As transformações da notícia de rádio na fase pós-televisão Valci Regina Mousquer Zuculoto*

Resumo

Na chamada “fase vitrolão” da história da radiofonia brasileira, que inicia nos anos 50 e se estende por todo os 60, o rádio sofre o impacto do advento da tele- visão e inclusive chega a ter sua morte decretada, por obra da obsolescência total que lhe atribuem diante 34 do surgimento do novo meio. Passa de uma era de espetáculo para um período no qual a maioria das emissoras se limita a rodar discos em praticamente toda sua programação. Porém, ao mesmo tempo, é quando outra boa parte das emissoras constrói a his- tória da radiofonia brasileira através do desenvolvi- mento do radiojornalismo. E o avanço da tecnologia, com novidades como o transístor e vários outros equi- pamentos eletrônicos, constitui-se num dos aspectos históricos que mais influi na trajetória do rádio neste período e por decorrência, também na sua notícia. *Professora do Departamento de Jornalismo da UFSC, onde coordena o Projeto Universidade Aberta, Mestre em Ciên- cias da Comunicação pela PUC-RS, Diretora de Formação Palavras-chave Profissional da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e radiojornalismo - notícia - história ex-diretora da Rádio Cultura Fm do Rio Grande do Sul.

Estudos em Jornalismo e Mídia, Vol. I Nº 1 - 1º Semestre de 2004 A “época de ouro” do rádio brasileiro, em forma completamente oposta a sua “época de que o radiojornalismo realmente nasceu e a ouro”, quando tinha suas orquestras próprias, sua notícia se consolidou como parte efetiva músicos e cantores contratados, um verdadei- das suas programações, termina no início ro broadcast que alcançava imenso sucesso, da década de 50, com a implantação da tele- exatamente por estar nas ondas do rádio. Seus visão1 . E especialmente a partir de meados broadcasts numerosos e arrebatadores de públi- de 50, o rádio brasileiro vive um tempo que co e publicidade transferem-se para a televisão passou para a história da radiofonia nacional ou são desfeitos. O rádio já não tem mais como como a “fase vitrolão”, período que se estende sustentá-los porque as contas publicitárias por toda a década seguinte, a dos anos 60. também foram levadas pela televisão. E até Mas, apesar deste declínio, é uma fase em muitos dos próprios empresários da radiofonia, que o radiojornalismo e, por conseqüência, a ao receberem concessões para a exploração do sua notícia muito se desenvolvem e se trans- novo veículo, igualmente deixam de investir formam, impulsionados principalmente pelos nas suas emissoras. avanços tecnológicos daquela época. Esta transformação, contudo, não ocorre O rádio muda radicalmente na fase pós- da noite para o dia. Como lembra Joaquim 1 Conforme Bonavita 35 (1982:81), ocorreram várias televisão, porque este novo meio de comuni- Ferreira dos Santos(1997:148), no final dos demonstrações e transmissões experimentais de televisão cação literalmente rouba a cena. anos 50, mais precisamente em 58, “o Brasil se no Brasil entre 1939 e 1950, divertia à beira do rádio e, talvez pela última mas não existem dados mais ”A televisão, definitivamente, ocupou o pri- exatos acerca delas. A autora meiro plano entre os meios de comunicação vez naquela década, a Nacional, PRE-8, ainda cita uma demonstração do sistema alemão em 1939, levando consigo as verbas publicitárias, tinha muito mais charme do que a TV Tupi e a outra pública, no MASP, nos anos 40 e transmissões expe- os profissionais e a audiência. No período Rio juntas”. A maioria do povo brasileiro con- rimentais da Rádio Nacional noturno, ela passa a ser a grande estrela” tinuava a se informar principalmente através em 1946 e em 1950. Também de acordo com Bonavita, a (ORTRIWANO, 1990:82). do rádio. Operando em ondas médias e curtas, primeira emissora de tele- além de contar com muitas retransmissoras, visão foi inaugurada em 18 Segue-se a chamada “fase vitrolão” do rá- de setembro de 1950 em São a Rádio Nacional ainda liderava a audiência Paulo - a PRF-3 TV das Asso- dio, em que o veículo chegou a ter sua morte ciadas. E em 20 de janeiro de brasileira, estabelecendo... 1951, no Rio de Janeiro, hou- anunciada. Em especial a partir da década ve a inauguração da segunda de 60, coincidindo com a consolidação da “... uma verdadeira aldeia global cobrindo estação - a TV Tupi Canal 6, mais uma emissora das Asso- televisão, o rádio passa a existir quase que todo o país e fundando ‘princípios básicos’ da ciadas. exclusivamente como musical. Porém, de cultura nacional(FERREIRA DOS SANTOS, 1997:153)”. então novos instrumentos tecnológicos, entre

Já na década de 60, quando chega ao auge a os quais o gravador magnético, o transístor, a transformação do rádio sob o impacto da tele- Freqüência Modulada e as unidades móveis de visão, o veículo realmente fica desfigurado em transmissão. E todos estes avanços revelaram-se relação ao perfil que ostentava glorioso na sua instrumen-tos especialmente adequados não só época de ouro. Mas não caiu na obsolescência. à continuidade do rádio como a um maior desen- Transformou-se. volvimento do seu jornalismo. Um dos avanços tecnológicos que mais in- Além do surgimento das unidades móveis, esta fluenciou a transformação, a garantia de sobre- também foi a época em que se reduziram peso e vivência do rádio foi, sem dúvida, o transístor, volume de equipamentos técnicos utilizados na pois melhorou a qualidade de transmissão e produção, gravação e transmissão, o que possi- bilitou reportagens de rua, entrevistas fora de recepção. Os aparelhos receptores transisto- estúdio e ao vivo, facilidades que foram grandes rizados, que começaram a ser produzidos no responsáveis pelo novo impulso ao radiojornalis- Brasil em 1955 e substituíram os antigos rádios mo. Ainda nesta fase surgem as FMs, de início a válvula, puderam dispensar fios e tomadas. E 36 exclusivamente musicais e sendo utilizadas, pela passaram a levar as mensagens radiofônicas ao recepção, apenas para som ambiente, de fundo. ouvinte em qualquer lugar e em qualquer tempo, Outro avanço tecnológico da década de 60 foi o o que representou uma vantagem em relação à som estereofônico2 . Trouxe aprimoramento da televisão. qualidade de som para os ouvintes e mais um in- “Como 60% do Brasil não dispunham de redes de centivo para que continuassem ouvindo rádio. eletrificação, pode-se imaginar o impulso que essa O Brasil vivia o período pós-ditadura do Esta- 2 O som estereofônico co- meçou a ser utilizado pela inovação deu ao rádio e à indústria eletro-eletrô- do Novo de Getúlio Vargas: a política nacio-nalis- radiofonia após o surgimento nica” (BONAVITA FEDERICO, 1982:86). das FMs, melhorando ainda ta deu lugar ao desenvolvimentismo de Juscelino mais a qualidade de recep- ção destas emissoras em Também Ortriwano (1990:83-85) aponta as Kubitschek, que abriu o país para o investimento comparação com as AMs. inovações tecnológicas como responsáveis pelas de multinacionais, mas sempre procurando Tanto que muitas das rádios que operam em Frequência transformações que o rádio evidencia neste pe- manter um aparente caráter nacionalista e de Modulada fazem questão de informar quando são “FM ríodo, especialmente o radiojornalismo. Diz ela legitimidade nacional para o processo. Foi nesta Stereo”. Chegou a ocorrer que o rádio encontrou, na eletrônica, seu maior fase da história da radiofonia que também acaba tentativa de se implantar também o AM estéreo, mas aliado para sobreviver, através de uma série de o império da até então poderosa PRE-8. A Rádio esta não vingou.

Estudos em Jornalismo e Mídia, Vol. I Nº1 - 1º Semestre de 2004 Nacional perde sua imensa audiência e, aos E o rádio, pelo à qual foram integradas todas as emissoras poucos, igualmente sua estrutura de grande e baixo custo e gaúchas. bem sucedida emissora. as facilidades “As programações foram canceladas e todas Aos “50 anos em 5” de JK, o lema que o presi- de transmissão as emissoras retransmitiam as mensagens do dente Juscelino adotou para impor seu modelo Palácio, 24 horas por dia. Boletins informativos desenvolvimentista, seguiu-se um tumultuado e recepção possibilitadas a todo o momento; conclamações aos gaúchos, período sócio-político-econômico com Jânio indicando locais de postos de alistamento; in- pelas novidades Quadros, João Goulart e o golpe militar de 64. formações do centro do país; listas de adesões Um período propício para que o radiojornalismo eletrônicas, de personalidades; pronunciamentos de líderes se desenvolvesse, já que o público estava ávido demonstrava, políticos e, sempre que algum fato importante por notícias, assim como aconteceu durante a então, que era acontecia, o próprio Leonel Brizola vinha ocupar Segunda Guerra em favor da rápida consolida- o veículo de o microfone (REIS,1995:47-48)”. ção do Repórter Esso e outros correspondentes massa com mais As cadeias de rádio, que muito influíram no surgidos ou incentivados sob o seu rastro de su- condições de desenvolvimento do jornalismo radiofônico e cesso. E o rádio, pelo baixo custo e as facilidades informar na sua notícia, tiveram um impulso em meados 36 de transmissão e recepção possibilitadas pelas 37 da década de 60 com as melhorias nas tele- novidades eletrônicas, demonstrava, então, que comunicações brasileiras. Via Embratel, por era o veículo de massa com mais condições de linhas telefônicas e micro-ondas, as emissoras informar. entravam em rede e conseguiam, inclusive, Não foi à toa que, naquele período, Leonel fazer transmissões simultâneas ao vivo. A Jo- Brizola identificou o potencial e o poder que vem Pan, de , naquela época ainda o rádio mantinha, utilizando o veículo na re- chamada Rádio Panamericana, foi uma das sistência à primeira tentativa de golpe contra que logo lançou mão deste recurso inovador, seu cunhado João Goulart, que em 61 estava colocando-o à serviço do seu então crescente sendo impedido de assumir a Presidência após radiojornalismo, especialmente do “Jornal de a renúncia de Jânio Quadros. Brizola criou Integração”. a “cadeia de legalidade”, com a participação Um modelo que misturava rádio musical de dezenas de emissoras brasileiras. O então com rádio informativo acabou sendo a principal governador do Rio Grande do Sul falou para saída para as muitas emissoras que já vinham todo o país, exigindo a posse de Jango, a partir trilhando o caminho do jornalismo paralela- dos porões do Palácio Piratini, numa cadeia mente ao do rádio-espetáculo. E a pioneira foi a Rádio JB do Rio de Janeiro. Além da captação, já que servem mais ao local, ao re- gional. Um exemplo de que o rádio informativo “A virada dos anos 60 traria ainda o formato notícia prestador de serviços apontava para o potencial Música e Informação proposto pela Rádio Jornal jornalística, de audiência ainda a ser explorado e o caminho do Brasil. O modelo se mostraria não só conve- o rádio a ser seguido, encontra-se na publicação come- niente aos recursos da empresa como oportuno informativo morativa aos 20 anos da Rádio Nacional, em para cobrir e documentar os anos tormentosos de então é 1956, e em Ferreira dos Santos (1997:157). Re- que vão da posse de Jânio Quadros na Presi- impulsionado latam que numa noite do final daquela década, dência da República ao 1 de abril de 1964[...]” um avião da FAB, com 14 pessoas à bordo, não (SAROLDI e MOREIRA, 1984:83-84). também pelo espaço conseguia pousar em , no Mato A Jovem Pan foi outra que logo buscou so- Grosso, porque o aeroporto estava totalmente às brevivência na mescla de música e informação. maior dado à prestação escuras devido a problemas na rede de energia Ainda como Panamericana, a emissora também elétrica. O piloto pediu auxílio à base aérea do adota a prestação de serviços como recurso para de serviço e Rio de Janeiro que avisou a Rádio Nacional, enfrentar a televisão. Em 1966, a Panameri- à utilidade solicitando que esta colocasse no ar o seguinte cana, que tinha tentado a especialização como pública pedido de socorro: 38 “Emissora de Esportes”, muda a programação e “Atenção Campo Grande, atenção Campo o nome. Edileuza Soares (1994:105) relata que Grande em Mato Grosso. Uma vo- a emissora “passou a dividir seu tempo entre adora da FAB precisa aterrar. O campo de esporte, radiojornalismo e prestação de serviço” pouso está às escuras. Os moradores da cidade e adotou o nome de Jovem Pan por causa de devem ir com seus carros até o aeroporto para um programa musical da TV Record - o “Jovem iluminarem a pista. Atenção Campo Grande, Guarda” - comandado por Roberto Carlos, um Mato Grosso...” grande sucesso da época, que dominava a au- Logo depois da transmissão do aviso, o trân- diência televisiva dos domingos. sito se agitou na noite de Campo Grande. Além da notícia jornalística, o rádio infor- “ ...A dois mil quilômetros de distância, na- mativo de então é impulsionado também pelo quele momento, vários carros mudaram de espaço maior dado à prestação de serviço e à itinerário. Algumas pessoas saíram de casa utilidade pública. São aspectos informativos e foram para seus automóveis. Às 23:45hs a que acabam aparecendo na notícia e influen- Fortaleza Voadora descia serenamente, no meio ciando seu modo de produção e suas fontes de do raio de luz que dezenas e dezenas de faróis

Estudos em Jornalismo e Mídia, Vol. I N¦º 1 - 1º Semestre de 2004 de automóveis despejavam sobre a escuridão do ensaia seus primeiros passos em direção à es- campo de pouso.” pecialização/segmentação, fenômeno que igual- A Rádio Nacional estava exercendo a utilidade mente ocorre com toda a imprensa do país. pública, a prestação de serviço pelas ondas do “No Brasil, projetou-se então na ideologia a rádio e também desenvolvendo o rádio informa- distinção de classes de uma sociedade industrial tivo. Porque jornalismo e prestação de serviço antes mais ou menos ocultada pela presença têm estreita ligação, são praticados recorrendo populista: os jornais já não eram mais feitos a uma busca de informação que necessita de para todos, mas para camadas do público” fontes, captação, clareza, correção, veracidade, (LAGE,1979:32). credibilidade. E o enveredamento do rádio pelos As inovações tecnológicas da época, aliadas a caminhos da utilidade pública também está im- necessidade de o rádio enfrentar os tempos pós- bricado com o seu perfil local/regional, que se vai televisão, deram um novo impulso ao radiojor- afirmar com bastante força na busca de saídas nalismo, principalmente através do incentivo para enfrentar a concorrência da televisão. Ape- à reportagem própria (no sentido de prática sar de na sua “época de ouro” ter-se desenvolvido para a captação de informações), o que vai in- 39 principalmente com um perfil nacional - este foi terferir decisivamente nas transformações da o padrão das inúmeras grandes emissoras que notícia radiofônica nesta fase. Lentamente, os existiam então - nesta fase pós-televisão ouve-se noticiários radiofônicos deixam de ter sua base um rádio local já se sobressaindo e crescendo em Lentamente, quase que exclusivamente voltada às agências número de estações que adotam tal modelo. os noticiários de notícias e aos jornais. Os repórteres passam “Quanto ao rádio, de veículo potencialmente radiofônicos a ser essenciais para a produção da notícia de rádio, já que as emissoras começam a inves- internacional, graças a sua versatilidade, tomou deixam de o lugar dos diários e semanários locais e regio- tir na reportagem, inclusive nas chamadas ter sua base nais, que não puderam acompanhar a evolução externas. tecnológica: regionalizou-se, conforme tese de quase que Na Rádio Continental do Rio de Janeiro, uma Zita de Andrade Lima, tomando a seu cargo as exclusivamente das pioneiras em se especializar neste tipo de reportagem, o destaque foi o radialista Carlos comunicações de interesse e importância para voltada às Pallut. Ele introduziu, de forma mais organi- áreas populacionais limitadas, fazendo-se serviço agências de zada, a reportagem externa em rádio. Como de utilidade pública” (BELTRÃO, 1976:44). notícias e aos relata Ferreira dos Santos (1997:153), “na Neste período, o rádio brasileiro também jornais Rádio Continental investia-se no jornalismo com a equipe do Pallut”. Foi de Pallut a idéia redação prévia da notícia, o que vai torná-la de ter carros específicos para a reportagem e mais coloquial, menos concisa, menos objetiva. para isso, conseguiu o patrocínio dos veículos Mas estas são transformações que não alteram recém lançados pela Dodge. Tornou-se conhe- muito o seu formato, já que até hoje a maioria cida a publicidade da equipe de reportagem dos repórteres continua a redigir previamente do radialista: “Carros Dodge - que não podem seus boletins e, nesta redação, seguem as orien- falhar nem parar”. tações básicas que têm suas raízes no repórter Conforme Edileuza Soares ( 1994:59), com os Esso. O improviso, na verdade, foi possível não “Comandos Continental”, repórteres e técnicos apenas pelo desen-volvimento da prática da re- transmitiam diretamente dos locais dos aconte- portagem. Também aconteceu como decorrência cimentos. E Pallut trouxe, do departamento de do fim da censura que reinou na era Vargas e esportes da emissora, para o radiojornalismo, do DIP. Antes, o Departamento de Iimprensa o sistema de externas que, segundo a autora, e Propaganda controlava, pelos roteiros, as já era, então, uma rotina no rádio esportivo notícias que as emissoras levavam ao ar. praticado pela Continental. “Nessa época, a Mas propriamente na notícia, a influência rádio liderava no Rio as transmissões externas maior da reportagem vai ocorrer na Rádio Jor- 40 de esporte”. O radialista Afonso Soares3 recorda nal do Brasil. Esta também foi uma emissora que a primeira cobertura externa informativa que deu um novo impulso ao jornalismo nas produzida por Pallut aconteceu em fevereiro de décadas que se seguiram à “ época de ouro”. A 1951, quando espalhou postos com “repórteres” JB, desde sua criação em 1935, sempre dispen- por todo o Rio e contou ao vivo, pelas ondas da sou um tratamento diferenciado ao jornalismo, Continental, como era o carnaval carioca. mais sisudo, mais sóbrio que o modo de fazer No final da década de 50, a reportagem já do Esso e seus seguidores. Mas até a década de fazia sucesso no rádio e “a serviço do povo em 60 mantinha um volume bastante reduzido de toda a parte, os Comandos Continental em informativos: apenas dois. Na virada da déca- ação”4 realizavam uma organizada cobertura da de 60, passa para quatro o número de seus externa dos fatos no Rio, fornecendo informa- 3 Depoimento ao vídeo-do- noticiários. E logo em seguida, numa proposta cumentário Rádio no Brasil, ções para a redação dos noticiários que ainda 1922-1990. Produção: Tele revolucionária para a época, adota o formato Tape, TVE RJ e Art Plan mantinham a fórmula Esso de transmitir Música e Informação, desenvolvendo bem duas notícia. Com a reportagem, o radiojornalismo 4 Característica que identi- vertentes básicas de sustentação do rádio: a ficava o famoso programa de de então começa também a ensaiar as trans- reportagens externas de Car- do entretenimento através da música e a da missões de informações por improviso, sem a los Pallut.

Estudos em Jornalismo e Mídia, Vol. I Nº1 - 1º Semestre de 2004 informação jornalística. As sínteses sobriedade que marcaram os notici-ários desta Dentro desta proposta de programação com noticiosas que se emissora. Clóvis Paiva, nas suas regras básicas maior espaço para o jornalismo, a JB introduz consolidaram no que deviam ser observadas por toda a equipe trechos de reportagens gravadas nos seus no- JB, entre outras, ensinava: ticiosos, junto aos textos lidos pelos locutores, radiojornalismo “... redação perfeita, incluindo a eliminação do divergindo da linha que havia sido implantada brasileiro, com supérfluo, de termos inacessíveis à maioria da pelo Repórter Esso e copiada quase fielmente sua linguagem população, de chavões, de termos complicados por todos os demais noticiários brasileiros. telegráfica, e de frases com sentido duplo ou duvidoso” (in Inaugura, assim, uma nova escola para o ra- enxuta, mas FELICE, 1981:74). diojornalismo brasileiro que vai influenciar os vibrante, rápida O incremento ao jornalismo por parte das noticiosos pelo país afora principalmente na e sensacionalista década seguinte, a de 70. As sínteses noticiosas emissoras de rádio nesta fase também decorre na voz do locutor, que se consolidaram no radiojornalismo brasi- da obrigatoriedade de transmissões informa- leiro, com sua linguagem telegráfica, enxuta, no estilo JB tivas, imposta pela legislação. A lei 4.ll7, de mas vibrante, rápida e sensacionalista na voz passam a ter 27 de agosto de 1962, que instituiu o Código do locutor, no estilo JB passam a ter mais tempo mais tempo de Brasileiro de Telecomunicações, e o Decreto 40 41 de duração, notícias mais longas, entremeadas duração, notícias 52.286, de 23 de julho de 1963, que regulamen- por boletins de repórteres, declarações e trechos mais longas, tou as atividades de rádios e tevês, tornaram das entrevistas. A notícia de rádio, assim, in- entremeadas obrigatório “um mínimo de 5% de seu tempo corpora algumas características diferentes das para a transmissão de serviço noticioso”. Para por boletins o cumprimento da exigência, boa parte das que vinham fazendo sua história na radiofonia de repórteres, brasileira. emissoras – em especial as que não queriam No início da década de 60, o jornalista Clóvis declarações optar pelo radiojornalismo e inclusive as Fms Paiva assume a rádio JB e é sob seu comando e trechos das – reavivou a antiga prática da “cola e tesoura”. que “o estilo JB” começa a se impor. A notícia entrevistas Os jornais impressos e também a rádio-escuta daquela emissora sofre transformações que vão voltaram a ser fontes de captação. Desta vez, porém, embora não acompanhassem a instan- influir boa parte do radiojornalismo posterior- taneidade e o imedia-tismo característicos do mente. No manual que elaborou para o serviço veículo, as notícias copiadas dos jornais ou de na JB, embora se conserve muito do que era outras emissoras pelo menos recebiam uma norma para o Esso, vê-se que é cada vez mais nova redação. Mas de uma forma ou de outra, forte a presença da linguagem colo-quial da a obrigatoriedade deste mínimo de transmissão noticiosa acabou abrindo espaço para o desen- Janeiro, Copacabana, Mayrink Veiga, Difusora volvimento da notícia. Fluminense e Guanabara AM. Conforme Cohen E nas rádios que se dedicaram mais ao radio- (in Revista de Comunicação, 1992:14-17), que jornalismo, as transformações que influenciam baseia suas informações em tese de Júlio Vasco no texto e produção da notícia são mais fortes Guimarães da Costa, o período mais marcante e evidentes. Agora, neste período da história do GJF, o de maior audiência, situa-se nas da notícia radiofônica, além das agências de décadas de 50 e 60. E uma das razões aponta- notícias internacionais, já existiam também das para tal sucesso: “era o único a transmitir as nacionais ligadas aos principais jornais, atos oficiais dos três poderes, fazendo com que e as emissoras contavam com repórteres. No o ouvinte do interior tivesse acesso a essas rastro deste aumento das formas de captação informações antes mesmo de receber o próprio e por conseqüência, da ampliação das origens e Agora, neste ‘Diário Oficial’”. volumes de informações na notícia, começam a período da A notícia do GJF, assim como muitos outros se consolidar modelos de noticiários que privi- história noticiosos que surgiram ou se firmaram naquela legiam o nacional e, principalmente, também da notícia época, também tinha características de presta- o local, o regional. ção de serviço. E além de captar as informações 42 Além disso, pela boa aceitação desta nova radiofônica, através de sua equipe de produção, ou seja, fórmula por parte do público ouvinte, as além das fazendo reportagem, ainda utilizava como fonte emissoras fomentam as suas transmissões agências os próprios ouvintes, que principalmente por em rede, levando a notícia mais recente, mais de notícias cartas enviadas do interior forneciam dados imediata também ao interior dos estados e do internacionais, para as notícias. Um detalhe interessante é que país, através das próprias pequenas emissoras já existiam o Grande Jornal citava os nomes das pessoas locais. Um exemplo destes novos moldes de também as que passavam as informações. Uma notícia do noticiosos radiofônicos foi o “Grande Jornal nacionais GJF daquela época: Fluminense”. Este noticioso fluminense esteve “Petrópolis - Correspondência de Carlos Ferreira no ar em emissoras do estado do Rio por mais ligadas aos Abreu - Médicos pediram demissão coletiva: pe- de 30 anos, a partir de 1949 até 1981. Era pro- principais rigo no Pronto-Socorro! Porque recebem somente duzido em Niterói, por um grupo de jornalistas jornais, e as 6 mil cruzeiros e o prefeito Nelson Sá Earp não que locavam uma emissora para transmiti-lo. emissoras quis aumentar seus salários, os médicos do Pron- Foi sucessivamente irradiado pelas rádios Ta- contavam com to-Socorro de Petrópolis, ontem, pediram de- moio, Clube do Brasil, Jornal do Brasil, Rio de repórteres missão coletiva, o que poderá ter conseqüências

Estudos em Jornalismo e Mídia, Vol. I N¦º 1 - 1º Semestre de 2004 drásticas durante os dias de carnaval” (COHEN Com esta da Jovem Pan, expressando uma tendência que in Revista de Comunicação, 1992:15). estrutura de apontou e se consolidou nesta fase da história Em São Paulo, o Jornal de Integração Nacio- produção, a do rádio, utiliza as inserções de sonoras, mo- dificando o tipo de texto, que passa a ser mais nal da Jovem Pan (antiga Panamericana) era notícia da coloquial e um pouco menos rígido em termos outro exemplo de que a notícia no rádio brasi- Jovem Pan, leiro e ampliava e modificava as características de objetividade. expressando do perfil que adquirira a partir do Esso. No caso uma tendência “Na época do Jornal de Integração Nacional, as específico do rádio paulista, as transformações informações da vida brasileira eram muito defa- ocorrem muito mais em relação ao Grande que apontou e sadas em termos de horário. Os jornais impres- Jornal Falado Tupi. É que o rádio de São Paulo se consolidou sos fechavam cedo e só chegavam nas bancas desenvolveu o jornalismo com uma linguagem nesta fase da às 6 horas da manhã.[...] Para outros Estados não tão telegráfica, objetiva e aprisionada a história do o atraso era maior, até de dias. Em Brasília, a regras rígidas quanto aqueles que seguiram rádio, utiliza capital do país, os jornais chegavam no início fielmente o Esso. Também se diferenciou por as inserções da tarde.[...] E foi nesse quadro que surgiu o mais rapidamente praticar a cobertura local e Jornal de Integração Nacional - diz José Carlos de sonoras, 43 nacional, certamente por influência dos tempos modificando o Pereira da Silva - que se transformou numa em que a Record aderiu à Revolução Constitu- tipo de texto, iniciativa de interesse das principais capitais cionalista de 32 e fêz rádio informativo voltado que passa a ser brasileiras. As notícias do Brasil chegavam para a então principal questão de São Paulo, a vários pontos do próprio país com rapidez, colocando-o à serviço da campanha anti-getu- mais coloquial informando, formando opinião, esclarecendo” ( lista lá desencadeada. e um pouco ALVES DE FARIA, 1994:194). O Jornal de Integração Nacional da Jovem menos rígido Neste fase da história da radiofonia bra- Pan era retransmitido em rede e procurava em termos de sileira, o rádio, assim como os demais meios veicular informações de vários centros do país objetividade informativos, sofre a censura do governo e para isso, contava com repórteres em várias militar, instalado no país a partir de 1964. cidades. Na fase que se segue a esta, a de 70 a Uma censura que também vai-se refletir na 90, tal tendência vai-se ampliar e consolidar na notícia, com mais evidência e mais força no figura dos chamados correspondentes, que as seu conteúdo, aspecto que não é o objeto do emissoras passam a manter inclusive no exte- presente estudo. Era comum, naquele período, rior. Com esta estrutura de produção, a notícia que o Dentel (Departamento Nacional de Te- lecomunicações) e o Ministério da Justiça, através da Polícia Referências Bibliográficas ALSINA, Miguel Rodrigo. La construcción de la noticia. Barcelona, Federal, requisitassem cópias de programas e entrevistas para Edciones Paidós, 1993. censurar o conteúdo. E embora o impacto maior deste perído de ALVES DE FARIA, Álvaro. Jovem Pan, 50 anos. São Paulo, Mal- censura se expresse no conteúdo da notícia, também é possível tesa, 1994. concluir que ocorreram reflexos no formato. O comentário e BAHIA, Juarez. Jornal, História e Técnica - As técnicas do jorna- o “vivo”, que já poderiam ser mais desenvolvidos nesta épo- lismo. São Paulo, Ática, 1990. ca pelas inovações técnicas que permitem veiculações mais BELTRÃO, Luiz. Jornalismo Interpretativo. , Sulina, instântaneas e imediatas, com certeza ficaram refreados em 1976. função de censura. Por consequência, impediram que a notícia, BONAVITA FEDERICO, Maria Elvira. História da Comunicação enquanto texto e produção, caminhasse mais rápido no sentido – Rádio e TV no Brasil. Petrópolis, Vozes, 1982. CÖHEN, Guilherme. “No ar, o Grande Jornal Fluminense”. In.: Re- de adquirir uma linguagem coloquial, menos presa a regras vista de Comunicação. Rio de Janeiro, Agora Comunicação Integrada que impõem a objetividade e a brevidade, e de ampliar suas Ltda, ano 8, nº 30, novembro de 1992. fontes de captação da informação. DIJK, Teun A.van. La noticia como discurso – compreensión, Nesta fase, portanto, a notícia radiofônica é sinônimo de estrutuctura y producción de la información. Barcelona, Editora resistência. Poderia ter-se calado assim como aconteceu com o Paidós, 1990. 44 rádio-espetáculo construído na “época de ouro”. Mas resistiu e FARIA, Álvaro Alves. Jovem Pan 50 anos. São Paulo, Maltese, não apenas sobreviveu junto com o meio. Embo-ra não se tenha 1994. desenvolvido em todo o rádio brasileiro, não ficou estagnada FELICE, Mauro de. Jornalismo de Rádio. Brasília, Thesaurus e nas emissoras em que vingou, especialmente por conta e Editora, 1981. FERREIRA DOS SANTOS, Joaquim. Feliz 1958: o ano que não apoiada em instrumentos do progresso eletrônico, ampliou devia terminar. Rio de Janeiro, Record, 1997. formas de captação, espaços de coleta de informações e de GOLDFEDER, Miriam. Por trás das ondas da Rádio Nacional. Rio veiculação, e iniciou transformações em seu texto que, somente de Janeiro, Paz e Terra, 1980. na fase que se segue a esta, vão-se tornar mais evidentes. As KLÖCKNER, Luciano. O Repórter Esso na História Brasileira raízes do estilo Esso - concisão e objetividade especialmente (1941- - permanecem. Mas já é possível notar os sinais em direção a 1945 e 1950-1954). Porto Alegre, Dissertação de Mestrado em Co- um texto mais coloquial, menos seco e pomposo, que, por isso, municação Social apresentada à Faculdade dos Meios de Comunicação já não se presta mais à locução vibrante, grandiloqüente e, Social da PUCRS, 1998. muitas vezes, sensacionalista que predominava em todos os LAGE, Nilson. Convergência Tecnológica. Palestra proferida no noticiosos de rádio até então. 27º Congresso Nacional dos Jornalistas, Porto Alegre, maio de 1996. ______. Ideologia e Técnica da Notícia. Petrópolis, Vozes, 1979.

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