LEITURAS TRANSATLÂNTICAS Diálogos Sobre Identidade E O
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1 FRANK NILTON MARCON LEITURAS TRANSATLÂNTICAS Diálogos sobre identidade e o romance de Pepetela Tese apresentada como requisito à obtenção do grau de Doutor em Antropologia Social. Universidade Federal de Santa Catarina, Programa de Pós- graduação em Antropologia Social. Orientadora Profª. Dra. Ilka Boaventura Leite. FLORIANÓPOLIS 2005 2 LEITURAS TRANSATLÂNTICAS Diálogos sobre identidade e o romance de Pepetela FRANK NILTON MARCON Esta Tese foi julgada e aprovada em sua forma final para a obtenção do título de DOUTOR EM ANTROPOLOGIA SOCIAL. BANCA EXAMINADORA Dra. Ilka Boaventura Leite (Orientadora PPGAS/UFSC) Dr. Omar Ribeiro Thomaz (UNICAMP/CEBRAP) Dra. Rita de Cássia Natal Chaves (USP) Dra. Sônia Maria de Melo Queiroz (UFMG) Dr. Theofilos Rifiotis (PPGAS/UFSC) Dr. Alberto Groisman (PPGAS/UFSC – Suplente) Dra. Miriam Hartung (PPGAS/UFSC – Suplente) Florianópolis, 2005. 3 Para a família Conceição Tomás, minha família em Luanda. (“Nós precisamos de nos sentar debaixo de uma árvore e conversar.”) (Pepetela, 2004) 4 (“Quanto mais uma palavra tem um uso mágico, mais tem uma função móvel: pode-se empregá-la em tudo. Essa palavra é um pouco palavra-maná, palavra- curinga: ela pode ser vazia, é verdade, mas ocupa também, ao mesmo tempo, o maior espaço; e a justificativa da palavra é menos o seu sentido do que o seu lugar, a sua relação com as outras palavras. A palavra só vive em função de seu contexto, e esse contexto deve ser compreendido de maneira ilimitada: é todo o sistema temático e ideológico do escritor, e é também a nossa própria situação de leitor, em toda a sua amplidão e fragilidade.”) (Roland Barthes, 2004, p. 260) 5 Agradecimentos Meu agradecimento especial à Profª. Dra. Ilka Boaventura Leite pela orientação à pesquisa, pelo afeto, pela paciência e credibilidade quanto ao resultado deste trabalho. Ao fomento da CAPES, pelas bolsas de estudo de demanda social, qualificação docente e estágio no exterior. À professora Dra. Clara Carvalho, do ISCTE, de Lisboa, pela acolhida profissional, pelo estímulo intelectual e pelo carinho. Aos professores Ana Mafalda Leite, Carlos Serrano, José Carlos Venâncio, Miguel Vale de Almeida, Omar Ribeiro Thomaz, Raúl Antelo, Rita Chaves, Sônia Maluf, Sônia Queiroz e Theofilos Rifiotis pela abertura ao diálogo e pelas contribuições ao desenvolvimento ou ao resultado final desta Tese. Aos professores, funcionários e colegas do Programa de Pós-graduação em Antropologia Social da UFSC. 6 Ao senhor Soares da Costa, da Edições 70, ao senhor Zeferino Coelho, da Editorial Caminho, ambas de Lisboa, e ao senhor Jacques, da editora Chá de Caxinde, de Luanda, por me receberem para falarmos sobre literatura e suas publicações. A António Tomás, que desde quando nos conhecemos em Lisboa, no ano de 2003, nos tornamos interlocutores e afinamos uma grande e terna amizade. Ao Juju, ao Dadinho, à Noêmia, à dona Fátima, ao seu Andrade e às Aninhas pelo lar em Luanda, pelos dias em Angola, pelo carinho e por todo aprendizado. Ao escritor angolano Henrique Abranches, in memoriam, pelos breves e proveitosos sarais literários. Ao escritor Pepetela pela pronta recepção e pela oportunidade agradável de conversarmos pessoalmente em duas ocasiões tendo por vista a baía de Luanda. Ao Fábio Brüggemann e ao Eduard Marquardt pelas revisões e pelo diálogo e ao Günther Butzen pelo auxílio no abstract. Ao César Lavoura, ao Ferpa e à Nega, pelas contribuições e pelos ouvidos prestados. Aos meus pais, Nilton e Paula, aos meus irmãos, Merolen e Fabrício, e à Martina e à Júlia que sempre contribuem de um jeito especial. À Taís e ao Uaná em tudo, pela cumplicidade, palavra-maná. 7 Sumário Convite à navegação...............................................................................................11 1. Alegoria e retórica...........................................................................................29 2. Narrativas e narradores..................................................................................33 Capítulo Primeiro Iniciando o diálogo, provocando encontros .............................................................48 1.1 As publicações de Pepetela ..........................................................................51 1.2 Literatura e nação..........................................................................................62 1.3 O Brasil como contraponto e diálogo ..........................................................69 Capítulo Segundo A nação narrada nos romances de Pepetela.............................................................78 2.1 Vontade de passado e futuro........................................................................89 2.2 Comunidade de sentimento .........................................................................107 2.3 Histórias da nação.........................................................................................124 Capítulo Terceiro Identidade e retóricas da mistura............................................................................139 3.1 Diálogos sobre “cultura mestiça” e sociedade “crioula” ...........................156 3.2 Encontro, fronteiras e contrapontos.............................................................181 3.3 Mistura e ambivalência.................................................................................197 Considerações finais...............................................................................................215 Bibliografia ..........................................................................................................228 Anexo. Transcrição da entrevista com Pepetela...............................................253 8 Resumo Esta Tese é sobre o encontro com a literatura do escritor Pepetela, de Angola. É um diálogo sobre nação, sobre identidade e diferença. Uma etnografia que chamo de tradução possível da narrativa dos romances, promovendo relações e diálogos intertextuais, considerando minha experiência de leitura e de trânsito entre Brasil, Angola e Portugal. Neste caso, a viagem e a leitura são tomadas como complementares e como metáforas de travessia e de encontro. Contextualizo o percurso da produção literária do escritor nos últimos quarenta anos, provoco discussões que envolvem temas como a relação entre literatura e nação em Angola, penso o Brasil como referência de diálogo nos romances, problematizo a nação sendo narrada como comunidade de sentimento, analiso retóricas de identidade, diferença e ambivalência e realizo uma reflexão mais pontual sobre o que chamo de retóricas da mistura. 9 Abstract This thesis is an encounter with the writing of Pepetela. It is a dialogue of nation, identity, and difference. It is also an ethnography that is a kind of possible translation of narrative, providing relations of intertextuality, taking into account my experience of reading and traveling - these elements are here conceived as complements and metaphor of the encounter. I contextualize the literary production of last 40 years in the author´s life, trigger a discussion involving literature and nation in Angola, think on Brazil as a dialogical reference, address nation as being narrated as community of sentiment, analyze the rhetoric of identities, differences and ambivalence, and, punctually, I focus on what I call rhetoric of mixture. 10 Lista de Abreviaturas ACSHELP - Associação de ciências sociais e humanas em língua portuguesa CEI - Casa dos estudantes do império CPLP - Comunidade dos países de língua portuguesa FNLA - Frente nacional de libertação de Angola FRELIMO - Frente para libertação de Moçambique MPLA - Movimento popular de libertação de Angola PALOP - Países africanos de língua oficial portuguesa UNITA - União nacional para a independência total de Angola UPA - União dos povos africanos 11 Convite à navegação Teve uma visão de Aníbal nadando para mar alto, sempre a direito, caminho do Brasil, sem forças nem vontade de lutar contra a corrente que a sugava. (A geração da utopia) Quando surgiu a idéia desta tese, eu tinha algumas intuições sobre as possibilidades de um olhar crítico para o mito da harmoniosa mestiçagem racial e cultural fabulada como argumento de singularidade nacional no pensamento ensaístico do Brasil.1 A intenção inicial, mesmo que incipiente, era olhar para as narrativas literárias de outros países do antigo mundo colonial português na África (Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e 1 Com a obra de Gilberto Freyre, a partir de Casa grande e senzala (1996), publicado pela primeira vez em 1933, a mestiçagem passou a ser sinônimo da especificidade nacional no Brasil. O principal argumento é que no país a “mestiçagem” ocorrera tanto racial como culturalmente e se manifestara nas características físicas e na mistura dos costumes - a culinária, as danças, a moral, a religiosidade. A obra de Freyre passou a ser reconhecida nacional e internacionalmente como síntese da formação histórico-social da “cultura brasileira”, sistematizando, assim, um “mito nacional”, o da harmoniosa miscigenação, que é considerado por vários estudiosos um dos mitos da invenção da identidade da nação brasileira. Nos últimos anos saíram muitos estudos críticos sobre a mestiçagem como mito no Brasil. Lília Schwarcz (1999) diz que “no sentido em que os antropólogos empregam o termo, é um conjunto de idéias e valores poderosos que fazem com que o Brasil seja o Brasil” (p. 309). E continua a autora, dizendo que “quem sabe no Brasil o mito tenha virado história e a história, realidade, ou, melhor, a história não passe de uma boa metáfora” (SCHWARCZ, 1999, p. 309).