10 Anos De Transformação
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criança e consumo 10 ANOS DE TRANSFORMAÇÃO Ana Olmos, Adriana Cerqueira de Souza, Arthur Meucci, Clóvis de Barros Filho, Flávio Paiva, Frei Betto, Giovana Longo Silva, Inês Vitorino Sampaio, João Lopes Guimarães Junior, José Augusto Taddei, José Eduardo Elias Romão, Ladislau Dowbor, Marcelo Sodré, Maysa Toloni, Nádia Rebouças, Pedrinho Guareschi, Solange Jobim e Souza, Vidal Serrano Nunes Junior e Yves de La Taille organização: Lais Fontenelle prefácio: Isabella Henriques criança e consumo 10 ANOS DE TRANSFORMAÇÃO 1ª edição São Paulo 2016 prefácio DEZ ANOS DEPOIS, PARA ONDE VAMOS? por ISABELLA HENRIQUES Dez anos passaram-se sem que nos déssemos conta. Uma década. Muito tempo. De vida. De história. Para o Universo, claro, é muito pouco. É um sopro. Guardadas as proporções, para o projeto Criança e Consumo não foi muito nem pouco. Foi tempo suficiente para termos feito o que fizemos e para ter acontecido o que aconteceu. Mas, sem dúvida, é um marco. Um aniversário a ser comemorado e celebrado, com conquistas e vitórias. Um momento para renovar a visão do que virá, do que pode acontecer, do que se quer como presente no futuro. Hora de olhar atentamente para o que passou, inclusive em relação ao que saiu diferente do que se imaginou. Feliz aniversário, projeto Criança e Consumo do Instituto Alana! Nesses últimos 10 anos, tive o prazer e a honra de estar à frente da coordenação desse incrível trabalho desenvolvido por uma equipe que sempre foi e continua sendo extremamente comprometida, dedicada e movida por um ideal de vida maior, que é o resgate do humanismo na sua mais completa profundidade. ISABELLA HENRIQUES é advogada, mestre em Direito das Relações Foram anos de trabalho intenso que, aos poucos, misturou-se com Sociais, Direitos Difusos e Coletivos e diretora de advocacy do Instituto nossa vida privada. Não apenas tivemos mais um emprego, mas colocamos Alana. Coordena o projeto Criança e Consumo desde o seu nascedouro. nossa energia na defesa de uma causa, com nosso coração, estômago e nossas vísceras. Passou a ser comum entre nós refletir sobre nossa atua- tema era pouco debatido e o mercado avançava sobre o público infantil ção – e termos talvez as melhores ideias – longe do escritório, nas horas sem freios ou constrangimentos. de lazer, na nossa rotina de vida, perto dos amigos e familiares. Também a absoluta liberdade de ação que nos foi garantida pelo Ins- Tornou-se impossível uma ida ao supermercado ou a um shopping tituto Alana, tanto por seus fundadores como pela direção da institui- center sem o olhar crítico que desenvolvemos. Passeios no parque, em ção, aliada às condições estruturais que tivemos ao longo dessa década, praças, praias e ruas tornaram-se, por vezes, objetos de estudo. Também propiciou o pleno desenvolvimento do nosso trabalho e da nossa atuação o almoço de domingo, as reuniões de pais e mestres e as conversas de bo- frente a uma causa tão importante e controversa. tequim não passaram ilesos a uma discussão mais acalorada sobre temas Sem dúvida, não foi o trabalho de uma ou duas pessoas, nem de apenas como consumo, infância e mídia. um pequeno grupo, mas de milhares que se juntaram à causa e fortalece- Todos à nossa volta passaram a ser entusiastas do trabalho ou pro- ram o que fazíamos e fazemos. Em todas as esferas da sociedade brasileira – fundos conhecedores do tema, tamanho o envolvimento que tivemos e por vezes em âmbito internacional – encontramos eco para nossas vozes. com a defesa da criança frente aos apelos de consumo, à publicidade e à O consumismo na infância, tema pouco falado, passou a ser discuti- comunicação mercadológica voltados ao público infantil. do nas mais diversas searas, das universidades às redes sociais, da mídia Também durante essa década contamos com o permanente apoio do tradicional aos poderes da República, dos bares às reuniões de pais e mes- Conselho Consultivo do projeto, o qual, importante frisar, está presente tres. Da mesma forma, o impacto do direcionamento da publicidade e da no dia a dia e não se limita à mera assinatura dos renomados integrantes, comunicação mercadológica a crianças com menos de doze anos também mas colabora e participa ativamente. passou a ser frequentemente discutido e apontado como uma das causas Foram muitas as conversas, os cafés, almoços e as reuniões que tive- – que de fato é – de uma série de consequências danosas à infância. mos para que nos ajudassem a escolher o caminho certo, a não perder o Hoje são inúmeros os trabalhos de conclusão de curso, dissertações rumo escolhido e a seguir em frente. Recebemos apoio profissional cons- de mestrado, teses de doutorado, livros, artigos científicos, reportagens, tante, mas também calor humano e palavras de incentivo, em especial matérias jornalísticas, pareceres jurídicos, decisões judiciais, relatórios nos momentos mais delicados da defesa de uma causa que, infelizmente, de pesquisa e depoimentos sobre o tema que podem ser encontrados com é ainda combatida com unhas e dentes por um setor produtivo que almeja facilidade por quem tiver interesse. Ou, mesmo quando não são procura- apenas incremento financeiro. Tornaram-se amigos e queridos de vida. dos, estão à nossa volta. Para além do Conselho, muitas pessoas participaram da construção Com certeza fizemos um belo trabalho, muito consistente e coerente coletiva e, particularmente, da consolidação do trabalho do Criança e Con- com a missão, a visão, os valores e os princípios do projeto. Passamos sumo. Representantes de organizações parceiras, as próprias organizações, por alguns planejamentos estratégicos que nos ensinaram a importância militantes de causas e movimentos sociais variados, membros de órgãos do plano de voo quando o céu é o limite. Contudo, é absolutamente im- governamentais, estudantes, professores, entusiastas, advogados, jornalistas, perioso que se faça o devido reconhecimento ao fato de que o Criança e publicitários, donas de casa, mães, pais, algumas empresas, seus empresários Consumo nasceu em um momento no qual a sociedade brasileira estava e executivos, profissionais liberais diversos e, como não poderia deixar de ser, com o grito de basta à publicidade infantil represado na garganta. Por as crianças, que, ao longo desses anos todos, inspiram-nos cada vez mais. conta disso, tivemos tanto espaço e crescemos de maneira vertiginosa, Isso tudo sem falar da querida Ana Lucia Villela e sua ideia visionária muito além de qualquer meta que tenhamos rabiscado de início. de criar e fomentar um projeto no terceiro setor para discutir o impacto Foi uma coincidência de fatores que fez do Criança e Consumo o que da publicidade sobre as crianças, bem naquele ano de 2006, quando o é hoje. Essa especial conjuntura favoreceu o aparecimento da discussão com a força e a intensidade que teve, transformando a bandeira do projeto Precisamos, para isso, popularizar nosso discurso, conquistar a mente em uma causa de todos e todas. e o coração dos adultos deste Brasil, que é enorme, díspar e tem tantos Não foi por acaso que o tema da redação do Enem de 2014 tenha sido outros desafios. o direcionamento da publicidade às crianças. Ou que uma parte relevante Fazer a conexão com outros temas, como violência e ecologia, é igual- do setor produtivo começou a mudar sua atitude e bradou aos quatro mente necessário, assim como chamar a população à reflexão acerca cantos que não anunciaria mais para crianças com menos de doze anos. do espaço da internet como meio propagador de infindáveis convites É o resultado de uma intensa mobilização em torno do tema. publicitários às crianças sem qualquer fiscalização. Afinal, quem é contra uma infância livre do assédio consumista? Também está no radar fomentar uma discussão séria e profunda sobre Publicamente? Ninguém. Não dessa forma. Pode-se falar em público, de as formas de financiamento das produções culturais audiovisuais para maneira retórica, que se é contra o cerceamento à liberdade de expressão, à crianças no país e de uma autorregulação eficaz. censura, às intenções controladoras governistas, às organizações das quais Enfim, temos trabalho para, pelo menos, outra década, com dias não se conhece os reais objetivos, à padronização do consumo nos moldes intensos e uma equipe incansável, que tem na busca pela garantia dos do pior pesadelo socialista e por aí vai. Mas ninguém vem a público defender direitos humanos das crianças um de seus maiores valores. que as crianças sejam submetidas a incontáveis horas de publicidade dia E o que é melhor: temos uma sociedade muitíssimo mais atenta e após dia com o objetivo de incrementar as vendas e aumentar os ganhos esclarecida sobre os malefícios do direcionamento da publicidade voltada financeiros. Chega-se até a dizer que as crianças precisam ter o direito de às crianças e a difusão de valores consumistas e materialistas junto aos escolher, por meio da publicidade, o que querem pedir de presente. No Na- pequenos. Sociedade que levará esses desafios futuros, seja lá como for. tal, no Dia das Crianças, na Páscoa, na segunda-feira na cantina da escola, na Não há caminho de volta. De agora em diante será sempre com o olhar terça-feira na padaria, na quarta-feira na internet e assim por diante. Mas à frente que todos caminharemos, inclusive aqueles que ainda insistem não se fala em explorar abusivamente a peculiar fase de desenvolvimento em convencer o público infantil por meio da publicidade, que, mais dia em que se encontram os pequenos. menos dia, acabarão deixando as crianças em paz. Lobby no Congresso, defesas jurídicas com os melhores e maiores es- Que o presente livro traga lembranças desses dez últimos anos e tam- critórios de advocacia, acesso à justiça, influência nos maiores veículos de bém o desejo de seguir em frente, na busca de uma sociedade mais justa, comunicação de massa, mudança de formato da publicidade, sofisticação humana e fraterna.