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Ação direta: via para a transformação social ( 1906-1919)

1 DANILLO ROSA MARCELINO *

Este texto tem proposta de evidenciar de alguns levantamentos sobre o princípio anarquista da ação direta. Buscando compreender como a ação direta foi mobilizada no contexto da formação do movimento operário brasileiro. O mote para o presente texto é o de investigar se esse princípio anarquista, no contexto brasileiro de formação do movimento operário, em algum momento esteve identificado ao desejo da revolução social no Brasil. Isso surge do questionamento de que contexto econômico, político e social brasileiro pode ter dado outras dimensões do modo de como a ação direta foi mobilizada no país de maneira que a questão da transformação social não fosse necessariamente o fim principal que se desejou naqueles momentos em que as práticas de ação direta foram colocadas em prática. As fontes analisadas no decorrer desse caminhos são os jornais ligados aos libertários e ao movimento operário brasileiro nos primeiros do século XX. Em paralelo também são analisadas as Resolução dos Congressos Operários Brasileiro de 1906 e 1913. A bibliografia utilizada está em diálogo com diferentes trabalhos que nos permite ter uma visão heterogênea sobre o princípio anarquista da ação direta. Tem-se como os principais teóricos da ação direta Emile Pouget, , George Sorell, entre outros, homens que estiveram em contato com as ideias libertárias, para a construção de um novo modelo de sociedade, e com o movimento operário internacional. A metodologia que está sendo aplicada é a análise conceitual do princípio da ação direta, que é entendido, prioritariamente, com seu vinculado ao movimento operário, o movimento anarquistas e o sindicalismo revolucionário.

Palavras chaves: ação direta, anarquismo, sindicalismo revolucionário, movimento operário

* Universidade Federal de São Paulo/Campus Guarulhos, mestrando em História Social e bolsista pela CAPES.

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O levantar da ação direta no movimento operária: da AIT ao sindicalismo revolucionário

A ação direta como um princípio prático teorizado tem suas raízes ligadas à formação de uma rede internacional da classe trabalhadora a partir da Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT)2 em 1866. Ela está em consonância com a determinação saída dessa associação, que é creditada à Karl Marx3, no que diz: “a emancipação da classe operária é obra da própria classe operária”. De posso desse posicionamento iniciou-se uma série de discussões entre intelectuais e operários4 de como/quais deveriam ser as práticas de luta da classe trabalhadora como contra o capitalismo e o Estado.

De modo sintético, podemos afirmar que todo esse processo de mobilização internacional estava se desenvolvendo dentro da dinâmica histórica da Revolução Industrial que começou a produzir significativas alterações modos de produção e distribuição de bens e produtos, consequentemente, impactando da vida de milhares de pessoas que passaram a mobilizar-se contra5, a Revolução Industrial começou espalhar-se pela Europa, entre os séculos XVIII e XIX, e depois tomou o mundo de forma particular em diferentes regiões. Concomitantemente, a esse processo que auxiliaria da formação do sistema capitalista, houve importantes mudanças nas

2 A AIT foi uma organização que abarcou diferentes correntes políticas desde a reformistas a revolucionários de fato e por meio de seções ela foi presente em diversos países. Ver: MARINI, Gualtiero. Revolucão, Anarquia e Comunismo: às origens do socialismo internacionalista italiano (1871-1876). Tese (Doutorado em História) - . Universidade de Campinas. Campinas, SP. 2016.

3 Essa formulação, entretanto, é fruto de reflexões anteriores de Marx e Fredrich Engels em relação suas análises sobre as condições de vida legada pelo sistema capitalista aos trabalhadores urbanos ligados a indústria.

4 Dependendo da atuação de cada um, dentro do movimento operário ou do movimento anarquista, a pessoa do intelectual ou operário de mistura na característica de militante ao protagonizar ações dentro de ambos movimentos, também pode acontecer de uma mesma pessoa realizar atividades como operário, intelectual e militante. Nesse caso, seria interessante analisar as vidas de Emile Pouget (1860-1931) e George Sorel (1847-1922), por exemplo, para ter uma dimensão do papel que eles realizaram no movimento operário. No Brasil, a vida de Edgar Leuenroth (1881- 1968) é um dos caminhos para termos uma percepção da dinâmica de atuação desses homens que no Brasil ou fora tiveram a perspectiva de uma sociedade socialista.

5 Ver: MARTINHO, Francisco. Resistências ao capitalismo: plebeus, operários e mulheres. In: FERREIRA, Jorge; FILHO, Daniel A. Reis; ZENHA, Celeste. (Org.). O século XX: o tempo das certezas, da formação do capitalismo à Primeira Grande Guerra. 5°ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011. (pp.187-211)

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questões de ordem política que deram por abalar as bases das monarquias europeias6, os anos de 1789, 1848 e 1871, com especial atenção à França, foram marcantes nesse quesito. Englobando esses elementos de instância econômica e política vemos o raiar das teorias socialistas emergirem para buscar defender os mais prejudicados com essa dinâmica histórica, em particular, as classes trabalhadores.

Dentro da AIT passou-se a discutir sobre o papel das greves como meio de luta para que os trabalhadores pudessem alçar à mudanças substanciais em sua realidade e a revolução social, já que conforme o sistema capitalista avançava as condições de vida do operariado em diferentes regiões entrava em um trajeto de deterioração material. Tanto que quando da idealização AIT por trabalhadores ingleses e franceses uma das ações estabelecidas foi a troca de correspondência para informar qual era a realidade das condições de vida e trabalho da classe trabalhadora (SAMIS, 2015, pp. 161-164). Como mencionado por Pere Gabriel: “en la Primera Internacional fueron los belgas quienes más desarrollaron ideias sobre la huelga general, entendida como un modo básico de llegar a la revolución social.” (1991, p. 16). , que esteve ao lado de alguns dos libertários internacionalistas belgas na AIT, foi também defensor da greve geral. Bakunin algum tempo antes da Comuna de havia publicado “diversos artigos no jornal L’Egalité, incluindo o texto Dupla greve de Genéve, de 1869, onde analisou as greve organizadas pela Primeira Internacional e traçou a estratégia da greve geral” (SILVA, p.74, 2016).

Mas cabe ver que a discussão sobre greve (e/ou greve geral) no movimento operário é acompanhada de diferentes visões e interpretações dentro do movimento operário, e que ela era pensada circunscrita de dentro alguns objetivos específicos tornando-a um divisor de águas no movimento. Contudo, a profundidade nesse debate toma ênfase no final do século XIX, dentro do movimento operário francês, a partir de seus Congressos e órgãos de impressa, e no começo do XX com perspectiva sindical revolucionária também francesa. As referências para o período são

6 Ver também no livro da nota anterior: RODRIGUES, Antonio E. M. As revoluções burguesas.

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de Fernand Pelloutier, , Henri Girard, Emile Pouget, Paul Delessale, George Sorel e Hubert Lagardelle (GABRIEL, 1991; GIANINAZZI, 2006). O elementar nas formulações desses atores históricos foi a orientação que eles deram para práticas de luta e organização já existente ao final no século XVIII7.

Formas de associação e de luta contra o empregador, como a greve e a sabotagem, já eram parte do repertório da armas de mobilização para a classe trabalhadora, contudo, dessa transição do século XIX ao XX o ponto chave foi a dimensão que a questão política tomou dentro do movimento operário em conjunto dos anarquistas e sindicalistas revolucionários, que passaram a estabelecer diferentes críticas apontando para a insuficiência de a via política eleitoral fazer avançar as reivindicações desejadas pelo operariado. Dessa maneira, a questão da autonomia operária iniciada na AIT toma uma característica mais radical ao negar um sistema político que era entendido como a regra naquela ocasião. Outro fator importante para o momento foi o fato de as ideias elaboradas na França ultrapassarem as fronteira desse país, inclusive, chegando à América - por meio da Argentina, Brasil, Estados Unidos e Uruguai.

O texto substancial para esse momento foi L’action Directe8 publicado por Pouget, onde é expressado o que ele - e o grupo de militantes ao qual ele foi membro - entendiam por ação direta no movimento sindical dos trabalhadores: “A ação direta é simbolização do sindicalismo atuante”9. Ao que tudo indica Pouget é reconhecido como o “fundador” do princípio da ação direta por parte da historiografia que discorre sobre o tema do anarquismo, do sindicalismo revolucionário e movimento operário10. A significância do pensamento libertário francês dentro

7 Ver: LINDEN, Marcel van der. Trabalhadores do mundo: Ensaios para uma história global do trabalho. Tradução Patrícia de Queiroz Carvalho Zimbres. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2003.

8 L’action Directe de Pouget. A bibliografia indica que o ano de lançamento desse texto foi em 1906. <>

9 Idem. “L’action Directe est la symbolisation du syndicalisme agissant”.

10 Em nota de rodapé Edilene Toledo (p. 66, 2004) sinaliza para o fato de Pouget “inventou termo ação direta”. Ver também ALVES, Paulo. Anarquismo e anarcosindicalismo: Teoria e prática no movimento operário brasileiro (1906-1922). Curitiba: Aos Quatro Ventos, 2002.

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do anarquismo e sindicalismo revolucionário francês (e internacional) pode ser sentida ao passo que suas obras eram recomentadas e vendidas aos operários a partir dos jornais libertários no Brasil11. Ao lado de Pouget, Fernand Pelloutier que também tem diferentes textos publicados em jornais ou livros que dizem respeito à forma de ação e organização dos trabalhadores12.

A prática do boicote e da sabotagem foram outras formas de ação direta que fez parte do repertório de ação dos trabalhadores em âmbito internacional, mas que também ocupou espaço nas reflexões de Pouget. A boicotagem dentro das práticas da ação direta por Pouget era uma forma de luta existente entre os trabalhadores ingleses a qual o anarquista francês e outros anarquistas dentro do movimento sindical revolucionário trouxeram para dentro do conjunto de práticas combativas da ação direta entre 1896 e 1897.

Le congrès confédéral CGT de Toulouse, du 20 au 25 septembre 1897, donna l’occasion à Émile Pouget de faire une entrée remarquée dans le mouvement syndical. Depuis le début de 1896, Le Père Peinard défendait deux idées ramenées d’Angleterre : le boycottage et le « go canny » que Pouget traduisait par « sabottage » [sic]. Émile Pouget fut délégué au congrès par le syndicat des cordonniers cousu main de Paris, la fédération des syndicats de Vienne et la bourse du travail d’Amiens.

Les anarchistes présents au congrès, Pierre Narcisse, Rémy Thierrart, Bernadac, et Émile Pouget s’inscrivirent en bloc dans la commission qui devait plancher

11 A Terra Livre, ano III, num. 60, 1908, p. 4, apresenta o livro Bases do Sindicalismo de Pouget; A Voz do Trabalhador, ano I, num. 2, ago/1912, p. 4, de Porto Alegre trouxe em sua edição a recomendação deste mesmo livro. A Plebe, ano III, num. 2, set./1919, p. 4, trouxe uma tradução feita por Adelino Pinho de Como faremos a revolução, escrito por Emilio Pataud e Pouget, nessa edição do periódico encontra-se, provavelmente, a segunda parte da tradução. Era algo comum nesse período os periódicos publicarem texto continuação em outras edições. Isso pode ter corrido devido a questões de diagramação e o conteúdo da edição ou também para estimular a compra da próxima edição do periódico.

12 Entre tantos escritos os conhecido parece ser o Histoire des Bourses du Travail: origine, institutions, avenir, publicado na década de 1920, após seu falecimento. Muitos de seus escritos foram publicado no periódico francês L’Ouvrier de deux mondes, entre 1897 e 1898. Ver em << http://gallica.bnf.fr/services/engine/search/sru?operation=searchRetrieve&version=1.2&startRecord=0&maximumRe cords=15&page=1&query=%28gallica%20all%20%22Pelloutier%2C%20Fernand%22%29: acessado em 30 de outubro de 2016 às 14:00. >>

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sur le boycottage et le sabotage, composant la moitié de ses membres. Le commission accoucha d’un rapport – rédigé, probablement à l’avance, par Pouget – qui fut approuvé à l’unanimité par le congrès. Le mot « sabotage », dans cette acception, entra au Larousse quelques années plus tard.13

Em 1897, Pouget escreveu o texto intitulado A Sabotagem onde ele expressa a relação histórica do termo com a prática e sua origem teórica inglesa, notemos isto por meio de suas palavras: “na sua atual formulação teórica, é uma importação inglesa”14, ele a define como “fórmula de combate social que recebeu batismo sindical no Congresso da Confederação de Toulouse, em 1897”15. Os escritos de Pouget sobre as práticas ação direta começaram a ser publicados no pequeno folheto Le Père Peinard que teve sua primeira edição lançada em 24 de fevereiro de 1889, desse folheto era uma “publicação defensora da propaganda pelo ato”16.

Todas essas reflexões chegaram ao Brasil ainda no final do século XIX, mas foi no século XX vemos elas tomarem mais forma.

Ação direta em São Paulo: greves, boicotes, sabotagem e bombas

A prática da greve – outras mobilizações - no Brasil pode ser percebida antes da entrada da Primeira República no século XX17. Contudo, um dos marcos da mobilização e organização operária no Brasil pode ser sentida a partir de 1906, quando no Distrito Federal, do dia 15 ao 20 de abril, foi realizado o Primeiro Congresso Operário Brasileiro. Desse momento em diante o

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14 << Disponível em http://www.cntgaliza.org/files/emile%20pouget%20a%20sabotagem%20web.pdf: acesso em 30 de outubro de 18:00.>>

15 Ibdem.

16 Ibdem.

17 MATTOS, Marcelo Badaró. Experiências comuns: escravizados e livres no processo de formação da classe trabalhadora no Brasil, in Anais do XXIV Simpósio Nacional de História, 2007, São Leopoldo.

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sindicalismo revolucionário de ação direta foi declarado com prioridade no processo de mobilização do movimento operário brasileiro, e brevemente se tratou da greve geral.

Com características semelhantes ao contexto internacional, a condição de vida para o trabalhador no período da Primeira República tanto urbano quanto do campo não se apresentava nada fácil (MARAM, 1979). Os resquícios do trabalho escravo ainda era presente na maneira como os patrões estabeleciam as relações de trabalho. A indústria lentamente vinha sendo desenvolvida modificando o ambiente urbano e trazendo consigo os primeiros trabalhadores urbanos. Falta de estrutura para estes – e outros – trabalhadores não permitiu que eles encontrassem em quem se apoiar para fazer suas reivindicações. As leis trabalhistas eram inexistentes e as cidades ainda não estavam organizadas para receber o novo grupo social que aparecia.

Como forma de conquistar o que lhes faltava, restou a classe trabalhadora no Brasil republicano se auto organizar e mobilizar-se. Dentro disso, começou a emergir de modo oscilante uma série de greves, no começo do século XX, por parte do trabalhadores.

Na primeira década do século XX, foram, por todo o país, deflagradas 111movimentos de grevistas, na sua maioria por questões salarias. Durante a conjuntura dos anos de 1917 a 1920, somente no eixo Rio de Janeiro/São Paulo, outras, mais de duzentas, podem ser acrescidas ao número de verificado até 1910. (SAMIS, 2004, pp. 151-164)

Podemos notar que a ação direta no Brasil teve forte presença ao longo dos primeiros vinte anos do século XX, as cidades São Paulo e Rio de Janeiro por questões especificas foram as principais regiões a evidenciar essas práticas. Podemos destacar que os anos antes a Primeira Guerra e anos pós foram os momentos de maior mobilização dos trabalhadores. A maioria da greves articulas requeriam conquistas imediatas, e não foram espontâneas como parte de uma historiografia busca concluir. “Os primeiros anos do século XX reuniram algumas condições favoráveis à eclosão de movimentos reivindicativos... (como) a proliferação de organizações operarias voltadas para a resistência, isto é, a luta sindical” (BATALHA, 2000, p.39), assim não podemos considerar o caráter espontâneo das mobilizações por completo.

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Cabe ressaltar que as práticas de ação direta não foram aceitas de forma sem criar conflitos em seu entendido, tanto entre os grupos no Brasil quanto fora, algo que impactava na perspectiva de caráter espontâneo do movimento. Vejamos duas diferentes posições ilustrada por Giuseppina Sferra:

Mas a ação direta, para os anarquistas, será atingida pela espontaneidade dos indivíduos, concentrando sua atuação na propaganda educativa do ideal anarquista, na evidenciação do antagonismo de classes para conscientizar os trabalhadores, na tentativa de que estes espontaneamente, cheguem à ação revolucionária e reorganizem a sociedade comunista-anárquica. Já para os anarcossindicalistas, a ação direta se concretiza fundamentalmente na organização de classe. (SFERRA, 1987, p. 68)

A sabotagem e o boicote também estiveram presentes no Brasil da Primeira República, essas práticas de luta do trabalhador eram outras formas que eles tinham para continuar a pressionar os empregadores que visam sempre seus lucros e pouco a atenção da para as condições materiais de seus empregados. O boicote era o “não-consumo de determinada mercadoria geralmente, quando a empresa responsável por tal produto encontrava-se em litígio com os seus operários” (FERREIRA, p. 106, 1978). Isso demonstra que o operariado tinha força de combate dentro e fora das fábricas que poderia se tornar maior com a adesão das famílias a determinadas práticas contra os industriários. Pode-se perceber que a prática da boicotagem dentro do movimento dos trabalhadores em São Paulo não era estabelecido sem uma organização prévia e convocava as todos os trabalhadores e não somente os trabalhadores ligados diretamente no conflito com a indústria que deveria ter seus produtos boicotados18.

Mas a prática que mais parece ter causado divergência entre os militantes e operários foi a ação direta a partir dos atentos à bombas. Visto que

18 “Como resulta da publicação da ata da reunião geral dos Conselhos dos Sindicatos, que publicamos em outra secção do jornal, ficou contituido em S. Paulo um Comité com o escluzivo encargo de cuidar da iniciativa da ‘Boicote à Caza Matarazzo’. [...]. Este comité lembra a todas as sociedades de S. Paulo e do interior a necessidade de se mandar imprimir em todos os manifestos e publicações sociais uma nota em que se faça um apelo aos operários, para que boicotem os produtos da ‘Caza Matarazzo’.” (Lucta Proletaria, edição de número 13, 1908).

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A ação anarquista, no que se refere às atitudes adotadas pelos operários para consecução de objetivos imediatos, obedeceu a distintas táticas em função dos diversos entendimentos que tiveram os grupos operários, relativos às resoluções congressuais. A ação direta, apontada em todos os três Congressos como método fundamental para a obtenção das transformações sociais desejadas, não encontrou entre os trabalhadores anarquistas uma única interpretação. Assim, como o boicote e a sabotagem, outras formas de ação direta foram adotadas, no interior do movimento sindical revolucionário, a partir de uma interpretação mais radical. (SAMIS, 2004, pp. 147-148)

As duas maiores repercussão no Brasil com práticas de ação direta ligada a utilização de bombas ocorreu em 1918, na cidade do Rio de Janeiro e em 1919, na cidade de São Paulo (BANDEIRA, 1980). Ambas atividades acabaram de maneira frustrada. Em 1918, a ação que se estava tentando orquestra foi desbaratada pelo polícia, que tinha um espião dentro do grupo insurrecional. Na cidade de São Paulo, em 1919, a ação nem chegou ser posta em prática pois um incidente liquidou a tentativa de levante o operário. Há outros casos no Brasil que envolve uso de bombas por parte dos militantes e operários em 1894, 1908, 1909 e 1915 (SAMIS, 2004, pp. 148- 149).

Os dois eventos acima, apesar de não terem alcançado o êxito desejado, são emblemáticos para compreendermos a dimensão de desejo revolucionário, pelo menos a partir do eixo Rio de Janeiro/São Paulo, e como a ação direta estava vinculada a esse desejo. Creio que essa tentativas são frutos das mobilizações ocorridas desde o início do século XX, e em principal, da forte mobilização iniciada entre 1916 e 1917. No ano de 1917, as greves germinaram de modo impressionante em São Paulo como também no Distrito Federal e outros estados. Houve também um outro momento de impulso na constituição de associações de resistência que davam mais organização ao movimento. Assim, o movimento atingia uma maturidade e experiência que dava brechas para que voos maiores fossem alçados por uma ala mais radical do movimento. Junto a isso temos a presença da Revolução Russa no cenário mundial que pode ter dado mais combustível para essas ações de 1918 e 1919, apesar da maneira confusão que as notícias sobre a Revolução chegavam aos militantes e operário no Brasil. Esses curtos episódios não demonstram um desejo total de todo o movimento operário em subverter a ordem, contudo, para caminhos

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para a reflexão de como é possível notar tênues práticas insurrecionais quando o país vivia os conflitos sociais da Primeira República. O ponto fulcral desse ponto é observar que essas ações foram decididas de forma autônoma, como requer o princípio da ação direta, entre militantes e operários.

Conclusão

A partir do pretendido com esse texto, tentou-se esboçar o momento histórico concreto de quando surge a ação direta. Com isso, foi possível observar que as práticas da ação direta quando teorizadas refletiu sobre práticas já existentes nas lutas de trabalhadores, porém o diferencial foi o fato de que com as teorização práticas como a greve não diziam respeito somente a questões econômicas, algo que fez ampliar o campo de atuação do operariado para uma perspectiva política de negação da via reformista e eleitoral. Também pontou-se que o papel dos intelectuais, militantes e trabalhadores francês nesse momento foi fundamental; por outro lado pode-se captar que todo esse processo de uma forma ou de outra foi um trabalho em conjunto a nível internacional.

No Brasil, foi possível ver que a ação direta fez parte do cotidiano de luta operária no país. Greves, boicotes, sabotagem e atentados com bombas fizeram parte da realidade da mobilização e organização da classe trabalhadora aliada aos libertários e sindicalistas revolucionários. Porém, a perspectiva revolucionária a partir dessas práticas foi sobreposta pelas reivindicações de caráter imediato, entretanto, não se pode considerar que em momento algum houve uma perspectiva para chegar a derrubada do governo. Os debates entres os militantes em relação a isso não facilmente identificáveis, mas por meio de algumas ações poderemos atingir conclusões mais consistentes em relação a esse assunto.

Referências Bibliográficas

BANDEIRA, Moniz. O ano vermelho: A Revolução Russa e seus reflexos no Brasil. 2° Edição. São Paulo: Brasiliense, 1980.

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