Alfredo Jaar Milão, 1946: Lucio Fontana visita seu ateliê em seu retorno da Argentina, 2013. caixa de luz com transparência em preto e branco 622,3 × 622,3 × 45,7 cm (Fonte: http://artsy.net/artwork/) 20

ISSN 1517-5677

Arte e Política no Contemporâneo

Editor: Luiz Sérgio de Oliveira Coeditor convidado: Jorge Vasconcellos Ano 13 - Dezembro de 2012

Revista do Programa de Pós-Graduação em Estudos Contemporâneos das Artes Universidade Federal Fluminense Rua Tiradentes 148 – Ingá – Niterói – RJ|CEP 24.210-510 tel. (21) 2629 9672 Universidade Federal Fluminense Instituto de Arte e Comunicação Social Poiésis / Revista do Programa de Pós-Graduação em Estudos Contemporâneos das Artes

Editor Conselho Consultivo Luiz Sérgio de Oliveira Ana Beatriz Fernandes Cerbino (UFF/PPGCA) Coeditor Convidado Ana Cavalcanti (UFRJ/ EBA-PPGAV) Jorge Vasconcellos Andrea Copeliovitch (UFF/PPGCA)

Conselho Editorial André Parente (UFRJ/ ECO) Luciano Vinhosa Ângela Âncora da Luz (UFRJ/ EBA-PPGAV) Luiz Guilherme Vergara Carolina Araújo (UFRJ/ IFCS-PPGF) Luiz Sérgio de Oliveira Jorge Vasconcellos (UFF/PPGCA) Josette Trépanière (UQTR/Canadá) Agradecimentos Especiais Alfredo Jaar Leandro Mendonça (UFF/PPGCA) Ana Godinho-Gil Ligia Dabul (UFF/PPGCA) Art21 Luciano Vinhosa (UFF/PPGCA) Caroline Alcione de Oliveira Leite Luiz Guilherme Vergara (UFF/PPGCA) Eduardo Augusto Alves de Almeida Luiz Sérgio de Oliveira (UFF/PPGCA) Gisele Ribeiro Maria Luisa Távora (UFRJ/EBA-PPGAV) Guilherme Wisnik Martha D’Angelo (UFF/PPGCA) Isabela Frade Martha de Mello Ribeiro (UFF/PPGCA) Jorge Vasconcellos Pedro Hussak Van Velthen Ramos (UFRRJ - UFF/PPGCA) Luiz Carlos de Carvalho Sally Yard (University of San Diego, EUA) Magali Melleu Sehn Tania Rivera (UFF/PPGCA) Marcus Vinicius de Paula Rachel Souza Ued Maluf (UFF/ PPGCA) Ricardo Maurício Gonzaga Viviane Matesco (UFF/PPGCA) Rosana Costa Ramalho de Castro Tato Taborda (UFF/PPGCA) Produção Gráfica Thom Donovan Projeto Gráfico: João Alt e Joana Lima Viviane Matesco Designer Gráfico: Joana Lima Produção Editorial Revisão Linguística: Caroline Alciones e Luiz Sérgio de Oliveira Almir Miranda da Silva Web-designer: Cláudio Miklos

Poiésis é uma publicação semestral do Programa de Pós-Graduação em Estudos Contemporâneos das Artes da Universidade Federal Fluminense. Versão online: http://www.poiesis.uff.br/

© 2012 by PPGCA – É permitida a reprodução total ou parcial do conteúdo desta publicação, desde que para fins não comerciais e que os créditos e referências à publicação sejam feitos.

Esta publicação foi parcialmente financiada com recursos da Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação da Universidade Federal Fluminense, através do Edital FOPESQ. Sumário

09 Editorial

Dossiê: Arte e Política no Contemporâneo Organizador: Jorge Vasconcellos

13 Arte e Política no Contemporâneo: o Comum e o Coletivo... Jorge Vasconcellos

17 Espaço público em fuga: arte e arquitetura brasileiras na virada dos anos 1960 Guilherme Wisnik

33 Da arte pública à esfera pública política da arte Gisele Ribeiro

45 As probabilidades desiguais de Francis Bacon Ana Godinho Gil

Entrevista

59 Cinco questões por uma prática contemporânea com Suzanne Lacy por Thom Donovan Tradução: Caroline Alciones e Luiz Sérgio de Oliveira

Artigos

73 Charles Baudelaire: contemporâneo do passado, do presente e do futuro Eduardo Augusto Alves de Almeida

85 A fratura iconológica Marcus Vinicius de Paula

105 Corpo, ação e imagem: consolidação da performance como questão Viviane Matesco 119 Eu, robô? o trânsito do ser humano ao pós-humano em Ricardo Maurício Gonzaga

137 A preservação da arte contemporânea Magali Melleu Sehn

Página do artista

151 Blanco y Negro, 2001-2013 Luiz Carlos de Carvalho

Ditos + Escritos

159 Stencil como arte pública Rachel Souza

161 Stencil como arte vívida Isabela Frade

165 Stencil como arte pública, de Rachel Souza Rosana Costa Ramalho de Castro

169 Normas para submissão

Campo doDesejo pelaUniversidade Federal dasFaculdades (2007)”. individuais ecoletivas noBrasileexterior, como se apresenta “doutor emCuradorismo no que, tendoexposto artista suasobrasemmostras porLuiz CarlosdeCarvalho, do artista” Publicamos Blanco y Negro , projeto de arte criado exclusivamente também para a “página publicação. raram paraampliaroescopo detemaseabordagensdesta Santo eUniversidade Federal de MinasGeraisque,comsuaspesquisasereflexões, colabo- Federal doRiodeJaneiro, Universidade Federal Fluminense,Universidade Federal doEspírito Melleu Sehn,respectivamente pesquisadoresdaUniversidade deSãoPaulo, Universidade Almeida, Marcus Vinicius dePaula, Viviane Matesco,RicardoMaurícioGonzagaeMagali Para alémdodossiê,aPoiésis 20contoucomacolaboraçãodeEduardo Augusto Alves de na produçãodearterecente. a busca de um melhor entendimento acerca de algumas das manifestações mais instigantes trevista deSuzanneLacy, eteóricacujosescritospráticasartísticastêmenfrentado artista neira acontribuirparaessatrocadeideiasnaconfluênciaentrearteepolítica,publicamosen- partir de “perspectivas acríticadearte,históriadafilosofiaarte”. distintas: Dema- convidados Guilherme GiseleRibeiroe Wisnik, Ana Godinho-Gilemumdiálogoaprofundadoa em tornodequestõesquearticulamarteepolíticanocenáriocontemporâneo,tendocomo rânea dasartes.Nestenúmero,coubeaJorge Vasconcellos aorganizaçãododossiêcentral so com o adensamento do debate crítico multidisciplinar em torno da produção contempo- entreosperiódicoscientíficosdedicadosàsartes,reafirmandoseucompromis- de destaque Contemporâneos das Artes daUniversidade Federal Fluminense,aPoiésis consolidaseulugar Chegamos aonúmero20daPoiésis! Publicada peloPrograma dePós-GraduaçãoemEstudos Editorial

9 - Editorial 10 - Revista Poiésis, n 20, p. 9-10, Dezembro de 2012 possível. das Artes daUniversidade Federal publicaçãonãoteriasido Fluminense,semosquaisesta do número 20 da Poiésis, revista do Programa de Pós-Graduação em Estudos Contemporâneos Para finalizar, aênfase noregistrodenossoprofundoagradecimentoatodososcolaboradores Ramalho deCastro. Costa lada edição, Estudos Contemporâneosdas Artes daUniversidade Federal Fluminense.Emsuaprimeira juntoaoProgramareflexão apresentadas dePós-Graduaçãoem emtornodasdissertações Fechando onúmero,aPoiésis inauguraumanova seção–Ditos+Escritos–,espaçode Stencil comoartepública,seguidodoscomentárioscríticosdeIsabelaFrade eRosana apresenta um breveDitos + Escritos apresenta de Rachel resumo da dissertação Souza, intitu - Os Editores

lher aquiloqueseriao qualpropõeJacques“Comum” (tal Rancière). Precisamente: nãosó deexistir.singularidades, todaequalquersingularidadecomopotência absoluta Emais,aco- Foucault (masparticularmenteemGillesDeleuze &FélixGuattari) éacapacidade deafirmar processo singular de constituiçãoda ética, mas também estética de si. O político em Michel ou processosderefundaçãosimesmo.Opolítico, pode-sedizer, éomaisaltomomento biopolíticos deresistênciaaospoderesinstituídos, sejam elesprocessosglobaisecoletivos talvez nadamaissejaqueinventar novas subjetividadesemderiva, istoé,constituir processos coletivas fundadorasdenovas possibilidadesaoexistir... Política hoje,nocontemporâneo, lítica comoumcampoabertoàsexperimentações.Experimentações/experiênciasdeações rumo políticaearte.Ouainda,pensarapo- danauearticularvigorosamente,agora,também 1990, tecerofioquerelacionava eligava políticaeética,masretomaro fundamentalmente fato, colocá-la em outras bases. Talvez não seja mais, como sefez urgência nos anos1980- arte epolíticanaatualidade. Issoporqueentendemosproblematizarapolíticaseria,de Os textosumagamadeperspectivas aquireunidospretendemapresentar dasrelaçõesentre Universidade Federal Fluminense. Publicou, entre outros, de do Departamento Artes eEstudos Culturais/RAE edoPrograma dePós-GraduaçãoemEstudos Contemporâneosdas Artes da *Jorge Vasconcellos é Doutor, egraduadoemFilosofia,UFRJ, Mestre,Especialista alémdetercursadoCinema naUFF. ÉProfessor e Deleuze (2010). Arte ePolítica noContemporâneo: Deleuze e eoCinema (2006) o ComumeColetivo... Arte, Vida ePolítica: ensaios sobreFoucault Jorge Vasconcellos *

13 - Arte e Política no Contemporâneo: o Comum e o Coletivo... 14 - Revista Poiésis, n 20, p.13-16, Dezembro de 2012 zomático. Ointelectual radical nãoéumindignado... elenãoseindigna, revolta-e-age... emnomedepráticaspolítico-estéticas de modo ri- -la... aforma-Estadoéraiz; daínossaluta Iràraizedecepá- incessantescontraaforma-Estado quesetrata. delutas pois éjustamente econforto na buscadebemestar paraosauspícios umaboavidaburguesa, leis doEstado, ativismo dadiferença. Trata-se quenãoapenasreformem mas lutas as deempreenderlutas, cas ehegemonizadorasdestemesmopresente. Trata-se deum deumativismo, entretanto, Este pensaráopresentenopresente,maspensando-o acontrapelodasleituras hegemôni- necessidade deumintelectual deoutrotipo,quetemos aquichamado de fetividade –movimento Queer;mulheres–pós-feminismo a etc).Denossaparte,apontamos são participantes:váriosaquiosativismos(negros –açõesepráticasafirmativas; homoa- cífico”; dasquaisele(as) ocorre noseiodaslutas quesuapráticadepensamentojustamente contemporaneamente opapeldeintelectual luz,pelo que eledenominoude “intelectual espe- o nascimento de um novo tipo de intelectual partidário que ocupou que sucederia o militante ilibada(ocasoDreyfus correção ética edereputação ),nossofilósofode suposta apresentou intelectual públicoquefala emnomedooutrodefendendo eimbuído posiçõeshumanistas telectual luz”(aquelequepodever pelooutroeiluminardoravante seuscaminhos),paraum decertointelectual,mental típicodaépocadoEsclarecimentooqualeledenominoude Isso porque se Foucaultmos instantâneos. apontou em sua obra um deslocamento funda- Este novo tipodeintelectual-ativista-participativo, aquelequepraticaaçõespontuais eativis- realmente umnovo tipo deintelectual naesfera pública,umintelectual ativista-participativo. Bey). Trata-se de reinventarmo-nos como intelectuais e como artistas. Trata-se de fazer nascer hordas nômadesquesefazem deslizaremZonas Autônomas Temporárias (TAZ, comoHakim Deleuze), a partir daí – seja no plano microsocietário dos grupelhos empreendendo lutas e de ultrapassamentodassociedadesdisciplinaresparaascontrole(Foucault/ –nãosócomosedeucomoprocesso porâneos, sejanoplanomacrosocietáriocapitalístico roso campodoComum,talvezsejaoquesefaça maisurgente clamaraosnossoscontem- econtrole...Fazerassujeitamento políticadadiferença, umvigo- politizaraestética,instaurar constituem os dispositivos do biopoder, suas tecnologias de docilização, disciplinarização, reverterbuscar o espaço deste mesmo Comum, como também as correlações de força que “intelectual radical” “in- . mente paraoperar soboutrarubrica conceitual eproblemática:osentido deesfera pública. na qualdespontouaideia de “arte pública”, típicadosnos1970, desloca-secontemporanea - A autoraprocuramostrarem seuartigoqueodebateacercadarelaçãoentre arte epolítica tica apartirdosanos1970, tendocomopontodeinflexão anoçãode “arte eesfera pública”. O segundotexto, escritopelaprofessora GiseleRibeiro,analisa asrelaçõesentrearteepolí- politizar opensamentosobreurbanonoBrasil. blemáticas de Vilanova Artigas e Paulo MendesdaRocha emsuasrespectivasde propostas privilegiando emsuasanálisesocasodaarquitetura edourbanismoapartirdasfigurasem- mostra comohouve nesteperíodoumafulguraçãoderadicalidadepolítica nocampodaarte, lisado oespaçopúbliconaarteearquitetura brasileiras nofimdosanos1960. Otexto Guilherme O primeirodeles,escritopelocrítico,arquiteto e ensaísta noqualéana- Wisnik, por meiodeseustrêstextos. dessa possibilidade de invenções da política no plano da arte que este dossiê procura tratar que tornemnovamente possívelpolíticaquantoartisticamente.É ademocraciaradical,tanto somente poderá ser forjado por intermédio de estratégiascoletivas... invenções coletivas arte epolíticacomoproblemaparaoContemporâneo.Defendemos, então,queesteComum práticas. Nossaintençãoétrabalharreflexivamente emconjunto,partindodarelaçãoentre entresi,borrando limites,produzindocamposampliadosemsuas contágio efrequentação audiovisual, oteatro/aperformance/a zona dançaeasartesvisuaisnãoestejamemcerta de não é mais possível produzir um pensamento da arte no Contemporâneo no qual o cinema/o tudo, devem serpensadas demodotransversal, heterodoxo etransdisciplinar. Issoporque para aproduçãodeumsentidocríticoofazer artísticoentrenós.Essaspráticas,con- e linguagens.Essedebatesobreapolíticadasartesemnossaatualidade épontodepartida aocampodasartes,desuaspráticas mamos deContemporâneo,emespecialnoquetange Pensar as relações entre arte e política, assim queremos crer, é uma das tônicas do que cha- nocampodasartes. sejam oquenoséComumapartirdeaçõesdiretas e ativismopolíticodevem necessariamenteserradicais:praticariniciativas coletivas queen- E alémdisso,eleocupa,atua ereterritorializa oquefoi antesdesterritorializado, poisatuação

15 - Arte e Política no Contemporâneo: o Comum e o Coletivo... 16 - Revista Poiésis, n 20, p.13-16, Dezembro de 2012 esfera pública,épensar paraalémdomercadodearte. têm algoqueasunifica:pensaroContemporâneo,nocampodasartesedesuainserçãona essasperspectivas acríticadearte,históriadafilosofiaarte.Entretanto, distintas: Os trêstextos têmcomopontodeinflexão relacionararteepolíticapartindodeperspectivas sar filosoficamenteaobradopintorirlandêsFrancis Bacon. Lisboa, Ana GodinhoGil,analisaoproblemadarelaçãoentrearteepolítica,procurandopen- O terceiro e derradeiro texto, de autoria da professora de filosofia da Universidade Nova de (Publifolha, 2009) USP. Publicou, (CosacNaify, entreoutros,LucioCosta 2001), VelosoCaetano (Publifolha,Crítico:ÀDeriva eEstado nasCidades 2005) *Guilherme formado éarquiteto,críticoeensaísta, em arquiteturaWisnik edoutorpelaFaculdade de Arquitetura eUrbanismoda Mendes daRocha Keywords: artandarchitecture inthe1960s, Vilanova Artigas, Paulo tion ofthecriticalthoughtonurbaninBrazilthat period. and Paulo MendesdaRocha intheirrespective proposalsonthepoliticiza- architecture andurbanismfromtheemblematicfigures of Vilanova Artigas radical politicsinthefieldofart,privilegingitsanalysis thecaseof tecture attheendof1960s. Itshows thattherewas afulgurationof ABSTRACT: This articleanalyses thepublicspaceinBrazilianartandarchi- Mendes daRocha Palavras-chave: artee arquitetura nosanos1960, Vilanova Artigas, Paulo de politizaropensamentosobreurbanonoBrasilentão. Vilanova Artigas e Paulo Mendes da Rocha em suas respectivas propostas caso daarquitetura edourbanismoapartirdasfigurasemblemáticasde radicalidade política no campo da arte, privilegiando em suas análises o brasileiras nofimdosanos1960. Mostracomohouve umafulguraçãode RESUMO: Esteartigoanalisaoespaçopúbliconaarteearquitetura Espaço públicoemfuga: arte earquitetura brasileiras navirada dosanos1960s Guilherme Wisnik*

17 - Espaço público em fuga: arte e arquitetura brasileiras... 18 - Revista Poiésis, n 20, p. 17-32, Dezembro de 2012 dialético interpretado arquitetonicamente.(WISNIK,2010)dialético interpretado através da forma. aexpressão Oseubrutalismo é,portanto, quaseliteraldeummaterialismo empregou asenormesmassasdeconcretocomoexplicitação agônicadeconflitossociais fetichista da construção acabada.Membroatuante doPartido Brasileiro, Comunista Artigas no concretoarmadoapareciamcomosinaisdotrabalho naobrafeita, impedindoareificação através da qual a exposiçãosão claramente marxista, das marcas das fôrmas de madeira 1969, econstruindo razão aela,projetando aquelasque sãoasduascasas Artigas deu total pre severa, quasepuritana.” (BARDI, 1950) Edefato, quasevinteanosdepois,entre1968 e de rotinadohomem”, mas aocontrário,lheimpunhamumaleivital, “uma moralqueésem- premonitoriamente queas casasde Vilanova Artigas nãoseguiam pelavida “as leisditadas Já em1950, LinaBo italiana Bardi, aarquiteta entãorecémchegada aoBrasil, observara pelo últimoLe Corbusier, o “brutalista”. Corbusier, o “purista”, foi aarquitetura dosanossessenta fortemente paulista influenciada Se aarquitetura sobosauspíciosdoprimeiroLe modernacariocasurgiunosanostrinta “Brazilian style”. dasimagensquederamamarcadaquiloficouconhecidonoexteriordistanciou-se como rior, baseadanaleveza formalcomanatureza enaintegraçãohedonista tropical.Comisso, arquitetura nãodesenvolveu paulista umarelaçãofrancaetransparenteentreinteriorexte- especulação imobiliária. Assim, diferentemente fluminense, a do que aconteceu na capital de umacidade,quecresceumodomuitorápidoecaótico,soboimpulsopredatórioda ganhou acentomaistécnico.Paralelamente, deincorporaraopacidade seusedifíciostrataram não daEscoladeBelas Artes –comonocasodoRio–,oensino dearquitetura emSãoPaulo Paulo, centroindustrialefinanceirodopaís.NascidonointeriordaFaculdade deEngenharia,e vidade daproduçãoarquitetônicanacionaljásehavia deslocado doRiodeJaneiro paraSão de maiorradicalidade.QuaseumadécadadepoisdainauguraçãoBrasília,ocentrogra- No finaldosanos1960, aarquitetura umdosseusmomentos brasileiraatingecertamente Entre ourbanoedoméstico pelo mestre franco-suíço nocontexto amargo do pós-SegundaGuerra Mundial “Escola Paulista”, combinouoaspecto críticodaquelarevisão da feita“utopia maquinista” 1 2 Vilanova Artigas, olíderdessegrupo chamado de

3 , aumavi- trava avançado em umpontobastante desua procuraemrompercom aarteobjetual da em Londres, ocorrida entrefevereiro eabrilde1969. Naquele momento,Héliojáseencon- agudos. Umbomíndicedisso éagrandemostradeHélioOiticicana Whitechapel Gallery, Na mesmaépoca,pode-se dizerumdeseus pontosmais que a artebrasileiraatingetambém exteriorizadas, aindaqueespacialmente introvertidas. casasinteiramente de quesuasformasinstigamareação. São,portanto, pedemresposta, deMottada ordemsocialcontrolamoarbítriosubjetividade individual–daíaobservação va pelaliberdadedooutro,poisasregras dacidade, ondecadaumtemsualiberdadepautada em prol de uma ideia cívica de vida inteiramente pública: a casa como um fórum da vida coleti- em peças contínuas. O que desejavam, era abolir o espaço privado portanto, e seus segredos, mântica eburguesadelar–realizando,porexemplo, umafusãoentrearquitetura emobiliário ximo possível aintimidade,extirpando asmarcasidiossincráticaspessoais ligadasàideiaro- estavam procurando, naquelemomento,eraurbanizaravidadoméstica,istoé,aboliraomá- Como ficaclaroatravés dessesexemplos, oquearquitetoscomo Artigas eMendesdaRocha responsabilidadesocial.”lho criadorcomsuaimplícita (MOTTA, 1967, grifo meu) condições derespeitohumano”. porqueétraba- Ecompleta: quepederesposta, “é proposta oconvívioum aceita comosdemais,semmuradassólidas,masdentrodenovas eprocuradas despojamento supõeum “relacionamento doviver meio sons edosodores. Trata-se deumespaçocriadocomo “projeto social”, dizFlávioMotta, cujo fazendo dos doespaçointerno daresidênciaumambienteúnicoecontínuodopontodevista que construiu parasipróprioem1964, asparedesdoscômodosnãochegam atocaroteto, varandas paisageminterior:acozinha.E,assimcomonacasa internas,sobreumainusitada interior dacasa. Também ali,osquartosnãoseabremparaoexterior, massedebruçam, como optou porfazer comasfalto, opiso dasaladeestar prolongandooambientegaragemno culmina naresidênciaFernando Millan(1970), dePaulo Mendes daRocha, naqualoarquiteto para pisos,parapeitosemobiliárioemgerallheconfere umaasperezaímpar. Esseprocesso sequer janelas e adominância do concreto edocimento como materiais de acabamento próprios interiores.Nocasodaresidência Telmo Porto, sobretudo, osquartosnãopossuem concreto armadoeaparente,quasequeinteiramentecegasvoltadasparaseus mais radicaisdesuacarreira: asresidências Telmo Porto eMartirani.São,ambas,caixasde favela racionalizada”, noqual “cada

19 - Espaço público em fuga: arte e arquitetura brasileiras... 20 - Revista Poiésis, n 20, p. 17-32, Dezembro de 2012 um depoimento noqualdeclaraagrande influênciadeOiticica em suatrajetóriaartística, deMarcos Bonisson,norte-americano No filmeHéliophonia(2002), oartista dá da cidade. (OITICICA, 1986, p.130) Istoé,oaconchego doúteroéaantíteseespaçofrioeimpessoal as pessoasquechegassem do “frio dasruas londrinas,repetidas,fechadas emonumentais”. no seu de se deixar absorver “calor infantil” proporcionasse um novo para comportamento mo, Hélio procurou criar, na sua nós”, prossegueOiticica, “cada qualéacélula-mater”. (OITICICA, 1986, p.115-116) Emresu- de um “novo mundo-lazer”, istoé,doCrelazer: apromessadeummundoonde “eu, você, módulos experimentaisparaaconstrução de “espaços-casa”, comodizHélio,figurandoaideia laxadamente “à esperadosolinterno,lazer não-repressivo”. Tais como ambientesserviam apóspisardescalçonoscamposdeareia,fenopodia deitar eágua,assimposicionar-sere- penetráveis comchão etelas denáiloncriavam deespuma,cobertas-saco oespaçoondese da mostra,lograndodomesticizaroespaçopúblico(agaleriadearte). Ali, ascamas-bólide,os vivenciaisinstalações deveriam serusadaseaté pelos visitantes-participantes “habitadas” a artista, “criação deliberdadenoespaçodentro-determinado”. (OITICICA, 1986, p.186) Essas curou re-fundaroespaçodagaleriacomo “recinto-participação”, promovendo, naspalavras do dos por caminhos sinuosos com piso de areia e pedra –, uma estruturação que pro- ambiental primeira vez oprojeto “Éden” –areuniãodetendas,camas,ninhos epenetráveis entremea- Mais doqueumagranderetrospectiva desuacarreira, aWhitechapel Experiencerealizou pela dele”. (RAMOS, 2007, p.121-123) brasileira. A saber:oatode “materializar aobranomundoacabaporcriarumrefúgiodentro roço poético” daobradeHélio,segundoNuno,dáotomboaparteartecontemporânea plásticoNunoRamos. Esse artista otambém bem observa “pequenoparadoxo”, queéo “ca- poderosos”, mas,porissomesmo, “cada vezdocontágiomundo”, maispreservados como Malevitch. Projeto que levará brasileiroa oartista “duplicar avidaeminteriorescadavez mais construtivos aartistas desdobrando umprojetovanguardistaqueremonta comoMondriane tal”. Trata-se, afinal, da ideia de embaçar – e, no limite, eliminar – a fronteira entre arte e vida, corpo deforma cadavez maisativa naexperiência daobra,oquechamou de “antiarte ambien- edacontemplação,transformando emparticipanteeincluindoo representação oespectador Whitechapel Experience , um espaço “útero”, onde a alegria Vale lembrarqueotrabalhode Acconci em ça, masdeumcompostoheterogêneoformado porunidadesprivadas. deumespaçopúblicogenericamenteabertoatodos,comoparqueouumapra- portanto, em privacidade e ter uma relação com outras pessoas”. (BRAGA, p. 268) Não se trata, 2008, revelaram umaconcepção nova deespaçopúblico,ondevocê pode,aomesmotempo, “estar gem emespaçodepermanência.Para Acconci, nomeiodomuseu essascápsulasdeestar oespaçodomuseu–demaneiralúdica,transformandoobras –eportanto olugardepassa- o público,emsuacélulaBarracão no.2,formada porumasériedeNinhosa suas “habitar” curto-circuito criado porHélio entre as esferas pública e privada naquelaocasião,aoestimular de Nova York emjulhode1970, daqualambosparticiparam. Acconci serefere sobretudo ao assimilada a partir da exposição coletiva Information, ocorrida no Museu de Arte Moderna fazendo, naquelemomento,eraproblematizar afronteiraentre asesferas pública eprivada esquematicamente opostos, poisapesardessascruciais diferenças, oqueambosestavam Mas não se pense, em por pólos isso, que seria correto posicionarmos arquitetos e artistas por umaartesanalidadeleve ehedonista. Temos, umasignificativa portanto, contraposição. visava doartista aproposta alcançaraintimidade,olazerpuritana, eoacolhimento, guiados letividade eaindústria,lançandomãodopesodeuma asperezamaterialausteraeumtanto zação e a interiorização. E se o projeto dos arquitetos se orientava por categorias como a co- netráveis de HélioOiticica,inversamente, pretendiamdomesticizaravidapública. A exteriori- de Vilanova Artigas ePaulo MendesdaRocha procuravam urbanizaravidadoméstica,ospe- Retomando ofioinicial,éinteressanteperceber, nocasobrasileiro,queseascasasbrutalistas o trânsitosemmediaçõesentresegredoíntimoea publicidade. p. 205)Estáaíamatrizdeumpercursoque Vito Acconci viriaaradicalizar nosanosseguintes: ponto aponto”, sendoqueoseexpunha era,naverdade, essaatividade. (ACCONCI, 2005, expandida.em umespaçodehabitação Assim, a “exposição”, diz Acconci, era “a atividadede em Nova York, transformando adistânciade80quadrasentregaleriaeoseuapartamento de diferentes paraointeriorda galeriaGainGround,também cômodos doseuapartamento época, realizava otrabalho também locar cotidianamenteparaomuseucomobjetivo dechecar sua correspondência. Namesma sua caixadecorreio pessoalparaoespaçoexpositivo, fazendo comqueeleprecisassesedes- Room Piece(1970), noqualtransferia objetospessoais Information Service Area) (Service consistia emdesviar

21 - Espaço público em fuga: arte e arquitetura brasileiras... 22 - Revista Poiésis, n 20, p. 17-32, Dezembro de 2012 passado quase umanoexilado noUruguai. Hélio Oiticica, em1970, apósreceber umabolsa de São Paulo e impedidos de trabalhar no país. Artigas, aliás, já havia sido preso em 1964 e aqui, em 1969 Vilanova Artigas e Paulo Mendesda Rocha foram desligadosda Universidade entraram naclandestinidade. Para até merestringiràbiografiadaspersonalidades citadas presos, torturados, exilados oumortos, eosmovimentos artísticossofreramrestriçõesou de chumbo” estudantes brasileiro –, muitos artistas, e intelectuais do regime militar foram o AI-5 –esobretudo atéofinal do governo Médici,em1974, durante os chamados “anos cativa improdutividadepública. dutível àinstrumentalização dasrelaçõessociaisatravés deexperiências deexplícitaeprovo- Oiticica,porsuavez,de tradiçãopatrimonialista, afirmava asubjetividadecomoantídotoirre- estavam forçandomaisresponsavelmente acriação deumcomportamento civilemumpaís pensos noardeforma contínuaenãohierárquica.Ocorre quese Artigas eMendesdaRocha pela explosão dosuportebidimensional e pelaautonomiadosplanoscromáticostonais,sus- poderemos facilmente associá-losaosNúcleos(1960-63) deOiticica:ambientesformados seu jogoativo efluidodeplanossoltosdefasados, cinzaseocres,opacostransparentes, de SãoPaulo por –projetado Artigas em1961, masinauguradoexatamenteem1969 –,com plos espaçosinternosdoedifíciodaFaculdade de Arquitetura e UrbanismodaUniversidade vo deseususuários como ação e reação. Assim, não époracasoque se olharmospara os am- os limites e convenções exatamente essaqualidadedeindeterminaçãoespacialqueelastêm,umavez querecusam caracterização deFlávioMotta como dessascasaspaulistas “favelas racionalizadas”indica de modoatransgredi-las,inventando assimformas novas eexigentes doviver. Aliás, aaguda anos antes,criao Ato Institucional n Em 13 dedezembro de1968, brasileira,quehavia militar tomadoopoderquatro aditadura Do lixo àterra mento degrupos oumovimentos comooCinemaNovo eo Tropicalismo, entreoutros. cultural ocorrida no país desde 1967 com a radicalização do movimento estudantil e o surgi- lizou atortura. fermentação Oendurecimentodoregimerespondiaaumainédita políticae criou censuraaosmeiosdecomunicação,restringiu enormementeosdireitosciviseoficia- a priori de um ambiente e se abrem ao condicionamento intersubjeti- o 5(AI-5),decretoquedissolveu oCongressoNacional, 4 Após mesmo ano. Sobre isso, conta ZéCelso: mesmo ano.Sobreisso,conta ção edeconstrução queseacumulavam nasruas duranteasobrasdo “Minhocão” naquele por Linanosprópriosescombrosdobairro, istoé,nomistoindistintodeentulhos dedemoli- ruína. O cenário era descartável e amatéria-prima para suaconfecção havia sido encontrada pelos atoresepela platéia ao longo da encenaçãoaté converter-se, ao final, em carcaça nua, figurinos da peça, Lina Bo Bardi transformou opalcoemumringue de box, queeradestruído engajado” deesquerda,quehavia marcadooseuinício.Chamadaaconcebercenárioeos tudo, viraramesa”, naspalavras deZéCelso,afastandodefinitivamente ogrupo do “teatro 1912, foi tomadaentãopeloOficinacomomotedeumarevolução cênicacapazde “quebrar de Bertolt Brecht. A peça do jovem Brecht, entre dois homens na Chicago de que narra a luta Ali, em1969, ogrupo dirigidoporZéCelsoMartinezCorrêa encenouNaselva dascidades, triz viária,situa-se o Teatro apenasvintemetrosdo Oficina,distante “Minhocão”. como oBexiga. cindidoporessabruta cica- violentamente Nesse bairro deimigraçãoitaliana, da cidade,bemcomoalgunsdeseusbairros históricos,popularesecomintensavidacultural, lômetros emeiodeextensão, essesistemadeviasexpressas elevadas cortouaáreacentral o desenvolvimento da indústriaautomobilísticanacional.Comaproximadamente quatroqui- mentismo” dostemposdeJuscelino Kubitschek (1956-60), queconstruiu Brasíliaeincentivou Amazônia, prolongandocomumacentomaistecnocráticoegrandiloquenteo “desenvolvi - ufanista dochamado “milagre econômico”, doBrasildeusinashidrelétricaseestradasna ideológico: oElevado PresidenteeSilva, Costa conhecidocomo “Minhocão”. Em 1970, o governo inaugurou em São Paulo militar a obra que se tornou seu grande marco experimental, combinandoguerrilha políticaaumaespéciede “guerrilha artística”. vezes,caminhos maissubterrâneos e,muitas radicalizaramaindamaissua “negatividade” permanecendo lá durante oito anos. As manifestações artísticas que persistiram, trilharam da Fundação Guggenheimmudou-separa Nova York emumaespéciedeexílio voluntário, Então tinhaaquele lixo lá noBexiga sendo removido, ealiássendosubstituído porumoutro:o naquelebairro lá,queestavacom agente,aconteciatambém sendo entulhado delixo. (…) ruas aomeioedevastou tudo… Me dava asensação dequeoaconteciacommundo, Um mundodecortiços,rasgados derepenteporesseMinhocão,viadutoquepartiuas [O Bexiga] eraumbairro fantástico, marginal. Tinha milhõesdebocas, umamargináliaincrível! 5 Eraotempo

23 - Espaço público em fuga: arte e arquitetura brasileiras... 24 - Revista Poiésis, n 20, p. 17-32, Dezembro de 2012 daí adenominação de “geração tranca-ruas” alipresentes. Emseu aumapartedosartistas em 1968 –,equeacontecia nocontexto deforte resistênciaedenúnciaàrepressãopolítica, promovidas peloMuseude Arte Moderna doRiodeJaneiro, comooevento antecedidapor algumas açõespioneiras organizadas deartepública nopaís–imediatamente Parque Municipal dacidadeeseusarredores. Tratava-se deumadasprimeirasmanifestações Horizonte, que reuniu ações artísticas em áreas externas ao Palácio das Artes; no caso, o Em abrilde1970, ocríticodearteFrederico Moraiscurouoevento Docorpoàterra, paralisações porfaltadeverbas noqualoOficinaseconverteu defato emescombros. guração donovo teatrojánoraiardosanos1990, depoisdeumpenosoprocesso deobrase somente depoisdoexílio deZéCelsonaEuropaeÁfrica(1974-78) eterminoucomainau- acabou levando ogrupo aumprocessodeautodestruição criativa seiniciou que,noentanto, 207) Assim, a experiência de pelo corodeditirambos,comoumgrupo p.206- deescola samba.(LOPES;COHN,2008, umteatro-sambódromo,sematradicional um palco-pista, parede”,“quarta eprotagonizado necessidade dedemoliro Teatro Oficinaparaconstruir umnovo edifício,pensadoentãocomo terra originaldobairro doBexiga, existente pordebaixo dopiso,ZéCelsoeLinasentirama queentãodavaprotagonista passagemparaonovo teatrodocorodionisíaco–,echegar à ringue de box – metáfora das antiquadas estruturas sociais, assim como do “velho” teatro do experiência catárticadeNaselva dascidades . Porque depoisdedestruir seguidamenteaquele explica forma decerta ahistóriatransformação dopróprioedifício Teatro Oficina,apósa p. 51)Comefeito, é interessantepercebercomoessaessênciasacrificialdotropicalismo o Brasil”eseuelogiodetudo oquelhesparecesseaprincípioinsuportável. (FERRAZ,2005, daestéticatropicalista, masoquista “com suareproduçãoparódicadoolharestrangeirosobre te asuaamadabossanova, Caetano Veloso retomaaafirmação deZéCelsoacercadocaráter Ao analisaravocação parricida dotropicalismo,queparaexistirsimbolicamen- precisou matar catava oquehavia demaissórdido,triava ebotava nocenário.(CORRÊA,1998, p.168) rua: ‘Quebonito!Quemaravilha!’ pensavam Osmaquinistas queamulherestava maluca;ela Tanto que a gente não pagou quase nada para o cenário. Ela saía feito uma doida no meio da bém: a Lina Bardi, que fazia a cenografia da doteatro.Etinhaolixo- Minhocão, quepassahojeemfrenteàporta dedentrodoteatrotam Na selva das cidades , replicando ao avesso a obra do Minhocão, Selva, pegava o lixo do Bexiga e trazia para o palco. Arte no Aterro, Arte em Belo Ou olixeiro”. (DRUMMOND, p.35) 2008, considerado umaprovocação. Elateráporperto,sempre,apolícia. A repressãonão tardará. linguagem –eaordem.Fazer arteàmargemdo sistema,invendável eirrecuperável, podeser próprias palavras, “situar oobjetode artefora do museu,questionandosuaaura,ésubverter a for recolhido logo, começaráacheirar muito mal.” Moraisagoracom suas Assim, completa dos lixeiros deLondres naquele momento: “o lixo da rainha é igual ao de todo mundo:se não do chefe doslixeiros doPalácio deBuckingham, emjustificativa àgreve decincosemanas te osretiraramdecena. A propósitodisso,Frederico Moraiscitoucomhumoradeclaração policiais, políticosefuncionáriosdoparquequeoscondenaram publicamenteousimplesmen- tonomia estéticaesechocaram defrentecomasregras sociais,encarnadasnessecasopor dos desaparecidospolíticos.Éevidente quetrabalhoscomoessescruzaram afronteiradaau- no cotidianodacidadeequenãodeixavam deevocar adesova, militar, peladitadura decorpos das doribeirão Arrudas, fazendo-as apareceranonimamente comoobjetosmórbidosboiando trouxas depano,conhecidascomoTrouxas, easdespejounaságuaspoluí - ensanguentadas e totem-monumento aopresopolítico,emqueCildoMeirelesateoufogo adezgalinhasvivas, ros quesetornarammarcantesnahistóriadaartebrasileira.Refiro-me àsaçõesTiradentes: Foi quedoisjovens emDocorpoàterra, noentanto, realizaramtrabalhosefême- artistas entre arteevidanoBrasil:umaviadeacessoàdesrepressãodocorpoindividualsocial. institucionais eurbanasquepareciamimpedir, naquelemomento,umencontromaisfraterno signo urbano. Símbolo da vida, essa “terra-mãe” aparece como antípoda das espessas capas Bo Bardi –recaisobre oelementonatural aterra, enãoexatamentesobreum eessencialista, Note-se aqui, quea referência redentora – a exemplo doque aconteceu no cenário deLina -se comoselementosnaturais, comoestrutural básicodavida”. (DRUMMOND, p.51) 2008, encontrariam segundo Morais, os artistas “a terra”, istoé, “o corpo envolvido eenvolvendo- Assim, nesseprocesso dedesinstitucionalização ecríticaàmercantilizaçãodaarte,ainda cidade “expositiva” dos museusegalerias.(DRUMMOND, p.31) 2008, engendrartrabalhosmaisativamente- artística quepossibilitaria críticos,emoposiçãoàestati discurso curatorial,Moraisassociava doespaçoexterno aconquista umsignodevitalidade Situação T/T,1, emque Artur Barrio enroloupedaçosdebarro, carne,ossosesangueem

25 - Espaço público em fuga: arte e arquitetura brasileiras... 26 - Revista Poiésis, n 20, p. 17-32, Dezembro de 2012 dos anos1960. Dizele: “é curiosoque a artenorte-americanacontemporânea aH.O. tenha termo de comparação entre as artes brasileira e norte-americana gem, retira um importante descreve odesertocomomaiordoslabirintos: o “labirinto dapuraexterioridade”. Dessaima- NunoRamos lembra deumcontoJorgeem umainterioridadeinfinita, LuisBorges que Ao analisarosignificadodaobsessão deOiticicapelametáfora dolabirintocomomergulho de modernizaçãobrasileira,comomostraSérgioBuarque deHollanda,entreoutros. segundo interessespessoais.Essaprática marcafortemente“patrimonialista” aexperiência desdobrado modernamentenadebilidadedesuasinstituições viaderegra, civis,tratadas, rompido com a declaração da Independência (1822) e a criação da República (1889), e por isso estrutural deumacargahistórica:opassadocolonial e escravocrata dopaís,nãointeiramente tância pública ea oficialidade repressora encarnadapelo regime militar, quanto pela marca por questõesconjunturais, relativas àassociação,inevitável naquelasituação, entreains- aderir aumadimensãomaisedificantedeespaçopúblico. Oqueseexplica, ameuver, tanto Como ficaevidente, havia brasileirosem naquelemomentogranderesistênciadosartistas é asua “lata-fogo”, queHéliodescreve daseguintemaneira: passantes, ficantesedescuidistas”. (OITICICA, 1996, p.104) A materializaçãodessaproposta baldios da cidade como displicentemente, para ser ‘achada’“uma obra perdida, solta pelos cotidiana”, sejam colocados em terrenos e propõe que os trabalhos de arte realmente vitais após acriação do Parangolé, declara que o artista “o museuéomundo”, isto é, “a experiência literis daartequandoencerrada emmuseusegalerias,seguequase cionalização mercantilista A críticadeFrederico Moraisem1970 doconceitode àestaticidade “exposição”, eàinstitu- Um enorme penetrável a argumentação deHélioOiticicaemseu a argumentação de1966.“programa ambiental” Ali, doisanos repente seapagaumdia,masenquantoduraéeterno.(OITICICA, 1996, p.104) sós, iluminandoanoite(ofogo quenuncaapaga)–sãoumailustraçãodavida:ofogo duraede quenadaexiste pela cidade:jurodemãospostas maisemocionantedoqueessaslatas ‘obra’ aover, nacaladadanoite,asoutrasespalhadascomoquesinaiscósmicos,simbólicos, geral’: quemviualata-fogoisoladacomoumaobranãopoderádeixardelembrarqueé é a obra que eu isolei na anonimidade da sua origem– existe aí como que uma ‘apropriação 6 ipsis de lugardadimensãopúblicanoBrasil. significou oexíliocomoqueexplicitandoeconsagrandoaeternaausência dopróprioEstado, lização daarte,seguindoomitonorte-americano “estrada aberta” UnidosrepresentouummovimentoEstados radicaldedesinstitucionalização edesmercanti- émuitosignificativoA respeitodisso,noentanto, ofato deque seafugaparaodesertonos ência daconstrução deBrasília(1956-60), nointeriordespovoado doPlanaltoCentralpaís. em termosdeescalaepoéticaintrínseca,teríamosqueevocar necessariamenteaexperi- Se fôssemoscompararostrabalhosdeLandArt de Pavlov paralisadoporestímuloscontraditórios”. (RAMOS, 2007, p.126) Porém,e respostas. aocontráriodeOiticica, oeucomoumautômato,rato “Nauman trata como bem ser vistas “penetráveis” que têm por horizonte o corpo como centro de estímulos de Bruce NunoRamos, asinstalações Naumanpodemmuito rais, poiscomomostratambém comocorpoémuitoindicativaque ostrabalhosláecáestabelecem desuasdiferenças cultu- espiral nasuperfíciedeumlagosalgado”. (RAMOS, 2007, p.126) Além disso,aprópriarelação do umalinhanoseusoloseco,cavando umduplonegativo nocanyon ouconstruindo uma elegido odeserto,labirintoextremo danarrativa deBorges, comoespaçooperativo, traçan- talhas judiciaisqueenvolveramtalhas alguns dessestrabalhos,como oTiltedArc(1981-89) deSerra. programa Percent for Art, existente cidadesdopaís–assimcomonas intensasba- em muitas sociedade, o que se rebate inclusive de incentivos na regulamentação municipais, como o lidam comumsentidodevalor público muitoconcreto,porqueassumidodeforma geralpela próprias. Positivos ounegativos emsua inserçãofísica,ostrabalhosdeartenorte-americanos -fogo” deOiticica, colocadasanonimamenteemterrenos baldiosànoiteeconsumidasporsi emimportantes Serra, das implantadas “plazas” decentrosurbanos,estãodistantes - “latas mas simoquantoaspeçasdePicasso,Calder, Moore eNoguchi, assimcomoasdeRichard auto-referente da escultura moderna e a unicidade crítica dos trabalhos do tipo aquidiscutiradiferençares emqueforamNãoimporta implantadas. entreo “nomadismo” referências desucessonosentidoseremreconhecidascomovalores públicosnosluga- Grande Vitesse , 1969 eFlamingo,1973), emChicago(La Grand Rapids etambém setornaram os anos1960. Lá,esculturas comooPicassodeChicago (1967), ouaspeçasdeCalderem Unidosdesde Não poracaso,aartepúblicaéumtemadeintensadiscussãonosEstados 8 norte-americanos comreferências brasileiras 7 , aqui,aocontrário,ela site-specific,

27 - Espaço público em fuga: arte e arquitetura brasileiras... 28 - Revista Poiésis, n 20, p. 17-32, Dezembro de 2012 É interessante notar que mesmo na produção de artistas pertencentes aumavanguarda quemesmo naproduçãodeartistas É interessante notar emuma tímida também “cultura pública”domeioartísticoemquestão. histórico alheamentodascidades brasileirasemrelaçãoàpresençadaarte,que seespelha conseguem semantercomo tal. Ao ladodisso,enãoporacaso,podemosidentificar um espaços quenãonasceram públicoseque,umavez tornadospúblicos,apenasprecariamente riores dosadros,pátioseterreiros dasigrejas.(TEIXEIRA; VALLA, 1999, p. 218) São,portanto, configuração irregular doslotes – comoos “largos”, porexemplo –,ouentãoevoluções poste- ramente foram elementosgeradoresdoconjunto,esim,aocontrário,espaçossobrantesna doquedeumprincípioreguladorgeral.Igualmente, suaspraçasra- a terrenos acidentados, particulares de seus traçados de certos edifícios, e de adaptações a partir do protagonismo zação espanholaemtornodeuma “plaza mayor”, noBrasilascidades seorganizarammais regulador doconjunto. Ao contráriodagrelhacartesianaqueorganizaascidadesdecoloni- portuguesa, não seguiu planos abstratos que impusessem uma ordem pública como desenho queaprópriaformação históricadascidadesbrasileiras,atravésconstatação, dacolonização público nelapressuposta”. (SALZSTEIN, p.13) 2005, Seriaprecisolembrar, emapoioaessa nalidade deumacultura aadesãoàmoraldeumespaço urbanaetecnológica,tampouco “o fato dequeaabordagemdoterritório emescalageográficanãocarreou olastroderacio- de hoje. Assim, dizSalzstein, seháumapeculiaridadebrasileiranocampodaartepúblicaé questões identificadas no ponto fulcral da passagem dos anos 1960 para os 1970, até os dias que subscrevo aqui, me permiteestender, aindaquecomcertograudegeneralização,as significado da “escala aliobtidos.Suaavaliação, pública”naartebrasileiraàluzdosresultados 1998 e 2001 em lugares diversos do sul do país, Sônia Salzstein fez um breve balanço do No catálogodoevento Fronteiras Cultural, projetodeartepúblicarealizadopeloItaú entre esse caráterdedomíniopúblico”. (CARNEIRO; PRADILLA,1999, p.11-12) seria realmenteumtrabalhodeartepúblicanoBrasil. A música,porexemplo, sim,temaqui preciso queculturalmente assimelaseefetive.” também Ecompleta: “é difícildefiniroque definir através da simples presença do trabalho em um lugar público. Para a arte ser pública é te consideradacomoartepública.Dizele: “acho queoconceitodecoisapúblicanãopodese - Resende aideiadequeumapeçacolocadaemespaçourbanopossaserdiretamen contesta Tendo emmenteessadiferença Unidos,oescultorJosé abissal entre oBrasileosEstados sempre erapercebidacomoespaço‘externo’”. Assim, prossegueaautora: de modo esquivo em todo caso, quase ouno mínimo reticente à questão dacidade; esta, à experiência do espaço, aludisse emancipada da moldura e da base, e confrontada imediata xava deserumapeculiaridade cultural ofato dequeaarteconstrutiva brasileira,umavez novamenteobra dearte,essaquestãosemantém.Comoobserva SôniaSalzstein: “não dei- construtiva, comooneoconcretismo,equesepropuseramarealizarpróprioespaço laboratórios de umasociabilidadenova, maisfrancaegenerosa, nointeriordosedifícios. Daí utópicanacriaçãodeprotegidos porumaaposta caótico edecaído,compensada, noentanto, parecem serfruto deuma desistência daatitude deinsistirnatransformação daqueletecido do espaçourbanodemodo atransformá-lo, ouasedeixartransformar porele. Ao contrário, Quer dizer, nãoestão, aexemplo também dasartes plásticas,atuando naarenaconflituosa que carregam, elasdemonstram umaposiçãoclaramentedefensiva emrelaçãoàcidade. Rocha, nosso ponto de partida e de chegada, que, apesar do discurso urbano é preciso notar Voltando aoexemplo de dascasaseescolasbrutalistas Vilanova Artigas e Paulo Mendesda sussurrado entreamigosnuma pequena saladeestar. tímida, nemmuitomenosregressiva (MAMMÌ,1992) –,queparecialevar apúblicoumcanto a bossanova, foiealgoamadorística –emboranunca todobaseado emumadicçãointimista vê namúsicapopularbrasileira,qualoestiloque alcançou maiorpoderdeuniversalidade, co noBrasil.Nessesentido,talvezsepassecomasartes plásticasalgosemelhanteaoquese sem ressignificaradimensãodaesfera públicaemsimesma–algoeternamenteproblemáti- doquerealizandotrabalhossignificativosOiticica aquicitados, emespaçourbanoquelogras- lerias através deumainvasão transgressoradaesfera privada, como nosexemplos deHélio maiscontundentesresultados subvertendo oespaçodefrequência públicademuseusega- dasquestõesaquilevantadas,Me parece,emvista quea “arte pública”brasileiraalcançou de vida.(SALZSTEIN, p.23) 2005, acontrapelodacidade evivificadoporrituaisespaço dedescompressãobrotando comunitários da arte.Ésignificativo,peloambientefavela, aesserespeito,ointeressedoartista esse lugar, àexperiência deindividuaçãoesubjetivaçãonaesfera enfim,antagonista pressuposta assomava, pode-se dizer, emsuaforma negativa (comoo “lugar” queresistiaàsubjetividade), Mesmo no trabalho de Hélio Oiticica, que parecia aspirar a uma sociabilidade urbana, a cidade

29 - Espaço público em fuga: arte e arquitetura brasileiras... 30 - Revista Poiésis, n 20, p. 17-32, Dezembro de 2012 preto, Arquitetura eUrbanismo– AU n de “irracionalismo” dobrutalismo europeu,cujoconteúdoideológicoera,segundoele, “bem outro”. Ver Vilanova Artigas, Embrancoe pelo crítico italiano Bruno pelocríticoitaliano de suaobracomoumaricercabrutalista Alfieri naspáginas darevista 2 nuncaaceitoudebomgradooqualificativoArtigas, noentanto, de parasuaarquitetura,“brutalista” chegando aironizar adesignação 1943 noMuseumofModern Art deNova York, comcuradoriadePhilipGoodwin. The Architectural Press, 1962). O”Brazilianstyle” setornouconhecidomundialmenteapósagrandemostraBrazilBuilds,ocorrida em 1 Ver, apropósitodotermo”Brazilianstyle”, emReyner Banham, Age oftheMasters:aPersonal View ofModern Architecture (Londres: Notas te, comoumenormepenetrável. de tule, poderemosentrever umadimensãonaqualoprédiodaFAU aparece,inesperadamen- te prescritos. Assim, se trocarmosasespessas “cortinas” deconcretopelasdiáfanas cortinas interna dadaporambientesqueseinterpenetram,permitindousosnãoforam previamen- aparente, é o que permite, dialeticamente, a criação de uma extrema indeterminação espacial rigorosa rigidezexterna dessesedifícios,formalizada emgeralcomocaixascegasdeconcreto na expressão de Mendes da Rocha –, e não para o lado, isto é, para a cidade. Igualmente, a que as suas aberturas se voltem para cima através de clarabóias – “janelas para o espaço”, 6 Ver SérgioBuarquedeHollanda,Raízes doBrasil (1936). SãoPaulo: Companhias dasLetras, 1998. Leste-Oeste deSãoPaulo, a queconecta Avenida Francisco MatarazzoàRadial Leste. 5“Minhocão” éosistemaviárioformado peloElevado PresidenteeSilva Costa e o Viaduto Jaceguai, constituindo achamada Ligação Basualdo (ed.),Tropicália: aRevolution inBrazilianCulture, 1967-1972. SãoPaulo: CosacNaify, 2005. çado naqueleano. Ver FloraSüssekind,Chorus, Contraries,Masses: The Tropicalist ExperienceandBrazilintheLateSixties,Carlos Gilberto Gil, respectivamente) noIIIFestival daMPB, emoutubro; eoromancePanamérica, de José Agrippino dePaula, lan- também encenada pelogrupo deAlegria,Alegria Oficinaapartirdesetembro;apresentação a própriacançãoTropicália porCaetano , composta Veloso entreagostoesetembro;apeçaORei da Vela, deOswald de Andrade, Nova ObjetividadeBrasileira,inauguradanoRioemabrilde1967; ofilmeTerraem Transe, deGlauberRocha, queestreouemmaio; 4 Dentreosmarcosartísticosocorridos em1967, ainstalação podemsercitadas Frampton, L’autre Le Corbusier:laforme primitive etlavillelinéaire,L’Architecture d’Aujourd’hui no249,1987. sendo tomadoporuma “angústia grave” maispragmática,coladaàrealidadedo seupresentehistórico:opós-guerra. Ver Kenneth 3 Momento no qual,segundoKenneth Frampton, Le Corbusierrompe com aquelautopia positiva deuma “civilização maquinista”, o 17 , 1988, p.78. Tropicália, deHélioOiticica,queintegrava amostra e DomingonoParque (deCaetano Veloso e Zodiac (n o 6,1960), eacensurarcarga ACCONCI, Vito. Referências Cultural,mim eporLígiaNobre,noItaú emsetembrode2009. 8 Reproduzo feita aquiumaobservação porNunoRamos nosemináriodeartepúblicaAs cidadesesuasmargens,coordenadopor Jr., Arquitetura moderna:aarquitetura dademocracia.SãoPaulo: CosacNaify, p.31. 2002, característica, deCoopereMelvillea Whitman e Twain, celebrava imagensdedesabrigo,movimento efluxo contínuo.” Vincent Scully então. O americano foi, o primeiro europeu a experimentar o fluxo portanto, contínuo dos tempos modernos,ea sua literatura mais europeia e o seu novo ambiente natural era maior, mais hostil e, acima de tudo, menos confinado do que tudo que conhecera até 7 “É evidente que o europeuna América nunca sesentiufixadono continente. Eletinhadeixadoojardimfechado dapaisagem Cultural, 2005. SALZSTEIN, sobreaescalapúblicanaescultura Sônia.Notas brasileira.In:SALZSTEIN, Fronteiras Sônia(org.). . SãoPaulo: Itaú Globo, 2007. RAMOS, Nuno.Àespera deumsolinterno.In:RAMOS, Nuno.Ensaiogeral:projetos,roteiros,ensaios, memórias.SãoPaulo: Editora OITICICA, Hélio.Aspiro aograndelabirinto.RiodeJaneiro: Rocco, 1986. MOTTA, Flávio.Paulo MendesdaRocha. Acrópole, n.343,set.1967 2008. MORAIS, Frederico. Docorpoàterra. In:DRUMMOND, Neovanguardas Marconi(org.). . Belo Horizonte: Museude Arte daPampulha, 63-70. MAMMÌ, Lorenzo. João Gilbertoeoprojetoutópicodabossanova. Novos Estudos Cebrap,no.34,SãoPaulo, Cebrap,nov.1992. p. LOPES, EncontrosZéCelsoMartinezCorrêa . RiodeJaneiro: KarinaeCOHN,Sérgio(org.). Azougue Editorial,2008. HOLLANDA, SérgioBuarquede.Raízes doBrasil.SãoPaulo: CompanhiasdasLetras, 1998 (1936). FRAMPTON, Kenneth. L’autre Le Corbusier:laforme primitive etlavillelinéaire.L’Architecture d’Aujourd’hui , n.249,1987. 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31 - Espaço público em fuga: arte e arquitetura brasileiras... 32 - Revista Poiésis, n 20, p. 17-32, Dezembro de 2012 n. 54,2010. WISNIK, Guilherme. Vilanova Artigas andtheDialecticsofStress.2G–Revista Internacionalde Arquitectura, Barcelona, Gustavo Gili, Companhia dasLetras, 2005. VELOSO, Diferentemente Caetano. Omundonãoéchato dosamericanosdonorte.In:FERRAZ,Eucanaã(org.). . SãoPaulo: TEIXEIRA, ManuelC.e VALLA, Margarida.Ourbanismoportuguês: séculosXIII-XVIII,Portugal-Brasil. Lisboa:LivrosHorizonte, 1999. Tropicália: aRevolution inBrazilianCulture, 1967-1972. SãoPaulo: CosacNaify, 2005. SÜSSEKIND, Flora,Chorus, Contraries, Masses: The Tropicalist ExperienceandBrazilintheLateSixties.In:BASUALDO, Carlos(ed.). SCULLYJR., Vincent. Arquitetura moderna:aarquitetura dademocracia.SãoPaulo: CosacNaify, 2002. Artes daUniversidade Federal doEspíritoSanto-UFES. Email:[email protected] * GiseleRibeiroéProfessora de Adjunta doDepartamento Artes Visuais edoPrograma dePós-Graduaçãoem Artes doCentrode sphere”. Ininvestigating todeepen thispassage,ithasbecomenecessary 1970’s, this notionhasbeenreplacedby theexpression “art andthepublic blic art”. Predominant in the debates related to art and politics since the growing problematization andconsequentpolitizationofthenotion “pu- ABSTRACT: The fromthetransformations articlestarts propelledby the Palavras-chave: artepública,eesfera pública,opolítico. na arteatual. conceito de “esfera pública”, tendocomoconsequênciasuasimplicações A discussão avança sobre as diversas possibilidades de entendimento do política, sãoprodutivos nahoradeconvocar opotencialpolíticodaarte. bora tradicionalmentepertencentesaocampomaisespecíficodateoria Para isso,recorremos aalgunspressupostoseposicionamentosque,em- torna-se necessárioaprofundarareflexão sobreo “público” eo “político”. à expressão “arte eesfera pública”. A fimdeinvestigar essapassagem, e políticaapartirdos anos 1970, noção vai tal dandolugarpoucoa pública”. Predominante nosdiscursosinteressadosnarelaçãoentre arte rentes daproblematizaçãoeconsequentepolitizaçãonoçãode “arte RESUMO: Otexto temcomopontodepartidaastransformações decor- Da arte públicaàesfera públicapolíticadaarte Gisele Ribeiro*

33 - Da arte pública à esfera pública política da arte 34 - Revista Poiésis, n 20, p. 33-44, Dezembro de 2012 à “arte pública” em seu livro no iníciodosanos1990, W. J. T. Mitchell defendia umamudançade perspectiva comrelação A fimdesituar ocontexto transformação, deafirmação desta pode-seconsiderarque,ainda sibilidades deentendimento doconceitode “esfera pública”esuasimplicaçõesnaarteatual. tir dosurgimentodessaexpressão, nossadiscussãopretenderefletirsobreasdiversas pos- partir dosanos1970, foi dandolugarpoucoaàexpressão “arte eesfera pública”. A par- de “arte pública”, predominantenosdiscursosinteressados narelaçãoentrearteepolíticaa dutivos na hora deconvocar opotencial políticodaarte. Vale jádeinícioqueanoção ressaltar embora tradicionalmentepertencentesaocampomais específicodateoriapolítica,sãopro- em suarelaçãocomopolítico.Para isso,recorremos aalgunspressupostos eposiçõesque, co” e “política”, afimdeaprofundarodebateeextrair possíveis posicionamentos paraaarte torno daexpressão “arte pública”–, tornou-se necessárioinvestigar os conceitosde “públi- como consequênciadodesenvolvimento daspráticasdesite-specificediscussõesem nica comarealidade(cadavez maiscompreendidacomo “realidade social”)e,nosegundo, “meio”e “site”–noprimeirocaso,através daimplicaçãodosmeiosdereprodutibilidade téc- de “arte pública”. Com a ampliação dos questionamentos políticos em torno das noções de tida astransformações decorrentes daproblematização,econsequentepolitização,noção políticas implicadas tanto nos políticas implicadastanto “meios” quantonos “sites” O textoaqui–derivado queapresentamos deumapesquisa maisamplasobrequestões se pensaro “público” demodomaisamplo eaprofundado: Keywords: publicart,artandthesphere,political sphere” anditsimplicationsincurrent art. evolve intodifferent theconceptof possibilitiesofunderstanding “public productive to the discussion on the political potential of art. These debates bed tothespecificfieldofpoliticaltheory, butthathave proven tobe analyses premises and positions that traditionally have been circumscri- the debateover the “public” andthe “political”. Inthiscontext, thetext Art and the Public Sphere (1992) 1 daarte–temcomopontodepar- 2 , enfatizando a necessidade de Alexander Kluge intitulado “The Public Sphere” (1991). Rosler Participatory,Mediating, andRendered inthePublic Sphere?”(1996) enoprojetodeMartha acabamos decitar, emtextos comotambém de Andrea Fraser, “What isIntangible, Transitory, Mas noiníciodosanos1990, aexpressão aparecenãosomente nolivrodeMitchell, que ainda nãoincluíanenhumartigoquemencionasseemseutítulo aexpressão “esfera pública”. the Public Interest(1989), consideradaummarconatransformação danoçãode “arte pública”, primeiro caso,éinteressanteconsiderarquearecopilaçãodetextos de , Artin pública” juntoaoâmbitoartístico,menosnoscontextos anglo-saxões ehispânicos.No Já nofinaldosanos1990 opredomíniodaexpressão einíciodoséculoXXI,nota-se “esfera foco de discussão, mais contundente quanto à necessidade dessas mudanças, gira em torno uma categoria(emboraem versão contemporânea) emmeioàpintura, escultura etc.Outro nica daarteemgênerosartísticos, ondea “arte pública”começava comomais asertratada de muitosdebates.Podemos comoumdelesacrítica emtornodasubdivisãocanô- apontar As transformações quefazem emergiranoçãode “esfera pública”nocampodaartederivam publicações. equegerouimportantes em 2005 do evento Desacuerdos:sobrearte,políticasyesfera español,realizado públicaenelEstado blicado em2001, intitulado Modosdehacer:artecrítico,esfera além públicayaccióndirecta, de algunsanos–Paloma Blanco,Jesús Carrillo, Jordi ClaramonteeMarceloExpósito,pu- jádes- Com relaçãoaocontexto oprojetoeditorial–esgotado espanhol,poderíamosdestacar If You Lived Here(1991), cujapublicação,acargodeBrian Wallis, traziaumtexto de ou tradicional, é portanto a questão que conecta estesensaios(MITCHELL, aquestãoqueconecta 1992,ou tradicional,éportanto p.2-3). como temageralparaasartes,questãoquevai alémda “arte pública”emsentidoestrito freram diversas eprofundasmudançasnosúltimostempos. A inevitabilidadedaesfera pública formações napráticaartística,masporqueascondiçõesepossibilidadesdavidapública[...]so- sugere Arlene Raven, acavalo”,“já nãoéumheróimontado issonãosedeve somenteàstrans- comohorizonteque issonãonosserve teóricoepráticodepesquisa.Seaartepública,como comasváriasformas ouarelaçãodosartistas de autoridadepúblicasejairrelevante;estado só esfera públicaem transformaçãoIssonãosignificaqueaartepatrocinadapelo eemdisputa. mais contemporâneos:oproblemadaproduçãoerecepçãoartísticascomrelaçãoanoçõesde ram suaatençãoaumconjuntodetemasqueparecemaomesmotempomaisdesafiadorese dada, financiadaepertencenteaoEstado. Ao contrário,oscolaboradoresdestevolume dirigi - Este livronão é somentesobreartepúblicanosentido tradicional –istoé,artequeéencomen- 4 3

35 - Da arte pública à esfera pública política da arte 36 - Revista Poiésis, n 20, p. 33-44, Dezembro de 2012 Public Art Nina Felshin, ArtinPublic Interest(1989) de Arlene Raven, Mappingthe Terrain: New Genre início dos anos 1990 – com publicações como acanonizaçãodaexpressãoSe, portanto, “arte pública”chegaria aoseupontomaisaltono interesse público” (KWON, 2004). este últimoconcordariacomatendênciamaiscontemporâneadeartepública “voltada parao implicado comaspráticasvoltadasparaacomunidade,seconfigurariacomo “site discursivo”; da crítica institucional,propostas que Kwon chamaria “site social institucional”; e o terceiro, já menológico ouexperiencial”; osegundojáentenderiasitedotrabalhodearteapartirdas do minimalismo(eaoneoconcretismoemnossocontexto) e seria denominado “site feno- ligadoàsexperiênciasde “site”teriapassadoportrêsestágiosdistintos:oprimeiroestaria –, sob a perspectiva do desenvolvimentoporânea” (2000) da lógica Benjamin Buchloh em “Procedimentos naartecontem- alegóricos:apropriaçãoemontagem Ou seja,segundoMiwon Kwon,Place After emseulivroOne –mastambém Another (2004) deram origemaotermo “site-specific”) vai assumindoseucaráterdiscursivo. doscaminhostraçadospelaescultura resultante que que anoçãodelugarousite(também zadas noentornourbano,evai ganhandopoucoaumadensidade desentidosàmedida referindo-se limitada, bastante basicamenteaquestõesescultóricasquandolocali- conotação do adjetivo queespecificaacategoria,ouseja,otermo “público”, quetemaprincípiouma E continua: e ‘esfera pública’podemoferecercríticas”(MARCHART, aestas umaresposta 2007, p.426). Marchart argumenta: “Em definitiva, somenteumapolitização dosconceitosde‘artepública’ críticaselaboradas contraosprojetosde dasmuitas Em vista “arte pública”, oteóricoOliver contundente, anecessidadedeolharquestãodopúblico comoquestãopolítica. pela crescenteutilizaçãodaexpressão “arte eesfera pública”, edemodomais mastambém, anos) – este ápice revelou não somente a exigência de mudanças de perspectiva, indicada Jane Jacob,Mary eSculptur Projekte Münster(queacontecedesdeosanos1970 acadadez (1995) somente enquanto artepolítica conceito deartepúblicaimplica oconceitodeartepolítica.[…] Arte públicaseriaentãopossível definido emtermosurbanos,mas porque acontece em meioaoconflito.Consequentemente, o O quedefatoéaarte públicanãoéporqueaconteceemumespaçopúblico importa 5 deSuzanneLacy, eoseventos Sculpture Chicago(1995), comcuradoriade

(MARCHART, 2007, p.426). But is it art? The Spirit of Art Activism 7 site-specific, a noção (1995), de 6 lidade, através da pluralidade de perspectivas sobre um mesmo objeto –, além de seu repúdio como aqueleondeseproduz osentidodascoisasnomundo–ouseja,ondese constrói area- tos maiscontemporâneos, abuscapelaautonomiadopolítico,suanoçãodeespaço público (ARENDT, 2010). vezesApesar derecairmuitas emumelitismoqueaafastadeposicionamen- conseguinte, danecessidade depolitização da noçãodeespaçopúblico,ou “esfera pública” A críticadaneutralidade da esfera pública em Arendt partirádeseuapegoàpolítica e, por sianos, oquejustificaaretomadadestespensadores porteoriaspolíticascontemporâneas. noquestionamentodospressupostoshaberma- escritos deHabermas,serãoimportantes Arendt (2010) edeCarlSchmitt sobreo (2006) “público” eo “político”, ambasanterioresaos Habermas quecomsuavisãoeconcepçãodeesfera pública. As consideraçõesdeHannah proximidade quetal teriamenosaver notar comaépocaemqueescreveÉ importante rência dosespaçosdaarte. aproxime baseados naideiadeuniversalidade de pressupostosmaismodernistas, etranspa- contexto dassociedadesindustrializadas–vãofazer comqueopensamentodeHabermasse poderiaterno comrespeitoaopapelqueesta mo –oquedámargemàsuavisãopessimista e irremediavelmentecultura completa estaria submetida ao avanço- e interesses do capitalis implicadas poderiaseralcançado,obviamente através daracionalidade;eterceiro,dequea segundo, dequehaveria umaúnicaesfera públicaondeoconsensoentretodasaspartes ro, seriapossível prescindirdopolíticoatravés dadefesa esfera; deumaneutralidadenesta liticamente neutrocasoseativesse aoscritériosdaRazão. Ospressupostosdeque,primei- âmbitopoderiaseconfigurarcomopo- suposiçãodequetal Iluminismo esuaconcomitante oconceitodeesferaEntretanto, públicadesenvolvido porHabermasterácomobaseo mento dasociedadeburguesaeseusdispositivos políticos. sociológica daformação doconceitoedesuastransformações notranscursododesenvolvi- “esfera pública”(emalemão Öffentlichkeit) atravéshistóricaquanto deumaanálisetanto onde oautor, noiníciodosanos1960, assumeatarefadediscutirespecificamenteotermo tural daesfera pública: investigações quantoaumacategoriadasociedadeburguesa,de1962, “esfera pública”nãopoderia evitarascontribuiçõesdeJürgenHabermasemMudançaestru- da artequantoteoriapolíticaefilosofia. Assim, umareflexão críticasobreaexpressão perspectiva dopolíticoeserámarcadopeloseurenovado porpartedocampo interessetanto Em concordânciacomMarchart, odebatesobrea “esfera pública”deverá soba serafrontado

37 - Da arte pública à esfera pública política da arte 38 - Revista Poiésis, n 20, p. 33-44, Dezembro de 2012 a Razão modernahoje emdia(MOUFFE, 2007, p. 12). curso damodernidadecomo partedesteresíduomedieval; queseveria daíalimitação imersa presentenodis- concepção, nãoseriaparte essencialdaideiadeautoafirmação,masestaria pré-moderna”. modernaaumapergunta tentativa dedarumaresposta Oracionalismo,nesta que seria “meramente uma ‘reocupação’ porpartedeumapostura medieval; ouseja,uma separar aquiloqueseria “realmente moderno” (segundo ela,aideiadeautoafirmação)daquilo culadas historicamente, uma não dependeria necessariamente da outra. Seria então possível (política) eoutrade “auto-fundamentação” (epistemológica).Emboraambasestivessem arti- Mouffe defende que existiriam no Iluminismo, uma de duas lógicas distintas “autoafirmação” Recorrendo emDieLegitimitätde auto-fundamentação. aHansBlumenberg, derNeuzeit, nar, masosresquíciospré-modernosqueaindapersistiriam nospressupostosessencialistas democráticos doIluminismoaquelescontraosquais deveríamos nosposicionar ouquestio- tão quetocaaprópriaperiodizaçãodomoderno.Propõe, quenãosejamosideais portanto, euniversalista– não comoumproblemadamodernidade,masporumaques- racionalista ta, namentos deautoresconsiderados “modernos” –porsesituarem nesteâmbitoessencialis- éprecisoesclarecerqueMouffeEntretanto, entendesuadiferença comrelaçãoaosposicio- ra umobstáculoparaacompreensãodaesfera públicapolítica. euniversalistaqueabrigariaanoçãodeesferaracionalista pública habermasianaqueconside- essencialismo, segundoela,persistenteemdiversas teoriaspolíticas, criticandoaestrutura contrao a mantémpróximaaopensamentodeHabermas),masempreendendoumaluta reitera aimportânciadeconsideraroespaçopúblicocomocampodiscursivo (pontoqueainda Hegemony andSocialist Strategy político desdeosanos1980, comapublicaçãodeseulivroemautoriaErnestoLaclau, contrário àqueledeHabermas,alémteradquiridogranderelevância nosdebatessobreo Mouffe,samento dateóricabelgaChantal cujoposicionamentoarespeitoéexplicitamente maisdeacordocomasabordagenscontemporâneas,convémoutra queestaria tomaropen- Com o fim de comparar uma visão mais moderna com relação à ideia de esfera pública com neas, ondeaesfera pública políticaganhaopacidade. emdireçãoaoutrasmaiscontemporâ- abordagens maispróximasaospreceitosmodernistas sociedade homogeneizante,sãoascontribuiçõesde Arendt quemarcamumapassagemde atentativa deneutralizaçãopolíticalevadaà domesticaçãoquerepresentaria acaboporuma (1985). Nestelivro e emoutrosposteriores, Mouffe frisa e do qual elabora a ideia de uma disputa pública nãomais como confronto entre inimigos, mas do qual elabora a ideia de uma disputa defesa enoposterior desenvolvimento doantagonismo do conceitode “agonismo”, através através dadivisãoentreamigoseinimigos (SCHMITT, seráchave 2006) paraMouffe emsua ca”, dosescritosdeCarlSchmitt. queresgata Oconceitode “político” elaboradoporSchmitt cas éseuinteressepela “diferença política”, ou seja,adistinçãoentre “o político” e “a políti- deMouffeOutra contribuiçãoimportante paraodebateemtornodasesferas públicaspolíti- buscam iralémdessasoposições. e opacidade,porumlado,universalidade, indistinçãoetransparência,poroutro.Ouseja, as formulaçõesMouffe deChantal permitemfugirdoimpasseentresingularidade,diferença atravessadas –(MOUFFE; econfiguradasporantagonismos LACLAU, 1985). Destemodo, rem comoesferas neutras,cujatransparênciaseriaobtidaatravés daracionalidade,seriam se referir àsidentidadesquantocomrelaçãoesferas públicas–quelongedeseconforma - outro lado,Mouffe vai quando insistirnacríticadanoçãodetransparência,querecusarátanto âmbitosnãopoderiamserentendidoscomoesferasséculo XIX–tais opacas.Por totalmente das diversas esferas públicas–cujaproliferação serianotávelproletáriasdo a partirdaslutas de seusprocessosformação. Assim sendo,apesardaautonomizaçãogeradanaformação que arelaçãoentreelasseriaimprescindível àsuaprópriaconfiguração, ouseja,seriaparte esferasentende quetais nuncapoderiamsedarisoladamente, comoentidadesfechadas, já “interesse comum”quepudesseunirtodosemtornodeumasóesfera. Ao mesmotempo, tência deumamultiplicidadeesferas públicas,evitandoquehajaumaquestãocentralou De todomodo,emcontraposiçãoàabordagemhabermasiana,Mouffe vai defender aexis- a modernidade” (MOUFFE, 2007, p.12-13). distintoquesignificariaumarupturapara designarumperíodohistóricocompletamente com derno tornavisível o “inadequado dotermo‘pós-modernidade’”, diriaMouffe, “quando seusa respeito aotermo “pós-moderno”, coincidiríamoscomMouffe, jáquesuaconcepçãodomo- diversos, questionando a própria noçãode linearidade histórica (BRITO, –,no que diz 2000) passado ésubstituída pelareconsideraçãodequestõesprovenientes demomentoshistóricos no campo da arte e queentende o momento atual como aquele cuja ideia de ruptura com o livrar deumapartepré-moderna, “falsa”, comonosso–originado nãocoincidatotalmente decompreensãodomodernocomodiscursoqueteriase proposta Apesar deque,esta 8

39 - Da arte pública à esfera pública política da arte 40 - Revista Poiésis, n 20, p. 33-44, Dezembro de 2012 neutralizante. Não se trata, portanto, depassar adefender portanto, neutralizante. Nãosetrata, aspaixões comoas “verdadeiras tas “racionalidades” emcurso,ouseja,aracionalidadenãopodefuncionar comomecanismo antídoto contraaRazão habermasiana.Comonosmostra Carl Schmitt existem (2006), distin- to, raciocínioesensibilidade, comoacabafazendo Mouffe defender aotentar apaixãocomo denos apoiarmosemantigasdicotomiasepolarizações entrerazãoesentimen- não setrata Por criticada, outrolado,comrelaçãoàapologiada racionalidade emHabermas, já bastante linguagem, comotecnologiaqueé,operardemodotransparente). “espúria comunicação manipulada”, como defende tal Habermas (como se fosse possível à ras públicas, mas abrindo mão do ideal de uma “autêntica comunicação” como alternativa à Neste caso,seriaprecisomanteraatençãonoaspecto discursivo queconforma asesfe- desejavelmente maisdemocrática(MOUFFE,p.158-159). 2008, mas emdireçãoaumamudançanaordemvigente, reivindicandooutraforma hegemônica contra-hegemônicasnãonosentidodeeliminaropoder,poderia seocupardeintervenções a hegemoniavigentereprime,multiplicandoossitesondesepoderiaquestioná-la. A arte na (tanto América Latinaquantoemqualqueroutraparte)podemtornarvisíveis aquiloque mascarar. ofazMouffe, comotambém Chantal Apostaríamos, em queaspráticasartísticas atuação daarteincideexatamentenodesvelamento daquiloque oconsensogeraltendea contrariamente aospressupostosdaesfera públicadeHabermas,umadaspossibilidades esferas públicascomo esferas políticasforjadas por dissensos econfrontações. Assim sendo, como um espaço neutro, transparente e consensual, mas compreendê-la junto às múltiplas Retornando entãoàarte,ouesfera detomá-laouidealizá-la públicadaarte,jánãosetrata A esfera públicapolíticadaarte todas as possibilidades de abordagens com relação à ideia de esferanão esgotam pública. Obviamente estestrêsautores–JürgenHabermas,Hannah MouffeArendt eChantal – Habermas (MOUFFE, 2007). entre adversários. Oagonismoserásuaarmateóricacontraalógicadoconsensoracionalde possibilidades deentendimentodanoçãoesfera pública. posiçõesmaisespecíficas,erelacionáveis, elesrepresentam sobreasdiversasEntretanto, 9

de Ronaldo Britoem “O modernoeocontemporâneo:novo eooutronovo”: inclusive noâmbitoartístico, para alémdequalquerpretensãoneutralidade.Empalavras Resta buscarentrever opolíticoqueconformapaixõeseracionalidades, esubjaznasdistintas comprometidas comaprópriaconstituição dasracionalidades. e sentidodascoisasnomundo,comovimosem Arendt. Ouseja,asesferas públicasestão responsáveispelovalorcomo âmbitospolíticosdeenfrentamentos, justamente simbólico motivadoras dapolítica”(MOUFFE, 2007, p.20),masdecompreenderasesferas públicas to sem obstáculos em direção ao “outro”, defender tampouco não basta a opacidade como formas ligadasàreprodutibilidadetécnica –nãodeixadeindicarumavontadedeslocamen - discussõesnas transparência –atribuídadurante muitotempoàlinguagememotivo detantas gências eocaráterpolítico dasituação naqualvivemos. Por outrolado,seadefesa deuma dições discursivas einstitucionais ascontin- que nosemolduram,denegarmosaaceitar de nos agarrarmos ao ideal de transparência, evitando olhar as con- Concluindo, não se trata com asdemaisesferas. da arteé,nonossoentendimento,umpressupostobásico paraentendersuarelação(política) parciais etemporárias. A afirmaçãodocaráterincompleto,abertoepoliticamente negociável àspráticasartísticasquantoesferasção tanto públicas,mesmoquehajasemprefixações em ambas “investigações” éoquepermiteacríticadetodotipofixação últimacomrela- própriadopositivismológico. cientificista A tensãoentreopacidadeetransparênciapresente a umaartedesmaterializadaeasinvestigações filosóficaswittgensteinianas aumaapologia Ludwig Wittgenstein (1994) parecemvoltaraganharpertinência,senãoreduzirmosprimeira aarteconceitualNeste sentido,tanto anglo-saxãelatino-americanaquantoasreflexões de na exatamedidaemqueseulugaréapenaseradicalmentereflexivo (BRITO, p.210-212). 2000, cessante cerebração,passamconstitutivamente pelasváriasinstânciasdaartecontemporânea que quaisquerprocedimentosformais ounúcleostemáticos.[...]Umcálculoderazão,umain- problemática dessecálculocaracterizaedistingueaproduçãocontemporânea,muitomaisdo comumcálculodeeficiência. A presença ticulações damaterialidadearteenelapossaintervir asar- modalidade decombatecrítico.Umraciocínioanalítico,mediatizado,quelogredetectar Um raciocíniopolíticomaisfinoeminucioso,estratégico,vai aparecer, comonova entretanto,

41 - Da arte pública à esfera pública política da arte 42 - Revista Poiésis, n 20, p. 33-44, Dezembro de 2012 Habermas, notexto Esfera yexperiencia públicaproletaria (1972). Alexander KlugeeOskarNegtsuasreflexões sobreumaesfera públicaproletáriaquesecontraporiaaesfera públicaburguesade ções sobreaspossíveis “contra-esfera públicas”, emJustice Interruptus: criticalreflectionsonthe‘postsocialist’ condition(1997), ou Virno, emAgramáticadaMultidão(2001) eMichael Hardte Antonio Negri,emImpério comoPaolo merecematenção,comoaquelesderivados italiana, 9 Outrosautoresinteressantestambém datradiçãoautonomista enelladesdeelprincipio” lasposibilidades inscritas modernidad, sinoaceptar (MOUFFE, 2007, p.12-13). la razónmoderna,eranenrealidadreocupacionesdeposicionespremodernas, estáclaroquecuestionarlosnoimplicarechazar la 8 Emais: dequeelracionalismoyuniversalismo“Cuando caemosenlacuenta abstracto,lejosdeserelementosconstitutivos de nossa. 7 Tradução nossa. 6 Tradução 5 Esselivrosurgiuapartirdeumaconferência sobreartepúblicanoCalifornia Collegeof Arts andCrafts em1989. de1989.adiante, data Seissoéumsintomaoucausadacrescenteutilizaçãodotermonestecontexto artísticoédifícilaveriguar. 4 Deve-se considerarqueaprimeiratraduçãoparaoinglêsdolivrodeJürgenHabermas sobrea “esfera pública”, quecomentaremos nossa. 3 Tradução em 1989. 2 Olivroéumarecopilaçãodetextos organizadaapartirdosimpósio Art andPublic Spaces:DaringtoDream,realizadoemChicago, ainserçãoentrecolchetestambém datradução emportuguês. cific. Comosuatraduçãopor “lugar” ou “espaço” nãonosparecesuficienteparaabarcarossentidosatreladosaotermo,evitaremos 1 Manteremosapalavra “site” eminglêsaolongodotexto porserumtermoatreladoaodesenvolvimento daspráticasdesite-spe- Notas constituição. oslimitesecontornosdesta mos aenfrentar incompleto, abertoepoliticamentenegociável detodocamposó épossível senosdispuser- to. RepetindoMouffe, osargumentosdeChantal acríticadetodotipofixação,docaráter acabam abdicandodatarefadetornarvisíveis asforças hegemônicasemjogonestecontex- prescindir do debate em torno do terreno artístico (quando emolduradas por ele) também por completoapesardadefesa desuaautonomia.Por outrolado, aspráticasquepretendem terminante emsuaconstituição –pressupõequeocampodaartenãopoderánuncasefechar mesma, umaesfera pública política–cujasrelaçõescomoutrasesferas épermanenteede- ao longo deste trabalho, a ideia de que a arte configura, por si argumentar Como tentamos frente aoslimitesdarepresentação. renúncia àexterioridade eàalteridade;ambasposiçõescarregam umadecepçãoidealista (2000), ouNancyFraser(2000), esuascontribui- MOUFFE, Prácticas Chantal. artísticasydemocracia agonística.Barcelona: MACBA /UAB, 2007. Intellectual? Wien: Akademie derBildendenKünst Wien/Schlebrügge Editor, 2008. MOUFFE, Cultural Chantal. Workers asOrganicIntellectuals. 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45 - As probabilidades desiguais de Francis Bacon 46 - Revista Poiésis, n 20, p. 45-55, Dezembro de 2012 duzir arte. realidade. A violênciaabre-se sobrequalquer coisa queérara.Opodeprecisamentepro- Trazer aviolênciaparapintura nãoétrazer aviolênciadaguerra, masaviolênciadaprópria inevitável. aviolênciadorealestá inscritonamatrizdoseupróprioprocessodecriação. Pintar ao ar é um fato e é o mais real. É a força parece brutal de uma coisa, que inesperada, também cara oucoroa.Maisrealéassimogestoefetivamente feito: sentir-se rodopiarquandoseatira que sesenterodopiarentreavidaemortecomouma moedaqueseatiraaoarparajogar Com umalucidezprivada detodaaesperança,Francis Bacon confidenciaráaDavid Sylvester que éinvivível deoutramaneira. à crueldade, implicaacaptura noprocessodecriação,implicaviver deforças o queintervêm nhar”. (LEIRIS, p.15) 2004, E a únicaoportunidade pararesponder ao intolerável, ao horror e devia ser, possuídopelaraiva se elenãoéengendradopelaprópriacoisa,odoartista deapa- deverdade..., senãosobumaformagritante estegrito vida nãopudessesercaptada gritante, de exacerbação, dadoounãonoqueéconsideradocomoabase, ecomosearealidadeda invisíveis aaparecer, necessariamentedeumaespécie resultasse “como seoatodepintar mesmo ondeelasnascem,nãonaorigem,masnomeio(deumprocesso).São,então,forças fundo doreal”ouumainconscienterealidadetornadaforça. Trata-se deapanharascoisasaí Bacon “fazedor paraobterumapresençaenãoescondenada-“o deimagens”pinta próprio Algo novo, novas imagens,novas possibilidades com as quais sepodecriarrealidade. Francis O queFrancis Bacon (1909-1992) bempróximodenossospropósitos. pareceestar pinta dos sentidos,daspráticasedopensamento.Novos corpossãonecessários. lá dassensaçõestriviaisabre-se,assim,umpotencialnovo uso.Umnovo usodassensações, política estãoligadas,deacordocomoquenospropomos,forma críticaenecessária.Para Talvez, então,setrate de umanova “política” – umamicro-política – edeuma nova arte. quem eaísepudessetornarvisíveis “coisas” quenoutrascondições nãoousariamaparecer. se emumdevir-mão eamãoemumdevir-pensamento, nãosesabequemé nesseinstante improvável. pararealizaroqueéinfinitamente liberta Comoseopensamentoentras- tamente operações precisas-realmentemanuais,querdizer, queimplicam ousodeumamãoabsolu- possibilidade de experimentar e falta eaaparecersemprenova. dealgunsaspectosdessa Propomo-nosanálise,tratar nesta 1. A arteeapolíticapodemexperimentarumaliberdadeinesperadacomoforça em enquanto práticas que implicam certas tomaremos ambas enquanto práticas que implicam certas Arte e porquê, como: dizer fazer algumacoisa,estouatentar alguma coisa”. (SYLVESTER, 1993, p.198) Sem uma história.Nãomaisexplicar, - nem interpretar “afinal, nãoestourealmente atentar micro-política, faz devir -umaluz,linha,umsom,movimento ganhamcoresnovas. lavatório, esvai-se qualquercoisa mortífera. EmFrancis Bacon, umapolítica,oumelhor não domesmomasdadiferença. A cadatela,emumgrito,guarda-chuva, emum O queohorror eaviolêncianos subtraem,aarteecriaçãotrazem devolta,emumretorno siona, restituindo orealaoreal.Criaintensidadesnovas. Novas paraavidaeosentido. essas mesmasqueFrancis Bacon desse lugarqueasapri- arranca deláerouba-astambém, mortífera avida.Roubam-nos São querouba constantemente forçasacadainstante. vitais Não éumamaneiradeseproteger, eultrapassaalinha afronta éantesaquelaqueenfrenta, mesmo emqueumaprobabilidadedesigualdehaver pintura setorna quaseumacerteza. p. 132)2004, Francis Bacon, “ferozmente ávido de realidade”, no momento começa a pintar da porMichel Leiris comoessaquepara “um homemsemilusões éofato deexistir”. (LEIRIS, vitalidade. rebelde,umaestranhezainqualificáveluma espéciedeespontaneidade eextraordinária Francis Bacon escaparáaossaberesconstituídos, aocontroleeaospoderesdominantescom mil aberturas imperceptíveis. ceptibilidade. ritmo e,rodopiando,sobrevoando osabismos,isolar, distorcer, deformar, dissiparatéàimper- sofisticada” –assim,simplificaratéàrealidade,abreviar até à intensidade. Apanhar certo seu. Umaespéciedeenergiacriadoraintensidadesquetêmseruma “simplicidade realidade”, capturar essamesmaqueeletenta equelhedaráumaespéciedepoderésó e precisa.Literal,porqueéaúnica “maneira possível deopintor irbuscaraintensidadeda Francis Bacon faz oquefaz por “razões estéticas”paraconseguirqualquercoisamaisaguda o figurativo, eliminarosensacional p ções na criação e no pensamento,não se ficará mais no mesmo lugar. Romper com Há umapráticaenelaháqualquercoisadesubversivo erevolucionário comimplica- que todasascoisassejogam. Trabalha nasfronteiras, noslimiaresecomeles. A suasingular “presença” édefini- Há umaliteralidadedavidaquesaisuapintura comosaiumarespiraçãopor Não querer pintar ohorror,Não quererpintar neutralizá-lo.Não maiscontar roduz umaabertura quepode sermicro,masénela

47 - As probabilidades desiguais de Francis Bacon 48 - Revista Poiésis, n 20, p. 45-55, Dezembro de 2012 Experimentar novasExperimentar maneirasdever, novos regimesdeproduçãodarealidadeé gurativo enãosimbólico, sómicro-percepçõesocaptam: “o não-figurativo do desejo”. Francis Imperceptível, demasiadoinvisível, nãointerpretável, inconscientetornado molecular, nãofi- 119); queintensificada dáavernoatoderir, podemosacrescentar diretamente, oseupoder. desaloja doseuesconderijoedáaver (DELEUZE,2011,a vidadetecta, noatodegritar” p. não éessealgodedemasiado visível quenosfaz fraquejar;éantesessaforça invisível, que -la sensaçãopictórica,torna-aintensamentepoderde vida.Mas, “precisamente amortejá funções. vier vem desse combateganho.Osorriso eogritotêmemFrancis Bacon amaisestranhadas turo jáestáaí,enãoestá,comodizDeleuze. umcombatereal.Oque Énecessárioumaluta, nascer daí, de onde menos se espera, do instinto puro. Da figura sem horror. O poder do fu - exercem sobre um corpo. “O corpo é a Figura” (DELEUZE, 2011 p. 59) e o improvável pode que produzem “Figuras”. Pura simplicidade, “economia” emfunçãode todasasforças quese As imagensdeFrancis Bacon sãoimagens-choque. Choquedelinhasecores,sensações atravessam inteiramente. abismo semfim,saemnovos espaços-tempos,zonas neutras,indiscerníveis eforças queos te pelasimagensqueemergemsemsaberdeondevêm.Dele,desconhecido,comoum caos”. (SYLVESTER, 1993, p.190) Ocaosopermitenãoantecipar, étomadoinconscientemen- caos, deseja-o.Ooquefaz ésugerir-lheimagens.Noseu caso,diz: “eu adoroviver no novos mundos.Odesejo éaquidesejoderealidade.Francis Bacon sente-seemcasacomo emergir singularidades,pequenosacontecimentossilenciososquesãocomoaformação de abre rupturas, quebraedesfaz ordenseníveis, limiares,hierarquiaseorganizações,fazendo cias enovos corpos. O própriodesejoquesedesejaealargaestendeportodooespaço, nova Figuraeelasaido caos.Deseja-se a inevitabilidadedeumaimagem.Deseja-se distân- agem esãocapazes defabricar aobradearte,produzir uma nova vida.Deseja-seuma pintor-caos, edaí,dessazona conseguida,emergeacoisareal,saem sensaçõesintensasque tência da pintura de Francis Bacon Francis - sua realidade é o que é pintado. Bacon torna-se O sorriso grita como a vida grita à morte e como a vida grita O sorriso grita (SILESIUS, 1991, p.49) seavemos.Não cuidadesiprópria,nãopergunta A rosaésemporquê;floresceporquefloresce, quando essa força é a morte, ao torná- a po- dois, brusco anúncio, perturbador eperturbado, aesgueirar-se, deumamudança de estado, uma desordem. Sinais de mudança que aparecem nas transições, nas passagens, no entre po quepassaedesúbito aparecequalquercoisa,umaonda,umacidente, tormenta, captar, modificável saídodeumespaçoneutralizado, variável, acada instante, comootem - de o e desconhecido,incerto em cada umde nós quebem gostaríamos a morte. Inquietante tinha revelado. contraaignomínia,ameaçadeperdae Ogritodenuncia,luta queexistissem espéciesquenuncasuspeitamos eninguémantes monstros assustadores, 2011, p.117) Ogritoécego,masvêofuturo como osseus “poderes diabólicos”. Comeletrará tudo oquepossaserespetáculoeultrapassam mesmo adoresensação”. (DELEUZE, dor. ésemprecomovítimasdeforças Segritamos, invisíveis enãosensíveis quetranstornam nem mesmocomdeterminadosobjetossensíveis cujaaçãodecompõeerecompõeanossa responde: ogritonãoseconfundedetodocom “espetáculo visível peranteoqualsegrita, dos objetosdapintura? Porque ogritoéumcaso utopia. Deleuzequaisasrazõesparaque Bacon pergunta: veja nogrito um dosmaiseleva- oudedesterritorialização – dedesorientação As coordenadasserão outras:linhassecretas do sentirdeumsujeito. espaço. Éarealidadedeumcorpoquetemoportunidade desentirintensamenteparaalém rompeosseuslimitesorgânicos,abreumespaçonovoO corpoquegrita eabre-senesse corpo-sombra (veja-se Study for Portrait, 1949, HeadVI,1949after ou Study Velásquez , 1950). sentido denãoserinterpretável, emcarneviva, imediato,movimento singularesemlugar, cura forças devidacapturadas noreal. Vivo éogritocomoviva éapintura, vivo, mesmo,no outras deformadas atéchegar àdissipaçãomáxima, à imperceptibilidade. Francis Bacon pro- particularmente intenso. Trata-se decapturar forças vindasdocaos.Umasserãoisoladas, invisíveis quenosfazem demodoalgumcolorirumsom avidaintensa.Nãosetrata gritar cada vez menosohorror visível”. Nãoumsentimento,masumaforça. Sãosempreforças as doreseoshorrores ultrapassados– ogrito,maisdoquehorror”,“pintar diz: “pintarei um abismodesombra”, acadagritotrazàvisibilidade,presença,violência,ointolerável, que faz Francis Baconsevero. etemdeserabsolutamente quegrita, A bocaaberta “como “A tarefadapintura define-se comoatentativadetornarvisíveis forças queonãosão.” Éo ressoar, emoutraescalaecomoutrasformas. Bacon fazmoleculares,aagire imagensparanãoseremencontradas.Estãoaídiretamente, “especial” queéobrigatórioconsiderar. E

49 - As probabilidades desiguais de Francis Bacon 50 - Revista Poiésis, n 20, p. 45-55, Dezembro de 2012 sensações seria, para ele, um trabalho de desmoronamento e abolição da representação eda sensações seria, paraele,umtrabalhode desmoronamentoeabolição darepresentação cepções psicológicasouque fazem dasimagens ofimdapintura. Pode dizer-se quepintar forças invisíveis: “Eu pintoforças enãoimagens”, afirmaBacon, emumaclara críticaàscon- parência cortouradicalmente, apagouefez desaparecer devez osautomatismos,paracaptar ceu, algoimperceptível emolecular se passouemumamatériavolátil. Umângulodetrans- Na ruptura, nãoéapenasamatériadopassadoquese volatiliza, masaforma doqueaconte- a vida “inorgânica” eomovimento “infinito”, comodiriaDeleuze. formas, desloca edecompõe,dissociaosmateriais.Umaespéciededesmaterializaçãotorna a sairdocaosimprevisível, élevada aoextremo. Uma desterritorialização sem fimquebraas doras, apanhaoqueresiste.Comacriação,matéria inesgotável, sempreprestesaentrare todos ostemposeespaços.Comprocedimentos mais violentos,astécnicasdemoli- complexo quenãoseencontraemuma “coisa qualquer”. Eleabreum espaçodetensãoentre os meiosemateriais. Traça linhas sempassado,presenteefuturo, comummaterial O passadodeixadeexistir. Francis Baconcomtodos entrapelavidacotidiana jáláestando, velhos clichês, enadaserácomoantes. voltar atrás,impedindoosclichês derenascerem. As imagenstêmdepoderfazer explodir os comorealéprecisoalcançarlimiarapartirdoqualnãosepodemais ter umarelaçãodireta ser ainda “demasiado intelectual”, demasiadoabstrato.Para seoperarumaruptura e completa eliminar, arejeitar. Enãochega a “maltratar”, deformar outransformar oumesmoisolar, por dos clichês, daspercepçõesjáfeitas, dovividosubjetivo. Hátodaumacategoriadecoisasa desorganizando-a, dandoumaoportunidade aoimprovável. Bacon limpaparaesvaziar atela gurabilidade pré-pictural contraumdestino,umaherança,necessidade, comoquemluta Francis Bacon deve, insiste em queo artista antes detudo, contra essa fi- limpar a tela, lutar Como agarrar ecapturar forças cósmicasdesiguais? para queapintura nãosejaoureapareçacomoumcliché? Comotrazer onovo quefalta? 2. presença éhistérica,porquedáaver diretamente. Abominável àsvezes, vindodeumaangústiaiminente,quesobrevém tênuemasnítida. A dificilmente contido no círculo ounocubo,deformado, feito deafetos, nãode sentimentos. Simplificar até à realidade, abreviar epintar. até à intensidade. Começarapintar Comofazer prolongando uma boca,criandozona irrisório. Marcas deindeterminação numdetalhe Podem sertraços elinhas,podemsermanchas desfigurandoumcorpo, ecoressobrepostas, só dizem respeitoàmãodopintor. As marcassãomanuais, feitas pela mãolivre,aoacaso. porque elas dependem do acaso e não exprimemrepresentativas, justamente nada: elas não de umtipoescolhaou deaçãosemprobabilidade.Essasmarcaspodem ser ditas “ao acaso”, querdizer: umavez feitas nãodesignarãomaisasprobabilidades. Trata-se agora (asmaisreais,porquenãoforamsão acidentais, modificadas pelopensamentoconsciente) improvável. ExtrairaFiguraimprovável dasprobabilidadesfigurativas desiguais. Tais marcas para destruir nelaafiguraçãonascenteepoderdar uma chance àFigura,queéopróprio É necessáriorapidamentefazer “marcas livres”, nointeriordaimagempintada, acidentais, mão livre,umanova práticadapercepçãoedosprocessosdecriação. mentos rigorososqueabremosespaçosdesérticos quenóstestemunhamos,oolhotátil,a definem um novo regime: a Figura assignificante que faz o plano de composição, os procedi- porquê. Fazer =dissolver desencadeandooprópriocaos.Bacon encontraascondiçõesque pequeno demais,écondiçãoparafazer apareceressacoisasingular, queousasemmaisnem nãolocalizável,irrisório, absolutamente contudo intensamentepresente.Oirrisório, talvez -dissipação não é para ser compreendido enquanto efemeridade, mas corresponde mais a um dade queé,naverdade, umacoisasingularquefaz desapareceroutra.Odesaparecimento- Fazer =dissolver, enquantoprimeiraoperaçãoparaacriação.ÉdelaqueBacon extrai areali- fazer-se edesfazer-se. variar asdistânciasquenãovariam sementraremoutrasmultiplicidades,quenãoparamde Figura quesejaumfato passa-separaooutrolado. Aceder implicamudardenatureza, fazer figuras aquelequesabetransporolimite”. p.34)Para uma sepoderlibertar (DELEUZE,2000, umobjecto,denarrar umahistória,deilustrarsituação.de representar “Acede àsnovas te desuapintura. Desfigurá-los,oqueaquisignifica:deixamdeserfigurativos, defigurar, clichês, essesquesãoprofundamenteviolentos,desejapodervarrê-los, limpá-losinteiramen- tereotipado, ascrueldades quedominamanossavidadetodososdias. Aquilo aquesechama para fazer surgiruma “zona deindiscernibilidade”. Desfaz falsas percepções,osensacionales- e deposturas) vindosdoinstinto.Captura –acidentais, otransitório,fugitivo, ocontingente irracionais (processos específicos de limpeza da tela, deformação dos corpos, escolha de tons conceptualização em que toca e põe a nu uma realidade sempre em tensão, usando meios

51 - As probabilidades desiguais de Francis Bacon 52 - Revista Poiésis, n 20, p. 45-55, Dezembro de 2012 dos automatismos sãoalgunsdosprocedimentos maiscomplexos, tornadosoperações que movimento livredoscorposvê-seclaramente emFrancis Bacon. Oolhotátileamãolivre desequilíbrios.Restituirconstantemente aoconceitodepolíticacomofazer artístico,um zer macroscopicamenteumapolítica, asubverter devez odomínio davisãoeaprovocar manual sobreumatela,potência manualaressoarnopensamento,potência manualafa- Depois da mão, o desigual aparecerá nas misturas de cor, na espessura, na luz. Potência mesmo pensarecriar. novo, sensações,compor, Pintar datelapintada. com umnovo potencialpara pensarquefaz mas entre o visível e o invisível, o audível e o inaudível. A política e a arte saem do movimento to) a escapar-se e a autonomizar-se. Ver no dado o não dado, que faz devir, não o horror, pintar os corposintensificadoscomnovas capacidades(desentir, demovimento, corepensamen- com esseínfimoefêmero,imperceptível queele “vê” àsuamaneiracomoapolítica “vê”. São para trazer essasforçasqueressoamemtodasasdireções.2.Porque vitais Bacon trabalha mente, aoacaso.Bacon suspeitava fortemente queoacasoeinconscienteconspiravam de levar acabo.Mesmo queparaissotenhamdeofazer subterraneamente, inconsciente- molir osclichês. semtréguasquesóaarteepolítica,nestesentido,têmopoder Éumaluta sempre contemporâneasaagirsobrelinguagemeassensaçõespermanentementede- tempo umafissuraedeixaentraresserealprocurado.Sãoforças decriaçãoeinvenção ridade nuanascores,navidaenomovimento quesaidatela, que rompeeabreaomesmo Por queháemFrancis Baconpossibilidadepolíticaeartística?1. esta Porque háumasingula- habitual, fazendo-a explodir. energiaparaumnovo econservam Sãocorposquecaptam real. saem forças novas parafazer novas aparecertambém dadoxa sensações, desconectadas política. OscorposdeFrancis Bacon sãocorpospolíticosnosentidomesmoemquedeles -tempo são já umuso político, se se quisersubversivo e revolucionário que ligam aarte à ordem eumritmo,caos-germe. um fato masummeioqueotornapossível. Éumcaos,umacatástrofe quepodegeraruma as linhasezonas tornam-seassignificativas enãorepresentativas.Por sisóamãonãoé o olhoefigurativo, provocando umacatástrofe. A mãoassimloucatornar-se-áoperatória: çasse atraçarmarcasquenãodependemmaisdenossavontade. A mãovem desorganizar um trapo,umaescova, comoseamãoganhasseumaindependênciadesconhecidaecome- involuntárias, irracionais, insignificantes e assignificantes, confusas, feitas com uma esponja, Os procedimentosdelimpezaqueabremparaoutroespaço- e nu,feito denudezincomparável, nitidamenteimperceptível. de Bacon éoutracoisa,claro, pelo contráriooqueestáládentro,somosnóstambém, fazem-se comasdecisõesdoshomens,guerras, asviolações,osmassacres.Naobra aparecer emcadatela.Ohorror eaviolênciaestãoláfora oucádentro,nasruas, nasnotícias, o real mais real que Bacon procura. Não o espectáculo do mundo, mas sensações límpidas a nos ligaaocaosdanoite.Energia,poisquetocaosangue eacarneosossos,paranosdar de impossibilidadespossíveis, familiarestranheza luminosaquesaipelabocae einquietante irrepresentávelum Xemmilrostosepaisagens.Semrepresentação, passagem. Testemunha da suasingularidadequaseinforme, doseutempoerrante imprevisível, noespaçoqueabre, quase…. ou no úmido…todososelementosdouniverso capturados emum corpointenso…movimento sensações, comonaágua,nofogo, naareiaenopóar, no quenteenofrio,seco que julgamospoderlocalizá-lo. Porque seesgueiraeapareceirrisoriamente noscorpos,nas Circunscrever oimprovável éoquefaz amão,mesmoquenãopermaneçajamaisnolugarem Emissões deluz. 175) tornar-se-ãopura presença. Os corpos, as Figuras na pintura de Bacon são energia pura. para fazer apareceras forças envolvidas. Emanações,melhor, “energia” (SYLVESTER, 1993, p. paralimparatelae da matéria-movimento-infinito eemalgummomentoprecisará intervir mão enquantoécatástrofe aproduziroutracoisa. A mãodesenhaetraçaopercursopossível do pensar e faz para que não se veja, nem se ouça, nem se pense, precisamente. E será a desafia asrelaçõesdominanteseconstituídas donossocotidiano,ver, doouvir, dosentir, verdadeiramente noreal.Sóumamicro-políticadapercepçãonos podesalvar. Francis Bacon o cérebro e quenos dão oportunidadeatingem diretamente de escolher, de pensare de estar deserto. Somos, assim,feitos de figurasdeliquescentes,dissolvidas, dissipadas. Vemos o pratica umanova percepçãoparaacederàsforças quenão reconhecemosnemcontrolamos. é umfato, ehádesobreviver esubsistiraoapagamento. (veja-se SandDune , 1981) Bacon pasmódicos, amudardecor, insustentáveis. luminosos,abjetos,inquietantes, O corpomuda, fazemliberta, devir oscorpos.Pálidos,vivos oudescoloridosdescaídos,deformados, es- Segundo um ritmo de estações estranhas,B Segundo umritmodeestações As sensações,agentesdeminúsculastransf micro-movimento oumovimento infinito. E, noquenãonosdiz, diz-nos, diz-nos ormações cromáticasnascidasdamão acon abrenotempoe espaçoum

53 - As probabilidades desiguais de Francis Bacon 54 - Revista Poiésis, n 20, p. 45-55, Dezembro de 2012 Esse avesso imperceptível ésimultaneamente epresente, estranho, maslivreeautónomo, de maneirainevitável eparaondenãoesperamos,escapamo-nos. paraondenãoestamos Que desejo?Oavesso familiar inquietantemente emqueBacon nosobrigaaentrar, leva-nos so, paraasurpresa, invenção, adesobediência, oinesperadoouacaso. ilusão dorealeaseguiromovimento dalógicadominante,nãodeixandoespaçoparaoexces- de fugamolecular, umatosubversivo, namedidaemqueopoderestásempreafabricar a Enfim, conseguirtrazer orealàvisibilidadedaartesópodeserumamicro-política,linha agir comoum “diagrama” paraatingirumnovo, nuncaantesvisto. cedimentos exaustivos, revolucionários, subversivos, forças políticaseartísticassingularesa de milcoisas.Ocheio emvez dovazio.deabrir, Depois,trata-se rasgar, romper, limpar, pro- forças, a Acontecem realmentenavidaearte.Daviolênciadosclichês paraumanova relaçãode em bloco,afetos decores.(Desejopuro.Novos corpos,novas relações.Denovo odesejo.) ou emfaltasaidoscorpos,eescapa-se,linhasdefugaabremespaçonodeserto.Sensações real. Encontramo-nosnoUmaeconomiapolíticaatravés da pintura. Energiadesmedida vel, insuportável,nossasvidas.Estãoaísemnada comunicar. que contamina Encontramoso saem dos massacres, das catástrofes, da guerra, das violações, das notícias, da dor intolerá - presença dapintura. Emcarneviva. (veja-se Painting, eu dissolvido,dopurodevir, daimanência. Arrancadas aospedaçosdomundoetrazidasà As cores,osgritos,as linhas,aluz,omovimento, asFigurassãoimagensdadiferença, do (DELEUZE, 2011, p.120) ço”, econsegue “erguer porsuainsistência,presença”. indómitas Figurasindómitas, no exatoemqueBacon instante pinta “o horrível, amutilação,prótese,quedaouofalhan- de vida.OsquadrosBacon visamumanova ordemnomundo.Umamicro-políticaaparece espaço novo, quese abre natela,epode-se,enfim,realmenterespirar, ganha-seumtempo inatingível, porissoquasesorrimos, ousorrimos mesmo,diantedeumquadro.Háar, no onde. Sentimos na carne e não na pele uma tensão nova, um desejo sem medida, imediato e quele preto de abismo sem fim, no encarnado vivo. nitidamente lá, sem sabermos Estamos sensações extremas. Sem mediações, entramos naquele laranja intenso, mortífero, ou da- de traços,sombraseluz.Umacriaçãofeita deabismo,no vazio, energiaexplosiva das que vemos, sentimosoqueemtodasualiteralidade. Toda atelaéfeita decores, realidade segundoFrancis Bacon. povoados jáestamos Antes decomeçar apintar 1946) Corposvivos, políticos,histéricos, Que política? SILESIUS, Angelus. LEIRIS, Michel. Francis Bacon, face etprofil.Paris: Albin Michel, 2004. DELEUZE, Gilles.CríticaeClínica.Lisboa:Ed.SéculoXXI,2000. DELEUZE, Gilles.Francis Bacon-Lógica daSensação.Lisboa:Orfeu Negro, 2011. Referências umjatodeágua. liberdade queserásóumaareiaoupó,erva, e desenvolve, criaçãoinesgotável de Vida edePensamento. Francis Bacon alcançaráuma não submetidojamaisàscondiçõesempobrecedorasdavidabanal.Serlivrequeseconserva SYLVESTER, David. Intreviews withFrancis Bacon. Oxford: Thames andHudson,1993 A rosaésemporquê.Lisboa: Vega, 1991. .

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mento derecursos turísticos. importante uma recentecolaboraçãocomoKnowleimportante West MediaCenter cute váriosprojetos nos quaisaduraçãotemsido a chave paraosucesso, não sendo menos processos deengajamento,colaboraçãoecrítica política. Naentrevistaaseguir, Lacydis- contemporâneosqueusamprojetosdeartecomomeioexpandirprecursora deartistas volvido processos emcomunidadesespecíficas,algunspodemconsiderá-la como importante tro decomunidadesdurantelongosperíodos. Visto queLacytemsistematicamentedesen- duração como um de seus elementos-chave, reconhecendo o valor potencial de trabalhar den- (Immigration Movement International).Críticosedefensores dessestrabalhosmencionama Houses); nodeBruguera, emCorono,Queens ascomunidadesdeimigrantesestabelecidas Orleans); no caso deLowe, oterceiro distrito, pobre, afro-americano deHouston (Project Row to. NocasodeChan,nononodistritoNova Orleanspós-Katrina(Waiting for GodotNew Bruguera atençãoporsuascolaboraçõescomcomunidadesemconfli- têmatraídobastante demudanças. ção ecomocatalisadora Trabalhos recentesdePaul Chan,Rick Lowe e Tania complexas equestõespolíticas,semseafastardolugardaarte enquantofonte deimagina- modelosquetemosdeumapráticaexploraum dosmaisimportantes dinâmicassociais blica [expressãoe,maisrecentemente,práticasocial).Issoproporciona cunhadapelaartista] movimentostantes nahistóriadaartecontemporânea(artefeminista, novo gênerodeartepú- abrange váriasdécadaseimpor- educadoraeativista A carreira deSuzanneLacycomoartista, múltiplas vezes àpequenacidadeapalachiana é a “Universidade doConhecimentoLocal” emBristol, Reino Unido.Outroprojetosignificante Beneath Landand Water: A Project for,noqualLacyeseuscolegas retornam ElkhornCity Cinco QuestõesporumaPráticaContemporânea 3 paratrabalharcomresidentes nodesenvolvi- com SuzanneLacy por Thom Donovan por Thom 2 , quebuscafundar 1

59 - Cinco Questões por uma Prática Contemporânea com Suzanne Lacy Suzanne Lacy, Susan Steinman e Yutaka Kobayashi Beneath Land and Water: a Project for Elkhorn City, 2001~. Foto: SL Steinman (Fonte: http://blog.art21.org/2012/11/13/) de maneirastransformadoras. aproximar outras pessoas, ainda que apenas para expressar suas diferenças e seu dissenso sociais complexos, Lacyatua principalmentecomoumacomunicadora – alguémquepode empáticasquantoemumaconsciênciadeterritórios emrespostas estéticas baseadastanto 7 Day Genesis(1991). Usandoaconversação comoseuprincipalmeioetomandodecisões La PieldelaMemoria(1999, revisitadaem2011); oupacientescomcânceremCancerNotes: rie dedezanos);oufamíliaspelaviolênciaemThe colombianasimpactadas SkinofMemory/ plo, adolescentesafro-americanosde Angeles, Lacyeventualmente semove emdireçãoaterritórios menosfamiliares: por exem - outra vez em2012), noqualelamonitoraafrequênciadeestupros emváriosbairros deLos fotografias, eoscorposdeoutrasmulheresemobrascomoThree Weeks inMay (1977; e obras comoFalling Apart(1976), nuaeaparentementeeviscerada noqualsevêaartista em marginalizadas. Tomando vulnerabilidadenasprimeiras seuprópriocorpocomolugardesta vulnerabilidade deindivíduosquevivem emcomunidadeseconomicamente epoliticamente em relação a no uma início permanente de conscientização sua da carreira, mas também ethosapartirdeJudyassume tal Chicagoede , queatuaram comomentores se esforça emdesalienaroparticularepolítico,aautobiografia eavidasocial.SuzanneLacy da arte.Centralàcoletâneaéocomprometimentocomaarteenquantotrabalhodevidaque refletir sobreodesenvolvimento desuapráticaemrelaçãoaquestõesmaisamplasdahistória foram escritosapartirdeumanecessidadecomunicar-secom seuscontemporâneosede fiquei impressionado com a relevânciaenglobando a carreira da artista, desses escritos, como Lendo aobraLeaving Art,(2010), coletâneadetextos deperformances, ensaiosedeclarações Oakland emThe Roof isonFire (1994, partedeumasé-

61 - Cinco Questões por uma Prática Contemporânea com Suzanne Lacy Suzanne Lacy and Pilar Riano Skin of Memory, 1998-1999. Foto: Carlos Sanchez (Fonte: http://blog.art21.org/2012/11/13/) Eu cheguei aoCalArts prática? 1. Qualéasuaformação comoartista ecomoessaformação informa emotiva sua de produção, aquelasquemudamdeacordo comassituações sociais epolíticas.Emcerto favor das práticas sociaistendemaseinteressarpornovas Osartistas do capitalismo. formas Tem quehaver alguma arenaparaaquelesdenósquenãofomos dragadospara trabalharem por quenão? formatar oespaçopúblico, aresponsabilidade cívicae aaçãopolítica?Por quesimou do campoampliado das artes visuais e das maneiras que aspráticas estéticas podem 2. Você acha que há necessidadepara otipo de trabalho que você tem feito, emfunção da performance eaosurgimentodaartefeministaart. comodacommunity-based qual entreinacenaartísticadeLos aoiníciodaarte Angeles, especialmenteemrelaçãotanto Meusinteressesrefletemomomentoespecíficono nós daqueletemposomosgeneralistas. claro, desenvolvi algumaexpertise emperformanceaolongodosanos.Muitos de einstalação mentos edosprocessossociais.Nãosouumaexpert emnenhummeiodearte,contudo, é ram osformatos demeutrabalho.Eumeinteressopela “forma” dasideias,dosrelaciona- Essas influênciassãoevidentesinfluencia- emminhasescolhasdetemas, maselastambém popular. tes fontes paraotrabalho,damesmamaneiraqueosproblemas raciaiseimagensdacultura formance, podíamosexplorarideias.Filosofia,psicologia esociologiaforam- muitas importan uma ação,performanceemfotografia ouumgesto,documentado ouvídeo.Comaper- emumapinturanão terianecessariamentequeresultar ouescultura, maspoderiasetornar masdesejada:umaimagem No CalArts,apráticadaexperimentaçãonãoeraapenasaceita greve dostrabalhadores agrícolas. estava nafaculdade durante osprotestosdaguerra do Vietnã, o movimento Black Power ea sobreraçaepobreza.Felizmente,e pelaescrita minhafamília encorajouessesinteresses.Eu questão paramim.Quandoadolescente,euprocurava pelosprimeirostextos pré-feministas de política(nestecaso,ofeminismo) comarteerairresistível. Justiça semprefoi umagrande e osprogramasdedesignmedesalojaramminhaformação pré-médica–acombinação 4 noseuprimeiroanocampus Valencia. A artefeminista, aescrita

63 - Cinco Questões por uma Prática Contemporânea com Suzanne Lacy 64 - Revista Poiésis, n 20, p. 59-70, Dezembro de 2012 analisando problemas,formando valores epartilhando experiências pessoais.Quandovocê voluntários deváriasáreas.Noprocesso dedesenvolvimento discussão, dotrabalhohámuita e ao redordegrandescomunidades emprojetosdelongoprazo ativistas queincluemartistas, Também fui inspiradaporpessoasquetrabalharamcomigoemprojetos.Minhavidaéformada ecolegas,mesmocommeusestudantes.artistas Muitodeminhaleituratas. estásituada fora dasartes. Eucontinuoaaprendercomjovens de Bretteville e Allan Kaprow. Porém eusemprefuimaisinfluenciadaporescritoreseativis- As primeirasinfluênciasnasartesforam mentorescomoJudy Chicago, Arlene Raven, Sheila descreva. 3. Háoutros projetos, pessoase/oucoisasquetêminspirado seutrabalho? Por favor, incorporadas quecontinuarãoaserumcaminhoviável paratrabalhar. tendência queserásubstituída poroutraspreocupações,masessasideiasestãoagoratão feministas históricasepolíticasapráticassociais.Provavelmente, ofoco atual éapenasuma feministas sãocomuns,apesardeaindahaver trabalhosaserfeitos paraunirperspectivas mecei, tivemosparasermosvistoscomoartistas. Agora, quelutar mesmoaspreocupações questões locaiseglobaissãoinformados pelasteoriaspolíticas esociais.Quandoeuco- na artefoihojesãoconscientesde influenciadapelaminhageração,porémmaisartistas impactosésobreocampo[daarte]. Um denossosmaisimportantes A atual “virada” social cação eassimpordiante. com arte e mais com a escala de nossos recursos – tempo, dinheiro, tecnologia de comuni- nós temosfora dascomunidadesespecíficasnasquaistrabalhamos. Issotemmenosaver que resolver comoesedefato oquãodeefeito mudançasocorrem. Eunãoestoucerta direto simbolicamente oudefato –através denossosprópriostermoscomprometimento,temos Uma vez quecriamos uma situação naqualalgumtipo de transformação épartedotrabalho– ções criativas. os problemas.Emnível local,nóspodemoslevantar questõeseenvolver pessoasemsolu- diferente.completamente visuaistêmmaneirasinventivas Osartistas eabordar deobservar porémnossaatençãoàformasentido, nósoperamoscomooutrosativistas, écomfrequência projeto para a Creative Time retorna aumlocal,comoeufizsemanapassadaemEasternKentucky, pesquisandoumnovo estrutura dotrabalho. Code 33foi favorito em outro sentido:eleabrangeuoposiçãoediscórdiadentro daprópria bre conflito.Então,The Roof isonFirefoi o “favorito” emtermosdeprazer naprodução,mas deuma questão que era muito controversa.mas por setratar Foi um trabalho conflituoso so- jovens foidaspessoas, epoliciaisemCode33,cincoanosmaistarde, difícil–nãoporconta quepercebinaaudiênciaduranteaperformance.descoberta Por outrolado,trabalharcom simplesmente belos como seres humanos. Você poderia de fato sentir o mesmosenso de satisfatório porqueosjovens eram divertidos, comprometidos,profundamentehonestose Oakland duranteThe Roof isonFire–230jovens falando sobresuas vidas–foi intensamente Cada umpossuiseusprópriosprazeres. Por exemplo, trabalharcom adolescentesem 4. Quaisforam osprojetos nos quaisvocê maisgostou detrabalhar e porquê? opressão, nãohácomoevitarserafetado pelasexperiências daspessoas. ver questõesdeperspectivapessoalquantopolítica.Se você tanto trabalhanoterritório da almente, aforma dotrabalhoemerge.Noprocesso,amizades são formadas eeucomeçoa quanto às imagens que seformam entre nós. Eu testo as imagens nas conversas e, eventu - aoaprendizado de trabalhoarte.Quandoemprojetos,euprestoatençãotanto falamos ésobrecomoouvir é,defato, aprender. Essaéarazãopelaqualrealizo essetipo A práticadeouviràpúblicaqueéquaseumcliché. étãofundamental Oquenósnão meu trabalho. por terexperimentadoessavariedade derelacionamentosdentro eduranteaproduçãode e criarumavidanaqualelespodemdarretornoàsuacomunidade.Eusoumuitoafortunada os quaistrabalheiemOaklandnosanos1990, agoraadultos,queconseguiramsairdapobreza essa causafoi profundamenteinspirador. Damesmaforma sedeucomosadolescentes que estavam nomovimento antiviolênciapordécadas.Seucomprometimentotodavidaa Em Madri em 2010, trabalheiem um projeto sobreviolênciacontramulherescom mulheres são rapidamentereconstituídos. e2005 entre 2000 5 , relacionamentos que foram construídos há mais de cinco anos

65 - Cinco Questões por uma Prática Contemporânea com Suzanne Lacy Suzanne Lacy, Unique Holland and Julio Morales Code 33: Emergency, Clear the Air, 1998-2000. (Fonte: http://blog.art21.org/2012/11/13/) as universidades e,porconseguinte,apolíticadejovens artistas. arte; inter-relaçãoentreglobalelocal;comoocolapso econômicoafetará asescolasdeartee está disponível; nosso relacionamento com o mercado de arte; como definimos o público de líticos: nossasformasecomunicação; oespetáculodaproduçãovisualque derepresentação sociaisepo- Atualmente comoartistas estoupensandosobreproblemasquenos confrontam neste caso,mídiasocialorganizandoestratégias–para repensarumtrabalho. in May, sobreaviolênciacontramulheresemLos Angeles) tenhoquedesenvolver razões– como fizrecentementecomThree Weeks (deumprojetode1977, inJanuary Three Weeks o jornalismodoqueparaaarte.Nãorecriotrabalhoscomfrequência,masquandofaço, uma obrapela “originalidade” doconteúdo;nesteponto, émaisrelevante“descoberta” para novas maneirasdeformatar aobraéoquemeestimula.Nãoacho quepossamosmensurar Enquantoasquestõescomquaiseulidopodemseassemelhar,ser limitantes. aprender É umdesafioevitarserepetir. As habilidadesdesenvolvidas easformas depercepçãopodem que seutrabalho tomará? 5. Emquaisprojetos você gostaria detrabalhar nofuturo? Quedireções você imagina trabalhar comcentenasdeperformers nãoensaiadoseumpúblico imprevisível. trabalho deRobert –estejasemprelá,namaioriadasvezesWilson rompidapelarealidadede sempre éalcançada,emboraparamimoimpulsoemdireçãoàelegânciaformal –euamoo aperfeiçãotipo deobra.Certamente deumtrabalhoteatralem umambientecontroladonem nada obra?Nãoacho quetenhamosmedidasavaliativas acomplexidade quereflitam deste oqueconstituiMesmo issoéumprocessodedescoberta: osucessoestéticoemdetermi- quando fracassampodesertraumático.Háváriasmaneirasdemensurarfracassoesucesso. ma instância,improvisadas. Erros acontecem.Quandoelassãobemsucedidas,ficofeliz, mas cias efrequentementesobreassuntoscontroversos. Sãodealtorisco,imperfeitas e,emúlti- Performances a grandes audiên- são difíceis porque elas são realizadas em público, abertas

67 - Cinco Questões por uma Prática Contemporânea com Suzanne Lacy 68 - Revista Poiésis, n 20, p. 59-70, Dezembro de 2012 Há maisdeseisanostenhotrabalhadocoma Arnolfini Gallery tornou muitoclaroquandopasseiumtempoem Appalachia. ceito, a vergonha e a falta de oportunidades que acompanham a questão de Eu entendiaapobreza,éclaro,jáquefuicriadapróximoela,masnãooprecon- qual aarteeraumaexpressão natural, masquestõesdeclassenãoeramnuncamencionadas. Fui criada em uma comunidade rural na Califórnia em uma família da classe trabalhadora na para mim,enquantonorte-americana,temsidoumtemaelusivo –aqueleacercadeclasse. Um projetodelongoprazo noqualestoutrabalhandoaconteceemBristol.Eleexplora oque da “universidade” emseuspróprios termos edeacordocomsuasprópriascategorias. dade nopróximo “ano letivo”, com acomunidadelocalparticipandoon-linedareconfiguração Bristol temcompiladoissoemumwebsite queseráreformatadopelosresidentesdacomuni- “cursos” através deumextenso debatecomosresidentesdacomunidade. A Universidade de esses fragmentosdeconhecimentolocal “textos” eosclassificamosemcategoriasou (estudos deagricultura) emanutençãodecarros antigos(engenhariamecânica).Chamamos crianças por mães adolescentes (psicologia para adolescentes),cultivo de vegetaisorgânicos oconhecimentoprópriodosresidentes:caçaaocoelho(produçãoanimal),educaçãode tratam Nós gravamos 1.000 vídeoscurtos,variando entre30segundosa4minutoscadaum,quere- a noçãodeclasseéreforçada pelosistemadeensinosuperior. fato poucos jovens ingressam na universidade. Tanto Unidos, na Inglaterra como nos Estados comunidadecom as expectativasrelação desta easoportunidades deensino superior. Láde A Universidade doConhecimentoLocal da [ULK,eminglês]começoucomaobservação aoensinosuperior.o acessolimitado porém osresidentesdeKnowle West odesemprego,estereótipoe continuamaenfrentar anosdepois,essas fábricassedesenvolveram, edebolsasnosarredores. Oitenta de tabaco anos 1930. Residentes foram transferidos deáreasdegradadasparatrabalharnasfábricas pequena comunidadeemBristolquefoi fundadaduranteagrande depressãonoiníciodos trabalhadora local através da criação de uma universidade Knowle metafórica. West é uma Hassan noKnowle West MediaCenteremBristolpara “mapear” oconhecimentodaclasse 6 ePenny Evans eCarolyn classe. Isso se Suzanne Lacy with Penny Evans and Carolyn Hassan University of Local Knowledge, 2010~. Foto: Suzanne Lacy (Fonte: http://blog.art21.org/2012/11/13/) 70 - Revista Poiésis, n 20, p. 59-70, Dezembro de 2012 6 N.T.: Trata-se deumagaleriaarte localizadanoCentrode Arte Contemporânea Arnolfini nacidadedeBristol. e emoutrospaíses. 5 N.T.: Organizaçãosemfinslucrativos comsedeemNova York Unidos queencomendaerealizaprojetosdeartepúblicanosEstados 4 N.T 3 N.T.: Refere-se àcidadede Appalachia, localizadano 2 N.T.: Trata-se deumaorganizaçãobeneficentelocalizadanosuldacidadeBristol. novembro de2012 (http://blog.art21.org/2012/11/13/5-questions-for-contemporary-practice-with-suzanne-lacy). 1 Entrevistaconduzidapor Thom Donovan epublicadanoblogdaArt21,organizaçãonorte-americanasemfinslucrativos, em13 de Notas este éoprazer nestetipodeprojeto. quantoao certa “formato” queissotomaráenquanto “arte”. Ainda estouprocurando;acho que auniversidadedos residentesearelaçãocomnoçãodefrequentar etc.Porém, nãoestou emtermosdosensodeorgulho ção; acoreografiadeváriasagendasparceiras;osresultados da comunidade; a dura- com definições de arte e de eficácia: a escala em termos do tamanho deve ganhar a forma de exposição ou texto, e assim por diante. O que me intriga tem a ver como falar sobreisso,sedeve criarounãoperformances (conversações encenadas),se estetrabalhocomo Uma coisainteressanteparamimnesteprojetoécomoapresentar “arte”: .: Instituto de Arte daCalifórnia–California Institute of Arts.

est ado Tradução: Caroline Alciones eLuizSérgiodeOliveira

norte-americano

de

Virgínia.

Universidade deSãoPaulo (PGEHA/USP).E-mail:[email protected] *Eduardo Augusto Alves de Almeida émestrandodoprograma dePós-GraduaçãoInterunidades emEstéticaeHistória da Arte da and critics,amongotherauthors thatdedicatetheirwork tothisissue,in art production.Itispossible throughadialoguewithphilosophers,artists Baudelaire thatpermeatesrecent in1863, theideaofcontemporary ABSTRACT: arte, literatura Palavras-chave: contemporaneidade,modernidade,estéticaepolítica, ressonâncias. origem namodernidadedeCharlesBaudelaire equeaindahojeproduzem -político emqueatuam, criam,pensametransformam. Questõesquetêm para omelhorentendimentodaspessoasedocontexto sócio-estético - espaço-tempo, masaoconjuntodequestõesquepermanecemrelevantes O contemporâneo,nocaso,nãosereduzaumaapreensãocronológicado que dizrespeitoaoregimedepensamentoesuarelaçãocomopassado. tema, procurando identificar semelhanças e desacordos, emespecial no autores –filósofos, entreoutros–quesededicam ao críticos, artistas, criações artísticasrecentes.Issoépossível pormeiodeumdiálogo com Baudelaire em 1863, escrita o conceito de contemporâneo que permeia as RESUMO: Esteartigoprocuradiscutir, apartirdeumaafirmaçãoCharles This by article intends to discuss, from a statement Charles Charles Baudelaire: contemporâneo do passado, dopresente edofuturo Eduardo Augustode Almeida* Alves 1

73 - Charles Baudelaire: contemporâneo do passado, do presente... 74 - Revista Poiésis, n 20, p. 73-84, Dezembro de 2012 sensibilidade crítica seriamcapazes derealizar. daquela metrópole em ascensão que apenas seu olhar perspicaz e sua outras observações de Guys é o retrato da modernidade queo próprio Baudelaire produziu a partir delas, entre emevidênciaa obradoartista aolongodotempo. queascriações Assim, maisimportante vida moderna,queacabouporsetornar umdosseusensaiosmaisreveladores epormanter difícil imaginá-lotãopopularsemaconfiançaqueBaudelaire lhedepositouemOpintorda Praticamente umséculoemeiodepois,reconhecemosesseméritodeGuys, emboraseja o caráterdaquiloque[chamamos] modernidade”. (BAUDELAIRE, 2010, p.89) do mundocumprir;elebuscouportodaapartebeleza passageira,fugaz,davidapresente, desprezaramequecabiasobretudoradamente, umafunçãoqueoutrosartistas aumhomem Mas Guys possuíaaindaum “mérito profundo queémuito próprio dele:elecumpriu,delibe- Debucourt, Moreau, Saint-Aubin e Gavarni, entre outros pintores que considerava excelentes. passar dosanos,célebreshistoriadoresdesuasépocas. Para Guys opoeta, seequiparava a dopresente,tomandocomoexemplona observação quehaviam artistas setornado,como Guys terá para a posteridade. Ele afirma o fato sem duvidar de que ocorrerá, e ofaz baseado neira como,em1863, CharlesBaudelaire fala daimportânciaqueaobradopintorConstantin marão emarquivos preciososdavidacivilizada”. (BAUDELAIRE, 2010, p.89)Écuriosaessama- “Podemos comsegurançaque,empoucosanos,osdesenhosdoSr. apostar G.setransfor- Charles Baudelaire: contemporâneo dopassado, dopresente edofuturo Keywords: contemporary, modernism,aestheticsandpolitics, art, literature Baudelaire’s andstillproducereechoes. Modernity they act,create,thinkandmodify. Questionswhich originisplaced onthe ofpeopleandthesocial,aestheticpoliticcontextderstanding where foris relatedtoagroupofquestionsthatremainsimportant better un- can’tporary bereducedtoachronologic apprehensionofspace-time–it thought system anditsrelationshipwiththepast.Inthiscase, contem- a tentativetoidentifysimilaritiesanddisagreements,inspecialaboutthe suas próprias obras. (2004, p.72) suas própriasobras.(2004, epormeiodecritériosincompatíveistas comaexplicação racional comqueelesdefinem Marcel Duchamp a posteridade consagra um número pequeno de artis- décadas mais tarde, co, buscandocompreendereevidenciarComoconstatou asrelaçõesqueseestabeleciam. do período. Além de pertencer àquela sociedade modernaque ganhava corpo, eraseu críti- dos sonhosepensamentosquesomentemuitodepoisseriamconsideradosdefinidores Podemos dizer queBaudelaire foi umhomemdeseutempo,contemporâneodosanseios, tista quenelasseexprimetista enoconteúdo quenelasserevela. p.52)Essa (RANCIÈRE, 2009, Freud nãoestáinteressado nosaspectosformais dasobrasdearte,masnaintenção doar- Da Vinci. Leonardo Édipo Rei (século V a.C.),deSófocles, àVirgem com oMeninoeSant’Anna (1502-1516), de textos, pinturas eesculturas outrasfontes deperíodosdiversos,cultura, entretantas do Em outraspalavras, Freud por teriaconcebidosuateoria apartirderelaçõespossibilitadas canalista teriadesenvolvidocanalista suapesquisaapartirdomaterialdisponível nacultura domundo: surgimento da teoriafreudiana de inconsciente e suarelação com aarte,propondo que opsi- consciente estético,quereúneduasconferênciasRancière analisao realizadasnoano2000, tentam nodecorrer da história,emespecialnoâmbitodaestéticaepolítica tentam O filósofo Jacques Rancière nosajudaacompreenderrelevância quealgumasobrassus- sobreopróprioconceitodecontemporaneidade. e também aindahoje–oquenoslevatinua fundamental poéticas arefletirsobre perenidade decertas quela Paris emviasdesetransformardaartemoderna,podemosafirmarquecon- nacapital Baudelaire éindiscutível. Quantoaovalor desuaproduçãopessoalparaoentendimentoda- gloriosa da “palavra viva”. p. 38) (RANCIÈRE,2009, sua prosa,averdade deumacivilização oudeumtempo,verdade querecobreacenaoutrora dão testemunhodeummundo eescrevem uma história. mudadascoisasrevela,A escrita na pelos labirintosdoeu.Elerecolheosvestígios, exuma osfósseis,transcreve ossignosque O escritoréogeólogoouarqueólogoqueviajapeloslabirintos domundosociale,maistarde, desse “inconsciente”. p.11) (2009, o terreno dasobrasdearteedaliteratura sedefinecomooâmbitodaefetivação privilegiada identificaçãodeumamodalidadeinconscientedopensamento,eporque mente clínico,certa A teoriapsicanalíticadoinconscienteéformulável porquejáexiste, fora doterreno propria- 1 NocasodasobrevivênciaGuys, deConstantin oapoiode 2 . NolivroOin-

75 - Charles Baudelaire: contemporâneo do passado, do presente... 76 - Revista Poiésis, n 20, p. 73-84, Dezembro de 2012 quase sempre inseparável. sentido, todacriaçãohumana éfruto deseutempo,eumaestácontidanooutro demodo savam; aindaassim,seupensamentopertence aocontexto emquefoi produzido.Nesse eram, na verdade,somente às produções contemporâneas – estas as que menosointeres- Como oquelheinteressava eraaessênciaoriginal dasobrasdearte,Freud nãoseatinha lecidas quesejampertinentesaosdilemasemvoga. saberenxergar- Resta,portanto, nopassadorelaçõesaindanãoestabe ído naqueleinstante. os sobreviventes continuamcomopotênciasativas dopensamentoqueestásendoconstru- desaparece, eessaescolhanãoseexplica p.72)–sabemosapenasque racionalmente(2004, Duchamp nosadiantou,ahistóriadaarteeopúblico determinam quempermanecee relevantes dopassadocontinuamadialogarcomasquestõespresente. ComoMarcel mais relevantesinquietações para o momento. Nem sempre os pensadores verdadeiramente se modificam,asideias se renovam, as problemáticas ganham novo fôlegoesevoltamàs Ao longodotempo,asreferências mudam,aatençãoseprendeoutrosassuntos,osvalores criador ma edesimesma,potênciaessaquesomenteserádisparadaporumolharcriativo –umato do queapalavra–facilmente escrita decodificável emsimes- –,possuiumapotênciaoculta leituras ourelações.Éa “palavra surda”, p.41),que,maiscomplexa comodizRancière (2009, Toda paraativar obradeartecarrega umapotênciapronta pensamentoseproporcionarnovas sos daquelesqueasoriginou. em outrosespaços,entreoutraspessoas,contextosvezes muitas diver completamente - relíquias culturais queatravessa asbarreiras dotempoparacontinuaratuando comefetividade acadavezinéditas emqueocontexto eoleitorserenovam. Seriaumaparteindefinível das “essência original”, como podemos chamá-la, permanece viva e pulsante, permitindo leituras serve à fundamentação dopensamentocontemporâneo: àfundamentação serve 3 . Segundoesseprincípio,qualquerfeito dohomem,assimcomoopróprio em si a potência da linguagem. (RANCIÈRE, 2009, p.36) em siapotênciadalinguagem.(RANCIÈRE,2009, frase quenãocarregue emsiapotência daobra.Porque nãohácoisaalgumaquecarregue narrativos eepisódios descritivos importantes acessórios.Nãoexiste episódio,descriçãoou da revolução estética. Nãoexistem temasnobresevulgares,muitomenosepisódios quenoscolocamnocaminhodaverdade,esses detalhes seinscreve nacontinuidadedireta A granderegrafreudianadequenãoexistem desprezíveis,“detalhes” deque,aocontrário,são de indiferenciação pelofilósofo citada GillesDeleuze emtexto sobrealiteratura e avida.Em tudo édevir, nosentidomesmodaquele devir localizado numazona deindiscernibilidadeou dos sujeitos, do contexto,de do ponto de vista, das maneiras de perceber e atuar; em suma, p.37),daí suatransversalidade.2005, Umtempoemquenadaé,efetivamente –tudo depen- estético dasarteséade uma co-presençadetemporalidadesheterogêneas” (RANCIÈRE, estética edapolíticacontemporâneas.(RANCIÈRE,2005) “A temporalidadeprópriaaoregime no quedizrespeitoaoestudo entreaspessoasnoplanoda dasrelaçõesqueseestabelecem -tempo, mundoafora; uma “partilha dosensível”, otítulo paracitar deoutrotexto importante infinitos contemporâneosacontecendoconsecutivamente, compartilhandoomesmoespaço- à “aventura damodernidade” queaindaencontrainterlocutoresnosdias dehoje.Existem é sólidodesmancha noar”, comosugereotítulo poético comqueMarshallBerman sereferiu contemporâneo, nem mesmo essa afirmação pode ser tomada como definitiva; “tudo o que neo”. No quenãoseenquadraemnenhumadefiniçãogeneralista. Eleétãoamploemutante prudente colocaremdiscussãoacomplexidade conceitual contidanotermo “contemporâ- e permanece,agora,contemporâneodonosso.Para esclareceresseparadoxo, talvezseja as novidades comummistodefascínio edesconfiançafoi contemporâneodeseutempo Podemos dizer, francêstãoafoito então,queaquelepoeta porcriticaroentornoeencarar enquantoeleaindaépresente. vontade decompreenderoinstante pelo tempo. imposta Ambos estãoem busca deperceberoqueénovo emsuaépoca,numa do-os, Brett eBaudelaire compartilhampensamentosquenãoestão fadados àdecomposição realmente novo emsua época”. (1997, p.253)Mesmocomquaseumséculoemeioseparan- apenas emseguirosrótulos eismosfornecidos pelahistóriada artedeixadever aquiloqueé reproduzir opensamentodeBaudelaire. Emsuaspalavras, quesecontente “qualquer artista salto radical”apassagemdaartelatino-americanamodernaparapós-moderna,eleparece Guy Brett, concordaria, pois ao considerar crítico contemporâneo nosso, certamente “um hoje, leraquelaépocaatravés deseusolhos. legandoaofuturo textoshistórico emqueviviacomoajudouapreservá-lo, quepossibilitam, risiense demeadosdoséculoXIX.Emoutraspalavras, elenão sócompreendeuomomento escritor foi além dele: contribuiu para a construção do imaginário atual sobre a sociedade pa- permitiu fazê-lo nãofoieaprojeçãodopresente. Fruto apenasaobservação deseutempo,o Da mesmamaneira,seBaudelaire previu arelevância deGuys paraaposteridade,oque

77 - Charles Baudelaire: contemporâneo do passado, do presente... 78 - Revista Poiésis, n 20, p. 73-84, Dezembro de 2012 Sua ideiadedissociação– ou deslocamento–nosajudaaentenderoproblema: possível definiracontemporaneidade? Emquesebaseariaessadefinição? ficam porcompletocomconceitospreexistentes oucomcânonesvigentesnopassado,seria p. 57). Se as obras desse momento não se identi- que significa ser contemporâneo?”(2009, recentemente publicado. “De quemedoquesomos contemporâneos?E,antesdetudo, o “O queéocontemporâneo?”, ofilósofo pergunta Giorgio Agamben notítulo deumensaio em definiçõesredutorasouconceitospreviamente formulados. Infinitossignificados,impossíveissignificados. Sãoinfinitos,nototal. deseremenquadrados produzindonovasexemplo, emmutação, outros–também possibilidadesde entretantos se deparam com elementos ativadoresmulheres e crianças em mutação – obras de arte, por ou oseuelementoativador. Trata-se deumatopropriamentedito. homens, A cadainstante, contemporâneo se faz durante a experiência de ser, o local em que se realiza não importa paradoxalmente seinscrevem emnossostecidos”. (2010, p.88)Emoutraspalavras, omundo presente, masaatualidade deumaquestãoquenosimplicaenquantoatoresdaspráticas uma nova tradição. “O quenostornacontemporâneos,então,nãoéacondiçãotemporaldo da, aexperiênciaconstróiomundoaoseuredor, desernomundotambém fundamentando tempo, criadoraecriatura denossospróprioscorpos;pois,namedidaemqueéexperimenta- realizam. Para ElizabethMedeirosPacheco, adimensãoestéticacontemporâneaé,aomesmo se faz doentornonaquelemomento–concepçõestãodiversas quantoaspessoasque No mundocontemporâneo,tudo épossível, tudo podeserconcebido pormeiodaleitura que [...] Éumprocesso” (1997, p.11), emseguida: paracomplementar suas palavras, “escrever éumcasodedevir, sempreinacabado,emviadefazer-se. pulação. (DELEUZE,1997, 11) não preexistentes,menosdeterminadosnumaforma tanto quantosesingularizamnumapo- uma mulher, deumanimalouumamolécula:nãoimprecisosnemgerais,masimprevistos, nhança, deindiscernibilidadeouindiferenciação quejánãosejapossível tal distinguir-sede Devir nãoé atingir umaforma Mimese), mas encontrarazona (identificação, imitação, de vizi- sentido, inatual; mas,exatamenteporisso, exatamenteatravés dessedeslocamento edesse coincide perfeitamente nesse comeste,nem estáadequadoàssuaspretensõeseé,portanto, Pertence verdadeiramente aoseutempo,é verdadeiramente contemporâneo,aquelequenão na produçãoliterária. lheémuitocara: A ideiadedeslocamentotambém foi. Nãoémaisdevir. Não seencontra mais naquela região limítrofe queGilles Deleuze verifica quem obedeceàssuasordensjá “é” aoinvés de “poder ser”, ou seja,jápertenceàquiloque críticos. Quemseencaixaperfeitamente emseucontexto jádeixou desercontemporâneo; por algum tipo deinquietude quefaça ver oentorno com olhosatentos, curiosos, fortuitos e tual”: atualizado estar e,aomesmotempo,levemente deslocado dessaatualização, atingido bem oagora – énecessárioencontrar nele umincômodo e reagir. É oquesugere termo “ina- contrário doqueserianatural pensar, compreendereviver parasercontemporâneonãobasta essa quepermiteouvirpropõeintromissões. atransmissãooriginal,masquetambém Ao participa sempertencerouquevibraemumafrequêncialigeiramentediferente –frequência Para ofilósofo, écontemporâneoaquelequenãocaminhajuntodeseuprópriotempo, Esses outros, cujosnomesseperderam napoeiradahistória,viviam segundovalores do de, elefaz quesetratava questãodesalientar deumatarefadesprezadaporoutrosartistas. que vive, seriatidacomocaracterísticamarcanteda modernida- aquelabelezaquemaistarde Quando Baudelaire enalteceoímpeto deGuys abelezafugazdaépocaem porrepresentar perceber asquestõesrelevantes paraomundo de agora. de pensamento,um “regime deidentificação” p.28),umamaneirade (RANCIÈRE, 2005, do tempo, não está atrelado a uma cronologia, mas a um registro exatamente a um instante a ideiadecontemporâneoesseespaço-tempodopresente. Ocontemporâneonãoserefere suaefemeridade.percebido, elejápertenceaopassado,tamanha Portanto, atrelar nãobasta deslocado doatoqueooriginou;paradizer deoutramaneira,quandoopresenteé,enfim, culdade deapreensão:quandoopresenteéfinalmente percebido,elejásefoi, jáseencontra atual, emespecialnoqueserefere ao “presente”. aessadifi- A ideiadepresenteestá sujeita Tanto Agamben quantoDeleuze se debruçam sobreodeslocamentoemrelaçãoaotempo não escritor”. (DELEUZE, 1997, p.17) revele seufora, paraalémdetodasintaxe.[...]Escrever tornar-seoutracoisaque étambém uma criaçãosintáticanelatraceespéciedelínguaestrangeiraequealinguageminteira Para escrever maneiraque talvezsejaprecisoquealínguamaternaodiosa,masdetal (AGAMBEN, p.58) 2009, anacronismo, eleécapaz,maisdoqueosoutros,depercebereapreenderoseutempo.

79 - Charles Baudelaire: contemporâneo do passado, do presente... 80 - Revista Poiésis, n 20, p. 73-84, Dezembro de 2012 Possivelmente forem quantas asmaneiras dedecifrá-lo,assimcomo hojeinterpretamos tantas camadas diferentesQuantas de contemporaneidade seescondemnesseescuro? daquelas luzes”. (AGAMBEN, p.63) 2009, da épocaparadescobrirsuas trevas, separável oseuescuro especial,quenãoé,noentanto, o escuroassimcomoseenxerga a luz, sendonecessário “neutralizar asluzes queprovêm escuro, nocaso,nãoéafaltadevisão,masumtipo particulardevisão.Épossível enxergar sugerido nasentrelinhas,ocultooucegopelaclareza sedutoraeludibriantedoimediato.O aquelequeconsegueverContemporâneo é,portanto, nopresenteoqueestásubentendido, entreasideiasdepresenteecontemporâneo: a ambiguidadequeseapresenta Agamben propõeumametáfora interessantearespeitodamaneiracomopodemosentender de seussemelhantes. que foram ou mesmo compreensão, concebidos, talvez não tenham encontrado aceitação, fértil. Percebemos issonosdesenhosdeGuys enoensaiodeBaudelaire que,naépocaem mesmo tempo em que só é possível porque ele existe. Trata-se de uma dialética bastante “deslocamento” sugeridoporGiorgio Agamben. éfrutoA inquietação dodeslocamento,ao entrepessoas,formastas esentimentos;umaideiaqueoferece algumasimilaridadecomo dúvida sua própria natureza. Trata-se de uma matéria em formação, propondo relações inédi- (FREUD, 2010, vezes p.331),muitas quepõeem proporcionadopeloespanto dadescoberta familiar” aoqueéhámuitoconhecido,bastante queremonta pécie decoisaassustadora resume aotermoe,porissomesmo,nãodeve serreduzida a ele. “O éaquelaes- inquietante provocada peloqueé familiar, porémseencontrafora deeixo. Umaestranhezaquenãose tentou desvendar, em1919, emumdeseusestudos maiscuriosos. Umaespéciedeangústia proporcionada pelotempo.EssasensaçãomuitoseassemelhaàquelaqueSigmundFreud quesóseesclarece–quandocomadistância outra época,algodeinquietante nadehojequantoqualquer Há algodeestranhonaproduçãocontemporânea,tanto participavam sempertencer verdadeiramente aoseutempo. passado enãopercebiam–oucompreendiamanova problemáticaqueoscercava. Eles de escrever mergulhandoapenanastrevas p.62) dopresente.(2009, aquelequesabeverobscuros. Contemporâneoé,justamente, essaobscuridade,queécapaz luzes, mas oescuro. Todos ostempossão,paraquemdelesexperimentacontemporaneidade, Contemporâneo éaquelequemantémfixo oolharnoseutempo,paranelepercebernãoas não se mede assim. Walter Benjamin e Sigmund Freud, por exemplo, continuam presentes anosnadasignificamnotempodiacrônico. O sentimentodotempo nosso presente.Setenta anos,oquenãoaimpededecontinuardialogando comosproblemasdo já somasetenta anjo dahistóriadescritopor Walter Benjamin em1940. (1994, p.226)Sim,umaalegoriaque nosimpele aofuturo, comoo pestade aindaquenossorostoestejavoltado aopassado,tal aele. que significariapercebê-locomcertodeslocamento, sempertencertotalmente A tem- o agora,sejadamaneiracomosemprefizemos, sejacomodemandaocontemporâneo, Talvez oprogressonosarraste paraofuturo semque tenhamosaoportunidade deperceber é antesdetudo umnovo regimederelaçãocomoantigo”. p.36) (2005, daquiloqueaartefazpretação oudaquiloqueafaz serarte[...].Oregimeestéticodasartes tico”, “não começoucomdecisõesderuptura artística. Começoucomasdecisõesdereinter- o pensamentoartísticocontemporâneo,quedecerto mododefineochamado “regime esté- prende aoacontecido,enterrado econgeladoparasemprenaspáginasdahistória.Para ele, dessaoutramaneiradeentenderopassadoquenãose Jacques trata Rancière também tempo, deletomadistâncias”. (AGAMBEN, p.59) 2009, raneidade [...]éumasingularrelaçãocomoprópriotempo,queadereaestee,aomesmo quefazemosmente comoainterpretação dasobrasdeartenos diasatuais. “A contempo- “através subjetivas” deumacadeiareaçõestotalmente (DUCHAMP,- p.73),justa 2004, O novo temponãoé cronológico, massensível, ouseja,pessoal,únicoesingular, percebido no passado,atualizando-as erecriando-asrevivendo-as, sempreemumarelaçãoinédita. significaperceberopresenteemsituações também ocorridas Ser contemporâneo,portanto, dizer, comexperiência devida.Eotempodiacrônicoédocontemporâneo. filósofo p.59),nãosedefinecomnúmerosemedições,masmediações,quer (2009, pelo período específico,contidoemumaoudemaisdécadas–poisotempodiacrônico,citado doutrinados, podemosnosesforçar eperceberqueocontemporâneo nãoserestringeaum p.70) po. (2009, Ao invés dacronologiatradicional,linearidade históricapelaqualestamos Para Giorgio Agamben, éviver sercontemporâneotambém umarelaçãodiferente comotem- existe sempreumanova leitura, umanova obraacadaencontrodoseuoriginalcomoleitor. sob novos eemoutroscontextos. pontosde vista Protegida peladistânciadotempopassado, com nossabagagemcultural,as obrasdopassado,completando-as fazendo leituras pessoais

81 - Charles Baudelaire: contemporâneo do passado, do presente... 82 - Revista Poiésis, n 20, p. 73-84, Dezembro de 2012 Arte”. p. 72) Portanto, (2004, como o público atuaria no ato criador da obra de arte, mastambém não apenas como coautor do artista que suadeclaraçãoassumaumvalor social eparaque,finalmente,aposteridadeoincluaentreasfigurasprimordiais daHistória diráqueele o autortambém “pode proclamardetodosostelhadosqueéum gênio; terádeesperarpeloveredicto dopúblicopara e, decertomodo,aindapermeiaasproduções recentes.Sobreoentendimentodarelevânciapara ahistóriadaarte, deumartista sagrados pelaposteridade”. p.72)Essetexto (2004, deMarcelDuchamp para opensamentoartísticocontemporâneo éfundamental criam;somente algunspoucosmilhares são discutidosouaceitospelopúblicoemuitomenosaindaoscon- “milhares deartistas sobreaformaçãoqual discorre sobreoprocessodecriação deumaobraarteetambém daprópriahistóriaarte.Para oautor, 1 Em1957, MarcelDuchamp apresentouoensaiointitulado Oatocriador àFederação Americana de Artes, emHouston, Texas, no Notas abarca questõessequerimaginadasemsuaépoca. oregimecontemporâneodepensamentoque dialogar comostemposdeagora,alimentando for, Baudelaire odeGuys permitiuqueseutrabalhoedecertomodotambém continuassema próprias palavras. Enãoseriaousadosuporquetinhaconsciênciadessedestino.Sejacomo tornou umarquivo precisodavidacivilizada(BAUDELAIRE, 2010, p.89),parautilizarsuas se também dernidade esuaobraaindaseconfundirem–especialmentehoje.Opoeta gítimo cidadãodeseutempo,soubeeleprópriopertenceraessepontomo- GuysConstantin teriamparaaposteridade,poisalémdereconhecer naquelepintorumle- aimportânciaqueosolhosatentoseopincelpeculiarde tor davidamoderna,aodestacar A perenidadedeCharlesBaudelaire provém dosmesmosvalores queeleelegeuemOpin- Ele explica: nosso séculoedo “hoje”, dassuasfigurasnostextosp.72) mastambém dopassado.(2009, novas dependerádanossacapacidadedesermoscontemporâneos nãoapenasdo propostas contribuições artísticasparaosdilemasdoagora.ComoafirmaGiorgio Agamben, oêxitodas científicas,asdivergênciasender omundo,asdescobertas culturais, asrelaçõessociaise em que,adespeitodadistânciacronológicaquenossepara,eleaindaajudacompre- no pensamentocontemporâneo.Podemos dizer omesmodeCharlesBaudelaire, namedida do seuarbítrio,masdeumaexigência àqualelenãopoderesponder. (AGAMBEN, p.72) 2009, inédito ahistória,de “citá-la” segundoumanecessidadequenãoprovém demaneiranenhuma à altura detransformá-lo edecolocá-loemrelaçãocomosoutrostempos,nelelermodo aqueleque,dividindoeinterpolandootempo,está luz;étambém te, neleapreendearesoluta Isso significaqueocontemporâneonãoéapenasaqueleque,percebendoescurodopresen- (2004, p.74)(2004, o mundoexterior, forma,suacontribuiçãoaoatocriador”. suasqualidadesintrínsecase,desta acrescenta decifrandoeinterpretando entreaobradeartee balança estética.Resumindo, ocontato oatocriadornãoéexecutadosozinho;públicoestabelece peloartista realprocessou-seeopapeldopúblicoédedeterminarpesodaobraartena inerte numaobradearte,umtransubstanciado “o experimentaofenômeno atocriadortomaoutroaspectoquandooespectador pelatransformação datransmutação; matéria 3 Essaideiaseassemelhaàsdesenvolvidas porMarcelDuchamp noensaiode1957 previamentenesteartigo,paraquem comentado possíveis dotempo”. p.17) (2005, se podedizer sobreoqueévisto,dequemtemcompetênciaparaver equalidadeparadizer, daspropriedades do espaço e dos dosencontros,atritoseatoscriadores.Parapossibilita, dizer comsuaspalavras, “a políticaocupa-sedoquesevêe o tempo e o discurso que se produz neste e a partir deste contexto. Em outras palavras, das relações que a vida sua política trata das formas degoverno, quecostuma oespaço, acompanharotermodeimediato.Elaengloba mundo, aspessoasqueohabitam, p. 13) A política,porsuavez, éentendidapelofilósofo demaneiramaisampladoqueatradicionalatuação administrativa epartidária e modosdepensabilidadesuasrelações,implicandoumadeterminadaideiadaefetividade dopensamento”. (RANCIÈRE,2005, tificação epensamentodasartes:ummododearticulaçãoentremaneirasfazer, formas devisibilidadedessas maneirasdefazer teoria daarteemgeralouumaqueremeteriaaseusefeitos sobreasensibilidade,masumregimeespecíficodeiden- trazidas pelaRevolução nocampoartístico. paraamaneiracomqueessasquestõessãotratadas Industrial,comdestaque “Não a dequestõespróprias dohomemmoderno,oriundasdasmudançaspolíticas,sociaiseculturaisporâneas. trata A estética,portanto, debaseàsproduçõesartísticascontem- modernidade epós-modernidade.Esseregimedepensamentopermaneceativo, servindo lugar, dizrespeitoaumregime depensamentosurgidonaEuropa,viradadosséculosXVIIIeXIX,posteriormentedivididoem 2 Éconveniente, nesteponto,entenderosconceitosdeestéticaepolíticacomqueJacques Rancière trabalha.Estética,emprimeiro des de umaobra de arte através divorciadas de considerações completamente das explicações racionalizadas doartista”. p. 72) (2004, dereferência.obras deartequelheservem Naspalavras doautor, “a História da Arte tempersistentemente decididosobreasvirtu- minado. Seriaquasecomoumatocriadorpropriamentedito,sujeitoàsvontadesmisteriosasdaintuição, similaràcriaçãodaspróprias Por fim,Duchamp diráqueahistóriadaarteseconstróidemaneirasubjetiva e,decertomodo,fora deumcontrolerigidamentedeter- aos críticos e teóricos,que constituiriam curiosos do museu, mas também um público instruídose restringe aos visitantes e influente. “selecionador” depersonagensparaahistória.Issonãonecessariamenteocorreria demaneiraconsciente,eessepúblicotampouco BRETT, Guy. Umsaltoradical. In: ADES, Dawn. Artena América Latina:aeramoderna,1820-1980. SãoPaulo: Cosac&Naify, 1997. Paulo: CompanhiadasLetras, 2007. BERMAN, Marshall. Baudelaire: o modernismo nas ruas. In: Paulo: Brasiliense,1994. BENJAMIN, Walter. Sobreoconceito daHistória.In:Magiaetécnica,artepolítica:ensaios sobreliteratura ehistóriadacultura. São BAUDELAIRE, Charles.Opintordavidamoderna.In:moderna.Belo Horizonte: Autêntica, 2010. AGAMBEN, Giorgio.Oqueéocontemporâneo?In:contemporâneo?eoutrosensaios.Chapecó: Argos, 2009. Referências Tudo o que é sólido desmancha no ar: a aventura da modernidade. São

83 - Charles Baudelaire: contemporâneo do passado, do presente... 84 - Revista Poiésis, n 20, p. 73-84, Dezembro de 2012 RANCIÈRE, Jacques. Oinconscienteestético.SãoPaulo: 34,2009. RANCIÈRE, Jacques. Apartilhadosensível: estéticaepolítica . SãoPaulo: 34,2005. NETO, João Leite; LIMA,Elizabeth Araújo. Subjetividadecontemporânea:desafiosteóricosemetodológicos.Curitiba:CRV, 2010. PACHECO, ElizabethMedeiros.Dosporos aosopro:adimensãoestéticadaexperiência. In: ARAGON, LuísEduardo;FERREIRA outros textos (1917-1920). SãoPaulo: CompanhiadasLetras, 2010. FREUD, (1919). Sigmund.Oinquietante In:Históriadeumaneuroseinfantil: (“O homemdoslobos”):alémdoprincípioprazer e DUCHAMP, Marcel.Oatocriador. In:BATTCOCK, (ed.).Anova Gregory arte.SãoPaulo: Perspectiva, 2004. DELEUZE, Gilles. A literatura eavida.In:Críticaclínica.SãoPaulo: 34,1997.

História da Arte pelaEBA-UFRJ. E-mail:[email protected]. *Marcus Vinicius dePaula éprofessor adjunto daEscoladeBelas Artes daUFRJ. Édoutor emDesignpelaPUC-RioeMestre enable toface theblindareasthatinhabitimagesinterfaces aroundus. advertising campaign. The final goal istoshow iconologicalstrategiesthat andthelegibility,ality noteven fromworks ofartany time,butalsoinan between the visu- connections that could be established and fragmentary ding tradition,technically calledalegorese. Than itinvestigate theramified approach betweenhisimageanalysis methodologyandtheallegoricalrea- ABSTRACT: This article uses W.J.T. an Mitchell to establish critical theory Palavras-chave: iconologia, arte,leitura deimagem,alegoria. asinterfacespontos cegosquehabitam entreasimagensnoscercam. os enfrentar tivo estratégiasiconológicasquepermitam finaléapresentar de diversasemumacampanhapublicitária.Oobje- épocas,mastambém entreovisívelser estabelecidas eolegível, nãoapenasemobras dearte partir daíinvestiga-se asconexões ramificadasefragmentáriasquepodem tradição de leitura alegórica, tecnicamente denominadacomoalegorese.A lecer umaaproximação entresuametodologiadeanálisedaimagem ea RESUMO: O artigo utiliza a teoria crítica de W.J.T. Mitchell- para estabe Keywords: iconology, art,imagelegibility, allegory A fratura iconológica Marcus V inicius de Paula* 1

85 - A fratura iconológica 86 - Revista Poiésis, n 20, p. 85-104, Dezembro de 2012 ralelo aoqueFoucault indicouterprocedidocomalinguagem contradições e paradoxos. Esse olhardaimagem para elamesma funcionaria comoum pa- método deanálisequestionandoimagensquenãosó se “auto definem”, comoexpõem suas 1995) o que ele denomina como iconologia crítica e põe em prática esse que fundamenta Dentro dessa perspectiva, Mitchell desenvolve a metodologia da instituídas pelatradiçãojudaico-cristã. terdependência entre visível e legível, que teria se tornado conflituosa devido às convenções deumain- âmbito institucional daartequantonocultura naconstatação demassa,resulta comseupróprionome.Essainvestida,volta sobresimesmateriadeconfrontar-se no tanto Fundo Branco,em1915, voltou-se demodocontraditório sobreoíconebizantino limites desse conceito. Por exemplo, quando Malevitch pintou o emumprofundoconhecimentodaimagem,comoparaumadestruiçãofundamentada dos vale apena enfatizarvoltar-separaumaauto-superação queessadobraauto-críticapodetanto cender oslimites convencionais da visão.Dentrodosparâmetros deanáliseMitchell, o icônico dasinterferências visuaisqueobstruiriam umsupostoolharcósmicocapazdetrans- ensão visualdafigura.Oícone nãoicônicodeMalevitch oícone propriamente terialibertado provocado icônicas e superar o olhar circunstancial de ultrapassar suas limitações pela apre- giram paraasquestõesenvolvidas nainstituição danoçãodoícone busca deseusfundamentosicônicos.Por essemotivo,sediri- suaspreocupaçõestambém A iconologiadentrodessesparâmetrosfuncionariapormeiodeumadobraiconográficaem pelo caráterauto-reflexivo impostopelousodaimagemnaartemodernaecontemporânea. Owens, 2012, p.167), Mitchell voltou-se paraumaindistinçãoentreesseslimitesnorteada gico, (oquelevava aumaseparaçãorigorosaentreformaCraig econteúdo,comoobservou preocupado emhierarquizaromododeapreensãopré-iconográfico,iconográficoeiconoló- W. J. T. Mitchell deu novas diretrizes àiconologiadePanofsky. Enquantoesteúltimoestava Uma imagem nunca está só. O que conta é arelaçãoentreasimagens. Uma imagemnuncaestásó.Oqueconta 2 na modernidade. No entanto, namodernidade.Noentanto, Gilles Deleuze (2010, p.71) metapicture Quadrado Preto Sobre o 1 . Umaiconologiaquese 3 (MITCHELL, comintuito e, portanto, precisamos dela para vislumbrar os precipícios localizados em suas fronteiras. precisamosdela para vislumbrarosprecipícios localizadosemsuasfronteiras. e, portanto, queo estáforacentar doalcancedaiconologiapodenosserculturalmente imperceptível que tudo investigar queimporta acres- naimagem éaquiloqueestáalémdela,mastambém encontrar oqueaimagem não é.Nãosepretendesomenteparafrasear Wittgenstein tão utilizarométodoiconológico nãoapenasparainvestigar oqueéaimagem,mastambém vel mesmo problemaqueenvolve as margensdaiconologiaondeafigurasedissolve no “infigurá- O figurativa contra seuslimites. nos negaqualquerdimensãofigurativa, empurra apróprianoçãodedimensão comotambém natural étãoparadoxal daárvore quantoaausência dedentesnumarosa.Naumannãosó nosexpõeriência, comotambém aoseudilaceramento. A aparentereintegraçãoàcoerência imagem edotexto (edesuainter-relação)nãosónosinterroga sobreossentidosdessaexpe - e textualmente doscontextos apartada necessáriosàpercepção, essamúltiplanegaçãoda placa foipelocrescimentodacascadessaárvore. poucoasendocoberta Visualmente Filosóficas, de Wittgenstein, numaplacadechumbo eafixouEssa notroncodeumaárvore. lhas peloprópriométododeanálise.Naumangravou umafraseretiradadolivroInvestigações só emidentificarasfalhas dosistemafigurativo, emumaabsorçãodessasfa mastambém - convenções paradoxais umaiconologiaautodestrutiva. davisão,mastambém não Issoresulta -imagem. Dessemodo,nãoproduzapenasiconologiacríticacapazdeinvestigar eexpor as reflexão sobresuasfraturas eacabaporremeteraoquepoderia serdenominadocomonão- 1966, induzaoutrotipodeinvestigação quealémdeproduzirreflexão sobreaimagem,gera nológicas, aobradeBruce Nauman,ARose HasNo Teeth (Umarosanãotemdentes),de Em contrapartidaaesseíconeauto-críticocomaptidãoparainvestigar ascontradiçõesico- que essadobracríticaestejaenvolta pelohermetismocaracterístico daobradesseartista. que conhecêssemosmaissobreosíconesbizantinosdoelespróprios,nãoimportando uma imagemcomumpotencialreflexivo maior. Oanti-íconedeMalevitch faria, então,com a pintura aosedobrarsobreatradiçãodaprópriapintura suprematista figurativa teriacriado co, qualqueríconemedieval, seriacapazdegeraresse tipodeautorreflexão, também porém reflexão sobretoda a tradição bizantina. A princípio, qualquer imagem e, nessecasoespecífi- Quadrado Preto SobreFundo Brancofuncionariacomoumametapicture capazdeproduzir quadrado pretosobreofundobrancoeARose Has No Teeth paraum sãosoluçõesdistintas ”, quenoprimeirofuncionacomoclarividênciaesegundo comofracasso.Deseja-seen- 4 dizendo

87 - A fratura iconológica 88 - Revista Poiésis, n 20, p. 85-104, Dezembro de 2012 escolhe pornós” (1994, p.159) equese hojeutilizamosapalavra “figura” éporque oslatinos alguma práticasocialacaba porinterferir naprópria prática.Didi-Hubermandizquea “língua Aparentemente, umacultura quandocria um termo, ouumconjuntodetermos,paralidarcom alegoricamente inspirada. produzidos em diferentes contextos é, como será visto, uma exigência de uma iconologia se expandir ou seretrair. As aproximações e osafastamentos entre imagens e conceitos de diversas épocaselocais.Issoporqueoslimitesdeumaalegoriasãomovediços, podem entrealegorias seus métodosdeinter-relação,nãosónointeriorda alegoria,comotambém lecidas entreasimagens.Dessamaneira,aimagem não dobrasobreelamesma,mas da imagemeadealegoriaumaexpansão descentralizadavoltadaparaasinterfaces- estabe ramificada ecomparativa. A noçãodeíconeleva aumaconceituação centradanotransbordar uma análise que converge sobre ela mesma, a noção de alegoria abre-se para uma análise nificações labirínticas sentido doíconeéfocado nelemesmoenasuatranscendência, aalegoriaramifica-seemsig- Verbo, aalegoriaestásempreassociadaaoincompleto,imperfeito efendido. Enquantoo Diferente doíconeque supreaimagemcomcompletude daduplaeparadoxal natureza do de ampliá-laeenriquecê-la. versas noções,dentreelasadealegoria,quepodemseraproximadas àiconologiacomintuito de íconepelaalegoriacomomodelodometodológico.Oquesepropõeéexistem di- dométodo.Nãoseestásugerindotrocaranoção indicarasprópriaslimitações siga também instrumento capazdeextravasar aanáliseiconológica;mantendo-aaindacrítica,masquecon- cristã medieval atéa arte contemporâneaeacultura demassa–podeserutilizadacomoum daninhaemmeioàproduçãodeimagensdesdeatradição comoumaerva – queseinstalou que aalegoriaé “estética doerro”. Éviável afirmarquea “monstruosa” noçãodealegoria como umdosmaisalegóricosescritorescontemporâneos,masque,apesardisso,teriadito rada contraseuslimitesiconográficos.EmoutroartigoOwens Borges cita (OWENS, 2004) (OWENS,aquilo que ela oculta 2012, p.169), abrindo a possibilidade de uma iconologia empur- revela,a análisedaimagempodesevoltarnãoapenasparaoquerepresentação maspara No brilhanteartigoRepresentação, Apropriação ePoder , CraigOwens acabaporsugerirque 5 . Dessemodo,enquantoanoçãodeíconeimpulsionaiconologiapara *** não maisacreditava nos deusesdeHomeronemno sentidooriginaldeseus mitos”. (ELIADE, p.130-135):à tradiçãoliteráriadamitologia grega(ELIADE,2002, “a Antiguidade agonizante pois eraconcebidocomorealidade.MirceaEliadeassocia essa metafórico, “desmitificação” (BENJAMIN, p.250)Osentido míticodosdeuseseramágicoousobrenatural, 2004, mas não pagã: “a alegoriacorresponde aosdeusesantigosreduzidos àsuacondiçãodecoisainerte”. górica éconsequênciadeumprocessoautodestrutivo ocorrido nointeriordacultura clássica p.248),elemesmosugerequeaestratégiaale- ésementecristã”(2004, propriamente dita (BENJAMIN, p. 247) Portanto, 2004, apesar de o próprio Benjamin afirmar que “a alegoria do queaquelesconceitos[...]tudo istopreparadeforma intensaocaminhoparaaalegoria”. mais relevante; osdeusespersonificadosnãotêmparaelesumsignificado maisprofundo Horácio eOvídio [...]jánestesautoresosconceitosabstratosganham um lugarcadavez traços abstratos.[...]acrençanosdeusesdaépocaclássica iaperdendosuaforça [...]desde Média: “nos primeirosséculosdaeracristãospróprios deusesassumiamfrequentemente velmente da cultura helenísticaeromana)entreoperíododa Antiguidade Tardia eaIdade Walter Benjamin afirmaqueaalegoriasedesenvolve movida pelascontingências(prova- indicar queo “significado oculto” nãoéaalegoria,masumdeseusfundamentos. ou “sentido subterrâneo”. Porém, os dois termos não são exatamente sinônimos e parecem noia, (hypo =debaixo e nous =menteouintelecção)quequeriadizer “significação oculta” significar. Otermosubstituiu, (46-120 notempodePlutarco d.C.),outromaisantigo:hypó- diferente dosentido literal”, oqueimplicaemaalegorianãosignificaaquiloparece e Portanto, otermoalegoriaseoriginadogrego:allos(quesignifica “outro” ou “segundo outro”) queelateráassumido. uma palavraassociadoaossentidoscircunstanciais estádiretamente ria, símbolo,figura,fetiche, etc.Desse modo, buscaraetimologiade signo,representação pelaspalavras: estãocircunscritas imagem,ícone,ídolo,alego- massa porqueelastambém isso queaiconologiasófaz sentidodiantedaartemodernaecontemporânea edacultura de em contrapartida,doaprisionamentoperceptivoQuersedizer queelamesma instaura. com cia iconológicaqueaquisepropõeéumainvestigação conscientedesuaprisãocultural e, pois serãosempredevedores dascontingênciasqueosfizeram surgir. Portanto, aexperiên- faz ver queasanálises formalista,iconológica,semióticaetc.nãosãométodosuniversais, diziam “figura”paratraduzirapalavra grega “tropos”. Issoédesumaimportânciaporquenos agoreuei (quesignifica “dizer”). Unidospoderiamsertraduzidoscomo “dizer algumacoisa

89 - A fratura iconológica 90 - Revista Poiésis, n 20, p. 85-104, Dezembro de 2012 preciso paraessa leitura seriaalegorese . leitura complexa econtraditóriadaBíblia. Ele mesmotermina por afirmar que otermomais entre todasascoisasdouniverso. Didi-Huberman nosdescreve aexegese cristã comouma conhecimento híbrido(visual everbal)correspondências queseriautilizadoparaestabelecer (a hypónoialeitura emsignificaçõesocultas ) quedava figuradafundamentada acessoaum as imagens sagradas da escrita mundana (tal como a escrita alfabética) comoaescrita mundana(tal as imagenssagradasdaescrita categoria dolegível oucomoalgoqueoultrapassa.Oesvaziamento dos ídolosaproximou cultura cristãéilegível enãoalheiaaessaleitura. Oilegível deve serentendidooucomouma O esvaziamento doídolopagãopossibilitoualeitura figurativa conceito alheioaoscontextos originais. em arrancar fragmentosdesignificaçãoereorganizá-losnummosaicoqueilustrassealgum alegóricaconsistiam de Benjamin aalegoriaquantointerpretação pareceindicar que tanto ser confundidacomele,poisaalegoriaenvolve oemparelhamentodessessentidos. A obra como será denominadatambém “figura retórica”ou “sentido metafórico”), masnãodeve vaziamento dosídolospagãosclássicosedaconstrução danoção de “sentido figurado” (que Annaeus Cornuto a partir da etimologia de seus nomes. Desse modo, a alegoria parte do es- comoumcatálogoparaossentidosfiguradosdosdeuses,formulado porLucius servindo doprimeiroséculodenossaera,jáhaviaMesmo antesdisso,nasegundametade umtratado zando osentidofigurado dessas imagensmitológicasesvaziadas de suasautonomias divinas. tempo emquecomeçamaaparecernoséculoIId.C.asprimeirasenciclopédiassistemati- (1987, p. 86-89) nos lembra que no período helenístico o paganismo entra em crise, ao mesmo figurativa pelosdogmascristãosfoi estabelecida devedora daretóricaclássica.UmbertoEco elaboração dométodoalegórico. Alain Besançon (1997, p.274-281) afirmaqueasofisticação p.137)2002, Oqueparecesignificar atradiçãocristãnãofoi aúnicaresponsável pela do ídolo,poisoídolonasuaautonomiaeraalheioàleitura profana diferença entreessa “ilegibilidade” alegóricaeoquepoderiaserdesignado comoa-legibiliade Éprecisoesclarecermelhora tre ossentidosfiguradosqueessamesmatipologiajustapunha. linear e, por isso, acabou por atribuir um caráter ilegível associado à labiríntica inter-relação en- com que o encadeamento de metáforas ultrapassasse os limites de uma simples narrativa consolidou anoçãodealegoria. A autorreflexão tipológicaenvolvida naexegese bíblicafez (DIDI-HUBERMAN, 1994, p.165) Portanto, o caráter 6 , masfoi atradiçãocristãque 7 . A alegoriaformulada pela 8 ealimentou uma alegoria comasaproximações queinduz. as dimensõesfigurativas sãoasferramentas responsáveis pelonãocomprometimento da ção figurativa se mascara em definições precisas. também As fendas entre estabelecidas é necessárioficaratentoporque aomesmotempoemquesugereumacomplexa ramifica - o segundo,acomplexa armadilhaqueessaaparênciabanalpodeassumir. Por essemotivo óbvio. Poderia dizer queoprimeirofator configuraaaparênciadespretensiosa daalegoriae e, desse modo, os recontextualiza, agora sim de modo enigmático, ou seja, de modo nada nada enigmáticos e desloca esses fragmentos para um novo contexto onde os aproxima tre imagenseconceitos.Dizendo deoutromodo,aalegoriadescontextualiza significados indica,demodoimpreciso,sutisaproximaçõesao mesmotempoaalegoriatambém en- convençõescomopontodepartida,mas alegorias éprecisoconhecercertas queservirão xas. Issoporque,aalegoriapartedesignificadospré-fixados, ouseja,paraseinterpretar Deve-se, salientar, também banaisecomple- queasalegoriaspodemsersimultaneamente O procedimentoquenosiluminaeiludeéomesmo. para asanalogiasouumacegueiravoltadaqualquerincongruência quenossejaimposta. rio entreessasdimensõese,dessemodo,proporcionarão,aomesmotempo,maiorabertura um isolamentodaimagem.Serãoessasfendas quejustificarãoesseemparelhamentoaleató- pela alegoriapartemdessevácuoabertoruína doídolo. A autonomiaidólatraestimulava Antiguidade Tardia porqueasinter-relações figurativas se torna fundamental estabelecidas que aalegoriaabriga vácuos imperceptíveis. Essesvácuoslocalizam-seentreasdiferentes dimensõesfigurativas mais seucaráterilegível, poisalémdelabirínticaeexpansiva, aramificaçãoalegóricaguarda não a preenche, apenas emparelha possíveis significações. Esse procedimento agrava ainda mesmo tempoemquepreenche, esvazia. Melhorainda,elasomente esvazia aimagem,pois fendas estabelece não sóemparelhasentidosfiguradoscomotambém entreeles,poisao dimensionou afenda que havianoídolodesmitificado.Issoporqueaalegoria sidoinstaurada aoproblematizaraleituraNo entanto, emparelhandosentidosfiguradosaalegoriacristãre- tidamente sobre si própria para transbordar de si mesma”. (DIDI-HUBERMAN, 1994, p. 165) ilegível dasimagensenvolvidas emalegoriasderiva deumaleitura quebusca “se voltarrepe- 9 , oudizendo deoutromodo,oesvaziamento dasdivindadespagãsna ***

91 - A fratura iconológica 92 - Revista Poiésis, n 20, p. 85-104, Dezembro de 2012 enraizado na cultura doqueumameraconspiração. dealguma práticaenganosaquesedevaentanto, desmascarar, poisconstitui-se dealgomais no vazios, nãogeraminterseção.Não setrata, poissemsemelhançaostermos justapostos constituem analogiasabsurdas mascaradasemsemelhançaquegerampontos decontato ler, demodotortuoso, os sentidosdaimagem.Essasaproximações entrecoisasdíspares não “falam amesmalíngua”, maséatravésvisualenigmáticaquepodemos dajustaposição por meiodarelaçãoentreelasqueaimagemseexpressa. Conceitualmente asduasfiguras de sentido alegórico. Apesar das figuras de Cristo e do deus fluvial serem incompatíveis, é issoqueindicaaBabel,É justamente ouseja,ocaráter fragmentárioinseridonaprodução dimensões figurativas sãoperceptíveis, oqueéimperceptível éessevácuoqueassepara). medida, velada, mesmoqueissonãosignifiquesejadesprezível(as para ainterpretação lógicas. Porém, comoexiste umvácuoentreelas (as figuras),essaconexão fica,emcerta apesar denãocompartilharemamesmadimensão figurativarelaçõesicono- estabelecem dos contextos na inter-relação entre esses contextos, de cada figura como também ou seja, imagem não conseguiria produzir esse tipo de fratura. dentro A relação alegórica se dá tanto os separa.Ofundamentodesseabismoéoídolovazio, poissem essepassoapercepçãoda mente presentesàpercepçãoumdiantedooutro,masalegoricamenteexiste umabismoque e porissonãocompartilhamamesmadimensãofigurativa. Os dois “deuses” estãovisual- Devem serlidasenão veneradas. As duasimagenspossuemreferenciais retóricosdistintos imagem deCristoquantoadodeusfluvial sãoimagensemsentido figurado(nãosãoídolos). dimensão dafiguradeJesus.a Dentrodosparâmetrosqueestão sendoesboçados,tanto do Deusúnico.Seriaincoerentecomadoutrinacristãmostrarumdeuspagãonamesma acima, não é mais um ídolo pleno. A prova contundente disso é que foi ao lado representado noção dealegoria.Odeusfluvial queapareceaoladodeCristo eSãoJoão Batista,citado imagens produzidasna Antiguidade Tardia exemplificam partedoprocessodaconstrução da umacriseiconológica.Essasduas damente alcançaraquestãoiconográficaqueestabelece p. 955)noChristos-HéliosdotúmulodosJúliosnanecrópole Vaticano poderemosrapi- símbolo sumerianoparavidaera,normalmente,umafolha deparreira” –CHEVALIER, 2002, e Dionísio,poisovinhoerasímbolodajuventude edavidaeternanastradiçõesarcaicas: “o deCristocomodeus presentação Apolo envolto porvideiraseucarísticas (atributodeCristo cúpula doBatistério dos Arianos emRavena (iníciodoséculo V) ecompararmoscomare- ao lado de Cristo e São João a divindade aquática representada Batistana Se observarmos Cristo-Apolo Batistério dos Arianos em Ravena Mosaico do Túmulo do Julios na Necrópole do Medalhão central da cúpula (séc. V d.C.) Vaticano (séc. IV d.C.)

No exemplo do Christos-Hélios do túmulo dos Júlios na necrópole do Vaticano, o ídolo pagão é testemunho do processo de esvaziamento e da simultânea sobreposição de uma retórica sa- grada que reinstitui a completude misteriosa, mas exterior à imagem. Esse tipo de associação com a iconografia mitológica greco-romana, utilizada pelos primeiros cristãos, já havia sido es- tabelecida pelos escritos de Clemente de Alexandria (150-213 d.C.). Esse dado não assegura plenamente que a temática estivesse rigorosamente atenta às normas cristãs e que não se trata de uma representação herética,10 mas indica o desenvolvimento do processo de ruína da autonomia da imagem pagã. A diferença entre o mosaico na cúpula do Batistério dos Arianos em Ravena e esse Christos-Helios é que no primeiro a fissura estava entre as duas figuras e 94 - Revista Poiésis, n 20, p. 85-104, Dezembro de 2012 seguirá aproximar ideologiascontraditóriassemqualquercomprometimento conceitual é justamente acertezadequeexisteé justamente aliumafenda queossepara deus; isso seria inadmissível, pois seria o retorno à idolatria. O que permite a conexão entre eles O gens seentrelaçamlabirinticamente,porémsemtocar, ouseja,permanecemimaculadas. perfeitas eabsurdasconstruídas peloprocessoalegórico,as ideologias quevivem nasima- 1987, p.151-208), quepormeiodasconexões maséprecisoacrescentar desconexas, im- sempre impregnadadeideologias.Mitchell sugerequetodaimageméideológica(MITCHELL, no mundohelenístico.Por frisarqueessasofisticadailusãoalegóricaestará isso,éimportante desdobramentos persuasivos dessaestratégiadentrodocontexto dadifusãodocristianismo sehouvesseCertamente espaço para uma análise mais extensa seriapossível averiguar os estivessem namesmadimensãofigurada. ídolo propiciava apercepção visualsimultâneadeCristoe ambos Apolo semque,noentanto, sobreaprópriafigura,poisoesvaziamento sendoinstaurada do no segundoafissuraestaria tendência autodestrutiva daanáliseiconológicainspirada pelanoçãodealegoria. que possamseraelasassociadas. Ditoisso,éprecisoagorainvestigar outrosaspectosdessa gens commaiorpotencialpara exporodeoutras imagens suas fissurasalegóricase,também, produzir reflexão sobreaprópriaimagem; emcontrapartida,pode-seafirmarqueexistem ima- formular suateoria,afirmouqueexistem algumas imagensquepossuemmaiorpotencialpara gia autodestrutiva, poisexpõe umaregiãoqueestáalémdassuaspossibilidades. Mitchell, ao colocar-se acimadelas,asempurra contraogapqueexiste- entreelas.Estimulaumaiconolo tida, pormeiodainter-relaçãoentreessasdimensõesconvencionais.se estabelece Emcontrapar- tentativa deabolirascontingênciasfigurativas daimageme,dessemodo,superarovácuoque mamente enriquecedora, pois se dirige ao cerne do que tem sido investigado. Foi feita uma seria odeexterminá-la. Essaatitude típicadasutopiasdavanguarda russa acabasendoextre- aqui,foiacuada. Dentrodosparâmetrosestabelecidos efetivamente dissimulada,masointuito uma fratura na tela de Malevitch iconológica. No entanto, a fissura alegórica existe, mas foi no Teeth, poissehaviaHas sugeridoquesomentenaobradeNaumanseriapossível identificar Agora épossível retornar, maisumavez, aoQuadradoPreto SobreoFundo BrancoeaARose umaferramentapode produzirtanto libertáriaquantoumpoderosoinstrumento dealienação. Christos-Helios nãoeraumaafirmaçãodequeJesus e Apolo haviam sefundidoemumsó A Rose Has no Teeth eliminaasdimensõesfigurativas, também masaoinvés detentar 11 . Dessemodo,aalegoriacon- 12 . Isso . Isso a coerênciado mundoquenoscerca– foi deslocada, atravessando a percepçãocomoum ao contrário,essaseparação fragmentária–queparadoxalmente passouaseconfundircom chamou aissode “Lógica do Papai Noel”. (BAUDRILLARD, p.175-176) 2008, NoGrandeBaco, Baudrillardde casanãocompartilhada mesmadimensãodadonadecasaqueelarepresenta. de profissionalmaisindicado pararecomendá-lo. elamesmacomodona A atrizrepresentando timos tranquilos sabendo que, mesmo que a atriz tenha usado o sabão em pó, ela não é o tipo visão emqueumaatrizfamosa recomendaqueseutilize determinadosabão empó,nossen- circulam emnossacultura alegórica.Por exemplo, quandoassistimosaumcomercialdetele- segurosdiante dasimagensque é umaferramenta paraquenossintamos importantíssima de Baco. uma representação Fica então claro que a fenda,pintar apesar de imperceptível, diferença dedimensãofigurativa,Baco poisumatorquerepresenta seriaamesmacoisa existe entre odeusdovinhoeatorsetornoumuitoestreitoapontodeparecernãohaver to, oGrandeBaco umarelaçãomaistraiçoeiracomseusprecipícios. O vácuoque estabelece Era possível- contemplaraimagememanter-seafastadodasbordas desseabismo.Noentan não seintimidassecomapossibilidade de uma vertigem diante doabismoqueelacontinha. fenda instituída sobre oChristos-Heliosestava tãoexpostaquefazia comqueoobservador pseudoalegorias). Oslimitesentreasdimensõesqueaalegoriamanipulaforam violados. A prio processo alegórico) quanto duas alegorias interdependentes em sua incompletude (duas indícios levam podeserumaalegoriadentrode outra(umaalegoriadopró- acrer que tanto serassociadaàiconografiadaestatuária clássica.Muitos aposepodetambém No entanto, Lambert dizqueoombroàmostrarefere-se aosmodosdasprostitutas deRomap.32). (2008, to podeindicaracompletude dadivindade.(HOCKE,p.281-331)Gilles hermafrodita 2005, do pintor. pelas associadaaointeressemaneirista A androginiaestátanto “aberrações” quan- fantasiado deBaco?MarioMinniti,companheirojuventude Hojesabemosquesetrata grego quantodeixaescaparumaafetação teatral.Éodeusdovinho ouummodeloandrógino meio desuametáfora. brilhacomoummármore Além disso,opretensodeusdovinhotanto mas necessárioàramificaçãoalegórica,tivesse sidoparadoxalmente expostaàpercepçãopor começando adeteriorar, comosearuína doídolopagão,queabriuumespaçoimperceptível plexa. Para começar, asfolhas tanto dacoroadeparreira quantoalgunsfrutos estão dacesta Quando Caravaggio pintouoGrandeBaco, em1596, umarelaçãoalegórica- com estabeleceu

95 - A fratura iconológica 96 - Revista Poiésis, n 20, p. 85-104, Dezembro de 2012 Stupid (sejaestúpido) Recentemente amarcaderoupasDieselveiculou umacampanhapublicitária intitulada Be tidade paracadaumdeles. para dentrodesisentidosfiguradosdestroçados,pois nãoépossível criaralgumtipodeiden- ruína, poisafenda quedeveria separarasdimensõesfigurativas está,nessecaso,arrastando se encontranemdimensãofigurativa nempercepçãovisual. A alegoriafoi consumidaporsua mas umaalegoriaquefoi engolidaporessafalha, poisaloja-sedentrodela. Nessaobranão em car outraquestãoiconológicanaobradeBruce Nauman,poisomodeloalegóricoencontrado A partirdessaquestãoautodestrutiva identificadanaalegoriabarroca, épossível agoraverifi - voltasse contraelamesma. Idade Médiaproduziualegoriascontraditóriaselabirínticas,masnuncaumaalegoriaquese suas falhas paraencontrardentrodaalegoriaespaçosvazios quealeitura nãotemacesso. A existe deimperceptível eilegível dentrode seu própriocódigo. Desse modo,volta-se para Contrarreforma). Por essemotivo, seuslimiteseoque aalegoriabarroca começaatestar o procedimentoalegórico(talvezmovidas pelaautocríticaenvolvida nocontexto cultural da contra seuprópriosistemaefazem deleumdeseussentidosfigurados,ouseja, “alegorizam” foi suaforça motrizdurante aIdadeMédia.Por essemotivo, algumasalegoriassevoltam alegoria barroca éumaalegoriaemcrise,poisdesconfiadesuacapacidaderevelação, que desipróprio. alegórico noperíodobarroco setornaautocrítico,poiscomeçaasuspeitar A com o intuito de manipular essa estratégia em vez de ser manipulado por ela. O mecanismo superá-la,pelocontrário,mergulhadentrodela com aprópriaestratégiaalegórica.Nãotenta O figurados sãotãoimperceptíveis quantonecessários. ruído. Issosignificaque,nomundoalegóricoqueconstruímos, osvácuosentresentidos na que está colocada sobre a mureta. na queestácolocada sobreamureta. Associado a essaimagemestãoosseguintes dizeres: qual doisrapazes impedemqueoutra pessoafantasiadademacacoconsigapegarumabana - lambuzarem. na Atrás delas sedesenrolauma cena irônica com características surrealistas, apontodese sedeliciandocomumagrandequantidadede sorvete de umapequenamureta Grande Bacoumjogosarcástico , dentrodoslimitesdofinalséculoXVI,estabelece A Rose Has no Teeth nãoéapenasumainvestigação sobreasfissurasdomecanismo, 13 . Emumdoscartazesproduzidos vemosdiante trêsmoçassentadas *** essa contaminação. pela ideologiademercado. alegóricapodeprovocarcontaminada Apenas umainterpretação Essevaziosentam. quesepara essasduasdimensõesimpedequeaideologiasubversiva seja por qualquerpessoacomum, nãoseconfundemcomaspessoasincomunsque elasrepre- elas mesmas experimentando uma pequena subversão cotidiana que poderia ser vivenciada confundisse comaempatiaeinteligênciadaimagem divulgada. As modelos, representando nha publicitáriatãodispendiosa–nãopermitiuquea mensagem “compre roupaDiesel”se desejodecomprapormeioumacampa- roupas –queprecisanecessariamentedespertar paraapreciartodaessaretóricasofisticadaecontemporâneaporqueempresade tade sesentiráàvontodas essascenaslegendadaseologotipodamarca Diesel.Oespectador - se emparelham,masexiste umdessesvácuosquevale apenaressaltar, poissealojaentre Existem váriasfissurasimperceptíveis separandoasdiversas dimensões figurativas queali Dean” decuecaqueatiramodoestupidamente bombástico seusbensbanaisnafogueira. quálidas quedizem “sim” aosimpulsosinstintivos eextravagantes, extravasa parao “James de persuasão. A relação alegórica se espalha, pois o simbolismo associado a essas moças es- para a estupidez) e, desse modo, produz uma caricatura grosseira do poder propositalmente pseudomacaco queémanipuladodemodopatético(sugerindoumquestionadorsímbolo por comida)foram emparelhadasaumasátiraenfaticamente porum banal,protagonizada esconderam atrásdeummuroridiculamentemenorqueelas(parasaciarodesejosubversivo Essas belasninfascostura ese dopoderosomundodaalta quedesceramdeseuspedestais tras coisas,dentreelas “vida excitante” e (agitada “glamourizada’) e “anorexia” (oubulimia). ou- simbolizamuitas modelo, mastambém à profissãode não sóremete um biótipoque lhados quetalveznãosejapossível esgotá-los. As moçassãomagraselongilíneasindicando por exemplo, na mureta, sentidos figurados empare- das meninas encostadas possui tantos em cadapeçapublicitária,masumaalegoriaqueseramificaportodaacampanha.Ocartaz Ao seanalisardiversosqueexiste cartazes,épossívelnãosóumsistemaalegórico constatar stupid” (Vida longaestúpido)eembaixo novamente: “Be Stupid –Diesel”. bens materiais.Pode-se ver umacadeiralançadaaosares. Acompanha osdizeres: “Long live Diesel), diantedeumafogueira onde,aoquetudo indica,ele acabadeatirarseusúltimos vemosEm outrocartaz umjovem vestindo decostas, apenasumacueca(provavelmente “Smart says No.Stupid says Yes” (Espertodiznão.Estúpidosim)e “Be Stupid –Diesel”.

97 - A fratura iconológica Be Stupid Pôsteres da campanha publicitária da empresa Diesel (2010)

Be Stupid Pôsteres da campanha publicitária da empresa Diesel (2010) a matériaaolixoporessafantasmagoria parecemtraduzirfigurasquenãosecontaminaram moças quesaboreiamdemodosubversivo quantoojovem osorvete, decuecaatirandotoda veste contraofetiche emrelaçãoaosvácuosimperceptíveis. quecegaoespectador Tanto as medida,autocrítica,poisin- emcerta aalegoriadapublicidadeDieselétambém, No entanto, modo similaraidolatria,éalheioàleitura; emveneração. ambosparalisamoespectador crítica,abloqueia.Issoporqueofetiche,estimular aalegorese,ouseja,interpretação de todoesseenigmáticocomplexotorno dafissuraalegórica.Noentanto, publicitárioemvez de marcaapósmarca,todosos infinitamente, em citária àoutra,justapondo “comportamentos” serão preenchidos pelofetiche”. Por meiodisso,amodase ramifica deumacampanhapubli- estereotipados queespalhamentreeles,demodoefêmero,enormesvácuos cognitivos que fico, “moda éumaestratégiaalegóricaproduzida por emparelhamentode sentidos figurados lada pelosmeiosdecomunicação.Seriaconveniente retificardizendo que,nestecasoespecí- de Cristo,não “falam amesmalíngua”. “Moda écomportamento”, dizafrasedeefeito veicu- comoaimagemdodeusfluvial publicitárioedeumaobraarte,masque,tal aimagem taz . umaaproximação Issoestabelece entreasdimensões figurativas deumcar- gem remetemaalgumasobrasdeartecontemporâneacomo,porexemplo, oscartazesde Além disso,valequeascaracterísticasgráficasutilizadaspararelacionartexto ressaltar eima- Barbara Kruger. Diesel). “Be stupid”,pram diz a Diesel, “Don’t be a Jerk de ” (Não seja um otário), diz o cartaz põe-seaveneraro espectador-consumidor aquelesquenãoveneram oconsumo(equecom - adormece criandoumestereótipo a alegoriadoGrandeBaco críticaenquantoacampanhadaDiesel estimulaainterpretação sobreposição fantasmagórica,ouseja,transforma emfetiche aprópriaruína. Sendoassim, percepção nadireçãodafissuraimperceptível, nacampanhadaDiesel(ametáfora) gerauma dutora. Diferentemente da metáfora da ruína do ídolo pagão, que no em vez de descortinar umestranhamento,odesviaparaumafenda aindamaisse- metafórica da Dieselemparelhafazem dofetiche atento,pois umafiguraretórica,maséprecisoestar ilusória veiculada pela cultura do consumo. Portanto, os sentidos figurados que a publicidade 15 daquelesqueestãoacimadosestereótipos.Dessemodo Grande Baco empurra a 14

99 - A fratura iconológica Barbara Kruger Don’t Be a Jerk, 1984. gem não é, mas também encontraremnossocotidianoalegóricoesses locaisdecegueira. gem nãoé,mastambém alheio à leitura. O objetivo dessa iconologia não é apenas produzir uma teoria do que a ima- de leitura, nãosóoquehádeilegível, oqueé estratégiasquevisemenfrentar mastambém gens” umametodologiaconformista. A iconologiadeve, aosmétodos acrescentar portanto, leituras queabrigatornaqualquerferramenta voltadaexclusivamente para “leitura deima- permitindo acesso. Vivemos emumacultura emquetodaimagemestátão saturada pelas oslugaresaosquaisessesmecanismosculturaisdos mecanismos,mastambém nãoestão gem emnossacultura deve equipadaparacompreendernãoapenasofuncionamento estar que a tecnologia propicia. Uma iconologia que pretenda investigar os desdobramentos da ima - atravésgurados associadosàmercadoria,mastambém dasinesgotáveis ramificaçõesvirtuais pareceterseespalhadonãosóatravésmodo deinterpretação daproliferação desentidosfi- entre imagens. A ilegibilidadelabirínticaexistentenaproduçãoalegóricacomodoseu tanto imersos envolveO mundo alegórico em que estamos aaproximação cada vez mais frenética com queelasexpressem umacríticasocialpormeiodesuasfraturas. nossa cultura visualetextual nãosóparaexpor parafazer seusmecanismos,mastambém desconexo segundo intenções conceituais roubaalegorias ramificadas em fluidas, a artista mãe eseubebê. Tal demodo como aalegoriaquesequestrasentidosfiguradoseosjustapõe (1980) linguagem),dizoutrafrasedaartista a furtar associadaàimagem,emclose,deuma das fragmentáriasqueos separam. “We areobliged to steal language ” (nóssomos obrigados desentidosfiguradospassaaremeter,em alegoriascujajustaposição demodocrítico,àsfen - sistema dedominaçãofalocêntrico. (1996, p.149-158) Dessemodo, seuscartazesreconstro- ção – lidam com estereótiposutilizados para produzir analogias absurdas que estruturam um (verbais evisuais)relativas àsmulheres–quesãoemparelhadaspelosveículos decomunica- “signos subversivos” deBarbara Kruger, HalFoster nosajuda acompreenderqueasretóricas espalhadas em nossa cultura, expulsando a fantasmagoriaqueali se alojava. Ao analisar os comoemARoseprópria obra,tal Hasno Teeth parainserir-senasfissuras , comotambém seuprópriosistema,nãosóparaseintroduzirnasfissurasda produzir alegoriasqueatacam ointeresse pelosmecanismosalegóricos,optoupor A artecontemporânea,aoreinstalar

101 - A fratura iconológica 102 - Revista Poiésis, n 20, p. 85-104, Dezembro de 2012 passam adeterminar umfundamentodaalegoria,namedida emquetodapossibilidadedeemparelhamento figurativo sófoi viável fundo dasletrasdafrasecomoumlocal (ouumnãolocal)defratura. Porém distinto, pois aquiestásendoutilizadademodoumtanto pirada naanálisequeFoucault faz deIstonãoéumcachimbo deMagritte, naqualeleindicaafronteiraentreofundododesenhoe 9 Essanoçãodevácuoimperceptível entre ossentidosfiguradosqueaalegoriadeterminanãoexiste nateoriadeBenjamin efoi ins- (DEBRAY,e graficamenteabstrata. p.93-130). 2004. mundana cantis deorigemsemítica).Dessemodo, sepodededuzirqueaalegoriaserumresgatevisualdentrodeuma escrita 8 SegundoRegis Debray, oalfabetodesenvolvida éuma modalidadeescrita parafinsutilitários(provavelmente porcomunidades mer- um serquepossuiemsimesmoarazãoeoprincípiodesuaprópriaexistência [...]silenciosaeevidente”. (BESANÇON, 1997, p.31) 7 Alain Besançon dizqueas “figuras divinas[...]nãoprecisamfalar, nãotêmnenhumamensagematransmitir. Sua[...]qualidadede os parâmetrosabstratosdopensamentogrego.(GAUR, 1992, p.60-65). Ver STROULHAL, também p.235-242. 2009, Clemente de Alexandria, sagradaegípciademododeturpado HorapoloePlotinoqueconheciamaescrita ea “traduziram” segundo e anoçãodealegoriafoina estabelecida Antiguidade Tardia, provavelmente entreoprimeiroesegundoséculodenossa erapor nifica queosentidodessetermofoi modificadoenãomaisremeteaosistemaegípciooriginal. A associaçãoentreotermo “hieróglifo” atradiçãoalegóricapassouutilizarotermo entanto, “hieróglifo” parasereferir aoenigmáticohibridismolegível/visível, masissosig- figurado. Éprovável queogermedessanoçãodedimensãofigurativa seencontrenaideografia,masnãodevem serconfundidas.No hieroglíficafaraônica,6 Éprecisoesclarecerqueaescrita apesardeserem partepictográficaeideográfica,nãoconheciaosentido buscava umjuízo devalor, resumirtodouniverso alémdetambém depossibilidadesaessabipolaridade. 5 Nãosedeve e confundiressecontrapontocomatradicionaloposiçãoentresímboloealegoriaquepossuíaumteorfundamental que elucidaequívocos nanossaforma depensardecorrentes defalhas (oufraturas) linguísticas.(STRATHERN, 1997) Tractatus doqueotinhadito.Disso resultou aobraInvestigações eramuito mais importante Filosóficaspublicada em 1952 em que devemos falar. A partir dessa reviravolta dentro de seu próprio pensamento, Wittgenstein declarou que o que não tinha ditono Porém,poderiam serditas. paradoxalmentepercebeuqueascoisasdenãopodemosfalar também inclueminúmerascoisasde coisas(asqueultrapassamesseslimites)simplesmentenão isso nãopodemosiralémdalinguagem.Issoimplicariaemquecertas No períodoentre-guerras suasreflexões o levaram aafirmarqueoslimitesdalinguagemsãodopensamentoepor Logico-philosophicus, que produziu durante a Primeira Grande Guerra, escreveu: “sobre aquilo de que não se pode falar, deve-se calar”. rigorosamente de uma paráfrase, mas de uma inspiração nos comentários desse filósofo.4 Não se trata Na conclusão do (BESANÇON, 1997, p.599) exposição, oque,paraumrusso, significava queeleohavia colocadono‘cantovermelho’, paraossantosícones”. olocalreservado 3 Alain Besançon noslembraque “Malevitch cuidaradesuspenderseuQuadradopretonumlugarelevado aumcantodasalade dizer senãoasiprópria”. (FOUCAULT, 1995, p.312- 317) jetividade quesóaelapertencem”. [...] porMallarmé,dapalavra “a descoberta, emseupoderimpotente[...]ondenadamaistema 2 “A partirdoséculo XIX, alinguagemse dobra sobresimesma,adquire espessura própria,desenvolve umahistória,leiseob- ”.and thestruggle betweeniconoclasmandidolatry (MITCHELL, 1987, p.xiii) 1 “Iconologyturned outtobe,notjustascienceoficons,butpoliticalpsychology oficons,thestudy oficonophobia,iconophilia, Notas Tractatus exclusivo.o Alcançou podia pagar por uma. A partir de 1996 no mercado norte-americano produzindo jeans caro e aceitação a marca entrou com muita mítica na Itália do final dos anos 1970. Diz o relato que Renzo Rosso, aos 15 anos, manufaturou sua primeira calça jeans, pois não 13 Essafoi acampanhaprimavera-verão 2010, criadapelaagênciadepublicidade Anomaly London. A marcaDieseltemumaorigem é precisoquefiqueregistradaaimportânciadeMitologiasparaformulação iconológicaqueestoupropondo.(BARTHES, 1989) não leva emconsideraçãonematradiçãoiconográfica,dívidaalegóricaemuitomenosnoçãodedimensãofigurativa. Entretanto, Desse modoaomesmotempoemqueomitodeforma, nãoseresponsabilizapor seus “crimes”. Porém, aconstrução teóricadeBarthes ao queestousugerindo.Refiro-me ànoçãodequeomitodespojamitificado desuahistória,masaresguardaapenascomoumálibi. 12 Roland Barthes, quandodefineomitomoderno,identifica,pormeiodeinstrumental semiótico,mecanismosmuitosemelhantes se afenda estivesse seabrindonesseperíodo. 11 Éprecisoreforçarseriacomo queesseéomomentoemanoçãodedimensõesfigurativasportanto, estásendoinstaurada; -nascido, oSolbíblicodesalojoupagão”. (PANOFSKY, 1989, p.160-161) o perigodelevar aidentificaçãodeCristocomoSoltãolongepontoresvalar nopaganismo”. “Na eradoCristianismorecém- aceitável, amenosquefosse desdeoinicioinvestida solares”. deconotações “Santo Agostino teve deadvertir vigorosamentecontra Antiguidade estavaembebidadaonipotênciadodeus-solquenenhumaideiareligiosanova [...]tãocompletamente podiatornar-se Invictus”. vezeserguidacomopilotodeumaquadriga. Eramuitas comamãodireita representado “A experiência religiosadofinalda egípcia, elevou-se [...]naépocahelenística”. “O pontoculminante foi quandooimperador Aureliano (214 –275d.C.)proclamou-oSol “distinto de Apolo”, que nareligiãogrega”noperíodoclássico, “não tinhadesempenhadopapelimportante “mas sobainfluência 10 ÉopróprioPanofsky quemnosfornece maiorinformação iconográficasobreessetema.Na Antiguidade Tardia odeus-solHélio, asuascompletudesrestritas míticasnãoseabriamparaessainter-relação.(FOUCAULT, 1989, p.32-33) mediante aquebradaautonomiadoídolo.Dessemodo,asimagensfendidas podiamseraproximadas, poisenquantoestivessem BAUDRILLARD, Jean. Osistemadosobjetos.SãoPaulo: Perspectiva, 2008. BARTHES, Roland. Mitologias.SãoPaulo: EditoraGlobo,1989. BARTHES, Roland. Escritores,Intelectuais, Professores. Lisboa:EditorialPresença, eoutrosensaios 1975. Referências escrita”. (BARTHES, 1975, p.37) 15 SegundoRoland Barthes, oestereótipo “é constituído porumanecrosedalinguagem, umaprótesequevem fechar umburacoda contra nossapercepçãopormeiodasuperexposição dessasmesmasmercadorias. zação” vivendosentidosfiguradosdesconexos damercadoria,estaríamos emummundoondesórestaram quesãoarremessados imerso. (BENJAMIN, Dentrodeumaperspectiva 2009) naqualosentidoliteraldos objetosnãoseriamaisacessível devido à “fetichi- 14 Remetendo aoconceito “benjaminiano” noqualafantasmagoriaseriacomoumsonhoalegóricoohomemmoderno está (TUNGATE, 2008) do queroupas.Essasfamosas campanhascomeçaramnosanos1980 eaoquepareceenvolviam muitosmilhõesdedólarespor ano. sociaistransgressores deestranhamentocoolquedifundemmuitomaiscomportamentos panhas publicitáriassofisticadasrepletas status deluxo semnuncasedesprenderdoálibimíticooriginal.Por meiodessaestratégiadesenvolveu cam-

103 - A fratura iconológica 104 - Revista Poiésis, n 20, p. 85-104, Dezembro de 2012 TUNGATE, Mark.Fashionfrom Brands–BrandingStyle Armani toZara.Londres: Kogan Page Limited,2008. STROULHAL, Eugen.Osescribasdascasasda vida.In:Avidanoegitoantigo.Barcelona: Folio, 2009. STRATHERN, Paul. Wittgenstein. RiodeJaneiro: Jorge Zahar, 1997. PANOFSKY, Osignificadonasartesvisuais.Lisboa:Ed.Presença, 1989. Erwin. OWENS, Representação,apropriaçãoepoder. Craig. Arte&Ensaios,RiodeJaneiro, n.23,2012. OWENS, Oimpulsoalegórico:sobreumateoriadopós-modernismo.Revista Craig. Arte&Ensaios , RiodeJaneiro, n.11, 2004. NÉRET, Gilles.Malevitch. Lisboa: Taschen, 2003. MURICY, Katia.Alegoriasdadialética,imagemepensamentoem Walter Benjamin. RiodeJaneiro: Relume Dumará,1999. MITCHELL, W. J. T. Picture. Chicago: Theory The University ofChicagoPress, 1995. MITCHELL, W. J. T. Iconology, Image, Text, Ideology.Chicago: The University ofChicagoPress, 1987. LAMBERT, Gilles.Caravaggio. Lisboa: Taschen, 2008. HOCKE, GustavR.OPansexualismo. In:Maneirismo:omundocomolabirinto.SãoPaulo: Perspectiva, 2005. GAUR, Albertine. FOUCAULT, Michel. Istonãoéumcachimbo. RiodeJaneiro: Ed.Paz e Terra, 1989 FOUCAULT, Michel. As palavras eascoisas.SãoPaulo: MartinsFontes, 1995. FOSTER, Hal.Signossubversivos. In:Recodificação. SãoPaulo: CasaEditorialPaulista, 1996. ELIADE, Mircea.MitoeRealidade. SãoPaulo: Perspectiva, 2002. ECO, Umberto.O Alegorismo enciclopédico.In:Arteebelezanaestéticamedieval. SãoPaulo: EditoraGlobo,1987. 1994. DIDI-HUBERMAN, George.Poderes dafigura:exegese evisualidadenaartecristã.Revista deComunicaçãoeLinguagens,n.5,dez. DELEUZE, Gilles.Conversações. SãoPaulo: Editora34,2010. DEBRAY, Regis. A decolagemalfabética. In:Deusumitinerário.SãoPaulo: Ed.Schwarcz, 2004. CHEVALIER, Jean. Dicionáriodesímbolos . RiodeJaneiro: José Olypio,2002. BRUGGEN, Coosjevan. Bruce. Nova Nauman York: Rizzoli, 1980. BOEHM, Gottfried. Oquesemostra.Dadiferença Icônica.Arte&Ensaios,RiodeJaneiro, n.22,2011. BESANÇON, Alain. BENJAMIN, Walter. BENJAMIN, Walter. A History of A History Writing. Londres: The BritshLibrary, 1992. A imagemproibida.RiodeJaneiro: Ed.Bertrand Brasil,1997. Paris, doséculoXIX(Exposéde1939 capital ). In:Passagens. Belo Horizonte: Ed.UFMG,2009. Origem dodramatrágicoalemão.Lisboa: Assírio & Alvim, 2004. curadora, crítica. Pós-Graduação emEstudos Contemporâneosdas Artes daUniversidade Federal Fluminense, atua comopesquisadora,professora, graduação emHistóriapelaUFRJe MuseologiapelaUNIRIO. Professora de Adjunta do Departamento Arte edoPrograma de * Viviane Matescoédoutoraem Artes Visuais pelaEscoladeBelas Artes/UFRJ emestreemHistóriada Arte pelaPUC-Rio,com the 1960s and1970s. The notionofliteralbody, ofaction thetemporality turned thecurrent performance away fromtheartisticmanifestations of impose commercialandinstitutional mechanisms of theartsystem that The status of objects that remain after an action, as well as their images, image, aimingtoreflectontheprocessofconsolidation ofperformance. ABSTRACT: The articleanalyzes therelationsbetweenbodyinactionand Palavras-chave: corpo,performance, artecontemporânea mance dentrodamolduradosistemadearte. instável, marcasdaidentidadeinicialartecorporal,elegitima aperfor- nesse processo. A intersecçãodessesaspectosquestionaoefêmeroe papel daimagemviavídeooufotografia sãooselementosinvestigados anos 1960 e1970. A noçãodecorpoliteral,atemporalidadedaaçãoeo aperformancearte quedistanciam atual dasmanifestações artísticas dos imagens impõemmecanismoscomerciaiseinstitucionais dosistemade tatuto deobjetosquepermanecemdepoisumaação,assimcomosuas jetivando refletir sobre o processo deconsolidação da performance. Oes- RESUMO: O artigoanalisa as relações entre corpo em ação e imagem, ob- Corpo, açãoeimagem: consolidaçãoda performance comoquestão Viviane Matesco* 1

105 - Corpo, ação e imagem: consolidação da performance.... 106 - Revista Poiésis, n 20, p. 105-118, Dezembro de 2012 Henri-Pierre Jeudi desenvolve (2002) amplodebate sobrearelaçãoentre corpo eestética, umavezpo aindaimpõereservas, queseuteorartísticonãoéconsensona teoria daarte. Por maisquea performance estejaassimiladaaocircuitoinstitucional, aliteralidade docor- categoria artística,bemcomo suaprópriainstitucionalização. parasepensaraquestãodaconsolidação daperformanceelementos fundamentais como literalidade docorpo,atemporalidadedaaçãoeopapel daimagemviavídeooufotografia são ações éescapardosmecanismoscomerciaiseinstitucionais daarte,entãocomosituá-los? A de umaação,assimcomosuasimagens,supõe discussãobásica:seafinalidadedessas imprensa e recordações dos participantes. O estatuto dos objetos que permanecem depois bram testemunhosdeváriasnaturezas: objetos,fotografias, vídeos,entrevistas,informes da gesto, a fotografia esse trabalho transitório. é usada para documentar Ao final da obra, so- verdadeira quebra demoldura?Comoocorpoématerialdaarteapenasenquantodura fora dequalquer apreensãoespecular. Masseráquearessurreição dacarneimplicaemuma edadeformação,dio dafragmentação agoraseafirmaumcorpoprimário,supostamente idealizadoporintermé- Se comaartemodernarompe-seimagemdocorpoocidental mediante ênfase dedimensõesantesreprimidas,comoasexualidade, osfluídoseodores. a recepção. O corpo abandona o espelho e passa a atuar literalmente seja mediante ação ou –acriação e como sujeito quantoobjeto acaba comafronteira entre eleeo espectador tanto assumenovasartista funçõesmaispróximasdopapeldemediador. Opapelduplodoartista, doséculoXX.Diantedele,oestatuto tradicionaldaobradeartedesmorona-seeo metade O corpoemaçãoéumdenominadorcomumadiversas expressões artísticasnasegunda Keywords: body, art performance, contemporary legitimates theperformance withintheframeofsystem ofart. ofbodyart,and marksoftheinitialidentity the ephemeralandunstable, tigated duringthisprocess. The intersectionoftheseaspectsquestions and theroleofimageviavideoorphotography aretheelementsinves- das imagenscorporaisdesenvolvidas porPaul Schilder critériosnãoexistiriam.tais Para suaposição,oteóricopartedaanáliselabilidade sustentar compreensão, excetuando-se asregrasdomercadoeavaliações doscríticosprofissionais, Jeudi questiona os critérios que fazem do corpo em ação um objeto de arte, pois em sua tereótipo daexibição doscorpos,aindamaisacentuado pelosdiscursos doscríticosdearte. de rompercomoespecularnasperformances epassarparao outroladoseriaograndees- objetivando discutirsualegitimidadeenquantoobjetoartístico.Segundooautor, asintenções vida cotidiana. porRégis DebrayA mesmaopiniãoésustentada (1992) aoafirmarque,abolir bos utilizariamummimetismo caricaturesco banalidadesda darealidadeaoreproduzircertas isso, aperformance seriaparalelaàexpansão de sentidoefetuada pelo ready-made,poisam- produziria umefeitoO atodoartista de significânciaporserumconceito “implantado” e,por em suacompreensão,oprincípio degrandepartedasexperiências estéticasdosanos1960. Exacerbar aexibição docorpoparadeleextirpar todasaspossibilidadesde linguagemseria, logosetransformarepresentação emestereótipo: earealidade. entre arepresentação A exibição implicaumasuperoferta erevela oquantoa reconstituição deumasuperespecularidadequenãodependemaisdojogodascomparações para Jeudi, exibir torna-se ocontrárioderepresentar, poisaraiva doespelhosetraduzpela atemporal como um quadro ou estátua.imagens corporais em uma representação Por isso, Caberia àartegeraresseefeitoseriaaquelequetransforma eoartista as deestabilidade -lhe a tensão entre representação e realidade. (JEUDI, 2002, p.113) erealidade.(JEUDI,2002, -lhe atensãoentrerepresentação O estéticosubsistenaforma deintelectualização queprecedeaprópriaperformance retirando- emantersuspensoopróprioatodarepresentação. do pensamentoquepretendeadiantar-se emtemporealumacolisãoentreliteralidadedoacontecimentoeaatualidade senta imediata uma vezprecederiaoatodaperformance. queainterpretação Odesempenhocorporalapre- estética, aparecedeimediatocomoademonstraçãouma construção teóricapreliminar, o que é então designado como ritual em que modalidade de exibição do corpo, não importa gera umsemelhanteefeitop.28) (JEUDI,2002, deestabilidade. ras operadasnotempoeespaço,pelasubversão exercida noquedizrespeitoaostabus, estáveis.representações Éaarteque,porsuaaventura, porsuasextravagâncias, pelasruptu- convencionaisrepresentações docorpoenossasreferências culturais, maspoderiamtornar-se Se asimagenscorporaissãomúltiplas,lábeis,instáveis eincontroláveis,as desestabilizam 1 e argumenta: eargumenta:

107 - Corpo, ação e imagem: consolidação da performance.... 108 - Revista Poiésis, n 20, p. 105-118, Dezembro de 2012 agora, poisimplicaacopresença,emespaçoetempo reais,deperformer edeseupúblico. da literalidade do corpo, deDuveThierry (1981) definiua performance comoaartedoaquie pois umaperformance podeserestática,masnuncaatemporal. Também partindodaquestão to comomatérias-primasdaperformance; eotempoteriaproeminênciasobremovimento, ocernedodebateseriaanalisartempoemovimenção designos.NaopiniãoGlusberg, - (artecorporal)aoconferir plenovalor aocorpohumanoeàsuacapacidadedeprodu- programas instituídos, eocorpotomadocomoelemento doprocessoartístico.Éocasoda sua imagemespecular, pondoadescoberto a distânciarealentreasconvenções sociaiseos comunicação. Dessamaneira,aperformanceresolver tenta a contradição entreohomeme da performanceentreemissorereceptorporserumatode residirianarelaçãoestabelecida aatençãodaaudiência,condicionadapelasartestradicionais.Osignificado busca despertar Ao tomaro corpo comoobjeto artístico, longe de proporum “corpocentrismo”, aperformance jeto éumsigno,masporqueelasetornasignoduranteocursodeseudesenvolvimento. daperformance erepresentação sedeveapresentação aofato deelaexistir nãoporqueoob- partir deumaabordagemsemiológica,Jorge Glusberg(1987) queaconfusãoentre aponta outrasvertentessibilidade darepresentação, teóricasdefendem pressupostosdiferentes. A Se por um lado o debatesobre a validade do corpo como objeto de arte centra-se na impos- como artenãoserestringeàperformance, masaoready-made , enfim,aoséculoXX. tro doprópriocampoartísticocomoumareflexão sobreomeio, arejeiçãoedesqualificação clássica. se enquadrarememumarepresentação Ao den- ignoraraquestãodarepresentação ouseja,pornão acabarem comqualquerrelaçãosemânticanecessáriaaumarepresentação, Jeudi quantoDebray questionam ocorpoprimárioeaimediaticidadedasperformances por ou avidaautoimageantes. Agora aquilonãoseassemelhaou nãoseparece,masé. Tanto as fronteirasentrearteevidaaosesuprimiro “re” torna-searealidade darepresentação, nome: aprática da performance. queumaperformance Nãosepretende,portanto, produza um a cadaumseulugaretempo, eoeloparafazer existir umobjetoquenãopreexiste aseu cias estão reunidas: uma instituição, um performer, um público. Quanto ao ritual, ele assegura éumcontratoe rito.Ocontratoétrilateral,umavezjunta quenaperformance trêsinstân- dependente dohicetnunc,intransportável noespaçoenãoreprodutível notempo.Oqueos A obradeartecessaexistir umavez queo performer eseupúblicoseseparam,porissoé do própriosistema dearte. marcas daidentidadeinicial daartecorporal,passandoalegitimaromeiodentro damoldura belece entreaçãoeimagem. A reuniãodessesdoistermosesgarçaoefêmero eoinstável, - relaçãoqueseesta assimilação dacategoriapelo sistemadearteédecorrente daestreita reu naturalmente apenaspela maiorvisibilidadeeamplitude adquiridaaolongo dotempo. A universitários, galerias, museus e bienais. Pretendemos discutir que esse processo não ocor- porsuaincorporaçãoemdepartamentos lização daperformancepodeseratestada também associado aoutros,comovídeoououtrosmeioseletrônicos. A consolidaçãoeinstituciona- cênicas,nasquaisocorpoatuainstalações comoumdoselementosquepodeounãoser dos anos1960 e1970. Ocaráterdramáticodohappening oudaperformance cedelugara pois nãoexiste maisaprerrogativa doengajamento direto docorpo,incontornável paraaarte Nesse novo contextodiferença jánãofaz ouporatores, tanta seelaérealizadapeloartista e . Trata-se aídeumareencenaçãoperformances como peçasdeteatro. pectiva detrabalhosemblemáticoscomaqueles Vito Acconci, GinaPane, faznoites deperformancesnasquaisaartista umaretros- noMuseuGuggenheimem2005, . EmartigodedicadoaMarina Abramovic, Jay MurpyanalisaSetePeças (2006) , sete recentes,comoLauraLimae ChrisBurdenatéosdeartistas históricos, comoosdoartista Roselee sobreaperformance Goldberg(2006) contemporânea, englobandodesdetrabalhos ideia daconsolidaçãocategoriadepoisde40anos. umestudoA publicaçãoapresenta de vista vista segundoasespecificaçõesoriginaisconcebidaspeloartista. A re- a museus,reapresentadas tem várias edições passíveiscomo uma instalação, de serem vendidas a colecionadores ou a performance passounosúltimosanos. Agora elaassumeacaracterísticadeprojetoe,tal rida em1981 einsuficientesdiantedastransformações nosparecemlimitadas pelasquais produzir edeorganizarumefeito estéticoimediato. As afirmaçõesdessaconferência profe- ce, umavez queabrangetodaatividadehumanacujapercepção éelaprópriasuscetível de Para DeDuve oaquieagora,apresença,seriaquedistinguiria ofenômeno performan- Contemporary 21, Contemporary Duchamp. (DeDUVE,1981, p.18 ) performance comoourinolde dependedeumanominação,eissoéumobjetoarte,tal gem; umconjuntosemregrasquefoichamar estabelecido performance, porissoofenômeno umritoperformativo,objeto dearte,masqueinstaure sejacomgestos, dança,ato,ouima- com umnúmeroespecialmentededicadoàperformance, nosdá uma

109 - Corpo, ação e imagem: consolidação da performance.... 110 - Revista Poiésis, n 20, p. 105-118, Dezembro de 2012 e Fotopoemação de daação. Ana MariaMaiolino. Emtodos,apotência daimagemdáconta estupro de e, se pensarmos no Brasil, o trabalho pressuposto. Oscasossão inúmeroscomoaperformance dotirodeChrisBurden,acena de e tempoqueresumatodo oprocesso. A açãoépensadatendooclosefotográfico como a fotografia seimpõeàação;háumcorte espacialetemporal,aescolhadeespaço(corpo) celhas. Agora concebeeescolheummomento sintéticodaaçãoemumaimagem: oartista quiagem emsuafacecomumalâmina pequenaslinhasabaixo eentãocorta desuassobran- lâmina, eemPsique,de1974, ajoelha-sediantede um espelho,metodicamenteaplicama- em seuestúdioefotografada emclose.EmOcorposondado,de1975, opécomuma corta com lâminasdebarbearnosdegraus;aaçãofoi executada paraumpequeno grupo deamigos atingir umasociedadeanestesiada.Em1971 emEscalada , Pane sobeumaescadademetal o meiodaartefrancês,GinaPane acreditava queador ritualizada tinhaefeito purificadorpara fronteiras noestatuto dostrabalhoscomcorpo.Umadasreferências para maisimportantes blemáticas paracompreensãodoslaçosentreação e imagemdecomoelesestabelecem O mesmonãosepodedizer dosrituais deautodilaceração , performances em- mos comerciaiseinstitucionais daarte. eram expostos, umavez queacabavam sendoincorporadoscomorelíquiaspelosmecanis- constituírem resíduosdotrabalho,desencadearamintensosdebatessobreomodocomo da obra,fotografias efilmestinhamomesmoestatuto deentrevistas,relatoseobjetos.Por omomentodaação.Comotestemunhas oregistropararesgatar relatos complementassem anterior. As imagensnão davam dacomplexidade conta dostrabalhos;eranecessárioque e público,sendoasimagensoufilmesapenasregistrosincompletosdeumatemporalidade sitório. Esses trabalhos só existiam efetivamente no aqui e no agora da presença de artista o acontecimento,efotografiasessemomentotran- efilmeseramusadosparadocumentar como condutordeumaação.Ocorpoeramaterialdaarteapenasenquantodurava ogesto, situações comunsemacontecimentosnaturalísticos nosquaisopúblicoidentificava oartista eaçõesFluxusbuscavam serextensão davidacotidiana,girandoemtornode via diluído.Daíaênfase emprocessosorgânicoseaexploração dascapacidadesdocorpo. de choque emrelaçãoaosoutrosmeiosdamodernidadequeasociedadedemassasha- papel central,poiseraummeionovo eautêntico,umcampoinexplorado,deefeito portador Nas décadasde1960 e1970, comseuprópriocorpodesempenhava aidentificaçãodoartista Des-Compressão, de Barrio, Ana Maria Maiolino O que sobra (Fotopoemação), 1968. fotografia (Fonte: ZEGHER, Catherine. Anna Maria Maiolino: Vida Afora / A Life Line. Nova York: The Drawing Center, 2002)

Gian Pane Ana Mendieta O corpo sondado, 1975. Cena de estupro, 1973. ação fotografia (Fonte: L’ART au corps, le corps exposé de Man Ray à nos jours. (Fonte: WARR, Tracy (ed.). The Artist’s Body. Londres: Phaidon Marseille: Musées de Marseille, 1996) Press, 2000) 112 - Revista Poiésis, n 20, p. 105-118, Dezembro de 2012 tos comoduração erepetição,tédiointensidade. Apesar dediferentes, Naumane Acconci pular, deprocessos queexploram tocarviolino,osentido dostrabalhoséresultante elemen- poral. Nosfilmese,depois, nosvídeosdeBruce Nauman,envolvendo açõescomoandar, nocontinuum aintervenção adiante, ovídeo,possibilitariam ideia queseopunhaàconcepção deobjetoarteúnico,porisso,afotografia, ofilme e, buscavam final.Essesartistas única doresultado novos mecanismosde veiculação deuma séries deimagensasquaismostramotrabalhoemcurso deelaboração,emvez deimagem vezes integramoprocessodaobraaoslimitesderevistascomdossiês fotográficos com processo conceitual. comoDanGrahamou As proposiçõesdeartistas Vito Acconci muitas põe concepçãodecorpocomoelementosintáticoe introduzanoçãodeperformance como Em 1969, Vito Acconci desenvolveu a Following Piece real, porissoaênfaseentão comopeçadearte. narelaçãoarteevida,tratada emsituação.que impliqueacolocaçãodoespectador Issorequerumasituação deespaço efetuemartistas atransferência deumaconcepçãoobraenquantoobjetoparaumtrabalho e dascategoriasartísticas. paraqueos As ideiasderepetiçãoeprocessosãofundamentais fotografia, filme,vídeoaumadiversidade dedisciplinas,ambicionaumaalteraçãodoscódigos comumasituaçãoespectador perceptiva naqualousodeumapráticamultimídia,mesclando do oobjeto,masaconfrontação tidiana ederotinastrabalho.Oessencialnãoétanto que poderiamserveículos paraaspreocupaçõescomarepetição, aintroduçãodavidaco- Há umafascinaçãodiagramas,descriçõesneutras,elementos comnúmeros,mapas,listas, cesso eoprodutodaarte,ainformação eossistemassubstituem aspreocupaçõesformais. (LIPPARD, 1997) Para que procuram reestruturar artistas a percepção e a relação entre o pro- inscreve nouniverso estéticoda “desmaterialização daobradearte” característicaaoperíodo. mas elasjáestãocifradasporumformato deprocesso.Realidade efêmera,aartecorporalse Em umprimeiromomento,ocorpoéaindareferência através desuascaracterísticasfísicas, códigos e mensagens. estabelece como linguagem, elemento mediante o qual o artista conceitual retiraoaspectoorgânicodocorpoquepassaasergradativamente compreendido de umcorpolibertárioparatornar-seprocessomaisintelectual. Oprocessoinerenteàarte 1970 aperformance acabaporseimporcomomeioquedescola dessabuscadeideologia vez queestáimersaemnova atitude diantedostrabalhoscorporais. Ao longodadécadade pelopressupostodaimagem nãodeveA distânciaimposta seranalisadaisoladamente,uma (a arte de seguir), trabalho que pressu- de umprocessoespaciale tem- têm abordagem anti-heróica do corpo, o que produz importante consequência: ela estabelece nítida distância entre o artista e o corpo que, a partir de então, escapa a toda identificação que antes ocorresse. Eles introduzem na performance dois elementos que se relacionam: o primeiro é o ritmo que, por repetição e/ou lentidão ou pelo instantâneo fotográfico, suspende o fluxo normal da vida. O outro elemento é o fato de os trabalhos serem concebidos a partir do pressuposto da imagem. Esses dois aspectos separam o artista de seu corpo, que passa então a ser observado do exterior. Essa distância fez-se fundamental para que, na década de 1970 o corpo se tornasse um meio entre muitos outros.

Bruce Nauman Andando de maneira exagerada em torno do perímetro de um quadrado, 1967-68. vídeo , 8 min. (Fonte: WARR, Tracy (ed.). The Artist’s Body. Londres: Phaidon Press, 2000) 114 - Revista Poiésis, n 20, p. 105-118, Dezembro de 2012 no temporeal,naimagemaovivo emsincroniacomseuobjeto,utilizandoofeedback imediato: cepção eprojeçãodeumaimagemofísicohumano usadocomocondutor. Ovídeoinvestiu uso cotidianodapalavra mediumqueseriamsugestivas paraessadiscussão:asimultâneare- descreveria acondiçãopsicológicamaisdoquefísica.Haveria entãoduascaracterísticasdo afirma umadiferença entreanatureza dovídeoeadasoutrasartesvisuais,postoqueo crítica Rosalind Krauss(1976) Krauss comoumnarcisismoendêmico. Emsuaargumentação, A especificidadedarelaçãodovídeoebodyart(artecorporal)emestúdiofoi analisadapela balhos deBruce Naumane Vito Acconci realizadosemestúdioesempúblico. na década de 1970, embora a análise do historiador francês não situe a singularidade dos tra- Parfait (2001) comooselementoscaracterísticosdostrabalhosquerelacionamvídeoecorpo são sensorial.OsaspectosdotemporealeduraçãovídeoconsideradosporFrançois nesse caso,seriaumarelíquia,objetoquereenviaseparadadadimen- àação,mastotalmente concluímos que umafotografia nãodaria o pesodosofrimentodos24minutos. A fotografia, No primeirotempoelaéqueimadaporvelas e,levando-se otemporealdovídeo, emconta em1973,Galeria Stadler elaproduzumvídeoqueduraotempodaperformance, 45minutos. até mesmoumahora.QuandoGinaPane realizaotrabalhoAutorretratos emtrêstemposna de umabobina16mm; osvídeos,porsuavez, davam margematrabalhosde20minutos, ecâmara.Osprimeirosfilmesde xima entreartista Acconci duravam trêsminutos,otempo tempo realeafacilidade demanuseioetransportedoaparelho permitemrelaçãomaispró- o corpo. A duraçãodosuporteinfluencia o formato daobra,umavez queaintroduçãodeum senvolvimento datecnologia dovídeo,poisalteraprofundamenteostrabalhosrealizadoscom e menos naturalista, a relação entre ação e imagem é intensificada com o de- Mais abstrata aquela donarcisismo”. (KRAUSS, 1976, p.51) A condiçãodequemtransformou oobjeto-libido emego-libido,segundoateoriadeFreud é sejam externos, eéporissoqueareflexão-espelho apagariaadiferença entresujeitoeobjeto. do eucomosenãotivesseé umarepresentação passado,nemconexão comobjetosquelhe ele está comprometido ao texto de perpetuação dessa substituição da imagem. O resultado aconsciência de qualquercoisaaelaanterior.suplanta Aprisionado comsuaprópriareflexão, condição de autorreflexão. é uma imagem continuada dele próprio que do artista A resposta a imediaticidadedoespelho.Issoconstróiumasituação espacialdeclausura,promovendo a teses. A primeiraéacâmera,segunda,omonitor, com aimagemdoartista queprojeta o corpoestáaícomoseestivesse entreduasmáquinasemposiçãodeabrirefechar parên- garçam oefêmero eoinstável, marcasdaidentidade inicialdaartecorporal.Nas performances Como vimos,arelaçãoentre açãoeimagemimplicaumasériedecondicionamentos quees- categorias performance evideoperformance. pensados comoimagemque tornoupossível aconsolidaçãodeumalinguagemdocorpo nas portrabalhos poderíamos afirmarquefoi imposta exatamente aconsciênciaderepresentação De maneiraanáloga,naconjuntura dostrabalhoscorporais nasdécadasde1960 e1970, setornavamna representação evidentes, maisperdiamarelaçãocomsua funçãoreferencial. uma vez que sedesligadoestatuto daaparência;assim, quantomaisosmeiosempregados neiras diversas napintura enapoesia. torna-semanifestaçãoA representação delamesma direção àautonomiadasartes,umavez queanalisacomoossignosirãoestruturar-se dema- asucessãoeespacializaçãodotemponarrativo,resentar Lessingpassoem dáimportante relacionados aoespaçoeacorposcomsuasqualidades visíveis eaimpossibilidadederep- fronteiras dapintura edapoesia. Ao artística como aqueles definir oslimitesdarepresentação com aqueledeLessing (1998), anosantesemseutrabalhoLaocoonteousobreas escrito200 da performance como categoria. O debate trazido pelo texto de Rosalind Krauss relaciona-se dade docorpo,atemporalidadedaaçãoeopapelimagemnoprocessoconsolidação A análisedeKraussévaliosa pararefletirmossobrenossostermos deinvestigação: aliterali- a videoperformance comocategoriaartística. deseucorpoenquantoprocessonaturalístico, pecto separaoartista distânciaquepossibilita pois omovimentoaumenquadramentoquelheéexterior. nascesimultaneamente Esseas- ambos introduzem a alteridade que impede uma identificação. Nesse processo não há fusão, umdepois,adestinaçãoespectador,antes, oprocessoealinguagem,comotambém e linguagem queseconfirmaaoanalisaroconjuntodesuasobras.Então,nãoapenasháum obedecem simaumtexto prévioqueosrelacionaaumahistória: éaideiadoprocessoede como Naumame Acconci desenvolvem movimentos comseuscorposdiantedacâmara,eles destinadas àesfera privada parasatisfazer unicamenteodesejodesever. Quandoartistas exploram não são gravaçõesque osartistas porintermédio do próprio corpo; noentanto, novos suportes em que surge a videoarte. Nesse contexto, imediata o vídeo introduz resposta mo inerenteatodasasautofilmagens,masnãoconsideraocontexto deexperimentação ce háogozocertonarcisis- naaspiraçãoespecularasimesmo.Krausstemrazão aoapontar Para aautora,senasperformances aintençãoérompercomoespecular, navideoperforman-

115 - Corpo, ação e imagem: consolidação da performance.... 116 - Revista Poiésis, n 20, p. 105-118, Dezembro de 2012 historicidade inerenteàsuaconsagraçãocomocategoria. nãosóalegitimaçãodomeiopelomuseu,masprópria atesta Museu Guggenheim(2005) artística? cesso comoconsciênciadarepresentação A retrospectiva deMarina Abramovic no poderíamos questionar:areflexãooquedistinguiriaessepro- domeionãoseria,portanto, substituição doengajamentodiretocorpoemproveito deumametáfora docorpo.Então, eopúblico.Issopressupõeumadistânciaqueexplica,medida,atendênciaà artista emcerta com dor, as relações com o espaço, ou com o social, ou ainda, analisando a relação entre o do em si mesma e materializando conceitos de arte através de investigações como o corpo em processomaisabstratoeintelectualizado. A performance legitima-se, buscandoosenti- naturalístico comdesenrolartemporal,comonohappening,paraseconstituir contestatório ou afotografia.dosentidodeevento Issosignificaautonomiadomeio,quesedistancia esuspensãotemporalimpostospelarelaçãocomovídeo posteriores, ocorre distanciamento (Fonte: 21.SpecialissueonPerformance. Contemporary Londres, v. 89, 2006) performance Sete Peças –Lebre,2005. Morta Marina Abramovic

117 - Corpo, ação e imagem: consolidação da performance.... 118 - Revista Poiésis, n 20, p. 105-118, Dezembro de 2012 SCHILDER, Paul. A imagemdocorpo,asenergiasconstrutivas dapsique.SãoPaulo: MartinsFontes, 1999. PARFAIT, François. Video: unartcontemporain.Paris: EditionsduRegard, 2001, p.178-246. MURAY, Jay. Marina 21.Specialissueonperformance.Abromovic. Londres, InContemporary v. 89,p.20-23,2006. Press, 2001. LIPPARD, Lucy. Six Years: The Dematerialization ofthe Art Objectfrom1966 to 1972 Berkeley /Los Angeles: UniversityofCalifornia LESSING, Gotthold Ephraim.Laocoonteousobreasfronteirasdapintura edapoesia.SãoPaulo: Iluminuras,1998. KRAUSS, Rosalind. Video: The Aesthetics ofNarcissism.In:October.Nova York, v. 1, p. 50-64,primavera de1976. JEUDY, Henri-Pierre. Ocorpocomoobjetodearte.SãoPaulo: Liberdade,2002. Estação GLUSBERG, Jorge. Aartedaperformance. SãoPaulo: Perspectiva, 1987. GOLDBERG, Roselee. Be HereNow. 21.SpecialissueonPerformance. In:Contemporary Londres, v. 89,p.12-15, 2006. Performance etMultidisciplinarité: Postmodernisme. Montreal:Parachute, 1981. DUVE, de.LaPerformanceThierry Pontbriand hicetnunc.Chantal, (dir.). Performances tex (e)setdocuments. Actes duColloque DEBRAY, Régis. Vie etmortdel’image.UnehistoireduregardenOccident.Paris: Gallimard,1992. Referências corpo: éaautoimagemtridimensionalquetodostêm. experiência daunidadedocorpo,algomaisquepercepção,chamamos imediata esquemadenossocorpooumodelopostural do e integraçãodetodasasexperiências incorporadasnocursodenossavida,sejam elasperceptivas, motoras,afetivas ousexuais. À trutura libidinaldinâmicaquenãopárademudaremfunçãonossasrelaçõescomomeio:éumprocessocontínuodiferenciação ou imaginação:envolve mentais. A noçãodeimagemcorporalnãoémodelofisiológico,massupõees- figuraçõeserepresentações Para oautor, asolidezdocorpodependedecontínuaconstrução ereconstrução não émerasensação desuaimagemque,noentanto, 1 Em1935, tendoformação emneurologia,psiquiatriaefilosofia,Schilder desenvolveu umainvestigação sobreaimagemcorporal. Notas pelo PPGAV daEBA/ UFRJ. colaborador docursodemestrado PPGA damesmainstituição. mestre(2001) Étambém emLinguagens edoutor(2005) Visuais plásticoeperformático,*Ricardo MaurícioGonzagaéartista professor adjuntodaUniversidade Federal doEspíritoSantoeprofessor Keywords: art,body, performance, technical images,technology horizon of the new technologies. ception ofthebodyasanobjectliabletomanipulation intheoperational tual proposalscangeneratepracticalundesirableresults, fromtheper- analyzes, from a phenomenological perspective, how audacious concep- art.Italso digmatic influenceontheextended fieldofthecontemporary tist Stelarc fromthe theoreticalperspective ofthe technical images para- ABSTRACT: The articleapproaches thepoeticalwork ofthe Australian ar- Palavras-chave: arte, corpo, performance, imagenstécnicas,tecnologia operacional dasnovas tecnologias. percepção docorpocomoobjetopassível demanipulaçãono horizonte práticosindesejáveisais audaciosaspodemgerarresultados apartirda perspectiva fenomenológica, proposiçõesconceitu omodocomocertas - sobre ocampoampliadodaartecontemporânea. deuma Analisa também, da perspectiva teóricadainfluênciaparadigmáticadasimagens técnicas australianoStelarcapartir RESUMO: Oartigoabordaapoéticadoartista Eu, robô? otrânsito doserhumano ao pós-humanoemStelarc Ricardo MaurícioGonzaga* 1

119 - Eu, robô? o trânsito do ser humano ao pós-humano... 120 - Revista Poiésis, n 20, p.119-136, Dezembro de 2012 invólucro deumapresença”, Le p.15) observa Breton. (2003, temporâneo ocorpoépensado comoumamatériaindiferente, simplessuportedapessoa[...] perspectivalá para cá, esta vem se ampliando e se reforçando: “no discurso científico con- apenas pelasingularidade de suasengrenagens”. (DESCARTES, apudLEBRETON, p. 17) De que “o modelodocorpoé a máquina,ocorpohumanoéumamecânicadiscernível dasoutras doséculoXVII,Descartesformulava,No âmbitodavisãomecanicista Le como destaca Breton, na perspectiva demanipulaçãoradicaldarealidadequeoparciência/técnicahojeproporciona. relativa àconstrução deadmiráveis mundosfuturos quenóseasnovas geraçõeshabitarão 17) oproblemadaresponsabilidade Encontramo-nos hojefrenteaodesafiodecomoenfrentar em umcadáver, aqualdesigneipelonomedecorpo”. (DescartesapudLEBRETON, p. 2003, comoaparece deossosecarne,tal rosto, mãos,braços,etodaessamáquinacomposta dualidade originária nos termos corpo/mente: “considerei-me primeiramente como tendo um nasequência,porsuaprolongaçãoformuladatambém, pelocogitocartesiano,queatualiza a tão mais no céu,mas na Terra”. tradição, seja pela via docristianismo, como Herdeiros desta humano comotúmulodaalma,imperfeição radicaldeumahumanidadecujasraízes nãoes- francês David Lep.13), Breton (2003, queprossegue: “Platão, porsuavez consideraocorpo desdeospré-socráticos”, docorpopercorre omundoocidental de suspeita osociólogo aponta Remonta aosfilósofosentrecorpoealma: pré-socráticosaseparaçãodualista “uma tradição objeto deanálise. oquejustificasuaescolhacomo cialmente pertinenteaquestõesemergentesfundamentais, como espe- contemporâneos. Dentre estes, o australiano Stelarc se destaca vários artistas fazer eparecer, põem emcirculação,commaioroumenorpropriedade,asproposiçõesde ções docorpocomosujeito,objetoeimagem,passíveis deserem vinculadosaosverbos ser, Existência, operacionalidadeeidentidade,conceitosvinculadosrespectivamente àspercep- que podemosdenominarde “extremo contemporâneo”. chamado “campo ampliado” daartenacontemporaneidade,emespecialsituação atual no centralparaaspreocupaçõesdeváriosartistas passou aocuparumaposiçãotambém cide sobreomodocomonossaexistência comoseresvivos eautoconscientessemanifesta Somos umcorpooutemoscorpo? A questãocentralparaadefiniçãoontológicaquein- Corpo sujeito, corpo objeto, corpo imagem manipula ascoisaserenunciaahabitá-las”, ética holística,persistindoemsuavisãoparcialedescompromissadadomundo, “a ciência apartirdeumaperspectivaIsto decorre deque,emsuarecusatradicionalseestabelecer saímos de um modelo clássico de representação que contavasaímos de um modelo clássico de representação com a noção de uma verdade pela influênciaparadigmática dasimagenstécnicas,sendoafotografia aprimeiradentreelas, cionada anteriormente.Engano. Nocampoampliadodaartecontemporânea, caracterizado se dariacomamesmanaturalidade nocasodapercepçãodocorpocomomáquina, men- segundavertente, por esta seevidenciaapresentada emsimesma,aparentemente istonão Ora, sealigaçãodocampodaartecomoproblema da relaçãoentreidentidadeeaparência, à imagemdenossaface. para nossapercepçãodomundoeoutro,identidade pessoalseassociaplenamente indivíduo veioeconfirmarque,dadaaimportância queosentidodavisãotem estabelecer tituiu apartirdoRenascimento miméticadoreal,oretrato nostermosdarepresentação De outraperspectiva, quesecons- pelaviadeumdosaspectosdatradiçãoarteocidental ação sobreomundo. comoobjetopassíveltomando-o, portanto, dealterações queaumentemsuacapacidadede incidesobreocorpocomoalgoàparte,sejadamenteoudoespírito, A visãomecanicista em relaçãoaeles.ComosugereMerleau-Ponty, aassumirresponsabilidades desuasoperaçõescomcenáriosconsequentesetambém tado em suaeuforia deonipotência,aciênciarecusa-serefletirsobre oenvolvimento doresul- o mundoatual”. (MERLEAU-PONTY, 1974, p.275)Eximindo-se dequalquerjuízo devalor ético, veis astransformações com permitidasporsuadefinição,sódelongeemsedefronta brica para si modelos internos delas [das coisas] e, operando sobres esses índices ou variá- quantoirresponsável,seus procedimentosoperatórios,comocriançatãosuperdotada ela “fa- 1974, p.276) silenciosamente sob minhas palavrassentinela que se posta e meus atos. (MERLEAU-PONTY, queéumamáquinadeinformação,lícito sustentar massimessecorpoatual quedigomeu,a lavrado comosãoemnossavida,paranossocorpo,nãoessecorpopossível tais doqualé em geral–torneacolocar-senumháprévio,nolugar, nosolodomundosensível edomundo mister se faz queo pensamento deciência – pensamento de sobrevoo, pensamentodo objeto

como observou Merleau-Ponty.como observou (1974, p.275)Em

121 - Eu, robô? o trânsito do ser humano ao pós-humano... 122 - Revista Poiésis, n 20, p.119-136, Dezembro de 2012 verdade domundo, campos dosaber. A ciência, comsuasestratégiasdeobjetividade,queintentavam revelar a mudançade perspectivaalteraçãonaformaesta geraumaimportante comose organizamos eaquichegamosFlusser acrescenta, aopontocrucial quefecha aalçadoargumento,que emancipadas da “outra” realidade, adomundo. dasimagens esimultaneidade serásubstituídalidade lineardaescrita pelainstantaneidade não hierárquicacomqueasimagensoperamentresi ecomarealidadeexterna. A tempora- cujo paradigmaestrutural aseguinteserámoldadapelarelaçãosimultâneae seriaaescrita, Se aprimeirasituação históricacaracterizava-se porummodelolinear de desenvolvimento conceito pensado”. (FLUSSER,1985, p.18) não maistornamvisível odiscursofalado, mastransformam emimagem,someatoo (FLUSSER, 1985) Segundo a conceituação de Flusser, “prétextos, prescrições, programas de dar significado ao mundo”. (FLUSSER, 1996, p. 68) Torna-se, segundo Flusser, “pré-texto”. plicar o mundo, mas para dar-lhe sentido”, colaborar “com a nova imaginação na sua tarefa omundoepensamentoconceitual2006) adquirenova função: nãomaisparaex “serve, - e sentidoaomundo. Agora, torna-sepreciso,porassimdizer, (GONZAGA,“pro-presentar” nele. Ou seja, nós é que atribuímos valoressignificado no mundo a não ser o que projetamos espera deserrevelado,comele.Nãohá massedáapartirdenosso contato representado, omundo.Nasegunda,percebe-sequesignificadodomundonãoestálá,à re-presentar cação: naprimeirasituação, osignificadovem domundo,épreciso extraí-lo dele,portanto, aíumamudançaradical,inversãoNota-se vetorial nadinâmicadeproduçãodasignifi- absurdo” e significadosobreomundo”.“que éohomemquemprojeta (FLUSSER,1996, p.68) nada nomundoquepossaserdecifrado,[...]aonascermosfomosnum projetados a adquirir “caráter textual”, texto aserdecifrado,nova consciência “‘descobriu’ quenãohá textos, projetava, ainda segundoFlusser, sobreomundo”,“as regrasdaescrita quepassava “a consciência histórica, linear e calculadora”. (FLUSSER, 1996, que derivava p. 67) Se esta, de nativa, computadora”, queeledenomina “consciência pós-históricaemergente” eirásubstituir Segundo Vilém Flusser, com a fotografia surge uma nova consciência, “bidimensional, imagi- uma situação atribuiçõesdecompetênciasseconfundem. emquetais aser prévia absoluta “lida” portextos porimagensartísticas,para científicoseapresentada da imagemfotográfica com oreal. a importânciadalegenda. Ela éotexto quevai produzir, ousimular(quemgarante?)ligações tudo maisnada) dafotografia quemostra,porserimagem, nãotemcomoacrescentar deriva forçaquando? Emais:onde?Desta (quetudo fraqueza (queparaalémdeste mostra)edesta o fotografado, retirando-odofluxo dotempo.Istofoi: sim,mas “o quê” éisto?Etambém: sa nasualógicatemporal,continuaasemodificar, ao passoqueaimagemfotográfica congela real eofotográfico –quecomeçanomomentomesmodoclique. A imagemdomundo,imer- “isto foi”, umadistância entreestesdoiselementos–o passa aseproduzirimediatamente fusãoda imagemfotográfica aesta comseureferente,Simultaneamente quedizsemcessar “adere aoreal”. (BARTHES, apudCOUCHOT, inPARENTE, 1993, p.40) a partirdeumaconexão físicacomseureferente, otrecho dorealfotografado, afotografia grifo meu]”. (BARTHES, 1984, p.15) Portanto, analógica, nasuaindicialidade,porqueproduzida paradas: avidraçaepaisagem,[...],dualidade(s)quepodemosconcebermasnãoperceber que, ela “pertence aessaclassedeobjetosfolhados cujasduplas folhas nãopodemserse- referente, a fotografia sempre dizendo estará que‘isto foi’ [ou ‘isto aconteceu’], (‘ça yest’)”, já cionava que “por mais queumadistânciavenha inapelavelmente seinterporentreelaeseu natureza”. (PEIRCE, apud fotográfica é sejaproduzida,esta “obrigada fisicamenteacorresponder pontoporà Charles SandersPeirce que,devido observou àscircunstânciasquepermitemaimagem formações radicaisemnossapercepçãodemundo. primeiramente apartirdainfluênciaimagemfotográfica edo modocomoelaoperatrans- a artequantoparaciência,cabeanalisar, omodocomoistoocorre, aindaquesucintamente, para seasimagenstécnicasfuncionamparadigmaticamentecomomodelostanto Entretanto, confundir e,porvezes, asesuperpor. Assim, nestecenário, oslimitesentrecamposdeaçãodaarteeciênciapassamase repensarmos conceitoscomo “verdade” e “conhecimento”. (FLUSSER,1996, p.68) procurava conferir significado[grifo meu].Ora,ciênciacomoumaarteentreoutrasobrigará que atransformará emdisciplinaartística,jáqueaarte(opensamentoimaginativo) sempre deixará deserdisciplinaqueexplica epassaráaserdisciplinaqueconfere significado[...],o SANTAELLA; NÖTH,1999, p.110) Roland Barthes, porsuavez, men- [

123 - Eu, robô? o trânsito do ser humano ao pós-humano... 124 - Revista Poiésis, n 20, p.119-136, Dezembro de 2012 -se comomatéria-prima paraqualquer significação, redimensiona aoextremo opoderativo com sujeitosvariados. Omundo,assim percebido,não-significanteemsi,masconstituindo - de disponibilidade para novosestado significados possíveis produzidos na interação relacional cial entreomundoeasnovas imagenssignificantes, então, todas as coisasencontram-seem serem reveladas; se,ainda,produz-seumvácuo designificaçãonopercursodadistânciaindi- absurdo, comosupõeFlusser, apartirdaimpossibilidade decrençaemverdadesa absolutas para todos os agentes envolvidos efetivamente na operação. Se o mundo apresenta-se como curso entreoolhoeamente,estipulaumanova cargaderesponsabilidade moraleintelectual ça naquela “verdade espiritual” interna, para oespaço entre objeto e sujeito, e neste, no per - deste movimento de externalizaçãoA constatação do conteúdo, que parte da falência da cren- realizações quevãoproduzirnovos sentidosparaoreale,porconseguinte, fundarofuturo. realização dotrabalho,comodefato sedá,masdeconscientizardopoderimplícitoem apenasdeteragoratodososmateriais,técnicaseassuntosdisponíveisNão setrata paraa práticosdetransformaçãoque seconfiguracomoéticaemfunçãoderesultados doreal. precedentes deampliaçãodanova consciênciadesuaresponsabilidade.Responsabilidade de novos significados. Assim, a exigência a ampliação do campo da arte implica também sem dos osseres,todasasimagensetextos estãodisponíveis paraagenciarinteraçõesprodutivas pliado” daarte.(KRAUSS, 1984) Édissoquesevalenaatualidade. oartista Todas ascoisas,to- pessoas podemproduzirnovos sentidosdentrodaquiloquesepodechamar de “campo am- Assim, emprocessos alegóricos,agenciamentosentreimagens,textos, coisaseatémesmo Jasper Johns ouasmarilyns serializadasde Andy Warhol. desde o ready-made duchampiano até a cabra de Rauschenberg, de as latinhas de cerveja paradoxal. Dualidadeque,napráticaseconfigurouemblematicamente naartedoséculoXX dualidade deslocamento dosentido,aomododaalegoria,quesenutreprecisamentedesta distância indicialfundadapelaimagemfotográfica, umapossibilidadede decorre, portanto, 1992) operaçãoqueafirmaoduplonounoaparenteetempormodeloa A partirdesta objeto, qualquerrelaçãopossasignificaroutracoisa”. (BENJAMIN, apudOWENS, a definiçãode Walter Benjamim, naalegoriaficadispostoque “qualquer pessoa,qualquer funcionamento. Como? Alegoricamente. Etimologicamente,alegoriadiz: “outra fala”. Segundo a fotografia serelacionacomorealedoefeito decorrente da legendacomoparadigmade Muito doqueseproduzemartenacontemporaneidadevale destemodoindicialcomo com suacaracterísticamaismarcante:adinâmicadeseupotencialmetamórfico. Para estevetor propresentativo,projetordesignificâncias,asimagensvirtuais contribuem produzidas apartirdeconceitos–pré-textos. zarão plenamente a definição de imagens pós-históricas da definição de Flusser – imagens dequalquerreferentepela ausênciatotal imagéticoprévio,que, exatamenteporisso,reali- vos de percepção do real. Por sua vez, serão as imagens virtuais, que diferem das fotográficas arte baseia-se,comovimos,nomodoaimagemfotográfica influencianossosdispositi- essaanáliserelativaNo entanto, àpossibilidadedofuncionamentoalegóricotrabalhode quais admiráveis mundosnovos? de cadaopção. Trata-se agoradeinventar pontespossíveis sobre o abismo, mas pontespara consequentementeacargaderesponsabilidade eaumenta nesteintervalo de intervenção (STELARC apudJONES) eram, emparte,umcaminho paradeterminarosparâmetrospsicológicosefísicos docorpo”. Nas palavrasto peloartista. dopróprioStelarc, “as primeirasperformances desuspensão 2002) A continuidade doprocessodemonstraaênfase napercepçãodocorpo comoobje- um tipo de subjetividade para outro tipo, a ser atingido mediante a prática ascética”. (ORTEGA, cética pressupõeanoçãodeumaidentidadeemtrânsito, “ela constitui umdeslocamentode cessos desubjetivação, daordemdasasceses,segundoFrancisco as- Ortega,todaconduta Apesar deasexperiênciasprimeiras performancesparapro- desuspensãodestas apontarem de outraordem. volvida, para longe de seu contexto originário em função de uma intencionalidade, pré-textual, imagem fotográfica. Ocorre aqui o deslocamento do evento, com sua noção de sacrifício en- característico, como vimos,dofuncionamento paradigmáticoda de deslocamentoalegorista, culturas, típicosdecertas sofremaquioprocesso tem aosritosdepassagemàidadeadulta (ou deseucorpo)pormeioganchos suspensões,quereme- fincadosemsuapele.Estas Em suas performances australiano Stelarc produzia suspensões de si próprio iniciais, o artista Stelarc

125 - Eu, robô? o trânsito do ser humano ao pós-humano... Stelarc Sentando, balançando: evento para suspensão de pedra Tamura Gallery, Tóquio, 11 de maio de 1980. (Foto: Kenji Nosawa)

Stelarc Animação suspensa durante sua performance na Galeria Armadale. (Foto: Claudio Oyarce) Os trabalhos seguintes refletem a importância que a tecnologia assumira para Stelarc a partir de sua estada no Japão. Em O terceiro braço, ele acopla uma prótese, um braço robótico, a seu braço direito. É interessante notar que, inicialmente, o aspecto visual do trabalho tinha importância substantiva e, somente em seguida, o artista se ocuparia com a possibilidade de acrescentar aspectos funcionais à prótese. Segundo ele, “o terceiro braço foi projetado inicial- mente como um acréscimo visual ao corpo, mas a tentação de encontrar algum tipo de uso funcional para ele resultou em algumas tentativas de desenhos e textos escritos”. (STELARC apud JONES). Sintomaticamente, sua descrição do processo de escrita destes últimos revela seu conteúdo como proposições conceituais prévias, ao modo de pré-textos, expresso pelas palavras escolhidas por ele:

devido ao espaçamento entre as mãos, você tem que escrever cada terceira letra, então não se tratava tanto de um controle físico, mas da tentativa de lembrar a sequência das letras. Então eu escrevia ‘e’, ‘l’, e ‘i’ como três primeiras letras e então deslocava as três mãos para escrever ‘v’, ‘u’, e ‘o’, movia novamente, e escrevia ‘o’, ‘t’, e ‘n’. Demorei vários meses praticando isso para conseguir um resultado relativamente delicado. (STELARC apud JONES) Ou seja, a palavra resultante era evolution (evolução). Sugestivamente, além desta, Stelarc só conseguiu atingir o resultado pretendido com uma outra: decadence (decadência).

Stelarc A“Evolução” escrito à mão Galeria Maki, Tóquio, 22 de maio de 1982 (Foto: Akiro Okada) 128 - Revista Poiésis, n 20, p.119-136, Dezembro de 2012 to metamorfoseável em funçãodasnecessidades funcionaisedosdesafios que oaguardam. complexoda: ocorponãocomoresultante deumprocessonatural evolutivo, mascomoobje- como sintomadaperspectiva surgetambém assumi- tência nautilizaçãodotermo peloartista (designed) Corpos desenhadosouprojetados “para seremabertospara oambiente”. A insis- em seudiscursonapercepçãodeumaausênciacotidiana docorpo: entrecorpoemente,característica,comovimos,dacultura emerge ração dualista ocidental Fator paraoprocessodeconcepçãodocorpocomoobjetoemStelarc,asepa- fundamental com umamoçaquetinhaumbraçoartificial: corpo comoobjetosuscetívelemStelarcésuadescriçãodeumencontro deserdescartado Significativa paraacompreensãodoprocessodedeslocamentodapercepção também apud JONES) pelo fatoé aumentada de que nós funcionamos automaticamente e por hábitos. (STELARC ausência pos ausentes,comocorposdesenhadosparaseremabertos para oambiente.Esta fazemos yoga.nomundoporquenósevoluímos Então, nós operamosmentalmente como cor- fisicalidade emergeéquandotemosumproblema,nos sentimosdoentes,ouquando nossos corposfísicosparecemrecuarparatrásdenós,eo único momentoemquenossa nósoperamosnomundoe noespaço.Mentalmente, o quesignificacorposeprojeta desenhado paraserabertoomundo,eleécompostopor dispositivos deinputexternos, o queéintriganteparamimcomonósevoluímos comocorposausentes.Porque ocorpoé toda anoçãodecorporificaçãoeidentidade[grifo etraduçãomeus].(STELARC apud JONES) eoferecidaparte daquelapessoatinhasidosimplesmentedesconectada aoutrocristalizou eu comquatro,eelasaiuandandoumsó!Masaideiageraldequeoeravisualmente o braçodesimesma,meentregouesaiuandando!Foi porqueláestava meiodesconcertante, seus braçoseeudisse: “Bem, sim,claro.” ela,noato,desatarraxou Esemamenorhesitação, eu tenho sempre alguns extras?” de ficar com um de Então ela me perguntou se eu gostaria ou eu estou sempre perdendo um dedo ou queimando uma parte do braço, então consertado, disse: “você temnoçãodequeeutenhomuitosdessesbraços[jáque]sempreumsendo movendoficou bemanimadaporestar ela amãomecânica.Depoisquedesconectamos, ummecanismooperacional,entãonósaplicamos algunseletrodosnobraçodelaeela mentar artificial, basicamenteapenasestético[cosmetic].Elaeraestudante dearte equeriaexperi- vieram falar comigonofinal.Empoucotempo,percebiqueumadelastinhadefato umbraço ofereci umseminário sobreOterceirobraçohámaisoumenosdoisanoseduasgarotas Segundo BrianMassumi, Stelarc nãoestá sozinho.Odesejode atingir apossibilidadedeuma identidadepuramente oprocesso,jáemandamentoacelerado, decoisificaçãodoser.aí, àmedidaquealimentam imaginário douniverso daficçãocientífica. Esteéoseupré-texto eoriscoresidejustamente derivam realidadesficcionais,jáqueestas emgrandepartedo transposição paraorealde tais proposiçõesresideexclusivamenteOra, oteordeaudácia tais nasugestãodeefetiva máquinas esereshumanos: que,nolimite,produziriamhíbridosde pormeiodeprocessosmetamórficos físicas ementais declara ocorpoobsoletoepassaasugerirbuscadeumaotimizaçãosuasperformances proposições, Stelarcrevela umaperspectivadatécnica, derecepçãoeufóricadasconquistas Dando continuidadeaeste processo depercepção objetivada docorpo, na sequênciade suas SISTEMAS HÍBRIDOS HOMEM-MÁQUINA etc. (STELARC, in DOMINGUES, 1997, p.54-59) [...] TROCAR A PELE[...]SEMNASCIMENTO /SEMMORTE –OZUMBIDO DO HÍBRIDO [...] SUAVE ESENSUAL DEUMLOCALOU UMA TELA. [...]Comointerface, apeleéinadequada político. Masagoraesticadaepenetradapormáquinas, A PELENÃOÉMAIS A SUPERFÍCIE amente afronteiradoeu.Comointerface, umavez elafoi olugardocolapsopessoale SUPERFÍCIE EOEU. Comosuperfície,umavez apelefoi- ocomeçodomundoesimultane como umobjeto–NÃOUMOBJETO DEDESEJO, MAS UMOBJETO DEPROJETO [...] A sim comoumaestrutura asermonitoradaemodificada.Ocorponãocomoumsujeito,mas HUMANO. Nãofaz maissentido ver ocorpocomoumlugarparaapsiqueousocial,mas com seunovo ambiente extraterrestre [...]REPROJETAR OCORPO/REDEFINIRQUEÉ cisão, velocidade epoderdatecnologiaestábiologicamentemalequipadoparasedefrontar da binocular eumcérebrode1.400 cm O CORPOOBSOLETO: seumcorpobípede,querespira,com visão Éhoradeseperguntar para ousoeanecessidade[traduçãominha].(MASSUMI apudSMITH,p.142) 2005, po comoumobjetoconhecidodarazãoinstrumental comfunçõesconhecidaseregularizadas sua extensão-atual paradentrodopensamentoúnicodarazãoinstrumental. Eleassumeocor- meça pelopolodapossibilidadecomolimite,oexterno dafuncionalidadedocorpo,de sensível objetivado, cujomodoabstratoéodapossibilidade.Stelarccomeçapelofim.Eleco- paraStelarcéaabordagemdocorpo comoumobjeto–conceito o queéimportante quantidade, complexidade equalidadedeinformações queacumulou;éintimidadopelapre- 3 éumaforma biológicaadequada.Elenãopodedarconta

129 - Eu, robô? o trânsito do ser humano ao pós-humano... Stelarc A terceira mão Yokohama, Tóquio, Nagoya, 1984 (Foto: Toshifumi Ike) pela seguinte descrição: apud JONES) Oentusiasmo pelosavanços doartista áreapodeseravaliado científicosnesta não odomíniodocyborg,masdasimagens inteligentes”.to bemhabitar (STELARC limites dopós-humano.Neste contexto elesugereque “o domíniodopós-humanopodemui - protética Partindo deuminteressecrescenteporsistemasrealidadevirtual, StelarcrealizaCabeça uma vez por todasdasamarras deumcorpomaterial. gens numéricasnasquaissedissolveria navirtualidade deumaexistência finalmentelivrede por transformações radicaisdarealidadedocorpoobjetificadoparaatraduçãoseremima- passasse,comoefetivamenteNada maisnatural, queoartista portanto, ofez, dointeresse imagens sintéticas,semdaraimpressãodemudar universo”. (JEUDY, p.152) 2002, Henri-Pierre Jeudy,como observa ver “Stelarc passar dos ‘rituais de suspensão’ ao uso de po étomadoemlabilidadesimilaràdasimagensnuméricas, deixandodesersurpreendente, Assim, emprocesso de feedback sobainfluênciadoparadigmadasimagenstécnicas,ocor- (MERLEAU-PONTY, 1975) “o eamatrizdequalqueroutroespaçoexistente”. corpoéparaaalmaoseuespaçonatal ônticaquantoontológica. à suaprópriadissolução,tanto Afinal, comodisseMerleau-Ponty, posto devir libertárioradical,corre-se oriscodepermeabilizá-loaoperaçõesqueconduzirão quaisquer limitesexistenciários –ônticoseexistenciais –ontológicosemnomedeumsu- definir que,natentativadeultrapassarasfronteirasfísicasdoentequesomos,abandonando o principal:nostermosdafenomenologia poderíamos deHeidegger(HEIDEGGER,2002), sem restrições,aplicando-a,maisqueaocorpo,próprioser, elidem,nessemovimento, Tais proposiçõesqueliteralizamavirtualidade pós-fotográfica eatualizam-na fisicamente Institute of Technology (MIT),porLe citada Breton: radicaisnocampodaciência,comoadeG.J.tas Sussman,professor doMassachusetts incorpórea, espiritual efazê-laprótesesonipotentesmotivaalgumaspropos- habitar também em 2003 que sinaliza uma ampliação mais radical da possibilidade de extensãoem 2003 dos última geraçãoquevai morrer. (SUSSMAN,apudLEBRETON, p.215) 2003, em outramáquina. Todos Infelizmente deserimortais. nósgostaríamos temoquesejamosa eternamente. Mesmoseparar, você podesempreseretirarparaumdisqueteerecarregar-se Que osdiaboscarreguem ocorpo físico,nãoteminteresse.Masumamáquinapodedurar se você puderfazer umamáquinaquecontenhaseuespírito,entãoaévocê mesmo.

131 - Eu, robô? o trânsito do ser humano ao pós-humano... 132 - Revista Poiésis, n 20, p.119-136, Dezembro de 2012 a ser selecionadas para aumentar suaschancesa serselecionadas paraaumentar desobrevivência e,consequentemente,de ças vantajosasque,submetidas aoprocessonatural dacompetiçãoentreespécies, venham as espécies, é a única que tem a capacidade, e pode ter a pretensão, de produzir as diferen- capacidade performática doindivíduo nomundo.Sabemosqueoserhumano,dentretodas queelalê,alucinando-a paroxisticamente, da comobuscadaotimizaçãoirrestrita darwinista sensato quedevamos, aocontrário, procurar entendê-la como informada pelaprópria tese a motivaçãohibridaçõesnaideiade originalparatais “fim daevolução darwiniana”, parece 1996) Ora,oproblematalveznãosejatãosimplesassim. Emprimeirolugar, longedebuscar cemos; elaéocomeçodahibridaçãodobiológicopelo artificial”. (STELARC apudDONGUY, Para Stelarc comoaconhe- “a tecnologiaonipotentemarcaofimdaevolução darwiniana isto é,transforma emimagem.Umpós-trato:pós-humanoepós-histórico. geradaapartirdeconceitosqueimagina, Uma imagemtipicamentepós-histórica,portanto, SMITH, p.72)OqueseconfirmanadescriçãodopróprioStelarc, 2005, protótipo dasconversações futuras entrehumanosecomputadores”. (KROKER; KROKER, in de que esta “é aprimeiravisãoeletrônicadocorpolíquido”. Assim, segundoeles, “para além a verdades pessoaisprópriasaoindivíduoStelarc. Arthur eMarielouise Kroker consideram desprovida dequalquercaráterrepresentativo,expressivo deconteúdosinterioresrelativos similaridade comaaparênciadafacesurgeaquicomoumainterface doartista comunicativa Sua cyborgs ealiens,autômatosconstructos deinteligênciaartificial,aCabeçaprotéticaéo Cabeça protéticanãoéumautorretrato nosentidoclássico,longedisso. A relaçãode (STELARC apudSMITH,p.231) 2005, problemas associados às noçõesdeconsciência,inteligência,agenciamentoe corporificação. deve suporque elailustraalgumtipodeinteligênciaincorpórea.Depreferência, elaexpõe os pode dizer queelaéapenastãointeligentequantoapessoafala comela[risos].Nãose eresponde àpessoaqueainterroga. dor queseassemelhadealgummodoaoartista Você [a ção naInternet,temquehaver melhorescaminhosderecuperação”. (STELARC apudJONES) informa noçãodeagentesvirtuais- de manhã.Esta ébeminteressante,claro,porquecomtanta paravocêzer oresultado paraoseuagentequequerevirtual eapresenta coleta em que se pode programar um agente para procurar informação na Internet: “você só precisa di- [d]o trabalhodePatty Neece,noMIT, queestátrabalhandonumprojetodeagentesdaInternet, Cabeça protética]éum sistema conversacional- – uma cabeçaem3Dgeradapor computa Stelarc Cabeça protética São Francisco, 2003. 134 - Revista Poiésis, n 20, p.119-136, Dezembro de 2012 soal e no momento no qual uma determinada instituição funcionará”. (STELARC Para ele, “juízos de valor sãofrequentemente imersos na memória cultural, na história pes- que estessãosempredifíceisdesefazerque acredita alémdeserempolêmicos”. (STELARC) Stelarc “evita emitirjuízos devalor oumoraissobre opapeldatecnologianasociedade,já Atuando decompetências, aindadeacordocom oparadigmamodernodedivisãoparcialista JONES permanecerhumano”significado deterumcorpoouseaindaéimportante (STELARC apud mim, elas[asperformances] sãoestratégiasdeusonovas tecnologiasqueredefinemo venhamque istosedêaopreçodeestas adeixarserpropriamentenossas. “Para qualquer projetodesupostoaprimoramento “nossas” capacidadesperformáticas, mesmo permeabilidadeatodoe Stelarc desafiaoslimitesontológicosdohumano,propondosuatotal arriscando oslimitesquedefinemomododeserdoentesomos. alterandoasregrasdessejogoeconsequentemente – asalteraçõesgenéticas–,estamos na forma final, através das interferências cirúrgicas, plásticas ou não; seja na causa original Isto querdizer que,quandonostornamosaptos,comoagora,a modificar anósmesmos,seja é ampliada. pelos quais nossa capacidade de ação sobre o ambiente, incluindo a de transformação deste, mais complexas, industriais,técnicas(máquinas);oupós-industriais (aparelhos)sãomeios reprodução. As próteses, desde asmais simples, pré-industriais (os instrumentos); até as Maturana, Stelarc? Orobôaindaéum “eu”? Comoindagaoteórico dasciênciasdacognição,Humberto tecnologias úmidas, porexemplo, um foguete como propõe ao qual meucérebro se conecta, se meucérebrofor transferido paraoutrosdispositivos, híbridos,derivados daschamadas membro danificadoouausente,masatéquepontoeu(qualquereu)permaneçosendoeu, Eu, robô?avatar? Vejamos. Umacoisaéumaprótesequesubstitua, porexemplo, um

), dizele. ambições, desejosoufantasias?(MATURANA apudMAGRO; PAREDES, 2001, p.189) gresso nodesenvolvimento dopoderdamáquina,enquantoelessatisfazem suaspróprias facilmente manipuladosporoutroshumanosatravés deseusargumentos geraçãodepro- onde nós,indivíduoshumanosresponsáveis,emtudo estamos isto,quepodemosser tão apud JONES) Se équeistoaindapossaterqualquerimportância. Da humanidade,éclaro. uma ciênciaigualmenteirresponsável paraaexterminação dofuturo. Tomara casocontrário,podeserqueaarte jáestejacolaborandocom queelaesteja certa, destino daespécie”. (GOODAL apudSMITH,p.29) 2005, implicações culturais dasprovocações paramodificaro deStelarcqueemqualqueraposta relação aopotencialbiotecnológicodacoevolução”. Assim, elasediz “mais interessadanas Para concluir, ficocomasconsideraçõesdeJane Goodallquesepronunciacomo “cética em novas tecnologias,um tecno-nerd: Mas, comoeleprópriosurpreendentementeafirma,issonãofaria deleumusuárioacríticodas LE BRETON, David. Adeus aocorpo: antropologia esociedade. Campinas:Papirus, 2003. KRAUSS, Rosalind. A escultura nocampoampliado.Gávea, RiodeJaneiro, n.1,1984. JEUDY, Ocorpocomoobjetodearte.SãoPaulo: Liberdade,2002. Henry-Pierre. Estação e Tempo. Petrópolis:HEIDEGGER, Martin.Ser Vozes, 2002. em Artes Visuais daEBA -UFRJ, RiodeJaneiro, n.13, 2006. GONZAGA, R.M.Read Me,Readydoseremtemporeal.ArteeEnsaios,Revista Me:acaixa-preta doPrograma dePós-graduação FLUSSER, Vilém. FLUSSER, Vilém. Prétextos paraapoesia. CadernosRioArteRiodeJaneiro, ano1,n.3,1985. BARTHES, Roland.sobreafotografia. Acâmaraclara:nota RiodeJaneiro: Nova Fronteira, 1984. Referências Texto/ Imagemenquantodinâmicado Ocidente. CadernosRioArteRiodeJaneiro, anoII,n.5,1996. apud JONES) humano ousocialqueocorre devido emédicas.(STELARC aousodetecnologiasmilitares dos comosabusosdessastecnologias,ouquenãoestejamospreocupadosodesespero nãoestejamospreocupa- Não éumdilemaparamim,masistonãosignificaquecomoartistas contemporâneas paradeterminareavaliar einteragecomele. omundoecorpoquehabita grega “techne”, quesignificahabilidade.Portanto astecnologiassãomeramenteestratégias nem mesmosouumtecno-entusiasta nosentidoestritodapalavra. Tecnologia vem dapalavra

135 - Eu, robô? o trânsito do ser humano ao pós-humano... 136 - Revista Poiésis, n 20, p.119-136, Dezembro de 2012 Acessado em26/3/2012. JONES, Mark.Disponível em. Sítios eletrônicos STELARC entrevistaaJacques Donguy. In : L’Art. Paris: auCorps Flammarion,1996. Entrevistas SMITH, Marquard(ed.).Stelarc,theMonograph.Cambridge: The MIT Press, 2005. Press, 1992. OWENS, Beyond Craig. Recognition -Representation,Power, andCulture. Berkeley, Los Angeles, Oxford: University ofCalifornia B. Lacerda; VEIGA-NETO, Alfredo. (orgs.).ImagensdeFoucault eDeleuze: ressonânciasnietzschianas. RiodeJaneiro: DP&A,2002. ORTEGA, Francisco. Daasceseàbio-ascese,oudocorposubmetidosubmissãoao. MERLEAU-PONTY, Maurice.Oolhoeoespírito.(coleçãoOsPensadores –XLI).SãoPaulo: Abril Cultural, 1974. UFMG, 2001. MATURANA, Humberto, Cognição,ciênciaevidacotidiana (organização etraduçãoCristinaMagro Victor Paredes).Belo Horizonte: In: RAGO, Margareth;ORLANDI,Luiz

Museo Reina Sofiaem Madri,Espanha,combolsadaFundação Vitae. em Poéticas Visuais pela USP. Realizou de deConservação/Restauração Arte ModernaeContemporâneano estágionoDepartamento *Magali MelleuSehnéprofessora de doDepartamento Artes PlásticasdaUniversidade adjunta Federal de MinasGerais.Édoutora sition, artist acqui- documentation, Keywords: preservation, art, art installation, contemporary works ofprevious centuries. of ethical codes that until then werei.e., the applicability adopted for the ceptual thantechnical, comeintoconflictwiththeduties ofthemuseum, multimedia artandmade methods, institutions have ephemeralart, thedifficult ofpreserving task much artisticproduction isstillproducedwithtraditional ofcontemporary lenge for all professionals working ofcollections. withthesetypes While ABSTRACT: art hasbeenagreatchalThe ofcontemporary - preservation aquisição,artista tação, Palavras-chave: documen- de arte,preservação, artecontemporânea,instalações dos séculosanteriores. paraasobras lidade doscódigosdeéticaque,atéentão,eramadotados tram emconfrontocomasatribuiçõesdomuseu,ouseja,aaplicabi- de materiaisdiversos. maisconceituaisAs propostas, quetécnicas,en- aarteefêmera,multimídiaecomposta missão depreservar da serproduzidacommétodostradicionais,asinstituições têmadifícil acervo. Apesar degrandepartedaproduçãoartísticacontemporâneaain- categoriasde safio paratodososprofissionaisquetrabalhamcomtais RESUMO: daartecontemporâneatemsidoumgrandede- A preservação A preservação daarte contemporânea 1 ​ ​of various materials. The proposals, morecon- Magali Melleu Sehn* 1 1

137 - A preservação da arte contemporânea 138 - Revista Poiésis, n 20, p.137-148, Dezembro de 2012 so deinvestigação, umpercursodeatuação demandando dos conservadores ancoradona conceituais éumacondiçãoinicial óbviaas propostas dosartistas para avançar noproces - suas variabilidades, considerando suas conexões com tempo, contexto e espaço. Conhecer nacompreensãodasformascontemporânea. Osegundo desafio parece estar operativas e artísticaconstitui, dearte de cadaproposta talvez,oprimeirodesafioparaos conservadores Decifrar ossignificadossubjacentesdosmateriaisea relevância damaterialidadenocontexto conceitualnalmente emfunçãodaproposta decadamodalidade. dapreservação. A próprianoção doqueseentendepor vista “dano” transforma-se proporcio- dicionais categorias,induzemumanova também, forma depercepçãodoobjetoponto formas operativas easnovas organizaçõesdosmateriais,provocando orompimentodastra- ecomo conduzir umdiscursopertinente.Issosignificaqueasnovas dosartistas propostas adequadamentesignificadosimplícitosreferentes parainterpretar rios deanáliseadotados às da arte contemporânea, está na reflexãoO cerne da questão, quanto à preservação dos crité- o todosobreaspartes. dos séculosanteriores,masporumaprofusãodeelementosecomponentes,prevalecendo contemporânea estánofato denãoserconstituída porapenas umobjetocomonasobras nações diversas, Outro aspecto que caracteriza arranjosa arte em função de cada proposta. 313) usufruem, eexplorando Osartistas apropriando-sedosmateriais,estabelecendo combi- econvite”.tas àexperimentaçãocomadeum self-service “restaurante p. (SCHINZEL,2005, usufruírem todagamademateriais disponíveis. Schinzel possibilidades de ofer compara tais - material. A introduçãoderesinassintéticasenovas ligasmetálicaspermitiuaosartistas levante porquedesestrutura basesteóricasconstruídas doaspecto sobopilardapreservação efetichismoda artecontemporânea,aambiguidadeentreconservação pareceseramaisre- para administrar os desafios é evidente. Do universo de questões referentes à preservação a velocidadepoéticasnasinstituições decritérios dainserçãodetais edoestabelecimento cial significativo daproblemáticaatual eexibição. quantoàpreservação Odescompassoentre O legadodasmanifestações artísticasproduzidasapartirdosanos 1960 constitui umreferen- jos noespaço Novos significadosdosmateriais, novas experiências sensoriais e novos arran- à aparência total daobra. à aparênciatotal aspecto dafuncionalidade, mas quantoaoíndice deintegraçãomotoreseequipamentos complexo, casosejanecessárionofuturo, requerendo umaanálisenãoapenasquantoao responsáveis pelo funcionamento estão aparentes, tornando o processo de reposição mais materiais e equipamentos omesmoartista, sequências cromáticas.Em outras obras, citando mente aaparênciadaobra,umavez queaopacidadeédeterminanteparapercepçãodas estão cadavez alteramsignificativa maisrarasnomercadoeasdemaislâmpadastestadas - ilustram partedessaquestão,poisaslâmpadasleitosas originalmenteutilizadaspeloartista No contexto deobrascinéticas,osaparelhosCinecromáticosdoartista Abraham Palatnik demodalidadesartísticasqueincorporammotoreseequipamentoselétricos. interpretação da década de 1960, mas quanto ao encontro de medidas preventivas que visem à correta encontro de soluções viáveis atualmente grande parte da produção artística para preservar A obsolescênciademateriaisconstitui umdosfocos dasdiscussõesnãoapenasquantoao uma mesmaobraaolongodosanos. umposicionamentodiferente podeapresentar aspecto, ouummesmoartista emrelaçãoa opostoreferente umposicionamentototalmente podeapresentar aummesmo cada artista características diferenciadasobras apresentam materiale/ouconceitual, soboponto de vista singularidades decadaobradevem seranalisadassobváriosângulos,porqueassimcomoas questão.Éevidente asnuançasaseremanalisadasemtornodesta que ção, sãomuitas - profissionais daimportânciadeinformaçõesquantoàpreserva dasintençõesdos artistas aoartista. Apesar doconsensoatualmaterial aoconceitodaobrasemaconsulta entreos zações, poisnemsempreépossível dissiparasambiguidades darelevância dapreservação cada aspectoparticulardotrabalhoecontexto noqualfoi concebidoparaevitargenerali- faz-seração dafuncionalidadedeumobjeto.Noentanto, necessárioanalisarcuidadosamente Admite-se ereposiçãodepartescomosoluçãoparaarecupe- reprodução,complementação rando queaoriginalidadesemprenorteouoscritériosdeintervenção. principalmente quanto ao aspecto autenticidade, conside- torno dos critérios de intervenção, referentes àproblemática daartecontemporâneaestãonadissoluçãodasdiscrepânciasem interdisciplinaridade paraoprocessodetomadadecisão. As questõesmaiscomplexas

139 - A preservação da arte contemporânea 140 - Revista Poiésis, n 20, p.137-148, Dezembro de 2012 for Conservation of Contemporary Art for of Contemporary Conservation contribuem com pesquisaseentrevistas comartistas. artigos, projetos,tesesemetodologias; asegundaforma sóéacessível aosmembrosque de acessoecompartilhamento deinformação: aprimeirapermiteacessolivreàliteratura, duasformasatuam daartemodernaecontemporânea.Oprojeto apresenta napreservação sionais dediversas áreaseinstituições foco do debate por ocasião de fóruns, conferências e projetos interdisciplinares entre profis- aspectosvêmsendoo modalidadesrequeremoutrosparâmetrosparaanálise,tais Como tais Quanto àspossibilidadesdepreservação: sensoriais ea introdução doconceitodetempo, conforme aexpressão time-based-media. mero deobjetos,novo status designificânciaentreaspartescomotodo,fenômenos ópticos, des emfunçãodealgumas características como processualidade,introdução de grandenú- asvariações artística.Sãomuitas semânticasquecaracterizamessasmodalida- da proposta éproporcionalàcomplexidadeos critérioscanônicosecomasmetodologiasdepreservação com oespaço,contexto, denominadasnaatualidade de dearte”,“instalações oconfrontocom Dos ambientesdadécadade1960 outrasrelações àsmodalidadesartísticasqueapresentam vezes,porque, muitas umsignificadoespecialparaoartista. apresenta contexto decadaobra,faz-se necessárioidentificararelevância doprocessodeconstrução de arte”. Nocasodessasmodalidades,alémdaidentificaçãorelevância dosmateriaisno almente edarelaçãodaspartescomotodocomo,porexemplo, nocasodas “instalações estratégiasquevisemàidentificaçãodecadacomponenteindividu- sendo necessárioadotar oíndicedeambiguidadequantoaovalortambém decadacomponentenoconceitodaobra, ainserçãodeobjetos, equipamentos,materiaisefêmeros,aumenta À medidaqueaumenta vazio de significânciaousubstância.(STRINGARI, p.272) 2005, sivelmente, aummomentoparticularnahistória;semestecontexto, otrabalho podetornar-se aumespaçoemparticulare,pos- éumaresposta efêmeros; emmuitoscasosumainstalação pode serchamado pararepormateriaisouencontrarsoluçõescriativas parapreservar (exceto vivo pode estar e desejar no papel), o artista “reconceber” o trabalho, o conservador ção dotrabalho,oprópriotrabalhopodenãoexistir maisoupodenuncatersidomaterializado maisdisponíveis, paraarecria- [...] osmateriaispodemnãoestar ouatecnologiaserobsoleta 3 2 que constitui a maior plataforma de profissionais que . Destaca-se oprojetoINCCA–InternationalNetwork . Destaca-se 4 Outroprojeto, integradoaoINCCA, intercâmbio deinformação. teoriaesemântica,administraçãodeconhecimento documentação, participação doartista, caso, oprojetoconsistiunodesenvolvimento deseistemaspesquisacomopreservação, deartecoleçõeseuropeias.(SCHOLTE,caso deinstalações 2007, p.4) Além deestudos de métodos decaptura dainformação, dosobjetivos apósoestabelecimento do registro. doconceito.Osregistrospodemserrealizados comdiferentesdos materiaisàpreservação substituições, reposições, reconstruções, ouseja,quandosediscuteostatus designificância mesma obra.Osmaiores momentosdetensãoreferem-se principalmenteàsrepinturas, obviamente, aolongodosanosemrelação auma mudançasnoposicionamento doartista mações provenientes considerandotempoecontexto dosartistas, deexecução dasobrase, das decisões, faz-seresponsabilidade da totalidade necessário analisar criticamente as infor- nãodeveSe porumladoháconsensodequeoconservador transferir a paraoartista de conservação/restauração. bemcomodoconservador,cipação doartista, noprocessodetomadadecisãodasações oslimitesdaparti- ancorar osprocessosdetomadasdecisão.Questionam-se, noentanto, no casodeobrascomplexas ouquandoasfontes secundáriasnãooferecem subsídiospara e quantoàsformasnofuturo dereapresentação como medidapreventiva, principalmente Não sequestionaarelevânciaquantoàpreservação doregistrodasintençõesdosartistas ção, constitui umavantagemsignificativa emrelaçãoàsobrasdos séculosanteriores. medida dopossível,- significadosimplícitosdosmateriaisesuas intençõesquantoàpreserva nestecenário,explicitando,na sionais deoutrasáreasdoconhecimento,aentradaartista do, comopontodepartida,aintencionalidadeartística. Além dainclusãonodebatedeprofis- consideran- paradissiparconflitoseambiguidadesemtornodoquesepreserva, preservação agentes dedeterioração,induzindoaumareavaliação quantoaoscritériosemetodologiasde maioresíndicesdevulnerabilidadeaos No compassodasmudanças,asobrasapresentam preservação A relevância doregistro dasintenções dosartistas soboponto devistada Art Installation Preservationof edenominadoInsideInstallation. realizado duranteoperíodo2004-2007 5 , teve comoobjetivo pesquisarmétodosdesalvaguarda apartirdeestudos de

141 - A preservação da arte contemporânea 142 - Revista Poiésis, n 20, p.137-148, Dezembro de 2012 informação têmsidoaprimoradasatravés dosprojetosjámencionados etécnicasparaarmazenamentotre outros.Metodologiasparacomunicaçãocomartistas da fontes primáriasaseremcapturadas assistentes,familiares, viaentrevistascomartistas, en- dacomplexidadeem vista materialeconceitual, comoauxíliode sendonecessáriocontar No contexto daartemodernaecontemporânea,osrecursoscientíficos tornam-selimitados sólidasparaaartetradicional. a profusãodosrecursoscientíficospropiciam fundamentações fontesda produção.Quandotais sãoinsuficientesparaidentificarmateriaiseprocedimentos, outros, sãofontes primordiaisparaacompreensão,principalmente deaspectosconceituais pessoais a curadores, amigos, familiares, entre críticos de curadores, consultas galeristas, textosarquivos deinstituições, deartistas, dedocumentação bibliotecas,publicações,pastas quenãoestãovivos, Nocasodeartistas asfontesdeterminado artista. secundáriascomo inicieumprocessodeinvestigaçãotaurador paraconhecermateriais, técnicasetrajetóriade A pesquisahistóricaeestilísticaconstitui- opontodepartidaparaqueumconservador-res seja desconhecida pela maioria dos profissionais da preservação, sendonamaioria dasvezes,seja desconhecida pelamaioriadosprofissionais dapreservação, de trabalhosefêmeroseperformances. Ofato denãoserpublicadaemlivrosfaz comque critérios deseleção,mudanças aolongodeumpercurso,métodosconstrutivos edescrições o percursodereflexão significadosde materiaise emtornodeuma produção,mastambém permitenãoapenascompreender referenciaisA produçãoacadêmicade artistas teóricos e 1999, p.53) sas produzidas pelos artistas: Wolfgang Pfeiffer, Walter Zanini e Aracy Amaral. (LOURENÇO, Cristiano MascaroeJoão aspesqui- Musaeosprimeirosdocentesdaáreateóricaaorientar comoClaudio tas Tozzi, Evandro Jardim, Alcindo MoreiraFilho,Regina Silveira, CarmelaGross, epesquisa. asprimeiraspesquisasrealizadas porartis- restauração A autoracita conservação, dadifusão, sobopontodevista importância daproduçãoacadêmicaproduzidaspelos artistas a abordar a importância da produção acadêmica no campo da história da arte brasileira, aponta própria produçãoartística.MariaCecíliaFrança,Moderno, ao emseulivroMuseusAcolhem comênfaserelevância tesesememoriaisproduzidosporartistas emsua dasdissertações, a etc.Destaca-se revistas especializadas,depoimentos,produçõesacadêmicasdeartistas de textosmaior parte é resultante críticos de curadores em catálogos de exposição, jornais, sendoquea restrita, contemporâneosaindaébastante A bibliografianacionalsobreartistas 6 . gerenciamento enaacessibilidadedainformação. (VANRELL, 2007, p.315) redução doriscodeperdadainformação, naanálisequalitativa dainformação capturada, no estána soriais emúltiplosarranjos noespaço.Omaiordesafiodoprocessodedocumentação obras constituídas, principalmente,pormateriaisefêmerosequeenvolvem experiências sen- de os objetivos e compreender em que momento começa a documentação da documentação mento edimensionamentodeobjetosnoespaço,faz-se necessário, inicialmente,estabelecer recursos tecnológicos disponíveis que permitem registrar luz, som, movimento, posiciona- constituição juntoaosartistas umadasferramentas maispoderosas. Apesar daprofusãodos tos intangíveis relevantes ao conceito da obra. Conforme mencionado, a captura de informa- apenasaoregistrodamatériafísica,masdeaspec- rânea enãoestámaisrestrita daartecontempo- temsidoumaferramenta paraapreservação A documentação importante O espectro deatuação dadocumentação naatualidade.digitais as últimasfontesdasbibliotecas deinformaçãoapesardaimplantação aseremconsultadas, principal critério paraaaquisiçãodeuma obranocontexto institucional giraem tornodejuízo de aquisiçãoobrascontemporâneas. Senocasoespecíficodasobrasmais tradicionais, o Um dosaspectosmaiscomplexos museológicoestánaanálisedoscritérios dopontode vista Aquisição eacomunidadeartística. do ecossistemamuseológico,comooartista inseridos no contextocom a preservação institucional, incluindo aqueles que não fazem parte de análiseecritériosimplicaemumarevisão dopapeldetodososprofissionaisenvolvidos armazenamento e(re)exibição nofuturo. Rever espaços físicosmuseológicos,metodologias das quandodeterminadasmodalidadessãoadquiridas, como,porexemplo, possibilidadesde mas de uma revisão- das práticas museológicas estabeleci rios de conservação/restauração, Preservar aartecontemporâneanãoimplicaapenasem umarevisão demetodologiasecrité- Revisão depráticasmuseológicas

143 - A preservação da arte contemporânea 144 - Revista Poiésis, n 20, p.137-148, Dezembro de 2012 de manipulação edeslocamentodosobjetos dearte,requerendo umaperfeiçoamento dos exposiçõesAs constantes temporáriasdeintercâmbios culturais intensificamosprocessos (Re)exibição específicas. deterioração deoutro,requercondiçõesfísicaseambientais vezes, pormateriaisprecários,emque,muitas de obrascompostas umpodeseroagentede estivessem perturbando umaordemestabelecida. A diferenciação deíndices defragilidade por exemplo, dearteestãosemprecausandoumestranhamento,comose umainstalação Em umlocaldearmazenamento tradicional,conjuntosdeparteseobjetosquecompõem, sãoincompatíveisdadiversidadetambém emvista deformatos, espessurasemateriais. ouconstruídos.com asdimensõesfísicasdeedifíciosadaptados Osmobiliáriostradicionais de ambientesdiferenciados. As grandesdimensõesdealgunstrabalhossãoincompatíveis por grandenúmero de objetose equipamentos que,namaior parte dasvezes, necessitam caso dealgumascategoriasporexistirem apenascomoprojetos ouporseremcompostas Quanto aosmétodosdearmazenamento,no aambiguidadedealocação éumaconstante Armazenamento o objetoseráinserido. ção possaseranalisadaporângulosdiferenciados emfunçãodocontexto institucional noqual edemaisprofissionaisdainstituiçãocom oscuradores,artistas paraquedeterminadasitua- que consistenaemissãodeparecerestécnicos,masparticipardadiscussãoemconjunto no processo de análise deveA participação do conservador ir além da simples prática usual arte, performances, entreoutrasmodalidades. por materiais efêmeros, por novasdamente obras compostas de tecnologias, instalações analisar criteriosamenteaspossibilidadesreaisdeumainstituição exibiradequa- epreservar questãopertinenteàesferaentrar noméritodesta anecessidadede curatorial, aponta-se a aquisiçãodeobracontemporânearequerinclusãooutrosparâmetrosanálise.Sem de valor, anecessidadedesuprirlacunasdeterminadacoleção, considerando-setambém

instituições necessitam realizar adaptações, construindoinstituições realizaradaptações, paredes,pisosetetos necessitam “técnicos” físicas,estruturaisprias limitações etecnológicasdosespaçosdeexibição.vezes Muitas as e aspectosaseremanalisadosemtornodessaquestão,podendoinclusive decorrer daspró- Obviamente originaldoartista. existemnuanças ção quenãocorresponda àproposta muitas efêmeros e/oudiversos àspossibilidadesdeexibi arranjos noespaço,estãosempresujeitas - umaconstrução material,obrasquenãoapresentam tradicionalequeincluemmateriais vista de objetoseformatos. Além dosriscosinerentesquantoaos deslocamentosdopontode des dimensões,peso,superfíciesnãoenvernizadas, obrasnãoemolduradas,grandenúmero da complexidadeção em relação às obras mais tradicionais, em vista construtiva, como gran- maioresíndices de fragilidadeaosagentesdeteriora- nas econtemporâneasapresentam métodos deembalagemcomoobjetivo dereduzirriscosinerentes.Emgeral,obrasmoder- xidade sefor requerida aparticipaçãoefetiva, deinstituições noprocesso depreservação, Obviamenteumgrau aindamaiordecomple- processo depreservação. aquestãoapresenta porânea alémdoperímetro museológico,incluindoaparticipaçãodacomunidade artísticano Por aimportânciadareflexão daartecontem- último,destaca-se emtornodapreservação O papeldacomunidadeartística recurso museográficodeforma equivocada podeimplicaremalteraçãode conceito. ouseja,autilizaçãodeumsimples decadaproposta, incorreta risco deumainterpretação diferencial dessasformas deexpressão, emrelaçãoàartetradicional,estánoaumentodo obras queincluemorganismosvivos. dasformasogrande Dopontodevista apresentação, pornovasobras cinéticas,compostas tecnologiase,sobretudo, nocasoespecíficode o períododeexibição,inclusive necessitando demanuaismanutenção,comonocaso Outrasmodalidadesrequereminvestimentoacervo. especialde recursoshumanosdurante por oferecerem paraopúblico eparaasdemaisobrasdo algum tipoderiscoparaoartista, exibiçãomentos especiaisde segurança duranteoperíododemontagem, edesmontagem Algumas modalidades, quando exibidas em contexto institucional, de procedi- necessitam do capturada –sãoasprincipaiscausasdeconflitosduranteosprocessos(re)exibição. De forma geral,aperdadainformação e ogerenciamentoinadequadodainformação –quan- 7 .

145 - A preservação da arte contemporânea 146 - Revista Poiésis, n 20, p.137-148, Dezembro de 2012 artistas brasileiros. Oobjetivoartistas dobancodedadosécompartilhar informação nãopublicada. 4 Via . Participação inserindoresumosdeentrevistascom daautoracomo membrodesde2008, 3 IntroduçãodoProjeto. Disponível em:. Acesso em5jun.2000. metodológico. moderna econtemporânea,ilustramacima detudo umametodologiainterdisciplinardetrabalhocontínuo comummaterialteóricoe da arte para debater a preservação advogados, e restauradores cientistas, conservadores do conhecimento como curadores, artistas, pelo NetherlandsInstitute for Cultural eventos Heritage. Além detais comaparticipaçãoprofissionais dediversas contarem áreas Cares? (2010),Art: Who (1998), Netherlands Institute organizado ocongressoContemporary for Cultural Mortality/Imortality Heritage, 2 ComoFrom MarbletoChocolate (1995), organizadopela Cares? TateArt: Who emLondres, Modern Gallery discussões metodológicas.ECA/USP, 2010. 1 Parte dotexto extraído datesedefendida pelaautoraAPreservaçãode de “Instalações Arte” comênfase nocontexto brasileiro: Notas deumacomunicaçãomaispróximaecontínuacomosartistas. estabelecimento experiências inseridasemcontextos específicosquepossamsercompartilhadas,alémdo importância dasomadeesforços, masaimportânciadeproduzir conhecimentoapartirde As iniciativas deprojetosinterdisciplinaresnocontexto internacionalnãoilustramapenasa Considerações finais documentação. entre instituições privadas epúblicas,principalmentequantoà elaboraçãodeestratégias de difundirainformação; epromover aelaboraçãodeprojetosinterdisciplinaresecontínuos da artecontemporâneanocontexto acadêmiconãoespecializado porserumaforma indireta metodologiasetécnicasviáveis;apontando proporcionaradiscussãoreferente àpreservação dapreservação, sobopontodevista documentais processo deelaboraçãoseusacervos diversos, arrisca-se apontar, neste contexto, no algumas possibilidades: auxiliar os artistas dessa comunidade. Apesar deserumquestionamentoquepodeanalisadoporângulos comaparticipaçãoefetivacabe ainterrogação sobreasreaispossibilidadesdesecontar privadas, e assistentes, de colecionadores, de famílias ou seja, já que de artistas de artistas, (1997), organizadopelo Londres: Archetype, 313 2005. p. SCHINZEL, Hiltrud. Mixed Media,Mixed Functions, Mixed Positions. In.HUMMELEN, Y;Cares? SILLÉ,D. (eds.).ModernArt:Who Escola deComunicaçõese Artes, Universidade deSãoPaulo. 106 2002. aosmétodosde intervenção. (Mestrado)– SEHN, MagaliMelleu.ArteContemporânea : dapreservação p.Dissertação cas. 2010. 238p. Tese (Doutorado)–EscoladeComunicaçõese Artes, Universidade deSãoPaulo. de SEHN, MagaliMelleu.Apreservação dearte”“instalações comênfase nocontexto brasileiro : discussõesteóricasemetodológi- LOURENÇO, MariaCecíliaFrança.Moderno. SãoPaulo: MuseusAcolhem Edusp,1999. p.53. 2009. HUYS, Frederika. A Methodology for the Communication with Artists. Disponível em: . Acesso em: 22 nov HUMMLEN, Y.; SILLÉ,D. (ed.).ModernArt: Who Cares?Londres: Archetype, 447p. 2005. CODDINGTON, James. The Case Against Amnesia. In:CORSO, Immortality? M.A.(ed.).Mortality The Legacy of20 Referências comoesconderfiaçãoeaparatostecnológicos. ridas, tais 7 Estruturas deobrascomplexas criadasparaproporcionarinstalações comoresistênciaàtensão,pesoedemaisnecessidadesreque- Amsterdam (1999). Disponível em:. Acesso em2mar. 2006. The Guide The GoodPractice: Artists’ Institute Interviews. for Cultural Heritage/Foundation forofModern theConservation Art, Amsterdam (1999). Disponível em:. Acesso em2mar. 2006. 6 Ver The ConceptScenario Artists’ Institute Interviews. for Cultural Heritage/Foundation forofModern theConservation Art, 5 IntroduçãodoProjeto. Disponível em:. Acesso em10 abr. 2004 Legacy of20 HUMMLEN, Y. The Immortality? The ofModern Conservation Art: New MethodsandStrategies?In: CORSO M.A.(ed.).Mortality In: Modern Art, NewBilbao.208p. Museums.IIC2004, HUMMLEN, Y; TATJA, S. SharingKnowledgeArt: ChangingRoles forofContemporary inaMuseum theConservation Without Walls? Dilemmas andUnconfortable Truts. Londres: p.229-240. V&A, 2009. FISKE, Tina. White Walls: Installations, Absence, IterationandDifference. In:RICHMOND, Alison; BRACKER, Alison (ed.).Principles, FRANÇA, Rafael. Videoinstalação. In:COSTA, Semmedodavertigem Helouise(org.). .SãoPaulo: MarcaD’Água,1997. 90p. Angeles: J. Paul Getty Trust, 1999. 20p. th Century Art.LosCentury Angeles: J. Paul Getty Trust, 1999. 72p. th Century Art.LosCentury

147 - A preservação da arte contemporânea 148 - Revista Poiésis, n 20, p.137-148, Dezembro de 2012 Dilemmas, andUnconfortable Truts. Londres: p.210-222.V&A, 2009. WHARTON, Glenn;MOLOTCH, Harvey. The ChallengeofInstallation Art. In:RICHMOND, Alison; BRACKER, Alison (eds.).Principles, de arte.In:CONGRESSOIII-Grupo infalible EspañoldelIIC,Dateoríaalarealidad.LaConservación .Oviedo, IIC,2007. p.315-317. VANRELL, Arianne V. Prevención delriesgodepérdidaInformación deexposicionesinstalaciones enelmontage yconservación Archetype, 272p. 2005. STRINGARI, andProblems Carol.Installations ofPreservation.In:ModernArt: Who Cares?HUMMELEN, Y; SILLÉ,D. (eds.).Londres: Unconfortable Trutsand . Londres: p.223-228. V&A, 2009. STERRET, Art. In:RICHMOND, MuseumsofContemporary Jill.Contemporary Alison; BRACKER, Alison (eds.),Principles, Dilemmas, - ICN/SBMK,2007. 4p. SCHOLTE, Tatja & BALDOCK, Karen. Introduction. Disponível em: . Amsterdam. (Versão impressa

*1

Luiz Carlos de Carvalho* Blanco y Negro, 2001-2012. fotografia e pintura corporal

Agradecimentos a Karla de Martins, Raísa Inocêncio e Danielle Simas

* Luiz Carlos de Carvalho é doutor em Curadorismo no Campo do Desejo pela Universidade Federal das Faculdades (2007). Tem exposto suas obras em mostras individuais e coletivas no Brasil e no exterior, com destaque para a XII Bienal de São Paulo (1973). Atualmente realiza residência artística no Engenho do Mato, Niterói, Rio de Janeiro. (informações fornecidas pelo artista)

* Rachel estencileira emestreemCiênciada Souzaéartista, Arte peloPPGCA-UFF. Palavras-chave: stencil;artepública;cidade Isabela Frade. comentários críticos das professoras Rosana Ramalho de Castro e Costa aseguiremumbrevepela Capes,éapresentada resumodaautora,com Ramalho deCastroeIsabelaFrade. A pesquisa,parcialmentefinanciada professores LuizSérgiodeOliveiradapesquisa),Rosana (orientador Costa agosto de2012, sendoaprovada pelabancaexaminadora formada pelos Fluminense, intitulada Stencilcomoartepública,ocorreu nodia30de Programa de Pós-GraduaçãoemCiênciada Arte daUniversidade Federal demestradoRachel dadissertação A apresentação Souzajuntoao Stencil comoarte pública Rachel Souza* 1

159 - Stencil como arte pública 160 - Revista Poiésis, n20, p. 159-160, Dezembro de 2012 go construído entretemas,práticaseteoriasdiscutidos aolongodadissertação. volvidos no processo de criação dostencil Ao oferecemos final da dissertação, um pequeno panorama do pensamento de agentes en - serção do objeto na cidade: a ressignificação do conjunto simbólico e a sobrecarga simbólica. colagem e o estencileiro como ticas semelhantesàquelasderivadas acidadecomo dostencilnomeiourbano.Observamos sistema decomunicação.Identificamosacolagemcomo referência àsparticularidades esté- dacidadecomo cando suacomposiçãoatravésnasrepresentações dossignosestabelecidos semiótica naambiênciapública,tendocomopontodepartidaavisualidadeurbana,identifi- Dessa forma, nocorpodotextodeaspectosestéticos doobjeto,suadinâmica tratamos na práticadostencil,suaconstituição esuasinfluênciasestéticas. pesquisafoitendeu nesta omapeamentoeareflexão acercados aspectosgeraispresentes formas deapropriaçãomercantilizáveis.essaseoutras questões,oquesepre- Enfrentando público. Por imunesàs outrolado,asartesvisuaisurbanasnãoestãonempoderiamestar entreointeresseprivadoque reclamamacidadeeironizamrelaçãoestabelecida oespaço Como movimento,umacrescentemanifestação podemosobservar visualdefraseseícones do espaçodarua. stencil propõeumcontrausodacidadeeassumeumaapropriaçãocríticamercantilização paraveicularem protestos,sendoigualmenteutilizadoporartistas seusdiscursoscríticos.O amplo uso como ferramenta sua larga utilização em embates sociais e políticos. Observamos buição enquantolinguagem,considerandoquesuafacilidadeseu gráfica tempossibilitado -lo nasdiscussõesdeartepública.Localizado oobjeto,partimos paraentendersuacontri- decaracterísticasestruturaisInicialmente tratamos doobjeto,paraemseguidacontextualizá- aspiraàcompreensãodealgunsaspectosdostencilenquantoartepública. dissertação Esta bricoleur, enquanto identificamos dois aspectos sígnicos da in- – três artistas e um galerista – a partir de um diálo- e um galerista – três artistas tudo, quedissofaz arte. tempo... E nesse mundo onde todo mundo está perdido, aparece o sujeito que brinca com mos quecirculamospelacidaderapidamente,sempre compressa,ecadavez commenos campos deatravessamentos emisturas, processadosnavelocidade alucinante–sepensar- Um mundoemprogressãovertiginosa dedesmaterialização.Passamos poressesintrincados tempo, revelando novas outrascoisas.Umanatureza emuitas constituída devirtualidades. veladuras. Cada uma,mesmonasuaqualidadediáfana, vaiaqui ealie,aomesmo ocultando doreal,subsistemmilafinidades:criam-se,cadavezocultamento mais,novos refluxos em da porváriascamadasfluidasdecomposiçõesiconográficas naqual,entrearevelação eo imergemnessemardesignoscambiantes.Umapaisagemconstituímuitos sorvedouros, - reverberações eespelhamentos. Correntes queengolfam os sujeitos que,nosrepuxos de a qualconverge arealidade, quasetodaconstituída imagéticasemsuas porrepresentações Vivemos emummundo detelas,dascoisasquesefazem unidimensionais.Daplanurapara bem humoradonoqueproduzgraçamordazecríticacontundente. o queelemesmovai geraréoextraordinário encravado novulgare,especialmenteele,tão rio. “Arte Ordinária”, aquiloqueestánoespaçodocomum.Ozibrincacomessaideiaporque grafiteiro que coopta o sujeito em seu rushgrafiteiro que coopta parada marcante,oencontrosignificativo.comoécasodo Quesejaporumsó instante, contexto, épostoàprova oartista comoaquelequevai gerarsentido,quevai propiciara Sentimos aondulaçãodoespaçoliquefeito seconformando emfluxos deimagens.Nesse em suapolifonia dissonante,vai gerandoespaçosondesinaisemarcasdiscursosfervilham. imersosemumambienteondeosignotemmuitomaisvalorEstamos queoreal. A cidade, Comunicação Estética. E-mail:[email protected] *Isabela Frade éarteeducadora,docentedoPPGARTES/UERJ, Procientista/FAPERJ de e líderdoGP/CNPqOCE-Observatório cotidiano, interceptando-o em seu trajeto ordiná- cotidiano, interceptando-o Stencil comoarte vívida Isabela F rade* 1

161 - Stencil como arte vívida 162 - Revista Poiésis, n 20, p. 161-164, Dezembro de 2012 zem agentesdetransformação, de mudança.Promovem aafirmação dosentidosobreocaos Sua pesquisa indica “a tribo”. Mesmo que dentreeles estejam os rebeldes sem causa,se fa- de ummodobandoleiro. tir umdesejodedominação doespaçourbano,modocomonelenoscomunicamos eisso Mas nemsempreéassim inconciliável: na “vandalice” emOzi,aindapodemos sen- apontada inversão depropósitos.Podem apropriadamenteparadecoraçãodeambientes. mesmoservir de umcastelonaEuropa(Gêmeos)efazer quadrosnasgalerias,elesse aproximam deuma emedeessepesodosistema.Quandoelessãoconvidadosumafachadaartista parapintar você opercebe angustiadoeaindaquestionador. Ali eleagoracomeçaaselegitimarcomo antiengenharia, aindaseguemaisalém.Pode sairdacalçadaeentrarnocubobranco,onde bricoleur. E em tratodecolagem edospalimpsestosdemuro, na táticaagressiva doplanoda osfragmentosdoquesequeridentificar,coletando comungaidentidadecomolivreprocesso impõe, eletemumprojetodesubversão. Comoele está aquiealireunindoinformações, mento ecriaaliumvórtex desemiose,lépidomovimento deorganizaçãosentido.Elese urbana. Elegeraumacontraordem,produzlinguagem.vai ao vazio, aonadadoentendi- Então, nessaleitura, euentendooestencileirocomoalguémquegeraumcortenabalbúrdia caráter desuspensegradativo, rarofeito acadêmica. emumadissertação emocionante. Envolvente. oclimadopróprioobjetodeestudo, um Elaabsorve apresentando no sentidodosimplesejusto,pensamentoconciso,perspicaz,construindo umanarrativa vibrante,Rachel cuidadosa,ritmadaemumaescrita Em umaapresentação Souzacuidadisso virtuosismo vigoranainteligenteproeza. em lugaresproibidos,ouquaseinacessíveis –umaregrapara opicho –primordialpartedo por suadisposiçãoecoragem.Equantossãofeitos correndo riscosdeváriasordens:estão ao produzirartenomergulhonesseredemoinhodeimagens.Romantizado porseudesapego, lícia queévê-loatuar nessemeioeoseuperitocontrole–mesmoqueprecárioobtém nelenossasprópriasfantasias,fazendoprojetando umherói.Fazemos doartista issopelade- prir esseúltimodesígniodostencilecolocarsobretudo issoumaúltimacamadadesentido, Realmente nãohácomocolocarmaisumlayer frioesearrisca aomaisescondido. limpas carasàestéticamoderna,coloreocimentado trabalhanarasuradoprojeto daengenhariaurbana.Destróiassuperfícies Intrépido pervertido , maisumafolha, comosefôssemoscum- (ou mulher)desprezível. na qualidadedesviante.Seu caráteranônimo.Eofato umhomem denossoheróisertambém merece umacategoriaàparte, algoqueindiquesuacomunicaçãoemurgência. Suarapidez opapelcomunicativoagride. Elenãoapresenta relacionaldaartepúblicadenovo gênero.Ele compor esseenlaceenvolvente, porqueostencil Mais umaidentidadepartilhadacomseusobjetos... Bem, masnemémesmoassimpara possuiesseformatoA dissertação decumplicidadecom oleitor, operacomoemumdiálogo. doaventureiroEsse jogodarepresentação daurbeaindasecontraiemencantamento. alguns de seus atores. E quem será ela mesma, pessoa, sem o papel de artista? apresentar nós nãoosconhecemoseapesquisavaiabrir essaardilosafiguradografiteiroao também Ozi, Gitahy e Melin. Fica um delicioso mistério sobre quem são eles, mesmo assim... porque heterogênea. Todos exibem forteemsuasdiferenças: personalidade.Cada umseposta Baixo, sempre umlancedetroca.Ogrupo seconforma emumatriboanimadaevibrante,diversa e umfluxotas, interno,umriosubterrâneo deimagens.Umdosentrevistadosdeclaraquehá jogada ésempredivulgada,circulandoparaalémdaquelecampodafeitura. Háentreosartis- Essas obras perpassam entreos grafiteiros. E se já conhecem é porque o trabalho é bom. A obrasdeLe depersonagensmarcantes,comocertas Rat, intervenções Vallauri. coleção pessoal. O Luiz Vitão deimagens,partesua com sobreposições. pesquisadoramostraumbeloacervo A artista que Rachel estencileiraesistematizaaomododeseupróprioobjetojogar Souzaétambém registros. Nacolagemdostextos dasentrevistas,forma-se umareuniãodeestencileiros.É A categorizaçãodomateriallevantamento etnográficogera umasobreposiçãodefalas e segue rico,massinto,nãoéfeliz. mercado, ele não me comove e eu fico com o Bansk e com o Rato. O empresariado do grafite E mesmo que Baixocooptado. do argumente muito bem sobre suas estratégias de conquista que faz sangrarosujeitonasuaintegridade.Équandoseperde issoquesecomeçaaser das passagens,comoselementosdísparesdeseuentorno.Daíqueseestánofiodanavalha Ela vem jogartinta, riscaraeconomiadoespaçourbano. comosfragmentos A tribo trata babelesco dacidade.Naverdade, atribovem paraproduziroheroísmodamultidãosilenciosa. do Ozi, por exemplo, é incrível, assim como formas históricas de é agressivo, ocaminho, elenosintercepta

163 - Stencil como arte vívida 164 - Revista Poiésis, n 20, p. 161-164, Dezembro de 2012 duz, emsuasformas emmuitosoutroslugares,paradoxo tãobemexpresso pelaartestencil. em suaextemporaneidade contraditória. A vidanãoéamesma paratodos,maselaserepro- Estesubsistenoencontrodaparticularidadedecadamodoexistênciainstante. apreendido Gitahy eos Assaro. Eles nossuspendemdapressaloucaefazem ver apreciosidadedo o passante,tornando-omaisumnapartida.Entãoporisso,vemos eamamosBansky, Blek, uma comunicaçãomaisampla.Eéexatamentequandofala com toda/portodaatriboecoopta ordem. Ao mesmotempoemqueativa oespaço,elelançaparamaisafora, projeta-o Ele mexe coma “pele domundo”. Rasga auniformidade emaculaodesejodapureza todos ostempos. valia a celebridade. Por para o infortúnio, outro lado, a celebridade abria as portas como em casas dosenricadosecelebrizados,pois,seosroubados eramconhecidosnoseutempo, daquelesrecursos paraobterseusganhoscomosrouboscometidosnas ladrões seserviam apareciam novamente, avidaefêmeradoanterior. semimportar Interessanteésuporqueos Pois apareciamsemquesesoubessequemoshavia realizadoe,apesardeapagadosdepois, De algummodo,oanonimatoeaefemeridade eramosmotesquenorteavam aquelesgrafos. provedores. com característicasespecíficasequenãocompartilhavam dosmesmos hábitosdeseus –participantesdeumgruposorrateiro, aosinteressadosqueeramosassaltantes social Este hábitoseespalharapelascidadesdaEuropaatendendoàfunçãodeinformar, demodo básicos e que somados comunicavam se ali morava uma senhora rica e solitária, por exemplo. sos. Osgrafos erampequenosinformativos, apenasrealizadospormeiodeelementosvisuais idade avançada, com pouca segurançae,principalmente,seeramprovidos demuitosrecur- los compostosdecírculos,triânguloselinhas,osgrafos indicavam ascasasdosmoradoresde dorouborealizadoporoutrosgruposresultados queporalipassassem.Empequenossímbo- grupos deladrõesnosmurosdascasas,asituação deseusmoradores,propiciandoosbons século XVIIeXVIIIqueinformavam, através depequenosdesenhoscifrados,rabiscadospor O trabalhodeRachel Souzatrouxe amimlembrançadosregistrosrealizadosnaEuropado UFF (2004). Semiologia juntoaoPrograma dePós-Graduação emLetras daUniversidade Federal Fluminense(2010) edoutorado emHistóriana eprofessora*Rosana Ramalho deCastroéartista daEscola deBelas Costa aposentada Artes daUFRJ. Realizou pós-doutoradoem Stencil comoarte pública, deRachel Souza Rosana Cost a Ramalho deCastro* 1

165 - Stencil como arte pública, de Rachel Souza 166 - Revista Poiésis, n 20, p. 165-168, Dezembro de 2012 no casodo grafite, através podemos entender que é possível das superposições, também a Ao entendermosquenacidadeépossível subjetivar eé possível identificar asmudanças, éafunçãodaarte. a todosnós.Esta Esurpreende.Semprealteraostatus quo paraabrirnovosque estáestabelecido. horizontes Ver nestemovimento umaspectoda arteémuitoapropriado,poisasempresubverte o para a urbe, o grafiteiro comete uma infração que subverteproposta a ordem estabelecida. Ao roubarum determinadoaspectodacidadeparapassaroutrainformação, diferente daquela lho proposto. determinar onde,quandoequemvai pintar. Eisto,assim posto,éumacontradiçãoaotraba- aartedosgrafiteiros,mesmoassimquerem Mesmo quandoestesórgãosdecidemaceitar ao mundo. muro conforme paravir socialmenteaceito, ou seja,limpo dos grafites, com acara projetada paramanterocelebrado para protegerosmuros,alémdeaparatostecnológicosqueservem seencontrammateriaisisolantes olocal,também pararepintar duções. Nãoapenasatinta E detãofora dospadrões,leva paraaretiradadaspro- aousodeaparatosquesãoadotados de retiraraobraalipintada. umroubo.Pora presençadografite ou dostencilsempre representará isso, é comum o ato dosgovernamentais,cujos murosforamDopontodevista tãobemaparelhadosepintados. sejado pelosórgãosgovernamentais, responsáveis pelaurbanidade.Oudosdonosdascasas aparências, a ideia éoutra na medidaem que o “roubo”, no segundo caso,éodo aspecto de- apesardas o estencileiroseassemelhaaosladrõesdosséculosXVIIeXVIII.Noentanto, algumacoisa:oinversotacar docelebrado,oopostodamesmice. Maisdoqueografiteiro, ecelebradoparades- incorporar aquelaproduçãoquerasgaoconceitodoéestabelecido intocável eomurocomoumarepresentação nãopode ali atéentão.Nemsempreéaceita Como oanterior, oestencileiro umarealidadequenãoeravista “rouba” ummuroparaanotar ceis daatualidade. osgrafosentrópicos, poissãorealizadosmecanicamente,tanto dosladrõescomoosestên- conhecimento queseespalhapelacidade. Tanto umcomoooutronãocorrem oriscodeser O stencil, nocasocomparativo, revela aideiadarepetiçãoinformação, redundandono É assimqueocorre naartepública. tíssimo universo desímboloseimagens denossacultura estáàdisposiçãoparaserutilizado. momento –osgrafites–,mais doquetudo, estápresenteocultivotransgressão. Ovas desta - ebeligeranteemrelaçãoàsideias,àvidamudança. Nocasodaartedo sidade constante Mas senãoháumarevolução emandamento, isso nãoquerdizer quenãohajaumaneces- O murodeBerlim éemblemáticonestesentido. entreoideológicoerepresentado. umarelaçãodireta gética estabelecendo imagética tocava uma nova adotaram nos produtos de consumo de massa, eles também ima - referenciais visuaisdasartesdeantes,assimcomofez apopartquetransgrediaporque gredir easurpreender. iconográfico,osgrafiteirosabandonaram Se,dopontodevista Mesmo atécnicaduvidosaacadêmico reveste dopontodevista osmuros demodoatrans- previsivelmente bela:adaarteondegerminaofuturo. e doenvelhecimento. Morre aquelequevem subvertendo aordemcomumalinguagemim- as marcas de agora as marcas anteriores, pois elas somam, aceitando internet. Sem importar podemos serapenasseressemasmaquiagensdamoda,osapetrechos vendidos pela emorre aquelequesimplesmentedemonstra E assimvingaaimagem,representação tém celebradanomercado. adiante emleilõescujospreçosdependerãodecomoaimagemdosantesanônimosseman- sobretelas,acabarãosendovendidassuas obras,pintadas pelasgaleriasdearteoupassadas Os maisinoportunos setransformamexposições empersonagensdeimportantes dearte.E publicados emlivros. de serladrõesdosmurosdascidades. pelosmeiosdecomunicaçãoe Vão sendoreportados estencileiros /grafiteirosvãosendoreconhecidosporsuasartes–quesãoótimas–,deixando relação entreoserdespidoeabuscapelacelebração. Aos poucos, anônimoseefêmeros é oaceitável, seráquevale apena?Masinfelizmente, revemos tãocontraditória sempreesta se move entreasmudanças dascidadesedomundo.Serdesconhecidoénefasto. Nãoser O anonimato dos grafiteiros e o não anonimato mostram como é difícil ser apenas um ser que consumido, atémesmopeloolhar. ecelebrado,domercado,objetoaser nacontramãodorepresentado todos nóstransitar

167 - Stencil como arte pública, de Rachel Souza 168 - Revista Poiésis, n 20, p. 165-168, Dezembro de 2012 desperta paraalgoimprevisíveldesperta minutosantes. ouapenasparaaimagemaliposta ohumordaquelequepassapelarualocal, oentornoeprópriosuporte,mudandotambém e apesar deseremosmurosdascidadesedorecortepoderseromesmo;poismuda tições são,naverdade, obrassolitáriasdeartequesurgemem suportessemprediferentes, ção, afirmandoprincipalmentearedundânciasementrarnareduçãoentrópica. Afinal, asrepe- o Baseada questõesaquiabordadas,oprodutodasimagensrealizadas nos muroscom nestas vezes,secos. Muitas eemgeral,estessignossãoapenasmetáforas deumaoutrahistória. semquesejamapenasrepetiçõescomvalores elesosadotam equalidadesintrín- entanto, nhecíveis pormuitos,porquesãoelementoshíbridosquesomam àcultura detodosnós.No enorme quantidadedeelementosvisuaisjáreco- Os grafiteirosreinamaoconsideraresta stencil somentedeve seravaliado comoumaartepúblicaquesevale domeiodacomunica- A revista tem periodicidade semestral e são editados doisnúmeros/ano. A revistatemperiodicidadesemestralesãoeditados da sociologia,antropologia,filosofia,história,literatura eoutros. cinema, vídeo,web-arte) e suas interlocuções comocampodosestudos culturais, dasmídias, de reflexão as artes (artes visuais, dança, teatro, música, performance, arquitetura, urbanismo, doBrasileexterior.artistas Nossofoco deinteressesãoartigos quetenhamcomoobjeto das Artes daUniversidade Federal Fluminense. Aceitamos colaboraçõesdepesquisadorese A Revista Poiésis éumapublicaçãodoPrograma dePós-Graduação emEstudos Contemporâneos de correio eletrônicoparaoendereço:[email protected]. O material para submissão de artigos à Poiésis deve ser encaminhado exclusivamente através ção dapesquisa. acompanhada de comentários críticos de pesquisadores participantes do processo de avalia- 7) Ditos+Escritos,seçãodedicadaàpublicaçãode pesquisas demestrandosdoPrograma, te multimídia(DVD) paratrabalhosartísticoscomimagensemmovimento; 6) Páginado paraprojetoscomimagensfixasdesenvolvidosArtista, paraarevista;emsupor- 5) Resenhas críticasdelivros,obras,projetosouatividadesartísticas; quisa doPrograma eparaodebatecríticoemtornodasartes; 4) Tradução detextos consideradosrelevantes peloConselhoEditorialparaaslinhasdepes- colocado emdebate; de instituição estrangeira,emquetemaouquestão emcomumaosdoispesquisadoresé 3) Conexão Internacional,seçãodivididaporumprofessor doPrograma eumpesquisador externos;por pareceristas 2) Artigos livressubmetidosàanálisepeloConselhoEditorial,Consultivo e/ou 1) Dossiêtemáticoorganizadoporumcoeditorconvidado; Estrutura darevista consta: Normas para submissão

169 - Normas para submissão 170 - Revista Poiésis, n 20, p. 169-170, Dezembro de 2012 proposta. OBS: endereço,e-mailetelefone doproponentedevem serencaminhadosjuntocoma decidirão que sobre suapublicaçãoounão; pareceristas ou Consultivo Editorial, Conselho ao submetido será artigo o • as nomasda ABNT; com acordo de estar devem notas, das depois texto, do final no bibliográficas, referências • nofinaldotexto,• notas apósosdadosdoautor, numeradas emalgarismosarábicos; incluídos nofinaldotexto; caractéres(espaçosnãoincluídos),devematividades eprodução,comnomáximo300 ser principais suas e acadêmica vinculação sua informando autor, o sobre curriculares dados • • ossubtítulos nãodevem serenumerados; • osparágrafos nãodevemmasseparadosem blocosporinterlinhadupla; tabulados, estar emextensãoestar dpi; TIF ouJPG,comresoluçãode300 artigo. o devemTodasilustrar imagens para as imagens cinco a três de envio o sugerimos • • trêspalavras-chaves; (item indispensável); inglês em versão e incluídos), não (espaços caractéres 400 máximo no com resumo, um • caractéres(espaçosnãoincluídos); de 22.000 • texto em português, incluindo notas e referências, com um mínimo de 20.000 e um máximo rior (fonte Times New Roman, corpo12, espaço1,5),seguindoasseguintesespecificações: Os artigosdevem ser inéditosnoBrasil,encaminhadosemarquivos Word ousupe- 97-2003 Normas para apresentação daspropostas: Universidade Federal Fluminense

Reitor Pró-Reitor de Graduação Roberto de Souza Salles Renato Crespo Pereira

Vice-Reitor Diretor do Instituto de Arte e Comunicação Social Sidney Luiz de Matos Mello Leonardo Caravana Guelman Pró-Reitor de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação Antonio Claudio Lucas da Nóbrega Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Estudos Contemporâneos das Artes Coordenador de Pós-Graduação Stricto Sensu da Luiz Sérgio de Oliveira PROPPi José Walkimar de Mesquita Carneiro Vice-Coordenador do Programa de Pós-Graduação Coordenadora de Pesquisa da PROPPi em Estudos Contemporâneos das Artes Andrea Brito Latge Luciano Vinhosa

Programa de Pós-Graduação em Estudos Contemporâneos das Artes

Área de Concentração Corpo Docente Permanente Estudos Contemporâneos das Artes Andrea Copeliovitch Ana Beatriz Fernandes Cerbino Jorge Vasconcellos Linhas de Pesquisa Leandro Mendonça Estudos Críticos das Artes Ligia Dabul Estudos das Artes em Contextos Sociais Luciano Vinhosa Estudos dos Processos Artísticos Luiz Guilherme Vergara Luiz Sérgio de Oliveira Martha D’Angelo Professores Colaboradores Martha Ribeiro Guilherme Werlang da Fonseca Costa Tania Rivera Pedro Hussak Van Velthen Ramos Tato Taborda Ued Maluf Viviane Matesco

Agradecimentos à Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação pelo apoio à publicação da Poiésis. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Poiésis. Publicação do Programa de Pós-Graduação em Estudos Contemporâneos das Artes da Universidade Federal Fluminense – n.1 (2000). – Niterói: PPGCA, 2012. 21 cm; Il;

OLIVEIRA, Luiz Sérgio de; VASCONCELLOS, Jorge (Editores). Poiésis n. 20, v1, Niterói Universidade Federal Fluminense; Programa de Pós-Graduação em Estudos Contemporâneos das Artes; Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação; Instituto de Arte e Comunicação Social. Dezembro de 2012, 172p. ISSN 1517-5677 semestral 1. Artes ; 2. Práticas artísticas ; 3. Crítica de arte ; 4. Estética ; 5. Cultura