UNIVERSIDADE DE RIBEIRÃO PRETO CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS, NATURAIS E TECNOLÓGICAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM TECNOLOGIA AMBIENTAL

Estudo dos Impactos Ambientais causados pelo Antigo Lixão, no Jardim Juliana A e Jardim das Palmeiras II

Jeannette Marcean Bervique

Ribeirão Preto 2008

Jeannette Marcean Bervique

Estudo dos Impactos Ambientais causados pelo Antigo Lixão, no Jardim Juliana A e Jardim das Palmeiras II

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Tecnologia Ambiental da Universidade de Ribeirão Preto para obtenção do título de Mestre em Tecnologia Ambiental.

Orientadora – Prof. Dra. Maristela Silva Martinez

Ribeirão Preto 2008

Ficha catalográfica preparada pelo Centro de Processamento Técnico da Biblioteca Central da UNAERP

- Universidade de Ribeirão Preto -

Bervique, Jeannette Marcean, 1956 - B552e Estudo dos impactos ambientais causados pelo antigo lixão, no Jardim Juliana A e Jardim das Palmeiras II / Jeannette Marcean Bervique. - - Ribeirão Preto, 2008. 132 f .: il.color.

Orientador(a): Profa. Dra. Maristela Silva Martinez.

Monografia (mestrado) - Universidade de Ribeirão Preto UNAERP, Tecnologia Ambiental. Ribeirão Preto, 2008.

1. Lixo – Eliminação – ambiental. 2. Resíduos sólidos – Aspectos ambientais. 3. Meio ambiente. I. Título.

CDD: 628.44

Aos meus filhos, Raphael e Jean, que são a luz dos olhos meus...

AGRADEÇO à Prof. Dra. Maristela Silva Martinez, pela orientação, durante a elaboração desta dissertação.

AGRADEÇO ao Prof. Dr. Reinaldo Pisani Junior, pela ajuda na obtenção de materiais para a pesquisa.

AGRADEÇO ao Maurício de Melo Figueiredo Junior, da Secretaria de Planejamento e Gestão Ambiental, pelo fornecimento de documentos e pela prestação de informações valiosas, durante as nossas conversas.

AGRADEÇO ao Sebastião Lásaro Bonadio, da CETESB, que facilitou meu acesso aos documentos pertencentes àquele Órgão.

AGRADEÇO ao amigo Rafael Antonio da Silva Junior, pelo fornecimento de cópias de jornais e documentos da Câmara Municipal.

AGRADEÇO à Breila Pereira Diniz e José Thomaz da Silva, moradores do Jardim das Palmeiras, pelas informações prestadas e pelo acompanhamento, durante as minhas visitas à área de estudo.

AGRADEÇO aos meus pais, Janete e Pilotto, pelo empenho na busca de material para a pesquisa, pela ajuda na organização e correção desta dissertação.

“Quando eu olho para o mundo, eu o adultero uma vez; quando eu penso sobre o mundo, eu o adultero duas vezes; quando eu falo sobre o mundo, eu o adultero três vezes; quando eu escrevo sobre o mundo, eu o adultero quatro vezes. Por isso, se alguma vez eu disse alguma coisa que não corresponde à realidade, não vou brigar com Deus, por não ter feito o mundo assim como eu disse”. (Albert Einstein)

SUMÁRIO

Lista de Figuras

Lista de Tabelas

Lista de Siglas

Resumo

Abstract 1 INTRODUÇÃO 15

2 OBJETIVOS 22

2.1 Objetivo Geral 23

2.2 Objetivos Específicos 23

3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 25

3.1 “O lado sombrio do crescimento” 26

3.2 Conceitos e classificação dos resíduos 30

3.3 Os resíduos sólidos domiciliares como problema ambiental e de saúde pública 32

3.4 Trajetória e destino dos resíduos sólidos domiciliares 35

3.5 Reciclagem: as novas relações com os resíduos sólidos domiciliares 37

3.6 Estudos realizados em antigos aterros sanitários 38

3.6.1 O potencial de biodegradabilidade de dois aterros experimentais no Brasil 39

3.6.2 Geração de metano em aterros 40

3.6.3 Uso de antigos aterros na Flórida 40

3.7 Os resíduos sólidos domiciliares em Ribeirão Preto 46

3.8 O “Antigo Lixão Juliana” 49

3.9 Caracterização do local da pesquisa:Jardim Juliana A e Jardim das Palmeiras II 53

3.10 Degradação ou contaminação ambiental 63

3.11 Medidas de remediação de áreas contaminadas 78

4 METODOLOGIA 85

5 RESULTADOS E DISCUSSÕES 89

5.1 Avaliação da área 91

5.2 O problema sob a ótica dos moradores 96

5.3 Resultados a partir do tratamento dos questionários 103

5.4 Riscos da área 110

5.5 Propostas de mitigação para os impactos causados 112

6 CONCLUSÃO 116

7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 124

ANEXOS 129

LISTA DE FIGURAS

Figura 01 Levantamento aerofotogramétrico 51

Figura 02 Antiga área de disposição de resíduos 65

Figura 03 Projeto urbanístico do Jardim Juliana A 68

Figura 04 Local de coleta do Ponto 1 da CETESB 69

Figura 05 Gráfico indicativo da presença de gases no Ponto 1 69

Figura 06 Local de coleta do Ponto 2 da CETESB 70

Figura 07 Gráfico indicativo da presença de gases no Ponto 2 70

Figura 08 Local de coleta do Ponto 3 da CETESB 71

Figura 09 Gráfico indicativo da presença de gases no Ponto 3 71

Figura 10 Local de coleta do Ponto 4 da CETESB 72

Figura 11 Gráfico indicativo da presença de gases no Ponto 4 72

Figura 12 Arborização 79

Figura 13 Espaços livres 1 80

Figura 14 Espaços livres 2 81

Figura 15 Passarela 82

Figura 16 Escalada 83

Figura 17 Balanço 83

Figura 18 Estrelão 84

Figura 19 Balsa 84

Figura 20 Projeto urbanístico do Jardim das Palmeiras II 92

Figura 21 Projeto urbanístico do Jardim Juliana A 93

Figura 22 Posto de Saúde (abandonado) 93

Figura 23 Projeto urbanístico do Jardim Juliana A – Casas Demolidas 95

Figura 24 Projeto urbanístico do Jardim das Palmeiras II – Casas Demolidas 96

Figura 25 Rua Antonio Abrahão, 153 97

Figura 26 Rua Antonio Abrahão, 153 97

Figura 27 Rua Antonio Abrahão, 153 98

Figura 28 Rua Nicolau R. Cosenza, 85 99

Figura 29 Rua Ignácio Scandar 100

Figura 30 Rua Matilde Pinho Sant’Anna 100

Figura 31 Rua Nicolau R. Cosenza 101

Figura 32 Roedor encontrado no corredor de casa visitada 102

Figura 33 Trecho entre Jardim Juliana A e Parque dos Servidores 110

Figura 34 Trecho entre Jardim Juliana A e Parque dos Servidores 111

Figura 35 Demarcação das residências demolidas 113

Figura 36 Proposta de reurbanização do Jardim das Palmeiras II 114

Figura 37 Proposta de implantação de áreas verdes, canchas de bocha e mesas de jogos no Jardim Juliana A 115

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Período de decomposição dos RSD...... 34

Tabela 2 Distribuição dos respondentes por faixa etária e bairro...... 103

Tabela 3 Distribuição dos respondentes por sexo e bairro...... 104

Tabela 4 Distribuição dos respondentes por estado civil e bairro...... 104

Tabela 5 Distribuição dos respondentes por escolaridade e bairro..... 104

Tabela 6 Distribuição dos respondentes por tempo de residência nos

bairros ...... 105

Tabela 7 Distribuição dos respondentes quanto aos fatores que

motivaram as demolições...... 106

Tabela 8 Distribuição dos respondentes quanto às causas da

depreciação/desvalorização dos imóveis...... 107

Tabela 9 Distribuição dos respondentes quanto aos fatores de risco

observados...... 108

Tabela 10 Distribuição dos respondentes quanto às sugestões para

intervenção nos espaços vazios...... 109

LISTA DE SIGLAS

MPCC Modelo de Produção e Consumo Capitalista

CETESB Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental

COHAB-RP Companhia Habitacional de Ribeirão Preto

PNS Política Nacional de Saneamento

ONG Organização Não-Governamental

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

FEPASA Ferrovia Paulista S. A.

GRAPOHAB Grupo de Análise e Aprovação de Projetos Habitacionais

PAIH Plano de Ação Imediata Habitacional

FGTS Fundo de Garantia por Tempo de Serviço

CEF Caixa Econômica Federal

DURSARP Departamento de Urbanização e Saneamento de Ribeirão Preto

CAEX Centro de Apoio à Execução

NBR Norma Brasileira

EESC Escola de Engenharia de São Carlos

USP Universidade de São Paulo

DDT Diclorodifeniltricloretano

HCB Hexaclorobenzeno

HCH Hexaclorociclohexano

UNAERP Universidade de Ribeirão Preto RSD Resíduos Sólidos Domiciliares

MSW Municipal Solid Waste

RESUMO

Esta dissertação trata das conseqüências sócio-ambientais do impacto causado pelo “Antigo Lixão Juliana” sobre os conjuntos habitacionais Jardim Juliana A e Jardim das Palmeiras II, de Ribeirão Preto – SP, edificados sobre o mesmo. Situa, inicialmente, o panorama atual das questões ambientais, o descaso com que são tratadas, inclusive em sua dimensão humana; e conceitua impacto ambiental, recorrendo a autores nacionais e estrangeiros, situando a questão dos resíduos sólidos como produto da sociedade industrial moderna e contemporânea, e seu modelo de produção e consumo capitalista (MPCC). Expõe a literatura consultada, incidindo sobre as ameaças à habitabilidade do Planeta, e à preservação da vida humana e dos sistemas ecológicos; e inclui aspectos informativos/educativos sobre a questão dos resíduos sólidos, que, pela falta de controle e disposição inadequada, representam uma ameaça à saúde, bem-estar e qualidade de vida dos seres humanos, cujo grande desafio é aprender a lidar com os vários aspectos dos resíduos sólidos, enfocados em nível global e de Ribeirão Preto: desde a fase dos lixões e dos aterros sanitários, até o Programa Lixo Útil (Coleta Seletiva de Resíduos Domiciliares). Discorre sobre os resultados conseguidos e discutidos pela autora, que representam a parte nuclear da mesma, a partir de considerações sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, quanto aos bens a proteger, e sobre degradação ambiental; expõe os resultados decorrentes do exame de documentos oficiais da CETESB, do Ministério Público/Promotoria de Justiça, da Prefeitura Municipal, da COHAB-RP, entre outros; dos jornais diários A Cidade, Verdade e Folha Ribeirão, e de outras fontes bibliográficas que possibilitaram: historiar o Antigo Lixão Juliana e os impactos ambientais por ele causados; caracterizar o local da pesquisa, o Jardim Juliana A e o Jardim das Palmeiras II, considerando-o em seus diferentes aspectos: construção ilegal sobre o “Antigo Lixão”, o comprometimento ambiental decorrente, o comprometimento estrutural das unidades habitacionais, as intervenções do Ministério Público/Promotoria em favor dos mutuários e contra a COHAB, batalha essa que vem se arrastando, até hoje. Conclui pela ocorrência de degradação/contaminação ambiental da área estudada, com base em documentos oficiais; e finaliza com sugestões da pesquisadora para a recuperação/remediação do local da pesquisa, considerado “área contaminada.

Palavras-chave: meio ambiente, resíduos sólidos, impacto ambiental, comprometimento estrutural, área contaminada.

ABSTRACT

This dissertation deals with the social environment consequences of the impact caused by the "old dump site Juliana" on the habitation group of houses in Jardim Juliana A and Jardim das Palmeiras II, from Ribeirão Preto-SP , built on the site. It takes place, primarily, an actual overall view of the environment issues, the careless which such are treated, including the human dimension; and continue environment impact, recurring to national and foreigners authors, placing the issue of solid waste as a product of a capitalist modern industrial society- CMIS. Exposes the literature studied, the treats to life in the planet, and the preservation of human life and the ecological systems; and includes informative/educational aspects about the solid waste issues, the lack of control and not proper exposition are a risk to health, well being and quality of life of human beings, whose greatest challenge is to learn how to deal with the vary aspects of solid waste, and focused in a global level and in Ribeirão Preto: since the time of big dump sites and sanitary landfills , even the program Useful garbage ( Selective collect of housing waste). Reports the results discussed by the author, which represent a nuclear part of the same, from the considerations about National Environment Politics, referring to the protection of goods, and the environment degradation; exposes the results from the exam of official documents from CETESB, from the Minister of Justice, and from the City Hall, and COHAB-RP, among others; from the daily journals A Cidade, Verdade and Folha Ribeirão, and other bibliographic that enable: Historic the old dump site Juliana and the environment impacts caused by it : characterizes the social of the research, Jardim Juliana A and Jardim das Palmeiras II, considering their different aspects: illegal construction on the old dump site , "Antigo Lixão" , the environment damages, the compromise structure of houses, intervention of the Public Ministry in favor of the people who bought the houses again COHAB, a battle that is still unsolved. I understood by the degradation /contamination of the studied area, based in official documents; and suggestions from the researcher to recuperate/ remediate the research area, considering " contaminated area" .

Key-words: environment , solid waste, environment impact , structure compromise , contaminated area .

1 INTRODUÇÃO 16

As questões ambientais começaram a despertar a necessidade de uma reflexão crítica e tomada de decisões, em nível governamental, somente a partir da segunda metade do século XX, quando o incremento da industrialização no Brasil começou a gerar impactos sobre o meio ambiente. Entretanto, este era visto, apenas, do ponto de vista físico: solo, água, ar e vegetação afetados pelo progresso da civilização; e, ainda hoje, pouca coisa existe sobre “meio ambiente como realidade humana” (COIMBRA, 1985, apud VIEIRA, 2002, p.4). Se esta for considerada ao lado dos recursos naturais e do aproveitamento econômico destes, transformando o ambiente natural em ambiente cultural, então, toda questão ambiental evolui para sócio-ambiental, assim como os impactos ambientais decorrentes caminham para sócio-ambientais; estes afetam a vida de pessoas que ocupam os espaços urbanos e rurais, e são descritos como: a compactação desordenada do solo reduzindo a taxa de infiltração das águas das chuvas, a emanação de gases, a infiltração de componentes químicos no solo, a contaminação de lençóis d’água, representando riscos à saúde dos habitantes e à qualidade do morar.

No Brasil, somente a partir da década de 1960, as questões ambientais começaram a ser levadas em conta e contempladas na legislação brasileira. Em

1967, foi instituída a Política Nacional de Saneamento (PNS) e, mais de duas décadas depois, na Constituição Federal de 1988 (art. 225), passou a constar a exigência de estudo e relatório prévio de impacto ambiental, para a instalação de obras ou serviços potencialmente impactantes ao ambiente. Só 20 anos depois, a poluição tornou-se crime ambiental, com o advento da Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998 – a Lei dos Crimes Ambientais, voltada, predominantemente, a questões pertinentes à flora e à fauna; nesta, a questão de lançamento de resíduos 17

sólidos domiciliares (RSD) e de outras substâncias no meio ambiente figura, apenas, no inciso V do seu Art. 54 (VIEIRA, op. cit.).

Estas referências legais não representam toda a legislação ambiental; são alguns tópicos que servem, entretanto, para elucidar o descaso com a dimensão humana, portanto, social, no tratamento de questões ambientais ou sócio- ambientais.

A constatação dessa realidade, através de leituras, de cursos e de observações assistemáticas em alguns espaços urbanos da cidade de Ribeirão

Preto – SP, ensejou a escolha do tema para a realização da pesquisa, voltada, especificamente, para a questão do impacto ambiental causado pelo “Antigo Lixão

Juliana” nos Conjuntos Habitacionais Jardim Juliana A e Jardim das Palmeiras II.

Apesar da recência da legislação e dos estudos sobre questões ambientais no Brasil, e do problema local que motivou a escolha do tema serem atuais, a preocupação e o interesse por tais questões remonta a períodos históricos precedentes. No século XVII, por exemplo, ao cunhar a frase “natureza atormentada”, o filósofo empirista Francis Bacon referia-se à natureza como objeto do conhecimento científico. Segundo esse pensador, o “tormento” do mundo natural significava conhecê-lo – não pelo saber desinteressado – para dominá-lo, transformá-lo e, a partir daí, utilizá-lo de maneira mais eficiente e de forma precisa.

Entretanto, Bacon não imaginou como esse ideal iria atormentar filósofos e cientistas, de todas as áreas do conhecimento, no século XXI (HAAG, 2005).

Haag (op. cit.) refere-se aos perigos da mercantilização da ciência, trazendo

Pablo Rubens Mariconda, da Universidade de São Paulo – USP, para o contexto da discussão, citando-o, literalmente:

18

“Ter a chance de conhecer a fundo os fenômenos e, dessa forma, controlar a natureza, em si, não é um mal. O problema é a utilização estritamente materialista dessa conquista. (...) Sempre que produzimos conhecimento somos responsáveis pelos efeitos colaterais dessa criação” (p. 89).

Mariconda (2003, apud HAAG, op. cit.) insiste, ainda, que a presença de valores não impede a Ciência de atingir um conhecimento objetivo e imparcial; e alerta sobre o perigo da valoração excessiva do controle da Natureza, em detrimento de outras formas de relacionamento com os objetos naturais.

Refletindo essa mesma preocupação, o químico Robert Watson, cientista- chefe do Banco Mundial e um dos idealizadores do Protocolo de Kyoto, vigente a partir de 16 de fevereiro de 2005, afirma que, todos os dias,

“luta contra um inimigo insidioso: o lançamento na atmosfera de milhões de toneladas de um coquetel dos chamados gases estufa – gás carbônico, metano e aerossóis, entre outros vilões. Cerca de um quarto de todo esse lixo, que é responsável pelo aquecimento global, é despejado no ar pelos Estados Unidos...” (WATSON, 2005, p. 24).

Tem-se, hoje, evidências científicas de que a maior parte do aquecimento ocorrido nos últimos 50 anos, bem como outros desastres ambientais, é causada pelos seres humanos, que são afetados no que se refere à moradia, à alimentação, podem sofrer com a falta d’água ou com a piora da qualidade da água disponível, com seus efeitos deletérios sobre a saúde, a generatividade e o “modus vivendi” como um todo, tanto em nível de estilo de vida como em nível relacional. A esse fenômeno dá-se, atualmente, o nome de impacto ambiental.

A questão do impacto ambiental, oriundo da própria atividade humana e com efeitos agressivos para a vida no Planeta, tornou-se um dos temas mais discutidos, desde as duas últimas décadas do século XX e neste início do século XXI.

Entretanto, a preocupação com esta questão retrocede no tempo e pode ser 19

encontrada em muitos pensadores; entre eles, Thomas More (1478 – 1535), filósofo renascentista, que em sua principal obra, A Utopia, expõe suas idéias sobre a comunidade ideal, recomenda que os hospitais e os matadouros sejam construídos fora dos muros da cidade, a fim de que a população não seja afetada em sua saúde por contaminações e pelo hediondo espetáculo da morte de animais, e em sua qualidade de morar pelos dejetos oriundos daqueles abatedouros (MORE, 1972).

Decorrente do processo gradual de agressão à vida no Planeta, pela ação do próprio homem, começa a ser sentida a necessidade de despertar a consciência ecológica e, neste sentido, ocorre um fato, profundamente significativo, que denota uma mutação paradigmática que está ocorrendo no mundo: é o surgimento da

Ecologia, redescoberta nos anos 60, do século passado. Até então, pouquíssimos eram os que se preocupavam com os efeitos do aumento da população, da urbanização e do êxodo rural, da revolução tecnológica na agricultura, na indústria, nos transportes e nas comunicações, entre outros fatores, no meio ambiente.

Entretanto, aos poucos, a consciência da necessidade de preservação do solo, da

água e do ar, principalmente, foi se consolidando, tendo atingido, hoje, uma significativa importância, com a criação de órgãos controladores do processo de poluição; ao lado destes, um sem número de movimentos, associações, organizações, ONG e projetos proliferam em defesa da qualidade de vida e da vida no Planeta, amparados pela Legislação Ambiental.

“A consciência da importância do meio ambiente em relação à vida é cada vez mais acentuada, à medida que se dá a expansão demográfica e a mobilidade populacional é cada vez mais acentuada” (AZEVEDO, 1991, p. 153).

No entanto, ainda se está longe da consecução de metas voltadas à redução dos níveis de impacto ambiental derivados da destinação de dejetos, apesar de 20

medidas tomadas, de multas aplicadas e de uma legislação cada vez mais rígida. As medidas e soluções têm sido tópicas e paliativas; foram criadas estações de tratamento para água, esgoto, ar, entre outras, e por meio delas os dejetos são detectados, devidamente tratados, antes de voltarem a integrar a Natureza.

No que se refere aos RSD – produto da sociedade industrial moderna e contemporânea, e seu “modelo de produção e consumo capitalista – MPCC”

(VIEIRA, op. cit., p. 1) – a falta de instalações e de manejo apropriados é a causa de uma série de moléstias que podem adquirir características de verdadeiras epidemias, além das endêmicas; e, nesse processo, há que se considerar:

“... a participação maciça dos grandes complexos industriais de vários tipos, de onde procede uma série inimaginável de refugos que, sob a forma de matéria sólida, líquida ou gasosa, são incorporados nefastamente ao meio ambiente, causando problemas de várias ordens” (AZEVEDO, op. cit., p. 155).

O Brasil tem um sem número de exemplos a serem citados – mas que não são objeto desta investigação – e a cidade de Ribeirão Preto-SP, a “Califórnia

Brasileira”, também tem alguns. Entre eles, o “Antigo Lixão Juliana”, hoje o solo sobre o qual foram assentados os Conjuntos Habitacionais Jardim Juliana A e

Jardim das Palmeiras II, cujas residências e seus moradores estão sofrendo as conseqüências do impacto ambiental, oriundo daquele depósito.

Os Conjuntos Habitacionais referidos foram definidos como o local desta pesquisa, devido à sua importância no contexto ambiental da cidade de Ribeirão

Preto, uma das maiores e mais expressivas, economicamente, do Estado de São

Paulo. A investigação da qual resultou esta dissertação focalizou, especificamente, os níveis atuais de impacto ambiental causado pelo “Antigo Lixão Juliana” sobre o

Jardim Juliana A e o Jardim das Palmeiras II. 21

Com estas considerações introdutórias, a intenção foi chamar a atenção para um problema, bem próximo de todos nós, e que, direta ou indiretamente, está afetando as nossas vidas; inclusive, devido aos “significados psicológicos do lixo”, expressos com palavras com carga afetiva intensa, tanto em termos de causas como de conseqüências: para as primeiras, desorganização, falta de educação e ignorância; para as segundas, sujeira, doenças, mau cheiro, poluição, insetos e imundície. E sempre os aspectos negativos associados aos RSD prevalecem na consciência das pessoas, na qual “o material lixo e a palavra lixo estão fortemente relacionados à sujeira” (CORTEZ, MILFONT E BELO, 2001, p.25).

2 OBJETIVOS 23

Feitas estas considerações, julgadas necessárias a situar o tema escolhido para esta dissertação, num contexto contemporâneo, se definiu alguns objetivos – o geral e os específicos - com a intenção de ter um lineamento, relativamente seguro, para orientar a trajetória desta pesquisadora, até chegar à consecução dos mesmos.

Portanto, com esta pesquisa, foi possível atingir os objetivos apresentados a seguir e que serão retomados no último tópico desta dissertação, voltado às conclusões ou considerações finais e sugestões.

2.1 Objetivo geral

Como objetivo geral, pretendeu-se investigar os impactos ambientais em dois

Conjuntos Habitacionais de Ribeirão Preto-SP, o Jardim Juliana A e o Jardim das

Palmeiras II, edificados sobre o “Antigo Lixão Juliana”.

2.2 Objetivos específicos

A fim de demarcar uma provável trajetória para esta pesquisa, definiu-se, como desdobramentos do objetivo geral, os seguintes objetivos:

- caracterizar os Conjuntos Habitacionais Jardim Juliana A e Jardim

das Palmeiras II, como o local da pesquisa, considerando que ambos

foram implantados sobre o “Antigo Lixão”;

- identificar os problemas relativos às moradias e aos moradores,

conseqüentes de os mesmos terem sido edificados sobre o “Antigo

Lixão”, através de observação, registro fotográfico e depoimento de

moradores; 24

- qualificar os níveis atuais de impacto ambiental causado pelo “Antigo

Lixão”, nesses conjuntos habitacionais;

- propor medidas envolvendo urbanismo e paisagismo, para atenuar as

conseqüências desses impactos na qualidade do morar de sua

população.

3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 26

Para efeito de sistematização da literatura levantada, a revisão bibliográfica foi dividida em 11 subtítulos, como segue.

3.1 “O lado sombrio do crescimento”

Capra (op. cit., p.226), que assim se referiu às conseqüências do modelo desenvolvimentista americano – reproduzido pelos países em desenvolvimento e outros desenvolvidos - , chama a atenção para as inúmeras ameaças à conservação da habitabilidade do Planeta e à preservação da vida humana, afetadas pelos efeitos do mesmo; desastres ecológicos estão ocorrendo, em nível mundial, e podem, muito bem, resultar num desastre ecológico de grande escala.

O crescimento da população, a superpopulação dos grandes centros urbanos e a tecnologia industrial tem contribuído, de várias maneiras, para uma grave deterioração de meio ambiente natural. A produção contínua e crescente de resíduos sólidos – desde os alimentares aos químicos tóxicos – vem ameaçando nossa saúde, bem-estar e qualidade de vida, seja por falta de controle ou pela disposição inadequada dos mesmos. Em várias cidades do mundo, situadas, por exemplo, na Califórnia, no México, na Grécia, na Turquia e no Brasil, “a poluição atmosférica tornou-se agora um importante risco para a saúde (...) durante a maior parte do ano”; e essa contínua poluição do ar “não só afeta os seres humanos, como também atinge os sistemas ecológicos” (Id., ibid., p.21), provocando alterações na vida vegetal, que podem levar a drásticas mudanças em populações animais que dependem das plantas, inclusive os seres humanos.

Além da poluição atmosférica, a saúde do Planeta, no que se refere ao equilíbrio sistêmico, e a nossa saúde, também, são ameaçadas pela água e pelos 27

alimentos contaminados por uma grande variedade de produtos químicos tóxicos. O envenenamento químico passa a fazer parte, cada vez mais, do cotidiano humano, não só nos grandes centros urbanos, mas em qualquer comunidade humana, inclusive, em menor escala, nas rurais. Em todos os lugares, aditivos alimentares sintéticos, pesticidas, agrotóxicos, plásticos e outros produtos químicos são comercializados numa proporção avaliada, atualmente, em mais de mil novos compostos químicos por ano. E todas essas ameaças à vida – humana, vegetal e animal – constituem efeitos diretos e óbvios da tecnologia humana sobre o meio ambiente natural; os indiretos e menos óbvios, recentemente reconhecidos, ainda não foram compreendidos em toda a sua extensão, como os psicológicos, mentais, motivacionais e relacionais, face aos estressores, cada vez mais numerosos, presentes em nosso cotidiano (PIETRONI, 1998). Quanto ao aspecto psicológico, a depressão grave, as neuroses, a esquizofrenia, as psicoses e outros distúrbios do comportamento, parecem brotar de uma deterioração paralela do meio ambiente social (CAPRA, op. cit.), eis que o funcionamento do mundo é sistêmico: o que acontece em uma parte se reflete no todo. Assim sendo, paralelamente à degradação ambiental, à desintegração social com suas conseqüentes epidemias de transtornos comportamentais – alcoolismo, consumo de drogas, o recrudescimento de crimes violentos, suicídios de pessoas jovens, entre outros – tem-se presenciado um sem número de anomalias na maioria das economias nacionais, como: inflação, desemprego, distribuição desigual de renda e da riqueza, contingentes populacionais abaixo da linha de pobreza, entre outras. A consternação e o desalento, resultantes disso, são agravados pela percepção de que “a energia e nossos recursos naturais – os ingredientes básicos de toda a atividade industrial – estão sendo rapidamente exauridos” (Id., ibid., p.22). 28

O excessivo crescimento tecnológico criou um meio ambiente no qual a vida se tornou doentia: em se tratando das dimensões ambiental e social, física e mental.

Ar poluído, ruídos irritantes, congestionamento de tráfego, poluentes químicos, riscos de radiação, tudo resulta em um aumento de agentes estressores que passaram a fazer parte da vida cotidiana das pessoas. Mais próximos, entretanto, por estarem essas pessoas contribuindo para a sua produção, estão os resíduos sólidos domiciliares e urbanos. Estes, em enormes quantidades diárias, são o resultado dos efeitos combinados do crescimento tecnológico, econômico e populacional. A obsessão pela expansão, pelos lucros crescentes e pelo aumento de produtividade levou países industrializados – à maneira dos Estados Unidos – a desenvolverem sociedades de consumo competitivas, que induzem as pessoas a comprar cada vez mais, a usar cada vez menos e a jogar fora quantidades, cada vez maiores, de produtos de pouca utilidade ou descartáveis (BROWN, 1980, apud

CAPRA, op. cit.).

O problema oriundo dos resíduos sólidos cresce quando se considera que para produzir esses artigos, de uso comum e rotineiro – aditivos alimentares, fibras sintéticas, plásticos para diferentes finalidades, drogas e pesticidas, por exemplo – foram desenvolvidas tecnologias que envolvem consumo intensivo de recursos, sendo que muitas delas dependem, maciçamente, de produtos químicos complexos; e com a produção e o consumo crescentes, o mesmo acontece com os resíduos químicos, que são subprodutos inevitáveis desses processos de fabricação. Só os

Estados Unidos produzem mais de mil novos compostos químicos por ano, muitos deles mais complexos que seus predecessores e mais estranhos ao organismo humano, como, também, à fauna e à flora; ao mesmo tempo, o montante anual de 29

lixo de alto risco é crescente, em média, 35 milhões de toneladas em uma década; e a tendência constante é aumentar (CAPRA, op. cit.).

Enquanto a produção e o consumo crescem em ritmo acelerado, o desenvolvimento de tecnologias apropriadas, para dispor dos subprodutos indesejáveis, ainda, é precário. A explicação para tal negligência é simples: a produção de bens de consumo descartáveis é altamente lucrativa para os fabricantes, ao passo que o tratamento apropriado e a reciclagem dos resíduos não são. Desde muitas décadas passadas, os resíduos sólidos domiciliares e urbanos, e os resíduos perigosos classe A (MONTEIRO, et al., 2001) não vêm sendo tratados de forma adequada, apesar da existência de Legislação Ambiental; as indústrias químicas despejam seus lixos no solo, sem as salvaguardas adequadas; os efluentes domésticos e industriais – resíduos da atividade doméstica e industrial misturados à água utilizada para efetivar seus processos – são descartados nos condutos de esgotos ou em águas naturais, contendo altas concentrações de dejetos. O esgoto doméstico é constituído, basicamente, de: urina, fezes, papel, sabão, detergentes sintéticos, restos de alimentos, terra, graxa, cosméticos, sais,

óleos, micro-organismos e outros dejetos; e os industriais têm, na sua composição: matéria orgânica, corantes, ácidos diluídos etc., em altas concentrações. Em ambos os casos, os esgotos não recebem tratamento, cujo objetivo é torná-los apropriados para serem descartados em águas naturais, salvo os casos em que a água é utilizada para beber, preparar alimento, entre outras finalidades domésticas

(MENEZES, 1996).

Os fenômenos ambientais, aqui descritos, evidenciam que há um conflito entre o ser humano e a natureza; que o meio natural e o meio social continuam como duas antíteses, sem a harmonia dialética; que o progresso interessa mais que 30

o processo; que a visão científica da natureza é fortemente mecanicista e utilitarista; que a natureza e seus recursos naturais estão aí, para que o homem os investigue, os entenda, para melhor dominá-los e usá-los em proveito de seus projetos de crescimento material. Isto coloca um sério problema na relação do homem com a natureza: “Como conciliar um ser originalmente natural (e, portanto, sem propósito) como o homem, com os projetos deste acerca de si mesmo e da natureza?”

(NASCIMENTO JR., 1996, p.46).

3.2 Conceitos e classificação de Resíduos Sólidos

O conceito de reciclagem de resíduos não é recente. Já nos idos do século

XVIII, Lavoisier, químico francês e fundador da Química moderna, com seu talento observador, constatou que reciclar é um fenômeno natural, integrante do processo de autopreservação da Natureza. E ele formulou essa concepção na conhecida frase: “Na Natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”. Então, os resíduos sólidos não são um problema da Natureza, mas do ser humano; e assim sendo, o homem deve tratar de equacioná-lo, a fim de que o meio ambiente em que ele vive e do qual faz parte, continue sendo uma casa habitável, com boa qualidade.

A Ciência vem evidenciando que muitos recursos naturais são esgotáveis e limitados; a capacidade humana de criar inovações tecnológicas não leva isso em conta; e o modelo atual de desenvolvimento, fruto da Revolução Industrial (iniciada há mais de dois séculos), tem no seu bojo que o progresso significa produção e consumo de bens materiais. Com isso, a industrialização crescente, a partir de 1950, a produção, e o consumo de bens de curta duração e de descartáveis, fizeram aumentar o volume de RSD gerado pelas atividades humanas. E a mentalidade 31

descartável veio se difundindo, aliada ao fator tempo e aos conceitos de praticidade e facilidade; e as decisões do consumidor passaram a ser influenciadas por esses novos valores, substituindo a durabilidade como critério da escolha de bens e produtos (MATOS et al., 1999).

O progresso da civilização é evidente, sustentado pela idéia de produção e consumo de bens materiais, exacerbada pela mentalidade descartável; entretanto, esse modelo de desenvolvimento pouco atentou para o uso racional dos recursos naturais, pela preservação e conservação, além da recuperação do meio ambiente, no que ele já foi degradado pela ação do homem. Nas discussões pertinentes à preservação, conservação e recuperação do meio ambiente – considerando como pano de fundo o uso racional dos recursos naturais - a questão dos resíduos sólidos, em termos do que é, de como é produzido, para que serve e o que fazer com ele, cresce em importância. Eis que, no mundo contemporâneo o fenômeno da produção de RSD é irreversível e tende a produzir efeitos nocivos à vida humana, cada vez maiores.

Entretanto, uma mudança de atitude e a criação de atitude preventiva, em relação às conseqüências da produção de RSD, passa pela necessidade de uma re- significação dos RSD; pois, a definição contida nos dicionários, apenas com conotações negativas, já não serve mais. RSD deve ser entendido, hoje, como todo resíduo descartado pelos seres humanos ou gerado pela Natureza, em aglomerações urbanas ou em localidades rurais; também, tudo aquilo que é jogado fora, por não ter mais serventia ou valor comercial. Porém, o conceito de utilidade é relativo, pois materiais que são descartados por certas pessoas podem ser reaproveitados por outras, passando a ter inclusive um valor econômico. 32

A decisão do que fazer com os resíduos sólidos, bem como, de qualquer proposta de coleta seletiva, implica conhecer a classificação, simples e abrangente, dos RSD produzidos, como resultado das atividades humanas cotidianas (Id., ibid.).

De acordo com Monteiro (2001), os critérios para a classificação dos resíduos sólidos são estabelecidos pelas NBR 10.004, 10.005, 10.006 e 10.007 da ABNT

(2004):

- os de classe I ou perigosos: que são aqueles que, em função de suas características intrínsecas de inflamabilidade, corrosividade, reatividade, toxicidade ou patogenicidade, apresentam riscos à saúde pública.

- os de classe II ou não perigosos, que ainda podem ser não-inertes (Classe II

A) ou inertes (classe II B). Os não-inertes (Classe II A) são os resíduos que podem apresentar características de combustibilidade, biodegradabilidade ou solubilidade, com possibilidade de acarretar riscos à saúde ou ao meio ambiente, não se enquadrando nas classificações de resíduos classe I ou classe II B. O inertes (classe

II B) são aqueles que, por suas características intrínsecas, não oferecem riscos à saúde e ao meio ambiente e, quando amostrados segundo a norma NBR 10.007, não tiverem nenhum de seus constituintes solubilizados a concentrações superiores aos padrões de potabilidade da água.

3.3 Os resíduos sólidos domiciliares como problema ambiental e de saúde pública

Todo o resíduo produzido, em nível urbano, rural e na Natureza, pode ser enquadrado em duas grandes categorias: biodegradável e não-biodegradável. A biodegradação é um processo natural de decomposição pela ação de fungos e 33

bactérias, que se alimentam de matéria orgânica – de origem animal e vegetal - transformando-a em compostos mais simples que voltam ao ambiente; a reciclagem, portanto, se faz, naturalmente (VIEIRA, op. cit).

Por outro lado, segundo o mesmo autor, os resíduos produzidos pelo homem, junto aos resíduos orgânicos, contém muitos compostos oriundos de produtos industrializados, cuja decomposição não é tão fácil como acontece com os orgânicos. O período de decomposição varia lentamente, conforme indica o rol da

Tabela 1, do tempo aproximado.

Esse período de decomposição varia bastante, pois os diversos materiais, quando encapsulados debaixo de uma montanha de lixo, podem permanecer intactos durante muitos e muitos anos, inclusive a matéria orgânica. Os arqueólogos do lixo já encontraram, nos Estados Unidos, por exemplo, uma alface que estava encoberta num aterro sanitário havia quatro anos (Id., ibid).

Acrescente-se, à questão em pauta, que a maior parte do lixo do Planeta é lançada, irresponsavelmente, nos lixões a céu aberto ou em cursos d’água; sem deposição adequada, os resíduos sólidos acabam causando problemas ambientais castastróficos, afetando a qualidade de vida e a saúde da população: os gases e o chorume (líquido escuro) produzidos pela decomposição emanam o mau cheiro; e o chorume se infiltra, poluindo o solo e os lençóis d’água, inclusive as fontes de água potável. Sem contar que o lixo em decomposição atrai animais (insetos e roedores, responsáveis pela transmissão de doenças graves). Tem-se aí um sério transtorno à saúde pública (MATOS et al., op. cit.).

34

Tabela 1 – Período de Decomposição dos RSD - Fonte: King Kount Solid Waste Division Seatle, Washington – setembro – 1989 (apud MATOS et al., 1999).

Material Tempo

Papel 2 a 4 semanas

Tecido de algodão 1 a 5 meses

Corda 3 a 14 meses

Meia de lã 1 ano

Vara de bambu 1 a 3 anos

Chiclete 5 anos

Estaca de madeira 13 anos

Lata de conserva 100 anos

Lata de alumínio 200 a 500 anos

Plástico até 450 anos

Fralda descartável indeterminado

Garrafa de vidro indeterminado

Pneu Indeterminado

35

Outros danos ecológicos, muitas vezes, irreversíveis, são produzidos quando os resíduos são jogados nas ruas, em canais de drenagem, em encostas, manguezais, córregos e rios, cujo destino é o mar. Também, a deposição de resíduos nos oceanos, hoje em desuso, face à preocupação mundial com essa prática, por causar sérios problemas à navegação e à maricultura, bem como à fauna e à flora submarina; por exemplo, a morte de animais marinhos por estrangulamento ou asfixia, ao engolirem sacos plásticos. Outra questão preocupante é a queima do lixo, que tem como uma das principais desvantagens, a formação de poluentes atmosféricos (material particulado, NOx, SO2, HCl, CO, dioxina), trazendo danos à saúde e incômodos à população, além de provocar incêndios, difíceis de controlar. Nem o espaço sideral escapa à ação humana, que o converte em depósito de lixo; satélites abandonados e outros objetos artificiais descartados nas explorações e viagens espaciais estão orbitando a Terra, provocando colisões e fazendo do céu um espaço perigoso (Id., ibid.).

3.4 Trajetória e destino dos resíduos sólidos domiciliares

Considerando a composição, a quantidade e a qualidade do RSD, produzido no dia-a-dia brasileiro, é interessante conhecer alguns dados. Quanto à composição gravimétrica, distribui-se em 65% de matéria orgânica, 3% vidro, 4% metal, 3% plástico e 25% papel, e estima-se que cada brasileiro produz de 0,5 a 0,8 kg por dia

(MONTEIRO et al., 2001); mas a quantidade e a qualidade produzidas, em nível urbano, variam segundo alguns fatores socioculturais e econômicos: nível de renda familiar, grau de industrialização dos alimentos, hábitos de consumo da população e nível de consciência das pessoas quanto ao destino do RSD (Id., ibid.). 36

Em se tratando de limpeza urbana, serviço pertinente ao saneamento básico e à saúde pública, esta compete ao poder público municipal; é realizada por órgãos de sua administração direta ou indireta, ou terceirizada; esta forma pode ser conflituosa, devido à lógica empresarial que move a produção de bens e serviços, nem sempre comprometida com a educação ambiental e a qualidade de vida

(VIEIRA, op. cit.).

Segundo Matos et al. (op. cit), considerando o tratamento de resíduos gerados diariamente no Brasil, em torno de 90 mil toneladas, tem-se a seguinte distribuição da destinação (IBGE, 2001): 76% lixão, 13% aterro controlado, 10% aterro sanitário e 1% incineração; não está incluída a coleta seletiva, devido à recência desse sistema. No lixão, os resíduos sólidos são jogados a céu aberto, com as conseqüências ambientais e sociais, já referidas; no aterro controlado, o lixo é despejado sobre o solo, compactado e coberto de terra, em camadas sucessivas; e no aterro sanitário, há a impermeabilização do solo antes do início da deposição dos resíduos, drenagem do chorume, captação do gás produzido e correta compactação das camadas de terra, evitando-se a presença de animais e de catadores.

A mesma autora informa que a incineração se destina a lixos de fontes especiais, prevenindo a contaminação ambiental e humana, com certos materiais e produtos; entretanto, o alto custo operacional e o risco de poluição atmosférica constituem-se desvantagens; ainda, no Brasil, as usinas de incineração não contam com sistemas de reaproveitamento do calor gerado pela combustão do lixo. Por fim, as usinas de reciclagem, onde o lixo é separado em materiais secos (papéis, vidros, plásticos e metais) e orgânicos (resíduos animais e vegetais); os primeiros vão para as usinas de reciclagem e retornam ao ciclo econômico,e os segundos são transformados em um composto orgânico usado na agricultura, através de um 37

processo biológico chamado compostagem. A qualidade de ambos é inferior aos provenientes da coleta seletiva, em que os materiais já são separados nas fontes produtoras de lixo.

3.5 Reciclagem: as novas relações com o lixo

Neste momento histórico que o mundo atravessa, o reaproveitamento dos restos da produção industrial e do consumo urbano, se impõe para a conservação dos recursos naturais e a preservação do Planeta. Trata-se da reciclagem do lixo, que implica uma mudança atitudinal quanto à maneira de produzir, consumir, descartar, e de os seres humanos se relacionarem entre si e com o meio ambiente.

A maioria dos países europeus já tem a coleta seletiva como um hábito incorporado e, com isso, a tendência atual é diminuir a quantidade de lixo produzida; e reduzir é mais ecológico que reciclar: o cidadão paga pelo lixo produzido, embalagens biodegradáveis custam menos e as empresas são responsáveis legais pelo recebimento do seu produto depois de sua utilização pelo consumidor; por exemplo, a carcaça de um automóvel é de responsabilidade de sua montadora, na

Alemanha (MATOS, op. cit.).

A solução para o lixo urbano, segundo Matos et al. (op. cit.), requer uma mudança de atitude, que passa pelo princípio 3R: reduzir a produção do lixo, que implica pensar antes de comprar, escolher produtos em embalagens recicláveis, comprar só o que for usar e diminuir o consumo de materiais que resultam em lixo tóxico; reutilizar, que significa preferir as embalagens retornáveis, ser criativo no uso do material antes de descartá-lo, usar frente e verso do papel para escrever ou para imprimir, enviar livros em desuso para sebos e bibliotecas públicas, levar roupas e 38

móveis usados para brechós ou doá-los etc.; e reciclar, ou seja, voltar ao processo de produção os materiais usados e descartados (papel, plástico, vidro e metal), pois a reindustrialização reduz a extração de recursos naturais; começar a reciclagem em casa com a separação de materiais, aprender a reciclar artesanalmente papéis e a compostagem do material orgânico; e em grande escala, tem-se as usinas de reciclagem.

Segundo um artigo de Evandro Spinelli para o Jornal Folha On line, veiculado no dia 11 de maio de 2003, Ribeirão Preto deixa de arrecadar 7,2 milhões de reais por ano com a falta de um programa abrangente de coleta seletiva de lixo, que poderia vir da venda de papéis, vidros, plásticos e metais, que são despejados no aterro sanitário.

Na cidade, apenas 20 bairros têm coleta seletiva, mesmo assim, em cada bairro, o caminhão do “lixo útil”, como é conhecido, só passa uma vez por semana.

Somando o que a coleta nas casas recolhe, com o que é depositado pela população em 237 pontos de entrega voluntária espalhados pela cidade, são recolhidas, diariamente, 8 toneladas de lixo reciclável, ou seja, apenas 1,6% das 490 toneladas de resíduos produzidas por dia.

3.6 Estudos realizados em antigos aterros sanitários

Em diversos locais espalhados pelo mundo, tentou-se dar novos usos para antigos aterros sanitários. Na leitura de alguns artigos, pode-se constatar que, na maioria dos casos, não é recomendável a construção para fins habitacionais.

39

3.6.1 O potencial de biodegradabilidade de dois aterros experimentais no Brasil

Durante um ano foi realizado o monitoramento da biodegradabilidade anaeróbia de resíduos sólidos, do potencial de geração de metano e da composição microbiológica de dois aterros sanitários experimentais, construídos de modo similar aos aterros convencionais, com drenagem de chorume, coletores de biogás e recobertos de solo e grama. A decomposição dos resíduos foi estudada sem reciclagem do chorume. A quantidade total de MSW (resíduos sólidos municipais), em ambos os aterros, correspondia a onze anos de resíduos sólidos urbanos produzidos em uma cidade brasileira com 2000 habitantes, com nível econômico similar ao de pequenas cidades na Europa. A caracterização do MSW foi baseada sobre oito amostras de lixo (100 kg cada), obtidas em quatro diferentes áreas da cidade de São Carlos, Estado de São Paulo, durante o verão e o inverno. O MSW foi classificado como alimento/jardinagem, papel, vidro, metal, plástico, trapo, madeira/couro/borracha e outros. Os resíduos sólidos municipais (MSW) continham de 50 a 70% de matéria orgânica e a sua degradação anaeróbia foi confirmada pela formação de metano e chorume, através do método de potencial de metano, descrito por Mounton et al. (1985, apud VAZOLLER et al., 2001). Observou-se que, apesar da grande heterogeneidade dos resíduos sólidos, os resultados em termos de estabilização da matéria orgânica durante a fase de produção de metano foram similares para os dois aterros. Ambos os sistemas apresentaram as mesmas faixas de produção de metano (91,5 L CH4/kg STV – sólidos totais voláteis) e de ácidos orgânicos, principalmente ácidos acético e butírico. Isolou-se ainda, culturas bacterianas dos gêneros Megasphaera, Selenomonas, Methanobacterium,

Methanobrevibacter and Methanosarcina. 40

3.6.2 Geração de metano em aterros

O gás metano é um subproduto de resíduos sólidos municipais (MSW) aterrados. A maior parte do MSW global é despejado em aterros não- regulamentados e o metano gerado é emitido para a atmosfera. Alguns dos modernos aterros regulamentados preocupam-se em capturar e utilizar o biogás , uma fonte renovável de energia, para gerar eletricidade ou calor. Até 2001, havia cerca de mil aterros coletando biogás em nível mundial. Nos Estados Unidos, os aterros que capturam metano nos aterros, coletam cerca de 2,6 toneladas anualmente, 70% do qual é usado para gerar calor e/ou eletricidade (Themelis;

Ulloa, 2001). Estudos teóricos e experimentais indicaram que a biodegradação anaeróbia completa dos MSW gerou em torno de 200 Nm3 de metano por tonelada de biomassa seca compactada. Em digestores industriais anaeróbios, essa proporção de geração de metano alcança de 40 a 80 Nm3 por tonelada de resíduos orgânicos. Tem-se notícia, também, de que vários aterros americanos coletam aproximadamente 100 Nm3 de metano por tonelada de MSW aterrado em um dado ano. Essas descobertas conduzem a uma estimativa média de geração de metano em torno de 50 Nm3 por tonelada de MSW aterrado. Em conseqüência, pelo aterramento global estimado em 1,5 bilhões de toneladas anualmente, a taxa correspondente de geração de metano em aterros é de 75 bilhões Nm3 e, até o presente momento, menos de 10% desse potencial é capturado e utilizado.

3.6.3 Uso de antigos aterros na Flórida

Estudos realizados por Martin e Tedder (2002) indicam que, muitos dos municípios e regiões mais populosas da Flórida estão sendo pressionados para 41

incrementar o uso desses locais com propriedade. Os usos recreacionais são muito populares e surgem como uma das melhores opções para manter a proteção ambiental, garantindo segurança pública e propiciando um uso alternativo e bem sucedido para esses locais. Por outro lado, os autores afirmam que, a construção de estruturas sólidas sobre esses antigos aterros, principalmente, condomínios residenciais, continua gerando preocupação e não é recomendada.

Martin e Tedder (2002) apresentam estudos de caso, afirmando, inicialmente, que o uso bem sucedido de antigos aterros requer planejamento muito avançado, construção apropriada, monitoramento e manutenção subseqüentes. Precisam ser considerados vários fatores, tais como: localização e topografia do terreno, características dos resíduos, exigências do fechamento e manutenções posteriores, monitoramento e controle de emanação de gases, monitoramento da qualidade da

água, estabilidade estrutural do aterro quando em uso, saúde humana e proteção ambiental e, principalmente, envolvimento e apoio da comunidade envolvida.

Foram selecionados quatro aterros para estudos de caso, cujos projetos estavam locado sobre ou próximos aos aterros. Os dois primeiros casos apresentaram dificuldades no que concerne à saúde humana, devido à desconsideração de alguns fatores acima referidos; os outros dois foram considerados bem sucedidos.

O Hampshire Homes Landfill, localizado na cidade de Miramar, Broward

County, Flórida, recebeu, primeiramente, resíduos de escombros de construções, provenientes de casas construídas como parte de um amplo loteamento do um projeto conhecido como Hampshire Homes Subdivision. O lote onde o aterro estava localizado era a parte mais elevada do loteamento e foi planejada para ser utilizada como área de contenção de enchentes. Os escombros das construções foram usados como aterro na preparação da fundação dessa área. Ao final do projeto, os resíduos dos escombros foram nivelados, cobertos com solo e, então, cobertos por 42

grama. Foram construídas 20 casas em torno desse perímetro. Quando o loteamento foi concluído, o quintal comunitário partilhado pelas residências tornou- se um atratativo parque para as crianças que viviam ali.

Em 1996, cinco anos após a conclusão do projeto, crianças noticiaram afundamentos no quintal comunitário. Esses buracos foram examinados pelos pais, que relataram ter visto, dentro deles, vários tipos de resíduos, incluindo madeira, pneus, caçambas e outros escombros de construções. Assim, o único atrativo comunitário, tornou-se um lago com resíduos em vez de uma “praia coberta de areia”... Uma pesquisa com radar no subsolo mostrou que nenhuma das casas havia sido construída sobre os resíduos, mas os proprietários ficaram muito irritados, porque o valor de seus imóveis foi reduzido, como resultado da publicidade negativa.

Cada um deles foi compensado, pela companhia de desenvolvimento, com uma quantia não revelada.

O Gunn Highway Landfill está localizado próximo à rodovia Gunn Highway, em Tampa, Hillsborough, Flórida, o aterro foi usado para a disposição de resíduos sólidos municipais (MSW) de 1958 a 1962, ocupando uma área de, aproximadamente, 15 acres. Após o fechamento do aterro, a propriedade foi loteada para desenvolvimento. Um total de 13 prédios de apartamentos e a sede de um clube foram construídos sobre a área do aterro. De acordo com um relatório de uma investigação feita por uma firma de consultoria, segundo Geraghty e Miller (1996, apud MARTIN e TEDDER, 2002), as fundações estruturais foram construídas como segue:

“O complexo está fundado sobre colunas de madeira e sistemas de laje estrutural de concreto pós-tensionado, devido às condições do subsolo. As plantas da construção, aprovadas pelo município de Hillsborough, indicava que uma membrana sintética seria instalada sob as lajes, para bloquear e dispersar a migração de gás metano, gerado pela decomposição dos resíduos sólidos”.

43

Apesar dos esforços, durante a construção, para prevenir a geração de gás metano, os problemas apareceram no final de 1980. Além dos gases permeando as estruturas, a disposição diferenciada dos resíduos resultou em fraturas das mesmas.

Numerosas investigações foram realizadas nas propriedade, avaliando se o gás metano estava migrando entre as estruturas e se havia a possibilidade de que ele migrasse para fora do condomínio. Alguns registros de monitoramente chegaram a detectar concentrações de gás metano em níveis significativamente superiores ao limite mínimo para não ocorrerem explosões. O gás foi detectado sob as lajes da sede do clube e em muitos prédios de apartamentos. Felizmente, não foi detectada a presença do gás nos apartamentos localizados no primeiro andar. Ventilação adicional foi acrescentada e as lajes-piso foram revestidas numa tentativa de se minimizar os riscos de acúmulo de gás. Com o passar dos anos, os níveis de gás vem diminuindo no local.

O Dyer Road Landfill, localizado próximo à Dyer Road, oeste de Riviera

Beach, no município de Palm Beach, na Flórida, era operado pela Solid Waste

Authority do município de Palm Beach, entre 1970 e 1980 e recebia resíduos sólidos municipais, escombros de construção e demolição e lixo. O aterro ocupava uma gleba de 405 acres, mas apenas em 253 havia resíduos aterrados. Em 1990, foi encerrado e coberto com um sistema de revestimento em PVC. Um sistema de extração de gás também foi instalado para coletar e queimar os gases combustíveis gerados na decomposição dos resíduos.

A Solid Waste Authority decidiu usar a área para propostas recreacionais. Em fevereiro de 1996, iniciou a construção de um projeto para converter o aterro em um belíssimo parque paisagístico denominado Dyer Park, que foi concluído em 44

setembro de 1997. Agora, o Dyer Park possui pistas para “mountain bike”, trilhas eqüestres e para caminhadas, campo de futebol e um sistema de espelhos d’água que servem como habitat para pássaros e outros animais silvestres. Segundo

Hodgkins (1997, apud MARTIN e TEDDER, 2002), o projeto custou US$ 5,6 milhões, aproximadamente. Até o momento, não se tem conhecimento de nenhum prejuízo ambiental ou conseqüências para a saúde humana, associadas ao uso do

Dyer Road Landfill como um parque recreacional.

O aterro St. Lucie County Northeast Airport, localizado ao lado do Aeroporto, com uma área de 300 acres, os resíduos foram depositados em uma vala não forrada de, aproximadamente, 150 acres. O aterro começou a funcionar em 1968 e recebeu resíduos sólidos municipais, industriais, resíduos de saúde e outros tipos de resíduos perigosos. Recebeu, também, materiais descartáveis, sucatas de automóveis e entulhos de terra, operando com pouca ou nenhuma regulamentação federal ou estadual. Em 1974, o aterro foi fechado para a disposição de resíduos, pois estava atraindo aves e causando perigo nas proximidades do Aeroporto. Em

1980, foi confirmada a contaminação de águas subterrâneas por compostos orgânicos voláteis e o Departamento exigiu remediação e fechamento oficial do aterro. O município iniciou um processo de estudo de opções viáveis para o encerramento.

A opção selecionada incluía a recuperação e um sistema de tratamento da

água subterrânea, um projeto para proteção das espécies de animais existentes no local e a construção de um campo de golfe como gerador de renda. O projeto foi considerado concluído em 1993, com um custo aproximado de US$ 7,32 milhões, segundo Hazen e Sawyer (1993, apud MARTIN e TEDDER, 2002). E, no primeiro ano de funcionamento, o campo de golfe atraiu mais de 70 mil jogadores e turistas, 45

tendo uma receita de US$ 1,8 milhões. O espaço continua sendo bem sucedido, com gerador de renda para o município e proporcionando proteção ambiental. Ele funciona conforme planejado, com exceção do controle de águas, por conta das tempestades tropicais que assolam a costa sudeste, causando graves inundações.

Apesar de terem sido poucas experiências, algumas lições oriundas desses usos ficaram bem claras. Embora algumas dessas lições não sejam novas, elas confirmam o que outras observaram e experimentaram com fechamento de aterros; e reforçam a necessidade contínua de projetos de engenharia e construções adequadas às propostas de intervenção. No geral, as lições são as seguintes:

- o potencial de antigos aterros em gerar níveis perigosos de gás metano, por muitos anos, não deve nunca ser ignorado ou tratado superficialmente, em qualquer projeto de uso dos mesmos. Mesmo quando o controle de gases é incluído nos projetos de engenharia, ainda podem ocorrer problemas. Portanto, deve-se cuidar para que a saúde humana seja protegida.

- a construção de estruturas sólidas sobre antigos aterros devem incluir rigoroso estudo dos requisitos de fundação (alicerce), pois a camada de cobertura colocada sobre os resíduos não será uma adequada fundação para as estruturas construídas sobre esse terreno. E, o reforço com estacas, nem sempre é adequado.

- os legisladores precisam elaborar normas mais claras que ajudem a orientar o uso desses antigos aterros.

- quando são adequadamente projetados, construídos e operados, o uso de antigos aterros pode promover a proteção ambiental, proteger a saúde humana e possibilitar alternativas benéficas. Usos recreacionais parecem ser a melhor opção, enquanto que, a construção de estruturas sólidas, principalmente, conjuntos habitacionais, devem ser evitadas. 46

3.7 O lixo em Ribeirão Preto

Em um artigo intitulado “Gestão de resíduo sólido doméstico da cidade de

Ribeirão Preto-SP: histórico, avaliação e recomendações”, seus autores, Cardoso e

Teixeira (s.d.), discorrem, objetivamente, sobre a questão-título, que fornece as informações, a seguir.

No ano de 1856, nasceu a cidade de Ribeirão Preto e seus poucos habitantes já produziam resíduos, até então denominado “lixo”. Esses resíduos, por serem, em grande parte, resultantes de sobras orgânicas, eram utilizados como alimento para animais domésticos e como adubo nas pequenas plantações, nos fundos dos quintais. Com o crescimento da população, a quantidade gerada e a disposição inadequada começaram a preocupar os governantes, que adotaram medidas emergenciais, que mais tarde seriam transformadas em leis, regulamentando o serviço de limpeza pública na cidade. O “lixo” passou a ser recolhido por funcionários municipais e levado por carroças para terrenos situados fora do perímetro urbano ou para chácaras, que utilizavam os detritos como componentes de adubo orgânico. Em 1902, foi criado o Código de Posturas, que regulamentava os procedimentos internos do governo municipal; nele, o Capítulo II tratava, especificamente, da Higiene das Habitações (CARDOSO e TEIXEIRA, op. cit.).

Em 1908, foi adotado um novo procedimento: uma parte do lixo coletado nas ruas era vendida, para chacareiros, através de concorrência pública, e a parte excedente continuava sendo depositada nos arredores da cidade, causando constantes reclamações, além de contribuir para a falta de higiene. Em 1917, os resíduos passaram a ser triturados em “equipamentos apropriados” e, após esse 47

processo, transformavam-se em excelente adubo, que era vendido pela Câmara

Municipal (Id., ibid.).

Segundo esses autores, a partir de 1960, as mudanças ocorreram de forma significativa, pois as novas leis permitiram: a aquisição de caminhões para os serviços de coleta, incineradores, exploração e industrialização dos resíduos, carrocerias coletoras e compactadoras. Em 1966, todas as 80 carroças, do sistema de coleta a tração animal, foram substituídas por 19 caminhões; e, em 1969, foi institucionalizado o “lixão a céu aberto”, que constituía na deposição dos resíduos em terrenos baldios, de propriedade do poder público, sem passar por nenhuma forma de tratamento.

Em 1973, quando o lixo passou a ser, obrigatoriamente, embalado em sacos plásticos, surgiu um novo problema: a sua disposição final foi agravada, em virtude da dificuldade de degradação natural do plástico, provocando a saturação gradativa das áreas disponíveis para os lixões. A falta de uma política de gestão dos resíduos, por parte do poder público, estendeu esse problema por quase 20 anos. Somente em 1989, com a intervenção do Ministério Público e dos meios de comunicação, a

Prefeitura Municipal, através da promulgação de lei, desapropriou uma área para a construção de um aterro sanitário, no município (Id., ibid.).

Com a implantação progressiva, em 1991, do Programa Lixo Útil (Coleta

Seletiva de Resíduos Sólidos Domiciliares), em alguns setores da cidade, esperava- se uma mudança de postura; mas, devido à morosidade na ampliação do programa, não ocorreu a diminuição do uso do aterro sanitário, acelerando o término de sua vida útil prevista e a conseqüente necessidade de desapropriação de outra área para a construção de um novo aterro (Id., ibid.). 48

Cardoso e Teixeira (op. cit.) esclarecem que as áreas degradadas pelo uso inadequado como lixões, tais como Jardim Dutra 1, Jardim Juliana A, Jardim das

Palmeiras II, Parque dos Servidores e Estrada de Serrana, não tiveram qualquer tipo de tratamento especial após o encerramento, a não ser uma cobertura superficial com solo da região, sendo que, os três primeiros, tiveram parte de suas áreas utilizadas para a implantação de conjuntos habitacionais pela COHAB. A quarta área

(Estrada de Serrana), por ser mais confinada, foi utilizada por um período maior; e por estar em contato, praticamente direto, com o afloramento do Aqüífero Guarani, sofreu, e ainda sofre, algumas intervenções no sentido de monitoramento de suas condições, visando à prevenção dos riscos de contaminação dessa importante área de recarga do manancial subterrâneo.

Informam, também, que a primeira área utilizada como aterro sanitário, situada na estrada Mário Donegá, que teve sua vida útil encerrada em 2000, não obedeceu à cota original do projeto. Foram executadas camadas excedentes, numa tentativa de se ganhar tempo, até a desapropriação do terreno vizinho e adequá-lo

às condições necessárias para a utilização como novo aterro.

Avaliando o histórico descrito, pode-se constatar que houve uma falta de acompanhamento ou seguimento dos planos propostos pelo poder público. Vários projetos apresentados, que resultariam em possíveis soluções ao longo do tempo, foram abandonados. Até hoje, a situação permanece sem definição; isso sugere que os governantes, ainda, não estão devidamente sensibilizados com a degradação ambiental antrópica.

Há que se considerar que a Gestão de Resíduos Sólidos Domiciliares envolve políticas para a solução de cada uma das fases do problema, ou seja, desde a geração, programas para redução, reaproveitamento, coleta, tratamento/reciclagem/ 49

compostagem e disposição final. Para que tenha condições de ser implantada, exige a obediência aos planos e projetos, que levam anos em estudos e que, normalmente, são ignorados, pois estão atrelados aos mandatos dos governantes e, por isso, não têm uma seqüência lógica.

Outra forma de se chegar a essa Gestão, é através da conscientização da população, de seus deveres e direitos. A Educação Ambiental, hoje tratada como tema multidisciplinar nas escolas, é uma das soluções para a tomada de posição de todos os envolvidos. Com isso, todos aprendem a valorizar o seu entorno: a casa, a rua, o bairro, a escola e a cidade. A sociedade deve participar de todas as fases do processo, que modifica para melhor ou para pior as suas condições de vida. Para que isso aconteça, é preciso que tenha acesso às informações pertinentes ao assunto e que tenha discernimento nas escolhas (MAGALHÃES et al., 2003).

3.8 O “Antigo Lixão Juliana”

O antigo “Lixão Juliana” já foi objeto de alguns estudos, dentre eles o de

Vieira (op. cit.), dada a sua importância no contexto ambiental da cidade de Ribeirão

Preto, uma das maiores cidades do Estado de São Paulo, com uma população estimada em 530 mil habitantes, aproximadamente, em 2003; abriga cerca de 145 mil domicílios particulares permanentes, com lixo coletado (IBGE, 2001).

Sendo uma cidade em contínua expansão, o crescimento populacional, a urbanização, a mudança do perfil social, de rural para urbano com o êxodo rural, a industrialização continuada e o crescimento exacerbado dos níveis de consumo, tem demandado significativa quantidade de recursos naturais e produzido grandes quantidades de resíduos sólidos, líquidos e gasosos, degradáveis e não- 50

degradáveis, que necessitam de destinação adequada. Esses fatores requerem crescentes e contínuas intervenções no meio ambiente, que é a fonte daqueles recursos e o destino final dos resíduos (VIEIRA, op. cit.).

Desde a década de 20, Ribeirão Preto já teve dez lixões. O único que foi transformado em aterro sanitário, com controle ambiental e fiscalização do governo,

é o aterro atual, na Rodovia Mário Donegá, na saída para Dumont.

Na década de 20, o lixão de Ribeirão Preto ficava na região onde hoje está a chamada Baixada, próximo ao Mercado Municipal. Nos anos 40, o lixão se transferiu para a área da praça Amin Calil, que na época era desabitada. Na década de 50, duas áreas foram usadas como lixões: os barrancos próximos às Sete Capelas e à

Santa Terezinha. Já na década de 60, havia deposição de lixo no Monte Alegre, no

Alto do Ipiranga e no atual Jardim Marchesi. (Id., ibid.)

Entre os anos de 1974 e 1978, parte da área em estudo foi destinada à deposição de resíduos sólidos urbanos do município de Ribeirão Preto, compreendendo hoje, parte dos lotes pertencentes aos Conjuntos Habitacionais

Jardim Juliana A e Jardim das Palmeiras II. Segundo informações constantes no

Parecer Técnico (FIPAI, 1993), a área destinada ao depósito de lixo consistia em

“vala aberta pela FEPASA, construída para abrigar um ramal ferroviário cuja implantação jamais se efetuou” (Figura 1).

51

Figura 1 – Levantamento Aerofotogramétrico - Fonte: Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto – Secretaria de Planejamento e Gestão Ambiental (junho/84).

Posteriormente, entre 1978 e 1989, o lixo foi depositado na rodovia Abrão

Assed, entre Ribeirão Preto e Serrana, na área do Aqüífero Guarani, o maior do mundo. A área está cercada e sendo monitorada por órgãos ambientais.

O exame do Laudo Pericial (CORNETTI, 2003), em que a Instituição investigada foi a Companhia Habitacional Regional de Ribeirão Preto (COHAB), que teve como objetivo “apresentar provas” de que os conjuntos habitacionais Jardim 52

Juliana A e Jardim das Palmeiras II foram construídos, por essa Companhia

Habitacional, sobre uma área utilizada pela Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto como depósito de lixo urbano – “Lixão” - , no período compreendido entre os anos de 1974 e 1978, revelou características e dados do “locus da pesquisa”, resumidos a seguir.

O antigo “Lixão Juliana” situava-se na zona urbana do município de Ribeirão

Preto, ao lado direito da Rodovia Anhangüera, sentido Norte, no setor Leste da cidade. Na classificação do IAC (Instituto Agronômico de Campinas), o solo local é um Latossolo Vermelho Amarelo, unidade Laranja Azeda. Do ponto de vista geológico, a rocha local é denominada de Arenito da Formação Botucatu da Bacia do Paraná. A área utilizada pela Prefeitura Municipal como lixão situa-se sobre a

área de recarga do Aqüífero Guarani.

Cornetti (op. cit.) ressalta que o referido Laudo não trata do problema de trincas, rachaduras, emanações fluídas (chorume) ou gasosas em uma determinada casa; trata dos efeitos destes nas casas dos conjuntos habitacionais, como um todo.

Neste lixão, construído no leito ferroviário de um ramal da FEPASA, verificou- se que os métodos e técnicas de gestão e gerenciamento de resíduos deveriam ser implementados previamente, de maneira a minimizar eventuais impactos ambientais instalados ou potenciais, conforme recomendado por D’Almeida e Vilhena (2000).

Os autores mencionados alertam, ainda, que o processo de estabilização física, química e biológica de um lixão leva entre dez a quinze anos para que, posteriormente, seja destinado a um uso compatível. Entre as providências que devem ser adotadas em relação à área, por sugestão da mesma fonte, estão: a) drenagem de biogás e percolado da massa de resíduos; b) coleta e tratamento de biogás e percolado; c) monitoração geotécnica e ambiental, e projeto paisagístico e 53

de uso futuro da área (não sem, antes, atentar para os pré-requisitos de se isolar os resíduos do ambiente; impedir a infiltração das águas de chuvas, evitando o aumento do volume de líquidos percolados e a saída não-controlada do biogás).

Partindo das considerações já relatadas, pode-se inferir que, quando da implantação, operação e encerramento do “Lixão Juliana”, os procedimentos não foram precedidos dos cuidados técnico-ambientais recomendados.

3.9 Caracterização do local da pesquisa: Jardim Juliana A e Jardim das

Palmeiras II.

A caracterização do local da pesquisa foi construída a partir de documentos oficiais e de matérias publicadas nos jornais A Cidade e Verdade, de Ribeirão Preto e Folha Ribeirão (Folha de S. Paulo). Dentre os primeiros, destacam-se: a Carta- resposta da COHAB (s.d.) ao Requerimento nº. 15.494, de 21 de novembro de

1991, da Câmara Municipal de Ribeirão Preto, em cuja ementa consta: “Solicita informações sobre a compra de área e construção de casas populares do Conjunto

Habitacional Jardim Juliana A e Jardim das Palmeiras II”; e o Relatório do Inquérito

Civil nº. 098/98, da Promotoria de Justiça de Ribeirão Preto, expedido em 12 de julho de 2001. Considerando os jornais diários – A Cidade, Verdade e Folha Ribeirão

(Folha de S. Paulo) - foram utilizados exemplares cobrindo o período de 2001 a

2006, dos quais foram extraídas importantes informações descritivas da realidade pesquisada, bem como das conseqüências negativas e dos danos causados por aquele ambiente aos seus moradores e à qualidade do morar. Com isso, uma caracterização sucinta pôde ser elaborada, como segue. 54

Visando a atender famílias de baixa renda, em julho de 1991, a COHAB –

Companhia Habitacional Regional de Ribeirão Preto, deu início às obras do

Conjunto Habitacional Jardim Juliana A e do Jardim das Palmeiras II; e, desde então, deparou-se com diversos obstáculos à aprovação do projeto pelo

GRAPROHAB - Grupo de Análise e Aprovação de Projetos Habitacionais, órgão da

Secretaria de Habitação do Estado, incumbido da aprovação de projetos, para a construção de conjuntos habitacionais pelo poder público.

Como a área de construção havia sido utilizada para disposições de resíduos sólidos urbanos, no período de 1974 a 1978, o GRAPROHAB, após vistoria realizada pela CETESB – Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental, indeferiu o projeto; isto porque a COHAB não apresentava estudos e sondagens que comprovassem a inexistência de lixo no local, enquanto que as informações técnicas da CETESB apontavam para a potencialidade de poluição do solo, produção de CO2

(dióxido de carbono), CH4 (gás metano) e outros gases nocivos (Relatório do

Inquérito Civil, nr. 098/98).

Diante disso, a COHAB enviou Carta-resposta (s. d.) à Câmara Municipal, informando das providências a serem adotadas diante do impasse, visto que, na região, estavam previstos diversos conjuntos de moradias populares, totalizando cerca de 2.500 casas. O Jardim Juliana A e o Jardim das Palmeiras II fazem parte do PAIH-Plano de Ação Imediata Habitacional, do Ministério da Ação Social, com recursos do FGTS-Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. A área em questão

(trata-se de uma faixa de 150 metros de largura e quase 2 km de extensão) pertencia à Construtora Lagoinha e era utilizada para o plantio de cana-de-açúcar.

Segundo a COHAB: 55

- apenas 20 das unidades a serem construídas deveriam ficar sobre a área provável, onde estivera o “Lixão” (cerca de 5% do conjunto); e partindo dessa constatação, fez-se o remanejamento das quadras, transformando esses espaços em áreas de lazer;

- técnicos locais estavam elaborando um plano de solução ideal, para a proteção dos futuros mutuários do conjunto, bem como a conscientização da comunidade sobre as implicações dessa incidência;

- o projeto original, aprovado, preliminarmente, pelos órgãos municipais competentes, foi encaminhado à CEF-Caixa Econômica Federal, para a obtenção dos recursos necessários para a construção das casas;

- esta área, vala da FEPASA, já abandonada, foi escolhida, por técnicos e cientistas contratados, para a implantação do primeiro e verdadeiro “aterro sanitário” de Ribeirão Preto, por ter lençol freático profundo (40 metros), terreno adequado à cobertura do “aterro” e topografia ideal à uma futura recuperação. Esse “aterro”, implantado pelo DURSARP, foi considerado modelo e, na ocasião, foi capa da revista Limpeza Pública;

- o aterro, com 13 anos (novembro/1991), foi encerrado e sua cobertura foi tão bem feita, que em raros trechos pode-se identificar onde fôra feita e as camadas têm, em média, 2 metros de altura;

- assegura que não há problemas de adensamento do terreno que, em até 3 anos após o término das disposições, se acomoda; sem contar que, nesses 13 anos e por várias safras, trafegaram pelo terreno inúmeras máquinas agrícolas e caminhões que, ajudados pelas águas das chuvas, estabilizaram o solo;

- não há, em ponto algum, indícios de vetores, roedores, insetos etc.; 56

- a mata nativa existente na região foi, inteiramente, preservada em projeto e não será tocada;

- sobre o “aterro sanitário”, as camadas de lixo tinham de 2 a 3 metros de altura e foram recobertas, diariamente, com cerca de 20 cm de terra, quantidade suficiente para a eliminação de vetores e roedores, possibilitando a aeração do lixo; seis meses depois, haveria a deposição de uma nova camada sobre a primeira, seguindo os mesmos procedimentos, pois a matéria orgânica leva 6 meses para se neutralizar.

Apesar do indeferimento e das “medidas adotadas” (que não têm nenhum fundamento técnico), o certo é que, em 20 de julho de 1993, a COHAB, escudada em certidões de órgãos da municipalidade, obteve o certificado de aprovação do projeto (Relatório do Inquérito Civil, op. cit.).

Em julho de 1998, a Promotoria de Justiça recebeu denúncias de que as unidades habitacionais do Jardim Juliana A e do Jardim das Palmeiras II estavam sendo acometidas de graves problemas de rachaduras. Instalado inquérito civil, a

Promotoria determinou a realização de perícia por profissionais habilitados do

CAEX-Centro de Apoio à Execução, do Ministério Público do Estado, com as seguintes conclusões:

- as telhas utilizadas nas construções são de má qualidade e não permitem perfeito encaixe, violando as disposições da NBR 8093/83;

- as paredes apresentam trincas provenientes de recalques estruturais e não receberam demão de chapisco, para anteceder o revestimento, e nem a impermeabilização nas primeiras fiadas, o que provoca descolamento do revestimento e infiltrações; 57

- o revestimento interno não recebeu o traço (composição de areia, cal e cimento) adequado e está se decompondo;

- as paredes não têm cinta de amarração, o que provoca trincas nos apoios da estrutura do telhado;

- todas as irregularidades revelam violações no memorial descritivo da obra.

Com o trabalho pericial, concluiu-se que as unidades habitacionais, além de terem sido construídas com material da pior qualidade, apresentavam graves problemas estruturais; certamente, em decorrência do fato das edificações se instalarem em solo defeituoso, que abriga resíduos sólidos, comprometendo a fundação. Tanto é verdade que, até, a pavimentação asfáltica afundou... Todas as conclusões emergentes dos relatórios, em face das ameaças de desmoronamento das casas, foram no sentido de os defeitos serem estruturais, decorrentes da não- compactação do solo. Esses problemas foram admitidos pela própria COHAB, em vistorias realizadas.

A Promotoria de Justiça afirmou ter envidado todos os esforços necessários para que os problemas atinentes aos conjuntos habitacionais fossem solucionados.

No entanto, apesar de diversas tratativas com a direção da COHAB, os moradores do Jardim Juliana A e do Jardim das Palmeiras II continuaram experimentando danos materiais e morais. Muitas famílias moradoras em casas “condenadas”, estavam expostas a graves riscos à vida e à integridade corporal, enquanto aguardavam providências para sua remoção (Id., ibid.).

Em 19 de novembro de 2001, conforme publicado no Jornal Verdade, os moradores do Jardim Juliana A e do Jardim das Palmeiras II, fizeram um ato de protesto defronte à casa do Prefeito da época. Munidos de faixas e cartazes de 58

protesto, com um trenzinho cheio de crianças e um carro de som, os manifestantes fizeram bastante barulho, mas não obtiveram êxito na tentativa de receberem uma resposta para o problema.

Em 18 de dezembro de 2001, o mesmo Jornal Verdade noticiou que 07 moradores dos conjuntos Jardim Juliana A e Jardim das Palmeiras II receberam notificações, entregues por funcionária da COHAB, de que suas casas seriam demolidas. A decisão foi tomada pelo Ministério Público, com base em um relatório da CETESB, que constatou, no local, a presença de gás metano, emitido do subsolo e prejudicial à saúde dos moradores. Para o Promotor de Justiça do Meio Ambiente, que acompanhava o caso e participara da reunião, a desocupação deveria ser feita, já que o laudo da CETESB orientava para isso. Os moradores poderiam se recusar a deixar o local, mas as crianças deveriam ser retiradas, por força da lei, já que a

área oferecia risco à saúde.

Em 25 de abril de 2002, o promotor determinou que as crianças residentes nas casas a serem demolidas deveriam deixar o local, até 06 de maio. Tal decisão foi notificada pelos Jornais Folha Ribeirão (Folha de S. Paulo) e A Cidade.

Em 18 de novembro de 2003, o Jornal Verdade noticiou perícia requerida pelo

Ministério Público, visando a identificar os imóveis que deveriam ser desocupados de imediato, por apresentarem: situação de risco ou existência de grave defeito e, também, os que, mesmo não oferecendo risco imediato, apresentassem danos que comprometessem o bem-estar de seus moradores. Além disso, pediu à Justiça a remoção dos respectivos moradores dos imóveis indicados no Laudo Pericial, para outros de dimensões equivalentes, em local compatível com os conjuntos habitacionais e em perfeitas condições de habitação, até a entrega de imóvel novo 59

ou a total indenização das quantias pagas pelos mutuários, em valor atualizado, além de perdas e danos.

O comprometimento estrutural de residências foi, novamente, denunciado, através do Jornal Verdade, em 8 de junho de 2004, quando uma casa, abandonada pelos seus moradores, desabou sobre uma criança de nove anos, que, além de ferimentos em todo o corpo, corria o risco de perder um dos dedos, o que, felizmente, não aconteceu. O “desastre” suscitou consternação e a reiteração das queixas pelos moradores, contidas em frases registradas pelo jornalista, como: estremecimento da casa à passagem de carros na rua, rachaduras nas paredes e piso estufado, risco de vida, falta de informação de irregularidade da construção na compra da casa, perda dos R$ 35 mil investidos, retirada de famílias e demolição de casas em situação de risco. Às famílias foi prometida, pela COHAB, a remoção para imóvel de tamanho equivalente, e ressarcimento do valor investido no imóvel a ser demolido, bem como do valor aplicado em benfeitorias. Entretanto, segundo o

Relatório do Inquérito Civil nº. 098/98 (Promotoria de Justiça, p. 5), no seu item 1 –

Dos Fatos: “Alguns moradores foram removidos de suas casas e foram alojados em imóveis de qualidade tão ruim quanto aqueles que lhes pertenciam e, ainda, de dimensões inferiores, alugados pela COHAB”. Outras perdas e danos foram consignados, além das materiais e monetárias, pois a indenização não cobriu os custos dos investimentos dos moradores e, ainda, existem famílias que estão em demanda judicial contra a COHAB; também, não ocorreu a indenização por danos morais e, o dano moral é inquestionável (Id., ibid.), que segundo Minozzi, citado no mesmo relatório (p. 20),

“... não é o dinheiro nem a coisa comercialmente reduzida ao dinheiro, mas a dor, o espanto, a emoção, a vergonha, a injúria física ou moral, em geral uma dolorosa sensação experimentada pela pessoa, atribuindo à palavra dor o mais largo significado.” 60

A extensão dos danos causados aos mutuários, os submeteu “a situação de tamanha angústia, aflição e constrangimento” (Id., ibid, p.21), que foi pedida a fixação da reparação moral em valor não inferior a 100 (cem) salários mínimos, para cada comprador que foi atingido pela situação.

Constatou-se os problemas de comprometimento estrutural apresentados por unidades habitacionais, descritos nas fontes de pesquisa supracitadas, quando das visitas da pesquisadora ao “locus”, e as unidades atingidas e demolidas foram identificadas nas plantas baixas dos projetos urbanísticos, sendo 08 no Jardim

Juliana A e 63 no Jardim das Palmeiras II, sendo que, neste último, há previsão de demolição de mais 33 unidades.

O exame dos jornais diários – A Cidade, Verdade e Folha Ribeirão - no período de 2001 a 2006; dos documentos oficiais da CETESB (Parecer Técnico e

Laudo, 2000; Conceituação 1000/Projeto CETESB-GTZ, 2001; e Informação Técnica nº. 229, 2004); dos documentos da Promotoria de Justiça (Relatório do Inquérito

Civil nº. 098/98 e Laudo Pericial, 2003); de plantas-baixas de projetos urbanísticos, de levantamentos aerofotogramétricos, e documentação fotográfica e registros efetuados pela própria pesquisadora em Diário de Campo; além de conversas incidentais e informais com moradores, tudo contribuiu para confirmar as denúncias veiculadas pelos meios de comunicação, principalmente, jornais, rádio e TV, que confere aos moradores atingidos pelas conseqüências dos impactos ambientais, principalmente em nível de qualidade do solo, o direito de acumular danos patrimoniais e morais. Nesse sentido, Nelson Nery Júnior (1991), um dos autores do anteprojeto do Código de Defesa do Consumidor (citado no Relatório do Inquérito

Civil nº. 098/98, p. 20), em se referindo a aspectos relevantes do mesmo, considera: 61

“O Código admite expressamente a acumulação de danos patrimoniais e morais, pondo termo à antiga discussão que se formou, principalmente em face da jurisprudência do STF (Supremo Tribunal Federal), sobre a não-cumulatividade do dano moral com o patrimonial. Agora a lei a permite expressamente”.

Segundo o mesmo documento, isso parece razoável, “diante da extensão dos danos causados aos mutuários” (p. 21), seja em nível de defeitos que vêm comprometendo a segurança das famílias ou de defeitos não solucionados, apesar de a COHAB ter sido instada a repará-los.

O ano de 2005 tem seu inicio marcado com a batalha do Ministério Público, em prol dos moradores do Jardim Juliana A e do Jardim das Palmeiras II, contra a

Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto. O Jornal A Cidade, de 23 de março de 2005, noticiou que este Órgão estaria estudando manter moradores no Jardim Juliana A, propondo construir casas em uma área verde do próprio bairro e transferir os moradores para as novas unidades; alegava a existência de, apenas, 30 casas afetadas. O Ministério Público se contrapõe a esse dado, afirmando que a área atingida é bem maior, cerca de 360 mil metros quadrados, e que no Laudo Pericial

(CORNETTI, 2003) consta que dezenas de casas estão ameaçadas de ruir e que outras, apesar de não terem sua estrutura atingida, sofrem pela emissão de gás metano do subsolo; o mesmo Laudo acusa, ainda, que algumas casas foram construídas, exatamente, em cima da antiga vala da FEPASA e correm o risco de desabar, devido à movimentação do solo, causada pela deterioração do lixo. A ação do Ministério Público pede a remoção dos moradores e a indenização de R$ 100 mil

(o Relatório do Inquérito Civil 098/98 informa valor não inferior a 100 salários mínimos), a cada família atingida, a título de dano moral. Uma audiência de conciliação entre as duas partes deveria acontecer, a fim de resolver o impasse, mas a possibilidade de acordo foi ignorada pelo Prefeito, de então. 62

Em 14 de maio do mesmo ano, a Folha Ribeirão retoma a questão dos dois laudos periciais emitidos a pedido da Justiça, referentes à ação movida pelo

Ministério Público, que incluem, praticamente, todas as casas do Jardim Juliana A e do Jardim das Palmeiras II na categoria de condenadas, havendo, inclusive, o risco de explosão e contaminação dos moradores por substâncias cancerígenas; e apresenta a “radiografia” de ambos os bairros, condenados pela perícia, com a totalidade das casas afetadas, ou seja, 458 e 345, respectivamente.

Chegou-se ao ano 2006, sem que o impasse tivesse sido resolvido, pois nada de concreto foi realizado, e o Jornal Verdade, de 23 de março de 2006 (p. 5), denuncia: “Casas no Lixão. MP (Ministério Público) afirma que COHAB tenta persuadir os mutuários e pede retirada das famílias”, que não aconteceu, contrariando a Ação Civil Pública ajuizada contra a COHAB; as famílias continuaram morando no local e os moradores têm sido assediados por funcionários da COHAB,

“para persuadi-los a firmar acordo e promover o esvaziamento da ação proposta” (p.

5), segundo depoimentos de mutuários à Promotoria. Face a esta situação, o

Promotor de Justiça completou: “Agora, ao que parece, a COHAB continua desrespeitando essas pessoas, com a tentativa de frustrar os seus direitos e até mesmo censurando o fato de estarem engajadas numa batalha judicial para a defesa de tais direitos” (p. 5).

Em março de 2007, conforme documentação fotográfica e registros em Diário de Campo, efetuados pela pesquisadora, aproximadamente 70 casas foram demolidas e seus moradores transferidos para outros bairros. De lá para cá, muita discussão, notícias em jornais, promessas políticas, entrave judicial, mas a maioria das famílias continua morando nos conjuntos habitacionais considerados nesta dissertação. 63

Esta caracterização panorâmica foi o que se pôde obter, considerando as fontes literárias e documentais levantadas e examinadas; possibilitará, na seqüência, a discussão do local da pesquisa como “área degradada/ contaminada”.

3.10 Degradação ou contaminação ambiental

A literatura especializada, internacional e nacional, segundo Sánchez (op. cit.), emprega vários termos como sinônimos de “área contaminada”, como: sítio contaminado, terrenos contaminados, solos contaminados e solo poluído. A este conjunto o autor acrescenta o termo “área degradada”, que engloba contaminação e poluição; e enfocando o compartimento “solo”, considera degradação como a ocorrência de alterações negativas de suas propriedades físicas e a alteração de suas características químicas.

O Projeto CETESB-GTZ (2001), no tópico denominado “Conceituação 1000”

(p. 4), definiu “área degradada como uma área onde ocorrem processos de alteração das propriedades físicas e/ou químicas de um ou mais compartimentos do meio ambiente”; e considera “área contaminada” como “um caso particular de uma

área degradada, onde ocorrem alterações principalmente das propriedades químicas, ou seja, contaminação”. E este documento considera os termos “poluição” e “contaminação” como sinônimos, sendo o primeiro mais usado e melhor definido na Legislação Ambiental Federal e do Estado de São Paulo (Figura 2).

A Lei 997/76, que dispõe sobre o controle da poluição ambiental no Estado de

São Paulo, define poluição do meio ambiente como a presença, o lançamento ou a liberação, no solo, nas águas, no ar, de toda e qualquer forma de matéria ou energia, com intensidade e quantidade de concentração ou com características em 64

desacordo com as que forem estabelecidas em decorrência dessa Lei, ou “que tornem ou possam tornar as águas, o ar ou o solo: impróprios, nocivos ou ofensivos

à saúde; inconvenientes ao bem-estar público; danosos aos materiais, à fauna e à flora; prejudiciais à segurança, ao uso e gozo da propriedade e às atividades normais da comunidade” (Id., ibid., p.4).

Conforme Lei Estadual nº. 12.300, de 16 de março de 2006, que institui a política Estadual de Resíduos Sólidos, no Capítulo III, artigo 5º., IX e X, área contaminada é a “área, terreno, local, instalação, edificação ou benfeitoria que contém quantidades ou concentrações de matéria em condições que causem ou passam causar danos à saúde humana, ao meio ambiente e a outro bem a proteger” e área degradada é “área, terreno, local, instalação, edificação ou benfeitoria que por ação humana teve as suas características ambientais deterioradas”. 65

Figura 2 – Antiga área de disposição de resíduos - Fonte: AHU, Consultoria em Hidrogeologia e Meio Ambiente, Alemanha, 1987 (apud CETESB, 1999).

Fontes de perigo: 16 – Resíduos domésticos 17 – Resíduos sólidos industrial e comercial 18 – Aterro com entulho, solo e escória Cenários: 19 – Percolação de poluentes lixiviados para água subterrânea 20 – Poluição de água subterrânea pela percolação de contaminantes 21 – Bombeamento de águas contaminadas 22 – Irrigação com água subterrânea contaminada 23 – Contaminação de água potável 24 – Emissão de gases tóxicos por resíduos 25 – Infiltração de gases tóxicos nas casas 26 – Entrada de gases nocivos através da rede de esgotos 27 – Entrada de vapores na edificação 66

28 – Rachaduras nas construções devido aos recalques do aterro 29 – Contato dermal e ingestão de material tóxico Medidas emergenciais: 32 – Fechamento da estação de tratamento d’água

Considerando os dados levantados e apresentados nos dois itens anteriores –

O antigo “Lixão Juliana” e Caracterização do local da pesquisa – de antemão, e à vista dessa definição, inclusive do uso de “poluição” e “contaminação” como sinônimos, e desta ser considerada um caso particular de “degradação”, pôde-se concluir que: a área considerada nesta pesquisa, onde foram edificados o Jardim

Juliana A e o Jardim das Palmeiras II, tem características que autorizam incluí-la na categoria de “degradada/ contaminada/ poluída”.

Uma contribuição da literatura, que corrobora esta afirmação, é encontrada em Fetter (2003, apud CETESB, 2004, p. 5), que classificou as fontes de contaminação das águas subterrâneas e do solo em 6 categorias, das quais a segunda se aplica à questão examinada nesta dissertação, por incluir: “as fontes projetadas para armazenar, tratar e/ou dispor substâncias no solo, na qual estão incluídas as áreas de disposição de resíduos (aterros sanitários e industriais, lixões, botas-fora etc.)”.

Entretanto, o exame de documentos oficiais revela posições contraditórias, em relação à questão contaminação/não-contaminação. A Carta-resposta da

COHAB (s.d.) ao Requerimento nº. 15.494 da Câmara Municipal, de 21 de novembro de 1991, que “solicita informações sobre a compra da área e construção de casas populares do Conjunto Jardim Juliana A e Jardim das Palmeiras II”, assim se refere

à mesma: possui lençol freático profundo (40 m), terreno adequado à cobertura do aterro e topografia ideal à recuperação futura; o aterro sanitário foi orientado por especialista e foi considerado modelo e capa da Revista Limpeza Pública, na ocasião; a cobertura do mesmo é tão bem feita, que a torna quase imperceptível; o 67

lixo é recente e foi colocado sobre o mato novo; não há indícios de vetores, roedores, insetos etc.; a mata nativa foi preservada e não será tocada; a área comprada em 1982 sempre foi usada para plantio de cana; as camadas de lixo têm de 2 a 3 metros de altura e, diariamente, são recobertas com 20 cm de terra e após

6 meses a matéria orgânica estará neutralizada; o aterro sanitário é recomendado como saneamento habitual em áreas semelhantes e orientado por sanitarista de renome; a elevação da temperatura do lixo recoberto chega a 65 graus C, pasteurizando os compostos e eliminando os micro-organismos patogênicos; e ao final foi coberto com capa superior a 50 cm de terra. Por conseguinte, conforme o conteúdo dessa Carta-resposta, nenhuma anormalidade existe, ou existiu, no que se refere à contaminação da área considerada, pelo “Antigo Lixão”.

A quantificação dos gases (metano e dióxido de carbono) foi realizada por cromatografia gasosa com detector de condutividade térmica, no Laboratório de

Processos Anaeróbios do Departamento de Hidráulica e Saneamento da Escola de

Engenharia de São Carlos (EESC-USP).

Constatou-se, também, ao exame do Relatório e Parecer Técnico (CETESB,

2000) sobre a presença de gás metano nos pontos de coleta números 1 (Figuras 4 e

5), 2 (Figuras 6 e 7), 3 (Figuras 8 e 9) e 4 (Figuras 10 e 11), localizados no Conjunto

Habitacional Jardim Juliana A (Figura 3), que este documento não aponta nenhuma anormalidade no que se refere à degradação/ contaminação/poluição. Referindo-se

às coletas e análises realizadas pela Escola de Engenharia de São Carlos – USP, no período de junho/98 a julho/99, relata: não foi evidenciada a presença do gás metano, o que já vinha ocorrendo desde 1997; devido ao tempo de aterramento dos resíduos no local (superior a 20 anos), a fração de matéria orgânica que resta a ser degradada é ínfima, já constatado em 1993, com valores próximos a 5%, portanto, o 68

processo de digestão anaeróbia de resíduos acha-se em extinção; a mistura de gás metano com o ar apresenta-se próxima ao limite inferior (5%) da mistura “ideal”, que se situa entre 5 e 15%; e a presença de exaustores que encaminham os gases para a atmosfera tornam as residências não-suscetíveis de explosões, estando, portanto, isentas desse risco; o gás metano não tem sido liberado nos últimos três anos, conforme resultados dos ensaios realizados pela Instituição referida.

Figura 3 - Projeto Urbanístico do Jardim Juliana A – Pontos de coleta e monitoramento de gases (demarcação dos pontos feitas pela pesquisadora) - Fonte: Prefeitura Muncipal de Ribeirão Preto - Secretaria de Planejamento e Gestão Ambiental (1993)

69

PONTO 1

Figura 4 – Ponto 1

120

100

80 Ar 60 Dióxido de Carbono Metano 40

20

0

o o o r ro ç ho nh b n mbro Ju em Mar Ju te Outub v Se o N

Figura 5 – Gráfico indicativo da presença de gases no ponto 1 (em %) - Fonte: CETESB (2000)

O ponto 1, nos meses de novembro/98, março e junho/99, apresentou valores inferiores a 0,35% para o dióxido de carbono (abaixo do limite de detecção do equipamento) e, para o metano, valores próximos a zero. 70

PONTO 2

Figura 6 - Ponto 2

120 100 Ar 80 60 Dióxido de Carbono 40 Metano 20 0

o o rço mbro ubr mbr a unho Junho e e M J Out Set Nov

Figura 7 – Gráfico indicativo da presença de gases no ponto 2 (%) - Fonte: CETESB (2000) 71

O ponto 2, nos meses de março e junho/99, apresentou valores nferiores a

0,35% para o dióxido de carbono (abaixo do limite de detecção do equipamento) e, para o metano, valores próximos a zero.

PONTO 3

Figura 8 - Ponto 3

120 100 Ar 80 60 Dióxido de Carbono 40 Metano 20 0

o o rço mbro ubr mbr a unho Junho e e M J Out Set Nov

Figura 9 – Gráfico indicativo da presença de gases no ponto 3 (%) – Fonte: CETESB (2000) 72

O ponto 3, nos meses de março e junho/99, apresentou valores inferiores a

0,35% para o dióxido de carbono (abaixo do limite de detecção do equipamento) e, para o metano, valores próximos a zero.

PONTO 4

Figura 10 - Ponto 4

120 100 Ar 80 60 Dióxido de Carbono 40 Metano 20 0

Junho Março Junho Outubro Setembro Novembro

Figura 11 – Gráfico indicativo da presença de gases no ponto 3 (%) – Fonte: CETESB (2000) 73

O ponto 4, nos meses de novembro/98, março e junho/99, apresentou valores inferiores a 0,35% para o dióxido de carbono (abaixo do limite de detecção do equipamento) e, para o metano, valores próximos a zero.

Observações: as coletas foram feitas de junho/98 a junho/99.

Por outro lado, o mesmo documento (CETESB,2000) considera alguns aspectos negativos constatados: no que se refere às técnicas de controle de poluição, não se tem registros de que tenham sido adotadas medidas de saneamento da área do “Lixão”; não foram efetuados estudos de caracterização geológica e hidrogeológica, e de definição e delimitação da contaminação, não se podendo, portanto, apontar se haverá ou não a contaminação das águas subterrâneas e superficiais, e do solo; nem esses estudos no sentido de apontar se haverá ou não riscos para a saúde e segurança dos moradores; a área, em pauta, não pode ser considerada correta, tecnicamente, para a construção de unidades habitacionais, devido aos riscos da liberação de gases e de desabamento das construções, estes devidos aos recalques diferenciais nos trechos onde houver lixo no subsolo; os moradores podem correr riscos caso ocorram recalques diferenciais acentuados; não foram realizados estudos de contaminação do lençol freático.

Portanto, o relatório conclui que: não existe material espalhado pela área, nem a exalação de odores que incomodem os moradores; mesmo não sendo realizadas caracterizações geológica e hidrogeológica no local, o solo do município de Ribeirão

Preto é classificado como latossolo vermelho escuro, bastante profundo, de textura variável, não havendo empecilhos técnicos para o uso do mesmo para a disposição de resíduos sólidos domésticos. 74

O Parecer Técnico 006/00 EERO de 14 de abril de 2000 (Id., ibid.), decorrente dos estudos (coletas e análises) realizados, considera que: as amostragens de gases não foram suficientes; as medidas adotadas para o saneamento das áreas foram adequadas, mas não suficientes, pois não foram caracterizadas as contaminações do solo e do lençol freático em nenhum local da

área; não foram realizados estudos de caracterização geológica e hidrogeológica, mas apenas sondagens para a delimitação da área com presença de resíduos; a construção de unidades habitacionais sobre a área usada para a disposição de lixo é ilegal, pois viola os dispositivos da Lei Federal nº. 6.766, de 12 de dezembro de

1976, que dispõe sobre o uso e ocupação do solo (hoje Lei nº. 2.157 de 31 de janeiro de 2007); e, por último, que as unidades habitacionais apresentam comprometimentos estruturais, decorrentes da fragilização do terreno e acomodação do solo (recalque), bem como da má compactação do lixo nos mesmos.

Relatório e Parecer apresentam ambigüidades, não afirmando, categoricamente, se existem ou não anormalidades impossibilitadoras do uso residencial da área tomada como local da pesquisa.

Outro documento analisado, com o intuito de se verificar a questão degradação/contaminação da área, foi o Relatório do Inquérito Civil nr. 098/98, da

Promotoria de Justiça, do qual extraiu-se trechos que vêm ao encontro da questão examinada. No seu item I – Dos Fatos, mencionou que o aterro de resíduos sólidos apresenta grande potencialidade de poluição do solo, podendo produzir gases nocivos como CO2 e CH4 (p. 4); que as unidades habitacionais apresentam graves problemas estruturais por se instalarem em solo defeituoso, que abriga resíduos sólidos, comprometendo a fundação (p. 5); que face ao defeito de compactação do solo fazer reparos nas unidades é inútil; que pelo péssimo material de construção e 75

solo inconsistente, já usado como depósito de lixo, as casas estão em decomposição (p. 6 e 7). Em seu item II – Da Responsabilidade da Requerida, mencionou, novamente, a condição das casas em razão da existência, outrora, de depósito de lixo no local (p. 15). A partir daí, o documento entrou na discussão dos direitos dos mutuários, no que se refere aos danos materiais e morais, bem como à saúde, pelos quais devem ser indenizados e ser objeto de outras providências quanto à qualidade do morar. Este documento revelou, portanto, condições que permitem incluir o local da pesquisa na categoria de área degradada/contaminada, conforme definições já apresentadas.

O exame do Laudo Pericial (CORNETTI, 2003) teve como objetivo apresentar provas de que os conjuntos habitacionais Jardim Juliana A e Jardim das

Palmeiras II foram construídos pela COHAB sobre o “Antigo Lixão”, ativo de 1974 a

1978. As provas foram construídas a partir de mapas (escala 1:5.000), elaborados com base em levantamentos aerofotogramétricos; os instrumentos de coleta de dados utilizados e a análise subseqüente permitiram ao Especialista (Engenheiro de

Minas), a partir dos indicadores levantados, além de apresentar as provas objetivadas, aplicar a denominação de “Área Contaminada” para a área considerada

(p. 3). O Laudo descreve: os efeitos da redução do volume do lixo aterrado, ao longo do tempo de digestão do mesmo, gerando chorume e gases, e provocando afundamento da camada do solo que recobre o lixo, condenando as moradias à falência estrutural (p. 4); os efeitos da decomposição do lixo que, soterrado, funciona como um biodigestor “in situ”, produzindo, na primeira fase, ácidos orgânicos e gases nocivos como o CO2 e CH4, e na segunda, os ácidos são consumidos por micro-organismos formadores de metano, sendo CH4 e CH2 os produtos finais; e nesse sentido, descreve que o local periciado era um “lixão”, sem nenhuma 76

tecnologia, onde os gases não têm um sistema preferencial de escoamento e drenagem, vazando pela trincas e rachaduras dos sistemas de escoamento de

águas servidas ou se acumulando em perigosos bolsões. Cornetti destaca que “o metano à concentração de 14% é altamente inflamável” e que “em um aterro natural

(lixão) o tempo de emissão de gases é superior a 100 anos” (LIMA, 1990 apud

CORNETTI, 2003). Os limites considerados explosivos para o gás metano estão na faixa de 5 e 15%. Descreve, também, os tipos de contaminantes derivados de resíduos sólidos, domésticos e urbanos, como os materiais pesados contidos no chorume, as substâncias organoquímicas, os elementos radioativos, os fertilizantes, os pesticidas e os micro-organismos (vírus e bactérias); acentua que dentre os inorgânicos o mais problemático e nocivo à saúde é o nitrato, devido à sua mobilidade e estabilidade nos sistemas aeróbicos de águas subterrâneas, e o que mais incomoda é o gás sulfídrico, devido ao cheiro de ovo podre (p. 6).

Considerando que a construção dos dois conjuntos habitacionais sobre um

“Lixão” que não dispõe de sistemas de drenagem de gases e chorume, faz com que os mesmos se distribuam aleatoriamente no solo; e seus efeitos deletérios atingem, não só, pessoas, mas, também, o meio ambiente circundante, principalmente, o

Aqüífero Guarani (p. 7). Outra questão relevante, que o Especialista considera, é a contaminação dos moradores pela ingestão e inalação da poeira do solo, representativa do solo local, que pode conter ingredientes nocivos à saúde humana e animal, listadas a seguir, através de três descritores (substância, efeito, forma de contaminação): arsênico, cancerígeno, ingestão; benzopireno, cancerígeno, ingestão/inalação; chumbo, vários, inalação; cádmio e cromo, vários, inalação; DDT e HCB, cancerígenos, ingestão; HCH, vários, ingestão; níquel, vários, inalação;

PCB, mercúrio, dioxinas e furanos, vários, ingestão (p. 7 e 8). O Laudo Pericial 77

prova, “de forma cabal e insofismável” que os conjuntos habitacionais foram edificados sobre o “Antigo Lixão”; e fornece vários indicadores de que o local pode ser incluído na categoria de área degradada/contaminada.

O último documento oficial examinado foi a Informação Técnica nº. 229/2004, da CETESB, de 15 de setembro de 2004, emitida em atenção à solicitação da

Promotoria de Defesa do Consumidor de Ribeirão Preto, que, após enunciar a responsabilidade daquele Órgão pela qualidade das águas dos mananciais de captação de água bruta superficial e subterrânea, informa: que a Portaria nº. 518, de

25 de março de 2004, do Ministério da Saúde, estabelece critérios sobre os procedimentos e responsabilidades, quanto ao controle e vigilância da água para consumo humano, de competência dos Serviços de Abastecimento de Água e

Secretarias Municipais de Saúde ou órgãos equivalentes; que a análise da água de abastecimento público do Jardim Juliana A e Jardim das Palmeiras II, solicitada, foi efetuada pelo Laboratório da CETESB da Gerência Regional da Bacia do Mogi-

Guaçu e Pardo, sobre as amostras de números 73710, 73711 e 73712, de água do cavalete, coletadas no dia 30/08/2004, num período de 24 horas sem chuva, entre

09h20m e 10h25m, respectivamente, nos seguintes locais: Rua Artur Fernandes de

Oliveira, nº. 147 (Jardim Juliana A), e Rua Alcides Cosenzo, nº. 196 e Rua

Domingos Humberto Barilari, nº. 210 (Jardim das Palmeiras II), conforme constam dos Relatórios de Ensaios anexos à Informação Técnica nº. 229/2004. Esta informa que, de acordo com os resultados das análises laboratoriais, os valores se apresentavam de acordo com o estabelecido na Portaria nº. 518, de 25 de março de

2004, capítulos IV e V, não indicando, portanto, a ocorrência de anormalidades, tanto para os ensaios bacteriológicos quanto os fisicoquímicos, para as amostras e 78

parâmetros analisados. O conteúdo desta Informação não evidencia qualquer traço que possa ser usado para atribuir ao local a designação de “área contaminada”.

De tudo o que se pôde aferir, ao exame dos documentos oficiais, tomados como referência, se concluiu que há mais peso nas considerações e informações pertinentes à polaridade “área contaminada” do que à sua antítese que defende a não-existência de anormalidades em relação ao local da pesquisa, o Jardim Juliana

A e o Jardim das Palmeiras II. Com esta conclusão, considerou-se necessário um aporte à literatura que trata da recuperação e remediação de área degradada/contaminada, visando à obtenção de subsídios para sugerir propostas, nesse sentido, ao final desta dissertação.

3.11 Medidas de remediação de áreas contaminadas

A arborização surge como uma alternativa viável ou recomendável, dada a importância, hoje, atribuída às áreas verdes para o equilíbrio ambiental. Macedo e

Oliveira (2002, p.42) consideram como áreas verdes urbanas, “um espaço tipicamente aberto, ao ar livre, não ocupado completamente por estruturas artificiais urbanas, com características predominantemente naturais, independentemente do porte da vegetação”.

Para Biondi (1990) e Bianchi (1992)(apud MACEDO e OLIVEIRA, op. cit., p.

42), não apenas os parques, praças e bosques são considerados como áreas verdes, mas, também,

“cemitérios, aeroportos, corredores de linha de transmissão de água, esgoto, energia elétrica, além de faixas de domínio legal para vias públicas de transporte, como estradas e ferrovias. Constam também na lista, as margens de córregos, rios e outras áreas alagadas, depósitos abandonados de lixo e áreas de tratamento de esgoto”

79

Segundo Romero (1988), a arborização deve ser utilizada para proporcionar sombreamento, atenuando os efeitos da radiação solar, atuando como filtro das radiações absorvidas pelo solo e pelas superfícies construídas, refrescando os ambientes próximos, uma vez que a folhagem atua como anteparo protetor de superfícies que se localizem imediatamente abaixo e nas proximidades. Realiza, ainda, papel depurador, e de fixação de contaminantes e poeira, através do processo de fotossíntese e a partir de seus próprios elementos constitutivos (Figura

12).

Figura 12 – Arborização - Fonte: Romero (1988)

Relacionada à melhoria da qualidade de vida das populações urbanas, a arborização desempenha importantes funções ambientais: absorver ruídos, amenizar o rigor térmico, formar e aprimorar o senso estético, abrigar e alimentar pássaros, lazer, criar ambientes de descanso e recreação, baixar a temperatura média do ambiente através da transpiração, captar e absorver águas pluviais, drenar

águas subterrâneas, reduzir ou conduzir ventos dominantes, atenuar o sentimento de opressão do homem com relação às grandes edificações e filtrar particular sólidas em suspensão na atmosfera (MACEDO e OLIVEIRA, op. cit.). 80

Ao lado da arborização, os espaços livres representam uma estratégia de urbanização útil e necessária, quando se trata da recuperação do equilíbrio ambiental, visando ao bem-estar da população. De acordo com Duarte, Silva e

Brasileiro (1996), é fundamental que se procure oferecer uma grande variedade e diversidade de espaços livres públicos, que devem ser projetados de modo a reforçar uma vocação já existente e propiciar a maior possibilidade de escolha para os moradores. Isso trará uma maior vitalidade à área, variedades, contrastes, estímulos, e flexibilidade no desenho e uso (Figura 13).

Figura 13 – Espaços Livres 1 - Fonte: Duarte, Silva e Brasileiro (1996).

Esses espaços devem estar, preferencialmente, inter-relacionados, e integrados com as casas e com as diversas vias de acesso. Devem estar localizados em todo o tecido do bairro, do modo mais uniforme possível, procurando formar um sistema de espaços livres, no qual todas as áreas serão hierarquizadas e distribuídas, qualitativamente, entre os habitantes. O espaço resultante da demolição das casas condenadas servirão para o desenvolvimento de atividades de lazer, artesanais, comerciais, esportivas ou, simplesmente, para reunião ou jogos para moradores de todas as idades (MASCARÓ, 1991). Esses espaços são muito importantes para as comunidades de baixa renda (Figura 14), como é o caso das focalizadas nesta dissertação: do Jardim Juliana A e do Jardim das Palmeiras II. 81

Figura 14 – Espaços Livres 2 – Fonte: Mascaró (1991)

Também, áreas de recreação poderão favorecer a remediação das conseqüências dos impactos, inclusive do ponto de vista psicológico, contingente aos danos morais, causados aos moradores. De acordo com Rolnik e Cymbalista

(1997), para a definição de uma área de recreação, alguns elementos devem ser observados, pois esses espaços têm seus objetivos, clientela e peculiaridades:

- organização do espaço, ou seja, na definição do projeto, deve ser considerado o raio de abrangência, sua vocação e o caráter de seu equipamento;

- distribuição dos brinquedos e as possibilidades de acoplamento entre eles, para o que devem ser levadas em conta a segurança e a compatibilidade;

- implantação, atentando-se para a construção de brinquedos, que não difere muito das obras de construção civil, exigindo cuidados especiais na definição das medidas e na posição de algumas peças. Como esses equipamentos, geralmente, ficam expostos às intempéries, as peças devem ser tratadas. Portanto, para que o projeto seja implantado, é necessária a preparação do terreno, o tratamento paisagístico e o tratamento da madeira. 82

Devidos às condições peculiares da área onde a intervenção está sendo proposta, os equipamentos podem ser construídos conforme modelos sugeridos pela Fundação Prefeito Faria Lima (1986), que se utilizam, em sua maioria, de materiais reciclados (como pneus e tambores) e troncos de madeira, barateando o custo das obras (Figuras 15, 16, 17, 18 e 19)

PASSARELA Figura 15 – Fonte: Fundação Prefeito Faria Lima (1986). 83

ESCALADA Figura 16 – Fonte: Fundação Prefeito Faria Lima (1986).

BALANÇO Figura 17 – Fonte: Fundação Prefeito Faria Lima (1986). 84

ESTRELÃO Figura 18 – Fonte: Fundação Prefeito Faria Lima (1986).

BALSA Figura 19 - Fonte: Fundação Prefeito Faria Lima (1986).

4. METODOLOGIA 86

O ponto de partida foi o levantamento bibliográfico e documental para constituir o referencial teórico, visando à sustentação da busca de dados através da pesquisa de campo, requerida pela natureza desta investigação.

O levantamento bibliográfico foi efetuado, de início, junto ao acervo da

Biblioteca da Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP) e do Centro Cultural do

Banco do Brasil (RJ). E, na seqüência, em órgãos públicos, como a Prefeitura

Municipal, COHAB e CETESB, visando a conseguir documentos pertinentes ao problema-tema desta dissertação, que constam das Referências Bibliográficas.

Efetuou-se, também, um levantamento complementar, junto a sites de busca na

Internet, tais como Lilacs, Bireme, Scielo, entre outros, e em artigos publicados em jornais e revistas da cidade.

As obras, os artigos e os documentos encontrados foram selecionados para a utilização no presente trabalho, com base nos seguintes critérios:

a) pertinência em relação ao assunto-objeto desta dissertação;

b) relação com os objetivos definidos para esta pesquisa; e

c) confiabilidade da fonte, clareza, e concisão das informações e resultados.

Feita a leitura e o fichamento do material coletado, os dados de interesse foram sistematizados - resumidos ou transcritos - ficando disponíveis à utilização, no momento oportuno.

A pesquisa de campo foi efetuada no próprio local, o Jardim Juliana A e o

Jardim das Palmeiras II. Os instrumentos utilizados para a coleta de dados foram uma câmera digital Sony para registros fotográficos, um Diário de Campo para observações efetuadas e um questionários estruturado (Anexo 1). Nessas visitas, observou-se os aspectos concretos dos Bairros, e foram feitos registros fotográficos e no Diário de Campo do que pareceu interessante documentar. Nas conversas 87

com moradores, física e psicologicamente afetados pela situação em que se encontrava o Jardim Juliana A e o Jardim das Palmeiras II, se notava o descontentamento; as reclamações quanto à qualidade do morar foram a tônica das falas ouvidas; esses encontros com as pessoas foram incidentais, pois chegavam espontaneamente, fazendo perguntas, para as quais não obtiveram respostas.

A aplicação do questionário foi efetuada em 200 respondentes de cada

Conjunto Habitacional, perfazendo um total de 400.

Antecedendo a coleta de dados através do questionário, cada participante assinou, espontaneamente, um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo

2), conforme Resolução CNS 196/ 96, no qual estavam explicitados os objetivos da pesquisa, a garantia do anonimato da identidade do participante e a forma de utilização dos dados provenientes da investigação.

Considerando que no Jardim das Palmeiras II, das 348 unidades inicialmente existente, 66 já foram demolidas e 33 estão previstas para demolição; e que, no

Jardim Juliana A, das 458 unidades iniciais, 8 foram demolidas, não havendo previsão para novas demolições: a amostra referida, em termos de número de respondentes, foi estabelecida considerando o problema comum aos moradores dos dois Conjuntos pesquisados. Trata-se de uma amostra aleatória estratificada, com base na constatação de problemas comuns que acometem as unidades habitacionais e a vida dos moradores.

O critério para a identificação da amostra aleatória estratificada está conforme as conceituações de dois autores pesquisados: Vera (1980) e Goode e Hatt (1991).

O primeiro considera que esse tipo de amostra se baseia em “uma classificação prévia da população em estratos baseados em um ou mais critérios” (p. 53). O segundo entende que, tal amostra, num universo homogêneo “exige uma amostra 88

menor do que uma amostra heterogênea (...) economizando tempo e dinheiro, bem como, alcançando maior precisão” (p. 285).

A fase laboratorial foi substituída por dados fornecidos pela CETESB, a partir de coletas e análises realizadas pela Escola de Engenharia de São Carlos – USP.

Os dados coletados foram sistematizados, conforme as necessidades para a construção do texto e correspondência com os objetivos, a fim de possibilitar a apresentação e discussão dos resultados, bem como as conclusões/ considerações finais e sugestões.

Pretendeu-se, com a escolha da Metodologia descrita, chegar à consecução de uma dissertação que fosse, tanto quanto possível descritiva e interpretativa da realidade pesquisada.

Considerando os objetivos propostos, anteriormente, a consecução dos mesmos, através da pesquisa realizada, provavelmente, poderá fornecer subsídios para incrementar a reflexão crítica de pessoas interessadas em qualidade de vida, sobre a questão dos resíduos sólidos na cidade de Ribeirão Preto e no Brasil, como um todo, como uma resposta ao direito à vida, assegurado por todas as leis; também, contribuir com mais uma unidade para o acervo da literatura específica sobre o tema dos impactos ambientais provocados pela ação humana; ainda, mobilizar os agentes sócio-econômicos e gestores políticos, tanto em nível estratégico como tático, no equacionamento desse problema; e mais, estimular pesquisas congêneres sobre as questões levantadas, na busca de soluções viáveis para o equacionamento das mesmas.

5. RESULTADOS E DISCUSSÕES 90

O solo foi considerado, por muito tempo, um receptor ilimitado de substâncias nocivas descartáveis, como o lixo doméstico e o urbano, e os resíduos industriais, com base no suposto “poder tampão e potencial de autodepuração, que leva ao saneamento dos impactos criados” (CETESB, 2001, p.1). Essa capacidade foi superestimada e, somente a partir da década de 1970, o solo passou a ser objeto de maior atenção, quanto à sua proteção. Entretanto, isto só aconteceu porque o mundo industrializado começou a se conscientizar dos problemas causados pelas

áreas contaminadas, no final da década de 1970 e início da década de 1980, quando o mundo tomou conhecimento da ocorrência de “casos espetaculares” nos

Estado Unidos (Love Canal), na Holanda (Lekkerkerk) e no Canadá (Ville la Salle); só então, foram criadas políticas e legislações voltadas a essas questões ambientais, em vários países, províncias e estados (CETESB, 2001).

Justamente nessa época, parte da área em estudo - Jardim Juliana A e

Jardim das Palmeiras II – foi destinada à deposição de resíduos sólidos, domésticos e urbanos, ou seja, foi transformada em “Lixão”. E quando a Política Nacional do

Meio Ambiente (Lei nr. 6.938/81) foi implantada, o problema já estava instalado

(CETESB, 2001). Esta Lei considera como bens a proteger:

- a saúde e o bem-estar da população;

- a fauna e a flora;

- a qualidade do solo, das águas e do ar;

- os interesses de proteção à natureza/paisagem;

- a ordenação territorial, e o planejamento regional e urbano;

- a segurança e a ordem pública.

Entretanto, a despeito dessa Lei, o “Antigo Lixão Juliana”, como é conhecido, continuou sem nenhum tratamento especial e o Jardim Juliana A e o Jardim das 91

Palmeiras II, edificados, posteriormente, sobre ele, e protagonistas desta dissertação, são as vítimas e testemunhas silenciosas da “degradação do solo”, que, segundo Sánchez (1998), significa:

“a ocorrência de alterações negativas das suas propriedades físicas, tais como sua estrutura ou grau de compacidade, a perda de matéria, devido à erosão e à alteração de características químicas devido a processos como a salinização, lixiviação, deposição ácida e introdução de poluentes” (p. 76).

Por ser a infra-estrutura de sustentação do Jardim Juliana A e Jardim das

Palmeiras II, o “Antigo Lixão Juliana” será objeto de algumas considerações, a seguir.

5.1. Avaliação da Área Impactada

De posse das plantas baixas dos projetos urbanísticos do Jardim Juliana A e do Jardim das Palmeiras II, demarcou-se, com linhas verdes, as construções que estão sobre o terreno do “Antigo Lixão”. Essa demarcação foi feita com base nos levantamentos aerofotogramétricos dos anos de 1984 e 1994 (Figuras 20 e 21).

Pode-se constatar que, no Jardim Juliana A, aproximadamente 15 residências foram construídas sobre o lixo, sendo que, no Jardim das Palmeiras II, esse número sobe para mais de 130...

92

Figura 20 - Projeto Urbanístico do Jardim das Palmeiras II – Área ocupada pelo Antigo Lixão Juliana (demarcação da área feita pela pesquisadora) - Fonte: Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto - Secretaria de Obras e Infra-Estrutura (s.d.). – demarcações feitas pela pesquisadora.

93

Figura 21 - Projeto Urbanístico do Jardim Juliana A – Área ocupada pelo Antigo Lixão Juliana (demarcação da área feita pela pesquisadora) - Fonte: Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto - Secretaria de Planejamento e Gestão Ambiental (1993) – demarcações feitas pela pesquisadora.

Os espaços destinados às áreas verdes no Jardim Juliana A, também são impróprios e até mesmo a Escola Municipal que fica na área institucional reservada para o bairro, encontra-se sobre essa faixa. O antigo Posto de Saúde, que foi abandonado, está no mesmo terreno da escola (Figura 22).

Figura 22 - Posto de Saúde (abandonado) 94

Segundo depoimento de um morador, José Tomaz da Silva, que conheceu o lixão em operação, portanto antes da construção dos conjuntos habitacionais, a mancha de lixo – ao contrário dos 12 mil metros quadrados estimados pela COHAB

– ocupa cerca de 28 metros de largura, por 15 mil metros de extensão, resultando um total de, aproximadamente, 420 mil metros quadrados.

O Jardim Juliana A teve seu projeto alterado no início da construção, quando o lixo foi “descoberto”. Um quarteirão de casas, com as fundações prontas, foi demolido. E, com o passar do tempo, as demolições foram se sucedendo, ano após ano... Hoje, temos o seguinte placar: Jardim Juliana A: 08 casas demolidas; Jardim das Palmeiras II, 66 casas, conforme assinalado nas plantas baixas dos projetos urbanísticos. (Figuras 23 e 24).

95

Figura 23 - Projeto Urbanístico do Jardim Juliana A – Casas Demolidas (demarcações feitas pela pesquisadora) - Fonte: Secretaria de Planejamento e Gestão Ambiental da Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto (1993) – demarcações feitas pela pesquisadora.

96

Figura 24 - Projeto Urbanístico do Jardim das Palmeiras II – Casas Demolidas (demarcações feitas pela pesquisadora) - Fonte: Secretaria de Obras e Infra-Estrutura da Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto (s.d.) – demarcações feitas pela pesquisadora.

5.2. O problema sob a ótica dos moradores

Na primeira visita aos bairros, o senhor. José Thomaz da Silva, antigo morador da região e hoje, dono de uma das casas “condenadas” do Jardim das

Palmeiras II, relatou que trabalhou no “Antigo Lixão” e que foi o responsável pelo 97

recobrimento dos resíduos ali depositados. Ele conta que um espaço da vala era preenchido e, quando atingisse o volume máximo, uma camada de 20 cm de terra, retirada do próprio local, era usada como cobertura e, sobre ela , passava-se um trator de esteira... Nada mais que isso! Sua casa fica na Rua Antonio Abrahão, 153 e, como mostram as Figuras 25, 26 e 27, foi muito prejudicada pelos recalques diferenciais sofridos pela acomodação do terreno.

Figura 25 - R. Antonio Abrahão, 153

Figura 26 - R. Antonio Abrahão, 153 98

Figura 27 - R. Antonio Abrahão, 153

A moradora Breila Pereira Dias, que já foi presidente da Associação dos

Moradores, também deu seu depoimento e contou que, no final de 2001, um geólogo deveria ser contratado para que se fizessem novas perfurações, com o objetivo de se verificarem quais seriam as áreas de risco, pois em alguns pontos já perfurados, encontrava-se lixo a pouco mais de um metro de profundidade. Em abril de 2002, por não aceitar se mudar do bairro, chegou a perder a guarda de sua filha, uma adolescente de 16 anos, quando o promotor da Infância e Juventude ordenou que algumas crianças/adolescentes fossem retiradas do bairro. Sua filha foi viver com a avó materna, mas seu cão de estimação ficou e perdeu todos os pelos... Sua casa também foi “condenada”, mas ainda não foi demolida (Figura 28).

99

Figura 28 - R. Nicolau R. Cosenza, 85

Maria Conceição Malvino, avó de um menino de 3 anos (em 2002) e moradora do Jardim Juliana A, também teve que mandá-lo para a casa de parentes.

O promotor determinou que algumas famílias retirassem as crianças e adolescentes das casas, pela presença do gás metano, emitido pelo lixo do subsolo, que poderia causar explosão. E que, se isso não ocorresse, teriam que pagar multa de 3 a 20 salários mínimos. Em relação à COHAB, ela é taxativa: “Eles querem me colocar numa casa de aluguel por um ano e fazer estudos na área. Se não tiver risco, querem que eu volte. Se eu sair do Jardim Juliana, não volto nunca mais!”.

Edileuza de Fátima Almeida teve sua casa interditada pela COHAB em novembro/2003, por haver risco de desmoronamento. Apesar de lhe ter sido oferecida uma casa de aluguel, ela optou por morar “de favor” na casa de uma amiga, por não querer abandonar o bairro onde morava há 6 anos.

O sr. Benício Reinaldo dos Santos e sua esposa Maria Romilda, disseram ter visto o sonho da casa própria ruir entre trincas e rachaduras. Eles praticamente reconstruíram o imóvel. Benício, pedreiro de profissão, gastou todas as economias e tempo disponíveis na construção da casa idealizada durante anos e que, hoje, teme por ver seu imóvel no chão e, o que é pior, sem ter para onde ir (Figura 29)! 100

Figura 29 - R. Ignácio Scandar

Segundo Nilson da Silva Barreira, desde a fundação do bairro é que existe a promessa da construção de uma “praça para o povo”, em frente à sua casa, na rua Matilde Pinho Sant’anna. No espaço reservado para ela, existem 3 poços de monitoramento de gases (Figura 30)... A Prefeitura deu início às obras e, a seguir, paralisou as atividades, alegando que a responsabilidade era da COHAB. E, até hoje, o povo e a praça estão abandonados. Mas salienta que “é só começar campanha de vereador e prefeito que aparece um monte de gente aqui, dizendo que vai fazer uma praça no local”.

Figura 30 - R. Matilde Pinho Sant’anna

101

Uma casa abandonada, na Rua Egídio Bacalã, desmoronou em junho/2004, machucando uma criança de 9 anos que brincava no interior da mesma, em companhia de outros amigos. Os antigos moradores foram retirados do local pela

COHAB, porque a casa estava com as estruturas comprometidas.

Rosângela de Resende, moradora da mesma rua, disse que sua casa estremece quando passa um carro. E que, só não sai de lá com as crianças, porque não tem para onde ir... mas sabe que está correndo riscos.

Rita de Cássia investiu 35 mil na aquisição do imóvel e esse dinheiro é dado como perdido. No ato da compra, nenhum morador foi informado de que as casas foram construídas sobre o “Antigo Lixão”.

Segundo Marcos César Bredarioli, em março de 2005, a Prefeitura e a

COHAB propuseram a construção de casas novas para apenas 30 famílias. Elas desocupariam suas casas e não seriam ressarcidas dos valores gastos em benfeitorias. A COHAB utilizaria um espaço destinado à área verde para a construção de novas moradias e, segundo ele, o problema só seria transferido de lugar. Que o seu medo é que o local se transforme num “bairro fantasma” (Figura

31).

Figura 31 - R. Nicolau R. Cosenza

102

Em maio de 2005, a aposentada Lourdes Alarcon, moradora do Jardim

Juliana, disse que todos estavam revoltados com os governantes, que iludem o povo com promessas eleitoreiras. Afirmou que ainda ocorriam emissões de gases nos canos implantados em frente à sua casa e que não adiantava mentir, pois a casa dela tinha rachaduras, a do vizinho também; todas as casas do bairro têm problemas.

Outro grande problema, sempre constante na reclamação dos moradores, é a presença de roedores e insetos, conforme Figura 32.

Figura 32 – Roedor encontrado no corredor de casa visitada

Durante as visitas aos bairros e em conversas informais com os residentes, constatou-se que a associação de moradores encontra-se ativa, mobilizando a população, solicitando providências no sentido de que seja diagnosticada, tecnicamente, a extensão e profundidade do problema, seus riscos e perigos à segurança, à saúde das pessoas e pleiteando o ressarcimento dos prejuízos a que estão expostas. Seus membros, por meio dos órgãos de comunicação, buscam o apoio da opinião pública, objetivando sensibilizar as autoridades para a solução do problema. 103

5.3 Resultados a partir do tratamento dos questionários

Ouvidos os depoimentos e pareceres informais de alguns moradores, sobre os problemas dos Conjuntos estudados, estava estabelecido o “rapport” para a obtenção de dados através do questionário.

A partir dos dados resultantes da aplicação do questionário, foi feita a caracterização dos respondentes, moradores do Jardim das Palmeiras II e Jardim

Juliana A, perfazendo um total de 400 aplicações, chegando-se aos resultados expressos em percentuais, no que se refere à idade (Tabela 2), sexo (Tabela 3), estado civil (Tabela 4) e escolaridade (Tabela 5).

Tabela 2 – Distribuição dos respondentes por faixa etária e bairro (%)

BAIRROS FAIXA ETÁRIA Palmeiras II Juliana A 20 - 29 8 6 30 - 39 8 12 40 - 49 76 72 50 - 59 4 7 Acima 60 4 3 Total 100 100

Constatou-se que, na distribuição dos respondentes por faixa etária, prevaleceu, nos dois Conjuntos pesquisados, os situados entre 40 e 49 anos.

104

Tabela 3 – Distribuição dos respondentes por sexo e bairro (%)

BAIRROS SEXO Palmeiras II Juliana A MASCULINO 28 31 FEMININO 72 69 Total 100 100

Nesta, a distribuição dos respondentes evidenciou a maioria do sexo feminino em ambos os Conjuntos, provavelmente pelo fato de as mulheres terem mais permanência em suas residências que os homens.

Tabela 4 – Distribuição dos respondentes por estado civil e bairro (%)

BAIRROS ESTADO CIVIL Palmeiras II Juliana A SOLTEIRO 28 18 CASADO 72 82 Total 100 100

Quanto ao estado civil, prevaleceram os casados, nos dois Conjuntos, que devem ser os proprietários dos imóveis visitados.

Tabela 5 – Distribuição dos respondentes por escolaridade e bairro (%)

BAIRROS ESCOLARIDADE Palmeiras II Juliana A FUNDAMENTAL 80 77 MÉDIO 20 23 Total 100 100

Verificada a escolaridade, constatou-se que a maioria possui instrução em nível de ensino fundamental. 105

Resumindo, a população respondente, em sua maioria, encontra-se na faixa de 40 a 49 anos, é do sexo feminino, casada e tendo cursado o ensino fundamental.

Os resultados expressos nas Tabelas de número 6 a 10, referem-se ao tempo de residência (Tabela 6), fatores que motivaram as demolições (Tabela 7), causas da depreciação/desvalorização dos imóveis (Tabela 8), fatores de risco (Tabela 9) e sugestões para intervenção (Tabela 10).

Tabela 6 – Distribuição dos respondentes por tempo de residência nos bairros (%) BAIRROS TEMPO(anos) Palmeiras II Juliana A até 5 8 10 6 a 10 20 27 11 a 15 68 62 16 a 20 4 1 Total 100 100

Quanto ao tempo de residência, constatou-se, em ambos os conjuntos, que maioria fica na faixa de 11 a 15 anos, que estão entre os moradores mais antigos.

Durante o tempo de moradia, a maioria dos residentes assistiu às demolições das unidades habitacionais, sendo 84% para o Jardim das Palmeiras II e 70% para o

Jardim Juliana A.

106

Tabela 7 – Distribuição dos respondentes quanto aos fatores que motivaram as demolições (%) BAIRROS FATORES Palmeiras II Juliana A trinca nas paredes 76 68 afundamento de piso 56 53 tremor à passagem 0 2 de carros infiltração de água 44 38 nas paredes e pisos presença de gases e 64 61 mau cheiro infestação de insetos 12 12 nocivos risco de 24 23 desabamento outros 8 7

Questionados sobre os fatores que motivaram as demolições, a maioria dos respondentes, nos dois Conjuntos, referiu-se às trincas nas paredes, seguido da presença de gases e mau cheiro e de afundamento do piso. Com menos de 50%, foram referidos, também, os seguintes fatores: infiltração de água nas paredes e pisos, risco de desabamento, infestação de insetos nocivos , por ser área de risco e tremor à passagem de carros (apenas para o Jardim Juliana A).

Apenas um morador do Jardim Juliana A referiu-se à ausência de qualquer risco.

Os respondentes de ambos os Conjuntos consignaram existência de algum fator de risco em sua unidade habitacional, sendo 72% no Jardim das Palmeiras II e

68% no Jardim Juliana A, que consideraram como os fatores mais significativos: mau cheiro, trincas e rachaduras (88%) e, os restantes, referiram-se a água poluída e afundamento do piso. 107

Do ponto de vista de mudanças na vida dos moradores com as demolições,

88% dos moradores do Jardim das Palmeiras II e 79% do Jardim Juliana a, responderam que esse evento afetou as suas vidas em termos de: auto-estima, moral, qualidade de vida e saúde. E, os restantes, citaram infestação de insetos e mudança de casa.

Inqueridos sobre depreciação ou devalorização dos imóveis com as demolições, 92% do Jardim das Palmeiras II e 89% do Jardim Juliana A, responderam afirmativamente, considerando as causas relacionadas na Tabela 8.

Tabela 8 – Distribuição dos respondentes quanto às causas da depreciação/desvalorização dos imóveis (%)

BAIRROS CAUSAS Palmeiras II Juliana A mais difícil de vender 72 71 preço caiu 56 60 pessoas têm receio de comprar 32 33 casas são consideradas perigosas 28 25 outros 8 4

A maior freqüência de respostas ficou em maior dificuldade de venda do imóvel, seguida de queda no preço, devido às notícias veiculadas pela TV e jornais locais; um dos respondentes expressou-se que, esses imóveis, se colocados à venda, “de graça, é caro!”.

No Jardim das Palmeiras II, 96% dos moradores e 95% do Jardim Juliana A, consideraram que as casas mais próximas às áreas de demolição são as mais prejudicadas.

Tratando-se dos fatores de risco da área estudada, os respondentes se expressaram conforme a Tabela 9. 108

Tabela 9 – Distribuição dos respondentes quanto aos fatores de risco observados (%) BAIRROS Fatores de Risco Palmeiras II Juliana A contaminação do solo 48 50 contaminação da água 68 65 emanação de gases tóxicos 68 63 comprometimento das 44 52 moradias presença de insetos nocivos 12 15 outros 8 0

Prevaleceram, nos dois Conjuntos, a contaminação da água e a emanação de gases tóxicos como fatores de risco. Com menores percentuais, foram considerados: contaminação do solo e comprometimento das moradias, em nível ainda numericamente significativo. Em escala menor, foram citados ainda: presença de insetos nocivos e riscos à saúde. Apenas um respondente, do Jardim Juliana A, referiu-se à não-existência de riscos.

No que se refere às sugestões emitidas para a intervenção nos espaços vazios resultantes das demolições, as opiniões dos respondentes foram agrupadas conforme está na Tabela 10.

109

Tabela 10 – Distribuição dos respondentes quanto às sugestões para intervenção nos espaços vazios (%). BAIRROS SUGESTÕES Palmeiras II Juliana A praça de esportes 56 62 praça de eventos 84 78 parque ecológico 28 32 quadras 68 73 poliesportivas outros 12 10

O maior número de respondentes, dos dois Conjuntos, sugeriu praça de eventos, seguida por um número significativo que escolheu quadras poliesportivas e praça de esportes. Em menor número, estão os que preferem parque ecológico e, por último, os que sugeriram a limpeza e impermeabilização da área.

Como esses acontecimentos influenciaram a vida das pessoas, gerando estados afetivos, os mais diversos, por implicar uma necessidade básica, que é a moradia, os moradores foram inqueridos em relação a como se sentiam em morando nesses locais. O exame das respostas permitiu relacionar um grande número de sentimentos negativos, expressos através de palavras, repetidas inúmeras vezes: desgostosa, desmoralizada, decepcionada, incomodada, perda, frustrada, triste e difamada, entre outras, para a maioria (88%). Os 12% restantes, expressaram sentimentos positivos, em termos de: lugar escolhido para morar, muito bem, bem, normal, morador comum, entre outras expressões.

Concluiu-se que a maioria, portanto, não está satisfeita com a situação gerada pelos problemas que acometeram suas moradias e espera que os órgãos competente tomem alguma posição em relação a isso, e que alguns dos benefícios sugeridos por eles, para intervenção na área, sejam efetivados.

110

5.4 Riscos da área

Os dados levantados confirmam que o “Lixão Juliana”, depois de desativado, provocou a exalação de gases, odores, poluição do solo, depreciação de imóveis no entorno e comprometimento de moradias construídas, indevidamente, sobre a vala da FEPASA usada para a deposição dos resíduos.

A lista dos impactos é grande e a Prefeitura Municipal, ainda, não se propôs a avaliá-los, detalhadamente, visando à eliminação ou remediação, dentro de parâmetros seguros e aceitáveis. Até o momento, o poder público limitou-se a: instalar drenos para a captação de gases, cuja eficiência parece duvidosa; demolir algumas casas, transferindo seus moradores para outros locais; e plantar eucaliptos nas laterais do antigo depósito, no trecho entre o Jardim Juliana A e o Parque dos

Servidores (Figuras 33 e 34).

Figura: 33 - Trecho entre Jardim Juliana A e Parque dos Servidores

111

Figura 34 - Trecho entre Jardim Juliana A e Parque dos Servidores – Rua Matilde Pinho Sant’anna esquina com R. Dr. Urandy V. de S. Leite

Deve-se acrescentar, ainda, que o topo da área usada para disposição dos resíduos foi recoberto com material, aparentemente, inerte, coberto por vegetação rasteira e o solo apresenta depressões, que indicam processo de estabilização da massa do resíduo (VIEIRA, op. cit.).

Entretanto, ao se considerar o tempo entre o encerramento das operações de despejo de resíduos até os dias atuais, é possível deduzir que a falta de implementação de providências, por parte do poder público, seja motivada pelos altos custos da regularização, que não só retardarão a solução dos problemas, como poderão ocasionar a necessidade de se avaliar a eficácia dos estudos dos impactos causados. Portanto, a mitigação dos impactos esbarra em obstáculos técnicos e burocráticos, que parecem vir ao encontro da lentidão e, provavelmente, do desinteresse do poder público em equacionar, definitivamente, o problema, enquanto a poluição e a degradação continua a provocar seus efeitos negativos no ambiente (Id., ibid.).

As deficiências operacionais observadas no gerenciamento do Lixão e os impactos ambientais provocados são exemplos que poderão embasar a preparação de um programa, que conscientize os atores sociais e políticos, e estabeleça novos procedimentos para essa realidade, funcionando como elemento facilitador de novas 112

relações sociais com o espaço geográfico. Esse programa não pode ser concretizado, isoladamente, mas deve partir de uma agenda formulada pela sociedade, sem tendências ou condicionamentos, respeitando as dificuldades, limitações, potencialidades e conflitos que a tarefa traz consigo.

No Laudo Pericial examinado, Cornetti (op. cit., p.7) faz um alerta, quando afirma: “o dano que ocorre hoje em determinada residência em grau acentuado é apenas uma questão de tempo para que venha a ocorrer em qualquer outra que esteja localizada sobre o ‘Lixão’”.

Apesar do baixo valor imobiliário que as áreas vizinhas adquiriram, já existem estudos encomendados pela Prefeitura Municipal, com vistas à construção do

Jardim das Margaridas, cuja parte central do loteamento estaria assentada sobre o final da vala do “Antigo Lixão”. Diante disso, podemos concluir que, mesmo não tendo resolvido os problemas dos moradores do Jardim Juliana A e do Jardim das

Palmeiras II, o poder público pretende construir mais casas populares, que certamente, apresentará os mesmos problemas estruturais e riscos para os moradores, ocorridos nos bairros citados.

5.5 Propostas de mitigação dos impactos causados

A proposta de uso futuro da área do “Antigo Lixão”, utilizando-se dos espaços reservados para as áreas verdes e das casas que foram demolidas, conforme demarcados na Figura 35, deve considerar que, independente do encerramento da disposição de resíduos no local, deverão ser construídos sistemas de drenagem superficial de águas pluviais, especialmente nos espaços destinados às áreas verdes e para a reutilização das áreas remanescentes da demolição das casas. 113

Mesmo após atingir a estabilização, o maciço de lixo inerte apresentará uma resistência semelhante à turfa, que possui uma baixa resistência de suporte, sendo desaconselhável a implantação de edificações.

Figura 35 – Demarcação das residências demolidas, das que estão em área de risco e das áreas verdes

Portanto, propõe-se a implantação de áreas verdes, equipamentos comunitários como praças esportivas, campos de futebol e áreas de convívio, já que o “Antigo Lixão” situava-se numa área que, hoje, está totalmente urbanizada.

Uma praça de esportes e eventos, onde a comunidade possa se reunir para assistir e participar de jogos, de apresentações musicais e teatrais, para a divulgação de trabalhos artesanais feitos pelos moradores, para a prática de lazer ativo e passivo, para comemorações, festas juninas e carnavalescas, e para que as crianças possam desfrutar de um play-ground; devendo incluir, também, um espaço para estacionamento. Tudo deverá ser edificado após a substituição de uma camada 114

do solo de, pelo menos, um metro, seguida de compactação e impermeabilização do terreno. Essas intervenções poderão ser feitas nas quadras do Jardim Palmeiras II, em que houve a demolição das residências, conforme mostra a Figura 36.

Figura 36 – Proposta de reurbanização da área em que as casas do Jardim Palmeiras II foram demolidas

Para os espaços destinados às áreas verdes, que pertencem ao Jardim

Juliana A, a proposta é que seja criado um Parque Botânico, de uso controlado, onde possam ser plantados diversos tipos de árvores, da flora nativa e outras espécies. De acordo com o Jornal Ambiente Brasil, de 08/05/2007, as espécies lenhosas mais usadas em recuperação são: Mimosa scabrella, Eucalyptus spp,

Tabebuia spp, Inga spp, Pinus spp, Parapiptadenia rígida, Peltophorum dubium,

Leucaena leucocephala, Balfourodendron rieddelianum. Além dessas, outras espécies também são utilizadas: Schinus terebinthifolius, Eugenia uniflora, Psidium catleianum, Vitex megapotamica, Luehea divaricata e Cerpania vernalis. Com a criação desse Parque, as escolas poderiam se utilizar dele para o ensino de

Botânica, Ecologia... enfim, para Educação Ambiental. Nas áreas onde as casas 115

foram demolidas, a proposta é de que sejam construídas canchas para jogo de boxa e mesas para outros tipos de jogos, como xadrez, dama etc. (Figura 37).

Figura 37 – Proposta de implantação de áreas verdes controladas, canchas de bocha e mesas de jogos, no Jardim Juliana A

A requalificação da área deve integrar-se ao seu entorno, considerando-se, principalmente, as necessidades da comunidade local, refletidas nos resultados das aplicações dos questionários, mostrados na Tabela 9 (p. 107).

6. CONCLUSÃO 117

O problema do Jardim Juliana A e do Jardim das Palmeiras II, que tematizou esta dissertação, é mínimo, do ponto de vista de extensão territorial, talvez, o “mais minúsculo” dos alfinetes espetados no planisfério da degradação ambiental.

Entretanto, se considerado em nível de Ribeirão Preto, o contexto mais próximo no qual se insere, esta começa a ganhar vulto, pois a Política Nacional do Meio

Ambiente (Lei nº. 6.938/81), que, entre outros dispositivos, estabelece os bens a proteger, não foi considerada; e os danos estão aí – no ar, no solo, na água, nas moradias, na qualidade do morar e na saúde de seus moradores, cuja dignidade e direito inalienável à vida, não estão sendo considerados, conforme foi constatado.

Para orientar a pesquisa em pauta, definiu-se alguns objetivos – o geral e os específicos, cuja consecução ou não será esclarecida, a seguir, com apoio nos achados resultantes da mesma e na literatura tomada como infra-estrutura teórica.

Pode-se afirmar que o objetivo geral – investigar os impactos ambientais em dois

Conjuntos Habitacionais de Ribeirão Preto – SP, o Jardim Juliana A e o Jardim das

Palmeiras II, edificados sobre o “Antigo Lixão Juliana” – foi atingido. A literatura compulsada – que reuniu obras gerais e específicas, artigos científicos, matérias de jornais locais, documentos e plantas – bem como a trajetória metodológica percorrida, adequada aos objetivos específicos, permitiram realizar a investigação proposta, em nível satisfatório; pôde-se obter a caracterização do problema em pauta, definir alguns impactos ambientais e descrever as conseqüências dramáticas dos mesmos à vida dos moradores do Jardim Juliana A e do Jardim das Palmeiras

II, tomados como local da pesquisa.

Os desdobramentos do objetivo geral, em cinco objetivos específicos, possibilitaram passos mais seguros ao processo de investigação. 118

Como primeiro objetivo específico definiu-se: caracterizar os conjuntos habitacionais Jardim Juliana A e Jardim das Palmeiras II, como o local da pesquisa.

A sua consecução envolveu exame minucioso de jornais diários de Ribeirão Preto (A

Cidade, Verdade e Folha Ribeirão), do período de 2001 a 2006; os exemplares consultados expuseram, de maneira dramática, todos os problemas e conseqüências oriundos da edificação desses conjuntos habitacionais sobre o

“Antigo Lixão Juliana”: a contaminação do solo pela percolação do chorume e de componentes químicos do lixo; a poluição do ar pela exalação de gases nocivos à saúde, como o metano, resultante da decomposição da matéria orgânica, entre outros, bem como do mau cheiro, permeando o dia-a-dia de seus moradores; a fragilização do terreno, em conseqüência da compactação inadequada do lixo depositado; os problemas estruturais apresentados pelas unidades habitacionais, decorrentes da fragilização do terreno e acomodação do solo; a presença contínua de insetos e roedores, transmissores de doenças, que ameaçam os moradores todos os dias; os riscos de desabamento e os danos morais, só para citar alguns.

Tudo o que os jornais denunciaram foi corroborado por documentos oficiais, entre eles: o Relatório e Parecer Técnico da CETESB, cobrindo o período de junho/98 a junho/99, emitido pela Escola de Engenharia de São Carlos – USP; o Laudo Pericial, assinado por Marco Antonio Cornetti, Engenheiro de Minas, apresentando provas que os dois conjuntos habitacionais foram construídos pela COHAB sobre o “Lixão”, ativo no período de 1974 a 1978. Ainda, a documentação fotográfica e os registros em Diário de Campo efetuados pela pesquisadora,k no próprio “locus” da pesquisa; e o exame minucioso, de plantas-baixas de projetos urbanísticos e levantamentos aerofotogramétricos fornecidos por órgãos públicos: Secretaria de Obras e Infra- estrutura, e Secretaria de Planejamento e Gestão Ambiental. Tudo isso possibilitou a 119

consecução deste objetivo e permitiu a aplicação do conceito de “área degradada” ou “contaminada”, segundo a conceituação de Sánchez (1998), já exposta, que impossibilita o uso do solo/terreno para suas funções naturais, principalmente, a agricultura, a construção de moradias e a extração de água potável de boa qualidade.

O segundo objetivo proposto – identificar os problemas relativos às moradias e aos moradores, conseqüentes de os mesmos (Jardim Juliana A e Jardim das

Palmeiras II) terem sido edificados sobre o “Antigo Lixão” – foi operacionalizado a partir do exame, sob este ponto de vista, dos jornais diários do período de 2001 a

2006, dos documentos oficiais, de projetos urbanísticos e de levantamentos aerofotogramétricos, da documentação fotográfica e registros efetuados pela própria pesquisadora – usados em relação ao objetivo anterior -, além de conversas informais e incidentais com moradores e dados dos questionários aplicados. O resultado confirmou as denúncias que vinham sendo veiculadas pelos meios de comunicação – jornais, rádio, TV - bem como pelas queixas dos moradores, que poderiam ser traduzidas como danos morais.

“Dano moral”, segundo Minozzi (citado no Relatório do Inquérito Civil nr. 098/98, p. 20), “... não é o dinheiro nem coisa comercial reduzida a dinheiro, mas a dor, o espanto, a emoção, a vergonha, a injúria física ou moral, em geral uma dolorosa sensação experimentada pela pessoa, atribuindo à palavra dor o mais largo significado”.

Constatou-se os problemas estruturais apresentados por unidades habitacionais, descritos nas fontes de pesquisa supracitadas, em visitas ao “locus”, e as unidades atingidas e as demolidas foram identificadas nas plantas- baixas, sendo

08 no Jardim Juliana A e 63 no Jardim das Palmeiras II. Além dos danos morais, os moradores tiveram outras perdas com a sua remoção para outros conjuntos habitacionais: unidades habitacionais menores que a anterior, indenização inferior 120

ao valor pago pela moradia anterior, entre outros, que implica na transgressão ao

Código de Defesa do Consumidor, pois, segundo Nelson Nery Júnior (1991), um dos autores do anteprojeto desse Código (citado no Relatório do Inquérito Civil nº.

098/98, p. 20), em se referindo aos aspectos relevantes do mesmo:

“O Código admite expressamente a acumulação de danos patrimoniais e morais, pondo termo à antiga discussão que se formou, principalmente em face da jurisprudência do STF (Supremo Tribunal Federal), sobre a não-acumulatividade do dano moral com o patrimonial. Agora a lei permite expressamente”.

Considerando, ainda, os problemas relativos às moradias e aos moradores, pertinentes a este objetivo, causou consternação e revolta um desastre, noticiado no

Jornal Verdade, de 8 de junho de 2004: “Casa desaba em cima de criança de 9 anos”, em conseqüência de comprometimento estrutural da residência, que, por isso, havia sido abandonada pelos moradores. A mesma matéria se refere, também, a várias queixas dos mesmos, consignadas nas expressões: estremecimento da casa à passagem de um carro na rua, rachaduras nas paredes, piso estufado, situação de risco, desconhecimento da construção ser irregular por ocasião da compra, perda do dinheiro investido de R$ 35 mil e a morosidade da Justiça.

No que tange ao terceiro objetivo – codificar os níveis atuais de impacto ambiental causados pelo “Antigo Lixão Juliana”, nesses conjuntos habitacionais – foram compulsados documentos oficiais como o Relatório e Parecer Técnico

(CETESB, 2000), o Laudo Pericial (CORNETTI, 2003), a Informação Técnica nº.

229/2004/CMg-R, solicitada à CETESB pela Promotoria de Justiça de Defesa do

Consumidor; os dados pertinentes aos documentos da CETESB foram conferidos e confirmados pela pesquisadora, quando de sua visita a esse Órgão, em 9 de maio de 2007. Com isso, pode-se afirmar que este objetivo foi, satisfatoriamente, atingido, eis que: o Relatório e Parecer Técnico referido, sobre a presença de gás metano nos 121

pontos de coleta, entre junho/98 e junho/99 evidenciou valores próximos a 5% de material ainda passível de degradação, portanto, o processo de digestão anaeróbia encontra-se em extinção; os 4 exaustores de monitoração, interligados a um sistema de drenagem horizontal que facilita a condução dos gases para a atmosfera, impedem que o gás metano invada as residências e ocorram explosões. Por outro lado, não se tem notícia de que tenham sido adotadas medidas de controle de poluição; nem estudos que apontem a possibilidade de haver ou não a contaminação de águas subterrâneas e superficiais, ou do solo, bem como de riscos para a saúde e a segurança dos moradores. Entretanto, salienta o Parecer, que as amostras de gases não foram suficientes, pois os pontos de amostragens não são representativos, nem a periodicidade das amostras. Quanto à Informação Técnica referida, pertinente à água de abastecimento público, constatou-se, de acordo com os resultados de análises laboratoriais, que estes não indicam anormalidades, seja para os ensaios bacteriológicos quanto fisicoquímicos, para as amostras e parâmetros analisados. O Laudo Pericial considerado, não tinha como finalidade tratar dos impactos ambientais, mas apenas apresentar provas de que os dois conjuntos habitacionais foram construídos sobre o “Lixão”, pela COHAB; entretanto, fornece um dado importante, quanto à ingestão e inalação do solo, em forma de poeira, pelas pessoas. E a poeira do solo é representativa do solo local, podendo conter substâncias nocivas à saúde dos moradores.

Finalmente, a consecução do quarto objetivo – propor medidas envolvendo urbanismo e paisagismo, para atenuar as conseqüências desses impactos na qualidade do morar de sua população – demandou considerar a Educação

Ambiental, visando à ampliação da consciência ecológica, como ponto de partida, pela sua importância “como instrumento de auxílio na construção de um ambiente 122

urbano sustentável” (MAGALHÃES et al., 2003, p.90); considerou-se, também, a importância de “áreas verdes mitigadoras de impactos ambientais urbanos”

(MACEDO E OLIVEIRA, 2002, p. 43), integradas à malha viária, através da arborização; evidenciou-se, também, a necessidade de “recuperação e remediação de áreas contaminadas” (CETESB, 2001, p.11), através de medidas corretivas, visando à utilização dessas áreas para um determinado uso, por exemplo, para implantação de estacionamento e praça de esporte, com pavimento impermeável, ou

área verde de uso controlado, entre outros. Acrescente-se as sugestões de intervenção na área emitidas pelos moradores, em resposta ao questionário (Tabela

9 – p. 107).

Tendo em vista a importância da temática investigada, no que se refere, principalmente, à qualidade de vida e ao bem-estar dos moradores do Jardim

Juliana A e do Jardim das Palmeiras II, considerou-se necessário buscar subsídios na literatura, que pudessem orientar propostas de medidas interventivas, visando à atenuação dos impactos referidos na parte nuclear desta dissertação, na qualidade do morar.

Para tanto, propôs-se a ocupação e integração dos espaços livres dos dois bairros, com praças esportivas e de eventos, estacionamento, áreas verdes e áreas de convívio.

Considerando-se que, nos dois bairros, existem casas que não foram afetadas pelos impactos causados pelo lixo, porque nem todas foram construídas sobre a faixa por ele ocupada, a requalificação/remediação deverá promover a revitalização e, também, a revalorização da área. Durante todo o tempo que esse processo vem se arrastando, os moradores das casas não-afetadas viram seus 123

imóveis serem desvalorizados e, a área vizinha ao “Antigo Lixão” perder todo o valor e interesse imobiliário.

Tendo chegado a este ponto e constatada a consecução dos objetivos, após a retomada e justificação dos mesmos à luz da pesquisa realizada, e feitas as sugestões para recuperação e remediação da área estudada, considerou-se concluído o que foi proposto como investigação desta dissertação.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 125

AZEVEDO, M. N. de. As dimensões inexploradas de uma ecologia mental. In: BRANDÃO, D. M. S. e CREMA, R. (orgs.). Visão Holística em Psicologia e Educação. São Paulo: Summus, 1991. p. 149 – 160.

CAPRA, F. O Ponto de Mutação. A Ciência, a Sociedade e a Cultura Emergente. São Paulo: Cultrix, 1989.

CARDOSO, V. A.; TEIXEIRA, E. T. Gestão de resíduo sólido doméstico da cidade de Ribeirão Preto-SP: histórico, avaliação e recomendações. Disponível em: http://www.fec.unicamp.br/sapsa/files/SAPSA37.doc. Acesso em 03 de março de 2007.

CETESB – Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental. Conceituação 1000. Projeto CETESB – GTZ (atualizado). nov.1999.

______. Relatório e Parecer Técnico nº. 006/00 EERO, de 19.abr.2000. Ribeirão Preto-SP.

______. Informação Técnica nº. 229/2004, de 15.set.2004.

CORNETTI, M. A. Laudo Pericial. Ribeirão Preto: Promotoria de Justiça, 2003.

COHAB – Companhia Habitacional Regional de Ribeirão Preto. Carta-resposta (ao requerimento nº. 15.494 da Câmara Municipal). Ribeirão Preto-SP, 15.nov.1991.

CORTEZ, J. C. V.; MILFONT, T. L., BELO, R. P. Significados psicológicos do lixo: um estudo através das redes semânticas naturais. Psico – Usf. Bragança Paulista: Universidade São Francisco. v6, nº. 2, jul./dez.2001, p.21 – 27.

D’ALMEIDA, M. L. O.; VILHENA, A. Lixo Municipal: manual de gerenciamento integrado. São Paulo: IPT/CEMPRE, 2000.

126

DUARTE, C. R.; SILVA, O. L.; BRASILEIRO, A. (org). Favela, um bairro. Propostas metodológicas para intervenção pública em favelas do Rio de Janeiro. São Paulo: Pro-Editores, 1996.

ECHEVERRI, A. P. N. de. El reencantamiento del mondo: ideas para uma ética- estética desde la dimensión ambiental. Rev. Mimesis Ciências Humanas. Bauru – SP: Universidade Sagrado Coração. v.23, nº. 1, 2002, p. 25 – 43.

FIPAI – Fundação para o Incremento da Pesquisa e do Aperfeiçoamento Industrial. Condições de faixa de terra localizada nos Conjuntos Habitacionais Jardim Juliana A e Palmeiras II, face a sua possível utilização para a disposição de resíduos sólidosurbanos da cidade de Ribeirão Preto entre 1974 e 1978, Parecer Técnico, 1993.

FUNDAÇÃO PREFEITO FARIA LIMA. Brinquedos para parques infantis. São Paulo: CEPAM, Governo Montoro, 1986.

GOODE, W. J.; HATT, P. K. Métodos em pesquisa social. São Paulo: Nacional, 1991.

HAAG, C. Natureza Atormentada. Pesquisa FAPESP. nº. 114, ago. 2005, p. 86 – 89.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2000. Rio de Janeiro: IBGE, 2000.

______. Pesquisa nacional de saneamento básico. Rio de Janeiro: IBGE, 2000.

MACEDO, R. l. G.; OLIVEIRA, T. K. de. Manejo de áreas verdes urbanas. Anais do V Simpósio de Ciências Aplicadas da FAEF. Garça: FAEF, 2002, p. 41 – 52.

127

MAGALHÃES, W. M. et al. Educação Ambiental com instrumento de sustentabilidade do ambiente urbano. Anais do VI Simpósio de Ciências Aplicadas da FAEF. Garça: FAEF, 2003, p. 89 – 103.

MARTIN, W. L. e TEDDER, T. B. Use of old handsfills in Florida. 16th GRI Conference, Geosynthetic Institute Philadelphia, PA, USA, December 16-17, 2002, p. 136.

MASCARÓ, J. L. Infra-estrutura habitacional alternativa. Porto Alegre: Sagra, 1991.

MATOS, B. T. et al. Considerando mais o lixo. Florianópolis: Insular, 1999.

MENEZES, M. L. de. Tratamento de efluentes domésticos. Ciência Contemporânea e Ensino: Novos aspectos. Bauru: UNESP, 1996, p. 101 – 104. (Série Ciência e Educação, nº. 2).

MINISTÉRIO PÚBLICO. PROMOTORIA DE JUSTIÇA. Relatório do Inquérito Civil nº. 098/98. Ribeirão Preto-SP, 13.jul.2001.

MONTEIRO, J. H. P. et al. Manual de gerenciamento integrado de resíduos sólidos. Rio de Janeiro: IBAM, 2001.

MORE, T. A Utopia. Os Pensadores X. São Paulo: Abril Cultural, 1972.

NASCIMENTO JÚNIOR, A. F. Natureza, ciência e meio ambiente. Ciência Contemporânea e Ensino: Novos aspectos. Bauru: UNESP, 1996, p. 39 - 48. (Série Ciência e Educação, nº. 2).

PIETRONI, P. Viver holístico. São Paulo, Summus, 1998.

ROLNIK, R.; CYMBALISTA, R. (org.). Instrumentos urbanísticos contra a exclusão social. São Paulo: Polis, 1997.

128

ROMERO, M. A. B. Princípios bioclimáticos para o desenho urbano. São Paulo: Projeto Editores Associados Ltda., 1988.

SÁNCHEZ, L. E. A desativação de empreendimentos industriais: um estudo sobre o passivo ambiental. Tese de Livre-Docência, Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1998. 178p.

SPINELLI, E. Ribeirão Preto(SP) perde R$ 7,2 milhões por ano com lixo. Folha Online. Acesso em 19/08/2007. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/ folha/cotidiano/ult95u74657.shtml.

THEMELIS, N. J.; ULLOA, P. A. Methane generation in landfills. Earth Engineering Center and Department of Earth and Environmental Engineering, Columbia University, New York, NY 10027, USA, 2006..

VAZOLLER, F. et al. Biodegradability potencial of two experimental landfills in Brazil. Brazilian Journal of Microbiology. 32:97 – 92, 20001. ISSN 1517-8382.

VERA, A. A. Metodologia da pesquisa científica. Porto Alegre: Globo. 1980.

VIEIRA, E. A. A questão ambiental do resíduo/lixo em Ribeirão Preto. Universidade Estadual Paulista – UNESP, Rio Claro, 2002 (dissertação de mestrado).

WATSON, R. Clima de Urgência (entrevista). Rev. Época. nº. 352, 14 fev. 2005. p. 24 – 26. www.ambientalbrasil.com.br. Recuperação de áreas degradadas. Jornal Ambiente Brasil – Portal Ambiental. 08.maio.2007. Acesso em 12.agosto.2007.

ANEXOS

130

ANEXO 1 - QUESTIONÁRIO

Prezado(a) Senhor(a)

Solicito a sua colaboração para uma pesquisa que estou realizando sobre condições sócio- ambientais dos moradores dos Jardins Juliana e Palmeiras II, respondendo este questionário, anonimamente.

Dados do respondente:

Bairro: ______Idade: ______Sexo: ______Estado Civil: ______

Escolaridade: ______Questões:

1. Há quanto tempo reside no bairro?

( ) até 5 anos

( ) 6 a 10 anos

( ) 11 a 15 anos

( ) 16 a 20 anos

2. Durante esse tempo, você assistiu a ocorrência de demolições de unidades habitacionais?

( ) sim ( ) não

3. Assinale alguns fatores, de que você tem notícia, que motivaram as demolições.

( ) trincas nas paredes

( ) afundamento do piso

( ) tremor à passagem de carros

( ) infiltração de água nas paredes e piso

( ) a presença de gases e mau cheiro

( ) infestação de insetos nocivos

( ) risco de desabamento

( ) outros; cite: ______

4. Você nota algum fator de risco na unidade em que você mora?

( ) sim ( ) não

Se sim, quais? ______

5. A demolição de casas afetou a vida dos moradores do conjunto habitacional?

Se sim, como? ______131

6. Com as demolições ocorridas, houve depreciação ou desvalorização dos imóveis do Conjunto Habitacional?

( ) sim ( ) não

Se sim, examine as opções abaixo:

( ) ficou mais difícil de vender

( ) o preço caiu

( ) as pessoas têm receio de comprar

( ) as casas são consideradas perigosas

( ) outros; quais? ______

7. As casas mais próximas ao terreno das casas demolidas são as mais prejudicadas?

( ) sim ( ) não

8. Conhecendo o bairro como um todo, que fatores de risco você considera os mais importantes, entre os abaixo relacionados:

( ) contaminação do solo

( ) contaminação da água

( ) emanação de gases tóxicos

( ) comprometimento das moradias

( ) presença de insetos nocivos

( ) outros; quais? ______

9. Quais suas sugestões para os espaços vazios resultantes das demolições?

( ) praça de esportes

( ) praça de eventos

( ) parque ecológico

( ) quadras poliesportivas

( ) outros; quais? ______

10. Para terminar, como você se sente morando neste Conjunto Habitacional?

______

______

132

Anexo 2

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E EXCLARECIDO

Título da pesquisa: Estudo dos Impactos Ambientais causados pelo Antigo Lixão, no Jardim Juliana A e Jardim das Palmeiras II

Informações aos entrevistados

Eu, Jeannette Marcean Bervique, aluna do Curso de Mestrado em tecnologia Ambiental da Universidade de Ribeirão Preto, venho, através deste, solicitar sua colaboração em minha pesquisa, que tem por objetivo geral investigar os impactos ambientais em dois Conjuntos Habitacionais de Ribeirão Preto, o Jardim Juliana A e o Jardim das Palmeiras II, edificados sobre o “Antigo Lixão Juliana”.

A sua colaboração consiste em responder ao questionário para coleta de dados, para posterior análise, mediante a sua autorização e concordância em participar da mesma.

A sua participação será voluntária e você terá a liberdade de abandonar esta pesquisa em qualquer tempo ou por qualquer motivo, sem que isto lhe acarrete qualquer prejuízo.

Asseguro, também, que não haverá a divulgação de sua identificação pessoal e que você poderá e deverá fazer todas as perguntas que julgar necessárias, antes de concordar em participar da pesquisa, assim como a qualquer momento durante o desenvolvimento desta.

Eu, ------, RG. ------, após ter lido e entendido todas as informações referentes a essa pesquisa, concordo, espontaneamente, em participar e autorizo o uso de minhas respostas em futuras publicações de informações de dados, desde que seja mantido completo anonimato. Declaro, ainda, que recebi todas as informações necessárias para minha compreensão dessa pesquisa.

(Data e Assinatura do Respondente)

Eu, Jeannette Marcean Bervique, declaro ter fornecido as informações necessárias para a compreensão da pesquisa, ao respondente acima assinado.

(Data, Assinatura e RG da pesquisadora)