Anatomia Dos Lenhos De Ephedra Tweediana, Gnetum Gnemon E Welwitschia Mirabilis (Gnetidae) 1
Total Page:16
File Type:pdf, Size:1020Kb
BALDUINIA, n. 61, p.23-30, 15-IV-2018 http://dx.doi.org/10.5902/2358198032387 ANATOMIA DOS LENHOS DE EPHEDRA TWEEDIANA, GNETUM GNEMON E WELWITSCHIA MIRABILIS (GNETIDAE) 1 ANELISE MARTA SIEGLOCH2 JOSÉ NEWTON CARDOSO MARCHIORI 3 RESUMO O lenho das espécies em estudo apresenta estruturas muito distintas. Ephedra tweediana tem anéis de cres- cimento descontínuos, vasos numerosos e de lúmens estreitos, e placas de perfuração foraminadas, com 6-20 perfurações. Gnetum gnemon identifica-se pela ausência de anéis de crescimento, pelos vasos de grandes lúmens e placas de perfuração simples, por vezes foraminadas (até 8 perfurações). Welwistchia mirabilis, por sua vez, distingue-se pelas células espiculares com cristais de oxalato de cálcio. Palavras-chave: anatomia da madeira, Ephedra, Gimnospermas, Gnetidae, Gnetum, Welwitschia. ABSTRACT [Wood anatomy of Ephedra tweediana, Gnetum gnemon and Welwitschia mirabilis (Gnetidae)]. The three studied wood species present a large variation in its wood anatomical features. Ephedra tweediana shows discontinuous growth rings, numerous vessels with narrow lumens and only foraminate perforation plates (6-20 perforations). Gnetum gnemon distinguishes itself by the absence of growth rings and vessels with large lumens, with simple perforation plates, sometimes foraminate up to 8 perforations. The wood of Welwistchia mirabilis, in turn, shows spicular cells with calcium oxalate crystals. Key words: Ephedra, Gnetidae, Gnetum, Gymnosperms, Welwitschia, wood anatomy. INTRODUÇÃO As Gnetidae têm particular importância no Na natureza, encontram-se cinco linhagens contexto da evolução das plantas por reunirem principais de plantas vivas com sementes: caracteres tanto de Gimnospermas (sementes Cycadidae, Ginkgoidae, Gnetidae, Pinidae e envolvidas em um ovário), como de Angios- plantas com flores (Angiospermas). As quatro permas, caso de elementos de vaso no lenho, primeiras compõem as Gimnospermas, por te- estruturas reprodutivas com aspecto de flores e rem sementes nuas, em oposição às dupla fertilização (Judd, 2009). Angiospermas, cujas sementes estão protegidas A subclasse Gnetidae compreende as ordens no interior de um carpelo (Judd et al., 2009). Ephedrales, Gnetales e Welwistchiales, com As Gimnospermas, com exceção das uma única família e gênero em cada ordem, as Gnetales, apresentam traqueoides no xilema; já quais são muito distintas entre si sob o ponto de as Angiospermas e Gnetales apresentam elemen- vista morfológico (Christenhusz et al., 2011; tos de vaso, que são mais eficientes do que Judd et al., 2009). traqueoides para o transporte de água em algu- A família Ephedraceae reúne ervas e arbus- mas circunstâncias (Judd, 2009). tos eretos ou volúveis (raramente arvoretas), ge- ralmente dioicos, com ramos verticilados geral- mente verdes e fotossintetizantes, e folhas sim- 1 Recebido para publicação em 20/11/2017 e aceito para ples, opostas ou verticiladas, escamiformes e de publicação em 16/02/2018. 2 Engenheira Florestal. Doutoranda do Programa de Pós- margem inteira (Souza & Lorenzi, 2012). Graduação em Engenheira Florestal. Bolsista – CAPES. O gênero Ephedra, com cerca de 60 espéci- Universidade Federal de Santa Maria. Santa Maria, RS, es, distribui-se nas regiões temperadas do mun- Brasil. [email protected] 3 Professor Titular do Departamento de Ciências Flores- do, com exceção da Austrália. Adaptadas a re- tais, Universidade Federal de Santa Maria. Santa Maria, giões extremamente áridas e ensolaradas, as RS, Brasil. [email protected] espécies habitam estepes e desertos, em altitu- 23 des de até 4000 m nos Andes e Himalaia (Judd to, maciço, com duas folhas opostas e em for- et al., 2009). No Brasil, registra-se uma única ma de fita, as quais, a partir da base, crescem ao espécie, Ephedra tweediana, nativa no Rio longo de toda a vida da planta (Gifford; Foster, Grande do Sul (Souza & Lorenzi, 2012). 1988). Trata-se do dito “polvo-do-deserto”, na- Conhecida popularmente por “efedra” ou tivo na região do Cabo Negro, no sudoeste da “trepadeira-macarrão”, Ephedra tweediana é África, em área de clima extremamente árido nativa na Argentina, Uruguai e sul do Brasil, (Rodin, 1953). De sua morfologia, destacam- chegando a ser frequente na Serra do Sudeste se, ainda, os estômatos em ambas as faces da do Rio Grande do Sul e nos arredores de Porto folha e os cones femininos vermelhos, com uma Alegre (Marchiori, 2005). Trata-se de arbusto única semente alada, que se dispersa pelo vento dióico, escandente e de até 6m de altura, provi- (Gifford; Foster, 1988). do de folhas caducas de 5mm de comprimento. Além da descrição anatômica do lenho de Os estróbilos masculinos, globosos (cerca de Ephedra tweediana, Gnetum gnemon e 6mm), reúnem 3-7 pares de brácteas decussadas. Welwistchia mirabilis, o presente estudo visa a Os femininos, pedunculados, vermelhos, reconhecer caracteres anatômicos de valor carnosos e com 8-10mm de comprimento, apre- taxonômico para os táxons envolvidos. sentam, geralmente, duas sementes (Marchiori, 2005). MATERIAL E MÉTODOS A família Gnetaceae reúne lianas lenhosas, As amostras de lenho de Gnetum gnemon e arbustos e árvores, as quais são, geralmente, Welwitschia mirabilis foram recebidas median- dioicas, de folhas simples, opostas, largas, te permuta com o New York Botanical Garden. comumente elípticas, e sementes envolvidas em A de Ephedra tweediana foi coletada no Rio sarcotesta carnosa (Judd et al., 2009; Souza; Grande do Sul e sua exsicata encontra-se depo- Lorenzi, 2012). sitada no Herbário do Departamento de Ciênci- O gênero Gnetum compreende umas trinta as Florestais da Universidade Federal de Santa espécies (principalmente lianas) de distribuição Maria (HDCF) sob o número 3215. pantropical disjunta. No Brasil, encontram-se Das amostras disponíveis, foram preparados seis espécies na Amazônia: Gnetum leyboldii, três corpos-de-prova, orientados para a obten- G. nodiflorum, G. paniculatum, G. schwa- ção de cortes anatômicos nos planos transver- ckeanum, G. urens e G. venosum (Souza; sal, longitudinal radial e longitudinal tangencial; Lorenzi, 2012). de outro fragmento foram obtidos palitinhos, Gnetum gnemon L., conhecido por “melinjo” usados no preparo de lâminas de macerado. ou “belinjo”, é planta nativa no Sudeste da Ásia Os corpos-de-prova foram fervidos em água, e ilhas do Pacífico Ocidental, incluindo Fiji, até a expulsão completa das partículas gasosas Indonésia, Malásia, Papua Nova Guiné, Filipi- existentes no interior da madeira. nas e Vanuatu. Árvore pequena (8-15 m) e de A microtomia foi realizada no Laboratório folhas verdes, opostas, inteiras e oblongas (de de Anatomia da Madeira da Universidade Fe- 10-20×4-7 cm), apresenta estróbilos masculinos deral do Paraná, utilizando-se micrótomo de pequenos, em longos pedúnculos, e estróbilos deslizamento modelo Spencer (American femininos carnosos, vermelho-alaranjados, de Optical n. 860), regulado para obtenção de cor- 6-10cm, com uma única semente (Harley; tes anatômicos com espessura nominal de 16 a Craing, 2006). 20 µm. A família Welwitschiaceae, compreende uma Mantidos em Placa de Petri, com água, os única espécie viva, Welwitschia mirabilis Hook. cortes sofreram coloração com solução aquosa f., nativa no Sudoeste da África (Namíbia). Ca- de “Safra-Blau”, ou seja, uma mistura, em par- racteriza-se, morfologicamente, pelo caule cur- tes iguais, de Safranina 1% e Azul-de-Astra 1%. 24 Após esta etapa, os cortes foram lavados em contínuos, interrompidos por raios largos (Fi- água destilada, para a extração do excesso de gura 1A,B). corante, desidratados em série alcoólica ascen- Vasos: de seção poligonal (27,5-38,5-57,5 dente (álcool etílico 25%, 50%, 75%, 90%, 95%, (s=6,9) µm), com abundância de 235/mm² com duas passagens em álcool absoluto P.A.) e (s=21,4) e paredes relativamente finas (1,3-3,6- diafanizados em xilol. Na montagem de lâmi- 6,3 (s=1,3) µm). Porosidade difusa, uniforme. nas permanentes, usou-se “Entellan”. Vasos solitários ou em contato parcial com ou- No preparo das lâminas de macerado, os tros, compondo 27% do volume da madeira (Fi- palitinhos, obtidos manualmente com formão, gura 1A,B). Elementos vasculares de 650-1032- passaram por dois banhos em solução de Jeffrey 1340 (s=174) µm de comprimento, com placas (Freund, 1970), com duração de 24 horas cada. de perfuração foraminadas, verticais, providas O material dissociado foi recolhido em papel de 6-20 perfurações arredondadas, alternas (Fi- filtro (funil), colorido com Safranina 1%, desi- gura 1D). Apêndices, espessamentos espi- dratado em álcool etílico conforme anteriormen- ralados, estriações, tilos e depósitos, ausentes. te descrito, e conservado em Xilol até a monta- Pontoações intervasculares escassas, arredon- gem de 6 lâminas permanentes por amostra. dadas (10-14-15 (s=1,7) µm) e em arranjo A descrição baseou-se nas recomendações unisseriado, por vezes bi ou trisseriado-alterno, do IAWA Committee (Wheeler et al., 1989). No com abertura circular-inclusa. (Figura 1D) caso da percentagem dos tecidos, foram reali- Parênquima axial: apotraqueal difuso-em- zadas 600 determinações ao acaso, com auxílio agregados, por vezes paratraqueal, representan- de contador de laboratório, conforme proposto do 12% do volume da madeira. Séries por Marchiori (1980). A abundância de poros parenquimáticas axiais de 195-350-500 (s=96) foi obtida a partir de um quadrado de área co- µm de altura, geralmente com 2 ou 3 células. nhecida, superposto a fotomicrografias de se- Raios: com abundância de 3-6-9/mm (s=1,3), ções transversais da madeira. ocupando 22% do volume