Eduardo Gonçalves De Andrade (Depoimento, 2012)
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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS CENTRO DE PESQUISA E DOCUMENTAÇÃO DE HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA DO BRASIL (CPDOC) Proibida a publicação no todo ou em parte; permitida a citação. A citação deve ser textual, com indicação de fonte conforme abaixo. ANDRADE, Eduardo Gonçalves de. Eduardo Gonçalves de Andrade (depoimento, 2012). Rio de Janeiro, CPDOC/FGV, 2013. 48 p. EDUARDO GONÇALVES DE ANDRADE (depoimento, 2012) Rio de Janeiro 2013 Transcrição Nome do entrevistado: Eduardo Gonçalves de Andrade (Tostão) Local da entrevista: Belo Horizonte, Minas Gerais Data da entrevista: 25 de outubro de 2012 Nome do projeto: Futebol, Memória e Patrimônio: Projeto de constituição de um acervo de entrevistas em História Oral. Entrevistadores: Bernardo Buarque de Hollanda e Bruna Gottardo Transcrição: Letícia Cristina Fonseca Destro Data da transcrição: 19 de novembro de 2012 Conferência da transcrição : Maíra Poleto Mielli Data da conferência: 28 de novembro de 2011 ** O texto abaixo reproduz na íntegra a entrevista concedida por Eduardo Gonçalves em 25/10/2012. As partes destacadas em vermelho correspondem aos trechos excluídos da edição disponibilizada no portal CPDOC. A consulta à gravação integral da entrevista pode ser feita na sala de consulta do CPDOC. Bernardo Hollanda – Tostão, boa tarde, gostaria de começar agradecendo por nos receber em sua casa com tanta generosidade e acolhimento. Tostão, para começar: a infância, suas lembranças. Você é natural aqui de Minas Gerais, Belo Horizonte, certo? Eduardo Andrade – É isso. Grande abraço. Eu nasci em Belo Horizonte, morei ali dois anos na Floresta que é um bairro tradicional de Belo Horizonte. Fui, com dois anos, para o IAPI que era um bairro na Lagoinha, tem um conjunto de nove prédios. Para você imaginar, são novecentos e noventa e nove apartamentos interligados por pontes e no centro desse conjunto tinham vários campos de futebol, tinha campos gramados, campos cimentados. Então, isso tudo propiciou que eu caminhasse para o futebol, gostasse de jogar futebol e me tornasse jogador. Então, foi nesse ambiente. Somos quatro irmãos, eu o mais novo. O meu pai era bancário, trabalhava noInstituto de Aposentadoria e Pensões Bancárias, esse prédio, construído para os bancários morarem. E, então, morei ali dez anos. Um lugar ótimo para uma criança porque além dos campos de futebol, um lugar amplo que eu tinha total liberdade, desde pequeninho, de descer as escadas. Eu morava no terceiro andar, sair para rua, brincar e jogar futebol. Estudei normalmente, tinha um grupo público, 2 Transcrição que era muito bom, próximo. Então dava tempo de estudar e brincar de jogar bola e se divertir lá. B.H. – Só para registro histórico, sua data de nascimento? E.A. – Eu nasci em vinte e cinco de janeiro de 1947. B.H. – Você teve irmãos? E.A. – Éramos quatro, eu o mais novo. Isso também me ajudou a ir para a carreira de futebol, porque os três eram mais velhos, todos os três trabalhavam para ajudar os meus pais a ter uma renda melhor e eu ali pequeno fui protegido tanto emocionalmente como também materialmente para que eu pudesse ali brincar, não precisar trabalhar tão cedo como eles fizeram e poder estudar, aí mais tarde encaminhar para o futebol. B.H. – Podemos dizer, então, que os irmãos pavimentaram seu caminho? E.A. – Ah, não tenho dúvida. E do ponto de vista também de cidadania, pessoas bem instruídas, cidadãos conscientes, responsáveis. Isso foi importante na minha formação. Bruna Godatto – E você começou a jogar bola nesse conjunto? Junto com as crianças? Como se dava? E.A. – Justamente. Então, muito pequeno eu já brincava de bola. Diz o meu irmão mais velho que daí nasceu o apelido de Tostão, porque tostão era um centavo, a moeda, o menor valor de uma moeda, então como eu era muito pequeninho e tinha hábito de estar sempre jogando e brincando com os mais velhos. Dizem eles que não só no futebol, em outras coisas eu gostava de ficar com os meninos maiores e comecei a jogar com eles.Então eu era o menorzinho, e daí nasceu o Tostão. B.H. – Fala um pouquinho da sua mãe, você falou do seu pai que era bancário, agora fala um pouquinho da sua mãe. 3 Transcrição E.A. – A minha mãe trabalhava em casa durante muito tempo, mas depois também trabalhou fora. A minha mãe foi funcionário dos Correios em Belo Horizonte para também aumentar a renda familiar. Ela trabalhava ali no centro da cidade e eu tenho uma grande lembrança: eu era muito pequeno – não me lembro a idade, mas muito pequeno – como ela não tinha ninguém para me deixar, os meus irmãos já saíam, tinham seus compromissos, eu ia com ela para o Correio. Então, enquanto ela trabalhava durante o dia, acho que na época era um horário só, no outro eu estudava, eu ficava ali quatro, cinco, seis horas com ela acompanhando. Inclusive tinham aquelas máquinas para selar as cartas e a máquina tinha que carregar, levar não sei onde, lá no próprio correio para carregar. Então eu levava a máquina, descia elevador, subia, bem pequeninho ficava ali ajudando ela. B.H. – Pequeno assistente. E.A. – É. [riso] B.H. – E seus avós maternos e paternos, você conheceu? E.A. – Não, não conheci. Todos morreram. Um morreu eu tinha dois anos, mas não tenho nenhuma lembrança porque era muito pequeno. Então, a minha convivência era com meus irmãos, com meus pais. Nesse local ali tinha torneios de futebol desde torneios para meninos muito pequenos, para os meninos médios, maiores. No final de semana campeonatos. Então, eu cresci ali jogando bola e sempre com a companhia dos meus irmãos. B.H. – Mas seus avós já eram de Belo Horizonte? Porque Belo Horizonte é uma cidade planejada, uma das primeiras do Brasil, em 19001 é fundada.[INAUDÍVEL]. Eles vinham de algum outro lugar...? E.A. – Minha mãe nasceu em Barão de Cocais, município de Santa Bárbara, interior de Minas, e meu pai nasceu em São Bartolomeu que é um distrito de Ouro Preto, que é 1 A cidade de Belo Horizonte foi fundada em 1897. 4 Transcrição uma cidade histórica famosa. Então, eles vieram para Belo Horizonte e se conheceram em Belo Horizonte. Então os meus avôs faleceram onde moravam os meus pais quando nasceram. B.H. – Bom, esse interesse pelo futebol, crescendo com os irmãos, já tinha algum clube? Como foi sua relação não apenas como jogador, mas como alguém que acompanhava o futebol e apreciava? E.A. – Além dos meus irmãos gostarem de jogar, já jogavam nos times lá uniformizados do bairro, o meu pai foi apaixonado pelo futebol. O meu pai, na época do amadorismo, jogou no América Mineiro, era torcedor do América. Então, a partir aí dos sete anos ele me levava para ver os jogos do América, até treinos do América. Então, eu tenho muita lembrança dessa época. Depois do treino tinha um café ali na cidade, o café Pérola, no centro de Belo Horizonte onde se reunia os americanos. O meu pai ia para lá para discutir o futebol e eu ficava no meio da turma, não é? E com sete anos eu já jogava em times uniformizados e com chuteira, com camisa, com campos de tamanho profissional. Ali perto do bairro tinha vários campos, tinha o campo ali do Pitangui, onde se tinha grandes campeonatos de futebol amador. E todo domingo, lembro bem disso, onze horas, era alugado para o nosso time o campo e nós jogávamos, tinha o time do bairro, e aí que eu comecei a me destacar no futebol, porque todo mundo falava que eu tinha jeito para ser um grande jogador. Então nós tínhamos um time organizado com chuteiras, o meu pai era quase o patrono do time. Lembro até, é interessante, que antes do jogo o meu pai passava no mercado, comprava muitas bananas e levava, distribuía no intervalo para os meninos e falava: “Banana tem muito potássio”. E é verdade, para evitar câimbras e esses problemas musculares. B.G. – E esse time tinha um nome? E.A. – Tinha, era Industriários, porque o conjunto era IAPI – Instituto de Aposentadoria e Pensões Bancárias. O bairro Industriários e IAPI o... Então, nós fizemos um grande sucesso no bairro, espalhou por toda cidade porque não era só eu, vários meninos ali eram muito bons de bola. Então fizemos um grande time de garotos que faziam 5 Transcrição um grande sucesso na cidade. Jogamos uma vez contra o time infantil do Atlético e ganhamos. Isso foi maior festa na cidade, porque era ganhar do infantil de um time profissional. Eu lembro que eu fui carregado do campo do Atlético, que é aqui próximo de onde nós estamos lembrando esses fatos, e fomos até o IAPI que é bem longe, a pé pelas ruas e eu carregado nos ombros das pessoas e tal, porque era uma festa ter vencido o time infantil do Atlético. B.H. – Tostão, então o nome Industriários era uma alusão ao conjunto habitacional, não era um time operário, um time de fato? E.A. – Não, não. Era do bairro. B.H. – Porque no Brasil a gente teve essa tradição de times operários... No caso era residencial. E.A. – É. O técnico do nosso time, me lembro bem do Itaíbes que já morreu, o Itaíbes era um dos maiores publicitários da nossa época aqui de Belo Horizonte e ele adorava. Ele que era o técnico do time e ele falava sempre para a gente: “Está proibido dar chutão. Tem que jogar futebol com a bola no pé”. [riso] B.H. – Quando menino você era torcedor americano por conta do seu pai? E.A. – Era torcedor do América. Eu fiquei no bairro até os doze anos jogando, nesses campeonatos internos que tinha.