Tamura Celiamitie D.Pdf

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Tamura Celiamitie D.Pdf iii iv À memória de meus avós, Sueko e Shōichi Tamura; Aos meus pais, Mitsuco e Yasuhiro; Aos Srs. Hiroko e Toshiji Takahashi E a todos os Quixotes do universo... v vi Agradecimentos Agradeço, em primeiro lugar, ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq – Brasil, cujo apoio foi fundamental para a realização do presente trabalho – que pretende poder ser, mais que um trabalho individual, uma forma de colaboração para a sociedade. Muito obrigada, também, ao querido Prof. Arnoni, que mais uma vez me proporcionou a sua importante orientação, bem como ao Corpo Docente do Curso de Teoria e História Literária do Instituto de Estudos da Linguagem, da Universidade Estadual de Campinas, e a todos os funcionários do IEL, sempre dedicados e eficientes. Aos Editores dos Periódicos em que foram publicados artigos de minha autoria, durante o período de meu curso de Doutorado: Professoras Samara Lócio e Cláudia Pino, da Revista Criação & Crítica – USP – SP; Professor Acir Dias da Silva, da Revista Travessias – UNIOESTE – PR; Professores Sílvio da Silva e Rosidelma Fraga, da Revista Virtual de Letras – UFG – GO, que proporcionaram maior entusiasmo nesta empreitada, por meio de seu reconhecimento. A todos os meus amigos... e à querida Pinky, que me acompanhou durante o terço mais bonito de meu caminho, em sua – tão alegre quanto curta – passagem pela Terra. vii viii È un uomo fato di libri, di favole e di fantasmi. La materia di cui si nutre viene da un altro mondo. Ed è questa alterità che permette all‟autore di rivelare la realtà di un mondo atuale e presente, di un mondo vero. (Alfonso Berardinelli, “L‟incontro con la realtà”, p. 344) Para os seres de nossa espécie, ler ou escrever é mais importante que viver. Substituímos monstruosamente a vida pela ficção. Quanto a mim, já não leio romances, mas que são a história, a filosofia, senão outras tantas ficções, e talvez mais ousadas, porque se presumem de alicerçadas no real? (Cyro dos Anjos, Abdias, p. 38) Ter imaginação é ver o mundo na sua totalidade; pois as Imagens têm o poder e a missão de mostrar tudo o que permanece refratário ao conceito. Isso explica a desgraça e a ruína do homem a quem “falta imaginação”: ele é cortado da realidade profunda da vida e de sua própria alma. (Mircea Eliade, Imagens e símbolos, p. 16) Importa uma descida ao mundo interno do sonho, mas de modo algum isto imporia a abdicação do intelecto. Procure-se o equilíbrio harmonioso de nossas faculdades espirituais, busque-se o homem mais completo. Na vida de hoje, dominada pela função teórica, cumpre que se opere uma revolução espiritual que libere a atividade da função estética e a integre na vida total. A vida do espírito e, com ela, a arte só poderão reencontrar uma nova plenitude quando o homem se vir tão grande no Pensamento quanto no Sonho. (Cyro dos Anjos, A criação literária, p. 77) Em suma, todo grande escritor individualiza as grandes imagens. Às vezes a obra literária é como que esmagada por lembranças de leitura. Por vezes a habilidade do narrador é tal que ele consegue fazer passar por realidade o que, de fato, na própria criação literária, pertence ao onirismo. A imagem literária é mais viva do que qualquer desenho. Ela é mesmo movimento sem matéria, é movimento puro. (Gaston Bachelard, A terra e os devaneios do repouso, p. 165) ix x RESUMO: Esta tese propõe uma nova leitura da obra literária de Cyro dos Anjos, tendo como ponto de partida a questão do mito quixotesco, constantemente referida nos romances do Autor. Estuda-se, assim, o mito, tendo como base a obra de ciência das religiões, de Mircea Eliade, bem como a fenomenológica de Gaston Bachelard. O caráter quixotesco é fundamentado em afirmações amplamente consagradas pela clássica crítica literária acerca da obra de Cervantes, sendo os estudos mais importantes, os de Miguel de Unamuno e José Ortega y Gasset. Esse caráter quixotesco é representado por toda a esfera imaginativa, sobretudo a arte e a poesia. Para Cyro, a poesia é a própria vida, compreendendo também o amor, a memória, o sonho, a música, a crença religiosa e até mesmo Deus, a poesia suprema. A tese aponta Cyro dos Anjos como partidário do quixotismo cervantino, revelando-o como um Autor que transpõe o idealismo mítico universal para uma obra genuinamente brasileira. PALAVRAS-CHAVE: Cyro dos Anjos; Crítica e Interpretação; Quixotesco; Mito e Romance. xi xii ABSTRACT: This study proposes to present a new interpretation of the literary work of Cyro dos Anjos, based on the Quixotesque myth, constantly mentioned in the Author‟s novels. The myth is discussed from the work of Mircea Eliade, based on the study of religions, as well as from the fenomenology of Gaston Bachelard. The Quixotesque characteristics are based on already established ideas by the classical literary criticism of Cervantes‟s works, such as the studies by Miguel de Unamuno, José Ortega y Gasset. Art and Poetry are the major representatives of the Quixotesque, that means the imaginative sphere. For Cyro dos Anjos, Poetry is Life, and also includes love, memory, dream, music, religious belief, and even God – the supreme Poetry. This study presents Cyro dos Anjos as a follower of Cervantes‟s Quixotesque, but as an Author who carries this universal mythical idealism to a genuine Brazilian novel. KEYWORDS: Cyro dos Anjos; Criticism and Interpretation; Quixotesque; Myth and Novel. xiii xiv Sumário Introdução 1 Capítulo I – Poesia, mito e imaginação 13 Capítulo II – Belmiro quixotesco 61 Capítulo III – O quixotesco em Abdias e A menina do sobrado 117 Conclusão 175 Bibliografia 191 xv xvi Introdução O quixotesco revela não apenas o parentesco entre as artes, mas também a sua origem comum, situada no mito, no sagrado. Produções do homem, as artes têm ocupado lugar privilegiado na formação da civilização e da sociedade. Porém, além de sua característica humana, a arte possui um atributo sagrado, que inspira quem cria. Tudo isso mostra uma intensa relação entre o homem e o Cosmos. Podemos tentar definir o quixotesco como uma instância na qual predominam a interioridade, o intimismo, a fantasia, a irrealidade (o verdadeiro real), o sonho, a idealização, o imaginário... Todos esses aspectos são materializados por meio das artes – música, pintura, dança –, mas, sobretudo, pela literatura e pela poesia. Nesta definição, o poético é o que melhor exemplifica a questão quixotesca. Dom Quixote, o cavaleiro que enfrentou moinhos de vento, tomando-os por gigantes, dá nome ao mundo imaginário. Enfeitiçado pelas leituras de romances de cavalaria, parte em busca de aventuras, para honrar sua dama imaginária, revelando a existência da relação direta entre a literatura e a imaginação, ambas coexistentes e co-dependentes. Essa é a relação que se constata a partir da obra de Cyro dos Anjos. Mas não se trata, aqui, necessariamente, de um mito quixotesco idêntico ao que expõem Cervantes, Unamuno, Ortega y Gasset e vários outros renomados escritores e críticos. Cyro cria, para si, o seu próprio mundo quixotesco, com notas muito pessoais, mesmo embasando-se no mito primordial, de Dom Quixote. Trata-se, então, de uma interpretação própria, do mito quixotesco, adequada à sua visão poética do mundo. Nessa visão, privilegia-se o literário, como elemento formador do ser humano. É com o intuito de esclarecer quais as características de Dom Quixote presentes na literatura de Cyro, que se elabora esta tese. Muitas vezes, o quixotesco não só se confunde com o poético, com as artes, como com elas se identifica, pois é essencialmente poético. Pelo seu caráter interiorizado, imaginativo, a sua identificação com a poesia pode ser ilustrada pela definição de Octavio Paz: 1 La poesía es conocimiento, salvación, poder, abandono. Operación capaz de cambiar al mundo, la actividad poética es revolucionária por naturaleza; ejercicio espiritual, es un método de liberación interior. La poesía revela esse mundo; crea otro. Pan de los elegidos; alimento maldito. Aísla; une. Invitación al viaje; regresso a la tierra natal. Inspiración, respiración, ejercicio muscular. Plegaria al vacío, diálogo com la ausencia: el tedio, la angustia y la desesperación la alimentan. Oración, letanía, epifanía, presencia. Exorcismo, conjuro, magia. Sublimación, compensación, condensación del inconciente. Expressión histórica de razas, naciones, clases. Niega a la historia: en su seno se resuelven todos los conflictos objetivos y el hombre adquiere al fin conciencia de ser algo más que tránsito. Experiencia, sentimiento, emoción, intuición, pensamiento no-dirigido. Hija del azar; fruto del cálculo. Arte de hablar en una forma superior; lenguage primitivo. Obediencia a las reglas; creación de otras. Imitación de los antiguos, copia de lo real, copia de una copia de la Idea. Locura, éxtasis, logos. Regresso a la infancia, coito, nostalgia del paraíso, del infierno, del limbo. Juego, trabajo, actividad ascética. Confesión. Experiencia innata. Visión, música, símbolo. Analogía: el poema es un caracol en donde resuena la música del mundo y metros y rimas no son sino correspondencias, ecos, de la armonía universal. Enseñanza, moral, ejemplo, revelación, danza, diálogo, monólogo. Voz del pueblo, lengua de los escogidos, palabra del solitário. Pura e impura, sagrada y maldita, popular y minoritaria, colectiva y personal, desnuda y vestida, hablada, pintada, escrita, ostenta todos los rostros pero hay quien afirma que no posee ninguno: el poema es una careta que oculta el vacío, ¡ prueba de la superflua grandeza de toda obra humana! (PAZ, 2008, p. 13). A partir do trecho de Paz, torna-se fácil identificar características essenciais do poético, ao mesmo tempo em que nos certificamos da impossibilidade de defini-lo com palavras. Da mesma forma, o quixotesco, que seria uma aplicação do poético na vida do poeta e do leitor, revela-se um fenômeno que não é passível de ser reduzido à compreensão meramente racional.
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