Versão online: https://www.lneg.pt/wp-content/uploads/2020/05/Volume_107_CIG.pdf Comunicações Geológicas (2020) 107, Especial II, 105-109 ISSN: 0873-948X; e-ISSN: 1647-581X

Emissão de CO2 na Lagoa das Sete Cidades (São Miguel, Açores)

CO2 emission from Sete Cidades (São Miguel, )

C. Andrade1,2*, J. V. Cruz1,3, F. Viveiros1,3, R. Coutinho1,3

Recebido em 03/11/2019 / Aceite em 28/12/2019 Artigo original Publicado online em julho de 2020 Original article © 2020 LNEG – Laboratório Nacional de Energia e Geologia IP

Resumo: A Lagoa das Sete Cidades na ilha de São Miguel é o maior lago Estudos sobre processos de desgaseificação difusa em lagos vulcânico dos Açores com uma área total de 4,41 km2. Nos lagos vulcânicos têm vindo a ser realizados em regiões vulcânicas de selecionados foram efetuados perfis hidrogeoquímicos em diferentes todo o mundo, nomeadamente trabalhos que visam a locais de amostragem. As águas são frias (temperatura média = 14,0 ºC), quantificação dos gases libertados à superfície destas massas de pouco mineralizadas (condutividade elétrica média = 116 µS/cm) e com água (Bernard e Mazot 2004; Kusakabe et al., 2008; Padrón et pH neutro (pH médio = 7,7). No que concerne ao fluxo de CO2 foi realizada uma campanha de medição, com valores a variar entre 0,3 e al., 2008; Mazot e Taran, 2009; Hernández et al., 2011; Mazot et 17,2 g m-2 d-1 (Lagoa Azul) e 2,1 e 17,9 g m-2 d-1 (Lagoa Verde). As áreas al., 2011; Pérez et al., 2011; Caudron et al., 2012; Chiodini et al., de desgaseificação mais significativas estão associadas às zonas onde 2012; Arpa et al., 2013; Mazot e Bernard, 2015; Andrade et al., existe a presença massiva de florescências algais e macrófitas. Os valores 2016, 2019a, b; Melián et al., 2016; Sun et al., 2017). medidos parecem estar relacionados com uma única fonte de CO2, a qual A natureza vulcânica dos Açores converte as ilhas do deverá representar uma origem biogénica. O valor estimado total de -1 arquipélago num laboratório natural para o estudo de fenómenos emissão de CO2 dos lagos estudados variou entre 5,8 t d (Lagoa Verde) vulcânicos, e em particular dos processos geoquímicos que e 25,0 t d-1 (Lagoa Azul). ocorrem nos lagos. Com efeito, nos Açores existem 88 lagos Palavras-chave: Lagoa das Sete Cidades, Ilha de São Miguel, inventariados, dispersos pelas ilhas de São Miguel, Terceira, desgaseificação difusa, lago monomíctico, CO biogénico. 2 Pico, Graciosa, Flores e Corvo, os quais ocupam uma área de 9,5 km2 (0,4% da área total do Arquipélago) (DROTRH-INAG, Abstract: Sete Cidades Lake in São Miguel island is the largest volcanic 2001). No que diz respeito aos processos de desgaseificação lake of the Azores, with a total area of 4.41 km2. Hydrogeochemical difusa que ocorrem em lagos nos Açores, os primeiros estudos profiles were carried out in both in different sampling sites. Waters foram realizados na ilha de São Miguel por Andrade (2014). are cold (mean temperature = 14.0 ºC), weakly mineralized (mean Mais recentemente, outros trabalhos mostraram a relevância do electrical conductivity = 116 µS/cm) and with neutral pH (mean pH = estudo nestas massas de água, principalmente no que diz respeito 7.7). In what concerns the CO2 fluxes at the surface of the lakes a survey was carried out and values are in the range of 0.3 to 17.2 g m-2 d-1 (Lagoa às emissões de CO2 e à dinâmica do fluxo de gás (Andrade et al., Azul) and 2.1 to 17.9 g m-2 d-1 (Lagoa Verde). The most significant 2016, 2019a, b, c, d; Melián et al., 2016;). Estes trabalhos degassing areas are found out associated to the massive presence of permitiram não só quantificar as emissões, e o respetivo macrophytes and algal blooms. The measured values seem to be comportamento sazonal, como determinar as possíveis origens do correlated with one single CO2 source, which is probably biogenic. The CO2. Em alguns casos, como na Lagoa das Furnas (ilha de São -1 estimated total CO2 emission varied between 5.8 t d (Lagoa Verde) and -1 Miguel) e na Lagoa da Furna do Enxofre (ilha Graciosa), o CO2 25.0 t d (Lagoa Azul). resulta quer de processos biogénicos, quer de processos de Keywords: Sete Cidades Lake, São Miguel Island, diffuse degassing, profundidade (hidrotermal) (Andrade et al., 2016, 2019b), monomictic lake, biogenic CO2. embora na maioria dos lagos dos Açores a origem do CO2 seja apenas biogénica (Andrade et al., 2019a, b, c, d). 1 Instituto de Investigação em Vulcanologia e Avaliação de Riscos, O presente estudo visa caracterizar e estimar as emanações de Universidade dos Açores, Rua da Mãe de Deus, 9500-801 , . CO2 na lagoa das Sete Cidades, assim como identificar a 2 Centro de Informação e Vigilância Sismovulcânica dos Açores, Universidade existência de possíveis zonas de desgaseificação anómala nesta dos Açores, Rua da Mãe de Deus, 9500-801, Ponta Delgada, Portugal. massa de água. 3 Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade dos Açores, Rua da Mãe de Deus, 9500-801, Ponta Delgada, Portugal. *Autor correspondente/Corresponding author: [email protected] 2. Área de estudo

2.1. Enquadramento geográfico e geológico 1. Introdução O arquipélago dos Açores localiza-se no Oceano Atlântico Norte Após os incidentes fatais ocorridos nos lagos Monoun (1984) e entre as latitudes 37º e 40º N e as longitudes 25º e 31º W, a uma Nyos (1986), nos Camarões, o estudo de emissões gasosas em distância de cerca de 1400 km do continente europeu e 1900 km lagos vulcânicos ganhou relevância internacional (Barberi et al., do continente Americano. O arquipélago abrange uma superfície 1989; Oskarsson, 1990). 106 Andrade et al. / Comunicações Geológicas (2020) 107, Especial II, 105-109 geográfica de 310 km de longitude por 560 km em latitude, e é 2.2. Vulcão das Sete Cidades constituído por nove ilhas e diversos ilhéus de natureza vulcânica, dispostas de acordo com uma direção WNW-ESE e O Vulcão das Sete Cidades abrange uma área com cerca de 12 ocupando uma área emersa aproximada de 2332 km2. Em função km de diâmetro basal e apresenta um volume emerso aproximado 3 do seu posicionamento relativo, as ilhas dispõem-se em três de 45 km . Limitado pelo mar na sua maior extensão, coalesce a grupos distintos: as ilhas das Flores e do Corvo são as que se SE com o Sistema Fissural dos Picos (Queiroz, 1997). Este situam mais a W, constituindo o Grupo Ocidental, enquanto as vulcão central apresenta no topo uma caldeira com forma ilhas de Faial, Pico, São Jorge, Graciosa e Terceira constituem o grosseiramente circular, com escarpas abruptas, sub-verticais e Grupo Central; o Grupo Oriental é formado pelas ilhas de São alturas que variam desde os 30 m a cerca de 400 m, na zona do Miguel e Santa Maria (Fig. 1A). vértice geodésico dos Remédios. Esta estrutura apresenta um O presente estudo decorreu na ilha de São Miguel, situada entre diâmetro de 5 km na bordadura, uma profundidade média da 2 as latitudes 37º42´ e 37º54´ N e as longitudes 25º51´ e 25º08´ W. ordem dos 350 m e cerca 15 km de área interior, correspondendo 3 Esta ilha, a maior do arquipélago dos Açores, apresenta um a um volume próximo de 5,2 km (Queiroz, 1997). comprimento máximo de cerca de 65 km e uma largura máxima A formação da caldeira ocorreu em três fases distintas, a de cerca de 16 km, uma área aproximada de 742 km2, e atinge primeira das quais datada de há cerca de 36000 anos, e os outros uma cota máxima de 1103 m, no designado Pico da Vara (Fig. dois eventos, mais recentes, respetivamente há 29000 e 16000 1A). A geologia da ilha é dominada por três vulcões centrais anos (Queiroz et al., 2008). A base da caldeira encontra-se ativos (Sete Cidades, Fogo e Furnas), ligados por sistemas ocupada por duas lagoas interligadas (Lagoa Azul e Lagoa vulcânicos fissurais (sistemas fissurais dos Picos e do Congro); a Verde), alvo de estudo no presente trabalho, e por vários centros parte mais oriental da ilha é formada pelo Vulcão da Povoação e eruptivos secundários, tais como maars (s.l.) (e.g. Lagoa de pelo Complexo Vulcânico do Nordeste, que é o mais antigo de Santiago, Lagoa Rasa), cones de pedra pomes (e.g. Caldeira do São Miguel (Gaspar et al., 2015). O lago estudado encontra-se no Alferes e Caldeira Seca) e domos. Vulcão das Sete Cidades. 2.3. Lagoa das Sete Cidades A Lagoa das Sete Cidades, situada a 260 m de altitude, é constituída por dois troços, o primeiro dos quais corresponde à Lagoa Azul, com uma área de 3,6 km2, um comprimento de 2600 m e uma largura máxima de 2100 m, e um volume de água aproximado de 45,9x106 m3. Por seu turno, o segundo troço, designado por Lagoa Verde, possui uma área de espelho de água de 0,86 km2, 1540 m de comprimento e 770 m de largura máxima, e um volume armazenado de 10,3x106 m3 (Tab. 1) (Pacheco et al., 2010). A Lagoa das Sete Cidades apresenta carácter monomítico, com estratificação da coluna de água no período de Verão (Cruz et al., 2015). Durante o presente trabalho, efetuaram-se medições a uma profundidade máxima de 25 m na Lagoa Azul e de 21,5 m na Lagoa Verde.

3. Metodologia de amostragem e de análise

3.1. Perfis hidrogeoquímicos No decurso do mês de janeiro de 2017 foi realizada uma campanha de amostragem na Lagoa das Sete Cidades, com recolha de amostras de água ao longo de quatro perfis verticais. Os perfis foram realizados numa altura do ano em que não se observa a estratificação da coluna de água da lagoa. Dois perfis foram efetuados nas zonas mais profundas de cada troço, enquanto a localização dos outros dois perfis foi projetada tendo em atenção as áreas de menor profundidade e, no caso particular da Lagoa Verde, que cumulativamente intercetasse uma zona com uma densa cobertura de macrófitas aí existente (Fig. 1B). Nestes locais recolheram-se amostras de dois em dois metros ao longo da coluna de água, perfazendo um total de 33 amostras (18 na Lagoa Azul; 15 na Lagoa Verde). As recolhas das amostras foram efetuadas com recurso a uma garrafa amostradora SEBA com um volume de 1000 mL. A Figura 1. (A) Localização geográfica do local em estudo: (a) arquipélago dos Açores determinação de alguns parâmetros físico-químicos, com a ilha de São Miguel em evidência; (B) Lagoa das Sete Cidades. A batimetria e a nomeadamente a temperatura, a condutividade elétrica (CE), o localização dos pontos de medição de fluxo de CO2 e dos perfis hidrogeoquímicos pH e a concentração de CO2 livre foi efetuada no local, verticais realizados na Lagoa estão igualmente representados. imediatamente após a recolha das amostras, tendo sido utilizados Figure 1. (A) Geographic location of the study site: (a) Azores archipelago highlighting registadores digitais portáteis Testo 925, para a temperatura, e the location of São Miguel Island; (B) Sete Cidades Lake. Bathymetry and location of WTW 340i para a CE e pH. Para a determinação do CO2 livre the CO2 flux measurement points; the hydrogeochemical vertical profiles made in the Lake are also represented. recorreu-se a uma titulação volumétrica (APHA/AWWA/WPCF, CO2 na Lagoa das Sete Cidades 107

Tabela 1. Principais características dos lagos estudados (dados do presente trabalho e de Pacheco et al., 2010).

Table 1. Main features of the studied lakes (data from the current work and from Pacheco et al., 2010).

Lagoa Altitude Área da Lagoa Comprimento (m) Largura Volume Profundidade (m) Classificação (m) (km²) (m) (10³ m³) Geológica

Azul 260 3,60 2600 2100 45937 25,0 Cratera de Colapso Verde 260 0,86 1540 770 10329 21,5 Cratera de Colapso

1985). Foi igualmente feita a recolha de amostras para a um máximo de, respetivamente, 1,3 e 1,0 mg/L, em ambos os determinação do valor isotópico de δ13C em cada lago: na Lagoa casos no último metro de profundidade (Fig. 2D). Este Azul, no local de maior profundidade, enquanto na Lagoa Verde enriquecimento em CO2 deverá ser explicado pela degradação da foi no local de menor profundidade. matéria orgânica nos sedimentos de fundo. Perante estes resultados (temperatura e CO2 dissolvido), foi 3.2. Medição do fluxo de CO2 possível verificar que a Lagoa das Sete Cidades não se encontrava estratificada, ocorrendo assim uma boa mistura ao Paralelamente à realização dos perfis hidrogeoquímicos, foram longo da coluna de água, não se registando alterações efetuadas medições do fluxo de CO2 à superfície da massa de significativas nos valores de temperatura entre a superfície e o água. Ao longo desta tarefa foram realizadas nas lagoas Verde e fundo dos lagos. Não se observou também um aumento Azul, respetivamente, 468 e 1292 medições de fluxo (Fig. 1B). expressivo nos valores de CO2 dissolvido na parte final da coluna Em cada ponto de medição foi registada a profundidade, de água, o que poderia indicar que o mesmo estivesse aprisionado utilizando para esse efeito uma sonda batimétrica Garmim no fundo dos lagos. ECHOTM 500c, tendo sido coberta uma área total de cerca de 4,39 km2 (Fig. 1B). Para as medições do fluxo de CO2 nos lagos utilizou-se um equipamento portátil que efetua medições pelo método da câmara de acumulação (Chiodini et al., 1998), o qual foi modificado para permitir flutuar na água. Este procedimento foi testado e validado em trabalhos anteriores desenvolvidos nos Açores (Andrade et al., 2016, 2019a, b, c, d; Melián et al., 2016). Este equipamento, fabricado pela empresa West Systems, é dotado de um detetor de infravermelhos (modelo LICOR LI-800) com escala máxima de 2%vol., e permite efetuar medições de fluxo de CO2 no intervalo entre 0 e 30000 g m-2 d-1 (West Systems, 2014). Aos dados de fluxo de CO2 foram aplicadas duas análises estatísticas: a abordagem estatística através de representação gráfica (GSA) e a simulação sequencial Gaussiana (sGs) (Cardellini et al., 2003). A abordagem estatística GSA baseia-se em gráficos de probabilidade acumulada, que possibilitam Figura 2. Variação da temperatura (A), pH (B), condutividade elétrica (C) e de dióxido identificar diferentes populações nos dados obtidos (Sinclair, de carbono dissolvido (D) ao longo da coluna de água nas lagoas Azul e Verde. 1974) e, consequentemente, determinar os processos que Figure 2. Temperature variation (A), pH (B), Electrical conductivity (C) and dissolved carbon dioxide (D) along the water column in the Azul and Verde lakes. explicam a origem do CO2. Em particular, desde logo podem ser consideradas duas origens possíveis para o CO2 libertado à superfície, nomeadamente uma biogénica e outra associada a uma No que diz respeito aos valores das medições de fluxo de dióxido de carbono, estes oscilam entre 2,1 e 17,9 g m-2 d-1, e de fonte de profundidade, associada à atividade vulcânica. Através -2 -1 do método sGs foram efetuadas 100 realizações de cada medição 0,3 a 17,2 g m d , respetivamente, para a Lagoa Verde e a Lagoa Azul. de fluxo de CO2. Com base no mapa final obtido foi estimada a A aplicação da abordagem estatística GSA permitiu a emissão de CO2 em ambos os lagos amostrados. identificação de quatro populações no conjunto de dados obtidos nos diferentes troços da lagoa das Sete Cidades (Fig. 3). Assim, 4. Apresentação de resultados foram detetadas duas populações em cada troço, nomeadamente O valor médio da temperatura da água foi de 14,0 ºC, inferior à as populações A na Lagoa Verde (Fig. 3A), e B na Lagoa Azul temperatura ambiente do ar, e as águas amostradas podem assim (Fig. 3B), que materializam todas valores de fundo com origem ser classificadas como frias, predominantemente neutras (média biogénica, como já mostrado em outros lagos nos Açores pH = 7,7) e pouco mineralizadas (média CE = 116 μS/cm). A (Andrade et al., 2019a, b, c, d); a população B da Lagoa Verde, temperatura da água na Lagoa Azul variou entre 13,4 e 14,2 ºC, o que agrega os valores mais elevados (Fig. 3A), está associada a pH entre 7,47 e 8,27 e os valores de CE variaram entre 104 e 107 locais que apresentam grandes massas densas de macrófitas e μS/cm (Fig. 2A, C). Na Lagoa Verde os valores registados foram algas. Por outro lado, a população A da Lagoa Azul, que ligeiramente diferentes, variando a temperatura da água entre corresponde aos valores mais baixos naquele troço (Fig. 3B), 13,9 e 14,5 ºC, o pH entre 7,63 e 8,00 e a CE entre 127 e 130 refere-se às áreas onde se encontram grandes quantidades de μS/cm (Fig. 2A, C). sedimentos finos, em particular junto às margens. As concentrações de CO2 dissolvido variam entre um mínimo No primeiro caso, a presença de macrófitas poderá explicar de 0,5 mg/L, detetado à superfície das Lagoas Azul e Verde, e os valores de fluxo mais elevados, e que correspondem à zona onde 108 Andrade et al. / Comunicações Geológicas (2020) 107, Especial II, 105-109

Lagoa das Sete Cidades é igual a 30,8 t d-1, com valores iguais a 5,8 t d-1 e 25,0 t d-1, respetivamente, na Lagoa Verde e na Lagoa Azul. Para efeitos de comparação, a emissão de CO2 por área associada à Lagoa Verde (7,2 t km-2 d-1) apresenta um valor ligeiramente superior ao estimado para a Lagoa Azul (6,9 t km-2 d-1). Estes valores são significativamente superiores ao calculado por Melián et al. (2016) (0,61 t d-1). As diferenças significativas na emissão de CO2 observadas nos dois trabalhos podem ser associadas não só a eventuais variações temporais do fluxo de CO2, mas essencialmente às diferenças no número de medições efetuadas, que foi consideravelmente superior no presente trabalho. Os valores determinados para a Lagoa das Sete Cidades Figura 3. Gráficos de probabilidade acumulada referentes à Lagoa Verde (A) e à Lagoa encontram-se dentro do intervalo de valores (~0,7-14,0 t km-2 d-1) Azul (B) das Sete Cidades. de emissão de CO2 de origem biogénica dos lagos dos Açores Figure 3. Cumulative probability plots for Verde Lake (A) and Azul Lake (B) at Sete para a atmosfera. Cidades. apresenta uma densa massa de macrófitas e algas. Já no segundo 5. Conclusões caso, sugere-se uma relação com os valores mais baixos, o que se As emissões de CO2 nos lagos estudados parecem estar poderá dever à maior acumulação de sedimentos finos, que essencialmente associadas a uma fonte biogénica. Os valores presumivelmente resulta na menor taxa de decomposição de mais elevados de fluxo de CO2 estão essencialmente relacionados matéria orgânica nestes locais (Fig. 4). com densas massas de macrófitas e algas visíveis à superfície dos lagos, em especial na Lagoa Verde. Os perfis hidrogeoquímicos, assim como a magnitude da emissão de CO2, não evidenciaram a influência do carácter monomítico da Lagoa das Sete Cidades. Com efeito, tendo em conta que ambos os troços da Lagoa não se encontravam estratificados no decurso da campanha de amostragem, não ocorre o aprisionamento de CO2 em profundidade, podendo este ascender livremente até à superfície. O valor estimado total de emissão de CO2 da Lagoa das Sete Cidades foi de ~31 t d-1, que corresponde a um valor aproximado de 7 t km-2 d-1. O desenvolvimento de estudos similares ao presente é importante não apenas como parte do programa de monitorização sismo-vulcânica do arquipélago dos Açores. Com efeito, os resultados obtidos poderão contribuir para identificar possíveis estruturas vulcano-tectónicas, e, eventualmente, avaliar potenciais riscos para as populações na medida que alguns aglomerados urbanos se localizam nas proximidades destas massas de água. Salienta-se, ainda, que os valores estimados permitem calcular com maior confiança o fluxo total de CO2 emitido para a atmosfera em resultado da atividade vulcânica, aspeto crucial para o estabelecimento de balanços geoquímicos a várias escalas.

Agradecimentos Os autores agradecem à Direção Regional do Ambiente pela cedência da embarcação, bem como todas as facilidades concedidas ao longo do trabalho. César Andrade foi suportado por uma bolsa de Doutoramento da Fundação para a Ciência e Figura 4. Mapa de fluxo de CO2 na Lagoa das Sete Cidades (tamanho da célula = 6 x 6 Tecnologia (Referência SFRH/BD/101962/2014). m).

Figure 4. Map of CO2 flux in Sete Cidades Lake (cell size = 6 x 6 m). Referências Contudo, e como referido, todas as populações apresentam Andrade, C., 2014. Emissão de CO2 em lagos vulcânicos dos Açores: valores muito baixos de fluxo de CO2 e devem, por isso, quantificação e implicações hidrogeoquímicas. Dissertação de representar uma origem biogénica. Para comprovar esta hipótese mestrado, Universidade dos Açores, Ponta Delgada, 254. executaram-se determinações de δ13C na água e os valores Andrade, C., Viveiros, F., Cruz, J. V., Branco, R., Moreno, L., Silva, C., obtidos, entre -19,62 e -14,30‰ vs. V-PDB, permitem verificar Coutinho, R., Pacheco. J., 2019a. Diffuse CO2 flux emission in two que são valores compatíveis com uma origem biogénica, valores maar crater lakes from São Miguel (Azores, Portugal). Journal of estes mais leves que o valor atmosférico (δ13C = -8.3‰; Clark, Volcanology and. Geothermal. Research, 369: 188-202. DOI: 10.1016/j.jvolgeores.2018.11.030 2015) e dentro de valores semelhantes a outros lagos nos Açores Andrade, C., Viveiros, F., Cruz, J. V., Coutinho, R., Branco, R., 2019b. (Andrade et al., 2019a, c, d).A emissão total de CO2 estimada na CO2 flux from two lakes in volcanic caves in the Azores (Portugal). CO2 na Lagoa das Sete Cidades 109

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