Representação
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EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO RANDOLPH FREDERICH RODRIGUES ALVES, brasileiro, Senador da República, portador da cédula de identidade nº 050360, inscrito no CPF sob o nº 431.879.432-68, com domicílio profissional na Avenida Procópio Rola, nº 2326, Bairro Santa Rita, Macapá - AP, CEP: 68.901-076; vem apresentar, com fulcro no artigo 5º, inciso XXXIV, alínea “a”, da Constituição Federal, e no artigo 53 da Lei nº 8.443, de 1992, o presente RELATO DE MATÉRIA EXTERNA para requerer a este TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO a tomada de todas medidas cabíveis para a investigação do esquema de “orçamento secreto” a nível federal divulgado nesse final de semana pelo jornal O Estado de São Paulo, com a aplicação das sanções de estilo caso constatadas as irregularidades delineadas nas reportagens. Com efeito, no sábado, recebemos a notícia de que haveria um orçamento secreto bilionário de Bolsonaro responsável por bancar trator superfaturado em troca de apoio no Congresso: esquema do governo que destina R$ 3 bilhões em emendas para auxiliar base no Congresso; parte delas é gasta para compra de tratores com preços até 259% acima dos valores de referência. Para que não restem dúvidas, confira-se a íntegra da reportagem1: Um esquema montado pelo presidente Jair Bolsonaro, no final do ano passado, para aumentar sua base de apoio no Congresso criou um orçamento paralelo de R$ 3 bilhões em emendas, boa parte delas destinada à compra de tratores e equipamentos agrícolas por preços até 259% acima dos valores de referência fixados pelo governo. 1 Disponível em: <https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,bolsonaro-cria-orcamento-secreto-em-troca-de-apoio-do-congress o,70003708713>. Acesso em 10/5/2021. O flagrante do manejo sem controle de dinheiro público aparece num conjunto de 101 ofícios enviados por deputados e senadores ao Ministério do Desenvolvimento Regional e órgãos vinculados para indicar como eles preferiam usar os recursos. O detalhe é que, oficialmente, o próprio Bolsonaro vetou a tentativa do Congresso de impor o destino de um novo tipo de emenda (chamada RP9), criado no seu governo, por “contrariar o interesse público” e estimular o “personalismo”. Foi exatamente isso o que ele passou a ignorar após seu casamento com o Centrão. Os ofícios, obtidos pelo Estadão ao longo dos últimos três meses, mostram que esse esquema também atropela leis orçamentárias, pois são os ministros que deveriam definir onde aplicar os recursos. Mais do que isso, dificulta o controle do Tribunal de Contas da União (TCU) e da sociedade. Os acordos para direcionar o dinheiro não são públicos, e a distribuição dos valores não é equânime entre os congressistas, atendendo a critérios eleitorais. Só ganha quem apoia o governo. O senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), por exemplo, determinou a aplicação de R$ 277 milhões de verbas públicas só do Ministério do Desenvolvimento Regional, assumindo a função do ministro Rogério Marinho. Ele precisaria de 34 anos no Senado para conseguir indicar esse montante por meio da tradicional emenda parlamentar individual, que garante a cada congressista direcionar livremente R$ 8 milhões ao ano. Ex-presidente do Senado, Alcolumbre destinou R$ 81 milhões apenas à Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), a estatal que controla, ao lado de outros políticos. Um caso emblemático é o do deputado Lúcio Mosquini (MDB-RO). O governo aceitou pagar R$ 359 mil num trator que, pelas regras normais, somente liberaria R$ 100 mil dos cofres públicos. No total, o deputado direcionou R$ 8 milhões. Há situações até em que parlamentares enviaram milhões para compra de máquinas agrícolas para uma cidade a cerca de dois mil quilômetros de seus redutos eleitorais. É o caso dos deputados do Solidariedade Ottaci Nascimento (RR) e Bosco Saraiva (AM). Eles direcionaram R$ 4 milhões para Padre Bernardo (GO). Se a tabela do governo fosse considerada, a compra sairia por R$ 2,8 milhões. À reportagem, Saraiva disse que atendeu a um pedido de Nascimento, seu colega de partido. Por sua vez, Nascimento afirmou ter aceito um pedido do líder da legenda na Câmara, Lucas Vergílio (GO). Planilha secreta do governo obtida pelo Estadão revela que Alcolumbre também destinou R$ 10 milhões para obras e compras fora do seu Estado. Dois tratores vão para cidades no Paraná, a 2,6 mil quilômetros do Amapá. Sem questionar, o governo concordou em comprar as máquinas por R$ 500 mil, quando pelo preço de referência sairiam por R$ 200 mil. As máquinas são destinadas a prefeituras para auxiliar nas obras em estradas nas áreas rurais e vias urbanas e também nos projetos de cooperativas da agricultura familiar. Os políticos costumam promover festas de entrega dos equipamentos, o que lhes garante encontros e fotos com potenciais eleitores em ano pré-eleitoral. Ao serem entrevistados, deputados e senadores negavam o direcionamento dos recursos ou se recusavam a prestar informações. Confrontados com ofícios assinados por eles e a planilha do governo, acabaram por admitir seus atos. O deputado Vicentinho Junior (PL-TO) escreveu à Codevasf que havia sido “contemplado” com o valor de R$ 600 mil para compra de máquinas. “Dificilmente esse ofício foi redigido no meu gabinete, porque essa linguagem aí, tão coloquial, eu não uso”, disse. Somente após o Estadão encaminhar o documento, Vicentinho Junior admitiu a autoria, mas minimizou a expressão “contemplado” ali utilizada. “Às vezes, uma colocação nesse sentido nada mais é do que ser simpático”, resumiu. “Minha cota”, “fui contemplado” e “recursos a mim reservados” eram termos frequentes nos ofícios dos parlamentares. Foi dessa última forma que a deputada e atual ministra da Secretaria de Governo, Flávia Arruda (PL-DF), se dirigiu à Codevasf para definir o destino de R$ 5 milhões. “Não me lembro. Codevasf?”, perguntou ao Estadão. Ao ler o documento, Flávia desconversou: “É tanta coisa que a gente faz que não sei exatamente do que se trata”. Nem tudo, porém, é registrado. O senador Rodrigo Cunha (PSDB-AL) admitiu que “ditou” para o ministro Marinho onde R$ 7 milhões deveriam ser aplicados. Na prática, a origem do novo esquema está no discurso de Bolsonaro de não distribuir cargos, sob o argumento de não lotear o primeiro escalão do governo. De um jeito ou de outro, a moeda de troca se deu por meio da transferência do controle de bilhões de reais do orçamento ao Congresso. Tudo a portas fechadas, longe do olhar dos eleitores. Em outra reportagem2, o próprio Estadão muito bem afirma que o esquema de um orçamento secreto montado pelo presidente Jair Bolsonaro para garantir apoio no Congresso 2 Disponível em: <https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,tratoraco-atropelou-leis-orcamentarias-e-veto-de-bolsonaro,70003 709466>. Acesso em 10/5/2021. atropela a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e posições assumidas por ele na campanha e já no exercício do mandato. Na liberação sigilosa de R$ 3 bilhões para serviços de obras e compras de tratores e máquinas agrícolas indicados por um grupo escolhido a dedo de deputados e senadores, no final ano passado, o governo atropelou ao menos três exigências da legislação. Veja-se: No que tange à LDO de 2020, as autorizações de repasses de recursos do Ministério do Desenvolvimento Regional deixaram de estabelecer critérios para definição das localidades beneficiadas e não apresentaram indicadores socioeconômicos ao distribuir os recursos. Além disso, não priorizaram a continuidade de obras iniciadas. Numa radiografia do orçamento secreto, as cidades de Tauá (CE), Santana (AP) e Petrolina (PE) aparecem em destaque como os redutos eleitorais de aliados do governo que receberam recursos de maneira desproporcional, por critérios apenas políticos. Os R$ 110,3 milhões que o relator-geral do orçamento, Domingos Neto (PSD-CE), destinou a Tauá, em dezembro, logo após a eleição de sua mãe, Patrícia Aguiar (PSD), fizeram da cidade a maior beneficiada do Brasil por repasses da pasta do Desenvolvimento Regional no ano passado. Encravado no Sertão dos Inhamuns, o município de 57 mil moradores vive da agricultura familiar e da pecuária. É um feudo familiar. Patrícia está no quarto mandato. O avô paterno do deputado, que lhe rendeu o nome, também foi prefeito duas vezes. O pai, Domingos Filho, foi vice-governador no mandato de Cid Gomes, entre 2011 e 2014, e depois virou adversário da família Ferreira Gomes. Na Região Norte, a cidade de Santana foi a mais beneficiada por recursos do orçamento secreto. Por indicação do senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), o município firmou contrato de repasse de R$ 95,7 milhões para a pavimentação de ruas, que teriam como destino Macapá se o irmão dele, Josiel Alcolumbre (DEM), tivesse vencido a eleição para prefeito da capital amapaense. Segundo fontes, para não turbinar o mandato do adversário da família, Alcolumbre redirecionou o investimento. O senador ainda redirecionou R$ 30 milhões para Tartarugalzinho (AP), onde o correligionário Bruno Mineiro (DEM) se elegeu. Laços de família foram motivos também que tornaram Petrolina (PE) a nona cidade com mais investimentos do Ministério do Desenvolvimento Regional em 2020. O município é administrado por Miguel Coelho (MDB), filho do senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE). O líder do governo no Senado ditou a transferência de R$ 46.569.000,00 ao município por meio da estatal Companhia do Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba (Codevasf) em dois convênios, celebrados nos mesmos valores. Há mais de duas mil cidades no Brasil com piores indicadores socioeconômicos do que Tauá, Santana e Petrolina. No ranking nacional de Índice de Desenvolvimento Humano, Petrolina e Santana estão na metade superior, enquanto Tauá não está nem entre as duas mil cidades de mais baixo índice, dentro de um total de 5565 municípios. Só no Ceará há 140 cidades com IDH mais baixo que o município administrado pela mãe do deputado.