de 1837, seria a tradução de Baiardo representada, pela primeira vez, no Teatro do Salitre, a 4 de abril de 1836, e publicada em agosto de 1839 (Archivo Theatral, vol. 2). Também não foi possível certificar se as traduções de João Baptista Ferreira de O Capitão Paulo (Archivo Theatral, vol. 6, 1843) e O Sineiro de São Paulo (Archivo Theatral, vol. 2, 1839) tenham sido os textos protagonizados por Joaquim de Barros, em julho de 1839 e em fevereiro de 1840, respectivamente.27 O que podemos afirmar seguramente é que o processo de introdução de traduções da dramaturgia francesa da cena romântica começou a se efetuar durante o mesmo intervalo de tempo, a partir da segunda metade da década de 1830, tanto em Lisboa quanto no Rio de Janeiro, sobretudo, pela circulação dos atores portugueses e das coleções teatrais francesas (textos originais) e portuguesas (traduções). Consequentemente, os repertórios montados nos palcos de lá e cá foram extremamente semelhantes. Os procedimentos de tradução do texto teatral foram pouco descritos. De fato, no campo dos estudos da tradução, Susan Bassnett constatou que “os textos dramáticos têm sido muito esquecidos”.28 Um dos motivos pode ser atribuído à relação dialética entre texto e representação, cujas distinções complexas foram descritas por Anne Ubersfeld.29 A partir da virada cultural observada nos estudos da tradução, a partir da década de 1990, acrescentou-se o plano cultural ao linguístico. A tradução passou a ser definida além de um trabalho de reescrita que se formula pela recodificação de um texto de uma língua para outra. Segundo Christine Zurbach, no caso dos estudos do texto teatral, o fator cultural é preponderante, pois “como é sabido, o teatro é uma arte muito sensível ao universo social e político onde existe e com o qual está em relação”.30 No século XVII, a atividade de tradução era concebida como transposição do original, cujo objetivo principal buscava garantir a reprodução do gênio criativo do autor e a

27 Ver anexos “Tabela 11 – Traduções de Dramas e Melodramas Franceses no Archivo Theatral” e “Tabela 12 – Tradutores Portugueses nos Teatros do Rio de Janeiro”. 28 BASSNETT, Susan. Estudos de Tradução: fundamentos de uma disciplina. Tradução de Vivina de Campos Figueiredo. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2003, p. 189. 29 UBERSFELD, Anne. Para Ler o Teatro. Tradução de José Simões. São Paulo: Perspectiva, 2010, p. 1-8. 30 ZURBACH, Christine. A Tradução Teatral: o texto e a cena. Casal de Cambra: Caleidoscópio, 2007, p. 21. Disponível em: . Acesso em: 11 maio 2017. 108

riqueza da língua fonte. Cumpria um duplo papel linguístico: permitir o aprendizado das línguas clássicas e enriquecer, a partir de suas formas de expressão, as línguas nacionais. Ou seja, a tradução era um exercício de formação do estilo e do gosto, pela emulação dos clássicos da Antiguidade, e também dos neoclássicos franceses, como demonstrou Ana Clara Santos com o fenômeno da imitação de Corneille e Racine em Portugal.31 No final do século XVIII, o foco de interesse do ato de traduzir foi reorientado, os tradutores passaram a se dedicar ao desvelamento do texto fonte, em análises de ordem biográfica, literária, histórica, política e cultural.32 A mudança de interesse da atividade tradutora se deu de forma indissociável do processo de mutação da concepção clássica dos gêneros. No início dos anos 1830, na França, “a tese das traduções fiéis a seus originais avançou com força no seio dos meios românticos”.33 Contudo, a propensão à transparência era relativa, pois, segundo Lieven D’Hulst, diferentes práticas de tradução nasceram e foram identificadas pelos epítetos que seguiam ao termo “tradução”, tais como “literal”, “nova”, “imitação”, “livre”, que explicitavam o grau de submissão ao texto fonte. Das traduções encenadas nos palcos brasileiros, provenientes do Archivo Theatral português, as análises que delas empreendemos apontam para a tendência descrita por Lieven D’Hulst, ou seja, de certa flutuação no grau de submissão ao texto original. A tradução Magdalena, realizada pelo português João Baptista Ferreira e montada por João Caetano no Teatro de São Francisco, em novembro de 1846, manteve intactas a galeria de personagens, as descrições de tempo e de espaço e as ações dramáticas do texto fonte. Porém, João Baptista Ferreira eliminou pequenos trechos licenciosos.34 No início do segundo ato há um número musical, com coro e copla, que foi totalmente suprimido. Trata-se de uma música alegre e ligeira sobre a relação amorosa entre o homem e a mulher do campo, que, com tom malicioso, aborda o desejo dos garçons e fillettes de se enamorarem e se casarem. O tradutor eliminou, igualmente, a descrição da pantomima que se segue, simultânea à musica, na qual as personagens Nicole e Pierre dançam.

31 Ver SANTOS, Ana Clara. La fortune de Racine au Portugal: traduction et mise en scène. Seventeenth-Century French Studies, vol. 27, 2005, p. 209-219. 32 Cf. D’HULST, Lieven. La traduction: un genre littéraire à l’époque romantique? Revue d’Histoire Littéraire de la France, 97e année, n. 3, mai-juin/1997, p. 392-395. 33 Ibidem, p. 396. No original: “la thèse des traductions fidèles à leurs originaux est avancée avec force au sein des milieux romantiques.” 34 Usamos como referência: ANICET-BOURGEOIS, Auguste & ALBERT [THIRY, Auguste-François]. Magdalena: drama em cinco atos. [Tradução de João Baptista Ferreira]. In: Archivo Theatral. Vol. 7. Lisboa: Tipografia do Archivo Theatral, 1844, p. 121-158. 109

CHŒUR Air de M. F. A. Stoepel. Paroles de M. A. Béraud.

Brave moissonneur, Le travail t’appelle ; À sa voix fidèle, Auprès de ta belle Fauche avec ardeur.

PIERRE Garçon et fillette, Voici la moisson. Fillette et garçon, Sus ! que tout s’apprête. Au sein d’ nos guérets, Vous, troupe coquette, Qu’en ce jour de fête Bleuets et paqu’rette Forment vos bouquets.

NICOLE Plus d’ombre discrète Tout le long des blés ; Les amours troublés Ont pris leur retraite. En revanche ici, Enfants de la faucille, Nous n’ somm’s qu’une famille ; Ici, jeune fille, On trouve un mari.35

A tradução portuguesa eliminou ainda o trecho final dessa cena, no qual o Cura da vila, o Senhor Lamberto, após uns goles de vinho, entoa versos da canção popular que abrira o ato. A representação de uma figura eclesiástica se embebedando, entre jovens, e cantarolando versinhos populares pode ter soado atrevida para o tradutor, que preferiu omitir a ação.

LAMBERT – Ah ça, mais... vous chantiez quand je suis arrivé tout à l’heure ?... continuez donc... PIERRE – C’est que devant vous, monsieur le curé, nous n’oserions pas... LAMBERT – Les cœurs franchement joyeux sont des cœurs honnêtes ; reprenez votre ronde... je la chanterai avec vous. PIERRE – Vous, monsieur le curé ? LAMBERT – Oh ! je suis de votre pays... et je me souviens d’un couplet de cette ronde que vous ne connaissez pas peut-être, et que mon vieux père m’a dit bien souvent... Oh ! je ne le chanterai pas comme toi, Pierre ; enfin, je vais essayer.

Moissons tutélaires ! Ce don du Seigneur Dit à votre cœur : Songez à vos frères, Soyez tous unis. Et toi, moissonneuse,

35 ANICET-BOURGEOIS, Auguste & ALBERT [THIRY, Auguste-François]. Madeleine: drame en cinq actes. Paris: Marchant, [s.d.], p. 10. 110

Pour vieille glaneuse, Sois bien oublieuse De quelques épis.36

Verificamos também esse tipo de supressão no texto Os Seis Degraus do Crime presente no Archivo Theatral.37 A tradução seria literal se não fosse a eliminação integral da ária e do coro, acompanhados pela partitura de Vogue, ma nacelle, de Auguste Panseron, cantados na abertura do texto original francês. Nesse trecho, Jules Dormilly versifica o seu estilo bon vivant, contrário aos sermões “des parents bougons”, as virtudes e escrúpulos, uma vida que celebrava com bebida a alegria de viver o momento e de postergar as responsabilidades para o amanhã (“À demain les affaires, / Si demain doit venir”).38 Assim, conjecturamos a hipótese de que as traduções montadas nos palcos brasileiros, provenientes da coleção Archivo Theatral, não são imitações dos originais franceses, pois não recriam nem nacionalizam os textos fontes. São, antes, traduções com graus levemente distorcidos de fidelidade e de literalidade, que mantêm intactos as galerias de personagens, os espaços, os tempos e as ações dramáticas. Porém, suprimem trechos, sobretudo partes musicadas, que poderiam parecer licenciosos à cultura de recepção. Outra proposta de tradução teatral foi pensada por Mendes Leal, importante homem de letras português. Incomodado com a presença massiva de traduções, razoavelmente literais, da dramaturgia francesa nos teatros de Portugal, o que prejudicaria, a seu ver, o desenvolvimento do teatro nacional, Mendes Leal propôs nova técnica de tradução, que denominou transubstanciação, cujo objetivo principal seria a recriação, ou a nacionalização segundo a cultura de recepção, dos textos dramáticos estrangeiros.

É tradução isto? É imitação? É uma e outra coisa, e é mais do que ambas. Um termo só, a meu ver, define aproximadamente semelhante gênero de trabalho: transubstanciação. Traduzir literalmente as obras-primas é enfraquecê-las e desfigurá-las! Tanto mais vale o original, tanto mais fica descorado o que assim não passa de seu reflexo. Transubstanciai esse original, e vê-lo-ei ressurgir inteiro. Tirai dele o que nele verdadeiramente vive e esplende. Para isso não confundais o lenho com a chama; não anteponhais a execução ao plano. Se copiais a traço o monumento, tereis apenas uma estampa. Reconstruí-o pelo originário desenho, será outro ele. Nisto a transubstanciação. Este método que se me figura verdadeiro.39

36 Ibidem, p. 11. 37 Usamos como referência: [NÉZEL], Théodore & [ANTIER], Benjamin. Os Seis Degraos do Crime: drama em três atos. In: Archivo Theatral. Vol. 5. Lisboa: Tipografia do Archivo Theatral, 1842, p. 163-187. 38 Idem, 1832, p. 3-4. 39 LEAL, José da Silva Mendes. “Parecer do Ill.mo Ex.mo Sr. José da Silva Mendes Leal”. In: CASTILHO, Antonio Feliciano de. Theatro de Molière. Primeira Tentativa. Tartufo, comédia vertida livremente e acommodada ao portuguez. Lisboa: Academia Real das Ciências, 1870, p. 221-222. 111

Antonio Feliciano de Castilho aplicou a ideia da nacionalização dos textos dramáticos franceses nas traduções livres que realizou das comédias de Molière, tais como Tartufo, O Médico à Força e As Sabichonas. Porém, antes de empreender esses trabalhos, traduziu Camoëns (TO, 1845), melodrama em cinco atos de Victor Perrot e Armand Dumesnil. O texto, que não recebeu montagem em Portugal, foi encenado somente por João Caetano, no Rio de Janeiro. O tradutor português recriou a obra francesa com o objetivo de ensinar ao leitor a biografia de Camões e o momento histórico no qual viveu, ou seja, tratava-se de uma “obra talhada para o remanso do gabinete”.40 A proposta de se compor obras de narrativas históricas em forma de texto dramático, para serem lidas e não, necessariamente, representadas, não era uma novidade. As cenas históricas floresceram na França, durante o período romântico, notadamente pelas peças de Ludovic Vitet, de Prosper Mérimée e de George Sand, autora que ofereceu a Musset o canevas de Lorenzaccio, inspirado em sua obra Une Conspiration en 1537.41 Assim, Antonio de Castilho transformou um melodrama em uma cena histórica de leitura instrutiva. Para tanto, enriqueceu as ações dramáticas, porque, a seu ver, a obra francesa, “de Camões, não tinha mais que o nome; da terra e dos tempos de Camões, coisa nenhuma”.42 No prefácio da obra, o tradutor revelou que algumas cenas haviam sido inteiramente copiadas, ao passo que outras eram integralmente novas. De fato, Antonio de Castilho acrescentou um prólogo, inexistente no original francês, e cenas que melhor esclareciam os fatos históricos; reformulou as rubricas de espaço, com maiores descrições dos cenários, e também os diálogos, com uma sintaxe e expressões próprias do português. A tradução de Antonio de Castilho foi trazida ao Brasil por Jacques Arago, quando este, rumo ao Rio de Janeiro, permaneceu alguns dias em Lisboa e estabeleceu contato direto com o poeta e tradutor português. Com a súbita morte de Arago, no Rio de Janeiro, em novembro de 1854, João Caetano herdou os livros do dramaturgo francês e conheceu o Camões de Antonio de Castilho. Quando o tradutor visitou o Rio de Janeiro, em

40 CASTILHO, Antonio Feliciano de. “Nota I. Notícia complementar”. In: Camões: estudo histórico-poético liberrimamente fundado sobre um drama francês dos senhores Victor Perrot e Armand Du Mesnil. Vol. II. 3 ed. Lisboa: Empreza da História de Portugal, 1906, p. 8. 41 Cf. LEDDA, Sylvain. “Théâtre et scènes historiques”. In: LAPLACE-CLAVERIE; LEDDA & NAUGRETTE, 2008, p. 95-123. Sobre a produção dramática de George Sand, ver BARA, Olivier. Le Sanctuaire des Illusions: George Sand et le théâtre. Paris: Presses de L’Université Paris-Sorbonne, 2010. 42 CASTILHO, Antonio Feliciano de. “A quem ler”. In: Camões: estudo histórico-poético liberrimamente fundado sobre um drama francês dos senhores Victor Perrot e Armand Du Mesnil. 2 ed. Lisboa: Tip. da Sociedade Tipográfica Franco-Portuguesa, 1863, p. ix. 112

fevereiro de 1855, o ator confidenciou-lhe o desejo de montar o seu Camões e encomendou a escrita de uma apoteose, pedido que foi prontamente atendido por Antonio de Castilho.43 A solicitação de João Caetano a Antonio de Castilho pode ter sido motivada pelo sucesso consolidado do melodrama Luiz de Camões (1845), de Burgain, que é finalizado por uma apoteose em reverência ao poeta português. Para João Caetano, o Camões de Antonio de Castilho seria a possibilidade de ter em seu repertório uma peça que tratasse da vida do célebre poeta, na tentativa de concorrer com a obra de Burgain. Esta, presente no repertório de Germano Francisco, se tornou sucesso editorial, alcançando cinco edições, e foi bem-sucedida nos palcos, com frequentes reprises no Rio de Janeiro e nas províncias.

[...] poucos dramas em língua portuguesa terão sido mais representados, aplaudidos e elogiados do que o Luiz de Camões. Outros têm aparecido sobre o mesmo assunto; mas ao Camões do Sr. Burgain pertence a dupla glória de ter sido o primeiro, e de ser hoje o único representado, tanto no Brasil como em Portugal. Outra distinção lhe cabe ainda, e é ser frequentemente escolhido nas províncias para representações solenes, como festas nacionais, inaugurações de teatros, etc. Se o drama Luiz de Camões foi tão feliz na cena, não o foi menos na leitura, o que se prova com cinco edições formando cinco mil exemplares, resultado único no Brasil, em obras deste gênero.44

O melodrama Camões, submetido ao Conservatório Dramático Brasileiro, em maio de 1855, foi aprovado de forma honrosa, considerado pelo presidente da instituição, Diogo Soares da Silva de Bivar, uma “obra tão primorosa”.45 A peça estreou no Teatro de São Pedro de Alcântara, a 30 de novembro de 1855, em espetáculo que contou com a presença do Imperador D. Pedro II em sua tribuna real. José Feliciano de Castilho assistiu à montagem e, em carta endereçada ao irmão, o tradutor da peça, relatou que João Caetano fizera cortes consideráveis no texto original sob a justificativa de não enfastiar o público, em uma récita de cinco horas de duração.46

43 Cf. CASTILHO, 1906, p. 7-9. 44 OS EDITORES. In: BURGAIN, Luís Antônio. Luiz de Camões: drama em cinco atos. 5 ed. Rio de Janeiro: Eduardo & Henrique Laemmert, [s.d.], p. vii-viii. 45 BIVAR, Diogo Soares da Silva de. In: SILVA, João José de Castro e. Administrador do Teatro de São Pedro d’Alcântara. Requerimento a Diogo Soares da Silva de Bivar, solicitando exame censório para as peças: Camões e A Morte de Gomes Freire. Rio de Janeiro, 27 maio 1855, p. 3. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 12, 017. 46 CASTILHO, José Feliciano de. “Extrato de uma carta de José Feliciano de Castilho de 14 de dezembro de 1855 a seu irmão Antonio”. In: CASTILHO, op. cit., p. 11. 113

2.4 As traduções brasileiras

Desde a década de 1830, homens de letras, nascidos tanto em Portugal quanto no Brasil, traduziram peças francesas que foram montadas nos palcos do Rio de Janeiro e das províncias. Identificamos em anúncios de espetáculos e em edições impressas traduções realizadas por José Joaquim Vieira Souto (1828-1891), genro de João Caetano, casado com sua primogênita, Joaquina Maria Rosa (1834-1895)47, conhecido pela tradução de La Dame aux Camélias (TVa, 1852), de Dumas (filho), representada no Teatro Ginásio Dramático, em 1856; Luiz Honório Vieira Souto (1819-1890), irmão de José Joaquim Vieira Souto, que construiu carreira política e foi redator do Jornal do Commercio; Antônio Rego (1820-1883), maranhense que fez parte da associação que tentou fundar, em São Luís, porém sem sucesso, um Conservatório Dramático; Antonio José de Araújo, poeta, professor, colaborador do Jornal do Commercio e membro do Conservatório Dramático Brasileiro; Joaquim da Silva Lessa Paranhos, outro genro de João Caetano, casado com Raquel Santos Lessa Paranhos (1842-1872). Dentre os tradutores do repertório francês, em sua maioria homens de letras, identificamos um ator. O biógrafo Joaquim Serra mencionou que Germano Francisco publicou na Bahia o Archivo Theatral Cachoeirense, uma coletânea de peças que teria traduzido, tais como Maria Joana ou a Mulher do Povo, O Marinheiro de Saint-Tropez e Justiça de Deus (provavelmente, La Justice de Dieu, TG, 1845, de Anicet-Bourgeois e Foucher).48 Observamos que diversos anúncios de espetáculos, nos quais Germano Francisco atuou, tanto no Rio de Janeiro quanto nas províncias, mencionavam que O Marinheiro de Saint-Tropez e O Processo Lesurques ou o Correio de Lião foram traduzidos pelo ator.49 Além de tradutor, Germano Francisco foi também autor de peças musicadas. Localizamos no acervo da Sociedade Brasileira de Autores (SBAT) o manuscrito de O Diabrete Feminino (também intitulado A Mulher do Diabo), uma comédia em três atos ornada de música, original de Germano Francisco, segundo a própria capa do manuscrito, encenada no Rio Grande do Sul, em 1869.50 Conforme apuramos, a partir de anúncios de espetáculos, são também da autoria de Germano Francisco: O Tunileiro Enredador (1860), ópera em um ato, e a letra do terceto O Velho Ciumento (1853), musicado pelo maestro Gianini.

47 Ver SILVA, 1935, p. 395. 48 Cf. SERRA, 1862, p. 9-10. 49 Ver anexo “Tabela 13 – Traduções no Brasil”. 50 OLIVEIRA, Germano Francisco de. O Diabrete Feminino. Manuscrito pertencente ao acervo da Sociedade Brasileira de Autores (SBAT). 114

As traduções brasileiras, notadamente aquelas destinadas à encenação nos teatros do Rio de Janeiro, foram formatadas pelas diretrizes do Conservatório Dramático Brasileiro. Os censores, de modo geral, não demonstravam realizar a tarefa de cotejo da versão traduzida com o original francês. São raros os casos nos quais o censor empreendeu uma análise comparativa, e quando a fez, tendeu a condenar a tradução, considerando-a imperfeita. Assim ilustra o parecer emitido por Antonio Luis Fernandes da Cunha sobre a peça Simão ou o Velho Cabo de Esquadra: “se a tradução chegasse à altura do original, nada haveria tão perfeito como este drama, e os aplausos do público coroariam a obra de um modo admirável”.51 Como não obtivemos o texto de Simão ou o Velho Cabo de Esquadra, e tendo em vista que o censor não se prolongou em sua análise, não sabemos exatamente o que entendia por “chegar à altura do original”, se estaria argumentando em termos de fidelidade ao texto original ou o trabalho com a linguagem. Fato é que os censores, ao avaliarem as peças traduzidas, assim como as obras originais em português, preocupavam-se mais com o atendimento aos preceitos morais e políticos que com a qualidade literária dos textos dramáticos, uma vez que este último critério desempenhava peso menor na avaliação e não culminaria na reprovação de uma obra. A avaliação exercida pelo Conservatório Dramático se estruturava em três pilares (a Monarquia e a figura do Imperador, a religião e a Igreja Católica, o decoro e a manutenção dos bons costumes). Seguia o “Aviso de 10 de novembro de 1843” e a “Resolução Imperial de 28 de agosto de 1845”, transcritos nos formulários de censura.

Não devem aparecer na cena assuntos, nem mesmo expressões menos conformes com o decoro, os costumes e as atenções que em todas as ocasiões se devem guardar, maiormente naquelas em que a Imperial Família honrar com a Sua Presença os espetáculos. (Aviso de 10 de novembro de 1843).

O julgamento do Conservatório é obrigatório quando as Obras censuradas pecarem contra a veneração à nossa Santa Religião, contra o respeito devido aos Poderes Políticos da Nação e as Autoridades construídas e contra a guarda da moral e decência pública. Nos casos porém em que as obras pecarem contra a castidade da língua, e aquela parte que é relativa à Ortoépia, pode-se notar os defeitos, mas não negar a licença. (Resolução Imperial de 28 de agosto de 1845).52

51 CUNHA, Antonio Luis Fernandes da. In: SILVA, João José de Castro e. Administrador do Teatro São Pedro d’Alcântara. Requerimento a Antonio Luis Fernandes da Cunha, solicitando exame censório para o drama: Simão, ou, O Velho Cabo de Esquadra. Rio de Janeiro, 6 abr. 1858, p. 4. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 14, 120. 52 VASCONCELOS, José Rufino Rodrigues. 1º Secretário do Conservatório Dramático. Designação para Ângelo Muniz Silva Ferraz e João Antônio de Miranda examinarem a peça: A Graça de Deus. Rio de Janeiro, 5 mar. 1847, p. 3. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 05, 072 n. 003. 115

Assim, as diretrizes do Conservatório Dramático, estruturadas a partir da moral religiosa e monárquica, impactaram consideravelmente nas traduções representadas nos teatros. Isso demonstra que nem tudo presente nos textos dramáticos franceses seria possível (ou aceitável) nos palcos brasileiros da época.

2.4.1 A censura do Conservatório Dramático Brasileiro

Christophe Charle propôs que o modelo cultural liberal explicaria a difusão internacional da dramaturgia francesa do século XIX. Segundo o autor, o modo de vida parisiense e a história única desta capital, que exerciam certo fascínio nas outras culturas, teriam autorizado “os dramaturgos a abordar temas delicados (o divórcio, as tensões entre homens e mulheres, os conflitos de gerações), maneiras de falar ou vestir-se próprias dos vários grupos, conflitos políticos mais ou menos explícitos entre os grupos sociais”.53 No Brasil, sabemos que houve essa curiosidade, até mesmo um fascínio, pela vida parisiense, especialmente pelos seus passeios, cafés e teatros. Os correspondentes dos periódicos brasileiros noticiavam com frequência os programas apresentados pelos teatros de Paris, inclusive os populares, e apresentavam sinopses das peças encenadas. No texto publicado pelo Correio Mercantil, periódico do Rio de Janeiro, em 1856, o correspondente descreveu o interior das três salas de espetáculos dedicadas ao melodrama e narrou o comportamento costumeiro do público, que considerou “divertido”, durante as representações.

Os teatros do drama são a Porte Saint-Martin, o Ambigu e La Gaîté. Esses teatros, situados em bairros populares, têm um público duplo; o público dos primeiros lugares, e dos lugares mais baratos, que é composto dos obreiros parisienses que tem a paixão do drama. Esta gente desde a idade de 3 ou 4 anos assistem a todos os dramas que se representam. A Porte Saint-Martin é uma das mais vastas salas de Paris. A Gaîté e o Ambigu acomodam muito mais gente, porém não têm o aspecto grandioso da Porte Saint-Martin. A Gaîté tem tido agora grandes triunfos. O Médico dos Meninos, drama em 5 atos, é dessas peças que se representam 150 vezes seguidas. [...] O que há de divertido na representação deste gênero de peças é o espetáculo da sala, quando o drama torna-se tocante; os lenços agitam-se de tal modo que interrompem a representação; ouvem-se oh! Oh! E mil outros murmúrios.54

Apesar do fascínio pela arte dramática de Paris, isso não quer dizer que qualquer peça de lá oriunda seria encenada no Brasil. No que se refere à dramaturgia romântica, é

53 CHARLE, 2012, p. 199. 54 PARIS – Dezembro de 1855. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 18 jan. 1856, p. 1. 116

perceptível que houve um fenômeno de seleção. Verificamos um duplo movimento, caracterizado de um lado, da aceitação dos melodramas claramente moralizantes, e de outro, da recusa da permanência, ou até mesmo da primeira montagem, dos dramas românticos, sobretudo os de Victor Hugo, que representavam figuras monárquicas (Reis, Rainhas, Princesas) em situações indecorosas. A proibição pelo Conservatório Dramático Brasileiro da criação de Maria Tudor, de Victor Hugo, no Teatro de São Pedro de Alcântara, em janeiro de 1844, ilustra claramente a interdição do drama por motivos de ordem política. Durante a Monarquia de Julho, após a breve suspensão das atividades censoras, entre os anos de 1830 e 1835, e sua retomada posterior, a censura dramática francesa adotou critérios políticos, religiosos e dos bons costumes.55 Segundo Florence Naugrette, os censores avaliaram o drama romântico com cautela, proibindo-o frequentemente, pois perceberam que a entorse nos códigos e valores neoclássicos de representação, verificável especialmente nos desfechos anti-providenciais, eram sementes de subversão política e social, “que interrogam a legitimidade do poder e denunciam a violência do Estado”.56 No Brasil, o primeiro censor de Maria Tudor, José Clemente Pereira, argumentou a favor da proibição, tendo em vista que o drama apresentava a soberana inglesa em ações morais escandalosas e pervertidas, um desvio dos princípios neoclássicos, baseados na representação de Reis e Rainhas em “atos heroicos, morais e virtuosos”. Além disso, como a família imperial comparecia frequentemente, e sem aviso, à sua tribuna no Teatro de São Pedro de Alcântara, seria uma grande inconveniência fazê-la assistir a um drama que provocaria manchas no “prestígio da Realeza”.

O drama Maria Tudor apresentando o deplorável espetáculo de uma Princesa soberana, digna de censura pelos escândalos de sua moral pervertida como mulher e como Rainha, não pode deixar de deprimir, e muito, o prestígio da Realeza, se chegar a representar-se! E como, segundo os nossos princípios, só devam aparecer em cena os atos heroicos, morais e virtuosos dos soberanos, capazes de inspirar nos Povos sentimentos de amor, veneração e respeito, não posso convir em que se autorize a representação do referido drama; e muito principalmente no Teatro de S. Pedro de Alcântara, honrado frequentes vezes, e sem prévia participação, com a Augusta Presença da Família Imperial.57

55 Cf. KRAKOVITCH, Odile. Les romantiques et la censure au théâtre. Romantisme, n. 38, 1982, p. 33-46. 56 NAUGRETTE, 2011b, p. 40. No original: “qu’ils interrogent la légitimité du pouvoir et dénoncent la violence d’État.” 57 PEREIRA, José Clemente. Censor. Parecer censório sobre o drama de Victor Hugo: Maria Tudor, negando a licença por julgá-lo imoral. Rio de Janeiro, 20 jan. 1844, p. 3. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 22, 048. 117

Uma alternativa que possibilitasse a aprovação de Maria Tudor, cogitada pelo segundo censor, José Florindo de Figueiredo Rocha, seria a proposição de alterações na tradução. Porém, a notoriedade de Victor Hugo era tamanha que o censor brasileiro não se sentiu no direito de propor emendas em sua obra dramática.

O drama Maria Tudor tal qual foi submetido à censura do Conservatório Dramático, não deve ser representado nos teatros brasileiros, máxime na Augusta Presença de S. S. M. M. Imperiais; e não ousando em propor emendas ou supressões em uma composição de Victor Hugo, contento-me com negar pura e simplesmente o pedido de licença.58

Motivos semelhantes levaram o Conservatório Dramático Brasileiro a proibir a representação de A Torre de Nesle, de Dumas (pai), em junho de 1844, mesmo ano em que Maria Tudor foi impedida de subir ao palco no Rio de Janeiro. O último indício de encenação do drama data de 1842, no Teatro Niteroiense, em Niterói, em espetáculo beneficente em favor da atriz Estela Sezefreda. Em 1846, a peça foi encenada em São Luís, no Maranhão, onde a proibição do Conservatório Dramático do Rio de Janeiro não vigorava. Em ocasião desta montagem, Gonçalves Dias publicou uma crítica na imprensa maranhense, na qual interpretou a peça de Dumas (pai) como expressão artística da conciliação hugoana do sublime e do grotesco. Ao analisar a personagem Marguerite de Bourgogne – Rainha tirânica e libertina que mata seus parceiros de orgia e despeja os corpos dos amantes no rio Sena, e ainda comete incesto e assassina o filho –, Gonçalves Dias associou as ações violentas com sua caracterização de mulher essencialmente romântica. Assim, ela reuniria posturas e sentimentos opostos.

Eis o que ela é, mulher impudicamente sensual, mulher amante extremosamente, mulher friamente criminosa, mulher horrivelmente vingativa, mulher traiçoeira e cavilosa, rainha orgulhosa e prepotente, rainha boa, e bela e afável; ao mesmo tempo corajosa e fraca, astuciosa e franca, boa e tremenda, mulher e rainha.59

Porém, diferente de Gonçalves Dias, compreensivo e favorável à estética romântica, um dos censores do Conservatório Dramático Brasileiro viu em A Torre de Nesle apenas “uma moça criminosa, uma esposa adúltera e uma mãe incestuosa”60, comportamentos

58 ROCHA, José Florindo de Figueiredo. In: PEREIRA, 20 jan. 1844, p. 4. 59 DIAS, Antônio Gonçalves. “A Torre de Nesle, 28 de fevereiro de 1846”. In: GIRON, Luís Antônio (Org.). Crônicas Reunidas. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras, 2013, p. 140. 60 PRIMEIRO parecer de A Torre de Nesle de junho de 1844 apud NOVAES, Justino de Figueiredo. “Segundo parecer”. In: BIVAR, Luís Garcia Soares de. Requerimento a Antonio Luis Fernandes da Cunha, solicitando exame censório para a tradução de A torre maldita, de Alexandre Dumas. Rio de Janeiro, 16 fev. 1858, p. 16. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 14, 099. 118

imorais extremamente nocivos às mulheres que frequentavam os teatros. A peça foi proibida de receber novas montagens nos palcos do Rio de Janeiro por conter “tanta imoralidade”, pela “conduta do governo francês e dos outros países em cujo idioma se acha traduzida” que a baniram dos teatros e pelas “recordações do que experimentamos quando em outra época foi aqui representada”.61 Para ter uma tradução aprovada pelo Conservatório Dramático Brasileiro, ficou claro aos atores e tradutores que quisessem montar determinados textos franceses, sobretudo os dramas românticos anti-providenciais e os melodramas que representavam situações mais licenciosas, a necessidade de modificações nas peças originais, por meio de processos de atenuação e supressão de diálogos e monólogos. Foi o que permitiu o retorno de A Torre de Nesle aos palcos. Em 1858, Luís Garcia Soares de Bivar, filho de Diogo de Bivar, presidente do Conservatório Dramático, submeteu à instituição censora a peça A Torre Maldita, nova tradução do drama de Dumas (pai). Segundo o parecer do censor Justino Figueiredo Novaes, sabemos que a versão de Luís de Bivar suprimiu “diálogos e expressões em que havia alguma imoralidade”62, eliminando, até mesmo, cenas inteiras (cenas 3 e 4 do quarto ato). O tradutor suprimiu partes de diálogos e monólogos dos soberanos, a Rainha Marguerite de Bourgogne e o Rei Louis X, ou que a eles faziam referências, nos quais eram tratados em situações de degradação moral ou como agentes de vícios e paixões mundanas. O tradutor apagou referências explícitas às ações adúlteras e ao comportamento lascivo da Rainha, assim como as alusões ao caráter fraco do rei, retratado como esposo traído e um soberano coadjuvante, ignorado pelos seus súditos.63 As adequações realizadas por Luís de Bivar convenceram o primeiro censor, Francisco Joaquim Bittencourt da Silva, que aprovou a peça, pois considerou que o tradutor “soube nulificar honestamente, sob um véu de circunstâncias imprevistas, de acasos que se sucedem naturalmente, atos abjetos e sórdidos dessa Margarida de Borgonha”.64 Para atender aos ditames antirromânticos do Conservatório Dramático e tornar possível a realização cênica de A Torre de Nesle, o tradutor corrigiu o drama fazendo uso da Fatalidade, elemento da tragédia clássica que oferecia justificativas às ações criminosas de Marguerite de Bourgogne, e da punição divina, recurso do melodrama. A alteração, contudo, implodiu a poética do drama romântico, que subvertia a chave de representação neoclássica e a convenção da providência divina, ao apesentar personagens torpes e criminosas, cujas ações moralmente

61 NOVAES. In: BIVAR, 16 fev. 1858, p. 16. 62 Ibidem, p. 13. 63 Ver anexo “Tabela 14 – Trechos Suprimidos na Tradução de La Tour de Nesle”. 64 SILVA, Francisco Joaquim Bittencourt da. “Primeiro parecer”. In: BIVAR, op. cit., p. 8. 119

corruptas e violentas não recebiam punições. Para o censor, com a modificação, a peça deixava de ser uma ameaça às virtudes da mulher, e passava a demonstrar uma lição moral profunda, “de que não há ventura duradoura sobre a terra deslizada da virtude”.65 Eis como A Torre de Nesle transformou-se em um melodrama no Brasil. Porém, as modificações realizadas por Luís de Bivar não foram suficientes para obter a aprovação do segundo censor, Justino Figueiredo Novaes, que não encontrou diferenças substanciais entre a versão brasileira e o original francês. Para obter a aprovação, o censor acreditava que seria necessário, como ocorre no melodrama ou no drama realista, uma punição divina ou social mais visível a Marguerite e a Buridan, “para desvanecer a impressão que causam seus crimes”.66 Fazendo uso de seus poderes como presidente do Conservatório Dramático, Diogo de Bivar, o pai do tradutor, deu o veredicto final e aprovou a tradução de A Torre de Nesle realizada pelo filho, conformando-se com o parecer favorável emitido pelo censor Francisco Joaquim Bittencourt da Silva. A estreia da peça ocorreu no Teatro de São Pedro de Alcântara, a 29 de agosto de 1858, com João Caetano no papel de Buridan, Ludovina Soares como Margarida de Borgonha, e Florindo Joaquim como Gaultier D’Aulnay. O caso de A Torre de Nesle desvela a atuação do Conservatório Dramático Brasileiro como entidade de orientação da atividade de tradução da dramaturgia francesa a ser representada nos teatros do Rio de Janeiro. Assim como o caso da proibição de Maria Tudor, aponta para o impacto direto da instituição censora sobre a tímida presença do drama romântico nos palcos. Revela ainda os meandros do processo censório, que não previa medidas especiais em situações em que havia conflitos de interesses, permitindo, por exemplo, que o pai de um tradutor participasse da avaliação da tradução assinada pelo filho e deliberasse em favor de sua causa. A religião, atrelada aos motivos políticos, foi outro pilar que orientou as atividades censórias desempenhadas pelo Conservatório Dramático Brasileiro. Quando se tratava da avaliação de peças que subiriam aos palcos durante o período da Quaresma, os censores redobravam o rigor, chegando a negar a autorização de representação a determinadas peças, mesmo que estas já tivessem sido aprovadas e fossem encenadas com frequência em outras datas. O processo censório de D. César de Bazan revela essa prática adotada pelo Conservatório Dramático do Rio de Janeiro.

65 SILVA. In: BIVAR, 16 fev. 1858, p. 8. 66 NOVAES. In: Ibidem, p. 17. 120

Em 1845, doze meses após a estreia em Paris, D. César de Bazan foi criado por João Caetano no Teatro de São Francisco. O censor responsável pela avaliação, Antonio Pinto de Figueiredo Mendes Antas, não encontrou na peça “ponto algum proibitório”67, porém sinalizou para a falta de metrificação das coplas, que provocariam o único demérito do texto traduzido, demonstrando, ainda que de forma secundária, que os censores poderiam atentar-se a questões literárias, além de aspectos morais e políticos. O presidente Diogo de Bivar aprovou a peça sob a reserva de que “seria conveniente porém que se corrigissem os versos que em geral pecam na metrificação”.68 A montagem de D. César de Bazan por João Caetano conferiu nova identidade ao herói nos palcos brasileiros. Em Paris, Frédérick Lemaître o representava com tom burlesco, como podemos depreender da anedota em torno da criação da personagem, recontada por Charles Monselet. Este revelou que o ator francês decidiu no último momento acentuar em D. César de Bazan “um sentido claramente cômico”.69 No Brasil, João Caetano privilegiou o tom sério e cavalheiresco, conforme constatamos a partir das impressões de um cronista de Pelotas, que assistiu à encenação de D. César de Bazan oferecida por João Caetano em sua cidade, quando este realizou turnê no Rio Grande do Sul, em 1854.

Para interpretar com sucesso tal papel, é preciso um talento como o de João Caetano, porque o homem nobre que se embriaga e se degrada conserva sempre em suas ações, em seu porte, uma certa dignidade que lhe deu o berço, que todas as suas loucuras não podem destruir. João Caetano atingiu a sublimidade na execução do seu papel.70

Assim, a criação do papel de D. César de Bazan por João Caetano, ao eliminar o registro cômico da peça, garantido pelo jogo de cena de Frédérick Lemaître, buscou sublinhar a “dignidade” originária do “berço” nobre da personagem, que nasceu em meio aristocrático e conservava um título de nobreza, apesar de sua conduta moral degradante (a embriaguez, a inclinação pelos jogos de azar, os gastos excessivos de dinheiro, a dilapidação de bens e da herança). O que é compreensível, já que João Caetano cumpria o papel de ator oficial da

67 ANTAS, Antonio Pinto de Figueiredo Mendes. “Parecer Don César de Bazan”. In: SANTOS, João Caetano dos. Requerimento ao 1º secretário do Conservatório Dramático Brasileiro para as peças: D. Rodrigo, D. César de Bazan, A filha do cego. Rio de Janeiro, 28 out. 1845, p. 3. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 03, 039. 68 BIVAR, Diogo Soares da Silva de. In: Ibidem, p. 4. 69 MONSELET, Charles. 1880. In: Cote 8-RF-40596 – Recueil factice d’art. de presse et programmes sur “Don César de Bazan” de Dumanoir et Dennery, Collection Auguste Rondel, Bibliothèque des Arts du Spectacle, BNF – Richelieu. No original: “sa résolution au dernier moment de l’accentuer dans un sens franchement comique.” 70 O PELOTENSE, Pelotas, 25 out. 1854 apud SANTOS, Klécio. Sete de Abril: o teatro do Imperador. Porto Alegre: Libretos, 2012, p. 43. 121

Monarquia, subvencionado pelo governo imperial. Então, a peça foi realizada cenicamente sob as balizas da reabilitação da honra de D. César de Bazan. Após ter sido desviado do caminho da virtude moral por um comportamento corrupto, aparentemente inadequado à sua condição social, D. César de Bazan, um membro da aristocracia, estaria destinado a cumprir ações virtuosas, atendendo, assim, ainda que às avessas, ao código de valores e ao sistema de emprego das personagens da estética neoclássica. João Caetano garantiu que a representação de D. César de Bazan não implodisse totalmente o sistema de representação da estética neoclássica, nem colocasse em risco os valores sociais e políticos prezados pela nobreza. Contudo, não pôde abafar o tratamento ambíguo que a peça suscitava em torno do decoro moral e religioso, tendo em vista as práticas condenáveis do protagonista, como o consumo excessivo de bebidas alcoólicas, a realização de um casamento que feria as leis do sagrado matrimônio, a dilapidação de herança em jogos de azar, a fama de mau pagador e a fuga de credores. Em 1847, o administrador do Teatro de São Francisco, o português Camilo José do Rosário Guedes, submeteu novamente D. César de Bazan à censura, solicitando liberação da obra para ser representada durante o período da Quaresma.71 A princípio, o parecerista Francisco José de Souza Silva reconheceu que o regulamento da censura não o autorizava a proibir a encenação de uma peça em determinada época do ano. Contudo, como seria prática recorrente no período da Quaresma representar obras que celebravam os mistérios da religião cristã, concluiu que “Don César de Bazan não deve ser representado na Quaresma”.72 Para argumentar a favor de sua negativa, o censor recorreu à defesa dos preceitos cristãos celebrados pela Igreja, o que justificaria o impedimento de representação de um drama que apresentava coplas ambíguas e não propunha um ensinamento moral explícito no desfecho.

Contudo, uso é nosso, herdado de há muito, não aparecerem em cena assuntos menos sérios em uma parte do ano que a Igreja tem reservado para a celebração dos mistérios da religião cristã [...]. Como porém esse meu modo de pensar a tal respeito se funda tão somente no que está estabelecido por prática, e no mínimo escrúpulo que tenho de dar um juízo que não seja consciencioso, não quero com ele concluir senão que seria para desejar que a empresa daquele teatro, cujo repertório não se limita aos dramas do quilate deste, lançasse mão de outro, por ao menos não tão

71 Ver GUEDES, Camilo José do Rosário. Administrador do Teatro de São Francisco. Requerimento a José Rufino Rodrigues Vasconcelos, solicitando exames censório para as peças: L’Ambassadrice, Zampa, Jean de Paris, Fra Diavolo, D. César de Bazan, Gargalhada, Graça de Deus, Kettly, O vizinho Bagnolet e O Beijo, para serem representadas na quaresma. Rio de Janeiro, 4 mar. 1847. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 06, 002. 72 SILVA, Francisco José de Souza. In: VASCONCELOS, José Rufino Rodrigues. 1º Secretário do Conservatório Dramático. Designação para Francisco José de Souza Silva examinar a peça: D. Cezar de Bazan. Rio de Janeiro, 5 mar. 1847, p. 7. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 05, 072 nº 001. 122

saturado de sátira pouco filosófica, de coplas tão cheias de equívocos, e cujo fundo não é dos mais morais.73

O decoro social impactou na tradução e na realização cênica de La Grâce de Dieu, drama entremeado de cantos de Dennery e Lemoine. A peça, uma adaptação da canção À la Grâce de Dieu, de Loïsa Puget, esposa de Lemoine, aproxima-se do vaudeville. Primeiro, porque algumas partituras das árias e coplas da peça já existiam e foram emprestadas, por exemplo, dos compositores Frédéric Bérat e Giacomo Meyerbeer. Segundo, as personagens refletem os tipos principais do vaudeville, como a moça inocente, o rapaz apaixonado e virtuoso, e o homem mais velho inescrupuloso que ameaça o futuro dos jovens amantes. Terceiro, a intriga sentimental e moralizante é atenuada nos momentos de forte emoção por quiproquós que engendram comicidade ao tom dramático.74 La Grâce de Dieu estreou no Théâtre de la Gaîté, em Paris, em janeiro de 1841. No Rio de Janeiro, foi encenada em língua original no Teatro de São Januário, em maio de 1842, pelos atores franceses da companhia dirigida por Ernest Gervaise. Após a criação da peça em francês, uma tradução para o português foi montada no Teatro de São Pedro de Alcântara.75 Em fevereiro de 1845, João Caetano estreou sua versão da obra no Teatro de São Francisco, desempenhando o papel do jovem herói, o Marquês de Sivry/André. Com essa criação, um lado artístico pouco comentado de João Caetano se desvelou: ele cantava as coplas “com a sua linda voz de barítono”.76 A peça horrorizou um de seus censores, Ângelo Muniz da Silva Ferraz, que aconselhou “que a sumissem antes no fogo do que a expusessem ao público”. O censor não ofereceu argumentos (literários, políticos ou religiosos) que justificassem seu posicionamento radical, que recomendava queimar a peça no fogo, prática secular da censura inquisitorial, afirmou apenas que não encontrava termos para exprimir o “nenhum mérito” de A Graça de Deus. Aprovou a peça para representação em período da Quaresma pelo argumento mordaz de que seria “mais uma penitência que terão os fiéis que a ouvirem, como a que eu já tive em a ler”.77 Muito provavelmente, a construção dramática (personagens, ações, parte musical) pode ter sido o fator principal que levou o censor a detratar A Graça de Deus. O segundo censor, João Antônio de Miranda, desaprovou as letras de algumas árias e trechos de diálogos que representariam um comportamento feminino licencioso nas

73 SILVA. In: VASCONCELOS. Designação para Francisco José de Souza Silva..., 5 mar. 1847, p. 7. 74 Sobre os elementos de composição do vaudeville, ver GIDEL, Henry. Le Vaudeville. Paris: PUF, 1986, p. 27- 45. 75 Cf. INACIO, 2013, p. 221 e p. 87 do Annexe II. 76 J. Theatro de S. Francisco. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 11 fev. 1845, Correspondências, p. 3. 77 FERRAZ, Ângelo Muniz da Silva. In: VASCONCELOS, op. cit., p. 4. 123

relações amorosas. Em A Graça de Deus, duas moças representam posições e valores antagônicos: Chonchon busca o prazer e a fortuna, ao passo que Marie simboliza a inocência e a pureza feminina. Chonchon se transforma em cortesã, mantida pelo Comendador de Boisfleury, um sedutor sem escrúpulos, e Marie luta para se unir ao seu grande amor, o nobre André de Sivry, um jovem virtuoso. Chonchon antecede uma figura literária que passaria a ocupar o teatro e o romance realistas, como Marie Duplessis em A Dama das Camélias, de Dumas (filho), e Vatnaz em A Educação Sentimental, de Flaubert. No desfecho de A Graça de Deus, defende-se que a parceria entre a moral religiosa e os valores familiares seria a fórmula de sucesso para manter a pureza das donzelas e evitar que elas cedessem às tentações do submundo de seduções, prazeres e luxo. Só a pureza garantiria um casamento nos moldes burgueses, como é demonstrado pela trajetória de Marie. Àquelas que se deixavam seduzir pelos prazeres terrenos e adquiriam práticas de uma vida extravagante, como Chonchon, uma vez tomado esse caminho sem volta, estariam sentenciadas a permanecerem para sempre nessa situação, pois a mancha provocada na honra de uma mulher jamais se apagaria. Para a aprovação da representação da peça em período da Quaresma, o segundo censor exigiu a exclusão do trecho final de uma ária de Marie, na qual ela revela que seu coração, antes inteiramente dedicado à mãe, encontrava-se agora todo preenchido pela imagem de André; uma fala de Chonchon, na qual ela explicita sua necessidade de receber visitas de homens em sua casa, sobretudo, durante o inverno, quando fazia frio; e uma ária, uma copla e parte de um monólogo do Comendador de Boisfleury, nos quais o nobre traz à mostra, em tom de alegria, seu caráter inescrupuloso de sedutor e deflorador de donzelas.78 A edição impressa da tradução A Graça de Deus, publicada no Rio de Janeiro, em 1852, pela Tipografia Comercial de Soares & C., foi o texto encenado pela companhia de João Caetano. Na versão impressa, a ária de Marie, presente na sexta cena, do primeiro ato, foi corrigida segundo a orientação do censor João Antônio de Miranda, que exigiu a supressão da terceira e última quadra, restando as duas primeiras inalteradas.

ÁRIA Eu que junto a minha mãe Da mentira tinha medo, Hoje tenho p’ra com ela Dentro d’alma um segredo. Quando à noite junto dela Faço a minha oração, Outro nome sempre encontro

78 Ver anexo “Tabela 15 – Trechos Censurados de La Grâce de Dieu”. 124

Dentro do meu coração.79

Contudo, as outras exigências de supressões indicadas pelo censor não foram contempladas pela edição impressa. Isso nos permite cogitar duas hipóteses sobre a relação da censura do Conservatório Dramático Brasileiro com as atividades de tradução da dramaturgia francesa. Primeiro, poderia propor certa relativização do atendimento stricto sensu às recomendações de alterações exigidas pelos censores. Segundo, poderia revelar que, para a publicação das peças traduzidas, não se fazia necessário atender às exigências do Conservatório Dramático, que se restringiriam aos palcos. Avaliando a edição de A Graça de Deus, de 1852, constatamos que a tradução manteve inalteradas a galeria de personagens, as ações dramáticas e as rubricas do texto original. Porém, apagou o modo de falar provinciano, ainda que estereotipado, da personagem Pierrot, que se configura em um de seus expedientes cômicos de maior destaque, eliminando, assim, a distinção criada na peça original entre o falar de um nativo da Savoia e um parisiense. Os versos das árias e coplas mantiveram o canevas das canções originais, mas raramente reproduziram os esquemas de rima, muitas vezes alterados, simplificados ou suprimidos. Sabemos que as partituras originais das árias e coplas presentes em La Grâce de Dieu, executadas apenas na montagem oferecida pela companhia francesa no Teatro de São Januário, foram recriadas. Conforme revelou o cronista do periódico A Marmota na Corte, na montagem de Florindo Joaquim, no Teatro de São Francisco, “a orquestra teve alguns desvios, que só podem ser atribuídos a erros da cópia da partitura”.80 Já o acompanhamento musical da versão encenada por João Caetano foi recomposto pelo músico português Fernando de Sá Noronha.81

A Graça de Deus é por ventura um dos dramas do repertório francês que muito tem agradado, sempre que se representa em qualquer teatro, com muita concorrência e aplausos [...]. O Sr. João Caetano dos Santos, querendo descansar das tragédias, fê- lo traduzir em vulgar, e a entregou ao Sr. Noronha para a ornar de música, pois que, além daquela com que se representa no Teatro Francês, quis mais, e aquela a achou mesquinha para as situações. [...] O Sr. Noronha nada conservou da música antiga; e, ou porque assim o quisesse o tradutor, ou este de combinação com o compositor, o

79 DENNERY, Adolphe & LEMOINE, Gustave. A Graça de Deus: drama em cinco atos ornado de música. Rio de Janeiro: Typographia Commercial de Soares & C., 1852, p. 21. 80 C. Theatros. A Marmota na Corte, Rio de Janeiro, 22 abr. 1851, p. 2. 81 O português Fernando de Sá Noronha aportou no Rio de Janeiro nos anos 1840 para trabalhar como compositor e músico do Teatro de São Pedro de Alcântara. (Cf. A AURORA, Rio de Janeiro, 22 jun. 1851, p. 1-3). 125

certo é que ela tem muito mais música, e toda em situações admiravelmente adequada.82

A proposta de melhorias nas partituras, empreendida por Fernando de Sá Noronha, pode ter sido motivada pela coexistência nos palcos do Rio de Janeiro de La Grâce de Dieu e Linda di Chamounix (1842), sua adaptação operística realizada pelo libretista Gaetano Rossi e pelo compositor Gaetano Donizetti. Entre os anos 1850 e 1860, a ópera Linda de Chamounix ou a Graça de Deus – título que ganhou no Brasil – integrou, frequentemente, o repertório do Teatro Lírico Fluminense, sendo interpretada por cantoras líricas italianas, como Ida Edelvira e Anetta Casaloni. Acreditamos que a presença simultânea do melodrama e de sua versão operística estabeleceu um processo de simbiose entre as duas obras. A tradução A Graça de Deus, encenada por João Caetano, buscou se alimentar do prestígio da ópera junto aos diletantes fluminenses, o que teria motivado a reestruturação da parte musical da peça. Uma recriação que incrementava a partitura, muito provavelmente, objetivando uma aproximação com a vivacidade lírica dos duetos e árias da ópera de Donizetti, como “O luce di quest’anima”, que exprime o amor puro e fiel da personagem Linda pelo seu jovem amado. Da mesma maneira, as montagens da ópera, ao incluir o subtítulo A Graça de Deus nos anúncios de espetáculos, pretendiam fazer referência ao melodrama encenado com sucesso por João Caetano.

2.4.2 A autocensura do tradutor

Ao lado das diretivas da censura do Conservatório Dramático do Rio de Janeiro, a autocensura do tradutor também impactou na atividade de tradução do melodrama francês representado no Brasil. A tradução de La Dame de Saint-Tropez encenada por João Caetano revela que o ato de censura do próprio tradutor determinou o grau de fidelidade ao texto original. Uma primeira versão da peça, que desconhecemos, estreou no Teatro de São Pedro de Alcântara, em janeiro de 1846, sob o título O Marinheiro de São Tropez ou o Envenenamento, com o ator Francisco de Paula Dias no papel do protagonista. A peça foi avaliada pelo censor André Pereira Lima que, apesar de não ter vislumbrado mérito algum na composição, não encontrou motivos que impedissem a encenação e a aprovou sem a

82 J. Theatro de S. Francisco. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 11 fev. 1845, Correspondências, p. 3. 126

necessidade de qualquer modificação textual.83 João Caetano logo reconheceu o sucesso imediato da peça, que obteve reprises sucessivas naquele ano, e montou uma nova tradução no Teatro de São Francisco, em 9 de abril de 1847, com o título A Dama de Saint-Tropez.84 Ainda que a peça não apresentasse elementos, de acordo com o censor André Pereira Lima, que justificassem a interdição ou a exigência de modificações no texto segundo as normas da instituição censora, o tradutor da versão encenada por João Caetano decidiu eliminar e reduzir determinados trechos. Suprimiu uma longa fala de Hortense, na segunda cena, do primeiro ato, na qual a jovem afirma que, por mais que seu pai, o Conde d’Auberive, detivesse uma elevada posição social e uma grande fortuna, ela esperava que ele a deixasse ser a senhora na escolha de seu esposo. Hortense pretendia seguir seu coração e não as convenções sociais do casamento. Neste caso, o tradutor compreendeu que a fala de Hortense poderia abalar a soberania paterna na decisão do contrato de casamento das filhas. Também foi suprimida a declaração de amor de Hortense a Charles, que se segue no mesmo diálogo, no qual o casamento por amor é tido como importante pelas personagens, em detrimento do casamento por contrato, acertado pelas famílias dos consortes. O tradutor reduziu, consideravelmente, o diálogo entre Hortense e Pauline, na quarta cena, do primeiro ato, no qual Pauline revela que se casou com o velho notário, o senhor Langlois, porque ele possuía uma renda considerável. Essa alteração eliminou a comicidade, que explicita o interesse de Pauline, uma donzela de uma família nobre falida, em se casar com um pretendente rico, não importando a diferença de idade entre eles. A comicidade do trecho se constrói pela ambiguidade na resposta de Pauline, ao ser indagada por Hortense sobre a idade de seu esposo: “HORTENSE – Quel âge avait-il donc ?” A resposta da moça propõe um duplo entendimento, que pode ser a idade ou a renda do marido: “PAULINE – Cinquante... mille livres de rentes”. Pauline, diante da falência de sua família, abandona uma vida baseada na etiqueta da nobreza para se casar com um burguês enriquecido. Se antes, ela seria “marquise aux Ursulines”, tornou-se “reine... chez moi”. Os casamentos burgueses de Pauline e Hortense, duas jovens pertencentes a famílias nobres em bancarrota, representam a mudança sofrida pela nobreza francesa no final do século XVIII, época em que o enredo de A Dama de Saint-Tropez se situa, precisamente no ano de 1781.

83 Ver LIMA, André Pereira. In: ROMEIRO, José Antônio Thomas. Inspetor de cena do Teatro São Pedro d’Alcântara. Requerimento ao 1º secretário do Conservatório Dramático Brasileiro de exame censório para a peça: O marinheiro de Saint Tropez. Rio de Janeiro, 17 dez. 1845, p. 5-7. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 03, 054. 84 DENNERY, Adolphe & ANICET-BOURGEOIS, Auguste. A Dama de Saint-Tropez. Manuscrito, [s.d.]. (Cópia datilografada pertencente ao acervo da Sociedade Brasileira de Autores Teatrais – SBAT). 127

O tradutor optou por adotar um tom cauteloso ao tratar do tema principal da peça, o casamento por conveniência entre membros da nobreza falida e da burguesia enriquecida na França. Assim, além do apagamento da comicidade presente no diálogo entre as duas jovens, uma casada e a outra em vias de contrair matrimônio, a tradução silenciou a problemática em torno do tema do casamento por conveniência, que assumiu novas direções no contexto social francês pós-revolucionário.85 Les Deux Serruriers, peça de Félix Pyat, foi traduzida pelo maranhense Antônio Rego e representada pela trupe dirigida por Germano Francisco, no Teatro São Luiz, no Maranhão, em julho de 1853. Ainda que não tenha sido submetida à censura do Conservatório Dramático do Rio de Janeiro, a tradução, denominada Os Dois Serralheiros, revela as decisões do tradutor no sentido de amenizar as questões sociais suscitadas pelo texto original. Em Les Deux Serruriers, Félix Pyat ilustrou sua teoria da miséria, segundo a qual o povo seria vítima de uma outra fatalidade, não a divina, mas a provocada por deuses tão imperdoáveis como os do Olimpo, os ricos. As ações dramáticas constroem um ambiente de inferno social em torno da família de Samuel Davis, um ancião adoentado e endividado que vive na miséria com os dois filhos (George e Paul Davis) e uma neta, ainda bebê. O velho morre por falta de tratamento médico adequado; seus poucos bens são penhorados; o bebê falece de fome; Paul se alista em um regimento para poder quitar as dívidas da família; e George é tentado a cometer roubos diversas vezes por Burl, homem ambicioso e sem escrúpulos. A peça se estrutura a partir da luta entre o bem (representado pelo honrado e trabalhador George Davis) e o mal (encarnado por Burl e pelo banqueiro Murray). No desfecho, os corruptos Burl e Murray são punidos com a morte. A justiça é feita e o virtuoso George é absolvido da acusação de um crime que não havia cometido. Como recompensa, ele pode enfim se apoderar da herança à qual tinha direito legal. Uma vez reconhecida a sua honra, casa-se com a jovem que amava. Assim, ao recompensar o jovem trabalhador, que se mantém no caminho da virtude, Félix Pyat defendeu a moral do trabalho redentor, que “deve fornecer uma esperança para resolver o problema da necessidade tanto material quanto espiritual, e evitar a dominação do dinheiro que perverte os comportamentos humanos”.86 Quando redigiu Les Deux Serruriers, Félix Pyat já havia protagonizado embates com a censura francesa, que interditara trechos considerados licenciosos de outras peças de

85 Ver anexo “Tabela 16 – Supressões na Tradução de La Dame de Saint-Tropez”. 86 SABATIER, 1998, tome 1, p. 245. No original: “doit fournir un espoir pour résoudre le problème de la nécessité autant matérielle que spirituelle, et éviter l’emprise de l’argent qui dénature les comportements humains.” 128

sua autoria. Do novo drama, a censura exigiu diversas supressões parciais e integrais de diálogos e monólogos. Após as modificações, o discurso de crítica à miséria foi abrandado e quase eliminada a tensão social entre ricos (família do banqueiro Murray) e pobres (família de Samuel Davis). Félix Pyat demonstrava descontentamento com as decisões da censura teatral e a atacava publicamente, tanto na imprensa quanto nos preâmbulos de suas obras. No prefácio de Les Deux Serruriers, texto redigido em forma de comédia dialogada entre A Censura e O Autor, e encenado antes da peça no Théâtre de la Porte-Saint-Martin, o dramaturgo reafirmou seu posicionamento: “Eu disse e repito que o princípio da censura é um atentado ao direito natural e ao direito legal consagrado pela Constituição”.87 No mesmo ano de sua criação no palco, em 1841, foi publicada a versão original da peça, como compusera Félix Pyat e sem as intervenções da censura francesa. Porém, constatamos que não foi este o texto fonte adotado por Antônio Rego para a tradução. O maranhense traduziu a versão da coleção Le Magasin Théâtral, que imprimiu o texto encenado, ou seja, com as modificações exigidas pela censura. Mesmo tendo traduzido a versão emendada de Les Deux Serruriers, notamos ainda uma autocensura sutil do tradutor, que amenizou os vestígios de denúncia social remanescentes. Antônio Rego eliminou a palavra “faim” (fome) pronunciada por George (“GEORGE – [...] tu sens bien que je mourrais plutôt de faim que d’aller mendier près d’elle”88), omitindo, assim, a fome como a causa de sua possível morte (“GEORGE – [...] conheces que me seria mais fácil morrer do que ir mendigar-lhe alguma coisa”).89 No mesmo sentido, optou por traduzir “âmes d’élite” como “almas extremas”, transformando “élite” (sinônimo de “aristocratie”) em adjetivo (“extrema”), o que apagou a questão social suscitada pela personagem Rosalinde, que relembra o amante, de berço desconhecido, que o amor, leia- se o casamento, seria para a aristocracia “a mais alta das conveniências”. O amor, ou a união conjugal, é então retirado do campo social, convertendo-se em um valor de ordem moral, ou seja, “a mais sublime das conveniências” para as pessoas de “almas extremas”.

ROSALINDE (avec une impatience extrême) – Jamais, vous dis-je ! Songez, ami, que notre position est gênante, inconvenante, même, si pour les âmes d’élite, l’amour n’était pas la plus haute des convenances... mais enfin, mon frère pourrait s’apercevoir de notre liaison...90

87 PYAT, Félix. “Petite comédie avant le drame”. In: Les Deux Serruriers: drame en cinq actes. Paris: Au Répertoire Dramatique, 1841, p. iv. No original: “J’ai dit et je répète que le principe de la censure est un attentat au droit naturel et au droit légal consacré par la Constitution.” 88 Idem. Les Deux Serruriers: drame en cinq actes. Paris: impr. de Mme de Lacombe, [s.d.], p. 3. (Le Magasin Théâtral, édition conforme à la représentation). 89 Idem. Os Dois Serralheiros: drama em cinco atos. Tradução de Antônio Rego. Maranhão: [s.n.], 1853, p. 6. 90 Idem, [s.d.], p. 14. 129

ROSALINDA (com extrema impaciência) – Nunca, já vol’o disse! Lembrai-vos, meu caro, que a nossa posição é crítica, e até mesmo inconveniente se, para as almas extremas, não fosse o amor a mais sublime das conveniências...91

Antônio Rego atenuou sutilmente a tese da miséria como um mal social, engendrada pelas relações corruptas da própria sociedade, ao modificar parte de um monólogo de Samuel Davis, no qual o ancião vê a morte como a única saída para a fome e a orfandade da neta, ainda um bebê. Ao alterar a frase da personagem, traduzindo “de tous les maux de l’humanité !” como “de todos os males a que está exposta a triste humanidade”, o bebê desamparado, no lugar de ser uma vítima das relações sociais corruptas, seria nada mais que um exemplo dos desafortunados, suscetíveis aos infortúnios que tocariam igualmente toda “a triste humanidade”, sem exceção. Deixando de ser social, o sofrimento (fome, desamparo, vida precária) transfigura-se em um castigo de origem divina.

SAMUEL (seul) – [...] meure donc, pauvre fille, meure comme ta mère qui a emporté le lait pour te nourrir... Oui, heureux sont les morts ! Retourne donc à Dieu, lui dire que tu n’as pas pu rester plus longtemps sur cette terre, et que tu reviens t’abriter au ciel, de tous les maux de l’humanité !92

SAMUEL (só) – [...] morre portanto, mísera criança, morre como tua mãe que levou consigo o leite que te havia de alimentar... Sim, felizes são os que morrem! Volto portanto para Deus, a dizer-lhe que não pudeste ficar mais tempo nesta terra, e que voltas a abrigar-te no céu de todos os males a que está exposta a triste humanidade.93

Por que, então, traduzir o polêmico texto de Félix Pyat e ainda encená-lo? Apesar da questão central de Les Deux Serruriers tratar da miséria como produto social e não um castigo divino, tema atenuado pelas modificações impostas pela censura francesa, a peça propõe um ensinamento moral edificante no desfecho, ao defender o trabalho manual como redentor e condenar com a morte aqueles que cometeram crimes. Acreditamos que esse discurso moralizante e a justiça final, expediente do melodrama, tenham sido os polos de atração do tradutor, Antônio Rego, e do ator-diretor, Germano Francisco.

2.4.3 Construção lexical e semântica

Se, de um lado, o trabalho com a linguagem, a nível das escolhas lexicais, pode revelar a autocensura assumida pelo tradutor para amenizar a postura liberal ou socialista no

91 Idem, 1853, p. 34. 92 Idem, [s.d.], p. 6. 93 Idem, op. cit., p. 12. 130

discurso de alguma personagem, como vimos com o tratamento do tema da miséria em Os Dois Serralheiros, de outro lado, pode demonstrar também seu trabalho criativo, a fim de alcançar certa equivalência semântica em relação ao texto original. Isso pode ser verificado no uso de expressões populares pelos tradutores. Antônio Rego foi primoroso nesse ponto. Usou “sem tugir nem mugir” (sem reclamar, sem protestar, calado) para traduzir “sans souffler” (sem contar, sem confidenciar); “esticar a canela” como sinônimo de “morrer” (“mourir”); “dar com a língua nos dentes” (confidenciar algo que deveria ser mantido em segredo) no lugar da simples tradução de “parler”, em um contexto da peça no qual a personagem teme uma confissão; o provérbio “não há rosa sem espinhos” (tudo o que é belo ou bom traz algo indesejado) para a expressão francesa “il n’y a point d’orange sans écorce” (literalmente, “não há laranja sem casca”). Em A Gargalhada, o tradutor anônimo recorreu ao provérbio “Quem torto nasce, tarde, ou nunca se endireita” para traduzir “la garde meurt, elle ne se rend pas” (literalmente, “a guarda morre, não se rende”).94 Segundo a lenda, o General Pierre Cambronne, comandante da última infantaria de Napoleão Bonaparte em Waterloo, ao ter sido intimado a se render, teria respondido aos britânicos com a referida frase. Na peça, quem a profere é a personagem Léopold, que a emprega para explicitar a inalterabilidade de seu caráter ardiloso. O tradutor anônimo de A Graça de Deus optou pela expressão “de uma figa”, usada popularmente para manifestar irritação ou desprezo por alguém ou algo, para retratar o caráter abjeto do vilão, o inescrupuloso Comendador de Boisfleury, um sedutor de donzelas.95 A tradução de Trente Ans ou la Vie d’un Joueur, de Ducange, realizada no Rio de Janeiro pelo português Camilo José do Rosário Guedes, ilustra o impacto da escolha lexical do tradutor na construção dos sentidos, seja na caracterização das personagens, seja na amplificação dos sentimentos despertados pelos momentos patéticos do melodrama. Camilo Guedes, além de tradutor, compôs a farsa A Pateada, publicada em Lisboa, em 1816, e o drama O Dia de Júbilo para os Amantes da Liberdade ou a Queda do Tirano, editado no Rio de Janeiro, em 1831, após o retorno de D. Pedro I a Portugal, a quem a peça fazia alusão.96 Em 1822, transferiu-se de Lisboa ao Rio de Janeiro, onde desenvolveu atividades empresariais relacionadas ao teatro. Conforme averiguamos, Camilo Guedes foi “Sócio

94 Usamos como referências: ARAGO, Jacques & MARTIN, Alexandre. L’Éclat de Rire: drame en trois actes. Paris: Marchant, 1840, e ARAGO, Jacques & MARTIN, Alexandre. A Gargalhada. Rio de Janeiro: Oficina de escrituração de Carvalho Aguiar, 1864, (Cópia datilografada pertencente ao acervo da Sociedade Brasileira de Autores Teatrais – SBAT). 95 Ver anexo “Tabela 17 – Expressões Populares e a Tradução”. 96 Cf. SILVA, tomo II, 1859, p. 16 e tomo nono, segundo do suplemento C-G, 1870, p. 13-14. 131

Escritor Dramático”97 do Teatro da Praia de D. Manuel e administrador do Teatro de São Francisco, durante a década de 1840, quando João Caetano ali dirigiu uma companhia dramática. Em 1835, a tradução Trinta Anos ou a Vida de um Jogador, de Camilo Guedes, foi criada no Teatro da Praia de D. Manuel. Logo que João Caetano passou a representar este texto no Teatro Constitucional Fluminense, em 1836, os artistas portugueses adotaram outra tradução, realizada por Paula Brito, impressa em formato de folheto e vendida a um mil réis por sua livraria. Conforme Camilo Guedes revelou em correspondência publicada pelo Jornal do Commercio, a 14 de abril de 1836, sua tradução empreendeu alterações nas falas das personagens.98 A recriação das falas conferiu um tom ainda mais patético às cenas, uma vez que acentuou a sentimentalidade das personagens pelo uso de vocábulos inexistentes no original francês, tais como “monstro”, “malvados”, “coração” e “humanidade”. Na última fala da peça, proferida por Georges no terceiro ato, o tradutor acrescentou a condenação do vilão ao patíbulo, explicitando a punição por seus crimes. A verbalização de uma didascália da cena treze, do segundo ato, contribuiu também para acentuar a emoção. No texto original, o abraço dado por Amélie em seu filho era apenas uma ação descrita na didascália, que orientava a pantomima da atriz (“Elle l’embrasse avec transport”). Na tradução, a ação se transformou também em fala da personagem (“AMÉLIA – [...] querido filho, vem, vem a meus braços”).99

2.4.4 Verso e métrica: a tradução de Hernani

Após o drama Maria Tudor ter sido impedido de subir aos palcos do Rio de Janeiro pelo Conservatório Dramático Brasileiro, em 1844, o desejo de tentar encenar uma peça de Victor Hugo se tornou tarefa arriscada para as companhias dramáticas. Em julho de 1847, inclinado a montar Hernani, João Caetano consultou a opinião do Conservatório Dramático antes de encomendar a tradução da peça.

Sr. João Caetano dos Santos tendo muitos desejos de representar o drama Hernani, em português, e como ainda seja preciso traduzi-lo, e com receio que depois de traduzido seja impedido pelo Conservatório, por isso tenho a honra de enviar V. S. rogando da parte do mesmo Sr. V. S. o favor de submeter à censura o original para

97 GUEDES, Camilo José do Rosário. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 30 jan. 1835, Anúncios, p. 4. 98 Cf. Idem. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 14 abr. 1836, Correspondência, p. 3. 99 Ver anexo “Tabela 18 – A Tradução Trinta Anos ou a Vida de um Jogador”. 132

conforme o despacho mandar traduzi-lo para representá-lo pedindo V. S. toda a brevidade possível.100

Diogo de Bivar determinou “que pode mandar traduzir e que vindo a tradução à censura não haverá dúvida na licença”.101 A tradução foi então encomendada a Pinheiro Guimarães (pai), que já havia contribuído para o teatro com duas comédias originais, A Ciumenta e O Brasileiro em Lisboa, que estrearam no Teatro de São Pedro de Alcântara, em 1842. Traduziu também a tragédia La Pucelle d’Orléans (1762), de Voltaire, denominada A Donzela de Orleans, e o drama Sardanapalo (1821), de Byron, além de libretos de óperas italianas, especialmente os de Felice Romani, que estiveram em cartaz no Rio de Janeiro, durante a década de 1840, tais como Elixir de Amor (1832), do maestro Donizetti, e Norma (1831), de Bellini.102 Hernani é um drama histórico cujas ações se desenvolvem na Espanha, em 1519. A partir de um fio dramático amoroso e outro político, a peça trata do amor cortês e da sucessão régia no Império alemão. As ações, desenroladas em espaços lúgubres durante a noite – o que faz o drama beirar os cenários da literatura gótica –, são realizadas por personagens de ordens sociais diferentes: rei, cortesãos com títulos de nobreza, soldados, criados, bandidos e o povo. A peça faz uso de recursos provenientes da tradição farsesca, tais como o esconderijo, o disfarce e a omissão de identidade, que provocam quiproquós, e da tradição do melodrama, como os coups de théâtre e o reconhecimento, que ocasionam reviravoltas na linha progressiva da ação. No desfecho, D. Carlos é declarado Imperador e a verdadeira identidade do bandido Hernani é revelada: ele é o duque João de Aragão, um membro da nobreza, o que possibilita seu casamento com Doña Sol. O desenlace do fio amoroso de Hernani é anti-providencial e pessimista, como via de regra no drama romântico. A morte trágica no último ato se evidencia como a única solução para o nó da intriga. Don Ruy vê seus objetivos malogrados com as bodas de Hernani e Doña Sol. No dia do casamento, vem cobrar de Hernani a prerrogativa que este lhe dera de possuir sua vida, tendo em vista que o salvara de D. Carlos em ocasião passada. D. Ruy oferece a Hernani o veneno que extinguiria sua vida. Em um final inspirado na morte trágica de Romeu e Julieta, de Shakespeare, Doña Sol bebe do veneno de Hernani. Entre juras de

100 REIS, Carlos José dos. In: ROMEIRO, José Antônio Thomas. Inspetor de cena do Teatro São Pedro d’Alcântara. Requerimento ao 1º secretário do Conservatório Dramático Brasileiro solicitando exame censório do folheto da ópera Hernani. Rio de Janeiro, 27 maio 1846, p. 4. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 04, 020. 101 BIVAR. In: Ibidem. 102 Cf. BLAKE, vol. 3, 1970, p. 11-12. 133

amor, os dois amantes agonizam até o último suspiro. Ao presenciar o desenlace trágico que provocou, Don Ruy comete suicídio. No mesmo ano da montagem de Hernani por João Caetano, em 1848, a primeira edição da tradução de Pinheiro Guimarães saiu à luz. Em crítica literária sobre a obra, Gonçalves Dias se esquivou do trabalho de cotejo do texto traduzido com o original francês. O poeta se isentou da tarefa de avaliar se a tradução era “literal ou em que se afasta da letra, nem se tal ou tal pensamento do autor foi bem compreendido pelo tradutor, nem se tal frase corresponde a tal outra, nem se o verso português tem a mesma harmonia, a mesma força, a mesma expressão do original”.103 Gonçalves Dias propôs uma definição do drama, a partir das ideias que já expusera no prólogo a Leonor de Mendonça (1846): o drama seria o resultado da junção da tragédia com a comédia; a quebra com a gravidade trágica se daria nas cenas domésticas que retratam a vida íntima e familiar, um expediente proveniente da comédia. O poeta e dramaturgo brasileiro acreditava que Shakespeare “inventou o drama descrevendo fielmente a vida”104, e que, em termos formais, a inovação do bardo inglês consistia no uso simultâneo da prosa e do verso. Para Gonçalves Dias, a tradução do “corajoso” Pinheiro Guimarães seria um exemplo de inovação na linguagem do drama, na medida em que o tradutor mesclou a métrica do verso heroico, da redondilha maior e menor, para melhor atender aos efeitos de sentimentos. No entanto, acreditamos que, em termos da construção dos versos, a inovação custou ao texto traduzido certo distanciamento da linguagem poética do Hernani original. Apesar de ter estabelecido uma tradução que manteve a estrutura formal em versos, e que deixou intocáveis as ações dramáticas, a galeria de personagens, o tempo noturno e o espaço gótico, o tradutor brasileiro ignorou a complexa construção dos versos de Victor Hugo. Em alguns momentos de Hernani, o poeta francês abandonou o alexandrino clássico de ritmo binário (acentuação forte na sexta e na décima segunda sílabas), pelo alexandrino de ritmo ternário (acentuação forte na quarta, oitava e décima segunda sílabas), adotando os enjambements que abalam a harmonia fônica. Essa construção foi ignorada por Pinheiro Guimarães, que recorreu a inversões, reformulou os enjambements e suprimiu os versos alexandrinos e as rimas paralelas. A desconstrução dos alexandrinos franceses também se verifica na tradução do Othelo de Ducis, realizada por Gonçalves de Magalhães, que trocou

103 DIAS, Gonçalves. “Correio da Tarde, 21 jul. 1848”. In: GIRON, 2013, p. 406. 104 Idem. “Prólogo”. In: Obras Posthumas de A. Gonçalves Dias: precedidas de uma noticia da sua vida e obras pelo dr. Antonio Henriques Leal. Vol. 5. São Luís: Bellarmino de Mattos, 1868, p. 17. 134

os versos de ritmo clássico do original por decassílabos, estrutura poética que empregaria em suas tragédias Antonio José ou o Poeta e a Inquisição e Olgiato. Como resultado, a tradução de Pinheiro Guimarães provocou a simplificação da construção lírica de Hernani, a perda de musicalidade e a sensação de esvaziamento das imagens poéticas. Apesar dos elogios e do status de inovador conferido ao tradutor, Gonçalves Dias não deixou de notar que o desprezo da rima comprometia o lirismo, “toda a delicadeza, todo o requinte” de Hernani, principalmente nas cenas “tão delicadas e mimosas” de Hernani e Doña Sol, “que parecem incompletas se não rimadas”.105 A tradução de um diálogo entre os dois amantes, presente na segunda cena, do primeiro ato, ilustra a palidez lírica descrita por Gonçalves Dias.

DOÑA SOL Nous partirons demain. Hernani, n’allez pas sur mon audace étrange Me blâmer. Êtes-vous mon démon ou mon ange ? Je ne sais, mais je suis votre esclave. Écoutez, Allez où vous voudrez, j’irai. Restez, partez, Je suis à vous. Pourquoi fais-je ainsi ? Je l’ignore. J’ai besoin de vous voir, et de vous voir encore, Et de vous voir toujours. Quand le bruit de vos pas S’efface, alors je crois que mon cœur ne bat pas ; Vous me manquez, je suis absente de moi-même ; Mais dès qu’enfin ce pas que j’attends et que j’aime Vient frapper mon oreille, alors il me souvient Que je vis, et je sens mon âme qui revient !106

D. SOL Amanhã nós partiremos. Não estranhes minha audácia, Hernani, pois nem sei mesmo Se és meu anjo ou meu demônio; Só sei que sou tua escrava; Parte ou fica, eis-me a teu lado. Desejo só te estar vendo; Nunca estou farta de olhar-te. Quando me deixas, que cesso De ouvir as tuas pisadas, Meu coração não palpita. Se me faltas, me parece Que de mim mesma me ausento; Mas dês que sinto teus passos, Logo me lembro que existo, E me vem voltando a vida.107

105 Idem. In: GIRON, 2013, p. 409. 106 HUGO, Victor. Hernani ou l’Honneur Castillan. Paris: Barba, 1830, p. 12-13. 107 Idem. “Hernani ou a Honra dos Castelhanos”. In: GUIMARÃES, Francisco José Pinheiro. Traducções Poéticas de Francisco José Pinheiro Guimarães. Childe Harold e Sardanapalo, de Lord Byron, O Roubo da Madexa, de Pope, Hernani, de Victor Hugo. Rio de Janeiro: Typographia Universal de Laemmert, 1863, p. 485. 135

A construção poética que Pinheiro Guimarães empreendeu na tradução de Hernani, compreendida como inovação por Gonçalves Dias, foi avaliada como defeituosa por Machado de Assis, em 1863, quando a peça foi republicada no volume póstumo Traduções Poéticas de Francisco José Pinheiro Guimarães. Para Machado de Assis, os empregos de “uma locução menos branda” e de “um verso menos correto”108 eram os defeitos do tradutor, que seriam provenientes de sua falta de lima com a poesia, segundo revelação de Francisco Octaviano no prefácio da referida obra. A representação de Hernani, em 1848, ocorreu dois anos após a criação da adaptação operística Ernani, libreto de Francesco Maria Piave e música de Verdi, que estreara no Teatro de São Pedro de Alcântara, em junho de 1846. O drama obteve algumas reprises em 1848 e, depois, foi relegado ao esquecimento, ao passo que a ópera foi encenada repetidamente. A partir do levantamento que realizamos nos anúncios de espetáculos presentes em periódicos do Rio de Janeiro, verificamos que a ópera Ernani foi representada com frequência de 1846 a 1850, no Teatro de São Pedro de Alcântara, e de 1853 a 1859, no Teatro Lírico Fluminense. Ademais, árias e cavatinas da ópera recheavam, por vezes, os programas dramáticos oferecidos pelo Teatro de São Pedro de Alcântara. Dois fatores podem ter levado a ópera de Verdi a suplantar o drama de Victor Hugo nos palcos do Rio de Janeiro. Primeiro, o desfecho atenuante apresentado pelo libreto de Piave, que resguardou a vida de Elvira (denominação na ópera da personagem Doña Sol) e, assim, diminuiu o tom frenético das três mortes no final do texto original. Segundo, e mais importante, a união estabelecida entre o gosto do público fluminense pelo canto lírico e a manutenção do lirismo dos versos de Victor Hugo na ópera; lirismo que, de acordo com as impressões de Gonçalves Dias, havia se empalidecido na tradução de Pinheiro Guimarães.

2.5 A realização cênica

Elementos da mise en scène, como figurinos, cenários e maquinismos, descritos nas rubricas das peças publicadas nas coleções teatrais francesas, nem sempre eram seguidos à risca pelos ensaiadores brasileiros. Diante da condição financeira de seus teatros, eles recorriam a alternativas cênicas que simplificavam os efeitos espetaculares recomendados pelos autores ou reciclavam figurinos e cenários de outras montagens.

108 ASSIS, Machado de. Chronica. O Futuro, Rio de Janeiro, 15 fev. 1863, p. 372. 136

As peças, principalmente as de tema histórico, cujas ações eram ambientadas na Europa em épocas que compreendiam o período que vai do Renascimento à Revolução Francesa, exigiam grandes investimentos dos empresários e a criatividade dos ensaiadores para o preparo dos figurinos e cenários compatíveis ao tempo e espaço. Percebemos que, frequentemente, não se fabricavam vestuários e pinturas específicos a cada peça. A reutilização de materiais que, muitas vezes, comprometiam a ilusão teatral, provocando anacronismos, foi prática constante na mise en scène das obras francesas. Em abril de 1851, João Caetano foi o protagonista e o ensaiador da montagem de O Cavaleiro da Maison Rouge, tradução assinada por José Joaquim Vieira Souto do drama Le Chevalier de Maison Rouge, de Dumas (pai). A peça, estruturada em uma dezena de quadros, demandava doze modificações de cenários, sendo nove diferentes, e apresentava cenas militares movimentadas. Encenar o drama de Dumas (pai) requeria forte empenho do ator- ensaiador que, “reconhecendo o interesse e desenvolvimento cênico que ele exige, fá-lo subir à cena com todo o aparato, ornando-o nas situações competentes de grande número de tropa, generais e estado-maior a cavalo, e um parque de artilharia”.109 Assim informava o anúncio que divulgava a estreia de O Cavaleiro da Maison Rouge no Teatro de São Pedro de Alcântara. Ciente das dificuldades que a representação de tal drama impunha àquele que se propusesse a encená-lo, o cronista de A Marmota na Corte, assinado por C., ansioso pela criação da obra por João Caetano, indagou-se: “Para este drama ainda serão aproveitados os velhos trapos do teatro de S. Januário? E as sujas vistas dos Mistérios de Paris, do Trapeiro, e dos Ciganos? Será isto uma miséria”.110 De acordo com as impressões do mesmo cronista, a montagem de O Cavaleiro da Maison Rouge foi um fiasco, pois não teria atendido fielmente aos elementos necessários à mise en scène da obra. O figurino e os cenários eram remanescentes de outras montagens, portanto, nada condizentes com o contexto das ações do drama de Dumas (pai). C. estranhou o uso de uma pele de quati-mundéu pelo ator português Antônio José Areias (1819-1892). Ora, na época dos Girondinos era comum o uso desse tipo de pele? De modo irônico, o cronista declarou o sepultamento da peça. De fato, C. foi eficiente na previsão do futuro de O Cavaleiro da Maison Rouge no palco do Teatro de São Pedro de Alcântara. A obra logo saiu de cartaz e não reapareceu no repertório de João Caetano.

109 THEATRO de S. Pedro de Alcântara. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 25 abr. 1851, Espetáculos, p. 4. 110 C. Theatros. A Marmota na Corte, Rio de Janeiro, 22 abr. 1851, p. 2. 137

Passando a este mesmo teatro, o que diremos de bom? Só temos a noticiar o aparecimento do Maison Rouge. Rouge? Pas de tout! Noir, noir... comme la mort! Muito teríamos que dizer sobre a tradução, a pele de quati-mundéu (abundante em França na época dos Girondinos!) que figurava na cabeça do Sr. Areias; os trapos de S. Januário, pobres vistas escapas ao dilúvio; parques de duas peças, e cavalos a propósito, etc., com que mimosearam os pacientes espectadores até duas horas da noite. Mas, nada diremos, porque nunca atacamos defuntos. Enfim, Sr. Manoel Soares, mande passar a ordem de sepulte-se ao Maison Rouge!111

Sobre o texto encenado, C. afirmou que “muito teríamos que dizer sobre a tradução”, mas não o fez em sua crônica. Se o tivesse feito, conheceríamos melhor, mesmo que indiretamente, a tradução de Vieira Souto que, ao que tudo indica, não foi publicada, apenas encenada. Assim que João Caetano deu por encerradas as representações dessa peça, a tradução se esvaneceu. Outra sorte conheceu a tradução O Cavaleiro da Casa Vermelha, realizada no Maranhão, em 1853, por Antônio Rego. A tradução foi publicada na coleção teatral Bibliotheca Dramática, organizada pelo próprio tradutor, embora, aparentemente, não tenha sido montada. Sobreviveu como prática de leitura e não como manifestação dos palcos. O texto de Antônio Rego circulou no Rio de Janeiro por meio da comercialização do livreiro B. L. Garnier e como obra integrante do catálogo dos livros do Real Gabinete Português de Leitura.112 A primeira montagem de Trinta Anos ou a Vida de um Jogador, de Ducange, no Teatro da Praia de D. Manuel, modificou dois quadros da peça original, que exigiam investimentos da companhia na confecção de adereços para representar um baile mascarado e de maquinismos que recriassem um incêndio no palco. A décima primeira cena, da segunda jornada, que representa sem diálogos, apenas com música e pantomimas dos atores, um baile mascarado no salão da casa de Amélie, foi integralmente suprimida. Uma extensa rubrica de Ducange descreve um processo complexo de mudança de cenário para se realizar o baile em um salão ricamente ornado, transformado, logo em seguida, nos aposentos de Amélie. A última cena desse melodrama, essencialmente espetacular, ao inscrever as ações durante uma tempestade e um incêndio em um casebre, foi recriada de modo a eliminar o incêndio que é, justamente, a causa da morte do protagonista e do vilão. Em abril de 1836, João Caetano preparou uma nova montagem dessa peça no Teatro Constitucional Fluminense. Representou a versão completa da tradução de Camilo

111 C. A Marmota na Corte, Rio de Janeiro, 29 abr. 1851, Theatros, p. 1. 112 Ver CATÁLOGO da Livraria de B. L. Garnier n. 23 – Obras Principais. Rio de Janeiro: Typ. de Simon e Comp., 1864, p. 28, EXTRACTO do Catálogo da Livraria de B. L. Garnier. Rio de Janeiro: 1865, p. 2, e CATÁLOGO Suplementar dos Livros do Gabinete Português de Leitura no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Perseverança, 1868, p. 351. 138

Guedes, inclusive “a brilhante cena do baile mascarado”113 e o incêndio no casebre, quadros que haviam sido omitidos na montagem do Teatro da Praia de D. Manuel.

Domingo 24 do corrente subirá à cena a tradução muito interessante do drama Trinta Anos ou a Vida de um Jogador, que primeiramente se representou no Teatro da Praia de D. Manuel com geral aplauso. Este excelente drama será agora desempenhado com toda a pompa que lhe é análoga. No segundo ato, terá lugar um aparatoso baile; e a cena final, onde haverá o incêndio, é inteiramente nova.114

Além das questões materiais concernentes à realização cênica, o processo de tradução da dramaturgia francesa também esteve condicionado a fatores inerentes às carreiras artísticas dos primeiros atores. As traduções de Kean e A Gargalhada, peças representadas por João Caetano, são dois exemplos concretos para compreendermos a dimensão desse fenômeno. Se as principais personagens desempenhadas em Paris pelo ator Frédérick Lemaître foram projetadas em João Caetano, podemos também afirmar que o inverso é verdadeiro, ou seja, que as características artísticas do ator brasileiro se projetaram em um dos papéis que encarnou, o do artista inglês Edmund Kean, da obra de Dumas (pai). Segundo o parecer de José Rufino Rodrigues de Vasconcelos, primeiro secretário e censor do Conservatório Dramático Brasileiro, a tradução de Kean modificou a cena nove, do quarto ato, do texto original. Nesse momento da ação dramática, Kean representa em um teatro londrino a cena do adeus da tragédia Romeu e Julieta de Shakespeare.

SCÈNE IX ROMEO, à la porte d’un donjon gothique qui donne sur une terrasse, JULIETTE, sur le dernier escalier du donjon. LA COMTESSE DE KOEFELD, LE PRINCE DE GALLES, LE COMTE, dans une loge d’avant-scène ; LORD MEWIL, dans une loge de côté, LA NOURRICE, SALOMON.

JULIETTE Ne tourne pas les yeux vers l’horizon vermeil, Tu peux rester encore, ce n’est point le soleil, C’était le rossignol et non pas l’alouette Dont le chant a frappé ton oreille inquiète ; Caché dans les rameaux d’un grenadier en fleurs, Toute la nuit là-bas il chante ses douleurs... Tu peux rester encore, crois-en ta Juliette.

ROMEO Oh ! C’est bien le soleil, et c’est bien l’alouette ! Vois ce trait lumineux de mon bonheur jaloux, Qui perce à l’horizon et s’étend jusqu’à nous ; Vois le matin riant un pied sur la montagne,

113 O AMANTE de Theatro. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 23 abr. 1836, p. 3. 114 THEATRO Constitucional Fluminense. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 21 abr. 1836, p. 2. 139

Prêt à prendre son vol à travers la campagne ; Vois au ciel moins obscur les étoiles pâlir, Il faut partir et vivre, ou rester et mourir...115

O censor afirmou que a tradução brasileira substituiu a referida cena de Romeu e Julieta por uma das cenas de Othelo, porém, sem identificá-la: “E a linda cena 9ª do 4º ato de Julieta e Romeo foi transferida em uma das cenas de Othelo, e tudo por inferência do tradutor”.116 Ora, como vimos, João Caetano foi um grande intérprete do mouro de Veneza de Shakespeare, na versão edulcorada de Ducis. Nesse caso, o tradutor modificou o texto fonte para adequá-lo ao repertório do ator, uma vez que não encontramos indícios de que João Caetano tenha representado Romeu e Julieta. O tradutor preferiu apropriar-se da relação do ator com Othelo, uma simbiose ator-personagem (re)conhecida e apreciada pelo público do Rio de Janeiro. O melodrama L’Éclat de Rire, de Jacques Arago, também foi traduzido de modo a ser acomodado ao jogo cênico de João Caetano. A obra foi representada pela primeira vez com o título A Gargalhada ou o Ladrão Honrado no Teatro de São Pedro de Alcântara, em fevereiro de 1843, pela companhia dramática espanhola do ator D. José de La Puerta, em turnê no Rio de Janeiro.117 Após a criação da versão espanhola, João Caetano montou a peça em português. A estreia ocorreu no Teatro de São Francisco, em maio de 1843. A tradução encenada por João Caetano é razoavelmente fiel ao texto fonte. Manteve intactas as ações, a galeria de personagens e as rubricas de tempo e de espaço. No entanto, eliminou integralmente três cenas de transição do terceiro ato (cenas 2, 3 e 11). Essas supressões parecem ter sido a causa da ressalva do censor André Pereira Lima, do Conservatório Dramático Brasileiro, quando este leu a tradução para emitir seu parecer: “a linguagem da tradução me parece muito chegada aos destramas do original estrangeiro, o que seria bom remediar”.118 Essas cenas não interferem diretamente na progressão do fio principal da ação. Juntamente com as tiradas e os comentários maliciosos proferidos por uma criada, Madeleine,

115 DUMAS, Alexandre. Kean ou Désordre et Génie: comédie en cinq actes mêlée de chants. Paris: Marchant, 1836, p. 29. (Le Magasin Théâtral). 116 VASCONCELOS, José Rufino Rodrigues de. 1º secretário do Conservatório Dramático Brasileiro. Designação do 1º secretário do Conservatório Dramático Brasileiro ao próprio, para examinar a peça: Kean ou desordem e gênio, a ser encenada no Teatro São Francisco. Rio de Janeiro, 20 ago. 1844, p. 1-2. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 02, 007. 117 Cf. THEATRO de S. Pedro de Alcântara. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 20 fev. 1843, p. 3. 118 LIMA, André Pereira. “Parecer A Gargalhada”. In: VASCONCELOS, José Rufino Rodrigues. 1º secretário do Conservatório Dramático Brasileiro. Encaminhamento do 1º secretário do Conservatório Dramático Brasileiro de pedido de exames censórios das peças: A Gargalhada e Luiza de Lignerolles, por parte do Teatro de São Francisco. Rio de Janeiro, 20 abr. 1844, p. 2. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 01, 027. 140

e por um galanteador, Léopold, são as passagens mais cômicas da peça. Jacques Arago, como bom vaudevilliste e mal experimentado na composição de melodramas – redigiu apenas três peças sérias119 –, realizou uma junção dissonante de expedientes dos dois gêneros. Tendo em vista que não pretendia parodiar o melodrama, já que a peça é providencial e o desfecho moralizante, as tiradas cômicas sem freio de Madeleine e Leópold comprometem a intensidade dos momentos patéticos, os quais, como sabemos, eram estimados pelo jogo cênico de João Caetano. Desse modo, a eliminação das cenas cômicas na tradução fazia prevalecer os momentos de arrebatamento, dando maior destaque às gargalhadas lancinantes de André, papel desempenhado por João Caetano. A descrição desses processos de supressões, inclusões, substituições e reduções, em diferentes medidas, permite corroborar a tese de Christine Zurbach, segundo a qual “o texto traduzido é objecto de um processo de inserção numa área da vida cultural da sociedade de recepção cuja autonomia é condicionada por numerosos factores”120, sobretudo, de ordem política e econômica, variáveis de acordo com as circunstâncias. Nesse sentido, verificamos que a prática de tradução dos melodramas franceses para a realização cênica no Brasil acomodou as peças originais segundo a moral, a política e as condições materiais dos teatros e das companhias do contexto de recepção. A fidelidade da tradução variava na razão inversamente proporcional ao grau de moralização do texto francês. Ou seja, era menos fiel quanto mais licencioso fosse o texto fonte. Os trechos que poderiam provocar polêmicas eram atenuados ou simplesmente suprimidos, a fim de atender ao conjunto de orientações da censura. Assim, podemos repensar a ideia de que o melodrama francês teria obtido ampla aceitação no Brasil em função da extrema semelhança dessas “duas sociedades em crise”.121 Tendo em vista o conceito de transferência cultural, como proposto por Michel Espagne e Michaël Werner122, parte-se do princípio de que “toda passagem de um objeto cultural de um contexto a um outro tem por consequência uma transformação de seu sentido, uma dinâmica

119 Além de L’Éclat de Rire, Jacques Arago compôs o melodrama em três atos André Chénier (TG, 1833) e o drama histórico em cinco atos David Rizzio ou la Reine et le Musicien (TG, 1838). As informações sobre as obras dramáticas de Jacques Arago foram consultadas no seguinte dossiê: Cote 8-RF-21194 – Recueil factice d’articles concernant la vie et les œuvres de Jacques Arago, Collection Auguste Rondel, Bibliothèque des Arts du Spectacle, BNF – Richelieu. Consultamos também o index de autores e obras preparado por Charles Beaumont Wicks. Ver WICKS, Charles Beaumont. The Parisian Stage. Part III, 1831-1850. Alabama: University of Alabama Press, 1961, passim. 120 ZURBACH, 2007, p. 23. 121 BRAGA, Claudia. O melodrama francês no Brasil: tradução e recepção. Memória ABRACE X – Anais do IV Congresso de Pesquisa e Pós-Graduação em Artes Cênicas, Rio de Janeiro, vol. 1, n.10, 2006, p. 24. 122 ESPAGNE, Michel & WERNER, Michaël. La construction d’une référence culturelle allemande en France: genèse et histoire (1750-1914). Annales. Histoire, Sciences Sociales, 42e année, n. 4, p. 969-992, jui.-août/1987. 141

de resemantização”.123 Vimos, a partir das traduções, que o melodrama foi apropriado pelos palcos brasileiros, ressignificado de acordo com as circunstâncias locais concernentes à arte dramática, tais como os aspectos materiais e financeiros dos teatros e das trupes, a concorrência estabelecida entre os primeiros atores e os procedimentos praticados por uma instituição censora.

* * *

123 ESPAGNE, Michel. La notion de transfert culturel. Revue Sciences/Lettres, n. 1, 2013, p. 1. Disponível em: . Acesso em: 30 set. 2016. No original: “Tout passage d’un objet culturel d’un contexte dans un autre a pour conséquence une transformation de son sens, une dynamique de resémantisation.”

CAPÍTULO 3

CIRCULAÇÃO E DISPUTAS

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3.1 A circulação dos atores-empresários

Em julho de 1860, o periódico O Brado do Sul, de Pelotas, anunciou com entusiasmo que, brevemente, a companhia dramática dirigida pelo ator Germano Francisco realizaria uma temporada de espetáculos na cidade. A notícia trazia informações sobre a carreira do artista e destacava os seus trabalhos em teatros do Rio de Janeiro e do Norte do Brasil.

O Sr. Germano, este artista cheio de glória e talento, não só trabalha há anos na Corte e Norte do Império, onde é sempre de novo vitoriado, mas também se fez admirar na velha Europa, onde o ilustrado público das principais cidades de Portugal, Lisboa e Porto, o admirou e vitoriou. [...] A companhia deve achar-se nesta cidade no fim do presente mês de julho, sendo com impaciência esperada pelo público, não duvidamos de que ela seja bem recebida e generosamente acolhida pelos ilustrados diletantes pelotenses. Quanto a nós, desde já pomos ao dispor do Sr. Germano os nossos tênues serviços, comprometendo-nos a dar conta dos seus trabalhos em revistas teatrais.1

As temporadas dos artistas nas províncias brasileiras se tornaram uma oportunidade atraente de trabalho no século XIX, tendo em vista a construção de novas salas de espetáculos que substituíam as antigas casas de óperas, e as subvenções oferecidas pelos governos provinciais para atrair as companhias dramáticas do Rio de Janeiro e da Europa. A atividade teatral nas capitais das províncias brasileiras florescia graças à renda advinda da produção e comercialização de produtos primários de cada região: a economia do charque no Rio Grande do Sul, do açúcar na Bahia, do algodão no Ceará etc. Os artistas puderam circular mais facilmente pelo território litorâneo brasileiro, devido ao desenvolvimento da navegação a vapor. A Companhia Brasileira de Paquetes a Vapor, fundada em 1837, a fim de possibilitar o transporte rápido de mercadorias e pessoas e de garantir a unidade do vasto território, estremecido pelas revoltas nas províncias, possuía linhas costeiras que interligavam Belém do Pará ao Rio Grande do Sul, com pontos de paradas em portos no Maranhão, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina.2

1 CORRESPONDÊNCIA Teatral. O Brado do Sul, Pelotas, 1 jul. 1860, Noticiário, p. 1. 2 Sobre a Companhia Brasileira de Paquetes a Vapor, ver EL-KAREH, Almir Chaiban. A Companhia Brasileira de Paquetes a Vapor e a centralidade do poder monárquico. História Econômica & História de Empresas, vol. 5, n. 2, p. 7-27, 2002. Disponível em: Acesso em: 14 ago. 2015.

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João Caetano usufruiu da imagem de gênio artístico de renome nacional, o ator subvencionado pelo Império. Fixou-se no Rio de Janeiro como primeiro ator, ensaiador e administrador de companhias dramáticas financeiramente estáveis. Realizou curtas temporadas de espetáculos na Bahia (Teatro de São João, em 1849), Rio Grande do Sul (Teatro Sete de Setembro, em Rio Grande, e Teatro Sete de Abril, em Pelotas, em 1854), Santa Catarina (Teatro de São Pedro de Alcântara, em 1854) e Pernambuco (Teatro de Santa Isabel, em 1857). A dominância de João Caetano na cena teatral do Rio de Janeiro obrigou os primeiros atores que ambicionavam a direção de companhias dramáticas a buscarem outros caminhos para se firmarem em um campo teatral ainda não autônomo. Cada artista se distinguiu de modo a apresentar um perfil específico de ator-diretor a explorar suas empresas teatrais. Germano Francisco circulou extensivamente pelo território brasileiro. Por duas décadas, fez o principal percurso da rota dos barcos a vapor, passando pelas principais cidades das províncias do Norte, tais como Salvador, Recife, Fortaleza, São Luís, Belém, e também do Sul, como Pelotas, Rio Grande e Porto Alegre. Florindo Joaquim não encontrou meios de manter uma companhia dramática permanente no Rio de Janeiro que fizesse concorrência ao Teatro de São Pedro de Alcântara. O artista conseguiu maior autonomia artística como primeiro ator das companhias dramáticas nas quais atuou no Rio Grande do Sul, durante a temporada itinerante pelos palcos de Rio Grande, Pelotas e Porto Alegre, entre 1853 e 1856. Joaquim Augusto, reconhecido pelo público carioca desde a década de 1850, obteve melhores êxitos empresariais em São Paulo, onde dirigiu companhias dramáticas nas décadas de 1850 e de 1860. As iniciativas de concorrência empreendidas por Germano Francisco, Florindo Joaquim e Joaquim Augusto, tanto no Rio de Janeiro quanto nas províncias, intentaram reconfigurar a cena econômica da atividade teatral. Apesar de terem traçado percursos distintos pelo Brasil, esses artistas se aproximaram pelo repertório comum de melodramas e pela percepção de que as capitais das províncias ofereciam um nicho de trabalho atraente.

3.2 As temporadas de João Caetano nas províncias

Nas temporadas de espetáculos que João Caetano ofereceu nas províncias do Norte e do Sul do Império, encenou os títulos de sucesso de seu repertório. Suas turnês pelas

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principais capitais das regiões brasileiras cumpriram, além de um papel artístico de difusão da arte dramática, uma missão política de fortalecimento da unidade nacional, uma vez que João Caetano representava, na época, a imagem de ator pioneiro, fundador do teatro brasileiro. A primeira temporada de espetáculos que realizou fora dos limites da Corte ocorreu na Bahia, em 1849. Assim que pisou o solo baiano, João Caetano fez publicar no periódico A Marmota o poema “Saudação ao ilustre povo baiano”, um cartão de visita ao público da Bahia. Os versos apresentavam o artista e seu amor pela arte da cena (“Hoje meu coração é da minha arte; / É da glória dos meus, e de mim próprio. / Oh! A Cena! É a bela que idolatro, / Dama de meus amores extremosos!”), revelavam que as personagens que criara nos palcos estavam nele encarnadas, de modo a se criar uma persona de exaltados sentimentos e bravura (“No meio de meu sono ardendo em zelos / Otelo enfurecido eu me exaspero... / Ergo a destra... assassino a fida esposa... / Vou ferir-me também... e enfim desperto”) e reforçavam as ideias de pátria e de identidade nacional, personificadas no ator, a estrela do teatro brasileiro (“Eis-me enfim ante vós, nobres Baianos, / A pátria nos irmana: a vós me devo. / Dos protetores meus o mesmo título / Vós o tendes também, sois Brasileiros”).3 A presença de João Caetano no Teatro de São João4, casa de espetáculos pública de Salvador, despertou ampla discussão na imprensa pelos críticos e espectadores baianos. Corria-se o boato de que o artista viera “buscar dinheiro para levar para o Rio de Janeiro”.5 A especulação se justificava, uma vez que, como verificamos, os espetáculos que contavam com a atuação do artista fluminense tiveram os preços dos bilhetes de plateia inflacionados, passando de 1 mil para 2 mil réis cada6, refletindo assim a dinâmica econômica em torno das estrelas teatrais. A imprensa baiana louvou o talento do afamado artista. Os elogios provieram, sobretudo, das manifestações de espectadores anônimos. A atuação de João Caetano em Othelo ou o Mouro de Veneza foi enaltecida por um espectador, que fez publicar suas

3 SANTOS, João Caetano dos. “Saudação ao ilustre povo baiano pelo artista João Caetano dos Santos”. A Marmota, Salvador, 6 jun. 1849, p. 3. 4 O Teatro de São João foi idealizado por D. João de Saldanha da Gama e Melo e Torres Guedes de Brito, 52º Governador Régio da Bahia. As obras de construção foram iniciadas em 1806. A inauguração ocorreu a 13 de maio de 1812, aniversário de D. João VI, com a representação da peça A Escocesa, cuja autoria se perdeu com o tempo. O pano de boca, cuja ilustração representava a América Portuguesa, foi pintado pelo baiano Manuel José de Sousa Coutinho. A sala de espetáculos era composta por 340 cadeiras na plateia, 60 camarotes repartidos em três ordens e uma galeria que acomodava 400 espectadores. O Teatro de São João foi destruído por um incêndio a 6 de junho de 1922. (Cf. SILVA, 1938, p. 121-122 e RUY, 1959, p. 85-86). Como constatamos, os preços dos bilhetes eram semelhantes aos praticados pelos teatros da Corte: as forçuras (frisas) custavam 6 mil réis, camarote de primeira ordem, 8 mil, de segunda ordem, 4 mil, torrinhas, 2 mil, cadeiras de plateia, 1$500 réis, plateia geral, 1 mil, e varandas, 500 réis. (Cf. ANÚNCIOS. Correio Mercantil, Salvador, 13 out. 1848, p. 3). 5 A MARMOTA, Salvador, 30 jun. 1849, p. 3. 6 Cf. ***. Folhetins Teatrais. O Idiota e o Senhor João Caetano. Correio Mercantil, Salvador, 18 jun. 1849, p. 2.

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impressões no periódico A Marmota, em artigo no qual defendeu a ideia de que o papel do ator seria compreender as reais intenções do dramaturgo e exprimir corretamente as emoções de suas personagens. Segundo esse espectador, João Caetano “penetrou todo o sentido, e pensamento do grande poeta inglês” e soubera desempenhar “o ciúme, o amor, a amizade, o denodo e o brio soldadesco”.7 Porém, para Manoel Jarreta, folhetinista de A Marmota, apesar de o ator logo ter sido nomeado Rei e Nume pela plateia baiana, seu jogo de cena seria afetado: “abisma quando representa, se faz papel de louco estrebucha, quebra a cabeça, arranca o nariz, revira os olhos de tal maneira, que a gente na plateia grita aqui d’El-Rei”.8 Outros artigos, publicados na imprensa, que trataram da representação do artista, afirmaram que seria incontestável que “o Sr. João Caetano seja artista, e o primeiro da cena brasileira”9, mas “lhe encontramos defeitos”.10 Além da inflação nos preços dos bilhetes e do jogo de cena de João Caetano, o debate também se deu em torno da rivalidade deste com o ator Germano Francisco que, na época, era inspetor de cena do Teatro de São João.11 Com a chegada de João Caetano, logo se iniciaram as especulações sobre a possível atuação conjunta dos dois artistas nos espetáculos da temporada.

Não sei por que razão, não há de a administração, para fazer completa a sua obra, apresentar em cena o Sr. Germano. O sol não pode ter ciúmes de um grande planeta que se lhe avizinhe. O Sr. João Caetano não poderá deixar de estimar, quando o vir a seu lado, e o público da Bahia que tanto louvou, e inda estima o mérito artístico do Sr. Germano, sente a sua falta, e bem desejaria mitigar a saudade que dele tem.12

Os dois atores dividiram o palco na encenação de Othelo ou o Mouro de Veneza, na tradução de Gonçalves de Magalhães, a 30 de junho de 1849. João Caetano fez o papel de Othelo e Germano Francisco, o de Loredano (Cássio no Otelo de Shakespeare). Apesar do

7 ***. Comunicado. A Marmota, Salvador, 23 jun. 1849, p. 2. 8 Cf. JARRETA, Manoel. Carta do Dr. Manoel Jarreta a seu Compadre e amigo Pantaleão da Saubara. A Marmota, Salvador, 14 jul. 1849, p. 2. 9 A. RONZI. Correio Mercantil, Salvador, 4 jul. 1849, Crônica Teatral, p. 1. 10 O PALMEIRIM. Othelo, ou o Mouro de Veneza. Correio Mercantil, Salvador, 5 jul. 1849, Comunicado, p. 3. 11 A informação sobre a função de Germano Francisco como inspetor de cena do Teatro de São João foi obtida em uma crônica teatral: “O teatro dramático pode tornar-se digno de toda a proteção do público; o Sr. João Caetano galvanizou a companhia com sua presença; ela ressentiu-se disso e o patenteou evidentemente; agora muito depende da inteligência do novo inspetor de cena – o Sr. Germano – apoiado pela administração, sem o que o teatro dramático está em uma crise de morte. Veremos em que fica tudo isto, e em que cifra-se a inteligência da administração e de seu inspetor de cena”. (A. RONZI. Correio Mercantil, Salvador, 12 jun. 1849, Crônica Teatral, p. 2). 12 ***. Folhetim Teatral. A segunda representação da Gargalhada. Correio Mercantil, Salvador, 12 jun. 1849, Comunicado, p. 3.

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espaço dado a Germano Francisco, os críticos teatrais se mostraram descontentes com o grande entusiasmo do público por João Caetano e o esquecimento a que relegaram Germano Francisco, pois a estrela retornaria, brevemente, ao Rio de Janeiro, ao passo que, quem ali permaneceria e contribuiria para o desenvolvimento da arte dramática da província, seria o artista colocado em segundo plano. As crônicas da imprensa baiana nos permitem propor a hipótese de que uma situação de competição se instalou no Teatro de São João, durante a estadia de João Caetano, transferindo para a Bahia a antiga rivalidade entre os dois atores, nascida no Teatro de São Pedro de Alcântara, em 1841. De acordo com o folhetinista do Correio Mercantil, “Quem jamais deixou de proclamar o Sr. João Caetano como o primeiro dos artistas brasileiros, quem poderá deixar de admirá-lo? Mas, ele tem de retirar-se, e o Sr. Germano é nosso, e conosco ficará”.13 O mesmo posicionamento foi partilhado pelo Dr. Manoel Jarreta, cronista de A Marmota. Também consciente do retorno de João Caetano ao Rio de Janeiro, declarou, de modo bem-humorado, que, tendo em vista a retirada do “monarca João Caetano para a sua quinta do Rio de Janeiro”, o governo deveria nomear Germano Francisco Vice-Rei, para que se repartissem “com igualdade entre os cômicos as glórias”.14 Pantaleão, em crônica teatral publicada pelo mesmo periódico, fez coro ao Dr. Manoel Jarreta em defesa da importância de Germano Francisco para o teatro baiano.

Fui convidado para na noite de 18 do corrente assistir no Teatro de São João a posse do Vice-Rei da cena, o magnífico artista Germano Francisco de Oliveira, não pude resistir ao pedido, embarquei e fui, e tomando assento no camarote de quem me havia convidado, fiquei arrebatado de satisfação por ver o bem que desempenhou a interessante parte de Pedro-Sem o mencionado Vice-Rei, e no meu fraco entender, achei que pouco é inferior ao Rei da cena, o sublime João Caetano. [...] Faço saber a todos a quem chegar o conhecimento desta, que meu Compadre, o Dr. Manoel Jarreta, decretou e eu sancionei a Lei seguinte: Art. 1. Será reconhecido no Império do Brasil como Vice-Rei da cena o exímio ator Germano Francisco de Oliveira.15

Na temporada de espetáculos de um mês que ofereceu na Bahia, com exceção do drama O Idiota (Le Pauvre Idiot, TG, 1838), de Depeuty e Fontan, João Caetano representou peças de sucesso de seu repertório, consolidadas pela criação e reprises nos palcos do Rio de Janeiro. Além das tragédias Othelo, Antônio José ou o Poeta e a Inquisição e Nova Castro, protagonizou A Gargalhada, A Dama de Saint-Tropez, D. César de Bazan e Kean.

13 ***. Viva o príncipe da cena! Honra a Bahia. Honra a administração do teatro! Correio Mercantil, Salvador, 18 jun. 1849, p. 2-3. 14 JARRETA, Dr. Manoel. A Marmota, Salvador, 27 jun. 1849, Parte Oficial, p. 1. 15 PANTALEÃO. Carta do Pantaleão da Saubara a seu compadre o Dr. Manoel Jarreta. A Marmota, Salvador, 25 jul. 1849, p. 2-3.

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A peça de Dumas (pai) foi selecionada pelo artista para ser representada em um dos espetáculos, oferecidos entre 2 e 4 de julho de 1849, em comemoração ao movimento de Independência da Bahia, ocorrida a 2 de julho de 1823. Kean apresenta uma personagem que faz referência a um ator real, o britânico Édmond Kean (1787-1833). A peça leva ao palco, a partir de uma intriga amorosa, a situação ambígua dos atores célebres que, apesar da notoriedade, adulação pública, contatos diretos com a nobreza e, por vezes, a fortuna, conquistada graças ao trabalho artístico, não se subtraíam da condição social em que se encontravam e continuavam a ser considerados, pejorativamente, saltimbancos e bufões. A peça foi primeiramente encenada por João Caetano no Teatro de São Francisco, a 14 de agosto de 1841, em espetáculo que celebrou a ascensão ao poder de D. Pedro II como Imperador do Brasil. A récita oficial e patriótica foi honrada com a presença do monarca que, de sua tribuna, acompanhou a execução do Hino Nacional e a representação da peça de Dumas (pai).16 Assim, a encenação de Kean na Bahia por João Caetano simbolizou menos um espetáculo de entretenimento que uma celebração coletiva de uma data política, os vinte e seis anos de emancipação e anexação da província ao território brasileiro independente, em récita que contou com a presença do general francês Labatut, que participara das lutas.17 Os dois espetáculos, no Rio de Janeiro, em 1841, e na Bahia, em 1849, ilustram um dos principais papéis assumidos pelos teatros oficias durante a Monarquia de D. Pedro II: um espaço público de manifestação patriótica, de construção e reafirmação da nacionalidade brasileira. Em um contexto patriarcal, onde o Imperador desempenhava o papel de mecenas da arte, João Caetano, um artista subvencionado pelo Império, compreendeu e buscou expressar com as encenações de Kean que a condição social do ator passava por uma aproximação da “melhor sociedade”. Assim depreendemos do seguinte trecho de seu livro Lições Dramáticas (1862):

Finalizarei, portanto senhores, o meu raciocínio sobre o estudo e a conduta dos atores, com o que disse Baron: O ator devia ser criado ao colo de uma rainha. Com estas palavras bombásticas, queria sem dúvida dizer que o ator deve sempre professar os mais nobres sentimentos, ter as maneiras da melhor sociedade, e escolher as suas relações entre as pessoas mais instruídas e de maior distinção.18

16 Cf. THEATRO de S. Francisco. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 13 ago. 1841, p. 3. 17 Antes de se exilar no Brasil e participar das lutas na Bahia, Labatut (Marselha, 1775 – Bahia, 1849) fizera parte da armada de Napoleão Bonaparte. (Cf. BOCCANERA JÚNIOR, Sílio. O Teatro na Bahia: da colônia a república, 1800-1923. 2. ed. Salvador: EDUNEB: EDUFBA, 2008, p. 117-118, e HESSEL & RAEDERS, 1979, p. 144 e 150). 18 SANTOS, João Caetano dos. Lições Dramáticas. Rio de Janeiro: Typ. Imp. e Const. de J. Villeneuve & C., 1862, p. 54, grifos do autor.

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Após um mês de estadia, João Caetano se despediu da Bahia em espetáculo a 9 de julho de 1849, no qual protagonizou a tragédia Antônio José ou o Poeta e a Inquisição. O poema “Adeus ao público baiano”, publicado pelo periódico A Marmota, a 11 de julho, selou a despedida do artista, que agradecia pelos aplausos que recebera de “um povo esclarecido”, a quem deixava “do agradecido coração metade”.19 A segunda temporada de espetáculos de João Caetano no interior do Império teve lugar no Rio Grande do Sul. Em agosto de 1854, em meio aos preparativos de comemoração ao sete de setembro, o artista aportou em Rio Grande. Na época, o contato do Rio Grande do Sul com o restante do Império brasileiro se dava, principalmente, pelo porto de Rio Grande que, além de posto de circulação de pessoas, era por onde se escoava o charque, principal produto econômico da região. A vinda de companhias dramáticas, tanto estrangeiras quanto nacionais, para se apresentarem nos teatros dessa província já era uma prática recorrente na década de 1850. As trupes aportavam em Rio Grande e, assim que terminavam as récitas nesta cidade portuária, adentravam pela província e se apresentavam em Pelotas, em Jaguarão (na fronteira com o Uruguai) ou em Porto Alegre (ao norte).20 João Caetano se apresentou no Teatro Sete de Setembro21, em Rio Grande, durante o mês de agosto de 1854, e nos dois meses seguintes, no Teatro Sete de Abril22, em Pelotas. O artista fluminense dividiu os palcos com os atores da companhia dramática dirigida por Manoel José da Silva Bastos (1825-1861) – dramaturgo e empresário teatral rio-grandino que organizou a turnê23 –, dentre os quais Gabriela da Cunha de Vecchy, Josephina Miró, Jacinto Heller e João Thomas Sirôlo. Tanto em Rio Grande quanto em Pelotas, João Caetano representou os mesmos programas teatrais, constituídos pelos melodramas franceses de sucesso presentes em seu consolidado repertório: A Dama de Saint-Tropez, A Gargalhada, D. César de Bazan e Os Seis Degraus do Crime.24

19 SANTOS, João Caetano dos. Adeus ao público baiano. A Marmota, Salvador, 11 jul. 1849, p. 4. 20 Cf. BITTENCOURT, Ezio da Rocha. Apontamentos sobre o movimento teatral em Rio Grande no século XIX. BIBLOS – Revista do Instituto de Ciências Humanas e da Informação, Rio Grande, FURG, vol. 8, 1996, p. 121. 21 O Teatro Sete de Setembro foi inaugurado em Rio Grande, a 7 de setembro de 1832. Além das cadeiras da plateia, a sala de espetáculos possuía três ordens de camarotes. O edifício passou por diversas reformas ao longo do século XIX. Foi demolido em 1949. (Cf. Ibidem, p. 124-131). 22 O Teatro Sete de Abril foi inaugurado a 2 de dezembro de 1833. A ampla sala de espetáculos possuía 61 camarotes e 233 cadeiras, podendo acomodar até 500 pessoas. Sua construção foi financiada pelos charqueadores da província, detentores da maioria dos camarotes. (Cf. SANTOS, 2012, p. 16-17). 23 “As mais importantes companhias trazidas à província foram organizadas por ele. Foi quem trouxe sucessivamente a nossas plagas Florindo, Joaquim Augusto e João Caetano em 1854”. (ESBOÇO biográfico Manoel José da Silva Bastos. Revista Mensal da Sociedade Parthenon Litterario, Porto Alegre, 2ª série, 2º ano, n. 4, abr./1873, p. 147). 24 O repertório apresentado por João Caetano em Rio Grande foi consultado em BITTENCOURT, 1996, p. 128; e o repertório exibido em Pelotas, em MÜLLER, Dalila. “Feliz a População que Tantas Diversões e

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No espetáculo de despedida em Pelotas, João Caetano reprisou a peça de estreia da turnê, A Dama de Saint-Tropez. Em lágrimas, o ator recitou um poema dedicado ao público do Rio Grande do Sul. A emoção eletrizou os espectadores, que se sentiram tão comovidos como se assistissem a João Caetano em uma das cenas patéticas dos melodramas que protagonizava. Após a comoção coletiva, o poeta local Antônio José Domingues recitou cem versos em celebração ao artista. E, por fim, este foi acompanhado até a residência onde estava hospedado por diversos espectadores que lhe deram muitos vivas.25 A presença de João Caetano aqueceu a economia em torno da atividade teatral na província do Sul. A notoriedade que o ator construíra como o principal artista dramático brasileiro inflou os preços dos bilhetes dos espetáculos nos quais se apresentou. Em Rio Grande, uma cadeira custava quatro mil réis, e os camarotes, 32, 50 e 60 mil réis. Uma alta elevada nos preços, tendo em vista que o valor cobrado por cada cadeira era, geralmente, de um mil réis. Não apenas os administradores dos teatros aproveitaram da presença do artista, os tipógrafos também exploraram o filão. Retratos de João Caetano eram vendidos nas livrarias por três mil réis cada.26 Segundo uma crônica teatral publicada pelo periódico O Pelotense, membros da ordem dirigente da cidade, com condições financeiras para custear os preços elevados dos camarotes, constituíram o público de João Caetano no Teatro Sete de Abril, tais como “vereadores, comendadores, oficiais superiores da Guarda Nacional, doutores, magistrados, e os membros da Câmara Municipal”.27 Com este seleto público, João Caetano compartilhou cenas de sociabilidade que extrapolaram a sala de espetáculos. Hospedado na residência do negociante Eufrásio Gomes de Araújo, o Barão de São José do Norte, o ator foi convidado a um ilustre banquete oferecido no salão da sociedade Harmonia Pelotense, a 12 de outubro de 1854. O jantar contou com a presença de quase 200 pessoas, dentre as quais figuras políticas, como João Jacinto de Mendonça, candidato a uma cadeira na Assembleia Legislativa, e o deputado provincial José Vieira da Cunha. No final do banquete, João Caetano foi “acompanhado a sua casa por grande número de pessoas, e precedido por uma banda de música”.28

Comodidades Goza”: espaços de sociabilidade em Pelotas (1840-1870). 340 p. Tese (Doutorado em História) – Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, 2010, p. 309. 25 Cf. THEATRO. Dama de Saint-Tropez. O Pelotense, Pelotas, 24 out. 1854, Pelotense, p. 1. 26 Cf. BITTENCOURT, 1996, p. 128. 27 THEATRO, op. cit. 28 O PELOTENSE, Pelotas, 18 out. 1854, p. 1-2 apud MÜLLER, 2010, p. 91.

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No caminho de volta para o Rio de Janeiro, o ator fez parada de um dia na cidade de Nossa Senhora do Desterro (atual Florianópolis), a 5 de novembro de 1854. Representou A Gargalhada no Teatro de São Pedro de Alcântara, ao lado de atores amadores catarinenses. Como acontecera nas cidades do Rio Grande do Sul, João Caetano recebeu honrarias do público (poemas, flores, aplausos) após o espetáculo, e foi escoltado do hotel ao teatro, do teatro ao hotel e do hotel ao navio a vapor por um cortejo de admiradores e por uma banda de música que tocava ininterruptamente.29 A terceira temporada de espetáculos de João Caetano além dos limites do Rio de Janeiro ocorreu em Pernambuco, durante os meses de fevereiro a abril de 1857. O ator recebeu subvenção do governo provincial para ali formar uma companhia dramática, da qual faziam parte artistas que trouxera do Rio de Janeiro, como a atriz Gabriela da Cunha de Vecchy, e atores locais, como Pedro Batista de Santa Rosa. Na breve estadia no Teatro de Santa Isabel30, João Caetano protagonizou, com exceção de Mariana a Vivandeira (Marianne, TAC, 1850), de Anicet-Bourgeois e Michel Masson, as peças de sucesso de seu repertório que representara na turnê no Rio Grande do Sul: as tragédias Antônio José ou o Poeta e a Inquisição e Othelo, e os melodramas A Dama de Saint-Tropez, A Gargalhada e D. César de Bazan.31 Em Pernambuco, assim como na Bahia, no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, João Caetano exalou a imagem de artista de grande notoriedade. A consagração do ator diante do público recifense pôde ser constatada pelas recorrentes leituras de elogios poéticos durante os espetáculos, publicados posteriormente pela imprensa – como o poema de João Franklin da Silveira Távora, então com quinze anos de idade32 –, e pelas manifestações públicas de adoração, a exemplo de uma procissão ocorrida no final de uma récita, na qual João Caetano foi acompanhado até a residência por espectadores portando brandões acesos.33 Nesse ato simbólico, João Caetano representava o santo a ser idolatrado, ao passo que os espectadores, os fiéis mais dedicados.

29 Cf. SACHET, Celestino. História de Santa Catarina. Vol. 3. Curitiba: Grafipar, 1970, p. 56-57. 30 Assim denominado em homenagem à filha mais velha de D. Pedro II, o Teatro de Santa Isabel foi projetado pelo engenheiro francês Louis Léger Vauthier. Inaugurado em 1850, o teatro foi destruído por um incêndio em setembro de 1869. Foi reconstruído e reinaugurado a 16 de dezembro de 1876. O teatro avançou o século XX e continua ativo. Passou por uma grande restauração em 2000. (Cf. ARRAIS, Isabel Concessa. Teatro de Santa Isabel. Recife: Fundação de Cultura Cidade do Recife, 2000, passim). 31 Ver anexo “Tabela 19 – Repertório Francês de João Caetano nas Províncias (1849-1857)”. 32 TÁVORA, João Franklin da Silveira. Elogio. O Liberal Pernambucano, Recife, 1 maio 1857, p. 3. 33 Cf. UM COMERCIANTE Nacional. O Liberal Pernambucano, Recife, 2 abr. 1857, p. 3, e O COMERCIANTE Brasileiro. O Liberal Pernambucano, Recife, 3 abr. 1857, Correspondências, p. 2.

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O modus operandi das turnês de João Caetano nas províncias do Império pode ser aproximada do stock star system, modelo de organização de espetáculos teatrais assim descrito por Dominique Leroy:

O termo tão bárbaro [stock star system] descreve bem a situação na qual um ator ou artista “sem igual”, de renome nacional ou internacional, um tipo de monstro sagrado, visita uma companhia para um certo número de atividades ou de representações, na ocasião das quais esse grande artista (o ídolo) impõe todas as condições e as regras do jogo: o tempo que deve durar sua estadia, as condições de sua intervenção, a escolha das obras, da mise en scène, da distribuição, dos cenários, etc. Tudo é imposto pela estrela (star) de modo que tudo gravita em torno de sua pessoa.34

João Caetano aportou nas províncias da Bahia, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Pernambuco como o “monstro sagrado” do teatro nacional. Nos espetáculos em que representou, os artistas das companhias dramáticas dos teatros desempenharam os papéis secundários nas peças escolhidas por João Caetano, os carros-chefes de seu repertório, cujos protagonistas, personagens de características virtuosas, valores cavalheirescos e ações moralizantes, permitiram que o artista fluminense resplandecesse nos palcos. Além da ribalta, tanto dos teatros do Rio de Janeiro quanto das províncias, João Caetano viveu cercado de adulações, situações inimagináveis até mesmo para os atores- estrelas de nossos dias. Essas cenas de sociabilidade, compartilhadas entre o ator e o público, de forma mais intensa nas províncias, revelam que a missão artística de João Caetano, de fundação do teatro nacional e propagação da arte dramática, esteve subordinada estruturalmente a mediações econômicas e políticas. Nesse caso, a ideia de subordinação estrutural dos pintores e escritores franceses descrita por Pierre Bourdieu, resguardadas as especificidades tanto de contexto (França e Brasil) quanto da arte em questão (pintura, literatura e teatro), pode auxiliar na compreensão do fenômeno da posição do ator no teatro brasileiro.35 De um lado, João Caetano esteve submetido às leis do mercado teatral, que começava a se instituir no Brasil e a impactar nas empresas tanto diretamente, por meio da

34 LEROY, Dominique. Histoire des Arts du Spectacle en France: aspects économiques, politiques et esthétiques de la Renaissance à la Première Guerre mondiale. Paris: L’Harmattan, 1990, p. 259-260. No original: “Ce terme assez barbare décrit bien la situation dans laquelle un acteur ou un artiste ‘hors pair’, de renommée nationale ou internationale, sorte de monstre sacré, rend visite à une compagnie pour un certain nombre de journées et de représentations, à l’occasion desquelles ce grand artiste (l’idole) impose toutes les conditions et les règles du jeu : le temps que doit durer son séjour, les conditions de son intervention, le choix des œuvres, de la mise en scène, de la distribution, des décors, etc. Tout est imposé par la star de sorte que tout gravite autour de sa personne.” 35 Ver BOURDIEU, 1996, p. 65.

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venda de bilhetes e do número de espectadores, quanto indiretamente, pelo jornalismo e as críticas teatrais, ou pela avaliação espontânea de espectadores anônimos. A notoriedade de João Caetano foi a força motriz de toda uma economia teatral, construída a partir de sua imagem de ator de talento que representava o teatro nacional, haja vista a flutuação dos preços cobrados pelos bilhetes quando o ator encenou nos teatros das províncias e o aparecimento de impressos em sua reverência. De outro lado, as ligações com pessoas influentes na arte e na política contribuíram certamente para orientar o mecenato da Monarquia em favor de João Caetano. Assim ilustram as reuniões em instituições sociais regadas a banquetes, como a ocorrida na sociedade Harmonia Pelotense, os cortejos, que reuniam multidões, banda de música e archotes, os poemas, flores e aplausos que o congratulavam durante os espetáculos e a hospedagem nas residências de famílias abastadas e com título de nobreza. As turnês do artista pelas províncias simbolizaram mais que a propagação da arte dramática do Rio de Janeiro ao interior do Brasil. Assim como as viagens da família imperial às regiões do Império – por exemplo, Rio Grande do Sul, em 1846, 1865 e 1885; Bahia, Pernambuco, Paraíba, Alagoas, Sergipe e Espírito Santo, entre 1859 e 186036 –, com objetivos meramente políticos, as estadias de João Caetano na Bahia, durante a celebração da Independência da província, e no Rio Grande do Sul, em período das festividades em comemoração ao sete de setembro, buscaram reafirmar a tão sonhada união nacional, tanto em termos artísticos quanto políticos.

3.3 Germano Francisco, de ator a empresário teatral e negociante

Durante duas décadas, Germano Francisco atuou nas principais salas de espetáculos das províncias brasileiras. Apesar de se aproximar de João Caetano, na medida em que representou peças francesas criadas pelo célebre ator nos palcos do Rio de Janeiro, Germano Francisco dele se diferenciou, sobretudo pelas suas habilidades artísticas múltiplas. Além de primeiro ator, foi um astuto empresário teatral, atento aos negócios, diretor de companhias dramáticas, ensaiador e tradutor de melodramas franceses.

36 Klécio Santos narrou as viagens da família imperial a Pelotas e sua presença na tribuna em espetáculos no Teatro Sete de Abril. Ver SANTOS, 2012, p. 28-37. Sobre a viagem pelas províncias, iniciada em outubro de 1859, ver MEMÓRIAS da Viagem de SS. Magestades Imperiaes às Províncias da Bahia, Pernambuco, Parahiba, Alagoas, Sergipe, e Espírito-Santo. Tomo I – Bahia. Rio de Janeiro: Typ. e Livraria de B. X. Pinto de Sousa, 1861. Disponível em: . Acesso em: 21 fev. 2017.

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O percurso de Germano Francisco pelos teatros das províncias brasileiras é extremamente dinâmico. O ator iniciou a carreira empresarial na Bahia, em 1848, no Teatro de São João, onde permaneceu até 1850. Assumiu a direção do Teatro de Santa Isabel, em Pernambuco, nas temporadas de 1850-1852 e de 1857. Sua companhia se apresentou no Ceará em 1852, 1855 e 1863. Em São Luís, no Maranhão, o artista dirigiu o Teatro São Luiz nas temporadas de 1853-1855 e de 1862. No Pará, sua companhia representou em 1854 e 1857. No Sul do Império, Germano Francisco ofereceu espetáculos em Pelotas e Rio Grande, em 1860. Entre 1868 e 1869, atuou nos teatros de Rio Grande, Pelotas e Porto Alegre. Retornou ao Rio de Janeiro em 1870, para assumir a direção do Teatro de São Pedro de Alcântara. Por fim, abandonou os palcos em 1873, quando se instalou no Sul do Império e passou a se dedicar ao exercício da medicina homeopática. Em 1848, Germano Francisco foi recebido na Bahia sem muito alarido na imprensa, diferente do que ocorreu quando João Caetano ali aportou em junho de 1849. O ator era visto, na época, apenas como mais um artista do Rio de Janeiro.37 Logo, foi contratado pela sociedade Thalia Bahiense que se apresentava no Teatro de São Pedro de Alcântara.38 Estreou em espetáculo beneficente a 28 de abril de 1848. Permaneceu nesse teatro até o mês de outubro de 1848, quando se transferiu para a companhia dramática do Teatro de São João, com a dupla função de primeiro ator e inspetor de cena. Sua presença, apesar de ativa, não atraía a atenção dos folhetinistas e espectadores, que começaram a enaltecê-lo somente após a estadia de João Caetano. Em 1850, Germano Francisco foi para o Recife. Lá, assumiu a direção do recém- criado Teatro de Santa Isabel, com direito a um subsídio anual de quinze contos de réis.39 A inauguração do teatro ocorreu a 18 de maio de 1850, em espetáculo que exibiu o drama O Pajem de Aljubarrota, de Mendes Leal. Foi no Teatro de Santa Isabel que Germano Francisco passou a desempenhar as funções de um empresário teatral. Na Bahia, fora apenas inspetor de cena e primeiro ator do Teatro de São João. Em Pernambuco, tornou-se empregado público com o título de administrador do Teatro de Santa Isabel. Assim que assumiu a direção,

37 Em um dos folhetins teatrais de A. Ronzi, publicados pelo periódico Correio Mercantil, o cronista anunciou brevemente o espetáculo beneficente em favor de Germano Francisco, recém-chegado a Salvador: “Sexta-feira, 28 do corrente, levar-se-á à cena do Teatro de S. Pedro de Alcântara, a tragédia Nova Castro em benefício do 1º galã Germano Francisco de Oliveira, artista do Teatro de S. Pedro de Alcântara do Rio de Janeiro, aqui chegado não há muito”. (A. R. Correio Mercantil, Salvador, 27 abr. 1848, Crônica teatral, p. 2). 38 O Teatro de São Pedro de Alcântara se localizava na Rua de Baixo de São Bento, em Salvador. Foi desativada em 1879. (Cf. RUY, 1959, p. 86-87). 39 Cf. O THEATRO de Santa Isabel e o seu empresário. A Imprensa, Recife, 15 out. 1850, Comunicado, p. 2.

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Germano Francisco investiu na composição de cenários, figurinos e na formação de um arquivo teatral. Manteve uma companhia lírica italiana e um corpo de baile permanentes.40 Em agosto de 1852, antes de se instalar no Maranhão para assumir a direção do Teatro São Luiz, Germano Francisco realizou curta temporada de espetáculos no Ceará. Foi acolhido e auxiliado pelo cearense Henrique Ellery. Ali permaneceu “o intervalo de um vapor”41 e ofereceu apenas três récitas no Teatro Thaliense42, nas quais protagonizou melodramas franceses do repertório de João Caetano, a saber: A Gargalhada, D. César de Bazan e O Marinheiro de Saint-Tropez. Germano Francisco dali partiu, em dezembro de 1852, acompanhado dos artistas Silvestre Francisco Meira, Raimundo José de Araújo, Antônio José Alves, Manoel Antônio Nunes, Joana Januária.43 A companhia dramática rumou para o Maranhão, onde, em março de 1853, Germano Francisco assumiu a administração do Teatro São Luiz44, em contrato com o governo da província. O ator-empresário se beneficiou de um subsídio do Tesouro Público Provincial na quantia de quinhentos mil réis, de março a junho de 1853, e de seiscentos mil réis, de julho de 1853 a fevereiro de 1854. Enquanto ocupava a direção do Teatro São Luiz, a companhia dramática de Germano Francisco realizou uma temporada de espetáculos em Belém, no Pará, de março a maio de 1854. Não foi possível fazer o levantamento das peças que a trupe encenou no Teatro Providência.45 Segundo Vicente Salles, Germano Francisco representou peças que recorriam “aos grandes lances dramáticos que o texto comportava, como o punhal, o rapto de crianças, traições, falso testemunho, o veneno e outras maquinações tenebrosas”.46 Ou seja, o artista

40 Cf. SERRA, 1862, p. 12. 41 O SR. GERMANO. O Cearense, Fortaleza, 17 ago. 1852, p. 4. 42 O Teatro Thaliense, localizado na Rua Formosa (atual Rua Barão do Rio Branco), foi inaugurado em 1842. A sala de espetáculos continuou ativa até 1872. (Cf. COSTA, Maria Clélia Lustosa. Urbanização da sociedade fortalezense. Revista do Instituto do Ceará, 2008, p. 199. Disponível em: . Acesso em: 16 out. 2015). 43 Cf. NAVIOS saídos no dia 21. O Liberal Pernambucano, Recife, 23 dez. 1852, Movimento do porto, p. 4. 44 Após as reformas empreendidas pelo governo do Maranhão no edifício do Teatro União, este foi reaberto, a 14 de março de 1852, como Teatro São Luiz. A sala de espetáculos foi novamente reformada em 1862. Sobre a administração, as companhias dramáticas e o repertório encenado nessa sala de espetáculos no período em que Germano Francisco ali atuou, ver MENDES, 2014, p. 27-118. 45 O Teatro Providência, localizado no Largo das Mercês, foi inaugurado em 1835. Manteve-se inativo durante grande parte da revolta da Cabanagem, que durou de 1835 a 1840. Com o final da revolta, voltou a oferecer récitas frequentes. Sofreu um incêndio em 1872. Após a inauguração do Teatro da Paz, o Teatro Providência foi relegado a segundo plano. (Cf. SOUZA, Roseane Silveira de. Teatro da Paz: histórias invisíveis em Belém do Grão-Pará. Anais do Museu Paulista, São Paulo, vol. 18, n. 2, p. 93-121, dez./2010. Disponível em: . Acesso em: 23 out. 2015). 46 SALLES, 1994, p. 35.

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representou em Belém, muito provavelmente, os melodramas que já integravam o seu repertório. Germano Francisco permaneceu na direção do Teatro São Luiz até abril de 1855.47 Em 22 de maio desse ano, sua companhia dramática retornou ao Ceará. Acompanharam o empresário, os atores Manoel Antônio Nunes, Raimundo José de Araújo, Júlio dos Santos Pereira, Antônio Bastos Pinto e Francisco Libânio Colás Filho, e as atrizes Manoela Lucci (?-1898) e Carmella Lucci. Quando a companhia de Germano Francisco se despediu do Ceará, em julho de 1855, Victoriano Augusto Borges, diretor do Teatro Thaliense, fez publicar na imprensa suas palavras de reconhecimento pelos trabalhos prestados. Agradeceu a Germano Francisco o zelo com o guarda-roupa do teatro, os reparos que fizera nos cenários e os espetáculos beneficentes que oferecera em favor do Hospital de Caridade.48 A companhia dramática de Germano Francisco aportou no Pará, em 1857, para uma nova temporada de espetáculos. Nessa época, Antônio Maximiano da Costa, ex- integrante da trupe, dirigia o Teatro Providência. Muito provavelmente, as relações de amizade entre ambos facilitaram as negociações para a nova turnê no Pará. No final de junho do mesmo ano, Germano Francisco retornou a Pernambuco. Em setembro de 1857, reassumiu a direção do Teatro de Santa Isabel, ocupação que exerceu até meados de 1861.49 Enquanto era empresário do teatro em Pernambuco, Germano Francisco realizou a primeira temporada de espetáculos no Sul do Império, em 1860. Isso demonstra que o ator, mesmo com a administração fixa de um teatro, excursionava pelas províncias brasileiras para se apresentar em outras salas de espetáculos, ou até mesmo dirigi-las. No palco do Teatro Sete de Setembro, em Rio Grande, o artista protagonizou Pedro e Os Dois Renegados, de Mendes Leal, e O Mosteiro de Santo Iago, de Burgain. Seguindo o trajeto comum das trupes que realizavam temporadas de espetáculos no Rio Grande do Sul, a companhia dramática de Germano Francisco se despediu de Rio Grande e partiu rumo à cidade de Pelotas, onde era aguardada. Em Pelotas, ofereceu espetáculos no Teatro Sete de Abril, entre 19 de agosto e 11 de outubro de 1860. A temporada previa vinte récitas, cujo pagamento adiantado deveria ser feito pelos espectadores a cada cinco espetáculos. Germano Francisco se comprometera a

47 Cf. MENDES, 2014, p. 45-46 e 57. 48 BORGES, Victoriano Augusto. O Commercial, Fortaleza, 26 jul. 1855, A pedidos, p. 3. 49 Cf. SILVA, José Amaro Santos. Música e Ópera no Santa Isabel: subsídio para a história e o ensino da música no Recife. Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2006, p. 99.

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representar dez dramas e comédias novas de três a cinco atos, e dez pequenas comédias de um a dois atos, ornadas ou não de músicas.50 Domingos Antônio Felix da Costa estava incumbido do recebimento dos pagamentos adiantados das assinaturas. Isso revela um dado importante da economia dos espetáculos na época, ou pelo menos no que toca, especificamente, às turnês da companhia dramática de Germano Francisco. O recebimento antes do início da temporada garantiria a própria existência da turnê, ume vez que, a acumulação de recursos financeiros proveria o ator-empresário das condições necessárias para cobrir os gastos da viagem da trupe e o preparo dos primeiros espetáculos. Após a temporada no Sul do Império, e com o fim do contrato de administração do Teatro de Santa Isabel, em Pernambuco, Germano Francisco retomou a direção do Teatro São Luiz, no Maranhão, em 1862. O artista assinou um contrato com o governo provincial, que lhe cedeu o teatro por seis anos com o direito a uma subvenção de seis contos de réis.51 Em 1863, enquanto aguardava a renovação do contrato, Germano Francisco realizou nova temporada no Ceará, durante os meses de fevereiro a junho. Na época, Germano Francisco não recebia a subvenção acordada com o governo provincial do Maranhão. Então, decidiu arrendar o Teatro São Luiz aos artistas José Couto Rocha e Francisco Libânio Colás e, assim, permanecer no Ceará. Manteve a concessão oficial do teatro até fevereiro de 1865, quando o governo rescindiu o contrato e concedeu a direção da sala de espetáculos a Vicente Pontes de Oliveira. De ator, tradutor de peças francesas, ensaiador e empresário teatral, Germano Francisco passou a se dedicar também ao comércio. No Ceará, o ator abriu uma loja de tecidos e produtos variados de consumo (roupas, acessórios, sapatos, perfumes, candeeiros, lamparinas e vinhos), denominada América, e firmou sociedade com Domingos da Cunha Taborda. Porém, logo se despediu do ramo do comércio, desfazendo a sociedade em dezembro de 1864. A incursão de Germano Francisco no comércio revela a necessidade dos atores de buscarem outros meios de sobrevivência quando não usufruíam de subvenções dos governos. Isso demonstra que, nessa época, apenas a venda dos bilhetes dificilmente garantiria a manutenção financeira de uma companhia dramática. Em 1864, verificamos a presença de Germano Francisco na empresa do ator Antônio José Duarte Coimbra, instalada no Teatro de Santa Isabel, em Pernambuco. Germano Francisco atuou na montagem de Luxo e Vaidade, de Macedo, peça que estreara no Teatro do Ginásio Dramático, no Rio de Janeiro, em 23 de setembro de 1860. Constatamos também sua

50 Cf. THEATRO 7 de abril. O Brado do Sul, Pelotas, 27 jul. 1860, p. 1-2. 51 Cf. MENDES, 2014, p. 86.

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atuação em espetáculo de maio de 1865, quando protagonizou o melodrama Maria Joana, Mulher do Povo ou a Pobre Mãe, de Dennery e Mallian, traduzido pelo próprio ator. Em outubro de 1869, após o incêndio devastador do mês anterior que destruíra o Teatro de Santa Isabel, Germano Francisco, que já havia estabelecido morada no Sul do Império, submeteu ao vice-presidente da província de Pernambuco uma proposta de reedificação da sala de espetáculos. O projeto previa dez meses para a reconstrução do edifício e reservava ao empresário o usufruto do teatro por dez anos. A proposta de Germano Francisco foi preterida e José Augusto de Araújo, escolhido como o novo administrador do teatro. No final da década de 1860, os negócios que o ator-empresário mantinha no Norte, tanto no ramo do comércio de produtos de consumo quanto na atividade teatral, já não lhe rendiam os frutos de outrora, como constatamos com o anúncio do leilão de uma vivenda penhorada no Ceará para o pagamento de suas dívidas na praça. Germano Francisco pode ter se sentido motivado, então, a trocar as províncias do Norte pelo Sul. Localizamos notícias de espetáculos esporádicos que ofereceu, em 1868, em Rio Grande – como a récita especial que festejou o “16º aniversário da grande batalha que nos campos de Monte Caseros sepultou o feroz despotismo do ditador João Manoel Rosas”52 –, e em Pelotas, onde encenou O Ultraje, de Barrière e Plouvier, e 29 ou Honra e Glória, de José Romano.53 Em dezembro de 1869, o artista foi contratado como primeiro ator da companhia dramática do empresário José de Almeida Cabral, que se apresentava no Teatro São Pedro54, em Porto Alegre. O repertório era composto por dramas realistas, como Os Íntimos, de Victorien Sardou, e por melodramas de sucesso consolidado, como A Gargalhada e D. César de Bazan. Germano Francisco logo encontrou a oportunidade de retornar aos palcos da Corte do Império. Almeida Cabral dissolveu a trupe, em fevereiro de 1870, e rumou ao Rio de Janeiro com alguns artistas, dentre os quais Germano Francisco.55 No mesmo ano, o ator se tornou diretor de uma companhia dramática no Teatro de São Pedro de Alcântara. A “Empresa Germano” ofereceu espetáculos entre 1870 e 1871, selando, ao que tudo indica, o

52 RIO Grande do Sul. Cearense, Fortaleza, 4 mar. 1868, Noticiário, p. 3. 53 As duas representações em Pelotas foram mencionadas por MÜLLER, 2010, p. 320. 54 O projeto de edificação do Teatro São Pedro data de 1833, quando o presidente da província, Manoel Antônio Galvão, doou um terreno localizado no centro de Porto Alegre para a sua construção. As obras foram interrompidas durante a Revolução Farroupilha, sendo retomadas em 1847. O Teatro São Pedro foi inaugurado a 27 de junho de 1858. A sala de espetáculos continua ativa até os dias atuais. Sobre o teatro, ver FERREIRA, 1956, p. 39-59. 55 Cf. Ibidem, p. 111 e 120-121.

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fim de sua carreira teatral, tendo em vista que, após essa data, as notícias sobre o ator nos palcos se esvaneceram. Durante a maior parte de sua carreira artística e empresarial, Germano Francisco atuou nos principais teatros do Norte. No Teatro de São João (Bahia), além de primeiro ator, iniciou-se como ensaiador. No Teatro de Santa Isabel (Pernambuco) e Teatro São Luiz (Maranhão), organizou companhias dramáticas sob um sistema que, excetuando as subvenções que recebeu dos dois governos, aproximou-se do stock system, modo de exploração do teatro baseado no duplo princípio de “existência de uma trupe permanente (stock), de uma parte; de outra parte, a direção desta é assumida por uma pessoa que é simultaneamente diretor da trupe e diretor do teatro”.56 Nesse sistema, o diretor escolhe os atores, distribui os papéis e dirige as representações, funções que, como averiguamos, foram realizadas por Germano Francisco. Além disso, o stock system prevê que uma parte das representações se faça em outras cidades ou teatros, mas que essa exploração externa permaneça secundária face à atividade principal, que é a permanência em um teatro. As companhias dramáticas dirigidas por Germano Francisco também apresentaram essa característica, tendo em vista que, durante os momentos de renovação dos contratos ou de suspensão temporária dos espetáculos no teatro permanente, neste caso em Pernambuco e Maranhão, o diretor, acompanhado dos artistas de maior destaque de sua companhia realizaram temporadas no Teatro Thaliense (Ceará), no Teatro Providência (Pará), no Teatro de São Januário (Rio de Janeiro), no Teatro Sete de Setembro e no Teatro Sete de Abril (Rio Grande do Sul). O repertório que Germano Francisco representou nas províncias brasileiras era constituído, majoritariamente, por traduções de melodramas franceses. Protagonizou com frequência peças do repertório de João Caetano, como A Dama (O Marinheiro) de Saint- Tropez, A Gargalhada, A Graça de Deus e D. César de Bazan. Apesar de representar os melodramas de grande sucesso, Germano Francisco se distinguiu de João Caetano por ter apresentado um repertório diversificado de peças musicadas e farsas. O ator protagonizou o papel do Príncipe Henrique na ópera bufa em dois atos Cosimo ou o Príncipe Caiador (Cosimo, TOC, 1835), de Saint-Hilaire e Duport; representou a personagem Conde de São Germano na peça em três atos entremeada de cantos O Diabo ou o Conde de São Germano, também denominada O Conde de São Germano ou o Diabo em Paris (Le Comte de Saint-Germain, TVa, 1834), de Depeuty e Fontan; e encenou a comédia-

56 LEROY, 1990, p. 213-214. No original: “existence d’une troupe permanente (stock), d’une part ; d’autre part, la direction en est assumée par une personne qui est à la fois directeur de troupe et directeur de théâtre.”

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vaudeville em três atos As Memórias do Diabo (Les Mémoires du Diable, TVa, 1842), de Étienne Arago e Eugène Guinot.57 Germano Francisco também montou nas províncias peças musicadas brasileiras, como O Remendão de Smyrna ou um Dia de Soberania, de Burgain, representado em fevereiro de 1852, no Teatro de Santa Isabel. Esse vaudeville em três atos havia sido criado no Teatro de São Januário, em 1839, pela companhia dramática portuguesa de Ludovina Soares. Ou seja, o gênero já estava presente nos palcos do Rio de Janeiro antes da chegada da companhia francesa de Ernest Gervaise, em 1841. Representou nos teatros do Norte e do Sul do Império O Fantasma Branco, de Macedo, que estreara a 22 de junho de 1851, no Teatro de São Pedro de Alcântara, ensaiada por João Caetano. Em Pelotas, Germano Francisco encenou A Saloia, de Joana de Noronha, argentina radicada no Brasil e casada com o músico português Francisco de Sá Noronha. Estudada como romancista e pelas contribuições ao jornalismo feminino, Joana de Noronha é praticamente desconhecida como dramaturga. A Saloia é um drama ornado de música que trata da condição social de uma atriz (a saloia), que decide os rumos de seu destino, abdicando do casamento com um grande amor em favor de sua carreira artística. Ao lado dos heróis dos melodramas e das peças musicadas, Germano Francisco, a partir da formação de sua companhia dramática em Pernambuco, em 1850, passou a encenar também papéis farsescos. Isso revela sua versatilidade como ator, capaz de se adequar tanto aos tipos sérios dos melodramas quanto aos cômicos. Sua companhia dramática desempenhou um importante papel na difusão da dramaturgia de Martins Pena nas províncias de Pernambuco e Maranhão. Em Pernambuco, os artistas montaram Os Irmãos das Almas e Quem Casa, Quer Casa, no Maranhão, O Noviço e O Juiz de Paz da Roça, e nas duas províncias, O Diletante, Os Dois ou o Inglês Maquinista e O Judas em Sábado de Aleluia. Nas representações de O Diletante, Germano Francisco desempenhava o papel do paulista Marcelo, e de O Judas em Sábado de Aleluia, encarnava o espevitado Faustino. A atuação de Germano Francisco nas províncias do Norte em papéis cômicos criados por Martins Pena permite propor algumas considerações sobre a presença da dramaturgia desse autor nos palcos brasileiros. Dos atores-empresários mais importantes da época, Germano Francisco foi o mais receptivo às produções farsescas de Martins Pena. Como constatamos a partir das representações, as peças desse autor obtiveram aceitação nos palcos, não apenas do Rio de Janeiro, mas também das províncias do Norte. E confirmamos

57 Ver anexo “Tabela 20 – Repertório Francês de Germano Francisco nas Províncias (1848-1864)”.

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que, com exceção de Vitiza ou o Nero de Espanha, montado em setembro de 1845 no Teatro de São Pedro de Alcântara, no Rio de Janeiro, os demais melodramas do autor não conheceram as luzes da ribalta.

3.4 Florindo Joaquim no Sul do Império

Se João Caetano construiu sua glória como o artista nacional, sobretudo nos palcos do Rio de Janeiro, e Germano Francisco obteve êxito como empresário teatral nas salas de espetáculos do Norte do Império, Florindo Joaquim, por sua vez, obteve espaço em companhias dramáticas do Rio Grande do Sul. A primeira estadia no Sul do Império ocorreu em 1849, quando o ator integrou a trupe de Jacinto Heller, instalada no Teatro D. Pedro II58, em Porto Alegre. Florindo Joaquim protagonizou o drama A Mulher do Artista, do autor porto-alegrense Miguel Pereira de Oliveira Meireles (1828-1872), e Pedro Sem que já teve e agora não tem, de Burgain.59 Retornou ao Rio de Janeiro e, em novembro de 1849, reintegrou-se ao Teatro de São Pedro de Alcântara, em espetáculo no qual protagonizou O Marinheiro de Saint-Tropez. Florindo Joaquim rumou novamente ao Sul do Império, em 1853, logo após ter dissolvido a companhia dramática que dirigiu no Teatro de São Francisco. Entre 1853 e 1856, atuou nos principais teatros de Pelotas, Rio Grande, Porto Alegre e Jaguarão, como integrante da trupe do empresário teatral João Ferreira Bastos.60 Protagonizou traduções de melodramas franceses que faziam parte de seu repertório no Rio de Janeiro, tais como Pedro Landais ou o Alfaiate Ministro e Gabrina ou a Coroa Ducal de Parma, e peças do repertório de João Caetano, a exemplo de Kean.61 Além da representação de peças francesas, Florindo Joaquim também levou aos palcos do Sul do Império obras brasileiras montadas no Rio de Janeiro. Em Pelotas, em junho de 1854, representou O Cego, de Macedo, drama que encenara no Rio de Janeiro, em 1849, ao lado de João Caetano, e a tragédia Antônio José ou o Poeta e a Inquisição, de Gonçalves de

58 Em 1838, uma sociedade dramática particular foi formada para a edificação de um teatro em um terreno situado à Rua de Bragança. A sala de espetáculos, nomeada Teatro D. Pedro II, foi relegada a segundo plano quando o Teatro São Pedro, maior e mais elegante, foi erigido nas proximidades da Praça da Matriz. (Cf. BITTENCOURT, Ezio. Os Primeiros teatros do Rio Grande do Sul. Anais do XXIV Simpósio Nacional de História – ANPUH. São Leopoldo, 2007, p. 6-7. Disponível em: . Acesso em: 5 nov. 2015. 59 Cf. FERREIRA, 1956, p. 26. 60 Cf. HESSEL & RAEDERS, 1979, p. 223-224. 61 Ver anexo “Tabela 21 – Repertório Francês de Florindo Joaquim no Rio Grande do Sul (1853-1855)”.

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Magalhães. Em outubro do mesmo ano, representou Pedro Sem que já teve e agora não tem, de Burgain. Quando João Caetano esteve em Pelotas, em outubro de 1854, os dois primeiros atores compartilharam o Teatro Sete de Abril. A curta turnê de João Caetano não parece ter comprometido o espaço conquistado por Florindo Joaquim nesse teatro. O público pelotense, além das demonstrações de apreço pelo grande intérprete da cena nacional, também direcionou sua atenção a Florindo Joaquim, dedicando-lhe versos, os quais, seguindo a prática recorrente na época, eram lidos durante os espetáculos e publicados pela imprensa.62 O artista regressou ao Rio de Janeiro, a 16 de janeiro de 1856, vindo de Porto Alegre com sua família.63 Nos anos seguintes, atuou no Teatro de São Januário e Teatro de São Pedro de Alcântara. Em 1865, retornou ao Sul do Império. No Teatro Sete de Abril, em Pelotas, protagonizou o drama O Escravo Fiel, de Carlos Antônio Cordeiro (1812-1866), em setembro de 1866. Carlos Cordeiro, bacharel em ciências sociais e jurídicas, foi também dramaturgo e sócio do Conservatório Dramático Brasileiro.64 O Escravo Fiel, peça em que “os males da escravidão estão presentes em sua ação dramática”65, havia estreado no Teatro de São Pedro de Alcântara, no Rio de Janeiro, em dezembro de 1859, ensaiado por João Caetano e com Florindo Joaquim no papel do escravo negro Lourenço.66 O drama, ao representar um escravo fiel ao seu senhor, revela o posicionamento do autor em defesa da integração desse tipo de escravo “à sociedade e à família branca”.67 De carreira empresarial tímida, Florindo Joaquim esteve condenado a ser um artista de segundo plano nos teatros do Rio de Janeiro. No final da década de 1850, após as duas tentativas fracassadas de manutenção de companhias dramáticas independentes, nas quais atuou como primeiro ator, ensaiador e empresário, acabou sendo incorporado por João Caetano ao Teatro de São Pedro de Alcântara. Além das iniciativas empresariais no Rio de

62 Como exemplo, transcrevemos um acróstico publicado pelo periódico O Pelotense: “Famoso Florindo, ator sublimado, / Luzeiro brilhante do Sete de Abril, / O teu raro gênio, de glória adornado, / Resplandece fulgores em todo o Brasil. / Invida um esforço, terás conquistado / Não só mil aplausos, não só coroas mil, / Da pátria verás na lúbrica história. / O nome Florindo coberto de glória”. (O PELOTENSE, Pelotas, 8 mar. 1853, A pedidos, p. 2 apud MÜLLER, 2010, p. 179). 63 Cf. REGISTRO do Porto. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 17 jan. 1856, p. 1. 64 Cf. CARLOS Antonio Cordeiro. In: BLAKE, vol. 2, 1899, p. 44-47. 65 FARIA, João Roberto. Teatro romântico e escravidão. Teresa – Revista de Literatura Brasileira, São Paulo, n. 12-13, 2013, p. 102. Disponível em: . Acesso em: 15 nov. 2015. 66 Cf. THEATRO de S. Pedro de Alcântara. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 24 dez. 1859, Teatros, p. 4. 67 AZEVEDO, Elizabeth. R. Presença ausente/ausência presente – índios e negros no drama brasileiro do século XIX. Anais do XXVI Simpósio Nacional da História – ANPUH, São Paulo, jul./2011, p. 7. Disponível em: . Acesso em: 15 nov. 2015.

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Janeiro, conseguiu maior liberdade artística quando trabalhou nos teatros do Rio Grande do Sul, onde encontrou oportunidades para interpretar os protagonistas do repertório encenado.

3.5 Joaquim Augusto no Sul e em São Paulo

Em março de 1845, o ator português Francisco Fructuoso Dias68 partiu com sua companhia dramática para o Rio Grande. Joaquim Augusto estava entre os artistas da trupe. A companhia dramática se instalou no Teatro Sete de Setembro, onde encenou Os Dois Renegados, de Mendes Leal, em espetáculo comemorativo que contou com as presenças das majestades imperiais, D. Pedro II e Teresa Cristina, que visitavam a província do Rio Grande do Sul na ocasião. Joaquim Augusto retornou ao Rio de Janeiro em 1849. Em setembro desse ano, apresentou-se no Teatro de São João, na Bahia, onde protagonizou A Morte de Camões, de Burgain, e Teresa, de Dumas (pai). Regressou aos teatros do Rio de Janeiro. Entre meados de 1854 e 1855, dirigiu uma companhia dramática em São Paulo. Protagonizou melodramas franceses do repertório de João Caetano, como A Graça de Deus, D. César de Bazan, O Marinheiro de Saint-Tropez, Os Seis Degraus do Crime e Trinta Anos ou a Vida de um Jogador, e outros que faziam parte de seu repertório no Rio de Janeiro, como A Escrava Andréa (L’Esclave Andréa, TPSM, 1837), de Julien de Mallian e Alfred Legoyt, Joana de Flandres (Jeanne de Flandre, TAC, 1835), de Louis-Marie Fontan e Victor Herbin, e O Peregrino Branco ou os Meninos da Aldeia (Le Pélerin Blanc, TAC, 1801), de Guilbert de Pixerécourt. Em dezembro de 1855, Joaquim Augusto partiu para o Rio Grande do Sul, onde permaneceu até 1858. Participou da Companhia Dramática Provincial, que representou no Teatro D. Pedro II, em Porto Alegre, peças do repertório de João Caetano, como A Dama de Saint-Tropez, A Gargalhada, D. César de Bazan, Kean e Os Sete Infantes de Lara.69 Fez reentrada no Teatro de São Pedro de Alcântara, no Rio de Janeiro, em 1859 e, nos anos seguintes, atuou no Teatro Ginásio Dramático. Joaquim Augusto retornou a São Paulo em abril de 1862. Solicitou subvenção ao governo da província para manter uma companhia dramática ativa. Em carta a F. Quirino dos

68 Antes de embarcar para o Brasil, Francisco Frutuoso Dias havia dirigido uma companhia dramática no Teatro do Salitre, em Lisboa. Aportou no Rio de Janeiro a 21 de julho de 1843. Logo, passou a fazer parte da companhia dramática do Teatro de São Pedro de Alcântara. 69 Cf. HESSEL & RAEDERS, 1979, p. 209.

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Santos, o ator esclareceu que sem o auxílio do governo seria obrigado a desistir da carreira teatral. Assim como os outros empresários brasileiros da época – João Caetano, Florindo Joaquim e Germano Francisco –, Joaquim Augusto também defendeu a ideia da necessidade do incentivo financeiro do governo para a manutenção das companhias dramáticas.

Desde o dia em que cheguei a São Paulo, o meu trabalho e vida são-lhe patentes. Peço que não se esqueça de dizer que ouço pessimamente desde a idade de quatro anos. Quanto ao mais, espero... o que espero eu? Espero a realização da profecia de Emílio Doux, se o governo quiser lançar os olhos sobre o teatro. Do contrário suponho que terei de voltar as costas a Melpomene e Thalia, para ir vender cebolas ou aguardente, adquirindo assim direito a ser juiz de paz na minha freguesia.70

O ator-empresário foi agraciado com uma subvenção do governo paulista na quantia de três contos de réis mensais.71 Permaneceu como diretor da companhia dramática até 1866, quando retornou ao Rio de Janeiro. Regressou a São Paulo em 1868, como integrante da trupe da atriz Eugênia Câmara. Ainda que representasse peças realistas, o repertório que Joaquim Augusto protagonizou no Teatro de São José72 não ignorou os melodramas de sucesso consolidado, como A Gargalhada, A Graça de Deus, O Marinheiro de Saint-Tropez e Trinta Anos ou a Vida de um Jogador.73

3.6 Os artistas brasileiros nos palcos de Lisboa

Em janeiro de 1858, Germano Francisco retornou aos palcos da Corte após anos de ausência, período em que realizara temporadas nas principais províncias brasileiras e viajara para a Europa. O ator, segundo uma notícia publicada pelo periódico fluminense Correio Mercantil, regressou ao Rio de Janeiro com maior experiência, graças à estadia no Velho Mundo e ao contato que estabelecera com os “mestres” do teatro português.

O Sr. Germano é hoje quase uma novidade para a cena fluminense. Retirado dela há muitos anos, o seu reaparecimento deve causar no público, que já conhece e apreciou o seu não vulgar talento, uma expectação a que o nosso patrício não deixará de corresponder, porque, tendo viajado pela Europa, vendo e estudando a sua arte

70 SOUZA, Joaquim Augusto Ribeiro de. Carta apud SANTOS, 1863, p. 351. 71 Cf. LEIS Provinciais. Correio Paulistano, São Paulo, 14 maio 1863, p. 2. 72 O Teatro de São José, inaugurado em setembro de 1864, foi palco de diversas companhias dramáticas e de estrelas internacionais, como Sarah Bernhardt. Foi destruído em 1898 por um incêndio. Sobre o Teatro de São José, ver AMARAL, 1979, p. 61-159. 73 Ver anexo “Tabela 22 – Repertório Francês de Joaquim Augusto nas Províncias (1849-1868)”.

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em seus mais fiéis representantes, é de crer que o seu talento tenha ganho muito com a lição dos mestres que teve a fortuna de conhecer.74

Após o retorno de Portugal, em 1856, informações sobre a viagem ecoaram na recepção de Germano Francisco pelas regiões brasileiras. Em Pernambuco, ao representar o vaudeville O Duque de Roquelaure ou o Homem Mais Feio da França (Roquelaure ou l’Homme le Plus Laid de France, TG, 1836), de Adolphe de Leuven, Charles de Livry e Léon Lhérie, o anúncio do espetáculo destacou que “foi esta comédia em que o artista Germano, em Lisboa, fez a sua prova pública neste gênero, no Teatro do Ginásio, e em que obteve um triunfo completo”.75 A estadia na Europa conferiu ao artista a notoriedade que lhe faltava em solo brasileiro, principalmente no Rio de Janeiro, uma vez que não usufruía do status de estrela nacional, pertencente unicamente a João Caetano. A viagem de Germano Francisco foi possível graças aos avanços nos meios de transporte a vapor, que dinamizaram o deslocamento de mercadorias e pessoas entre o Brasil e a Europa (Inglaterra, Portugal, Espanha, França).76 Com linhas de transportes eficientes, o Império brasileiro pôde se inserir, a partir da segunda metade do século XIX, de modo mais frequente, nas rotas internacionais das turnês de companhias dramáticas. Porém, o país tropical não foi apenas o destino final de artistas estrangeiros, mas também o ponto de saída de alguns atores, que levaram aos teatros de Lisboa as técnicas cênicas e o repertório que representaram nos palcos brasileiros. João Caetano passou uma temporada na Europa, entre 1860 e 1861. Assim como Germano Francisco, representou no Teatro de D. Maria II, em Lisboa, e visitou Paris para conhecer as salas de espetáculos da capital europeia do teatro. Joaquim Augusto também integrou a lista de artistas brasileiros que viajaram a Portugal. Em 1864, escriturou no Porto atores para sua companhia dramática e representou no Teatro do Ginásio77, em Lisboa, a poesia dramática Cerração no Mar, do portuense José Maria Dias Guimarães. Os três atores-empresários representam exemplos de fluxo de artistas na contramão da prática mais recorrente na época, que era a entrada contínua de portugueses no teatro brasileiro. Nos casos de Germano Francisco e de João Caetano, os dois atores levaram

74 NOTÍCIAS diversas. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 3 jan. 1858, p. 1. 75 THEATRO de Santa Isabel. O Liberal Pernambucano, Recife, 16 nov. 1857, p. 3. 76 Sobre as linhas transatlânticas de paquetes entre o Brasil e a Europa, ver EL-KAREH, Almir Chaiban. O Rio de Janeiro e as primeiras linhas transatlânticas de paquetes a vapor: 1850-1860. História Econômica & História de Empresas, vol. 6, n. 2, 2003, p. 41-53. Disponível em: Acesso em: 14 ago. 2015. 77 O Teatro do Ginásio, de pequenas dimensões, foi inaugurado em 1846. Passou por reformas em 1852 para oferecer melhores instalações ao público. (Cf. VASCONCELOS, 2003, p. 49-51).

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aos palcos de Lisboa a dramaturgia melodramática francesa que receberam, ressignificada segundo a atividade de tradução e a realização cênica no Brasil. Assim, as representações que ofereceram na capital portuguesa ilustram exemplos peculiares de transferência cultural. Nos dois casos que evocamos a circulação envolve um duplo sentido entre Europa e América – da França ao Brasil e do Brasil a Portugal – que, no entanto, não impacta na cultura de partida (França).

3.6.1 Germano Francisco e A Gargalhada

Em 26 de agosto de 1855, Germano Francisco partiu do Maranhão para Lisboa, “com o fim de viajar pela Europa tanto quanto lhe permitirem os seus recursos”.78 Os meios financeiros do artista lhe possibilitaram uma estadia no Velho Mundo que durou até junho de 1856. Acompanhado da atriz Manoela Lucci, o ator pretendia estudar as artes dramáticas portuguesa e francesa, ao passo que buscava, obviamente, uma forma de consagração de sua carreira artística. Germano Francisco fez primeira paragem em Lisboa, apresentando-se no Teatro de D. Maria II79, a 20 de dezembro de 1855. Permaneceu na capital portuguesa até fevereiro de 1856, quando se dirigiu para a França, onde pretendia conhecer os teatros de Paris. Em seguida, visitou “Londres, e algumas cidades da Alemanha”.80 Ao aportar em Portugal, Germano Francisco se apresentou em ensaio geral para uma comissão de homens de letras, dentre os quais se encontrava Mendes Leal, organizada pelo então ministro do reino, Rodrigo da Fonseca Magalhães. A comissão avaliou a atuação do artista brasileiro e o considerou apto para representar no palco do Teatro de D. Maria II.81 Antes da estreia, Germano Francisco fez publicar no periódico Imprensa e Lei, dirigido por Mendes Leal, uma carta direcionada ao público de Lisboa, na qual declarou que o culto da arte, e não a obtenção de lucro, era o que o motivava na arte teatral. Tomou como juiz um povo, “irmão primogênito do seu, tão conhecido pela sua antiga ilustração, como pela

78 NOTÍCIAS teatrais. Marmota Fluminense, Rio de Janeiro, 25 set. 1855, p. 3. 79 O Teatro Nacional D. Maria II, idealizado por Almeida Garrett, incumbido pelo governo português da tarefa de fundar um teatro nacional, foi construído entre 1842 e 1846 em terreno situado no lado norte da Praça de D. Pedro IV, antigo Largo do Rossio. Fortunato Lodi, arquiteto italiano, foi o responsável pela planta do teatro, que apresentava novidades em sua estrutura arquitetônica, como um vasto salão nobre que se assemelhava a um passeio público. Após o incêndio ocorrido em 1964, o teatro foi reconstruído. Sobre a história desse teatro, ver CARNEIRO, Luís Soares. “A arquitetura do Teatro Nacional D. Maria II”. In: BRILHANTE, Maria João (Dir.). Teatro Nacional D. Maria II: sete olhares sobre o teatro da nação. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda: Teatro Nacional D. Maria II, 2014, p. 21-63. 80 A SENTINELA. São Luís, 6 de julho de 1856. A Sentinela, São Luís, 7 jul. 1856, p. 1. 81 Cf. SERRA, 1862, p. 16-17.

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sua cavalheirosa generosidade”. Afirmou confiar no “bom senso, na candura, no sentimento da hospitalidade, e nas ideias de equidade do público português”, para que lhe perdoasse sua formação em uma “escola dramática diversa” e a diferença de pronúncia do idioma, o que poderia causar “estranheza aos ouvidos lisbonenses”.82 Finalizou a carta pedindo conselhos ao público e aos críticos teatrais, para que contribuíssem de forma benevolente com o seu aprendizado da arte dramática. A estreia de Germano Francisco ocorreu a 20 de dezembro de 1855. Segundo uma crítica publicada pelo periódico lisboeta Progresso, a representação, “anunciada por todos os jornais da capital, chamara ao teatro numerosa concorrência, apesar da noite tenebrosa que corria e da chuva que prometia alagar os curiosos”.83 O artista protagonizou A Gargalhada, de Arago, melodrama de seu repertório no Brasil. Uma segunda exibição da peça foi oferecida a 23 de dezembro. Nos dois espetáculos, Germano Francisco desempenhou o papel de Thomaz (André na versão francesa), ao passo que as demais personagens da peça foram interpretadas por atores portugueses da companhia dramática do Teatro de D. Maria II, como Josefa Soller (1822-1864).84 De sua companheira de viagem, a atriz Manoela Lucci, não encontramos indícios de que tenha se apresentado juntamente com Germano Francisco. A tradução representada pelo artista em Lisboa não foi a que ele estava habituado a encenar nos palcos brasileiros, da qual levara consigo uma cópia manuscrita. Mendes Leal fez correções e alterações na tradução para eliminar “as locuções viciosas e antigramaticais”.85 A nova tradução de A Gargalhada, representada por Germano Francisco em Lisboa, foi posteriormente encenada pelo artista no Teatro de São Januário, no Rio de Janeiro, em 1858.

O empresário da companhia dramática do Teatro de S. Januário [Florindo Joaquim] tem a honra de participar ao respeitável público que, tendo chegado a esta Corte o seu colega e amigo o Ilm.º Sr. Germano Francisco de Oliveira, obteve deste distinto artista o favor de trabalhar em sua companhia enquanto se demorar nesta capital. O

82 OLIVEIRA, Germano Francisco. Imprensa e Lei, Lisboa, 20 dez. 1855, p. 2. 83 PROGRESSO apud Diário do Maranhão, São Luís, 29 mar. 1856, p. 2. 84 Filha de atores espanhóis, Josefa Soller nasceu em Lamego, em 1822. Iniciou-se na carreira de atriz representando papéis de criança na companhia ambulante de seu pai. Em Lisboa, foi bailarina no Teatro de São Carlos. Tomou lições com o ensaiador Émile Doux, quando este era empresário do Teatro da Rua dos Condes. Em 1846, passou a integrar a companhia do Teatro de D. Maria II, onde por mais de uma década desempenhou papéis em dramas e melodramas. Em 1859, retornou ao Teatro da Rua dos Condes. Faleceu em Lisboa, em 1864. (Cf. ABREU, Ilda Soares de. “Josefa Soler d’Assis”. In: ESTEVES, João & CASTRO, Zília Osório de. (Dir.). Feminae. Dicionário Contemporâneo. Lisboa: Editorial do Ministério da Educação e Ciência, 2013, p. 393-395). 85 LEAL, José da Silva Mendes. Um artista brasileiro no teatro normal – primeira representação da Gargalhada drama em três atos, por Arago. Imprensa e Lei, Lisboa, 23 dez. 1855, Folhetim, p. 1.

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primeiro espetáculo será dado com a Gargalhada, tradução correta e emendada pelo Sr. Mendes Leal.86

Após as duas representações de A Gargalhada no Teatro de D. Maria II, Germano Francisco viajou para Paris, em fevereiro de 1856, com o objetivo de conhecer os teatros da capital francesa, a fonte do repertório que encenava nos palcos brasileiros. Assim que chegou na cidade, a notícia de sua presença foi publicada pelo impresso semanal Revue Franco- Italienne, a 28 de fevereiro de 1856. A notícia informou os trunfos recentes do artista, como o sucesso que obtivera em Lisboa e a condecoração da Ordem da Rosa conferida pelo governo brasileiro, assim como os objetivos de sua estadia em Paris para estudar os teatros, suas administrações e regulamentos.87 A Revue Franco-Italienne publicava notícias de artistas e críticas dos espetáculos apresentados pelos teatros parisienses e estrangeiros. Muito provavelmente, em função das informações veiculadas pela notícia, o próprio Germano Francisco pode tê-la redigido e enviado para ser publicada pelo jornal, já que este imprimia inserções em suas páginas ao preço de 1,25 francos a linha. Tendo em vista que se tratava de um periódico com uma seção dedicada ao teatro, a notícia sobre a presença de Germano Francisco era um cartão de visitas que permitiria ao ator estabelecer eventuais contatos com figuras do teatro francês e ser reconhecido por artistas que realizaram turnês no Brasil. Uma forma eficiente de autopromoção em terras estrangeiras no século XIX. Em Portugal, Mendes Leal noticiou na Imprensa e Lei a estadia de Germano Francisco na capital francesa. O homem de letras português defendeu, usando como exemplo o caso de Germano Francisco – um artista saído do Brasil para desbravar as terras europeias –, que não haveria fronteiras nacionais para os verdadeiros artistas, uma vez que “as grandes vocações e as boas e legítimas reputações em toda a parte se acham em família”.88

86 THEATRO de S. Januário. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 4 jan. 1858, p. 4. 87 “Um artista dramático célebre no Brasil, Sr. Germano Francisco de Oliveira, chegou a Paris há alguns dias. Ele acaba de obter recentemente em Lisboa um imenso sucesso nas duas representações, dadas no Teatro Normal dessa cidade, do drama português A Gargalhada, do Sr. Jacques Arago. O Sr. de Oliveira, a quem os méritos artísticos valeram, da parte do governo do Brasil, a condecoração da ordem da Rosa, vem a Paris para aqui estudar o estado dos nossos teatros dramáticos, suas administrações e regulamentos, porque o sr. de Oliveira é não somente um grande artista, mas também diretor de uma trupe no Rio de Janeiro”. (CHRONIQUE des Théâtres. Revue Franco-Italienne, 28 fév. 1856, Paris, p. 71. No original: “Un artiste dramatique célèbre au Brésil, M. Germano Francisco d’Oliveira, est arrivé à Paris depuis quelques jours. Il vient d’obtenir tout récemment à Lisbonne un immense succès dans deux représentations, données au Théâtre-Normal de cette ville, du drame portugais La Gargagliada, de M. Jacques Arago. M. d’Oliveira, à qui ses mérites artistiques ont valu, de la part du gouvernement du Brésil, la décoration de l’ordre de la Rose, vient à Paris pour y étudier l’état de nos théâtres dramatiques, leur administration et leurs réglements, car M. d’Oliveira est non seulement un grand artiste, mas il est encore directeur d’une troupe à Rio-Janeiro.”) 88 LEAL, José da Silva Mendes. Variedades. Imprensa e Lei, Lisboa, 12 abr. 1856, p. 3.

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A notícia também repercutiu na imprensa brasileira. O correspondente do Diário do Rio de Janeiro em Lisboa comentou em sua resenha que o artista pretendia “estudar os teatros franceses e aplicar os resultados de suas observações aos teatros do Brasil”.89 Ao reproduzir um trecho da notícia publicada pela Revue Franco-Italienne, que tratava do sucesso do artista em Lisboa, o jornalista observou que sua intenção era a de “registrar estes votos autorizados, que reforçam os louvores e aplausos que o público de Lisboa deu ao ator brasileiro”.90 A estadia em Paris – reconhecida na época como a capital mundial do teatro –, com o objetivo de realizar uma pesquisa de campo que contribuísse para o aprimoramento do teatro no Brasil, conferiu notoriedade a Germano Francisco em sua terra natal. Nesse sentido, os artigos de Mendes Leal foram cruciais para o processo de legitimação do talento do ator e do reconhecimento que angariara na Europa, uma vez que o homem de letras português reforçou o caráter humilde do artista na ânsia pelo aprendizado e divulgou suas atividades em Lisboa e Paris. Na época, os elogios de Mendes Leal conferiram uma chancela ao trabalho artístico de Germano Francisco, como depreendemos das considerações do biógrafo Joaquim Serra.

[...] um artigo escrito por esta forma e assinado Mendes Leal é um monumento de glória, por isso que o distinto literato português, artista de subido engenho, não se tornaria um claqueur por bonomia; não baratearia elogios a quem ele conscienciosamente não achasse que os merecia.91

Os correspondentes brasileiros em Lisboa também atuaram nesse processo de atribuição de notoriedade a Germano Francisco. Reproduziram nos periódicos do Rio de Janeiro e das províncias as notícias das imprensas lisboeta e parisiense, que destacaram o bom desempenho de Germano Francisco em A Gargalhada e os seus nobres objetivos de aprendizagem da arte dramática do Velho Mundo.92

89 CHRONICA diária. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 21 abr. 1856, p. 1. 90 CORRESPONDÊNCIA do Diário. Portugal. Lisboa, 13 de abril. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 8 maio 1856, Exterior, p. 2. 91 SERRA, 1862, p. 23, grifo do autor. 92 Com a circulação transatlântica dos periódicos e a atuação dos correspondentes, os leitores dos jornais brasileiros se informavam sobre o repertório e os artistas que representavam nos palcos parisienses, londrinos, lisboetas etc. Sobre a atuação nos periódicos brasileiros dos correspondentes em Lisboa e Paris na divulgação de notícias sobre a atividade teatral, remetemos ao estudo de caso que realizamos em torno do drama A Dama das Camélias, de Alexandre Dumas (filho). Ver RONDINELLI, Bruna Grasiela da Silva. A Dama das Camélias Desembarca no Rio de Janeiro: encenações e recepção crítica (1856-1860). Miscelânea, Assis, vol. 14, p. 103- 123, jul.-dez./2014.

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Mas, afinal, o que Germano Francisco pode ter conferido nos palcos parisienses, em março e abril de 1856, para colaborar com o seu aprendizado da arte dramática? O que estava em cartaz nos teatros de Paris nos meses em que o ator ali permaneceu? Germano Francisco esteve diante de um leque de possibilidades para se deleitar nas salas de espetáculos. De operetas e vaudevilles a dramas e tragédias, estavam em cartaz nos teatros parisienses peças que foram canonizadas e outras, esquecidas. O Théâtre de l’Odéon apresentava Le Cid, de Corneille, a Comédie-Française, Le Tartuffe, de Molière, o Gymnase Dramatique, Le Demi-Monde, de Dumas (filho), a Opéra-Comique, Manon Lescaut, de Scribe. No bulevar popular, os dramas Le Courrier de Lyon, de Siraudin, Moreau e Delacour, Henri III, de Dumas (pai), e Le Paradis Perdu, de Dennery e Dugué, eram o menu oferecido aos espectadores do Théâtre de la Gaîté e do Théâtre de l’Ambigu-Comique. A atriz italiana Adelaide Ristori, que estava em turnê no Théâtre Italien, protagonizava as heroínas das tragédias Mirra e Rosmunda, de Alfieri. Após a curta estadia em Paris, Germano Francisco retornou a Lisboa. Em abril de 1856, Mendes Leal comunicou na Imprensa e Lei que o ator brasileiro daria “duas ou três representações no famoso Teatro do Ginásio, manifestando-se num gênero diferente daquele em que revelou o seu alto mérito no teatro normal”.93 A 18 de maio, Germano Francisco protagonizou o vaudeville O Duque de Roquelaure ou o Homem Mais Feio da França, peça que encenaria mais tarde no Brasil. O vaudeville foi reprisado a 23 de maio, em espetáculo beneficente em favor do próprio artista, “cujo produto é por ele aplicado em benefício da casa pia de Lisboa”.94 O espetáculo, segundo Mendes Leal, foi “honrado com a presença de Sua Majestade El-Rei o Senhor D. Pedro V”.95 Mendes Leal analisou a primeira récita de O Duque de Roquelaure no periódico Imprensa e Lei. Para o dramaturgo português, apesar de duas circunstâncias desfavoráveis – “o tipo de herói da comédia, popular em França, mas estranho à grande maioria do nosso público; a locução defeituosa de uma versão demasiadamente literal” –, o artista brasileiro provou, ao protagonizar uma peça cômica, “a flexibilidade e maleabilidade do seu talento”. O que lhe rendeu novamente, nos finais dos atos, uma salva de palmas do público lisboeta, assim como ocorrera meses antes na representação de A Gargalhada. No entanto, mesmo reconhecendo a boa recepção que o artista obtivera ao representar um papel cômico, Mendes

93 LEAL, José da Silva Mendes. O artista brasileiro. Imprensa e Lei, Lisboa, 29 abr. 1856, p. 3. 94 THEATRO do Gymnasio. Imprensa e Lei, Lisboa, 22 maio 1856, Espetáculos, p. 4. 95 LEAL, José da Silva Mendes. Folhetim. Imprensa e Lei, Lisboa, 21 maio 1856, p. 1.

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Leal concluiu que a vocação de Germano Francisco se encontrava na representação de peças de elevado sentimento e paixão, nas quais conseguia imprimir seu espírito e coração.

O gênio do Sr. Oliveira compraz-se no sentimento elevado, na paixão veemente, nos lances arrojados que são o nervo e a força das mais sérias concepções do espírito. Está ali o ator trágico, com todos os dotes de expressão e locução que tornam este eminente. Está ali a ação enérgica, a voz vibrante, o gesto audaz que faz estremecer as mais íntimas fibras do coração. Viu-se no modo com que pronunciou. Bem dizia Sócrates: a beleza não está no rosto, está no coração! Ninguém o faria melhor!96

As apresentações do artista em Lisboa ecoaram na imprensa brasileira por meio da atuação dos correspondentes na Europa. O jornalista do Correio da Tarde, folha do Rio de Janeiro, afirmou que o público apreciou favoravelmente as habilidades dramáticas de Germano Francisco e “deu-lhe merecidos aplausos, porque o ator compreendeu e desempenhou maravilhosamente o seu papel, mostrando muita habilidade e talento na arte a que com tanto esmero se dedica”.97 O Jornal do Commercio, do Rio de Janeiro, narrou o debute do artista no Teatro de D. Maria II e destacou os aplausos e bravos recebidos “no 2º e 3º ato, em que brilha pela expressão e naturalidade com que desempenha o papel de alienado [...] sendo chamado ao proscênio no fim de ambos os atos”.98 Para agradecer ao público de Lisboa, Germano Francisco fez uso da imprensa mais uma vez. Em carta de despedida, o artista se mostrou grato pelos aplausos que, honrosamente, coroaram “os esforços aplicados ao constante estudo que fez durante o curto espaço de tempo que habita esta bela capital”. Para o ator, o triunfo obtido diante da plateia lisboeta o motivava a continuar rumo ao aperfeiçoamento “na sua dificílima arte”. Germano Francisco agradeceu aos artistas portugueses, sem nomeá-los, que se apresentaram no melodrama A Gargalhada “pela nobre fraternidade com que o trataram desde a primeira vez que com eles praticou”. Reconheceu os conselhos e favores que recebeu de Luiz da Costa Pereira (1819-1893), ensaiador do Teatro de D. Maria II99, e os empenhos de D. Pedro de Menezes Brito do Rio, comissário régio do teatro100, por tê-lo recebido em Portugal e pelo

96 Ibidem. 97 CORRESPOND. do Correio da Tarde. Lisboa, 13 de janeiro de 1856. Correio da Tarde, Rio de Janeiro, 4 fev. 1856, Exterior, p. 1. 98 CORRESP. do Jornal do Commercio. Lisboa, 7 de janeiro de 1856. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 2 fev. 1856 (Suplemento ao n. 33), Exterior, p. 1. 99 Além de diretor artístico do Teatro de D. Maria II, Luiz da Costa Pereira foi colaborador de periódicos e compôs as obras Mistérios d’Alma, Recordações de Viagem, Leituras sobre Astronomia e Reflexos, Poesia e Prosa Varia. (Cf. LUIZ da Costa Pereira. In: SILVA, tomo XVI, 1858, p. 11-12). 100 Brito do Rio foi nomeado comissário régio do Teatro de D. Maria II em 1853, quando a administração da sala de espetáculos passou ao Estado português. Auxiliado pelo diretor artístico, Brito do Rio, que se reportava diretamente ao ministro do Reino, era responsável pela fiscalização do teatro, ocupando-se de questões

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“modo por que de pronto fez dar andamento à sua primeira representação”.101 Germano Francisco agradeceu, por fim, aos críticos da imprensa pelas considerações positivas que redigiram. A carta de despedida de Germano Francisco revela dois aspectos de sua viagem a Portugal. Primeiro, o artista reforçou que a estadia foi motivada não por interesse econômico, mas pelo gosto sincero que nutria pela arte dramática e pelo desejo de aprender com os mestres do teatro europeu. De fato, de acordo com Mendes Leal, o ator não recebeu pagamento pelas récitas nas quais trabalhou, exigindo apenas um benefício cuja renda foi revertida em prol de uma entidade lisboeta: “O artista [...] não solicitou senão uma compensação do seu trabalho, cujo fruto generosamente abandona aos seus irmãos da arte. Esta compensação foi a faculdade de dispor de uma récita, em benefício de um estabelecimento pio!”102 Segundo, Germano Francisco não se aventurou às escuras em terras lusas. Os laços de amizade e os favores que recebeu do ensaiador e do comissário régio do Teatro de D. Maria II possibilitaram sua inserção nessa sala de espetáculos. Ademais, os elogios proferidos pela imprensa, principalmente advindos da pena de Mendes Leal, homem de letras experiente, reconhecido na época pelos serviços prestados ao teatro nacional português, como dramaturgo e membro da primeira comissão administrativa do Teatro de D. Maria II, asseguraram-lhe certa notoriedade para se movimentar no meio teatral e ser bem recebido pela plateia lisboeta. Contudo, se as críticas foram elogiosas ao tratarem do desempenho do artista, não economizaram linhas para sentenciarem que A Gargalhada era uma peça medíocre em termos de estrutura dramática. Para Mendes Leal, em crítica publicada pelo periódico Imprensa e Lei, “o drama da Gargalhada vale pouco [...] há ali a base de um drama; mas não se pode dizer que o drama saísse, vivo e feito, robusto e viril, das mãos do seu criador”.103 Segundo Ernesto Biester, em crônica veiculada por A Ilustração Luso-Brasileira, em A Gargalhada “há apenas uma intenção dramática diluída em três atos faltos de vida e movimento”.104 A Gargalhada ilustra as fronteiras porosas entre os gêneros dramáticos nas produções da cena romântica. Neste caso, elementos do vaudeville penetram na estrutura do

administrativas, econômicas e artísticas que garantissem o bom funcionamento do estabelecimento. Foi substituído por D. António da Costa de Sousa Macedo, que assumiu a função em agosto de 1860. (Cf. VASCONCELOS, Ana Isabel. “Etapas legais da vida de um teatro nacional”. In: BRILHANTE, 2014, p. 74 e 78-79). 101 OLIVEIRA, Germano Francisco de. Imprensa e Lei, Lisboa, 5 jan. 1856, p. 2. 102 LEAL, 29 abr. 1856, p. 3. 103 Idem, 23 dez. 1855, p. 1. 104 BIESTER, Ernesto. Crônica Semanal. A Ilustração Luso-Brasileira, Lisboa, 3 maio 1856, p. 8.

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melodrama, o que levou o cronista português Sikiskoff, em crítica que analisava o debute de Germano Francisco no Teatro de D. Maria II, a classificar A Gargalhada como comédia- drama. Muito provavelmente, por conhecer Arago como um experiente vaudevilliste, Sikiskoff mostrou estranhamento, ao constatar que “é uma peça, que em nossa opinião fica muito aquém do grande engenho que a traçou; ou, antes, não parece produção de Arago”.105 De acordo com Mendes Leal, o interesse por A Gargalhada provinha “mais da execução que da concepção”.106 Para justificar a assertiva, o dramaturgo português se pautou em duas justificativas. Primeiro, como lhe confiaram amigos que habitaram no Rio de Janeiro, a peça se mantinha em cartaz nos teatros brasileiros devido à rivalidade entre João Caetano e Germano Francisco, que mediam forças no protagonismo dos melodramas, a exemplo da criação da personagem André de A Gargalhada.

A fortuna que o tem sustentado nos teatros do império nas mãos de dois artistas rivais, e ambos altamente nomeados, confirma esta ideia, corroborada ainda na quinta-feira no Teatro Normal. [...] Dizem pessoas, que tem habitado o Rio de Janeiro, que o terceiro ato desta peça é o triunfo mais brilhante do célebre ator João Caetano dos Santos, de quem o Sr. Germano é competidor no Brasil.107

A segunda justificativa explicava o interesse pela peça devido aos méritos da performance de Germano Francisco, elogiada unanimemente pelos críticos lisboetas. Estes destacaram o desempenho do ator no final do segundo ato e ao longo do terceiro, nas cenas em que a personagem André, sofrendo de alucinações, desferia repetidas gargalhadas que expressavam seu estado de loucura. Para Mendes Leal, “o olhar vivido e seguro, a dicção fácil e correta, a ação cuidadosamente calculada, e a inteligente divisão do período”108 foram os méritos da performance do artista brasileiro, que conseguiu exprimir a paixão e a loucura do protagonista. O ator não somente desempenhou adequadamente o papel, dando vida aos seus sentimentos, como também eletrizou a plateia, comovendo-a com as emoções experimentadas pela personagem em seu estado de loucura.

O final do segundo ato foi uma comoção unânime. Aquela gargalhada estridente, pavorosa, mais terrível que todas as convulsões do choro, anúncio inesperado de uma alienação repentina, e, todavia, preparada pelo ator com arte esmerada, fez estremecer uma fibra íntima no coração de todos os espectadores. Era um rir mais

105 SIKISKOFF. Fim de ano. Teatro de D. Maria II. A Gargalhada. Um ator brasileiro. Opinião. Imprensa e Lei, Lisboa, 30 dez. 1855, Folhetim, p. 1. 106 LEAL, 23 dez. 1855, p. 1. 107 Ibidem, p. 1-2. 108 Ibidem, p. 2.

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que humano; era um rir que doía em desafio às lágrimas. Ficava uma sensação opressiva.109

Ernesto Biester, homem de letras do círculo de Mendes Leal, comparou a criação de Germano Francisco da personagem André com a do ator francês Charles Lemaître (1830- 1870), segundo filho de Frédérick Lemaître, que realizava temporada de espetáculos em teatros de Lisboa, em 1856. O crítico concluiu que “é opinião de todos os entendidos que o paralelo não é favorável ao artista francês. [...] A gargalhada, que revela o delírio na boca do Sr. Germano, excitou uma comoção profunda. Charles Lemaître nesta peripécia capital ficou- lhe extremamente inferior”.110 Parte da crítica portuguesa, ao lado das avaliações elogiosas, fez uma ressalva sobre a performance do ator. A advertência proveio menos do sotaque do artista que de sua declamação e gestual calcados na mise en scène romântica. De fato, os críticos elogiaram os esforços de Germano Francisco na tentativa de amenizar o sotaque. Para Sikiskoff, “o Sr. Germano venceu uma grande dificuldade, e destruiu muitas apreensões. Referimo-nos à pronúncia, que era por certo o maior obstáculo com que o digno ator tinha que lutar”.111 O crítico teatral do periódico Pátria mostrou admiração pela dicção do ator, que conseguiu “quase esconder a pronúncia nativa”.112 Por outro lado, não poupou sua pena para repreender a declamação, recoberta de sentimentalismo e entonações.

No primeiro ato, onde se revela mais a comédia da atualidade, é que se mostrou mais inexperiente, acomodando pouco a sua declamação à verdade, e ressuscitando por vezes a velha escola. Nos outros atos, logo que feriu a corda do sentimentalismo, mostrou-se ator consciencioso e dramático.113

O mesmo tom crítico foi adotado por um jornalista do Progresso, que, apesar de reconhecer a inteligência do artista, observou que sua gesticulação era exagerada e que as entonações que imprimiam aos diálogos “passaram de moda”. A culpa, no entanto, segundo o crítico, não era do ator, mas da escola dramática no Brasil, “onde a arte, segundo nos afirmam, não sofre reforma há quarenta anos”.114 O crítico também avaliou o desempenho de Germano Francisco na famosa cena em que o protagonista dá gargalhadas (cena quatorze do

109 LEAL, 23 dez. 1855, p. 2. 110 BIESTER, 3 maio 1856, p. 8. 111 SIKISKOFF, 30 dez. 1855, p. 1. 112 PÁTRIA apud Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 19 fev. 1856, p. 1. 113 Ibidem. 114 PROGRESSO, 29 mar. 1856, p. 3.

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segundo ato). Ao contrário de Ernesto Biester, fez uma ressalva na atuação, pois considerou que a gargalhada que o ator dera não era adequadamente verdadeira.

Uma gargalhada de louco (digam-no aqueles que cultivam a arte) é uma das mais sérias dificuldades que o ator pode vencer. Aquele rir convulso e desconcertado não se gradua facilmente para produzir efeito. Fraco, é importante para comover os ânimos. Exagerado, cai no ridículo e em vez de comover, provoca hilaridade e mata o ator juntamente com o drama. O Sr. Germano, que nos dizem ter estudado aquela situação num hospital de alienados, pudera ser mais feliz ou mais verdadeiro. Pareceu-nos ser muito extensa aquela gargalhada estridente e convulsa, e a repetição, sem destaque marcado, produziu-nos mau efeito. Preparara, sobretudo, a situação com habilidade de mestre, e se não foi verdadeiro quando desejáramos foi ao menos consciencioso.115

Consciente de que o jogo cênico de Germano Francisco se fundamentava na escola romântica, o crítico concluiu que, tendo em vista “a sua voz vigorosa e sonora, o seu gesto nobre e seguro, a sua fisionomia e figura”, o ator brasileiro obteria grande sucesso se protagonizasse “os dramas da escola de Victor Hugo ou de Alexandre Dumas”.116 Dramas frenéticos que exploram os temas das paixões arrebatadoras, levando a mortes impactantes como solução viável ao nó do enredo. Tendo em vista que se tratava de uma récita especial, que marcava sua estreia nos palcos de Lisboa, o que teria motivado Germano Francisco a escolher A Gargalhada? Por que confiou seu sucesso no Teatro de D. Maria II a esse melodrama francês? Nessa época, A Gargalhada era uma peça bem-sucedida nos palcos brasileiros, representada por João Caetano e Florindo Joaquim no Rio de Janeiro, e difundida nas províncias do Império por Germano Francisco. Isso certamente foi o fator que motivou a escolha do ator em Lisboa. Em Paris, no entanto, A Gargalhada não conheceu nenhum sucesso, nem provocou qualquer tipo de repercussão junto ao público e crítica. Ao contrário, como constatamos pelas reprises durante duas décadas, o melodrama obteve tamanho sucesso no Brasil. Como explicar a boa aceitação de A Gargalhada nos palcos brasileiros? O melodrama de Jacques Arago e Alexandre Martin avalia se os fins justificariam os meios: um homem probo pode roubar para pagar um tratamento médico a sua mãe adoecida? A punição divina, manifestada pela loucura humana, e a autopunição provam que a resposta defendida pela peça é negativa, e que é sempre necessário lutar contra o pecado do roubo para manter a consciência no caminho do bom cristão.

115 Ibidem. 116 Ibidem.

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Esse tema moralizante e os efeitos patéticos, obtidos pelas expressões verbais carregadas de emoção e pelas pantomimas dos atores – elementos tipicamente melodramáticos –, explicam, em certa medida, o sucesso de A Gargalhada nos palcos brasileiros. Os momentos mais patéticos da intriga, que auxiliam o autor na afirmação da moral defendida, se concentram nas ações do herói André. A personagem justifica seu crime com palavras que exprimem o desespero e a fatalidade.

ANDRÉ, à meia voz e freneticamente. Oh, fatalidade !... Bem, sim, eu cometi um crime, um crime horrível!... Minha mãe sofria, ela necessitava de socorro, ela estava em seu leito de morte, eu roubei para salvar minha mãe, roubei para não viver órfão; roubei porque não tinha meios de pagar um tumba para minha mãe; cometi um crime, um crime terrível [...].117

Para conferir emoção intensa ao clímax, no momento da loucura de André, e assim amplificar a piedade que o público sentiria pelo herói, os autores intervêm na cena quatorze do segundo ato com uma didascália que orienta o jogo cênico do ator. Trata-se da cena da gargalhada, que atraiu a atenção de Ernesto Biester e do crítico português anônimo do Progresso.

O MÉDICO: – André! Bom André! (André dá uma gargalhada. Observando-o.) Céu! Essa palidez mortal... Esse riso convulsivo... André dá uma gargalhada novamente. Momento de silêncio, durante o qual o Médico, após ter dado um passo em direção a André, como que por lhe dar a mão, para, sente o seu pulso e o coração, olha-o fixamente, estupefato. André dá gargalhadas de tempo em tempo durante esse jogo de cena.118

Além do texto dramático, a amizade entre João Caetano e Jacques Arago contribuiu para o sucesso de A Gargalhada. Em sua segunda estadia no Rio de Janeiro, em outubro de 1850, Arago foi recebido pelo Imperador D. Pedro II, que lhe comentou sobre a

117 ARAGO, Jacques & MARTIN, Alexandre. L’Éclat de Rire: drame en trois actes. Paris: Marchant, 1840, (Collection Le Magasin Théâtral), p. 15. No original: “ANDRÉ, à demi-voix, et frénétiquement. O fatalité !... Eh bien, oui, j’ai commis un crime, un crime horrible !... ma mère souffrait, elle avait besoin de secours, elle était à son lit de mort, j’ai volé pour sauver ma mère, j’ai volé pour ne pas vivre orphelin ; j’ai volé parce que je n’avais pas de quoi payer une tombe pour ma mère ; j’ai commis un crime, un crime épouvantable [...].” 118 Ibidem, p. 18. No original: “LE DOCTEUR: – André! Bon André! (André part d’un éclat de rire. Le regardant.) Ciel! Cette pâleur mortelle... Ce rire convulsif... André rit de nouveau aux éclats. Moment de silence, pendant lequel le Docteur, après avoir fait un pas vers André, comme pour aller lui serrer la main, s’arrête, lui tâte le pouls et le cœur, le regarde fixement et demeure stupéfait. André rit de temps à autre pendant ce jeu de scène.”

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representação de A Gargalhada por João Caetano. Para agradar ao escritor francês, o ator brasileiro representou a peça no Teatro de São Januário, a 18 de outubro. João Caetano lhe “ofereceu graciosamente um camarote [...] ricamente decorado”119 com flores e guirlandas. O autor recebeu como presente uma coroa de ouro. Assim foi selada a amizade pública entre ambos. Sobre “meu amigo Caetano”120, Arago escreveu as seguintes palavras:

Esse Caetano é o ator mais completo que jamais conheci, é uma voz simpática, como os mais simpáticos, é a dor com todas as suas lágrimas, é a cólera com toda sua inflamação; Caetano não teve mestre que ele próprio, seu coração, sua alma. Tão trágico quanto Talma, tão dramático quanto Frédérick Lemaître, não há pessoa que exprima a ternura melhor que ele; e, quando vos declama suas esperanças e suas angústias, credes que ele fala vossa língua, vós o compreendeis. Caetano dos Santos é, eu repito, o mais admirável ator das duas Américas, e eu encontrei nele Frédérick Lemaître e Talma de tão gloriosa memória.121

Em setembro de 1854, Arago retornou ao Brasil, onde permaneceu até sua morte, a 27 de novembro do mesmo ano. Após a morte do autor, João Caetano reprisou A Gargalhada no Teatro de São Pedro de Alcântara. O sucesso póstumo do escritor no Rio de Janeiro encorajou a trupe francesa de Ludovic, que se apresentava no Teatro de São Januário, a criar L’Éclat de Rire em outubro de 1857. Pela primeira vez, o melodrama era representado em texto original, tendo em vista que a tradução encenada por João Caetano havia empreendido modificações. Assim, ao escolher A Gargalhada para sua estreia no Teatro de D. Maria II, Germano Francisco, que já estava habituado a representá-la nas províncias brasileiras, esperava triunfar em Lisboa, porque era uma peça de sucesso em cartaz nos teatros do Rio de Janeiro. Contudo, se a peça foi bem aceita no Brasil, a representação em Lisboa, na mesma época, suscitou as críticas negativas dos homens de letras portugueses, principalmente daqueles do círculo de Mendes Leal, engajados nesse momento com o “drama da atualidade”, de inspiração realista francesa. Desse modo, mesmo com o reconhecimento positivo do jogo cênico de Germano Francisco, os críticos defenderam que a estrutura dramática de A Gargalhada era medíocre e sem méritos.

119 ARAGO, Jacques. Les Deux Océans. Tome 3. Bruxelles; Leipzig: Kiessling: Schnée et Cie., 1854, p. 209. No original: “a gracieusement offert une loge [...] richement pavoisée”. 120 Ibidem, p. 211. No original: “mon ami Caetano”. 121 Ibidem, p. 210. No original: “Ce Caetano est le comédien le plus complet que j’aie jamais entendu, c’est une voix sympathique comme les plus sympathiques, c’est la douleur avec toutes ses larmes, c’est la colère avec tous ses embrasements ; Caetano n’a eu de maître que lui, son cœur, son âme. Aussi tragique que Talma, aussi dramatique que Frédérick Lemaître, il n’est personne qui exprime la tendresse mieux que lui ; et, quand il vous dit ses espérances et ses angoisses, vous croyez qu’il parle votre langue, vous le comprenez. Caetano dos Santos est, je le répète, le plus admirable comédien des deux Amériques, et j’ai retrouvé en lui Frédérick Lemaître et Talma de si glorieuse mémoire.”

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3.6.2 João Caetano e A Dama de Saint-Tropez

Em crônica de 23 de julho de 1860, Joaquim Manuel de Macedo anunciou que “o Sr. João Caetano dos Santos se dispõe a partir para a Europa dentro de breves semanas”.122 Quatro anos após a estadia de Germano Francisco em Lisboa, era a vez de João Caetano cruzar o Atlântico, carregando em sua bagagem o sonho de aprimorar e atualizar o teatro brasileiro. A iniciativa foi louvada por Macedo, esperançoso de que, ao seu retorno, o artista oferecesse ao país “a observação zelosa e o fruto de estudos conscienciosos e indispensáveis para que nos dê a reforma e a regeneração do Teatro de São Pedro de Alcântara”.123 João Caetano se despediu do público fluminense com a representação de A Gargalhada. Embarcou para Portugal, em 25 de setembro de 1860, a convite de um grupo de distintos homens de letras portugueses, dentre os quais Antonio Feliciano de Castilho, Ernesto Biester, Francisco Palha, José Romano e Júlio César Machado.124 Uma vez em terras lusas, marcou presença em espetáculos no Teatro de D. Maria II, onde debutou a 17 de novembro, como o protagonista Jorge Maurício de A Dama de Saint-Tropez. Logo após as representações no Teatro de D. Maria II, João Caetano partiu “para Paris, pelo caminho de ferro do Sul”125, em 4 de dezembro de 1860. Além das capitais portuguesa e francesa, o artista também conheceu Madri. Em seu relatório de viagem, datado de 16 de fevereiro de 1861, João Caetano afirmou ter visitado os conservatórios dramáticos de Lisboa, Madri e Paris; e de ter conferido atuações de Pierre-François Beauvallet (1801-1873), Joseph-Isidore Samson (1793-1871) e François-Joseph Regnier (1807-1885), atores da Comédie-Française, e de Étienne Mélingue (1808-1875), ator do Théâtre de l’Ambigu- Comique.126 Repisou o solo da terra natal em 3 de fevereiro de 1861, trazendo consigo José Simões Nunes Borges127, ator português escriturado para a sua companhia. Poderíamos imaginar que o artista, símbolo da nacionalidade brasileira, encarnaria no palco do Teatro de D. Maria II um herói mítico da história da ex-colônia, o protagonista de uma obra proveniente da pena de um filho da jovem nação americana. Porém, não foi o que

122 MACEDO, Joaquim Manuel de Macedo. “2ª feira, 23 de julho de 1860”. In: CANO, Jefferson (Org.). Labirinto. Campinas, SP: Mercado de Letras: CECULT; São Paulo: FAPESP, 2004, p. 112. 123 Idem. “2ª feira, 26 de novembro de 1860”. In: Ibidem, p. 262. 124 Cf. SILVA, Lafayette. João Caetano em Lisboa. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 19 set. 1931, p. 4. 125 LISBOA – 14 de dezembro. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 3 jan. 1861, p. 2. 126 O relatório de viagem de João Caetano foi transcrito em: JOÃO Caetano e o Teatro Nacional. Revista de Teatro – SBAT, maio-jun./1970, p. 11-14. 127 José Simões Nunes Borges nasceu na freguesia de Beijos a 10 de março de 1826. Estreou no Teatro de D. Maria II a 9 de julho de 1850. Trabalhou como ator e ensaiador no Teatro da Rua dos Condes entre 1854 e 1858. Em agosto de 1858, estreou no Teatro Ginásio de Lisboa. Faleceu a 21 de fevereiro de 1904. (Cf. SIMÕES. In: BASTOS, 1908, p. 180).

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João Caetano apresentou para os espectadores portugueses. O ator optou por lançar mão da tradução de uma peça francesa que integrava o seu repertório há quase quatorze anos. A relevância de A Dama de Saint-Tropez em seu repertório encorajou João Caetano a protagonizar o papel do marinheiro Jorge Maurício em Portugal. A recepção crítica da criação de La Dame de Saint-Tropez em Paris, em 1844, se deu em torno de uma polêmica, já que a ação dramática da peça fazia analogia ao caso criminal de Marie Lafarge, um fait divers que chocou a França em 1840. Marie foi acusada de envenenar seu marido com deliciosos doces que ela mesma cozinhava. Mesmo diante da falta de provas concretas de sua responsabilidade no crime, e sem a sua confissão, ela foi condenada a trabalhos forçados em uma prisão. Após doze anos encarcerada, Marie foi agraciada por Napoléon III, em 1852.128 A alusão ao caso Lafarge foi identificada pela censura dramática de Paris, que demandou mudanças na peça, submetida primeiramente com o título Georges Maurice.129 Dentre as alterações realizadas, os nomes das personagens foram modificados e a peça foi renomeada La Dame de Saint-Tropez. Após a estreia no Théâtre de la Porte-Saint-Martin, com o ator Frédérick Lemaître no papel do marinheiro, Théophile Gautier ressaltou, em sua série de folhetins dramáticos no jornal La Presse, que “o assunto, as cenas, os tipos, as personagens se reencontram no processo que teve, há alguns anos, imensa repercussão”.130 Ou seja, apesar da tentativa da censura de apagar qualquer relação com o caso Lafarge, os esforços foram em vão, pois logo na estreia as associações foram desencadeadas. No Rio de Janeiro, o caso Lafarge foi noticiado em folhetins do Jornal do Commercio, ao longo de dezembro de 1840, e o livro de memórias escrito pela própria condenada, Mémoires de Marie Cappelle, veuve Lafarge (1841-1842), foi anunciado e vendido pela livraria de J. Villeneuve. Apesar disso, as representações de A Dama de Saint- Tropez não foram associadas ao caso criminal. Os recursos do melodrama se fazem presentes nessa obra de Dennery e Anicet- Bourgeois: a música instrumental e as lágrimas das personagens amplificam as emoções das cenas patéticas; uma personagem órfã é amparada por um protetor incógnito; um vilão desestabiliza a harmonia inicial; o antagonismo bem/mal acompanha as ações e os

128 Cf. LEDDA, 2013, p. 212-213. 129 Cf. RAPPORT de la censure. “Théâtre de la Porte-Saint-Martin. Georges Maurice, drame en 5 actes”. Cote F21 975, Archives Nationales, Pierrefitte-sur-Seine. 130 GAUTIER, Théophile. “Porte-Saint-Martin. La Dame de Saint-Tropez, drame en cinq actes, de MM. Anicet- Bourgeois et Dennery”. La Presse, Paris, 25 nov. 1844, Feuilleton de La Presse, p. 2. No original: “Le sujet, les scènes, les types, les personnages se retrouvent dans un procès qui eut, il y a quelques années, un immense retentissement.”

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sentimentos das personagens; o reconhecimento final resolve o nó da intriga e reestabelece a harmonia. Para Jules Janin, em crítica publicada pelo Journal des Débats na ocasião da estreia em Paris, os coups de théâtre e as fortes emoções, efeitos convencionais do gênero, continuavam a eletrizar a plateia.

Emoção vulgar, dizeis; velho melodrama, velho vilão, velha inocente, velho diálogo desarticulado e extremamente previsível. Oh! Como queria ali vos ver; quem quer que sejais [...]; bom! Eu vos juro que teríeis medo. [...]. Subitamente! Oh! Que terror! No espelho revelador Georges acaba de ver Antoine, seu bom primo, que envenena sua bebida. Dizeis ainda (eu vos escuto): – Mau efeito de melodrama! Mas, sabeis, não existe mau efeito quando esse efeito é dramático, surpreendente; o inesperado sempre impressiona. Não existe mau efeito quando uma sala inteira permanece atenta, ofegante, curiosa pela súplica de um moribundo.131

Os recursos patéticos favorizavam o jogo de cena de João Caetano. A ideia de que o ator tornava viva no palco a personagem Jorge Maurício esteve na base da grande maioria das críticas teatrais e comunicados de espectadores, publicados na imprensa brasileira, que avaliaram as exibições de A Dama de Saint-Tropez. Em 1856, esse argumento embasou as análises de Quintino Bocaiúva, que destacou a genialidade de João Caetano na expressão dos mais diversos sentimentos de Jorge Maurício.

No papel de Jorge Maurício, o marinheiro generoso, apaixonado e tímido no primeiro ato; terno, cuidadoso e desconfiado no segundo; ativo, sombrio, ciumento e dissimulado no terceiro e abatido, desanimado e sem consolo, vergando o peso de uma moléstia desconhecida e terrível, com as entranhas a diluir-se à erosão de um violento veneno, presa dos mais dolorosos sofrimentos e preocupações no quarto e quinto; o Sr. João Caetano elevou-se, como já se disse, até a altura de seu gênio; altura donde jamais deveria descer e onde praz-me vê-lo entronizado como um verdadeiro soberano.132

Um espectador, sob o pseudônimo King, comparou o desempenho de João Caetano na cena final de A Dama de Saint-Tropez, que culmina na morte de Jorge Maurício, com o canto V do Inferno da Divina Comédia, de Dante Alighieri. Sua descrição da encenação constrói a imagem de vigor e autenticidade, até mesmo poética, alcançada pelo jogo cênico de João Caetano ao representar a morte no palco.

131 JANIN, Jules. Journal des Débats Politiques et Littéraires, Paris, 25 nov. 1844, p. 2. No original: “Émotion vulgaire, dites-vous ; vieux mélodrame, vieux traître, vieille innocente, vieux dialogue démantibulé et cousu de fil blanc. Oh ! que je voudrais vous y voir ; qui que vous soyez, [...] eh bien ! je vous jure que vous auriez peur. [...] Tout à coup ! Oh ! Quelle épouvante ! Dans la glace révélatrice Georges vient de voir Antoine, son bon cousin, qui empoisonne sa boisson. Vous dites encore (je vous entends) : – Mauvais effet de mélodrame ! Mais, sachez-le, il n’y a pas de mauvais effet quand cet effet est dramatique, inattendu ; l’inattendu saisit toujours. Il n’y a pas de mauvais effet quand toute une salle reste attentive, haletante, curieuse à la prière d’un agonisant.” 132 Q. B. [Quintino Bocaiúva]. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2 out. 1856, p. 1.

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Não o vimos ainda no domingo na Dama de S. Tropez? Não ouvimos o gemido rouco do moribundo? Não vimos aquela convulsão geral e instantânea dos músculos no transe de luta em que a alma se desprende do corpo, o espírito da matéria? E, depois, não o vimos cair... como disse Dante no seu episódio da Francesca: E caddi, come corpo morto cade! (E caiu, como cai o corpo que é cadáver).133

Tendo em vista que os objetivos principais da interpretação de João Caetano eram eletrizar, extasiar e arrebatar a plateia, ao interpretar o papel de Jorge Maurício em Lisboa, esperava exercer esse fascínio sobre o público do Teatro de D. Maria II. O artista brasileiro encenou a peça nas noites de 17, 18, 22 e 24 de novembro de 1860, ao lado dos artistas portugueses Teodorico, Manuela Rey, Emília Adelaide e Delfina. De acordo com o testemunho de L., correspondente do periódico Publicador Maranhense, de São Luís, o público que compareceu à estreia era o mais seleto da capital.

Um numeroso público enchia a sala do nosso primeiro teatro de declamação no dia de sua estreia. A corte, as pessoas reais, o ministério todo, os jornalistas, os homens de letras, a melhor sociedade brasileira, o mais escolhido dentre a melhor companhia da capital, damas, cavalheiros, todos aplaudiram com entusiasmo o artista que empreendera tão longa viagem para ter o prazer de nos agradar.134

Os críticos portugueses se mostraram receptivos ao artista, filho da ex-colônia e, assim, um compatriota. Para Ernesto Biester, João Caetano “era um hóspede, e um hóspede que havia prestado relevantes serviços aos nossos irmãos no Brasil. Todas estas condições asseguravam-lhe o triunfo, e obteve-o completo”.135 No entanto, desaprovaram o sotaque do artista, seu jogo de cena e a escolha da peça para seu debute. Júlio César Machado, logo após a estreia, desferiu elogios a João Caetano, em crítica publicada pelo jornal Revolução de Setembro. Para o crítico, o ator “quando entra em cena tudo se agita e se anima, e o que era um mau esboceto a carvão toma as cores de um quadro de mestre. Julgamos ouvir uma cena de amor, de ciúme ou piedade. Lê-de a peça. Não está lá nada disso, foi João Caetano que escreveu tudo”.136 Como apontou Almeida Prado, o trecho de César Machado era uma paráfrase da crítica teatral de Théophile Gautier, publicada pelo La Presse dias após a estreia de La Dame de Saint-Tropez em Paris. O crítico francês avaliou o desempenho de Frédérick Lemaître no papel de Georges Maurice com as seguintes palavras, a partir das quais podemos constatar a fonte da inspiração de César Machado.

133 KING. Arte dramática – João Caetano dos Santos. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 25 jul. 1852, Publicação a pedido, p. 3, grifos do autor. 134 L. Correspondência do Diário de Pernambuco – Lisboa, 28 de novembro de 1860. Publicador Maranhense, São Luís, 21 dez. 1860, p. 3. 135 BIESTER, Ernesto. Chronica. Revista Contemporânea de Portugal e Brasil, Lisboa, vol. II, 1860, p. 340. 136 MACHADO, Júlio César. Revolução de Setembro, Lisboa, 20 nov. 1860 apud SILVA, 19 set. 1931, p. 4.

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Dès qu’il entre dans une action, tout s’anime, tout s’agite, tout se précipite au dénouement ; les acteurs les plus froids s’échauffent, et cette mauvaise ébauche au charbon prend les coleurs d’un tableau de maître. Vous croyez entendre des scènes d’amour, des mots de flamme, des cris de vengeance ; lisez la pièce, il n’y a rien. C’était Frédérick qui écrivait tout cela en levant les yeux au ciel, en se jetant à genoux, en changeant une chaise de place, en laissant tomber son front orageux dans ses mains convulsives. Un tel jeu, ce n’est plus du talent, c’est du génie et du plus haut !137

A ideia de uma representação que eletrizasse a plateia, a ponto de lhe tirar o fôlego e levá-la às lágrimas, revela a sensibilidade dos espectadores e o apreço pelo patético cênico. Em 1845, um ano após a estreia, a atuação de Frédérick Lemaître nas reprises de La Dame de Saint-Tropez, em Paris, ainda provocava forte emoção no público do Théâtre de la Porte-Saint-Martin: “Nós ainda estamos emocionados com o efeito prodigioso que ele produziu no quarto e quinto atos. Toda a sala eletrizada se levantou em massa como um único e mesmo homem, e o aplaudiu com furor!”138 Uma sensibilidade compartilhada pelos folhetinistas brasileiros, e até mesmo pelo português César Machado, que buscaram criar um elo entre João Caetano e o ilustre ator francês, o mais importante intérprete do melodrama romântico. Em meio à constatação de que João Caetano possuía “o dom supremo que constitui os trágicos”139, César Machado não deixou de notar algumas incorreções em seu jogo cênico. No entanto, os defeitos foram indulgentemente justificados pelo próprio crítico, que culpou a falta de formação profissional do ator brasileiro. O gênio criativo de João Caetano, possuidor de relâmpagos de talento que conferiam vivacidade ao espetáculo e eletrizavam o público, seria motivo suficiente para desculpar seus defeitos.

Eu poderia falar-lhe em incorreções e em defeitos. Mas quem os não têm? E quem é mais desculpável deles do que um artista no seu caso, que só pôde aprender consigo mesmo, e inspirar-se pela esplêndida majestade de sua América? Ele faz muito, faz mais que muito, pois que nos relâmpagos do seu talento ilumina a cena e aquece o público!140

Se, logo após os espetáculos, César Machado foi indulgente com o artista brasileiro, sua opinião se alterou com o passar do tempo. Em Apontamemtos de um

137 GAUTIER, 25 nov. 1844, p. 2. 138 PORTE-Saint-Martin. Le Journal des Théâtres: littérature, musique, beaux-arts, Paris, 18 oct. 1845, Théâtres de Paris, p. 3. No original: “Nous sommes encore ému de l’effet prodigieux qu’il a produit au quatrième et cinquième actes. Toute la salle électrisée s’est levée en masse comme un seul et même homme, et l’a applaudi avec fureur !” 139 MACHADO, Júlio César apud PORTUGAL – Lisboa, 30 de novembro de 1860 – Carta do Correspondente. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 20 dez. 1860, p. 2. 140 MACHADO, 20 dez. 1860, p. 2.

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Folhetinista, obra de 1878, ao reviver a estadia de João Caetano em Lisboa, César Machado abandonou os elogios desmedidos direcionados ao artista e detratou a peça por ele encenada: representou “o seu papel muito habilmente; mas a peça era antipática, a pronúncia dele não era destinada a desvanecer a impressão pouco agradável que o drama suscitou; e a exageração de escola em que ele primava, chegava já para nós fora de tempo”.141 Ora, as transformações estéticas pelas quais o drama passou durante os dezoito anos que separam o evento de sua rememoração determinaram, obviamente, o tom de desaprovação do jogo cênico do ator e de seu repertório. Por outro lado, Ernesto Biester foi mais rigoroso que César Machado ao tratar do debute de João Caetano no Teatro de D. Maria II. Para o crítico português, ao artista brasileiro “não lhe pertencem as honras que se conferem às grandes celebridades artísticas; mas cabem- lhe os louvores com que se animam as boas vocações”.142 João Caetano foi classificado como um artista que estaria um degrau abaixo do “esplendor do gênio” e “perfeição” das italianas Adelaide Ristori (1822-1906) e Marietta Alboni (1826-1894), e dos franceses Rosine Stoltz (1815-1903) e Pierre Levassor (1808-1870). Biester negou o título de “celebridade artística” a João Caetano porque o ator pertencia a uma escola dramática considerada ultrapassada pelos homens de teatro portugueses, engajados com a estética realista francesa. Nesse momento, Biester já havia composto para o palco do Teatro de D. Maria II dramas da atualidade que buscaram se alinhar aos preceitos realistas, como Um Quadro da Vida (1854), A Redenção (1856) e Homem de Consciência (1859). Nesse sentido, a obra escolhida por João Caetano, A Dama de Saint- Tropez, casaria com o jogo cênico e a declamação do artista brasileiro, considerados, aos olhos de Biester, produtos de uma escola antiga.

João Caetano dos Santos é, repetimos, um ator de talento, mas da mesma escola a que pertence o drama que escolheu para se apresentar entre nós, que foi a Dama de S. Tropez. Na data desta produção, que é muito antiga, está a data da escola dramática de João Caetano dos Santos. Apesar do teatro no nosso país não haver chegado ao aperfeiçoamento da escola moderna em França, apresenta já um reflexo dessa escola, ostentando mui lisonjeiro adiantamento, que bastante concorreu para mais sensível tornar a declamação do artista brasileiro.143

Os correspondentes dos jornais brasileiros em Lisboa, como Correio Mercantil, do Rio de Janeiro, e Publicador Maranhense, de São Luís, cobriram a estadia de João

141 MACHADO, Júlio César. Apontamentos de um Folhetinista. Porto: Typ. da Companhia Litterária, 1878, p. 238. 142 BIESTER, 1860, p. 340. 143 Ibidem.

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Caetano na Europa. Em suas crônicas de além-mar, os correspondentes relataram a chegada do ator em Portugal e o espetáculo no Teatro de D. Maria II, permeando a narrativa com o enaltecimento de suas qualidades artísticas e seu engajamento com o teatro brasileiro. O objetivo dos correspondentes era mais informar os leitores brasileiros que um filho de sua pátria era bem recebido em terras lusas e ali colhia louros, que desenvolver uma análise crítica de seu desempenho no palco, como o fizeram César Machado e Ernesto Biester. Nesse sentido, veicularam a imagem de um artista que representava um elo entre as nações portuguesa e brasileira, recentemente separadas politicamente. A ideia de que João Caetano pertencia a um país coirmão de Portugal permeou a descrição que o correspondente português do Publicador Maranhense apresentou do artista brasileiro. O jornalista reforçou que a visita do ator a Portugal era para “ver sancionada pela apreciação das suas plateias e da nossa empresa literária, uma reputação criada e robustecida em um país coirmão do nosso”, e destacou os “repetidos obséquios e finezas que tem generosamente prestado a muitos dos nossos compatriotas residentes no Brasil”.144 A apreciação de João Caetano como um protetor dos imigrantes portugueses no Brasil também embasou um artigo publicado pelo Jornal do Commercio de Lisboa, na ocasião da chegada do artista ao país. O correspondente do periódico carioca Correio Mercantil transcreveu os trechos mais elogiosos do artigo, que salientaram o respeito de João Caetano com Portugal, “saudoso torrão dos seus avós”, os espetáculos de gala que oferecia no Teatro de São Pedro de Alcântara, no Rio de Janeiro, em comemoração aos “aniversários natalícios de nossos reinantes”145 e os benefícios que socorriam instituições e imigrantes portugueses.

* * *

144 L., 21 dez. 1860, p. 3. 145 JORNAL do Commercio, Lisboa apud PORTUGAL – Lisboa, 29 de outubro – Carta do Correspondente. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 18 nov. 1860, p. 1.

CAPÍTULO 4

PERMANÊNCIA E RENOVAÇÃO

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4.1 A longa permanência nos palcos

Em novembro de 1859, João Caetano resgatou O Sineiro de São Paulo, de Bouchardy, peça que estreara no Teatro de São Januário, em janeiro de 1840, protagonizada pelo português Joaquim de Barros. A remontagem recebeu cuidados especiais de João Caetano, com direito a vistas, mobiliário, acessórios e vestuários novos. O retorno da peça ao palco desagradou ao jovem Machado de Assis, que acreditava não parecer “coerente arrancar do pó do arquivo aquele drama, velho na forma e no fundo; pautado sobre preceitos de uma escola decaída, limpo totalmente de mérito literário”.1 Com o advento do teatro realista, os adeptos de sua estética não pouparam esforços para atacar a permanência do melodrama herdado da cena romântica, associando-o a fósseis, taxando as peças de “composições-múmias”, nos termos de Machado de Assis, e considerando-as pertencentes a uma escola ultrapassada e fora de moda. As críticas desaprovavam, sobretudo, o uso dos expedientes melodramáticos convencionais. As peças de Bouchardy, como O Sineiro de São Paulo, por exemplo, seguem um modelo específico para a estruturação do enredo. Os títulos evocam o nome do herói epônimo, em geral um homem pobre, seguindo-se a sua profissão ou o local onde habita. O prólogo e o primeiro ato apresentam o herói e sua família virtuosa em estado de equilíbrio. A harmonia é logo interrompida pela chegada do mal, corporificado pelo vilão. Esse, a princípio, triunfa por meio da vilania cometida, o que motivará o desejo de vingança no herói, “um simples homem do povo que supera o rico e poderoso vilão ou tirano”.2 Em uma evidente oposição entre o bem e o mal, o herói desempenha o papel da providência divina para vingar os crimes e proteger os oprimidos. A sua identidade é revelada apenas no final da peça, quando se dá o reconhecimento entre as personagens. Bouchardy, apesar de fazer uso de convenções formais do melodrama e de posicionar uma moral incorruptível, acima das paixões desenfreadas, não deixa de recorrer a expedientes do drama romântico, como o uso do veneno para provocar a morte. Os críticos teatrais brasileiros, adeptos da proposta de renovação nos palcos, posicionaram-se contrários ao resgate das “antigualhas”, nascidas do caldeirão romântico, que operou uma intensa mistura de gêneros dramáticos. No entanto, constataram que, mesmo no

1 ASSIS, Machado de. “Revista de Teatros, O Espelho, 13 nov. 1859”. In: FARIA, João Roberto (Org.). Machado de Assis: do teatro. São Paulo: Perspectiva, 2008, p. 171. 2 MCCORMICK, John. “Joseph Bouchardy”. In: COOPER, Barbara T. (Dir.). Dictionary of Literary Biography: French Dramatists, 1789-1914. Vol. 192. Detroit (Mich.): Gale, 1998, p. 24. No original: “the simple man of the people who overcomes the rich and powerful villain or tyrant.” 187

final dos anos 1850, ainda havia boa aceitação do melodrama por parte do público. O caso de O Sineiro de São Paulo, de Bouchardy, que 21 anos após a estreia em Paris, ocorrida em 1838 no Théâtre de la Gaîté, retornava aos palcos do Rio de Janeiro exemplifica esse acolhimento.

Enquanto o público o aplaudir, represente; enquanto esse mesmo público concorrer às antigualhas, como Sineiro de S. Paulo, dê-lhes o Sineiro; e enquanto a matilha ladrar, diga-lhes que o nome de Bouchardy nunca será profanado, pondo-o em paralelo com qualquer literato da fama do peixe frito. Dr. Til.3

A longa permanência de determinados melodramas em cartaz não foi exclusividade dos palcos brasileiros – acusados pelos críticos teatrais da época de estarem parados no tempo e serem avessos às renovações da dramaturgia –, sendo um fenômeno comum da atividade teatral do século XIX, verificável, especialmente, nos teatros populares de Paris. As peças La Dame de Saint-Tropez, D. César de Bazan e La Grâce de Dieu, por exemplo, conheceram sucesso de público logo após suas estreias, alcançando quantidades excepcionais de reprises na capital francesa. Além do sucesso imediato, obtiveram permanência mais longa nos palcos do que a média dos melodramas coetâneos. A peça La Dame de Saint-Tropez, criada por Frédérick Lemaître no Théâtre de la Porte Saint-Martin, em 1844, foi reprisada em outros teatros parisienses ao longo do século XIX, inclusive durante a Exposição Universal de 1878.

Após o grande artista [Frédérick Lemaître] tê-la encenado em Londres, tiveram que a retomar no Porte-Saint-Martin, no início da temporada seguinte, em 15 de outubro de 1845. E o renome que ela tinha adquirido era tal que, dez anos depois, retornava com sucesso no Ambigu, em 7 de abril de 1855, sem que nenhum “fato novo” parecesse militar a favor dessa reprise, já que a heroína que a havia inspirado, a Sra. Lafarge, já se encontrava morta há dois anos, nas águas de Ussat, alguns meses após ter obtido enfim sua graça. Desde então, a Dama de São-Tropez permaneceu no “repertório”; antigamente a encenaram aqui e ali; e, não mais tarde que no início da Exposição de 1878, ela figurava no programa do Teatro do Château-d’Eau, representada por Péricaud, Pougeaud e a senhorita Daudoird e ali fez, durante uma quinzena, boa figura assim como Jean le Cocher, L’Aveugle, Diane de Chivry, Georges le Mulâtre, Le Secret de Miss Aurore e outros mélos tão sensacionais.4

3 DR. TIL. Teatro de S. Pedro. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 21 nov. 1859, p. 2, grifos do autor. 4 CAZAUBON. “Madame Lafarge au Théâtre”. In: Cote 4-RF-40737 – Recueil factice d’articles de presse et programmes sur diverses pièces de Adolphe D’Ennery, premier volume. No original: “Après que le grand artiste fut allé la jouer à Londres, on dut la reprendre à la Porte-Saint-Martin, à l’entrée de la saison suivante, le 15 octobre 1845. Et le renom qu’elle avait acquis était tel que, dix ans après, on la reprenait avec succès à l’Ambigu, le 7 avril 1855, sans qu’aucun « fait nouveau » semblât militer en faveur de cette reprise, puisque l’héroïne qui l’avait inspirée, Mme Lafarge, était morte depuis deux ans déjà, aux eaux d’Ussat, quelques mois après avoir enfin obtenu sa grâce. Depuis, la Dame de Saint-Tropez est restée au « repértoire » ; naguère on la jouait encore de-ci, de-là ; et, pas plus tard qu’au début de l’Exposition de 1878, elle figurait au programme du Théâtre du Château-d’Eau, jouée par Péricaud, Pougeaud et Mlle Daudoird et y faisait, une quinzaine durant, aussi bonne figure que Jean le Cocher, L’Aveugle, Diane de Chivry, Georges le Mulâtre, le Secret de Miss Aurore et autres mélos aussi sensationnels.” 188

Destino semelhante nos palcos franceses foi reservado a La Grâce de Dieu, peça que, após a criação no Théâtre de la Gaîté em 1841, ali permaneceu em cartaz ininterruptamente durante um ano. O sucesso da obra foi tamanho que originou uma linha de produtos de vestuário e impressos: “vestidos, chapéus, gorros; vendiam-se em todos os lugares litografias, gravuras e até mesmo imagens de Épinal representando as aventuras da infortunada Maria”.5 Logo, Frédérick Lemaître incorporou o melodrama ao seu repertório, representando-o ao lado de sua companheira, a atriz Clarisse Miroy (1820-1870), que desempenhava o papel da jovem Maria. Na década de 1860, a peça foi montada no Théâtre de la Porte Saint-Martin, sob a direção de Marc Fournier, e no Théâtre de la Gaîté, em 1878, com a soprano Hortense Schneider (1833-1920) – importante intérprete das operetas de Jacques Offenbach, como La Belle Hélène – no papel de Chonchon, a graciosa cortesã. La Grâce de Dieu adentrou o século XX tendo sido montada, em junho de 1925, no Théâtre du Nouvel- Ambigu. D. César de Bazan ganhou vida no palco do Théâtre de la Porte Saint-Martin, em 1844, pela atuação de Frédérick Lemaître, tornando-se a peça que o ator mais representaria ao longo de sua carreira artística.6 O drama entremeado de cantos foi resgatado com sucesso pela mesma sala de espetáculos na temporada de 1896-1897. Nessa reprise, o ator Coquelin aîné (Benoît Constant Coquelin, 1841-1909), que naquela época se consagraria na criação de Cyrano de Bergerac (TPSM, 1897), de Edmond Rostand, desempenhou o papel de D. César de Bazan. A peça, uma sequência das aventuras de D. César de Bazan, um fidalgo espanhol, personagem concebida originalmente por Victor Hugo em Ruy Blas, atingiu tamanho sucesso no palco do Théâtre de la Porte Saint-Martin que ganhou traduções para o inglês e português, e inspirou adaptações para outros gêneros – ópera, ópera-cômica (com música de Jules Massenet), melodrama, romance, silent films –, não apenas em língua francesa, mas também em inglês e italiano.7

5 BLUM, Ernest. “Fígaro, 5 out. 1887”. In: Cote 8-RF-40570 – Recueil factice d’art. de presse et progr. sur “La Grâce de Dieu” de Dennery et Lemoine, Collection Auguste Rondel, Bibliothèque des Arts du Spectacle, BNF – Richelieu, p. 3. No original: “des robes, des chapeaux, des bonnets ; on vendait partout des lithographies, des gravures et même des images d’Épinal représentant les aventures de l’infortunée Marie.” 6 Cf. LECOMTE, Louis-Henry. Un Comédien au XIXe Siècle: Frédérick-Lemaître: étude biographique et critique, d’après des documents inédits. Vol. II. 1840-1876. Paris: L.-Henry Comte, 1888, p. 55. 7 Listamos as traduções e adaptações que levantamos: DON Caesar de Bazan: a drama in three acts. Edited by Epes Sargent. New York: William Taylor & Co.; Baltimore: W. M. Taylor & Co., 1846; DENNERY, Adolphe & DUMANOIR. D. César de Bazan: comédia em 5 actos. Tradução de E. Nascimento Correia. 2 ed. Lisboa: Livraria Popular de Francisco Franco, [s.d.]. (Bibliotheca Dramática Popular); PERUZZINI, Giovanni & TRAVERSARI, Antonio. D. Cesari di Bazan: melodramma in quatto atti. Napoli: Tipografia Flautina, 1856; PERUZZINI, Giovanni & TRAVERSARI, Antonio. D. César de Bazan: melodrama em 4 actos. Porto: Typographia de Antonio José da Silva Teixeira, 1858; THE Comedy of Don César de Bazan. As presented by Edwin Booth. New York: William Winter, 1878; WILLIAMS, Henry L. The Spanish Dancer. Pola Negri 189

Se, em um primeiro momento, D. César de Bazan foi a personagem que cativou a plateia dos teatros – tanto na obra de Dennery e Dumanoir, quanto na adaptação operística homônima de 1872, cuja partitura foi assinada pelo então jovem compositor Jules Massenet –, na virada para o século XX, entretanto, foi seu par amoroso, a cigana Maritana, que se transferiu para o écran. A personagem feminina foi apropriada pelo emergente cinema silencioso americano em dois filmes. Em 1923, Ernst Lubitsch dirigiu Rosita (1923), que apresentou Mary Pickford no papel da cigana. No mesmo ano, Herbert Brenon dirigiu The Spanish Dancer para os estúdios Paramount. A atriz Pola Negri e o ator espanhol Antonio Moreno encarnaram os papéis de Maritana e Don César de Bazan, respectivamente. O roteiro se baseava no romance inglês homônimo que, por sua vez, era uma adaptação de Henry L. Williams da obra de Dennery e Dumanoir. Assim, as adaptações teatrais e cinematográficas mantiveram vivas no imaginário dos espectadores a figura de um fidalgo espanhol bufão e beberrão e de uma bela cigana ambiciosa, ambos enredados por uma ação melodramática, de capa e espada, inscrita em tom burlesco. La Dame de Saint-Tropez, La Grâce de Dieu e D. César de Bazan são casos exemplares do fenômeno descrito por Christophe Charle sobre a permanência da dramaturgia séria, advinda da cena romântica, durante o Segundo Império na França. De acordo com o autor, a presença do melodrama diminuiu nos programas teatrais logo no início dos anos 1850 devido, sobretudo, ao ostracismo político que o teria atingido, pois as autoridades lhe atribuíram a culpa pela difusão das ideias subversivas que culminaram na Revolução de 1848. As reprises seriam provenientes de teatros periféricos e de palcos especializados em melodrama, tais como o Théâtre de l’Ambigu-Comique, que possuía um rico acervo de peças antigas. Christophe Charle comentou as reprises de obras criadas originalmente pelo célebre ator Frédérick Lemaître: as 96 representações de Robert Macaire e L’Auberge des Adrets, em 1880, no Théâtre de l’Ambigu-Comique, e as 136 exibições de Les Mystères de Paris ao longo da temporada de 1886.8 Contudo, o resgate dos melodramas de maior sucesso nos teatros populares de Paris, que retornaram esporadicamente aos programas, durante a segunda metade do século XIX, foi mal visto pelos críticos franceses, favoráveis a formas dramáticas que tentavam romper com o modelo espetacular e patético do melodrama. Em seus artigos, não pouparam o edition. Illustrated with scenes from the Paramount picture. New York: Grosset & Dunlap, [s.d.]; MARITANA: a grand opera in three acts. Philadelphia: Ledger Job Printing Office, 1870, (a ópera, com libreto de Edward Fitzball e música de William Vincent Wallace, estreou no Theatre Royal Drury Lane, em Londres, a 15 de novembro de 1845); Don César de Bazan, ópera-cômica com libreto de Adolphe Dennery e Jules Chantepie, e música de Jules Massenet, estreou na Opéra-Comique, em Paris, a 30 de novembro de 1872. 8 Cf. CHARLE, 2012, p. 238. 190

uso de adjetivos negativos para identificar as composições populares, achatadas sob o rótulo pejorativo de mélos. Consideraram ultrapassada e sentimentalista a poética que se baseava nos efeitos melodramáticos e na mistura de gêneros; compararam as reprises dessas peças de longa data a exumações de cadáveres mortos. Os críticos apontaram para o esgotamento e o envelhecimento do melodrama, ao passo que o gênero sobrevivia nos palcos populares de Paris. Em outubro de 1864, quando estreou no Théâtre de la Porte Saint-Martin a peça Les Drames du Cabaret, uma nova colaboração de Dennery e Dumanoir, o crítico Xavier Aubryet lastimou a permanência dos recursos tradicionais do melodrama, que continuava a alimentar os palcos. Recorrendo à arqueologia, comparou o gênero ao megatério, animal pré- histórico, espécie de preguiça gigante, que havia sido extinta da Terra há aproximadamente 11 mil anos.

Tudo se transforma em nossa época: as instituições, os costumes, as ideias; somente o Melodrama permanece imprescritível com sua estética convencionada e seus meios tradicionais; a Tragédia está morta, a Poesia não bate que uma asa, o Vaudeville foi substituído pela Revista, tão somente ele o Melodrama, esse Megatério dramático, subsiste inteiramente.9

Na França, a permanência da poética melodramática nos palcos se deu de forma ininterrupta, ao longo do século XIX. O resgate de determinados títulos bem-sucedidos do período romântico ocorreu em temporadas específicas nos teatros populares (TG, TPSM, TAC). Charles Dinamis, crítico da Revue d’Art Dramatique, ao avaliar as reprises parisienses de D. César de Bazan, Les Mystères de Paris e Les Enfants d’Édouard, em 1897, ensaiou uma explicação para o contínuo interesse nas peças antigas. Para o crítico, no limiar do século XX, o público ainda se emocionava, sentia-se envolvido com as ações dramáticas e com as personagens dessas obras.

Nós não queremos mal a Don César de Bazan, que data de 1844, aos Mystères de Paris, que vive em cena desde 1843, aos Enfants d’Edouard, que avança até a ribalta desde 1833. Não lhes queremos mal, se, em 1897, eles ainda nos interessam e nos emocionam. Como os insensíveis vão rir! Indignar-se contra Glocester, estremecer diante do horroroso Mestre de escola, da Chouette assustadora, do sinistro Tortillard,

9 AUBRYET, Xavier. “Théâtre de la Porte-Saint-Martin. Les Drames du Cabaret, drame en 5 actes et 9 tableaux, de MM. d’Ennery et Dumanoir. 20 oct. 1864”. In: Cote 4-RF-40737 – Recueil factice d’articles de presse et programmes sur diverses pièces de Adolphe D’Ennery, premier volume, p. 95. No original: “Tout se transforme à notre époque : les institutions, les mœurs, les idées ; seul le Mélodrame reste incommutable avec son esthétique convenue et ses moyens traditionnels ; la Tragédie est morte, la Poésie ne bat que d’une aile, le Vaudeville a été remplacé par la Revue, lui seul le Mélodrame, ce Mégathérium dramatique, subsiste tout entier.” 191

vibrar nobremente com dom César pela fraqueza de um inocente adolescente, ou pela honra ameaçada de sua rainha.10

Charles Dinamis, ao explicar a permanência do gênero segundo o interesse do público pela experiência catártica engendrada pelo melodrama, permite-nos associar sua interpretação do fenômeno ao conceito freudiano de ilusão. Para Freud, seria agradável assistir “impunemente a acontecimentos que, na vida real, seriam penosos”. A ilusão, nesse caso a ilusão teatral, provocaria “uma diminuição da dor graças à certeza de que, primeiramente, é um outro que age e sofre em cena e que, em segundo lugar, aquilo é apenas um jogo que não pode causar dano algum à nossa segurança pessoal”.11 Na mesma direção argumentou o crítico teatral Gaston Liberty, após acompanhar a reprise de La Grâce de Dieu no popular Théâtre de l’Ambigu-Comique, em junho de 1925. Apesar de quase um século de separação entre a concepção da obra e sua reprise no século XX, o crítico pressente que “estamos ainda muito próximos” de uma peça “velha de oitenta anos”, devido a um certo “encanto das coisas obsoletas”. Os recursos principais do melodrama ali presentes, entendidos por Liberty como “banalidades”, “emoções falsificadas” e “gritos do coração”, ainda sensibilizariam o público.

Repetiram-me desde a minha infância que os dramas de Dennery são banais e enfadonhos. Pois bem! A Graça de Deus, que reaparece, velha de oitenta anos, não é nem tanto enfadonha; suportei muito facilmente sua representação. E pois a reprise de uma obra-prima do mélo, que fez chorar tantas pessoas valentes, não é desprovida de ensinamentos. [...] Um século de sentimentalismo e de literatura se respira nesse drama. Sem dúvida estamos ainda muito próximos dessas banalidades, dessas emoções falsificadas, desses gritos do coração desencadeados mecanicamente; nós bem vemos por quais procedimentos infantis extorquem-se lágrimas ao bom povo – tão facilmente quanto sua cédula de voto. Mas quando um pouco de tempo terá passado, não veremos nesse drama mais que a expressão de uma moda antiga; saborearemos o encanto das coisas obsoletas.12

10 DINAMIS, Charles. Le théâtre populaire. Revue d’Art Dramatique, Paris, jui./1897, p. 691. No original: “Nous n’en voudrons pas à Don César de Bazan de dater de 1844, aux Mystères de Paris de vivre à la scène depuis 1843, aux Enfants d’Édouard d’avoir approché la rampe dès 1833. Nous ne leur en voudrons pas, si, en 1897, ils nous intéressent et nous émeuvent encore. Et ici nos blasés de rire ! S’indigner contre Glocester, frémir devant le hideux Maître d’école, la Chouette effrayante, le sinistre Tortillard, vibrer chevaleresquement avec don César pour la faiblesse d’un innocent adolescent, ou pour l’honneur menacé de sa reine.” 11 FREUD, 1969, vol. 10, p. 163 apud PAVIS, “Ilusão e inconsciente”, 2015, p. 203. 12 LIBERTY, Gaston. “Notes et impressions de théâtre. À l’Ambigu ‘La Grâce de Dieu’. 19 juin 1925”. In: Cote 8-RF-40570 – Recueil factice d’art. de presse et progr. sur “La Grâce de Dieu” de Dennery et Lemoine, p. 6. No original: “On m’a ressassé depuis mon enfance que les drames de Dennery sont banals et ennuyeux. Eh bien ! La Grâce de Dieu, qui reparaît, vieille de quatre-vingts ans, n’est pas tellement ennuyeuse ; j’en ai très aisément supporté la représentation. Et puis la reprise d’une œuvre maîtresse du mélo, qui fit pleurer tant de braves gens, n’est pas dénuée d’enseignements. [...] Un siècle de sensiblerie et de littérature se respire dans ce drame. Sans doute sommes-nous encore trop près de ces banalités, de ces émotions truquées, de ces cris du cœur mécaniquement déclenchés ; nous voyons trop par quels procédés enfantins on extorque au bon peuple ses larmes – aussi aisément que son bulletin de vote. Mais quand un peu de temps encore aura passé là-dessus, l’on 192

Desse modo, a poética do espetáculo total do melodrama, voltada para a realização cênica, pode justificar a longa permanência desse gênero. Na medida em que o melodrama atua sobre o sentido visual e auditivo, produzindo impressões poderosas na plateia, uma “comoção elétrica” ou “galvânica”, segundo Florence Naugrette13, a catarse se engendra pelo efeito patético e se funda na certeza de que, no desfecho, as virtudes serão recompensadas e os vícios punidos. O melodrama imputa no coração do espectador a garantia de que sempre haverá uma recompensa e um final feliz, mesmo após as injustiças divinas ou sociais. Se a permanência do gênero sugere que suas convenções mais clássicas – os coups de théâtre, o tema da orfandade, a sedução causada pelo mistério, a mistura do cômico e do terror, a oposição entre a honestidade e o crime, as canções e os acompanhamentos musicais emotivos – encontraram sempre aceitação por parte do público, necessário se faz reconhecer, de saída, que esses mesmos recursos dramáticos não se engessaram com o decorrer do tempo. Segundo Alain Vaillant, “o melodrama, com sua mistura de ação, suspense e bons sentimentos, é sem dúvida a principal contribuição romântica à cultura popular”14, porém, suas convenções foram atualizadas e distorcidas para se acomodarem a novos contextos e mídias.

Ora, ainda hoje, todas as ficções de massa (literárias, cinematográficas, televisivas) repousam sobre a mecânica do melodrama: poderíamos aliás dizer tanto de nossa referência coletiva na atualidade e, em toda circunstância, de nossa confusa aspiração ao romanesco happy end que viria a punir os vilões e a recompensar os heróis – mesmo que se perca a consciência da História. Nossas modernas indústrias midiáticas se limitaram a atualizar e distorcer o cenário familiar de um romantismo sem dúvida muito depreciado e insosso – mas cujos arquétipos não vêm menos em linha reta das obras universalmente difundidas de um Alexandre Dumas ou de um Eugène Sue, aos quais seria necessário, um dia, que a história literária atribuísse um justo lugar.15

ne verra plus dans ce drame que l’expression d’une mode ancienne ; on y goûtera la charme des choses surannées.” 13 NAUGRETTE, Florence. Le plaisir du spectateur romantique. Revue d’Histoire du Théâtre – L’Autre Théâtre Romantique, Paris, n. 257, jan.-mars/2013, p. 21. No original: “commotion électrique ou galvanique.” 14 VAILLANT, Alain (Dir.). Dictionnaire du Romantisme. Paris: CNRS, 2012, p. xx. No original: “le mélodrame, avec son mélange d’action, de suspens et de bons sentiments, est sans doute la principale contribution romantique à la culture populaire.” 15 Ibidem, p. xx-xxi. No original: “Or, aujourd’hui encore, toutes les fictions de masse (littéraires, cinématographiques, télévisuelles) reposent sur la mécanique du mélodrame : on pourrait d’ailleurs en dire autant de notre rapport collectif à l’actualité et, en toute circonstance, de notre confuse aspiration au romanesque happy end qui viendrait punir les méchants et récompenser les héros – quitte à en perdre jusqu’à la conscience de l’Histoire. Nos modernes industries médiatiques n’ont donc fait qu’actualiser et détourner le décor familier d’un romantisme sans doute très galvaudé et affadi – mais dont les archétypes n’en viennent pas moins en droite ligne des œuvres universellement diffusées d’un Alexandre Dumas ou d’un Eugène Sue, auxquelles il faudra bien, un jour, que l’histoire littéraire accorde leur juste place.” 193

Identificamos permanência semelhante do melodrama e de certas peças francesas de sucesso nos palcos brasileiros durante o século XIX. Sabemos que essa presença do gênero no Brasil tem relação com o fenômeno da difusão mundial da dramaturgia francesa oitocentista e de um suposto interesse permanente do público ocidental pela estética romântica que continua perdurando até os dias atuais nas formas reinventadas pelo cinema e pela telenovela. Contudo, para além disso, configurou-se em função das circunstâncias locais, que dizem respeito aos fatores específicos do contexto da arte dramática no Brasil. A partir de um sistemático levantamento de dados, verificamos que a permanência do melodrama foi condicionada pela tradução teatral e por dinâmicas de concorrência estabelecidas entre os primeiros atores, que se construíram à semelhança de João Caetano.

4.2 Palcos românticos e realistas

Durante a década de 1840, quando as estreias de melodramas franceses abundaram nos palcos brasileiros, a crítica teatral, incipiente na época, ressaltou os efeitos patéticos e moralizantes dessas peças. As críticas de Martins Pena e de Gonçalves Dias, que trataram de espetáculos representados por João Caetano, ilustram esse tipo de avaliação do melodrama. Ainda que sua série de folhetins dramáticos intitulada “A Semana Lírica” publicada pelo Jornal do Commercio, fosse dedicada às récitas líricas, Martins Pena analisou alguns poucos espetáculos oferecidos por João Caetano. Elogiou a sua criação do papel de Jorge Maurício, em A Dama de Saint-Tropez, pois o ator soube dar ao protagonista “verdadeira vida”, interpretando “fielmente as paixões e seus paroxismos”, o que teria levado “o terror e a compaixão ao seio dos espectadores”.16 Como Martins Pena, Gonçalves Dias avaliou positivamente o tom extremo que o talento de João Caetano conferia aos momentos patéticos dos melodramas. A montagem no Teatro de São Francisco de O Idiota, de Charles Depeuty e Louis-Marie Fontan, surpreendeu o crítico por representar os sentimentos maternais mais nobres. João Caetano, um ator que zelava pela “Arte”, com “A” maiúsculo, teria sido exitoso na tradução cênica de sentimentos que tocam os espectadores.

16 PENA, Luís Carlos Martins. A semana lírica. Teatro de S. Francisco. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 27 abr. 1847, Folhetim do Jornal do Commercio, p. 2. 194

Há alguns lugares em que a duquesa traduziu tão bem a comoção maternal, que nos deixou surpreendidos. João Caetano fez o que só ele pode fazer: porque é um artista que, além de grande talento e de grandes recursos, estuda conscienciosamente e tem zelo pela Arte.17

Gonçalves Dias também analisou a montagem de O Trapeiro de Paris no Teatro de São Francisco, em outubro de 1849. Para o crítico, as personagens contrastantes, de acordo com o valor moral que representam, uma divisão balizada pela dicotomia bem-mal do melodrama, e a ação dramática em espiral, repleta de coups de théâtre e de quadros variados, foram os fatores que teriam garantido o sucesso da representação da peça de Félix Pyat.

O que explica, porém, o feliz sucesso da obra é a ação: é, sem dúvida, preciso grande talento para ter o público suspenso e atento durante cinco horas com a representação de 13 quadros; mas os quadros são breves e variados; é já no cais de Austerlitz, na casa do Trapeiro, na sala do baile, no Hotel Hoffman, na casa da parteira, na Polícia e na prisão. O interesse vai sempre crescendo, e os caracteres, embora imperfeitos, contrastam felizmente.18

O ensinamento moral foi um dos principais tópicos de análise do repertório de melodramas abordados pelos que publicavam textos de forma anônima ou com pseudônimos na imprensa da época. Um folhetinista teatral anônimo do Jornal do Commercio, ao tratar da estreia de Luísa de Lignerolles no Teatro de São Pedro de Alcântara, em janeiro de 1841, louvou o seu “profundo pensamento moral, a santidade do vínculo conjugal”.19 De fato, o casamento é o tema principal dessa peça, e um caso de adultério encaminha o desenvolvimento de suas ações dramáticas. Henri de Lignerolles, casado com Louise de Lignerolles, se enamora de Cecília de Givry, uma ex-cantatriz, esposa do coronel de Givry, sobrinho do Príncipe de Miré. Os dois amantes adúlteros são reconhecidos por seus familiares. Cecília de Givry enlouquece – lugar comum no melodrama das mulheres adúlteras e jovens defloradas – e Henri de Lignerolles é morto em duelo com o coronel de Givry, que tentava salvar sua honra. Porém, o crítico do Jornal do Commercio filtrou os temas apresentados, ao supervalorizar e focalizar apenas a condenação do adultério, apagando a discussão sobre o exílio político sofrido pelo senhor Lagrange, um liberal convicto, e o debate metateatral em torno das disputas entre a estética neoclássica (defendida pela jovem Louise e seu pai, o

17 DIAS. “Teatro de São Francisco: O Idiota. Correio da Tarde, Rio de Janeiro, 4 fev. 1848”. In: GIRON, 2013, p. 168. 18 Idem. “Teatro dramático, Correio Mercantil, Rio de Janeiro, Folhetim, 13 out. 1849”. In: Ibidem, p. 258. 19 THEATRO de S. Pedro d’Alcântara. Luiza de Lignerolles, drama em 4 actos, por MM. Dinaux e Legouvé. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 1 jan. 1841, Folhetim, p. 1. 195

senhor Lagrange) e a romântica (representada por Henri de Lignerolles, um dramaturgo ávido por paixões frenéticas).

HENRI – O que diz, Louise? LOUISE – É bem sombrio, para uma mulher, uma questão de punhal; mas como essa morte não deve matar ninguém, sou da opinião de meu pai. HENRI – Muito bem, filha de Espartano. (Ao senhor Lagrange) Quereis uma colher de chá, armadura de uma única parte que não compreendeis que alguns homens não são de um só bloco. LAGRANGE – Compreendo, ao menos, que você é muito racional admitindo os caracteres que não o são. HENRI – Uma personalidade! Ah, bom! Eu me revolto! Eu defendo que os homens de um só temperamento, de caráter duro como vós, meu muito honrado sogro, são as exceções. Os caracteres ordinários são os caracteres que se desmentem sempre; e Édouard, com sua imaginação inconstante e quente, Édouard, com suas mil paixões contraditórias, é verdadeiro.20

Em uma época em que o divórcio não era amparado por leis civis, nem estava na pauta das discussões no espaço público, o melodrama Louise de Lignerolles foi lido, como nos permite constatar a crítica do Jornal do Commercio, somente como um alerta sobre os perigos do adultério, uma conduta imoral que poderia levar as famílias ao opróbrio. Nesse sentido, fica clara a ideia da catarse pela lágrima com efeito moralizante, já que a morte do homem adúltero, no desfecho, e todo o sofrimento vivido pela esposa que luta por manter a honra familiar, atuam como lição ao público: “assim termina esse drama, cuja catástrofe terrível deve ficar como lição para quantos por leviandade e desfastio zombam desse contrato que a sublime religião católica santificou elevando-o a ordem de sacramento”.21 Na década de 1840, averiguamos que as montagens dos melodramas foram elogiadas, sobretudo, porque as traduções e a mise en scène privilegiaram o efeito moralizante das peças, acentuado pela atuação dos primeiros atores. Na década seguinte, entretanto, os

20 DINAUX, Prosper & LEGOUVÉ, Ernest. Louise de Lignerolles: drame en cinq actes et en prose. Paris: Imprimerie de Jules Didot l’Ainé, [s.d.], p. 396. No original: “HENRI – Qu’en dis-tu, Louise ? LOUISE – C’est bien grave, pour une femme, une question de poignard ; mais comme cette mort ne doit tuer personne, je suis de l’avis de mon père. HENRI – Très bien, fille de Spartiate. (A M. Lagrange) Voulez-vous du thé, armure toute d’une pièce qui ne comprenez pas que quelques hommes ne soient pas d’un seul bloc. LAGRANGE – Je comprends, du moins, que vous êtes très conséquent en admettant les caractères qui ne le sont pas. HENRI – Une personnalité ! Eh, bien ! Je me révolte ! Je soutiens, moi, que les hommes d’un seul jet, les barres de fer comme vous, mon très honoré beau-père, sont les exceptions. Les caractères ordinaires sont des caractères qui se démentent sans cesse ; et Édouard, avec son imagination mobile et chaleureuse, Édouard, avec ses mille passions contradictoires, est vrai.” 21 THEATRO, 1 jan. 1841, p. 2. 196

críticos brasileiros, alinhados com a proposta teatral realista e ávidos pela renovação da dramaturgia e dos palcos, passaram a detratar especialmente o tom patético das peças. Como demonstrou João Roberto Faria em seu estudo pioneiro do teatro realista no Brasil, o Teatro Ginásio Dramático se engajou, a partir da segunda metade da década de 1850, na renovação do repertório exibindo a dramaturgia realista de autores franceses, tais como Théodore Barrière, Alexandre Dumas (filho) e Émile Augier, e de brasileiros, como José de Alencar, Quintino Bocaiúva e Macedo.22 Porém, apesar de ser reduto da renovação realista, ali também foram representados os melodramas, especialmente nos momentos em que a casa passava por crise financeira.23 Simultaneamente a esses espetáculos no Teatro Ginásio Dramático, João Caetano continuava a encenar, no Teatro de São Pedro de Alcântara, os melodramas de sucesso, tais como A Dama de Saint-Tropez, D. César de Bazan e Os Seis Degraus do Crime. Esse fenômeno revela que, ao longo dos anos 1850, ele não alterou o cerne de seu repertório francês. A permanência dos melodramas em uma das principais salas de espetáculos do Rio de Janeiro se deu por relações de conflito com a proposta realista adotada pelo Teatro Ginásio Dramático. Relações abordadas pela crítica teatral da época sob o embate velho-novo. Esse foi o ponto argumentativo que norteou a polêmica gerada pela remontagem de O Sineiro de São Paulo por João Caetano, em 1859, como ilustramos com o trecho de uma crítica anônima publicada na ocasião pelo periódico Correio Mercantil.

Não há poucos anos, ainda éramos menino, ouvíamos falar com louvor deste drama que então nessa época memorável do teatro de S. Pedro, estava ainda na moda literária; hoje, porém, quando o drama moderno cheio de verdade e natureza, veio expelir do teatro nacional esses abortos do espírito criador, torna-se insuportável a lembrança e a representação desse fóssil.24

Machado de Assis retratou em suas crônicas o antagonismo entre o Teatro de São Pedro de Alcântara, reduto do repertório antigo, e o Teatro Ginásio Dramático, receptivo aos dramas realistas. Defensor da reforma nos palcos, Machado de Assis nutria o desejo de que “as benções da reforma” recaíssem sobre a cabeça de João Caetano e que o artista abandonasse “as composições-múmias que desfilam simultâneas em procissão pelo seu

22 Ver FARIA, 1993, parte II – “O teatro realista francês no Brasil” (p. 67-101) e parte III – “O teatro realista no Brasil” (p. 103-260). 23 Ver Ibidem, p. 107 e SOUZA, 2002, p. 83-88. 24 THEATRO de S. Pedro. O Sineiro de S. Paulo. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 30 out. 1859, p. 2. 197

tablado”.25 Segundo João Roberto Faria, além de Machado de Assis, outros homens de letras, como Joaquim Manuel de Macedo, José de Alencar e Quintino Bocaiúva, publicaram críticas teatrais na imprensa da época. Apesar de certas divergências nas avaliações das peças e no grau de adesão ao modelo realista, todos “apoiaram a renovação feita pelo Ginásio”.26 Durante a década de 1850, Florindo Joaquim dirigiu duas companhias dramáticas no Rio de Janeiro: a primeira instalada no Teatro de São Francisco, de 1851 a 1853, e a segunda, no Teatro de São Januário, de 1856 a 1857. O ator não se mostrou receptivo à proposta de renovação realista nos palcos e, assim como João Caetano, ofereceu reprises de títulos que faziam sucesso desde os anos 1840, como O Marinheiro de Saint-Tropez, A Graça de Deus, Kean e A Gargalhada. Obviamente que os dois atores entremearam as reprises com as montagens de peças francesas inéditas. João Caetano atuou nas estreias, por exemplo, de O Palhaço (Paillasse, TG, 1850), de Dennery e Fournier, na tradução de Luiz Honório Vieira Souto, Joana a Doida (Jeanne la Folle ou la Bretagne au XIIIe Siècle, TO, 1830), de Louis-Marie Fontan, O Cavaleiro da Maison Rouge, de Dumas (pai), O Flagelo dos Mares (Le Fléau des Mers, TAC, 1856), de Léonce e Eugène Nus. Florindo Joaquim estreou O Peregrino Branco ou os Meninos da Aldeia, de Pixerécourt, Pedro Landais ou o Alfaiate Ministro, de Émile Souvestre, e O Negociante Honrado ou o Caixeiro Ladrão (Émery le Négociant, TG, 1842), de Boulé, Hippolyte Rimbaut e Dupré. Como averiguamos, excetuando O Peregrino Branco ou os Meninos da Aldeia de Pixerécourt, todas as outras peças são melodramas de autores dos teatros populares de Paris, criados nos palcos entre as décadas de 1830 e 1850. Os temas do casamento entre membros de ordens sociais distintas, da sucessão de herança, da dilapidação de bens e dos vícios mundanos (jogos de azar, bebida, luxúria amorosa) não foram uma novidade da dramaturgia realista. Pelo contrário, já eram tratados pelos melodramas desde a década de 1830. Acreditamos que o tratamento dos temas sociais a partir de alusões codificadas e indiretas, em ações dramáticas inscritas em períodos históricos passados, alimentou o argumento principal da crítica anti-melodrama, que se centrou na inverossimilhança provocada pelo uso de recursos convencionais. Contudo, a acusação de inverossimilhança se devia menos a uma inadequação ao real do que ao modo patético de sua representação. Compreendemos isso quando acompanhamos a recepção do melodrama Paillasse, de Dennery e Fournier. Criada em Paris por Frédérick Lemaître, a peça tem como tema

25 ASSIS. “Revista de Teatros, O Espelho, 9 out. 1859”. In: FARIA, 2008, p. 145. 26 FARIA, 1993, p. 141. 198

principal o casamento de uma mulher de origem nobre, Madeleine de Montbazon, com um homem do povo, o palhaço Belphégor. O casal tem dois filhos, um menino que se apresenta com o pai nas praças dos vilarejos, e uma menina adoentada. A família vive em plena miséria. Uma esperança nasce quando são surpreendidos com a notícia de que Madeleine era herdeira de uma das famílias mais ricas da França. Contudo, para fazer jus à herança, Madeleine precisaria abandonar a família e renegar o casamento com o palhaço. Após reviravoltas, Madeleine e o palhaço decidem continuar unidos. Porém, entregam seus filhos ao duque de Montbazon para que os crie e eduque em melhores condições. A partir desse enredo, a obra trata da questão da mistura de ordens sociais (neste caso, nobreza e povo), e tende para a defesa dos subalternos, ao ridicularizar os hábitos caricaturados da nobreza (gosto pelo luxo, hipocrisia, desprezo pelos pobres, ódio a Napoleão Bonaparte). A crítica social se dá, no entanto, pelo registro melodramático e não pela objetividade realista. Assim, Madeleine, ao se casar com o palhaço, desconhece que é herdeira de uma das famílias mais ricas da França. A revelação atua como um coup de théâtre que (re)alimenta uma ação dramática que se desenvolve em espiral. A pobreza em que vive a família do palhaço ora se apresenta como consequência da condição precária dos artistas de rua, ora se agrava com as artimanhas de Lavarennes, encarnação do clássico vilão do melodrama, que rouba identidades, é ardiloso e dissimulado. As ações dramáticas não são ambientadas na época em que a peça foi criada em Paris, em 1850, mas se inscrevem no início da Restauração francesa, após a queda de Napoleão, em 1814. A montagem realizada por João Caetano no Teatro de São Pedro de Alcântara, em 1852, recebeu leituras redutoras de cronistas anônimos da imprensa, que focaram a análise tão somente nas lições morais que a peça propaga sobre a maternidade e a união familiar. Assim depreendemos de uma crônica publicada pelo Periódico dos Pobres: “O Palhaço, priminha, não tem nada de palhaçaria, é o contrário; tem cenas muito tocantes, de muita moralidade. Seria bom que todos os pais levassem ali suas filhas; os esposos suas consortes [...]. Um divertimento, donde as famílias podem aproveitar tanta moralidade”.27 Já para um cronista teatral do periódico A Imprensa, devido aos esquemas melodramáticos recorrentes nas peças representadas nos palcos do Rio de Janeiro, não haveria muito a discorrer sobre O Palhaço, apenas que “muitos de seus lances se encontram em outros que já temos visto”.28 Por outro lado, um espectador anônimo que solicitou a publicação de seu artigo opinativo na seção “Publicações a pedido” do Jornal do Commercio fez uma leitura da peça

27 VISITA das priminhas. Periódico dos Pobres, Rio de Janeiro, 6 nov. 1852, p. 2-3. 28 REVISTA Hebdomadária. A Imprensa, Rio de Janeiro, 31 out. 1852, p. 4. 199

segundo a estética à qual ela pertence: “é um verdadeiro painel da vida de um homem da classe inferior e pobre colocado no verdadeiro quadro de sensibilidade e honradez”.29 Ou seja, o autor do artigo não buscou uma representação puramente realista de um homem do povo no melodrama de Dennery e Fournier. Compreendeu que essa representação se constrói por efeitos dramáticos que tecem um “verdadeiro quadro de sensibilidade” e de imagens metafóricas que simbolizam os sentimentos humanos, tais como o sofrimento, a dor e a alegria. Ao lado da sensibilidade, O Palhaço defenderia uma moral que garante a honradez do homem, não importando sua origem social.

4.2.1 Ideias de renovação

Nos anos finais da década de 1850, João Caetano não empreendeu um processo de renovação de seu repertório dramático, porém idealizou a institucionalização de um teatro nacional mantido pelo governo do Império. Durante sua carreira artística, demonstrou grande atenção aos assuntos políticos em torno da atividade teatral e lutou para manter a subvenção que recebia desde 1847 (dois contos de réis mensais de 1847 a 1853; três contos de réis mensais de 1853 a 1858; quatro contos de réis mensais de 1858 até sua morte).30 A defesa da necessidade de garantir a proteção financeira do governo para o teatro era partilhada por dois importantes homens de letras da época, Machado de Assis e Joaquim Manuel de Macedo. O primeiro não via com bons olhos a submissão do teatro nacional aos princípios comerciais, baseados nas leis da livre concorrência, os quais não poderiam assegurar a criação de uma escola dramática que contribuísse para o ideário de civilização da nação.

Criar no teatro uma escola de arte, de língua e de civilização, não é obra da concorrência, não pode estar sujeita a essas mil eventualidades que têm tornado, entre nós, o teatro uma cousa difícil e a arte uma profissão incerta. É na ação governamental, nas garantias oferecidas pelo poder, na sua investigação imediata, que existem as probabilidades de uma criação verdadeiramente séria e seriamente verdadeira.31

29 THEATRO de S. Pedro de Alcântara. O drama – Palhaço. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 13 dez. 1852, Publicações a pedido, p. 2. 30 Cf. MAGALHÃES JÚNIOR, Raimundo. As relações entre José de Alencar e João Caetano. Revista Brasileira de Cultura, Rio de Janeiro, n. 6, out.-dez./1970, p. 148-149. 31 ASSIS, Machado de. “Domingo, 1º de dezembro de 1861”. In: CANO, Jefferson & GRANJA, Lúcia (Org.). Comentários da Semana. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2008, p. 129. 200

Contudo, apesar de defenderem o protecionismo do governo, acreditavam que João Caetano não se empenhara na renovação do teatro nacional, despendendo inadequadamente os recursos financeiros de que usufruía. Para Macedo, somente o governo teria o poder de renovar o teatro nacional: “para que tenhamos um teatro dramático normal, é pouco uma subvenção de 4:000$? Pois despenda embora o governo o dobro dessa quantia com este importante serviço, contanto que a despesa nos dê um fruto real”.32 Simpatizante do Teatro Ginásio Dramático, Macedo sugeriu, em 1861, a formação de uma companhia dramática nacional, subvencionada pelo governo, que unisse João Caetano e Ludovina Soares, os mais importantes artistas do Teatro de São Pedro de Alcântara, aos talentosos atores do teatro concorrente, como Joaquim Augusto.33 Em 1861, José de Alencar, então deputado, participou como relator da comissão de orçamento que reestruturou as finanças para o biênio 1862-1863. Na época, João Caetano reclamou às entidades competentes o não recebimento da quantia integral de quatro contos de réis mensais da subvenção a que teria direito. Alencar sugeriu que emendas fossem discutidas sobre a subvenção teatral durante a tramitação da proposta de orçamento. No entanto, nada foi debatido e, em agosto de 1861, a Câmara não aprovou a manutenção da subvenção a João Caetano.34 A resolução transformou-se em um dos temas mais polêmicos da biografia de João Caetano, tratada pela maioria dos biógrafos como uma tentativa de vingança da parte de Alencar diante da recusa do ator de representar O Jesuíta.35 Para defender seus interesses, João Caetano direcionou ao Imperador D. Pedro II, em 1862, um relatório de sua estadia na Europa, datado de 16 de fevereiro de 1861, juntamente com um projeto que apresentava as diretrizes para a criação de uma escola e de um Júri Dramático no Teatro de São Pedro de Alcântara. Os documentos formalizavam o pedido de ajuda ao governo imperial para a viabilização das duas instituições, cujos objetivos seriam “promover e aperfeiçoar a arte e as letras dramáticas”.36 A escola dramática cuidaria da formação de atores nos três mais importantes gêneros (tragédia, comédia e drama) e o Júri Dramático teria como função avaliar as composições de autores nacionais. Os teatros subvencionados pelo governo estariam obrigados a montar as peças consideradas aptas pelo Júri Dramático. Ao governo imperial, caberia a proteção financeira de todo o processo, por meio de prêmios concedidos aos dramaturgos brasileiros. O projeto proposto por João

32 MACEDO. “Segunda-feira, 26 de novembro de 1860”. In: CANO, 2004, p. 263. 33 Cf. PRADO, 1972, p. 180. 34 Ver Ibidem, p. 175-176. 35 Ver MAGALHÃES JÚNIOR, 1970. 36 JOÃO Caetano e o Teatro Nacional. Revista de Teatro – SBAT, maio-jun./1970, p. 14. 201

Caetano não recebeu atenção das autoridades. Naquele mesmo ano, a saúde do ator se deteriorou. Afastou-se definitivamente dos palcos, vindo a falecer no ano seguinte, a 24 de agosto de 1863. Germano Francisco e Joaquim Augusto, que não recebiam subvenção do governo imperial, não propuseram projetos que institucionalizassem o teatro brasileiro. Porém, foram mais receptivos aos dramas de inspiração realista que surgiram nos anos 1850. Como verificamos, a renovação que praticaram foi parcial, uma vez que não abandonaram totalmente os melodramas de sucesso que estavam habituados a representar. Após a estadia em Portugal, entre 1855 e 1856, tendo estabelecido um contato direto com os dramaturgos do círculo de Mendes Leal, Germano Francisco incorporou ao seu repertório o chamado “drama da atualidade”, expressão adotada pelos autores portugueses para designar os dramas de inspiração realista francesa. Segundo Vítor Manuel de Aguiar e Silva, essas peças tratam de “sentimentos afetuosos e ternos”; as personagens são “mais próximas da realidade da vida, mas quase sempre desenhadas unilinearmente”; a representação de outras épocas históricas “é substituída pela pintura da sociedade coeva, procurando o dramaturgo denunciar um vício ou uma injustiça social”.37 Essa dramaturgia portuguesa, assim como a escola realista francesa, pretendia registrar sua época, a partir do olhar crítico do dramaturgo que almejava ser objetivo e verdadeiro, sem deixar de ser moralizante. Porém, apesar de tratar de temas relacionados à sociedade contemporânea, como o casamento de conveniência, a honra familiar burguesa e o dinheiro, o “drama da atualidade” manteve “as situações patéticas e a expressão exaltada dos sentimentos característicos do drama romântico”38 e, por que não dizer, do melodrama? César de Lacerda, que conheceu Germano Francisco quando este esteve em Lisboa, dedicou ao artista brasileiro o drama Os Dois Mundos (Teatro Ginásio Dramático, 1855), “em testemunho de amizade, consideração e fraternidade artística”.39 O ator e dramaturgo português destacou no prefácio da obra que, quando Germano Francisco representou em Lisboa, logo reconheceram suas “tendências melodramáticas da escola romântica”.40 Comentou que a escola realista seria desconhecida no Brasil, em 1855, e celebrou a iniciativa de Germano Francisco de tentar “regenerar” a arte dramática de seu país

37 SILVA, Vítor Manuel de Aguiar e. O teatro de actualidade no romantismo português (1849-1875). Separata da Revista de História Literária de Portugal, ano I, vol. II, 1964. Coimbra: [s.n.], 1965, p. 9. 38 REBELLO, 1980, p. 76. 39 LACERDA, A. César de. Dois Mundos: comédia original em três atos. Lisboa: Tipografia de Joaquim Germano de Souza Neves, 1856, contracapa. 40 Ibidem, p. vi. 202

natal por meio da viagem que fizera a Europa, para estudar com “artistas de reconhecida valia e reputação”.

Conheceu-se que a escola moderna, a da verdade, era quase desconhecida em teu país, e que, por consequência, tinhas realmente a intenção, altamente civilizadora, de regenerares a arte por meio do estudo com artistas de reconhecida valia e reputação. [...] Realmente, pena era que num país como o Brasil, não houvesse a inovação, que só o teu bom senso e o teu amor à arte seriam capazes de empreender.41

O dramaturgo português adotou a expressão “regeneração dramática” para explicitar a sua visão, e a de seus pares, simpatizantes da escola realista, quanto à necessidade de se gerar uma nova poética para o drama, que extrapolasse os registros patético do melodrama e frenético do drama romântico, acentuando, desse modo, as diferenças entre o “drama antigo” e o “drama moderno” (realista). Para César de Lacerda, por mais que o melodrama mostrasse “o castigo ao vício e o prêmio à virtude”, falharia na doutrinação moral do povo de “limitada inteligência”, exatamente por retratar outras épocas históricas e personagens irreconhecíveis ou inacessíveis. Ao contrário, a dramaturgia realista, ao retratar “tipos”, pensamentos e sensações reconhecíveis pelo público coevo, cumpriria de modo mais eficiente esse “grande fim” do teatro, qual seja, o de moralizar a plateia.

Antigamente, nesses dramas de punhal, venenos e portas-falsas, não via senão o horror do crime, e a apoteose da virtude; isto mesmo via o mal, porque, acobertado por uma linguagem a maior parte das vezes nimiamente afetada, ações quase sempre exageradas, caracteres excepcionais e muitas vezes impossíveis, o drama antigo era uma aglomeração de dificuldades para a limitada inteligência de um operário ou de uma criança. Esse grande fim que o escritor deve ter sempre em vista, o castigo ao vício e o prêmio à virtude, via-o o povo, mas via-o porque sabia que o devia ver, não porque o entendesse a maior parte das vezes. No drama moderno já não acontece isto. Vê ali tipos muito seus conhecidos, ouve frases inteiras que já ouviu, experimenta sensações que já experimentou, e isto prende-lhe a atenção, inoculando- lhe, sem o perceber, uma linguagem pura, inflexões razoáveis, e o conhecimento prático dos perigos do nosso século. Preenche, pois, um grande fim, esta escola moderna, e é bem mereceres da tua pátria as diligências que fazes para lá a plantares.42

De volta ao Rio de Janeiro, Germano Francisco montou Pedro, de Mendes Leal, no Teatro de São Januário, em janeiro de 1858. A peça trata do tema do casamento a partir da problemática sobre a manutenção dos privilégios herdados pela nobreza e a busca de direitos pelos membros da burguesia. Pedro, nascido em uma família do povo, entra em conflito com uma casta social nobre, que lhe recusa o direito de contrair matrimônio com uma mulher de

41 Ibidem, p. vi. 42 Ibidem, p. viii. 203

nascimento nobre. Em fevereiro de 1860, quando Germano Francisco dirigia uma companhia dramática que se apresentava no Teatro de São Januário, no Rio de Janeiro, o artista foi contratado pela direção do Teatro Ginásio Dramático para ali oferecer espetáculos avulsos, em um momento em que o teatro passava por uma crise, após a saída de seus dois principais atores, Furtado Coelho e Eugênia Câmara.43 Germano Francisco escolheu para a estreia Pedro, drama que reprisava com frequência naquela época. Para um dos críticos da Revista Theatral, a oportunidade poderia congraçar “as duas escolas”, a romântica e a realista, criando “um tipo sumamente novo” de representação, tendo em vista que Germano Francisco se formara no modelo de atuação romântico, sua dicção era declamada e ele seria pouco afeito à “escola moderna”.

Estreou no Pedro quinta-feira no Teatro Ginásio, o distinto ator brasileiro Germano Francisco de Oliveira. Esta repentina e inesperada aparição sem contrato, segundo nos informam devida sem dúvida aos embaraços com que tem lutado o Ginásio, não deixa de ser um desses últimos recursos de que lançam mão as empresas quando certas de que nem uns esforços a não serem extraordinários as poderão salvar. [...] Continuar assim era impossível, a empresa ia mal a não ser o recurso de que acaba de lançar mão, convidando o Sr. Germano a dar ali algumas representações avulsas. Quer como for, o resultado há de ser seguro, porque das opiniões, nascem as questões e as questões sempre interessam o teatro. A entrada do Sr. Germano vai chamar grande concorrência. A sua dicção meio declamada, mas sem ir de mais para com a escola moderna, cria um tipo sumamente novo, que pode muito fazer, congraçando as duas escolas, e que pode muito fazer concorrendo para o ver em cena aqueles que pela distância não vão a S. Januário.44

Além de Pedro, Germano Francisco protagonizou no palco do Teatro Ginásio Dramático, em 9 de fevereiro de 1860, A Dama das Camélias, de Dumas (filho), ao lado da atriz Manoela Lucci, que integrava sua companhia dramática no Teatro de São Januário. Era a primeira vez que o ator interpretava o papel de Armand Duval do drama de Dumas (filho) que, desde sua estreia no Teatro Ginásio Dramático, em fevereiro de 1856, obtivera grande repercussão junto aos críticos e ao público.45 Entretanto, a incursão de Germano Francisco no Teatro Ginásio Dramático foi breve e sem grandes repercussões. No Teatro de São Januário, Germano Francisco continuou a encenar melodramas franceses e dramas históricos portugueses. Em 11 de novembro de 1858, protagonizou o drama histórico em três atos O Capitão Urgel de Camprodon, “original do Sr. Mendes Leal Júnior, escrito expressamente para o artista”.46 A peça de Mendes Leal revela que o

43 Cf. SOUZA, 2002, p. 112. 44 O SR. GERMANO. Revista Theatral: jornal dilletanti, variado e imparcial, Rio de Janeiro, 4 fev. 1860, p. 26. 45 Sobre as encenações de A Dama das Camélias no Rio de Janeiro, ver FARIA, 1993, p. 81-87. Ver também RONDINELLI, 2014. 46 ESPETÁCULOS. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 11 nov. 1858, p. 4. 204

dramaturgo português, engajado no “drama da atualidade”, não descansara sua pena dos dramas históricos que estava habituado a redigir desde os anos 1840, nos quais retratava capítulos-chave da história lusitana. E a montagem de O Capitão Urgel de Camprodon por Germano Francisco permite constatar que o ator brasileiro não renovara integralmente seu repertório após a viagem a Portugal.

Um dos nossos primeiros escritores dramáticos, o Sr. Mendes Leal acaba de escrever um drama para ser representado no Brasil. Intitula-se O Capitão Urgel de Camprodon, drama em 3 atos, precedido de Ostalric, o Mosqueteiro, prólogo. O prólogo passa-se no 1º de dezembro de 1640, no dia da revolução da independência, o drama quase um ano depois, nos primeiros movimentos da guerra da aclamação. Tem variedade de lances e novidade de situações. O protagonista é um tipo daquela raça de aventureiros que de Alemanha e Itália vieram à Península sob o impulso de Carlos V, muitos dos quais depois se congregaram em Lisboa para a infeliz expedição de África, e cujas tradições se perpetuaram até que o exército português tomou uma forma mais regular nas mãos de Schomberg.47

A montagem de O Capitão Urgel de Camprodon por Germano Francisco nos ajuda a pensar que, ao contrário da ideia de suplantação dos gêneros dramáticos, os palcos presenciaram a coexistência desses, testemunhando a longa permanência do melodrama. De fato, Germano Francisco, atento empresário teatral e ator formado na escola romântica, não pretendeu efetuar uma reforma radical de seu repertório, nem do jogo de cena. Simultaneamente às investidas que fazia na dramaturgia realista, francesa e portuguesa, o artista representava melodramas inéditos, como A Torre de Londres (La Tour de Londres, TAC, 1855), de Eugène Nus, Alphonse Brot e Charles Lemaître, montado no Teatro de São Januário, em dezembro de 1859. Ao lado das estreias de peças inéditas, também reprisava os melodramas de sucesso que compunham seu repertório desde o final dos anos 1840, como A Graça de Deus, A Gargalhada e Maria Joana, ou a Mulher do Povo. Na ocasião em que assumiu a direção do Teatro de São Pedro de Alcântara, em julho de 1870, Germano Francisco declarou, em carta publicada pelo Jornal do Commercio, que não pretendia “reformar a escola dramática, mas seguir na que encetou”, buscando apenas conter “os abusos românticos”48, ou seja, os excessos. Em outubro do mesmo ano, representou o melodrama A Virgem do Mosteiro, de Anicet-Bourgeois. As impressões de um espectador anônimo revelam que o jogo cênico de Germano Francisco se manteve no registro patético.

47 BIESTER, Ernesto. Chronica semanal. A Ilustração Luso-Brasileira, Lisboa, vol. I, n. 4, 23 jan. 1856, p. 27. 48 OLIVEIRA, Germano Francisco de. Theatro de S. Pedro de Alcântara. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 30 jul. 1870, Anúncios, p. 3. 205

O papel do juiz Delannoye, em extremo árido nos primeiros atos, coube ao Sr. Germano; o distinto artista houve-se com a sua reconhecida maestria no desempenho de uma parte sem dúvida abaixo do seu talento, e nas últimas cenas arrancou bravos e frenéticos aplausos. No final da confissão e no reconhecimento da filha, o Sr. Germano esteve de um patético admirável; aquelas poucas palavras de esperança dirigidas ao miserável Francisco, com que fecha o drama, foram ditas de maneira a fazer a reputação de um artista.49

Joaquim Augusto, e não Germano Francisco, se destacou como o discípulo de João Caetano, formado na escola romântica de representação dramática, que mais aderiu à renovação do repertório. Entre 1859 e 1861, além das peças realistas francesas e brasileiras, protagonizou uma série de “dramas da atualidade” de autoria portuguesa no Teatro Ginásio Dramático. De Ernesto Biester, representou Raphael (1853), em outubro de 1859, A Probidade (1858), em janeiro de 1860, e Os Homens Sérios (1858), em dezembro de 1861. De Mendes Leal, Abel e Caim, em outubro e dezembro de 1859, e Os Homens de Mármore, em janeiro de 1860. De César de Lacerda, Os Filhos dos Trabalhos, em janeiro de 1860. Machado de Assis celebrou a entrada de Joaquim Augusto no Teatro Ginásio Dramático, em 1859, e elogiou seu protagonismo nas montagens dos dramas da nova escola. Avaliou como acertada sua decisão de abandonar o melodrama, gênero no qual se formara e atuara até então.

Com a sua entrada para o Ginásio, o Sr. Joaquim Augusto veio mostrar-nos a transfiguração de uma vocação erradia outrora em um clima que te não convinha, o que forçosamente lhe nulificava a aptidão e a inteligência. Artista consciencioso, aperfeiçoado pelo estudo e pela observação, não podia viver na luz melancólica que um quadro envelhecido te podia dar; o romantismo não se acordava com a sua fibra dramática; chamava-o uma outra escola; uma outra plateia. Eu, que tão crente sou nos efeitos benéficos da rampa, regozijo-me sempre que uma garantia de futuro vem assentar assim sobre o tablado.50

Contudo, após o ingresso no Teatro Ginásio Dramático, apesar da incorporação de peças realistas ao seu repertório, Joaquim Augusto não abandonou totalmente os melodramas franceses. No palco desse teatro, onde a renovação seria o lema, Joaquim Augusto protagonizou, em setembro de 1859, O Asno Morto (L’Âne Mort, TG, 1853), uma adaptação de Théodore Barrière e Adolphe Jaime do romance homônimo de Jules Janin, traduzida pela atriz Maria Velluti. Machado de Assis viu como ousada a montagem da peça no Teatro Ginásio Dramático. Reconheceu, porém, que o drama era “um belo trabalho” da escola a que pertencia.

49 THEATRO S. Pedro de Alcântara. Jornal do Commercio, Rio de janeiro, 6 out. 1870, p. 1. 50 ASSIS, Machado de. “Revista de Teatros, 10 de janeiro de 1860”. In: Crítica Teatral. Rio de Janeiro: W. M. Jackson, 1938, p. 157. 206

O Asno Morto pertence à escola romântica e foi ousado pisando a cena em que tem reinado a escola realista. Pertenço a esta última por mais sensata, mais natural, e de mais iniciativa moralizadora e civilizadora. Contudo não posso deixar de reconhecer no drama de sábado passado um belo trabalho em relação à escola a que pertence. [...] A tradução é boa e só notei um engage que me fez mau efeito; mas são coisas que passam e nem é de supor outra coisa tendo se ocupado desse trabalho importante a Sra. Velluti.51

No mesmo mês, Joaquim Augusto representou no Teatro Ginásio Dramático, ao lado de Furtado Coelho, a peça A Honra de uma Família, tradução de L’Honneur de la Maison (TPSM, 1853), de Léon Battu e Maurice Desvignes. A peça trata de dois temas principais: o casamento entre um órfão pobre e uma donzela de uma família burguesa e o destino social de um filho natural. Jovem, Elise de Neuvilly foi seduzida por Georges de Maubreuil. Grávida, Elise não teve a oportunidade de contar ao amante a novidade, pois Georges foi enviado para um regimento militar na Argélia, a pedido de seus pais, que viam como desvantajoso o casamento de seu filho, de estirpe nobre, com uma jovem de família burguesa. Desonrada e abandonada, Elise se casou rapidamente com Maurice de Chennevières, um provinciano que acabava de se fixar em Paris. A princípio, Maurice não desconfiou da paternidade de Paul, que teria nascido prematuramente. Vinte anos se passam e Georges, então um Coronel renomado, retorna a Paris e se apaixona pela jovem Mathilde de Chennevières, filha de Elise com Maurice. Durante um baile oferecido pela Baronesa d’Origny, Paul e Georges se desentendem, trocam injúrias, e marcam um duelo para o dia seguinte. Entrementes, Maurice declara a Elise que há mais de dezessete anos sabe que Paul não é seu filho. Para salvar a honra de sua família, Maurice declara a Georges que Paul é seu filho e que o duelo seria, então, impossível. Maurice e Georges duelam. Este morre e leva consigo ao túmulo o segredo que mancharia a honra da família de Maurice. A Honra de uma Família trata do casamento burguês e da condição social dos filhos naturais, temas que se tornaram essenciais à dramaturgia a partir dos anos 1850, retratados não somente pelas peças da estética realista, mas também pelos melodramas criados nos teatros populares parisienses. Nesse sentido, a peça de Léon Battu e Maurice Desvignes não se distancia dos outros melodramas de sua época, tal como Paillasse, de Dennery e Fournier, que analisamos anteriormente. De fato, A Honra de uma Família é uma peça cujo título poderia sugerir um típico exemplar da escola realista. Contudo, não se trata de uma obra criada no palco do Gymnase Dramatique de Paris. A peça estreou no Théâtre de la Porte-Saint-Martin, reduto do melodrama. Seu principal autor, Léon Battu (1828-1857), produziu, sobretudo, melodramas e

51 ASSIS. “Revista de Teatros, O Espelho, 11 set. 1859”. In: FARIA, 2008, p. 119. 207

óperas cômicas para teatros populares, como Théâtre des Variétés e Théâtre du Vaudeville. Em L’Honneur de la Maison, o dramaturgo francês recorreu aos expedientes do melodrama e ao registro patético para tratar dos temas sociais e estruturar as ações dramáticas. A peça traz um órfão virtuoso que desconhece sua origem, salvo pela filantropia de uma bondosa família – neste caso, notamos a semelhança com a personagem Carlos de A Dama de Saint-Tropez. Reviravoltas e coincidências encaminham a ação dramática ao clímax, culminando no duelo entre Georges e Paul, pai e filho. A ação providencial de Maurice, um pai honrado, possibilita a cena de reconhecimento, ao revelar a Georges que ele era o verdadeiro pai de Paul. O reconhecimento resolve o nó da intriga e mantém a honra e a felicidade da família. Desconhecemos o texto traduzido e representado no Teatro Ginásio Dramático, em 1859. Então, não sabemos exatamente quais podem ter sido as eventuais modificações empreendidas no texto de partida. Porém, é interessante notar que a montagem da peça foi interpretada por Machado de Assis na chave realista e, assim, elogiada. O crítico não mencionou a presença dos recursos melodramáticos, que ele tanto detratava em suas críticas teatrais. Muito provavelmente, Machado de Assis sensibilizou-se pelo ensinamento moral da peça, cujo ápice se dá na última cena que, para ele, “é uma verdadeira chave de ouro”. Maurice, após duelar contra Georges, retorna ao seu lar e mantém em silêncio o segredo sobre a paternidade de Paul. Até mesmo o jovem rapaz ignora que aquele a quem está habituado a chamar de pai não o é. A peça defende que todos os esforços não seriam em demasia para a manutenção da honra da família e a reabilitação da figura materna.

Que drama, amável leitora! Pelas primeiras cenas de exposição conhece-se o dedo de mestre que delineara o quadro. Depois os cinco atos que decorrem são uma série continuada de cenas, importantes todas, de um acabado completo, como ação, como diálogo, como estilo, como sentimento. Os caracteres do primeiro plano – estão desenhados com maestria e fineza de traços. São quatro figuras importantes que se movem no quadro largo daquela composição arrojada. A luta dos sentimentos e das conveniências sociais, tudo se encontra tão bem, tão perfeitamente se chocam, que a ação caminha sempre interessante desde a primeira cena até a última que é uma verdadeira chave de ouro. [...] O drama é excelente por todas as faces, e um dos melhores do repertório. A empresa dá-lo-á muitas vezes ao público, e peço àquelas minhas leitoras que o não viram que se apressem a isso.52

A tessitura de L’Honneur de la Maison indica que as fronteiras entre o melodrama da década de 1850 e o drama realista podem ter sido, até certo ponto, porosas. Os temas sociais (casamento burguês, mistura de ordens sociais, honra da família, trabalho, filho natural) foram retratados tanto pelos autores de melodrama, quanto pelos realistas. A grande

52 ASSIS. “Revista de Teatros, O Espelho, 25 set. 1859”. In: FARIA, 2008, p. 126-127 e 129. 208

diferença se dá na forma patética, ou não, dada ao tema. Essa hipótese sobre os pontos de intersecção entre os gêneros dramáticos indica a necessidade de se conhecer mais profundamente os textos originais, sobretudo, daqueles de dramaturgos praticamente esquecidos em nossos dias. E, se possível, identificar as traduções encenadas no Brasil. Desse modo, a partir do estudo da dinâmica dos palcos, constatamos que não houve uma ruptura drástica entre o melodrama e o drama realista, ou, dito em outros termos, uma suposta suplantação do “antigo drama” pelo “drama moderno”. Quando acompanhamos de perto a trajetória dos primeiros atores brasileiros e analisamos seus repertórios dramáticos, verificamos o fenômeno da coexistência, em vez da ruptura proposta pela divisão da história teatral em escolas literárias, a partir de cronologias pré-determinadas. Joaquim Augusto é uma figura artística exemplar para ilustrarmos essa ideia. Em termos de renovação, o ator esteve mais próximo do “drama da atualidade” português que, como sabemos, ancorou-se no registro patético. Contudo, ao lado da proposta de renovação, Joaquim Augusto não abandonou a representação de melodramas. Em novembro de 1864, quando dirigia em São Paulo uma companhia dramática, encenou A Graça de Deus, melodrama de sucesso nos palcos há vinte anos. Entre março e abril de 1870, protagonizou Simão ou o Velho Cabo de Esquadra no Teatro de São Pedro de Alcântara. A peça havia sido criada no mesmo teatro, na década de 1850, por João Caetano, que obtivera no papel de Simão, segundo Machado de Assis, “grandes enchentes e grandes aplausos”.53

4.3 A construção de um mito

João Caetano, em vida, foi visto como um importante primeiro ator, responsável por criar os grandes heróis da dramaturgia. Era tão estimado que motivou a redação de uma biografia quando ainda atuava, publicada no periódico O Brasil Ilustrado, em dezembro de 1856.54 O ator partilhava do mesmo status de outras figuras, tais como pensadores, militares, pintores e poetas, que se tornaram ícones nacionais. Assim nos faz crer o seguinte artigo publicado na seção “A pedidos” do Jornal do Commercio:

A glória de um sábio, de um gênio militar, de um pintor célebre, de um poeta e de um ator, é glória nacional. A glória de ser indisputavelmente o mais insigne ator

53 ASSIS. “Revista de Teatros, O Espelho, 23 out. 1859”. In: FARIA, 2008, p. 155. 54 Cf. PRADO, 1972, p. 191. 209

brasileiro, o melhor intérprete das paixões de um herói em cena, essa glória que pertence ao Sr. João Caetano dos Santos reflete sobre o país.55

João Caetano não foi o único ator de sua época biografado em vida. Germano Francisco, Joaquim Augusto e Furtado Coelho também inspiraram narrativas de suas trajetórias artísticas.56 Um privilégio para poucos atores. Contudo, João Caetano foi, aparentemente, o único ator brasileiro a redigir um livro de memórias, Lições Dramáticas, obra dedicada ao Imperador D. Pedro II. No interior das treze lições dramáticas, escritas com o tom de uma narrativa de memórias, o artista rememora os pontos altos da carreira, os principais papéis que representou, assim como reflete sobre o seu modo de atuação e seus esforços para a fundação do teatro nacional.57 A morte de João Caetano, ocorrida a 24 de agosto de 1863, desencadeou manifestações públicas de extrema sensibilidade. Uma série de necrológios publicados na imprensa celebraram a longeva carreira do artista e lamentaram seus sofrimentos por causa da doença cardíaca. A imprensa anunciou na ocasião a publicação do volume O Monumento de João Caetano dos Santos, uma recolha de produções literárias em louvor ao artista realizada por Oliveira Quintana e Santos Neves. A classe artística do Rio de Janeiro acompanhou o enterro e se enlutou. Na época em que João Caetano falecia no Rio de Janeiro, Germano Francisco se apresentava no Ceará. Este, “que não era amigo particular do Sr. João Caetano”58, quando soube da notícia do falecimento do colega de profissão, deixou de lado as rivalidades que por anos travaram nos palcos e organizou a celebração de uma missa de réquiem em Fortaleza, que contou com a presença dos artistas de sua companhia dramática, como Francisco Libânio Colás, Vicente Pontes de Oliveira, e os irmãos Augusto, Carmela e Manoela Lucci. Após um pequeno hiato, a memória de João Caetano foi resgatada e celebrada pela primeira biografia póstuma, que veio à luz em 1870. Assinada por Manuel Duarte Moreira de Azevedo, foi publicada pela Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro na seção “Biografia dos brasileiros distintos por letras, armas, virtudes etc.” Moreira de Azevedo narrou a vida de João Caetano, da infância à morte. A carreira artística do ator adquiriu o status de um capítulo da história oficial da nação brasileira.

55 JORNAL do Commercio, Rio de Janeiro, 25 out. 1852, p. 2. 56 Ver SERRA, 1862, SANTOS, 1863, p. 348-351, e SOBRINHO, Francisco Antonio Filgueiras. Estudos Biographicos. Theatro – I. Furtado Coelho. Pernambuco: [s.n.], 1863. 57 Ver SANTOS, 1862. 58 FORTALEZA, 10 de junho de 1863. Pedro II, Fortaleza, 11 jun. 1863, Noticiário, p. 3. 210

Há homens que personificam uma época, constituem a história de uma geração, imprimem por seus talentos, suas ideias, atividade, trabalhos e tentativas um caráter peculiar às letras, às artes no tempo em que vivem; entes predestinados, Deus pelo gênio, na bela linguagem de Lerminier, cercam-se esses homens de uma auréola e prestígio que os engrandece, transforma-os em apóstolos da civilização, em levitas da luz, e eles caminham iluminando o período em que vivem. [...] Percorrei os monumentos históricos de cada nação, de cada povo, e vereis esses vultos que chamamos gênios exercendo decidida influência no domínio das letras ou das artes no tempo em que existiram, e vereis cada povo endeusar, glorificar a esses sacerdotes da civilização, porque seus nomes exprimem progresso, seus nomes são raios de luz.59

Em 1871, dois atores italianos em turnê internacional, Ernesto Rossi e Tommaso Salvini, ofereceram espetáculos no Rio de Janeiro e representaram peças que haviam sido outrora encenadas por João Caetano. No Teatro Lírico Fluminense, em maio de 1871, Rossi encenou Kean, de Dumas (pai), e Othelo, em tradução italiana da obra shakespeariana, diferente da versão de Ducis que fora representada por João Caetano. Salvini protagonizou Othelo no Teatro de São Pedro de Alcântara, em setembro e outubro de 1871. As representações motivaram o aparecimento de manifestações públicas na imprensa de admiração por João Caetano, que configuraram sua imagem póstuma como um ícone nacional, o “símbolo da arte no Brasil”.60 A biografia assinada por Moreira de Azevedo foi transcrita no Jornal da Tarde de 15 e 16 de junho de 1871, aproveitando-se do debate que surgira em torno da figura do ator falecido. França Júnior, na época crítico teatral do mesmo Jornal da Tarde, colocou João Caetano em pé de igualdade a Rossi. Por mais que considerasse o ator brasileiro uma “flor sem cultura”, entendia que sua intuição criadora, o “fogo sagrado”, o inspirara a realizar feitos grandiosos nos palcos.

Rossi, aparecendo em todo o esplendor de sua celebridade, não fê-lo esquecer! Digam embora pretendidos críticos, que o nosso Talma seria um pigmeu ao lado do eminente italiano, eu sustentarei que entre os dois não há essa grande distância que querem enxergar. [...] João Caetano foi a flor sem cultura, e que no entretanto inebriava os sentidos com ignotos perfumes. [...] levantava as massas, inspirado apenas pelo fogo sagrado que o animava.61

Dada a necessidade de cultivar uma referência para o teatro brasileiro, que estivesse à altura dos grandes atores europeus, como o italiano Ernesto Rossi e o francês

59 AZEVEDO, Manuel Duarte Moreira de. Biografia dos brasileiros distintos por letras, armas, virtudes etc. – João Caetano dos Santos. Revista Trimestral do Instituto Histórico e Geográfico, Rio de Janeiro, tomo XXXIII, parte 2, 1870, p. 337. 60 HELEODORO, Joaquim. Ernesto Rossi. Othelo – João Caetano dos Santos. Jornal da Tarde, Rio de Janeiro, 1 jun. 1871, p. 2. 61 JÚNIOR, França. Ernesto Rossi. Jornal da Tarde, Rio de Janeiro, 9 maio 1871, Folhetim do Jornal da Tarde, p. 1. 211

Frédérick Lemaître, intensificou-se um processo de mitificação de João Caetano, operado em diferentes instâncias legitimadoras. Como constatamos, missas eram celebradas a pedido da classe artística para solenizar sua memória a cada década, no aniversário de sua morte, tal como a missa encomendada pela Sociedade Protetora dos Artistas Dramáticos, ocorrida em agosto de 1893. Além das missas de réquiem decenais, espetáculos comemorativos nos teatros celebraram também a memória de João Caetano. Em outubro de 1867, uma récita especial foi promovida por Moura Guimarães no Teatro Lírico Fluminense, com o objetivo de arrecadar fundos para a compra da posse perpétua do jazigo onde João Caetano fora enterrado. O programa foi dividido em três partes, compostas pelos quadros “A memória de um ator”, “A saudade” e pela apoteose “O príncipe do palco brasileiro”.62 Os títulos das performances criadas para o espetáculo sugerem a proposta de celebração da memória de um grande ator nacional. Outras festas artísticas foram organizadas nas décadas seguintes e contribuíram para reafirmar a imagem de João Caetano como a grande estrela do teatro brasileiro. Em agosto de 1873, aniversário do primeiro decênio de morte, um espetáculo em tributo à sua memória foi apresentado no Teatro de São Pedro de Alcântara. A performance se deu em um cenário neoclássico com colunatas, onde o ator a ser adorado era representado por uma estátua. Ao som de uma marcha coral, alegorias representaram o reconhecimento da nação (“vinte províncias do Império em talares”) e da arte dramática (“a Tragédia e a Comédia”) pelos feitos do artista. Seus antigos companheiros, profissionais de sua época, depositaram coroas de flores para simbolizar a saudade do artista ausente.63 Assim, o espetáculo em tributo à memória de João Caetano celebrava a morte, bem como cimentava sua imagem de inigualável ator nacional. Uma série de festas artísticas foram organizadas pelo ator Francisco Correia Vasques (1839-1893), de 1884 a 1891, com o objetivo de arrecadar fundos para a construção de um monumento a João Caetano. Os festivais, que recebiam a presença da família imperial, contaram com o desempenho de atores de renome da época, como Furtado Coelho, que proferiu um discurso no espetáculo de agosto de 1884, publicado em forma de folheto,64 Xisto Bahia, Eugênio de Magalhães, Cinira Polônio, que cantou a “Ave Maria” e Eduardo Brasão,

62 Cf. LYRICO Fluminense. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 20 out. 1867, Teatros, p. 4. 63 Cf. THEATRO S. Pedro de Alcântara. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 26 ago. 1873, p. 6. 64 Ver COELHO, Luís Cândido Furtado. À Memória do Grande Actor João Caetano dos Santos. Discurso official proferido pelo actor Luiz Candido Furtado Coelho no Theatro Sant’Anna, no dia 24 de agosto de 1884, anniversario da morte do Grande Genio. Rio de Janeiro: Typ. de Augusto de Mont’Alverne, 1884. 212

que recitou a poesia “Durante a Tempestade”, de Lopes de Mendonça, no espetáculo de agosto de 1887.65 Arthur Azevedo aparecia nos programas como autor de poesias originais escritas para serem declamadas durante os espetáculos, como os versos da saudação patriótica “Glória ao gênio”, declamados no espetáculo de agosto de 1884.66 Os esforços de Vasques não foram em vão. O modelo em gesso de João Caetano em pose sóbria, como o protagonista da tragédia Oscar, Filho de Ossian, realizado por Francisco Manuel Chaves Pinheiro, em 1850, foi fundido em bronze. O monumento foi inaugurado em ato solene em frente à Escola de Belas Artes, no Rio de Janeiro, em 1891.67 Posteriormente, foi transferido para a Praça Tiradentes, em frente ao Teatro João Caetano, antigo Teatro de São Pedro de Alcântara, rebatizado com o nome do ator em 1923. Após a primeira biografia póstuma, assinada por Moreira de Azevedo, estudos biográficos sobre João Caetano continuaram a vir à luz no decorrer dos séculos XIX e XX, redigidos por importantes homens de letras e estudiosos, como Joaquim Manuel de Macedo, Ferreira Guimarães e Cassiano César, Melo Morais Filho, Pires de Almeida, Adamastor Vergueiro da Cruz, Roberto Seidl e Lafayette Silva.68 Almeida Prado, ao analisar essas biografias, constatou cópias de informações, divergências na caracterização do perfil de João Caetano e incompletudes no traçado de sua carreira artística. Erros advindos da falta de rigor histórico dos biógrafos e de suas idealizações quanto à vida artística de João Caetano, excetuando-se dessa condenação apenas o estudo de Lafayette Silva.69 No Ano Biográfico, publicado em 1876, Joaquim Manuel de Macedo apresentou uma curta narrativa da vida daquele que considerava “o famoso e inspirado ator dramático ainda sem igual no Brasil”.70 Macedo foi o primeiro biógrafo a associar João Caetano à

65 Cf. IMPERIAL Theatro de S. Pedro de Alcântara. João Caetano. Orgam Commemorativo, Rio de Janeiro, 28 ago. 1887, p. 4. 66 Cf. THEATRO Sant’Anna. Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 24 ago. 1884, p. 6. 67 Cf. ATA do assentamento da primeira pedra do pedestal da estátua do ator brasileiro João Caetano dos Santos, falecido em agosto de 1863, em frente à Escola Nacional de Belas Artes. Rio de Janeiro, 1891. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, II – 35, 04, 029. Disponível em: . Acesso em: 7 maio 2015. 68 Ver MACEDO, Joaquim Manuel de. “João Caetano dos Santos”. In: Anno Biographico Brazileiro. Vol. I. Rio de Janeiro: Typographia e Lithographia do Imperial Instituto Artístico, 1876, p. 509-514. GUIMARÃES, Ferreira & CÉSAR, Cassiano. Biographia Completa do Primeiro Actor Dramatico Brasileiro João Caetano dos Santos. Rio de Janeiro: Typographia e Lithographia a Vapor Lombaerts & Comp., 1884. MORAIS FILHO, Melo. João Caetano (estudo de individualidade). Rio de Janeiro: Laemmert e C. Editores, 1903. ALMEIDA, Pires de. Brazil-Theatro. Coletânea. Rio de Janeiro: Tip. Leuzinger, 1901-1909. CRUZ, Adamastor Vergueiro da. João Caetano dos Santos. Niterói: Companhia Editora Fluminense, 1928. SEIDL, Roberto. João Caetano. Rio de Janeiro: Imprensa Moderna, 1934. SILVA, Lafayette. João Caetano e Sua Época. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1936. 69 Ver PRADO, 1972, capítulo “A imagem póstuma”, p. 191-212. 70 MACEDO, 1876, p. 509. 213

literatura dramática romântica. Afirmou que ele fora iniciado na escola romântica por Gonçalves de Magalhães e Araújo Porto-Alegre quando, em 1836, ambos retornavam da estadia na Europa. A ideia lançada por Macedo sobre a iniciação de João Caetano na escola romântica foi reproduzida pelo biógrafo Roberto Seidl, em 1923.

Em 1836 chegavam da Europa, Gonçalves de Magalhães e Araújo Porto Alegre, trazendo ambos, em suas malas, a semente do Romantismo. Amigos de João Caetano, viram os dois brasileiros recém-chegados, que era ele terreno ubérrimo, para cultivar a mimosa planta que tão opulentamente sazonava na velha Europa, e que depois tinha que morrer acalcanhada pelo escalracho do realismo.71

Se, no final do século XIX, João Caetano foi celebrado como um gênio dos palcos, um artista de talento inimitável, ao longo do século XX, o ator passou a ser associado cada vez mais à literatura dramática do romantismo. A imagem de João Caetano como um ícone do período romântico, considerado o momento de fundação do teatro nacional, apareceu nas primeiras histórias literárias brasileiras do início do século XX. Em sua História da Literatura Brasileira (1915), José Veríssimo afirmou que a escola romântica produziu um grande representante nos palcos, o ator João Caetano, do qual não seria necessário apresentar uma biografia, tendo em vista que, embora passado meio século desde a sua morte, ele continuava “saudosamente lembrado”.

Simultaneamente apareceu aqui um grande ator que, com seu nativo talento e ardor pela arte dramática, realizou no palco, mediante companhias em que chegou a interessar os mesmos estadistas do tempo e outros conspícuos cidadãos, e com aplauso e colaboração do público, o teatro brasileiro. O nome desse ator, João Caetano, chegou até nós com tal auréola de admiração e de glória, tão saudosamente lembrado, que se lhe dispensa a biografia ou mais positivos testemunhos do seu valor real. A impressão que ele causou nos seus contemporâneos, impressão profunda e duradoura, basta para assegurar-lhe a primazia na realização cênica daqueles e doutros autores e, portanto, na criação de “teatro” aqui.72

Em 1963, para festejar o centenário de morte de João Caetano, uma conferência foi proferida por Raimundo Magalhães Júnior na Academia Brasileira de Letras (ABL). O biógrafo destacou que Machado de Assis fora um dos principais críticos teatrais do trabalho de João Caetano, e que “o ocaso de sua vida artística coincidia com o alvorecer da vocação literária de Machado de Assis”.73 Assim, ao aproximar a glória de João Caetano no teatro à de

71 SEIDL, Roberto. João Caetano. Illustração Brasileira, Rio de Janeiro, ano IV, n. 30, fev./1923, p. [13]. 72 VERÍSSIMO, 1969, p. 252. 73 MAGALHÃES JÚNIOR, Raimundo. O centenário da morte de João Caetano. Revista de Teatro – SBAT, mar.- abr./1964, p. 31. 214

Machado de Assis na literatura brasileira, Magalhães Júnior elevou a figura de um grande ator nos palcos à de “um verdadeiro símbolo do teatro brasileiro”74, um vulto da cultura nacional. Além de ator de talento, biografado, festejado e rememorado, João Caetano se tornou um capítulo da história da dramaturgia brasileira. Um capítulo diretamente associado ao processo de formação da nacionalidade. Em João Caetano (estudo de individualidade), publicado em 1903, Melo Morais Filho propôs a coincidência “das impulsões de seu talento com os grandes acontecimentos políticos da Independência e do tempestuoso período regencial”.75 Em meados do século XX, João Caetano transfigurou-se no intérprete do repertório romântico, sobretudo, dos “dramalhões de capa e espada, que devem ter feito as delícias das plateias menos exigentes”.76 Para Almeida Prado, que dedicou duas obras ao estudo da carreira artística e empresarial do ator – João Caetano: o ator, o empresário, o repertório (1972), a mais confiável das biografias publicadas, e João Caetano e a Arte do Ator (1984) – este seria “o fulcro em torno do qual girou a atividade dramática brasileira”77 durante três décadas. João Caetano, ator “único, em sua época”78, despontou como a figura de referência na montagem do repertório do período romântico.

João Caetano encenou todo este repertório romântico quase ao mesmo tempo em que interpretava as tragédias clássicas ou neoclássicas, aproximadamente entre 1836 e 1845, com exceção dos dramas históricos portugueses, um pouco retardatários, que continuaram a estrear até 1850, ou mais, estimulados pelo apoio do público do Rio de Janeiro. São mais de vinte peças, abrangendo os principais autores da França, Espanha e Portugal.79

Todo esse longo processo de mitificação culminou na figuração de João Caetano como um ator de inestimável talento, que se consagrou nos palcos, paradoxalmente, pela representação de um vasto repertório de melodramas franceses. Outros atores e atrizes, considerados seus rivais ou amigos mais íntimos, foram tratados timidamente pela historiografia do teatro romântico, ofuscados por uma narrativa que se centrou em um intérprete mitificado. Porém, ao acompanharmos as carreiras artísticas e empresariais desses outros atores, além da do próprio João Caetano, profissionais como Ludovina Soares,

74 Ibidem, p. 38. 75 MORAIS FILHO, 1903, p. 11-12. 76 MAGALHÃES JÚNIOR, 1964, p. 35. 77 PRADO, 1972, p. 217. 78 AGUIAR, Flávio. “João Caetano: o mestre aprendiz”. In: NUÑEZ, Carlinda Fragale Pate et al (Org.). O Teatro Através da História. Vol. 2. Rio de Janeiro: Centro Cultural Banco do Brasil: Entourage Produções Artísticas, 1994, p. 67. 79 PRADO, op. cit., p. 48. 215

Florindo Joaquim, Germano Francisco e Joaquim Augusto, constatamos que a dinâmica de concorrência entre eles contribuiu para a introdução e a permanência do melodrama. Certas peças acabaram por se tornar os carros-chefes de seus repertórios, difundindo-se largamente nas salas de espetáculos, tanto no Rio de Janeiro quanto nas províncias, durante as décadas de 1830 a 1870. Após a morte de João Caetano, quando o repertório musicado e suas divettes passaram a dominar os programas teatrais no Rio de Janeiro, a presença longeva desses profissionais nos palcos foi decisiva para a manutenção do melodrama. Germano Francisco, Florindo Joaquim e Joaquim Augusto, já envelhecidos, ofereceram reprises do antigo repertório entre as décadas de 1860 e 1870.

4.4 José Dias Braga, herdeiro do melodrama

Quando os mais importantes primeiros atores do período romântico saíram de cena, o ator, ensaiador e empresário teatral português José Dias Braga despontou como o herdeiro dos melodramas. Nascido em Funchal, na Ilha da Madeira, em 31 de dezembro de 1846, Dias Braga se naturalizou brasileiro e faleceu no Rio de Janeiro a 23 de novembro de 1910, vítima de um atropelamento de bonde.80 Segundo as impressões de Sousa Bastos, que assistiu a algumas representações de Dias Braga, o artista era uma figura singular, “um ator cheio de defeitos, mas com muita audácia”.81 Ao longo de sua carreira artística e empresarial, que durou até 1908, Dias Braga explorou diferentes salas de espetáculos do Rio de Janeiro, como o Teatro Ginásio, o Teatro São Luiz, o Teatro Recreio Dramático, o Teatro Variedades e o Teatro Lucinda. Verificamos que as companhias dramáticas que dirigiu apresentavam um diversificado repertório de melodramas, peças realistas, comédias, revistas e mágicas. Do repertório realista, Dias Braga protagonizou notadamente peças de Dumas (filho): A Dama das Camélias, O Filho Natural (Le Fils Naturel, TGD, 1858), O Suplício de uma Mulher (Le Supplice d’une Femme, TF, 1865), A Mulher de Cláudio (La Femme de Claude, TGD, 1873), Dionísia (Denise, TF, 1885) e Francillon (TF, 1887). Porém, apesar de ter encenado peças realistas, o repertório de Dias Braga era recheado de melodramas, gênero mais representado pelo ator e que lhe ofereceu grandes sucessos de bilheteria.

80 Cf. SOUSA, tomo II, 1960, p. 128-129. 81 BASTOS, 1898, p. 601. 216

A partir da década de 1880, Dias Braga estreou uma série de melodramas inéditos nos palcos do Rio de Janeiro, produzidos nos teatros populares parisienses após os anos 1850. Criou com extremo sucesso o papel de Edmond Dantès em O Conde de Monte-Cristo, adaptação de Dumas (pai) e Auguste Maquet do romance homônimo, anunciado pela imprensa como “o maior acontecimento teatral do país”.82 De fato, os anúncios que divulgavam os espetáculos contabilizaram 68 representações de O Conde de Monte-Cristo entre outubro de 1885 e março de 1886, o que pode ser considerado um sucesso de bilheteria na época. A peça continuou a ser representada por Dias Braga até o final de sua carreira, em 1908. Averiguamos que, além da montagem de melodramas inéditos, Dias Braga resgatou, a partir da segunda metade da década de 1880, antigos títulos de sucesso do repertório de João Caetano, como A Graça de Deus, Kean e Os Seis Degraus do Crime.83 Desconhecemos quais foram as traduções dessas peças representadas por ele. Sabemos somente, por meio dos anúncios publicitários, que a tradução de Kean, de Dumas (pai), se manteve fiel à cena nove, do quarto ato, do texto original, quando Kean representa em um teatro londrino a cena do adeus de Romeu e Julieta, de Shakespeare. A versão encenada por João Caetano, conforme constatamos, trocara o trecho de Romeu e Julieta por uma cena de Othelo, papel no qual o ator havia se consagrado. Dias Braga remontou com sucesso Os Seis Degraus do Crime, de Nézel e Antier, exibido em espetáculos de 1886 a 1902. Criado por João Caetano meio século antes, Os Seis Degraus do Crime retornou aos palcos em abril de 1886, no Teatro Recreio Dramático, com Dias Braga no papel de Jules Dormilly. Anunciado na imprensa como um exemplar do “repertório do imortal ator João Caetano”84, o resgate do melodrama foi vendido ao público como um espetáculo alternativo aos que não simpatizavam com as “peças literárias” e aos integrantes da “velha guarda”, cuja sensibilidade se formara no seio dos “antigos dramas”.

Teve uma boa ideia a direção daquele teatro, lembrando-se de pôr em cena agora esse popularíssimo drama. O público, que desdenha as peças literárias, os diálogos primorosos e as situações bem encadeadas, logicamente deduzidas, representando com fidelidade quadros da vida real, escritos com a pretensão única, mas exagerada, de espantar pela reprodução escrupulosíssima da verdade, e aprecia as grandes situações violentas dos antigos dramas, mostrou-se mais uma vez entusiasmado com este e com os seus intérpretes. [...] a velha guarda composta dos admiradores de João Caetano e de seus companheiros, representada pela maioria da plateia, a velha

82 THEATRO Recreio Dramático. Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 26 fev. 1886, p. 4. 83 Ver anexos “Figura 11 – José Dias Braga (1846-1910)” e “Tabela 23 – Repertório Francês de Dias Braga no Rio de Janeiro (1872-1908)”. 84 THEATRO Recreio Dramático. Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 29 abr. 1886, p. 4. 217

guarda dos que conservam religiosa lembrança dos triunfos alcançados por aqueles há tantos anos, a velha guarda dos exigentes e dos incontestáveis, aplaudiu vivamente esta nova interpretação.85

O resgate de um melodrama de sucesso do repertório de João Caetano foi financeiramente vantajoso à empresa teatral de Dias Braga. Segundo uma nota publicada pelo periódico Gazeta de Notícias, o ator teria encontrado “um segundo Conde de Monte-Cristo: todos os dias casa cheia”86, em referência ao seu último sucesso de bilheteria. Ao resgatar uma peça do repertório de João Caetano no momento em que a glória póstuma do ator estava sendo construída de modo mais intenso pelas biografias e espetáculos comemorativos organizados por Francisco Correia Vasques, Dias Braga, que se mostrava um empresário teatral atento aos negócios, explorou a memória do célebre artista do ponto de vista comercial. Esses espetáculos de resgate foram vendidos como uma proposta de recuperação de uma outra época do teatro brasileiro, com o objetivo de suprir as saudades de um público ávido por reviver ou por conhecer as obras que o mais insigne ator brasileiro representara nos palcos décadas antes. Contudo, essa expedição de “arqueologia melodramática”87, nas palavras de Arthur Azevedo, que resgatou obras de sucesso da época de João Caetano, ocorreu quando novas formas cênicas de expressão da emoção já haviam despontado. Assim, verificamos que a recepção crítica das novas montagens dos antigos melodramas deu-se por meio de deslizamento de sentidos. Diferentemente do que ocorrera nos anos 1840, ao final do século XIX, as produções populares parisienses suscitaram ressalvas, especialmente, por parte de Arthur Azevedo, prolífico crítico teatral que não economizou linhas para detratar os melodramas. Suas críticas às programações teatrais que exibiram melodramas franceses descrevem os espetáculos como “extravagantes incursões no velho repertório do bulevar do Crime” ou “exumações”88 de um repertório “carunchoso”.89 A produção de melodramas do Théâtre de l’Ambigu-Comique, o teatro parisiense que se tornara o reduto do gênero na segunda metade do século XIX, foi considerada não “digna da nossa inteligência”.90 Os

85 Artigo da Gazeta da Tarde transcrito em: THEATRO Recreio Dramático. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 2 maio 1886, p. 8. 86 GAZETA de Notícias, Rio de Janeiro, 9 maio 1886, Publicações a pedido, p. 2. 87 AZEVEDO. “O Theatro, 30/01/1896”. In: NEVES & LEVIN, 2009, p. 14. 88 Idem. “O Theatro, 21/12/1905”. In: Ibidem, p. 177-178. 89 Idem. “O Theatro, 18/09/1896”. In: Ibidem, p. 124. 90 Idem. “O Theatro, 02/07/1896”. In: Ibidem, p. 90. 218

autores do bulevar, como Dennery e Bouchardy, anunciados outrora com renome, foram descritos pelo crítico brasileiro como dramaturgos sem estilo, “serôdios e pantafaçudos”.91 Os expedientes clássicos do melodrama, como as ações dramáticas que se desenrolam em espiral, as reviravoltas e os efeitos espetaculares, interpretados na década de 1840 como demonstrativos do valor positivo das obras, foram considerados por Arthur Azevedo como labirintos dramáticos, desnecessários e exagerados. O drama em seis quadros Caminho do Crime (La Croix de Saint-Jacques, TG, 1849), de Bouchardy, montado no Teatro Santana, no Rio de Janeiro, em janeiro de 1898, foi depreciado exatamente por apresentar um enredo “complicado”.

Não pode haver peça de enredo mais complicado, em que as cenas violentas se sucedam umas às outras num abrir e fechar de olhos; mas essa mesma profusão de incidentes fazem com que a ação caminhe de extravagância em extravagância, e não se salve na barafunda nem o próprio senso comum.92

Verificamos, assim, uma transformação na recepção crítica do melodrama. Na época de João Caetano, momento de introdução e difusão nos palcos brasileiros, o gênero foi interpretado como gatilho de lágrimas que moralizavam o público, transformando-se na fonte dos títulos convertidos em carros-chefes do repertório de João Caetano e de outros atores contemporâneos. No final do século XIX, contudo, tendo em vista a emergência da nova sensibilidade nos palcos em decorrência dos dramas realistas e das peças ligeiras, operou-se um deslizamento desse sentido. A remontagem de Os Seis Degraus do Crime por Dias Braga é um caso ilustrativo desse fenômeno de recepção. Segundo um cronista do Jornal do Commercio, o desfecho da peça levou o público às gargalhadas em meio aos aplausos: “o 3° ato, digo, é de um cômico irresistível. Ao cair o pano, toda a sala está em gargalhada e os aplausos irrompem uníssonos, frenéticos”.93 O final da peça de Nézel e Antier nada tem de cômico; pelo contrário, é o momento de maior concentração patética, alcançada graças a recursos do melodrama, como o reconhecimento e a formação do tableau. O desvirtuado Jules Dormilly, condenado ao cadafalso por ter assassinado a ex-amante e o seu novo companheiro, está foragido. Ele é encurralado por policiais e por uma turba, ávida por assistir ao vivo na Place de Grève à condenação de um jovem de estirpe nobre. Temendo a morte e a infâmia de subir ao

91 Idem. “O Theatro, 20/01/1898”. In: Ibidem, p. 11. 92 Idem. “O Theatro, 20/01/1898”. In: Ibidem, p. 11. 93 DIÁRIO do Brazil. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 13 maio 1886, p. 8. 219

cadafalso, Jules pede ajuda a Michel. Este o atende prontamente e, ao revelar sua verdadeira identidade, causa um espanto geral.

JULES – Michel! Ajuda-me! MICHEL – O que diz? JULES – Salva-me da infâmia, por meu pai! MICHEL – Por teu pai, eu consinto... Toma... (Ele o apunhala. Jules cai. As portas são arrombadas.) CENA XIII FRANÇOIS (a Michel) – Oh céus! O que fizeste? MICHEL – O meu dever. FRANÇOIS – Então, quem és? MICHEL – O carrasco. (Todo mundo forma um quadro, gritando: O carrasco!).94

As convenções do melodrama se tornaram risíveis na montagem de Dias Braga, em 1886, assim como insignificante o tema de um nobre condenado a perder a cabeça no patíbulo, em praça pública. Corrobora a ideia de deslizamento de sentidos na recepção de Os Seis Degraus do Crime a aproximação que o público pode ter vislumbrado entre esse melodrama e a revista O Bilontra, de Arthur Azevedo e Moreira Sampaio, que estreara naquele mesmo ano, em janeiro de 1886, no Teatro Lucinda. Faustino, o bilontra, encontra-se arruinado financeiramente e é perseguido por meirinhos que pretendem penhorar seus bens. O Trabalho, a Ociosidade e a Jogatina, personagens alegóricas, propõem alternativas para que Faustino obtenha dinheiro. Porém, não é pelo trabalho honesto que ele se reestabelece, mas sim pela venda de um título falso de Barão. Um crítico anônimo do Diário do Brazil, ao analisar a representação de Os Seis Degraus do Crime, associou a personagem Michel à alegoria Trabalho de O Bilontra: “Júlio penetra na corte do rei Jogo, desprezando sempre os conselhos do Homem Negro [Michel] uma espécie do Trabalho, do Bilontra, que a todo o transe o quer afastar do caminho do vício”.95 O crítico observou, porém, que a personagem Jules (Júlio na versão em português) se diferenciava do Faustino de O Bilontra, pois seria “muito mais perverso [...], joga, rouba e

94 NÉZEL & ANTIER, 1832, p. 61. No original: “JULES – Michel ! Aidez- moi ! MICHEL – Que dis-tu ? JULES – Sauvez-moi l’infamie, pour mon père ! MICHEL – Pour ton père, j’y consens... tiens... (Il le frappe. Jules tombe. Les portes sont enfoncées.) SCÈNE XIII FRANÇOIS (à Michel) – O ciel ! Qu’avez-vous fait ? MICHEL – Mon devoir. FRANÇOIS – Qui donc êtes-vous ? MICHEL – Le bourreau. (Tout le monde en général forme un tableau, en criant : Le bourreau !).” 95 DIÁRIO, 13 maio 1886, p. 8. 220

assassina”.96 A partir dessa crítica teatral, parece possível supor que o tom cômico de O Bilontra impactou na recepção do melodrama Os Seis Degraus do Crime, resgatado por Dias Braga três meses após a estreia da revista de Arthur Azevedo, levando o público às gargalhadas, ao reconhecer na dupla Jules-Michel semelhanças com Faustino-Trabalho.

* * *

96 Ibidem.

CONCLUSÕES

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A reconstituição do repertório representado, aliada ao estudo dos textos traduzidos, da circulação e da recepção dos melodramas franceses forneceram um quadro apurado e crítico da presença do gênero no teatro brasileiro oitocentista. Essa abordagem, que incluiu fatores políticos, econômicos e artísticos, inerentes à atividade dos palcos, permitiu colaborar com os trabalhos, hoje clássicos, que foram desenvolvidos por Almeida Prado em dois aspectos. Primeiro, na problematização do estudo da dramaturgia romântica a partir de concepções que engessaram e isolaram os gêneros. Segundo, na consideração dos outros primeiros atores que também foram intérpretes do repertório, inserindo João Caetano em uma dinâmica teatral maior. O melodrama começou a aportar nos palcos brasileiros a partir dos nos anos 1830, juntamente com os dramas românticos, e permaneceu nos programas teatrais até a primeira década do século XX. As peças que chegavam tinham sido criadas nos teatros populares de Paris, como o Théâtre de l’Ambigu-Comique, o Théâtre de la Gaîté e o Théâtre de la Porte- Saint-Martin. Da intensa produção dessas salas de espetáculos, notamos que houve uma preferência pelos melodramas que tratavam de questões em torno do casamento e da família, tais como o casamento por amor versus por conveniência, o casamento entre membros de ordens sociais distintas, a maternidade, o adultério, a herança, a honra e a castidade feminina. Peças que foram escritas, sobretudo, por Auguste Anicet-Bourgeois, Adolphe Dennery e Joseph Bouchardy. Algumas alcançaram sucesso duradouro, sendo representadas ao longo de décadas, a exemplo de A Dama de Saint-Tropez, A Gargalhada, A Graça de Deus, D. César de Bazan e Os Seis Degraus do Crime. As montagens de melodramas sociais foram tímidas. De Félix Pyat, localizamos apenas representações de O Trapeiro de Paris e de Os Dois Serralheiros. De Émile Souvestre, somente Pedro Landais foi encenado. Assim, constatamos que os melodramas que tratavam de temáticas sociais, como a pobreza e a exploração dos menos favorecidos, não encontraram espaço nos palcos brasileiros. Os melodramas de grande espetáculo, que representavam desastres naturais (terremotos, tempestades, vulcões) ou guerras, foram raramente representados, devido ao custo elevado que as montagens exigiam para a confecção satisfatória de figurinos, cenários e maquinismos. Conforme verificamos com representações desse tipo de melodrama, a permanência em cartaz era mínima. Muitas vezes, as peças conheciam apenas a primeira representação, a exemplo da montagem de O Castelo das Sete Torres (Le Château des Sept Tours, TG, 1846), de Julien de Mallian e Alboize de Pujol, peça que tematizava a campanha

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de Napoleão Bonaparte no Egito, em 1799. Ao que tudo indica, foi encenada apenas uma vez por Germano Francisco, que desempenhou o papel do General francês no Teatro de Santa Isabel, em Pernambuco, em 1858. As peças de grande espetáculo obtiveram maior espaço no repertório de Dias Braga, importante mantenedor do melodrama nos palcos brasileiros, entre o final da década de 1870 e os primeiros anos do século XX. Dias Braga protagonizou, por exemplo, A Volta ao Mundo em 80 Dias (Le Tour du Monde en 80 Jours, TPSM, 1874) e O Capitão Grant (Les Enfants du Capitaine Grant, TPSM, 1878), de Dennery e Jules Verne, e O Conde de Monte- Cristo, de Alexandre Dumas (pai) e Auguste Maquet. No momento da introdução do gênero no Brasil, os atores portugueses do grupo de Ludovina Soares foram pioneiros. Esta atriz desempenhou os primeiros papéis femininos dos melodramas franceses durante quase três décadas. Joaquim de Barros, seu compatriota, foi o artista que mais protagonizou os heróis de Bouchardy, entre 1837 e 1844, ano em que veio a falecer no Rio de Janeiro. João Caetano, por sua vez, passou a incorporar o gênero ao seu repertório em meados da década de 1830. Ao lado da esposa, a atriz Estela Sezefreda, formaram o par amoroso em diversas montagens. Ao longo dos anos 1840, discípulos de João Caetano, os brasileiros Germano Francisco, Joaquim Augusto e Florindo Joaquim, começaram a interpretar os papéis dos protagonistas. Diante de uma dinâmica teatral fortemente monopolizada por João Caetano, o melodrama se tornou um gênero cobiçado, em cujos papéis os profissionais se especializaram a fim de estabelecer empresas concorrentes, de modo mais ou menos autônomo. Entre os anos 1840 e 1870, esses artistas se cruzaram, ora em relações amigáveis, nas quais dividiram os palcos, ora em relações de franca concorrência pelo público. No Rio de Janeiro, Germano Francisco dirigiu uma trupe no Teatro de São Januário (1859-1860) e outra no Teatro de São Pedro de Alcântara (1870-1871); Florindo Joaquim foi o empresário do Teatro de São Francisco (1851-1853) e do Teatro de São Januário (1856-1858); Joaquim Augusto esteve à frente da companhia do Teatro Ginásio Dramático (1861-1862). A concorrência intensa entre esses primeiros atores foi decisiva para a difusão do melodrama nas províncias já que João Caetano dominava a cena teatral da Corte e simbolizava a arte nacional. João Caetano se apresentou na Bahia, Pernambuco, Rio Grande do Sul e Santa Catarina, regiões nas quais desembarcou com o status de representante da nação. Germano Francisco, em contrapartida, foi um empresário teatral bem-sucedido nas províncias do Norte (Bahia, Pernambuco, Maranhão, Ceará, Pará) e no Rio Grande do Sul.

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Florindo Joaquim trabalhou nos teatros das principais cidades do Sul (Rio Grande, Porto Alegre e Pelotas), ao passo que Joaquim Augusto realizou curtas turnês nas províncias da Bahia, Maranhão e Rio Grande do Sul, e dirigiu companhias em São Paulo. Os melodramas franceses compuseram os programas dramáticos tanto de espetáculos rotineiros, em sistema de assinaturas ou venda de ingressos avulsos, quanto dos beneficentes, cuja receita era revertida em prol de instituições de caridade, igrejas e artistas. Integraram também os programas festivos das récitas especiais em que se celebravam as datas da Monarquia (Independência – 7 de setembro, Dia do Fico – 9 de janeiro, natalícios de membros da família imperial, a exemplo do 2 de dezembro, aniversário do Imperador D. Pedro II). Nesses espetáculos comemorativos, que contavam com a presença da família imperial na tribuna, os melodramas eram representados logo após a execução do Hino Nacional pela orquestra do teatro. Os textos encenados pelos atores estudados eram traduções para o português. Parte das traduções foi realizada por brasileiros, tais como Antônio Rego, José Joaquim Vieira Souto e Joaquim da Silva Lessa Paranhos, genro de João Caetano. Outra parte dos textos veio de Portugal, em versões, por exemplo, de Luís José Baiardo e João Baptista Ferreira, tradutores dos teatros de Lisboa (Teatro da Rua dos Condes, Teatro do Salitre e Teatro de D. Maria II). Imigrantes portugueses instalados no Rio de Janeiro também traduziram melodramas para o idioma, como Francisco Luiz Machado, membro do Conservatório Dramático Brasileiro, Henrique Chaves (1849-?), jornalista da Gazeta de Notícias, e Eduardo Garrido (1842-?), autor de mágicas e óperas cômicas. No processo de tradução e realização cênica do melodrama francês no Brasil, empreenderam-se modificações nos textos originais. As traduções estiveram sob a tutela da censura exercida pelo Conservatório Dramático Brasileiro. Nesse sentido, dentre as supressões exigidas pela censura, a fim de eliminar trechos das peças interpretados como licenciosos, estão diálogos e canções que tratavam mais abertamente do comportamento feminino em A Graça de Deus. Impediu-se a representação de trechos que não haviam despertado a desconfiança da censura francesa. Para a realização cênica, o texto passava por alterações de acordo com as condições materiais das companhias, ou seja, a quantidade de atores e os recursos financeiros de que dispunham para a confecção dos figurinos, cenários e maquinismos. Conforme verificamos, a tendência era simplificar ou eliminar as cenas que exigissem elevados investimentos, a exemplo da montagem de Trinta Anos ou a Vida de um Jogador no Teatro da

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Praia de D. Manuel, que suprimiu a representação de um baile mascarado e de um incêndio em um casebre. O jogo de cena de João Caetano, que desempenhava com frequência a função de ensaiador, também produziu alterações nos textos originais, para atender suas características artísticas. Como apresentamos, na montagem de Kean, houve a troca da cena de Romeu e Julieta, de Shakespeare, por um trecho de Othelo. Na representação de A Gargalhada, suprimiram-se passagens cômicas, a fim de não comprometer o desempenho arrebatador de João Caetano nos momentos patéticos. Quando os dramas românticos foram banidos dos programas, a partir da década de 1840, os atores e os tradutores se redirecionaram para peças que fossem aceitáveis pela censura. Foi o momento em que o melodrama francês recente passou a ser o gênero sério mais bem-sucedido nos palcos brasileiros. Ainda que essas peças abordassem questões intrínsecas ao contexto francês, como a ascensão de ordens sociais, o casamento entre membros da nobreza falida e da burguesia enriquecida e a defesa de ideias socialistas, a exemplo das peças de Félix Pyat, as montagens brasileiras não despertaram debates sobre esses assuntos na imprensa. De acordo com as resenhas e textos opinativos publicados pelos periódicos, sublinhava-se o ensinamento moral das peças, ao passo que se atenuavam os discursos sociais. As representações, por meio dos efeitos patéticos expressos na atuação dos primeiros atores, despertavam as lágrimas que moralizavam o público. Assim, a partir da sensibilização, os melodramas foram encenados com o intuito de oferecer modelos de conduta moral ao público, no que dizia respeito às questões do casamento e da organização familiar. Como exemplo, verificamos que a encenação de Luísa de Lignerolles, em 1841, foi interpretada como um alerta sobre os perigos do adultério, que levaria a família ao opróbrio por condenar uma relação sacramentada. O melodrama francês foi tido no Brasil como uma proposta perfeita para o que se esperava do teatro na época, uma arte cujo papel era moralizar a sociedade. Uma moralização que seguia os preceitos políticos monárquicos, os mandamentos da religião católica e os bons costumes conservadores, ideais defendidos pelo Conservatório Dramático Brasileiro. Um sistema adequado ao público dos teatros, no início do Segundo Reinado, que era integrado pelos membros da família imperial, famílias de posses, instaladas nos camarotes, e trabalhadores livres (profissionais liberais, assalariados do comércio, funcionários públicos de

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baixo escalão), que se acomodavam na plateia, onde os preços dos assentos eram razoavelmente mais acessíveis. O melodrama adquiriu tamanho prestígio que se transformou em uma dramaturgia de referência. Guiou a produção séria de Martins Pena e de Burgain, e até mesmo daqueles que compuseram em outros gêneros, como Gonçalves de Magalhães na tragédia e Gonçalves Dias no drama romântico. Quando se apresentaram no Teatro de D. Maria II, em Lisboa, Germano Francisco e João Caetano escolheram representar melodramas bem-sucedidos nos palcos brasileiros, confiantes de que, assim, conquistariam a glória em terra lusa. A partir de 1855, o repertório constituído por melodramas estabeleceu relações de conflito com a proposta de renovação realista e o jogo cênico dos atores do Teatro Ginásio Dramático. Contudo, sabemos que peças criadas originalmente nos teatros populares de Paris também estiveram em cartaz nessa sala de espetáculos. Assim, os palcos demonstram que a desejada renovação mais efetiva da dramaturgia foi bloqueada pela longa permanência do melodrama e que houve um cruzamento entre os gêneros (melodrama e drama – realista ou “da atualidade”) e seus públicos. Nessa época, os jovens homens de letras, a exemplo de Machado de Assis e Quintino Bocaiúva, também foram espectadores do melodrama. Em suas crônicas, Machado de Assis tratou da representação dessas peças, não apenas no Teatro Ginásio Dramático, mas também no Teatro de São Januário, dirigido por Germano Francisco entre os anos de 1859 e 1860. Ali, o ator-empresário protagonizou melodramas em espetáculos vespertinos, destinados a classes populares, sobretudo, aos caixeiros. Após a morte de João Caetano, em 1863, e a aposentadoria dos primeiros atores da cena romântica, o melodrama passou por novas dinâmicas e encontrou outros sentidos nos palcos. O processo de mitificação do célebre ator – iniciado a partir de 1870 com a publicação de estudos biográficos, a construção de um monumento no Rio de Janeiro e os espetáculos para celebrar a sua memória – deu impulso às representações de determinadas peças do antigo repertório. Dias Braga foi o responsável pelo resgate de A Graça de Deus, Os Seis Degraus do Crime e Kean. Essas reprises, apresentadas no final do século XIX, reviveram parte da história do teatro nacional, então celebrada na figura de João Caetano, e evocaram sentimentos de nostalgia nos espectadores da “velha guarda”, cuja sensibilidade se formara no seio das peças moralizantes e de intenso efeito patético. Contudo, às vésperas do século XX, devido à emergência de novas formas de expressão da emoção, seja com as peças ligeiras,

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seja com o drama moderno, o patético dos antigos melodramas já não conduzia os novos espectadores às lágrimas. Inserido em uma dinâmica internacional de circulação do melodrama francês, durante o século XIX, o Brasil foi um espaço de recepção que apresentou fenômenos semelhantes aos da França, mas também passou por processos singulares, que produziram apropriações do gênero pelos nossos palcos. Algumas das peças de longa permanência em Paris alcançaram sobrevida similar nos teatros brasileiros, tais como A Dama de Saint-Tropez, A Graça de Deus, D. César de Bazan e Kean. Na França, após a morte do ator Frédérick Lemaître, essas peças foram resgatadas em temporadas específicas nos teatros populares. No Brasil, permaneceram nos palcos enquanto os discípulos de João Caetano se mantiveram em atuação, até meados da década de 1870. Após a aposentadoria deles, alguns sucessos foram retomados por Dias Braga, a partir dos anos 1880. Além desses títulos, verificamos que a permanência de A Gargalhada e de Os Seis Degraus do Crime ocorreu somente no Brasil. A Gargalhada se manteve no repertório devido à presença, no Rio de Janeiro, de seu autor, Jacques Arago, e da amizade dele com João Caetano. Por terem se tornado duas peças bem-sucedidas do repertório desse ator, foram incorporadas pelos outros artistas, que as encenaram nos teatros das províncias do Norte e do Sul do Império. A atividade teatral no Brasil não se estruturou sob um sistema de privilégios, como ocorreu na França, onde leis determinavam quais gêneros cada teatro poderia encenar. Desse modo, lá o melodrama era representado apenas nos grandes teatros privados dos bulevares populares, tais como o Théâtre de l’Ambigu-Comique, o Théâtre de la Gaîté e o Théâtre de la Porte-Saint-Martin. As salas de espetáculos oficiais – entenda-se por oficial o teatro subvencionado pelo governo, como a Comédie-Française – não montavam os melodramas. Contrariamente, no Brasil, o gênero foi representado em todos os teatros, não importando se era subvencionado, privado, o reduto da renovação realista, ou uma sala de espetáculos dedicada à ópera, tal como o Teatro Lírico Fluminense, onde João Caetano encenou A Dama de Saint-Tropez, em 1856. No Brasil, o melodrama estabeleceu uma relação específica com o poder monárquico, de modo não observado na França durante a Monarquia de Julho. João Caetano, ator-empresário que recebia subvenção do governo imperial, cujo jogo cênico se apoiava fortemente nos efeitos patéticos, tornou o gênero incontornável para os demais primeiros atores, que tentavam manter empresas teatrais rivais, de caráter comercial, no Rio de Janeiro,

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ou subvencionado, nas províncias. A concorrência interna entre esses profissionais, desencadeada pelo monopólio do ator favorecido pela oficialidade das subvenções, explica, assim, a dinâmica de apropriação e permanência do melodrama francês nos palcos brasileiros oitocentistas.

* * *

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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DOCUMENTOS E FONTES CONSULTADAS

PERIÓDICOS

Bahia

A Marmota (1849)

Correio Mercantil: folha official de commercio e de literatura (1848-1849)

O Mercantil (1848)

Ceará

D. Pedro II (1852, 1855, 1861-1863, 1868)

O Araripe (1859, 1864)

O Cearense (1852, 1862-1864, 1868)

O Commercial (1855-1857)

Lisboa

A Ilustração Luso-Brasileira (1856)

Archivo Pittoresco (1863)

Imprensa e Lei (1855-1856)

Revista Contemporânea de Portugal e Brasil (1860)

Maranhão

A Imprensa (1857)

A Sentinela (1856)

Diário do Maranhão (1856-1857)

O Estandarte (1856)

O Globo (1853)

O Observador (1853-1855)

Publicador Maranhense (1853-1855 e 1862-1864) 231

Paris

Journal des Débats Politiques et Littéraires (1844)

La Presse (1844)

Le Journal (1903)

Le Journal des Théâtres: littérature, musique, beaux-arts (1845)

Le Nouvelliste (1856)

Revue d’Art Dramatique (1897)

Revue Franco-Italienne (1856)

Pernambuco

A Imprensa (1850)

A União (1850-1852)

Diário de Pernambuco (1839, 1854)

Diário Novo (1852)

Jornal do Recife (1859, 1865-1866 e 1869)

O Constitucional (1861)

O Liberal Pernambucano: jornal político e social (1852-1858)

O Telegrapho: periódico joco-serio (1850)

Rio de Janeiro

A Aurora (1851)

A Marmota (1858)

Correio do Imperador ou o Direito de Propriedade (1836)

Correio da Tarde (1856)

Correio do Rio de Janeiro (1822)

Correio Mercantil (1848-1863)

232

Coruja Theatral (1840-1841)

Diário de Notícias (1872)

Diário do Rio de Janeiro (1834-1871)

Gazeta de Notícias (1875-1910)

Jornal do Commercio (1834-1871)

Jornal dos Debates (1837)

Marmota na Corte (1851)

Marmota Fluminense (1855)

Pharol do Império (1837)

O Álbum Semanal (1852)

O Brasil (1841)

O Despertador (1839-1841)

Revista Theatral: jornal dilletanti, variado e imparcial (1860)

Sete de Abril (1836)

Rio Grande do Sul

A Federação (1893)

O Brado do Sul (1860)

Revista Mensal da Sociedade Parthenon Litterario (1873)

Santa Catarina

O Correio Catharinense (1854)

São Paulo

Correio Paulistano (1854-1855 e 1862-1868)

233

CATÁLOGOS

CATÁLOGO da Livraria de B. L. Garnier n. 23 – Obras Principais. Rio de Janeiro: Typ. de Simon e Comp., 1864.

CATÁLOGO Suplementar dos Livros do Gabinete Português de Leitura no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Perseverança, 1868.

EXTRACTO do Catálogo da Livraria de B. L. Garnier. Rio de Janeiro: 1865.

DOSSIÊS DA COLLECTION AUGUSTE RONDEL (Bibliothèque des Arts du Spectacle, BNF – Richelieu)

Cote 4-RF-40737 – Recueil factice d’articles de presse et programmes sur diverses pièces de Adolphe D’Ennery, 2 vol., Collection Auguste Rondel, Bibliothèque des Arts du Spectacle, BNF – Richelieu.

Cote 8-RF-21194 – Recueil factice d’articles concernant la vie et les œuvres de Jacques Arago, Collection Auguste Rondel, Bibliothèque des Arts du Spectacle, BNF – Richelieu.

Cote 8-RF-40570 – Recueil factice d’art. de presse et progr. sur “La Grâce de Dieu” de Dennery et Lemoine, Collection Auguste Rondel, Bibliothèque des Arts du Spectacle, BNF – Richelieu.

Cote 8-RF-40596 – Recueil factice d’art. de presse et programmes sur “Don César de Bazan” de Dumanoir et Dennery, Collection Auguste Rondel, Bibliothèque des Arts du Spectacle, BNF – Richelieu.

PARECER DA CENSURA FRANCESA

Cote F21 975 – RAPPORT de la censure. “Théâtre de la Porte-Saint-Martin. Georges Maurice, drame en 5 actes”, Archives Nationales, Pierrefitte-sur-Seine.

PARECERES DO CONSERVATÓRIO DRAMÁTICO BRASILEIRO

BIVAR, Luís Garcia Soares de. Requerimento a Antonio Luis Fernandes da Cunha, solicitando exame censório para a tradução de A torre maldita, de Alexandre Dumas. Rio de Janeiro, 16 fev. 1858. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 14, 099.

GUEDES, Camilo José do Rosário. Administrador do Teatro de São Francisco. Requerimento a José Rufino Rodrigues Vasconcelos, solicitando exames censório para as peças: L’Ambassadrice, Zampa, Jean de Paris, Fra Diavolo, D. César de Bazan, Gargalhada, Graça de Deus, Kettly, O vizinho Bagnolet e O Beijo, para serem representadas na 234

quaresma. Rio de Janeiro, 4 mar. 1847. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 06, 002.

MELLO, Jacinto Correa de. Diretor de cena da Sociedade Dramática Particular Minerva e Harmonia. Requerimento ao 1º secretário do Conservatório Dramático Brasileiro solicitando exame censório para a peça: As Minas da Polônia. Rio de Janeiro, 5 set. 1846. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 04, 045.

PEREIRA, José Clemente. Censor. Parecer censório sobre o drama de Victor Hugo: Maria Tudor, negando a licença por julgá-lo imoral. Rio de Janeiro, 20 jan. 1844. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 22, 048.

ROMEIRO, José Antônio Thomas. Inspetor de cena do Teatro São Pedro d’Alcântara. Requerimento ao 1º secretário do Conservatório Dramático Brasileiro de exame censório para a peça: O marinheiro de Saint Tropez. Rio de Janeiro, 17 dez. 1845. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 03, 054.

______. Requerimento ao 1º secretário do Conservatório Dramático Brasileiro solicitando exame censório do folheto da ópera Hernani. Rio de Janeiro, 27 maio 1846. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 04, 020.

______. Requerimento ao 1º secretário do Conservatório Dramático Brasileiro de solicitação de exame censório para a peça: Trinta anos da vida de um jogador. Rio de Janeiro, 23 abr. 1847. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código, I – 08, 06, 015.

SANTOS, João Caetano dos. Requerimento ao 1º secretário do Conservatório Dramático Brasileiro para as peças: D. Rodrigo, D. César de Bazan, A filha do cego. Rio de Janeiro, 28 out. 1845. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 03, 039.

SILVA, João José de Castro e. Administrador do Teatro São Pedro d’Alcântara. Requerimento a Antonio Luis Fernandes da Cunha, solicitando exame censório para o drama: Simão, ou, O Velho Cabo de Esquadra. Rio de Janeiro, 6 abr. 1858. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 14, 120.

______. Requerimento a Diogo Soares da Silva de Bivar, solicitando exame censório para as peças: Camões e A Morte de Gomes Freire. Rio de Janeiro, 27 maio 1855. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 12, 017.

VASCONCELOS, José Rufino Rodrigues de. 1º secretário do Conservatório Dramático Brasileiro. Designação do 1º secretário do Conservatório Dramático Brasileiro ao próprio, para examinar a peça: Kean ou desordem e gênio, a ser encenada no Teatro São Francisco. Rio de Janeiro, 20 ago. 1844. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 02, 007.

______. Designação para Ângelo Muniz Silva Ferraz e João Antônio de Miranda examinarem a peça: A Graça de Deus. Rio de Janeiro, 5 mar. 1847. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 05, 072 n. 003.

235

______. Designação para Francisco José de Souza Silva examinar a peça: D. Cezar de Bazan. Rio de Janeiro, 5 mar. 1847. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 05, 072 nº 001.

______. Encaminhamento do 1º secretário do Conservatório Dramático Brasileiro de pedido de exames censórios das peças: A Gargalhada e Luiza de Lignerolles, por parte do Teatro de São Francisco. Rio de Janeiro, 20 abr. 1844. Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, Código I – 08, 01, 027.

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ARAGO, Jacques & MARTIN, Alexandre. L’Éclat de Rire: drame en trois actes. Paris: Marchant, 1840. (Collection Le Magasin Théâtral).

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ANEXOS

(ILUSTRAÇÕES)

248

Figura 1 – Ludovina Soares da Costa (1802-1868)

Ludovina Soares da Costa. Litografia de A. de Pinho, a partir do ambrótipo de Pacheco e Smit Fonte: Biblioteca Nacional.

Figura 2 – Percurso de Ludovina Soares nos Teatros

1830-1840 1840-1850 1850-1860 1860-1870

1840-1864 Teatro São Pedro de Alcântara

1829-1834 Teatro Imp. São Pedro de Alcântara 1834-1864 (1829-1831)/Teatro Constitucional Teatro da Praia de D. Manuel (1834-1838)/ Fluminense (1831-1834) Teatro São Januário (1838-1864)

1833 1866 Teatro da Rua dos Teatro Ginásio Arcos Dramático

RIO DE JANEIRO

24

9

250

Figura 3 – Personagem Orosmane da Zaíra, de Voltaire, no Teatro de São João

ARAGO, Jacques. Voyage Autour du Monde: souvenirs d’un aveugle (Nouvelle édition revue et augmentée). Paris: H. Roux, 1880, p. 37.

251

Figura 4 – João Caetano dos Santos (1808-1863)

João Caetano dos Santos. Gravura de autoria de Sebastien Auguste Sisson (1856). Fonte: Biblioteca Nacional do Rio Janeiro.

Figura 5 – Percurso de João Caetano nos Teatros

1830-1840 1840-1850 1850-1860 1860-1870

1834-1840 1841-1850 Teatro Constitucional Teatro São Francisco e Teatro São 1851-1863 Fluminense/Teatro São Pedro de Januário (a partir de 1848) Teatro São Pedro de Alcântara Alcântara

1842-1860 1833 Teatro Santa Tereza Teatro Niteroiense (Niterói) (Niterói) e Teatro do Valongo 1856 Teatro Lírico

RIO DE JANEIRO Fluminense

PROVÍNCIAS BRASILEIRAS 1854 E PORTUGAL Teatro Sete de Abril (Pelotas), Teatro Sete de Setembro (Rio Grande) e Teatro São Pedro de Alcântara (Desterro)

1849 1857 Teatro São João Teatro Santa (Salvador) Isabel (Recife)

1860 Teatro Nacional D. Maria II (Lisboa)

2

52

253

Figura 6 – Germano Francisco de Oliveira (1820-1885)

Germano Francisco de Oliveira. Fonte: SERRA, Joaquim. Biografia do Actor Brasileiro Germano Francisco de Oliveira. São Luís: Tip. do Progresso, 1862. Figura 7 – Percurso de Germano Francisco nos Teatros

1830-1840 1840-1850 1850-1860 1860-1871

1834-1840 1841-1848 1858-1860 1870-1871 Teatro da Praia de D. Teatro São Pedro de Teatro São Teatro São Manoel/Teatro São Alcântara Januário Pedro de Januário Alcântara 1865 Teatro Lírico Fluminense 1870 1851 1860 1833 Teatro Fênix Teatro São Teatro Ginásio Teatro Rua Dramática Francisco dos Arcos Dramático

RIO DE JANEIRO

PROVÍNCIAS BRASILEIRAS 1848 1852 1855 1857 E PORTUGAL Teatro São Pedro Teatro Teatro Teatro 1869 de Alcântara Thaliense Thaliense Providência 1863 Teatro São (Salvador) (Fortaleza) (Fortaleza) (Belém) Teatro Thaliense Pedro (Fortaleza) (Porto Alegre) 1854 1860 1868 Teatro Teatro Sete de Abril (Pelotas) Teatro Sete de Abril (Pelotas) Providência e Teatro Sete de Setembro e Teatro Sete de Setembro (Belém) (Rio Grande) (Rio Grande)

1848-1850 1850-1852 1853-1855 1855-1856 1857 -1861 1862-1864 1864 -1865 Teatro São Teatro Teatro São T. Nac. D. Maria II e Teatro Santa Isabel Teatro São Teatro João Santa Isabel Luiz Teatro do Ginásio (Recife) Luiz Santa Isabel (Salvador) (Recife) (São Luís) (Lisboa) (São Luiz) (Recife)

2

54

Figura 8 – Percurso de Florindo Joaquim nos Teatros

1830-1840 1840-1850 1850-1860 1860-1870 1870-1890

1837-1841 1841-1842 1843-1844 1844-1848 1849-1851 1851-1853 1856-1858 1858-1873 Teatro Constitucional Teatro São Teatro São Teatro São Teatro São Teatro São Teatro São Teatro São Pedro de Fluminense/Teatro Francisco Francisco Pedro de Pedro de Francisco Januário Alcântara São Pedro de Alcântara Alcântara Alcântara

1883

1849 Teatro São Pedro de 1843 Teatro São Januário Alcântara Teatro São Pedro de Alcântara

RIO DE JANEIRO

PROVÍNCIAS BRASILEIRAS 1853-1854 1849 Teatro Sete 1855 1866 Teatro Dom Pedro II de Abril Teatro Teatro Sete de (Porto Alegre) (Pelotas) D. Pedro II Abril (Porto Alegre) (Pelotas)

2

55

256

Figura 9 – Joaquim Augusto Ribeiro de Souza (1825-1873)

Joaquim Augusto Ribeiro de Souza. Fonte: Archivo Pittoresco, n. 44, Lisboa, 1863, p. 349. Figura 10 – Percurso de Joaquim Augusto nos Teatros

1840-1850 1850-1860 1860-1871

1841-1844 1849-1850 1851-1854 1859-1862 Teatro São Teatro São Teatro S. Pedro Teatro Ginásio 1871 Francisco Januário de Alcântara Dramático Teatro Fênix Dramática

1870 1851 1852 1859 1862 1864 1867 Teatro São Pedro Teatro São Teatro São Teatro São Pedro Teatro Ateneu Teatro Lírico Teatro São Pedro de Alcântara Francisco Januário de Alcântara Dramático Fluminense de Alcântara RIO DE JANEIRO

PROVÍNCIAS BRASILEIRAS E PORTUGAL 1864 1867 1849 1853 Teatro do Ginásio Teatro São Luiz Teatro de São Teatro Sete de (Lisboa) (São Luiz) João (Bahia) Abril (Pelotas)

1854-1855 1855-1858 1862-1864 1865-1868 1845-1849 Teatro São Paulo Rio Grande Teatro São Paulo Teatro São José Rio Grande do (São Paulo) do Sul (São Paulo) (São Paulo) Sul

2

57

258

Figura 11 – José Dias Braga (1846-1910)

José Dias Braga. Fonte: Almanack dos Theatros, Rio de Janeiro, 1909, p. 26.

ANEXOS

(TABELAS)

260

Tabela 1 – Repertório Francês da Companhia Portuguesa no Teatro da Praia de D. Manuel (1834-1838) / Teatro de São Januário (1839)1

Tradução Peça original A Família de um Judeu ou o Le Prévôt de Paris (TG, 1836, drama em três atos), de Preboste de Paris Auguste-Louis-Désiré Boulé e Eugène Cormon La Famille Moronval (TPSM, 1834, drama em cinco A Família Moronval atos), de Charles Lafont L’Honneur dans le Crime (TAC, 1834, drama em A Honra no Crime cinco atos), de Julien de Mallian L’Idiote (TPSA, 1837, drama em três atos), de A Idiota Alboize de Pujol La Joueuse (TPR, 1789, drama em três atos e em A Jogadora ou os Três Dias de verso), de Pigault-Lebrun (pseudônimo de Charles Paris Antoine Guillaume Pigault de L’Epinoy) A Mulher de Dois Maridos ou a La Femme à Deux Maris (TAC, 1802, melodrama em Virtude entre o Amor e o Crime três atos), de Guilbert de Pixerécourt La Fiancée de Lammermoor (TPSM, 1828, A Noiva de Lammermoor ou o melodrama em três atos), de Victor Ducange, Último dos Ravenswood adaptação do romance The Bride of Lammermoor (1819), de Walter Scott La Vénitienne (TPSM, 1834, drama em cinco atos e A Veneziana oito quadros), de Alexandre Dumas (pai) e Auguste Anicet-Bourgeois Calas (TAC, 1819, drama em três atos), Calás ou as Vítimas do Erro de Victor Ducange

Carlos Perseguido ou a Cabana La Cabane de Montagnard ou les Auvergnats (TPSM, da Montanha 1818, melodrama em três atos), de Victor Ducange

1 Os títulos que integram a tabela foram pesquisados em anúncios de espetáculos publicados pela imprensa diária do Rio de Janeiro, entre 1834 e 1839. Localizamos indícios de encenações de outros dramas traduzidos do francês, mas, pelas informações incompletas, não foi possível identificar os títulos originais: O Libertador da Pátria ou a Traição de um Ministro de Estado, drama em três atos, A Tomada de Narva por Pedro o Grande, Imperador da Rússia, drama em três atos, O Prodígio do Amor Filial ou o Órfão e o Assassino, drama em três atos, Na Maior Desgraça o Céu Acode ou o Mestre Tacão, tradução do Dr. Antonio Soares de Azevedo, Pedro o Grande ou os Falsos Mendigos, tradução do Padre José Manuel de Abreu e Lima, O Mendicante ou o Delator de Si Mesmo, drama em três atos, Frederico II, Rei da Prússia, ou as Duas Últimas Horas de um Condenado, drama em três atos de Anicet-Bourgeois, e O Limpa Candeeiros ou o Homem das Consequências, drama em um ato, todos os três traduzidos por Luís José Baiardo. Encontramos ainda indícios de representações de dramas que conhecemos apenas os títulos em português, sem saber, no entanto, se se tratam de traduções de dramas franceses: Leonor de Morville, drama em quatro atos, D. Pedro, Duque de Osuna, ou o Grande Vice-Rei de Nápoles, drama em três atos, Fitz Henrique na Casa dos Doidos, drama em três atos, Cristina, Rainha da Suécia em Nicoping, drama em três atos, O Anjo Tutelar ou a Mulher do Diabo, drama em três atos, Blanford, drama em três atos, O Jogador Parricida, O Rachador Escocês, Generosidade e Ciúme ou o Holandês Orgulhoso. Múcio da Paixão informa a montagem de outros dramas pela companhia do Teatro da Praia de D. Manuel, dos quais, no entanto, não localizamos os anúncios de espetáculos: Cora, Virgem do Sol, drama em cinco atos, Ana Fredegaire ou a Mulher Intrigante Iludindo o seu Soberano, drama em três atos, e Leonide, Princesa da Hungria ou o Filósofo Iludido, drama em três atos – acreditamos que, muito provavelmente, seja uma tradução do melodrama Lisbeth, la Fille du Laboureur, de Victor Ducange, baseado em seu romance Léonide, ou la Vieille de Surène. Ver PAIXÃO, 1936, p. 150-151. 261

Clémence et Waldémar, ou le Peintre par Amour Clemência e Waldemare ou o (1801, reprise no TPSM em 1806, drama em três Esposo Pintor atos), de Benoît Pelletier-Volméranges Clementina e Desormey ou os Clémentine et Désormes (1780, drama em cinco atos), Funestos Resultados do Jogo de M. de Monvel Dago, Vítima da Inquisição ou os Dago ou les Mendiants d’Espagne (1806, melodrama Mendigos da Espanha em três atos), de Jean Cuvelier de Trie Dix Ans de la Vie d’une Femme ou les Mauvais Dez Anos da Vida de uma Mulher Conseils (1832, drama em cinco atos), ou os Maus Conselhos de Eugène Scribe Don Juan de Maraña ou la Chute d’un Ange (TPSM, Dom João de Maraña ou o Fim de 1836, mistério em cinco atos e sete quadros), um Dissoluto de Alexandre Dumas (pai) La Duchesse de Vaubalière (TPSM, 1836, drama em Duquesa de la Vaubalière cinco atos), de Michel Nicolas Balisson de Rougemont Eulalie Granger (TPSM, 1837, drama em cinco atos e Eulalia Granger sete quadros), de Michel Nicolas Balisson de Rougemont La Famille d’Anglade ou le Vol (1817, melodrama em Família de Anglade três atos), de Louis Pierre Narcisse Fournier Fedra Phèdre (1677, tragédia em cinco atos), de Racine Fieschi ou la Machine Infernale (1835, melodrama Fieschi ou a Máquina Infernal em três atos), de Auguste Jouhaud Gaspard (TAC, 1837, drama em quatro atos e cinco Gaspardo, o Pescador ou o Herói quadros, precedido de um prólogo), de Joseph Milanês Bouchardy Il y a Seize Ans ou les Incendiaires (TG, 1831, drama Há Dezesseis Anos ou os em três atos entremeado de música), de Victor Incendiários Ducange Jean Sbogar (TG, 1818, melodrama em três atos), João Sbogar ou o Salteador de de Jean Cuvelier de Trie, adaptação do romance Monte-Negro homônimo de Charles Nodier Latude ou Trente-Cinq Ans de Captivité (1835, Latude ou Trinta e Cinco Anos de melodrama em três atos), de Auguste Anicet- Cativeiro Bourgeois e Guilbert de Pixerécourt Lucrécia Borgia ou o Terror da Lucrèce Borgia (TPSM, 1833, drama em três atos e Itália em prosa), de Victor Hugo Mérope (CF, 1743, tragédia em cinco atos), de Mérope Voltaire Nabuchodonosor (TAC, 1836, drama em quatro atos), Nabucodonosor de Auguste Anicet-Bourgeois e Francis Cornu O Abade de l’Épée ou a Órfã de L’Abbé de l’Épée (1799, drama em cinco atos), Bruxelas de Jean Nicolas Bouilly

O Castelo de Kenilworth ou a Le Château de Kenilworth (1822, melodrama em três Grande Isabel, Rainha da atos), de Eugène Cantiran de Boirie e Henri Lemaire, Inglaterra adaptação de Kenilworth (1821), romance de Walter Scott 262

O Cura Merino, Famoso Le Curé Mérino (1834, drama em cinco atos), Guerrilheiro Espanhol ou as de Julien de Mallian, Victor Bernard e Pierre Lutas dos Carlistas e Cristinos na Tournemine Península L’Auberge des Adrets (TAC, 1823, melodrama em Os Fugitivos das Prisões de Leão três atos de grande espetáculo), de Benjamin Antier, Lacoste de Saint-Amand e Paulyanthe Os Túmulos de Verona ou Julieta Les Tombeaux de Vérone (1782, drama em cinco e Romeu atos), de Louis-Sébastien Mercier La Pie Voleuse ou la Servente de Palaiseau (TPSM, Pega Ladra ou a Serva de 1815, melodrama em três atos), Palaiseau de Caigniez e D’Aubigny Seis Degraus do Crime ou o Novo Les Six Degrés du Crime (TAC, 1831, melodrama em Jogador três atos), de Théodore Nézel e Benjamin Antier Teobardo Soberano dos Estados Berthilie (TAC, 1814, melodrama em três atos de da Turíngia ou os Efeitos do Erro grande espetáculo), de Louis-Benoit-François e do Fanatismo Trinta Anos ou a Vida de um Trente Ans ou la Vie d’un Joueur (TPSM, 1827, Jogador melodrama em três jornadas), de Victor Ducange

263

Tabela 2 – Joseph Bouchardy nos Teatros do Rio de Janeiro

Tradução Peça original Montagens Léa ou la Sœur du Soldat A Marquesa Octavia Teatro de São Januário, Florindo (TG, 1847, drama em ou a Irmã do Soldado Joaquim, março de 1857 cinco atos) Les Orphelines d’Anvers Teatro de São Pedro de Alcântara, As Órfãs da Antuérpia (TAC, 1844, drama em Florindo Joaquim, agosto de 1859 cinco atos e seis quadros) Christophe, le Suédois Teatro de São Pedro de Alcântara, Cristóvão, o Sueco (TAC, 1839, drama em Joaquim de Barros, junho de 1841 cinco atos) Com o título Gaspardo, o Pescador ou o Herói Milanês: Teatro de São Gaspardo, o Pescador Gaspardo le Pêcheur Januário, Joaquim de Barros, ou o Herói Milanês / (TAC, 1837, drama em fevereiro de 1839 Gaspardo ou o quatro atos e cinco Com o título Gaspardo ou o Pescador Pescador de quadros, precedido de de Placencia: Teatro de São Januário, Placencia um prólogo) João Caetano, agosto-setembro de 1849 Teatro de Santa Tereza, julho de 1850 Em francês: Teatro de São Januário, companhia dramática francesa dirigida por M. Ludovic, setembro de 1857 Com o título João o Cocheiro: Teatro Ginásio, Dias Braga, janeiro de 1880 Teatro São Luiz, Dias Braga, abril de 1880 Teatro Recreio Dramático, Dias Jean le Cocher (TAC, Braga, julho de 1895 João o Cocheiro / O 1852, drama em cinco Com o título O Fiacre 226: Teatro Fiacre 226 / O Guia atos e dois quadros, Recreio Dramático, Dias Braga, da Montanha precedido de um novembro-dezembro de 1884, janeiro, prólogo) fevereiro e maio de 1885 Com o título O Guia da Montanha: Teatro Recreio Dramático, Dias Braga, agosto de 1887, dezembro de 1894 Teatro Variedades, Dias Braga, julho de 1895 Teatro Lucinda, Dias Braga, maio de 1908

Teatro de São Pedro de Alcântara, Lazare le Pâtre (TAC, novembro de 1841 / com João Lázaro o Pastor 1840, drama em quatro Caetano, Joaquim Augusto e atos com prólogo) Ludovina Soares em março de 1851

264

Com o título O Marinheiro e o Carrasco: Teatro de São Pedro de O Marinheiro e o Bertram le Matelot (TG, Alcântara, Florindo Joaquim, Carrasco / Bertram, o 1847, drama em quatro novembro de 1848 Marinheiro atos e um prólogo) Com o título Bertram, o Marinheiro: Teatro de São Januário, Florindo Joaquim, maio de 1856 Le Secret des Cavaliers O Segredo dos Teatro de São Pedro de Alcântara, (TAC, 1856, drama em Cavalheiros outubro de 1862 seis atos) Teatro de São Januário, Joaquim de Barros e Ludovina Soares, fevereiro Le Sonneur de Saint- de 1840 O Sineiro de São Paul (TG, 1838, drama Teatro de São Pedro de Alcântara, Paulo em quatro atos e um Germano Francisco, julho de 1847 / prólogo) com João Caetano, Florindo Joaquim e Ludovina Soares em outubro de 1859 Paris le Bohémien Teatro de São Pedro de Alcântara, Paris o Boêmio (TPSM, 1842, drama em Joaquim de Barros, abril de 1843 cinco atos) Em francês: Teatro de São Pedro de Le Fils du Bravo (TAC, Alcântara, companhia dramática 1836, vaudeville em um francesa dirigida por M. Ludovic, ato) maio de 1857

265

Tabela 3 – Repertório Francês de Ludovina Soares no Rio de Janeiro (1830-1866)

Tradução Peça original Montagem L’Actrice (TO, 1826, comédia-vaudeville), de Jean Teatro de São Januário, fevereiro A Atriz Joseph Ader e Louis-Marie de 1844, novembro de 1846 Fontan La Chambre Ardente (TPSM, Teatro de São Januário, com 1833, drama em cinco atos e Germano Francisco, junho de 1839 nove quadros), de Mélesville A Câmara Ardente Teatro de São Pedro de Alcântara, (pseudônimo de Anne- com Florindo Joaquim, maio de Honoré-Joseph Duveyrier) e 1850 Jean-François Bayard Valérie Mariée, ou Aveugle et Jalouse (TAC, 1836, drama Teatro de São Pedro de Alcântara, A Cega Ciumenta em três atos), de Pierre Lafitte outubro de 1843 e Charles Desnoyer La Bohémienne de Paris (TG, 1844, drama em cinco atos Teatro Ginásio Dramático, A Cigana de Paris entremeado de canto), de empresa de Furtado Coelho, Gustave Lemoine e Paul de fevereiro de 1866 Kock La Croix de Feu, ou les Pieds- A Cruz de Fogo ou Noirs d’Irlande (TG, 1838, Teatro de São Pedro de Alcântara, os Pés Negros de melodrama em três atos), de janeiro de 1844 Irlanda Louis-Marie Fontan e Julien de Mallian Teatro de São Januário, com João Caetano e Joaquim Augusto, La Dame de Saint-Tropez março e maio de 1852 A Dama de Saint- (TPSM, 1844, drama em cinco Teatro de São Pedro de Alcântara, Tropez atos), de Auguste Anicet- com João Caetano, janeiro de 1853 Bourgeois e Adolphe Dennery e fevereiro de 1854 Teatro de Santa Tereza, com João Caetano, fevereiro de 1854 Le Massacre des Innocents A Degolação dos (TG, 1839, drama bíblico em Teatro de Santa Tereza, março de Inocentes cinco atos), de Louis-Marie 1853 Fontan e Julien de Mallian La Duchesse de la Vaubalière A Duquesa da (TPSM, 1836, drama em cinco Teatro de São Pedro de Alcântara, Vaubalière ou a atos), de Balisson de agosto de 1841 Defunta Viva Rougemont

La Duchesse de Marsan A Duquesa de (TAC, 1847, drama em cinco Teatro de São Pedro de Alcântara, Marsan atos e seis quadros), de abril de 1853 Adolphe Dennery

266

Notre-Dame de Paris (TAC, 1850, drama em cinco atos e quinze quadros), de Paul Teatro de São Pedro de Alcântara, A Esmeralda Foucher, adaptação do maio de 1854 romance homônimo de Victor Hugo A Filha de Fígaro La Fille de Figaro (TPR, Teatro de São Pedro de Alcântara, ou a República 1843, comédia-vaudeville em julho de 1844 Francesa cinco atos), de Mélesville L’Idiote (TPSA, 1837, drama Teatro de São Januário, setembro A Idiota em três atos), de Alboize de de 1839 Pujol La Folle (TAC, 1836, drama Teatro de São Pedro de Alcântara, A Louca em três atos), de Charles janeiro de 1842 Desnoyer e Hippolyte Gérau La Tireuse de Cartes (TPSM, A Mulher que Deita 1860, drama em cinco atos, Teatro de São Pedro de Alcântara, Cartas precedido de um prólogo), de maio de 1862 Victor Séjour Pauvre Mère! (TG, 1837, drama em cinco atos), de Teatro de Santa Tereza, maio de A Pobre Mãe Francis Cornu e Hippolyte 1854 Auger Les Mères Repenties (TPSM, Teatro Ginásio Dramático, As Mães 1858, drama em quatro atos), empresa de Furtado Coelho, maio Arrependidas de Félicien Mallefille de 1866 La Tour de Nesle (TPSM, Teatro de São Pedro de Alcântara, 1832, drama em cinco atos e A Torre Maldita com João Caetano e Florindo nove quadros), de Alexandre Joaquim, dezembro de 1858 Dumas (pai) La Vie d’une Comédienne (TPSM, 1854, drama em cinco Teatro de São Pedro de Alcântara, A Vida de uma Atriz atos e oito quadros), de outubro de 1854 Auguste Anicet-Bourgeois e Théodore Barrière Benvenuto Cellini (TPSM, Teatro de Santa Tereza, com João Benvenuto Cellini 1852, drama em cinco atos e Caetano, julho de 1854 oito quadros), de Paul Meurice Camoëns (TO, 1845, drama Teatro de São Pedro de Alcântara, Camões em cinco atos), de Victor com João Caetano, novembro de Perrot e Armand Du Mesnil 1855 Catharina la Voisin La Voisin (TG, 1841, drama Teatro de São Pedro de Alcântara, ou o Dote de 500 em cinco atos), de Paul maio de 1842 Mil Libras Foucher e Alboize de Pujol

Cinna ou la Clemence Teatro de São Pedro de Alcântara, d’Auguste (TM, 1641, tragédia Cinna com João Caetano e Florindo em cinco atos), de Pierre Joaquim, dezembro de 1861 Corneille

267

Claude Stocq (TPSM, 1839, drama em quatro atos, Teatro de São Pedro de Alcântara, Cláudio Stoq precedido de um prólogo), de maio de 1840 Narcisse Fournier Teatro de São Pedro de Alcântara, Clotilde (TF, 1832, drama em com João Caetano, julho de 1840, Clotilde cinco atos), de Frédéric Soulié março de 1854 e fevereiro de 1858 e Adolphe Bossange Teatro de Santa Tereza, com João Caetano, março de 1854 Teatro de São Pedro de Alcântara, com Joaquim de Barros, maio de Fayel (1770, tragédia em 1843 Fayel cinco atos), de François Teatro de São Januário, com João Baculard d’Arnaud Caetano e Joaquim Augusto, janeiro de 1852 Phèdre (1677, tragédia em Teatro de São Januário, dezembro Fedra cinco atos), de Racine de 1838 Stella (TG, 1843, drama em Floreska ou o Teatro de Santa Tereza, fevereiro cinco atos e seis quadros), de Heroísmo Filial de 1852 Auguste Anicet-Bourgeois Teatro de São Pedro de Alcântara, março de 1843, março-abril de Geneviève de Brabant (TFD, 1848, junho de 1855 Genoveva de 1838, melodrama em quatro Teatro de São Januário, fevereiro Brabante atos), de Auguste Anicet- de 1852 Bourgeois e Valory Teatro de Santa Tereza, abril e novembro de 1852 Gustave en Dalécarlie ou les Gustavo na Mineurs Suédois (1803, Teatro da Rua dos Arcos, junho de Dalecarlia ou os anedota histórica em cinco 1833 Mineiros Suecos atos), de Jean-Henri- Ferdinand Lamartelière Il y a Seize Ans ou les Teatro da Praia de D. Manuel, com Incendiaires (TG, 1831, Joaquim de Barros, maio de 1837 Há Dezesseis Anos drama em três atos Teatro de São Pedro de Alcântara, ou os Incendiários entremeado de música), de julho de 1842, fevereiro de 1844, Victor Ducange abril de 1848 Jeanne la Folle ou la Bretagne au XIIIe Siècle, (TO, Teatro de São Pedro de Alcântara, Joana a Doida 1830, drama histórico em com João Caetano, agosto de 1857 cinco atos), de Louis-Marie Fontan Jocelin ou o Jocelin le Garde-Côte (TAC, Teatro de São Pedro de Alcântara, Marinheiro da 1855, drama em cinco atos), com Florindo Joaquim, outubro de Martinica de Narcisse Fournier e Meyer 1859 Karl ou le Châtiment (TPSM, Karl, Conde de 1835, drama em quatro atos), Teatro de São Pedro de Alcântara, Richter ou o de Auguste Anicet-Bourgeois agosto de 1840 Castigo e Lockroy

268

Lazare le Pâtre (TAC, 1840, Teatro de São Pedro de Alcântara, drama em quatro atos com Lázaro o Pastor com João Caetano e Joaquim prólogo), de Joseph Augusto, março de 1851 Bouchardy Lucrèce Borgia (TPSM, Lucrécia Borgia ou Teatro da Praia de D. Manuel, 1833, drama em três atos e em o Terror da Itália julho de 1836 prosa), de Victor Hugo Marguerite Fortier (TG, 1843, drama em quatro atos Teatro de São Pedro de Alcântara, Margarida Fortier precedido do prólogo La fevereiro de 1844 Veille de Noël), de Alboize de Pujol e Paul Foucher Marie-Jeanne (TPSM, 1845, Maria Joana ou a drama em cinco atos e seis Teatro de São Pedro de Alcântara, Mulher do Povo quadros), de Adolphe Dennery julho de 1846 e Julien de Mallian Marianne (TAC, 1850, drama Teatro de São Januário, com João em sete atos e um prólogo Mariana a Caetano, novembro de 1851 dividido em duas partes), de Vivandeira Teatro de Santa Tereza, com João Augueste Anicet-Bourgeois e Caetano, março de 1854 Michel Masson Mérope (CF, 1743, tragédia Teatro da Praia de D. Manuel, Mérope em cinco atos), de Voltaire maio de 1838 L’Alchimiste (TR, 1839, drama em cinco atos e em Teatro de São Pedro de Alcântara, O Alquimista verso), de Alexandre Dumas abril de 1841 (pai) O Ambicioso Teatro de São Pedro de Alcântara, Político ou o * com Florindo Joaquim, julho de Especulador 1848 Republicano L’Aveugle (TG, 1857, drama Teatro de São Pedro de Alcântara, em cinco atos), de Auguste com Florindo Joaquim, novembro O Cego Anicet-Bourgeois e Adolphe de 1859 (ensaiado por Émile Dennery Doux) Le Fléau des Mers (TAC, Teatro de São Pedro de Alcântara, O Flagelo dos 1856, drama em sete atos e com João Caetano e Florindo Mares nove quadros), de Léonce e Joaquim, junho de 1858 Eugène Nus Teatro de São Pedro de Alcântara, O Novo Desertor Le Déserteur (1770, drama em com João Caetano, maio de 1851 e Francês cinco atos), de L.-S. Mercier agosto de 1857 Teatro de São Pedro de Alcântara, Paillasse (TG, 1850, drama com João Caetano, outubro- O Palhaço em cinco atos), de Adolphe dezembro de 1852 Dennery e Marc Fournier Teatro de Santa Tereza, com João Caetano, novembro de 1852 O Rendeiro Simão * (drama em três atos e quatro Teatro de São Pedro de Alcântara, ou o Abuso de quadros) outubro de 1850 Confiança 269

Les Enfants d’Édouard (TF, Teatro de São Pedro de Alcântara, Os Filhos de 1833, tragédia em três atos), com Joaquim Augusto, janeiro e Eduardo de Casimir Delavigne fevereiro de 1854 Teatro de São Januário, com Le Sonneur de Saint-Paul Joaquim de Barros, fevereiro de O Sineiro de São (TG, 1838, drama em quatro 1840 Paulo atos e um prólogo), de Joseph Teatro de São Pedro de Alcântara, Bouchardy com João Caetano e Florindo Joaquim, outubro de 1859 Les Mystères de Paris (TPSM, Os Mistérios de 1844, romance em cinco Teatro de São Pedro de Alcântara, Paris partes e onze quadros), de com João Caetano, março de 1851 Eugène Sue e Prosper Dinaux Teatro de São Januário, maio de 1852 (com João Caetano), outubro de 1864 Teatro de Santa Tereza, com João Les Sept Infants de Lara Caetano, maio de 1852 Os Sete Infantes de (TPSM, 1836, drama em cinco Teatro Lírico Fluminense, com Lara atos), de Félicien Mallefille João Caetano e Florindo Joaquim, setembro de 1860 Teatro de São Pedro de Alcântara, agosto de 1857 (com João Caetano), abril de 1864 Othello ou le More de Venise Othelo ou o Mouro Teatro de São Januário, com João (TRe, 1792, tragédia em cinco de Veneza Caetano, abril de 1852 atos), de Jean François Ducis Le Prince de Norwège ou la O Verdadeiro Bague de Fer (TPSM, 1818, Teatro Imperial de São Pedro de Heroísmo ou o Anel drama heroico em três atos), Alcântara, janeiro de 1830 de Ferro de Victor Ducange Paul et Virginie (TAC, 1841, Teatro de São Pedro de Alcântara, drama em cinco atos e seis Paulo e Virgínia com Florindo Joaquim, julho de quadros), de Philastre, 1848 Cambon e Boulé Le Vieux Caporal (TPSM, Simão ou o Velho 1853, drama em cinco atos), Teatro de São Pedro de Alcântara, Cabo de Esquadra de Adolphe Dennery e com João Caetano, junho de 1858 Dumanoir Tékéli ou le Siège de Montgatz (TAC, 1803, melodrama Tekeli ou o Cerco Teatro de São Pedro de Alcântara, histórico em três atos e de de Mongatz janeiro de 1853 grande espetáculo), de Guilbert de Pixerécourt Teatro da Praia de D. Manuel, Trente Ans ou la Vie d’un agosto de 1835 Trinta Anos ou a Joueur (TPSM, 1827, Teatro de São Pedro de Alcântara, Vida de um Jogador melodrama em três jornadas), abril de 1853, junho de 1858 (com de Victor Ducange Florindo Joaquim) * Peça original não identificada. 270

Tabela 4 – Victor Ducange nos Teatros do Rio de Janeiro

Tradução Peça original Estreia Teatro da Praia de D. Manuel, Calás ou as Vítimas do Calas (TAC, 1819, drama em benefício de um “Sócio Erro em três atos) Escritor Dramático”2, dezembro de 1835 La Cabane de Montagnard Carlos Perseguido ou a ou les Auvergnats (TPSM, Teatro da Praia de D. Manuel, Cabana da Montanha 1818, melodrama em três dezembro de 1837 atos) Sept Heures ou Charlotte Corday (TPSM, 1829, Teatro de São Francisco, Carlota Corday ou o drama em três atos e seis Florindo Joaquim, março de Assassino de Marat quadros), em colaboração 1852 com Auguste Anicet- Bourgeois Il y a Seize Ans ou les Teatro da Praia de D. Manuel, Há Dezesseis Anos ou os Incendiaires (TG, 1831, Joaquim de Barros, maio de Incendiários drama em três atos 1837 entremeado de música) Lisbeth ou la Fille du Laboureur (TAC, 1823, drama em três atos), Lisbeth ou a Vítima do Teatro de São Pedro de adaptação do romance Rigor Paternal Alcântara, abril de 1844 Léonide ou la Vieille de Surènes (1823), do próprio Ducange Le Prince de Norwège ou Teatro Imperial São Pedro de O Verdadeiro Heroísmo ou la Bague de Fer (TPSM, Alcântara, Ludovina Soares, o Anel de Ferro 1818, drama heroico em janeiro de 1830 três atos) Polder ou le Bourreau d’Amsterdam (TG, 1828, Teatro de São Januário, João Polder ou o Carrasco de melodrama em três atos de Evangelista da Costa, janeiro Amsterdam grande espetáculo), em de 1839 colaboração com Guilbert de Pixerécourt Trente Ans ou la Vie d’un Trinta Anos ou a Vida de Joueur (TPSM, 1827, Teatro da Praia de D. Manuel, um Jogador melodrama em três agosto de 1835 jornadas)

2 JORNAL do Commercio, Rio de Janeiro, 29 dez. 1835, p. 3. 271

Tabela 5 – Victor Hugo nos Teatros do Rio de Janeiro

Tradução Peça original Montagem Teatro de São Francisco, março de Angelo, Tyran de Padoue Angelo ou o Tirano de 1845 (TF, 1835, drama em três Pádua Teatro de São Pedro de Alcântara, jornadas e em prosa) setembro de 1845 Hernani ou l’Honneur Hernani ou a Honra Castillan (CF, 1830, Teatro de São Francisco, João Castelhana drama em cinco atos e em Caetano, março de 1848 verso) Lucrèce Borgia (TPSM, Lucrécia Borgia ou o Teatro da Praia de D. Manuel, 1833, drama em três atos Terror da Itália Ludovina Soares, julho de 1836 e em prosa) Marie Tudor (TPSM, Drama censurado pelo Conservatório Maria Tudor 1833, drama em três Dramático Brasileiro em janeiro de jornadas e em prosa) 1844. Não foi representado. Le Roi s’Amuse (CF, Teatro Constitucional Fluminense, O Rei se Diverte 1832, drama em cinco João Caetano, novembro de 1836 atos e em verso) Ruy Blas (TR, 1838, Em francês: Teatro de São Januário, drama em cinco atos e em companhia francesa dirigida por verso) Ernest Gervaise, janeiro de 1842

272

Tabela 6 – Alexandre Dumas (pai) nos Teatros do Rio de Janeiro

Tradução Peça original Estreia Com o título O Enjeitado: Teatro Constitucional Fluminense, João Antony / Antony (TPSM, 1831, Caetano, novembro de 1836 O Enjeitado drama em cinco atos)3 Com o título Antony: Teatro de Santa Tereza, João Caetano, dezembro de 1842 Les Demoiselles de Teatro de São Pedro de As Educandas de São Cyro Saint-Cyr (TF, 1843, Alcântara, março de 1845 comédia em cinco atos) Teatro Constitucional A Torre de Nesle Fluminense, João Caetano, La Tour de Nesle setembro de 1836 (TPSM, 1832, drama em Teatro de São Pedro de cinco atos e nove Alcântara, João Caetano, A Torre Maldita quadros) Florindo Joaquim e Ludovina Soares, dezembro de 1858 La Vénitienne (TPSM, Teatro Constitucional 1834, drama em cinco Fluminense, João Caetano, julho atos e oito quadros), em A Veneziana de 1836 colaboração com Teatro da Praia de D. Manuel, Auguste Anicet- Joaquim de Barros, maio de 1837 Bourgeois Teatro de Santa Tereza, João Le Laird de Dumbiky Carlos II Rei da Inglaterra Caetano, novembro de 1845 (TO, 1843, comédia em ou Lorde de Dumbiky Teatro de São Francisco, João cinco atos) Caetano, outubro de 1846 Charles VII chez ses Teatro de São Francisco, João Carlos VII entre os seus Grands Vassaux (TO, Caetano, outubro de 1846 Grandes Vassalos 1831, tragédia em cinco Teatro de Santa Tereza, João atos) Caetano, maio de 1846 Teatro Constitucional Fluminense, João Caetano, Catherine Howard setembro de 1836 Catarina Howard (TPSM, 1834, drama em Teatro de São Francisco, João cinco atos e oito quadros) Caetano, junho de 1848 Teatro de Santa Tereza, João Caetano, julho de 1848

3 Antony estreou no Rio de Janeiro com o título O Enjeitado, segundo uma correspondência publicada pelo Diário do Rio de Janeiro, em 1836: “mas hoje, que aparece anunciado Antony, debaixo do título Enjeitado [...].” (O MORALISTA. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 12 nov. 1836, p. 1). A peça O Enjeitado, “composição de Mr. Alexandre Dumas, autor da Torre de Nesle, Catharina Howard e outras”, foi anunciada para o espetáculo de 23 de novembro de 1836, no Teatro Constitucional Fluminense. (JORNAL do Commercio, Rio de Janeiro, 11 nov. 1836, p. 3). A obra foi encenada com o título original (Antony) por João Caetano, em 1842. Esses indícios sinalizam, então, que não se tratava da comédia L’Enfant Trouvé (1824), de Mazères e Picard, representado em Lisboa, no Teatro da Rua dos Condes, entre 1837 e 1839, traduzido como O Enjeitado e publicado no quarto volume da revista lisboeta Archivo Theatral (1841). 273

Don Juan de Maraña ou la Chute d’un Ange Teatro da Praia de D. Manuel, D. João de Maraña ou o (TPSM, 1836, mistério Joaquim de Barros, agosto de Fim de um Dissoluto em cinco atos e sete 1838 quadros) Kean ou Désordre et Kean ou Desordem e Génie (TV, 1836, Teatro de São Francisco, João Gênio comédia em cinco atos Caetano, junho de 1841 entremeada de cantos) Lorenzino ou o Tirano de Lorenzino (TF, 1842, Teatro de São Pedro de Florença drama em cinco atos) Alcântara, novembro de 1846 Em francês: Teatro de São Januário, companhia francesa Mademoiselle de Belle- dirigida por Ernest Gervaise, Mademoiselle de Belle-Isle Isle (TF, 1839, drama em maio de 1841 cinco atos) Em português: Teatro de Santa Tereza, João Caetano, janeiro de 1847 L’Alchimiste (TR, 1839, Teatro de São Pedro de O Alquimista drama em cinco atos e Alcântara, Ludovina Soares, abril em verso) de 1841 Com o título O Capitão Paulo: Teatro de São Januário, Joaquim Paul Jones ou Paul le O Capitão Paulo / Paulo de Barros, julho de 1839 Corsaire (1838, drama Jones Com o título Paulo Jones: Teatro em cinco atos) de Santa Tereza, João Caetano, maio de 1844 Le Chevalier de Maison- Rouge, Épisode du Temps des Girondins Teatro de São Pedro de O Cavaleiro da Maison (TH, 1847, drama em Alcântara, João Caetano, abril de Rouge cinco atos e doze 1851 quadros), em colaboração com Auguste Maquet Le Gentilhomme de la Montagne (TPSM, 1860, Teatro São Luiz, companhia de O Fidalgo da Montanha drama em cinco atos e Ismênia dos Santos, novembro de oito quadros, precedido 1874 de um prólogo) Le Mari de la Veuve Teatro de São Pedro de O Marido da Viúva (TF, 1832, comédia em Alcântara, agosto de 1843 um ato) Richard Darlington (TPSM, 1831, drama em três atos, precedido do Teatro Constitucional prólogo La Maison du Ricardo Darlington Fluminense, João Caetano, julho Docteur), em de 1837 colaboração com Jacques Félix Beudin e Prosper- Parfait Goubaux 274

Térésa (TOC, 1832, Teatro de São Francisco, João Teresa drama em cinco atos) Caetano, julho de 1847 Un Mariage sous Louis Teatro de São Pedro de Um Casamento no XV (TF, 1841, comédia Alcântara, Florindo Joaquim, Reinado de Luís XV em cinco atos) outubro-novembro de 1847

275

Tabela 7 – Repertório Francês de João Caetano no Rio de Janeiro (1835-1862)

Tradução Peça original Montagem Teatro de São Francisco, abril de 1847, abril de 1848 Teatro de São Januário, março- julho de 1852 Teatro de São Pedro de La Dame de Saint-Tropez Alcântara, com Ludovina (TPSM, 1844, drama em Soares, janeiro de 1853, A Dama de Saint-Tropez cinco atos), de Auguste fevereiro e novembro de 1854, Anicet-Bourgeois e abril e junho de 1860, setembro Adolphe Dennery de 1861 Teatro de Santa Tereza, janeiro de 1853, fevereiro-março de 1854, fevereiro de 1856 Teatro Lírico Fluminense, fevereiro e setembro de 1856 Teatro de São Januário, março Le Massacre des Innocents de 1849 (TG, 1839, drama bíblico A Degolação dos Teatro de Santa Tereza, março em cinco atos), de Louis- Inocentes de 1850 Marie Fontan e Julien de Teatro de São Pedro de Mallian Alcântara, janeiro de 1853 Teatro de Santa Tereza, abril de A Filha do Cego * 1846

Teatro de São Francisco, maio de 1843, maio e outubro de 1844, julho e novembro de 1847 Teatro de São Januário, abril e setembro de 1849, fevereiro de 1851, janeiro de 1852 Teatro de São Pedro de L’Éclat de Rire (TG, 1840, Alcântara, setembro de 1852, drama em três atos), de A Gargalhada janeiro de 1853, agosto de 1855, Jacques Arago e Alexandre maio de 1857, janeiro e Martin novembro-dezembro de 1858, janeiro de 1859, janeiro e setembro de 1860 Teatro de Santa Tereza, outubro de 1845, setembro de 1846, agosto de 1848, outubro de 1850, fevereiro de 1858, dezembro de 1861

276

Teatro de São Francisco, fevereiro e março de 1845, fevereiro de 1847 Teatro de São Januário, junho de 1845, abril de 1849 (com La Grâce de Dieu (TG, Joaquim Augusto), abril de 1841, drama em cinco atos 1850, abril de 1859 A Graça de Deus entremeado de canto), de Teatro de Santa Tereza, Adolphe Dennery e Gustave fevereiro, março e outubro de Lemoine 1845, abril e junho de 1849 (com Joaquim Augusto) Teatro de São Pedro de Alcântara, outubro de 1852, março de 1854 Teatro Lírico Fluminense, com Ludovina Soares, março de 1856 A Mendicante * Teatro de Santa Tereza, com Ludovina Soares, março-abril de 1856 Teatro Constitucional A Morte de Napoleão * Fluminense, dezembro de 1836 Com o título O Enjeitado: Teatro Antony (TPSM, 1831, Constitucional Fluminense, Antony drama em cinco atos), de novembro de 1836 Alexandre Dumas (pai) Com o título Antony: Teatro de Santa Tereza, dezembro de 1842 Pauvre Mère! (TG, 1837, drama em cinco atos), de Teatro de São Francisco, agosto A Pobre Mãe Francis Cornu e Hippolyte de 1847 Auger La Dame de Laval (TAC, 1835, drama em três atos e A Senhora de Laval seis quadros), de Julien de Teatro de São Francisco, 1846 Mallian e Alfred Alexandre Legoyt Les Mines de Pologne Teatro de São Pedro de (TAC, 1803, melodrama em Alcântara, 1836, julho de 1840, As Minas da Polônia três atos de grande setembro de 1857 (com espetáculo), de Guilbert de Ludovina Soares) Pixerécourt Teatro Constitucional A Torre de Nesle Fluminense, setembro-outubro de 1836 La Tour de Nesle (TPSM, 1832, drama em cinco atos e Teatro de São Pedro de nove quadros), de Alcântara, com Florindo A Torre Maldita Alexandre Dumas (pai) Joaquim e Ludovina Soares, setembro-outubro e dezembro de 1858

277

La Vénitienne (TPSM, Teatro Constitucional 1834, drama em cinco atos e Fluminense, julho de 1836 A Veneziana oito quadros), de Alexandre Teatro de Santa Tereza, junho de Dumas (pai) e Auguste 1856 Anicet-Bourgeois Teatro de Santa Tereza, Le Laird de Dumbiky (TO, novembro de 1845, maio de Carlos II, Rei da 1843, comédia em cinco 1846, janeiro de 1847 Inglaterra ou o Laird de atos), de Alexandre Dumas Teatro de São Francisco, Dumbiky (pai) outubro-novembro de 1846, agosto de 1847 Charles VII chez ses Grands Teatro de São Francisco, outubro Carlos VII entre os seus Vassaux (TO, 1831, tragédia de 1846, dezembro de 1847 Grandes Vassalos ou o em cinco atos), de Teatro de Santa Tereza, maio e Árabe Cativo Alexandre Dumas (pai) setembro de 1846 Camoëns (TO, 1845, drama Teatro de São Pedro de Camões em cinco atos), de Victor Alcântara, com Ludovina Perrot e Armand Du Mesnil Soares, novembro de 1855 Teatro Constitucional Fluminense, setembro-outubro Catherine Howard (TPSM, de 1836 1834, drama em cinco atos e Catarina Howard Teatro de São Francisco, junho- oito quadros), de Alexandre julho de 1848 Dumas (pai) Teatro de Santa Tereza, julho de 1848 Cinna ou la Clemence Teatro de São Pedro de Cinna ou a Clemência d’Auguste (TM, 1641, Alcântara, com Ludovina Soares de Augusto tragédia em cinco atos), de e Florindo Joaquim, dezembro Pierre Corneille de 1861

Teatro de São Pedro de Alcântara, com Ludovina Soares, janeiro-fevereiro e julho de 1840, fevereiro e abril de 1854, fevereiro e maio de 1858, maio de 1860 Teatro de Santa Tereza, fevereiro e abril-maio de 1844, Clotilde (TF, 1832, drama dezembro de 1850, março de Clotilde em cinco atos), de Frédéric 1854, setembro de 1860 (com Soulié e Adolphe Bossange Ludovina Soares e Florindo Joaquim) Teatro de São Francisco, janeiro de 1845, dezembro de 1846, fevereiro e julho-setembro de 1847, maio de 1848 Teatro de São Januário, maio de 1849, outubro de 1850, abril de 1859

278

Teatro de Santa Tereza, setembro de 1845, outubro de 1846, fevereiro de 1851 Teatro de São Francisco, setembro de 1846, janeiro de D. César de Bazan (TPSM, 1847 1844, drama em cinco atos Teatro de São Januário, março e D. César de Bazan entremeado de canto), de maio de 1849, fevereiro de 1851 Dumanoir e Adolphe Teatro de São Pedro de Dennery Alcântara, julho e novembro de 1854, janeiro e julho de 1855, maio de 1857, fevereiro, setembro e dezembro de 1858, maio de 1859, setembro de 1860, outubro de 1861 Don Juan de Maraña ou la Chute d’un Ange (TPSM, Teatro de São Pedro de D. João de Maraña 1836, mistério em cinco Alcântara, maio-junho e outubro atos e sete quadros), de 1855, setembro de 1856 de Alexandre Dumas (pai) Teatro Niteroiense, abril de 1839 Fayel (1770, tragédia em Teatro de São Pedro de Fayel cinco atos), de François Alcântara, junho de 1840 Baculard d’Arnaud Teatro de São Januário, outubro de 1849 Gabrina ou la Chambre du Berceau (TPSM, 1841, Gabrina ou a Coroa Teatro de São Januário, drama em três atos), de Paul Ducal de Parma setembro de 1849 (ensaiador) Henri Foucher e Alboize de Pujol Gaspard (TAC, 1837, Teatro de São Januário, agosto e drama em quatro atos e Gaspardo o Pescador de setembro de 1849 cinco quadros, precedido de Placencia Teatro de Santa Tereza, julho de um prólogo), de Joseph 1850 Bouchardy

Gaspard Hauser (TAC, 1838, drama em quatro Gaspar Hauser atos), de Auguste Anicet- Teatro de São Francisco, 1844 Bourgeois e Adolphe Dennery

279

Teatro de São Francisco, agosto- setembro de 1842, novembro de 1843, dezembro de 1846 Teatro de São Januário, junho e agosto de 1850 Hamlet (1769, tragédia em Teatro de Santa Tereza, Hamleto cinco atos), de Jean dezembro de 1854 François Ducis Teatro de São Pedro de Alcântara, janeiro-fevereiro de 1855, outubro de 1857 (com Ludovina Soares), novembro- dezembro de 1858, outubro de 1861 Héloise et Abeilard (TAC, Teatro de São Francisco, outubro 1836, drama em cinco atos), de 1842 Heloísa e Abelardo de Auguste Anicet- Teatro de Santa Tereza, maio de Bourgeois e Francis Cornu 1851 Hernani ou l’Honneur Hernani ou a Honra Castillan (CF, 1830, drama Teatro de São Francisco, março Castelhana em cinco atos e em verso), de 1848 de Victor Hugo Jeanne la Folle ou la Bretagne au XIIIe Siècle, Teatro de São Pedro de Joana a Doida (TO, 1830, drama histórico Alcântara, com Ludovina em cinco atos), de Louis- Soares, agosto de 1857 Marie Fontan Teatro de São Francisco, junho, julho e setembro de 1841, novembro-dezembro de 1843, agosto de 1844, outubro de 1847 Teatro de Niterói, novembro de 1841, outubro de 1846, outubro Kean ou Désordre et Génie de 1847 (TV, 1836, comédia em Teatro do Valongo, novembro de Kean ou Desordem e cinco atos entremeada de 1841 Gênio cantos), de Alexandre Teatro de Santa Tereza, janeiro e Dumas (pai) outubro de 1843, abril de 1844, agosto de 1845, setembro de 1846 Teatro de São Pedro de Alcântara, maio de 1851, dezembro de 1852, julho-agosto de 1859 (com Florindo Joaquim) Lazare le Pâtre (TAC, Teatro de São Pedro de 1840, drama em quatro atos Alcântara, com Ludovina Soares Lázaro o Pastor com prólogo), de Joseph e Joaquim Augusto, março de Bouchardy 1851 Louise de Lignerolles (TF, Teatro de Santa Tereza, abril de Luísa de Lignerolles 1838, drama em cinco atos), 1844 de P. Dinaux e E. Legouvé 280

Mademoiselle de Belle-Isle Mademoiselle de Belle- (TF, 1839, drama em cinco Teatro de Santa Tereza, janeiro Isle atos), de Alexandre Dumas de 1847 (pai) Madeleine (TAC, 1843, drama em cinco atos), de Teatro de São Francisco, Magdalena Auguste Anicet-Bourgeois e novembro de 1846 Albert Teatro de São Januário, com Ludovina Soares, novembro- dezembro de 1851 Teatro de Santa Tereza, janeiro Marianne (TAC, 1850, de 1852 drama em sete atos e um Teatro de São Pedro de Mariana a Vivandeira prólogo dividido em duas Alcântara, dezembro de 1852, partes), de Auguste Anicet- março-abril de 1854, setembro Bourgeois e Michel Masson de 1857 (com Ludovina Soares) Teatro Lírico Fluminense, fevereiro e outubro-novembro de 1856 Le Paysan Perverti ou Quinze Ans de Paris (TGD, O Camponês Pervertido Teatro Constitucional 1827, peça em três ou Quinze Anos de Paris Fluminense, maio de 1837 jornadas), de Théaulon de Lambert Le Chevalier de Maison- Rouge, Épisode du Temps des Girondins (TH, 1847, O Cavaleiro da Maison Teatro de São Pedro de drama em cinco atos e doze Rouge Alcântara, abril de 1851 quadros), de Alexandre Dumas (pai) e Auguste Maquet Le Fléau des Mers (TAC, Teatro de São Pedro de 1856, drama em sete atos e Alcântara, com Ludovina Soares O Flagelo dos Mares nove quadros), de Léonce e e Florindo Joaquim, junho-julho Eugène Nus de 1858 O Homem do Século ou Teatro Constitucional as Épocas de Napoleão * Fluminense, agosto de 1836 Bonaparte

Le Livre Noir (TPSM, 1848, Teatro de São Pedro de O Livro Negro drama em cinco atos e seis Alcântara, com Joaquim quadros), de Léon Gozlan Augusto, agosto de 1852

281

Teatro Constitucional Fluminense, 1835 Teatro de São Pedro de Alcântara, janeiro de 1840, maio de 1851 (com Ludovina Soares), novembro de 1852, julho-agosto de 1857, janeiro de 1860, Le Déserteur (1770, drama dezembro de 1861 O Novo Desertor em cinco atos), de L.-S. Teatro de São Francisco, Francês Mercier dezembro de 1847 Teatro de São Januário, setembro de 1850 Teatro de Santa Tereza, setembro de 1850, novembro de 1857 (com Ludovina Soares) Teatro Lírico Fluminense, novembro de 1856 Teatro de São Pedro de Alcântara, com Ludovina Paillasse (TG, 1850, drama Soares, outubro-dezembro de O Palhaço em cinco atos), de Adolphe 1852 Dennery e Marc Fournier Teatro de Santa Tereza, novembro-dezembro de 1852 Teatro de São Francisco, Le Pauvre Idiot ou le outubro-novembro de 1847, Souterrain d’Heilberg (TG, fevereiro de 1848 O Pobre Idiota ou o 1838, drama em cinco atos e Teatro de Santa Tereza, Subterrâneo de Heibelg oito quadros), de Charles novembro de 1847 Depeuty e Louis-Marie Teatro de São Januário, abril de Fontan 1849 L’Escamoteur (TG, 1860, drama em cinco atos), de Teatro de São Pedro de O Prestidigitador Adolphe Dennery e Jules Alcântara, maio de 1861 Brésil Oscar, Fils d’Ossian (TRe, Teatro de São Pedro de 1796, tragédia em cinco Oscar, Filho de Ossian Alcântara, junho de 1838, atos), de Antoine Vincent outubro de 1855 Arnault Les Bohémiens de Paris (TAC, 1843, drama em Teatro de Santa Tereza, junho de Os Ciganos de Paris cinco atos e oito quadros), 1850 de Adolphe Dennery e Eugène Grangé

Les Deux Francs-Maçons ou les Coups du Hasard Teatro de São Pedro de Os Dois Maçons (TIR, 1808, fato histórico Alcântara, outubro de 1838 em três atos), de Benoît Pelletier-Volméranges

282

Le Sonneur de Saint-Paul Teatro de São Pedro de (TG, 1838, drama em quatro Alcântara, com Florindo O Sineiro de São Paulo atos e um prólogo), de Joaquim e Ludovina Soares, Joseph Bouchardy outubro de 1859 Les Mystères de Paris Teatro de São Januário, maio de (TPSM, 1844, romance em 1850 Os Mistérios de Paris cinco partes e onze Teatro de São Pedro de quadros), de Eugène Sue e Alcântara, com Ludovina Prosper Dinaux Soares, março de 1851 Nos Intimes! (TVa, 1861, Teatro de São Pedro de Os Nossos Íntimos comédia em quatro atos), de Alcântara, com Florindo Victorien Sardou Joaquim, abril e junho de 1862 Teatro de São Januário, fevereiro de 1840, fevereiro de 1851 Teatro de São Francisco, agosto de 1843, outubro de 1846, novembro de 1847 Teatro de Santa Tereza, julho de 1846, fevereiro de 1852, agosto Les Six Degrés du Crime de 1857 Os Seis Degraus do (TAC, 1831, melodrama em Teatro de São Pedro de Crime três atos), de Théodore Alcântara, maio de 1851, abril Nézel e Benjamin Antier de 1853, março e agosto de 1854, julho de 1855, julho e novembro de 1857, fevereiro e junho de 1858 (com Florindo Joaquim), junho e outubro de 1859 Teatro Lírico Fluminense, agosto de 1856 Teatro de São Pedro de Alcântara, abril e maio de 1840 (com Florindo Joaquim), julho e setembro de 1855, junho e agosto de 1857 (com Ludovina Soares), junho de 1858, agosto- outubro de 1858, junho e agosto de 1859 (com Florindo Les Sept Infants de Lara Joaquim), setembro de 1860 e (TPSM, 1836, drama em dezembro de 1861 (com Os Sete Infantes de Lara cinco atos), de Félicien Ludovina Soares e Florindo Mallefille Joaquim) Teatro de São Francisco, julho de 1847 Teatro de Santa Tereza, maio de 1852 (com Ludovina Soares), outubro de 1852, março de 1854, maio de 1860 (com Ludovina Soares e Florindo Joaquim)

283

Teatro de São Januário, com Les Sept Infants de Lara Ludovina Soares, maio e julho Os Sete Infantes de Lara (TPSM, 1836, drama em de 1852 (cont.) cinco atos), de Félicien Teatro Lírico Fluminense, com Mallefille Ludovina Soares e Florindo Joaquim, setembro de 1860 Teatro de São Pedro de Alcântara, junho e outubro de 1838, janeiro de 1857 Teatro Niteroiense, novembro de 1838, dezembro de 1841 Teatro de São Francisco, outubro de 1842, fevereiro de 1844, fevereiro de 1845, dezembro de Othello ou le More de 1847, setembro de 1848 Othelo ou o Mouro de Venise (TRe, 1792, tragédia Teatro de São Januário, Veneza em cinco atos), de Jean novembro de 1839, abril de François Ducis 1850, fevereiro de 1851, março e julho de 1852 Teatro de Santa Tereza, dezembro de 1850, novembro de 1856 Teatro Lírico Fluminense, com Ludovina Soares, novembro de 1856 Le Chiffonier de Paris (TPSM, 1847, drama em Teatro de São Januário, com O Trapeiro de Paris cinco atos e doze quadros, Florindo Joaquim, outubro de com um prólogo), de Félix 1849 Pyat Paul Jones ou Paul le Corsaire (1838, drama em Teatro de Santa Tereza, maio de Paulo Jones cinco atos), de Alexandre 1844 Dumas (pai) Piquillo Alliaga ou Trois Châteaux en Espagne (TAC, 1849, drama em Teatro de São Januário, agosto- cinco atos e onze quadros), Piquillo Alliaga ou os setembro de 1850 de Auguste Anicet- Três Castelos em Teatro de Santa Tereza, Bourgeois e Michel Espanha setembro de 1850 Masson, adaptação do

romance Piquillo Alliaga ou les Maures sous Philippe III, de Eugène Scribe Richard Darlington (TPSM, 1831, drama em Teatro Constitucional três atos, precedido de um Fluminense, julho de 1837 Ricardo Darlington prólogo), de Alexandre Teatro de São Januário, Dumas (pai) e Prosper novembro de 1839 Dinaux 284

Robert Macaire (TFD, 1834, peça em quatro atos e Teatro de São Francisco, Robert Macaire seis quadros), de Frédérick outubro-novembro de 1846 Lemaître, Saint-Amand e Antier Le Vieux Caporal (TPSM, Teatro de São Pedro de Simão ou o Velho Cabo 1853, drama em cinco atos), Alcântara, com Ludovina de Esquadra de Adolphe Dennery e Soares, junho de 1858 Dumanoir Teatro de São Francisco, julho de 1847, março-maio de 1848 Térésa (TOC, 1832, drama Teatro de São Januário, abril- Teresa em cinco atos), de maio de 1849, outubro de 1850 Alexandre Dumas (pai) Teatro de Santa Tereza, abril de 1848 Thomas Maurevert (TAC, Thomaz Maurevert ou o 1837, drama em cinco atos), Teatro de São Januário, Homem do Povo de Julien de Mallian e novembro de 1839 Legoyt Trente Ans ou la Vie d’un Teatro Constitucional Joueur (TPSM, 1827, Trinta Anos ou a Vida de Fluminense, julho de 1836 melodrama em três um Jogador Teatro de São Pedro de jornadas), de Victor Alcântara, junho de 1853 Ducange Zaïre (CF, 1732, tragédia Teatro de São Januário, Zaíra em cinco atos), de Voltaire dezembro de 1839 * Peça original não identificada.

285

Tabela 8 – Repertório Francês de Germano Francisco no Rio de Janeiro (1837-1871)

Tradução Peça original Montagem La Belle Françoise (TV, Teatro de São Pedro de A Bela Francisca 1843, vaudeville em um Alcântara, abril de 1844 ato), de Paul Siraudin La Chambre Ardente (TPSM, 1833, drama em Teatro de São Januário, com A Câmara Ardente cinco atos e nove quadros), Ludovina Soares, junho de 1839 de Mélesville e Jean- François Bayard La Main Droite et la Main Teatro de São Pedro de Gauche (TO, 1842, drama A Corte da Suécia Alcântara, com Florindo em cinco atos), de Léon Joaquim, setembro de 1847 Gozlan La Dame aux Camélias Teatro Ginásio Dramático, com (TVa 1852, drama em cinco A Dama das Camélias Manoela Lucci, fevereiro de atos), de Alexandre Dumas 1860 (filho) Le Prévôt de Paris (TG, A Família de um Judeu 1836, drama em três atos), Teatro da Praia de D. Manuel, ou o Preboste de Paris de Auguste-Louis-Désiré setembro de 1838 Boulé e Eugène Cormon L’Éclat de Rire (TG, 1840, Teatro de São Januário, janeiro drama em três atos), de de 1858 A Gargalhada Jacques Arago e Alexandre Teatro de São Pedro de Martin Alcântara, agosto de 1871 La Grâce de Dieu (TG, Teatro de São Francisco, com 1841, drama em cinco atos Florindo Joaquim, julho de 1851 A Graça de Deus entremeado de canto), de Teatro de São Januário, fevereiro Adolphe Dennery e Gustave de 1858 (com Florindo Lemoine Joaquim), janeiro de 1860 La Lectrice ou une Folie de Jeune Homme (TGD, 1834, A Leitora ou uma Teatro de São Januário, janeiro comédia-vaudeville em dois Loucura de Rapaz de 1839 atos), de Jean-Françoise Bayard Alix ou les Deux Mères (TPSM, 1838, drama em Teatro de São Januário, abril de Alice ou as Duas Mães cinco atos), de Charles 1839 Desnoyer e Alphonse Brot La Nuit du Meurtre (TAC, Teatro de São Pedro de A Noite do Homicídio ou 1839, drama em cinco atos), Alcântara, novembro e o Ambicioso Político de Albert e Fabrice dezembro de 1870 Labrousse La Tour de Ferrare (TG, 1845, drama em cinco atos e Teatro de São Pedro de A Torre de Ferrara seis quadros), de Alboize, Alcântara, outubro de 1845 Lafont e Élie Sauvage 286

Teatro de São Januário, La Tour de Londres (TAC, dezembro de 1859 1855, drama em cinco atos), A Torre de Londres Teatro de São Pedro de de Eugène Nus, Alphonse Alcântara, outubro e novembro Brot e Charles Lemaître de 1870 La Pauvre Fille (TPSM, Teatro de São Pedro de 1838, melodrama em cinco A Virgem do Mosteiro Alcântara, setembro e outubro de atos), de Auguste Anicet- 1870 Bourgeois Catherine Howard (TPSM, 1834, drama em cinco atos e Teatro de São Pedro de Catarina Howard oito quadros), de Alexandre Alcântara, agosto de 1842 Dumas (pai) Don César de Bazan Teatro Lírico Fluminense, (TPSM, 1844, drama em janeiro de 1865 D. César de Bazan cinco atos entremeado de Teatro Fênix Dramática, canto), de Dumanoir e empresa do ator Heller, julho de Adolphe Dennery 1870 Teatro da Praia de D. Manuel, Fayel (1770, tragédia em outubro de 1837 Fayel cinco atos), de François Teatro de São Pedro de Baculard d’Arnaud Alcântara, maio de 1843, fevereiro e março de 1845 Gabrina ou la Chambre du Berceau (TPSM, 1841, Gabrina ou a Coroa Teatro de São Januário, janeiro drama em três atos), de Paul Ducal de Parma de 1860 Henri Foucher e Alboize de Pujol Giralda ou la Nouvelle Giralda ou a Nova Psyché (TOC, 1850, ópera Teatro de São Januário, Psyché cômica em três atos), de dezembro de 1858 Eugène Scribe Hubert le Sorcier (TG, 1846, drama em cinco atos e Teatro de São Pedro de Huberto o Feiticeiro seis quadros), de M. Alcântara, agosto de 1846 Cazenave Marie-Jeanne (TPSM, Teatro de São Januário, fevereiro Maria Joana, a Mãe do 1845, drama em cinco atos e de 1859, março de 1860 Povo ou a Pobre Mãe seis quadros), de Adolphe Teatro de São Pedro de Dennery e Julien de Mallian Alcântara, maio e junho de 1871 * (comédia em um ato, O Complacente ou o Teatro de São Pedro de traduzida por Germano Vestuário do Palhaço Alcântara, maio de 1844 Francisco)

Le Courrier de Lyon (TG, 1850, drama em cinco atos e Teatro de São Pedro de O Correio de Lião oito quadros), de Paul Alcântara, setembro e outubro de Siraudin, Alfred Delacour e 1870 Eugène Moreau

287

Le Fils de la Folle (TR, Teatro de São Pedro de O Filho da Louca 1839, drama em cinco atos), Alcântara, novembro de 1841 de Frédéric Soulié La Dame de Saint-Tropez Teatro de São Pedro de O Marinheiro de Saint- (TPSM, 1844, drama em Alcântara, janeiro de 1846 Tropez ou o cinco atos), de Auguste Teatro Lírico Fluminense, Envenenamento Anicet-Bourgeois e setembro de 1871 Adolphe Dennery La Branche de Chêne (TAC, 1839, drama em Teatro de São Pedro de O Ramo de Carvalho cinco atos), de Charles Alcântara, outubro de 1843 Desnoyer e Charles Lafont Le Sonneur de Saint-Paul (TG, 1838, drama em quatro Teatro de São Pedro de O Sineiro de São Paulo atos e um prólogo), de Alcântara, julho de 1847 Joseph Bouchardy Les Sept Infants de Lara Teatro de São Pedro de (TPSM, 1836, drama em Os Sete Infantes de Lara Alcântara, agosto de 1871 cinco atos), de Félicien (ensaiador) Mallefille L’Outrage (TPSM, 1859, drama em cinco atos), de Teatro de São Pedro de O Ultraje Théodore Barrière e Alcântara, fevereiro de 1871 Édouard Plouvier Prosper et Vincent (TV, Prosper e Vicente ou os Teatro de São Januário, janeiro 1833, vaudeville em dois Dois Irmãos Gêmeos de 1839 atos), de Duvert e Lauzanne Teatro de São Pedro de Suzana Esposa Culpada * (drama em cinco atos e Alcântara, dezembro de 1870, e Mãe Arrependida um prólogo) janeiro de 1871 Trente Ans ou la Vie d’un Joueur (TPSM, 1827, Trinta Anos ou a Vida de Teatro de São Pedro de melodrama em três um Jogador Alcântara, julho de 1871 jornadas), de Victor Ducange * Peça original não identificada.

288

Tabela 9 – Repertório Francês de Florindo Joaquim no Rio de Janeiro (1840-1874)

Tradução Peça original Montagem La Main Droite et la Main Teatro de São Pedro de A Corte da Suécia Gauche (TO, 1842, drama em Alcântara, com Germano cinco atos), de Léon Gozlan Francisco, setembro de 1847 La Duchesse de Marsan (TAC, Teatro de São Francisco, A Duquesa de Marsan 1847, drama em cinco atos e seis junho e julho de 1852 quadros), de Adolphe Dennery A Eleição de Carlos V, Imperador da Samuel le Marchand (TAC, 1838 Teatro de São Pedro de Alemanha ou o drama em cinco atos), de Alcântara, março e abril de Banqueiro de Montigny e Meyer 1848 Francfort L’Éclat de Rire (TG, 1840, Teatro de São Januário, A Gargalhada drama em três atos), de Jacques fevereiro de 1856, janeiro e Arago e Alexandre Martin junho de 1857 Teatro de São Francisco, La Grâce de Dieu (TG, 1841, fevereiro, abril, maio, julho, drama em cinco atos entremeado setembro e dezembro de A Graça de Deus de canto), de Adolphe Dennery e 1851 Gustave Lemoine Teatro Provisório, março se 1852 Léa ou la Sœur du Soldat (TG, A Marquesa Octavia Teatro de São Januário, 1847, drama em cinco atos), de ou a Irmã do Soldado março de 1857 Joseph Bouchardy Clermont ou une Femme d’Artiste (TGD, 1838, comédia- Teatro de São Francisco, A Mulher do Artista vaudeville em dois atos), de agosto de 1851 Eugène Scribe e Louis Vanderburch Angelo, Tyran de Padoue (TF, Angelo ou o Tirano de Teatro de São Pedro de 1835, drama em três jornadas e Pádua Alcântara, setembro de 1845 em prosa), de Victor Hugo Arthur ou Seize Ans Aprés (TVa, Arthur ou Depois de 1838, drama-vaudeville em dois Teatro de São Francisco, Dezesseis Anos atos), de Charles Depeuty, Louis- abril e maio de 1851 Marie Fontan e Davrigy Les Mères Repenties (TPSM, Teatro de São Pedro de As Mães Arrependidas 1858, drama em quatro atos), de Alcântara, dezembro de 1859 Félicien Mallefille Les Orphelines d’Anvers (TAC, Teatro de São Pedro de As Órfãs da Antuérpia 1844, drama em cinco atos e seis Alcântara, agosto de 1859 quadros), de Joseph Bouchardy (ensaiado por Émile Doux) La Taverne du Diable (drama em Teatro de São Francisco, cinco atos e seis quadros), de A Taverna do Diabo novembro de 1851, janeiro Alboize de Pujol e Bernard de 1852 Lopez 289

La Tour de Nesle (TPSM, 1832, Teatro de São Pedro de drama em cinco atos e nove Alcântara, com João Caetano A Torre Maldita quadros), de Alexandre Dumas e Ludovina Soares, dezembro (pai) de 1858 Bertram le Matelot (TG, 1847, Teatro de São Januário, maio Bertram, o Marinheiro drama em cinco atos e um de 1856 prólogo), de Joseph Bouchardy Sept Heures ou Charlotte Corday (TPSM, 1829, drama em três atos Carlota Corday ou o Teatro de São Francisco, e seis quadros), de Victor Assassino de Marat março de 1852 Ducange e Auguste Anicet- Bourgeois Teatro de São Francisco, Crime e Mistério * fevereiro de 1851 Christophe Colomb (TG, 1861, Cristóvão Colombo o drama em cinco atos e um Teatro de São Pedro de Descobridor do Novo prólogo), de Eugène Mestépès e Alcântara, novembro de 1864 Mundo Eugène Barré Teatro de São Januário, Fayel (1770, tragédia em cinco janeiro, fevereiro e agosto de Fayel atos), de François Baculard 1857 d’Arnaud Teatro de São Pedro de Alcântara, julho de 1858 Gabrina ou la Chambre du Teatro de São Francisco, Gabrina ou a Coroa Berceau (TPSM, 1841, drama maio e setembro de 1851, Ducal de Parma em três atos), de Paul Henri julho de 1852 Foucher e Alboize de Pujol Hamlet (1769, tragédia em cinco Teatro de São Francisco, Hamleto atos), de Jean François Ducis setembro de 1842 Hariadan Barberousse (TAC, 1809, melodrama em três atos), Teatro de São Pedro de Hariadan Barba-Roxa de L.-A. Lamarque de Saint- Alcântara, janeiro de 1843 Victor e Corse (pseudônimo de Jean-Baptiste Labenette) Teatro Lírico Fluminense, junho de 1857 Jocelin ou o Jocelin le Garde-Côte (TAC, Teatro de São Januário, Marinheiro da 1855, drama em cinco atos), de agosto de 1857 Martinica Narcisse Fournier e Meyer Teatro de São Pedro de Alcântara, com Ludovina Soares, outubro de 1859 Kean ou Désordre et Génie (TV, Kean ou Desordem e 1836, comédia em cinco atos Teatro de São Januário, Gênio entremeada de cantos), de agosto e setembro de 1857 Alexandre Dumas (pai)

Lord Surrey (TG, 1838, drama Teatro de São Pedro de Lord Surrey em cinco atos), de Eugène Fillion Alcântara, maio de 1871 e Louis Jousserandot (ensaiador)

290

Teatro de São Pedro de Alcântara, janeiro de 1841, junho de 1844 Louise de Lignerolles (TF, 1838, Teatro de Santa Tereza, Luísa de Lignerolles drama em cinco atos), de Prosper setembro e dezembro de Dinaux e Ernest Legouvé 1843 Teatro de São Francisco, outubro de 1843, setembro de 1851 O Ambicioso Político Teatro de São Pedro de ou o Especulador * Alcântara, com Ludovina Republicano Soares, julho de 1848 Teatro de São Pedro de L’Aveugle (TG, 1857, drama em Alcântara, com Ludovina O Cego cinco atos), de Auguste Anicet- Soares, novembro de 1859 Bourgeois e Adolphe Dennery (ensaiado por Émile Doux) Prêtez-moi Cinq Francs (TG, Teatro de São Francisco, O Empréstimo de 1834, drama em três atos), de abril, junho e outubro de Cinco Francos Albert e Fabrice Labrousse 1851, fevereiro de 1852 Le Fléau des Mers (TAC, 1856, Teatro de São Pedro de drama em sete atos e nove Alcântara, com João Caetano O Flagelo dos Mares quadros), de Léonce e Eugène e Ludovina Soares, junho de Nus 1858 Le Marin de la Garde (TIC, O Marinheiro da 1856, drama em cinco atos), de Teatro de São Pedro de Guarda ou os Auguste Anicet-Bourgeois e Alcântara, maio de 1858 Franceses em Portugal Michel Masson Com o título O Marinheiro de Saint-Tropez: Teatro de São Pedro de Alcântara, setembro de 1848, novembro de 1849, setembro, novembro-dezembro de 1851 La Dame de Saint-Tropez O Marinheiro de Teatro de São Januário, (TPSM, 1844, drama em cinco Saint-Tropez / A Dama outubro, novembro-dezembro atos), de Auguste Anicet- de Saint-Tropez de 1856 Bourgeois e Adolphe Dennery Teatro de São Francisco, dezembro de 1851 Com o título A Dama de Saint-Tropez: Teatro de São Januário, maio e junho de 1849 O Marinheiro e o Teatro de São Pedro de * Carrasco Alcântara, novembro de 1848

Émery le Négociant (TG, 1842, Teatro de São Francisco, O Negociante Honrado drama em três atos), de Boulé, maio-julho de 1851, março- ou o Caixeiro Ladrão Hippolyte Rimbaut e Dupré abril de 1852

291

Teatro de São Januário, Le Naufrage de la Méduse (TAC, O Naufrágio da novembro-dezembro de 1839, drama em cinco atos), de Medusa 1856, janeiro de 1857, maio Charles Desnoyer de 1858 Le Pélerin Blanc (TAC, 1801, Teatro de São Francisco, O Peregrino Branco melodrama em três atos e de fevereiro-abril, junho, agosto, ou os Meninos da grande espetáculo), de Guilbert outubro e dezembro de 1851, Aldeia de Pixerécourt fevereiro de 1852 Teatro de São Pedro de Le Sonneur de Saint-Paul (TG, Alcântara, junho de 1847, O Sineiro de São 1838, drama em quatro atos e um maio de 1850, outubro de Paulo prólogo), de Joseph Bouchardy 1859 (com João Caetano e Ludovina Soares) Teatro de São Francisco, novembro de 1842 Les Six Degrés du Crime (TAC, Teatro de São Pedro de Os Seis Degraus do 1831, melodrama em três atos), Alcântara, junho de 1858 Crime de Théodore Nézel e Benjamin (com João Caetano), julho de Antier 1863 Teatro D. Pedro II, março de 1874 Teatro de São Pedro de Alcântara, abril de 1840 (com João Caetano), setembro-outubro de 1841, Les Sept Infants de Lara (TPSM, julho de 1870 (ensaiador) Os Sete Infantes de 1836, drama em cinco atos), de Teatro de São Francisco, Lara Félicien Mallefille outubro de 1841 Teatro Lírico Fluminense, com João Caetano e Ludovina Soares, setembro de 1860 Teatro de São Francisco, Pierre Landais (TO, 1843, drama julho-agosto de 1852 Pedro Landais ou o em cinco atos), de Émile Teatro de São Januário, Alfaiate Ministro Souvestre fevereiro e dezembro de 1856, março de 1857 Polder ou le Bourreau d’Amsterdam (TG, 1828, Polder ou o Carrasco melodrama em três atos de Teatro de São Francisco, de Amsterdam grande espetáculo), Victor dezembro de 1851 Ducange e Guilbert de Pixerécourt

Teatro Lírico Fluminense, Ricardo III Richard III (TPSM, 1852, drama maio de 1864 em cinco atos), de Victor Séjour

292

Teatro de São Januário, junho de 1840, junho de 1856, janeiro de 1857 Trente Ans ou la Vie d’un Joueur Teatro de São Francisco, Trinta Anos ou a Vida (TPSM, 1827, melodrama em setembro de 1852 de um Jogador três jornadas), de Victor Ducange Teatro de São Pedro de Alcântara, junho de 1858 (com Ludovina Soares), julho de 1861 Un Mariage sous Louis XV (TF, Teatro de São Pedro de Um Casamento no 1841, comédia em cinco atos), de Alcântara, outubro-novembro Reinado de Luís XV Alexandre Dumas (pai) de 1847 * Peça original não identificada.

293

Tabela 10 – Repertório Francês de Joaquim Augusto no Rio de Janeiro (1843-1871)

Tradução Peça original Montagem La Citerne (TG, 1809, melodrama em quatro atos, Teatro de São Pedro de A Cisterna Arruinada de grande espetáculo), de Alcântara, agosto de 1853 Guilbert de Pixerécourt Adrienne Lecouvreur (TRe, 1849, comédia-drama em Teatro Lírico Fluminense, Adriana Lecouvreur cinco atos), de Eugène outubro de 1864 Scribe e Ernest Legouvé Provavelmente, Les Mystères de Paris (TPSM, 1844, romance em cinco Teatro de São Pedro de A Família Morel partes e onze quadros), de Alcântara, julho de 1851 Eugène Sue e Prosper Dinaux, adaptação do romance homônimo de Sue La Fille des Chiffonniers (TG, 1861, drama em cinco Teatro Ginásio Dramático, A Filha dos Trapeiros atos e oito quadros), de agosto de 1861 Auguste Anicet-Bourgeois e Ferdinand Dugué Teatro de São Januário, com La Grâce de Dieu (TG, João Caetano, abril de 1849 e 1841, drama em cinco atos abril de 1850 A Graça de Deus entremeado de canto), de Teatro de Santa Tereza, com Adolphe Dennery e Gustave João Caetano, abril de 1849 Lemoine Teatro de São Pedro de Alcântara, fevereiro de 1854 L’Honneur de la Maison Teatro Ginásio Dramático, com (TPSM, 1853, drama em A Honra de uma Família Furtado Coelho, setembro de cinco atos), de Léon Battu e 1859 Maurice Desvignes Teatro Fênix Dramática, Aimée ou o Assassino * (peça de Adolphe empresa do ator Heller, com por Amor Dennery) Ismênia dos Santos, março de 1871 A Independência da Teatro de São Pedro de * Escócia Alcântara, setembro de 1853 Teatro Ginásio Dramático, A Pecadora * fevereiro e outubro de 1861

Arthur ou Seize Ans Aprés (TVa, 1838, drama- Arthur ou Depois de Teatro de São Francisco, vaudeville em dois atos), de Dezesseis Anos fevereiro de 1851 Charles Depeuty, Louis- Marie Fontan e Davrigy

294

Fayel (1770, tragédia em Teatro de São Januário, janeiro Fayel cinco atos), de François de 1852 Baculard d’Arnaud Lazare le Pâtre (TAC, Teatro de São Pedro de 1840, drama em quatro atos Lázaro o Pastor Alcântara, com Ludovina Soares com prólogo), de Joseph e João Caetano, março de 1851 Bouchardy L’Ange de Minuit (TAC, Teatro Fênix Dramática, 1861, drama em seis atos), O Anjo da Meia-Noite empresa do ator Heller, março de Théodore Barrière e de 1871 Édouard Plouvier L’Âne Mort (TG, 1853, drama em cinco atos com um prólogo e um epílogo), Teatro Ginásio Dramático, com O Asno Morto de Théodore Barrière e Furtado Coelho, setembro de Adolphe Jaime, adaptação 1859 do romance homônimo de Jules Janin Le Livre Noir (TPSM, 1848, Teatro de São Pedro de O Livro Negro drama em cinco atos e seis Alcântara, com João Caetano, quadros), de Léon Gozlan agosto de 1852 Le Maître d’École (TAC, Teatro Ateneu Dramático, O Mestre Escola 1859, drama em cinco atos), outubro de 1862 de Paul Meurice Le Déserteur (1770, drama O Novo Desertor Teatro de Santa Tereza, em cinco atos), de L.-S. Francês dezembro de 1843 Mercier Teatro Ginásio Dramático, abril- L’Escamoteur (TG, 1860, maio e julho de 1861 drama em cinco atos), de O Pelotiqueiro Teatro Fênix Dramática, Adolphe Dennery e Jules empresa do ator Heller, fevereiro Brésil de 1871 Teatro de São Pedro de Les Enfants d’Édouard (TF, Alcântara, com Ludovina Os Filhos de Eduardo 1833, tragédia em três atos), Soares, janeiro-fevereiro de de Casimir Delavigne 1854 Les Pirates de la Savane (TG, 1859, drama de grande espetáculo em cinco atos e Teatro de São Pedro de Os Piratas da Savana seis quadros), de Auguste Alcântara, fevereiro de 1870 Anicet-Bourgeois e Ferdinand Dugué L’Outrage (TPSM, 1859, Teatro Ginásio Dramático, drama em cinco atos), de O Ultraje junho-agosto e novembro de Théodore Barrière e 1860, maio de 1861 Édouard Plouvier Rita l’Espagnole (TPSM, 1837, drama em quatro Teatro de São Francisco, Rita a Espanhola atos), de Desnoyer, Boulé e novembro de 1844 Jules Chabot de Bouin 295

Le Roman d’un Jeune Homme Pauvre (TVa, 1858, Teatro Ginásio Dramático, Romance de um Moço comédia em cinco atos e dezembro de 1859, julho e Pobre sete quadros), de Octave setembro de 1860, julho de 1861 Feuillet Teatro de São Pedro de Le Vieux Caporal (TPSM, Alcântara, janeiro de 1867, Simão ou o Velho Cabo 1853, drama em cinco atos), Março-abril de 1870 (empresa de Esquadra de Adolphe Dennery e do ator Antônio Francisco de Dumanoir Souza Martins) * Peça original não identificada.

296

Tabela 11 – Traduções de Dramas e Melodramas Franceses no Archivo Theatral

Montagem no Rio de Tradutor4 Tradução Peça original Janeiro Archivo Theatral (vol. 1). Lisboa: Tip. Carvalhense, 1838 La Tour de Nesle Não encontramos indícios (TPSM, 1832, drama que confirmassem a autoria Conde de A Torre de em cinco atos e nove da tradução encenada por Farrobo Nesle quadros), de João Caetano no Teatro Alexandre Dumas Constitucional Fluminense, (pai) em setembro de 1836 Não encontramos indícios Catherine Howard que confirmassem a autoria (TPSM, 1834, drama da tradução encenada por Inácio Pizarro Catharina em cinco atos e oito João Caetano no Teatro de Morais Howard quadros), de Constitucional Fluminense, Sarmento Alexandre Dumas em outubro de 1836, e no (pai) Teatro de São Francisco, em julho de 1848 O Gaiato de Não encontramos indícios Le Gamin de Paris Lisboa que confirmassem a autoria (TGD, 1836, comédia- (drama em dois da tradução encenada no vaudeville em dois atos imitado do Teatro de São Januário, em atos), de Bayard e Gamin de janeiro de 1840 e abril de Louis Vanderburch Paris) 1849 João Baptista Richard Darlington Ferreira Não encontramos indícios (TPSM, 1831, drama que confirmassem a autoria em três atos, Ricardo da tradução encenada por precedido de um Darlington João Caetano no Teatro prólogo), de Constitucional Fluminense, Alexandre Dumas em julho de 1837 (pai) e Prosper Dinaux

Uma tradução foi encenada por Ludovina Soares no Lucrèce Borgia Teatro da Praia de D. Manuel, (TPSM, 1833, drama em julho de 1836, porém Luís José Lucrécia Borgia em três atos e em parece improvável que tenha Baiardo prosa), de Victor sido esta tradução, pois a Hugo representação no Brasil se deu antes da publicação em Portugal

4 Os nomes dos tradutores portugueses foram consultados no banco de dados Tetra Base, do grupo de pesquisa “TETRA (Teatro e Tradução): para uma história da tradução de teatro em Portugal, 1800-2009”, disponível em: . Acesso em: 7 fev. 2017. 297

Le Chevreuil ou le Não encontramos indícios Fermier Anglais (TV, que confirmassem a autoria O Cabrito 1831, comédia em três da tradução encenada por Montez ou o atos entremeada de Manoel Baptista Lisboa no Rendeiro Inglês canto), de Léon Teatro de São Francisco, em Halévy e Jaime fevereiro de 1848 Le Pauvre Berger (TPD, 1823, O Pobre Pastor melodrama histórico (drama histórico *** em três atos), de Luís José em três atos) Daubigny, Carmouche Baiardo e Hyacinthe

Le Prévôt de Paris Teatro da Praia de D. Manuel, (TG, 1836, drama em Germano Francisco, setembro O Prevoste de três atos), de Auguste- de 1838, encenada com o Paris, 1369 Louis-Désiré Boulé e título A Família de um Judeu Eugène Cormon ou o Preboste de Paris5 Trente Ans ou la Vie A tradução encenada no Rio Trinta Anos ou d’un Joueur (TPSM, de Janeiro por João Caetano é a Vida de um 1827, melodrama em de autoria de Camilo do Jogador três jornadas), de Rosário Guedes Victor Ducange Não encontramos indícios La Chambre Ardente que confirmassem a autoria (TPSM, 1833 drama Pedro Ciríaco A Câmara da tradução encenada por em cinco atos e nove da Silva Ardente Ludovina Soares no Teatro de quadros), de São Januário, em junho de Mélesville e Bayard 1839 Não encontramos indícios Rodrigo de La Tâche de Sang que confirmassem a autoria Azevedo A Nódoa de (TG, 1835, drama em da tradução encenada no Sousa da Sangue três atos), de Julien de Teatro Constitucional Câmara Mallian e Boulé Fluminense, em fevereiro de 1837 Archivo Theatral (vol. 2). Lisboa: Tip. Carvalhense, 1839

Não encontramos indícios que confirmassem a autoria da tradução encenada por A Coroa Joaquim de Barros no Teatro Hereditária ou ** (drama em três * de São Pedro de Alcântara, o Perigo dos atos) em fevereiro de 1840, com o Povos título Os Máscaras Negros ou a Coroa Hereditária

5 No texto traduzido, que se encontra no primeiro volume do Archivo Theatral, não há a indicação da autoria da tradução. O nome do tradutor foi indicado no anúncio do espetáculo oferecido no Rio de Janeiro. Ver DIÁRIO do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 25 ago. 1838, p. 2. 298

Latude ou Trinta e Cinco Anos de Latude ou Trente-Cinq Cativeiro Ans de Captivité Não encontramos indícios (drama histórico (1835, melodrama em que confirmassem a autoria em três atos e * três atos), de Auguste da tradução encenada no cinco quadros, Anicet-Bourgeois e Teatro da Praia de D. Manuel, precedido de Guilbert de em agosto de 1837 um prólogo, Pixerécourt intitulado Uma Manhã em Trianon) La Tête de Bronze ou le Déserteur Hongrois O Desertor (TG, 1808, melodrama * Húngaro *** em três atos), de Jean- (drama) Baptiste-Augustin Hapdé Não encontramos indícios que confirmassem a autoria Jeanne de Flandre da tradução encenada no (TAC, 1835, drama Joana de Teatro Constitucional em quatro atos), de Flandres Fluminense, em setembro de Louis-Marie Fontan e Conde de 1836, e no Teatro de São Victor Herbin Farrobo Pedro de Alcântara, em setembro de 1840 Teatro de São Francisco, João ** (drama em dois Caetano, outubro de 1844, Um Erro atos) encenado com o título Um Erro ou Remorsos Não encontramos indícios Karl ou le Châtiment Francisco de que confirmassem a autoria Karl, Conde de (TPSM, 1835, drama Borja da tradução encenada por Richter ou o em quatro atos), de Carvalho e Ludovina Soares no Teatro de Castigo Auguste Anicet- Melo São Pedro de Alcântara, em Bourgeois e Lockroy agosto de 1840

Não encontramos indícios que confirmassem a autoria da tradução encenada por Le Sonneur de Saint- Joaquim de Barros e Paul (TG, 1838, João Baptista O Sineiro de Ludovina Soares no Teatro de drama em quatro atos Ferreira São Paulo São Januário, em fevereiro de e um prólogo), de 1840, nem por João Caetano Joseph Bouchardy no Teatro de São Pedro de Alcântara, em outubro de 1859

299

D. Juan d’Autriche, ou Não encontramos indícios D. João la Vocation, (TF, que confirmassem a autoria d’Áustria ou a 1835, comédia em da tradução encenada no Vocação cinco atos), de Teatro de São Francisco, em (drama) Casimir Delavigne abril de 1843 Não encontramos indícios que confirmassem a autoria Il y a Seize Ans ou les da tradução encenada por Incendiaires (TG, Há Dezesseis Ludovina Soares no Teatro da 1831, drama em três Anos ou os Praia de D. Manuel, em maio atos entremeado de Luís José Incendiários de 1837, e no Teatro de São música), de Victor Baiardo Pedro de Alcântara, em julho Ducange de 1842, fevereiro de 1844 e abril de 1848 Não encontramos indícios Hariadan Barberousse que confirmassem a autoria (TAC, 1809, da tradução encenada no Hariadan, melodrama em três Teatro Constitucional Barba-Roxa atos), de L.-A. Fluminense, em setembro de (drama) Lamarque de Saint- 1834, com o título Hariadan Victor e Leblanc Barba-Roxa ou a Honra e a Perfídia Archivo Theatral (vol. 3). Lisboa: Tip. Carvalhense, 1840 Não encontramos indícios que confirmassem a autoria La Duchesse de la da tradução encenada por Vaubalière (TPSM, A Duquesa de Ludovina Soares no Teatro de * 1836, drama em cinco la Vaubalière São Pedro de Alcântara, em atos), de Balisson de agosto de 1841, com o título Rougemont A Duquesa da Vaubalière ou a Defunta Viva Polder ou le Bourreau d’Amsterdam (TG, 1828, melodrama em Não encontramos indícios Polder ou o três atos de grande que confirmassem a autoria * Carrasco espetáculo), de Victor da tradução encenada no d’Amsterdam Ducange em Teatro de São Januário, em colaboração com janeiro de 1839 Guilbert de Pixerécourt Le Pélerin Blanc Não encontramos indícios (TAC, 1801, O Peregrino que confirmassem a autoria melodrama em três João Baptista Branco ou os da tradução encenada por atos e de grande Ferreira Meninos da Florindo Joaquim no Teatro espetáculo), de Aldeia (drama) de São Francisco, em março Guilbert de de 1851 Pixerécourt 300

La Vénitienne (TPSM, 1834, drama em cinco Teatro da Praia de D. Manuel, atos e oito quadros), A Veneziana Joaquim de Barros, maio de de Alexandre Dumas 1837 (pai) e Auguste Anicet-Bourgeois Luís José Don Juan de Maraña Baiardo6 ou la Chute d’un Ange Dom João de (TPSM, 1836, Teatro da Praia de D. Manuel, Maraña ou o mistério em cinco atos Joaquim de Barros, agosto de Fim de um e sete quadros), de 1838 Dissoluto Alexandre Dumas (pai) Archivo Theatral (vol. 4). Lisboa: Tipografia de G. M. Martins, 1841 Le Massacre des Não encontramos indícios Innocents (TG, 1839, que confirmassem a autoria A Degolação drama bíblico em * das traduções encenadas por dos Inocentes cinco atos), de Louis- João Caetano e Joaquim Marie Fontan e Julien Augusto de Mallian Le Paysan Perverti ou O Aldeão Não encontramos indícios Quinze Ans de Paris Pervertido ou que confirmassem a autoria * (TGD, 1827, peça em Quinze Anos de da tradução encenada por três jornadas), de Paris João Caetano Théaulon de Lambert Não encontramos indícios Les Sept Infants de que confirmassem a autoria Os Sete Infantes Lara (TPSM, 1836, das traduções encenadas por * de Lara drama em cinco atos), João Caetano, Germano de Félicien Mallefille Francisco, Florindo Joaquim e Joaquim Augusto Archivo Theatral (vol. 5). Lisboa: Tipografia do Archivo Theatral, 1842 Les Six Degrés du Não encontramos indícios Crime (TAC, 1831, que confirmassem a autoria Os Seis melodrama em três das traduções encenadas por * Degraus do atos), de Théodore João Caetano, Germano Crime Nézel e Benjamin Francisco, Florindo Joaquim Antier e Joaquim Augusto Archivo Theatral (vol. 6). Lisboa: Tipografia do Archivo Theatral, 1843

Lisbeth ou la Fille du Não encontramos indícios

Laboureur (TAC, que confirmassem a autoria Lisbeth ou a 1823, drama em três da tradução encenada no Filha do * atos), adaptação de Teatro de São Pedro de Lavrador Victor Ducange do seu Alcântara, em abril de 1844,

romance Léonide ou la com o título Lisbeth ou a

Vieille de Surènes Vítima do Rigor Paternal

6 Os anúncios de espetáculos publicados no Jornal do Commercio indicaram o nome de Luís José Baiardo como o tradutor de A Veneziana e D. João de Maraña. 301

Sept Heures ou Não encontramos indícios Charlotte Corday que confirmassem a autoria (TPSM, 1829, drama Sete Horas ou da tradução encenada por * em três atos e seis Carlota Corday Florindo Joaquim no Teatro quadros), de Victor de São Francisco, em março Ducange e Auguste de 1852 Anicet-Bourgeois Não encontramos indícios que confirmassem a autoria Paul Jones ou Paul le da tradução encenada por Corsaire (1838, drama João Baptista O Capitão Joaquim de Barros no Teatro em cinco atos), de Ferreira Paulo de São Januário, em julho de Alexandre Dumas 1839 (pai)

Archivo Theatral (vol. 7). Lisboa: Tipografia do Archivo Theatral, 1844 Não encontramos indícios Prêtez-moi Cinq que confirmassem a autoria Empresta-me Francs (TG, 1834, da tradução encenada por * Dois Pintos drama em três atos), Florindo Joaquim no Teatro (imitação) de Albert e Fabrice de São Francisco, em abril de Labrousse 1851 Não encontramos indícios La Branche de Chêne que confirmassem a autoria (TAC, 1839, drama O Ramo de da tradução encenada por * em cinco atos), de Carvalho Germano Francisco no Teatro Charles Desnoyer e de São Pedro de Alcântara, Charles Lafont em outubro de 1843 Não encontramos indícios Louise de Lignerolles que confirmassem a autoria (TF, 1838, drama em Luísa de da tradução encenada por cinco atos), de Prosper Lignerolles Florindo Joaquim no Teatro Dinaux e Ernest de São Pedro de Alcântara, João Baptista Legouvé em janeiro de 1841 Ferreira Madeleine (TAC, 1843, drama em cinco Teatro de São Francisco, João Magdalena atos), de Auguste Caetano, novembro de 1846 Anicet-Bourgeois e Albert * Tradutor não identificado. ** Peça original não identificada. *** Nenhum indício de encenação foi localizado.

302

Tabela 12 – Tradutores Portugueses nos Teatros do Rio de Janeiro

Tradutor Tradução Peça original Edição Montagem Jeanne la Folle ou la Bretagne au Teatro de São Pedro Alexandre XIIIe Siècle (TO, de Alcântara, João Joana a Magno de 1830, drama ** Caetano e Ludovina Doida Castilho histórico em cinco Soares, agosto de atos), de Louis- 1857 Marie Fontan 2 ed. Lisboa: Camoëns (TO, Tip. da Teatro de São Pedro Antonio 1845, drama em Sociedade de Alcântara, João Feliciano de Camões cinco atos), de Tipográfica Caetano e Ludovina Castilho Victor Perrot e Franco- Soares, novembro de Armand Du Mesnil Portuguesa, 1855 1863 Les Mines de Real Teatro de São Pologne (TAC, João, 1821 1803, melodrama As Minas Teatro em três atos de Manuscrito da Polônia Constitucional grande espetáculo), Fluminense, João de Guilbert de Antônio Caetano, 1836 Pixerécourt Xavier Teatro de São João, Le Déserteur 1823 O Novo (1770, drama em Teatro Desertor Manuscrito cinco atos), de L.- Constitucional Francês S. Mercier Fluminense, João Caetano, 1835 Archivo Teatro de São Theatral, Francisco, João Conde de vol. 2. Caetano, outubro de Um Erro * Farrobo Lisboa: Tip. 1844, encenado com Carvalhense, o título Um Erro ou 1839 Remorsos

Les Deux Orphelines (TPSM, 1874, drama em cinco atos e oito Teatro São Luiz, Eduardo As Duas quadros), de ** Dias Braga, janeiro Garrido Órfãs Adolphe Dennery e de 1876 Eugène Cormon

303

Le Tour du Monde en 80 Jours (TPSM, 1874, Teatro de São Pedro A Volta ao drama em cinco de Alcântara, Dias Mundo em ** atos e quinze Braga, fevereiro de 80 Dias quadros), de 1878 Adolphe Dennery e Jules Verne Eduardo Teatro Recreio Garrido Os Crimes * (de Léon Dramático, Dias ** da Parteira Jonathan) Braga, dezembro de 1886 Un Drame au Fond de la Mer (TAC, Teatro de São Pedro Um Drama 1884, drama em de Alcântara, Dias no Fundo ** cinco atos e seis Braga, novembro de do Mar quadros), de 1882 Ferdinand Dugué Jack l’Éventreur (TCE, 1889, drama Teatro Santana, Dias Eduardo Jack o em cinco atos e sete Braga, outubro de ** Victorino Estripador quadros), de Gaston 1901 Marot e Louis Péricaud La Tireuse de Cartes (TPSM, Lisboa: Teatro de São Pedro A Mulher 1860, drama em Ernesto Livraria de de Alcântara, que Deita cinco atos, Biester A. M. Ludovina Soares, Cartas precedido de um Pereira, 1861 maio de 1862 prólogo), de Victor Séjour Le Prince de O Norwège ou la Lisboa: Teatro Imperial São Verdadeiro Bague de Fer Fernando José Tip. de Pedro de Alcântara, Heroísmo (TPSM, 1818, de Queiroz Bulhões, Ludovina Soares, ou o Anel drama heroico em 1822 janeiro de 1830 de Ferro três atos), de Victor Ducange Teatro Recreio Martyre! (TAC, Dramático, Dias 1886, drama em A Mártir ** Braga e Ismênia dos cinco atos), de Santos, outubro de Adolphe Dennery 1886 Henrique Les Ruínes du Chaves Château Noir (TB, As Ruínas drama em nove Teatro São Luiz, do Castelo quadros, sendo um ** Dias Braga, maio de Negro prólogo), de 1880 Narcisse Fournier e Henri Meyer 304

Denise (TF, 1885, Teatro Recreio drama em quatro Dramático, Dias Dionísia ** atos), de Alexandre Braga, abril e maio Dumas (filho) de 1885 Francillon (TF, Teatro Recreio 1887, peça em três Henrique Francillon ** Dramático, Dias atos), de Alexandre Chaves Braga, maio de 1887 Dumas (filho) La Glu (TAC, Teatro das 1883, drama lírico Mulher Novidades, Dias em cinco atos e seis ** Visgo Braga, janeiro e quadros), de Jean fevereiro de 1884 Richepin Archivo Theatral, Madeleine (TAC, vol. 7. Teatro de São 1843, drama em João Baptista Lisboa: Francisco, João Magdalena cinco atos), de Ferreira Tipografia Caetano, novembro Auguste Anicet- do Archivo de 1846 Bourgeois e Albert Theatral, 1844 Os * (peça de Paul Teatro São Luiz, Joaquim José Demônios Féval e Lambert ** Dias Braga, setembro Annaya da Noite Thiboust) de 1880 Teobardo Soberano Berthilie (TAC, dos Estados 1814, melodrama Teatro da Praia de D. José Maria da da Turíngia em três atos de Manuel, Ludovina ** Costa e Silva ou os grande espetáculo), Soares, fevereiro de Efeitos do de Louis-Benoit- 1835 Erro e do François Fanatismo Porto: Typ. Comercial Portuense, Le Mari de la 1842. Veuve (TF, 1832, Teatro de São Pedro José Maria de O Marido Archivo comédia em um de Alcântara, agosto Sousa Lobo da Viúva Theatral. ato), de Alexandre de 1843 Rio de Dumas (pai) Janeiro: Villeneuve, 1843

Le Prévôt de Paris Archivo A Família (TG, 1836, drama Theatral, Teatro da Praia de D. de um Luís José em três atos), de vol. 1. Manuel, Germano Judeu ou o Baiardo Auguste-Louis- Lisboa: Tip. Francisco, setembro Preboste de Désiré Boulé e Carvalhense, de 1838 Paris Eugène Cormon 1838

305

L’Élève de Saint- A Mão de Cyr (TAC, 1838, Teatro de Santa Ferro ou o drama em um ** Tereza, dezembro de Estudante prólogo e cinco 1851 de S. Cyro atos), de Francis Cornu La Vénitienne (TPSM, 1834, Archivo drama em cinco Theatral, Teatro da Praia de D. A atos e oito vol. 3. Manuel, Joaquim de Veneziana quadros), de Lisboa: Tip. Barros, maio de 1837 Alexandre Dumas Carvalhense, (pai) e Auguste 1840 Anicet-Bourgeois Don Juan de Maraña ou la Archivo D. João de Chute d’un Ange Theatral, Teatro da Praia de D. Maraña ou (TPSM, 1836, vol. 3. Manuel, Joaquim de o Fim de mistério em cinco Lisboa: Tip. Barros, agosto de um atos e sete Carvalhense, 1838 Dissoluto quadros), de 1840 Alexandre Dumas Luís José (pai) Baiardo Frederico II, Rei da Prússia, ou * (drama em três Teatro da Praia de D. as Duas atos), de Auguste ** Manuel, Joaquim de Últimas Anicet-Bourgeois Barros, julho de 1837 Horas de um Condenado O Limpa Candeeiros Teatro da Praia de D. ou o * (drama em um ** Manuel, julho de Homem das ato) 1837 Consequên- cias O Teatro da Praia de D. Mendicante * (drama em três Manuel, Joaquim de ou o ** atos) Barros, agosto de Delator de 1837 Si Mesmo Uma Hora Teatro de São Pedro de Prisão * (drama em um de Alcântara, ** ou Um por ato) Francisco Fuctuoso Outro Dias, julho de 1844 Pedro o Padre José Teatro da Praia de D. Grande ou * (drama em quatro Manuel de ** Manuel, janeiro de os Falsos atos) Abreu e Lima 1837 Mendigos 306

Les Misérables (drama), adaptação Teatro de São Pedro Thomaz Lino Os de Charles Hugo do ** de Alcântara, Dias d’Assumpção Miseráveis romance homônimo Braga, julho de 1877 de Victor Hugo * Peça original não identificada. ** Edição não localizada.

307

Tabela 13 – Traduções no Brasil

Tradutor Tradução Peça original Edição Montagem Cinna ou la Clemence Teatro de São Pedro d’Auguste (TM, de Alcântara, Cinna *** 1641, tragédia em Ludovina Soares, cinco atos), de dezembro de 1861 Antonio Pierre Corneille José de L’Alchimiste (TR, Araújo 1839, drama em Teatro de São Pedro cinco atos e em de Alcântara, O Alquimista *** verso), de Ludovina Soares, Alexandre Dumas abril de 1841 (pai) Chatterton (TF, Antônio Teatro de Santa 1835, drama em três Marques Chatterton *** Isabel (PE), outubro atos), de Alfred de Rodrigues de 1854 Vigny L’Auberge de la Madone (TAC, A Estalagem 1842, drama em **** da Virgem cinco atos), de Hipollyte Hostein e Tavenet Clarisse Harlowe (TGD, 1846, drama Clara em três atos), de **** Harlowe Dumanoir, Clairville e León Guillard Bibliotheca Gaspar Hauser Dramatica: (TAC, 1838, drama Theatro Antônio Gaspar em quatro atos), de Moderno. **** Rego Hauser Auguste Anicet- Maranhão: Bourgeois e Typ. de J. C. Adolphe Dennery M, 1853- Mademoiselle de 1854 Belle-Isle Mademoiselle (TF, 1839, drama **** de Belle-Isle em cinco atos), de Alexandre Dumas (pai) Martin et Bamboche Martin e ou les Amis Bamboche ou d’Enfance (TG, **** os Amigos de 1847, drama em Infância cinco atos e dez quadros), de E. Sue 308

La Closerie des Genêts (TAC, 1846, O Casal das drama em cinco **** Giestas atos, oito quadros e um prólogo), de Frédéric Soulié Le Chevalier de Maison-Rouge, Épisode du Temps des Girondins (TH, O Cavaleiro 1847, drama em da Casa **** cinco atos e doze Vermelha quadros), de Alexandre Dumas Bibliotheca (pai) e Auguste Dramatica: Maquet Theatro Les Orphelins du Antônio Moderno. Pont Notre-Dame Rego Maranhão: O Órfão da (TG, 1849, drama Typ. de J. C. Ponte de em cinco atos e oito M, 1853- **** Nossa quadros), de 1854 Senhora Auguste Anicet- Bourgeois e Michel Masson Les Deux Serruriers Teatro São Luiz Os Dois (TPSM, 1841, (MA), Germano Serralheiros drama em cinco Francisco, julho de atos), de Félix Pyat 1853 Simon le Voleur (TG, 1847, drama Teatro São Luiz em quatro atos), de Simão o (MA), Germano Laurencin Ladrão Francisco, dezembro (pseudônimo de de 1853 Paul-Aimé Chapelle) La Fille du Paysan (TG, 1862, drama Teatro Ginásio Aquiles A Filha do em cinco atos), de *** Dramático, Varejão Lavrador Auguste Anicet- setembro de 1863 Bourgeois e Adolphe Dennery

A Torre de La Tour de Nesle Nesle (em (TPSM, 1832, Teatro de São Pedro colaboração drama em cinco de Alcântara, Arthur com José atos e nove *** companhia da atriz Azevedo Pinto de quadros), de Emilia Adelaide, Azeredo Alexandre Dumas julho de 1889 Coutinho) (pai)

309

Teatro São Luiz, Máscaras de ** (peça de *** Dias Braga, junho Bronze Adolphe Dennery) de 1880 Le Fils de Coralie (TGD, 1880, Teatro Lucinda, O Filho de Arthur comédia em quatro *** Dias Braga, julho de Coralia Azevedo atos), de Albert 1881 Delpit Teatro de São Pedro O Rei das de Alcântara, Dias Areias de ** *** Braga, novembro de Ouro 1877 Teatro da Praia de D. Manuel, Trente Ans ou la Vie Ludovina Soares, d’un Joueur Camilo José Trinta Anos 1835 (TPSM, 1827, do Rosário ou a Vida de *** Teatro melodrama em três Guedes um Jogador Constitucional jornadas), de Victor Fluminense, João Ducange Caetano, abril de 1836 Le Vieux Caporal Teatro de São Pedro (TPSM, 1853, Simão ou o de Alcântara, João drama em cinco Dr. Sampaio Velho Cabo de *** Caetano e Ludovina atos), de Adolphe Esquadra Soares, junho de Dennery e 1858 Dumanoir Lorenzino (TF, Pernambuco: 1842, drama em Typographia F. A. Barros Lourencinho cinco atos), de **** de Santos e Alexandre Dumas Comp., 1848 (pai) Clermont ou une Femme d’Artiste Teatro de São Francisco (TGD, 1838, A Mulher do Francisco, Florindo Corrêa da comédia-vaudeville *** Artista Joaquim, agosto de Conceição em dois atos), de 1851 Eugène Scribe e Louis Vanderburch

Hernani ou Rio de l’Honneur Castillan Francisco Janeiro: Teatro de São Hernani ou a (CF, 1830, drama José Typographia Francisco, João Honra em cinco atos e em Pinheiro Universal de Caetano, março de Castelhana verso), de Victor Guimarães Laemmert, 1848 Hugo 1863

310

Le Château des Sept Tours (TG, 1840, Teatro de São A Louca ou o drama em cinco Januário, Florindo Castelo das atos, precedido de *** Joaquim, outubro de Sete Torres um prólogo), de 1856 Julien de Mallian e Alboize de Pujol Jocelin le Garde- Teatro de São Jocelin ou o Côte (TAC, 1855, Januário, Florindo Marinheiro da drama em cinco *** Joaquim, março de Martinica atos), de Narcisse 1857 Francisco Fournier e Meyer Luiz Le Marin de la Machado Garde (TIC, 1856, O Marinheiro drama em cinco Teatro de São Pedro da Guarda ou atos e nove de Alcântara, *** os Franceses quadros), de Florindo Joaquim, em Portugal Auguste Anicet- maio de 1858 Bourgeois e Michel Masson Le Naufrage de la Teatro de São Méduse (TAC, O Naufrágio Januário, Florindo 1839, drama em *** da Medusa Joaquim, novembro cinco atos), de de 1856 Charles Desnoyer Marie-Rose (TG, 1853, drama em Dias Braga encenou A Doida de cinco atos), de *** a peça de 1877 a Montemayor Auguste Anicet- 1907 Bourgeois e Michel Francisco Masson Moreira O Pai de Sampaio Marcial (em Le Père de Martial Teatro Recreio colaboração (TGD, 1883, peça Dramático, Dias com José *** em quatro atos), de Braga, janeiro de Pinto de Albert Delpit 1885 Azeredo Coutinho)

Le Mariage au Tambour (TV, A Vivandeira 1843, comédia em Teatro de São Pedro Germano ou o três atos entremeada de Alcântara (BA), Francisco de Casamento a *** de canto), de Germano Francisco, Oliveira Toque do Leuven e agosto de 1848 Caixa Brunswick

311

Berthe la Flamande (TAC, 1852, drama Teatro de Santa Bertha, a em cinco atos), de Isabel (PE), Mercadora de *** Paul Henri Joseph Germano Francisco, Flandres Molé-Gentilhomme novembro de 1857 e Constant Guéroult Hubert le Sorcier Teatro de São Pedro (TG, 1846, drama Huberto o de Alcântara, em cinco atos e seis *** Feiticeiro Germano Francisco, quadros), de M. agosto de 1846 Cazenave Marie-Jeanne Germano Francisco Edição (TPSM, 1845, encenou a peça nos Maria Joana, vendida no drama em cinco teatros das Mulher do Recife na atos e seis quadros), províncias (Bahia, Povo ou a loja de de Adolphe Pernambuco, Pobre Mãe Cardoso Dennery e Julien de Maranhão e Rio Ayres, 1850 Mallian Grande do Sul) Les Mémoires du Diable (TVa, 1842, Teatro São José Memórias do comédia-vaudeville (CE), empresa do *** Diabo em três atos), de ator Lima Penante, Étienne Arago e maio de 1876 Paul Vermond Germano La Dame de Saint- Francisco de Germano Francisco Tropez (TPSM, Oliveira encenou a peça nos O Marinheiro 1844, drama em teatros das de Saint- cinco atos), de *** províncias (Bahia, Tropez Auguste Anicet- Ceará, Maranhão e Bourgeois e Pernambuco) Adolphe Dennery Teatro de São Pedro de Alcântara, Le Courrier de Germano Francisco, O Processo Lyon (TG, 1850, setembro de 1870 Lesurques ou drama em cinco *** Teatro de Santa o Correio de atos e oito quadros), Isabel (PE), empresa Lião de Moreau, Siraudin do ator Lima e Delacour Penante, janeiro de 1874

Un Enfantillage (TPR, 1844, comédia em um ato, Teatro de São Pedro Uma entremeada de *** de Alcântara (BA), Rapaziada canto), de setembro de 1848 Mélesville e Carmouche

312

L’Esclave Andréa 3 ed. São (TPSM, 1838, J. Vieira A Escrava Paulo: drama em cinco **** Pontes Andrea Teixeira & atos), de Julien de Cia, 1928 Mallian e Legoyt Les Mères Teatro de São Pedro Repenties (TPSM, As Mães de Alcântara, 1858, drama em *** Arrependidas Florindo Joaquim, quatro atos), de dezembro de 1859 Félicien Mallefille L’Aveugle (TG, Teatro de São Pedro 1857, drama em de Alcântara, cinco atos), de O Cego *** Florindo Joaquim e Auguste Anicet- Ludovina Soares, Bourgeois e novembro de 1859 Adolphe Dennery Teatro de São Pedro Le Fléau des Mers de Alcântara, João (TAC, 1856, drama O Flagelo dos Caetano, Ludovina em sete atos e nove *** Mares Soares e Florindo quadros), de Léonce Joaquim, junho de e Eugène Nus Joaquim da 1858 Silva Lessa L’Escamoteur (TG, Paranhos 1860, drama em Teatro de São Pedro O Prestidigi- cinco atos), de *** de Alcântara, João tador Adolphe Dennery e Caetano, 1862 Jules Brésil Le Secret des Cavaliers (TAC, Teatro de São Pedro O Segredo dos 1856, drama em seis *** de Alcântara, Cavalheiros atos), de Joseph outubro de 1862 Bouchardy Nos Intimes! (TVa, Teatro de São Pedro Os Nossos 1861, comédia em de Alcântara, João *** Íntimos quatro atos), de Caetano, junho de Victorien Sardou 1862 Richard III (TPSM, Teatro Lírico 1852, drama em Fluminense, Ricardo III *** cinco atos), de Florindo Joaquim, Victor Séjour maio de 1864

Charles VII chez ses Joaquim Carlos VII Grands Vassaux Teatro de São Norberto de entre os seus (TO, 1831, tragédia Francisco, João *** Sousa e Grandes em cinco atos), de Caetano, outubro de Silva Vassalos Alexandre Dumas 1846 (pai)

313

La Dame aux Camélias (TVa Teatro Ginásio A Dama das 1852, drama em *** Dramático, fevereiro Camélias cinco atos), de de 1856 Alexandre Dumas (filho) Bertram le Matelot Teatro de São (TG, 1847, drama Bertram, o Januário, Florindo em cinco atos e um *** Marinheiro Joaquim, maio de prólogo), de Joseph 1856 Bouchardy Le Chevalier de Maison-Rouge, José Épisode du Temps Joaquim des Girondins (TH, Teatro de São Pedro O Cavaleiro Vieira Souto 1847, drama em de Alcântara, João da Maison *** cinco atos e doze Caetano, abril de Rouge quadros), de 1851 Alexandre Dumas (pai) e Auguste Maquet Teatro de Santa O Espião ** (drama em cinco Tereza, Ludovina *** Fidalgo atos) Soares, janeiro de 1857 Les Parisiens (TVa, Teatro Ginásio 1854, peça em três Os Parisienses *** Dramático, atos), de Théodore dezembro de 1855 Barrière Marianne (TAC, 1850, drama em Teatro de São sete atos e um José Moreira Januário, João Mariana a prólogo dividido em Barbosa *** Caetano e Ludovina Vivandeira duas partes), de Júnior Soares, novembro Auguste Anicet- de 1851 Bourgeois e Michel Masson Sherlock Holmes Sherlock Teatro Recreio José Pinto (TA, 1907, peça em Holmes o Dramático, Dias de Azeredo cinco atos e seis *** Agente de Braga, setembro de Coutinho quatros), de Pierre Polícia 1908 Decourcelle

Christophe Colomb Cristóvão (TG, 1861, drama Teatro de São Pedro Julio Xavier Colombo o em cinco atos e um de Alcântara, de Oliveira Descobridor *** prólogo), de Eugène Florindo Joaquim, (ator) do Novo Mestépès e Eugène novembro de 1864 Mundo Barré

314

La Tour de Nesle Teatro de São Pedro (TPSM, 1832, de Alcântara, João A Torre drama em cinco Caetano, Florindo *** Maldita atos e nove Joaquim e Ludovina Luís Garcia quadros), Alexandre Soares, dezembro de Soares de de Dumas (pai) 1858 Bivar Prêtez-moi Cinq Teatro de São O Empréstimo Francs (TG, 1834, Francisco, Florindo de Cinco drama em três atos), *** Joaquim, abril de Francos de Albert e Fabrice 1851 Labrousse Paillasse (TG, Teatro de São Pedro Luiz 1850, drama em de Alcântara, João Honório O Palhaço cinco atos), de *** Caetano e Ludovina Vieira Souto Adolphe Dennery e Soares, outubro de Marc Fournier 1852 L’Ange de Minuit Teatro de São José (TAC, 1861, drama Machado de O Anjo da (SP), Joaquim em seis atos), de *** Assis Meia-Noite Augusto, novembro Théodore Barrière e de 1865 Édouard Plouvier Teatro da Praia de Manuel Mérope (CF, 1743, D. Manuel, Odorico Mérope tragédia em cinco *** Ludovina Soares, Mendes atos), de Voltaire maio de 1838 L’Âne Mort (TG, 1853, drama em cinco atos com um prólogo e um Teatro Ginásio Maria epílogo), adaptação Dramático, Furtado O Asno Morto *** Velluti de Théodore Coelho, setembro de Barrière e Adolphe 1859 Jaime do romance homônimo de Jules Janin

“Um dos Richard Darlington nossos (TPSM, 1831, Teatro advogados, drama em três atos, Constitucional que não Ricardo precedido de um *** Fluminense, João deseja Darlington prólogo), Alexandre Caetano, julho de brilhar com Dumas (pai) e 1837 alheias Prosper Dinaux glórias”7

7 TEATRO Fluminense – 1ª representação de Ricardo Darlington, drama de Dinaux, traduzido do francês. Jornal dos Debates, Rio de Janeiro, 26 jul. 1837, Revista dramática, p. 92. 315

Violante Le Cachemire Vert Rio de Atabalipa O Chale de (comédia em um Janeiro: Typ. Ximenes de Cachemira ato), de Alexandre e Livraria de **** Bivar e Verde Dumas (pai) e B. X. P. de Vellasco Eugène Nus Sousa, 1857 Manuscrito, [s.d.]. (Cópia La Dame de Saint- datilografada Tropez (TPSM, pertencente 1844, drama em Tradução do A Dama de ao acervo da * cinco atos), de repertório de João Saint-Tropez Sociedade Auguste Anicet- Caetano8 Brasileira de Bourgeois e Autores Adolphe Dennery Teatrais – SBAT) Rio de Janeiro: Oficina de L’Éclat de Rire escrituração (TG, 1840, drama de Carvalho Tradução do * A Gargalhada em três atos), de Aguiar, repertório de João Jacques Arago e 1864. (Cópia Caetano9 Alexandre Martin datilografada pertencente ao acervo da SBAT) La Grâce de Dieu Rio de (TG, 1841, drama Janeiro: em cinco atos A Graça de Typographia Joaquim Augusto, * entremeado de Deus Commercial 1852 canto), de Adolphe de Soares & Dennery e Gustave C., 1852 Lemoine * Tradutor não identificado. ** Peça original não identificada. *** Edição não localizada. **** Montagem não localizada.

8 Acreditamos que duas traduções de La Dame de Saint-Tropez foram encenadas simultaneamente nos palcos brasileiros. A tradução intitulada O Marinheiro de Saint-Tropez, que incluía nomes aos atos da peça (Ato I. O credor e o consórcio, Ato II. A estalagem e o encontro, Ato III. A intriga, Ato IV. O envenenamento, Ato V. O crime em flagrante), criada no Teatro de São Pedro de Alcântara, em 1845, foi a versão representada por Florindo Joaquim ao longo de sua carreira. A tradução denominada A Dama de Saint-Tropez era a representada por João Caetano. Identificamos esta tradução como sendo a cópia depositada no acervo da SBAT, ao compararmos a galeria de personagens do datiloscrito com os anúncios de espetáculos publicados pela imprensa do Rio de Janeiro. 9 “Repertório do célebre ator João Caetano”. In: ARAGO & MARTIN, 1864, capa. (Cópia datilografada pertencente ao acervo da Sociedade Brasileira de Autores Teatrais – SBAT). 316

Tabela 14 – Trechos Suprimidos na Tradução de La Tour de Nesle10

“ORSINI – Parce qu’ils sont entrés ici, il faut qu’ils meurent ! Parce que leurs yeux ont vu ce qu’ils ne devaient pas voir, il faut que leurs yeux s’éteignent ! Parce que leurs lèvres ont reçu et donné des baisers qu’elles ne devaient ni recevoir ni donner, il faut que leurs lèvres se taisent pour ne se rouvrir, comme accusatrices, que devant le trône de Dieu !” (Primeiro ato, cena 5, segundo quadro) “MARGUERITE – Mon époux peut se réveiller. PHILIPPE – Votre vieil époux ne saurait venir encore.” (Primeiro ato, cena 8, segundo quadro) “MARGUERITE – Et moi, je n’avais rien juré sur l’honneur, n’est-ce pas ? Je n’ai violé aucun serment pour toi, n’est-ce pas ? Oublie que j’ai été pour toi parjure, car le parjure est dans l’amour plutôt encore que dans l’adultère. Oublie et garde ta parole, et moi ma jalousie. Adieu ! GAULTIER – Marguerite, au nom du ciel ! MARGUERITE – L’honneur ! L’honneur d’un homme ! Et l’honneur d’une femme, n’est- ce donc rien ? Tu as juré ; mais moi, un mot, une pensée de toi, m’a fait oublier un serment fait à Dieu, et je l’oublierais encore, et, si tu m’en priais, j’oublierais le monde entier pour toi.” (Segundo ato, cena 7, quarto quadro) “SAVOISY – Vous n’êtes pas allé au devant du roi, sire de Pierrefonds ? PIERREFONDS – Non, monseigneur ; si la reine y va, je l’accompagnerai ; et vous ? SAVOISY – J’attendrai notre sire ici ; il y a sur la route une si grande affluence de peuple, que l’on ne peut y passer. Je ne veux pas me confondre avec tous ces manants. PIERREFONDS – Et puis vous avez pensé que le véritable roi ne s’appelant pas Louis-le- Hutin, mais Marguerite de Bourgogne, mieux valait faire sa cour à Marguerite de Bourgogne qu’à Louis-le-Hutin. SAVOISY – Peut-être y a-t-il quelque chose comme cela.” (Quarto ato, cena 2, sétimo quadro) “BURIDAN – N’est-ce pas, quand on est près d’elle, quand elle vous parle d’amour, n’est- ce pas qu’il est doux de passer la main dans ses longs cheveux qu’elle laisse si voluptueusement flotter, d’en couper une tresse comme celle-ci ?” (Quinto ato, cena 3, oitavo quadro)

10 Usamos a seguinte edição como referência: GAILLARDET & *** [DUMAS, Alexandre]. La Tour de Nesle: drame en cinq actes et en neuf tableaux. Paris: J.-N. Barba, 1832. 317

Tabela 15 – Trechos Censurados de La Grâce de Dieu11

Original Trechos censurados “Air du Savoyard (de Bérat) MARIE – Hélas ! Je n’avais jamais Fait à ma mère un mensonge ! Et maintenant, quand j’y songe, J’ai pour elle des secrets ! Et, le soir, lorsque je prie Auprès d’elle, pourquoi donc, Toda a terceira Dans mon cœur, pauvre Marie ! quadra Retrouve-je un autre nom ? Ah ! Si je n’aimais naguère Qu’elle en ce monde... aujourd’hui, Ce qui n’est plus à ma mère, Dans mon cœur, est donc à lui !” (Primeiro ato, cena 6) “PIERROT – Comme ça, c’est ici que vous habitez ? MARIE – Toute seule. PIERROT – Comment ! Vous ne recevez personne ? MARIE – Non. Personne ! A fala inteira de PIERROT – Ah ! C’est gentil ça. Chonchon CHONCHON (étourdiment) – Pas trop ! Je pourrais pas vivre comme ça moi ! En hiver, y fait trop froid !” (Segundo ato, cena 2) “Air C’est moi qu’on appelle Le Noir (Monpou) LE COMMANDEUR – C’est moi qu’on appelait jadis Le petit roué de la régence ! Sous Fronsac, le gentil marquis, J’avais quinze ans, lorsque je fis Mes premières armes en France ! Que nous avons ri ! Que de bons tours, lorsque j’y pense, Aux frais de l’innocence ! Que nous avons ri de ces bons maris A ária e a copla De Paris ! cantadas pelo Deuxième couplet Comendador Et cette Pagode-Chonchon, Boisfleury Cette Pagode si cruelle, Qui, méchante comme un démon, Me faisait perdre la raison, Menaçant toujours ma prunelle ! J’ai su triompher du mauvais ton de cette belle, Et de son poing rebelle, (Souriant) Et j’eus mon pardon, Aidé du petit Cupidon !” (Terceiro ato, cena 3)

11 Usamos a seguinte edição como referência: DENNERY, Adolphe & LEMOINE, Gustave. La Grâce de Dieu: drame en cinq actes mêlé de chant. Paris: Imprimerie de Boulé et C., 1841. 318

“LE COMMANDEUR – Du petit Cupidon et du gros Bacchus ! Sous la forme de deux bouteilles de champagne ! Et vous espérez, Toda o monólogo do petit séducteur que vous êtes, qu’il en sera de même, aujourd’hui, de Comendador la petite Marie ! Allons ! Avouz-le, avouz-le donc, fripon. Eh bien ! Boisfleury Oui, palsambleu ! Oui, je l’espère.” (Terceiro ato, cena 3)

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Tabela 16 – Supressões na Tradução de La Dame de Saint-Tropez12

Original Tradução “HORTENSE (lui tendant la main) – Je vous avais deviné, Charles. Écoutez-moi, mon ami. Qualque élevée que soit la position de mon père, quelque grande que soit sa fortune, j’ai toujours espéré qu’il me laisserait maîtresse du choix de mon époux. Quand M. d’Auberive vous présenta à moi, il me dit : Il est malheureux, aime- “HORTÊNCIA (estendendo- le bien, mon enfant. Et je vous aimai, Charles, comme lhe a mão) – Já tinha j’aurais aimé mon frère. Un jour vint où je compris que adivinhado o teu pensamento, ce n’était plus une tendresse de frère que vouz aviez Carlos, por isso hoje mesmo pour moi... et, je vous l’avouerai, Charles, mon cœur falei a meu pai. Ele só quer a s’en réjouit. minha felicidade.” CHARLES – Il serait vrai ! HORTENSE – Pourquoi le cacherai-je ? Cet amour est sain et pur comme le souvenir de ma mère, qui vous aimait aussi, qui nous avait unis dans sa pensée.” (Primeiro ato, cena 2) “PAULINE (à mi-voix) – Oui, je sais que M. Langlois avait de moins que moi un blason qui remonte au temps des croisades, et de plus que moi trente ans à peu près. Mais on m’a dit qu’il possédait autant de mille livres de rentes que d’années, et je ne l’ai pas trouvé bien vieux... HORTENSE – Quel âge avait-il donc ? PAULINE – Cinquante... mille livres de rentes. Avec l’illustre nom des Dormesson, je ne possédais que les “PAULINA (em voz baixa) – portraits de mes aïeux et un tout petit revenu de 1.800 Que queres? O Sr. Langlois livres. En me rettirant de notre couvent, ma tante possuía cinquenta mil libras de d’Esterbeck, qui est une femme de sens, me fit voir M. renda!” Langlois. Je le trouvai un peu gros, mais très bonhomme.

Il me fit rire. Ça me rassura un peu. Il m’envoya une corbeille magnifique, ça me rassura tout à fait. Enfin, que te dirai-je ? Je suis heureuse, très heureuse. Je n’étais que marquise aux Ursulines, je suis reine... chez moi. Et c’est si gentil de commander. En ménage, comme en politique, je ne connais que le gouvernement absolu.” (Primeiro ato, cena 4)

12 Usamos como referência: DENNERY, Adolphe & ANICET-BOURGEOIS, Auguste. La Dame de Saint- Tropez: drame en cinq actes. Paris: C. Tresse, 1845. 320

Tabela 17 – Expressões Populares e a Tradução

Original Tradução A Gargalhada “MADELEINE – [...] allez, allez, deux “MADALENA – [...] se há muito trigo não bonheurs valent mieux qu’un.” há mau ano!” “LÉOPOLD – La garde meurt, elle ne se “LEOPOLDO – Quem torto nasce, tarde, ou rend pas.” nunca se endireita.” A Graça de Deus “CHONCHON – Ah ! Je vous retrouve donc “CHONCHON – Ah! Encontro-vos enfim, enfin, horreur d’homme que vous êtes !” homem de uma figa!” Os Dois Serralheiros “BURL – [...] il n’y a point d’orange sans “BURL – [...] não há rosa sem espinhos.” écorce.” “BURL (à part) – Il fait d’une pierre deux “BURL (à parte) – Mata de uma cajadada coups...” dois coelhos...” “GEORGE – Vous avez donc bien soif, M. “GEORGE – Estais então com muita sede, Tom ? senhor Tom? TOM – J’en mourrai !” TOM – Estou seco que nem uma cortiça!” “GAZUA – E nem é preciso pôr mais na “PASSE-PARTOUT – Ni vu, ni connu !” carta!” “BURL – Senhora Sorte, peço-vos por “BURL – Seigneur Hasard, fais que le quem soes que façais com que o banqueiro banquier Murray meure sans souffler.” Murray estique a canela sem tugir nem

mugir.” “BURL – Se o banqueiro der com a língua “BURL – Si le banquier parle [...].” nos dentes [...].”

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Tabela 18 – A Tradução Trinta Anos ou a Vida de um Jogador

Original Tradução “AMÉLIE – Ah ! (Amélie éperdue se jette à “AMÉLIA – É ele! Sim é ele! O coração son cou.) C’est lui ! C’est lui ! (Elle m’o está dizendo; e a sua linguagem não l’embrasse avec transport.) C’est mon fils ! pode ser outra que a da verdade. Meu Mon Albert ! Ah ! Mon Dieu ! J’ai tant Alberto, querido filho, vem, vem a meus souffert avec courage, ne me laissez pas braços.” mourir de joie !” (Segundo ato, cena 12) (Segundo ato, cena 13) “AMÉLIE – Non, je vous démasquerai “AMÉLIA – Quando se desmascarão os devant mon époux lui-même.” malvados do teu lote, faz-se um benefício à (Segundo ato, cena 18) humanidade.” (Segundo ato, cena 26) “GEORGES – Viens ! Maintenant, tu ne me “JOGADOR – Monstro... tu não me hás de quitteras plus ! Je te le jure par l’enfer !” escapar. No mesmo patíbulo a que eu subir (Terceiro ato, cena 17) hás de receber também a punição de teus crimes!” (Terceiro ato, última fala)

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Tabela 19 – Repertório Francês de João Caetano nas Províncias (1849-1857)

Tradução Peça original Montagem Teatro de São João (BA), julho de 1849 La Dame de Saint-Tropez Teatro Sete de Setembro (Rio (TPSM, 1844, drama em Grande – RS), agosto de 1854 A Dama de Saint-Tropez cinco atos), de Auguste Teatro Sete de Abril (Pelotas – Anicet-Bourgeois e RS), setembro-outubro de 1854 Adolphe Dennery Teatro de Santa Isabel (PE), fevereiro de 1857 Teatro de São João (BA), junho de 1849 Teatro Sete de Setembro (Rio Grande – RS), setembro de 1854 L’Éclat de Rire (TG, 1840, Teatro Sete de Abril (Pelotas – drama em três atos), de A Gargalhada RS), setembro de 1854 Jacques Arago e Alexandre Teatro de São Pedro de Martin Alcântara (Desterro – SC), novembro de 1854 Teatro de Santa Isabel (PE), março de 1857 Teatro de São João (BA), junho de 1849 Don César de Bazan Teatro Sete de Setembro (Rio (TPSM, 1844, drama em Grande – RS), setembro de 1854 D. César de Bazan cinco atos entremeado de Teatro Sete de Abril (Pelotas – canto), de Dumanoir e RS), setembro-outubro de 1854 Adolphe Dennery Teatro de Santa Isabel (PE), fevereiro de 1857 Kean ou Désordre et Génie (TV, 1836, comédia em Kean ou Desordem e Teatro de São João (BA), julho cinco atos entremeada de Gênio de 1849 cantos), de Alexandre Dumas (pai) Marianne (TAC, 1850, drama em sete atos e um Teatro de Santa Isabel (PE), Mariana a Vivandeira prólogo dividido em duas março-abril de 1857 partes), de Auguste Anicet- Bourgeois e Michel Masson Le Déserteur (1770, drama O Novo Desertor Teatro de Santa Isabel (PE), em cinco atos), de L.-S. Francês abril de 1857 Mercier Le Pauvre Idiot ou le Souterrain d’Heilberg (TG, 1838, drama em cinco atos e Teatro de São João (BA), junho O Pobre Idiota oito quadros), de Charles de 1849 Depeuty e Louis-Marie Fontan 323

Les Six Degrés du Crime Teatro Sete de Setembro (Rio Os Seis Degraus do (TAC, 1831, melodrama em Grande – RS), setembro de 1854 Crime três atos), de Théodore Teatro Sete de Abril (Pelotas – Nézel e Benjamin Antier RS), setembro de 1854 Teatro de São João (BA), com Othello ou le More de Germano Francisco, junho de Othelo ou o Mouro de Venise (TRe, 1792, tragédia 1849 Veneza em cinco atos), de Jean Teatro de Santa Isabel (PE), François Ducis fevereiro de 1857

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Tabela 20 – Repertório Francês de Germano Francisco nas Províncias (1848-1864)

Tradução Peça original Montagem La Dame de Laval (TAC, 1835, drama em três atos e Teatro de São Pedro de A Condessa de Laval seis quadros), de Julien de Alcântara (BA), maio de 1848 Mallian e Alfred Alexandre Legoyt La Dame aux Camélias Teatro de Santa Isabel (PE), (TVa 1852, drama em cinco setembro de 1861 A Dama das Camélias atos), de Alexandre Dumas Teatro São Luiz (MA), outubro (filho) de 1862 La Duchesse de Marsan (TAC, 1847, drama em Teatro São Luiz (MA), janeiro A Duquesa de Marsan cinco atos e seis quadros), de 1855 de Adolphe Dennery Provavelmente, Les Teatro São Luiz (MA), fevereiro Mystères de Paris (TPSM, de 1854 1844, romance em cinco A Família Morel dos Teatro de Santa Isabel (PE), partes e onze quadros), de Mistérios de Paris dezembro de 1857, junho de Eugène Sue e Prosper 1858, novembro de 1861 Dinaux, adaptação do

romance homônimo de Sue Teatro de Santa Isabel (PE), junho-julho de 1850, maio e L’Éclat de Rire (TG, 1840, novembro de 1851, outubro de drama em três atos), de 1861 A Gargalhada Jacques Arago e Alexandre Teatro Thaliense (CE), agosto de Martin 1852 Teatro São Luiz (MA), janeiro e dezembro de 1863 Teatro de Santa Isabel (PE), dezembro de 1850, junho de La Grâce de Dieu (TG, 1852, julho de 1857, junho e 1841, drama em cinco atos novembro de 1861 A Graça de Deus entremeado de canto), de Teatro Thaliense (CE), 1852 Adolphe Dennery e Gustave Teatro São Luiz (MA), outubro- Lemoine novembro de 1853 Teatro Sete de Abril – Pelotas, (RS), setembro de 1860

Le Château des Sept Tours (TG, 1846, drama em cinco atos precedido do prólogo A Louca ou o Castelo Teatro de Santa Isabel (PE), Les Français en Égypte, das Sete Torres fevereiro de 1858 Épisode de 1799), de Julien de Mallian e Alboize de Pujol

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La Nuit du Meurtre (TAC, A Noite de Homicídio ou 1839, drama em cinco atos), Teatro de Santa Isabel (PE), o Ambicioso Político de Albert e Fabrice maio de 1852 Labrousse Teatro de Santa Isabel (PE), A Pecadora * julho e setembro de 1861 Arthur ou Seize Ans Aprés Teatro de São Pedro de (Tva, 1838, drama- Arthur ou Dezesseis Alcântara (BA), junho de 1848 vaudeville em dois atos), de Anos Depois Teatro São Luiz (MA), abril de Charles Depeuty, Louis- 1853 Marie Fontan e Davrigy Teatro de São Pedro de Les Mémoires du Diable Alcântara (BA), junho-julho de (Tva, 1842, comédia- 1848 As Memórias do Diabo vaudeville em três atos), de Teatro de São João (BA), julho Étienne Arago e Eugène de 1848 Guinot Teatro de Santa Isabel (PE), novembro de 1861 Teatro Sete de Abril – Pelotas, La Tour de Londres (TAC, (RS), outubro de 1860 1855, drama em cinco atos), Teatro de Santa Isabel (PE), A Torre de Londres de Eugène Nus, Alphonse maio de 1861 Brot e Charles Lemaître Teatro São Luiz (MA), dezembro de 1862 La Vénitienne (TPSM, 1834, drama em cinco atos e A Veneziana ou o Bravo Teatro de Santa Isabel (PE), oito quadros), de Alexandre de Veneza janeiro de 1852 Dumas (pai) e Auguste Anicet-Bourgeois Le Mariage au Tambour A Vivandeira ou o (TV, 1843, comédia em três Teatro de São Pedro de Casamento a Toque do atos entremeada de canto), Alcântara (BA), agosto de 1848 Caixa de Leuven e Brunswick Berthe la Flamande (TAC, Teatro de Santa Isabel (PE), 1852, drama em cinco atos), novembro de 1857, maio de Bertha, a Mercadora de de Paul Henri Joseph Molé- 1859 Flandres Gentilhomme e Constant Teatro São Luiz (MA), outubro Guéroult de 1862 Catherine Howard (TPSM, 1834, drama em cinco atos e Teatro de Santa Isabel (PE), Catarina Howard oito quadros), de Alexandre junho de 1852 Dumas (pai)

Clotilde (TF, 1832, drama Teatro de São Pedro de Clotilde em cinco atos), de Frédéric Alcântara (BA), outubro de 1848 Soulié e Bossange

326

Teatro de Santa Isabel (PE), setembro de 1850, junho de 1857, maio de 1858, novembro Don César de Bazan de 1861 (TPSM, 1844, drama em Teatro Thaliense (CE), agosto de D. César de Bazan cinco atos entremeado de 1852 canto), de Dumanoir e Teatro São Luiz (MA), março e Adolphe Dennery outubro de 1853, julho de 1862 Teatro São Pedro – Porto Alegre (RS), 1869 Don Juan de Maraña ou la Chute d’un Ange (TPSM, Teatro de São João (BA), junho D. João de Maraña 1836, mistério em cinco de 1848 atos e sete quadros), de Alexandre Dumas (pai) Fayel (1770, tragédia em Teatro de São João (BA), Fayel cinco atos), de François outubro de 1849 Baculard d’Arnaud Gabrina ou la Chambre du Teatro São Luiz (MA), julho de Berceau (TPSM, 1841, Gabrina ou a Coroa 1853 drama em três atos), de Paul Ducal de Parma Teatro de Santa Isabel (PE), Henri Foucher e Alboize de dezembro de 1861 Pujol Giralda ou la Nouvelle Teatro de Santa Isabel (PE), Giralda ou a Nova Psyché (TOC, 1850, ópera setembro de 1857, novembro de Psyché cômica em três atos), de 1861 Eugène Scribe Jeanne de Flandre (TAC, Teatro de Santa Isabel (PE), 1835, drama em quatro abril de 1852 Joana de Flandres atos), de Louis-Marie Teatro São Luiz (MA), abril de Fontan e Victor Herbin 1853 Teatro de Santa Isabel (PE), maio de 1859, maio de 1861 Jocelin le Garde-Côte Teatro Sete de Abril – Pelotas, Jocelin ou o Marinheiro (TAC, 1855, drama em (RS), outubro de 1860 da Martinica cinco atos), de Narcisse Teatro São Luiz (MA), julho de Fournier e Meyer 1862, dezembro de 1863 Teatro Thaliense (CE), 1863 Kean ou Désordre et Génie (TV, 1836, comédia em Kean ou Desordem e Teatro São Luiz (MA), fevereiro cinco atos entremeada de Gênio de 1855 cantos), de Alexandre Dumas (pai)

Lazare le Pâtre (TAC, Teatro de Santa Isabel (PE), Lázaro o Pastor 1840, drama em quatro atos outubro de 1851 com prólogo), de Joseph Bouchardy

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Teatro de São João (BA), fevereiro de 1849 Teatro de Santa Isabel (PE), Marie-Jeanne (TPSM, agosto de 1850, setembro de Maria Joana, Mulher do 1845, drama em cinco atos e 1857, maio de 1861 Povo ou a Pobre Mãe seis quadros), de Adolphe Teatro São Luiz (MA), março de Dennery e Julien de Mallian 1853, agosto de 1862 Teatro Sete de Abril – Pelotas, (RS), setembro de 1860 Le Comte de Saint-Germain Teatro de Santa Isabel (PE), O Conde de São (TVa, 1834, peça em três março de 1858, agosto de 1861 Germano ou o Diabo em atos entremeada de cantos), Teatro Sete de Abril – Pelotas, Paris de Charles Depeuty e Louis- (RS), setembro de 1860 Marie Fontan Roquelaure ou l’Homme le Plus Laid de France (TG, Teatro de Santa Isabel (PE), O Duque de Roquelaure 1836, vaudeville em quatro novembro de 1857 ou o Homem Mais Feio atos), de Adolphe de Teatro Sete de Abril – Pelotas, da França Leuven, Charles de Livry e (RS), setembro de 1860 Léon Lhérie Teatro de São João (BA), setembro de 1848 La Dame de Saint-Tropez Teatro de Santa Isabel (PE), (TPSM, 1844, drama em setembro de 1850, maio de 1858, O Marinheiro de Saint- cinco atos), de Auguste setembro de 1861 Tropez Anicet-Bourgeois e Teatro Thaliense (CE), agosto de Adolphe Dennery 1852 Teatro São Luiz (MA), março de 1853, setembro de 1862 Émery le Négociant (TG, 1842, drama em três atos), Teatro de Santa Isabel (PE), O Negociante Honrado de Boulé, Hippolyte setembro de 1851 Rimbaut e Dupré Le Nouveau Juif Errant (TPR, 1846, comédia em Teatro de Santa Isabel (PE), O Novo Judeu Errante três atos entremeada de abril-maio de 1852 cantos), de Antoine- François Varner Les Deux Serruriers Teatro São Luiz (MA), julho de Os Dois Serralheiros (TPSM, 1841, drama em 1853 cinco atos), de Félix Pyat Nos Intimes! (TVa, 1861, Teatro São Luiz (MA), junho de Os Íntimos comédia em quatro atos), de 1864 Victorien Sardou

Les Six Degrés du Crime Teatro de Santa Isabel (PE), Os Seis Degraus do (TAC, 1831, melodrama em outubro de 1850, julho e Crime três atos), de Théodore novembro de 1861 Nézel e Benjamin Antier Teatro São Luiz (MA), dezembro de 1853 328

Les Sept Infants de Lara (TPSM, 1836, drama em Teatro de São João (BA), Os Sete Infantes de Lara cinco atos), de Félicien novembro de 1848 Mallefille Teatro de São João (BA), com Othello ou le More de João Caetano, junho de 1849 Othelo ou o Mouro de Venise (TRe, 1792, tragédia Teatro de Santa Isabel (PE), Veneza em cinco atos), de Jean janeiro de 1851, abril de 1852 François Ducis Teatro São Luiz (MA), julho de 1853 Teatro de Santa Isabel (PE), L’Outrage (TPSM, 1859, maio de 1861 drama em cinco atos), de Teatro São Luiz (MA), junho de O Ultraje Théodore Barrière e 1864 Édouard Plouvier Teatro Sete de Abril – Pelotas, (RS), junho de 1868 Pierre Landais (TO, 1843, Pedro Landais ou o Teatro de Santa Isabel (PE), drama em cinco atos), de Alfaiate Ministro agosto de 1861 Émile Souvestre Simon le Voleur (TG, 1847, drama em quatro atos), de Teatro São Luiz (MA), Simão o Ladrão Laurencin (pseudônimo de dezembro de 1853 Paul-Aimé Chapelle) Le Vieux Caporal (TPSM, Simão ou o Cabo de 1853, drama em cinco atos), Rio Grande, agosto de 1869 Esquadra de Adolphe Dennery e Dumanoir Teatro de Santa Isabel (PE), Suzanne (TAC, 1854, drama julho de 1861 Suzana em seis atos), de Édouard Teatro São Luiz (MA), outubro Brisebarre e Eugène Nus de 1862 Trente Ans ou la Vie d’un Joueur (TPSM, 1827, Trinta Anos ou a Vida de Teatro de Santa Isabel (PE), melodrama em três um Jogador setembro de 1851 jornadas), de Victor Ducange Un Enfantillage (TPR, Teatro de São Pedro de 1844, comédia em um ato, Uma Rapaziada Alcântara (BA), setembro de entremeada de canto), de 1848 Mélesville e Carmouche * Peça original não identificada.

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Tabela 21 – Repertório Francês de Florindo Joaquim no Rio Grande do Sul (1853-1855)

Tradução Peça original Montagem L’Éclat de Rire (TG, 1840, Teatro D. Pedro II (Porto drama em três atos), de A Gargalhada Alegre), companhia dramática Jacques Arago e Alexandre de João Ferreira Bastos, 1855 Martin La Tour de Nesle (TPSM, Teatro Sete de Abril (Pelotas), 1832, drama em cinco atos e 1854. A peça foi impedida de A Torre de Nesle nove quadros), de subir ao palco pelo delegado de Alexandre Dumas (pai) polícia. Gabrina ou la Chambre du Berceau (TPSM, 1841, Gabrina ou a Coroa Teatro Sete de Abril (Pelotas), drama em três atos), de Paul Ducal de Parma junho de 1854 Henri Foucher e Alboize de Pujol Kean ou Désordre et Génie Teatro Sete de Abril (Pelotas), (TV, 1836, comédia em junho de 1854 Kean ou Desordem e cinco atos entremeada de Teatro D. Pedro II (Porto Gênio cantos), de Alexandre Alegre), companhia dramática Dumas (pai) de João Ferreira Bastos, 1855 Marianne (TAC, 1850, drama em sete atos e um Teatro Sete de Abril (Pelotas), Mariana a Vivandeira prólogo dividido em duas junho de 1854 partes), de Auguste Anicet- Bourgeois e Michel Masson Le Proscrit (TR, 1839, drama em cinco atos), de Teatro Sete de Abril (Pelotas), O Proscrito Frédéric Soulié e Timothée junho de 1854 Dehay Le Sonneur de Saint-Paul Teatro D. Pedro II (Porto (TG, 1838, drama em quatro O Sineiro de São Paulo Alegre), companhia dramática atos e um prólogo), de de João Ferreira Bastos, 1855 Joseph Bouchardy Les Sept Infants de Lara Teatro D. Pedro II (Porto (TPSM, 1836, drama em Os Sete Infantes de Lara Alegre), companhia dramática cinco atos), de Félicien de João Ferreira Bastos, 1855 Mallefille Pierre Landais (TO, 1843, Pedro Landais ou o Teatro Sete de Abril (Pelotas), drama em cinco atos), de Alfaiate Ministro fevereiro de 1853 Émile Souvestre

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Tabela 22 – Repertório Francês de Joaquim Augusto nas Províncias (1849-1868)

Tradução Peça original Montagem Le Massacre des Innocents (TG, 1839, drama bíblico Teatro de São José (SP), A Degolação dos em cinco atos), de Louis- novembro de 1865, fevereiro de Inocentes Marie Fontan e Julien de 1866 Mallian Teatro de São José (SP), A Donzela de Belleville * setembro de 1868 L’Esclave Andréa (TPSM, 1837, drama em cinco atos), Teatro de São Paulo (SP), A Escrava Andréa de Julien de Mallian e novembro de 1854 Alfred Legoyt Mademoiselle de la A Filha do Marquês de Seiglière (CF, 1851, Teatro de São Paulo (SP), la Seiglière comédia em quatro atos), de dezembro de 1862 Jules Sandeau L’Éclat de Rire (TG, 1840, drama em três atos), de Teatro de São José (SP), A Gargalhada Jacques Arago e Alexandre novembro de 1866 Martin La Grâce de Dieu (TG, Teatro de São Paulo (SP), 1841, drama em cinco atos setembro e novembro de 1854 A Graça de Deus entremeado de canto), de Teatro de São José (SP), Adolphe Dennery e Gustave novembro de 1864 Lemoine Teatro de São José (SP), Aimée ou o Assassino * (peça de Adolphe empresa de Eugênia Câmara, por Amor Dennery) outubro de 1868 Arthur ou Seize Ans Aprés (TVa, 1838, drama- Arthur ou Dezesseis Teatro de São Paulo (SP), março vaudeville em dois atos), de Anos Depois de 1855 Charles Depeuty, Louis- Marie Fontan e Davrigy As Recordações da Teatro de São José (SP), outubro * Mocidade de 1866 Les Femmes Terribles Teatro de São José (SP), As Mulheres Terríveis (TVa, 1858, comédia em empresa de Eugênia Câmara, três atos), de Dumanoir maio de 1868 Don César de Bazan (TPSM, 1844, drama em Teatro de São Paulo (SP), março D. César de Bazan cinco atos entremeado de de 1855 canto), de Dumanoir e Adolphe Dennery Jeanne de Flandre (TAC, 1835, drama em quatro Teatro de São Paulo (SP), julho Joana de Flandres atos), de Louis-Marie de 1854 Fontan e Victor Herbin 331

Jean le Cocher (TAC, 1852, drama em cinco atos Teatro de São José (SP), julho de João o Cocheiro procedido de um prólogo 1865 em dois quadros), de Joseph Bouchardy Jocelin le Garde-Côte Teatro de São José (SP), Jocelin ou o Marinheiro (TAC, 1855, drama em dezembro de 1865, janeiro de da Martinica cinco atos), de Narcisse 1866 Fournier e Meyer Kean ou Désordre et Génie (TV, 1836, comédia em Teatro de São José (SP), outubro Kean cinco atos entremeada de de 1865 cantos), de Alexandre Dumas (pai) Marianne (TAC, 1850, Teatro de São Paulo (SP), abril drama em sete atos e um de 1855 Mariana a Vivandeira prólogo dividido em duas Teatro de São José (SP), março partes), de Auguste Anicet- de 1865 Bourgeois e Michel Masson Le Fou par Amour (TG, 1857, drama em cinco atos e Maurício Renaud, o Teatro de São José (SP), sete quadros), de Auguste Louco por Amor fevereiro e maio de 1866 Anicet-Bourgeois e Adolphe Dennery L’Ange de Minuit (TAC, 1861, drama em seis atos), Teatro de São José (SP), O Anjo da Meia-Noite de Théodore Barrière e novembro de 1865 Édouard Plouvier Le Manoir de Montlouvier O Castelo de (TPSM, 1839, drama em Teatro de São Paulo (SP), julho Montlouvier cinco atos), de Joseph de 1855 Rosier Le Fils de la Folle (TR, Teatro de São Paulo (SP), julho O Filho da Louca 1839, drama em cinco atos), de 1855 de Frédéric Soulié O Incendiário de Saint- Teatro de São José (SP), maio de * Paul 1866 La Dame de Saint-Tropez Teatro de São Paulo (SP), agosto (TPSM, 1844, drama em O Marinheiro de Saint- de 1854 cinco atos), de Auguste Tropez Teatro de São José (SP), Anicet-Bourgeois e novembro de 1865 Dennery Émery le Négociant (TG, O Negociante Honrado 1842, drama em três atos), Teatro de São Paulo (SP), maio- ou o Caixeiro Ladrão de Boulé, Hippolyte junho de 1855 Rimbaut e Dupré L’Escamoteur (TG, 1860, drama em cinco atos), de Teatro de São José (SP), janeiro O Pelotiqueiro Adolphe Dennery e Jules de 1865 Brésil 332

Le Pélerin Blanc (TAC, 1801, melodrama em três O Peregrino Branco ou Teatro de São Paulo (SP), abril- atos e de grande os Meninos da Aldeia maio de 1855 espetáculo), de Guilbert de Pixerécourt Le Roman d’un Jeune Homme Pauvre (TVa, 1858, O Romance de um Moço Teatro de São José (SP), comédia em cinco atos e Pobre novembro de 1868 sete quadros), de Octave Feuillet Les Enfants d’Édouard (TF, Teatro de São José (SP), Os Filhos de Eduardo 1833, tragédia em três atos), dezembro de 1865 de Casimir Delavigne Les Nuits de la Seine Os Ratos do Sena ou (TPSM, 1852, melodrama Teatro de São José (SP), agosto- uma Vingança de Vinte em cinco atos e nove setembro de 1866 Anos quadros), de Marc Fournier Les Six Degrés du Crime Os Seis Degraus do (TAC, 1831, melodrama em Teatro de São Paulo (SP), agosto Crime três atos), de Théodore de 1854 Nézel e Benjamin Antier Le Supplice d’une Femme O Suplício de uma (TF, 1865, drama em três Teatro de São José (SP), abril de Mulher atos), de Alexandre Dumas 1866 (filho) e Émile de Girardin Paul Jones ou Paul le Corsaire (1838, drama em Teatro de São José (SP), julho de Paul Jones cinco atos), de Alexandre 1866 Dumas (pai) Pierre Landais (TO, 1843, Pedro Landais ou o Teatro Sete de Abril (Pelotas – drama em cinco atos), de Alfaiate Ministro RS), fevereiro de 1853 Émile Souvestre Teatro de São José (SP), Le Vieux Caporal (TPSM, fevereiro de 1865, setembro- Simão ou o Velho Cabo 1853, drama em cinco atos), novembro de 1868 de Esquadra de Adolphe Dennery e Teatro São Luiz (MA), fevereiro Dumanoir de 1867 Térésa (TOC, 1832, drama Teatro de São João (BA), Teresa em cinco atos), de setembro de 1849 Alexandre Dumas (pai) Trente Ans ou la Vie d’un Teatro de São Paulo (SP), julho Joueur (TPSM, 1827, Trinta Anos ou a Vida de de 1855 melodrama em três um Jogador Teatro de São José (SP), jornadas), de Victor fevereiro de 1865 Ducange * Peça original não identificada.

333

Tabela 23 – Repertório Francês de Dias Braga no Rio de Janeiro (1872-1908)

Tradução Peça original Montagem La Belle Grêlée (TRe, 1895, drama em cinco atos e sete quadros), adaptação de Teatro Santana, dezembro de A Bela Bexigosa Louis Péricaud do romance 1901 homônimo de Alexis Bouvier La Case de l’Oncle Tom (TAC, 1853, drama em oito Teatro Recreio Dramático, abril A Cabana do Pai Tomaz atos), de Adolphe Dennery e de 1884 Dumanoir * (vaudeville de Henry Teatro Recreio Dramático, A Casa de Suzana Kéroul e Albert Barré) agosto de 1907 (ensaiador) Teatro Ginásio, janeiro-fevereiro e abril de 1880 * (peça de Adolphe Teatro São Luiz, abril-maio de A Cruz da Morta Dennery e Auguste Anicet- 1880 Bourgeois) Teatro Lucinda, agosto de 1881 Teatro Recreio Dramático, fevereiro, maio e julho de 1885 La Dame aux Camélias (Tva 1852, drama em cinco A Dama das Camélias Teatro Lucinda, julho de 1886 atos), de Alexandre Dumas (filho) Teatro São Luiz, com Ismênia dos Santos, janeiro de 1877 Teatro Recreio Dramático, junho-julho de 1885, julho de 1887, abril de 1888, julho e Marie-Rose (TG, 1853, agosto de 1902, janeiro e drama em cinco atos), de A Doida de Montemayor setembro de 1904, abril-maio de Auguste Anicet-Bourgeois e 1906, agosto e novembro de Michel Masson 1907 Teatro Variedades, janeiro e março de 1900 Teatro Santana, novembro de 1901 La Famille Benoiton (TVa, Teatro Recreio Dramático, abril- A Família Benoiton 1865, comédia em cinco maio e outubro de 1883 atos), de Victorien Sardou

La Grâce de Dieu (TG, Teatro Recreio Dramático, 1841, drama em cinco atos novembro de 1893, maio e A Graça de Deus entremeado de canto), de novembro-dezembro de 1894 Adolphe Dennery e Gustave Teatro Variedades, fevereiro de Lemoine 1900

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Teatro Ginásio, abril de 1880 Teatro São Luiz, abril-maio e agosto-setembro de 1880 Teatro Recreio Dramático, setembro-outubro de 1885, Aimée ou o Assassino * (peça de Adolphe janeiro de 1886, março e por Amor Dennery) setembro-outubro de 1890, janeiro e outubro de 1891, março e dezembro de 1892, abril de 1894 Teatro Variedades, novembro de 1896 Teatro Recreio Dramático, com Martyre! (TAC, 1886, Ismênia dos Santos, outubro- A Mártir drama em cinco atos), de novembro de 1886, maio-julho Adolphe Dennery de 1887 La Mendiante de Saint- Sulpice (TAC, 1895, drama A Mendiga de São Teatro Variedades, janeiro de em cinco atos e dez Sulpício 1900 quadros), de Xavier de Montépin e Jules Dornay Teatro Ginásio, fevereiro-março La Femme de Claude (TGD, de 1880 A Mulher de Cláudio 1873, drama em três atos), Teatro São Luiz, abril e junho de de Alexandre Dumas (filho) 1880 La Reine Juana (CF, 1893, Teatro Recreio Dramático, junho A Rainha Joana drama em cinco atos), de de 1905 Alexandre Parodi La Voleuse d’Enfants (TAC, A Roubadora de 1865, drama em cinco atos e Teatro Recreio Dramático, Crianças oito quadros), de Eugène janeiro, março e junho de 1887 Grangé e Lambert Thiboust Teatro São Luiz, abril-junho e agosto de 1880 As Duas Filhas ou a Voz * (peça de Xavier de Teatro Recreio Dramático, do Túmulo Montépin) novembro-dezembro de 1884, maio e setembro de 1885 Teatro de São Luiz, janeiro de 1876, janeiro de 1877, maio de 1880 Teatro Ginásio, fevereiro de Les Deux Orphelines 1880 (TPSM, 1874, drama em Teatro Recreio Dramático, abril- As Duas Órfãs cinco atos e oito quadros), maio de 1884, junho-agosto de de Adolphe Dennery e 1885, março e setembro de 1886, Eugène Cormon maio, agosto, outubro-novembro de 1887, janeiro, março e outubro de 1888, março de 1890, janeiro de 1891, agosto de 1903

335

Teatro Lucinda, julho-agosto de Les Deux Orphelines 1886 (TPSM, 1874, drama em Teatro Variedades, fevereiro- As Duas Órfãs (cont.) cinco atos e oito quadros), março de 1900 de Adolphe Dennery e Teatro Santana, outubro de Eugène Cormon 1901, agosto de 1906 Les Ruínes du Château Noir (TB, drama em nove Teatro São Luiz, maio de 1880 As Ruínas do Castelo quadros, sendo um prólogo), Teatro Recreio Dramático, junho Negro de Narcisse Fournier e de 1885, março e maio de 1886 Henri Meyer * (drama de Adolphe A Tomada da Bastilha Teatro Lucinda, julho de 1906 Dennery) Teatro Recreio Dramático, junho La Tosca (TPSM, 1887, de 1902, agosto e dezembro de drama em cinco atos e seis A Tosca 1904 quadros), de Victorien Teatro Lucinda, junho-julho e Sardou setembro de 1906 Le Tour du Monde en 80 Jours (TPSM, 1874, drama A Volta ao Mundo em 80 Teatro de São Pedro de em cinco atos e quinze Dias Alcântara, fevereiro de 1878 quadros), de Adolphe Dennery e Jules Verne La Vie de Bohème (TV, 1849, peça em cinco atos), Teatro Recreio Dramático, Boemia de Théodore Barrière e agosto-setembro de 1902 Henri Murger Teatro Recreio Dramático, março-maio, julho, agosto, outubro e dezembro de 1884, Dalila (Tva, 1857, drama maio, agosto-setembro de 1885, Dalila em três atos), de Octave janeiro, abril-maio de 1886, Feuillet agosto e novembro-dezembro de 1887, janeiro, maio, julho e outubro de 1888, janeiro de 1889, outubro de 1892 Denise (TF, 1885, drama Teatro Recreio Dramático, abril- Dionísia em quatro atos), de maio de 1885 Alexandre Dumas (filho) La Foi, l’Espérance et la Teatro São Luiz, julho de 1880 Fé, Esperança e Charité (TG, 1848, drama Teatro Recreio Dramático, Caridade em cinco atos e seis partes), fevereiro-abril e junho-julho de de Joseph-Bernard Rosier 1886, abril-junho de 1888 Francillon (TF, 1887, peça Teatro Recreio Dramático, maio Francillon em três atos), de Alexandre de 1887 Dumas (filho) Jack l’Éventreur (TCE, 1889, drama em cinco atos e Teatro Santana, outubro de 1901 Jack o Estripador sete quadros), de Gaston Teatro Lucinda, junho de 1906 Marot e Louis Péricaud 336

João o Britador * Teatro Ginásio, março de 1876 Com o título João o Cocheiro: Teatro Ginásio, janeiro de 1880 Teatro São Luiz, abril de 1880 Teatro Recreio Dramático, julho de 1895 Com o título O Fiacre 226: Jean le Cocher (TAC, 1852, Teatro Recreio Dramático, João o Cocheiro / O drama em cinco atos novembro-dezembro de 1884, Fiacre 226 / O Guia da procedido de um prólogo janeiro-fevereiro e maio de 1885 Montanha em dois quadros), de Joseph Com o título O Guia da Bouchardy Montanha: Teatro Recreio Dramático, agosto de 1887, dezembro de 1894 Teatro Variedades, julho de 1895 Teatro Lucinda, maio de 1908 Teatro de São Pedro de Jerusalém Libertada * Alcântara, outubro de 1877 Kean ou Désordre et Génie Teatro Lucinda, agosto de 1881 (TV, 1836, comédia em Teatro Recreio Dramático, Kean cinco atos entremeada de junho-julho e dezembro de 1887, cantos), de Alexandre fevereiro de 1891, janeiro de Dumas (pai) 1907 Lua de Mel ou o Filho Teatro Recreio Dramático, * (vaudeville) Sogro do Pai fevereiro de 1907 Lucrèce Borgia (TPSM, Teatro Recreio Dramático, com Lucrécia Bórgia 1833, drama em três atos e Ismênia dos Santos, setembro de em prosa), de Victor Hugo 1887 Teatro Recreio Dramático, junho Marie-Jeanne (TPSM, de 1886 Maria Joana, Mulher do 1845, drama em cinco atos e Teatro Lucinda, junho e agosto Povo seis quadros), de Adolphe de 1886 Dennery e Julien de Mallian Teatro de Santa Tereza, agosto de 1886 * (peça de Adolphe Teatro São Luiz, junho-julho e Máscaras de Bronze Dennery) setembro de 1880 Teatro das Novidades, janeiro- La Glu (TAC, 1883, drama fevereiro de 1884 Mulher Visgo lírico em cinco atos e seis Teatro Recreio Dramático, quadros), de Jean Richepin março de 1884 Teatro São Luiz, maio-junho de 1880 Teatro Recreio Dramático, L’Ange de Minuit (TAC, dezembro de 1883, junho e 1861, drama em seis atos), O Anjo da Meia-Noite setembro-outubro de 1884, de Théodore Barrière e fevereiro, abril e outubro de Édouard Plouvier 1885, janeiro e julho de 1886, maio de 1887, outubro- dezembro de 1888, maio de 1891 337

Les Enfants du Capitaine Grant (TPSM, 1878, drama- Teatro Recreio Dramático, féerie em cinco atos e O Capitão Grant janeiro de 1890, fevereiro de quinze quadros), de 1902, setembro de 1907 Adolphe Dennery e Jules Verne Teatro Ginásio, fevereiro-março de 1880 Teatro São Luiz, abril-maio e Les Aventures de Mandrin julho de 1880 (TG, 1856, melodrama em Teatro Recreio Dramático, O Castelo do Diabo cinco atos e dez quadros), março-maio de 1884, fevereiro, de Alphonse Arnault e maio e agosto de 1885, fevereiro Louis Judicis de 1886, abril, junho e agosto- setembro de 1887, setembro de 1888 Teatro Santana, novembro- dezembro de 1901 O Comboio Número Seis * Teatro Recreio Dramático, janeiro e julho-agosto de 1902 Teatro Recreio Dramático, outubro-dezembro de 1885, janeiro-março, maio-junho, setembro e novembro de 1886, março-outubro e dezembro de 1887, junho-agosto e novembro- dezembro de 1888, outubro e dezembro de 1889, abril-maio, julho e novembro-dezembro de 1890, janeiro, abril e outubro de 1891, maio, agosto, outubro e dezembro de 1892, julho de Monte-Cristo (partes I e II), 1893, junho de 1894, janeiro, Le Comte de Morcerf e junho e novembro de 1902, Villefort (TH e TAC, 1848- O Conde de Monte- outubro de 1903, agosto e 1851, quatro dramas em Cristo novembro de 1904, fevereiro- cinco atos e 37 quadros,), de março e maio de 1906, fevereiro Alexandre Dumas (pai) e e novembro de 1907, janeiro, Auguste Maquet março e novembro de 1908 Teatro Lucinda, junho-setembro de 1886, junho-agosto e outubro de 1906 Teatro Variedades, janeiro e maio de 1896, janeiro e março de 1897, novembro de 1898, março de 1900 Teatro Santana, outubro de 1901 Teatro João Caetano (Niterói), janeiro de 1905

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Teatro Recreio Dramático, dezembro de 1885, janeiro, * (peça de Adolphe O Domador de Feras março e maio de 1886 Dennery) Teatro Variedades, março de 1900 Le Fils de la Nuit (TPSM, Teatro Recreio Dramático, 1856, drama em três O Filho da Noite dezembro de 1886, janeiro de jornadas e um prólogo), de 1887 Victor Séjour Teatro Lucinda, julho de 1881, Le Fils de Coralie (TGD, agosto de 1886 O Filho de Coralia 1880, comédia em quatro Teatro Recreio Dramático, maio atos), de Albert Delpit de 1884, novembro de 1886 Le Fils Naturel (TGD, O Filho Natural 1858, peça em quatro atos), Teatro São Luiz, junho de 1880 de Alexandre Dumas (filho) Teatro Lucinda, agosto de 1881 Teatro Recreio Dramático, junho O Guia da Montanha * (peça de Paul Féval)13 e agosto de 1885, novembro de 1886, abril de 1887 O Homem do Guarda- * (vaudeville de Teatro Recreio Dramático, Chuva Antony Mars) agosto de 1907 (ensaiador) La Légende de l’Homme sans Tête (TAC, 1857, Teatro Lucinda, maio de 1906 O Homem sem Cabeça drama em cinco atos e doze (ensaiador) quadros), de Édouard Brisebarre e Eugène Nus Le Médecin des Folles (TAC, 1891, drama em Teatro Recreio Dramático, O Médico das Loucas cinco atos), de Xavier de novembro-dezembro de 1907 Montépin Le Maître de Forges (TG, Teatro Recreio Dramático, maio O Mestre de Forjas 1883, comédia em quatro e agosto de 1904 atos), de Georges Ohnet Teatro Recreio Dramático, Le Naufrage de la Méduse outubro-dezembro de 1887, O Naufrágio da Fragata (TAC, 1839, drama em março e maio de 1888, janeiro Medusa cinco atos), de Charles de 1902 Desnoyer Teatro Lucinda, julho de 1906 Le Père de Martial (TGD, Teatro Recreio Dramático, O Pai de Marcial 1883, peça em quatro atos), janeiro de 1885 de Albert Delpit Le Prince Zilah (TGD, Teatro Recreio Dramático, O Príncipe Zilah 1885, drama em cinco atos), março-abril de 1886 de Jules Claretie O Rei das Areias de Teatro de São Pedro de * Ouro Alcântara, novembro de 1877

13 Os anúncios dos espetáculos publicados pela imprensa anunciaram que se tratava de uma peça de autoria de Paul Féval. 339

* (peça de Ferdinand Os Apóstolos do Mal Teatro São Luiz, junho de 1880 Dugué) Les Bourgeois de Pont-Arcy Os Burgueses de (TVa, 1878, comédia em Teatro Lucinda, julho de 1881 Pontarcy cinco atos), de Victorien Sardou Teatro Recreio Dramático, Os Crimes da Parteira * (peça de Léon Jonathan) dezembro de 1886, janeiro de 1887 Teatro São Luiz, setembro de 1880 * (peça de Paul Féval e Os Demônios da Noite Teatro Recreio Dramático, Lambert Thiboust) dezembro de 1888, janeiro- fevereiro de 1889 Les Deux Sergents (TPSM, Teatro Lucinda, julho-agosto de 1823, melodrama em três 1881 Os Dois Sargentos atos de grande espetáculo), Teatro Recreio Dramático, junho de Théodore d’Aubigny e setembro de 1885 Les Misérables (drama), Teatro de São Pedro de adaptação de Charles Hugo Alcântara, julho de 1877 Os Miseráveis do romance homônimo de Teatro Recreio Dramático, Victor Hugo novembro de 1903 Teatro Recreio Dramático, abril- Les Six Degrés du Crime maio de 1886, agosto e outubro Os Seis Degraus do (TAC, 1831, melodrama em de 1888, outubro de 1893, Crime três atos), de Théodore dezembro de 1901, fevereiro de Nézel e Benjamin Antier 1902 Teatro Lucinda, julho de 1886 Le Supplice d’une Femme Teatro Ginásio, março de 1880 O Suplício de uma (TF, 1865, drama em três Teatro Recreio Dramático, Mulher atos), de Alexandre Dumas dezembro de 1886, fevereiro de (filho) e Émile de Girardin 1887 Le Père Lebonnard (TL, Teatro Carlos Gomes (antigo Papa Lebonnard 1889, drama em quatro Teatro Santana), janeiro de 1905 atos), de Jean Aicard Sherlock Holmes (TA, 1907, Sherlock Holmes o peça em cinco atos e seis Teatro Recreio Dramático, Agente de Polícia quatros), de Pierre setembro-outubro de 1908 Decourcelle Un Drame au Fond de la Teatro de São Pedro de Um Drama no Fundo do Mer (TAC, 1884, drama em Alcântara, novembro de 1882 Mar cinco atos e seis quadros), Teatro Recreio Dramático, maio de Ferdinand Dugué de 1883 * Peça original não identificada.