Xv Congresso Brasileiro De Sociologia
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XV CONGRESSO BRASILEIRO DE SOCIOLOGIA 26 a 29 de Julho de 2011, Curitiba (PR) Grupo de Trabalho Violência e Sociedade A incidência da violência doméstica contra crianças nos bairros da cidade de Santa Maria-RS Autora: Mari Cleise Sandalowski1 Co-autores: Vinicius Foletto Bevilaqua2, Paola Stuker3, Gabriela Felten da Maia4. UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA – UFSM 1 Professora Doutora em Sociologia do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de Santa Maria. 2 Acadêmico do curso de Ciências Sociais da Universidade Federal de Santa Maria. 3 Acadêmica do curso de Ciências Sociais da Universidade Federal de Santa Maria. 4 Mestre em Ciências Sociais pesquisadora do Grupo de Estudos e Pesquisas em Cultura, Gênero e Saúde. RESUMO Este estudo tem por objetivo elaborar um mapeamento das ocorrências de violência doméstica contra crianças no cenário urbano santa-mariense, a partir de um diagnóstico da disposição desta forma de conflito nos bairros da cidade. Neste sentido, as questões relativas a esta temática precisam ser percebidas como aspectos que estão inseridos em diversas instâncias sociais como, por exemplo, o sistema judiciário, as relações familiares, econômicas, culturais e políticas de uma determinada sociedade. Nestas instâncias, os indivíduos estabelecem relações de sociabilidade que estão permeadas por interesses, conflitos e estratégias de se conduzir em sociedade, isto é, suas posições sociais estão inseridas em um contexto de hierarquização, representações sociais e relações de poder. Palavras-chave: violência doméstica, crianças, família INTRODUÇÃO A violência doméstica contra as crianças constitui hoje um dos parâmetros de discussão apresentados pelos movimentos sociais e pela sociedade civil. Reconhecida há poucas décadas como um problema social no país, ela passa a ser investigada em suas diversas formas, seja física, sexual ou psicológica. Ao contrário da violência familiar, o conceito de violência doméstica é mais amplo, pois abrange não apenas os conflitos existentes entre membros consangüíneos, mas também os embates sociais vivenciados no âmago das relações interpessoais entre os indivíduos que possuem algum tipo de relação doméstica. Deste modo, ela engloba além do grupo familiar aquelas formas de violências praticadas por amigos, vizinhos e parentes afins (Saffioti, 2000). A importância da pesquisa “Cartografia da violência doméstica contra crianças na cidade de Santa Maria/RS”5, que fundamenta este artigo, é subsidiar o debate público sobre esta forma de violência, bem como contribuir para a formulação de políticas públicas voltadas para o controle deste tipo de violência na área urbana. A temática da violência envolve outras problemáticas sociais adjacentes tais como a saúde, os direitos humanos, a cidadania e o trabalho. O combate à violência pressupõe o investimento governamental em políticas públicas de melhoria na distribuição de renda, educação em tempo integral e moralização dos recursos públicos. Neste sentido, os estudos sobre esta temática devem levar em consideração que os direitos sociais não podem mais ser observados somente como norma jurídica reguladora e detentora de poder e dos direitos positivados do Homem, pois a dignidade humana surge da sociedade e dos fatos sociais. A meta do estudo apresentado consiste, portanto, em produzir uma cartografia da violência doméstica contra crianças na cidade de Santa Maria, com as respectivas características sócio-econômicas dos envolvidos nesta forma de conflito. O intuito do mapeamento da incidência desta violência no cenário urbano é disponibilizar os dados obtidos aos órgãos públicos e privados, a fim de auxiliá-los no combate a este tipo de violência e na elaboração de políticas públicas. 5 Para viabilizar a realização deste projeto, fora utilizado o auxílio de um aluno bolsista com apoio financeiro proveniente do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI) nos anos de 2010 e 2011. Contou-se também com a ajuda de alunos voluntários do curso de bacharelado em Ciências Sociais/UFSM durante a fase de coleta e tabulação de dados. METODOLOGIA Os procedimentos de pesquisa adotados neste estudo consistem na utilização de uma abordagem quantitativa e qualitativa do objeto investigado. Para isto, atribuiu- se aos formulários6 elementos que satisfizessem ambas as perspectivas. As variáveis coletadas, relacionadas ao incidente, foram: natureza do fato, bairro onde ocorreu o fato, quem efetuou o registro da ocorrência. Em relação ao acusado, os dados coletados foram: sexo, cor da pele, idade, escolaridade, bairro de residência, estado civil e relação social com a vítima. Os dados coletados da vítima foram: sexo, idade, cor da pele, escolaridade e bairro de residência. Do total de 2822 ocorrências policiais registradas na Delegacia de Polícia de Proteção à Criança e ao Adolescente ao longo do ano de 2009, 703 casos referem-se às relações sociais de violência doméstica contra criança em Santa Maria. A sistematização dos dados fora realizada através do programa informacional SPSS 13.0. Esta ferramenta fora escolhida por ser capaz de abarcar quantidades massivas de dados e ainda assim possuir uma flexibilidade organizacional que torna possível este manuseio dos dados. A construção da base cartográfica está sendo realizada com o auxílio do software informacional ArcGis v8.3. Este software possibilita a criação e construção de mapas cartográficos a partir de uma base de dados previamente estabelecida. Devido a pesquisa ainda estar em andamento, esta etapa, a construção de mapas, encontra-se em desenvolvimento. Como bibliografia fora utilizada fontes que abarcam os temas de infância, família e sociologia jurídica. O ESPAÇO FAMILIAR COMO UMA INSTÂNCIA SOCIAL DE CONFLITO A família torna-se objeto de investigação de cientistas sociais brasileiros a partir dos anos oitenta, mais especificamente. Até aquela data, a preocupação sociológica voltava-se para temas macro-sociais, como trabalho, democratização do país, lutas sociais, políticas nacionais. Este redirecionamento no interesse da Sociologia para questões de caráter micro-social provém do cenário nacional nesse período, marcado pelas novas 6 O formulário utilizado na fase de coleta de dados encontra-se disponíveis na secção “anexo” deste artigo. demandas dos movimentos sociais, que colocam no centro de seus debates, problemas relacionados à infância, às mulheres, aos idosos, à família, à violência doméstica, dentre outros. Juntamente com a abertura política do país, ocorre o deslocamento de algumas problemáticas sociológicas, cujos temas passam a ser institucionalizados nas academias (Heilborn e Sorj, 1998). Contudo, é necessário lembrar que em um primeiro momento as pesquisas realizadas sobre situações de violência doméstica tinham como objetivo investigar aqueles conflitos em que as vítimas eram mulheres. Somente anos mais tarde, no limiar da década de noventa, que crianças e adolescentes passam a constituir-se em objeto de análise7 das ciências sociais. Para Adorno (2000), a adolescência passou a constituir-se um problema para a sociedade civil a partir do momento em que ela passou a ser associada à delinqüência. Entretanto, põe em ressalva que este grupo desempenha na contemporaneidade um duplo papel, ou seja, mesmo que estudos realizados, “... pela literatura especializada internacional quer nacional apontem crescente envolvimento de adolescentes com o mundo do crime violento, as mesmas fontes não cessam igualmente de apontar a crescente vitimização destes segmentos” (ADORNO, 2000: 69). A pesquisa social a respeito da temática da violência doméstica é cada vez mais extensa, podendo-se citar os trabalhos de Saffioti (1995, 2000), Côrrea (1983), Soares (1999), Heilborn (1992,1998) nos quais pode ser constatada a diversidade de interpretações sobre este assunto. Para estas autoras, há a necessidade de distinguir os conceitos de violência doméstica e violência familiar/intrafamiliar, pois estes possuem sentidos distintos. Enquanto esta abarca as situações de violência em que as agressões são praticadas pelo grupo domiciliar consangüíneo, aquela possui um caráter mais amplo, pois, além de englobar pessoas que possuem laços de consangüinidade entre si, inclui também aqueles indivíduos que possuem algum vínculo com a família da vítima, como amigos, vizinhos e parentes afins (Soares, 1999; Saffioti, 2000). 7 Os estudos realizados até os anos noventa enfocavam a infância e a adolescência através de seu envolvimento com a periculosidade e sua inserção na criminalidade, questões estas diretamente ligadas à pauperização deste grupo e de suas famílias. Portanto, estas pesquisas tinham um caráter macro-social fugindo da problemática dos conflitos de violência doméstica, inseridos em relações de micro poderes (Adorno, 2000). Embora partam de um conceito comum, as discordâncias nas suas interpretações são latentes. Bandeira e Suàrez (2002) apresentam uma divisão em relação às abordagens metodológicas sobre a temática ao tentar explicar o fenômeno da violência doméstica. A primeira perspectiva está ancorada no pressuposto teórico-metodológico marxista. Saffioti (1995) e Ardaillon e Debert (1987) entendem que o espaço familiar está permeado por relações de dominação e exploração. Neste sentido, o sexo é fundamental para a existência das relações de gênero, do mesmo modo que a classe é para o capitalismo. Logo, o gênero é percebido como determinante para o exercício da violência doméstica, motivo que explicaria a maior vitimização de mulheres no âmbito familiar,