Maria Izilda Santos de Matos

MARIA PRESTES MAIA: TRAJETÓRIA DE VIDA E LUTAS

Maria Izilda Santos de Matos Pontífica Universidade Católica de São Paulo

resumo A cidade de São Paulo/SP/Brasil tem seu traçado urbano marcado pelo denominado “Plano Avenidas”, que foi idealizado e implemen- tado pelo urbanista e prefeito Francisco Prestes Maia. Na ampla bi- bliografia sobre suas ações são raras as referências a sua esposa, a portuguesa, Maria de Lourdes Costa Cabral Prestes Maia. Esta inves- tigação objetiva dar visibilidade a Maria Prestes Maia, rastreando a trajetória biográfica desta mulher, destacando suas atividades polí- ticas, a atuação na Federação das Mulheres do Brasil, também suas experiências como atriz e professora de teatro, bem como as ações no setor cultural e na assistência social. Palavras-chave: Maria Prestes Maia. Assistencialismo. Feminismo. Federação das Mulheres do Brasil. Política.

abstract MARIA PRESTES MAIA: LIFE TRAJECTORY AND STRUGGLES The plan of the city of São Paulo/SP/Brazil is marked by the so called “Plano Avenidas”, which was conceived and implemented by the ur- banist and Mayor Francisco Prestes Maia. In the extensive literature about his actions one can barely find references to his wife, the Por- tuguese Maria de Lourdes Costa Cabral Prestes Maia. This paper aims at tracing the life trajectory of Maria Prestes Maia, a Portuguese immi- grant in São Paulo who related her artistic and intellectual activities with local and more global political struggles. Maria’s performance in the Brazilian Women Federation, her work experiences as an ac- tress, drama teacher, and relevant actions in the Brazilian cultural and social care sectors, are objective sources of analysis illustrating the importance of this Portuguese artist in Brazilian social history. Keywords: Maria Prestes Maia. Struggles. Feminism. Brazilian Feder- ation of Women. Politics..

resumen MARIA PRESTES MAIA: TRAJETORIA DE VIDA Y LUTAS La ciudad de São Paulo/ SP/ Brasil tiene su trazado urbano marcado por el denominado “Plano Avenidas”, que fue idealizado e implemen- tado por el urbanista y alcalde Francisco Prestes Maia. En la extensa bibliografía sobre sus acciones son raras las referencias a su esposa, la portugueas, María de Lourdes Costa Cabral Prestes Maia. Esta in-

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vestigación objetiva dar visibilidad a María Prestes Maia, rastreando la trayectoria biográfica de esta mujer, destacando sus actividades políticas, la actuación en la Federación de las Mujeres de Brasil, tam- bién sus experiencias como actriz y profesora de teatro, así como las acciones en el sector cultural y en la cultura asistencia social. Palabras clave: Maria Prestes Maia. Asistencialismo. El feminismo. Federación de las Mujeres de Brasil. Política.

Estes escritos investigam a trajetória de vida da observem os fluxos além das condições excep- imigrante portuguesa Maria Prestes Maia, des- cionais de pobreza, fruto das pressões do cres- tacando suas atividades políticas, assistencia- cimento da população (modelo malthusiano) listas, culturais e a atuação na Federação das ou de mecanismos impessoais do push-pull Mulheres do Brasil. Entre outras fontes, a pes- dos mercados internacionais (CORTI, 2007). Es- quisa baseia-se em documentos localizados tes processos superaram os limites das neces- nos acervos do DEOPS (Departamento Estadual sidades estritamente econômicas, agregando de Ordem Política e Social), depositados no questões políticas (refugiados, perseguidos e APESP (Arquivo Público do Estado de São Paulo) expulsos), étnico-raciais, culturais, religiosas, e em vários depoimentos. geracionais e de gênero. Os deslocamentos aparecem como alterna- Deslocamentos: questões e tivas adotadas por uma gama abrangente de inquietações sujeitos históricos, alguns inseridos em fluxo de massa, grupos e familiares, outros em per- Processos migratórios recentes vislumbram o cursos individuais; envolvendo processos de estabelecimento de novas ordens demográfi- migração engajada, mas, também, voluntária; cas, não se podendo prever todo o seu desen- abarcando diversos extratos sociais, levas e ge- cadeamento e amplitude, mas se constituindo rações; incluindo agentes inspirados por estra- em outros pontos de partida e polos de atração. tégias e motivações diferenciadas, até mesmo As facilidades e agilidades das viagens, so- culturais e existenciais. Entre essas múltiplas madas às múltiplas possibilidades de comuni- motivações que levaram à migração, merecem cação dinamizam os deslocamentos, tornando ressalvas a procura da realização de sonhos, -os um “acontecimento” perceptível na socie- da abertura de novas perspectivas, das fugas dade atual, mas provocador de tensões, hos- das pressões cotidianas, da busca do “fazer a tilidades, rejeições, conflitos e xenofobia, nas América”, envolta em variadas representações sociedades receptoras. Estas tensões levam ao construídas e vitalizadas neste universo. reconhecimento da importância da temática Foram vários os mecanismos que viabili- da migração, ampliando-se os estudos com di- zaram este processo, como: a constituição de ferenciadas perspectivas de análise, iluminan- redes, que incluíam a difusão de informação, do interpretações, enriquecendo abordagens chamadas, acolhimento, estabelecimento de e contribuindo para rever estereótipos. relações interpessoais, institucionais, agen- Cabe ressaltar que os deslocamentos care- ciadores, aliciadores, sistema de propaganda, cem de análises que suplantem os condicio- meios de comunicação e a organização do sis- namentos demográfico-econômico-sociais e o tema de navegação comercial, que viabilizou o paradigma mecanicista da miserabilidade, que transporte transoceânico em massa.

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A América, em particular o Brasil, que foi Ao desafio de lidar com esta diversidade de polo de atração de imigrantes, chega ao novo fontes, soma-se o exercício de cruzar, exami- milênio em uma outra posição. Como tudo que nar e interpretar contínua e exaustivamente os desempenha a função de revelação dos con- documentos. Descortinar o passado requer a flitos e crises por que passam certas áreas, paciente busca de indícios, sinais e sintomas, a as migrações internacionais contemporâneas leitura detalhada para esmiuçar o implícito e o criam oportunidades de reavivar as questões oculto, estabelecendo uma relação dialógica, em torno do tema e recuperar suas trajetórias na expectativa de resgatar as múltiplas expe- históricas. riências dos imigrantes portugueses. Para esta Nesse sentido, estes escritos pretendem investigação, foi privilegiada uma documen- trazer uma contribuição para o estudo da tação variada, com destaque para os dossiês presença portuguesa na cidade de São Pau- do DEOPS (Departamento Estadual de Ordem lo. Falar da imigração portuguesa constitui “o Política e Social), os arquivos de registros de resultado histórico de um encontro entre o entrevistas de imigrantes do Memorial da Imi- sonho individual e uma atitude coletiva” (PE- gração/SP e a imprensa paulista do período. REIRA, 1981, p. 9). Estes dizeres sintetizam a importância das histórias de vida para enten- Cenário: São Paulo a sociedade der o conjunto das experiências individuais de acolhimento e das transformações sociais, bem como a transmissão destas ações para novas gera- No começo do século XX, São Paulo assumiu ções através das tradições, questões observa- seu destino de metrópole, sob o influxo do das por possibilidades abertas pela história crescimento industrial, comercial e financeiro. De acordo com o censo de 1920, o número de cultural. Entre as múltiplas e emergentes indaga- habitantes atingiu a cifra de 579.033 pessoas, já ções que envolvem os deslocamentos, em par- entre 1920 e 1940, a população novamente du- ticular os dos portugueses, mereceria desta- plicou, saltando para 1.326.261 moradores. Em que o estabelecimento de circuitos culturais, 1934, totalizavam 287.690 estrangeiros (destes incluindo a circularidade de artistas de teatro, 79.465 portugueses), constituindo na cidade um músicos, pintores, escultores, expoentes das mosaico diversificado de grupos étnicos (Censo artes plásticas, artesãos e artífices, gráficos, Estadual de 1934). caricaturistas, entre outros, que estiveram ou Apesar das dificuldades enfrentadas nos fi- se fixaram no Brasil, trazendo e deixando suas nais da década de 1920 e início dos anos 1930 influências no setor das artes. (crise mundial de 1929 e a queda dos preços do Para poder enfrentar tal desafio, torna-se café, Revolução de 1930, perda da hegemonia necessário ampliar os focos das pesquisas, política da elite paulista e Movimento Consti- subtendendo buscar vestígios de outros tem- tucionalista de 1932), a indústria continuou se pos. Neste sentido, valorizou-se toda uma di- desenvolvendo, atingindo altos índices, no pe- versidade de fontes e referências, tendo como ríodo subsequente (1932-39). Assim, nas déca- dificuldade mais a fragmentação do que a au- das de 1930, 1940 e 1950, a cidade consolidou sência da documentação, já que as fontes de a expansão da industrialização, bem como o pesquisa não se resumem ao que está guar- crescimento dos setores comerciais e de ser- dado ou arquivado, mas também ao que está viços. As inversões no setor imobiliário ganha- silenciado, esquecido e ocultado. ram impulso, possibilitando novas edificações,

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tornando São Paulo “a cidade de um edifício maiores votações já recebidas por um candi- por hora” (MORSE, 1970, p. 365), com a redefi- dato, São Paulo contava com 3.259.087 habi- nição de territórios, como novas áreas comer- tantes, marcados por profundas desigualda- ciais, financeiras e de moradia. des sociais, vivendo e convivendo, nacionais e Os planos de intervenção urbana, orques- imigrantes, migrantes, sobretudo nordestinos trados na gestão de Prestes Maia (1938-45), re- envoltos em múltiplas tensões urbanas, expe- modelaram a cidade.1 Nos dois primeiros anos riências fragmentadas e diversificadas. da sua gestão, centrou suas ações na finaliza- ção das obras já iniciadas pelo seu predecessor Um caso de amor à primeira vista – Fábio Prado. Seguiu-se um “bota abaixo” até Enquanto professor da Escola Politécnica, então inusitado: abrindo avenidas, alargando Prestes Maia apresentou um projeto de refor- ruas, refazendo ligações viárias. Apesar de já ma urbana para São Paulo. Pela primeira vez, a terem aparecido outras propostas, foram prio- cidade era pensada no todo, em uma concep- rizadas as soluções já organizadas pelo Plano ção de intervenção e de organização espacial, Avenidas, que estabelecia as características da que sintetizava diversas influências, buscando expansão da cidade, assentadas nos princí- adaptar a estrutura urbana já existente de con- pios de centralização, expansionismo, vertica- formação radiocêntrica, gerando um plano ge- lização e rodoviarismo. Foram construídos par- ral baseado em avenidas radiais e perimetrais. ques, jardins e praças, o Vale do Anhangabaú Tratava-se de uma proposta inovadora e foi foi remodelado, além de se dar início a obras denominada “Estudos de um Plano de Aveni- que se completariam nas décadas seguintes das para a Cidade de São Paulo”, ficando mais (Avenida Itororó, hoje 23 de maio, Radial Leste, conhecido, como “Plano de Avenidas”. Em Avenida Rio Branco, prolongamento da Aveni- 1930, por estes estudos, Prestes Maia recebeu da Pacaembu). o Prêmio de Honra, Medalha de Ouro e o Gran- Nos anos de 1950, particularmente durante de Diploma do 4º Congresso Pan-Americano o governo Juscelino Kubitschek (1955-60), a ci- de Arquitetos, no . dade conviveu com a aceleração ainda maior da A premiação exigia muitas celebrações. A industrialização, com a penetração do capital Capital Federal era marcada por uma estimu- estrangeiro, com a modernização da produção, lante vida noturna, com vários restaurantes, que possibilitou a ampliação de certos bens de cabarés e teatros, os quais contavam com a consumo (em particular os automóveis), que presença de grupos de artistas nacionais e eu- tornavam a sociedade mais veloz, também mais ropeus. O programa escolhido pelo engenhei- conectada pelo rádio, mais visual, com a pene- ro e amigos incluía uma comédia de costume tração lenta da TV e marcada por um número (Chico das Pegas), encenada por uma compa- crescente de cinemas e teatros. nhia portuguesa. Nesta ocasião o engenheiro, Em 1961, quando Prestes Maia assumiu já com 34 anos e solteiro cobiçado, se encan- novamente o cargo de prefeito, em uma das tou pela intérprete e cantora soprano-lírica, a

1 Francisco Prestes Maia (1896-1965) engenheiro, urba- portuguesa Maria de Lourdes. nista e professor da Escola Politécnica de São Paulo, A atração inicial, pela beleza e desenvol- elaborou planos de urbanismo para Campos do Jor- dão, Santos, e Recife. Ocupou o cargo de di- tura da atriz, completou-se com a descoberta retor de Obras Públicas de São Paulo e, entre 1938-45, de muitos pontos e gostos em comum, a admi- foi prefeito da cidade, nomeado pelo interventor fe- deral no governo paulista – Ademar de Barros. Voltou ração pela literatura francesa, inglesa, alemã, a assumir o cargo no período de 1961-1965. russa, portuguesa, os longos debates sobre as

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lo Matarazzo e Assis Chateaubriand. As novi- Cativante e eloquente, Maria Portuguesa, dades atingiram as artes plásticas (Museu de como era chamada, foi professora de dicção, Arte de São Paulo MASP – 1947, Bienal de Artes oratória, presença cênica, postura e represen- de São Paulo – 1951, Museu de Arte Moderna tação, no Teatro Municipal e no Instituto Bra- MAM – 1948), mas especialmente os palcos. sil-Rússia.5 Muitos atores de realce foram seus alunos, como Sérgio Cardoso, Madalena Nicol Na capital Paulista implantou-se um sistema cultural denso e diversificado, que irá se ex- e Paulo Autran, este estreou em cena com a pressar ao mesmo tempo no teatro e na vida peça A esquina perigosa (Dangerous corner), intelectual, por causa de alterações na estrutu- de J. B. Priestley, traduzida por ela e equipe. ra social, decorrente do processo de metropoli- Ela frequentava e influía no meio teatral; zação por que passava a cidade, e em razão da tinha amigos como Ziembinsky, Sérgio Cardo- guerra mundial que gerou a vinda de professo- res e atores estrangeiros.4 (HAAG, 2010, p. 87) so, Nydia Lícia, Bibi e Procópio Ferreira, Paulo Autran, Tônia Carrero, Madalena Nicol, Cacilda A cidade tornou-se centro de experimen- Becker, Adolfo Celi, Henriette Morineau, Gianni tação no âmbito das artes cênicas, no cinema Ratto, Paulo Gouveia e Tatiana Belinky, entre (Companhia Vera Cruz – 1949) e notadamente outros. Apoiou movimentos teatrais emergen- no teatro, com a profissionalização deste cam- tes na cidade, como o Teatro Oficina, inaugu- po, através da criação da Escola de Arte Dra- rado em agosto de 1961, com a encenação de A mática – EAD (por Alfredo Mesquita –1948). vida impressa em dólar. Formou-se uma geração de novos interpre- Acho que Zé Celso e eu, embora ainda muito in- tes e vários experimentos na área; São Paulo gênuos naquele tempo, já intuíamos que seria tornou-se um polo modernizador do teatro, bom ter uma madrinha poderosa que nos aju- ofuscando a cena carioca. O Teatro Brasileiro dasse a resolver entraves burocráticos e exigên- de Comédia TBC (1948, de Franco Zampari) pro- cias.... Quem melhor para nos amadrinhar do punha-se a produzir um teatro requintado, na que a esposa do próprio Prefeito Prestes Maia? Convidamos Dona Maria Prestes Maia para cor- sua forma (textos, cenários, figurinos, ilumina- tar a fita de inauguração no dia da estréia. Ela ção), para tanto, incorporou cenógrafos, dire- aceitou. Dona Maria era uma ex-atriz portugue- tores, iluminadores europeus recém-chegados sa, muito despachada, falante [...]. No dia da à cidade (PASCHOAL, 1998, p. 28). estréia depois de pronunciar algumas palavras Para além do TBC, surgiu o Teatro de Arena portuguesas, cortou a fita verde e amarela de- (1955), que agregava uma equipe que buscava baixo de uma salva de palmas. (Depoimento de Renato Borghi) uma linguagem teatral que fosse mais aces- sível ao público, se caracterizando como “de A nossa madrinha foi Maria Prestes Maia, mu- vanguarda, nacionalista e popular”. Posterior- lher do prefeito Prestes Maia. Era uma tentati- va de burlar a censura que implicara com a pre- mente, constituíram-se diversos grupos, al- sença na peça de palavrões, cenas amorosas, guns originários do TBC, como as Companhias Tônia-Celi-Autran e Nydia Lícia-Sérgio Cardoso, 5 neste período, difundiram-se na cidade grupos de teatro amador e estudantil, com destaque para o Gru- outros artistas também fundaram suas compa- po de Teatro Universitário, Grupo de Artistas Amado- nhias: Fernanda Montenegro, Cacilda Becker e res, English Players (da Sociedade Cultural Inglesa), Sociedade de Artistas Amadores, Grupo de Amadores Maria Della Costa. da Faculdade de Ciências Econômicas. Em 1947, os atores amadores Paulo Autran e Madalena Nicol, indi- 4 A chegada de diretores estrangeiros, como Louis Jou- cados por Tatiana Belink, procuraram o curso de tea- vet, Adolfo Celi, Henriette Morineau, Ziembinsky, Gian- tro no Instituto Cultural Brasil-Rússia, oportunidade ni Ratto, contribuiu para a profissionalização do setor. em que foram alunos de Maria Prestes Maia. (MATTOS, (HAAG, 2010, n. 174, p. 87) 2002)

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passagens consideradas de pregação marxista líticos de diversos partidos, particularmente [...]. (Depoimento de Etty Fraser) durante as campanhas políticas do engenhei- Maria de Lourdes aceitou o convite, mas ro. Agregava autoridades como o presidente não deixou de interferir, fez questão de acom- Juscelino Kubitschek e sua esposa Sara, até panhar os ensaios, e, como a professora de notoriedades internacionais como o presiden- teatro, apontou dificuldades, tais como: o so- te do Egito, Abdel Gamal Nasser (CAVALCANTI; taque carregado e as inflexões duras, a falta de DELION, 2004). postura cênica, particularmente, as dificulda- Foto 02 - Maria de Lourdes e a filha Adriana des com as mãos “ou fumam o tempo inteiro ou enfiam as mãos nos bolsos para esconder a sua falta de repertório”, além da ausência de estilo e elegância das atrizes. A análise fazia parte da sua prática, pois escrevia críticas de teatro, música e artes plásticas, em uma coluna denominada “Le Fígaro”, usando pseudônimo. Articuladora cultural tornou-se amiga de Tito Schipa e Arturo Rubinstein, quando estes se apresentaram em São Paulo. Esteve pre- sente em praticamente todos os movimentos culturais da urbe, amiga de Ciccilo Matarazzo e Fonte: FREITAS, 2006, p. 143. Assis Chateaubriand, apoiou-os em várias ini- ciativas (MASP, MAM, Bienal). No salão, conviviam jornalistas de realce, como Júlio de Mesquita Filho, de O Estado de S. Salão da D. Maria Paulo, Galeão Coutinho, escritor e redator che- O domicílio do casal Prestes Maia estava sem- fe de A Gazeta, Alzira Godói, Francisco Martins, pre repleto de amigos e convidados, tornando Helena Silveira e Cristina Motta. famoso o salão de sua residência. D. Maria era Particularmente, contava com a presença considerada excelente anfitriã e capitaneava as de uma variedade de personagens do cam- atividades, que consistiam em encontros políti- po político, como os governadores Jânio da cos e de negócios, com conversas intermináveis, Silva Quadros e Carvalho Pinto, e o ministro em um ambiente alegre e descontraído, que San Tiago Dantas. Havia também represen- envolvia várias atividades: música, poesia, dis- tantes do legislativo, senador Frota Moreira, cussões artísticas e políticas. As reuniões eram os deputados Dagoberto Salles, Herbert Levy, muito concorridas, verdadeiros saraus, indo até Cunha Bueno, Jamil Haddad, Rogê Ferreira, altas horas da madrugada, sempre ao redor de Wilson Rahal, Israel Dias Novaes e a deputa- uma mesa farta, com bons vinhos e licores, ao da Ivete Vargas. Advogados e delegados como término da refeição. João Amoroso Neto e Guilherme Pires de Al- A casa tornou-se um centro em torno do buquerque. Havia a representação de vários qual gravitavam amigos, personalidades da partidos políticos, alguns que deram apoio vida cultural, artística, empresarial e política, político ao engenheiro em momentos variados com a presença de jornalistas, escritores, ar- de sua trajetória, como: União Democrática tistas, médicos e cientistas, empresários e po- Nacional (UDN), Partido Trabalhista Brasileiro

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(PTB), Partido Democrata Cristão (PDC), Parti- cardo Picchia e Victor Brecheret, que fez várias do de Representação Popular (PRP), Partido obras para a cidade durante a gestão de Pres- Social Democrático (PSD), Partido Republicano tes Maia. Não faltava também a turma do tea- (PR), e outros, pelos quais D. Maria tinha uma tro, para a qual D. Maria dedicava um carinho e simpatia particular, como o Partido Socialista atenção especial. Brasileiro (PSB) e Partido Comunista Brasileiro Maria de Lourdes era excelente dona de (PCB). casa, perfeccionista e muito exigente. Dedica- Luiz Carlos Prestes, o Cavaleiro da Esperan- da ao marido, cuidava sempre da sua aparên- ça, era amigo de Maria de Lourdes, por várias cia e com capricho da casa. Adorava cozinhar vezes esteve hospedado em sua casa, mesmo e era reconhecida por seus méritos, dominava nos períodos de clandestinidade (Depoimento todas as etiquetas à mesa e os segredos das de Adriana Prestes Maia Fernandes). boas receitas (que guardava os segredos a Sua casa foi palco de amplas articulações sete chaves, escrevia suas receitas em vários políticas, não só eleitorais, o movimento co- idiomas para que não fossem apreendidas), nhecido como “Frente Parlamentar Nacionalis- particularmente as de tradição portuguesa. ta”, com plataforma anti-imperialista, germi- Ela fazia uma açorda, prato português, que nou no seu salão. era uma delícia. Pratos de bacalhau, suflês, A bandeira da luta interna era a luta antiim- carnes, coelhos, patos, pernis e doces portu- perialista, a luta pela reforma agrária e a luta gueses, arroz-doce cremoso, bolos. Ela tinha o pela industrialização. São as três bandeiras na- dom para fazer pratos, tanto salgados quanto cionalistas e que eram também do partidão na doces, todos com perfeição. O arroz-doce era época. É por isso que o movimento nacionalista cremoso, feito com vários litros de leite, várias foi um movimento nacionalista brasileiro de es- gemas, cravos, canela, era cremoso, com ras- querda, não ideológico, não era marxista. Então pas de limão e era devorado em questão de não era um movimento xenófobo, nem era um minutos pelos convidados. Era a sobremesa movimento de cunho marxista. Agora, os da li- favorita do dia de reis, e outras festas. Nesse nha comunista militavam no movimento em ra- dia chamava os amigos, servia uma saborosa zão de seu caráter antiimperialista. (Depoimen- bacalhoada, com vinhos portugueses, e o cé- to de Adriana Prestes Maia Fernandes) lebre arroz-doce. Ela era uma pessoa muito festeira, adorava ter O salão era frequentado, também, por per- a casa repleta de amigos, comendo e bebendo sonalidades do mundo cientifico, como o Dr. bons vinhos e licores, ao término da refeição. José Rosemberg, famoso tisiologista e com Trata-se de um costume bem lusitano, que her- quem D. Maria abraçou a luta antituberculose, dei e procuro passar aos meus filhos. Outro cos- e o físico Mário Schenberg. tume dela era o cálice de vinho do Porto, sem- pre servido às visitas. (Depoimento de Adriana Além do mais, ali conviviam artistas, lite- Prestes Maia Fernandes) ratos e intelectuais, poetas e escritores, como Guilherme de Almeida, Menotti Del Picchia, Ian Maria de Lourdes era determinada e sedu- de Almeida Prado, Antônio Soares Amora, Au- tora, tinha muitas habilidades no trato com as gusto de Souza, Fidelino Figueiredo; as pianis- pessoas, e não media esforços para conseguir tas Antonieta Rudge e Helena Rudge, os maes- seus desígnios. Ela gostava da política e aju- tros Edoardo Guarniere e Armando Bellardi; dou ativamente o marido nas campanhas, pois artistas plásticos como os pintores Waldemar ele era mais introvertido e contava com a ação da Costa, Rebolo, Di Cavalcanti e Germana de envolvente da esposa, com sua eloquência, Angelis, os escultores Galileu Ememdábile, Ri- convencimento e articulações partidárias.

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“A primeira operária” de São Além das ações contínuas nas associações Paulo filantrópicas, com apoio à maternidade e à in- fância carente, à velhice e aos doentes (parti- Maria Prestes Maia não gostava de ser cha- cularmente nas campanhas de combate à tu- mada de primeira dama, nomeando-se “pri- berculose), ela realizou: meira operária” de São Paulo. Preocupada e Natais memoráveis para as crianças das cre- vinculada às questões sociais e assistenciais, ches, parques e escolas municipais. Na ocasião sua atuação nestas áreas não se limitou aos convocava as amigas e a família para ajudar. O períodos de gestão de Prestes Maia. A criação, ponto de encontro era o Estádio do Pacaem- administração e apoio a entidades filantrópi- bu, lotado de brinquedos, verdadeiro quartel- cas e assistenciais estiveram presentes na sua general. (Depoimento de Adriana Prestes Maia Fernandes) trajetória, assim como na de outras primeiras damas (SIMILI, 2008), transferindo para a esfe- Maria de Lourdes teve atuações estraté- ra pública as funções femininas de “cuidado- gicas na política cultural da cidade, cabendo ra” (junto a crianças, velhos e doentes). lembrar seu empenho na criação da Escola Mu- Empenhada nestas ações, ela buscou agre- nicipal de Bailado, em 1940. Esta tinha por ob- gar apoio e adesão às suas causas, particular- jetivo a formação de bailarinos, como o apoio mente das mulheres da elite, mas também do às montagens das temporadas líricas, nacio- setor empresarial. Fazia uso hábil da máquina nais e internacionais, e a formação de quadro administrativa em nome da filantropia, tendo para o corpo de baile do Teatro Municipal. como marco as mesmas: A Escola de Bailado era influenciada pela cultura europeia. Inicialmente, esteve instala- Concepções e práticas que orientaram a atua- ção das mulheres na política dos anos 30 e da nos altos do Teatro Municipal, e, devido ao 40. As questões sociais e assistenciais rela- grande sucesso da iniciativa, houve a necessi- cionadas ao feminino, à maternidade, à infân- dade de ser transferida para um espaço maior, cia estiveram na agenda da atuação das mu- embaixo do Viaduto do Chá, sendo capitanea- lheres em vários campos da política, criando da pela consagrada bailarina russa Maria Ole- uma história das mulheres na política social newa,6 convidada por D. Maria, em 1942, para e assistencial. Integram essa história, Carlo- assumir a direção da escola. ta Pereira de Queiroz e Bertha Lutz, as quais como deputadas, participaram da criação de Nas duas gestões do engenheiro na prefei- políticas públicas direcionadas à maternidade tura, ela se encarregou das temporadas líricas, e à infância; Pérola Byinton que, em São Pau- influenciando na programação e na definição lo, criou a Cruzada Pró-Infância, por meio da dos corpos estáveis do Teatro Municipal: qual foram desenvolvidos vários programas e serviços de proteção à infância e à maternida- Segundo é voz corrente nos meios artísticos de e de Darcy Vargas, que por intermédio da desta capital, uma portuguesa, amantes do se- organização de associações e entidades as- nhor prefeito Prestes Maia, é quem ‘manda’ no sistenciais traz as marcas das representações Teatro Municipal, na Orquestra Sinfônica e ins- tituições outras pertencentes ao Departamen- presentes no universo feminino da época de que a mulher tinha um papel a cumprir na so- 6 Maria Olenewa (1896-1965) nasceu em Moscou, foi pri- meira bailarina da Companhia Anna Pavlova e atuou ciedade, que era o de ser esposa e mãe e que na França e em outros países da Europa. No Brasil, suas causas deviam ser em defesa de proble- participou da fundação a Escola Oficial de Dança

máticas relacionadas ao feminino e que a ele (1927) e do corpo de Baile do Teatro Municipal do Rio de Janeiro (1936). Em 1942, assumiu a Escola de Baila- diziam respeito, tais como a maternidade e a do Municipal de São Paulo, posteriormente montou infância. (SIMILI, 2008, p. 58) sua própria Escola de balé. (PAVLOVA, 2001)

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to de Divulgação Artística da prefeitura. Disse Bellardi declarou que era o responsável pelas algures, que parece obter qualquer coisa nes- programações do Teatro, e que por ocasião do se setor da administração municipal é preciso, concerto do maestro José Siqueira, estiveram primeiramente, conquistar com atenções e pre- presentes e ocuparam lugares de honra na pla- sentes, essa senhora [...].7 téia, Luis Carlos Prestes, Maria de Lourdes Pres- tes Maia e Edoardo de Guarnieri etc. Outras ações de Maria Prestes Maia envol- vendo o Teatro Municipal também foram de- Inquirido por nós sobre a influência que ressal- nunciadas pelo DEOPS, cabendo destacar suas taria nos músicos da Orquestra Sinfônica Mu- nicipal, em relação à disciplina a simpatia ao atuações junto ao Sindicato dos Músicos e a esquerdismo, maestro Bellardi esquivou-se de Ordem dos Músicos de São Paulo, através do responder... Todavia as informações que obti- apoio “Aos senhores Eduardo de Guarnieri e vemos são de que o entrosamento entre este Armando Bellardi, a fim de que os mesmos, em senhor e a senhora Maria Prestes Maia era/é companhia de conhecido comunista Constan- perfeito, nada fazendo o maestro, sem consul- tar dona Maria, o que evidencia ser ele partidá- tino Milano Neto, controlassem a Ordem dos rio do esquerdismo de modo “velado”, tanto é Músicos de São Paulo”.8 verdade que, após ter programado, autorizado Seu envolvimento apareceu no inquéri- um conserto com artistas Russos (membros ofi- to aberto em junho, poucos meses depois do ciais da música comunista) no Teatro Municipal, golpe militar de março de 1964, centrado na manda em seguida, para ‘salvar as aparências’ questão da contratação para espetáculos mu- programar um conserto com as grandes expres- sões brasileiras: Guiomar Bereis, Sonia Lima, sicais de artistas russos, também na presença Antonieta Raigo [...] 5 de Junho de 1964.10 na plateia de personalidade da esquerda bra- sileira, como Luis Carlos Prestes e na difusão Apesar do tom de denúncia, característico de “ideias comunistas” entre os componentes da documentação da polícia política, perce- da Orquestra. bem-se as ações e influências de D. Maria, na Neste sentido, foram realizadas investiga- esfera cultural da municipalidade de São Pau- ções no Teatro Municipal de São Paulo, prio- lo, durante as gestões Prestes Maia e também rizando o depoimento do maestro Armando em outros momentos. Além disso, sua inserção Bellardi,9 que assumiu a direção das progra- no métier artístico e as relações com a intelec- mações da casa com a licença do maestro tualidade e artistas de esquerda. Edoardo de Guarnieri.

7 Dossiê DEOPS/AESP, n. 52-Z-0-14224, doc. 20k1102. A luta feminista 8 Em 1964, após o golpe militar de março, Constantino Milano Neto, que dirigia a Ordem dos Músicos de São No final da década de 1940 (1949), constituiu-se Paulo e o Sindicato dos Músicos, foi acusado de per- a Federação das Mulheres do Brasil (FMB), que tencer ao Partido Comunista e acabou destituído da Ordem, com a implantação de uma Junta interventiva, englobava militantes feministas de várias ten- abril/64. Dossiê DEOPS/AESP, n. 52-Z-0-14224. Relató- dências de esquerda, com forte influência do rio referente à “Ordem dos músicos do Brasil”, datado de 12/5/64, 30-C-1-16111 e 30-C-1-16470. Partido Comunista Brasileiro (PCB). A entida- 9 Em 1939, durante a primeira gestão de Prestes Maia na de, que mantinha articulações internacionais, prefeitura de São Paulo, Armando Bellardi, conside- rado “apadrinhado” de D. Maria de Lourdes, tornou- tinha como principais bandeiras a luta pelos se diretor artístico do Teatro Municipal de São Paulo, direitos da mulher, a paz mundial, a proteção onde criou o Coral Lírico, concretizando, posterior- mente, a oficialização da Orquestra Sinfônica de São à infância e as ações contra a carestia. Buscava Paulo (1949), também chamada de Orquestra do Tea- agir junto aos sindicatos, através da instalação tro Municipal de São Paulo. Consolidando as relações de amizade, em 1945, Bellardi batizou Adriana, filha 10 Dossiê DEOPS/AESP, n. 52-Z-0-14224. Relatório refe- do casal Prestes Maia. (Depoimento Adriana Prestes rente ao Teatro Municipal de São Paulo, 50H942027/ Maia Fernandes) Doc. 360.

196 Revista Brasileira de Pesquisa (Auto)Biográfica, Salvador, v. 03, n. 07, p. 187-202, jan./abr. 2018 Maria Izilda Santos de Matos de departamentos femininos e da participação da Federação Democrática Internacional de em movimentos como a “Greve dos 300 mil” Mulheres, realizado em Viena. Após o evento, (março de 1953). Particularmente, atuou na luta em convite oficial à comitiva brasileira, visi- contra a carestia, propôs o “Plano Nacional tou vários países do leste europeu e a URSS. contra a Carestia” e coordenou as ações para No retorno, participou da Conferência realiza- a realização da grande “Passeata da Panela Va- da na Biblioteca Municipal de São Paulo, em zia” (março/1953, reunindo mais de 60 mil pes- 28/8/1958. soas), tendo como resposta do governo o esta- Maria de Lourdes Prestes Maia, uma das comu- belecimento da Superintendência Nacional do nistas que fez parte da mesa, após fazer o his- Abastecimento, que visava agir neste setor. tórico da Federação Internacional de Mulheres Maria Prestes Maia atuou ativamente na Democráticas, apresentou amplo relatório, do 4 Federação das Mulheres do Brasil, particular- congresso Internacional de Mulheres, realizado em Viena referindo-se entusiasmada aos resul- mente no setor São Paulo, em vários momen- tados alcançados, descrevendo os trabalhos ali tos e como membro da diretoria no Departa- realizados. mento de Assistência Social (1958). Em 1961, foi convidada para assumir a presidência nacional Maria Prestes Maia disse que estiveram em vi- sita á URSS a convite das mulheres soviéticas, da entidade, mas declinou devido à eleição de tendo visitado diversas cidades do país socia- Prestes Maia para a prefeitura, mantendo, con- lista, assim como tomaram contato com organi- tudo, sua colaboração financeira à instituição.11 zações de assistência a infância, a maternidade Mesmo frente às resistências do marido, e e também sobre a vida das mulheres na URSS.12 como representante da FMB, foi a congressos Já em dia 14/11/1959, D. Maria foi a principal na Europa, visitou a URSS, Checoslováquia, Po- oradora na reunião preparatória para o de “En- lônia, Hungria, Iugoslávia, Bulgária, sempre se contro de Mulheres Latino-Americanas”, reali- destacando por sua capacidade de oratória e zado em Santiago do Chile. de cativar as pessoas (Depoimento de Adriana Ela permaneceu fiel à FMB até o encerra- Prestes Maia Fernandes). mento da instituição, continuando a luta e en- A polícia política paulista acompanhou as volvendo-se diretamente na campanha de de- ações de Maria Prestes Maia na FMB, arrolan- sarmamento infantil, estando sempre atuante do vários momentos da sua participação, em nas ações democráticas e simpática às causas julho de 1951, quando ela atuou no Primeiro de esquerda. Congresso da Federação de Mulheres do Brasil, Segundo relatório reservado de 13/4/61, a lí- em São Paulo. Já em 1957, estava presente na der comunista Eliza Branco Batista, falando do cerimônia de reabertura da FMB, na nova sede ‘Encontro das Mulheres Latino-Americanas’, localizada na Rua da Liberdade, 120, 1. Andar que seria realizado no Rio de Janeiro, de 21 à (1957). Em maio de 1958, ela organizou, no 23/4/61, por determinação da Federação In- Teatro Municipal de São Paulo, a Conferência ternacional de Mulheres, para tratar de suas Nacional Preparatória para o quarto Congres- reivindicações, inclusive da paz e da defesa da revolução cubana, disse que uma delegada so da Federação Democrática Internacional de daquela Federação estivera no Brasil para pre- Mulheres. parar o referido ‘encontro’. Adiantou também, No ano 1958, Maria Prestes Maia compôs que a aludida Federação achava muito fraco o a delegação paulista da FBM no IV Congresso movimento das mulheres na América Latina e que a Sra. Maria de Lourdes Prestes Maia, mem- 11 Dossiê DEOPS/AESP, n. 52-Z-0-14224, docs 50-J-104-826 e 50-C-1-14621. 12 Dossiê DEOPS/AESP, n. 52-Z-0-14224.

Revista Brasileira de Pesquisa (Auto)Biográfica, Salvador, v. 03, n. 07, p. 187-202, jan./abr. 2018 197 Maria Prestes Maia: trajetória de vida e lutas

bro do Conselho da Federação das Mulheres do tas, em 1961, saiu vitorioso no pleito à prefei- Estado de São Paulo, fora convidada para as- tura paulistana, obtendo uma votação maciça, sumir a presidência daquele organismo, porém ocupou este cargo até sua morte em 1965. Em declinara do convite, em virtude de outras tare- todos estes momentos, D. Maria participou ati- fas que tinha. Eliza Branco Batista esclareceu, inda que, a esposa do Sr. Prefeito Prestes Maia vamente das articulações políticas para o en- auxiliava pessoalmente, digo financeiramente, caminhamento da candidatura do engenheiro, o Partido Comunista do Brasil e a Federação das pois era determinada, envolvente, eloquente, 13 Mulheres do Estado de São Paulo. com habilidades no convencimento e não me- A Luta Política dia esforços para conseguir seus desígnios. Contudo, suas ações políticas iam muito As décadas de 1950 e 1960 se caracterizaram além destas intermediações, incluindo opções pela expansão e a criação de novas expecta- e preferências pessoais. Possivelmente, nunca tivas sociais, econômicas e políticas. À políti- chegou a se filiar a qualquer partido, mas cul- ca econômica desenvolvimentista, emergente tivava simpatias pelos de esquerda. com o governo de Juscelino Kubitschek (1956- No vasto dossiê localizado nos Arquivos 61), somaram-se novas manifestações culturais do DEOPS, Maria Prestes Maia teve seus passos (música, cinema, teatro, arquitetura), intensas registrados pela polícia-política (1945 a 1969), mobilizações da sociedade civil e das institui- foi identificada participando de atividades, co- ções políticas. Neste processo, destacou-se a mícios e atos públicos junto às lideranças do emergência de movimentos sociais e sindicais Partido Comunista e do Partido Socialista, en- (nas cidades e no campo), criando um quadro gajando-se na luta nacionalista e pela demo- crescente de ampliação das reivindicações de- cracia, no Brasil e em Portugal. As referências a mocráticas, expansão das articulações nacio- sua pessoa foram mais frequentes, no período nalistas, com novas proposições sintetizadas de 1957 a 1964, podendo-se conjecturar se isso nas Reformas de Base. As tensões internas se deve ao fato destes anos coincidirem com a crescentes, em uma conjuntura internacional gestão de Prestes Maia na prefeitura (1961-65), intervencionista na América Latina, levaram a ou talvez a uma maior ação política de D. Ma- articulações políticas que culminaram no gol- ria, ou ainda à própria conjuntura de grandes pe militar de 1964. tensões e movimentos político-sociais, levan- Neste contexto, Prestes Maia manteve-se do a uma maior articulação do equipamento atuante no campo político. Depois da gestão de investigação policial, mas talvez todos estes na prefeitura de São Paulo (1938-45), foi candi- fatores devam ser observados conjuntamente. dato ao governo paulista, pela União Democrá- Nos documentos do DEOPS encontram-se tica Nacional (UDN) em 1950; novamente, em referências de reuniões do Partido Comunista 1954, voltou a concorrer à administração do Es- realizadas na residência de D. Maria.14 Luís Car- tado, em uma articulação partidária composta los Prestes frequentou e se hospedou várias pela UDN, com o apoio de parte do PTB e dos vezes em sua casa, e o nome dela foi encontra- partidos Social Democrático (PSD), Republica- do nas famosas “cadernetas de Prestes”.15 no (PR), Democrata Cristão (PDC) e de Repre- 14 Dossiê DEOPS/AESP, n. 52-Z-0-14224, doc. sentação Popular (PRP); já em 1957, disputou 20K110B:05/11/1945. a prefeitura da capital com o apoio da UDN e 15 Após o Golpe de 1964, com o AI-1, Luis Carlos Pres- tes teve seus direitos políticos revogados, persegui- de frações do PTB. Depois destas três derro- do pela polícia, conseguiu fugir, mas na sua casa foi localizada uma série de cadernetas, que forneceram 13 Dossiê DEOPS/AESP, n. 52-Z-0-14224 e 50-J-104-826. dados e nomes para a base de inquéritos e processos.

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Em janeiro de 1958, quando o PCB já estava Em um contexto marcado pela Guerra Fria e na ilegalidade,16 ela foi citada pelo órgão do com várias repercussões no Brasil, Maria Pres- partido o jornal “Notícias de Hoje”: tes Maia foi membro atuante em associações representativas dos países comunistas, como [...] como uma das pessoas presentes a home- nagem prestada a Luiz Carlos Prestes, pela pas- a União Cultural Brasil-URSS, na qual ela foi sagem do seu 60 aniversário, homenagem essa professora de teatro, participou das ativida- efetuada no Teatro de São Paulo na noite do des culturais e integrou o Conselho Consultivo, dia anterior e intitulada ‘Noite de arte e cultura aparecendo na relação de envolvidos no in- brasileiras’.17 quérito do DEOPS sobre a associação.21 Dias depois (23/01/58), no mesmo jornal, Integrou também a Sociedade Cultural Si- ela subscreveu a nota de: no-Brasileira,

‘Homenagem da mulher paulista à Anita Loca- Informa-nos comunicado reservado que o dia dia Prestes’, um pedido de adesão de mulher 24/10/60, na sede social da ‘Sociedade Cultu- de São Paulo, o baile de homenagem a ser ofe- ral Sino-Brasileira’ realizou-se uma reunião de recido, no ginásio do Pacaembu à filha do líder cunho social, promovida pela diretoria da en- comunista Luiz Carlos Prestes.18 tidade, com finalidade de inaugurar a referida sede e estreitar as relações entre seus asso- O seu contato com o líder comunista man- ciados. Entre as pessoas presentes, destacadas tinha-se e, em 1959, ela esteve presente na: pelo comunicado em apreço, figura o nome de Maria Prestes Maia.22 [...] conferência proferida no dia 12/06/59, por Luis Carlos Prestes, na Faculdade de Direito da Em vários outros movimentos e manifesta- USP, diz a mesma contou com uma maioria de co- ções, Maria Prestes Maia foi agente, com des- munistas militantes, e que, entre as 600 ou mais taque para a luta democrática e nacionalista, pessoas presentes, foram notadas: Miguel Jorge particularmente na “Frente Parlamentar Na- Nicolau, Maria Prestes Maia, Mário Schenberg, Milton Marcontes, João Lousada e outros, que cionalista”. Esta organização suprapartidária aplaudiam entusiasticamente o líder vermelho.19 foi criada em 1956, operou no Congresso Na- cional, funcionava como um grupo de pressão Não se pode confirmar a sua filiação ao PCB, que condenava o imperialismo, as ações do todavia, ainda segundo relatório de 25/3/1963 capital estrangeiro, reivindicando a regula- (período em que seu marido ocupava a prefei- mentação da remessa de lucros para o exte- tura da cidade), Maria de Lourdes foi coroada rior, o controle estatal sobre a exploração dos uma das “rainhas”, na festa em comemoração recursos naturais básicos, além de assumir ao 41o Aniversário do Partido Comunista Bra- algumas reformas de base propostas, como a sileiro, realizada no Ginásio Municipal do Pa- reforma agrária. caembu.20 A Frente Nacionalista possibilitou uma “Consta o nome da epigrafada nos apontamentos de troca dinâmica entre o poder legislativo e a Luis Carlos Prestes” (caderneta n. 13). Dossiê DEOPS/ AESP, n. 52-Z-0-14224, doc 50-Z-9-3828/3832. e 15770. 16 o PCB foi criado em 1922, após a Intentona Comunista 21 o Jornal “Diário Popular”, em sua edição de 13/03/1965, de 1935, e, com a prisão de seus membros, tornou-se publica relação dos envolvidos no Inquérito da “União ilegal. Em 1945, retornou, obtendo registro partidário, Brasil-URSS” entre eles, a epigrafada. - Dossiê DEOPS/ elegendo representantes no parlamento; já em 1947 AESP, n. 52-Z-0-14224, doc. 30-C-21-240. teve seu registro cassado e os mandatos de seus par- 22 Dossiê DEOPS/AESP, n. 52-Z-0-14224, doc. 50-Z-9- lamentares extintos no ano seguinte. 1576. O Jornal “Folha da Manhã”, em sua edição de 17 Dossiê DEOPS/AESP, n. 52-Z-0-14224. 25/05/1965, publicou o nome da epigrafada, entre 18 Dossiê DEOPS/AESP, n. 52-Z-0-14224. outros elementos que faziam parte da Sociedade Cul- 19 Dossiê DEOPS/AESP, n. 52-Z-0-14224. tural Sino-Brasileira, acusados de atividades subver- 20 Dossiê DEOPS/AESP, n. 52-Z-0-14224, docs. 30-C-15408 sivas.

Revista Brasileira de Pesquisa (Auto)Biográfica, Salvador, v. 03, n. 07, p. 187-202, jan./abr. 2018 199 Maria Prestes Maia: trajetória de vida e lutas

sociedade civil; seus membros se colocavam Com a morte de Prestes Maia, em abril de como porta-vozes de movimentos sociais e 1965, diminuiu sua presença pública, mas não reivindicações populares (Ligas Camponesas, sua ação política. Em 10 de julho de 1969, em movimentos contra a carestia, União Nacional um momento altamente repressivo, no contex- dos Estudantes, Comunidades Eclesiásticas de to de ação do AI5, o DEOPS revelou, em decla- Base), em um momento de euforia participa- ração bombástica: tiva, com várias manifestações coletivas de Acabamos de saber e identificar quem é o ‘bra- cidadania e ações movidas por ideias de reno- ço direito’ dos comunistas, nesta capital, no vação (NEVES, s/d ). setor financeiro, qual tem conseguido fundos Segundo o Dossiê DEOPS, Maria Prestes elevados para a caixa do PCB sendo pesada Maia, no dia 20/09/1958: perfeitamente integrada vida dos comunistas brasileiros. Esteve no palanque armado no Largo de Pinhei- ros, quando, ali se realizou um comício comu- Trata-se, simplesmente, de ‘MARIA PORTUGUE- nista, promovido pela chamada ‘Frente Nacio- SA’, mulher já algo madura na idade, mas tipo nalista’ em favor das entidades da coligação inteligente e insinuante, bem vistoso ainda, e, P.S.P. – P.T.B – P.R.T. nada mais ou menos, que é a ‘amante’ direta do ex-prefeito Prestes Maia. A muito tempo que, Em 1962, compôs a mesa diretora da Con- não só se aproveitando das suas intimidades venção Popular por uma Política Nacionalista com o ilustre engenheiro, vem servindo de pon- to entre burgueses e proletários, num serviço e Democrática, ladeada por sujeitos políticos de infiltração da velha técnica com notáveis re- da esquerda, como pode ser observado: sultados, estando sempre ao par de planos e Em 23/7/62 realizou-se no cine Paramount a 1. projetos da plutocracia política. Convenção Popular por uma Política Naciona- A demais, por intermédio das relações pessoais lista e Democrática, sendo mesa diretora ficado do ex-prefeito, ficou conhecida de muita gen- assim constituída: Luciano Lepera, Cid Franco, te importante, do comércio e da indústria, aos Maria de Lourdes Prestes Maia, Francisco Julião quais visita constantemente, e pede auxílios e outros.23 para a campanha do Partido Comunista, ape- Ela apoiou vários movimentos grevistas, gando-se as circunstâncias de que política a ser seguida é democrática-progressista, e muito solidarizou-se com os trabalhadores e suas distanciada, portanto, do combatido comunis- famílias, em várias ocasiões, quando da gre- mo. ‘O seu nome é MARIA DE LOURDES CABRAL’.25 ve da Força Pública (fevereiro/1961), da greve na Indústria Brasileira de Refratários (outu- Entre as várias lutas democráticas em que bro/1961), no Sindicato dos Metalúrgicos (ju- esteve envolvida, D. Maria, como portuguesa, nho/1962) e junto aos trabalhadores agrícolas atuou constantemente na causa antissalaza- rista. Ela mantinha relações com os conterrâ- Em 13/11/61, foi realizada a 1 Conferência Esta- neos opositores ao regime salazarista, em São dual dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas, Paulo, tanto os articulados em torno do Centro como preparatória do I Congresso Nacional dos Lavradores Trabalhadores Agrícolas, a realizar- Republicano Português de São Paulo (reaber- se em Belo Horizonte, nos dias 17, 18 e 19 cor- to em 1958), como os organizados em torno do rente. O ato contou com a presença de 500 pes- Jornal Portugal Democrático, e vários de seus soas muito dos quais, elementos comunistas, membros frequentavam sua casa e gozavam tendo tomada à mesa, a Sra. Maria de Lourdes de sua amizade. Prestes Maia.24 Certa feita, de passagem por Portugal, quis 23 Dossiê DEOPS/AESP, n. 52-Z-0-14224, doc. 30-C-1-15137. 24 Dossiê DEOPS/AESP, n. 52-Z-0-14224, doc. 30-J-57-473. 25 Dossiê DEOPS/AESP, n. 52-Z-0-14224, doc. 50Z98812.

200 Revista Brasileira de Pesquisa (Auto)Biográfica, Salvador, v. 03, n. 07, p. 187-202, jan./abr. 2018 Maria Izilda Santos de Matos visitar a irmã e foi proibida de desembarcar A análise da trajetória de vida e lutas de pelo governo, como antissalazarista conheci- Maria Prestes Maia tornou-se emblemática da, e só obteve a autorização depois da inter- para a compreensão e o conhecimento da ex- ferência do Embaixador do Brasil. periência histórica de uma imigrante portu- Nesta frente, em 24/1/1960, esteve presen- guesa e sua participação nos circuitos culturais te e discursou na: e políticos de São Paulo. Apesar das dificulda- des enfrentadas, como o silêncio da persona- Na Primeira Conferencia Sul-Americana Pro-A- nistia para os Presos e Exilados Políticos de Es- gem na bibliografia e na documentação, este panha e Portugal, nos dias 23 e 24. Na ocasião, desafio buscou dar visibilidade a suas várias recomendou a leitura de vários escritores por- experiências, como atriz, professora de teatro, tugueses, que narram as atrocidades cometidas e a suas ações no setor cultural, a na Federação nas prisões salazaristas. Solicitou que fossem das Mulheres do Brasil, na assistência social e enviados pedidos aos governos de Franco e Sa- lazar, e também a ONU e a UNESCO, para a ces- nas várias frentes de luta política. sação desse estado de coisas.26 Referências Manteve-se articulada a esta questão polí- CAVALCANTI, Pedro; DELION, Luciano. tica, participando do ato público realizado em São Paulo e a juventude do Centro. São Paulo: Gripo, 2004. 27/7/62: Censo Estadual de 1934. Comissão Estadual de Re- No Cine Paramount realizou-se o anunciado ato censeamento. Governo do Estado de São Paulo, São público de solidariedade aos trabalhadores e aos povos de Espanha e Portugal, no qual toma- Paulo, 20 de setembro, 1934. ram parte diversos deputados, entre os quais, CORTI, Paola. Storia delle migrazioni internazionali. Paulo de Tarso, João Lousada, Jethero Faria Car- Roma: Editori Laterza, 2007. doso, Luiz Carlos Prestes (líder vermelho), Cid Franco, Da. Maria Prestes Maia e outros elemen- FREITAS, Sonia Maria. Presença portuguesa em São 27 tos comunistas. Paulo. São Paulo: Imprensa Oficial, 2006.

Sua influência manteve-se, com a presen- HAAG, Carlos. Palco de razões e paixões. Pesquisa ça percebida e registrada no Movimento pela Fapesp, SP, n. 174, p. 87-89, 2010. Anistia (anos 1970) e nas manifestações pelas MATTOS, David José Lessa. O espetáculo da cultu- Diretas Já (1980). Lideranças políticas busca- ra paulista: teatro e TV em São Paulo, 1940-50. São vam o seu apoio, em diferentes momentos e Paulo: Códex, 2002. ocasiões, com destaque para nomes como MORSE, Richard. M. Formação histórica de São Pau- Ulisses Guimarães, Fernando Henrique Cardo- lo. São Paulo: Difel, 1970. so, Orestes Quércia e Ermínio de Moraes. NEVES, Lucília Almeida. Frente Popular Nacionalis- Considerações finais ta: utopia e cidadania. s/d. Disponível em: . Após a sua morte, em 25 de abril de 1988 (com Acesso em: 21 ago. 2010. 86 anos), prestaram-se várias homenagens a sua memória, sendo dado seu nome a uma PASCHOAL, Eliana dos Santos. Cenas de Arena de um teatro. Guarnieri e Vianinha 1958-1959. 1998. 150 Rua, na Vila Guilherme e a uma escola esta- f. Dissertação (Mestrado em História) – Programa de dual, no Jardim Catarina. Pós-Graduação em História, Pontifícia Universidade

26 Dossiê DEOPS/AESP, n. 52-Z-0-14224. Católica de São Paulo, PPG História da PUC/SP, São 27 Dossiê DEOPS/AESP, n. 52-Z-0-14224. Paulo, 1998.

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PAVLOVA, Adriana. Maria Olenewa: a sacerdotisa do Etty Fraser. Disponível em: . Acesso em: 17 ago. 2010. PEREIRA, Miriam Halpern. A política portuguesa de emigração 1850-1930. Lisboa: Regra do Fogo, 1981. Renato Borghi. Disponível em: . Acesso SIMILI, Ivana Guilherme. Mulher e política: a trajetó- em: 17 ago. 2010. ria da primeira-dama Darcy Vargas (1930-1945). São Paulo: Editora da UNESP, 2008.

Depoimentos Adriana Prestes Maia Fernandes, acervo do Memorial Recebido em: 07.12.2017 dos Imigrantes de São Paulo, realizado em 5/09/2005. Aprovado em: 08.02.2018

Maria Izilda Santos de Matos é Doutora em História pela USP, Livre-docente em História pela PUC/SP. Professora-titular da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Pesquisadora 1A CNPq. e-mail: [email protected]

Rua Monte Alegre 984, Perdizes – São Paulo/SP. Tel: (11) 55747744

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