A Civitas Dos Banienses: Em Torno Da Sua Implantação E Territorium Joan Garibo Bodí ([email protected]), Sérgio Simões Pereira ([email protected])
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Actas de las iv jornadas de jóvenes investigadores del valle del Duero 2014 A civitas dos banienses: em torno da sua implantação e territorium Joan Garibo Bodí ([email protected]), Sérgio Simões Pereira ([email protected]). Arqueólogos INTRODUÇÃO om o presente trabalho pretendemos contribuir para a resolução de uma questão em aberto, relativa ao local de implantação da civitas dos Cbanienses. A sua existência é inequívoca face ao reconhecimento de duas epígrafes, uma na ponte de Alcântara (Espanha), que faz menção aos muni- cipia da Lusitaniae que colaboraram na sua construção, e a outra no sítio do Baldoeiro (Adeganha-Torre de Moncorvo) citando a civitati baniens. Nesta abordagem procurámos reler as fontes documentais, que abor- dam o tema da localização da cidade e os achados epigráficos. Os sítios indicados pelas fontes como potenciais sede da civitas beniensis foram visi- tados, com o intuito de confirmar a informação publicada e recolher novos dados, de modo a podermos cruzar as diversas fontes. Considerámos ain- da o panorama do povoamento pré-romano, os fatores de fixação de civi- tates, assim como a singularidade dos aglomerados das zonas interiores. Por último, lançaremos algumas propostas de trabalho relacionadas com o territorium da civitas, possíveis fronteiras e outras particularidades que consideramos interessantes. 532 A civitas dos banienses REFERÊNCIAS EPIGRÁFICAS ter, recolhida no sítio do Baldoeiro. À CIVITAS DOS BANIENSES O aparecimento desta epígrafe co- rrobora a existência desta civitas e A mais antiga referência a esta ci- permitiu uma maior aproximação à vitas, conhecida nos séculos XV e sua localização. Tratando-se de um XVI, é a inscrição que se encontra- altar de granito, dedicado a Júpiter, va inserida na Ponte de Alcântara foi publicado pela primeira vez por (CIL II 760), indicando os diversos António Carneiro de Magalhães. No municipia que contribuíram na sua seu relato, António Magalhães tes- construção. temunhou o achado in loco, encon- A transcrição da peça original trando-se a peça à superfície devido pode ter motivado alguns erros, aos revolvimentos motivados por tais como Arani em vez de Aravi e uma habitante de Estevais, que pro- Talores em vez de Tapores, todavia as curava tesouros. O local exato onde dúvidas não se reduzem a questões foi encontrada a epígrafe, foi rela- epigráficas, uma vez que a maioria cionado com os vestígios da igreja das civitates continuam por localizar denominada “Mesquita”, dedicada com precisão. Se excetuarmos os ca- a S. Mamede. Não parecem existir sos dos Igaeditani (Idanha-a-Velha) dúvidas de que a peça procede do e dos Aravi (Devesa), todas as res- Baldoeiro, sendo Estevais a po- tantes sedes de civitas se encontram voação mais próxima ao sítio, o por localizar. facto de Carneiro de Magalhães ter A segunda referência à civitas en- sido acompanhado por habitantes contra-se numa ara dedicada a Júpi- da aldeia e ser a origem do referido Fig. 1: Réplica atual da inscrição da ponte de Alcântara (CIL 760). Fig. 2: Reprodução da ara encontrada no Baldoeiro (CIL2399) publicada por Leite de Vasconcelos (1913, III, p. 229). 533 Actas de las iv jornadas de jóvenes investigadores del valle del Duero 2014 caçador de tesouros. Também a in- Mais tarde, Leite de Vasconce- dicação da existência de uma capela los (1913, III, p. 176) a propósito da e de “cobras esculpidas na rocha”, civitas Baniensium refere que “o seu gravuras publicadas por Santos Jú- oppidum creio ter sido um impor- nior (1931), confirmam ser esse o tante castro que está sobranceiro ao local do achado. vale da Vilariça”. A mesma ideia é repetida mais à frente (Vasconcelos, SÍNTESE SOBRE O ESTADO DA 1913, III, p. 223) “Aqui perto ha um INVESTIGAÇÃO castro que (…) creio ter sido a sede da civitas Baniensium. A partir daqui Os primeiros autores a debruça- a localização da civitas começa a ser rem-se sobre a questão da civitas dos relacionada com o cabeço de Santa banienses foram Carneiro Magalhães Cruz de Vilariça. (1845), General Pery (1845) e A. Ca- O Abade de Baçal (Alves, 1938- bral (1910), relacionando-se a sede 2000, IX, p. 238) ao fazer uma relei- da civitas com o local do achado da tura de L. Vasconcelos pensa que segunda epígrafe - Baldoeiro. O ma- “Derruida, São Mamede e Vila de nuscrito do general Pery, referido Santa Cruz coincidem ou se equi- por L. Vasconcelos, F. Alves e por J. valem geográfica e arqueologica- Alarcão, refere também que no local mente”. A confusão pode dever-se à designado por Mesquita (Baldoeiro) maior monumentalidade dos vestí- haveria uma capela em ruínas, na gios arqueológicos preservados no qual se encontraria a ara. Em sua cabeço de Santa Cruz da Vilariça, opinião, a capela seria adaptação de também à existência de uma cape- um templo romano e conservaria la, à posição geoestratégica do sítio ainda, no seu muro norte, parte da e mesmo a obtenção de foral em original obra romana até 2 m de al- 1225. A partir dos textos de Leite tura. Segundo a mesma fonte, num de Vasconcelos outros autores vão rochedo sobranceiro à capela have- repetindo o equívoco de relacionar ria “escavações de várias formas”, a sede da civitas com o sítio de San- à volta da capela haveria alicerces, ta Cruz da Vilariça ou Derruída - F. pedras de cantaria, telhas e em casa Alves (1938), V. Rodrígues (1957), J. próxima da capela haveria uma ins- Alarcão (1998, 1990 e 1995-96) e S. crição latina. Lemos (1993). A. Cabral (1910) publica ainda Jorge de Alarcão (1988, II, F1, o achado de um “touro” e de uma p. 45) sintetiza a questão e levanta “pedra lavrada”. No seu artigo, a uma nova hipótese: “Mesquita se- depreender pelas imagens, as pe- ria o local de um santuário romano, dras parecem elementos arquite- mas não a “civitas Baniensium”, tónicos da igreja: o suposto touro mantendo a eventual sede na “Vila seria antes um cachorrão represen- Morta de Santa Cruz da Vilariça” tando uma cabra e a outra peça um ou “Derruída”. elemento de porta. 534 A civitas dos banienses Fig.3: Vale da Vilariça com implantação das manchas de dispersão de materiais nos sítios de Baldoeiro (a), Santa Cruz da Vilariça (b), Chão da Capela (c), Olival das Fragas (d) e Vila Maior (e). GoogleEarth. Sande Lemos (1993, II, p. 354- Uma nova proposta de implan- 355) coloca algumas reticências à tação da civitas surge no trabalho localização da sede da civitas em académico de Carlos Cruz (2000, Santa Cruz, reconhecendo que II, p. 222), ao defender que poderia “nunca foram encontrados ma- implantar-se no sítio de Chão da teriais que demonstrassem uma Capela (Junqueira). Para além da ocupação romana do local”. O ausência de vestígios romanos nos autor, inclusive, chama a atenção trabalhos arqueológicos desenvol- para a ausência de vestígios ro- vidos pelo PARM, nos sítios de Bal- manos nas primeiras sonda- doeiro e de Santa Cruz da Vilariça, gens desenvolvidas pelo PARM o reconhecimento de uma “enorme em Santa Cruz da Vilariça, embora concentração de materiais de cons- relacione as 11 estelas, reutilizadas trução, cerâmica comum, elementos na capela de N. Sr.ª do Roncal, com de mó e alguma escória” junto ao uma eventual necrópole do sítio. lugar de Junqueira sustentam esta 535 Actas de las iv jornadas de jóvenes investigadores del valle del Duero 2014 hipótese. O mesmo autor arrola ainda ao sítio a presença de quatro Análise comparativa dos dife- epígrafes e a existência de uma ne- rentes sítios propostos crópole, com base em informações Analisadas as distintas propostas orais que referem a identificação de da investigação, juntaremos os dados sepulturas. arqueológicos recolhidos em cada um Num trabalho recente, dado à destes sítios, com o intuito de poder- estampa por António Silva (2014), o mos cruzar toda a informação dis- sítio do Chão da Capela foi reinter- ponível. De entre as diversas opções pretado, tendo como argumentos o tentaremos reduzir o número de hi- aparecimento de cinco novas estelas póteses procurando chegar até à mais funerárias e a subdivisão da enorme provável localização da sede de civitas mancha de materiais supracitada em dos banienses. três áreas de dispersão distintas. Se- gundo o autor (SILVA, 2014) “o sítio a) Baldoeiro do Chão da Capela deverá ser classi- ficado como santuário cristão da Alta O sítio está implantado na vertente Idade Média, com necrópole associa- voltada a oeste do Vale da Vilariça, da. Este santuário poderá sobrepor-se num esporão-plataforma destaca- a uma necrópole romana, relacionada da. A área de dispersão da mancha com o aglomerado rural do Freixo e/ de materiais é próxima aos 41.197 ou com o casal agrícola de Campo”, m2. Ali foram executadas várias sem no entanto apresentar alternativa intervenções arqueológicas, desen- à localização da civitas. volvidas pelo PARM, em volta da Os recentes trabalhos de recon- igreja de São Mamede e dos vestí- hecimento deste território, ao abrigo gios de uma possível torre roquei- da contextualização do Baixo Sabor, ra. Os materiais recuperados nestas permitiram-nos conhecer melhor os escavações apontam para duas ocu- diferentes sítios até agora propostos pações distintas - Calcolítico-Bron- como possível sede dos banienses. Por ze Final-Ferro I e Alta Idade Média. um lado, foi possível confirmar al- Aquela igreja foi referida como lo- gumas das informações publicadas, cal do achado da ara, dedicada a por outro, recolher novos dados que Júpiter por Sulpicius Basus e pelos podem contribuir para o aprofundar banienses. Do templo destacam-se desta temática. Nesta pesquisa recor- os elementos arquitetónicos preser- damos, também, uma notícia de Luís vados e uma necrópole rupestre as- Cardoso (1747-51) que refere a exis- sociada. Para além da epígrafe, não tência de uma antiga grande cidade se reconheceram materiais romanos no termo de Adeganha, no local hoje à superfície e nas escavações do em dia conhecido como Santuário de PARM, sendo mais provável que a Nossa Senhora do Castelo.