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PANTONE 1525 PRETO Medalha Filipéia a Roberto Marinho Ronaldo Cunha Lima enhor Presidente da Academia Brasileira de Letras poeta Ivan Deputado Junqueira, senhora e senhores Acadêmicos, D. Lily Marinho, federal, S ex-governador da familiares de Roberto Marinho. Paraíba. O governador da Paraíba, meu filho, me delegou poderes na gra- Comunicação tificante missão de trazer ao conhecimento desta Casa e da família apresentada na mesa-redonda de Roberto Marinho que, por decreto seu, criou a Medalha da Fili- 100 anos de péia – nome primeiro da Paraíba dado pelos espanhóis em homena- Roberto Marinho, gem ao Rei Felipe II da Espanha – e decidiu ele que a primeira me- realizada na Academia dalha, in memoriam, seria outorgada a um homem que não era carioca, Brasileira de nem paulista, nem mineiro, era brasileiro, e que a Paraíba queria ser Letras em 25 de o primeiro Estado a homenageá-lo com essa medalha e que eu co- novembro de 2004. municasse a Academia e aos familiares para recepção da outorga ma- ior que o Poder Executivo do meu Estado oferece a alguém pela sua história, pelo seu trabalho. E disse mais: – Meu pai, se possível lembre o episódio com o meu filho (meu neto) no dia do falecimento de Roberto Marinho. Meu 201 PANTONE 1525 PRETO Ronaldo Cunha Lima neto de 12 anos de idade, que adora televisão, gosta de poesia, me procurou ao ouvir o noticiário da morte de Roberto Marinho e me disse: – Meu avô, eu não estou entendendo! A televisão está dizendo que morreu o imortal Roberto Marinho. O que é ser imortal? Se é imortal, por que morreu? Coisa de criança. Eu disse: – Meu filho, vou tentar explicar a você o que é imortal. Imortal é o habitante do amanhã, é aquele que vive hoje e habitará sempre. Imortal não é imorrível, é aquele que faz imperecível alguma coisa na vida, e Roberto Mari- nho deixou imperecível a sua obra. Por isso ele já era e é imortal. Ele disse: – Agora eu entendi, meu avô. Ele realmente é imortal. Por isso, senhor Presidente, comunico a esta Casa e comunico a família de Roberto Marinho que a Paraíba se sente orgulhosa em outorgar, em primeiro lugar, in memoriam, a medalha Filipéia a Roberto Marinho, solicitando que a fa- mília designe representante para em solenidade especial o próprio governador fazer a entrega dessa comenda e dessa medalha. Muito obrigado aos senhores e minha homenagem a Roberto Marinho, o homem do século. 202 PANTONE 1525 PRETO Um homem chamado sucesso José Mario Pereira os 95 anos, o jornalista Roberto Marinho, dono das Organi- José Mario zações Globo, não mudou a rotina: acorda cedo, vai ao jor- Pereira é editor e A jornalista. nal O Globo – seu verdadeiro xodó, na opinião de muitos – e no co- Artigo publicado meço da tarde segue para a TV, onde almoça e dá expediente. E al- na revista moçar com ele é hoje privilégio de um seleto grupo. Em geral, ocu- República (abril, 2000). pam a mesa de refeições do escritório, de onde se descortina uma be- líssima paisagem do Jardim Botânico, os filhos Roberto Irineu, João Roberto e José Roberto; os advogados Jorge Rodrigues e Jorge Ser- pa; o diretor financeiro da TV Globo, José Aleixo; políticos como Antônio Carlos Magalhães e José Sarney quando de passagem pelo Rio; empresários como Carlos Henrique Ferreira Braga e Israel Kla- bin – e outros poucos íntimos. Aos visitantes que são levados ali pela primeira vez, recomenda-se elogiar a paisagem, um dos orgulhos do dono da sala. No tempo em que freqüentava a TV Globo, o pedetista Leonel Brizola nunca a elogiou. Certo dia levantou-se, com ar de quem finalmente ia fazer 203 PANTONE 1525 PRETO José Mario Pereira um comentário, deixando Dr. Roberto na expectativa. “Veja o CIEP que es- tou construindo ali!”, disparou Brizola, apontando para os lados da Lagoa Rodrigo de Freitas. Dizem que aí começou sua fritura na Globo. De hábitos frugais, Roberto Marinho raramente se excede à mesa. Não que faça dieta: vez por outra encara até mesmo pratos suculentos, mas a preferência é por peixe grelhado com batatas cozidas. Também nunca fu- mou nem bebeu. Quando se elegeu para a Academia Brasileira de Letras, fez questão de brindar com champanhe, mas só tomou meia taça. É um ho- mem tranqüilo, de fala mansa, que não levanta a voz e usa da mesma natu- ralidade ao dirigir-se a uma autoridade nacional ou internacional, a um de seus diretores ou ao mais humilde dos empregados. E é querido por todos. Nos corredores da Globo, é freqüente ser parado por alguns funcionários idosos, para quem tem sempre uma palavra gentil. Muitos desses compa- nheiros participaram das jornadas de combate aos dois incêndios da tevê, em 1969 e 1976. Costumam tachá-lo de Cidadão Kane, de senhor da política nacional. Di- zem que ninguém é nomeado no Brasil sem seu apoio ou consentimento. Tal- vez seja verdade. Mas ele não é de ostentar poder. Por seu gabinete já passaram todos os poderosos do país, da direita, da esquerda e do centro: Fernando Henrique Cardoso, Roberto Campos, Jânio, Brizola, Lula, Delfim Netto, Tasso Jereissati, Ciro Gomes – uma lista infindável. A todos interpela, objeti- vo, sobre o que pensam para o Brasil. Dr. Roberto não esconde a veneração pelo pai. Uma de suas lembranças mais vívidas remete à infância, quando foi mordido por um cachorro, e seu pai, durante vários dias, trazia-o ao Rio por volta das 4h da madrugada – moravam em Niterói – para tomar vacina; depois embarcava com o filho de volta, dor- mia um pouco, e logo retornava à então capital da República, para trabalhar. Ainda hoje, sempre que recorda a morte de Irineu Marinho (1876-1925), dias depois de fundar O Globo, as lágrimas lhe vêm aos olhos. Sim, trata-se de ho- mem sensível, que gosta de música, é amigo de Arnaldo Cohen e pode ser visto com freqüência no Theatro Municipal do Rio de Janeiro – mesmo quando a 204 PANTONE 1525 PRETO Um homem chamado sucesso diva Jessye Norman impôs como condição para cantar, apesar do calor cario- ca, que o ar condicionado fosse desligado. Durante anos acompanhou a impressão de O Globo; para isso mantinha no jornal um apartamento, espécie de estúdio no 4.º andar, onde às vezes almoça- va com os irmãos Ricardo (já falecido) e Rogério, e amigos. Entre estes desta- ca-se um lembrado sempre com saudade: Augusto Frederico Schmidt. Rober- to Marinho no Globo foi até fotógrafo: é dele a histórica foto de Washington Luís com o Cardeal Leme às vésperas da partida para o exílio. Ainda hoje es- mera-se em dar idéias para manchetes ou fotos da 1.ª página, e às vezes chama, entre outros, o caricaturista Chico Caruso para conversar. Conviveu com Nel- son Rodrigues, que sobre ele escreveu várias vezes, e até mesmo com o Barão de Itararé. Já Schmidt, o poeta de Estrela Solitária, escreveu em O Globo e, íntimo de pre- sidentes, dizem que se empenhou junto a um deles, Juscelino Kubitschek, para conseguir concessões de televisão para Dr. Roberto. Colaborador atento du- rante 14 anos na superintendência geral da TV Globo, o administrador de empresas Miguel Pires Gonçalves contesta: o grande orgulho do ex-patrão é ter comprado todas as concessões que detém. O poeta de Estrela Solitária e o jor- nalista eram inseparáveis, e são muitas as histórias que o dono das Organiza- ções Globo, com seu característico senso de humor, narra de Schmidt, que o apelidou de “O rei do mar”, por conta de sua paixão pelas aventuras marinhas. Um companheiro dessas investidas é o jornalista de economia Carlos Tava- res de Oliveira, da Confederação Nacional do Comércio, que muito colaborou para um dos últimos triunfos jornalísticos do amigo: a vitoriosa campanha empreendida pelo O Globo, em prol da modernização dos portos brasileiros, iniciada há dez anos, e que terminou com a promulgação da Lei n.º 8.630, de 25 de fevereiro de 1993. Dono de um folclore especial sobre Roberto Mari- nho, com quem convive há mais de 40 anos, Tavares relembra episódios onde o hoje conhecidíssimo empresário foi tratado como o mais comum dos mor- tais. Conta que, certa ocasião, caminhando em Paraty resolveram parar num posto de gasolina. Quando se dirigia ao bar viu entrar um enorme caminhão, 205 PANTONE 1525 PRETO José Mario Pereira Roberto Marinho e Stella Goulart em foto do casamento, em 1946. Roberto, Stella e os filhos. (As duas fotos são do Acervo família Marinho) 206 PANTONE 1525 PRETO Um homem chamado sucesso cujo motorista, da boléia, gritou para o Dr. Roberto, confundindo-o com o frentista: “Ei, você aí, enche o tanque!” De outra vez, na década de 70, saíram de barco. Entusiasmados com a bele- za do dia, se afastaram da área de Angra dos Reis e logo se deram conta de que já era tarde, e haviam prometido levar peixe para o almoço. Daí a pouco, en- contraram um pescador numa canoa cheia de peixe fresco, mas só então perce- beram que não tinham dinheiro. Tentaram negociar: “O senhor me deixa levar o peixe e logo mando um empregado meu com o dinheiro.” O pescador não quis conversa: “De jeito nenhum, só leva se pagar.” Depois de muito argumen- tar, Tavares apelou: “Ele não vai deixar de mandar pagar a você, rapaz! Ele é o Roberto Marinho, do Globo!” O pescador, encarando os dois tripulantes do confortável iate Tamarind, foi taxativo: “E eu com isso?” A negociação não aconteceu, e acabaram num restaurante. Hoje, certamente, com a popularidade da TV Globo e da figura do seu criador, tudo teria sido mais fácil – embora o empresário continue a andar sem dinheiro, cheque ou cartões de crédito.