837 Os Artistas Macchiaioli Como Exercício Para Uma
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GT- Artes visuais Eixo Temático- 6 Cultura visual e ensino/aprendizagem em artes visuais OS ARTISTAS MACCHIAIOLI COMO EXERCÍCIO PARA UMA LEITURA DA OBRA DE ARTE Maria Cristina Blanco1 Universidade de São Paulo – São Paulo-Brasil Resumo Este trabalho teve como objetivo elaborar reflexões que colaborem com estudos sobre um tema de importância para o ensino da arte: a leitura da obra de arte. Nesses estudos, bastante abordados por teóricos da História da Arte e da Arte-educação, encontra-se vasta bibliografia tanto nacional como estrangeira. Para elaborar tal estudo, pensamos em analisar uma obra de um artista italiano pertencente ao denominado grupo Macchiaioli, que foi importante na representação do chamado Movimento Impressionista e tão esquecidos pela História da Arte. Pensou-se em estudos da leitura da obra baseados em teorias da Retórica (Aristóteles) como também conceitos semióticos que nortearam essas atividades Palavras chave: Leitura da obra, História da Arte, Artistas Macchiaioli. THE MACCHIAIOLI ARTISTS AS EXERCISE FOR ART WORK READING Abstract This work has the goal of elaborating reflections which can collaborate with an important topic in art teaching: the artwork reading or analysis. In these studies, greatly approached by art history and art education theorists, there is a vast bibliography both national and international. To elaborate such a study, we thought of analysing a work by an Italian artist belonging to a group called Macchiaioli, which was important in representing the Impressionism and which is also neglected by History of Art. It was 1 Estudante de doutorado do Programa de Pós-graduação da Escola de Com. e Artes da Universidade de São Paulo. 837 also thought of reading studies based on the theory of rhetoric Aristóteles, as well as of semiotic concepts which could guide these activities. Keywords: artwork reading, History of Art, Macchiaioli artists. 1.1 Introdução Sobre os estudos leitura da obra de arte e suas diversas naturezas A leitura da obra de arte é produzida em uma situação de encontro, quando é possível o desdobramento em situações de encantamento, de dúvidas, de aflições compartilhadas; quando é possível descobrir, conhecer e criar. Esse encontro pede sujeitos presentes, abertos e disponíveis a transformações. Maria Christina Rizzi A leitura da obra de arte é abordada de diversas formas por seus mais variados autores que as compõe. Cada autor estabelece seus critérios de escolhas teóricas para compor seus estudos sobre o tema. No campo da arte-educação, por exemplo, nota-se a presença de diversos autores estrangeiros trazidos pela professora e pesquisadora Ana Mae T. Bastos Barbosa, (BARBOSA, 1999), que colabora de forma significativa com propostas educativas no ensino da arte, tanto em escolas como museus. A pesquisadora buscou nos arte-educadores norte- americanos, assim como em outros estudiosos dessa área, a presença de estudos sobre a aprendizagem da arte dentro de um aspecto social e antropológico. Descobriu assim a presença de estudiosos que entrelaçam suas atividades de leitura da obra com antropologia, caso de Edmund Burke Feldman (1970). O pesquisador Robert W. Ott, em seu trabalho de educação em museus, destaca a importância da leitura da obra, Com atividades em conjunto com as visitas aos museus e o desdobramento dessas ações em direção ao fazer artístico em ateliê. David Thistewood destaca a relevância social na aprendizagem da arte dentro da escola. Nessa obra2 a preocupação com o ensino da arte e a leitura das obras está ligada prioritariamente à arte na educação escolar. 2 Livro referido: Arte-educação: uma leitura no subsolo. BARBOSA, Ana Mae. Ed. Cortez. São Paulo. 1999. 838 Consultando-se a bibliografia relativa à área verificou-se que há vários termos que fazem parte do universo da leitura da obra como, por exemplo: “definição de imagem”, “interpretação da imagem”, “maneiras de ver”. Os estudos com bases nessas leituras apontam a contribuição nas áreas de história da arte/ estética, filosofia, ciências sociais (na qual dois dos campos abrangentes são a sociologia e a antropologia social), psicologia, assim como a forte contribuição da física no campo específico da óptica, destinada à percepção das imagens. 1.2 Sobre tempo e os escritores de análise de obras A análise da obra de arte constitui uma tarefa árdua, sabendo-se que para tanto é necessário levar em conta diversos fatores, como por exemplo: quem as produziu, quando, como, em que local, a que sociedade pertenceu, que tipos de valores e hábitos essa sociedade possuía. Enfim, não constitui uma boa leitura de obra o exercício que não levar em consideração esses aspectos. Um fato bastante recorrente nas análises de obra de arte é a leitura destes objetos artísticos a partir de um “lugar comum” (HANSEN, 2012, p 159). Porém, ressalva o autor que os conceitos retóricos se manteve com muitas diferenças desde os gregos do tempo de Platão e Aristóteles, até a revolução romântica na segunda metade do século XVII, “lugar-comum” tinha outro significado: Antes de tudo, como disse Cícero no século I A.C., repetido por Erasmo de Roterdã no século XVI, o lugar era como um molde definido como “sede do argumento”, que memorizava e que se aplicava para falar e escrever bem. O uso do lugar como molde era comum, como repetição partilhada coletivamente; mas a repetição não era mecânica como a do clichê na impressão, mas uma variação elocutiva feita como emulação de discursos que já tinham usado os lugares que eram repetidos na nova situação. (HANSEN, 2012, p 160). Portanto, como menciona o autor, é necessário examinar a expressão, de acordo com o período a que se refere o termo específico, entre os dos séculos XVI e XVII, e esse o significado dos termos pode variar de forma considerável. Analisar as obras de determinados pontos de vista “particulares” acarreta erros crassos na interpretação das mesmas. É importante sempre levar em consideração o conjunto 839 de informações necessárias para que não haja distorções nessa atividade tão importante no campo da história da arte e crítica. Quando se fala, por exemplo, dos trabalhos de artes das academias de Belas Artes brasileiras, sabe-se que grande parte desses artistas desenhava os modelos baseados em outros artistas que deixaram seus escritos pela história. Um exemplo é o livro Epitome de anatomia relativa às Bellas Artes seguido de hum compêndio de phycologia das paixões, organizado por Félix-Émile Taunay, de 1837, oferecido aos alunos da Imperial Academia das Bellas Artes do Rio de Janeiro (DIAS, 2006). Segundo a autora, o livro: Era um compêndio de teorias artísticas relativa à anatomia, organizado e traduzido por Taunay, publicado em 1837. O Epitome era um complemento fundamental às aulas de modelo vivo e de anatomia implantadas e desenvolvidas neste período. Baseavam- se nos principais tratados artísticos utilizados na academia francesa desde o século XVII. Era composto apenas de textos referentes às obras citadas e não apresentava imagens; os alunos deviam recorrer aos originais para a análise das pranchas. (DIAS, 2006, p. 84) 3 O livro Epitome, divide-se em duas partes, a primeira referia-se à osteologia e a segunda à mitologia. Os textos originais vinham da obra Abregé d’anatomie, accommodée aux arts de peinture et de sculture, cuja autoria era de François Tortebat e Roger de Piles, publicado em 1668. A segunda parte correspondia aos estudos da fisiologia das paixões de Charles Le Brun, presente em L’Expression Génerale et Particuliere. E a parte final do livro refere-se a verbetes sobre as proporções gerais de autoria de Aubin-Louis Millin, presente em seu Dictionnaire des Beaux-Arts, publicado em 1806 (DIAS, 2006, p. 84). Nessa mesma parte do livro Epitome, de Félix-Élime Taunay, é composta pela “Physiologia das paixões”, de Charles Lebrun. Esses desenhos referem-se às expressões humanas provenientes das paixões da alma. No que diz respeito à Physiologia das paixões, explica, DIAS, 2006: Como a própria obra cita, a tradução provém dos escritos de Charles Le Brun contidos em sua Conférence sur l’expression 3 DIAS, Elaine. O Epitome de Anatomia de Félix-Émile Taunay, 1837. Revista de História da Arte e Arqueologia, v. 1, p. 83-96, 2006. 840 génerale et particulière, de 1668. A conferência fazia parte, outros- sim de um programa didático e não menos intelectual promovido pelo diretor da Academie Royale de Peinture et de Sculture, Charles Le Brun, responsável pela organização didática da instituição recém formada sob o domínio de Luís XIV. Era, portanto, mais uma expressão de poder real, o qual se estendia a uma série de outras instituições também criadas sob a investidura do ministro Colbert [...]. (DIAS, 2006, p. 86). Além dessas questões relacionadas ao surgimento dos tratados deste período, a autora Elaine C. Dias, relata em sua publicação, O Epitome de anatomia de Félix-Émile Taunay, 1837, de onde provêm as ideias deste livro. Segundo a autora, a principal fonte de leitura na qual Taunay baseou -se foi Traité dês passions de René Descartes. Escrito no ano de 1649, e também a obra Charactères des passions, do médico Cureau de La Chambre, publicada em 1640. A questão que se coloca agora é analisar estas imagens, a partir de ensinamentos retóricos dentro das perspectivas do século XVII, estudadas e desenhadas para fins de ensinamentos nas Academias de Belas Artes Brasileiras. No entanto, é explicado através da publicação de Eliane C. Dias, que a própria obra Epitome, de Taunay, sofre adaptações quanto às formas de expressão como, por exemplo, o desdobramento de algumas delas. A prancha Compassion (Figura 1) sendo nesse caso a “compaixão”, não existia na edição original com este nome (na versão de Audran consta como “paixão”). Esta figura foi incorporada por Taunay na versão do Epítome de 1837. Fig. 1 – Compassion, (paixão) da série Physiologia das paixões 841 Há uma leitura interessante, feita por DIAS, (2006), sobre algumas destas feições desenhadas para compor o livro: “A contração dos músculos da testa e o movimento do nariz, a abertura da boca e dos olhos, a posição da pupila e, principalmente, a elevação das sobrancelhas constituem as características principais da “construção” da paixão nas figuras”.