UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS Reitor Edward Madureira Brasil Vice­Reitor Sandramara Matias Chaves

FACULDADE DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO Direção Angelita Pereira de Lima Vice­Direção Andréa Pereira dos Santos

PROGRAMA DE PÓS­GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO ­ PPGCOM Coordenação Dra. Andréa Pereira dos Santos Vice­Coordenação Dra. Ana Rita Vidica Fernandes

Qualquer parte desta publicação pode ser reproduzida, desde que citada a fonte. Todos os direitos desta edição reservados ao Programa de Pós­Graduação em Comunicação da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás. Disponível em http://mestrado.fic.ufg.br e https://semic.fic.ufg.br

Editoração, formatação e preparação dos originais: Geisa Müller de Campos Ribeiro Diagramação: Kamilla Cristina da Cunha Santos Ilustração: Mayllon Oliveira

DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP) RESPONSÁVEL: GEISA MÜLLER

Seminário Nacional de Mídia e Cultura (12. : 2018: Goiânia, GO)

S471a Anais do XII Seminário Nacional de Mídia e Cultura [recurso eletrônico] Organizado por Suely Gomes, Geisa Müller, Mayllon Oliveira. – Goiânia: PPGCOM/FIC/UFG, 2018. 187 p.

ISSN 2179­ 2860

1. Comunicação. 2. Mídia. 3. Cultura. I. Gomes, Suely. II. Müller, Geisa. III. Oliveira, Mayllon. CDU: 316.77

PPGCOM/FIC/UFG Universidade Federal de Goiás ‐ Campus Samambaia Faculdade de Informação e Comunicação ‐ Rua Samambaia Programa de Pós‐Graduação em Comunicação ‐ Sala 16 Caixa Postal 131 . CEP 74001‐970 . Goiânia‐Goiás . Brasil Telefone: (62) 3521‐1514 XII SEMINÁRIO NACIONAL DE MÍDIA E CULTURA

REALIZAÇÃO Programa de Pós­Graduação em Comunicação Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás – FIC/UFG

COMISSÃO ORGANIZADORA Suely Henrique de Aquino Gomes Claudomilson Braga Rosana Maria Ribeiro Borges Geisa Müller de Campos Ribeiro Mayllon Oliveira Eduardo Portanova Barros Pedro Faria Carlos Henrique Martins (UFG) Denise Soares (UFG) Elisa Manuela Ferreira Cardoso (UFG) João Victor Mariano Barbosa Inácio Lauriano (UFG) Juliana Cristina Barbosa Albuquerque (UFG) Kamilla Cristina da Cunha Santos (UFG) Karen Muzany (UFG) Louise Ramiro Costa (UFG)

COMITÊ CIENTÍFICO Dra. Adriana Rosa Cruz Santos (UFF) Dr. Alexandre Tadeu dos Santos (UFG) Dra. Ana Carolina Rocha Pessôa Temer (UFG) Dra. Andréa Pereira dos Santos (UFG) Dra. Ângela Teixeira de Moraes (UFG) Dra. Cicilia M K Peruzzo (FIAM/FAAM) Dr. Claudomilson Fernandes Braga (UFG) Dr. Dalton Lopes Martins (UNB) Dr. Deyvisson Costa (UFMT) Dr. Eduardo Portanova Barros (prof. Visitante PPGCOM/FIC/UFG) Ma. Filipe Reis Ma. Frederico Oliveira Ms. Geisa Muller (UFG) Dr. Goiamérico Felicio Carneiro dos Santos (UFG) Dr. João de Melo Maricato (UnB) Dra. Kelley Cristine Gonçalves Dias Gasque (UNB) Dra. Luciene de Oliveira Dias (UFG) Dr. Luiz Antonio Signates Freitas (UFG) Dr. Magno Luiz Medeiros da Silva (UFG) Dra. Marcia Tondato (ESPM) Dra. Marli dos Santos (Cásper Líbero) Ma. Mariana Reis Mendes (UFG) Dra. Mônica Rodrigues Nunes (USP) Dra. Nélia Rodrigues Del Bianco (UNB) Ma. Pedro Simon Gonçalves Araújo (UFG) Ma. Raniê Solarevisky de Jesus (UFG) Dr. Ricardo Pavan (UFG) Dra. Rosana Maria Ribeiro Borges (UFG) Dra.SimoneAntoniaciTuzzo (UFG) Dra.Suely Henrique de Aquino Gomes (UFG) Dr.Tiago Mainieri Oliveira (UFG) Dra.Valquíria Aparecida Passos Kneipp (UFRN) Ma. Weber Feliz de Oliveira (UFG) Anais de Resumos Expandidos do XII Seminário Nacional Mídia e Cultura

TEMA Utopias e Distopias: Modos Culturais, Mídia e Cidadania

Outubro de 2018 SUMÁRIO

Apresentação...... 6 Tema Central...... 8

GT Interfaces da Comunicação Crônica em movimento: (in)confidências cotidianas no transporte coletivo de Goiânia...... 10 Trabalho e envelhecimento: o ser, o estar e o vivenciar face à conjuntura político­tecnológica contemporânea...... 14

Representações sociais de jovens de Goiânia: análise do Jornal Daqui...... 17

Mineração de tweets no apoio à análise da disputa eleitoral presidencial...... 20

Comunicação e saúde pública: a universidade na prevenção ao vírus hiv/aids...... 26

Aplicabilidade da pesquisa ação e da pesquisa participante no campo da comunicação...... 30

Lobby e comunicação pela perspectiva dos profissionais de relações públicas...... 36

Objetividade jornalística: discussões e reflexões sobre uma possibilidade de construção de conhecimento...... 40

Comunicação e educação na perspectiva dos profissionais da educação a distância...... 44

A percepção dos profissionais de comunicação das Instituições Públicas de Ensino Superior em Goiás sobre comunicação pública...... 49

GT Mutações Discursivas, Comunicação, Literatura e Consumo Insurgente: crônica da repressão policial em três manifestações contemporâneas...... 56

O desejo invejoso: uma perspectiva de cercas e pontes no ato do consumo...... 61

Tecnologia ancestral: a lírica performática e a estética de resistência em “lundu” de Tatiana Nascimento...... 65

Novos mercados e consumo: um estudo teórico do perfil dos leitores da darkside books...... 69

Follow me: a era dos consumidores consumíveis...... 72

Elas Falam de Si: A expressão artística de mulheres goianas por meio da literatura...... 75

Os sentidos do passado: o uso de Flashbacks na série de TV ...... 79

GT Identificações Culturais e Produção de Sentidos Amizade e desavenças: jogadores, seus perfis e vínculos em mmorpg...... 84

A contribuição de Raymond Williams para a comunicação: uma análise a partir da obra“cultura e sociedade”...... 87

Saúde e significações em um mundo disperso: estudo de caso sobre a primeira capa de revista sobre a prep no Brasil...... 91 Oliver Queen, Daniel Rand e o jogo das identidades como ganho narrativo em Arrow e Iron Fist.... 96

Super­ heróis como fenômeno da cultura midiática: em busca de sentido na sociedade contempo­ rânea...... 100

Mídia, cultura e tecnologia: o corpo plugado e a imersão...... 102

O espaço fílmico como elemento de mediação comunicacional e produção de sentido: uma análise de pendular...... 105

Gari: heróis da rua...... 108

GT Corpo, Gênero e Subjetividade Abusos e superações: perfis de mulheres que sofreram com relacionamentos abusivos...... 112

Escrevendo utopias menores...... 115

Destituir a si mesmo: a subjetividade do ser em revolta...... 118

Mãos na massa: rede e diálogos na cozinha da folia...... 121

A invisibilidade das mulheres na ciência: análise da produção científica de docentes dos cursos de mestrado em Letras e Linguística e em Matemática da Universidade Federal de Goiás – Campus Samambaia...... 125

A permeação da violência doméstica e das representações sociais na novela “Segundo Sol”...... 129

Em defesa da diferença: por outras epistemologias indígenas, quilombolas e negras nas universi­ dades...... 133

Padrão da cobertura de feminicídios e punibilidade dos agressores: o que a imprensa nos conta ao longo das décadas...... 138

Novas produções de sentido: o caso do Ministério Evangélico LGBTQ+ “movimento cores”...... 141

Vestir para reconhecer e resistir: por um olhar queer do dispositivo da moda...... 144

Imagens, Cinema e Cultura Visual Do avesso: a desconstrução do vídeo 24 hours Psycho de Douglas Gordon...... 149

Infância e youtube: a performance da proximidade...... 153

Grupodidatismo em gameplays: inovações narrativas...... 156

Por uma noção de transparência: em busca do realismo fotográfico dos anos 1920...... 159

Baby Driver: remix como narrativa...... 164

Swordswoman: a representação da mulher espadachim nas séries vikings e Game OfThrones...... 167

A pose fotográfica nos retratos dos álbuns de família: uma proposta de cruzamento de imagens..... 172

Star Wars e as novas configurações narrativas no cinema...... 176

A descrição Imagética na hashtag #PraCegoVer: Uma Análise a partir da relação entre texto e imagem...... 179

A Twitch como meio emissor de uma mensagem...... 182

Entre utopias e distopias: uma análise de documentário Koyaanisqatsi ­ uma vida fora de equilíbrio 185 APRESENTAÇÃO

O décimo segundo Seminário Nacional Mídia, Cidadania e Cultura – XII Semic – promovido pelo Programa de Pós­Graduação em Comunicação, Cultura e Cidadania da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás – PPGCOM/FIC/ UFG, nos dias 18 e 19 de Outubro de 2018, em Goiânia, teve como tema central "Utopias e Distopias: modos culturais, midia e cidadania”. A escolha do tema central para o evento foi extremamente feliz pois marca os 50 anos do movimento estudantil que assolou Paris em maio de 1968 e se propagou para outros países nas décadas seguintes. Talvez, uns dos mais conhecidos slogans do movimento, e que resistiram até os dias de hoje, sejam “é proibido proibir”; “As armas da crítica passam pela crítica das armas”; “Professores, vocês nos fazem envelhecer” ­ os dois primeiros inspirando canções como ”É proibido proibir”, de Caetano Veloso, “É proibido fumar”, de Roberto Carlos, e “Caminhando”, de Geraldo Vandré – que embalaram a juventude brasileira nos anos mais extremados da ditadura militar no país. O ano 1968 foi, na perspectiva de Cardoso¹, o “ano síntese de contradições e mudanças radicais na história mundial”. Zuenir Ventura² dá uma dimensão desse acontecimento quando pondera que “ao se comportar como se fosse um ser animado suspeita­se que 1968 não foi um ano, mas um personagem – inesquecível e que teima em não sair de cena”. Podemos dizer que esse movimento inaugurou uma ébria utopia libertária das diferenças. Foi responsável por instaurar as “novas esquerdas” e oxigenar os movimentos de minorias políticas³ (feministas, homossexuais, ambientalistas) ao confrontar as categorias universalizantes e totalitárias – sustentáculo do marxismo ortodoxo4. A intenção dos organizadores do evento ao elegerem “utopias e distopias” como tema central marcando os 50 anos de maio de 68 foi propiciar espaço de reflexão e respeito às diferenças, sob a perspectiva da Comunicação. “Diferenças que têm um caráter pluralista, e não dicotômico, no sentido de que são vistas, percebidas e, mais importante de tudo, sentidas nas mais diversas áreas do conhecimento, tanto científico quanto popular”, nos elucida Prof. Eduardo Portanova, na defesa e apresentação do evento. Discutir tais questões se torna relevante frente às guinadas ultradireitistas, ultraconservadoras e ultranacionalistas que assolam o mundo e que culpabilizam os protagonistas do movimento de 68 de imporem “a nós todos um relativismo intelectual e moral. Os herdeiros de maio de 68 fizeram prevalecer a ideia de que não havia mais diferenças entre o bem e o mal, a verdade e a feiúra. A herança de maio de 1968 introduziu o cinismo na sociedade e na política”5. Pelo confronto com os ideais marxistas, a rebelião de maio de 68 é responsabilizada pelo fortalecimento do capitalismo, do consumismo e individualismo. Nesse momento delicado de nossa política, é necessário alinharmos estratégias, saberes e práticas e nos prepararmos para os enfrentamentos dos desafios que nos esperam. É necessário restituirmos a ludicidade política, a solidariedade e a crença que embalaram a juventude de 68 de que profundas mudanças sociais podem ser provocadas para a instauração de um novo arranjo social, sem perder a doçura, o bom­humor, mesmo que de forma debochada ou escrachada, marca da nossa juventude – se isso for possível nesses tempos estranhos que atravessaremos. É necessário que as estruturas desçam novamente as ruas6.

6 Desta forma, elegemos o XII Semic como locus privilegiado dessa espera que nos levou, sob a ótica da Comunicação, a reflexões, debates, proposições, deliberações rumo à defesa e luta por uma sociedade mais justa, mais plural e democrática, retomando o imaginário a utopia motivadora da geração de 68 de que um outro mundo é possível, tomando cuidado para que não caiamos em outros modos de dominação e submissão. Restauremos nossa capacidade de sonhar, imaginar e lutar por um mundo melhor. Riscos são imanentes às aventuras de ousar, mas não podemos nos paralisar diante desses. Para conduzir as reflexões tão necessárias quanto desejadas no contexto político atual, contamos como as participações dos professores Teixeira Neto ­ que proferiu palestra sobre “Utopias e distopias: Entre a vida e a arte de viver” ­ e Cleomar Rocha ­ que nos levou ao imaginário de uma cidade tecnológica com a fala “Humanidades Digitais: Entre a vida e a arte de viver”. Ficam aqui registrados nossos agradecimentos pela magnitude da doação de seus tempos para abrilhantar nosso evento. Aqui disponibilizamos a miríade de pensamentos e proposições de nossos autores. Pluralidade, fragmentações, recortes epistemológicos que representam as diferentes e diversas possibilidades de se analisar, criticar e pensar a comunicação e seus problemas de pesquisa. Esperamos que sirvam de inspiração para pensarmos a Comunicação sob a ótica dos acontecimentos contemporâneos. Há de se problematizar sobre papel da mídia pós­maio de 68. Desvendar como os meio de comunicação se apropriaram dos ideais do movimento e os tornaram mercadorias, sinalizando para uma vida feliz e libertária ­ “Liberdade é uma calça velha, azul e desbotada”7. Seria a mídia o poderoso dispositivo que na contemporaneidade nos tornou o que somos? Fica a questão que, apesar dos nossos esforços, ainda não foi plenamente respondida. No mais, minha gratidão a todos e todas (autores e autoras, avaliadores e avaliadoras, mestrandos e mestrandas, docentes do PPGCOM, funcionários e funcionárias da FIC­UFG, oficineiros e oficineiras) pela parceria e por acreditar que somos capazes de dialogar e enfrentar as diversidades. Fica um convite para cada participante: “Seja realista: peça o impossível”8. Obrigada por terem participado do XII SEMIC. Que venha o próximo!

Suely Henrique de Aquino Gomes Coordenadora Geral do XII SEMIC

¹ CARDOSO, Lucileide Costa. Ecos de 1968: 40 anos depois. Revista do Centro de Artes, Humanidades e Letras vol. 2 (1) 2008. ² (2008, apud CARDOSO, 2008, p. 6) ³ Esses movimentos não estavam presentes em maio de 68, mas tomaram impulso a partir desse acontecimento. 4 Araújo, Maria Paula Nascimento. A utopia fragmentada: as novas esquerdas no Brasil e no mundo na década de 1970. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2000. 5 Discurso de Sarkozy, atual presidente da França, citado por Cadoso (op. Cit, p. 6). 6 “Em 1968, uma das frases mais famosas que apareceu nos muros de Paris foi: ‘As estruturas não caminham pela rua!’ [...] A resposta de Jaques Lacan foi que, em 1968, na verdade, aconteceu exatamente isto: ‘As estruturas desceram indubitavelmente às ruas’.” In: As estruturas não caminham pela rua!" O maio de 68, segundo Zizek. Artigo publicado originalmente pelo jornal La Repubblica, em 14/04/2008. Disponível em http://slavoj­zizek.blogspot.com/2009/12/as­estruturas­nao­caminham­pela­rua­o.html. Acessado em Dezembro de 2018. 7 Anúncio televisivo de calças jeans, nos anos 1970, “que exibia um grupo alegre de rapazes e moças apinhados num trem, percorrendo campos verdes e ensolarados ao som do jingle: “Liberdade é uma calça velha, azul e desbotada” (CARDOSO, op cit, p. 9). 8 Uma das pichações dos muros de em Paris em Maio de 68. Gabriel Kwak. As lições de 1968, 40 anos depois. Disponível em , acessado em Dezembro de 2018.

7 TEMA CENTRAL

Utopias e Distopias: Modos Culturais, Mídia e Cidadania

A intenção é refletir a respeito das diferenças. Diferenças que têm um caráter pluralista, e não dicotômico, no sentido de que são vistas, percebidas e, mais importante de tudo, sentidas nas mais diversas áreas do conhecimento, tanto científico quanto popular. Não se trata só de A ou B. Sem uma reflexão sobre nossas utopias e distopias, portanto, ficamos à deriva, sem rumo. Mesmo sendo a utopia uma ilusão, continuamos nosso sonho. Mas e se não sonharmos mais? Há quem enxergue tudo de outra forma, sem esperança. Essa outra forma é o niilismo reativo, recalcitrante, pessimista. Esse niilismo negativo, digamos, chama­se distopia. Um nada. É o contrário da utopia. Porém, e daí a importância do debate, a utopia pode se transformar em algo perverso, como no 11 de Setembro de 2001, por exemplo, quando terroristas atacaram a então inexpugnável nação norte­americana. Esse conflito Teixeira Coelho, um dos nossos convidados, denominará de “guerras culturais” (e a Comunicação é que dá visibilidade a isso tudo). Diz ele que essas várias culturas estão permanentemente em guerra, uma guerra – como toda guerra ­ paradoxal, isso porque ela se intensificou no século 20 graças aos mesmos meios tecnológicos que têm servido, por outro lado, para nossa difusão cultural, que é a temática das polaridades. As polaridades (teoria­empiria, mente­corpo, indivíduo­sociedade) nem sempre tomam uma configuração oposta. São antagônicas, sim, mas, simultaneamente, complementares. Em meio a isso, a cultura, a mídia e a cidadania. Resta saber se o “desencantamento do mundo” weberiano, considerando aqueles termos “tópicos”, traveste­se, na atualidade, de uma ontologia niilista. Leia­se: o sentimento de perda da realidade. Não foi Heidegger que propôs um mergulho profundo no Ser? Ser, este conceito universal, mas que, segundo Heidegger, permanece obscuro. O resultado está aí sob uma forma interrogativa que este seminário nos aponta. O que motiva o ser? Qual é, na verdade, para citar uma ideia de outro alemão, Georg Simmel, o “rei secreto” (imaginário) desta época? Este encontro, portanto, que esperamos seja proveitoso, é só um minúsculo passo para nosso longo caminho investigativo em função dessa vasta e desafiadora constelação simbólica dos contrários, das positividades e negatividades culturais. Isso porque, para o pior ou para o melhor, não se interage no vazio. Para finalizar, poderíamos citar outro pensador das polaridades (entre vários outros), além de Teixeira Coelho, que faz um questionamento sério: “Como pode o homem, apesar da vida, tornar­se poeta”. Esse é o ponto. Esse é o ponto entre a vida e a arte de viver.

Prof. Dr. Eduardo Portanova Barros

8 GT Interfaces da Comunicação

Coordenação Andréa Pereira dos Santos e Filipe Reis CRÔNICA EM MOVIMENTO: (IN)CONFIDÊNCIAS COTIDIANAS NO TRANSPORTE COLETIVO DE GOIÂNIA

Amanda Lopes Sales1 Juliana França Oliveira2 Angelita P. Lima3

RESUMO

Goiânia segue o modelo de 90% do Brasil no que diz respeito ao fornecimento de transporte coletivo para a população (GOMIDES, 2006). Conforme o padrão nacional, o transporte público da capital goiana é formado por frotas de ônibus urbanos, administradas por empresas privadas escolhidas pela administração municipal por meio do modelo de licitação. Nos ônibus que cortam Goiânia e Região Metropolitana (RMG), trabalhadores e estudantes passam boa parte de seus dias no trajeto entre a casa, a escola/universidade e o local de trabalho. A empresa responsável por operar o transporte coletivo e organizar a rede de transporte de forma integrada em toda a RMG é a Rede Metropolitana de Transporte Coletivo (RMTC), criada em 2008 para esse fim. A organização atual da RMTC atende a 18 municípios da RMG que abrangem uma área de 6576 km². Operam no sistema 293 linhas de ônibus convencional e 10 linhas de Citybus que, apesar da capacidade menor, fornece aos passageiros um ambiente mais confortável com ar-condicionado e poltronas acolchoadas. O sistema é composto, ainda, por 21 terminais de integração, que permitem aos usuários fazer integração entre diversas linhas utilizando uma tarifa-única, e mais de 6400 pontos de embarque e desembarque (RMTC, 2018). A situação generalizada de caos e má administração do transporte público municipal em Goiânia também segue a tendência nacional. “O tempo excedente nas viagens poderia ser aproveitado para outras atividades remuneradas ou para a satisfação de necessidades básicas, como de lazer, por exemplo. Além disso, as longas viagens são responsáveis por reduções na produtividade do trabalhador urbano” (GOMIDE, 2003, p.

1 Amanda Sales é graduanda em Comunicação Social – habilitação em Jornalismo, na Universidade Federal de Goiás, em Goiânia. E-mail: [email protected]; 2 Juliana França é graduanda em Comunicação Social – habilitação em Jornalismo, na Universidade Federal de Goiás, em Goiânia. E-mail: [email protected]. 3 Profª. Drª. na Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás. [email protected] 10

14). A estrutura do transporte coletivo é formada pelos ônibus, linhas, pontos, terminais, mas também pela massa orgânica que faz toda a infraestrutura ser necessária. Os passageiros do transporte coletivo de Goiânia são os instigadores deste trabalho que investiga in loco os diálogos do cotidiano. Apesar do objeto empírico da pesquisa ser o transporte coletivo de Goiânia, é possível ampliar este foco para o efeito dos deslocamentos cotidianos nos habitantes das cidades. O gênero jornalístico utilizado para dar vida a estes personagens reais encontrados nos ônibus e terminais foi a crônica. Além de ser um gênero que se consolidou no país de modo distinto ao do resto do mundo, a produção da crônica brasileira permite também uma variedade de abordagens. “Crônica, modernamente, como se pratica no Brasil, é literatura, que vai da emoção à ironia” (LAGE, 2005, p. 28). Diante de uma história que as autoras ouviram como espectadoras indiretas, surgiu a inquietação de concretizar os diálogos que (in)surgem no transporte coletivo pelo prisma do jornalismo. Diante da narrativa, observou-se que as conversas entre pessoas em situações cotidianas, como o trajeto nos ônibus, constituem crônicas orais e inconscientes. Sendo assim, as crônicas que escrevemos são resultado do princípio de que há semelhanças entre a oralidade e este gênero escrito. Neves (2012, p. 82) acredita que a crônica é um gênero de “língua escrita com alto grau de coloquialidade, que toca a natureza da língua falada”, que pode ser expressa no texto utilizando recursos de formulação textual como os parênteses e os travessões, por exemplo. As (in)confidências ditas e ouvidas nos ônibus, durante as viagens cotidianas, resultarão em um livro-reportagem de crônicas. Desse modo a área abrangente deste compilado de crônicas será o Jornalismo Literário. Por Jornalismo Literário não podemos ter em mente “um subgênero do jornalismo a que chamaríamos tradicional, cujas fundações baseiam-se na distinção entre informação e opinião”, mas “um conjunto composto por diferentes categorias textuais e gêneros discursivos” (PASSOS E ORLANDINI, 2008, p. 78 e 79). É evidente que as impressões das autoras terão peso no momento de captar os diálogos e transformá-los em crônicas. Esta noção se justifica com a inserção do gênero na categoria do jornalismo opinativo. No entanto, o foco escolhido nas narrativas é a influência da oralidade na produção de crônicas e a existência de características do gênero nos diálogos. Para construir estas crônicas do diálogo inconcluso, devemos nos valer de recursos da oralidade, típicos da linguagem falada, no texto escrito. Neves

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(2012, p. 95) justifica esta possibilidade após exame que faz da crônica e que “mostra-a como um gênero que muito comodamente revela as próprias características que a definem, quando aciona recursos prioritariamente ligados à produção de língua falada”. A abordagem da pesquisa é qualitativa e o método é o Etnojornalismo, ou seja, a Etnografia aplicada ao campo do Jornalismo. Esse método, utilizado principalmente em trabalhos de Jornalismo Literário, proporciona ao profissional se aprofundar de uma maneira que outros métodos mais conhecidos no meio acadêmico não proporcionam. Este método se baseia, como sugere Travancas (2006) na imersão. Deste modo, não haveria método mais adequado para a elaboração de um livro-reportagem do que o etnojornalismo, já que as autoras pretendem extrair a matéria prima das crônicas das vivências apreendidas em viagens de ônibus por Goiânia. No que tange à publicação das crônicas, o estudo de Chiquin (2005) dá conta de que o gênero não se torna ‘menos jornalístico’ por não ter sua publicação em um periódico e posteriormente em um livro, uma vez que não é apenas seu suporte que o insere no campo da comunicação. Tendo em mente a possibilidade concreta de publicação da crônica em livro, surge como opção o livro-reportagem. Apesar de, como sugere o nome, este tipo de publicação servir como suporte das reportagens em profundidades, é possível adaptar sua funcionalidade para a publicação de crônicas em caráter experimental.Neste sentido, como dito anteriormente, as autoras pretendem seguir o modelo de Lima (2009), reunindo de dez a quinze crônicas agrupadas que, de alguma forma, proporcionem críticas sociais e uma possível reflexão sobre as histórias orais e cotidianas que, aos ouvidos leigos, podem soar como frivolidades. A pesquisa em questão permitiu além da elaboração do livro, a conclusão de que as narrativas orais inerentes ao ser humano podem resultar em narrativas jornalísticas ricas e capazes de diversificar a produção da área, bem como contribuir para a pesquisa acadêmica nos cursos de Jornalismo.

Palavras-chave: Jornalismo. Crônica. Transporte coletivo. Goiânia.

REFERÊNCIAS

CHIQUIM, Giovana. A impressão do cotidiano: um estudo das ambiguidades da crônica e a transgressão de seu caráter efêmero. Estação literária, Londrina, vol. 11, p. 27-40, jan/jul, 2013. Disponível em: http://www.uel.br/pos/letras/EL/vagao/EL11-Art2.pdf Acesso em: 27 de abril de 2018.

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GOMIDE, Alexandre de Ávila. Transporte urbano e inclusão social: elementos para políticas públicas. 2003. Disponível em: http://repositorio.ipea.gov.br/handle/11058/28 93 Acesso em: 21 de abril de 2018.

______. Mobilidade urbana, iniquidade e políticas sociais. 2006. Disponível em: http://repositorio.ipea.gov.br/handle/11058/4511 Acesso em: 21 de abril de 2018.

LAGE, Nilson. Teoria e técnica do texto jornalístico. São Paulo: Campus, 2005.

NEVES, Maria Helena de Moura. As estratégias discursivas e suas implicações na relação entre oralidade e escrita: um estudo do parêntese na crônica. Lingüística, Montevideo, vol. 27, n. 1, p. 77-97, jun, 2012. Disponível em: http://www.scielo.edu.uy/scielo.php?script =sci_arttext&pid=S2079- 312X2012000200005&lng=es&nrm=iso. Acesso em: 13 de abril de 2018.

PASSOS, Mateus Yuri; ORLANDINI, Romulo Augusto. Um modelo dissonante: caracterização e gêneros do jornalismo literário. Contracampo, Rio de Janeiro, v. 18, n. 2008, p. 75-96, jan./jun, 2008. Disponível em: http://www.contracampo.uff.br/index.php /revista/article/view/335/139 Acesso em: 29 de abril de 2018.

REDE METROPOLITANA DE TRANSPORTES COLETIVOS – RMTC, 2018. Informações Institucionais. Disponível em: http://rmtcgoiania.com.br/sobrea-a- rmtc/informacoes-institucionais. Acesso em 28 de abril de 2018.

TRAVANCAS, Isabel. Fazendo etnografia no mundo da comunicação. In: Duarte, Jorge; BARROS, Antônio (Organizadores). Métodos e técnicas de pesquisa em comunicação. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2006.

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TRABALHO E ENVELHECIMENTO: O SER, O ESTAR E O VIVENCIAR FACE À CONJUNTURA POLÍTICO-TECNOLÓGICA CONTEMPORÂNEA

Adriane Geralda Alves do Nascimento Cézar1

RESUMO

Esse trabalho objetivou compreender os significados assumidos pelo contínuo do trabalho no processo de envelhecimento, face às características político-tecnológicas contemporânea, para uma categoria específica de análise: os docentes da Universidade Federal de Goiás, com idade igual ou superior a 60 anos, que, mesmo aposentados, continuam muito ativos no mercado. O trabalho foi estruturado por meio de pesquisas bibliográficas e uma pesquisa de campo, qualitativa, utilizando-se a técnica de entrevistas em profundidade, aplicadas a uma amostra de dezessete entrevistados, composta por professores da UFG, já aposentados, com 60 anos ou mais. Os resultados constituem dados parciais de uma pesquisa de doutorado. O rompimento da rigidez fordista via um novo arranjo de mercado, ancorado pelas características da flexibilização: automação, avanços tecnológicos, busca de novos nichos de mercado, dispersão geográfica e fusões, pautou-se na flexibilidade dos processos de trabalho, mercados, produtos e também nos padrões de consumo, com ênfase nas tecnologias e nas respostas rápidas (HARVEY, 2014; ANTUNES, 1999). Esse novo modelo exigiu também modificações na própria postura do trabalhador: no âmbito da empresa, o individualismo, a competitividade e a eficácia, passaram a acarretar a desqualificação daqueles menos preparados ou menos aptos, além de invalidação daqueles que estão envelhecendo ou jovens demais, com pouca qualificação (CASTEL, 2009). De forma geral, os pesquisados deste estudo (docentes do serviço público federal) não se reconheceram como uma força de trabalho a mercê dos moldes de um trabalho degradante e exigentes da força física. Mesmo não se reconhecendo nessa situação e considerando-se privilegiados por isso, essa característica não deixou de ser

1 Doutora em Sociologia, pela Universidade Federação de Goiás, linha de pesquisa: Trabalho, Emprego e Sindicatos. Mestre em Administração, pela Unisinos. Especialista em Recursos Humanos, pela UniAnhanguera. Graduada em Relações Públicas, pela Universidade Federal de Goiás. Professora Adjunta do Curso de Relações Públicas, da Faculdade de Informação e Comunicação, da Universidade Federal de Goiás (FIC- UFG). E-mail: [email protected] 14 relatada pelos participantes dessa pesquisa: um grupo com alta formação intelectual2, que tiveram oportunidades face aos estudos, e que conseguiram um posicionamento social com salários relativamente dignos. Esses fatores, por sua vez, refletiram numa velhice mais segura e numa aposentadoria com bom retorno financeiro. O trabalho para os docentes concursados entrevistados foi muito mais visto como algo prazeroso, elemento vital, de realização pessoal e fonte de motivação, do que um elemento de desprazer, adoecimento, sofrimento, dor e, unicamente, recompensa financeira. Isso permite inferir que o exercício do trabalho docente, que abre possibilidades de formação de carreiras, em universidades públicas, está, por sua vez, muito mais caracterizado como um trabalho que proporciona prazer, estabilidade, certezas pessoais e futuras, além de abrir possibilidades longínquas de atuação no mesmo tipo de atividade, inclusive, pós- aposentadoria e velhice. Desse modo, tem-se que o trabalho assume significados diversos que estão relacionados ao modo como os indivíduos estruturaram suas carreiras ao longo de suas vidas, suas relações sociais e, sobretudo, o tipo de trabalho exercido. Apesar de maior parte de nossa sociedade ser marcada por uma força de trabalho explorada e de grande número de trabalhadores idosos viverem em condições precárias, sendo obrigados a se manter com uma renda mínima3 (o que dificulta sua saída de condições de pobreza e vulnerabilidades), os pesquisados desse estudo, de forma contrária, afirmaram ter um bom retorno financeiro advindos de seu trabalho e que o mesmo representa mover de vida e realização de contínuo, mesmo diante da aposentadoria e do envelhecimento.

Palavras-chave: Trabalho. Envelhecimento. Docentes Federais. UFG.

2 Os dados relativos ao Censo Demográfico do IBGE (2010), referentes a algumas características das pessoas com 60 anos ou mais de idade, demonstram que 50,2% possuem menos de 4 anos de estudo, 32,3% possuem entre 4 e 8 anos de estudo e apenas 17,4% possuem 9 anos ou mais de estudo. Desse modo percebe-se que o grupo pesquisado constitui não se encaixa nos dados característicos da população de 60 anos ou mais.Fonte: IBGE. Síntese de Indicadores Sociais, 2010. 3 Os dados relativos ao Censo Demográfico do IBGE (2010), referentes a algumas características das pessoas com 60 anos ou mais de idade, demonstram que 43,2% vivem com renda domiciliar per capita de até 1 salário mínimo, 29% vivem com renda per capita de mais de 1 até 2 salários mínimos e 22,9% vivem com renda per capita de mais de 2 salários mínimos. Fonte: IBGE. Síntese de Indicadores Sociais, 2010. 15

REFERÊNCIAS

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HARVEY. David. Condição pós-moderna. São Paulo: Loyola, 2014.

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REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE JOVENS DE GOIÂNIA: ANÁLISE DO JORNAL DAQUI

Gardene Leão de Castro1

RESUMO

Ao atuar no plano da representação social, a mídia se consolida como formadora de opinião pública, utilizando-se de recursos discursivos para legitimar seus enunciados. Ao utilizar essas ferramentas, elaborando discursos que supostamente representariam “a verdade”, os veículos de comunicação dãoespaço a representações sobre diversos atores, dentre eles, a juventude. Atualmente, devido ao sentimento de insegurança e ao medo do crime propagado também pela mídia, as pessoas se posicionam a favor de medidas mais duras e punitivas contra jovens, como a proposta de Redução da Maioridade Penal. Por isto, inicialmente, o objetivo dessa pesquisa foi perceber como os jovens são representados no Jornal Daqui, veículo de maior circulação impressa em Goiás, em estudo comparativo entre 3 meses dos anos de 2010 e 2014. Escolhi o Daqui por dois motivos: o primeiro é que o diário é um importante veículo formador de opinião em Goiás, possuindo, atualmente, a maior tiragem de jornais impressos do Estado e a 5ª maior tiragem de impressos no Brasil, ficando atrás somente do Super Notícia, O Globo, Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo. Para se ter um índice de comparação, em Goiás, enquanto o Daqui está em 5º lugar no ranking nacional o jornal O Popular, segundo com maior circulação do Estado, aparece em 47º lugar no ranking nacional O segundo motivo de escolha está vinculado ao perfil editorial da publicação. Conforme anunciado na página virtual da Organização Jaime Câmara, o Daqui é voltado para o público “C e D” da capital goiana e região metropolitana e possui uma linguagem mais “acessível” para este público, “mostrando o que de mais importante acontece de forma simples e dinâmica”. A delimitação de um perfil de leitor, que também contempla os jovens moradores das periferias de Goiânia, com idade entre 14 a 29 anos, foi também outro fator que me instigou.

1 Professora Doutora na Faculdade de Informação e Comunicação. Doutora em Sociologia. E-mail: [email protected] 17

Após estudar o polo da emissão do discurso midiático, através da análise das notícias sobre jovens vinculadas no Daqui, surge, então, a questão: como esse discurso é recebido por esses jovens? Por isto, nessa pesquisa, a intenção foi também investigar as representações sociais de jovens de Goiânia sobre os discursos midiáticos, envolvendo a temática da criminalidade e violência, a respeito de si. Através de uma sociologia compreensiva, tento compreender os conteúdos de sentido sobre mídia, juventude e violência por meio das representações sociais. O estudo das representações sociais sobre a violência entre os jovens ganhou espaço nos últimos anos por meio da Teoria das Representações Sociais. Contudo, a recepção de jovens sobre as representações sociais em diversos produtos midiáticos é objeto de poucos estudos. Fruto da própria invisibilidade, as representações sociais produzidas por jovens sobre os diferentes discursos envolvendo a temática da criminalidade não tiveram eco suficiente na academia. Resta a lacuna de compreender os discursos produzidos por estes jovens, a partir do processo de negociação de sentidos com os discursos midiáticos. É importante entender as representações sobre os jovens, analisando se eles compartilham os mesmos significados, se o fazem de forma parecida ou a razão pela qual compartilham ou não determinados significados. É preciso considerar a capacidade de autonomia das juventudes. No contexto das teorias pós-críticas da juventude, aparece a noção de subjetivação. Tal corrente teórica, também adotada nessa pesquisa, afirma que os sujeitos ora são configurados em consonância com os modelos regulatórios, ora são resistentes aos mesmos. Tal discurso valoriza a diversidade das juventudes, reconhecendo a importância da construção social do indivíduo. Através dessa pesquisa, pode-se perceber que, desde 2010, o Daqui faz uma forte ligação entre juventude, pobreza e o perigo em seu discurso. Em 2014, tal representação foi deslocada para a explicação do aumento da violência em Goiânia e em Goiás como consequência do envolvimento de jovens com o uso e com o tráfico de drogas. Após a análise das notícias, utilizando como referencial teórico a Teoria das Representações Sociais, buscou-se compreender como jovens de diferentes classes sociais (alta, média e baixa), moradores de Goiânia, recebem, compreendem e (res)significam as representações midiáticas envolvendo a temática da criminalidade e violência na juventude. Percebe-se que jovens não assimilaram o conteúdo midiático sem criticá-lo. Para eles, o Jornal Daqui é sensacionalista, violento, com notícias

18 superficiais que subestimam a capacidade de intepretação de seu público leitor. Apesar de vivenciar a violência de formas distintas, eles foram unânimes ao afirmar que a mídia não é imparcial ou neutra ao retratar o seu cotidiano.

Palavras-chave: Mídia. Violência. Juventude. Representações Sociais. Comunicação.

REFERÊNCIAS

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MINERAÇÃO DE TWEETS NO APOIO À ANÁLISE DA DISPUTA ELEITORAL PRESIDENCIAL

Isadora Campos Vaz1 Kátia Kelvis Cassiano2 Douglas Farias Cordeiro3

RESUMO

O crescente número de dados gerados e disseminados nas mídias sociais tem servido de insumo para uma diversidade de estudos, análises e geração de conhecimento. Neste sentido, considerando o cenário eleitoral, as redes sociais podem ser destacadas como um dos canais de maior acessibilidade e riqueza de dados no que se refere às opiniões da sociedade com referência a candidatos ou partidos políticos (ATTUX, 2017). Terra (2010) define mídias sociais como um mecanismo explorado por indivíduos, baseado na utilização de tecnologias e políticas na web, com o propósito de compartilhamento de opiniões, ideias, experiências e perspectivas. A Figura 1 apresenta as redes sociais com maiores números de usuários ativos. É possível observar que o Twitter se destaca como uma das redes sociais do tipo microblog com maior quantidade de usuários ativos. Ainda de acordo com o Portal Statista, o Twitter possui uma média de postagem de 500 milhões de tweets por dia, e 200 bilhões de tweets por ano. Os dados gerados por meio dos tweets são consideravelmente úteis no que se refere à análise de opiniões e sentimentos (SILVA, 2016), subárea da mineração de dados.

1 Graduanda em Gestão da Informação (UFG), bolsista PIBIC. [email protected] 2 Doutorado em Engenharia de Sistemas e Computação (UFRJ), professora adjunta da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás. [email protected] 3 Doutorado em Ciência da Computação e Matemática Computação (USP), professor adjunto da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás. [email protected] 20

Figura 1- Usuários ativos em redes sociais

Fonte: Statista

De acordo com Castro e Ferrari (2016), a mineração de dados pode ser descrita como o processo de, a partir de uma base de dados, filtrar os dados úteis e extrair informações relevantes para a formação de conhecimento, podendo ser aplicada nos mais diversos contextos, como no desenvolvimento de análises com base no conteúdo dos dados textuais acerca dos sentimentos expressados. Segundo Gomes (2012), análise de sentimentos auxilia na determinação automática de sentimentos em textos, podendo ser utilizada para formar avaliações a partir de comentários e opiniões, atribuindo a este dado textual um valor numérico entre zero (negativo) e um (positivo). Para desenvolvimento deste trabalho foi utilizada a metodologia KDD (Knowledge Discovery in Databases), que prevê a geração de conhecimento a partir de bases de dados (FAYAD, 1996). Neste sentido, foi definido como amostra um conjunto de tweets no intervalo de quinze dias (19 de Agosto a 02 de Setembro de 2018), escolhido por estar em conformidade com a realização de uma série de entrevistas com os presidenciáveis em uma rede de TV aberta, e com avaliações das candidaturas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Foi realizada a extração dos dados por meio da API do Twitter. Para tanto, foi desenvolvido um código Python que permitiu a conexão à API e conversão dos mesmos para o formato CSV (do inglês, CommaSeparetedValues). Durante esta etapa, foram

21 considerados os seguintes dados: nome de usuário, texto do tweet, e data de postagem. Os dados foram submetidos a um tratamento e filtragem, sendo removidos emojis e retweets(recurso que permite o compartilhamento de uma postagem anterior). Os dados foram indexados de acordo com as datas de postagem e de acordo com os candidatos presidenciáveis com candidatura registrada junto ao TSE no período considerado na amostra, sendo submetidos a rotinas de mineração de dados para análise de sentimentos. Para a realização da extração de dados foi considerado na consulta o termo “#eleicoes2018”, o que permitiu a captura de 89.323 tweets. Após a filtragem dos dados, fase em que foram removidos os retweets, foram obtidos 26.189 tweets (29% dos dados capturados). A amostra foi submetida a uma segunda filtragem, para remoção de tweets com ocorrência de dois ou mais candidatos, o que poderia representar ruído nas avaliações dos sentimentos. A Figura 2 apresenta a distribuição das menções considerando a amostra total e as amostras filtradas. É possível observar que na amostra geral o candidato Bolsonaro apresenta uma quantidade de menções consideravelmente maior, enquanto nas amostras filtradas, os candidatos Bolsonaro e Lula apresentam valores relativamente próximos. Considerando o conjunto de dados referentes à amostra com os dados filtrados, foi construída uma visualização com referência temporal, apresentado na Figura 3 (apenas para os cinco candidatos com o maior número de menções). Através desta visualização é possível observar, por exemplo, picos de menções, como ocorre com o candidato Bolsonaro, no dia 29 de Agosto de 2018, dia que sucede sua entrevista em estúdio a um telejornal de uma rede de TV aberta, e com o candidato Lula, no dia 01 de Setembro de 2018, dia que sucede a Sessão Plenária Extraordinária do TSE em que foi julgada a candidatura do mesmo. Finalmente, os dados foram submetidos a rotinas de mineração de dados para análise de sentimentos. Os resultados demonstram que, em uma visão generalista, a maior parte das menções realizadas se refere a emoções negativas em relação aos candidatos (valores menores que 0.5), com alguns registros mais isolados de comentários positivos.

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Figura 2 - Menções dos candidatos nos tweets das amostras consideradas

Figura 3- Evolução das menções dos candidatos no período considerado

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Figura 4 - Evolução temporal da média dos sentimentos associados aos candidatos

A solução apresentada neste trabalho é potencialmente relevante do ponto de vista de desenvolvimento de plataformas de críticas, opiniões e/ou reclamações, tendo como base a análise de sentimentos em mídias sociais. É importante ressaltar, ainda, que tal prática corrobora com as premissas do processo eleitoral, no que tange à avaliação do cenário eleitoral, acompanhamento dos candidatos, execução das atividades do processo e garantia de participação e informação aos cidadãos brasileiros.

Palavras-chave: Eleições. Análise de mídias sociais. Análise de sentimentos. Mineração de dados.

REFERÊNCIAS

ATTUX, R. C. Predição dos resultados das eleições de 2014 para presidente do Brasil usando dados do Twitter. 2017. 48 f. Monografia - Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2017.

CASTRO, L. N.; FERRARI, D. G. Introdução à Mineração de Dados: conceitos básicos, algoritmos e aplicações. São Paulo: Saraiva, 2016.

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TERRA, C. F. Usuário-mídia: a relação entre a comunicação organizacional e o conteúdo gerado pelo internauta nas mídias sociais. 2010, 217 f. Tese (Doutorado em Interfaces Sociais da Comunicação) – Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.

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COMUNICAÇÃO E SAÚDE PÚBLICA: A UNIVERSIDADE NA PREVENÇÃO AO VÍRUS HIV/AIDS

Rafael Borges Marques1 Johnny Ribas da Motta2 Bruno Roque3 Eva Márcia Arantes Ostrosky Ribeiro4

RESUMO

O objetivo desta pesquisa é analisar a percepção dos jovens universitários quanto à prevenção ao vírus HIV/AIDS, a partir de ações realizadas pela Universidade Federal de Goiás/GO, sendo esta uma representante do Estado, considerada como instância normativa e de controle da comunicação pública para formalização da participação social na esfera pública (MATOS, 2007). Como questão pesquisa, tem-se a seguinte indagação: qual a percepção dos universitários quanto às ações de comunicação realizadas pela universidade pública para a prevenção ao vírus HIV/AIDS? Caracterizada como pesquisa qualitativa do tipo exploratória, a coleta de dados foi realizada nos meses de agosto e setembro de 2018, por meio de entrevistas em profundidade com acadêmicos da instituição, tendo como técnica de amostragem a não probabilística por conveniência. Os dados coletados foram analisados a partir da perspectiva da Análise Descritiva e Análise de Conteúdo bardaniana (2011) com codificação em ciclos de Saldaña (2013). Pela concepção teórica de autores que tratam de comunicação pública (ZÉMOR, 2005; BRANDÃO, 2007; DUARTE, 2012), com consulta de documentos do Ministério da Saúde e de organizações envolvidas na prevenção do vírus, procura-se contextualizar e embasar o desenvolvimento deste trabalho. Como justificativa, são considerados os dados do Boletim Epidemiológico publicado pelo Ministério da Saúde em 2017, que aponta para uma crescente incidência

1 Graduando do 3º período do curso de Relações Públicas da Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected] 2 Mestrando pelo Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal de Goiás. Especialista em Gestão da Comunicação Pública e Empresarial e bacharel em Comunicação Social - Jornalismo pela Universidade Tuiuti do Paraná. E-mail: [email protected] 3 Graduando do 3º período do curso de Relações Públicas da Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected] 4 Professora substituta do curso de Relações Públicas da Universidade Federal de Goiás. Mestre em Comunicação pela Universidade Federal de Goiás. Especialista em Marketing pela Fundação Getúlio Vargas, graduada em Relações Públicas pela Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected] 26 de contágio pelo vírus HIV/AIDS em população jovem, com idade entre 25 e 39 anos. Estes dados se agravam ao apontar um crescimento de 35% de diagnósticos positivos entre jovens de 15 a 24 anos. As estatísticas sobre os hábitos de prevenção a Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs) dos jovens brasileiros revelam que este grupo (pessoas entre 15 e 39 anos) faz parte de um público alvo prioritário para as campanhas de conscientização, porém, evidencia-se que somente ações esporádicas ficam na memória, às vezes nem por seu conteúdo, mas pelo seu formato (como a inserção de figuras públicas em campanhas de comunicação, como foi o caso da cantora PablloVittar), ou as tradicionais ações em época de carnaval, por exemplo. A partir dos dados coletados, observa-se que termos como “universidade, papel e educação” são evocados constantemente pelos entrevistados, assim como se constata o conhecimento da doença por este grupo, mas, diverge com os hábitos da não utilização dos métodos de prevenção. Neste sentido, observando a problema apresentada, tem-se como amparo teórico os escritos de Zémor (2005), ao calcar a legitimação da comunicação pública na “legitimidade do interesse geral”, razão pela qual, acontece no espaço público sob o olhar do cidadão. Para o autor, suas finalidades públicas não podem estar dissociadas das finalidades das instituições públicas, pautadas no ato de informar; ouvir as demandas, as expectativas, as interrogações e o debate público; contribuir para assegurar a relação social e de acompanhar as mudanças, tanto as comportamentais quanto das organizações sociais. Com base neste pensamento, Duarte (2012) reitera que a comunicação pública ocorre em dinâmica informativa e interativa entre instituições públicas e atores sociais, objetivando a viabilização do direito social coletivo e individual, quanto à informação, o diálogo e a expressão. Desta forma, o exercício da comunicação pública está relacionado a uma concepção cidadã do fazer público, logo, envolvendo diretamente temas próprios ao interesse coletivo, que neste caso, versa-se sobre a importância de abordagens comunicativas que visem à prevenção ao vírus HIV/AIDS, tema de interesse público. Ao tratar de interesse público, McQuail (2012) fundamenta a partir de três características, a saber: i) interesse público como expressão da “vontade geral”, da vontade da maioria; ii) interesse público como princípio normativo absoluto, independente da vontade da população; e, iii) interesse público como expressão de interesses que presumivelmente todos têm em comum. Nesta perspectiva, estendendo a

27 concepção de (fazer) comunicação pública de Estado a todas as suas instituições, identificam-se as universidades públicas como ambientes viáveis para esta prática, ao refletir sobre o seu papel fundamental para a conscientização e educação (FREIRE, 1980). Neste sentido, indaga-se sobre o papel do Estado e das instituições públicas que estão em contato direto com jovens e que não instrumentalizam suas abordagens, falhando nos debates e em ações de prevenção as DSTs. Contudo, os apontamentos iniciais exercem mais um papel de alerta do que de diagnóstico, em que se versa o papel do Estado, aqui representado pela universidade pública, pois a saúde é, afinal, elementar na constituição de uma sociedade sadia, e o Estado, por intermédio da comunicação pública, devem aperfeiçoar seus processos e estratégias, com o intuito de educar e conscientizar a população.

Palavras-chave: Comunicação Pública. Universidade. HIV/AIDS. Ministério da Saúde. Saúde.

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APLICABILIDADE DA PESQUISA AÇÃO E DA PESQUISA PARTICIPANTE NO CAMPO DA COMUNICAÇÃO

Keyla Rosa de Faria1 Andréa Pereira dos Santos2

RESUMO

Ao pesquisar, empregam-se métodos para obter respostas/soluções a uma dúvida ou problema. Essa busca contínua aponta diversos caminhos ao conhecimento. Assim, este trabalho objetiva expor o conhecimento produzido sobre dois tipos de pesquisa alternativa – a pesquisa-ação e a pesquisa participante – e apontar as diferenças entre essas pesquisas; coletar e organizar dados sobre as duas formas de pesquisa. Procura compreender a aplicabilidade da pesquisa-ação e da pesquisa participante, e para isso buscou responder a seguinte problemática: Como está o uso da pesquisa-ação e da pesquisa participante na Ciência da Comunicação? A resposta para este questionamento ocorreu a partir da pesquisa bibliográfica realizada em três bases de dados, a saber: CAPES, Scielo e Google Acadêmico. Os procedimentos para a coleta dos dados foram executados em três momentos: 1. busca nas bases bibliográficas dos termos – título, assunto, autor, idiomas, períodos. Nesta etapa a pesquisa foi realizada de forma ampla/geral; 2. emprega os mesmos itens de busca do primeiro, mas incluiu o período entre 2010 a 2018; 3. busca neste estágio foi mais restrita, com o intuito de encontrar publicações dentro do campo da Comunicação, os termos utilizados na busca foram – título, autor, idioma (português), período de 2010 a 2018, e no assunto a Comunicação. Empregou esses procedimentos de recuperação da informação nas bases de dados, tanto do termo pesquisa-ação, como da pesquisa participante, porém executados em momentos diferentes para obter extrato individual de cada termo pesquisado. A pesquisa bibliográfica em livros, artigos científicos e anais de encontros científicos, contribuíram no levantamento dos dados teóricos e históricos sobre a pesquisa-ação e a pesquisa participante. Onde a primeira tem por objetivo melhorar as práticas sociais e educativas, já que possui o caráter participativo e colaborativo, se manifesta de diversas

1 Mestranda do Programa em Comunicação, Mídia e Cultura pela Universidade Federal de Goiás. [email protected] 2 Prof.ª Dra. do Curso de Biblioteconomia e do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Goiás. [email protected] 30 formas. Dependendo da sua aplicação, e do contexto que está sendo implantada a pesquisa, ela se molda ao pesquisador e aos pesquisados. Por sua aplicabilidade ser feita em grupo, os partícipes aprendem com suas experiências, e a partir delas transformam o meio no qual ocorreu a intervenção da pesquisa, visto que, um dos propósitos da pesquisa-ação é resolver ou esclarecer os problemas identificados. Desta forma, o pesquisador encontra flexibilidade para estruturar o esquema metodológico, segundo os hábitos, os costumes e a disciplina instituída no espaço geográfico a ser pesquisado. O exercício de conscientização dos grupos ou indivíduos é tarefa árdua, e os limites metodológicos tradicionais às vezes não conseguem alcançar esta subjetividade do comportamento, por melhor e mais estruturada que seja a metodologia. A diferença entre a pesquisa tradicional e a pesquisa-ação está na atuação dos investigados, já que uma vê os pesquisados como indivíduos passivos, que possuem armazenamento de informações, e os sujeitos considerados incapazes de perceberem e de encontrarem soluções para os problemas que os cercam. No campo da Comunicação a pesquisa-ação foi aplicada como forma de melhorar os modos de comunicação dos grupos populares. Seu caráter social, político e educativo se encaixa dentro da perspectiva da Educomunicação, uma vez que está direcionada para a transformação social. Na pesquisa participante o foco está mais no pesquisador, do que no pesquisado, outro fator é a ausência de ação dentro dos grupos escolhidos, onde esses continuam as atividades diárias, comuns, sem ter objetivos específicos para trabalhar, em prol da pesquisa. Portanto, essa pesquisa tem um viés, dentro do contexto da pesquisa antropológica ou etnográfica, e a preocupação do pesquisador está em ter um certo relacionamento com o grupo pesquisado e minimizar a estranheza dentro do grupo escolhido para campo de pesquisa. A inexistência da ação e do agir revela uma das diferenças entre as pesquisas alternativas. Essas diferenças podem advir do construto em que as pesquisas foram elaboradas, já que, a pesquisa-ação tem origem estadunidense, com embasamento sociológico, e a pesquisa participante surgiu na América Latina, com a atenção voltada ao processo educacional dos trabalhadores rurais. Os estudos voltados à pesquisa participante dentro da Comunicação Social começaram no final da década de 1980 e início de 1990, mas em seguida houve um descrédito, e esse, é fruto do fato de que a metodologia desta pesquisa não está sendo

31 discutida nos manuais ou nas obras que contenham publicações sobre os métodos de pesquisa. Esses dois tipos de pesquisa são rejeitados, devido a sua cientificidade. O levantamento dos dados, por meio da pesquisa às bases de dados Capes, Scielo e Google Acadêmico permitiu vislumbrar a usabilidade dos referidos métodos de pesquisa no Campo da Comunicação. Ao pesquisar pelo termo pesquisa-ação de forma ampla, ou seja, selecionando todos os campos de opções de busca, recuperou na Capes 24.440 (vinte quatro mil, quatrocentos e quarenta) itens; no Google Acadêmico 1.240.000 (um milhão, duzentos e quarenta mil) itens bibliográficos; Scileo 57.245 (cinquenta e sete mil, duzentos e quarenta e cinco). Na segunda parte da busca pelo termo pesquisa-ação no período de 2010-2018 obteve os seguintes números: Capes 11.107 (onze mil, cento e sete) itens; Google Acadêmico 868.000 (oitocentos e sessenta e oito mil) itens; Scielo 3.679 (três mil, seiscentos e setenta e nove) itens. Ao incluir na terceira parte da busca o assunto “comunicação” no período de 2010 a 2018 recuperou os seguintes dados: Capes 76 (setenta e seis) itens; Google Acadêmico 127 (cento e vinte sete) itens; Scielo 138 (centro e trinta e oito). Percebe-se que ao inserir o termo “Comunicação” no assunto entre os anos 2010/2018 ocorre uma diferença de aplicabilidade da pesquisa-ação, como método. O Google Acadêmico apresenta a maior desproporção, ou seja, nas diversas áreas do conhecimento obteve 868.000 itens, e com área de conhecimento definido – a Comunicação – recuperou apenas 127 itens. Com relação à pesquisa participante os resultados foram: busca geral Capes 14.311 (quatorze mil, trezentos e onze) itens; Google Acadêmico 118.000 (cento e dezoito mil) itens; Scielo 1.088 (um mil e oitenta e oito) itens; selecionando a opção por período de 2010/2018 revelou o seguinte: Capes 5.917 (cinco mil, novecentos e dezessete) itens; Google Acadêmico 87.200 (oitenta e sete mil e duzentos) itens; na Scielo 271 (duzentos e setenta) itens; Ao incluir o na seleção o assunto “Comunicação” no período de 2010/2018 as publicações recuperadas são escassas: Capes 44 (quarenta e quatro) itens; Google Acadêmico 67 (sessenta e sete) itens; Scielo 1 (um) item. Os resultados apontam que a aplicabilidade da pesquisa-ação e da pesquisa participante na área da Comunicação está associada à Educomunicação, as quais exigem do pesquisador dedicação e domínio das questões práticas e teóricas. Os estudos que

32 envolvem ação exploram comportamentos, que podem ser conscientes, ou não, todavia os aspectos simbólicos estão tanto no campo educativo, como no comunicativo. Ao analisar os dados coletados e fazer a proporcionalidade de publicação no âmbito geral e específico utilizando o termo “Comunicação”, a pesquisa participante teve mais aplicabilidade do que a pesquisa-ação no campo das Ciências da Comunicação, apesar de que a pesquisa participante é vista com muita semelhança à pesquisa-ação, e os pesquisadores ao utilizar tanto uma, como a outra podem nomeá-las como sendo uma, mas na verdade aplicam a outra. Essa similaridade nos métodos contribui para a confusão entre os dois tipos de pesquisa alternativa. A partir dos conceitos exposto sobre a pesquisa-ação e pesquisa participante pode-se dizer que elas não surgiram para substituir as pesquisas tradicionais, mas para investigar e produzir novas formas de conhecimentos sociais e novos relacionamentos entre pesquisador e pesquisado. Conclui-se que a usabilidade da pesquisa ação e participante dentro da comunicação é restrita devido às críticas, já que consideram o campo pesquisado por essas pesquisas complexo e dinâmica, o qual pode ser alterado antes mesmo da pesquisa ser finalizada. E pela pouca disseminação e informação sobre as pesquisas alternativas dentro do campo da Comunicação.

Palavras-chave: Pesquisa ação. Pesquisa participante. Metodologia. Pesquisa alternativa.

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LOBBY E COMUNICAÇÃO: O QUE PENSAM OS PROFISSIONAIS DE RELAÇÕES PÚBLICAS?

Bruno Roque1 Johnny Ribas da Motta2 Rafael Marques Borges3 Laís Forti Thomaz4

RESUMO

O presente estudo tem como objetivo analisar a percepção dos profissionais de Relações Públicas sobre Lobby, atividade essa, aceita como ocupação pelo Ministério do Trabalho brasileiro, amparada pela portaria Nº 397, de 09 de outubro de 2002. A partir desta perspectiva, propõem-se uma pesquisa qualitativa do tipo exploratória, com coleta de dados realizada entre agosto e setembro de 2018, tendo o público alvo composto por profissionais de Relações Públicas que atuam no município de Goiânia/GO. A técnica de amostragem utilizada é a não probabilística por conveniência e como instrumento de coleta de dados utiliza-se um formulário, com envio por e-mail e redes sociais (Whatsapp e Facebook), considerado por Mattar (1994) como questionário auto respondido, em que o entrevistado lê e responde de forma direta no instrumento de coleta, sem que haja intervenção do entrevistador. Os dados coletados foram tratados no software Iramuteq 0.7 alpha 02, e como método proposto para análise dos dados foi utilizada a Análise de Similitude, a partir da Árvore Máxima de Palavras. Justifica-se este estudo, tendo em vista a pouca literatura sobre Lobby no Brasil e sua imbricação com as Relações Públicas, vê-se uma latente possibilidade de abertura de discussões, principalmente, diante da carga negativa

1 Graduando do 3º período do curso de Relações Públicas da Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected] 2 Mestrando pelo Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal de Goiás. Especialista em Gestão da Comunicação Pública e Empresarial e bacharel em Comunicação Social - Jornalismo, ambas pela Universidade Tuiuti do Paraná. E-mail: [email protected] 3 Graduando do 3º período do curso de Relações Públicas da Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected] 4 Professora do curso de Relações Internacionais da Universidade Federal de Goiás. Pesquisadora de Pós- Doutorado e Professora colaboradora do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas - Unesp, Unicamp e PUC-SP, no qual obteve os títulos de Doutora e Mestre na área de Instituições, Processos e Atores (linha de pesquisa: Relações Exteriores dos Estados Unidos), com estágio de pesquisa de doutorado na Georgetown University (BEPE/Fapesp). E-mail: [email protected]

36 atribuída ao termo pelo senso comum, devido uma construção social e midiática (MANCUSO e GOZETTO, 2018). O Lobby vem sendo associado de forma pejorativa às práticas ilícitas, como corrupção e tráfico de influência, porém, como propõe Ferreira (2006), Lobby se trata de um instrumento democrático de defesa de interesse que media as relações entre os diversos grupos de pressão da sociedade e os detentores do poder por eles eleitos, assim, transmitindo seus interesses e desejos aos ocupantes dos poderes Legislativos e Executivos, em todas as esferas governamentais. Considerando o cenário atual brasileiro, com um governo com características intervencionistas, é importante obter mecanismos que tragam maior transparência e accountability(prestação de contas) a democracia, e que consigam estimular a participação da sociedade no processo de formulação de leis (FERREIRA, 2006; ANGÉLICO, GOZETTO e MANCUSO, 2016). No Brasil, há um amparo constitucional para a formação de grupos de pressão, em referência ao art. 5º, inciso XVII e XVIII da Constituição, que assegura a ampla liberdade de associação para fins lícitos (ARAGÃO, 1994). Portanto, é um direto de pessoas físicas, instituições, empresas, grupos da sociedade e movimentos sociais de assegurar seus interesses diante do poder público. Sendo assim, o presente estudo toma como base a visão acadêmica a respeito do termo Lobby, tendo em vista que a atividade está presente dentro do leque de possíveis atuações de um profissional de Relações Públicas. A partir desta perspectiva, indaga-se: "O que pensam os profissionais de Relações Públicas sobre o Lobby no Brasil?”. Para que essa pergunta seja respondida é necessário encontrar os pontos de confluência teórico-práticos entre Lobby e Relações Públicas, além de entender o desinteresse dos profissionais desta área em produzir e atuar, visto que a atividade já esteve mais presente neste cenário. Um exemplo da atuação do Lobby no Brasil foi o VII Congresso Brasileiro de Relações Públicas, realizado em Brasília em 1982, com participações internacionais de especialistas, entre eles Phillip Kotler, que evidenciou a utilidade profissional dolobbyng no âmbito das Relações Públicas. Na época, os profissionais de Relações Públicas reivindicavam a destinação de uma parcela do mercado no exercício das atividades profissionais como lobistas (GOZETTO, 2005). Deste modo, entende-se que há uma relação direta entre os termos Lobby e Relações Públicas, ambos em seus pontos comuns, exercem as funções como

37 mediadores de relacionamentos, transmissores de informação e comunicadores. No entanto, é preciso defini-las para que não sejam enxergadas como sinônimos, pois a Relações Públicas é tida como área capaz de se comunicar com os diversos públicos que constitui a sociedade, um dos quais é o poder político, já o Lobby se limita a influenciar as decisões no poder público (LODI, 1986). Por fim, cabe salientar que as questões principais expostas nesse estudo buscam evidenciar o perfil demográfico e a percepção dos profissionais no que tange às práticas de Lobby e as Relações Públicas em Goiânia/GO.

Palavras-chave: Lobby. Relações Públicas. Grupos de Pressão. Comunicação. Influência.

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OBJETIVIDADE JORNALÍSTICA: DISCUSSÕES E REFLEXÕES SOBRE UMA POSSIBILIDADE DE CONSTRUÇÃO DE CONHECIMENTO

João Barbosa1 Ângela Teixeira de Moraes2

RESUMO

Com base na necessidade de continuar aproximando teoria e prática no campo da comunicação, este trabalho tem o objetivo de refletir criticamente sobre os conceitos de objetividade jornalística e como eles influenciam na busca por uma verdade construída num campo não científico, bem como as possibilidades de enxergar o jornalismo como ambiente propício para a produção de conhecimento. Para tanto, o trabalho lança mão da metodologia de Pesquisa Bibliográfica para realizar tais discussões, buscando autores que discutem epistemologicamente os conceitos de verdade, objetividade e produção de conhecimento. Antes de iniciar as discussões, é importante explicar que o entendimento de objetividade apresentado neste estudo possui um viés baseado em visões do campo jornalístico, apesar de o termo ter sido herdado das ciências e da filosofia. Deste modo o campo do jornalismo deve ser classificado como dado à objetividade, implicando em uma obrigação em prestar contas em relação a uma realidade exterior, fazendo com que o objetivo do jornalismo seja o de mediar uma realidade social, criando conteúdos que possam ser assimilados por indivíduos ou grupos. Apesar de a origem datar de séculos atrás e sua disseminação moderna ter ocorrido junto com o positivismo, é importante destacar que as pesquisas sobre objetividade dentro dos estudos do campo do jornalismo se intensificaram com base na hipótese do newsmaking. Em resumo, a hipótese do newsmaking é entendida como um campo que emprega seus estudos na produção e nos produtores da notícia, ao atentar-se

1 João Victor Mariano Barbosa Inácio Lauriano é mestrando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected]. 2 Ângela Teixeira de Moraes é professora do Programa de Pós-Graduação em Comunicação na Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás. Doutora em Letras e Linguística com ênfase em filosofia da linguagem e análise do discurso. E-mail: [email protected].

40 em como essas rotinas industriais influenciam na representação e reconstrução dos fatos, indo de encontro com a ideia de que o jornalismo é um espelho da sociedade. Dentro desse arcabouço teórico encontram-se uma série de pesquisadores que fizeram estudos e críticas sobre o conceito de objetividade jornalística, entre eles estão os estudos realizados por Gaye Tuchman, que, com base em pesquisas etnográficas, concluiu que em uma redação o jornalista objetivo é aquele que consegue fazer a distinção entre o que pensa e o que é notícia, porém todos os rituais estratégicos identificados apenas apresentam uma tentativa de se chegar à objetividade, não atingindo essa finalidade. Pelo contrário, os métodos utilizados pelos repórteres podem resultar em efeitos inversos do pretendido. Já outros autores entendem a não existência de uma objetividade no jornalismo não como uma causa do sistema informacional contemporâneo, mas sim devido à produção e atividade realizadas pelos jornalistas, ou seja, as rotinas produtivas aos quais os jornalistas são submetidos. Além disso, o entendimento é de que a objetividade jornalística não é um conceito global, sendo possível perceber que cada país e região possuem seus próprios entendimentos sobre o termo, sendo possível concluir que não existe um único conceito de objetividade e reafirmando o entendimento de que é um conceito construído socialmente. Porém, buscando uma representação mais filosófica do conceito de objetividade no jornalismo, é possível apresentar o conceito como algo ligado à produção de conhecimento e, com base nisso, os problemas envoltos aos estudos da objetividade jornalística deixam de ter apenas características éticas e morais para ganhar contornos epistemológicos. Em um sentido epistêmico da distinção entre objetivo e subjetivo, uma afirmação ou discurso só pode ser considerado como objetivo se for reconhecido como verdadeiro ou falso independente dos sentimentos ou predileções que o receptor possa ter, já uma afirmação é considerada subjetiva se, para sua compreensão, seja essencialmente necessário o uso dos sentimentos dos receptores ou observadores. Quanto ao papel do jornalista em meio a essa discussão, é possível sim considerar o repórter como um indivíduo objetivo, mas somente se ele conseguir se guiar pela imparcialidade, se abstrair da maior quantidade de características pessoais possíveis. Porém, mesmo seguindo esses procedimentos, é sabido que a objetividade não é completa, surgindo o que se pode chamar de graus ou níveis de objetividade, sendo possível inferir que existirem áreas em que as informações são mais objetivas do que

41 em outras. Sendo assim, sobre o risco de se atingir um baixo nível de objetividade, é possível compreender que esse risco é menor no jornalismo investigativo, onde é possível perceber na pauta elaborada pelo repórter uma semelhança estrutural ao elenco de hipóteses que guia as pesquisas científicas. Tendo como resultados no campo do jornalismo a revelação de fatos que eram desconhecidos, e na ciência a descoberta de uma realidade físico-natural. Sendo assim, porque o jornalismo não é popularmente reconhecido como produtor de conhecimento? Sobre esta questão, é possível entender que a falta de credibilidade no jornalismo como construtor de conhecimento esbarra na falta de transparência dos métodos utilizados na produção das notícias, já nas publicações científicas, em que o método utilizado para se chegar a determinada resposta está sempre à disposição do leitor, garante uma maior sensação de objetividade e comprometimento. Complementando esta visão, entende-se que, com base na teoria da verdade como correspondência – o entendimento de verdade se refere a descrição de como são as coisas no mundo, e essas descrições serão consideradas verdadeiras ou falsas em função de as coisas serem de fato como são descritas –, o jornalismo está sim num campo epistemológico muito próximo ao das ciências, justamente por conseguir relacionar a linguagem com a realidade. A grande diferença fica por conta de que o jornalismo trabalha mais com uma realidade social do que com uma realidade natural, como as ciências tradicionais. Por fim, não se pretende classificar o jornalismo como uma ciência, mas é possível que ambos possam ser caracterizados como epistemicamente objetivos, já que tanto o jornalista como o cientista têm o objetivo de investigar fatos que não dependem das atitudes, de preconceitos e de vieses de qualquer tipo. Com isso, é possível acreditar que este seja o momento de o jornalismo se aproximar cada vez mais dos métodos científicos para que, ao mesmo tempo em que garante um resultado mais próximo da realidade, também consiga reconquistar a confiança e credibilidade que vem perdendo devido ao advento das novas mídias – em especial as redes sociais digitais –, que têm potencializado a desinformação e prejudicado a garantia do direito à comunicação e informação.

Palavras-chave: Conhecimento. Jornalismo. Newsmaking. Objetividade Jornalística. Verdade.

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COMUNICAÇÃO E EDUCAÇÃO NA PERSPECTIVA DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

Bruno Eduardo Slongo Garcia1 Johnny Ribas da Motta2 Claudomilson Fernandes Braga3

RESUMO

O presente estudo tem por finalidade analisar, sob a ótica dos profissionais que atuam na aprendizagem, a importância dos processos comunicativos para a Educação a Distância. A Educação a Distância (EAD) é uma modalidade de ensino abrangente, tendo como função a inclusão e democratização, por meio da ampliação do acesso ao ensino para uma parcela expressiva da população. Tratar-se de uma modalidade não tradicional e tipicamente relacionada à era tecnológica, dispondo de um acervo de técnicas a disposição da sociedade. Ainda, sua eficácia é comprovada de forma inegável e caracteriza a democratização do saber, considerando-a como a educação do futuro. A modalidade é composta pela presença de um tutor, com adaptação da linguagem, equipe multidisciplinar e blendedlearning4, integrando, as particularidades e especificidades como o público a ser atingida, continuidade do ensino, prática e a realidade, em que a crescente utilização de tecnologias chama a atenção dos planejadores educacionais para a educação, ao proporcionar benefícios como oportunidades de aprendizado, atualização das competências humanas, redução dos custos relacionados à educação, nivelamento das desigualdades sociais, conciliação da vida profissional, pessoal e agregação de experiências internacionais, por meio da modalidade a distância. Considerando a inserção das tecnologias na educação, é necessário observar de forma estratégica caracterizando-as a partir das Tecnologias da

1 Mestrando pelo Programa de Pós-graduação em Contabilidade da Universidade Federal do Paraná. Especialista em Gestão de Negócios (UFPR) e bacharel em Administração pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. E-mail: [email protected] 2 Mestrando pelo Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal de Goiás. Especialista em Gestão da Comunicação Pública e Empresarial e bacharel em Comunicação Social - Jornalismo, ambas pela Universidade Tuiuti do Paraná. E-mail: [email protected] 3 Doutor em Psicologia Social pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (2011). Pós-doutor em Psicologia Social pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás/ Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Professor adjunto da Universidade Federal de Goiás nos cursos de Relações Públicas e Gestão da Informação e no Programa de Pós-graduação em Comunicação PPGCOM (Especialização e Mestrado). E-mail: [email protected] 4 Refere-se a um sistema de formação onde a maior parte dos conteúdos é transmitida em curso à distância, normalmente pela internet, entretanto inclui necessariamente situações presenciais, daí a origem da designação blended, algo misto, combinado. Também é conhecido como ensino híbrido. 44

Informação e Comunicação (TICs), em um momento em que os ambientes de aprendizagem convergem e dialogam com campos de experiências que, por sua vez, processam mudanças na educação. Com intuito de atingir o objetivo proposto, elaborou-se um roteiro de entrevistas, para conhecer o perfil demográfico e o posicionamento quanto à importância da comunicação nesta modalidade de ensino. Para a coleta dos dados, foram considerados os atores envolvidos nas práticas pedagógicas da EAD, como tutores, coordenadores, professores e facilitadores. A amostra foi composta de maneira intencional, a partir do convite a 20 profissionais residentes na cidade de Curitiba/PR, que desempenham funções relacionadas à modalidade em instituições públicas e privadas, previamente identificados pelas atividades dentro das organizações em que atuam, e encontram-se nos mais diversos níveis de ensino. Os dados foram tratados e analisados a partir da perspectiva da Análise de Conteúdo proposta por Bardin (2009) e as técnicas de codificação elaboradas por Saldanã (2013), sob a acepção da Avaliação em Aprendizagem (ROMANOWSKI, 2008; GARCIA, 2013;). Os achados contribuem para compreensão da perspectiva dos profissionais da área. A partir das mesmas, foi possível estabelecer que os profissionais consideram o conceito de comunicação dinâmico, caracterizado por um processo em que a informação integra a mensagem e esta é codificada por atores. A importância de se estabelecer um conceito de comunicação torna-se relevante na discussão do presente estudo, qual permite compreender se há um consenso entre os respondentes. Conforme observado, há um consenso da dinamicidade do conceito a partir da informação, configurada como mensagem em relações construtivas. E a partir da comunicação, a EAD se desenvolve como um diálogo reflexivo. Ademais, a comunicação envolve múltiplos fatores e atores, e ao mencionar a avaliação para a interação com a tecnologia, surgem os diferentes perfis. A miscigenação dos fatores comportamentais requer abordagens dialógicas abrangentes, como um aparato de mediação entre o ator e a aprendizagem, considerando que o distanciamento físico requer uma aproximação comunicativa intermediada. Por fim, é possível estabelecer que coexista a necessidade de avaliar não somente a mediação tecnológica, mas, os atores envolvidos. A comunicação é um processo interativo, para tanto, é necessário considerar os atores sociais envolvidos, como professores, tutores e estudantes. Nesta perspectiva, é

45 estabelecido o pensamento de uma aprendizagem que é compartilhada por meio da comunicação. Conclusivamente, o pensamento dos profissionais da EAD é estabelecido em uma linha tênue entre a comunicação e a dinâmica, destacando que será efetiva a partir do processo avaliativo e implementador, no momento em que a comunicação é reconhecida como necessária para qualquer momento de aprendizagem. O estudo contribui para a compreensão da perspectiva profissional sobre a comunicação do estudante para os fatores e atores envolvidos, de forma breve contribui a ampliar o perfil profissional da área ao compreender os processos comunicacionais e suas contribuições para a aprendizagem, principalmente na modalidade a distância.

Palavras-chave: Comunicação. Educação a Distância. Profissionais da EAD. Teoria da Comunicação. Aprendizagem.

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A PERCEPÇÃO DOS PROFISSIONAIS DE COMUNICAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES PÚBLICAS DE ENSINO SUPERIOR EM GOIÁS SOBRE COMUNICAÇÃO PÚBLICA

Stephanie Silva1 Tiago Mainieri2

RESUMO

Muitos fatores dificultam a aplicabilidade da comunicação pública: estrutura inadequada, falta de servidores, equipes sobrecarregadas, gestão que não valoriza e que não possui visão estratégica da comunicação, mudanças constantes na equipe, falta de investimento em qualificação e capacitação dos profissionais, entre outros. Nos últimos anos, os órgãos e instituições públicas conseguiram superar algumas dessas dificuldades, porém, a maioria das instituições continua distante das práticas segundo os princípios teóricos da comunicação pública. Diante dessa realidade, pode-se questionar se somente a estrutura e os aspectos operacionais são impeditivos para a atuação segundo os princípios da comunicação pública ou se tem faltado aos servidores encarregados dessa função um “espírito público para lidar com a comunicação de interesse coletivo” (DUARTE, 2011, p. 128). Para buscar compreender o porquê da comunicação pública ainda ser um conceito de difícil aplicabilidade nos órgãos e instituições públicas é que se levantou como problema de pesquisa Como a percepção dos profissionais de comunicação que atuam nas instituições públicas de ensino superior em Goiás influencia na prática da Comunicação Pública nessas instituições? De acordo com Chaui (2008), a formação de uma pessoa, a história de vida e suas experiências influenciam na forma como as coisas são percebidas. Para a autora (CHAUI, 2008, p. 135), a percepção é o conhecimento de um sujeito corporal, assim, as condições do sujeito são tão importantes quanto as condições dos objetos percebidos.

1 Aluna do Programa de Pós-Graduação em Comunicação em nível de Mestrado da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás – FIC/UFG, na linha de pesquisa Mídia e Cidadania. Especialista em MBA em Marketing pelo IPOG (2012), graduada em Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo pela UFG (2008). E-mail: [email protected]. 2 Professor do Programa de Mestrado em Comunicação na linha de pesquisa em Mídia e Cidadania da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás – FIC/UFG. Pós-Doutor pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - ECO/UFRJ, doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo – USP. E-mail: [email protected].

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Com esse objetivo, o primeiro passo metodológico da pesquisa foi conhecer a amostra de profissionais de comunicação que atuam nessas IES, levantar quem são os servidores (efetivos, comissionados, temporários ou terceirizados), assim como bolsistas ou estagiários, que compõem as equipes de comunicação dos departamentos/coordenações/secretarias de comunicação das quatro IES públicas do estado de Goiás: Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Goiano (IF Goiano), do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás (IFG), da Universidade Estadual de Goiás (UEG) e da Universidade Federal de Goiás (UFG). Para identificar esses profissionais, levantou-se dados dos sites institucionais do IFG, IF Goiano, UEG e UFG sobre as equipes de comunicação. Após esse levantamento, verificou-se com os gestores de comunicação de cada uma dessas instituições se a listagem das equipes de comunicação disponibilizadas nos sites estava atualizada e qual era o quadro atual desses servidores. O segundo passo metodológico da pesquisa foi a realização de uma análise documental para conhecer melhor o perfil desses servidores, pesquisou-se os dados disponíveis sobre esses profissionais no Portal de Transparência Federal, no Portal Goiás Transparente e na Plataforma Lattes. A identificação da equipe e o levantamento do perfil dos profissionais de comunicação do IFG, IF Goiano, UEG e UFG possibilitou a listagem de dados que influenciam na percepção desses profissionais como tempo de vínculo com a instituição, formação profissional e experiências profissionais anteriores. Para um melhor entendimento dessa percepção, além de analisar os dados obtidos com o perfil levantado, buscou-se também ouvir qual é a compreensão do conceito e dos princípios de comunicação pública desses profissionais. Assim, o terceiro passo metodológico foi o envio de um questionário com 35 perguntas fechadas e semifechadas entre os dias 23 de agosto a 20 de setembro via e-mail por meio da plataforma Google Forms para 110 profissionais que integram as equipes de comunicação do IFG, IF Goiano, UEG e UFG. As perguntas abordaram questões como características da comunicação pública, espaços de manifestação dos cidadãos, classificação de informações quanto ao atendimento ou não do interesse público, opinião sobre atividades que integram ou não a função social de um profissional de comunicação, entre outras. O questionário continha perguntas com múltiplos formatos, opções com escolha única, opções com três ou mais escolhas e opções com escala de Likert. Da amostra de 110 profissionais para

50 os quais o link do questionário foi enviado via e-mail, 38 responderam ao questionário, o que representa 34,5% da amostra total. Para análise das respostas, utilizou-se os estudos de Zémor, Duarte, Brandão e Koçouski e sintetizou-se o conceito de comunicação pública no entendimento de uma comunicação dialógica orientada pelo interesse público que preza pela transparência e promove a cidadania. Além do conceito sintetizado, a análise foi norteada também pelos pré-requisitos da comunicação pública estabelecidos por Jorge Duarte (2007): a transparência, o acesso, a interação e a ouvidoria social. Apesar de 84,2% dos profissionais terem respondido que a comunicação pública deve ser priorizada nas IES, a maioria dos profissionais elegeram como características totalmente essenciais em uma comunicação para ela ser considerada pública particularidades da comunicação organizacional como o zelo pela imagem da instituição (84,2%), a publicidade institucional (60,5%) e a definição e divulgação da missão, da visão e dos valores da instituição (52,6%). Outros dados que também revelam a falta de clareza dos profissionais sobre o conceito de comunicação pública foram encontrados nas atividades consideradas pelos profissionais como totalmente integrantes à função social de um profissional de comunicação de uma IES pública. Enquanto 86,8% consideraram promover a instituição na mídia para o fortalecimento da imagem e identidade institucional uma atividade integrante à função social do profissional de comunicação, somente 39,5% elegeram estimular a sociedade a participar da gestão da instituição. Por esses e outros resultados obtidos com o questionário e com o levantamento do perfil dos profissionais, compreende-se que os profissionais de comunicação das IES públicas do estado de Goiás possuem uma percepção distorcida da comunicação pública.

Palavras-chave: Comunicação Pública. Percepção. Instituições públicas de ensino.

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GT Mutações Discursivas, Comunicação, Literatura e Consumo

Coordenação Goiamérico Felício e Janaína Jordão INSURGENTE: CRÔNICA DA REPRESSÃO POLICIAL EM TRÊS MANIFESTAÇÕES CONTEMPORÂNEAS

Bruno Souza Destéfano1 Angelita Pereira Lima2

RESUMO

A PEC 55, antiga 241, foi aprovada com 53 votos a favor em segunda votação realizada em sessão plenária do Senado. A medida que criou teto para o gasto público já havia sido aprovada em primeira votação no mês anterior (novembro de 2016) e foi promulgada no fim do mesmo ano. Nos dias das deliberações legislativas, duas grandes manifestações contrárias ao projeto de emenda ganharam forma por intermédio de outros atos e ocupações de estudantes em diferentes unidades de ensino do país: a de 29 de novembro e a de 13 de dezembro de 2016, realizadas nos arredores do Congresso Nacional, em Brasília. Meses depois, no centro de Goiânia, outro protesto resultante de uma greve geral também ganhou espaço, porém com objetivos diferentes (ou nem tanto assim). No dia 28 de abril de 2017, diversos estudantes, docentes, grupos organizados e trabalhadores em geral se reuniram para realizar uma manifestação contra a reforma trabalhista e a reforma previdenciária propostas pelo governo Temer. Ambos os cenários de protestos decorreram em tempos diferentes, com motivações diferentes, e em um contexto espacial diferente. Contudo, há um complexo jogo de ações nas duas narrativas que veio instrumentalizado por fumaça, tiros de borracha e sangue: a repressão policial e a força coercitiva deste instrumento de violência. Diversas narrativas surgiram entre as violências destas manifestações, mas talvez ainda existam vozes sufocadas que necessitem um instrumento específico para se projetarem, e essas vozes podem inferir significado por si mesmas nos moldes da repressão policial. A pesquisa que sustenta este trabalho se baseia nas seguintes questões: é possível enxergar traços de confluência entre as histórias?

1 Graduando em Comunicação Social – Jornalismo na Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás | [email protected] 2 Profª. Drª. na Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás [email protected] 56

Esses pontos de conexão podem gerar algum entendimento perante o motriz da violência policial nas manifestações contra a PEC 55/241 e as reformas do governo Temer, tal como o perfil das vítimas e o grau de repressão por meio de marcadores de diferença (raça, classe e gênero)? Por meio de histórias singulares de sujeitos pertencidos em um mesmo contexto socio-histórico, há uma linha narrativa em comum? “Insurgente: crônica da repressão policial” é um projeto experimental construído no formato de um livro-reportagem sob a ótica de vítimas que sofreram repressão policial nestas três manifestações. O objetivo é, por meio de crônicas (breves textos), formular uma crônica maior sobre a violência policial, no sentido de compreender as motivações dos agentes coercitivos, compreender as consequências na vida dos sujeitos-vítimas (e da sociedade como um todo, levando para o lado simbólico sobre o que o ato de manifestar representa) e compreender a experiência que é passar por esse tipo de repressão. Com base no referencial teórico em Jornalismo Literário e as metodologias de imersão, entrevistas em profundidade, construção de cena e diálogos, o resultado esperado do trabalho é a produção de uma narrativa que produza empatias sociais entre pesquisador, pesquisados e leitores. Além disso, a construção de um material voltado às experiências das vítimas estabelece novos registros para apreender e interpretar os recentes acontecimentos históricos os quais não devem ser esquecidos nem distorcidos. Narrar experiências de vida exige um comprometimento que vai além de simples técnicas predeterminadas, ainda mais quando o enredo é entendido apenas por um viés da realidade socio-histórica. As vozes sufocadas, em um contexto amplo e complexo, só conseguem respirar através de um diálogo franco e que trabalhe com a narração, apuração e investigação de maneira humanizada. Afinal, são pessoas de carne e osso que querem comunicar as suas ideias sem que o microfone seja constantemente retirado de suas mãos. Mudanças incomodam. Vozes que buscam modificações estruturais são vistas como ameaça. Transformar é um ato político e necessário, até mesmo quando estamos falando sobre contar histórias de violência. Afinal, balançar o status quo dentro do aparato jornalístico é mais do que elaborar notícias com várias vertentes de pensamento: é, também, pensar formas de lidar com inquietações coletivas. É, também, promover a consciência coletiva. É preservar a memória, humanizar ideias e promover a transformação social tendo em vista as pessoas e o contexto que estão inseridas. É imergir nesse mesmo contexto e construir pontes de diálogo.

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Observar realidades que correspondem as nossas é parte de um trabalho que envolve o campo da pessoalidade e o campo do "outro". Pois, ao mesmo tempo em que as codificações subjetivas estão intrínsecas nesta prática, as vivências de personagens em segundo, terceiro e quarto plano também orientam a experiência na sua forma ampla e complexa. O trabalho de campo nas manifestações de 2016 (Brasília) e de 2017 (Goiânia) fomentou a importância de elaborar um projeto jornalístico sobre a violência policial e suas consequências na vida das pessoas imersas nestes contextos. Para além do relato pessoal, estender a mão para buscar mais informações oriundas de outros horizontes abre caminho para o diálogo entre os valores inerentes ao "eu" e ao "nós", ao entendido como "individual" e ao social. Dessa forma, o método etnográfico já foi parcialmente aplicado por meio da observação participante nos levantes populares de Brasília e de Goiânia, que são os pontos-chave do livro-reportagem e da elaboração das crônicas dialogadas com a experiência do pesquisador e as experiências das vítimas da violência policial. Adiante, haverá a intersecção entre o material coletado e confeccionado (fotografias, crônica e perfil literário-jornalístico), e as entrevistas em profundidade. Ademais, todas as entrevistas serão disponibilizadas no site de podcasts para estabelecer um acervo contendo materiais sonoros das três manifestações, já que as vozes das vítimas são fundamentais no registro das recentes histórias de repressão policial no país. É necessário registrar para que os acontecimentos não sejam esquecidos ou distorcidos. É necessário compor a nossa própria história, tanto na integralidade (no caso, a inserção dos áudios completos na plataforma web) quanto na significação (uso das entrevistas e da experiência pessoal na elaboração das crônicas para o livro-reportagem).

Palavras-chave: Manifestação. Repressão. Violência policial. Crônica. Jornalismo Literário

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O DESEJO INVEJOSO: UMA PERSPECTIVA DE CERCAS E PONTES NO ATO DO CONSUMO

Karen Muzany1 Janaína V. de Paula Jordão2

RESUMO

Esse trabalho se trata de uma reflexão acerca dos desejos que norteiam o processo de compra de bens na vida social, tendo como elemento indicatório o sentimento de inveja. Pretende-se então, refletir como a inveja se insere nas escolhas dos bens de consumo, sendo estes configurados como cercas ou pontes no convívio humano, como já colocado por Douglas e Isherwood (2006). Para tanto, se trata de uma abordagem qualitativa de natureza básica exploratória, através da pesquisa bibliográfica. Dentro desse universo de possibilidades, na hora da decisão de compra as indagações acerca do pensamento é um ponto que vários pesquisadores se debruçam criando inúmeras possibilidades para entender a mente do consumidor como Veblen (1983), Simmel (1983), Baudrillard (1995), Bourdieu (2007), Bauman (2008). Entender o desejo é detectar a emoção inconstante que participa ativamente no cotidiano das pessoas, onde perpassam pelo consciente e inconsciente em suas atitudes na hora de escolher o que possuir e as indicações de valor dessa aquisição para exemplificar o seu ser. A inveja é um desejo que pode aparecer em todas as culturas, sendo vista em muitos momentos históricos nos contextos mais distantes. Seus primeiros estudos aparecem com autores como Aristóteles (2000), Tomás de Aquino (1895), Kant (1973) e Espinoza (1983) que indicavam a possibilidade de estímulo desse sentimento a partir da vida social. Dessa maneira, tanto homens como mulheres são passíveis dessa emoção, pois o confronto com as diferenças faz com que as pessoas entrem em um processo de comparação social. Logo encontramos as duas raízes da inveja explicitadas por Alberoni (1996), primeiro repelir o desejo adquirido e desvalorizar ou desmerecer o inalcançável e segundo o julgar, comparar o seu valor diante de outrem.

1 Mestranda em Comunicação, Mídia e Cultura pela UFG, Pós-Graduada em Marketing e Estratégia Digital pela Faculdade Araguaia, Bacharel em Comunicação Social – Habilitação em Publicidade e Propaganda pela PUC-GO. E-mail: [email protected] 2 Doutora em Sociologia pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Goiás, Mestre em Comunicação pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFG e Professora no Programa de Pós-Graduação em Comunicação e no curso de Publicidade e Propaganda da FIC/UFG. E-mail: [email protected] 61

Essa segunda raiz já foi defendida muito antes por Aristóteles (2000), onde dizia que a inveja é um pesar diante do sucesso obtido através dos bens do outro em relação ao que possuímos, portanto, competimos com que está próximo, como vizinhos, primos, irmãos, colegas de trabalho e profissão, e assim sucessivamente. Quem complementa posteriormente essa questão é Festinger (1954) que compreende a exigência comparativa desde a infância, onde são encontrados os primeiros confrontos entre os entes familiares, sejam irmãos, amigos, colegas de escola, que no decorrer da vida ou ficam para trás ou nos superam de alguma maneira gerando a avaliação dos pares, o que ocasiona os temidos sentimentos invejosos. Para alguns autores como Byington (2002) que estuda a psicologia simbólica baseada nos estudos de Freud e Jung, a inveja nada mais é que um símbolo com intuito de agir como função estruturante para o controle social, assim ela foi mal interpretada desde os seus primórdios, isso porque, o sentimento é tão criativo que motiva a busca pelo inalcançável, o novo, o crescimento constante, que de certa maneira deveriam ser ocultados para manter o controle nas mãos de quem detém o poder. Dentro dessa vertente, um dos primeiros fatores que desqualificaram a inveja é encontrada na religião, sendo constituída como símbolo estruturante no conhecimento de vida dos indivíduos com exemplos claros entre o bem e o mal, como Adão e Eva e o fruto proibido ou a crucificação de Jesus Cristo. Pois é proibida pela bíblia, tida como pecado capital que deve ser ocultado em suas vivências sociais (CUKIER, 2011). Essa percepção está pautada nas ideologias de igualdade que de acordo com Bourdieu (2007b), surgiram como uma espécie de ressentimento para assegurar o ethos, mostrando que para alcançar a ascensão é necessário seguir as normas religiosas. Nesse contexto, a inveja possui caráter processual de elaboração simbólica, moldando estruturantes de comportamento, dispensando a sua importância e passando a ser ocultada como o ciúmes, a raiva e a sexualidade. O desejo invejoso possui mecanismos para se originar, sendo eles classificados segundo Alberoni (1996) como indicação e identificação. No caso do consumo, a indicação é o primeiro fator a se observar, onde a mídia (marketing e propaganda) e suas personificações mostram aos seus públicos o que se deve desejar a partir de vertentes culturais e comportamentais que credibilizam o valor daquele bem e/ou serviço. Já na identificação, o perceber no outro é ponto de partida, ver como aquelas atribuições realmente fazem sentido, quando de posse de outra pessoa,

62 como um vizinho por exemplo. Geralmente, a identificação acontece dentro dos círculos em que o indivíduo está inserido. Neste momento, começa o processo de competir ou se deprimir, ser criativo ou se destruir, em tal caso, usar como uma ponte para conseguir saciar o seu desejo ou se cercar e permanecer onde está. Esses conceitos se interligam nas relações sociais com a mídia e as pessoas no círculo social, gerando uma cadeia de consumo a partir de uma emoção específica. Porém, todo o processo é individualista, criando-se uma perspectiva competitiva e criativa que conduz a encontrar a ponte para alcançar o desejo, ou mesmo depressiva e conflituosa que adentra em uma cerca de consumo. Assim, este artigo propõe entender essas conexões entre os fenômenos, a fim de esboçar uma probabilidade de exploração desses elementos dentro do consumo e posteriormente analisar de que maneira é introduzido na mídia.

Palavras-chave: desejo; inveja; bens; consumo; relações.

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TECNOLOGIA ANCESTRAL: A LÍRICA PERFORMÁTICA E A ESTÉTICA DE RESISTÊN IA EM “LUNDU” DE TATIANA NAS IMENTO

Juliana Cristina B. Albuquerque1 Goiamérico Felício C. dos Santos2

RESUMO

O objetivo deste artigo é investigar a subjetividade lírica presente na obra lundu da poeta contemporânea Tatiana Nascimento. A análise tem como aparato bibliográfico as proposições de Zumthor (2018) e Bosi (1977) investigando assim o lirismo e o viés performático presente nos versos da artista. Perscrutaremos as características estéticas da obra buscando a compreensão em torno da relação eu lírico/eu autobiográfico e do termo tecnologia ancestral, proposto pela própria artista, em lundu. Partindo dessa concepção adorniana de visão crítica e libertadora da arte investigaremos o primeiro livro de poesias da poeta contemporânea Tatiana Nascimento, brasiliense, doutora em Estudos da Tradução pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). lundu é o primeiro livro lançado da artista, ou melhor, pluriartista, pois Tatiana é também cantora e performer poética, a obra foi publicada pela padê editorial 3em 2016, apresenta 83 poemas e está em sua segunda edição. As sensações poéticas presentes na obra lundu apresentam um forte diálogo com a estética adorniana, se para Adorno a arte define-se como uma antítese social da sociedade por meio do seu caráter de ruptura com os parâmetros sociais impostos, sendo visto que na concepção adorniana, a arte enquanto forma de conhecimento é fundamental ao conhecimento da realidade, logo a realidade revela seu prisma social, ou seja, existe nessa relação um triângulo simbólico, na base podemos colocar a realidade e a sociedade, no topo a arte pontuando assim uma forte relação de significados e significância entre os objetos. É neste campo que muito nos interessa o diálogo entre literatura, sociedade e resistência.

1 Mestranda em Comunicação pela Universidade Federal de Goiás UFG Goiás, e-mail: [email protected] 2 Doutor em Letras pela PUC-RJ. Pós-Doutor em Literatura e Comunicação, Pela UNISINOS e UNR- Universidade Nacional de Rosário, Argentina. Prof. da UFG-Universidade Federal de Goiás. Integrante da LP Mídia e Cultura do PPGCOM-UFG e o GP-Comunicação, Discursos e Poéticas do Consumo – PPGCOM-ESPM;SP, e-mail: [email protected] 3 A poetisa Tatiana Nascimento utiliza-se de licença poética em sua obra, assim o nome da própria editora fundada por ela é grafada com letra minúscula, do mesmo modo que o título do seu livro de poesia analisado neste artigo também se apresenta com letra minúscula. 65

O movimento negro feminista e LGBT (Lésbica, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais ou Transgêneros) são temáticas fundamentais na compreensão acerca da estética presente em lundu que aqui nomearemos como estética de resistência, utilizando Bosi (1977), que se contrapõe a estética do racismo (Flores, 2007). São muitos os meandros sociais, artísticos e políticos que explicam o modo como originou- se e cristalizou-se o processo de retração da população negra, mas em contrapartida neste artigo analisaremos a subjetividade lírica construída pela poeta feminista e negra Tatiana Nascimento que busca em sua militância artística uma forma de romper essas estéticas padronizadas de raças e gêneros, além de dar voz a um coletivo, as poesias da artista militam e ecoam quer seja por onde perpassam. Ao analisar a obra lundu fica claro que não se pode dissociar o eu lírico do eu autobiográfico, eles estão entrelaçados por todos os versos de Tatiana Nascimento, subjetividade esta composta de significados e fundamental na compreensão da obra. Este trabalho se baseia na análise de poemas, associando alguns poemas as principais vertentes percebidas na obra. A nomeação de uma estética de resistência, vislumbrada a partir da teórica de Bosi (1977) diz respeito a dois pontos cruciais da poética da autora, também apontados como subjetividade lírica, o primeiro foi analisado frente à tecnologia ancestral, a tecnologia, por metonímia, entende-se como técnica ou conjunto de técnicas de um domínio particular, neste caso a tecnologia ancestral proposta pela poeta diz respeito a sua ancestralidade negra e os conhecimentos e memórias (sofrimentos) do coletivo de dois povos os africanos e os afro-brasileiros. Como se percebe em poesias que são analisadas neste trabalho, sendo assim, representa as temáticas mais latentes da obra, que o próprio título do livro indica; o segundo ponto apresenta uma relação à performance presente em Zumthor (2018), onde relacionamos com a visão o canadense McLuhan (1972), Tatiana apresenta uma performance desde a visualidade de sua poesia, sentido de desconstrução das palavras à resistência estética dessa poética narrando identidades subjetivas que começam a tomar o seu espaço legítimo de representação nas artes. O artigo tem como finalidade a construção de uma investigação consolidada em referências bibliográficas do campo da literatura buscando o diálogo com representações temáticas extremamente contemporâneas possibilitando a compreensão em torno de novas narrativas poéticas.

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Palavras-chave: Subjetividade lírica. Performance. Estética. Resistência. Feminismo Negro.

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NOVOS MERCADOS E CONSUMO: UM ESTUDO TEÓRICO DO PERFIL DOS LEITORES DA DARKSIDE BOOKS

HávilaSayuri de Oliveira Yoshy1 Luis Gustavo Baima Paiva2 MayllonLyggon de Sousa Oliveira3

RESUMO

A proposta desse trabalho é fazer um estudo sobre o mercado editorial super segmentado da Editora Darkside. Nesse sentido ele se propõe a estudar, “quais as características desses novos mercados super segmentados, bem como quais as nuances que compõem o perfil desse consumidor dos livros da editora”? O trabalho será feito a partir de uma pesquisa quantitativa e qualitativa, na qual a primeira busca entender as formas de segmentação a partir das leituras de Kotler (2012) e Anderson (2006), os números desse mercado editorial no Brasil a partir dos estudos da pesquisa FIPE da Câmara Brasileira de Livros (2016); já a segunda, nos possibilitará entender as nuances características da identidade, com base nas leituras de Rolnik (1997), Hall (2012) e Polon (2015), desse consumidor ativo da editora. A metodologia está baseada em: a) pesquisa bibliográfica sobre os conceitos que dão base ao trabalho; b) análise do discurso, a partir de Foucault (2015), nas formas de comunicação oficiais da empresa para com o mundo (site e redes sociais) e, por último, análise dos comentários dos clientes com empresa a partir dos meios de comunicação por ela utilizados. O mercado editorial é o responsável pela criação, desenvolvimento, publicação e comércio de livros. É composto por diversos profissionais, das mais diversas áreas, desde escritores,editores e tradutores a artistas gráficos e publicitários ( EARP; KORNIS, 2005) ; e se configura como uma das indústrias mais importantes em termos de formação cultural, educacional,profissional, social e política da sociedade. Apesar dessa importância, o livro é um produto proporcionalmente pouco consumido no Brasil, parte disso se deve ao preço dos livros e parte à falta de incentivo da leitura como hábito do indivíduo. O principal investimento das editoras se dá na produção

1 Graduando em RP na Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected] 2 Graduando em RP na Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected] 3 Mestre em Comunicação e Mídia. Professor substituto no curso de Relações Públicas da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected] 69 de conteúdo, o que envolve os direitos autorais. O catálogo de obras e autores de uma editora torna-se, assim, seu principal ativo, juntamente com os recursos humanos capazes de selecionar obras e autores, negociar, obter os direitos autorais e produzir os livros. Com a difusão da internet surge também no mercado editorial um novo produto, o e-book, livros digitais normalmente lidos em dispositivos destinados a esse fim. Uma das maneiras de se categorizar os livros é através do gênero, sendo o Terror uma dessas categorias e é essa, inclusive, uma das formas de segmentação do público leitor. A Darkside Books se tornou uma das editoras mais seguidas e apreciadas em um espaço relativamente curto de tempo. Fundada no dia 24 de outubro de 2012, no exato dia das bruxas, que serviu ainda mais para o contexto do próprio público alvo da empresa. Em um momento no qual o mercado editorial estava em declínio a Darkside escolheu apostar no escuro, como é dito no seu próprio manifesto. Entretanto esse escuro possui o significado também do obscuro, a empresa decidiu ser a primeira editora brasileira dedicada exclusivamente ao terror e à fantasia. Com o nicho já pré-estabelecido não precisou de muito para ela se popularizar entre os amantes desse tipo de literatura, que antes era marginalizada e muito pouco dedicada pelas editoras. A editora acertou identificando um problema existente no mercado onde outras grandes editoras nacionais não investiam. Dessa feita, ela encontra através dessa suposta falha de mercado uma oportunidade de não só ter seu próprio público cativo, como também de criá-lo. Esse processo, se consolida, acredita-se tanto na entrega da própria editora através do produto editorial, como também por meio das formas de interação nas redes sociais. Presente em quase todas as redes sociais, a Darkside possui uma presença e persona muito firme e interativa com os fãs respondendo a vários comentários e curtindo tantos outros ela vai construindo uma relação forte com os admiradores que se tornam os seus próprios promotores orgânicos.

Palavras-chave: Editorial, Consumidor, Darkside Books, Livro, Marketing.

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FOLLOW ME: A ERA DO CONSUMIDOR CONSUMÍVEL

Mariana de Paiva Araújo1

RESUMO

A relação entre humanos e suas invenções tecnológicas acaba por tornar-se perigosa. Estes são laços irreversivelmente dependentes. Seriamos capazes de sobreviver sem as máquinas? Seriamos capazes de sobreviver sem criar máquinas? Como nos tornamos consumíveis e visíveis pelos algoritmos? Essas perguntas estão entrelaçadas ao atravessamento das novas tecnologias na cultura, o que impulsiona a reorganização das relações sociais. O indivíduo desenvolve interações em formato beta dentro e fora das redes sociais digitais, ou seja, de forma experimental e líquida. Ao estudarmos as redes sociais na Internet, percorremos esse mesmo caminho, mas agora, adequando nosso cenário a um sistema composto pela comunicação mediada por computador (CMC). Aprofundando o entendimento do tema, Recuero (2009) ainda aponta que é necessário focar também no ciberespaço, em como as estruturas sociais vão sendo compostas e como as interações da comunicação mediada pelos computadores possibilitam a geração de fluxos de informações e trocas sociais que, por sua vez, impactam essa estrutura. É esta dinâmica que possibilita às redes sociais do ciberespaço definirem-se como espaços de fala reservado à troca, ao compartilhamento e atualizando a Internet quanto à interatividade. Reafirmar a identidade individual e reconhecer no outro a existência do coletivo é fundamental para essa interação, possibilitada por meio das conexões oriundas da comunicação mediada pelos computadores. Contudo, como nos relembra Bauman (2005), as conexões estabelecidas nesta modernidade líquida são efêmeras. Interage-se com os mais variados grupos, dentro e fora da Internet, mas não se busca nestas interações uma duração permanente. É possível interagir por um tempo determinado sem, contudo, estabelecer conexões firmes e duradouras. As conexões podem se dissolver a qualquer momento, respondendo aos

1 Mestre em Comunicação, Cultura e Cidadania pela Universidade Federal de Goiás (2012). Especialista em Gestão Estratégica de Marketing pela Universidade Estadual de Goiás (2009). Bacharel em Comunicação Social, habilitação Publicidade e Propaganda pela Universidade Federal de Goiás (2006).

72 interesses de seus atores. Nessas esferas as relações de consumo passam por uma transformação simbólica importante: o consumidor, posteriormente prossumidor (segundo o conceito ativo-passivo de Arlindo Machado) e agora consumidor consumível, torna-se coautor das narrativas criadas por marcas, meios de comunicação e demais consumidores pertencentes à rede. Muito além do consumidor que se torna consumível, é o prossumidor, quem está dirigindo o discurso das RSIs e por isso nosso engajamento em entender seu comportamento. O prossumidor é o sujeito da Geração Internet atravessado pelas demandas criadas pela sociedade de consumidores. Tem sobre si a necessidade não apenas de tornar-se consumível, mas de apropriar-se do ciberespaço como o seu espaço mais importante de fala. Nesse sentido, mergulhamos no processo de descoberta e construção das identidades virtuais. A pergunta a ser respondida nesse estudo é: de que forma a linguagem publicitária se tornou essencial para indivíduos se comportarem como marcas nas redes sociais digitais? Para responde-la recorreremos principalmente à etnografia digital e à análise de discurso (sob o olhar da escola francesa). Deste modo percebemos que tanto a narrativa coletiva quanto a individual presente nas redes sociais digitais são fortemente inspiradas em discursos publicitários, próprios até então, de marcas em busca de seus consumidores. Tais considerações nos permitem atualizar nossa análise sobre o consumidor atual: deixa de ser aquele que produz conteúdo em pequena, média e grande escala (o prossumidor), mas junto a esse comportamento, assume o discurso publicitário para obter relevância por meio da moeda mais valiosa de nosso tempo: a visibilidade. Colocamos em pauta o atravessamento do consumo na cibercultura. Principalmente a partir da ótica de Bauman (2008; 2005) buscamos evidenciar a relação entre a sociedade de consumidores e as novas tecnologias. As modificações oriundas dessa relação se refletem na construção da identidade do sujeito, e para compreendê-la recorremos também ao teórico Stuart Hall (1997; 2005). Segundo este autor a percepção de uma identidade plenamente completa e imutável é uma fantasia. As identidades virtuais ou identidades possíveis se apresentam ao sujeito na mesma velocidade em que a dinâmica cultural se atualiza. Portanto, quanto mais canais de virtualização, maior a multiplicidade de identidades. Os processos metodológicos são apresentados de forma discursiva, seguindo a complexidade trazida

73 pela netnografia (ou etnografia virtual) com Kozinets (1997) e as reflexões de Orlandi (2007) e a escola francesa de análise de discurso.

Palavras-chave: Consumo. Tecnologia. Narrativa. Identidade. Interação.

REFERÊNCIAS

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MACHADO, Arlindo. O sujeito na tela: modos de enunciação no cinema e no ciberespaço. São Paulo: Paulus, 2007.

ORLANDI, Eni. Análise de discurso: princípios e procedimentos. Campinas: Pontes, 2007.

RECUERO, Raquel. Redes Sociais na Internet. Porto Alegre: Sulina, 2010.

THOMPSON, John B. Mídia e modernidade: uma teoria social da mídia. Petrópolis: Vozes, 2009.

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ELAS FALAM DE SI: A EXPRESSÃO ARTÍSTICA DE MULHERES GOIANAS POR MEIO DA LITERATURA

Angelita Pereira de Lima1 Lethycia Santos Dias2

RESUMO

Elaborado como projeto experimental para Trabalho de Conclusão de Curso na graduação em Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo, Elas Falam de Si – O sentido de ser mulher, escritora e escrever sobre mulheres em perfis de escritoras goianas consiste na produção de um livro-reportagem com perfis de escritoras nascidas em Goiás que tiveram obras publicadas nos últimos 10 anos, sendo assim consideradas contemporâneas. O livro deve ser constituído de um prefácio; dos perfis, que devem constituir cada um, um capítulo; e por fim, posfácio. Além da produção do livro de perfis, que se mantém como objetivo geral, são objetivos específicos da pesquisa e de sua realização: contextualizar historicamente a literatura produzida por mulheres em Goiás, analisando características gerais; identificar escritoras goianas que atualmente publicam obras literárias; investigar as temáticas, protagonistas e voz narrativa de obras literárias produzidas por mulheres goianas; analisar o sentido da escrita e da literatura para escritoras goianas do cenário atual. O projeto perpassa questões como a desvalorização de mulheres escritoras enquanto artistas e intelectuais e a diferença de representação da mulher em personagens criadas por mulheres, em comparação às personagens criadas por homens. Espera-se atingir com este projeto uma atualização dos conhecimentos acerca da literatura produzida por mulheres em Goiás e uma compreensão da importância que a literatura pode ter para mulheres como forma de expressão artística e pessoal e registro de suas próprias existências. O referencial teórico que fundamenta Elas Falam de Si inclui discussões sobre jornalismo e literatura, a partir de análises sobre narrativas jornalísticas para chegar ao jornalismo literário e seu principal suporte, o livro-reportagem, e a uma forma de produção ligada tanto ao jornalismo literário quando ao livro-reportagem: a escrita de

1 Profª. Drª. na Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás. E-mail - |[email protected]. 2 Graduanda em Comunicação Social – Habilitação Jornalismo pela Universidade Federal de Goiás. E- mail: [email protected] 75 perfis. Também se discute a questão da mulher na literatura, em geral, bem como no Brasil e em Goiás. A pesquisa tem abordagem qualitativa e segue o método etnográfico, utilizando para coleta de dados os instrumentos mais pertinentes a ela, tais como: levantamento bibliográfico, pesquisa documental, entrevistas em profundidade e observação participante. Visto que tal pesquisa ainda se encontra em andamento, os resultados disponíveis atualmente ainda são incompletos. A pesquisadora fez um levantamento inicial de nomes de escritoras goianas e de seus livros e/ou publicações: Bruna Kunchenbecker, autora de O que os olhos não vêem, as memórias contam (romance); Bruna Martins, autora de Máquina de escrever (crônicas); Cássia Fernandes, autora de Abracadabras: crio enquanto falo (poesia) e outros títulos; Carol Oliveira, autora do conto Imersão do medo, publicado na antologia Sereias: Encantos & Perigos; Dani de Brito, autora de diversos livros infantis; Dheyne de Souza, autora de Ana & as cartas (romance em coautoria com Wilton Cardoso) e outros títulos; Keslley Cremonezi, autora dos livros O sabor da vingança (romance), entre outros títulos; Larissa Mundim, fundadora da editora Nega Lilu e autora de Sem Palavras (romance em coautoria com Valentina Prado) e outros títulos; Laurenice Noleto, autora de Flores no Quintal (memórias); e Thaise Monteiro, autora de Modus Operandi (poesia). Este levantamento leva a algumas conclusões iniciais. A primeira é de que são escassos os registros sobre a literatura produzida atualmente por mulheres em Goiás. As informações estão dispersas, quase sempre online, em meios informais como grupos e páginas no Facebook; blogs e sites das próprias autoras, matérias e entrevistas ocasionais em jornais locais, como O Popular e Diário da Manhã; ou perfis das próprias autoras e páginas de registro dos livros em sites voltados para leitores, como Skoob e Wattpad. A segunda é que os livros dessas escritoras são publicados por editoras independentes e de pequeno porte, quase sempre locais (Autografia, Kelps, Nega Lilu, Plágius, R&F) ou de forma independente, como é o caso dos livros de KeslleyCremonezi, disponibilizados de forma gratuita no site e aplicativo de escrita e leitura Wattpad, estando também um deles à venda, em formato digital, na loja online Amazon. A terceira conclusão, por fim, é de que ainda não há estudos acadêmicos sobre obras literárias publicadas por mulheres em Goiás durante o período delimitado pela

76 pesquisadora, isto é, os últimos 10 anos, o que nos leva a considerar que a pesquisa envolvida no projeto experimental Elas Falam de Si tem grande importância acadêmica.

Palavras-chave: Escritoras. Escritoras goianas. Jornalismo literário. Literatura goiana. Perfis.

REFERÊNCIAS

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DUARTE, Constância Lima. O cânone literário e a autoria feminina. Em Gênero e Ciências Humanas, p. 85, 1997. Disponível em: . Acesso em: 08 de abril de 2018

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OS SENTIDOS DO PASSADO: O USO DE FLASHBACKS NA SÉRIE DE TV ARROW

Luiz SIQUEIRA1 Goiamérico Felício Carneiro dos SANTOS2

RESUMO

O presente estudo tem por intuito a análise do uso de flashbacks na série de TV Arrow, exibida originalmente em 2012 pela emissora The CW e disponível atualmente pelo canal de streaming Netflix, baseada nos personagens da DC Comics. O protagonista da série, Oliver Queen, após cinco anos dado como morto devido ao naufrágio do Queen’s Gambit, iate em que viajava com seu pai, Robert Queen, e com a irmã de sua namorada, Sara Lance, com quem a traía, é resgatado em uma ilha ao norte da China, dotado de habilidades especiais que o permitem lutar contra criminosos. O acontecido a Oliver na ilha, durante os cinco anos em que lá esteve, é revelado aos poucos ao telespectador por meio de flashbacks que percorrem os episódios da série ao longo de suas temporadas, o que permite a construção de uma narrativa marcada pelos tempos presente e passado. Nesse sentido, o estudo tem por intuito refletir sobre o uso do passado na série de TV em questão, o que equivale a analisar a função desempenhada pelo recorrente uso de flashbacks. Posta de outra maneira, a questão norteadora do estudo é a relação que as cenas de flashback estabelecem com a narrativa em curso da série. Para tanto, por meio de uma perspectiva narratológica, à qual se ocupa das ações e atitudes dos personagens nessa série de TV, analisa-se cenas de Arrow nas quais se recorre ao passado de Oliver na ilha, em um entrelaçamento com as cenas do presente, à luz dos pressupostos teóricos de Metz (2014) e Gennette (1989) a respeito do discurso da narrativa, de Hobsbawm (2013) sobre o sentido social do passado na sociedade e de Jost (2007), Mittell (2012) e García (2016) sobre a televisão e as séries de TV. Em Arrow, a recorrência aos flashbacks que ilustram o tempo de vida

1 Mestrando em Comunicação no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da FIC/UFG. Graduado em Comunicação Social com habilitação em Publicidade e Propaganda pela UFG. E-mail: [email protected]. 2 Pós-doutor em comunicação pela Unisinos/RS (2010) e pela Universidade Nacional de Rosário/Ar (2010). Doutor em Teoria da Literatura pela PUC-Rio (2005). Mestre em Estudos da Linguagem - Teoria da Literatura pela Universidade Federal de Goiás (1999). Graduado em Letras pela Universidade Católica de Goiás (1997). Integra o PPGCOM - Programa de Pós-Graduação em Comunicação (UFG) e o PPGIDH - Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Direitos Humanos. E-mail: [email protected]. 79 em que Oliver Queen passou em e auxilia na construção de uma narrativa marcada pelos tempos presente e passado, permite que a série articule arcos narrativos longos, que são desenvolvidos ao longo de toda uma temporada ou ainda, em outras temporadas, a arcos narrativos curtos, com início, meio e fim dentro de um mesmo episódio, o que para Mittell (2012, p. 36), constrói uma estética operacional que caracteriza as narrativas televisivas da contemporaneidade. A interpolação entre os tempos passado e presente constitui, para Gennette (1989), uma anacronia que subordina uma narrativa à outra, em curso. Diante disso, neste estudo, tomando-se por base o resgate de Oliver Queen como narrativa primeira, procurou-se analisar a função desempenhada pelos flashbacks nessa série de TV. Por vezes, na narrativa da série, recorre-se ao passado para explicar a origem de alguma habilidade de Oliver, a exemplo do episódio “Vertigo”, no qual o flashback visa a explicar, interrompendo a narrativa em curso, como Oliver pode falsear uma morte através de um truque. Esse tipo de atuação do passado em relação ao presente constitui uma relação imediata e explicativa. Outro tipo de relação entre os tempos passado e presente, também de forma imediata, identificada na série por meio dos episódios “An Innocent Man” e “Seeing Red”, é a de contraposição. Nesta, os flashbacks tendem a demonstrar um aspecto mais sentimental dos personagens, revelando-os em profundidade psicológica como se observa nos episódios analisados, nos quais ressalta-se um Oliver imaturo e inseguro em contraposição ao Arqueiro que ele se tornou no presente. Em algumas situações, as habilidades adquiridas por Oliver não são explicadas de forma imediata, mas ao longo de episódios, de modo a compor um cenário, como é o fato de, no episódio piloto, o personagem conversar em Russo. A essa habilidade há um contexto que é invocado ao longo das temporadas, como o relacionamento de Oliver com a máfia russa. Nesse sentido, essa relação entre os fatos passado e o presente caracteriza-se como uma relação não imediata e conjuntiva, de modo a evidenciar o seu aspecto de composição por meio de situações narrativas que percorrem mais de um episódio na série. Dessa forma, Identificam-se em Arrow três sentidos no uso do passado em relação ao presente: o explicativo, que explica de forma imediata uma habilidade adquirida pelo personagem; o de conjunção, que requer outros flashbacks para sua compreensão e, em conjunto com estes, compõe um cenário narrativo e o de contraposição que, também de forma imediata, auxilia na construção do personagem em profundidade psicológica. Assim, ao invocar de forma fragmentada o passado não contado de Oliver, Arrow

80 parece convidar o telespectador a exercer a função de historiador, uma vez que o passado se trata, na concepção de Hobsbawm (2013), de uma memória individual, centrada em um personagem e, ao mesmo tempo, coletiva, fruto de sua relação com os demais personagens e com a cidade em que viveu, reconhecendo o sentido que ele exerce na narrativa em curso ou o sentido que pode vir a exercer, e desenvolvendo um laço com a série, que planta no passado, o futuro.

Palavras-chave: Séries de TV. Super-Heróis. Arrow. Flashbacks. Sentidos do Passado.

REFERÊNCIAS

GARCÍA; Alberto N. “A Storytelling Machine: The Complexity and Revolution of Narrative Television”, orms, Strategies and Mutations of Serial Narratives, Eds. A. Bernardelli – E. Federic – G. Between, V1.11 (2016), http://www.betweenjournal.it. Acesso em 9 ago. 2018.

GENNETTE, Gérard. Discurso da Narrativa. Trad. Fernando Cabral Martins. Lisboa: Editora Veja, 1989.

HOBSBAWM, Eric. Sobre História. Trad. Cid Knipel Moreira. São Paulo: Companhia das Letras, 2013.

JOST, François. Compreender a Televisão. Trad. Elizabeth B. Duarte, Maria Lília Dias de Castro e Vanessa Curvello. Porto Alegre: Sulina, 2007.

METZ, Christian. A Significação no cinema. Trad. Jean-Claude Bernardt. 2ª edição. São Paulo: Perspectiva, 2014.

MITTEL, Jason. Complexidade narrativa na televisão americana contemporânea. Matrizes, São Paulo, Ano 5, n.2, p. 29-52, Jan./Jun. 2012. Disponível em: < https://doi.org/10.11606/issn.1982-8160.v5i2p29-52>. Acesso em 9 ago. 2018.

Materiais Especiais

“AN INNOCENT MAN”. Arrow: Primeira temporada. Escrito por Moira Kirland e Lana Cho. Dirigido por Vince Misiano. Netflix.

“BIRDS O PREY”. Arrow: Segunda temporada. Escrito por Mark Bemesderfer e A. C. Bradley. Dirigido por John Bering. Netflix.

“LONE GUNMEN”. Arrow: Primeira temporada. Escrito por e Andrew Kreisberg. Dirigido por Guy Bee. Netflix.

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“PILOT”. Arrow: Primeira temporada. Escrito por e Marc Guggenheim. Dirigido por David Nutter. Netflix.

“SEEING RED”. Arrow: Segunda temporada. Escrito por Wendy Mericle e Beth Schwartz. Dirigido por Doug Aarniokoski. Netflix.

“STREETS O IRE”. Arrow: Segunda temporada. Escrito por Jake Coburn e Bem Sokolowski. Dirigido por Nick Copus. Netflix. “THE ODYSSEY”. Arrow: Primeira temporada. Escrito por Andrew Kreisberg e Marc Guggenheim. Dirigido por John Behring. Netflix.

“VERTIGO”. Arrow: Primeira temporada. Escrito por Wendy Mericle e Bem Sokolowski. Dirigido por Wendy Stanzler. Netflix.

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GT Identificações Culturais e Produção de Sentidos

Coordenação Ricardo Pavan e Rosana Borges AMIZADE E DESAVENÇAS: JOGADORES, SEUS PERFIS E VÍNCULOS EM MMORPG

José Abrão1

RESUMO

Este artigo trata sobre a comunicação, interação e dinâmica social entre os jogadores do jogo MMORPG The Elder Scrolls Online. Argumentamos que os jogadores não apenas desenvolvem laços sociais significativos no mundo do jogo como este relacionamento afeta diretamente a forma como o vídeo game é jogado e está envolvido, da mesma forma, nos sistemas do jogo eletrônico. Falaremos também dos perfis destes jogadores e como suas características individuais afetam esta dinâmica de jogo. Em minha dissertação de mestrado, trabalhei com a questão de como laços sociais são formados e mantidos em jogos online complexos. Em jogos deste tipo, os jogadores geralmente se reúnem em guildas ou clãs. É a comunicação e a interação entre estes jogadores que forma laços de amizade duradouros. Neste artigo vamos tratar brevemente sobre este relacionamento entre os jogadores com base em autores selecionados assim como nos dados obtidos durante a pesquisa de campo. O fator que diferencia os vídeos games de outras mídias é a sua interação com o mundo digital. O jogo precisa do input do jogador e o sistema reage conforme suas ações. Mas jogar um vídeo game vai além de apertar botões: a agência implica que as ações do jogador são significativas, afetando o cibermundo do jogo de maneira perceptiva e mesmo quantitativa. A agência é gratificante e confere ao jogador capacidade de tomar decisões e fazer escolhas (MURRAY, 2003). Sem ela, jogar não seria instigante. Como o jogo é interessante, Huizinga (2000) argumenta que o ato de jogar cria um círculo mágico, definido como uma fronteira simbólica e porosa entre o mundo do jogo e o mundo, digamos assim, “real”. Para o autor, em jogo, os jogadores criam significado pois estão engajados emocionalmente. O jogo também é uma atividade livre voluntária que traz consigo suas próprias regras: o mundo dentro das quatro linhas de uma partida de futebol é outro, em que o que vale dentro do jogo não vale para o mundo lá fora. Essas

1 Mestre em Performances Culturais pela Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Federal de Goiás. [email protected] 84 condições tornam de fato o mundo do jogo um mundo à parte, separado, e que, por sua natureza, iguala os jogadores que deixam seus status do lado de fora. Usando novamente um exemplo de futebol: em uma pelada de bairro, os jogadores deixam suas posições sociais e profissões do lado de fora para assumirem seus papéis de jogador por um período limitado de tempo. Goffman (2008) defende que as pessoas assumem papéis sociais na vida pública. O mesmo vale para os jogos: através das comunidades de jogo, as pessoas assumem estes papéis sociais através de fachadas que serão empregadas no mundo digital. Os jogadores conectados passam por este mesmo processo real em que criam laços e interagem uns com os outros. O autor argumenta que assim que entramos na presença de outro indivíduo, avaliamos e seremos avaliados a partir de um arcabouço variado de informações prévias e emitidas um pelo outro e assim o é da mesma forma nos jogos: uma avaliação entre avatares. Metodologicamente, relacionamos Goffman com o conceito de mecanismo de Elster (2003) que é uma relação causal simples que permite reconhecer, mas não prever padrões, que podem ser interpretados e nos são úteis para a interpretação dos dados obtidos durante a pesquisa de campo. Interpretando as ações dos jogadores também nos foi possível relacionar os dados com os perfis de jogadores, estipulados por Bartle (2016): conquistador, matador, socializador e explorador, que afetam diretamente a forma como o jogador interage com o mundo digital e com os demais jogadores, afetando, portanto, as dinâmicas do grupo. Começar um novo jogo estando sozinho é como chegar em uma festa em que você não conhece ninguém, e tentar jogar sozinho pode ser um grande problema a longo prazo, pois o conteúdo mais avançado requer, necessariamente, maior participação de jogadores e entrosamento entre eles. No caso de The Elder Scrolls Online, o conteúdo mais veterano são as trials, com mais de 20 jogadores participando, em que cada um tem um papel claro a ser cumprido e que requer planejamento e comunicação entre eles para obter o sucesso. Porém, as pessoas também se desentendem ou não se adaptam. Guildas com jogadores mais antigos podem formar “panelinhas”, alienando os novatos nos grupos. Sem criar estes laços, o jogador pode acabar desmotivado e saindo do game. Sendo assim, os jogadores de um clã ou guilda desenvolvem conexões emocionais que os mantém jogando.

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Desta forma, os MMORPG são, principalmente, jogos sociais. Enfim, com base no que foi apresentado, queremos argumentar que o fator social é fundamental para as dinâmicas dos jogos online em estilo MMORPG e que tais dinâmicas afetam profundamente a forma como jogo será jogado e a experiência individual de cada jogador. Da mesma forma, as características individuais do jogador, como seus interesses e personalidade, irão influenciar no modo com que ele irá interagir e será tratado pelos demais jogadores. Portanto, ficou claro para nós ao final da pesquisa que os jogadores permanecem jogando The Elder Scrolls Online por causa dos vínculos sociais criados dentro do jogo e que os próprios sistemas do jogo são dependentes destes vínculos, pois todas as suas atividades principais, incluindo aí a trial, seriam impossíveis de ser realizada sozinha e sem uma comunicação azeitada e de confiança entre os jogadores.

Palavras-chave: comunicação; mídias; vídeo games; interação; MMORPG

REFERÊNCIAS

BARTLE, Richard A. MMOs From the Inside Out: The History, Design, Fun, and Art of Massively-Multiplayer Online Role-Playing Games. Nova York, Apress, 2016.

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MURRAY, Janet H. Hamlet no Holodeck: o futuro da narrativa no ciberespaço. São Paulo: Editora Unesp, 2003.

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A CONTRIBUIÇÃO DE RAYMOND WILLIAMS PARA A OMUNI AÇÃO: UMA ANÁLISE A ARTIR DA OBRA “ ULTURA E SO IEDADE”

Diogo Carvalho Gondim Teles1 Ricardo Pavan2

RESUMO

Este artigo objetiva evidenciar a contribuição da obra de Raymond Williams, Cultura e Sociedade (2011), para o campo da comunicação. Para tanto, desenvolve-se uma revisão bibliográfica acerca das teorias da comunicação da primeira metade do século XX, destacando-se as principais características das Mass Communication Research e da Teoria Crítica frankfurtiana, e o surgimento dos Estudos Culturais Britânicos como um ponto de contraposição a estas duas correntes. Corrente teórica formalizada no ano de 1964 em torno da implantação do Centro de Estudos Culturais Contemporâneos (CCS, em inglês) da Universidade de Birmingham, os Estudos Culturais Britânicos incluem teóricos interessados na investigação das transformações ocorridas nos valores tradicionais da cultura operária da Inglaterra, sob uma perspectiva de cultura influenciada pelas relações políticas, econômicas e sociais. Três livros publicados no final dos anos 50 são considerados como fundadores dos Estudos Culturais Britânicos: The Uses ofLiteracy (1957), de Richard Hoggart; The Making of The EnglishWorking-class (1963), de E. P. Thompson; e Cultureand Society (1958), de Raymond Williams, obra destacada neste artigo. A discussão sobre a contribuição de Williams (2011) para a comunicação fundamenta-se inicialmente na definição do conceito de comunicação apresentado pelo autor, para quem a comunicação é um processo de transmissão e recepção de ideias e valores essenciais para a constituição da sociedade, ressaltando-se a capacidade do receptor de responder a esta transmissão de formas imprevisíveis e heterogêneas. Após a apresentação do conceito de comunicação do autor, traça-se um breve panorama das principais características das Mass Communication Research e da Teoria Crítica

1 Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação, na linha de pesquisa Mídia e Cultura, da Universidade Federal de Goiás. Bolsista da FAPEG (Fundo de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás). 2 Doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (2011). Docente do Programa de Pós-Graduação em Comunicação, na linha de pesquisa Mídia e Cultura, e professor adjunto no Curso de Jornalismo da Universidade Federal de Goiás.

87 frankfurtiana, além de seus pontos de divergência e confluência, para finalmente discutir os pontos onde o pensamento de Williams (2011) se contrapõe ao das duas correntes teóricas. Destaca-se a oposição do autor em relação ao modo de se analisar as pessoas como uma “massa” passiva em sua relação com os meios de comunicação. Ao apontar para a falsa existência de uma sociedade de massas, salientando o sentido ideológico do conceito, Williams (2011) relativiza a presença do indivíduo passivo e vulnerável a influência dos meios de comunicação de massa, característica pressuposta tanto pelas Mass Communication Research quanto pela Teoria Crítica frankfurtiana. Em sua crítica específica às Mass Communication Research, o autor aponta para as falhas desta corrente teórica ocasionadas por uma incapacidade de suas pesquisas em compreender toda a complexidade presente no processo comunicativo. A utilização de uma fórmula de comunicação linear, com papéis pré-definidos para o emissor e para o receptor, resulta, segundo Williams (2011), em um foco excessivo na instância da transmissão da mensagem e na busca por respostas homogêneas do receptor ao estímulo provocado pelo emissor. Opondo-se a esta visão linear de comunicação, o autor vem assim a valorizar a presença de um receptor ativo e suas diferentes maneiras de dar sentido à mensagem recebida, ressaltando que a comunicação não se resume ao processo de transmissão, sendo também composta pelos processos de recepção e resposta (WILLIAMS, 2011, p. 337). Em relação à Teoria Crítica, o autor aponta para o pessimismo dos frankfurtianos em relação às transformações culturais intensificadas na primeira metade do século XX, à medida em que critica a hierarquização entre cultura alta/baixa e reitera o erro em se analisar as pessoas como “massas”. Williams (2011) oferece subsídios para relativizar a crítica dos frankfurtianos – em especial, Adorno e Horkheimer (2002) – acerca da qualidade dos produtos da indústria cultural, ao destacar à existência de produtos midiáticos de boa qualidade disponíveis para o público, mesmo sendo desenvolvidos visando o consumo mercadológico, intenção que desestimularia, segundo os frankfurtianos citados, a emergência de uma razão crítica entre os indivíduos da “massa”. O posicionamento de Raymond Williams apresentado em Cultura e Sociedade (2011), com sua preocupação em contestar conceitualizações presentes em tradições teóricas consolidadas, apresenta determinadas afinidades entre a Teoria Crítica de

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Frankfurt e a Mass Communication Research, ao passo que expõe as divergências de sua visão acerca das transformações na sociedade ocorridas no século XX com a visão dos estudos desenvolvidos por estas duas correntes teóricas da comunicação. O autor contribui, assim, para despolarizar o campo da comunicação semeando um caminho para a relativização do conceito de massas e para a valorização da atividade humana, que serve de fundamento ao surgimento de estudos de comunicação voltados à análise mais aprofundada da instância da recepção. Desta forma, junto dos outros dois autores fundadores dos Estudos Culturais, Richard Hoggart e E. P. Thompson, Williams (2011) oferece uma abordagem teórica para os pesquisadores da comunicação que desejam entender a relação que se estabelece entre os meios de comunicação e sua audiência, a partir de uma perspectiva que reconhece a capacidade dos receptores de construírem ativamente os sentidos do que consomem como leitores, telespectadores etc. Nas décadas subsequentes à publicação de Cultura e Sociedade (2011) – de 1960 adiante – consolida-se a contribuição dos Estudos Culturais para o campo da comunicação, sendo sua perspectiva de análise prosseguida e diversificada na Inglaterra por nomes como o do antropólogo Stuart Hall (segundo diretor do Centro de Estudos Culturais Contemporâneos e estudioso das questões de identidade cultural no mundo globalizado), além influenciar no desenvolvimento dos estudos culturais de outros continentes, como os Estudos Culturais Latino-Americanos, representados por autores como Jesús-Martín Barbero e Néstor García Canclini.

Palavras-chave: Estudos Culturais. Raymond Williams. Revisão Bibliográfica. Teorias da Comunicação.

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SAÚDE E SIGNIFICAÇÕES EM UM MUNDO DISPERSO: ESTUDO DE CASO SOBRE A PRIMEIRA CAPA DE REVISTA SOBRE A PREP NO BRASIL

Roldão Alves de Barros Junior1 Rosana Maria Ribeiro Borges2

RESUMO

Em abril de 1989, Cazuza apareceu frágil e exposto na capa da principal revista semanal do país com o título: Uma vítima da aids agoniza em praça pública. As consequências da exposição estigmatizante no jornalismo voltaram a ser pauta em abril de 2018, 29 anos após o ocorrido com o cantor, com a capa da edição 1031 da revista Época, sobre a Profilaxia Pré-Exposição, a PrEP, que é uma das soluções mais novas na prevenção ao HIV no mundo, com o uso diário de uma pílula para impedir a infecção. Este estudo analisa então nas inter-relações entre o jornalismo e a saúde. Área historicamente recente, não regulada no Brasil e em constante mutação, até mesmo pelo dinamismo das práticas comunicacionais no mundo globalizado, o jornalismo tenta ajustar-se às questões de consumo enquanto descobre suas limitações éticas ao falar para e, sobretudo, com pessoas. Nesse processo desafiador, áreas sensíveis e estratégicas, como a saúde, têm no jornalismo o aliado e o vilão: divulgações bem embasadas são importantes para as estratégias de saúde pública, ao passo que comunicações com erros estruturais ou desvios de conduta podem trazer prejuízos difíceis de serem recuperados, especialmente no que concerne à produção social de sentidos. O caso estudado aqui, em que uma grande revista nacional falou sobre o início da distribuição gratuita de um medicamento estratégico para a prevenção do HIV no país, ganhou grande proporção entre médicos, pesquisadores, militantes, pessoas vivendo ou convivendo com o HIV, entidades representativas e boa parte da internet, ao

1 Bacharel em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pela Escola de Comunicação da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (2012). Foi aluno especial das disciplinas de Mídia e Cultura (2015) e Seminários de Mídia e Cultura (2018) do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected] 2 Pós-Doutoranda em Comunicação e Cultura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2018), Doutora em Geografia pelo Instituto de Estudos Socioambientais da Universidade Federal de Goiás (2013), Mestre em Educação Brasileira pela Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás (2000), Bacharel em Comunicação Social com habilitação em Radialismo pela Faculdade de Comunicação e Biblioteconomia da Universidade Federal de Goiás (1996). E-mail: [email protected] 91 ponto de a própria revista destacar a reportagem como a mais compartilhada do ano, até aquele momento. Rechaçada pelas principais fontes da matéria e até pelo Ministério da Saúde, por meio de notas de repúdio, a reportagem O novo azulzinho (THOMAS, 2018), sobre o acesso à Profilaxia Pré-Exposição no Brasil, publicada na edição 1031 da revista Época, teve também considerável volume de apoiadores. A discussão gerou, além de críticas e defesas, conteúdos informacionais como novas reportagens, entrevistas, artigos, posts e vídeos educativos, considerando pontos não abordados ou abordados de forma 'incorreta' pela revista. A observação dos argumentos utilizados por defensores e críticos, ambos embasados em dados e discursos validados, originou a inquietação fundamental para esta análise: é válida para questões de saúde a inferência de que o jornalismo pode intensificar o que é identificado por Borges (2013) como pensamento disperso? A questão resultou na escolha por desenvolver um estudo de caso, em que optou-se pela abordagem prioritariamente qualitativa, a partir de instrumentos como o levantamento bibliográfico de referências para questões comuns ao jornalismo, à saúde e à ciência; a pesquisa documental de notas de repúdio ligadas à reportagem mais polêmica, até o momento, sobre a Profilaxia Pré-Exposição no Brasil; e a análise do conteúdo a partir da categorização de expressões-chave utilizadas nas notas críticas ao trabalho do repórter, na nota de defesa publicada posteriormente pela revista e, finalmente, na reportagem publicada pela revista Época no dia 2 de abril de 2018. Com o presente estudo de caso, concluiu-se que apesar de os discursos da revista e da comunidade científica, a partir das notas analisadas, terem argumentos válidos, a incidência de expressões-chave ligada a pontos levantados pelo conjunto de notas críticas foi superior na reportagem. Para além disso, os dados, ao serem colocados de forma contextualizada e analisadas em conjunto com o discurso, revelaram equívocos sérios e confirmaram a relevância da apreensão adotada pela comunidade médica e pelo conjunto de entidades que assinam as críticas, incluindo as principais autoridades do país. Como comentaram, temiam que o produto jornalístico pudesse ser utilizado para o fortalecimento e validação de uma rede de significações negativas e de discursos estigmatizantes às populações-chave ligadas à Profilaxia Pré-Exposição no Brasil. Para além de visar contribuir para o fortalecimento dos estudos sobre o jornalismo em saúde no país refletir sobre os perigos da prática jornalística isenta de escolhas morais em

92 assuntos sensíveis, este estudo objetivou embasar a discussão sem deixar de lado o contexto atual, de intenso compartilhamento e polarização. Em meio às discussões contemporâneas sobre o papel do jornalismo para nossas sociedades e a perda de referências, cabe considerar o potencial dos estudos relacionando o pensamento disperso à prática jornalística. Ainda pouco adotado nos estudos da comunicação, conceito pode auxiliar os estudos de recepção, área em constante desenvolvimento neste século, a partir das novas realidades tecnológicas e dos novos comportamentos de comunicação da humanidade, cada vez mais alicerçados no compartilhamento e na visibilidade. As discussões possíveis a partir do conceito também contribuirão, certamente, para análises ligadas à prática profissional, aos comportamentos do público e à função social de veículos, mídias e atores nos processos comunicacionais do nosso mundo globalizado. A qualidade da informação e fatores de validação da informação a partir de suas fontes originais ou de compartilhamento, por exemplo, são alguns dos assuntos urgentes à nossa era, já que o acesso a ferramentas de publicação e compartilhamento derrubou barreiras e filtros ligados a forma como criamos e consumimos informação. Em um contexto onde é mais fácil e recorrente a localização de materiais para a validação de qualquer visão ou ponto de vista, incluindo questões mais delicadas como a saúde e os direitos humanos, vale o cuidado pela avaliação constantemente dos papeis do jornalismo, inclusive para a validação de estigmas e fortalecimento de discursos de ódio. Tais questões não puderam ser alcançadas de forma completa pelo presente estudo, como era esperado, por sua complexidade, mas são pontos que podem e devem ser fortalecidos por pesquisas e análises posteriores e relacionadas, nos campos da comunicação e da saúde.

Palavras-chave: Jornalismo. Pensamento Disperso. Saúde. HIV. PrEP.

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OLIVER QUEEN, DANIEL RAND E O JOGO DAS IDENTIDADES COMO GANHO NARRATIVO EM ARROW E IRON FIST

Luiz Siqueira1 Goiamérico Felício Carneiro dos Santos2

RESUMO

O presente estudo objetiva a uma análise das séries de TV Arrow, exibida originalmente em 2012 pela emissora The CW e disponível atualmente pelo canal de streamingNetflix, baseada nos personagens da DC Comics e Iron Fist, uma produção original da Netflix em exibição desde 2017, baseada em personagens da Marvel Comics. O protagonista, em ambas as séries de TV, reaparece em sua cidade natal, após alguns anos dado como morto, dotado de habilidades especiais que o permite lutar contra criminosos, o que evidencia assim, a construção de uma segunda identidade à qual é mantida secreta e em confronto com a anterior, a de homem comum. À essa reaparição se configura o ponto de partida deste estudo que assim, através de uma perspectiva narratológica, à qual se ocupa, logo, das ações e atitudes dos personagens nas séries em questão, tem por intuito refletir sobre o modo como se dá a construção narrativa dessas séries de TV à luz do conceito de identidade proposto por Stuart Hall (2006), das características inerentes ao meio televisivo, tomando-se por base Mittell (2012) e Jost (2007) e das considerações de Campbell (2007) e Robb (2014) a respeito de super-heróis. Em Arrow, a transformação de Oliver em Arqueiro é evidenciada e confrontada por meio de suas habilidades, que lhe permitirão cumprir a promessa realizada em memória de seu pai, e de cujas origens são reveladas através de flashbacks ao longo dos episódios. Ao recorrer às suas habilidades, Oliver é desafiado a manter em sigilo, diante dos mais próximos, sua identidade heroica e o ocorrido durante o tempo em que passou

1 Mestrando em Comunicação no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da FIC/UFG. Graduado em Comunicação Social com habilitação em Publicidade e Propaganda pela UFG. E-mail: [email protected]. 2 Pós-doutor em comunicação pela Unisinos/RS (2010) e pela Universidade Nacional de Rosário/Ar (2010). Doutor em Teoria da Literatura pela PUC-Rio (2005). Mestre em Estudos da Linguagem - Teoria da Literatura pela Universidade Federal de Goiás (1999). Graduado em Letras pela Universidade Católica de Goiás (1997). Integra o PPGCOM - Programa de Pós-Graduação em Comunicação (UFG) e o PPGIDH - Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Direitos Humanos. E-mail: [email protected]. 96 na ilha em que, por meio de flashbacks, se mostra inseguro e indefeso, em divergência com o Arqueiro que, a cada episódio, risca um nome escrito em um caderno ao eliminar um dos responsáveis pela corrupção em sua cidade. A oscilação entre herdeiro da Corporação Queen e justiceiro pelo bem de Starling City por vezes entra em conflito, o que cabe ao personagem decidir a cada momento, qual identidade prevalecerá. Ao salvar Malcolm tanto na primeira temporada, em “DeadtoRights”, quanto em “The Magician”, na terceira, a identidade do herdeiro da Corporação Queen prevalece em detrimento à do Arqueiro. Em ambos os casos, Oliver prioriza, em momentos específicos, suas relações afetivas ao invés de atuar como o vigilante justiceiro e punir Malcolm. Em Iron Fist, a questão identitária já é um conflito desde os primeiros episódios, uma vez que Danny Rand precisa provar sua identidade como herdeiro dos Empreendimentos Rand,desacreditado de ser quem é ao aparecer descalço e com roupas sujas para seus amigos de infância Joy e Ward Meachum, que agora controlam a empresa. Além de ser o herdeiro dos Rand, Danny também diz ser outro, o Punho de Ferro, resultado de seu tempo em K’un-Lun no qual, assim como detalhes do acidente aéreo, é revelado apenas em pequenos flashbacks ao longo dos episódios, conforme o personagem se recorda ou tenta meditar. Embora responda a seu médico ser ambos, Danny Rand e o Punho de Ferro, em determinadas situações, sobressai-se um ao outro, também ilustrando o jogo de identidades de Hall (2006). Nesse sentido que, a exemplo do que ocorre em Arrow, a oscilação entre as duas identidades, quando diante de um conflito, também requer do personagem a decisão de qual prevalecerá. Embora ainda em sua primeira temporada, os desdobramentos das hesitações de Danny em agir como o Punho de Ferro, a exemplo de em “Bar the Big Boss”, permitindo que Bakuto, seu rival mítico, sobreviva, se fazem notáveis ao fim da temporada, na conversa que Davos tem com Joy, dizendo-lhe que Danny deve ser morto, transformando-se assim, de amigo a potencial inimigo e quando Danny encontra próximo aos portões de K’un-lun, local que deveria proteger, homens de seu rival. Nesse sentido, nota-se que, em ambas as séries, seus protagonistas heroicos ilustram o jogo de identidades de Hall (2006), no qual se adota posições-de-sujeito diante de determinadas situações. Como narrativas seriadas, às quais, enquanto produto televisivo, têm por intuito estabelecer uma relação com o telespectador, porJost (2007),

97 a oscilação entre as posições resulta em um ganho narrativo que interessa às séries de TV: o adiamento do esperado conflito entre os super-heróis e seus rivais. Palavras-chave: Séries de TV. Arrow. Iron Fist. Super-heróis. Identidade.

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“BAR THE BIG BOSS”. Iron Fist: Primeira temporada. Escrito por Scott Reynolds. Dirigido por Andy Goddard. Netflix.

“DEAD TO RIGHTS”. Arrow: Primeira temporada. Escrito por GeoffJohns. Dirigido por GlenWinter. Netflix.

“IMMORTAL EMERGES ROM CAVE”. Iron Fist: Primeira temporada. Escrito por DwainWorrell. Dirigido por RZA. Netflix.

“LONE GUNMEN”. Arrow: Primeira temporada. Escrito por Marc Guggenheim e Andrew Kreisberg. Dirigido por Guy Bee. Netflix.

“PILOT”. Arrow: Primeira temporada. Escrito por Greg Berlanti e Marc Guggenheim. Dirigido por David Nutter. Netflix.

“ROLLING THUNDER CANNON PUNCH”. Iron Fist: Primeira temporada. Escrito por Scott Buck. Dirigido por Tom Shankland. Netflix.

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“SACRI ICE”. Arrow: Primeira temporada. Escrito por Marc Guggenheim e Andrew Kreisberg. Dirigido por David Barrett. Netflix. “SHADOW HAWK TAKES LIGHT”. Iron Fist: Primeira temporada. Escrito por Scott Buck. Dirigido por John Dahl. Netflix.

“SNOW GIVES WAY”. Iron Fist: Primeira temporada. Escrito por Scott Buck. Dirigido por Tom Shankland. Netflix.

“THE BRAVE AND THE BOLD”. Arrow: Terceira temporada. Escrito por Marc Guggenheim e GrainneGodfree. Dirigido por Jesse Warn. Netflix.

“THE CLIMB”. Arrow: Terceira temporada. Escrito por JakeCoburn e Keto Shimizu. Dirigido por Thor Freudenthal. Netflix.

“THE MAGICIAN”. Arrow: Terceira temporada. Escrito por Marc Guggenheim e Wendy Mericle. Dirigido por John Behring. Netflix.

“THE O ER”. Arrow: Terceira temporada. Escrito por Beth Schwartz e Brian Fors Sullivan. Dirigido por DermottDowns. Netflix.

“VERTIGO”. Arrow: Primeira temporada. Escrito por Wendy Mericle e Bem Sokolowski. Dirigido por Wendy Stanzler. Netflix.

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SUPER- HERÓIS COMO FENÔMENO DA CULTURA MIDIÁTICA: EM BUSCA DE SENTIDO NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA

Rosana Maria Ribeiro Borges1 Bruno André Cardoso Von Hauer2

RESUMO

Atualmente aumentou o número de pesquisas acadêmicas em torno do tema super-heróis. O contexto atual, portanto, é de ampliação de novas formas de produção e consumo audiovisual através da cultura midiática. Neste artigo por meio de uma pesquisa documental e bibliográfica, vamos analisar a existência de uma cultura heroica vinculada à popularidade do gênero super-heróis que vem sofrendo adaptações desde à sua origem nos quadrinhos, passando pela tv, cinema e jogos eletrônicos. O objetivo é analisar o sentido da permanência dos super-heróis enquanto produto midiático na sociedade contemporânea. Os super-heróis praticamente são conhecidos em todas as partes do mundo; são admirados, sobretudo, por sua coragem para enfrentar o mal, os dominantes e os poderosos. O heroísmo é um fato profundamente enraizado na psique humana, no imaginário e no senso moral popular. Atributos heroicos como coragem, dignidade e altruísmo, inspiram modelos e exemplos em diversos povos e diferentes culturas, constituindo assim figuras arquetípicas. O herói é uma representação mítica / arquetípica que reúne em si os atributos necessários para superar de forma surpreendente um determinado problema de dimensão catastrófica e épica. Situações de guerra, de conflito e de competição são cenários comuns para feitos considerados heroicos. O mito é uma narrativa tradicional com caráter explicativo ou simbólico, relacionado com o contexto cultural em que é produzido, procurando explicar os principais acontecimentos da vida, os fenômenos naturais, as origens do mundo e do homem por meio de deuses e heróis, que agem como símbolos de arquétipos, oriundos da psique humana. Como produto da cultura midiática, a figura do super-herói originada desde a década de 1930 surge como uma das mais relevantes representações da cultura

1 Doutora e Professora da Universidade Federal de Goiás / Faculdade de Comunicação e Informação UFG / FIC, e-mail: [email protected] 2 Mestrando do Programa de Pós-graduação em Comunicação pela Universidade Federal de Goiás – UFG FIC, e-mail: [email protected] 100 pop, sendo por isso constantemente readaptada e reapresentada nas mais variadas mídias (quadrinhos, tv, cinema e jogos eletrônicos), tornando-se assim alvo de pesquisas nas principais grandes áreas do conhecimento humano como filosofia, sociologia, antropologia, psicologia e comunicação. Em relação aos termos “pop” e “cultura pop”, estamos nos referindo ao que Kellner denomina de “cultura da mídia”, isto é, manifestações culturais produzidas e distribuídas de forma massiva através de meios de comunicação. Portanto, esse artigo poderá acrescentar conhecimento sobre o sentido do consumo da narrativa heroica dos super-heróis dentro da indústria do entretenimento representados pela cultura midiática.

Palavras-chave: Super-herói. Cultura Midiática. Mito. Busca de Sentido.

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MÍDIA, CULTURA E TECNOLOGIA: O CORPO PLUGADO E A IMERSÃO

Bruna Rafaella Almeida da Costa1 Rosana Maria Ribeiro Borges2

RESUMO

Propõe-se traçar uma proposta de abordagem do corpo humano na Realidade Virtual (RV) a partir da leitura cultural que a sociedade se encontra. Para isso, realiza-se a contextualização sobre cultura e seu cruzamento com as tecnologias que tem seu desenrolar com a convergência das mídias propondo novos experimentos. A Realidade Virtual (RV) é uma realidade “que é aceita como verdadeira, embora não necessariamente exista fisicamente e em termos computacionais, é considerada a forma mais avançada de interface com o computador” (REDEL; HOUNSEL, 2004 p.02). Um sistema de RV pode ser resumido através de três características principais: imersão, interação e envolvimento. Essa nova relação proporcionada por este espaço revela uma nova forma de se trabalhar as percepções sensoriais do corpo humano. Dentre os avanços tecnológicos essa base teórica servirá para entender o Áudio 3D na web. Essa experiência proporciona a sensação de realismo através da percepção sonora no ambiente virtual. O contexto é voltado para a situação real e virtual do corpo em meio a esta nova era. Apoiando-se no trabalho de Santaella (2003) explora-se o Corpo Biocibernético que é o cruzamento do ser humano com a máquina. Entende-se que a mídia é a extensão do corpo neste novo viés cultural que tem o ciberespaço como locus de atuação. Busca- se compreender de que forma o Áudio 3D se torna extensão do corpo a partir do ciberespaço e assim poder explorar essa tecnologia de forma a entender as funções que pode exercer para e através do corpo humano. Pode-se localizar o Áudio 3D, como o próprio “produto midiático”, sendo assim esse Áudio é considerado cognitivo e que amplia as percepções da comunicação do ser humano com a máquina. O que ajuda a entender essa mídia como meio, nesse caso, um meio como extensão do corpo, é um

1 Mestranda do Programa de Pós Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Goiás. Bacharel em Comunicação Social- Rádio e TV pela Universidade Federal do Maranhão. e-mail: [email protected]. 2 Orientadora do trabalho. Professora Doutora do Programa de Pós Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Goiás na Faculdade de Comunicação e Informação, e-mail: [email protected]

102 estudo que McLuhan explora e Martino (2009) destaca em três proposições: O meio é a mensagem; Os meios como extensões do homem ; Meios quentes e meios frios. Para Santos (2014, p.05) as tecnologias de gravação, como o Áudio 3D, realizam um “registro diretamente dos fluxos do real, sem precisar passar por qualquer tipo de processo humano, funcionando assim independente de ações de captura do corpo.” Dessa forma as máquinas estariam registrando o campo real das coisas e indo além do que os seres humanos seriam capazes de captar desenvolvendo dessa forma a expansão do sensível, tanto para os humanos quanto para as máquinas. Interessa a partir da sistematização de Santaella (2003) investigar o Corpo Plugado, pois nesse espaço entende-se que a troca de informação e conhecimento está mais ligada com a inovação tecnológica que se nomeia para este entendimento, o Áudio Imersivo, que proporciona a sensação de realismo através da percepção sonora no ambiente virtual que tem como recurso obrigatório o uso de fone de ouvido, ou seja, o corpo será plugado na máquina através desse elemento. O Áudio 3D dentro deste aspecto pode ser caracterizado como uma tecnologia própria a ser desenvolvida dentro da realidade do corpo plugado. A partir do momento que o Áudio é trabalhado evidenciando o seu objetivo que é proporcionar a sensação de imersão ao usuário, este exclui os estímulos que surgem do mundo exterior e passa a interagir somente no ciberespaço, que como vimos é característica dessa modalidade. Com base nesta visão de que a mídia é a extensão do corpo acredita-se que “o ser humano já está imerso em uma era pós-biológica, pós- humana”. (SANTAELLA, 2003, p.182). Além disso, é possível observar que as tecnologias e os novos meios são os maiores transformadores do mundo social. Ao situar as mudanças que ocorrem através da Cibercultura potencializam-se os tipos de experiências que podem ser desenvolvidas a partir desse espaço. A imersão proporcionada dentro deste ambiente através do Áudio 3D é capaz de remodelar o corpo o que fundamenta a mobilização do ser humano para este espaço.

Palavras-chave: Realidade Virtual; Corpo Biocibernético; Áudio 3D.

REFERÊNCIAS

MARTINO, Luiz C.; FRANÇA, Vera Veiga. Teorias da Comunicação: conceitos, escolas e tendências. 8. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 2008.

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REDEL, R; HOUNSELL, M. da S. Implementação de Simuladores de Robôs com o Uso da Tecnologia de Realidade Virtual. Anais do IV Congresso Brasileiro de Computação – CBComp 2004. Disponível em: http://www.niee.ufrgs.br/eventos/CBCOMP/2004/pdf/Robotica/t170100201_3.pdf. Acesso em: 05 de janeiro de 2018

SANTAELLA, Lucia. Cultura e artes do pós-humano: da cultura das mídias à cibercultura. São Paulo. Paulus. 2003.

SANTOS. Luiza. Ensaio sobre a leitura digital como relação humano-máquina: uma proposta de abordagem a partir das materialidades da comunicação. Anais do XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. São Paulo. 2016. Disponível em: http://portalintercom.org.br/anais/nacional2016/resumos/R11-0863-1.pdf Acesso em: 27 de dezembro de 2017.

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O ESPAÇO FÍLMICO COMO ELEMENTO DE MEDIAÇÃO COMUNICACIONAL E PRODUÇÃO DE SENTIDO: UMA ANÁLISE DE PENDULAR

Thiago da Silva Rabelo1 Rosana Maria Ribeiro Borges2

RESUMO

O tema do artigo é o uso do cinema como prisma para se pensar a pesquisa em Comunicação. Nesse sentido, o presente trabalho teve como objetivo investigar a concepção do espaço fílmico visto no longa-metragem de ficção Pendular (2017), tendo como base, para isso, o pressuposto de que a forma cinematográfica atua enquanto elemento de mediação comunicacional e produção de sentido. Através dela, entendemos que cineastas são capazes não apenas de estabelecer e influenciar interações mantidas entre personagens, sejam eles ficcionais ou não, mas também de elucidar significações comunicacionais específicas a partir do uso que fazem da imagem e do som. No filme, acompanhamos a trajetória de um casal de artistas anônimos a partir do momento em que decidem morar juntos. Para isso, ambos concordam em alugar um galpão e, também, em dividi-lo ao meio com uma fita adesiva, no intuito de delimitar espaços de trabalho que os dois possam utilizar no dia a dia. Aos poucos, no entanto, a divisão motiva tensões responsáveis por separá-los, sobretudo a partir do que elas revelam sobre como os protagonistas lidam com suas respectivas subjetividades. De abordagem qualitativa, o estudo utilizou levantamento bibliográfico e análise fílmica como instrumentos metodológicos. Nesse sentido, realizamos, a partir dos estudos de Santos (2004), Sodré (2006) e Marcondes Filho (2013), uma revisão a respeito do conceito de espaço enquanto elemento afetivo na Comunicação. Também buscamos em Merleau-Ponty (1999) definições sobre subjetividade que pudessem contribuir com o debate acerca da trama desenvolvida pelo filme. Em seguida, decompomos e segmentamos o longa-metragem Pendular a partir dos parâmetros estabelecidos por Bordwell, Thompson e Smith (2017) para pesquisas interessadas por fenômenos específicos do cinema, ao passo que o recorte proposto levou em conta a

1 Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação – PPGCOM da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected] 2 Pós-Doutoranda em Comunicação e Cultura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e professora do Programa de Pós-Graduação em Comunicação - PPGCOM da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected] 105 relação mantida entre corpos e espaços no projeto. Ao longo do processo de decomposição fílmica, nos ancoramos em três cenários de estudo. O primeiro diz respeito à relação que Ele mantém com o galpão alugado; o segundo, à relação que Ela estabelece com o mesmo espaço; por fim, buscamos exemplos de cenas e sequências nas quais ambos os personagens interagem entre si e com o local, simultaneamente. Na etapa final, analisamos a coleta à luz do arcabouço teórico levantado. Em termos de resultado, a análise demonstrou que o espaço fílmico em Pendular, quando estudado a partir das teorias interessadas pela influência do sensível na comunicação, atua como mediador comunicacional e produtor de sentido. Dessa forma, observamos no filme toda uma dinâmica de corpos e territórios que revela, expõe, partilha e faz agir, ou seja, que comunica. Em meio a ela, o conceito de atrito comunicacional proposto por Marcondes Filhos (2013) se destacou, contribuindo para a refutação de que o relacionamento dos protagonistas é pautado pela incomunicabilidade, ideia proferida pela imprensa na época de lançamento da obra. A análise mostrou que é a partir das tensões geradas pela divisão cartesiana do espaço, entendidas aqui como elementos essenciais da comunicação, que os personagens se transformam, descobrindo nuances afetivas que não sabiam possuir e que se mantinham veladas pela rotina. Dessa forma, consideramos que pensar a Comunicação a partir do filme de Júlia Murat realçou a importância dos afetos para o campo de estudos em questão. Elementos historicamente ignorados pelo pensamento da área, são eles que estabelecem os dois sistemas de subjetividades responsáveis por constituir o cerne dramático do projeto. Justamente por isso, a experiência de analisá-lo pode ser encarada como um sinal de que a dinâmica comunicacional não se baseia, em sua essência, na busca por um consenso, por alguma forma de concordância entre as partes que a compõem. Consideramos, nesse sentido, que os protagonistas do filme, no intuito de evoluírem enquanto indivíduos, precisam dos atritos motivados pela já citada dinâmica de corpos e espaços, tendo em vista as diversas camadas de dominação e sujeição presentes na maneira que lidam um com a outra. É por isso que consideramos a forma fílmica como prisma para se pensar a pesquisa em Comunicação. Sua capacidade de mostrar o invisível, amparada pelos instrumentos próprios da criação fílmica (mise-en- scène, montagem, fotografia, entre outros), permite ao(à) pesquisador(a) refletir sobre elementos que podem não ser considerados como deveriam no que diz respeito a uma

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área de estudos como aquela que nos serve de contexto. Em suma, Pendular nos permitiu vislumbrar outras possibilidades de investigação voltada aos afetos no campo comunicacional, principalmente por fazer de sua forma argumentos capazes de ressaltar a pertinência deste tipo de pesquisa.

Palavras-chave: Cinema. Comunicação. Forma. Pendular. Análise.

REFERÊNCIAS

PENDULAR. Direção: Júlia Murat. Produção: Tatiana Leite e Júlia Murat. Brasil; Argentina; França. Vitrine Filmes, 2017. Inspirado na performance The Other: Rest Energy(1980), de Marina Abramóvic e Ulay. Streaming (Net Now).

BORDWELL, David; THOMPSON, Kristin; SMITH, Jeff. Film art: an introduction. Wisconsin, Estados Unidos. Editora: University of Wisconsin, 2017.

MARCONDES FILHO, Ciro. O rosto e a máquina: O fenômeno da comunicação visto pelos ângulos humano, medial e tecnológico – nova teoria da comunicação. São Paulo: Editora Paulus, 2013.

MERLEAU-PONTY, Maurice. Fenomenologia da percepção. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2004.

SODRÉ, Muniz. As estratégias do sensível. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2006.

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GARI: HERÓIS DA RUA

Aline Goulart Soares1 Angelita Pereira de Lima2

RESUMO

A rua está inundada de personagens. Prédios, casas, calçadas, trânsito, animais e pessoas transbordam histórias, e transformam a cidade de Goiânia. Entre avenidas de propaganda, botecos de esquina e árvores do cerrado, elos são construídos com trabalhadores. Um olhar mais atento, e mais duradouro, enxerga uma silhueta com roupa laranja, um carrinho e uma vassoura tirando o lixo do chão. Aquele é o Gari, trabalhador da limpeza urbana, objeto de estudo deste trabalho de conclusão de curso (TCC). O trabalhador da limpeza urbana de Goiânia é um ser social, pois interage com outros seres humanos e ocupa o mesmo espaço. A Companhia de Urbanização de Goiânia é uma das empresas mais presentes no dia a dia dos moradores, por executar ações que interferem diretamente na qualidade de vida, e na sustentabilidade de Goiânia. A Comurg é responsável pela limpeza, jardinagem, coleta de lixo, iluminação pública, construção e manutenção de praças. O principal objetivo do trabalho é identificar o processo de formação de similaridade do trabalhador com a cidade de Goiânia ao longo da história. E percorrer, por anos, ruas, trabalho e histórias. A fim de compreender a transformação da cidade e das pessoas. Como se deu a migração interna na vida dessas pessoas? Como é sua relação com a vida de gari? O que essas pessoas têm para contar? Como foi vê as transformações da cidade para estes trabalhadores? Investigar o dia a dia do trabalhador de limpeza urbana, e descrever a rotina de trabalho do gari, se faz necessário para entender seu olhar no mundo. O gari é o trabalhador central da realidade urbana, da vida cotidiana e das diferentes interações dos sujeitos na cidade. Inúmeras são as mediações do gari, ele participa da transformação da

1 Estudante do curso de Comunicação Social – Jornalismo da Universidade Federal de Goiás. e-mail: [email protected]/ [email protected]. 2 Orientadora do trabalho. Professora Doutora do Programa de Pós Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Goiás na Faculdade de Comunicação e Informação, e-mail: [email protected]

108 realidade urbana, compartilha conhecimento na relação social, interpreta, ele mesmo, os monumentos de Goiânia e sua história. Para fazer este trabalho, contamos com cinco personagens; alguns ainda trabalham na profissão, outros estão aposentados. Por meio de entrevistas, imersão na vida; na casa e no trabalho dessas pessoas, contamos a história de Goiânia através desses olhares. Na pesquisa bibliográfica, levantamos estudos sobre a história de Goiânia, constituída por meio de palavras, concreto e memória. No livro de Márcia Metran de Mello “Goiânia, cidade de pedras e das palavras”, a história de Goiânia é desenhada pelo imaginário urbano. Partindo dessa premissa, o cotidiano do gari e suas próprias apreensões da realidade, se convergem com as transformações da cidade. A partir do seu cotidiano, o trabalhador vivencia relações sociais no espaço- tempo, e cria situações que caracteriza seu modo de vida e trabalho, ou seja, aquilo que o trabalhador faz é parte daquilo que ele é. Pela vivência, o sujeito aprende os hábitos e valores das pessoas ao redor. Investigar o cotidiano do gari é um trabalho de campo, por isso, a metodologia usada é a observação participante com entrevistas aprofundadas com os personagens do livro. Para José de Souza Martins, a vida cotidiana tornou-se uma nova esperança da sociedade. E a esperança de ver, e tornar-se testemunha da realidade, conduz o gari na condição de sujeito transformador do mundo. Portanto, essas histórias precisam ser narradas. Ademais, jornalismo e literatura são uma confluência das maneiras de narrar, duas vertentes capazes de compartilhar estruturas, como também desenvolver gêneros artísticos e literários. Para escrever um livro-reportagem, foi preciso buscar referências em autores de jornalismo literário. Os autores escolhidos foram Sergio Villas Boas com o livro “Perfis, como escrevê-los” e Edvaldo Pereira Lima com o livro “O que é jornalismo literário” e o livro “A jornada do herói” de oseph Campbell. Os perfis literários, cumprem um papel importante de referenciação humana. Um perfil é capaz de gerar empatia quando compreendemos a experiência do outro. Além disso, conhecer pontos de vista diferentes nos ajuda a aprender sobre o mundo. As trajetórias dos garis são narradas de forma a conhecer a empresa, e a evolução de todas as estruturas que, todavia narram o dia a dia da cidade. É preciso transmitir às próximas gerações a História dos trabalhadores da limpeza de Goiânia e, bem como, motivar outros pesquisadores a estudar a classe dos coletores, varredores, jardineiros, pedreiros e todos que trabalham para cidade, compartilhando suas

109 experiências, e o sentido do seu dia a dia e do trabalho. Essa narrativa do cotidiano do gari, faz parte da memória da cidade, e da memória do próprio trabalhador, em uma tentativa de compreender a sua realidade, e dar sentidos à sua vida.

Palavras-chave: jornalismo literário, jornada do herói, gari, Goiânia.

REFERÊNCIAS

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LEFEBVRE, Henri. A revolução urbana. Tradução de Sérgio Martins. Belo Horizonte: Ed UFMG, 1999.

LIMA, Edvaldo Pereira. O que é livro-reportagem. São Paulo: Brasiliense, 1998.

MARTINS, José de Souza. A sociabilidade do homem simples: cotidiano e história na modernidade anômala. São Paulo: Hucitec, 2000.

MELLO, Márcia Metran. Goiânia: cidade de pedras e de palavras. Goiânia: UFG, 2006.

CAMPBELL, Joseph. O herói de mil faces. 10. ed. São Paulo: Cultrix/Pensamento, 2005.

VILAS BOAS, Sérgio. Perfis: e como escrevê-los. São Paulo: Summus, 2003.

Portal da Companhia de Urbanização de Goiânia (COMURG) http://www.comurg.com.br/. Acesso em 14/08/2018.

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GT Corpo, Gênero e Subjetividades

Coordenação Suely Henrique de Aquino Gomes, Luciene Dias e Deyvisson Costa ABUSOS E SUPERAÇÕES: PERFIS DE MULHERES QUE SOFRERAM COM RELACIONAMENTOS ABUSIVOS

Letícia Assis Michalczyk Rocha 1 Angelita Pereira de Lima 2

RESUMO

A construção de perfis jornalísticos de mulheres que sofreram com relacionamentos abusivos é fruto de uma experimentação literária de pesquisa jornalística inserida no contexto dos estudos de violência contra a mulher. O projeto surgiu a partir da elaboração de uma reportagem sobre relacionamentos abusivos, realizada como produção de uma disciplina do curso de Comunicação Social da Faculdade de Informação e Comunicação, que alertou a insuficiência de estudos e espaços de discussão sobre o tema, apontando para a necessidade da elaboração de trabalhos mais extensos e profundos. O objetivo do presente trabalho é aumentar o campo de discussão nos estudos de gênero, oferecendo a compreensão da realidade das vítimas de relações abusivas e de seus processos de superação da violência sofrida, ligando suas histórias à conjuntura nacional. O trabalho, realizado com técnicas do Jornalismo Literário, expressa um olhar diferenciado sobre as estatísticas já estabelecidas por trabalhar a comunicação e conjunto com a literatura, o que aproxima a interpretação do leitor ao cenário da realidade das vítimas por se inserir diretamente em suas histórias, desmistificando a agressão em relacionamentos e auxiliando na compreensão da ocorrência cotidiana de abusos em relações, incentivando a busca e a análise das raízes desse problema. Além disso, a imersão nessas histórias expande a atmosfera de discussão e compreensão da problemática, o que enriquece a literatura a respeito do tema. Apesar dos estudos de violência e gênero compreenderem que o abuso acontece nas mais variadas formas de relações, a pesquisa abordou mulheres pertencentes a grupos específicos, com relatos de relacionamentos amorosos heterossexuais, para analisar as raízes patriarcais como suporte de comportamentos agressivos dos homens contra suas

1 Graduanda em Comunicação Social – Bacharelado em Jornalismo pela Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected] 2 Profª. Drª. na Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás [email protected]

112 companheiras. As fontes foram selecionadas com critérios que atendessem à diversidade e interseccionalidade seguindo o pressuposto de que o abuso ocorre em todas as camadas sociais. Todas as mulheres entrevistadas saíram da relação violenta há, no mínimo, seis meses e passaram por um processo de superação da situação, por isso, se sentem à vontade para publicizar suas histórias. O trabalho foi realizado em três etapas principais: com o estudo do contexto social e teórico do tema e da forma de abordagem escolhida, com a aplicação de questionários fechados para a coleta de dados principais a respeito das vítimas que se dispuseram a participar da pesquisa e com as entrevistas de profundidade, realizadas em forma de conversa e guiadas a partir de um roteiro, para a elaboração dos perfis. Os perfis literários abordam a violência sofrida e a experiência das mulheres em seus processos de ruptura e superação. Para a escolha do método de abordagem, foi realizado um estudo do referencial teórico jornalístico que compreende a ideia de que o jornalismo se insere nos contextos de violência de gênero como um espectro comunicacional da sociedade, o que expressa necessidade de estudo e discussão acerca do papel desempenhado pelos jornalistas ao trabalharem com um tema tão delicado, porém, tão corriqueiro. Por isso, os estudos da conexão entre jornalismo e literatura abriram caminho para uma conexão que possibilita novas formas de escrita e novos olhares, apresentando alternativas para o jornalista que procura diferentes formas de desempenho da profissão. O trabalho está baseado no referencial teórico do jornalismo narrativo e literário e, com auxílio das abordagens em estudos de gênero que contextualizam a violência contra a mulher, os estudos para a elaboração do livro reportagem foram conduzidos de forma a compreender os contextos históricos da violência e seu percurso alinhado ao gênero e à estruturação da sociedade patriarcal. Coma pesquisa, foi possível compreender que algumas mulheres, em situações sociais privilegiadas, como a de classe e raça, têm maior abertura para falar sobre o tema em suas vidas. Entretanto, todas as entrevistadas, independente do grupo social no qual se inserem, acreditam na publicização dos relatos de relacionamentos abusivos como forma de combate ao problema e querem auxiliar no crescimento do espaço de debate sobre o tema. O livro-reportagem de perfis de mulheres que sofreram com relacionamentos abusivos abrange as técnicas jornalísticas estudadas e oferece novos olhares sobre a discussão acerca do tema, o que enriquece a bibliografia desta luta

113 enquanto mecanismo de conhecimento, aprofundamento do tema e, possivelmente, fonte para debates. Ainda, auxiliando na valorização da realidade apresentada nos relatos e compreensão da condição feminina no Brasil e, especificamente, a condição das mulheres brasileiras em relacionamentos amorosos.

Palavras-chave: Relacionamentos. Abuso. Violência. Gênero. Patriarcado.

REFERÊNCIAS

BEAUVOIR, Simone de. O Segundo Sexo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980.

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LIMA, Angelita Pereira. A notícia de violência contra a mulher e a violência da notícia. FUNAPE. Goiânia, GO. 2001.

MICHALCZYK, Letícia. Abusos Silenciosos. Lilithiando, 2016. Disponível em: . Acesso em: 26 abr. 2018.

NICOLATO, Roberto. Jornalismo e Literatura: aproximações e fronteiras. Intercom, 2006. Disponível em: . Acesso em: 26 abr. 2018.

OLIVEIRA, Priscila Natividade Dias Santos. Jornalismo Literário: como o livro- reportagem transforma um fato em história. Intercom, 2006. Disponível em: . Acesso em: 26 abr. 2018.

SAFFIOTI, Heleieth. Gênero, Patriarcado e Violência. São Paulo: Expressão Popular: Fundação Perseu Abramo, 2015.

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ESCREVENDO UTOPIAS MENORES

Mayllon Lyggon de Sousa Oliveira1 Suely Henrique de Aquino Gomes2 Deyvisson Pereira da Costa3

RESUMO

Concebe-se a sexualidade como um dispositivo construído social e culturalmente cujo objetivo principal seria a instauração de uma ordem específica (FOUCAULT, 1998), ou seja, um conglomerado de discursos construídos por meio da biologia, ciências sociais, igreja e várias outras instituições e/ou construções de poder/saber cujo objetivo é criar em torno dos sujeitos formas de controle por meio da sexualidade. E, considerando o queer como um movimento e uma forma de pensar a vida que vê que as identidades não são mais processos satisfatórios para a determinação das características e das formas de expressão da sexualidade (LOURO, 1999), o trabalho pretende entender as formas subjetivas e subjetivantes por meio das quais os sujeitos queers transformam seu corpo, através do cuidado de si e para a construção estética de sua existência inaugurando outros lugares, espaços outros, uma sobreposição e sobredeterminação dos espaços presentes para além daqueles espaços determinados pelas relações de saber-poder instituídas através das instituições e dispositivos. Compreende-se esses espaços emergentes como heterotopias, ou seja, utopias plenamente realizadas (FOUCAULT, 2013). Nesse processo, o trabalho entende o corpo queer como uma sobreposição das características e das convenções de gênero, mas que nem por isso é generificado, mas antes, um corpo vibrátil e inserido, tal como o texto, em uma construção cultural e cuja “arquitetura é política” (PRECIADO, 2014). Nesses lugares utópicos instituídos e invocados pelos dispositivos para os corpos, alguns sujeitos, através de uma escrita de si, menor, instauram distopias que embaralham os discursos, bagunçam as formas de saber, mudam as normas e, mais que isso, determinam uma nova perspectiva, não mais utópica ou distópica, mas heterotópica de ser. Através desse relatar a si mesmo (BUTLER, 2015) esses sujeitos de

1 Mestre em Comunicação. Professor substituto no curso de Relações Públicas da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected] 2 Doutora em Ciências da Informação. Professora Titular da Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected] 3 Doutor em Comunicação. Professor na Universidade Federal de Mato. E-mail: [email protected] 115 vidas precárias (BUTLER, 2011) estabelecem uma crítica da violência ética. E é aí, somente aí, que eles são capazes de reverter a ordem das coisas estabelecendo novas formas de não conformação do seu corpo, ante a invocação performativa de uma heterossexualidade compulsória do meio em que estão imersos (BUTLER, 2003). Esses corpos subjetivantes e subjetivados questionam o dispositivo da sexualidade e toda a sua heteronormatividade. Afinal, é contra as formas de saber, os tipos de normatividade e as subjetivações que esses corpos-sujeitos colocam em suspeição. Em outas palavras, é contra a tríplice saber-poder-sujeito – relações que estruturam o dispositivo da sexualidade – que define o dispositivo da sexualidade que esses sujeitos se colocam. Dessa feita, é preciso estar atento à composição do dispositivo, ao que eles – como sujeitos – singularizam, fazendo-o ao instaurar um novo espaço, diferente daquele previsto para eles no contexto do dispositivo da sexualidade, inaugurando assim as heterotopias. Nesse processo, que esses sujeitos conseguem estabelecer suas formas de resistência perante o poder que busca docilizar seus corpos.

Palavras-chave: Corpo. Lugar. Queer. Subjetividade.

REFERÊNCIAS

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______. Mil platôs - capitalismo e esquizofrenia, v.1. Rio de Janeiro: Ed. 34, 2010

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DERRIDA, J. Gramatologia. São Paulo: Perspectiva, 1973

FOUCAULT, M. A Hermenêutica do sujeito. São Paulo: Martins Fontes, 2010

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116

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LOURO, G. L.O “estranhamento” queer. In: Anais do Seminário do Fazendo Gênero VII. Florianópolis, 2006. Disponível em: http://www.labrys.net.br/labrys11/libre/guacira.htm. Acesso: 29 de março de 17

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DESTITUIR A NÓS MESMOS: A SUBJETIVIDADE DO SER EM REVOLTA

Augusto Flamaryon Cecchin Bozz Bozz1 Deyvisson Pereira da Costa2 Flávia Luiz Giordano3 Lucas de Freitas Santos4 Marcelo Almeida Duarte5

RESUMO

A sociologia coloca a seguinte questão a cerca das insurgências: o que nos mobiliza? Esta questão a ocupa desde a sua gênese científica: as massas do séc. XIX, os proletários de 1929, as lutas por direitos civis de 1970 (GOHN, 2012). Problema moderno, portanto. E está intimamente ligado às questões secundárias que tratam da identidade: quem fala, de que lugar se fala e do que se fala. Entretanto, propomos uma outra questão, um tanto na contramão das pesquisas sociológicas, para ensaiar uma hipótese modesta. Ao invés de interrogar o que nos mobiliza, gostaríamos de problematizar o que na insurgência fala através de nós; o que, em seu transir revolucionário, nos destitui de nós mesmos para fazer, no jogo ininterrupto do devir, nascer do próprio parto (GUATTARI, ROLNIK 1996). Colocado deste modo a questão, o objetivo deste trabalho consiste em refletir sobre os modos de ser sujeito nas insurgências minoritárias que deslocam as “identidades coletivas” para além-de-nós6. Ao lado das lutas tradicionais contra a dominação e das lutas contra a exploração de uma classe sobre a outra, é a luta contra certas formas de assujeitamento (de ser sujeito a) que prevalece agora (LAZZARATO,

1 Professor substituto no curso de Jornalismo da Universidade Federal de Mato Grosso, Campus Universitário do Araguaia e membro do grupo de pesquisa Limiar – Estudos de Linguagem e Mídia. 2 Professor adjunto no curso de Jornalismo da Universidade Federal de Mato Grosso, Campus Universitário do Araguaia e membro do grupo de pesquisa Limiar – Estudos de Linguagem e Mídia. 3 Aluna do terceiro semestre do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Mato Grosso, Campus Universitário do Araguaia e membro do grupo de pesquisa Limiar – Estudos de Linguagem e Mídia. 4 Aluno do terceiro semestre do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Mato Grosso, Campus Universitário do Araguaia e membro do grupo de pesquisa Limiar – Estudos de Linguagem e Mídia. 5 Aluno do terceiro semestre do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Mato Grosso, Campus Universitário do Araguaia e membro do grupo de pesquisa Limiar – Estudos de Linguagem e Mídia. 6 Na língua portuguesa, a locução adverbial “além de” possui três sentidos: 1) indicação de algo, 2) coisa mais adiante e 3) algo fora de um campo restrito. Entretanto, ao empregarmos a loc. adv. com hífen, sugerimos a ideia de travessia, passagem e ultrapassagem que estão presentes na definição 2 e 3 acima citadas. Deste modo, o além-de-nós pode ser entendido como “trans-nós”, um movimento de travessia que nos leva para além de nós mesmos, numa direção incerta, indeterminada e fora do campo restrito da identidade. Mas também pode ser entendido como o próprio devir das coletividades, uma força pulsante que liga as pessoas entre si destituindo-as, as transindo e interpelando-as. 118

2014). Dito isto, a reflexão não recai sobre o sujeito em si ou sobre a trivialidade de sua identidade, enquanto pivô dos movimentos sociais. Ao contrário, tem como espaço de reflexão 1) as forças do presente que pressionam as formas de ser sujeito à axiomática capitalística e, a contrapelo, 2) as resistências que afrouxam a bofetadas o torniquete e escavam buracos nas relações de poder (PELBART, 2016). Diagnóstico do presente (ou Genealogia de nós mesmos), eis o nosso procedimento metodológico. Simples, mas tarefa árdua. Pois requer pensar a própria ideia de tempo. Presente é menos estar diante do que ocorre do que o liame que nos atravessa e nos amarra ao mundo. O presente é o encavalar do que éramos com o que podemos ser, o limiar, a fulguração do acontecimento puro (DELEUZE, 1996). Cabe à genealogia desatar o liame, percorrer o novelo e as tramas para mapear as problematizações que dão ao presente uma consistência intersticial (FOUCAULT, 2005). Mas cabe também à genealogia questionar as clausuras forjadas nos abalos da história – forjadas não sem pressão, nem sem ao menos uma dose de violência – que constituem a nossa visível e secreta “verdade” presente: Ser, Essência, Humano, Ideia, Comunicação, Eu (ROSE, 2011). Para o olhar genealógico, não há essência que não seja uma fabricação violenta e, do mesmo modo, não há subjetividade que não seja esculpida à marteladas pelos acontecimentos e pelos procedimentos minúsculos de Si. Nos artigos sobre a revolução iraniana da década de 70 e em sua interpretação sobre as análises de Kant a respeito da Revolução Francesa, Foucault (2010a, 2010b) afirma que as insurreições pertencem à história, mas ao mesmo tempo lhe escapa infinitamente. Pertencem à história na medida em que encontram no presente – aqui e agora, não mais! – o interstício entre o que éramos e o que podemos ser; mas lhe escapa porque é sempre intempestiva e extemporânea. As insurreições não são da ordem do indivíduo e sua consciência de classe, mas daquilo que o transe, o atravessa e o faz palpitar subitamente em todos os cantos. Os momentos de insurreições ou de revoluções são precisamente aqueles que deixam entrever o lampejo de um campo de possíveis, que criam novas existências, produzem uma nova subjetividade. Quando nos revoltamos, o que fala através de nossos gritos não é palavras de ordem, a identidade ou os direitos fundamentais, mas o inominável do presente, o intolerável das formas de assujeitamento, o esgotamento de tudo aquilo que nos liga ao mundo, que nos prende a ele e aos outros. Essas vozes nos empurram infinitamente para adiante, pois nos abala e nos choca ao manter o seu dedo

119 imperiosamente fixo na direção do desconhecido, do “além-de”. E quando o desconhecido nos interpela, quando a palavra toma emprestada seu escândalo, força aquele que a escuta a se arrancar de seu presente para dele devir, tornar-se outro. O sujeito esgotado das revoluções é aquele que, na intolerância de seu assujeitamento, se esgota ele mesmo e seu mundo. A subjetividade do ser em revolta destitui a si mesma para, desse aniquilamento, do vazio que surge, intensificar a potência de novos modos de ser e estar. Por esta razão, as insurgências caminham, em sua embriaguez, loucura e êxtase, para além-de-nós, despossuindo e desestabilizando liames do presente. As revoltas encrustam o eterno retorno do diferente: o devir! Como Deleuze (1992) nos alerta, não se trata de perguntarmos às insurgências qual dos regimes de vida é mais duro ou mais tolerável, mas como neles se enfrentam liberações e sujeições outras.

Palavras-chave: Insurgências. Subjetividade. Acontecimento. Transir. Além-de-Nós.

REFERÊNCIAS

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ROSE, N. Inventando nossos Selfs: psicologia, poder e subjetividade. Rio de Janeiro: Vozes, 2011.

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MÃOS NA MASSA: REDE E DIÁLOGOS NA COZINHA DA FOLIA

Denise Rodrigues Soares1 Luciene de Oliveira Dias 2

RESUMO

Este trabalho apresenta uma análise sobre a formação de uma rede de sociabilidade entre mulheres que ocupam a cozinha no contexto da preparação para a Alvorada da olia do Divino Espírito Santo em São oão D’ Aliança, cidade interiorana situada na microrregião da Chapada dos Veadeiros em Goiás. A existência dessa sociação, que circula nesse espaço gendrado, partiu de uma pesquisa exploratória que evidenciou o esforço laboral e de devoção de Inês Carlos Zacarias (74 anos), Nalzira Carlos Soares (69), Avelina Parode (60), Maria Bonifácia Rodrigues Soares (55), Lenir Dias (53) e Kamilla Teles Soares (18). Assim, a presente pesquisa busca entender os processos comunicativos que sustentam essa rede de sociabilidade a partir da interpretação das construções sociais desses corpos femininos e suas relações dialógicas na esfera privada do festejo. Para alcançar esse objetivo, realizamos no mês de maio de 2018 uma observação-participante natural. Esse método, como definem Marconi e Lakatos (2003), contempla pesquisas onde quem observa possui relações de pertencimento com o grupo investigado e, em razão da trajetória de uma das pesquisadoras, este foi escolhido. O diário de campo, onde se transcrevem as interpretações do vivido e sentido (BRANDÃO, 2007), complementou o método de coleta de dados. Em campo, acompanhamos Inês Carlos Zacarias, Nalzira Carlos Soares, Avelina Parode, Maria Bonifácia Rodrigues Soares, Lenir Dias e Kamilla Teles Soares, mulheres que constituíram uma sociação, em razão da organização para a Alvorada da Folia do Divino Espírito Santo, uma manifestação cultural do catolicismo popular. Percebemos nessa relação, elementos comunicacionais que alcançam a compreensão dos processos que circundam a composição das redes de sociabilidade em

1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Comunicação, na linha de Mídia e Cultura, da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected]. 2 Doutora em Antropologia. Professora do Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGCOM), linha de Mídia e Cultura, na Faculdade de Informação e Comunicação, e do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Performances Culturais, da Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected]. 121 níveis horizontal e local. Sociabilidade, por sua vez, é um conceito sociológico de origem simmeliana que evidencia os impulsos e propósitos como meios de promover a união de pessoas e promover inter-relações convergentes com o pensamento em rede. No entanto, é necessário explicar as redes a partir do uso social e não apenas dos usos do meio técnico-científico-informacional. Com isso, recuperamos os trabalhos de Manuel Castells (2005) que embora estude as redes e a sociedade na denominada Era da Informação, reconhece a existência de redes que mediam informações de maneira paralela ao contexto virtual e que, inclusive, antecedem esse movimento mais recente. Quando o autor, ao falar de mediações, afirma que as pessoas integram a tecnologia em suas vidas (CASTELLS, 2005), realça o movimento de incorporação, o que não significa, portanto, que as mediações que conectam sujeitos em redes dependem da tecnologia. Dessa maneira, reconhecer o processo comunicacional dessas redes de sociabilidade demanda conceber a comunicação como um fenômeno que envolve dialogicidade. As contribuições de Paulo Freire (1983) corroboram para a defesa do aspecto processual e dialógico da comunicação, do qual Dias (2014) se baseia para explicar o diálogo enquanto condição da existência humana e, por isso, dependente da troca com o outro. O diálogo, que se encontra também na sociabilidade de Simmel (1983) pela lógica de conversação, que perpassa a forma, mas que também é extensão, aponta a autonomia da conversa como um dos nós que tece as redes de sociabilidade. Para assegurar a congruência da discussão, ressaltamos que a extensão neste texto é compreendida como meio ou res externa, e não como a transmissibilidade linear que rompe com a dialogicidade. Na mesma direção de res externa estão os estudos de Greiner e Katz (2001) que interpretam os corpos dos sujeitos como participantes dos processos comunicacionais em razão dos contínuos agenciamentos de produção, armazenamento, transformação e divulgação de informações. Simmel (1983) também atribui a participação dos sujeitos, bem como seu envolvimento direto de troca e convivência social, como fator crucial não só para a composição da sociabilidade, como também da interação, o que podemos reconhecer como processos comunicacionais. A partir da leitura de Louros (2000), foi possível identificar na pesquisa de campo, o modo como as estruturas culturais constroem as relações de gênero que marcam os corpos dessas mulheres definindo sua presença – e ausência – no rito religioso.

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Como consequência, percebemos que o fluxo de ação dessas mulheres se concentra na cozinha, ou seja, no espaço privado da esfera doméstica (SOFFIATI, 1992). Embora a produção dos biscoitos para os foliões e a ornamentação da casa sejam partes importantes dos rituais da Folia, a maneira de existir desses corpos reproduzem processos sociais que as colocam como coadjuvantes na organização. Ainda assim, nesse lugar, essas mulheres desenvolveram autonomia e também articularam uma rede de sociabilidade que aporta não apenas a perspectiva de sociaçãosimmeliana como, principalmente, a dialogicidade. Desse modo, o principal corpo teórico dessa pesquisa, composto por Dias (2014), Freire (1983), Geertz (2008) e Simmel (1983), orientam a interpretação dos dados coletados em campo. Para além da apreensão da dimensão cultural e religiosa nos processos comunicacionais da rede de sociabilidade das mulheres envolvidas na organização da Alvorada da Folia do Divino Espírito Santo, notamos o diálogo como um modo de intercâmbio ritual (DIAS, 2014) que compreende o conceito simmeliano. Como dito, para Simmel (1983), o diálogo envolve duas partes e é uma manifestação genuína de reciprocidade. Isso significa dizer que formar uma rede de troca pressupõe a construção de uma relação comunicacional dialógica e, portanto, orgânica e cíclica. A autonomia para imprimir discursos e compor mediações revela as consequências do diálogo enquanto proximidade, pois, nos casos em que se observa o distanciamento da prática dialógica, ocorre uma ruptura no processo de ação para liberdade, como denuncia Dias (2014). Nesse sentido, não existem razões para não reconhecer a cultura como produto e produtora dessas redes de sociabilidade, inclusive porque a experiência dessas vivências culturais não produz apenas sensações, mas, como afirma Geertz (2008), produz também significados. Nesse contexto, a sociação, por sua vez, estabelece uma relação dialógica entre sujeitos que utilizam seus corpos para compor o processo comunicacional. Logo, foi possível interpretar a intenção da comunicação dialógica construída entre a rede de sociabilidade analisada e perceber a reprodução de padrões do catolicismo popular.

Palavras-chave: Comunicação. Diálogo. Redes de Sociabilidade. Corpo. Cultura.

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REFERÊNCIAS

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A INVISIBILIDADE DAS MULHERES NA CIÊNCIA: ANÁLISE DA PRODUÇÃO CIENTÍFICA DE DOCENTE DOS CURSOS DE MESTRADO EM LETRAS E LINGUÍSTICA E EM MATEMÁTICA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS – CAMPUS SAMAMBAIA

Hevellin Estrela1 Suely Henrique de Aquino Gomes2

RESUMO

Este trabalho tem como tema gênero e ciência. O objetivo é verificar diferenças nas atividades científicas de docentes dos programas de pós-graduação (Mestrado) em Letras e Linguística, Matemática da Universidade Federal de Goiás – Campus Samambaia, sob a perspectiva de gêneros. Adota-se abordagem quantitativa para proceder à análise comparativa das atividades acadêmicas e científicas desses docentes a partir de seus currículos Lattes. Utilizou-se o teste estatístico distribuição de frequência para verificar possíveis diferenças, estatisticamente significantes, na produção científica da população estudada. A variável observada nesse trabalho é a qualitativa nominal, quando não existe ordenação dentre as categorias e a variável sexo é a que norteia a presente pesquisa. O referencial teórico desse trabalho baseia-se em autoras como Betoni (2017); Beauvoir (2016); Praun (2011); Pierucci (2007); Silva (2012); Silva (2008); e Ramos, Neves, Corazza (2001) que tratam do feminismo e das lutas das mulheres por igualdade e direitos. Procurou-se discutir também a constituição da ciência moderna; a comunicação científica nos preceitos trazidos, principalmente, por Meadows (1999), Mueller (1995), Targino (1998) e a participação da mulher na ciência. A identificação do sexo do docente e suas produções científicas deu-se inicialmente pelo site do programa de Letras e Linguística (http://pos.letras.ufg.br/) e pelo site do programa em Matemática (http://posgraduacao.mat.ufg.br/). O corpo docente do curso de Letras e Linguística é composto por 24 de mulheres (62%) e 15 homens (38%). Já quando analisamos os professores e as professoras da matemática temos 27 homens (84%) e 5 mulheres (16%) com um total de 32 professores. Na análise do curso de Matemática o número de professoras é cinco vezes menor que o número de

1 Bacharel em Biblioteconomia, servidora do IF Goiano, mestranda do PPGCOM/FIC/UFG, e-mail: [email protected] 2 Doutora em Ciência da Informação, professora titular do PPGCOM/FIC/UFG, e-mail: [email protected] 125 professores, o que contribui para a ideia do senso comum que as áreas exatas não são para mulheres. Além do quantitativo de professores, foram verificadas também as publicações (artigo, trabalho em evento, capítulo de livro, livro, participação em bancas) desses professores nos anos de 2017 e 2018/1. Para a análise dos dados, foi considerado somente o Lattes atualizado no período de dezembro de 2017 a junho de 2018. Os dados foram coletados no mês de julho do presente ano. Constatou-se que o total de produção analisada nesse período do curso de matemática é de 380 publicações. Desse total, 16,05%, ou seja, 61 publicações são assinadas pelas 5 professoras integrantes do programa. Em média, as professoras da matemática têm 12,2 publicações para os anos analisados e o desvio padrão se refere a 12,56. Enquanto a média dos homens no mesmo período é de 11,81 publicações e o desvio padrão consta de 9,79. A média da produção científica das professoras do Curso de Letras e Linguística no período analisado (1155 publicações/24 professoras) é de 48,1 publicações, enquanto a dos homens fica em torno de 46,5 publicações para o mesmo período (608 publicações/15 professores). Somando-se as produções científicas dos dois cursos analisados no período analisado tem-se 2.233 publicações. Desse total, as mulheres - independente do programa a que está vinculada - são autoras de 1.216 publicações (54,46%), o que dá a média de 41,9 publicações para o sexo feminino. Os homens dos dois programas são responsáveis por 1.017 publicações (45,54%), resultando na média de 24,2 publicações. Observa-se que no geral, as médias de produção dos homens são inferiores àquelas das mulheres. Um dado interessante que vale ser destacado é que as mulheres participaram de 452 (432 de Letras e Linguística e 20 de matemática) bancas de orientações, enquanto os homens dos programas participaram de 394 (246 de Letras e Linguística e 148 de matemática). A escolha do destaque para as participações em banca se dá devido ao que Olinto (2011) defende, pois ela diz que a distribuição desproporcional entre os fazeres docentes pode ser uma das possíveis explicações para as dificuldades enfrentadas pelas mulheres. A autora ainda reforça a ideia de que são vários os indícios e diversos mecanismos que se estabelecem no ambiente científico que acabam gerando barreiras para as mulheres progridam profissionalmente. Por fim, acredita-se que este trabalho cumpriu o seu objetivo inicial de fazer o levantamento quantitativo de professoras e professores de dois programas da

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Universidade Federal de Goiás, no intuito de buscar conhecer um pouco do gênero na ciência e as suas produções científicas. Escolheu-se dois cursos bem distintos, historicamente com predominância de gênero, homens no curso de matemática e mulheres no curso de letras, para verificar se o senso comum continua valendo mas só em relação a quantidade de gênero, uma vez que os dados mostraram que, nos casos estudados, em termos de publicações (artigo, trabalho em evento, capítulo de livro, livro, participação em bancas) as mulheres publicaram mais que os homens.

Palavras-chave: Estudo de gênero. Mulheres cientistas. Produção científica. Atuação feminina. Igualdade de gênero.

REFERÊNCIAS

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A PERMEAÇÃO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E DAS REPRESENTAÇÕES SO IAIS NA NOVELA “SE UNDO SOL”

Jean Costa Sousa1 Magno Luiz Medeiros2

RESUMO

O artigo tem como objetivo promover a discussão sobre quais os tipos de violência domésticas e familiar que as mulheres têm sofrido em suas relações afetivas com seus companheiros/e ou parceiros e como a telenovela mostra essa relação. A partir da perspectiva da cena de um capítulo da novela “Segundo Sol”. Para tanto, a pesquisa se divide em conceitual e documental, nos quais teorias e documento estiveram de forma entrelaçadas. Nesse contexto, buscamos tratar dos fundamentos teóricos sobre as Teorias das Representações Sociais, dos Meios de Comunicação, da Violência Doméstica e de Gênero. A fim de contemplar aos estudos, apresentaremos uma pesquisa documental realizada no Núcleo de Atendimento à Família e aos Autores de Violência Doméstica, um programa que atende a população de Brasília/DF, promovido pelo Governo do Distrito Federal. Também buscamos entre as especificidades e inovações trazidas pela Lei de nº 11.340 de 07 de agosto de 2006, conhecida como Lei Maria da Penha, com isso pretendemos provocar reflexão sobre a definição, as tipificações de violência doméstica e familiar, e como os meios de comunicação – de forma específica a telenovela - tem trabalhado com a temática. Além, de possibilitar identificar a relação entre a violência doméstica e familiar, violência de gênero e as Representações Sociais. Teremos como ponto de partida a cena do capítulo 70 da novela “Segundo Sol” da Rede Globo, que traz a problemática a relação de um casal que vivem juntos há mais de 20 anos. Entretanto, uma vida amorosa bem conturbada de muitas revoltas e indignações da maneira que vivem. A cena mostra a permeação da violência doméstica entre o casal, e qual as representações sociais da mulher nesse contexto. No segundo momento, para confrontar com a cena fará parte da

1 Mestrando do Programa de Pós-graduação em Comunicação na Linha de Pesquisa em Mídia e Cidadania, da Faculdade de Informação e Comunicação – FIC - na Universidade Federal de Goiás - UFG. E-mail: [email protected] 2 Orientador, Professor Doutor do Programa de Pós-graduação em Comunicação da Faculdade de Informação e Comunicação – FIC - na Universidade Federal de Goiás - UFG. E-mail: [email protected] 129 pesquisa uma das perguntas do “formulário de acolhimento” que é utilizado por especialistas com os participantes que são atendidos no programa de atenção às mulheres e aos autores de violência doméstica do qual é oferecido pelo Governo de Brasília Distrito Federal. Portanto, a pergunta é: “Identificação das formas de violência sofridas durante o relacionamento (perspectiva do/a profissional): ( ) Física ( ) Psicológica ( ) Sexual ( ) Moral ( ) Patrimonial”. Nesse sentido, possibilitou identificar a relação entre a violência doméstica e família, violência de gênero e as representações sociais. De forma constante no campo dos meios de comunicação tem sido pauta a temática sobre violência doméstica contra as mulheres. A violência contra as mulheres configura-se como problema histórico que afeta mulheres em diversos países, independentemente de sua raça, classe social ou etnia. É uma problemática social, que se materializa nas relações afetivas e domésticas. Conforme pesquisadores (MELO e TELES, 2003; SAFFIOTI, 2004) apontam, as mulheres são vulneráveis nessas relações pelo simples fato de serem mulheres (DINIZ, 1999; MEDEIROS, 2015). É no espaço doméstico onde a maior parte das agressões ocorre e geralmente é praticada pelos próprios maridos e/ou companheiros. Considerando a relevância dos meios de comunicação na luta pelo fim da violência contra as mulheres, cresce em importância a compreensão de como os meios midiáticos abordam questões ligadas à violência doméstica. Sabe-se que os meios de comunicação promovem diversos eventos motivadores, com o objetivo de promover a discussão sobre a violência doméstica e familiar, a cidadania, políticas públicas que beneficiem o povo, a democracia, e promoção da paz. Para tanto, propomos como metodologia de pesquisa a análise de conteúdo como método de investigação por permitir quantificar e qualificar as características da violência doméstica vivenciada pela personagem da novela “Segundo Sol” da cena analisada e na pesquisa documental proposta. Entretanto, indica implicações na pergunta do formulário de acolhimento e permite fazer inferências sobre a cena da novela e seus possíveis apontamentos. A confrontação da cena com o resultado da pesquisa documental do formulário de acolhimento resultou, que as mulheres não sofrem apenas um tipo de violência doméstica nas suas relações com seu parceiro/ e ou companheiro, pois a pesquisa aponta

130 que as mulheres geralmente carregam associada além de outro tipo de violência doméstica e familiar a violência psicológica.

Palavras-chave: Representações Sociais. Violência Doméstica. Gênero. Meios de Comunicação.

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EM DEFESA DA DIFERENÇA: POR OUTRAS EPISTEMOLOGIAS INDÍGENAS, QUILOMBOLAS E NEGRA NAS UNIVERSIDADES

Sckarleth Martins1 Marta Quintiliano2

RESUMO

Há lugares e modos de se produzir e fazer circular o conhecimento na nossa sociedade. Neste ensaio exploratório problematizamos o estatuto das universidades brasileiras na sua maneira eurocentrada de produzir conhecimento e o modo como a inclusão de indígenas, quilombolas e negros, pessoas historicamente excluídas desse ‘lugar’ de constituição do ‘verdadeiro’ científico, provoca um reposicionamento ético e estético da sociedade nacional como um todo. A partir da etnografia junto aos estudantes indígenas e quilombolas da Universidade Federal de Goiás, na regional de Goiânia, acreditamos que se conferirá visibilidade a um modo muito singular de viver o ambiente acadêmico, que pode ser entendido como um indício de um mundo novo por vir, resgatando narratividades, interpretações e ciências antes silenciadas. Como meio de ‘compensar’ as violências históricas e epistêmicas sofridas por populações tradicionais e negras no Brasil, as Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) aderiram, muito em resposta aos movimentos sociais, Ações Afirmativas no contexto universitário em várias direções. Essas políticas afirmativas visam equiparar, reparar e compensar discriminações sociais sofridas por certos grupos sociais e prevenir que elas se reverberem. Dentre as frentes de ações, há a reserva de vagas por meio da Lei de Cotas (LEI 12.711/2012), regulamentada pelo Decreto nº 7.824/2012, que reserva vagas nas Instituições de Ensino Superior (IES) públicas brasileiras para segmentos sociais historicamente excluídos, combinando a frequência na escola pública, etnia e renda, que é um importante instrumento para a democratização do acesso à universidade brasileira.

1 Graduada em Comunicação Social/jornalismo pela Universidade Federal de Mato Grosso, mestra em Comunicação Social pela Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás, doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Faculdade de Ciências Sociais por essa mesma universidade. 2 Quilombola do Quilombo Vó Rita, do município de Trindade-Goiás. Graduada em Comunicação Social/Relações Públicas pela Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás, mestranda em Antropologia Social pela Faculdade de Ciências Sociais por essa mesma universidade. 133

Acreditamos, que em grande medida, a resposta institucional favorável à inclusão de diferentes em um ambiente elitizado como as universidades públicas, como pontuam José Jorge de Carvalho (2005) Boaventura de Sousa Santos e Maria Paula Meneses (2009) e Boaventura de Sousa Santos e João Arriscado Nunes (2003), resulta tanto de uma luta histórica, um contexto favorável, como da necessidade de precaver-se de um olhar malquisto do ocidente, leia-se Europa e Estados Unidos, da perda de prestígio. Afinal, como levar a sério um país de herança escravocrata, que tem a maioria da população negra em escolas públicas, mas não há a mesma proporcionalidade no ensino superior público? Isto é, além da completa invisibilidade estratégica sobre a educação escolar diferenciada para indígenas e quilombolas. Dessa forma, durante muito tempo, as universidades públicas agiram diante da lei, porém, se esquivando da responsabilidade moral de equiparação e promoção da democratização do acesso ao ensino superior (CARVALHO, 2005). O direito à educação escolar é assegurado constitucionalmente no seu Artigo nº 205, tornando-se direito inalienável. Porém, medidas orientadas a um projeto de elite, tornam a educação escolar uma ferramenta para a discriminação, apagamento das diferenças, e de promoção de um modo civilizatório, como esclarece Gersem José dos Santos Luciano (2011). Neste sentido, José de Sousa Martins (1997) esclarece que diante da naturalização dos mecanismos de exclusão social, há uma oferta precária e mal orientada para a inclusão, de fato. Assim, mascaram-se ações pretensamente compensatórias e voltadas para a inclusão, mas que trazem consigo as marcas do racismo institucional. Esta pesquisa se justifica pela quantidade expressiva de estudante indígenas, quilombolas e negros ingressantes na universidade através do Programa UFGInclui, que cria uma vaga para indígenas e uma vaga para quilombolas em todos os cursos da graduação (em dez anos de Programa, são cerca de 450 estudantes autodeclarados e reconhecidos por suas comunidades de origem) e pela Lei de Cotas (50% do total das vagas associando aspectos de raça, etnia, renda e escolaridade básica no ensino público, como já dito), alterando a dinâmica estática branca dos cursos da graduação - ainda que em alguns casos de forma mais ou menos incipiente, como nas áreas tidas como Hard Science. As diferenças que esses sujeitos trazem em seus corpos, seus modos de ser e conhecer o mundo exigem da comunidade acadêmica um posicionamento. Neste

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contexto, há uma distonia, que acreditamos ser programática, entre a obrigatoriedade de incluir diferentes nas universidades e as políticas ações afirmativas que garantam a permanência desses, o que seria índice de um racismo institucional. Fala-se de sujeitos atraentes enquanto ‘objetos’ de pesquisa, figuras exóticas; estranhos, por não corresponderem ao ideal ascético e elitista esperado. Estaríamos diante de um jogo de luz e sombra que atenderia a uma lógica imperialista de se produzir conhecimento, governar e conferir valor a modos de ser e existir, portanto. Ou seja, há um angustiante não-lugar que induz uma condição de estrangeiro àqueles/as que nos deveriam ser familiares. Dessa maneira, temos como objetivo empreender um gesto inicial na direção de uma desobediência epistêmica, como sugere Walter D. Mignolo (2008), na medida em que, mesmo fazendo uso de um repertório acadêmico, vislumbramos outras epistemologias, estéticas, ontologias, em suma, outros mundos possíveis. Escrever sobre essas experiências anti-imperialistas de conhecimento, requer, como explica Linda Tuhiwai Smith (2008), reescrever a ‘história’ sob vários pontos de vista massacrados pela ideologia colonial, porque para entender o presente é preciso reclamar às narrativas históricas de forma crítica é essencial para a descolonização dos saberes, metodologias etc. Por isso, acredita-se que uma outra proposta de linguagem ou a coautoria com estudantes indígenas e quilombolas da UFG não conferem por si, maior visibilidade aos saberes e experiências destes, assim como não potencializariam, a contento, suas formas de ver o mundo. Ou seja, nestas epistemologias contracoloniais, como explica Antônio Bispo dos Anjos (2018), mestre do saber quilombola, estudar cálculo de área só faz sentido quando associado ao conceito de botânica na plantação das roças, e lá, fazendo e pensando, associam-se ao que ele esclarece como pensamento orgânico. Neste, aprende-se fazendo, faz-se pensando. Há a necessidade de que outros conhecimentos percorram o imaginário da nossa sociedade para que aprendamos a respeitar outras formas de bem viver, posicionar a crítica a partir de outros pressupostos. O mestre quilombola ainda nos esclarece que é preciso dar vazão a uma ética da confluência, ou seja, “a lei que rege a relação de convivência entre os elementos da natureza nos ensina que nem tudo que se ajunta se mistura, ou seja, nada é igual”. (ANJOS, 2015, p. 89), em contraponto ao pensamento da transfluência, no qual nem

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tudo que se mistura se ajunta. Esse ‘estilo’ provoca deslocamentos quanto às linguagens, corporeidades, sociabilidades e subjetividades desses estudantes. Isto é, a partir do encontro com sujeitos que resistem no espaço acadêmico com suas epistemologias, se posicionando a partir de suas experiências em um espaço que a cada instante expurga os seus corpos e os seus conhecimentos, o que provocariam de deslocamentos quanto a práticas pedagógicas, sociológicas e de políticas afirmativas na universidade. Optamos pela pesquisa etnográfica porque esta se configura como uma abordagem teórica e metodológica necessária para entendermos melhor o modo como estes estudantes se engajam no domínio de um novo repertório linguístico, comunicacional e epistêmico do/no ambiente acadêmico, e em que medida contribuem para o questionamento desses mesmos pressupostos universalizantes.

Palavras-chave: 1. Epistemologias. 2. Saberes. 3. Indígenas. 4. Quilombolas. 5. Ações Afirmativas.

REFERÊNCIAS

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PADRÃO DA COBERTURA DE FEMINICÍDIOS E PUNIBILIDADE DOS AGRESSORES: O QUE A IMPRENSA NOS CONTA AO LONGO DAS DÉCADAS

Jéssica Estély Chiareli Nazareth1 Angelita Pereira de Lima2 Magno Luiz Medeiros da Silva3 Michele Cunha Franco4

RESUMO

O Brasil começou a rever na prática algumas questões sobre a sua jurisprudência, visando a garantia real dos princípios de igualdade de gênero, desde a virada do século. Alguns símbolos desse esforço de mudança são a Lei Maria da Penha, em 2006; a tipificação do feminicídio, em 2015; e a possível tipificação do estupro coletivo, ainda em discussão no Congresso. Todas elas podem ser consideradas resultado direto de dois fatores: as reivindicações dos movimentos feministas que ganharam corpo em diferentes lugares do mundo, entre eles o Brasil, desde os anos 1950; e as declarações e tratados internacionais pela igualdade entre homens e mulheres, como a declaração da Década da Mulher de 1976 a 1985, pela ONU. O avanço das três medidas legais brasileiras, embora sinalize mudanças no garantia do combate à violência contra as mulheres, contrasta com o aumento de notificações de crimes motivados por questões de gênero no país. De acordo com dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), analisados por Garcia et al (2008), no Brasil, estima-se que ocorreram mais de 50 mil assassinatos de mulheres entre os anos de 2001 e 2011 por conflitos de gênero, dos quais pelo menos 1/3 resultou de violência doméstica e familiar. O Mapa da Violência 2015: Homicídio de Mulheres (WAISELFISZ, 2015), por sua vez, demonstra que esse quantitativo é superior ao de décadas anteriores. De acordo com o estudo, entre 1980 e 2013 houve mais de 106 mil mortes violentas de mulheres no país. Um aumento de 252% do número de assassinatos durante o período compreendido pela pesquisa, que passou de 1.353, em 1980, para 4.762, em 2013. Os índices tornam o Brasil o 5ª país do mundo com maior taxa de feminicídio. No

1 Mestranda, Universidade Federal de Goiás, [email protected], Goiânia. 2 Doutora, Universidade Federal de Goiás, [email protected], Goiânia. 3 Doutor, Universidade Federal de Goiás, [email protected], Goiânia. 4 Doutora, Universidade Federal de Goiás, [email protected], Goiânia. 138

entanto, a situação possivelmente é pior, dada a escassez de dados. “O mais claro sintoma da posição subalterna da mulher na sociedade brasileira” (BLAY, 2008, p.25). Mesmo subnotificados, os registros existentes permitem perceber a repetição de um sistema de violência de gênero para o qual Rita Laura Segato chama a atenção em seus estudos sobre os condenados por estupro da penitenciária de Brasília (2003), bem como em seus trabalhos relativos à visita que realizou a Ciudad Juárez, no México (2005). A sua primeira pesquisa, realizada a partir de entrevistas a presos acusados de ataques sexuais a vítimas desconhecidas nas ruas “respalda a tese feminista de que os crimes sexuais não são obra de desviados individuais, doentes mentais ou anomalias sociais, mas sim a expressão de uma estrutura simbólica profunda” (p.38, tradução livre), muitas vezes nominada “cultura do estupro” entre as ativistas feministas. Essa estrutura seria compartilhada tanto pelo agressor quanto pela coletividade por meio do que a autora chama de “imaginário de gênero”. Vale ressaltar que essa estrutura não se aplica apenas a desconhecidos que atacam mulheres nas ruas. Dentro de casa a história se repete com amigos e familiares das vítimas, respaldando ainda mais fortemente o entendimento feminista sobre a existência de um contexto no qual o estupro é normatizado. Ambas as situações, para Segato, são resultado das construções históricas de masculinidade e feminilidade. Seja dentro ou fora do lar, o homem estupra ou mata para dizer que pode, que detêm o controle sobre os corpos femininos, para afirmar a sua virilidade. Depois de sua visita à Ciudad Juárez, tomada desde 1993 por uma onda de assassinato de mulheres que obedece a um mesmo modus operandi, Segato identificou que os crimes de estupro e feminicídio não só obedecem a uma lógica estrutural apoiada nas construções do imaginário de gênero, como também se comportam como um sistema de comunicação, isto é, “ ... os atos de violência se comportam como uma língua capaz de funcionar eficazmente para os entendidos, os avisados, os que falam mesmo quando não participam diretamente da ação enunciativa” (SEGATO, 2005, p.277). Nesse contexto, para a autora, o corpo feminino significa território, e, a partir da linguagem da violência de gênero, a mulher se anexa como parte de um país conquistado. Um alfabeto violento, um sistema de comunicação que se instala de maneira quase automática, de modo que é difícil eliminá-lo. Embora a discussão seja tão complexa, um dos fatores frequentemente apontados como facilitador dessa reafirmação da linguagem da violência de gênero, que cresce exponencialmente a

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revelia de leis mais rígidas e específicas, é a impunidade dos réus, verificável até quando trata-se da expressão máxima da violência contra as mulheres: o feminicídio. Conforme aponta pesquisa de mestrado em desenvolvimento, um olhar ao passado, dos anos 1970 até o início dos anos 2000, pode dar algumas pistas que ajudam a compreender o fenômeno, especialmente quando observada a cobertura jornalística de casos de assassinatos de mulheres por questões de gênero. Está sendo realizada uma análise de conteúdo das publicações do jornal Folha de S. Paulo sobre cinco casos de assassinatos de mulheres por questões de gênero nas últimas cinco décadas: a socialite Ângela Diniz (1976); a cantora Eliane de Grammont (1981); a atriz Daniella Perez (1992); a jornalista Sandra Gomide (2000) e a modelo Eliza Samudio (2010); de maneira a identificar as possíveis semelhanças entre as abordagens, em especial na construção de sentidos que apontem para punição dos agressores. Resultados preliminares indicam que existe um padrão de cobertura midiática de mulheres que possuem notoriedade. Esse padrão é caracterizado principalmente pelo fator continuidade, com grande volume de suítes dos casos de violência, que sugere uma eficácia na punibilidade dos assassinos que foge à regra. Espera-se, com a finalização da análise de conteúdo das publicações do jornal, compreender se tal padrão já identificado pode influenciar a construção de sentidos que apontem para a punição dos agressores.

Palavras-chave: Violência de gênero. Feminicídio. Imprensa. Punibilidade.

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NOVAS PRODUÇÕES DE SENTIDO: O CASO DO MINISTÉRIO EVAN ÉLI O L BTQ+ “MOVIMENTO ORES”

Thales Rafael Rodrigues de Moura1 Luiz Antonio Signates Freitas2

RESUMO

Propõe-se a exposição em formato de artigo do trabalho já desenvolvido pelo referido pesquisador, o qual esteve por 35 dias em pesquisa de campo na cidade de Belo Horizonte (MG), na Igreja Batista da Lagoinha, unidade Savassi, vivenciando como observador participante a rotina do intitulado “Movimento Cores”, ministério evangélico criado pela igreja citada e voltado exclusivamente para a comunidade LGBTQ+. Tal ministério existe desde 2013 e é estudado por este pesquisador desde Maio de 2017. Ora, também frisa-se que a Igreja Batista de Lagoinha é conhecida nacionalmente pela ampla rede de comunicação que possui, desde rádio, centenas de contas em redes sociais ligadas a seus ministérios e a existência de figuras específicas – pastores, cantores – que funcionam como uma espécie de influenciadores digitais, possuindo juntos mais de 5 milhões de seguidores. Os dados coletados pelo autor foram transformados num relatório que revelaram momentos de regularidade, de discrepância e de intensidade, sendo posteriormente levados para análise. A pesquisa de campo feita entre os meses de Junho e Julho juntamente com a apresentação de dados pinçados pelo mesmo pesquisador ajuda a apresentar as demarcações e delineamentos executados por diferentes agentes no campo. Após essa análise deve-se questionar o porquê dessas instituições tomarem determinadas atitudes. Primeiramente, como ponto de partida, o objeto foi estudado à luz dos dispositivos interacionais em Braga (BRUCK; JESUS, 2011, p. 27-36), no qual o pesquisador apresenta a Igreja Batista da Lagoinha (sede), a Lagoinha Savassi (local de funcionamento do Movimento Cores) e o próprio Movimento Cores como três dispositivos interacionais diferentes, os quais possuem certa interdependência.

1 Mestrando do Programa de Pós Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Goiás. Bacharel em Direto pelo Centro Universitário de Anápolis. e-mail: [email protected] 2 Orientador do trabalho. Professor Doutor do Programa de Pós Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Goiás na Faculdade de Comunicação e Informação, e-mail: [email protected] 141

Giddens entende à luz de Foucault que “a sexualidade não deve ser compreendida somente como um impulso que as forças sócias têm que conter. Mais que isso, ela é um ponto de transferência especialmente denso para as relações de poder” (GIDDENS, 1993, p. 28). O referido autor também nos lembra que a sexualidade é na verdade um termo que aparece pela primeira vez no século XIX. A sexualidade começou na se tornar identidade quando começou a existir a mídia (GIDDENS, 1993, p. 32). A questão comunicacional é que “as identidades, mesmo que demarcadoras de tradições que se especificam e ganham permanência temporal, são surpreendidas em negociação de sentidos, em transmutação simbólica”, trata-se da “processualidade dos símbolos em movimento. O contínuo vir-a-ser dos elementos culturais”, nunca hipostasiados sob o método próprio das ciências da comunicação (SIGNATES; DAMASIO, 2017, p. 57). Sendo assim, estamos tratando de um tema que possui resistências e adversidades: como uma igreja que se apropria de vários códigos pós-modernos abre um espaço para que o público LGBT possa produzir relações nela? Em que condições essas relações são produzidas? Em seguida, são apresentados os dados elencados como “descobertas” na pesquisa de campo, onde se apontam quatro tópicos em especial. Tais tópicos objetivam convergir para as ideias de inclusão e exclusão, entendidas como elementos presentes no contexto LGBTQ+ e religioso e, em especial, nas relações interacionais entre ministério (Movimento Cores) e igreja-mãe (IBL). Notou-se no período de pesquisa como observador participante a tentativa de invisibilização do Movimento Cores perante toda a estrutura da Igreja Batista da Lagoinha, a discrepância no número de participantes das reuniões e no atendimento particular realizado por seus obreiros, a diferença no formato das relações sociais entre membros do Movimento Cores e membros de outros ministérios da IBL e a invisibilização da líder do ministério, Priscila Coelho. Confirmou-se que a esse nível do poder e da cidadania, apesar da característica conservadora do código religioso da IBL, o Movimento Cores é uma nova linguagem de um código “perfurado”. Há rupturas e suturas da identidade LGBTQ+. Dessa maneira a identidade sexual sofre um “corte” que faz com que parte dela seja admitida e outra renunciada. É lícito ao fiel membro do Movimento Cores fazer parte do universo LGBT

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e consumir sua cultura, mas ele deve se restringir apenas isso. No código religioso da IBL nem mesmo o consumo cultural seria aceito.

Palavras-chave: Movimento Cores; Dispositivo Interacional; Subjetividade.

REFERÊNCIAS

BRUCK, Mozahir Salomão; JESUS, Eduardo. Prof. Dr. José Luiz Braga: Dispositivos interacionais: lugar para dialogar e tensionar conhecimentos // Interactional devices as places to dialog and to collate knowledge. Dispositiva, Belo Horizonte, v. 1, n. 1, p. 27- 36, dez. 2011. Disponível em: . Acesso em: 03 Mar. 2018.

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VESTIR PARA (RE) CONHECER E RESISTIR: POR UM OLHAR QUEER DO DISPOSITIVO DA MODA

Marco Aurélio Alves e Silva1 João da Cruz Gonçalves Neto2

RESUMO

Reconhecer-se e ser reconhecido é vital a todo indivíduo. Logo, para Taylor (2000), esse reconhecimento do outro e de si mesmo recai na essencial compreensão de todos os elementos que se relacionam e provocam o sujeito à formação de uma identidade que, ao fugir de uma normalidade imposta pelos dispositivos sociais e majoritariamente aceita, integra uma política de resistência. Nessa direção, o movimento queer, principalmente na década de 80, procurou abraçar não somente os escorraçados do convívio com a normalidade, mas, como observa Miskolci (2016), questionou as ações resignadas de alguns grupos homossexuais, que interpelavam a eterna luta binária: hétero versus homossexual e não constituíam um comando ativo para a desconstrução desse arcaísmo de forma mais enérgica. Energia essa que potencializou, segundo Butler (2015), os abjetos a experimentarem o lugar de sujeitos autorizados a denunciar e resistir a práticas excludentes capitaneadas pelos comandos institucionais, os quais, para Foucault (2015), marginalizam e pregam uma pedagogia binária performática de gêneros por meio de tecnologias e ferramentas diversas. Diante desse cenário, esta pesquisa parte da premissa de que o dispositivo da moda, as suas construções de estilo, os seus discursos, as suas ações e interpretações acabam, muitas vezes, interferindo no reconhecimento dialogal que o queer tem de si e do outro e caminham para desconstruir e comercializar a lógica libertária criada pelos abjetos – o genderless. Para essa investigação, a nossa primeira tarefa será delinear teoricamente o queer, a partir das ideias de Butler (2015) e Louro (2015), e o seu pretenso olhar ao mundo cercado por uma série desses dispositivos que comandam discursos e enunciados a serviço de um padrão de normalidade de gênero que se quer ratificar. Para se manter central ao longo de processos de ruptura, o dispositivo da moda,

1 Mestrando em Direitos Humanos no do Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Direitos Humanos da Universidade Federal de Goiás (UFG), e-mail: [email protected] 2 Pós-doutor em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina e professor na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Goiás (UFG), e-mail: [email protected] 144

como aponta Paixão (2017), mostra-se capaz de domesticar, apropriar e comercializar corpos e suas representações a serviço de uma normalidade falocêntrica, heteronormativa e binária que solidifica expectativas quanto à expressão de gênero do sujeito, silencia e amacia os discursos radicais de mudança do status quo. Logo, nos é cara a ideia de que a moda, perseguindo a noção de Lipovetsky (2009), não é um mero artifício para cobrir a nudez corporal, muito menos, um adorno estético, e sim um conjunto de discursos, ações e instrumentos que interagem com uma realidade e constrói seus significados comprometidos com uma noção que se quer representada. Logo, esse dispositivo está na rua, no urbano, que não são libertários: existe o olhar inquisidor – à espreita ou não - para aqueles que recorrerem a estilos não convencionais – negando, por consequência, aos sujeitos desviantes do padrão, o reconhecimento devido; invariavelmente, a veste é para ser vista e construir identificações específicas em franca dinâmica com o íntimo e coletivo. Sendo assim, Svendsen (2010) sublinha que a moda não deve ser compreendida apenas como uma linguagem ou como um poder alheio a intencionalidades de seus criadores, pelo contrário: ela consolida, muitas vezes, a repressão de gênero, levanta a carga simbólica de violência que uma peça de roupa carrega consigo ao apontar moldes binários acatados e massificados em estilos a serem obedecidos – que nos faz recordar a lição de violência simbólica desenvolvida por Bourdieu (1989). Ora, se a moda está no gênero e o gênero está na moda, uma peça de roupa acaba por domesticar corpos e performances de sujeitos que aprendem o que é a noção binária de gênero antes mesmo de serem ensinados a se comportarem de forma a cumprirem as expectativas da normalidade. Assim, moda constrói modelos externos, torna-se exemplo e não se preocupa com a individualidade e sua expressão íntima. Essa é a crítica que Erner (2005) tece ao afirmar categoricamente que a moda não se deixa dominar facilmente; para ele, somos vítimas dela, de uma construção pré-moldada e que pouco abre espaço para escolhas libertárias e rebeldes. A moda não respeita a formação indistinta do gênero de um corpo. Pelo contrário: castra essa construção, se apropria do novo, do diferente e o torna um produto amaciado ao gosto da normalidade que se quer conservar. Resistente a esse processo conservador, a prática queer mostra-se como um grito de resistência a esse poderio expresso pela moda; se o sujeito não deve receber ingerências quanto à formação de sua identidade de gênero, logo, não há como se sentir reconhecido com as

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roupas que reproduzem uma lógica masculina ou feminina tão somente. O dispositivo da moda, portanto, é inquisidor e pouco receptivo a novos olhares e interpretações que escapam de uma realidade mercadológica capitalista e profundamente binária quanto à diferenciação de gêneros. Sua técnica de ação discursiva e multilinear, assim como o conceito desenvolvido por Deleuze (1996), é se apropriar de discursos libertários e moldá-los de acordo com a intenção dos que detêm o poderio político, industrial e social do contexto analisado. Nesse sentido, é primordial compreender se essa nova práxis legitima essa rebeldia que, em um primeiro momento, nos parece mais acertada ou se acaba se deixando engolir pelo discurso contraproducente do dispositivo pesquisado. Essa posição rebelde frente aos comandos da normalidade sufocante coloca esse indivíduo em colapso, mas constroi uma ação de resistência. Assim, é necessário abrir outros caminhos e reinterpretações da realidade imposta pelas instituições sociais infladas de um poder repressivo. A moda é um dispositivo inquisidor, excludente e porta-voz das instituições dominantes, contudo, há, por vezes, criações que contestam esse poder, como a estética genderless, a moda pensada e criada sem que o gênero interfira em quaisquer processos criativos de sua confecção, como leciona assinala Afonso e Rodrigues (2017). Esse novo olhar, como vimos, estabelece uma política de resistência capaz de dialogar com outros embates sociais em busca do vital reconhecimento, mas que deve cuidar para que não seja engolido pelas ferramentas e instrumentos desse dispositivo. Ao longo dessa discussão, manteremos um esforço interdisciplinar de se imaginar o problema partindo da premissa. Para isso, lançaremos mão da pesquisa bibliográfica dos autores supracitados e de outros que nos darão aporte e na análise de peças de roupa da coleção Agenders, da marca Selfbridges, que se pretende genderless.

Palavras-chave: Moda. Dispositivo. Gênero. Queer. Reconhecimento.

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GT Imagens, Cinema e Cultura Visual

Coordenação Ana Rita Vidica e Eduardo Portanovaes

DO AVESSO: A DESCONSTRUÇÃO DO VÍDEO EM 24 HOUR PSYCHO DE DOUGLAS GORDON

Lana de Araújo Gomides1 Thiago ernando Sant’Anna e Silva2

RESUMO

A obtenção de novos significados a partir da desconstrução do vídeo tem sido viabilizada, principalmente, pela convergência de meios como a fotografia, o vídeo e o cinema. O artista Douglas Gordon tem se destacado nesse âmbito como um videoartista que pratica sua arte fora das fronteiras dos formatos tradicionais de vídeo e em 1993 emerge em meio ao caos com uma obra que oferece uma oportunidade para a reflexão: 24 Hour Psycho – uma videoinstalação exposta pela primeira vez em Glasgow (Escócia). Ele parte de um material de domínio público – neste caso, o filme Psicose (1960), de Alfred Hitchcock – e insere sua poética arrastada e intensa no plano de significações. Ao fazer um recorte de 20 minutos do filme, constrói um arranjo sucessivo de fotogramas – são exibidos dois por quadro - que se prolonga por vinte e quatro horas. Essa desconstrução, que é mais perceptível no quesito temporal, suscita níveis de detalhes das cenas que passam despercebidos se contemplados no tempo tido como normal (o espectador consegue se fixar em pormenores como gestos, expressões, ações, entre outros). Dessa forma, é evidente a intenção do artista de problematizar a concepção convencional de dispositivo tanto cinematográfico quanto do próprio fotograma. O título da videoinstalação “24 Hour Psycho” introduz o espectador ao que ele está prestes a contemplar: uma atenuação do encadeamento veloz das imagens que gera uma intensificação presente não apenas no filme Psicose, mas também na maior parte das obras que se tem acesso nas salas de cinema atualmente. A proposta é para a reflexão e não para o mero consumo. Como a exposição acontece em galerias e museus, há uma nova forma de contemplação em que o observador é convidado a ter uma experiência

1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Arte e Cultura Visual da Faculdade de Artes Visuais (FAV), Universidade Federal de Goiás, [email protected] 2 Pós-Doutor em Arte e Cultura Visualpelo Programa de Pós-Graduação em Artes e Cultura Visual, na Faculdade de Artes Visuais (FAV), Universidade Federal de Goiás, [email protected] 149

espontânea. Diferentemente das salas de cinema, nesses ambientes há alterações tanto na forma física de recepção quanto na percepção das imagens. O observador decide quando parar e quando retomar àquela videoinstalação. Com o intuito de apreender os resultados dessa vivência, este artigo faz uma relação entre a obra “24 Hour Psycho” de Douglas Gordon e estudos de autores consagrados da área da Cultura Visual, como W. J. T. Mitchell (a fim de uma aproximação teórica no que tange aos estudos das imagens), bem como de especialistas que se dedicam ao estudo do vídeo, como Christine Mello. O referencial teórico busca suporte nos pensamentos de Roland Barthes, Antonio Fatorelli e Nicolas Bourriaud com o objetivo de se aproximar de uma fala acerca desse consumo convencional dos filmes planejados pela indústria de Hollywood. Ao mesmo tempo, a escrita relembra a Filosofia da Caixa Preta (1983), de Vilém Flusser. Num segundo momento, foram selecionados 17 frames da cena clássica do filme Psicose (1960) para análise descritiva tanto no que tange ao espaço físico da videoinstalação quanto do plano das significações que a produção proporciona. Após uma minuciosa observação de cada frame, foi possível observar enquadramento, elementos narrativos, planos, entre outros fatores constituintes da obra. Ao fim da análise, chegou-se ao entendimento de que o videoartista Douglas Gordon atua nesse contexto da desconstrução do vídeo contra a corrente hegemônica e o seu “modo certo de se fazer vídeo”. Ele desconstrói o filme Psicose (1960), assim como a maneira de assistir e entender as cenas e entende não apenas o funcionamento dessa “caixa preta” elucidada por Vilém Flusser, mas também os processos de recepção do sujeito. Aliando subjetividade e criatividade, intervém no formato convencional reproduzido no cinema. Ainda que Flusser tenha uma fala voltada para o sentido da automatização das imagens, o modo criativo do artista quebra com a ideia de que essa repetição provocada pela automatização causa estereotipia, ampliando todo um universo de possibilidades. Partindo de conceitos apreendidos com W. J. T. Mitchell, Gordon permite um contato diferente com o não-visto ou não-visível. Afinal, os espectadores deixam de ver mensagens implícitas nos filmes feitos para o cinema catedral, como ele mesmo caracterizaria, sendo que ali há muito que ser lido. Outra percepção possível a partir dos estudos sobre a tese elaborada por Christine Mello é a de que o artista em questão, na busca por territórios fronteiriços, fez com que sua obra funcionasse como o locus do experimentalismo e da desconstrução através da desestabilização do conceito

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hegemônico de narrativa. E é exatamente por se utilizar da suspensão do tempo que o trabalho de Gordon proporciona a sensação, para o receptor, de estar frente a um novo filme. 24 Hour Psycho, definitivamente, leva a sociedade a pensar não tão somente na obra em si, mas no seu comportamento cotidiano ao que diz respeito à recepção de imagens. Seu silêncio chama a atenção, o preto e branco da projeção provoca emoções e seu espaço de inserção intriga.

Palavras-chave: Douglas Gordon. Vídeo. Videoinstalação.

REFERÊNCIAS

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INFÂNCIA E YOUTUBE: PERFORMANCES DA PROXIMIDADE

Ana Júlia de Freitas Carrijo1 Lara Lima Satler2

RESUMO

Este texto é um desdobramento do plano de trabalho de iniciação científica de título “Infância e YouTube: a recepção infantil de narrativas audiovisuais digitais”, que está vinculado à pesquisa "Grupodidatismo de youtubers: Em época de espetáculo do eu, cabem narrativas coletivas?", realizada na Universidade Federal de Goiás, e busca problematizar os estudos de recepção no contexto digital e propor uma reflexão sobre os desdobramentos advindos dos usos de plataformas de streaming, em especial o YouTube, pelo público infantil na contemporaneidade. As narrativas que aparecem nesse meio são produzidas por usuários da rede que, a partir do momento que se tornam produtores, são nomeados youtubers. De forma livre e gratuita, os usuários são convidados a veicular suas produções em canais (páginas personalizadas que hospedam os vídeos), os quais podem receber inscrições de sujeitos interessados em acompanhar a rotina de publicações. O objetivo deste estudo é compreender a estrutura dos vídeos do YouTube e investigar de que modo as narrativas dos youtubers cativam o público infantil. Para tanto, nosso esforço analítico procura reconhecer a estratégia narrativa das produções, examinar os recursos verbais e audiovisuais utilizados por elas e articular essa análise à recepção infantil. O referencial teórico que embasa a análise desenvolvida neste texto preocupa-se em manter a tensão advinda da relação entre produtos midiáticos e seus receptores, considerando a fecundidade da dinâmica cultural expressa na comunicação social. Esta análise considera o texto como produto de um contexto social amplo e mantém vivas as forças comunicativas dos receptores, do meio cultural e das lógicas de produção

1 Graduanda do curso Comunicação Social com habilitação em Publicidade e Propaganda, na Universidade Federal de Goiás. Atua como pesquisadora júnior do Núcleo de Pesquisa em Teoria da Imagem, na Faculdade de Informação e Comunicação (FIC/UFG) e é pesquisadora bolsista do programa de iniciação científica da UFG. E-mail: [email protected] 2 Pós-doutorado em Estudos Culturais (PACC/ UFRJ). Doutorado em Arte e Cultura Visual (PPGACV/ FAV / UFG). Professora-pesquisadora na Universidade Federal de Goiás (UFG), na Faculdade de Informação e Comunicação (FIC). É vinculada ao Núcleo de Pesquisa em Teoria da Imagem (NPTI / PRPG-UFG / CNPq). E-mail: [email protected]

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específicas da linguagem construída no YouTube (MARTÍN-BARBERO, 2018). Seria a construção de uma performance (nos termos de Paula Sibilia (2015)) de proximidade com o público o segredo do sucesso dos vídeos dos youtubers? Para responder a essa e a outras inquietações, realizamos um trabalho analítico de materiais audiovisuais disponibilizados no YouTube, embasados metodologicamente na análise de imagem e som (ROSE, 2003), desde a seleção dos referenciais teóricos e empíricos até a codificação dos dados coletados. Realizamos ainda um grupo focal (COSTA, 2005) com crianças de oito a doze anos, na Escola Sonho Dourado, Setor Jaó, Goiânia (GO), uma instituição da rede privada, localizada em um setor de classe média da capital. Na análise de imagem e som, selecionamos três vídeos para investigação, produzidos peloyoutuber citado mais vezes como preferido pelas crianças, Felipe Neto. Buscamos verificar a hipótese a qual afirma que a relação de intimidade estabelecida entre o público infantil e os youtubers é fator importante para consolidação da linguagem contemporânea típica dos vlogs. Para tanto, definimos quatro unidades de análise (chamada, apresentação do tema, desenvolvimento do tema e finalização) para serem investigadas por meio de critérios verbais e audiovisuais. A análise verbal aborda: 1) diálogo direto com o público; 2) busca por um discurso de autenticidade; 3) convites à ação; 4) inserção de interlocutor no ambiente do vídeo. A análise audiovisual observa: a) olhar voltado diretamente para a câmera; b) cenário que simula um quarto ou um espaço interno residencial; c) efeitos especiais de montagem. O grupo focal aconteceu no intuito de compreender o processo de negociação, produção e apropriação de sentido (nos termos de Martín-Barbero (1997) e Stuart Hall (2003)) realizado pelas crianças em contato com as narrativas dos youtubers a que costumam assistir. As indagações feitas às crianças abordaram e questionaram suas preferências de navegação no YouTube, buscando porquês para o fascínio por determinados youtubers, canais e vídeos. Além disso, questionamos o grau de interatividade dos colaboradores com a plataforma, isto é, se de fato elas utilizam os recursos oferecidos pelo YouTube para sentir-se parte atuante do processo comunicativo. Instigamos os participantes do grupo a refletir sobre os convites à interação propostos reiteradamente nos vídeos e sobre o comportamento performático dos youtubers. Concluímos, a partir da análise de imagem e som, ilustrada por trechos da transcrição dos vídeos e por frames das produções, que a construção de uma

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performance e de proximidade entre youtuber e público é a principal estratégia narrativa dos vídeos analisados. Sob o argumento da autenticidade, as narrativas oferecem sentidos simbólicos para a apreciação do público que se apropria do discurso. A partir da dinâmica do grupo focal, concluímos que as crianças não se questionam sobre a produção do conteúdo ou sobre o porquê de aquela figura estar falando sobre aquele assunto daquela maneira, nem mesmo se indagam sobre os recursos de edição. Elas se concentram na performance da proximidade, a qual as convence por conta de uma estratégia narrativa embasada na busca por um discurso autêntico e familiar. Perguntamos aos colaboradores sobre o que os fazia gostar dos vídeos. A resposta da maioria evidenciou o caráter crítico e humorado dos youtubers. As crianças se assustaram com a ideia de existir um roteiro, mesmo que aberto, para a produção dos vlogs. Quando provocadas sobre a noção de uma estrutura narrativa construída previamente visando um discurso coerente com a proposta da autenticidade, as crianças questionaram se não era "tudo feito no improviso", para usar a fala do colaborador 2.

Palavras-chave: Recepção. Youtubers. Público infantil. Proximidade. Performance.

REFERÊNCIAS

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GRUPODIDATISMO EM GAMEPLAYS: INOVAÇÕES NARRATIVAS

Lara Lima Satler (UFG)1 Laura Vilela Rodrigues Rezende (UFG)2

RESUMO

Estudo que traz um recorte do Youtube como uma plataforma de streaming de vídeo a fim de observar inovações em narrativas audiovisuais. Possui como hipótese a premissa de que, se por um lado, o serviço de streaming tal como é configurado estimula a inovação narrativa em razão da sua heterogeneidade e multiplicidade criativa, por outro, nota-se, depois de mais de uma década da sua criação, sua convergência (JENKINS, 2009) com as narrativas televisivas de modo que estas se constituem como âncoras estratégicas àquelas em diversos sentidos. Foram eleitos canais indicados por fãs durante uma atividade de grupo focal. Trata-se de gamers, como são chamados os autores dos canais no YouTube, que aliam o prazer dos jogos eletrônicos à prestação de um serviço de tutorial e que gradualmente se torna entretenimento, de modo a criarem narrativas audiovisuais que, simultaneamente, ensinam a jogar e divertem seu público. Uma vez que distribuem essas narrativas no YouTube, gamers são também conhecidos como youtubers, embora nem todo YouTuber seja gamer, isto é, nem todo YouTuber adota a gameplay como estratégia narrativa. No tocante à definição do que vem a ser gameplay, ressalta-se que, embora o termo seja traduzido por jogabilidade e Fragoso (2017) tenha discutido a gameplay a partir dos modos de existência do lúdico dentro do jogo, neste texto ela será classificada também como um gênero audiovisual difundido por serviços de streamings de vídeo como o YouTube. Com abordagem qualitativa, foram observadas as seguintes gameplays:  GOD OF WAR 2 #4 - A Fúria dos Titãs! (Gameplay em Português PT-BR)  Minecraft: Venom e os Aventureiros - Multiplayer #1 - Construindo o Abrigo. A partir da sua estratégia narrativa, as gameplays têm se tornando um fenômeno instigante por provocar mudanças de comportamento entre jogadores (players), a saber:

1 Pós-doutorado em Estudos Culturais (PACC/ UFRJ, 2018); DoutoradoemArte e Cultura Visual (FAV/ UFG,2016). ProfessoraAdjunto da Universidade Federal de Goiás, no Programa de Pós-Graduaçãoem Performances Culturais (PPGPC/ UFG) e naComunicação Social - Publicidade e Propaganda (FIC/ UFG). E-mail: [email protected] 2 Doutora e mestre em Ciência da Informação (UNB), professora associada da UFG na Faculdade de Informação e Comunicação. E-mail: [email protected] 156

se antes da popularização da gameplay, jogadores se reuniam para jogar em ambientes como os das lan-houses, hoje é comum que eles se reúnam também para assistir tais narrativas audiovisuais. Considera-se que o estudo faça parte das comunidades de prática das Humanidades Digitais, uma vez que se caracterizam pelo conjunto dos paradigmas, know-how e conhecimentos próprios, mobilizando simultaneamente os instrumentos e as perspectivas singulares do mundo digital (Manifesto das Humanidades Digitais, 2018). Neste contexto, são apresentados os conceitos da Inteligência Coletiva no Ciberespaço e grupodidatismo a partir de práticas que emergiram do encontro entre sujeitos. É preciso considerar que muitos desses gamers gradativamente aperfeiçoaram a técnica de captação do áudio e do vídeo na medida em que aprimoraram suas competências narrativas, performáticas e jogabilidade. Assim, uma qualidade de imagem e áudio amadora é associada à gamers que estão no início dos seus canais e, por consequência, a melhora técnica é narrada nos vídeos como sinônimo do seu crescimento e sucesso. Em termos de performance, quanto mais espontâneo o gamer se apresentar diante da câmera, mais autêntica e aceita será sua narrativa. Contudo, tal espontaneidade possui um protocolo expresso pelo linguajar urbano, cosmopolita e de classe média alta. O estudo conclui que, embora segundo Demo (2011, p.57) existam persistentes desigualdades de acesso, a socialidade observada rejeita a hierarquia favorecendo uma zona autônoma sempre aberta de comunicação e produção igualitária. As redes em torno de gameplays possuem como base uma contribuição, em geral prazerosa de dons livres além do sentimento de proximidade de interesses fortalecendo os laços e relações de confiança. Vemos cidadãos comuns se tornando referência, em uma determinada prática, neste caso os jogos, aperfeiçoando suas técnicas de produção e narração contribuindo para a produção de um conhecimento tácito, o qual é fortemente definido pela prática e informalidade, mas não menos importante do que o conhecimento formal, explícito. A gameplay, tal como se conhece foi sendo criada ao mesmo tempo em que os jogadores se descobrem enquanto sujeitos produtores de conteúdo no YouTube. Na análise, o grupodidatismo se expressa, além da produção conjunta com gamers de outros canais, na opinião do público registrada nos comentários e nas curtidas das gameplays. Observa-se, quão importante é para os canais esta avaliação do

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público sobre suas narrativas audiovisuais, que permitem também se obter privilégios junto ao YouTube. Embora tenha se discutido este aspecto em outro momento, tem-se que mais vale a interação entre o canal e os seus fãs, pois é desta interação que emerge o grupodidatismo, ou seja, novos saberes para os youtubers e pistas sobre inovações narrativas que, ao serem produzidas, agradarão aos fãs. Neste aspecto, nota-se que o grupodidatismo no ciberespaço é responsável por inovações em termos de gênero e formatos audiovisuais.

Palavras-chave: Grupodidatismo. Cibercultura.Gameplay. Narrativas.

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POR UMA NOÇÃO DE TRANSPARÊNCIA: EM BUSCA DO REALISMO FOTOGRÁFICO DOS ANOS 1920

Douglas Feitosa Romão1

RESUMO

Com esta exposição objetivamos, por meio de pesquisa bibliográfica, refletir acerca do Realismo na fotografia e como este teria se relacionado historicamente com a legitimação de um aspecto documental da fotografia entendido como “transparente”. Delineamos algumas noções sobre a função da fotografia a partir de Charles Baudelaire como a apropriação da fotografia enquanto instrumento de representação deslocando-a do campo das artes e validando um certo caráter epistêmico que lhe seria intrínseco. Deste modo esperamos refletir sobre alguns processos culturais e regimes de visualidade do início dos anos 1920 como desdobramentos desta interpretação da fotografia centrada na máquina. Em particular analisamos a recepção do argumento realista na Alemanha pela Nova Objetividade, na versão de Albert Renger-Patzsch, cujo fazer fotográfico costuma ser compreendido como elemento constituinte da modernização da fotografia de imprensa e publicitária. A partir da crítica de Charles Baudelaire em Le publicmoderne et laphotographie (1859) onde opõe-se ao uso artístico da fotografia em defesa da arte pictórica, poderíamos obter uma certa compreensão de Realismo e transparência fotográfica ao reservar um lugar de atuação da fotografia nos “arquivos da memória”. Como se a “máquina” traísse a imaginação e certo progresso industrial fomentasse a “estupidez da massa”, que veria arte na imagem fiel à natureza - mesmo que não passasse pelo gênio do artista -, mas não subtraísse a realidade no cálculo racional. Com o auxílio da leitura de Walter Benjamin em Sobre alguns temas em Baudelaire (1939), parece-nos que quanto mais Baudelaire agarra-se a certa experiência das belas-artes tanto mais parece evidenciar seu declínio. Experiência que, em se tratando do campo da Comunicação, numa interpretação benjaminiana, teria sofrido atrofia crescente quando a forma antiga de narrativa foi substituída pela informação e em seguida pela sensação.

1 Doutorando e Mestre em Comunicação do PPGCOM da UFF, Niterói, RJ. Bacharel em Filosofia pela USP, São Paulo, SP. Bolsista CAPES, e-mail: [email protected] 160

Se tomássemos essa experiência da fotografia enquanto informação, seria necessário crer que haveria um valor epistêmico que orientasse a imagem fotográfica mantendo uma fidedignidade à natureza. A fotografia pareceria se uma representação da natureza em si como uma forma não mediada da realidade. O meio seria considerado transparente. Considerando-se que se origina do latim médio no século XIII, como um meio que deixa passar a luz e que deixa ver objetos com nitidez, transparência – transparens, trans- 'através de' + parēre 'aparecer' – não teve seu sentido tão modificado. Significa na atualidade permitir o acesso de algo através de um meio que não apenas não o oculte, mas o torne evidente. Parece-nos, então, que esta característica de transparência seria motivo de especulação na história da fotografia, como elemento fundamental para sua interpretação realista. Sobretudo por conta do dispositivo fotográfico, cuja máquina seria isenta da ação humana garantindo uma certa contiguidade entre um assunto e sua fotografia. Parece ter sido essa a retomada “realista”, por assim dizer, da Nova Objetividade de Albert Renger-Patzsch nos anos 1920. Entre os anos de 1928 e 1930, na Alemanha da República de Weimar, em afinação com a teoria da Sachlichkeit (Objetividade) no campo artístico, a fotografia alemã pressupunha ser capaz de demonstrar a significância estrutural dos objetos que isolava. Assim, num argumento circular sobre a ordem interna do objeto, ela teria objetificado o processo de produção da imagem, tendo por consequência a retirada do elemento subjetivo da fotografia, isto é, supostamente permanecendo apenas o real. Esta tentativa de abordar a fotografia como um instrumento para descobrir o objeto puro poderia nos auxiliar a refletir sobre a uma retomada realista. A produção fotográfica, por exemplo em reportagens, teria passado a concorrer fortemente com a narrativa textual sob a forma visual, como se fosse mais verossímil e narrativa. Assim parece-nos as apropriações da nova objetividade. Essa maneira de produzir fotografia teria criado, segundo Herbert Molderings (1977, p. 83, tradução nossa), a “verdadeira natureza-morta do século vinte: expressão pictórica do fetichismo da mercadoria.”. Como consequência, criando o que se chamou transfiguração estética (Verklärung) por Bertolt Brecht e Walter Benjamin. Para este, no texto “O autor como produtor” (1934) o ímpeto excepcional da fotografia deve-se à sua técnica de publicação, no caso mencionando-se a imprensa ilustrada (BENJAMIN, 2008). Benjamin compara a força revolucionária do dadaísmo na capacidade de

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submeter a arte à prova de sua autenticidade, já que suas naturezas-mortas eram feitas com elementos do cotidiano associados a elementos pictóricos que, quando mostradas ao público faziam a moldura explodir o tempo (BENJAMIN, 2008). Porém, com a modernização da fotografia, esta tornou-se cada vez mais matizada e já não poderia mais fotografar “cortiços ou montes de lixo” sem transfigurá-lo, restando apenas dizer “o mundo é belo”, em alusão ao livro Die weltistschön de Renger-Patzsch publicado em 1928. Para o filósofo, interpretar o fotolivro de Renger-Patzsch seria obter a representação do apogeu da Nova Objetividade. Isto é, na leitura benjaminiana, a obtenção de uma prática que conseguiu transformar a miséria em objeto de fruição, pois teria captado o mundo segundo a moda, alimentando as massas e abastecendo a indústria da comunicação sem modificá-la. Assim ocorrendo, pois seria inevitável atribuir um valor estético, mesmo que ela não fosse artística. Por isso mesmo, fotógrafos como Renger-Patzsch, que seguiam os preceitos da Nova Objetividade, estavam de tal modo interessados nas qualidades estruturais e de uma certa objetificação técnica que teriam sido responsáveis pela criação da fotografia publicitária. Este tipo de fotografia, apesar de seu caráter comercial, ao ver de Renger- Patzsch teria qualidade estética do mesmo modo que uma obra de arte. Essa qualidade fotográfica seria o realismo e a fidelidade de reprodução. Sem se preocupar em concorrer com a arte pictórica para sua legitimação, o fotógrafo alemão afirmava que as artes deveriam ser abandonadas aos artistas, pois o esforço de criar imagens pela qualidade fotográfica, sem alterações, revelava uma natureza que não seria pobre ao ponto de necessitar aperfeiçoamento, como faziam os pictorialistas. Colocava, então, o fotógrafo completamente consciente de um certo fazer. Deste modo, refletir sobre uma noção de transparência parece-nos auxiliar a compreender a retomada de interpretação realista do mundo, sobretudo após a Grande Guerra e a desconfiança acerca dos administradores da informação: o estado e corporações com interesse comercial. Nesta pesquisa vemos o realismo como um conceito multifacetado que, a depender de sua compreensão, apresenta visões de mundo contrastantes e estetizadas como diz Benjamin sobre a forma fascista. Por conseguinte, parece-nos revelar como uma determinada sociedade e periodização histórica representaram a si mesmas com seus regimes próprios de visualidade. Desse modo, pensamos que a autonomização da fotografia em relação ao pictórico pode ter ao

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mesmo tempo caracterizado uma modernidade fotográfica operando uma relação mais poética com as imagens fotográficas.

Palavras-chave: Transparência. Modernidade. Fotografia. Revista Ilustrada. Realismo.

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BABY DRIVER: REMIX COMO NARRATIVA

Dayane Costa Oliveira da Silva1 Lucas Alves de Brito2 Bruna Rafaella Almeida da Costa3 Goiamérico Felício Carneiro dos Santos4 Ricardo Pavan5 Rosana Maria Ribeiro Borges6

RESUMO

Analisa-se o filme dirigido por Edgar Wright, Baby Driver (2017), lançado no Brasil com o nome “Em Ritmo de Fuga”, que conta a história de Baby (Interpretado por AnselElgort), um jovem apaixonado por música e um habilidoso piloto de fuga, coagido a trabalhar pelo maior mafioso da cidade, o Doc (interpretado por Kevin Spacey). Ao apaixonar-se por Debora (Interpretada por Lily James), Baby luta por sua saída do mundo do crime após seu último assalto. O objetivo do trabalho é analisar como o filme utiliza-se do remix como recurso de construção narrativa. A problemática se concentra nos questionamentos levantados pelo cinema contemporâneo e pela utilização de novos métodos de produção dentro da cultura midiática — especificamente, o remix. Como metodologia e instrumento de análise, utiliza-se a Análise Fílmica como proposta por Vanoye e Goliot-Lété (2012) onde, a partir da decomposição das cenas do filme selecionado em seus elementos básicos (frames, uso de trilha sonora, tempo de duração), será possível observar como os recursos sonoros são utilizados na mídia fílmica de forma a construir a narrativa. Em meio a uma miscelânea de produtos no espaço cultural atual, o cinema mantém seu status dinâmico e criativo (LIPOVETSKY; SERROY, 2009), abrindo mão de novas possibilidades técnicas e, assim, mantendo sua vitalidade. Dentre tais possibilidades

1 Mestranda em Comunicação: Mídia e Cultura (UFG). Graduada em Artes Visuais (UFG). E-mail: [email protected] 2 Mestrando em Comunicação: Mídia e Cultura (UFG). Graduado em Comunicação Social: Publicidade e Propaganda (UFG). E-mail: [email protected] 3 Mestranda em Comunicação: Mídia e Cultura (UFG). Graduada em Comunicação Social: Rádio e TV (UFMA). E-mail: [email protected] 4 Doutor em Comunicação e docente do PPGCOM da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected] 5 Doutor em Comunicação e docente do PPGCOM da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected] 6 Doutora em Geografia e docente do PPGCOM da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected] 164

Baby Driver explora os recursos sonoros a partir do remix, criando camadas diegéticas e extradiegéticas (dentro do universo fictício e fora do mesmo, respectivamente) que constituem uma narrativa singular. O termo remix popularizou-se na música através de artistas como Lee “Scratch” Perry no dube Grandmaster Flash no hip-hip, que utilizavam fragmentos de clipes sonoros pré-existentes (chamados de samples) para novas composições (NAVAS, 2012). Entretanto, com os avanços tecnológicos, a popularização e o barateamento da Internet, softwares e novas mídias, as técnicas de apropriação do remix perpassaram o campo da música, atingindo várias práticas culturais e sociais, originando uma cultura doremix que valoriza e potencializa o cortar/copiar e colar, compreendo tais ações como ferramentas criativas que resgatam formas do passado e as reinsere em contextos diferentes. Tanto em produções artísticas como músicas e filmes, como prática do dia-a-dia como escrever em um software editor de texto e utilizar uma rede social o remix está presente. Assim como Lev Manovich (2002) argumenta, o remix da era do software e da “computação cultural” é influenciado pela estética de movimentos como a avant-gardede 1910-1920 e o pós-modernismo com suas montagens e foto-colagens, aproveitando o excesso de informação disponível na época, manipulando conteúdos pré-existentes. Todavia, tais movimentos se diferenciam do remix porque este, ao contrário dos anteriores,não valoriza o contraste, e sim a continuidade e suavidade com que esses conteúdos são rearranjados em novas obras. É cada vez mais difícil distinguir o que é “sample” e o que é “original” em uma nova criação. No filme Baby Driver o remix é um recurso constante e peça fundamental da obra. Observa-se no filme analisado, que para criar uma história, o diretor utiliza o remix em várias camadas da narrativa, divididos em três tipos. Primeiramente, o próprio protagonista é um músico amador que compõe faixas através de samples, utilizando como matéria-prima desde falas do dia-a-dia capturadas através de seu gravador, instrumentos analógicos empilhados em sua casa e trechos de discos antigos que coleciona. Segundo, observa-se que Baby apropria-se de referências culturais que tem contato durante o filme e as utiliza na sua vida, construindo sua própria história através desses fragmentos. Os diálogos escutados em sua televisão, por exemplo, são apropriados em vários momentos do filme. Por último existe o remix por parte do diretor, principalmente com o uso de eastereggs, referências culturais que perpassam a própria diegese do filme que são “sampleadas” na narrativa, retiradas de vários locais como filmes, programas de

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televisão e músicas para compor a história. Tais elementos constituem uma característica específica do cinema contemporâneo de se apropriar de elementos culturais pré-existentes e os ressignificar na tela (LIPOVETSKY; SERROY, 2009). Esses fragmentos também são recursos comuns no que se define por narrativas complexas (MITTELL, 2015), colocados como pequenos desafios para o espectador mais atento, conhecedor da cultura pop, exigindo uma grande atenção cognitiva ao mesmo tempo que gera um prazer a mais em contraste aqueles que não pegaram as referências (JOHNSON, 2005).

Palavras-chave: Narrativa. Audiovisual. Remix. Análise Fílmica.

REFERÊNCIAS

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VANOYE, Francis; GOLIOT-LÉTÉ, Anne. Ensaio sobre a análise fílmica. 7. ed. Campinas: Papirus, 2012.

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SWORDSWOMAN: A REPRESENTAÇÃO DA MULHER ESPADACHIM NAS SÉRIES VIKINGS E GAME OF THRONES

Larissa Farias Vieira1 Sálvio Juliano Peixoto Farias2

RESUMO

Com a difusão da televisão por assinatura e a disponibilidade dos serviços on demand e streaming pela internet, as séries – narrativas seriadas – tem ganhado crescente popularidade. Salientamos, dentro dessa gama de opções, para fins de delimitação temática e de objeto de análise, as séries épicas: Vikings e Game of Thrones. Dentro desses universos narrativos nos voltamos para a observação e reflexão a respeito da representação da mulher espadachim, no caso, a personagem Lagertha Lothbrok, em Vikings, e Brienne of Tarth, em Game of Thrones. E por meio dessas personagens entender o que essa representação nos diz a respeito da associação da força física e a emancipação (empoderamento feminino) dessas mulheres, ou se essa associação reforma estereótipos de gênero. Assim como, analisar até que ponto a masculinização – no sentido de que essas mulheres estão tomando características tidas como masculinas – é uma visão construída pela normatividade de gênero e de que maneira as personagens conquistam relevância narrativa por meio da incorporação dessas características. Para além disso, explorar como o exercício de papéis tradicionalmente masculinos interfere no processo de construção da identidade de Lagertha Lothbrok e Brienne of Tarth e como isso afeta a suas relações com as personagens que desenvolvem papéis tradicionalmente femininos. Por fim, problematizar a questão do empoderamento por meio do desprezo das características relacionadas ao feminino em detrimento das características masculinas. O embasamento teórico para a compreensão e observação da temática, se deu pelo encontro entre os Estudos Fílmicos – que perpassam a televisão e a produção audiovisual como um todo – e os Estudos de Gênero dos quais surgiram pesquisas voltadas à compreensão da maneira como os papéis femininos são representados ao longo da história do cinema e da televisão. Buscando compreender as significações e ressignificações que as personagens mulheres reverberam dentro das narrativas.

1 Graduanda do Curso de Comunicação Social – Jornalismo da Universidade Federal de Goiás. e-mail: larissa [email protected]. 2 Professor e Mestre em Artes Visuais e Comunicação Visual, e-mail: [email protected]. 167

Para os fins da execução da análise foram aplicadas a análise fílmica, que teve por objetivo um exame mais profundo do produto audiovisual – séries – e de suas características poéticas e estéticas e da forma como ela se inscreve na tradição e história cinematográfica (FRANÇA, 2002, p. 60-61). Essa análise se deu em duas etapas: em primeiro lugar decompor, ou seja, descrever e, em seguida, estabelecer e compreender as relações entre esses elementos decompostos, ou seja, interpretar (VANOYE, 1994 apud PENAFRIA, 2009, p.1). Uma vez que essa pesquisa foi composta pela análise de um produto audiovisual, a análise documental fez-se necessária por trazer a identificação, a verificação e apreciação de documentos (MOREIRA, 2005, p. 271-272) permitindo verificar o teor e o conteúdo do material selecionado para análise. E muito mais que localizar, identificar, organizar e avaliar textos, som e imagem, esse método funcionou como estratégia eficaz para contextualizar fatos, situações, momentos. E dessa maneira, conseguimos introduzir novas perspectivas em outros ambientes e construir diálogos entre as personagens sem deixar de respeitar a substância original dos documentos. (MOREIRA, 2005, p. 276) Ao fim da pesquisa, constatamos que Lagertha Lothbroke e Brienne of Tarth são representadas enquanto assumem posições de poder e autonomia. Acerca disso a provocação de Kaplan (1995, p. 51) reverberou durante todo o processo: quando uma mulher espadachim está na posição dominante, ela assume uma posição masculina? Lagertha e Brienne parecem negociar essa noção de representação dominante masculina quando se comportam ou enunciam como seus congêneres espadachins. Contudo quando se toma a noção de performance em Butler (2003) nos dá uma alternativa sobre como observar e analisar essa postura. Uma vez que, as formas como elas representam pode ser ressignificação de comportamento. Ainda assim, esse caminho tem potencial subversivo real? Seria essa paródia realmente libertária e progressista? Ou elas estariam apenas travestindo e reverberando os discursos normativos e estereotipados. Diferentemente do que foi observado por Kaplan (1995, p. 59) em sua análise do cinema hollywoodiano, que demonstrava “amplamente as formas pelas quais os mitos patriarcais funcionam para situar a mulher como silenciosa, ausente e marginal”, essas duas heroínas mostraram que apesar de falhas em alguns níveis de representação, tem vozes, são fortemente presentes e conquistam espaços de protagonismo (mesmo que ainda não um protagonismo completo) nas narrativas. Contribuindo para a

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desconstrução dos padrões culturais e linguísticos a respeito das oposições dominador(ativo) e submisso(passivo). Ao observar a representação física das personagens, a swordswoman Brienne é vista como uma mulher sem os atrativos físicos esperados de uma mulher e por consequência, assexualizada e abdicando de seu título de “dama” nobre para poder seguir o caminho que deseja. Ainda assim, esse caminho é em prol de servir alguém a todo tempo. Enquanto Lagertha parece ser seu extremo oposto nesse tipo de personagem, ela é convencionalmente vista como uma mulher bonita e sexualmente desejável, e por meio da sua habilidade enquanto guerreira e ser alguém estimado socialmente ela não só almeja, mas consegue conquistar os títulos sociais mais altos de sua sociedade. E partindo do pressuposto de que as “representações não apenas são múltiplas, mas elas podem, também, se transformar ou se contrapor” (LOURO, 2003, p. 102), a representação de Lagertha foi fundamental. Uma vez que para além de swordswoman, ela associa e concilia diferentes características de identidade, como a maternidade e seu posicionamento sexualmente agressivo. Sua performance de swordswoman não significa uma identidade fixa – estereotipada –, essa personagem constrói suas significações do decorrer da sua jornada. Nesse ponto Brienne apresentou um abandono quase total daquilo que normativamente a caracterizaria como uma mulher – ela ainda apresenta traços de inocência estereotipadas. Lembramos que ambas produções são de autoria e produção masculina. O fato dessas narrativas terem proporcionado o aparecimento e o trânsito dessas personagens a posições de destaque não significa que suas representações estão preocupadas em trazer características empoderadoras, subversivas ou uma alternativa à narrativa machista/misógina. Mas não se pode negar que são reformas nas conjunturas clássicas de narrativas e mostram que a demanda do público (movimentos e teóricas feministas) surte efeito e tem gerado mudanças.

Palavras-chave: gênero, representação, swordswoman, séries.

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A POSE FOTOGRÁFICA NOS RETRATOS DOS ÁLBUNS DE FAMÍLIA: UMA PROPOSTA DE CRUZAMENTO DE IMAGENS

Rafael Delfino Rodrigues Alves1 Ana Rita Vidica Fernandes2

RESUMO

Este artigo busca pensar as relações das poses fotográficas dos retratos de família, a partir do cruzamento de imagens entre fotografias veiculadas em álbuns de família impressos, perfis de redes sociais, retratos de anúncios publicitários e outras fontes a fim de refletir sobre como “fenômenos” da fotografia, especificamente as poses fotográficas, podem criar um “sistema de pensamento” dessas imagens. Embora exista uma diferença das mídias escolhidas e do tempo em que foram realizadas, como estes meios criam um sistema de pensamento através das poses do retrato fotográfico da família? Parte-se da discussão teórica proposta por EtienneSamain (2012) que considera a existência de uma vida própria às imagens, acreditando que por meio de “fenômenos” elas possam criar um “sistema de pensamento”. Para estabelecer relações possíveis entre as poses fotográficas em diferentes mídias de diferentes épocas, propõe-se um cruzamento de imagens, alinhando-se à proposta conceitual-metodológica de Didi- Huberman (2013), que faz uma atualização/releitura dos processos de produção dos Atlas Mnemosyne de WarburgAby. A partir disso, Didi-Huberman propõe a realização de “cruzamentos”, “montagens” e “agrupamentos”, que neste trabalho será realizado com retratos da família para perceber como as poses fotográficas se relacionam ao longo do tempo e em diferentes mídias. Ambos os autores compreendem a imagem como portadora de um pensamento, que pode ser acessado ao olhar um agrupamento de imagens, cruzando-as e percebendo as suas possíveis relações. Segue-se esta perspectiva, a fim de refletir sobre as poses presentes nos álbuns de família cruzando-as entre si e com outras imagens.

1 Mestrando em Comunicação pelo Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal de Goiás, [email protected] 2 Doutora em História pela Faculdade de História-UFG (2017) com doutorado sanduíche na École dês Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS-Paris), professora do Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal de Goiás, [email protected] 173

A escolha do objeto de estudo, poses fotográficas da família, tanto em álbuns de família impressos, quanto em publicações de aplicativos midiáticos sociais online e outras mídias em que a fotografia possa estar presente, deve-se à sua relevância social, histórica e cultural para a compreensão da relação que as imagens criam em um universo de fenômenos e significações. O retrato de família, que segundo Leite (2001, p. 77), é encarado como um documento fotográfico que leva em consideração o tratamento com a imagem, o seu trato, uma tentativa de extrair e ao mesmo tempo tratar o que há de mais importante nas relações familiares de uma época. Enquanto Silva (2008, p. 177), em uma atualização desta temática, questiona a construção do retrato, do álbum e da própria definição de família no século XXI, pensado também em sua aplicação em dispositivos no universo digital e das redes sociais. Ao perceber como o retrato de família insere-se em diferentes mídias na atualidade e em alguns casos dialoga com poses fotográficas de uma estética de álbuns de família impressos, pensou-se na relação que essas imagens podem criar em um sistema para o retrato familiar. O desenvolvimento do artigo se dará, portanto, a partir de uma apresentação conceitual sobre retrato de família e seus possíveis álbuns, através de Leite (2001) e Silva (2008), além da discussão específica sobre as poses e os trejeitos no retrato e em fotografias familiares, encontrada em Turazzi (1995) e em Muaze (2006). Essa discussão se liga à metodologia do cruzamento de imagens proposto por Didi- Huberman (2013), por meio da escolha de uma amostra de uma família e a relação que o arquivo documental fotográfico têm com várias outras mídias que apresentam o retrato e outras referências da fotografia envolvendo famílias. Os critérios da escolha desta família foram feitos em relação à pais/mães que recentemente criaram um perfil para seus filhos/filhas em uma rede social, como exemplo o Instagram, e que ao mesmo tempo também apresenta álbuns de família impressos ou retratos de família com fotos de suas infâncias, assim como da infância de seus antepassados, com a presença de várias gerações (avôs/avós, pais/mães e netos/netas, como exemplo prático). Pautados na literatura apresentada e com uma amostra apresentada, na discussão teórica e metodológica, o objetivo desta produção científica é compreender o processo dialógico e de “pensamento das imagens” nos tempos da história e em diferentes

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dispositivos midiáticos, comparando como é construído um sistema de “pensamento das imagens” em relações, especificamente, às poses fotográficas do retrato de família. Assim, por se tratar de uma análise que fica entre a objetividade e subjetividade das imagens, as expectativas conclusivas são pautadas em uma inicial compreensão de como os retratos da família se relacionam por meio das poses fotográficas que criam ideais de construção da família por meio das imagens, que podem se relacionar independentemente de épocas e plataformas midiáticas.

Palavras-chave: Retrato de Família. Pose fotográfica. Álbum. Pensamento das Imagens. Cruzamento de Imagens.

REFERÊNCIAS

DIDI-HUBERMAN, Georges. A imagem sobrevivente: história da arte e tempo dos fantasmas segundo AbyWarburg. Rio de Janeiro: Contraponto, 2013.

LEITE, Miriam Moreira. Retratos de família: leitura da fotografia histórica. 3. ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2001.

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SAMAIN, Etienne (org.). Como pensam as imagens. Campinas: Editora da Unicamp, 2012.

SILVA, Armando. Álbum de família: a imagem de nós mesmos; tradução Sandra Martha Dolinsk. São Paulo: Editora Senac, 2008.

TURAZZI, Maria Inês. Poses e Trejeitos: a fotografia e as exposições na era do espetáculo (1839-1889). Rio de Janeiro: Funarte; Rocco, 1995.

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STAR WARS E AS NOVAS CONFIGURAÇÕES NARRATIVAS NO CINEMA

Dayane Costa Oliveira da Silva1 Luiz Carlos Siqueira Filho2 Goiamérico Felício Carneiro dos Santos3

RESUMO

O artigo se propõe a discutir alguns aspectos das configurações narrativas do cinema contemporâneo, especificamente questões que tangenciam o papel do subjetivo nas narrativas cinematográficas da última década. Com o avanço tecnológico e uma modificação da própria essência do cinema, somos impactados com narrativas que apostam na subjetividade do espectador e sua subsequente subversão de expectativas para a construção de um discurso narrativo contemporâneo. Através da construção narrativa que é perpetuada no meio social, somos capazes de materializar ideias, registrar nossas existências, nos identificarmos e nos comunicar. Perpassando a oralidade face a face, a escrita e a distribuição em série a partir da prensa de Gutemberg, o rádio, a televisão, o cinema e a internet, estamos rodeados por informações transpostas em narrativas e dissipadas no imaginário. Enquanto mídia de produção e distribuição em massa, o cinema constrói, a partir do audiovisual, narrativas capazes de dialogar com o espírito do tempo em que estão inseridas, perpetuando imaginários coletivos. Os estudos da comunicação também vêm atrelados ao contexto sócio-histórico em que estão inseridos. Incertezas, questionamentos contínuos e paradoxos permeiam tanto o ethoscontemporâneo quanto os levantamentos teóricos escolhidos, o que torna a pesquisa um ser pulsante, em constante mudança. Tendências podem ser apontadas, com um diálogo aberto às mais complexas variáveis. A partir de alguns apontamentos de Lyotard (2015), discutiremos alguns elementos acerca da contemporaneidade e da subjetividade presente em seu ethos, transposta em narrativas. Por outro viés, observamos por Lipovetsky e Serroy (2009) levantamentos sobre o espaço do cinema na contemporaneidade, em um contexto de produção que abrange a última década. Por fim, trazemos Legros et al (2014) e Silva

1 Mestranda em Comunicação pelo PPGCOM/UFG. E-mail: [email protected] 2 Mestrando em Comunicação pelo PPGCOM/UFG. E-mail: [email protected] 3 Pós-doutor em Comunicação pela Unisinos, professor da linha Mídia e Cultura do PPGCOM/UFG. E- mail: [email protected] 176

(2012) e suas considerações acerca do imaginário – suas tecnologias, dentre elas o cinema, e seu papel na construção de mitos. Sabe-se que, para os gregos, os mitos eram uma forma de pensamento, contendo a verdade em sua verossimilhança, nascendo na esfera do sagrado e exprimindo-se, em tempo e espaço determinados, em forma de narrativa, dotada de linguagem simbólica. Assim, através de uma pesquisa bibliográfica, do tensionamento entre tais autores, e por meio de uma perspectiva narratológica, que tem por intuito o estudo de narrativas, propomos discutir o status das narrativas cinematográficas na contemporaneidade, seus entrelaçamentos com o imaginário coletivo e sua posição dentro de uma cultura de massa. Para ancorar os conceitos apresentados, utilizaremos como objeto focal Star Wars: O Despertar da Força (2015), sétimo episódio da saga Star Wars (1977-atualmente). Através de filmes espalhados ao longo de quatro décadas, a franquia apresentou narrativas de cunho mítico, inspiradas deliberadamente na obra de Campbell (2007) e seu conceito de monomito, ao qual se atém na jornada heroica composta pelos rituais de passagem separação, diante do qual o personagem heroico se aventura em uma região desconhecida, frequentada pelo sobrenatural, iniciação, que se revela por meio de uma vitória obtida com dificuldade e retorno, no qual o personagem heroico retorno dotado do poder de levar benefícios aos seus semelhantes. Tratando-se de um produto cultural de massa, podemos visualizar questões interessantes em sua narrativa. Ao longo de quatro décadas, observamos temas que refletem o tempo em que foram produzidos: a primeira trilogia, na década de 1980, apresenta a partir de uma narrativa otimista, questionamentos acerca do pós-Guerra; a segunda trilogia, no início da década de 2000, explora a ascensão da tecnologia e questões como a clonagem; a terceira trilogia, em curso, discute as questões da identidade a partir da subversão do arquétipo heroico. Assim, como se faz perceptível a partir da relação das obras com o tempo em que foram produzidas, a franquia de filmes da saga Star Wars evidencia uma das funções do mito, a de propiciar histórias que se revelem como uma busca de sentido, através dos tempos, para a experiência humana. Embora a construção mítica em Star Wars seja um assunto debatido no campo acadêmico a partir de estudos estruturalistas e mitocríticos, aqui nos propomos a pensar o objeto por outra perspectiva: buscamos compreender, a partir de O Despertar da Força, filme da terceira trilogia da saga, as possibilidades de transformação desta narrativa clássica dentro de um contexto contemporâneo atual e tangível, onde a

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fragmentação e a contradição pela subversão do arquétipo heroico, atravessam o meio social e são refletidas nos produtos culturais – em questão, no cinema.

Palavras-chave: Star Wars. Narrativa. Audiovisual. Mito.

REFERÊNCIAS

CAMPBELL, Joseph. O herói de mil faces. São Paulo: Pensamento, 2017.

LEGROS, Patrick; MONNEYRON, Frédéric; RENARD, Jean-Bruno; TACUSSEL, Patrick. Sociologia do imaginário. 2. ed. Porto Alegre: Sulina, 2014.

LIPOVETSKY, Gilles; SERROY, Jean. A tela global: mídias culturais e cinema na era hipermoderna. Porto Alegre: Sulina, 2009.

LYOTARD, Jean-François. A condição pós-moderna. Rio de Janeiro: José Olympio, 2015.

MORIN, Edgar. Cultura de massas no século XX: espírito do tempo 1: neurose. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011.

SILVA, Juremir Machado da. As tecnologias do imaginário. 3. ed. Porto Alegre: Sulina, 2012.

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A DESCRIÇÃO IMAGÉTICA NA HASHTAG #PRACEGOVER: UMA ANÁLISE A PARTIR DA RELAÇÃO ENTRE TEXTO E IMAGEM

Lorrayne Caroline dos Santos1 Magno Luiz Medeiros da Silva2

RESUMO

O objetivo deste estudo consiste em compreender de que forma a descrição imagética é utilizada na construção da hashtag #PraCegoVer em publicações no Facebook das marcas, Samsung e Quem disse Berenice?. Estas marcas foram selecionadas em decorrência da utilização da hashtag #PraCegoVer, com a premissa de incluir o deficiente visual nas mensagens comunicacionais das suas fanpages. “A hashtag consiste em uma categorização de conteúdos publicados nas redes socias, que possibilitam aos integrantes da rede uma interação dinâmica do conteúdo, que estão ou são interessadas no respectivo assunto publicado”. Sendo assim, esta pesquisa baseou-se na seguinte problemática: “Como as marcas utilizam a descrição imagética na hashtag #PraCegoVer em suas fanpages?”. A hashtag #PraCegoVer é uma ação comunicacional de disseminação da cultura da acessibilidade nas redes sociais, e tem por princípio a audiodescrição de imagens para a apreciação de pessoas com deficiência visual. O projeto foi idealizado pela professora Baiana Patrícia Silva de Jesus, conhecida como “Patrícia Braille”, ele foi criado como uma estratégia de inclusão para pessoas com deficiência visual que, utilizam o Facebook e outras redes sociais com o auxílio de programas leitores de tela, capazes de transformar em áudio o conteúdo textual da internet. Contudo, os leitores leem somente caracteres e não pixels. Neste sentido, a estratégia surge da necessidade de transformar a imagem em elementos textuais, por intermédio da descrição, para que os leitores de tela consigam transmiti-las às pessoas com deficiência visual. A ação, além de visar incluir o deficiente visual nas postagens nas redes sociais tem o intuito de conscientizar os diversos públicos das marcas para a necessidade de mecanismos capazes de incluir a pessoa com deficiência visual na sociedade.

1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Comunicação na Linha de Pesquisa em Mídia e Cidadania, da Faculdade de Informação e Comunicação FIC-UFG, email: [email protected] 2 Professor Doutor do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Faculdade de Comunicação e Informação FIC-UFG, email: [email protected] 179

Considerando a caracterização qualitativa da pesquisa, a investigação foi realizada a partir de uma pesquisa bibliográfica, em qual se estabeleceu uma discussão conceitual da relação entre texto e imagem, a partir do conceito de imagem de Santaella e Noth (2005), a relação entre texto e imagem de Barthes (1990) e alguns elementos constitutivos da análise de imagem proposto pela Joly (2007). Nesse sentido, optou-se pela união da pesquisa bibliográfica e da análise estabelecendo uma relação entre texto e imagem, a fim de compreender como as marcas estão utilizando a hashtag #PraCegoVer como estratégia comunicacional para os deficientes visuais. Na análise das postagens foram utilizados alguns elementos presentes na metodologia da Martine Joly (2007) de análise de imagem e os conceitos de Barthes (1990) para compreender a relação entre a descrição, composta de elementos textuais com as especificações das imagens analisadas, a fim de identificar os elementos constitutivos presentes na construção da estratégia comunicacional. A análise das postagens das marcas e o estudo de sua efetividade comunicacional permitiu a compreensão implícita global das mensagens. A partir da análise foi possível perceber que as marcas que utilizam a hashtag #PraCegoVer, não possuem a mesma abordagem na descritivas das imagens. No caso das duas postagens analisadas é possível perceber algumas diferenças marcantes na forma de descrição realizadas pelas marcas.Posteriormente a coleta de informações para a construção do referencial teórico e diversas leituras sobre a temática da publicidade inclusiva, mais especificadamente sobre a utilização da hashtag #PraCegoVer como uma estratégia comunicacional, foi possível perceber por intermédio da análise, que a estratégia não possui parâmetros de aplicabilidade, uma vez que cada marca possui uma forma diferente de realizar a descrição das imagens. Após e análise e a percepção sobre a aplicabilidade da estratégia. Chega-se à conclusão de que a publicidade vende significados, valores, sensações, entre outro, tendo como objetivo final o consumo. Ela procura despertar o desejo nos consumidores a fim de que eles adquiram os bens e os serviços propagados no momento da divulgação. Portanto, a publicidade é uma estratégia pautada pelos estímulos dos sentidos, sensações e emoções. Dentro desta perspectiva, percebe-se que o deficiente visual não possui nesta estratégia a possibilidade de se encantar com a beleza das postagens e das sensações transmitidas por meio da imagem que possuem carga simbólica ilimitada, capaz de emocionar, influenciar, conquistar, seduzir e

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encantar o receptor, pois as descrições imagéticas são realizadas de maneira racional, superficial e informacional. Por fim, compreende-se por intermédio das análises que mesmo se tratando de uma estratégia que vise a inclusão da pessoa com deficiência a utilização da hashtag #PraCegoVer realiza uma abordagem racional, descrevendo apenas elementos visuais daquilo que constitui a imagem. Sem levar em consideração o processo de sedução, a criatividade a interatividade, princípios este que regem a construção das mensagens publicitárias.

Palavras-chave: Comunicação. Imagem. Descrição. Deficiente Visual. PraCegoVer.

REFERÊNCIAS

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CHIACHIRI, Roberto. O poder sugestivo da publicidade: uma análise semiótica. São Paulo: Cengage Learning, 2011.

JOLY, M. Introdução à análise de imagem. 11. ed. São Paulo: Papirus, 2007.

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SPINA, Felipe. Facebook Marketing. 2. ed. São Paulo: Independent, 2012. 181

A TWITCH COMO MEIO EMISSOR DE UMA MENSAGEM

Lara Lima Satler1 Cristian Vargas de Sousa Neves2

RESUMO

Este texto é um desdobramento do plano de trabalho de iniciação científica de título “A Twitch como forma de manifestação do audiovisual na web”, que está vinculado à pesquisa "Grupodidatismo de youtubers: Em época de espetáculo do eu, cabem narrativas coletivas?", realizada na Universidade Federal de Goiás, e busca entender a plataforma de streaming Twitch como um meio, teorizado por Marshall McLuhan. A interface vem de um spin-off, ou seja, uma derivação do site de transmissões ao vivo Justin.tv, a Twitch herda a forma lifecasting de narrar, sendo esta uma experiência de narrativa da vida cotidiana em tempo real que age abastecendo a demanda de um público de jogadores específicos que anseiam por um espaço que une a narrativa audiovisual sequenciada com os jogos, sendo esse público os gamers. O foco principal é a distribuição desse conteúdo via streaming. Através de sua própria rede consegue emitir e receber as informações ao mesmo tempo em que as repassa ao usuário de jogos em tempo real, incluindo transmissão de competições de eSports, esportes eletrônicos, além de conteúdos criativos de caráter ao vivo como os talk shows. Compreender a Twitch como um meio, levando em consideração os escritos de Marshall McLuhan (1993), em Os Meios de Comunicação Como Extensões do Homem, possibilita discutir como se dá a relação presente entre produtor e participante de um canal de transmissão dentro da interface, e consequentemente como é moldado seu conteúdo. Para isso é necessário entender que um meio, segundo Adriana Braga (2012), é tecnologia. Tomar a interface de transmissão de games em estudo como um meio, ou melhor como uma tecnologia, é dizer que ela consiste em um software de livestream

1 Pós-doutorado em Estudos Culturais (PACC/ UFRJ, 2018); DoutoradoemArte e Cultura Visual (FAV/ UFG,2016). Professora Adjunta da Universidade Federal de Goiás, no Programa de Pós-Graduação em Performances Culturais (PPGPC/ UFG) e na Comunicação Social - Publicidade e Propaganda (FIC/ UFG). E-mail: [email protected] 2 Bacharel em Publicidade e Propaganda pela Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected] 182

com foco específico em conteúdo relacionado a jogos. Separando os termos para melhor compreensão, entende-se que a Twitch como um software“congrega a capacidade de lidar com informações. A partir daí, processa instruções sobre tarefas possíveis de realizar. Como consequência, desdobra ações concretas aptas a produzir efeitos” (LADEIRA, 2016, p. 4). Pensando a plataforma como uma livestreamé valoroso definir os vocábulos livee stream separadamente. Stream, em um contexto técnico é um “Processo de distribuição de conteúdos, via Internet, em que o utilizador inicia a sua visualização sem necessidade de fazer download dos ficheiros que constituem os conteúdos” (ADÃO, 2006, p. 21). O termo live, neste âmbito, pode ser traduzido por “ao vivo”. Associando então os dois termos à tecnologia empregada na Twitch, esta é uma plataforma capaz de executar uma ação programada, ou seja, que transmite o conteúdo armazenado em seu servidor para os usuários ativos. Porém seu diferencial está na sentença live, pois a Twitch faz a ponte entre o computador do streamere o de quem assiste. Enquanto o gamer envia seu conteúdo audiovisual em tempo real para o site, o usuário já o recebe em sua máquina também em tempo real, antes mesmo de ser armazenado no servidor. Retornando aos escritos de Marshall McLuhan, o acadêmico diz que todo meio emite uma mensagem. A mensagem que o meio exibe não deve ser confundida com o conteúdo dele, como apresentado por McLuhan quando questionado em uma entrevista ao programa australiano Monday Conference, em 1977, sobre a relação do conteúdo da televisão e da mensagem da mesma, “o efeito desse grande ambiente de serviço em você é vasto, enquanto o efeito do programa é incidental” (MCLUHAN, 1977). Isto é, a mensagem tem grande impacto, tanto na sociedade quanto no indivíduo, enquanto o conteúdo é incidente, ou secundário. Assim, após discutir a Twitch como um meio e a tecnologia streamque ela engloba, sua mensagem se torna clara. A mudança no padrão comportamental dos consumidores de conteúdo audiovisual na internet, pela plataforma, está na sua palavra- chave live, como mencionado anteriormente. A conexão entre o streamer, aquele que constrói o conteúdo, e o usuário, que o consome, é oferecida pelo ao vivo, o que torna a prática dentro da Twitch muito mais ativa. No momento em que a narrativa audiovisual está sendo construída há a interação e interferência de seu público, quase que um feedback instantâneo sobre o que está

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sendo produzido, de seus consumidores ativos. Concluindo que essa ponte, que o “ao vivo” gera, a interação, é a sua mensagem, que impacta na forma que a interface se organiza e seu conteúdo é formado.

Palavras-chave: Audiovisual na web; streaming; plataforma; Twitch.

REFERÊNCIAS

ADÃO, Carlos. Tecnologias de Streaming em Contextos de Aprendizagem, Universidade do Minho, Guimarães, 2006.

BRAGA, Adriana. McLuhan entre conceitos e aforismos. In: ALCEU - v. 12 - n.24 - p. 48 a 55 - jan./jun. 2012.

LADEIRA, João Martins. A Organização Do Streaming No Brasil: telmex, globo e a associação entre telecomunicações e audiovisual, Revista Da Associação Nacional Dos Programas De Pós-graduação Em Comunicação, Brasília, v.20, n.1, jan./abr. 2017.

MCLUHAN, M. Entrevista concedida ao programa MondayConference. Disponível em:. Acesso em: 2 jun. 2018.

MCLUHAN, M. Os meios de comunicação como extensões do homem. São Paulo: Cultrix, 1993.

MONTAÑO LA CRUZ, Sonia. Plataformas De Vídeo: Apontamentos para uma ecologia do audiovisual da web na contemporaneidade, Universidade Do Vale Do Rio Dos Sinos, São Leopoldo, 2012.

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ENTRE UTOPIAS E DISTOPIAS: UMA ANÁLISE DO DOCUMENTÁRIO KOYAANISQATSI – UMA VIDA FORA DE EQUILÍBRIO.

Alexandre Tadeu dos Santos1

RESUMO

O presente trabalho propõe colocar em análise o documentário poético Koyaanisqatsi a partir do percurso gerativo de sentido, método de análise de texto proposto pelo semioticista Algirdas Julien Greimas (1979). O filme foi dirigido por Godfrey Reggio e produzido por Francis Ford Coppola em 1983. Por se tratar de uma obra que faz uso da linguagem não verbal, o desafio é produzir sentido buscando compreender o que as imagens procuram nos dizer sem o uso convencional da linguagem verbal. O referido percurso é estruturado em três níveis interdependentes chamados de fundamental, narrativo e discursivo. No nível narrativo operam-se transformações ocasionadas pelos sujeitos, ocorrem ações capazes de levar a história adiante. No caso de Koyaanisqatsi esses sujeitos são representados pelos elementos básicos da vida: terra, água, fogo e ar e também pelo próprio homem e pela máquina. No nível discursivo, no qual o sujeito da enunciação cria mecanismos discursivos para criar efeitos de realidade, ancora-se o texto no tempo, espaço e pessoas, em outros termos, é o nível interpretativo, no qual os leitores assumem o texto e criam discursos para tentar explicar e compreender as complexidades do texto; e o fundamental, quando as ideias são organizadas em oposições que são naturalmente contrárias, como, por exemplo, Vida versus Morte, oposição muito presente no filme. Dos três níveis, o que mais se aproxima de nosso principal ponto de reflexão é o nível fundamental, uma que vez que ele é caracterizado por oposições semânticas mínimas e nos ajuda a tentar compreender os mecanismos de funcionamento e a formação de hierarquias entre as oposições. Dito de outro modo, em qualquer produção de discurso, é possível apontar, através do texto, ideias que se chocam porque são contrárias ou contraditórias. Como aporte teórico-metodológico partimos da definição de documentário e de seu subgênero: documentário poético tal como definiu Nichols (2007). Além do modo poético, segundo o autor, o documentário pode ser classificado como expositivo, observativo, participativo, reflexivo e performático. O filme foi montado a partir de imagens de arquivo de lugares do Estados Unidos no início da década de 1980 e é considerado por muitos críticos como filme cult e extremamente relevante para a história do cinema. Esta necessidade

1 Doutor em Ciências da Comunicação pela ECA-USP, professor adjunto do Curso de Publicidade e Propaganda – FIC – UFG, e-mail: [email protected] 185

humana de apreender o “real” em mecanismos imagéticos sempre esteve presente nas diversas possibilidades de linguagem e, obviamente, não é exclusividade dos documentários, das imagens em movimento. A fotografia, por exemplo, funciona como um referente: arquiva traços indiciais da realidade. A priori, o que a fotografia registrou, de fato, aconteceu. Mesmo na era pré-fotográfica, o homem buscava registrar o que percebia através da pintura, na qual hábitos, costumes, registros de família eram retratados e que servem, até hoje, como documentos históricos e testemunhas de uma época. Com o surgimento das imagens em movimento (cinema) no século XIX, o registro do “real” passou a ser feito por essa nova modalidade de mediação de registro de imagens. Em 1898, os fatos de grande relevância como guerras, batalhas, dos quais as câmeras fotográficas não tinham registrado imagens, foram recriados. D.W. Griffith e outros importantes diretores de Hollywood se interessaram nos anos vinte 20 a reconstituir eventos históricos e bíblicos. E é exatamente esse interesse em reproduzir a história em imagens que, anos depois, a cinematografia convencionou chamar de documentário. A partir de então, o texto buscará respaldo, principalmente, na teoria semiótica do texto investigada por Barros(2000) e de elementos de análise do discurso conforme defende Fiorin (2009). Koyaanisqatsi é um filme que trabalha muito com a ideia de progresso e destruição, vida e morte, paz e guerra e sanidade e loucura, entre tantas outras ideias opostas. Nesse sentido, o filme nos faz supor a existência de um lugar distópico, extremamente desequilibrado, é como se a todo momento a humanidade se encaminhasse para um fim. Com efeito, o presente artigo propõe também colocar em diálogo com a análise a noção de utopia e distopia tal como proposta por Berriel (2005). Em uma análise preliminar é possível afirmar que, entre outras questões, o filme Koyaanisqatsi trata das relações turbulentas entre o homem e a natureza. O filme nos sugere que da mesma forma que o homem é dotado de inteligência para construir e contribuir com o progresso científico, ele é capaz de destruir a natureza e os materiais que cria em questões de segundos através de artefatos químicos e, por fim, nos leva a compreender que o progresso pode levar ao desenvolvimento tecnológico, mas que pode trazer danos irreparáveis à natureza. Como resultado, espera-se que a presente investigação traga contribuições significativas ao campo de análise de imagens ao colocar em uso o percurso gerativo de sentido, tradicionalmente utilizado para análise de texto verbal, como método de análise de textos audiovisuais.

Palavras-chave: Documentário. Utopia. Distopia. Koyaanisqatsi.

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REFERÊNCIAS

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VOLLI, Ugo. Manual de Semiótica. São Paulo: Edições Loyola, 2007.

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