A Música Segundo Tom Jobim
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CURTA NOSSA PÁGINA VOL. 22 | N. 38 | 2017 | http://dx.doi.org/10.15448/1980-3710.2017.2 Dossiê Game Studies Crédito: Sessões do Imaginário - n. 1 - 1996. Caravaggio,A estética do Rammstein imaginário MaterialidadesHipermodernidade, fílmicas, sociabilidade magia e Videogames,Manifestações transgressão e mídias e eno Madonna cinema montageme tecnologias digitais criatividadealternativas no Brasil TicianoDemian Paludo Garcia e André A. Medeiros EdneiErika Oikawade Genaro EmmanoelAntonio Brasil Ferreira e Samira Moratti Frazão P.79 P. 94 P.89 P. 112 P.127 P. 72 Recebido em 27 de dezembro de 2017. Aprovado em 27 de abril de 2018. Resumo Abstract O presente artigo pretende discutir The present article intends to dis- Música e biografia no os limites entre o biográfico e o mu- cuss the boundaries between the sical no contexto da produção do- biographical and the musical in the documentário brasileiro: uma cumental brasileira contemporânea. context of contemporary Brazilian Para tanto, apresenta uma análise documentary production. For that, análise semiopragmática de A semiopragmática de A música segun- it presents a semiopragmatic anal- do Tom Jobim (2011), documentário ysis of A música segundo Tom Jobim música segundo Tom Jobim1 que se caracteriza pelo protagonis- (2011), a documentary that is char- mo da matéria musical e que apon- acterized by the protagonism of the Music and biography in Brazilian ta para a possibilidade de expansão musical matter and that points to the dos limites do documentário biográ- possibility of expanding the limits of documentary: a semiopragmatic analysis fico musical para além de sua fórmu- the musical biographical documen- of A música segundo Tom Jobim la mais corrente, normalmente cen- tary beyond its more current, usually trada no recurso de depoimentos. centered formula in the resource of testimonies. Palavras-chave Keywords Documentário; música; biografia; Documentary; music; biography; se- 2 Sandra Straccialano Coelho semiopragmática. miopragmatic. 190 PORTO ALEGRE | v. 22 | n. 38 | 2017 | p. 190-198 DOI: http://dx.doi.org/10.15448/1980-3710.2017.2.29554 Sessões do Imaginário Música e biografia no documentário brasileiro: uma análise semiopragmática de A música segundo Tom Jobim Introdução Dentre eles, podemos citar, por exemplo, desde o tras palavras, a maior parte dessa produção tem sido Ainda que a categoria do “documentário musi- contexto mais favorável à produção cinematográfica destinada à construção de cine-retratos de músicos ou cal” careça de precisão teórica enquanto um sub- observado a partir dos anos de 1990 no Brasil, com o grupos musicais específicos. Nesse universo, estão in- gênero nos domínios do cinema documental (Lima, aumento das possibilidades de captação de recursos e cluídos, por exemplo, os documentários Paulinho da 2015), seu reconhecimento pela crítica, assim como maiores incentivos públicos ao audiovisual, até as di- Viola: Meu tempo é hoje (Izabel Jaguaribe, 2004), Nelson pelo público que atualmente frequenta as salas de nâmicas existentes entre as indústrias cinematográfica Freire (João Moreira Salles, 2003) e Fabricando Tom Zé cinema no Brasil, é inegável. Consideramos aqui, em e fonográfica nacionais, as quais podem ser rastreadas (Décio Matos Jr., 2004), assim como os mais recentes consonância com Altman (1999), que gêneros e seus desde o fenômeno das chanchadas, passando pelos Titãs, a vida até parece uma festa (Branco Mello e Oscar subgêneros são categorias instáveis, já que histórica filmes da Jovem Guarda e pela produção dedicada à Rodrigues Alves, 2008), Jards (Erik Rocha, 2012) e Chico: e culturalmente delimitadas. Desse ponto de vista, geração do rock nos anos de 1980, ou ainda pelo re- artista brasileiro (Miguel Faria Jr., 2015), isso para citar eles não se constituem exclusivamente por marcas de aquecimento recente da produção de cinebiografias apenas alguns poucos títulos. No entanto, segundo ob- identidade genérica inscritas no corpo dos próprios ficcionais de personalidades da música (ou grupos serva Lima, trata-se de um conjunto de filmes relativa- filmes, mas sobretudo no circuito multidirecional que musicais) tais como Cazuza: o tempo não para (Sandra mente coeso que, em sua maioria, “estão empenhados se estabelece entre estes e os polos da produção, da Werneck e Walter Carvalho, 2004), 2 Filhos De Francisco: em construir uma personalidade coerente e estável crítica e da recepção cinematográficas. A história de Zezé Di Camargo & Luciano (Breno Silveira, para os sujeitos retratados” (2015, p. 16). Nesse sentido, Em levantamento preliminar realizado pelo Labo- 2005), Gonzaga: de pai para filho (Breno Silveira, 2012) e ratório de Análise Fílmica (LAF/Póscom-UFBA) durante Somos tão jovens (Antônio Fontoura, 2013). não são raros os filmes que constroem a cronolo- pesquisa sobre o cinema musical na América Latina, Além desses fatores, cumpre ainda apontar a pró- gia da vida do personagem a partir de momentos se observou que, enquanto entre as décadas de 1960 pria revitalização do gênero documentário no Brasil, emblemáticos, que compõem uma trajetória plau- a 1990 foi produzido pouco mais de duas dezenas de observada mais ou menos a partir do mesmo período, sível, factível. Para tanto, eles se valem de proce- documentários que podem ser enquadrados segundo como um dentre os elementos que contribuíram para a dimentos convencionais, que nos remetem aos a etiqueta do “musical”, desde o início do século XXI multiplicação de documentários musicais nas salas de formatos televisivos (informativos ou de entreteni- já se realizou praticamente uma centena de títulos de cinema. A esse respeito, é importante observar que, ao mento), nos quais as imagens de arquivo são ma- natureza semelhante no Brasil. menos no campo do documentário, o musical tem se nejadas de maneira meramente ilustrativa e evoca- Mesmo que o objetivo central deste artigo não seja afirmado como uma das vertentes de maior aceitação das como documento de uma determinada época, esmiuçar as razões do atual crescimento exponencial pelo público e que, portanto, tem representado maior como evidência dos fatos. As entrevistas, também na produção de documentários musicais no cenário possibilidade de retorno em termos de bilheteria para recorrentes, compõem um mosaico com numero- nacional, deve-se apontar que estas provavelmente se produtores e cineastas. sos e fragmentados depoimentos, concatenados relacionam não a um, mas a múltiplos aspectos. Segun- Um olhar mais atento a esse universo de aproxi- de forma linear, sob uma lógica expositivo-argu- do Ramos (2012, p. 128), “as explicações para o fato têm madamente 100 documentários musicais brasileiros mentativa (Lima, 2015, p. 17). se resumido a indícios de natureza cultural, como o co- realizados desde o ano 2000 nos leva a perceber, con- nhecido apreço dos brasileiros pela música popular”, tudo, que mais da metade dessa produção pode ser contudo é possível levantar outros fatores que muito compreendida não apenas segundo a chave genérica Outros autores ainda, como Carvalho (2012; 2015) provavelmente contribuíram para esse crescimento. do “musical”, mas também pela do “biográfico”. Em ou- e Maia (2012), igualmente alinhados com o campo de 191 PORTO ALEGRE | v. 22 | n. 38 | 2017 | p. 190-198 Sessões do Imaginário Música e biografia no documentário brasileiro: uma análise semiopragmática de A música segundo Tom Jobim estudos do som no cinema, têm chamado a atenção de De acordo com análise de Carvalho (2015), A músi- tem como principal filiação o trabalho de Christian seus leitores para o paradoxo de que, na maior parte ca segundo Tom Jobim, realizado em 2011 por Nelson Metz, Roger Odin tem se dedicado à elaboração e de- dessa produção, a música tem sido relegada a um plano Pereira dos Santos e Dora Jobim, nos apresenta “uma fesa de um modelo que possa aliar a abordagem ima- acessório em detrimento da voz, se restringindo, quase biografia que não é didática, informativa e calcada na nentista a uma perspectiva pragmática no exercício da sempre, a um nível meramente temático. Reivindicam, palavra falada, e sim focada na palavra cantada, na mú- análise audiovisual. De acordo com esse modelo, que a partir dessa constatação, que ela possa ocupar um sica cantada de Tom Jobim”. Mais do que isso, segundo o autor denominou como “semiopragmática”3, seria papel de fato estrutural na materialidade fílmica dos a autora, é um filme que instaura “uma esperança da- preciso interrogar não apenas os modos pelos quais os documentários musicais, para com isso adquirir uma nada de ir ao cinema para ver um documentário sobre textos audiovisuais são construídos, mas considerar, si- centralidade que, segundo o ponto de vista defendido temas e personagens da história da música, em parti- multaneamente, as maneiras pelas quais essa constru- por estes autores, deveria caracterizar esse subgênero. cular da MPB, e ser surpreendido por uma nova relação ção pode afetar e conduzir a experiência dos especta- Já para Tavares (2013), autora que tem no aspecto entre imagem e som, música e documentário” (Carva- dores em contextos de recepção distintos. biográfico o foco de sua abordagem, a predominância lho, 2015, p. 129). Nesse sentido, se trataria de um dos Contudo, essa postura teórico-metodológica, que deseja relacionar o “espaço da realização” ao “espaço das biografias musicais no cinema documentário apon- raros momentos em que a música, enquanto matéria da leitura” no momento da análise (Odin, 2000), não te- ta para o fato de que “o investimento neste subgênero do audiovisual, alcançou