Ficha técnica IMOPOLIS, Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário, S.A. Mário Cravo Júnior Poeta António Ramos Rosa Moisés Preto Paulo JOÃO MAIA DOS SANTOS Pedro Cabrita Reis PROJETO GERAL Poeta Jorge de Sena Pedro Campos Rosado GABINETE DE ARQUITECTURA PAISAGISTA MOTA ENGIL, SGPS, S.A. Rui Matos Francisco Manuel Caldeira Cabral Poeta José Gomes Ferreira Susana Piteira Elsa Maria De Matos Severino PAPELACO, Sociedade de Representações de Papel e Máquinas de Zulmiro de Carvalho Escritório, S.A. Poeta Eugénio de Andrade CONSTRUÇÃO DA 1ª FASE DE OBRA PIMENTA E RENDEIRO, Urbanizações e Construções, S.A. ARTÍFICES CONSÓRCIO - ACORIL / CME Poetisa Florbela Espanca Aurimármores SANEST, Saneamento da Costa do Estoril, S.A. Centro Internacional De Escultura CONSTRUÇÃO DA 2ª FASE DE OBRA Poeta Alexandre Herculano Domingos Avelino Baleia CONSÓRCIO - EDIFER / ARTEMISIA SECURITAS, Serviços e Tecnologias de Segurança, S.A. Gárgula Gótica Poeta Francisco Rodrigues Lobo Infortipo TEMPLO DA POESIA SETH, Sociedade de Empreitadas e trabalhos Hidráulicos, Lda. Mármores Pardal INTERGAUP Poeta Cesário Verde Metalúrgica Coelhos SILCOGE, Sociedade Construtora de Obras Gerais, S.A. Metalúrgica Godinho Poeta Almeida Garrett Metalúrgica Lage ENTIDADES CONSULTADAS PARA DEFINIÇÃO DOS POETAS e Poetisa Natália Correia Socometal / Soares da Costa SOCIEDADE PORTUGUESA DE AUTORES SUC, S.A. – LUIS AGUIAR DE MATOS FACULDADE DE LETRAS DE COIMBRA Poeta Guerra Junqueiro FACULDADE DE LETRAS DO PORTO TECNOVIA, Sociedade de Empreiteiros, S.A. FACULDADE DE LETRAS DE LISBOA Poeta José Régio INTERVENIENTES DA CMO BIBLIOTECA NACIONAL TEIXEIRA DUARTE GABINETE DE COORDENAÇÃO E DIREÇÃO DO PP ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE ESCRITORES Poeta António Gedeão DECPC UNIVERSIDADE NOVA DE LISBOA TOMÁS DE OLIVEIRA, S.A. DOM Poeta Gil Vicente EMBAIXADAS E OU CASAS DE CULTURA UNITED BISCUITS IBÉRICA, Lda. COORDENAÇÃO DOS PAÍSES OU TERRITÓRIOS DE EXPRESSÃO OU CULTURA PORTU- Poeta Antero de Quental GABINETE DE COORDENAÇÃO E DIREÇÃO DO PP GUESA VILA FONTE, Exploração de Centros Comerciais, S.A. Gisela Duarte (com especial agradecimento ao escritor Orlando da Costa) Poetisa Sofia de Mello Breyner Andersen EDIÇÃO MUNICÍPIO DE OEIRAS © ENTIDADES CONSULTADAS PARA DEFINIÇÃO DOS ESCULTORES ESCULTORES GABINETE DE COMUNICAÇÃO ACADEMIA NACIONAL DE BELAS ARTES Álvaro Carneiro Elisabete Brigadeiro SOCIEDADE NACIONAL DE BELAS ARTES Álvaro Raposo de França PRODUÇÃO ASSOCIAÇÃO INTERNACIONAL DE CRÍTICOS DE ARTE António Matos Paulo Lourenço e Nuno Martins FACULDADE DE BELAS ARTES DE LISBOA António Vidigal DESIGN FACULDADE DE BELAS ARTES DO PORTO Armindo Alípio Pinto Rosa Duarte Pascoal EMBAIXADAS E ASSOCIAÇÕES CULTURAIS Carlos Marreiros CONTEÚDOS (com agradecimento ao SBAFCG e em especial ao professor Manuel Clara Menéres Sónia Correia Costa Cabral) Cristina Ataíde FOTOGRAFIA Dódo das Máscaras Carmo Montanha e Carlos Santos Fernando Conduto IMPRESSÃO MECENAS DAS ESCULTURAS Flávio Miranda SIG - Sociedade Industrial Gráfica, LDA ACORIL, Empreiteiros, S.A. Francisco Brennand TIRAGEM Poeta Camilo Pessanha Francisco Menezes 1000 exemplares AKELLER , Investimentos Imobiliários, Lda. Francisco Simões julho 2015 Poeta Miguel Torga Graça Costa Cabral ALCIR, Empreendimentos Imobiliários, S.A. Gustavo Bastos Poeta Alexandre O´Nell Hélder Coelho Batista ALRISA, Sociedade Imobiliária, S.A. Irene Vilar Poeta João de Deus João Antero BANCO ESPÍRITO SANTO, S.A. João Cutileiro Poetas Teixeira de Pascoais João Jorge Duarte e Vitorino Nemésio João Oom BCP, S.A. José Aurélio Poetisa Marquesa de Alorna José João Brito CONSISTE, Consultadoria, Serviços e Comércio de Equipamentos de José Rodrigues Informática, S.A. Lagoa Henriques Poeta Mário de Sá Carneiro Laranjeira Santos IGLOOLÁ, Distribuição de Gelados e Ultracongelados, Lda. Leão Lopes Poeta Fernando Pessoa Luísa Perienes

Pense. Qual é a melhor parte de um sonho? Deixar-se transportar para dentro de uma fantasia. Vivê-la como se fosse real. É essa a melhor parte de um sonho? Acordar, tomar consciência. Foi só um sonho. Decidir. Planear. Concretizar. É essa a melhor parte de um sonho?

O Parque dos Poetas é, na essência, o resultado de um sonho. Desde logo, o sonho de ver nascer, em Oeiras, um grande parque urbano. Um parque de lazer, de desporto e de cultura. O que começou por ser uma Alameda dos Poetas, onde estariam representados os vinte poetas portugueses mais relevantes, transformou- se num parque. Os poetas do século XX transformam-se na poesia, na língua portuguesa, em Portugal e no Mundo. Agora já não é um sonho. Já não é só um sonho. Já não é de um apenas. É de muitos. É de todos. A 18 de julho, despertamos para a concretização do sonho. A última fase do parque, 27 esculturas, os poetas do Barroco ao Romântico e os de países de expressão portuguesa. A peça que faltava. O Parque dos Poetas é o sonho tornado realidade. O Templo da Poesia. Uma das mais encantadoras imagens sobre a foz do Tejo e o Atlântico. Um convite à reflexão, à busca interior, à expressão mais profunda dos sentimentos. À evocação das fantasias e à realização dos sonhos.

No dia 18 de julho, vamos cumprir o sonho.

Paulo Vistas O Presidente da Câmara O Projecto

Numa área de 22,5 ha, entre os núcleos urbanos de Paço de Arcos e Oeiras, Poesia, o equipamento mais emblemático do Parque e os Espaços Temáticos resultante de uma política municipal de qualificação do território em termos dos 17 Poetas do Barroco ao Romântico e ainda os 10 alusivos aos países e ambientais, urbanísticos e sócio culturais, surge o Parque dos Poetas, um territórios de expressão portuguesa. espaço de grande qualidade paisagística, onde podem desenvolver-se atividades de lazer, cultura e desporto. Através da Praça do Túnel, cruzando a Rua S. Salvador da Baía, estende-se a zona mais a norte, que pela Alameda dos Poetas nos leva até à Praça da Água, Trata-se de um espaço estruturante, que em Oeiras integra a criação de uma junto à fonte e onde estão presentes as esculturas dos 20 maiores poetas do nova centralidade urbana, tornada uma das àreas mais nobres do Concelho e século XX. que permite a valorização das zonas residenciais e o desfrutar de um espaço cultural e recreativo de grande qualidade de vida urbana e ambiental. Aqui, o Anfiteatro, o Bosque da Poesia, o Parque das Merendas, mais uma Fonte Cibernética e a Zona Infantil, são um convite ao lazer, à tranquilidade, à Mas mais de que um parque urbano em Oeiras, o Parque dos Poetas, é um reflexão e à criatividade, que com a zona desportiva perfazem a intenção de espaço onde a história da poesia da língua portuguesa é de uma forma única, tornar o Parque dos Poetas num espaço diversificado, mas único no seu todo. contada pelas artes da escultura e dos jardins. Escultores Parte da ideia de homenagear a poesia portuguesa, representada através 23. Álvaro Carneiro dos 60 poetas e/ou sua obra, mais representativos, desde a fundação da 25. Álvaro Raposo de França nacionalidade até ao século XX, incluindo os países e territórios de expressão 15. António Matos portuguesa. 4. António Vidigal 13. Armindo Alípio Pinto É ao longo da Alameda dos Poetas que, através da visão dos 40 mais 37. Carlos Marreiros significativos escultores do nosso tempo do espaço lusófono, a Poesia 18. Clara Menéres 14. Cristina Ataíde em Português está indelevelmente representada pelas diversas correntes r u 35. Dódo das Máscaras a estéticas da expressão escultórica C o 27. Fernando Conduto s t Por isso o Parque é o primeiro “museu de ar livre” em Portugal e único e maior a 38. Flávio Miranda P in 1/2 repositório da arte pública contemporânea. t 32. Francisco Brennand o 8 40. Francisco Menezes A construção do Parque, correspondente a um investimento global de cerca 5 41 a 60 e 9. Francisco Simões 14 1 3 de 40 milhões de Euros, que dada a sua dimensão, foi faseada, ficando 1. Graça Costa Cabral 2 4 10 concluída a 1ª fase, em Junho de 2003 e a última em Julho de 2015. 10. Gustavo Bastos 9 14 6

17. Hélder Coelho Batista 9 5 De entre os vários percursos e fruição que o Parque proporciona, o da Poesia 8. Irene Vilar inicia-se a sul, junto ao viaduto do Espargal, onde ao longo da Alameda 19. João Antero 15 dos Poetas, ramificada pelos espaços representativos dos Trovadores aos 20. João Cutileiro 29. João Jorge Duarte 26. Luísa Perienes renascentistas, em número de 13, iniciados por D. Dinis, passando pela Ilha 11. João Oom 31. Mário Cravo Júnior dos Amores e o Lago de Camões, onde uma fonte cibernética proporciona 3. José Aurélio 24. Moisés Preto Paulo espetáculos de movimento, luz, cor e música, corolário da memória da água 7. José João Brito 21. Pedro Cabrita Reis através do percurso de um riacho iniciado na velha mãe de água. 6. José Rodrigues 16. Pedro Campos Rosado 5. Lagoa Henriques 2. Rui Matos Atravessando a Rua Carlos Vieira Ramos, por entre a Alameda, o pequeno 30. Laranjeira Santos 12. Susana Piteira Anfiteatro, as Zonas de Estar e o Miradouro, encontramos o Templo da 36. Leão Lopes 22. Zulmiro de Carvalho 17

Localizações Principais 17

1. Acessos principais 2. Acesso mobilidade reduzida 17 3. Anfiteatro 6 15 ru a 4. Anfiteatro Almeida Garrett C o ro 5. Alameda dos Poetas S a n 6. Campo de futebol to A m 7. Estacionamento coberto a ro 8. Fontes cibernéticas 8 d e O e 9. Gruta de Camões i ra 10. Ilha dos Amores s 60 11. Labirinto 8 56 57 12. Mãe de água aía rua S. Salvador da B 55 1/2 59 13. Quiosque 17 49 50 14. Riacho e lago 51 2 43 5 15. Sanitários 42 54 58 16. Templo da Poesia 24 25 27 44 28 53 29 17. Zonas de estacionamento 26 5 48 52 18. Zonas infantis 23 1/2 22 47 30 41 46 17 16 1/2 45 15 ru 15 a S . S 20 ru alv 11 37 a a

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13 Trovadores (séc. XII) aos Poetas da Renascença (séc. XVII) 17 Poetas do Barroco (Séc. XVIII) aos Poetas do Romântico (Séc. XIX) 10 Poetas dos países ou territórios de expressão ou cultura portuguesa 20 Poetas do século XX jardim D.DINIS (1261 / 1325) 1

__ Ai flores, ai flores do verde pino, Se sabedes novas do meu amigo, se sabedes novas do meu amigo! aquel que mentiu do que pôs comigo! Ai Deus, e u é? Ai Deus, e u é?

__ Ai flores, ai flores do verde ramo, Se sabedes novas do meu amado, se sabedes novas do meu amado! aquel que mentiu do qui mi á jurado! Ai Deus, e u é? Ai Deus, e u é?

(…) Trovadores (séc. XII) aos Poetas da Renascença (séc. XVII)

jardim D.DINIS (1261 / 1325) João Roiz de Castel-Branco (meados do séc.XV /1515) 2

Cantiga, partindo-se Partem tão tristes os tristes Tão tristes, tão saudosos tão fora d’esperar bem, tão doentes da partida, que nunca tão tristes vistes Senhora, partem tão tristes tão cansados, tão chorosos, outros nenhuns por ninguém. meus olhos por vós, meu bem, da morte mais desejosos que nunca tão tristes vistes cem mil vezes que da vida. outros nenhuns por ninguém. jardim 3 Gil Vicente (1465 / 1537)

Auto (de moralidade) da Senhores, que trabalhais Barca do inferno pela vida transitória, memória, por Deus, memória ... deste temeroso cais! À barca, à barca, mortais! À barca, à barca segura! Porém, na vida perdida Guardar da barca perdida! se perde a barca da vida. à barca, à barca da vida! ... 4jardim Gil Vicente (1465 / 1537) Garcia de Resende (1470 / 1536)

Trovas à morte de D. Inês de Castro e morte tão sem razão? ... Triste de mim, inocente, Qual será o coração que, por ter muito fervente tão cru e sem piedade, lealdade, fé, amor que lhe não cause paixão ao príncipe, meu senhor, uma tão grã crueldade me mataram cruamente! ... jardim 5 Bernardim Ribeiro (1480 / 1552)

Écloga Ii pela ribeira do Tejo, Dizem que havia um pastor seu pai acerca morava antre Tejo e Odiana, e o pastor de Alentejo que era perdido de amor era, e Jano se chamava. per da moça Joana. Joana patas guardava ... jardim Bernardim Ribeiro (1480 / 1552) Sá de Miranda 6 (1481 / 1558)

Trova à maneira antiga Antes que esta assim crescesse; Agora já fugiria Comigo me desavim, De mim, se de mim pudesse. Sou posto em todo o perigo; Que meio espero ou que fim Não posso viver comigo Do vão trabalho que sigo, Nem posso fugir de mim. Pois que trago a mim comigo, Com dor da gente fugia, Tamanho imigo de mim? jardim Cristóvão Falcão (1512 / 1557) 7

Crisfal

houve um pastor e pastora, Entre Sintra, a mui prezada, que com tanto amor se amaram e serra de Ribatejo como males lhe causaram que Arrábida é chamada, este bem, que nunca fora, perto donde o rio Tejo pois foi o que não cuidaram. se mete na água salgada, ... Cristóvão Falcão (1512 / 1557)

jardim Diogo Bernardes (1530 / 1605) 8

Meu pátrio Lima, saudoso e brando, Se tu, que livre vás, vás murmurando, Como não sentirá quem Amor sente, Que farei eu, cativo, estando ausente? Que partes deste vale descontente, Onde descansarei de dor presente, Donde também me parte suspirando? Que tu descansarás no mar entrando?

... jardim Luís de Camões (1524 / 1580) 9

Amor é um fogo que arde sem se ver; É querer estar preso por vontade; É ferida que dói e não se sente; É servir a quem vence, o vencedor; É um contentamento descontente; É ter com quem nos mata lealdade. É dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer; Mas como causar pode seu favor É um andar solitário por entre a gente; Nos corações humanos amizade, É nunca contentar-se de contente; Se tão contrário a si é o mesmo Amor? É um cuidar que ganha em se perder. jardim

António Ferreira (1528 / 1569) 10 Luís de Camões (1524 / 1580)

A Castro Acto IV Contra quem vens armado de crueza. Aqui me tens. Bastava teu mandado Inês e o Rei Pera eu segura, e livre t’esperar, Em ti, e em minh’innocencia confiada. …….Meu Senhor, Escusarás, Senhor, todo este estrondo Esta he a mãy de teus netos. D’armas, e Cavaleiros; que não foge. Estes são Filhos daquelle filho, que tanto amas. Nem se teme a innocencia, da justiça. Esta he aquella coitada molher fraca, ……………….. jardim Francisco Rodrigues Lobo (1575 / 1621) 11

Fermoso Tejo meu, quão diferente A ti foi-te trocando a grossa enchente Já que somos no mal participantes, Te vejo e vi, me vês agora e viste: A quem teu largo campo não resiste; Sejamo-lo no bem. Oh! quem me dera Turvo te vejo a ti, tu a mim triste, A mim trocou-me a vista em que consiste Que fôramos em tudo semelhantes! Claro te vi eu já, tu a mim contente. O meu viver contente ou descontente. ……………………… jardim Sóror Violante do Céu (1601ou 1602 / 1693) 12

… Considera que em terra convertida Jaz aqui a beleza mais louvada, Considera que a morte rigorosa Admite deste túmulo o aviso E que tudo o da vida é pó, é nada, Não respeita beleza nem juízo E vive do teu fim mais cuidadosa, E que menos que nada a tua vida. E que, sendo tão certa, é duvidosa. Pois sabes que o teu fim é tão preciso. jardim Frei Jerónimo Baía (1620 / 1688) 13

Falando com Deus

Só vos conhece, amor, quem se conhece; Quem tudo por vós perde, tudo ganha, Só vos entende bem quem bem se entende; Pois tudo quanto há, tudo em vós cabe. Só quem se ofende a si, não vos ofende, Ditoso quem no vosso amor se inflama, E só vos pode amar quem se aborrece. Pois faz troca tão alta e tão estranha. Só quem se mortifica em vós floresce; Mas só vos pode amar o que vos sabe, Só é Senhor de si quem se vos rende; Só vos pode saber o que vos ama. Só sabe pretender quem vos pretende, E só sobe por vós quem por vós desce. Poetas do Barroco (Séc. XVIII) aos Poetas do Romântico (Séc. XIX)

Frei Jerónimo Baía (1620 / 1688) jardim Correia Garção (1724 / 1771 ou 1772) 14

Comigo minha Mãe brincando um dia Em poucas horas aprendi a amá-la. a namorar c’os olhos me ensinava, Ditoso se tal arte não soubera: mas Amor que em seus olhos me esperava não me custara a vida não lográ-la. com mil brilhantes farpas me feria.

De quando em quando mais formosa ria Certo que aprender menos melhor era porque incapaz do ensino me julgava. pois não soubera agora desejá-la Porém tanto a lição me aproveitava nem de tão louco amor enlouquecê-la. que suspirar por ela já sabia. jardim15 Filinto Elísio (1734 / 1819)

Soneto Ronquem roucos trovões, rasguem-se os ares, rebente o mar em vão n’ocos rochedos, Nubla as estrelas, céu, que esta amargura solte-se o céu em grossas lanças de água. Estende o manto, estende, ó noite escura, em que se agora ceva o meu cuidado, enluta de horror feio o alegre prado; gostará de ver tudo assim trajado Consolar-me só podem já pesares; molda-o bem c’o pesar dum desgraçado, da negra cor da minha desventura. quero nutrir-me de arriscados medos, a quem as feições lembram da ventura. quero saciar de mágoa a minha mágoa! jardim 16 Nicolau Tolentino (1740 / 1811)

O Colchão dentro do toucado

Chaves na mão, melena desgrenhada, “Tu respondes assim? Tu zombas disto? Batendo o pé na casa, a Mãe ordena Tu cuidas que, por ter pai embarcado, Que o furtado colchão, fofo e de pena, Já a Mãe não tem mãos?” E dizendo isto, A filha o ponha ali ou a criada.

A filha, moça esbelta e aperaltada Arremete-lhe à cara e ao penteado. Lhe diz co’a voz que o ar serena: Eis senão quando (caso nunca visto) “Sumiu-se-lhe um colchão, é forte pena! Sai-lhe o colchão de dentro do toucado. Olhe não fique a casa arruinada...” jardim José Anastácio da Cunha (1744 / 1787) 17

O Abraço Ó meu, ó meu amor, aonde fugiste, «Alta rocha, sustém-me, que esmoreço! Onde estou eu agora e onde estava?... De amor não sei se estou para expirar... A alma começa a conhecer que existe Como me anseia!... Enquanto não faleço, Que até agora sabia só que amava. Com a noite quero aqui desabafar. ... jardim

Marquesa de Alorna (1750 / 1839) 18

Se me aparto de ti, Deus de bondade, À suave esperança me entregaste, Que ausência tão cruel! Como é possível E o preço de teu sangue precioso Que me leve a um abismo tão terrível Me afiança que não me abandonaste. O pendor infeliz da humanidade!

Conforta-me, Senhor, que esta saudade Se, justo, castigar-me te é forçoso, Me despedaça o coração sensível; Lembra-te que te amei, e me criaste Se a teus olhos na cruz sou desprezível, Para habitar contigo o Céu lustroso Não olhes para a minha iniquidade! jardim19

Manuel Maria Barbosa du Bocage (1765 / 1805)

Redondilhas Eu me arrependo; a língua quase fria Brade em alto pregão à mocidade, Já Bocage não sou!... À cova escura Conheço agora já quão vã figura Que atrás do som fantástico corria: Meu astro vai parar desfeito em vento... Em prosa e verso fez louco intento; Eu aos Céus ultrajei! O meu tormento Musa!... Tivera algum merecimento Outro Aretino fui... A santidade Leve me torne sempre a terra dura: Se um raio da razão seguisse pura! Manchei!... Oh! Se me creste, gente ímpia, Rasga meus versos, crê na eternidade! jardim Almeida Garrett (1799 / 1854) 20

Manuel Maria Barbosa du Bocage (1765 / 1805) Barca Bela Pescador da barca bela, Deita o lanço com cautela, Inda é tempo, foge dela, Pescador da barca bela, Que a sereia canta bela... Foge dela Onde vais pescar com ela, Mas cautela, Oh pescador! Que é tão bela, Oh pescador! Oh pescador? Não se enrede a rede nela, Não vês que a última estrela Que perdido é remo e vela No céu nublado se vela? Só de vê-la, Colhe a vela, Oh pescador. Oh pescador! jardim António Feliciano de Castilho (1800 / 1875) 21

Os treze anos (Cantilena)

Já tenho treze anos, Já sou mulherzinha; Já não sou Anita, que os fiz por Janeiro; Já trago sombreiro; como era primeiro, madrinha, casai-me já bailo ao Domingo, sou a senhora Ana, com Pedro Gaiteiro. co’as mais no terreiro. que mora no oiteiro. jardim Alexandre Herculano (1810 / 1877) 22

Arrábida

I Qual ao freixo robusto a frágil hera, Salve, oh vale do sul, saudoso e belo! E a romagem do túmulo cumprindo, Salve, oh pátria da paz, deserto santo, Só conhecer, ao despertar na morte, Onde não ruge a grande voz das turbas! Essa vida sem mal, sem dor, sem termo, Solo sagrado a Deus, pudesse ao mundo Que íntima voz contínuo nos promete O poeta fugir, cingir-se ao ermo, No trânsito chamado o viver do homem. jardim Soares dos Passos (1826 / 1860) 23

Canção

(...) Que sons, que folguedos! Parece aos rochedos E a fonte murmura Dizer mil segredos Por entre a verdura, D’infindo prazer. E ao longe d’altura Lá desce a gemer: (...) 24jardim João de Deus (1830 / 1896)

(...) Uma após outra lançou, A vida é flor na corrente, A vida - pena caída A vida é sopro suave, Da asa de ave ferida- A vida é estrela cadente, De vale em vale impelida Voa mais leve que a ave; A vida o vento a levou! Nuvem que o vento nos ares, Onda que o vento nos mares, (...) jardim 25 Antero de Quental (1842 / 1891)

O Palácio da Ventura Mas já desmaio, exausto e vacilante, Quebrada a espada já, rota a armadura... Sonho que sou um cavaleiro andante. E eis que súbito o avisto, fulgurante Por desertos, por sóis, por noite escura, Na sua pompa e aérea formosura! Paladino do amor, busco anelante O palácio encantado da Ventura! (…) jardim Gomes Leal (1848 / 1921) 26

O visionário ou som e cor

1 Sobre o mundo onde estou encontro-me isolado, E obedecendo ainda a meus velhos amores, e erro como estrangeiro ou homem doutras eras, procuro em toda a parte a música das cores, Eu tenho ouvido as sinfonias das plantas. talvez por um contrato irónico lavrado - e nas tintas da flor achei a Melodia. que fiz e já não sei noutras subtis esferas. Eu sou um visionário, um sábio apedrejado, passo a vida a fazer e a desfazer quimeras, A espada da Teoria, o austero Pensamento, enquanto o mar produz o monstro azulejado não mataram em mim o antigo sentimento, e Deus, em cima, faz as verdes primaveras. embriagam-me o Sol e os cânticos do dia... jardim Guerra Junqueiro (1850 / 1923) 27

Canção de batalha

(....) Acendei a fornalha enorme - a Inspiração. Dai-lhe lenha, - a Verdade, a Justiça, o Direito Entra-nos pelo peito em borbotões joviais E harmonia e pureza, e febre e indignação; Este sangue de luz que a madrugada entorna! E p’ra que a lavareda irrompa, abri o peito Poetas, que somos nós? Ferreiros d’arsenais; E atirai ao braseiro, ardendo, o coração! É bater, é bater com alma na bigorna As estrofes de bronze, as lanças e os punhais! (...) jardim Cesário Verde (1855 / 1886) 29

Ave - Marias O céu parece baixo e de neblina, o gás extravasado enjoa-me, perturba; Nas nossas ruas, ao anoitecer, E os edifícios, com as chaminés, e a turba, Há tal soturnidade, há tal melancolia. Toldam-se duma cor monótona e londrina. Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia despertam-me um desejo absurdo de sofrer. (...) jardim António Nobre (1867 / 1900) 30

E a Vida foi, e é assim, e não melhora. Toda a dor pode suportar-se, toda! Esforço inútil. Tudo é ilusão. Mesmo a da noiva morta em plena boda, Quantos não cismam nisso mesmo a esta hora Que por mortalha leva... essa que traz. Com uma taça, ou um punhal na mão! Mas uma não: é a dor do pensamento! Mas a Arte, o Lar, um filho, António? Embora! Ai quem me dera entrar nesse convento Quimeras, sonhos, bolas de sabão. Que há além da Morte e que se chama A Paz! E a tortura do Além e quem lá mora! Isso é talvez, minha única aflição. Labirinto Poetas dos países ou territórios de expressão ou cultura portuguesa

jardim31

Carlos Drumond de Andrade - Brasil (1902 / 1987)

No meio do caminho Nunca esquecerei desse acontecimento na vida de minhas retinas tão fatigadas. No meio do caminho tinha uma pedra Nunca esquecerei que no meio do caminho tinha uma pedra no meio do caminho tinha uma pedra tinha uma pedra tinha uma pedra no meio do caminho no meio do caminho tinha uma pedra. no meio do caminho tinha uma pedra. 32jardim

Manuel Bandeira - Brasil Carlos Drumond de Andrade - Brasil (1902 / 1987) (1886 / 1968)

Entre estas Índias de leste Quantas frias latitudes! Púbis a não poder mais E as Índias ocidentais Ilhas que a tormenta arrasa Altos como a estrela d’alva Meus Deus que distância enorme Que os terremotos subvertem Longínquos como Oceanias Quantos Oceanos Pacíficos Desoladas Marambaias - Brancas, sobrenaturais - Quantos bancos de corais Sirtes sereias Medéias Oh inacessíveis praias!... jardim33 José Craveirinha - Moçambique (1922 / 2003)

Um homem nunca chora

Acreditava naquela história Na adolescência Agora tremo. do homem que nunca chora. meus filmes de aventuras E agora choro. punham-me muito longe de ser cobarde Eu julgava-me um homem. na arrogante criancice do herói de ferro. Como um homem treme. Como chora um homem! 34jardim Alda Lara - Angola (1930 / 1962)

Prelúdio

Só duas lágrimas grossas, Pela estrada desce a noite em duas faces cansadas. Mãe-Negra, desce com ela... Mãe-Negra tem voz de vento, Nem buganvílias vermelhas, voz de silêncio batendo nem vestidinhos de folhos, nas folhas do cajueiro... nem brincadeiras de guizos, nas suas mãos apertadas. (…) jardim Vasco Cabral - Guiné / Bissau 35 (1926 / 2005)

O último adeus dum combatente Ao despedir-me eu trouxe a dor que tu levaste! Nem só teu amor me traz a felicidade. Naquela tarde em que eu parti e tu ficaste Quando parti foi por amar a Humanidade. sentimos, fundo, os dois a mágoa da saudade. Sim! Foi por isso que eu parti e tu ficaste! Por ver-te as lágrimas sangraram de verdade sofri na alma um amargor quando choraste. (...) 36jardim Jorge Barbosa - Cabo Verde (1902 / 1971)

Poema do mar desgastando as rochas das nossas Ilhas! nas fitas de cinema Deixando o esmalte do seu salitre nas faces dos pescadores, e nesse ar de outros climas que trazem os passageiros O drama do Mar, roncando nas areias das nossas praias, quando desembarcam para ver a pobreza da terra! o desassossego do Mar, batendo a sua voz de encontro aos montes, sempre baloiçando os barquinhos de pau que vão por estas costas... O Mar! sempre a esperança na carta de longe dentro de nós! O Mar! que talvez não chegue mais!... pondo rezas nos lábios, O Mar! deixando nos olhos dos que ficaram (...) cercando a nostalgia resignada de países distantes prendendo as nossas Ilhas, que chegam até nós nas estampas das ilustrações jardim José dos Santos Ferreira ou Adé – Macau (1919 / 1993) 37

Poema de Macau

Tu, Macau, de passado alegre e triste, Se estás em sossego, há tranquilidade, Fazes lembrar o céu quando varia de cor: Todos gozam, riem às gargalhadas... Dias em que o Sol brilha com graça, Vem a lestada, fustiga a ventania, Horas em que nuvens escuras retratam dor. Uns ficam a chorar, outros se põem a fugir! jardim 38

José dos Santos Ferreira ou Adé – Macau (1919 / 1993) Fernando Sylvan - Timor (1917 / 1993)

MENINAS E MENINOS Todos já vimos! Todos já vimos E então? Todos já vimos nos livros, nos jornais, no cinema e na televisão nos livros, nos jornais, no cinema e na televisão retratos de cadáveres de meninos e meninas retratos de meninas e meninos que morreram a defender a liberdade de armas na a defender a liberdade de armas na mão. mão. jardim 39 Alda do Espírito Santo - São Tomé e Príncipe (1926 / 2010)

Para lá da praia

os ventres inchados da praia morena Baía morena da nossa terra da minha infância, gemendo na areia vem beijar os pezinhos agrestes sonhos meus, ardentes da Praia Gamboa. das nossas praias sedentas, da minha gente pequena e canta, baía minha lançada na areia (...) 40jardim Alda do Espírito Santo - São Tomé e Príncipe (1926 / 2010) Adeodato Barreto - Goa (1905 / 1937)

As azinheiras aprestam, em sorrisos, seu toucado e vão erguendo ao céu os galhos novos. a quem as vê por dentro já pressente São como eu aquelas azinheiras o inverno que ameaça a Natureza: do montado... Mas sob o verde-claro dos renovos -igual ao que adensa na minha alma, o negro da tristeza igual ao que não veem meus amigos... Como o verão alegre põe doçuras se lhes adensa, em rama, tristemente e sorrisos no côncavo estrelado, nos abrigos; Fontes cibernéticas e Anfiteatro Fontes cibernéticas e Anfiteatro Templo da Poesia jardim Camilo Pessanha (1867-1926) 41 Poetas do séc. XX

Rosas de inverno

Gloriosa floração, Corolas, que floristes Surdida, por engano, Ao sol de Inverno, avaro, No agonizar do ano, Tão glácido e tão claro Tão fora da estação! Por estas manhãs tristes, ... 42jardim Teixeira de Pascoaes (1877-1952)

A sombra do homem

... Chamo por mim; e a estrela me responde. Já de tanto sentir a Natureza, Chamo, de novo; e diz o mar: quem chama? De tanto a amar, com ela me confundo! E diz-me a flor: onde é que estás? Aonde? E agora, quem sou eu? Nesta incerteza, Vede a sorte terrível de quem ama! Chamo por mim. Quem me responde? O mundo. ... jardim Mário de Sá Carneiro (1890-1916) 43

Quase

Um pouco mais de sol - eu era brasa, Quase o amor, quase o triunfo e a chama, Um pouco mais de azul - eu era além. Quase o princípio e o fim-quase a expansão... Para atingir, faltou-me um golpe de asa... Mas na minha alma tudo se derrama... Se ao menos eu permanecesse aquém... Entanto nada foi só ilusão! ...... jardim Florbela Espanca (1894-1930) 44

Ser poeta

Ser poeta é ser mais alto, é ser maior Do que os homens! Morder como quem beija! É ter de mil desejos o esplendor É ser mendigo e dar como quem beija! E não saber sequer que se deseja! É ser mendigo e dar como quem seja É ter cá dentro um astro que flameja, Rei do Reino de Aquém e de Além Dor! É ter garras e asas de condor! jardim José Gomes Ferreira (1900-1985) 45

Idílio de recomeço

VII Não me tragam rosas. Lembra-te de que nem todas as rosas Não percas tempo a colhê-las caem do sol para enfeitar de estrelas e há tantas, tantas, da cor dos punhais os meus sentidos. escondidos! jardim 46 José Régio (1901-1969)

Cântico negro

….. É uma onda que se alevantou. Ah, que ninguém me dê piedosas intenções! É um átomo a mais que se animou... Ninguém me peça definições! Não sei por onde vou, Ninguém me diga: “vem por aqui”! Não sei para onde vou, A minha vida é um vendaval que se soltou. -Sei que não vou por aí! jardim Vitorino Nemésio (1901-1978) 47

Fala das quatro flores E o malmequer concretiza: Eu sou como a Pitonisa Da Grécia do Amor ideada. Sou Arrogância e Beleza - Disse a rosa. E a luta acesa Feitas carne vegetal, Entre as flores, o cravo leal Só a saudade-renúncia E chamam Vossa Grandeza Volve: Eu, a mor gentileza, Teve esta suma pronúncia: Ao meu prestígio real. Cavaleiro de S. Graal. Calou-se... e não disse nada. jardim Miguel Torga (1907-1995) 48

Retrato Lá dentro há frutos, há frescura, há quanto O meu perfil é duro como o perfil do mundo. Faz um poema doce e desejado; Quem adivinha nele a graça da poesia? Mas quem passa na rua Pedra talhada a pico e sofrimento, Nem sequer sonha que do outro lado É um muro hostil à volta do pomar. A paisagem da vida continua. Jorge de Sena (1919-1978) jardim49

Water music, de Häendel

Sobre o rio descem cordas e madeiras Crepitam trompas e destilam flautas e remos a metais. na crespa ondulação que as proas tangem e morre em margens de oboé e bombo, É como o sol nas águas, no arvoredo verde cadenciando o choque das remadas de ouro. que as águas reverdece de verdura e sombra. Sophia de Mello Breyner Andresen jardim (1919 - 2004) 50

Este é o tempo Esta é a noite Densa dos chacais Este é o tempo Pesada de amargura Da selva mais obscura Este é o tempo em que os Até o ar azul se tornou grades homens renunciam. E a luz do sol se tornou impura jardim Carlos de Oliveira 51 (1921-1981)

Infância Chamo às estrelas Rosas. ... E a terra, a infância, Tão pequenas Crescem A infância, a terra. No seu jardim Com tão pouco Aéreo. Mistério. jardim Natália Correia (1923-1993) 52

A defesa do poeta

Senhores jurados sou um poeta Senhores banqueiros sois Sou uma impudência a mesa posta um multipétalo uivo um defeito o vosso enfarte serei de um verso onde o possa escrever e ando com uma camisa de vento não há cidade sem o parque ó subalimentados do sonho! ao contrário do esqueleto do sono que vos roubei a poesia é para comer...... (1923 - 2005) jardim Eugénio de Andrade 53 Urgentemente ódio, solidão e crueldade, e manhãs claras. alguns lamentos, muitas espadas. É urgente o amor Cai o silêncio nos ombros e a luz É urgente um barco no mar É urgente inventar alegria, impura, até doer. multiplicar os beijos, as searas, É urgente o amor, é urgente É urgente destruir certas palavras, é urgente descobrir rosas e rios permanecer. jardim Manuel Alegre (1936) 54

Pergunto ao vento que passa notícias do meu país Mas há sempre uma candeia Mesmo na noite mais triste e o vento cala a desgraça dentro da própria desgraça em tempo de servidão o vento nada me diz. há sempre alguém que semeia há sempre alguém que resiste canções no vento que passa. há sempre alguém que diz não. ... jardim Fernando Pessoa (1888-1935) 55

Mensagem Valeu a pena? Tudo vale a pena …. Se a alma não é pequena. Por te cruzarmos, quantas mães choraram, Quem quer passar além do Bojador X. MAR PORTUGUÊS Quantos filhos em vão rezaram! Tem que passar além da dor. Quantas noivas ficaram por casar Deus ao mar o perigo e o abismo deu, Ó mar salgado, quanto do teu sal Para que fosses nosso, ó mar! Mas nele é que espelhou o céu. São lágrimas de Portugal! …. jardim Alexandre O’ Neill (1924-1986) 56

A uma oliveira Pré-camoniana, sazão a sazão, Ao som bárbaro de um rádio de pilhas, Muito antes de Os Lusíadas diz-se que foste varejada séculos a fio. desdobram toalhas já aqui estavas. na tua sombra rala. O pinho viajou. Tu ficaste. jardim 57 António Ramos Rosa (1924 - 2013)

Não posso adiar o amor Não posso adiar este abraço nem o meu amor que é uma arma de dois gumes nem o meu grito de libertação Não posso adiar o amor para outro século amor e ódio não posso Não posso adiar o coração ainda que o grito sufoque na garganta Não posso adiar ainda que o ódio estale e crepite e arda ainda que a noite pese séculos sobre as costas sob montanhas cinzentas e a aurora indecisa demore e montanhas cinzentas não posso adiar para outro século a minha vida jardim

David Mourão - Ferreira (1927-1996) 58

E por vezes ao tomarmos o gosto aos oceanos encontramos de nós em poucos meses só o sarro das noites não dos meses E por vezes as noites duram meses o que a noite nos fez em muitos anos lá no fundo dos copos encontramos E por vezes os meses oceanos E por vezes fingimos que lembramos E por vezes os braços que apertamos E por vezes lembramos que por vezes E por vezes sorrimos ou choramos nunca mais são os mesmos E por vezes E por vezes por vezes ah por vezes num segundo se evolam tantos anos jardim António Gedeão (1906-1997) 60 Lágrima de preta …….. Encontrei uma preta Ensaiei a frio, Nem sinais de negro, que estava a chorar, experimentei ao lume, nem vestígios de ódio. pedi-lhe uma lágrima de todas as vezes Água (quase tudo) para a analisar. deu-me o que é costume: e cloreto de sódio. 60jardim Ruy Belo (1933-1978)

Quanto morre um homem que encontrar no coração e na cidade? Quando eu um dia decisivamente voltar a face Quem te porá como fruto nas árvores ou como paisagem daquelas coisas que só de perfil contemplei no brilho de olhos lavados nas quatro estações? quem procurará nelas as linhas do teu rosto? Quando toda a alegria for clandestina Quem dará o teu nome a todas as ruas alguém te dobrará em cada esquina? Conjunto Escultórico “Reunião com Poetas” - Praça do Memorial Entrada norte - Alameda dos Poetas