INSTITUTO

Hl STCRICO da llh a Terceira

BOLETIM

HISTóRICO-DA o r-í

/

N.0 6 1948

BOLETIM D O

INSIITUÍD IISTÓiO DA ILDA TERCEIRA

Vol. VI 1948

Nola e documentos sobre o comércio de

La Rocbelle com a Teiceira no século XVII

Pelo Dr. JULIÃO SOARES DE AZEVEDO

Já noutra ocasião procurei coligir alguns elementos para a histó- ria do comércio francês nos Açores, durante o século XVII (') Êste comércio, que não se sabe ainda em que época foi mais im- portante, estava, no entanto, no início do século XV1I1, em franca de- cadência. É pelo menos êste o parecer de Savary (2). As cidades de La Rochelle, Nantes e Marselha que, segundo êste autor, mandavam nos tempos atrás, grande quantidade de navios às Ilhas, passaram a enviá-los a outras terras. Desde o restabelecimento da paz entre Por- tugal e a França pelo Tratado de Utrecht (1715) até à data em que escrevia Savary (17171, apenas teriam vindo aos Açores 4 ou 5 em- barcações francesas. A decadência proviria da instalação, em S. Mi- guel, de indústrias de tecidos e chapéus que, utilizando mão de obra francesa, passaram a fazer concorrência, com vantagem de preço, às mercadorias do mesmo género com que a França abastecia os mer- cados açoreanos. Alguma seda francesa que aparecia era importada de Lisboa. Além de outros, não indicados por Savary, há um factor desta decadência que convém mencionar.

(i) «Revista Portuguesa de História», tomo III. P) «Dictionnaire Universel de Commerce", Paris, 1732, pág. 1086 ~ 87. 2 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

dOCU, entos adea . franiTv^"franceses vmham carregar à Terceira,!l ^ pelo menos^ sena transcrevem,parte do século os

a ReSta raÇã0 r nc a rne pZélToprivilegio (7o() ou as frotasf " aqui' Pdeixavam.' 'P ' nte açúcar, que os navios do

643 56 come ou a fa Franc^sasÍfpM() que se Ttornou necessárioÇ , bricaraos dirigentesaçúcar nas da AntilhasFranca proteger a produção dos seus domínios de Alem Mar. Sao conhecidas as tarifas protectoras de Colbert de 1664 e 1667

Oo ataçúcar rr das dcolomas18 v francesas8"'dc baixasse1667 es'abeieda de 15 para ^ 4° libras por ™cada

22 libras eS(loqsoldt0d0 0 aÇUCar refÍnad0 PaSSaVa 3 pasar de entrada Ue 0 me aC0 d Utr S PrOVeniendaS S áTaU (V ' ° "

dustrfa0H'Serambém neStaS medidas a PreocuPaÇâo de proteger a in- refrefinado. nal TinhamTÍnh"3^ começado0 ^ a$UCar, a estabelecer-se, dÍfÍCU,tando a ementrad França,a do asproduto primeiras já refmanas nas cidades de Nantes dentre 1666 e 1671), La Rochelle Bordéus, e c., cuja laboração se tornava necessário pôr ao abrigo da

rs=r,;s:s.*í—-c—

escrevia Satr e"0S (25 ^ Ab,i' de 'f,90' ''>■ A da,il "" que 0 açi,car d0 Brasl1 um '«"la SÇ- car d.da Martinica,Ma ? áde qualidade* P°r inferior30 (7'').l,e e,a a»"" o açu-

reSUltad0 t0daS estas medidas foi mentomPnt?H do açúcar íde origem portuguesa no mercado certamente, francês oe encareci-a dimi-

() V. «Boletim» do Instituto Histórico da Terceira, Vol, 4

des deceloppement , ave„„ (5) Idem, pág. 30.

No/ltod"',Sd°l'_*L'e,P°r'al,0n'l"8Kr"- a" "éd"' «""P <" <7) Ob. cit., pág. 947. DA ILHA TERCEIRA nuição da importação. Com ela baixava a importância do comércio francês com os Açores. Entre os portos de França, que comerciavam com os Açores e em especial com a Terceira, figura em lugar destacado La Rochelle. Como as demais cidades francesas interessadas neste tráfico, La Rochelle sofreu as consequências das medidas protecionistas e os seus navios passaram a buscar outras rotas, como o Canadá e a Terra No- va. No período que vai de 1682 a 1696, vieram de La Rochelle aos Açores, apenas 14 navios, todos de pequena tonelagem (8): 3 em 1683, 1 em 1685, 1 em 1686, 5 em 1688, dos quais 4 fizeram a viagem via Lisboa, 2 em 1692 e 2 em 1693. Quasi todas senão todas estas em- barcações se dirigiam à Terceira. O primeiro dos documentos que a seguir se publicam, dá uma ideia da variedade das mercadorias que La Rochelle mandava à Ter- ceira. São panos de Chatellerault, do Poicton, entretelas, sarjas de Tour, bolandas, tecidos de seda (armoizins, moyrés), lãs de Segovia, «futaines» (panos de algodão), cutelarias de Chatellerault, lantejoulas pólvora, papel, ferro, gesso, azeite, etc. Estes documentos, existentes no arquivo de La Rochelle, têm, ainda o interesse de revelarem outros dados importantes para quem um dia, pretenda escrever uma história económica dos Açores e em especial da Terceira. Dêles se extraem preciosas indicações sobre os preços por que se vendiam certas mercadorias estranjeiras na Tercei- ra e quanto valiam certos productos enviados por intermédio desta Ilha para os mercados franceses. Há ainda o registo dos direitos de entrada pagos pelas mercadorias à Alfandega de Angra, que andavam à volta de 10 o/0. Deles se extraem nomes de mercadores da Terceira e de La Rochelle interessados no tráfico e se conclue a participação de açoreanos nas tripulações dos navios de La Rochelle que deman- davam o porto de Angra. Notem-se também as despesas de desem- barque, direitos especiais cobrados sobre certas mercadorias, como o azeite, o setim, as bolandas, e os ordenados pagos. O guarda, que esteve a bordo, ganhava 200 reis por dia.

P) Segundo os elementos fornecidos pelo Livro em que se registavam as tripulações. -- Archives de la Charanse Maritime La Rochelle, B. 235. 4 BOUiTIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Há ainda indicações sobre o pêso das caixas de açúcar que mos- tram a fragilidade de algumas estatísticas, relativas à produção ou exportação desta mercadoria, calculadas em caixas ou arrobas. O pêso da caixa de açúcar oscila, num dos documentos, que se transcrevem, entre 39 e 48 arrobas. Se se atribue à arroba o valor aproximado de 15 quilos, quando se pretende reduzir o pêso das caixas às medi- das do Sistema Métrico, os resultados que se podem obter divergem bastante entre si, consoante se torne a caixa de 39 ou de 48. Mesmo que se calcule pela média, quando se trate de grandes quantidades, os resultados, talvez sugestivos, afastam-se muito do rigor que se pode exigir numa estatística relativa à história do comércio. No primeiro dos documentos, em que se colhem abundantes dados para a organização duma lista de preços absolutamente necessária para o estudo da evolução dos preços e do custo de vida na Ter- ceira, elementos basilares numa história económica, tem-se ainda ou- tra facilidade que é a de aparecerem as mercadorias francesas, em contas apresentadas por um francês encarregado da sua venda, avalia- das em reis (»). Não há portanto necessidade de fazer redução de uma moeda para outra, como acontece nos documentos seguintes em que a moeda utilizada é a libra.

(•) Neste documento, apesar do L, indicativo em gera* da libra, as Cunhs estão em reis como se concilie facilmente da leilnra. DA ILHA TERCEIRA 5

DOCUMENTOS

I

A Angra le 5e Juilkt 1644. Compte rendu à lVlons.r l,Hvesque des ínarcliandif?^ venuea dans Qirardot pour cnmpte de messieuts Allaire et lirenets et Consignées entre les mains de moy Jacques Rdfauld ve- nu snr la dite cargaizon. 10 Barisques d'hLiilles dolif 1 Barisque douillage (') reste 9 barisques lesquelles ont rendu suivante ie compte la smnme de 187$537 6 Basles de Chastellreault contenant 4000 aulnes payé a Talfandegue pour le drnit du Roy 400 " ' reste 3600 aulnes 215 aulnes de vendus a 80 rs raulne monte L 17$2(/0 reste 3385 aulnes que j'ay delivrées a Mnns. Lavesque 7 grosses de grands cousteaux qui font 84 douzainnes 8 douzainnes payé à 1'alfandegue pour le droit du Roy reste 76 douzainnes 35 douzainnes de vendues suivant la vente par le menu Ia somme de L. 7$240 reste ^ 41 douzainnes que j'ay delivrées à Monsieur Levesque

(') Sobre o significado desse teimo lè-se no «Dictionnaire de Tancienne langue Française» de Godefroy, art. ouil age ; «ouillage, oeillage, eullage, beullia- ge, s. tn. actinn de remptir un tonneau. ■ Payer pour oeillage, rtrnplage or rem- plissage des vins», to p iy for tlie leake of wines (ct. Hollyb ind, Du-t. fr. angi., Londies 'bPd). 6 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

12 grosses de Consteaux moyens qui font 144 douzainnes 14 douzainnes payés a Talfandegue pour les droits du Roy res^e 130 douzainnes que j'ay données a Mons.r Levesque 14 grosses de Consteaux manche noir qui font 168 douzainnes payéesa Talfandegue pour le droit du Roy reste 152 douzainnes 14 douzainnes de vendues a 140 rs. suivant la vente monte L. 1$960 res^e 138 douzainnes que j'ay delivrées a Mons.r Levesque 225 grosses grands Aiguilletes 22 grosses données pour les droits du Roy à Talfandegue reste 203 grosses 3 grosses vendues a 50 realles grosse monte L. $600 reste 200 grosses que j'ay données a Mr. Levesque 25 piesses de Futainne O 2 '/2 piesses données a Talfandegue pour le droits du Roy 22 1/2 piesse 'A piesses vendue pour Ia somme de L. 1$600 reste 22 piesses données à Mr. Levesque 5 douzainnes de bougrans 'A douzainne donnée a Talfandegue pour le droit du Roy reste 4 '/i douzainnes qui ont estés vendus suivant la vente par menu L 26$800 12 piesses draps de poittou contenant 199 aulnes 19'A aulnes payés a Talfandegue pour le droit reste 179 72 aulnes qui ont rendu suivant la vente _ par le menu L. 76$640

(l) Sobre a qualidade e o (ipo dos diversos tecidos v. Savary. Dictionnaire Universel de Commerce. DA ILHA TERCEIRA 7

10 piesses de serges de tour contenant 273 aulnes Va 27 aulnes donné a Talfandegue pour le droit du Roy reste 246 s/3 aulnes 75 aulnes qui ont rendu suivan la vente pour le menuL.27$33 reste 171 aulnes mises entre les mains de Monsieur Levesque Les serges de tour ont rendu la somme avec Ia vente cy dessus L. 346S907 50 grosses passements de layne 5 grosses données a 1'alfandegue pour le droit du Roy reste 45 grosses _2 grosses 7 douzainnes vendues a 500 r. grosse monte L. 1$270 reste 42 grosses 5 douzaines lasqueis j'ay mises entre mains de Mr. Levesque 25 grosses de poignés de bois qui font 300 douzainnes 30 douzainnes payés a 1'alfandegue pour le droit du Roy reste 270 douzainnes 45 douzainnes vendu a bij r la douzainne monte L, 3$255 reste 225 douzainnes que j'ay mises entre mains de Mr. Levesque 1 grosse destuits a poisson et d^utres a ressorts qui font 12 douzainnes 1 douzainne deux estuits payés a Talfandegue pour le droit du Roy reste 10 douzainnes 10 estuits 3 douzainnes 10 estuits vendus suivant Ia vente par le menu Ia somme de L. 1$47 reste 7 douzainnes que j'ay mises entre mains de Mons. Levesque 4 grosses de cousteaux manche blanq qui font 48 douzainnes 4 douzainnes payés a Ealfandegue pour le droit du Roy reste 44 douzainnes 19 douzainnes vendues suivant la vente par le menu L. 2$66n 8 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

reSte Éouzaínnesque j'av mises entre mains de Mons. Levesque 1 'A grosse cousteaux ferme manche qui font 18 douzainnes —UAjdouzaine payé a Talfandegne pour les droits du Rov reste 16 'A —1 douzainne vendu pour ta somme de L. $240 reste -JJ? douzainnes 'A mises entre mains de Monsieur Levesque I grosse de bouds d'espées qui font 12 douzainnes 1 douzainne payée a 1'alfandegue pour les droits du Roy reste 11 douzainnes que fay mises entre les mains de Mons. Levesque 4 douzainnes estuits a 5 piesses ^ue j'ay deiivrèes a Mons. Levesque douzainnes petits cousteaux a bette et lion gravé donné a Mons. Levesque 16 douzainnes d'esplingnes a la Reyne —PA douzainne pour les droits du Roy payé a Talfandegue reste uy, douzainnes qui font 29 sizains vendu a 100 r letTlillier L. 17$400 4 grosses cousteaux oeil de pedrix qui font 48 douzainnes 4—douzainnes payés a Talfandegue pour les droits du Roy reste 44 douzainnes que j'ay deiivrèes a Monsieur Levesque 4 grosse de cousteaux pied de biche (') qui font 48 douzainnes 4— douzainnes payées pour les droits du Roy a Talfandegue reste 44 douzainnes

() Os productos da cutelaria de Chatelleraut nos séculos XVII e XVIII foram estudados por Camille Pagé, -La Coutellerie depuis les origines iusqu'a

"coVteaTàcouteau a pied de biche»1896 escreve" SObr Pagéo0 tÍP0 : «Le de coufeau faCa aqUeà pied n0 de text0 biche se avecchama le

^íts dous^Tomo L^pág.^L'0116 a^an'e 'e bout ^mi d'u„ fer dVgent a six DÁ ILHA TERCEIRA 9

20 douzainnes lesquels ont rendu suivant Ia vente par le menu L. 2$400 reste 24 douzainnes que j'ay données a Monsieur Levesque 8 douzainnes de Trompes données a Mons. Levesque 24 piesses de hollande 2 piesses données a Talfandegue pour le droit du Roy reste 22 piesses 8 piesses de vendues qui ont rendu suivant la vente L. 55$500 reste 14 piesses que j'ay delivrées a Monsieur Levesque 15 piesses d'artnoizins 1 Vj piesses donnée a Talfandegue reste 13 '/z piesses 11 piesses données a Mons. Levesque contenant 299 aulnes et deux piesses entamées contenant 47 aulnes

2'/2 piesses qui a deux d'entamées lesquelles avec la 'A piesse a esté vendu 47 codues 'A 78 Q11' suivan la vente par le menu la somme de L. 141800 6 piesses de moyre contenant 125 aulnes 7^ 'A piesse payé a Lalfandegue reste 5 piesses données a Monsr. Levesque açavoir 4 entiers et unne entamée contenant en tout 101 aulnes reste 7» piesse qui a rendu avec ce qu'il fault de la piesse — 20 codues qui ont rendu suivant la vente la som- me de L. 4$800 1 piesse de satin passé donnée a Mons. Levesque 25 piesses de Cambrais double qui font 50 piesses 5 piesses payées a 1'alfandegue pour les droits du Roy reste 45 piesses 9 piesses de vendues suivant Ia vente Ia somme de L. 36$ este 36 piesses delivrées a Monsieur Levesque 10 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

1 caisson de Rubans contenant 35 duzainnes cudes (?) Incarnadins 5 douzainnes payé a Talfandegue pour les droits du Roy tant dessus que des 17 douzainnes cy bas plus grands cudes reste 30 douzaines 18 douzainnes vendues suivant Ia vente par le menu Ia somme de L. §$400 res^e 12 douzainnes cudes Incarnadins donnes a Mons. Levesque 17'/j douzainnes grands cudes Incarnadins données a Mons. Levesque 100 douzainnes Rubans cudes couleurs plains 1° douzainnes données a l'alfandegue pour les droits du Roy reste 90 douzainnes 37 72 douzainnes vendus suivant Ia vente par ie menu L. 141600 reSte 52 ciouzai"nnes rubans cudes plains données a Mr. Levesque 120 douzainnes Rubans cudes a bords 12 douzainnes payé a Talfandague pour Ie droit du Roy reste 108 douzainnes données a Monsieur Levesque 15 douzainnes Rubans a bords cudes Incarnadins

2'/2 douzainnes vendues pour la somme de L. 1$ 1272 données a Monsieur Levesque 120 douzainnes passelarges a bords 12 douzainnes données pour les droits a Talfandegue reste 108 douzainnes desqueles j'en ay donné a Monsieur Leves- que 107 douzainnes 1/2 150 douzainnes moyens a bords 15 douzainnes payé pour le droit a i'alfandegue 135 douzainnes 45 douzainnes vendus suivant la vente par Ie menu la som- me de L. 9$360 reste í)0 douzainnes mis entre mains de Monsieur Levesque DÁ ILHA TERCEIRA II

50 douzainnes clincquants a carreaux 5 douzainnes payé pour le droit du Roy reste 45 douzainnes 20 douzainnes qui font 4 masses a 1$ r masse monte L. 4$ reste 25 douzainnes lesquels j'ay données a Monsieur Levesque 50 douzainnes clincquants plains 5 douzainnes pour le droit de Talfandegue reste 45 douzainnes 15 douzainnes qui font 3 masses vendues a 1.000 r masse mont L. 3$ reste 30 douzainnes que j'ay données a Monsieur Levesque 50 douzainnes petits clincquants plains 5 douzainnes payé a Talfandegue pour le droit du Roy reste 45 douzainnes que j'ay donné a Monsieur Levesque 2 Bailes laines despees données a Monsieur Levesque 8 barils de poudre donnés a Monsieur Levesque 7 bailes laynes de sagouie 5 bailes données a Monsieur Levesque 2 bailes n. 5 et 6 pesant net 248 U 78 payé a 1'alfandegue pour le droit du Roy noiT 8 n données a Monsieur Levesque reste 162 il lesquelles ont rendu suivant la vente la somme de' L. 51660 30 bailes de papier 3 bailes données a Talfandegue pour le droit 27 bailes 14 bailes vendu par le menu faisant Ia somme de L 68$ 13 bailes 1/2 baile que c'est perdu a celuy qui estoit mouillé reste 121/2 bailes que j'ay données a Monsieur Levesque BOLETIM DO INSTITUTO Hl STÓRICO

8514 11 de fer vergaillon 851 11 payé pour le droit du Roy 7663 H de fer qui ont rendu suivant Ia vente Ia somme de . L. 142$725 195 barisques de plastre 25 quintaulx payés a Talfandegue pour le Roy et le restant est en nature

Monte les sommes cy dessus L. 789$457 DA ILHA TERCEIRA 13

Messieurs Allaires et Brenets sont debiteurs pour ies fraits des marchandizes venues de la Rochelle a Angra dans le navire la Licorne maitre Giraudot payé pour 45 barquees de marchandises a 200 r la barque monte payé aux chartiers pour 252 voyages a 40 r voyage monte 10$80 payé aux portefaicts de Talfandegue pour le poids des marchandises 1$220 payé pour le droit des huilles conforme la coustumme 18$ payé pour 655 ceaux a 6 chaque ceau monte 3$930 payé pour le droit du satin dont Ia piesse n'a pas esté couppé 3$ payé pour le droit de 4 piesses de hollande la somme 1$ payé au garde qui a esté a bord pour 12 jours a 200 r jour monte 2$400 payé pour le louage de marchandises et gesse la som- me de C 8$ monte Ies fraicts cy dessus la somme de 56$630 plus payé au maitre Giraudot en deduction de son fret L 22$700 plus pour ma Commission de 719$ r a 3 pour 100 monte 21 $570 100$900 Suivent les personnes qui doibvent Monsieur le proviziador pour marchandises la somme de 11$100 Monsieur le gouverneur pour marchandises la somme de 11$700 Monsieur Manoel do Canto pour marchandises 32$000 Monsieur pidro de Castro pour restant des marchandises 2$ e sergeant Roussillon pour marchandises a luy vendues 4$420 Domingo Codillo pour marchandises restantes a luy vendues 1$720 don joan de Souze pour restant d'une barisque d'huille dont le dit Souze Ia somme de ^$070 monte touttes les debtes laissées a Monsieur Levesque la somme de 70$090

Faict a Angra Isle de la Terciere le lOe Jour de Juilet 1644. 14 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Messieurs Allaires et Brenets sont debiteurs

pour 69 coffres de succres blancs ascheptes des personnes cv bas nommes et charges pour le dit compte dans le navire nommé Le licorne maitre Louys Girardot

11 Coffres du sieur pidro Lagar qui se montent suivant la cargaizon la somme de 3671300 10 Coffres du sieur Joseph Leal qui se montent suivant la carguaizon la somme de 332$415 40 Coffres du sieur Laurans Gomes payre qui se montent suivant Ia carguaizon la somme de 12581018 8 Coffres du sieur Georges Dies qui se montent suivant la cargaizon la somme de Et les fraits et droits se montent suivant Ia dicte car- 2301250 guaizon a la somme de 3261670 2514$653 commission ^ 75f490 25901143

(Extrait des minutes Cherbonnier, Liasse 1645 ■Arch. Charante Mari- time — La Rochelle)

f DA ILHA TERCEIRA 15

I I

1693 Março 14 !) Declaraçcão de Jacques de la Ronde sobre as presas e avarias sofridas nas mercadorias carregadas na caravela «Notre Dame de la Conception», na sua viagem de La Rochelle à Terceira e volta a La Rochelle. A caravela, comandada por Lourenço Franco, da Terceira, que partira de La Rochelle com mercadorias dirigidas a Guilherme Ficher, teria sido abordada, à saida de La Rochelle, por um corsário espanhol que entrando a bordo roubara as mercadorias indicadas num dos documentos, e deixara o navio continuar a sua rota. Em 1692, mês de Novembro, teria partido da Terceira comandada por Manuel Rebelo, carregada de açúcar (casson- nades blanches) enviado por Ficher pai, sob o nome de Manuel Camelo, a De la Ronde, e chegara a La Rochelle em 21 de Janeiro de 1693, depois de temporal que produzira as avarias na carga, que constam de outro documento. Além desta declaração consta o processo de um papel sobre as mercadorias roubadas pelo corsário espanhol e outro sobre as avarias e desvalorização sofridas pela carga, que se transcrevem. 2) Facture et compte de ce qui a esté pillé à la Caravelle Ia Nostre Dame de la Conception, maitre Laurans franco par un Corsaire Es- pagnol suivant la declaration du dit Laurans franco en datte du 13 octobre 1691, scavoir Les Victuailles £ 55 Un paquet de rubans contenant 14 douzaine de rubans figures à 35 s. Ia douzaine £ 24„10 Six masses de rubans unis contenant 16 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

10 piéces de n." 3 à £ 6 Ia p. £ 60 ) 18 piéces n." 1 '/, a £ 3,, 17„ 6 £ TO,^ S 137,, 15 droits et frais £ 7^10 i Un paquet contenant six crauattes à passements £ 53,.SJ Six chapeaux £ 52

deux manchons £ 3)(io deux mousquets et un pistolet £ 20 Les bardes de Tesquipage £ 150 £ 506,,7,, La caravelle la Nostre Dame de la Conception inaitre Laurans franco dans laquelle ont esté pillés les choses cy dessus valloit lors du pillage à peu prés cinq mille liures qui est pour la moitié celle de £ 2.500 Le fret quelle pouvoit faire douze cents livres qui est pour le tiers £ 400 3) De la Ronde Estat de Tavaries (s/c) sur 16 caísses de cassonnades 0) la cargaison de la Nostre Dame de la Conception maitre Manoel Rehello venant de la Terciere n.0 6 41 arobes 16ll a pesé 1020 ... 15 43 arobes 1611 a pesé 1222. 5 44 arobes 16" a pesé 1175.. . . 9 42 arobes 16" a pesé 1 iQO- -.. 3 47 arobes a pesé 1358.... 2 43 arobes a pesé 1026 .. 16 48 arobes 16" a pesé , 1270.... 7 39 arobes 16" a pesé 1200- •. • 25 40 arobes — a pesé 1009. • ■ 13 48 arobes a pesé 1305.. .. 10 43 arobes 16" a pesé 1008 " 12 47 arobes a pesé 1315 n 1 41 arobes—- a pesé 1180 " 14 46 arobes a pesé 1207 II 11 44 arobes 16" a pesé 1200 " 8 47 arobes 16'l a pesé 1125. 708 arobes a 30" rarobeTbois de france 18720.... (') Os documentos acham-se comidos pelo tempo e as margens ilegíveis. Os... indicam o que falta. DA ILHA TERCEIRA 17

doivent rendre 21240 11 et n'on rendu que 18820 pourtant il y a de coulage 2420 2124Õ 2420 H de cassonnades fines da baxe qui vallent 50 11 le cent £ 1210 deductian des droits a £ 14 le cent y ayant 20 pour cent de difference a cause de l'advantage qu'il y a sur les thares £ 338,, 10 Reste de perte sur le coulage £ 871„4 Les 8 caísses composées de cassonnades mouillés ont pesé ce qui suit 1450 II 131611 1411 1540 1569 1464 1618 1699 12067 11

12 o/0 1438 net 10619 lesquels estant seiches auroient vallu du moins £ 50 le cent montant a ce prix £ 5309,. 10 lesquelles 1061911 de cassonnades tnouillées a estè vendue a £ 36li le cent à Madame La Mittière et à son fils montant £ 3822,, 16 Aussi il y a de pert sur la qualité la some de £ 1486„14 Raport de Ia perte En coulage suivant le compte de l'autre part £ 871,, 4 Sur la qualité suivant le compte dessus £ 1486,,14 2.357„18 pour frais à separer les cassonnades seiches d'avec les mouillées et refaire les caísses £ 20 Total de Ia perte £ 2377„18 De la Ronde (Arch. Charante Maritime, La Rochelle, B, 5689) 18 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

*

Para mais completa elucidação do assunto, transcrevemos parte do estudo do mesmo autor— «Duas notas para a História do Comér- cio Francês em » — (Separata da ftevista Portuguesa de História, Tomo III, pág. 203. Coimbra. 1945).

I I

SOBRE O COMERCIO DE LA ROCHELLE COM OS AÇORES NO SÉCULO XVII

Durante o século XVI os franceses iam buscar aos Açores, prin- cipalmente, mercadorias que os navios, provenientes do Brasil e das índias Ocidentais, lá descarregavam quando arribavam : pau brasil, tabaco, coiros, cochonilha, etc. ('). Este comércio interdito depois da tentativa de desembarque fran- cesa em 1583 E), foi-se reconstituindo no tempo de Henrique IV apesar do pesado imposto decretado por este Príncipe sobre as mer- cadorias de tal origem, e da severa fiscalização exercida pelos espa- nhóis. Tal imposto, embora fosse uma dificuldade para o comércio, não conseguiu, no entanto, impedi-lo. Nos arquivos de La Rochelle, por cujo porto se comerciava então com os Açores, não se encontra- ram indícios da cobrança de tal direito (') e, no entanto, o comércio continuava a fazer-se. No inicio do século XVII enviava La Rochelle às nossas Ilhas tecidos, papel, retrozaria, ferro, quinquilharias, breu, resina, bacalhau sêco, algum sal e queijo (4).

{') Fagniez— «Le commerce de Ia France sous Hemi IV., in Rev. Historique tomo XVI. (2) Idem. P) M. Trocmé - «Le commerce Rochellais à la fin du XVF™'' e au débuf du XVIIeme siécle». V) M. Trocmc, ob. cif. DA ILHA TERCEIRA 19

O porto mais frequentado era o de Angra na Terceira, embora algum comércio se fizesse também pelos portos do Faial e S. Mi- guel (5). O tratado de 12 de Outubro de 1604, com a Inglaterra e França, que abolia o direito de 30 % sobre as mercadorias prove- nientes destes países, encontrou resistências para o seu cumprimento em alguns lugares do Reino, entre os quais figura a ilha de S. Miguel (6). Entre os armadores de La Rochelle interessados no tráfico, neste primeiro quartel do século, figuram membros das famílias Allaire, Guiton, Deslandes, Piccassarry, alguns deles de grosso trato na cidade (7). Os nomes das famílias Allaire e Guiton encontram-se ins- critos nos registos da Igreja Reformada (8). No decorrer do século, frequentemente, barcos franceses de La Rochelle ou de outras partes, eram fretados nos portos da Metrópole para viagens aos Açores onde iam carregar cereais para abastecimento da capital. Uma consulta da Camara de Lisboa ao Rei, de 11 de Outubro de 1631, refere-se à provisão concedida a vários franceses, para se empregarem neste tráfico, que não fora tida em consideração pelo Conde de Vila Franca O. Alem de franceses, navios de outras nacionalidades iam aos Açores em busca de pão para Lisboa. Em Abril de 1641, foi concedida a isenção do direito do sal embarcado em navios estrangeiros para os domínios ultramarinos, nomeadamente os Açores, com a condição de na viagem da volta carregarem trigo para Lisboa, ao requerente Gonçalo Roiz da Cunha, que fretara tres navios para tal fim C").

( ■') Trocmé, ob. cil. (6) Alvará de 22 de Dezembro de 1605 — Andrade e Silva. Cni. Cronológica de Legislação, I. (7) Trocmé, ob. cit, (8) P. Boissonade, «La Marine Marchande, le Port e les Armateurs de La Rochelle à TÉpoque de Colbert» in Bulletin de la Section de Geographie—Comité des Travauxe Historiques, tomo XXXVIII, 1922, pág. 21. (9) Freire de Oliveira, «Elementos para a Historia do Município de Lisboa», tomo III, pág. 449, (10) Documentos existentes no Arquivo Histórico Colonial — Caixa Açores — 1067-1688. 20 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Desde Março até ao fim do ano de 1633, o exame dos registos dos notários Moreau e Cousseau de La Rochelle (") fornecem quatro contratos de fretamento de barcas para a Terceira. Num dos casos trata-se de uma viagem directa La Rochelle-Terceira-La Rochelle C-') e nos outros três ha escala por Lisboa ou Madeira. A barca que faz a viagem directa leva milheiros de peixe seco, naturalmente bacalhau, e dez barricas de óleo de peixe. Não se indi- cam as mercadorias transportadas pelas outras barcas. Depois da Restauração o comércio francês dos Açores continuou apesar da pirataria dos espanhóis, que davam caça a todos os navios franceses que se dirigiam a portos portugueses. Os armadores de La Rochelle procuraram vencer este obstáculo ao comércio regular, carregando as mercadorias em navios holandeses. Veja-se, entre muitos documentos que poderia indicar para prova da afirmação acima, a declaração de Henry Vlamin «bourgeois et pro- priettaire du navire nomme La maison de Muzen. ■ • lequel vaisseau jl fait nauiguer a cause de Ia guerre quy est entre Ia france et L'espagne soubz le nom de Guillaume Henry, demeurant a amsterdam et Soubs ia baniere de hollande e le maisíre Et TEsquipage hollandaise, pour fauorizer son negoce et empecher la prise et depredation quy pourroyent faire Sur luy Les espagnols dudit nauire et cargaison comme françoise s'il ne se seruoit du nom dudit Guillaume henry et de la baniere hollandoize»... etc. ("). É talvez o caso do «Prophète Daniel» de Amsterdam, contratado pelo mesmo Henry Vlamin de La Rochelle para uma viagem à Madeira e aos Açores em 1657 (H). Durante esta segunda metade do século a principal mercadoria carregada nos Açores em barcos franceses, pelo menos a única que aparece indicada nos documentos e destinada às Antilhas, segundo os dados encontrados nos «Archives Départamentales de la Charante Maritime» (La Rochelle), foi o vinho.

(u) Archives Departamentales de la Charenfe Maritime. (I!!) Os quatro registos são dos livros do notário Cousseau = 3n de Março, 29 de Abril, 10 e 14 de Maio de 1633. Nos livros do notário Moreau não encontrei nenhum contrato de fretamento para os Açores nesta data. C3) 1 de Novembro de 1667 — Arch. Char. Mart. B. 5663 — 107. (H) Arch. Char. Mart. — Série B — 5553 — 18 DA ILHA TERCEIRA 21

No primeiro de Março de 1671 pai te de La Rochelie o «Phiilipe» que passa na Terceira e chega ao Faial em 24 de Abril, onde tomou 180 pipas de vinho para as Antilhas (5). Em 1675 a barca «Diligente», segundo o relato do seu mestre, Louis Ramé, de 7 de Junho do mesmo ano, fizera a viagem directa de La Rochelie ao Faial onde desembarcara mercadorias ali destinadas e carregara vinho para o mesmo destino (ic). Outros navios são fretados também para viagens aos Açores, especialmente às ilhas Terceira e Faial, e volta a La Rochelie. Não conseguimos, no entanto, apurar quais as mercadorias que transpor- tavam, pois os documentos não as mencionam. É de presumir que fossem as mesmas que constituíam o tráfico no inicio do século. Ocasionalmente outros produtos se trocaram entre franceses e açorianos quando acontecia os seus barcos tocarem em portos do Arquipélago, ou para abastecimento ou para se abrigarem do temporal. Eis um exemplo: Pierre de Congerie, mestre da nau «Marie* de 350 toneis, relata que «venant de Guinée, allant à Marseille, manquent de vitailles furent obligés de relacher a la Tersiere a la rade de la ville dengras au mois de febvrier dernier de la présente année de 1680, en laquelle ville il mit pied a terre et pris dans ycelle les vitalles et refreschissements qui lui avoient été fournis par le sier negre, côn- sul de la nation francoise en la ditte Isle de la Tersiere et luy donna pour le payement du tout deux negresses et un noir,et quelques jours après auroit vendu un noire a la solicitation du dit cônsul de la Nation françoise au sieur Louis Dalenhado Thoar, juge coregedor des dites Isles de Tersiere-. pour 175 iivres de monnaie de France, qui font 3500 reis de Portugal •. ctc. Esta segunda metade do século XVU deve corresponder à deca- dência do comércio francês nos Açores, que não pode, por enquanto, saber-se ao certo se, em algum tempo, foi muito importante, embo- ra o simples facto da existência de um cônsul francês em Angra im- plique, normalmente, relações comerciais estreitas.

CT Idem, Série B - 5670 - 226. ('q Idem, Série B, — 5674 — 68. (O) Arch, Char. Marit. — Série B -- 5679 — 171. 22 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

A verdade é que, para o período que vai de 1657 a 1685, vinte anos, apenas encontrámos nos fundos do Almirantado de La Ro- chelle, existentes nos Arquivos de que nos temos servido, Série B, notícias referentes a 7 navios que fizeram «le voyage des Açores». Nestes sete casos trata-se, evidentemente, de barcos de La Rochelle. Encontramos também menção de uma barca de Sables d'OIone fietada em 1656 para a viagem dos Açores e volta a Nantes, navio e mercadorias asseguradas em Amsterdam O8). Os navios mais geralmente empregados neste tráfico são de pe- queno calado, na maior parte dos casos, barcas. Os quatro fretados em 1633 para a viagem dos Açores, já indicados, variam entre 40 e 55 toneis. Entre os outros barcos, que fizeram a viagem em anos com- preendidos entre 1656 e 1685, figuram alguns de maior calado — o «Cesar» de 120 toneis (1677), o «Pliilipe» de 140 (1671) — mas a média não atinge os 100 toneis ('!l). Na tripulação do «Le Barthélemy», de 60 toneis, figuram dois poitugueses, Antonio Lobo, o Bravo, e Gregório Pires (20), quem sabe se açoreanos. Nesta segunda metade do século, tal como indicamos para o iní- cio, importantes mercadores da cidade tomam parte no comércio dos Açores, como aliás nas relações comerciais com portos portugueses, em geral. São Louis Allaire, Jacques de la Ronde, um Pagés, Jean e Cesar Godefroy aparecendo, este último, frequentemente como capitão dos seus próprios navios. Vale a pena indicar que os apelidos de to- dos estes mercadores aparecem inscritos nos registos da Igreja Refor- mada p1) de que La Rochelle foi, até à revogação do Edito de Nantes, um dos baluartes. O comércio de La Rochelle com os portos portugueses esteve, durante todo o século XVII, como esperamos demonstrar em trabalho que temos em preparação, nas mãos dos reformados. A decadência

(18) Are. Char. Marit — Série B. — 5662 — 18. P9) Idem, Serie B — 5677 — 140. (20) O rol da tripulação é de 10 de Junho de 1679 — Arch. Char. Marit Série B 5678 - 370. O P. Boissonade, oh. cit. pág. 21. DA ILHA TERCEIRA 23 do comércio deste porto com Portugal, neste mesmo século, coinci- diu com a revogação do Edito de Nantes e o cerceamento das liber- dades de que os reformados gosavam. Alem de outras provas a for- necer no trabalho a que acima nos referimos, podemos, no entanto, indicar desde já que entre as familias refugiadas, depois da revogação do Edito de Nantes, na Holanda, figuram os Godefroy e os Allaire, para falarmos só dos que eram interessados no comércio dos Açores. Em 1688 contavam-se em Amsterdam cerca de 500 refugiados de La Rochelle (").

P) Idem, pág. 42. Um manuscrifo da Bibiiofeca Nacional de Madrid

inferessanfe a hisfória dos Açores

no Século XVII

Pelo Dr, FRANCISCO MENDES DA LUZ

Para o estudo que estamos realizando sobre a administração e o comércio ultramarinos no primeiro quartel do séc. XVII, foi-nos ne- cessário consultar vários manuscritos das bibliotecas e Arquivos de Madrid e de Simancas. Durante estas investigações deparou-se-nos bom número de documentos interessantes à história dos Açores. De entre eles destacamos um volume da Biblioteca Nacional de Madrid intitulado : «D. Pedro Estevan de Avila - Cartas originais a Felipe IV e ao Conselho de Estado sobre o govêrno que tinha da Ilha lerceira e depois de Buenos Aires». Realmente, trata-se de um códice de 173 fólios, bem conservado, de cartas assinadas pelo comandante das forças castelhanas na Ilha Terceira desde 1622 a 1625, D. Pedro Estevão de Ávila, que depois foi mestre de campo e governador da Província do Rio da Prata. Porém as cartas respeitantes a este gover- no ocupam apenas os últimos vinte fólios do citado manuscrito. O interesse destas cartas ressalta não só dos informes propria- mente, que àcerca do estado militar, comercial e político daquela nossa Ilha nos vai dando o seu autor, mas ainda da maneira como estes factos nos são relatados por um espanhol que não se sentia muito à vontade, embora comandante de uma boa força, no ponto que cons- tituiu o último reduto de D, António Prior do Crato. DA ILHA TERCEIRA 25

Logo em carta de 4 de Abril de 1623 diz o comandante da guar- nição do Castelo de S. Felipe na Terceira: «... Aqui a passado pa- labra por via de mercaderes que se a ydo refrescando, que en Olanda se aprestava una gruessa armada para se vir sobre estas islãs, con Don Manuel hijo dei Prior de OCrato, y porque este nombre no esta de todo olvidado en algunos ânimos deste pueblo, e requerido ai Corregidor, Camara y demas personas a quien toca reparen las forti- ticaciones que estan en torno desta isla, y particularmente el Castillo de San Sebastian-., han me dado palabra, pero no Io cumplen, huyendo el cuerpo cada uno a la ejecucion». E várias são as cartas que informam o rei de ser voz corrente na Ilha a vinda do filho de D. António à frente de uma expedição de «rebeldes». A tal ponto, segundo o que ouvia na Ilha,cria D.Esteban de Ávila na acção dos descendentes do Prior do Crato que, quando da tomada da Baía pelos holandeses em 1624, informa a côrte espanhola de que a 10 do mês de Agosto chegara ao Faial um barco vindo de Pernam- buco e que trazia alguns marinheiros «naturales desta isla... y die- ron aviso de aver entrado en la ciudad de la B ihia una armada de olandeses acaudillada de D. Luis Manuel nieto de D. António Prior de o Crato»,tendo o cuidado de acrescentar: «estarem na Ilha convic- tos de que a esta hora já todos no Brasil se juntaram a D. Luis Manuel» ('). Na verdade, os açorianos não inspiravam muita confiança ao go- vernador castelhano, tendo mesmo chegado a sitiar o castelo onde este residia: «.. que el capitan cavo de esta ciudad caycse en el

(') Em Ant. Ciitíano de Sousa não figura o nome Luis Manuel. Dos netos de D. António, indicado;, por aquele autor, os nomes que mais se aproximam são Luis Guilherme e D. Manuel de Portugal. Este, pelo menos, sabemos nós que serviu os Estados da Holanda e chegou a ser governador de Stenwick. Trata-se portanto de má informação de D. Estevão de Avila. De sobejo nos são conhecidos os nomes dos comandantes da expedição holandesa à Baía em Maio de 1624 : Jacob Willekens, Pieter Piefersznon Hein e Jan Van Dorth. Podia favez admitir-se que algum neto de D. António tivesse tomado parte na expedição; no entanto, ne- nhuma relação da época nos fala disso e não seria natural que omitissem seme- lhante noticia. BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

liorror que hiço en sitiar este Castillo y buelto las armas que tiene cie V. Mg. contra esta placa.. » eis o que este diz ao rei em carta de 19 de Julho de 1623, e acrescenta que o mesmo «capitan» Manuel do Canto ameaçava atirar de sua casa com peças sobre o forte da pól- vora e apoderar-se ainda do castelo de São Sebastião. Tudo isto nos revela bem o estado de ânimo na Ilha Terceira contra o domínio estrangeiro. Os principais cabecilhas, de quem D. Pedro de Avila, se queixa são Manuel do Canto e Castro, provedor das naus que vinham da índia e capitão mor do porto de Angra, o corregedor Pedro Vaz Freire, o provedor da fazenda António Ferreira, Fernão Freixo e Cristóvão Borges, De todos os modos na Terceira se procurava molestar o capitão espanhol, opondo resistência aos seus desígnios, não satisfazendo os seus pedidos e até faltando-lhe com abastecimento de trigo para as tropas, como o provam várias das cartas contidas no códice de que nos ocupamos. Enfim, este chega a confessar ter mais medo dos na- turais que dos holandeses .' «con estos caudillos esta la gente popular de manera que me guardase dellos más que de los olandeses.» (') A par destas notícias, que nos não deixam dúvidas àcêrca do espirito insubmisso e de rebeldia que contra as ordens estranhas rei- nava na ilha, as cartas contêm, coma já disse, outros dados não me- nos valiosos para o conhecimento do papel desempenhado pelos Açores em período tão agitado e trágico para a nossa história ultra- marina. Como se sabe estas ilhas constituíam ponto de passagem na carreira das índias (■). E era ali, muitas vezes, que os corsários da Holanda vinham esperar as nossas naus. Nas Ilhas quase sempre se tinha notícia destas armadas inimigas que navegavam ao largo e imediatamente se organizavam «avisos» que vinham à metrópele a prevenir.

(') Carta de 16 de Julho de 1623 para o rei. O A este respeito ainda a carta de 4 de Janeiro nos diz a quantidade de di- nheiro necessária para o provimento das naus da índia que ali passavam.« .... Asi mismo ay todos los anos un gasto contimio que hacen las naus de la Índia y las caravelas de aviso que hecho el compto un ano con ofro sera más de ties mil ducados en cada un afio ..." DA ILHA TERCEIRA 27

Muitas das cartas deste códice nos informam a tal respeito. Mas não eram só os rebeldes de Holanda que atacavam e assal- tavam as nossas naus. Eram também os ingleses, os mouros e os turcos. E curioso é que, por intermédio destas cartas, se vê que muitas ve- zes as suas armadas buscavam as costas dos Açores para essa rapina. A 26 de Maio de 1623 diz D. Pedro Estevão de Avila para o rei que teve aviso «por via de mercaderes mes y médio á de que salieron de Argel ciento y quarenta velas y que sc qu^daban aprestando cincoenta para venir sobre estas islãs, y que en Olandase aprestaban algunas....» Outras vezes as cartas informam-nos do comércio nas Ilhas, de estrangeiros ali residentes e do contrabando que se fazia para fugir às apertadas pragmáticas do govêrno filipino: A! Rey por su Consejo de Guerra el 14 de Mayo de 1625 — Avisado tengo a V. Mg. como en esta isla, y islãs, hay gran número de estranjeros, ingleses, flamencos y francesses y aunque en algunas cartas que tengo, escritas por V. Mg. a mis antecessores, manda que se echen a algunos desta isla que oy viven en ella, no Io he ejecutado hasta de nuebo esperar lo que V. M. me mandare. Asi irismo han venido a este punto algunos navios estra- jeros cuyos mres traen despachos y passaportes de Amburgo- • ■» Já em carta de 18 de Outubro de 1624 dizia D. Estevão ao rei, que tinham ido parar ao Faial dois navios chamados Santa Catarina de Sena e Anjo da Guarda e que o capitão procurara vender a um inglês ali residente os seus produtos. Como porém a venda se não efectuou «veio aqui dar». Trazia gengibre, couros, açucare brasilete. Parece que vinham do Porto Rico e ali em (roca davam-lhe roupas, letras para Lisboa, algum dinheiro e «farinhas para derrotar-se com elas a Angola». Enfim, confirma-se que os Açores eram um importante centro de troca de produtos: especiarias em geral e sobretudo açúcar. Os povos do Norte tinham ali os seus representantes, quando não eram os próprios comerciantes flamengos e ingleses que lá residiam. D. Este- vam de Aviia confessa que um dos principais rendimentos «procede de las entradas y salidas que hacen los navios en estas islãs», sobre- tudo dos flamengos embora estes afluíssem, naquela altura, em me- nor número por causa da guerra de Flandres, Um outro aspecto curioso ressalta do apelo constante que o co- mandante castelhano faz ao rei e ao conselho de Portugal para que 28 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO lhe remetnm as somas e os materiais necessários ao acabamento e conservação do castelo de S. Felipe. Para isso mostra qual é a impor- tância estratégica da ilha quanto à navegação «das índias orientais e ocidentais», e daí a consequente necessidade do castelo estar bem fortificado e armado. Por carta de 3 de Julho de 1622 ficamos sabendo que o rei prometera dois mil ducados, que haviam de ser pagos pelos governa- dores de Lisboa, pagamento este que dificilmente se efectou. Numa das primeiras missivas que dali envia Estêvão de Avila pe- de cal «para que se vaya continuando esta fábrica (do castelo) porque es mucho Io que falta por acavar que aun oy no se halla en defensa y lo que esta echo se viene al suelo con muchas aguas y los gran- des vientos que aqui hay» ('). Também não tinha nem munições nem guarnição suficientes: «Asi mismo me hallo falto de gente. • • y que V. Mg. se sirva mandar prover de armas, polvora, y cuerda, y de un armero como esta mandado por V. Mg. para que repare las poças ar- mas que hay porque con la humedad de la tierra se pudren aunque más se procuren beneficiar. ..» p) Cremos, pois, que este volume de correspondência abunda em elementos que nos permitem um melhor conhecimento da história açoriana do primeiro quartel do século XVII, em especial da Ilha Ter- ceira. Podemos avaliar por aqui qual foi a sua acção durante este pe- ríodo do domínio felipino, tão cheio de vicissitudes e dificuldades, e compraz-nos ver como também ali nas ilhas se não adaptavam ao domínio estrangeiro procurando repeli-lo por todos os meios.

Lisboa, 29 de Julho de 1948.

/'raiicisco Mendes da Luz

P) Carta de 24 Ag. — 1622. (2j Carta de 4 Jan. — 1623. Relação dos emigrantes açorianos para os Estados

do Brasil, extiaída do "Livro de Registos de

Passaportes" da Capitania Oerai dos Açores

( Continuação da página 163 do vol. 5.° )

Por ANTÓNIO RAIMUNDO BELO

ILHA DE SANTA MARIA

Ano de 1784: — Inácio José Coelho de Andrade, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia dum seu irmão.

Ano de 1785: — José Manuel de Moraes, à cidade do Rio de Janeiro, a fazer cobrança duma herança que lhe adveiu por falecimento dum seu tio.

Ano de 1811; — Inácio de Sousa Soares, viuvo, à cidade do Rio de Janeiro, com seus filhos André Soares, Manuel José, D. Maria Candida, D. Rosa Coutinha, e um seu parente, Agostinho José de Figueiredo. 30 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

RESUMO

Masculinos Femininos Totalidades Maiores Menores Maiores Menores Ano de 1784; Ao Rio de Jnneiro . 1 Ano de 1785:

An Rio de Janeiro . 1 lí 1 Ano de 1811; Ao Rio de Janeiro . 8

H. IIA DE SÃO MIGUEL Ano de 1767 :

Miguel Ancelo Martins, à B in, a vender uma carregação de pano de linho e a fazer emprego do produto dela naquele paiz. Ano de 1770 : — Tomé de Teve, a Minas Gerais, para a companhia de seus irmãos, estabelecidos com negócio no Rio das Mortes. Ano de 1784 : — fosc Cardoso Tavares, à Baía, com sua mulher [nana Rosa Viterbo. Ano de 1788: — António Feliciano Serpa, à cidade do Rio de Janeiro, com sua mulher Ana Joaquina de Castelo Branco e um filho de 7 meses, cha- mado António, a procurar modo de vida. Ano de 1803: João de Aguiar Boto, à Baía, com um criado preto, chamado Manuel. DA ILHA TERCEIRA 31

— José Correia de Araujo, à Baía. — Manuel de Sousa Franco, com dois fillios maiores de 40 anos, a Pernambuco. — António Jacinto Tavares, a Pernambuco. — José António de Sousa, com sua mulher Maria do Carmo, seu filho menor Manuel, e sua sobrinha Francisca, aleijada, a Pernambu- co, por esmola do mestre da embarcação. Ano de 1809:

— João José da Costa da Silveira, solteiro, à cidade do Rio de Janeiro. — António Joaquim Ferreira, à Baía, onde tem o seu estabeleci- mento e família. Ano de 1810 : — João Lopes, com sua mulher e duas filhas, a Pernambuco. Ano de 1811: — José Inácio Machado de Faria e Maia, Tenente da 2.a Com- panhia do Regimento de Melicias de Ponta Delgada, à cidade do Rio de Janeiro, pelo tempo de 6 meses. — José da Costa c sua mulher Antónia dos Santos, a Pernambuco. Ano de 1812: — António Jacinto Moniz, a Pernambuco. — João Jacinto Moniz, a Pernambuco. — João de Castro Medeiros, e sua mulher Dona Laureana Emilia Bellarbek e 2 filhos menores, a Pernambuco. — Manuel Francisco Leite de Vasconcelos, com sua mulher Maria Madalena Pimentel e seu filho António Pedro de Jesus, à cidade do Rio de Janeiro. — Maria de Jesus, Manuel José Cabral, sua mulher Genoveva Rosa e António José, a Pernambuco. Ano de 1813: — Maria da Rocha, à cidade do Rio de Janeiro. — Quitéria Coelho Bernarda Claudina, à mesma cidade. 32 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Ano de 1817: — Manuel José Galvão, cirurgião, à cidade do Rio de Janeiro. Diao José Maria de Bettencourt Vasconcelos e Lemos, com seus 2 creados por nomes Inácio Martins, de 23 anos, e João, de 9 anos, à cidade do Rio de Janeiro. Jacinto José Pereira, à Baía- — José Constantino de Brito, da Vila da Praia, à Baía. — Eugênia Maria Madalena, viuva de Francisco António George, de Angra, para a Baia. — José Borges Machado, à Baía,

RESUMO

Masculinos Femininos Totalidades Maiores Menores Maiores Menores Ano de 1767 :

Á Baía ...... 1 — — 1 1 Ano de 1770;

A Minas Gerais . . , 1 — — — 1 1 Ano de 1784:

À Baía...... 1 — 1 — 2 2 Ano de 1788;

Ao Rio de Janeiro . . 1 1 1 3 3 Ano de 1808:

À Baía 3 — _ 3 A Pernambuco. . . . 5 I 1 1 8 Ano de 1809: 8 1 1 1 11 11

Ao Rio de Janeiro . . 1 1 A Baía 1 — — — 1 2 — — — 2 2 A transportar . . . 20 DA ILHA TERCEIRA 33

Ano de 1810: Trasnporte • . . . . .; 20 A Pernambuco. • . . 1 — 1 2 4 4 Ano de 1811 : Ao Rio de Janeiro . . 1 — — 1; A Pernambuco. . • • 1 — 1 — 2 Ano de 1812: 2 — 1 — 3 3 Ao Rio de Janeiro , ■ 2 1 — 3 A Pernambuco . . • • 5 2 3 10: Ano de 1813; 7 2 4 — 13 13 Ao Rio de Janeiro . . 2 — 2 2 Ano de 1817: j O Ao Rio de Janeiro . . 3 1 — ■— 4: A Baía 3 — 1 — 4: 6 1 1 — 8 8 i ! 50

ILHA TERCEIRA

Ano de 1766 : — José de Medeiros de Albuquerque, a Minas Gerais — d'onde viera — com sua mulher D- Mariana Rosa Narciza, seus sogros João José de Oliveira e Inez Mesquita, e 3 filhos António, José e Maria, para a companhia de seu tio João Furtado Leite. — António Pereira, oficiai de Sapateiro, e José Cardoso, aleijado, de Angra, à Baía, «para pedirem esmola por ser cidade opullen- la e rica » — Pedro José da Silva, filho de Pedro Cardoso e de Maria Jo- sefa, já defunta, natural das Pontinhas, à cidade do Rio de Janeiro, pa- ra a companhia de seu pai. 34 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Ano de 1767;

José Coelho Linhares, de 56 anos, à Baía, para a companhia de seu filho. — Francisco Ferreira, de 63 anos, á cidade do Rio de Janeiro, a fazer cobrança de uma dívida. — Francisco Ferreira Velho, a Vila Rica, donde viera- — Gregório Ferreira, à cidade do Rio de Janeiro. — Ana Catarina, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro. — Estevam de Almeida, de Angia, à cidade do Rio de Janeiro com sua mulher Rosa Mariana e três escravas chamadas Joana, Cus- tódia e Maria, para a companhia de uns seus cunhados. — Quitéria Rosa e suas filhas Joaquina Maurícia e Felícia Rosa, e sua irmã Maria Antónia, à cidade do Rio de Janeiro, para a compa- nhia de seu marido. — Tereza Mariana, de Angra, à Baía, com sua filha Ana da Con- ceição, para seu marido João Pereira. — Luzia Antónia e irmã Barbara Mariana, à cidade do Rio de Janeiro.

Ano de 1768: Diogo José, assistente em Angra, à Baía, donde viera. — Francisco Ferreira Velho, de S Barbara, à cidade do Rio de [aneiro. Ano de 1769 :

João Pedro, de S. Barbara, filho de Manuel Cota Vieira, A ci- dade do Rio de Janeiro. — Mateus de Sousa Pacheco, de S. Barbara, a Minas Gerais, a fazer cobrança de avultadas quantias de dinheiro que devem a seu tio Manuel de Sousa Pacheco. — Josefa Luiza Cabral de Melo, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro, com António Francisco, por ser pobre. — Manuel Soares, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de um seu irmão. João de Deus Cardoso, de Angra, à mesma cidade. Francisco da Costa, da Ribeirinha, A mesma cidade. DA ILHA TERCEIRA 35

Tomé Ferreira, filho de João Ferreira, da Terra Chã, à cidade cio Rio de Janeiro, para a companhia de seu irmão António Nunes, assistente na Vila do Paraty. — António Machado e seu irmão André Lourenço, de S. Barba- ra, a Minas de Ferro do Frio, onde se acha estabelecido seu tio Antó- nio Machado. Manuel Gonçalves, da Terra Chã, ao Rir. de Janeiro, para a companhia de seu tio Francisco Ferreira Xouvisso. Pedro Cardoso Machado, de Angra, à cidade do Rio de |a- neiro, na recadaçâo dos bens que por óbito de seu filho, o rv.mo Pa- dre António Xavier Cardoso, lhe ficaram. João José de Melo, de S. Barbara, a Minas Gerais, para a companhia de seu tio Matias Machado Fagundes. — José Machado, das Lagens, à cidade do Rio de Janeiro. António Machado Jaques, natural e batisado da freguesia de S. João do Morro Grande, comarca do Sabará, Bispado de Mariana, filho de António Machado Jaqu.s, ao Sabará.

Ano de 1770;

José Caetano da Silva, filho de Manuel Teixeira, oficial de ■ourives, e de sua mulher Maria Antónia do Sacramento, e José Fran- cisco Luiz, filho de Francisco Luiz Fialho e de sua mulher Clara Ma- ria. Primos, menores de 25 anos, de Angra, aos campos de Peroubela, para a companhia de seus tios Henrique Cardoso Leal e Antonio Luiz Fiaiho, que os mandaram buscar, em razão de não terem herdeiros e se acharem muito adiantados em anos. — Francisco de Sousa de Menezes, das Lagens, filho de Pedro de Sousa, falecido e de sua mulher Barbara de Santo Antonio, à cida- de do Rio de Janeiro, para a companhia de seu lio, o P.e Manuel de Sousa Menezes, que o mandara buscar. — Antonio Coelho Linhaies, da Vila Nova, ã comarca da Vila do Sabará de Minas Gerais, com sua mulher Inez Francisca, e seus filhos Mariana, Rosa, Maria, Clara, Ana, Rita e João, menores, para a fazenda que para ele comprou seu filho Mateus Coelho, assistente nas ditas Minas. — José de Almeida, menor, da Vila de São Sebastião, a Minas 3fi BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Gerais, na deligencia de cuidar do governo e Administração dos bens que lhe foram deixados por seu tio Antonio Vieira de Almeida. Francisco Vieira de Borba, das Lagens, a Minas Gerais, na deligencia de haver os bens e fazenda que lhe ficaram por óbito de seu tio Pedro Borges. Jacinto Caetano de Lima, da Vila Nova, a Minas Gerais, na deligencia de cuidar do governo e fruição dos bens que lhe deixou seu tio Manuel Nunes Evagelho. Vicente José de Brum, da Vila da Praia, sua mulher Clara Vitoria de Jesus, e tia Francisca Úrsula, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de Miguel Correia. José Nunes Coelho, da Vila Nova, à mesma cidade, com sua mulher Mariana Antónia, filho José Coelho e filha Esperança de Jesus. — João Teixeira, à mesma cidade. Francisco Caetano Linhares, de S. Barbara, a Minas Gerais, para receber a herança de seu tio Mateus Luiz Rodovalho. Domingos José, Joana Rosa, órfãos de Manuel Afonso, de S. Barbara, à cidade do Rio de janeiro. Estácio, escravo de cor branca, de Caetano de Saa Rocha, de Angra, à cidade do Rio de janeiro. Luiz do Rego, de Angra, a cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de um seu filho, que o mandara buscar. — Lourenço Martins de Avila, de Angra, a Minas Gerais, a fazer recadação da herança que lhe adveio por óbito de seu tio. Ano de 1776 : Izidora Francisca, de Angra, a cidade do Rio de Janeiro para a companhia de seu marido Vicente José dos Santos, que a mandara buscar Dona Josefa Paim Pamplona, do Porto Martins, à mesma ci- dade, para a companhia de seu marido Antonio Machado Fagundes, com seus filhos Francisco Paim e D. Rita Paim Pamplona. Maria Clara, viuva, de Angra, à mesma cidade, a procurar o amparo de uma filha casada, que a mandara buscar, levando em sua companhia, uma afilhada por nome Maria de Santa Tereza, órfã de pai e mãe. Brislcs do Coração de Jesus, viuva, pobre, á mesma cidade, a DA 11.HA TERCEIRA 37 procurar a companhia de seus dois filhos, que assistem na mesma ci- dade, favorecidos da fortuna — Vitorino José de Vasconcelos, de Angra, à mesma cidade, para a companhia dum seu tio, que o mandara buscar. — António Ferreira Machado, de S. Sebastião, para arrecadar uma herança que adviera a seu pai, por falecimento de sua irmã, em Minas Gerais, comarca do Rio das Mortes. — Manuel Machado Corvelo, da Fonte do Bastardo, à mesma cidade, a procurar o amparo de seu tio. — Francisco Machado Martins, de Santa Barbara, a procurar o amparo de um seu tio, à mesma cidade. — João Francisco, homem livre, de Angra, à Baía, a tratar de certas dependências. Ano de 1778: - António de Almeida Ponte, de Angra, à Baía, com sua mu- lher Genoveva Rosa, e dois cunhados de menor idade, João e Maria, para a companhia dum seu tio, que o mandara buscar. — Pedro de Oeiras Rodrigues, da Vila da Praia, à Baía, para a companhia de seu sobrinho, Vicente José dos Santos, que o mandara buscar. — Francisco de Sousa Fagundes, à Baía, onde se acha estabele- cido, levando sua mulher Leonor Maria, filha Maria Joaquina de Jesus e genro Francisco António da Rosa. — João Pereira de Matos, á Baía, para o efeito de rec/i/zrr certas pipas de aguardente e assucar e outros generos precisos nesta ilha. — Manuel Dias da Costa, das Pontinhas, à B. ía, para receber a parte que lhe pertence da herança de seu tio Bernabé Dias, falecido em Minas Gerais. — Bruno Manuel do Carvalhal, de Angra, à Baia, para procurar o amparo de seu tio e tres irmãos que tem nos Estados da America. — Estácio Joaquim Ferreira, clérigo, à cidade do Rio de Janeiro para a companhia de seus pais. Ano de 1779: — José Caetano Martins, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro, com seus oito filhos, chamados José Martins Lobayo, Mateus Correia 38 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Martins, Manuel de Sousa Lobayo, Ana Maria Margarida, Teodora Feliciana da Anunciada, Mariana Benedita do Sacramento, Feliciana Ludovina de Nazaret e Luiza Tomazia Victorina, e seu cunhado Padre Jacinto Manuel de Almeida Lobayo, um fâmulo chamado Miguel Ma- chado e duas escravas, Joana e Maria. — José Simões, do Porto Martins, à mesma cidade. — João Borges, das Lagens, cà mesma cidade. — Pedro Fernandes, do Purto Judeu, á mesma cidade. Joana Josefa, à mesma cidade, com sua filha Doretêa. José Martins Soares, do Porto Martins, à mesma cidade. Joaquim José, da Agualva, à mesma cidade. — Francisco Vieira Arruda, de Angra, à mesma cidade. Manuel de Almeida Ponte, de Angra, à mesma cidade, com sua mulher Luzia Delfina e um filho de peito, chamado João. — José Martins, da Vila Nova, à mesma cidade. José Gonçalves, homem pardo, de S. Bartolomeu, à mesma cidade. — João Correia de Melo, do Porto Judeu, à mesma cidade. ■ Joaquim Mendes de Brjto, da Vila da Praia, à mesma cidade. Manuel Caetano, da Vila Nova, à mesma cidade. Paula Mariana, de S. Bartolomeu, à mesma cidade do Rio de Janeiro, com seu sobrinho Fernandes, Francisco Inácio, do Porto Judeu, à mesma cidade, Francisco Andrade, do Cabo da Praia, à mesma cidade. Antonio Vieira, da Vila da Praia, à mesma cidade, João Nunes, da Fonte do Bastardo, à mesma cidade. — Antonio Vieira de Borba, à mesma cidade, para a companhia de seu pai Matias Vieira da Areia. — Antonio Xavier Pereira, soldado artilheiro de meia Praça do Castelo de S. João Batista, à cidade do Rio de Janeiro, com licença de um ano, para o efeito de procurar o amparo de uns parentes que na dita cidade tem favorecidos de bens. — Manuel Caetano de Andrade, do Juncal, da Vila da Praia, à mesma cidade. Manuel Toste de Borba, de São Sebastião, à mesma cidade. Manuel Machado Valadão, do Juncal, à mesma cidade. — João do Rego de Menezes, das Lagens, à mesma cidade. DA ILHA TERCEIRA 39

— José Luiz, da Vila da Praia, à mesma cidade.

Ano de 1780 :

— José Inácio da Silveira, de Angra, à Baia onde tem seu esta- belecimento. — Mateus Rodrigues da Rosa, da Terra Chã, à Baia, com sua mulher Rosa de Santo Antonio e dois sobiinhos, Jacinto Caetano e Inácia Joaquina. — Ambrósio Manuel Teles c seu filho Mauricio José Teles, com com suas mulheres e uma filha de menor idade, à Baía. — Ponciano José Pereira, de S. Mateus, à Baía. — João Pereira da Costa, de Angra, à Baía, com sua mulher Maria Feliciana Barreto e quatro filhos menores, chamados Ana, Ma- ria, Cipriano e Jerónimo. — Jacinto José da Fonseca, à cidade do Rio de Janeiro. — Manuel Martins de Andrade, da Ribeira da Agualva, à Baía. — Francisco Cardoso, de Santa Barbara, à cidade do Rio de Janeiro. — Manuel Luiz, de S. Bartolomeu, à Baía. — Maria Micaela da Conceição, de Angra, à Baia, com dois filhos menores. Domingos e Ana. — José Gonçalves, de S. Bartolomeu, à Baía, com sua cunhada Maria Inácia, sua filha Tomazia Inácia e seu sobrinho Joaquim José. — José Ribeiro do Vale, à Baía. — Jacinto Machado Neto Ralinho, de Angra, à Baía. — Domingos de Sousa Tavares, de Angra, à Baía, com duas es- cravas pretas chamadas Rita de Jesus e Maria de Jesus. — Antonio de Almeida, da Vila da Praia, à cidade do Rio de Janeiro. — André de Linhares, do Porto Judeu, à Baía. — Antonio de Aguiar, da Serra da Vila da Praia, à Baía. — José Xavier, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro. — Bernardo Machado, menor, de S. Mateus, à cidade do Rio de Janeiro. — Francisco José da Fonseca, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro, pela da Baía. 40 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

José Antonio da Costa, de Angra, oficial de carpinteiro, á ci- dade da Baía. — João, homem preto, escravo do Capitão Fabiam Antonio de Almeida Tavares, à Baía. -- Manuel Pacheco de Lima, do Porto Judeu, à Baía. — Mariana do Carmo, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro com escala pela Baía. — Raimundo Gonçalves, de Angra, à Baía. — Antonio Gonçalves Laranjo, dos Biscoitos, à Baía. — Miguel Francisco, de Angra, à Baía. — Antonio Furtado, da Vila Praia, à Baía, Ano de 1781; —• José Benedito da Siiva, Presbítero do habito de São Pedro, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de seus pais, levando um seu moço chamado João Machado de Azera. — Maria Inácia de Jesus, viuva de João Baptista Francez, de An- gra, à cidade do Rio de Janeiro, levando em sua companhia um pre- tinho de menor idade, por nome José. — Diógenes Tiburcio Pamplona, de Angra, à mesma cidade. João Caetano de Sousa, da Vila da Praia, à mesma cidade. — Vicente de Sousa, de S. Mateus, à cidade do Rio de Janeiro. Tomaz Curvelo, de S. Mateus, à mesma cidade. — - Francisco Borges, das Lagens, à mesma cidade. João Alves Diniz, da Agualva, à mesma cidade. Pedro Ferreira Luiz, do Porto Judeu, à mesma cidade. — Francisco Fernandes Pimentel, de S. Mateus, à mesma cidade. João de Sousa Machado, de Angra, à mesma cidade. — Caetano Correia, de S. Mateus, à cidade do Rio de Janeiro. Antonio Martins, de Angra, à mesma cidade. — Manuel Soares de Azevedo, do Porto Judeu, à mesma cidade. José Borges Leal, de Angra, à mesma cidade. Tomaz Borges, das Lagens, à mesma cidade. — José Luiz de Aguiar, das Lagens, à mesma cidade. — André Gonçalves, das Pontinhas, à mesma cidade. — José Nunes de Mendonça, da Fonte do Bastardo, á cidade do Rio dc Janeiro. DA ILHA TERCEIRA 41

— Mateus Machado, à mesma cidade. — [acinto José Ferreira, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de seu tio José Francisco, que o mandou buscar. — Catarina do Espirito Santo, de Angra, à mesma cidade, com sua filha menor, Mariana. — Francisco Pereira, do Porto Judeu, à mesma cidade. — Manuel d'Avila, da Vila da Praia, à mesma cidade. — Antonio Ferreira Velho, de S. Barbara, à cidade do Rio do Ja- neiro. — Valério José, de Angra, à mesma cidade. — Manuel Machado, do Porto Judeu, à mesma cidade. — Luiz da Costa Diniz, da Ribeirinha, à mesma cidade. — Antonio José de Bettencourt, da Vila da Praia, à mesma cidade. — Manuel Vieira Pacheco, de Angra, à mesma cidade. — Pedro José, de Angra, à mesma cidade. — José Machado Ribeiro, de Suão Sebastitão, à cidade do Rio de Janeiro. — José Inácio, de Angra, à mesma cidade.

Ano de 1782;

— José Antonio da Silva e Melo, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro.

Ano de 1784;

— Manuel Pereira, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro. ~ João Dias, das Pontinhas, à mesma cidade, para companhia dum seu tio. — Mariana Josefa, de Angra, à cidade do Rio de janeiro, para a companhia de seus irmãos, que a madaram buscar. — José Francisco Pereira, de Angra, â cidade do Rio de Janeiro, para companhia de seu tio Jacinto Pereira Machado, que o mandara buscar. — Inácio Camelo de Menezes Pamplona, de Angra, à mesma cidade, para viver na companhia de seus tios o Alferes Antonio Ma- chado Mendonça e Gonçalo Correia de Menezes. 42 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Ano de 1785;

Violante Rosa Joaquina, de Angra, a Minas Gerais, para rece° ber o beneficio da companhia de seu primo Antonio Pereira, que a mandara buscar. Antónia Maria de Jesus, de Angra, à cidade do Rio de Janei- ro, para a companhia de seu marido João de Sousa Machado, que a madara buscar e a seus dois filhos menores Maria Antónia e João Inácio. Antonio de Sousa Mendes, de Angra, à mesma cidade. — Antonio Machado Vieira, da Vila da Praia, à cidade do Rio de Janeiro, com sua filha Joaquina Rosa, para a companhia de um seu filho, que se acha favorecido de bens. — Manuel Machado Mendes, da Casa da Ribeira, à mesma cidade. Antonio Machado Nunes, da Fonte do Bastardo, à mesma cidade, para a companhia de seu irmão José Nunes de Mendonça, que o mandara buscar. Miguel Machado, de S. Bartolomeu, à mesma cidade, para a companhia de um seu tio para lhe dar modo de vida. Caetano de Sousa Coelho, das Lagens, à mesma cidade, para companhia de um seu tio. — Tomazia Mariana, de Angra, à Baía, para a companhia de seu marido José Cardoso. João de Sousa, das Lagens, à Ilha de Santa Catarina, para a companhia de seu tio Padre Manuel de Sousa, que o mandara buscar para o favorecer. — Antonio Machado, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de um seu tio que o mandara buscar para o favo- recer. — José Vicente de Noronha, Angra, à cidade do Rio de Janeiro. Manuel Borges de Andrade, das Lagens, à mesma cidade, pa- ra a companhia de um seu tio e dois irmãos, que o mandaram buscar para o favorecerem. — íoão Borges Homem, dos Altarea, à Ilha de Santa Catari- na, a deligenciar procuração bastante de seu tio Antonio Correia Bor- ges. — Manuel de Aguiar, da Vila da Praia, à cidade do Rio de Ja- DA ILHA TF.RCFJRA 43 neiro, para a companhia de seu irmão José de Aguiar de Almeida, que o mandara buscar. — Agostinho José, da Vila da Praia, à mesma cidade, a procurar modo de vida por não poder conseguir o seu adiantamento nos Estu- dos a que se tinha aplicado. — José Machado, da Vila da Praia, à mesma cidade, para a com- panhia de seu irmão germano, Francisco Machado Mondes, que o mandara buscar. — Jacinto Pereira, de S. Mateus, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de seu tio Jacinto Pereira. — José Martins de Andrade, da Vila da Praia, à mesma cidade, para a companhia de seu irmão Antonin Martins, que o mandara buscar. — Ana Claudina Vitorina, do Angra, à mesma cidade, para a companhia de seu irmão Manuel José Correia, que a mandara buscar. — Manuel Fernandes, das Lagens, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de seu tio Manuel Fernandes de Aguiar, que o man- dara buscar. — Lourenço Correia de Melo, à mesma cidade, para a compa- nhia de seu tio, Sebastião Correia de Melo, que o mandara buscar. — Diogo Alvaro, dos Biscoitos, à mesma cidade, para receber certa herança que lhe adveio por falecimento de João Romeiro. — Antonio Coelho, de S. Bartolomeu, à mesma cidade, a procu- rar modo de vida. — Martinho José Ferreira, de S. Sebastião, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de seu irmão Antonio Ferreira Machado, que o madara buscar. — Manuel Cardoso, de Santa Barbara, à cidade do Rio de Janei- ro, a procurar o amparo de seu tio Antonio Gonçalves. — Antonio Joaquim de Avila, de Angra, à mesma cidade, para a companhia de um seu irmão para lhe dar um modo de vida. — João Ferreira Velho, de S. Bartolomeu, à mesma cidade, a levar a seu irmão uma C.am de Banhou, e ver se o favorecia e a seu pai. — Antonio Francisco Ferraz, de Angra, à cidade do Rio de Ja- neiro, a receber certa herança que lhe adveio pelo falecimento de João Ribeiro, tio de sua mulher Ana Rosa, que leva em sua compa- nhia, e dois filhos, um de vinte meses e outro de três. 44 BOLOTIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

— João de Castro do Canto, de Angra, ao Rio de Janeiro a pro- curar modo de vida segundo a sua qualidade de nascimento. •— José Gonçalves, de Angra, ao Rio de Janeiro, para a compa- nhia de seu pai Jose Gonçalves Martins, que o mandara buscar. Beatriz Maria, do Cabo da Praia, à mesma cidade, para a com- panhia de um seu irmão. — José Toste, do Belo Jardim, à mesma cidade, com sua mulher Josefa Antónia, e seus filhos, Joaquim, José, e um de peito. — Mateus Romeiro, do , à mesma cidade, a receber certa herança que lhe adveio por falecimento de seu tio João Romeiro. Manuel Paim, do Cabo da Praia, à mesma cidade, para a companhia de seus pais, que o mandaram buscar, levando sua mulher Tomazia Mariana e dois filhos, Mariana e Mauricio. — Manuel de Sousa, das Pontinhas, à cidade da Baía, a procurar modo de vida, em razão da sua muita pobreza. — Manuel de Borba, à mesma cidade, a procurar modo de vida por viver pobremente. João Pereira de Matos, de Angra, à mesma cidade. Tomaz de Sousa, da Vila da Praia, à mesma cidade, a procu- rar modo de vida. — Francisco Xavier Coelho, à mesma cidade, para a companhia de seu pai Tomaz Francisco Coelho. — Francisco Machado, de S. Bartolomeu, à mesma cidade, para a companhia de seu tio Manuel Machado. — fose Joaquim da Silva, de Angra, à Baía, a tratar de negocios de seu pai Joaquim José de Sousa. — Manuel Aguiar de Almeida, da Vila da Praia, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de seu filho José de Aguiar de Almeida que o mandara buscar. ' — Mateus Cardoso, das Pontinhas, à Baía. a procurar modo de vida.

Ano de 1786:

- Francisco Cardoso Mancebo, de Angra, à cidade do Rio cie Janeiro, a procurar a companhia de seus pais. DA ILHA TERCEIRA 45

— Antonio Fernandes, de S. Barbara, à mesma cidade, com sua mulher Maria Josefa e seus filhos, Antonio, João, Maria, Barbara e Joana, a procurar modo de vida. — Francisco Machado Roiz, das , à mesma cidade, com sua mulher Maria Antónia e seus filhos, Antonio Machado, Fran- cisco Machado, Mateus Machado, Antonio Correia, Ana e Joana, a procurar modo de vida. Capitão João de Barcelos Pimentel, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro, Antonio de Menezes Camelo Rego, menor, natural da Vila da Praia, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de seu irmão Inácio Camelo, e seus tios, levando em sua companhia um seu moço chamado Francisco Machado. — José Coelho, das Doze Ribeiras, à cidade do Rio de Janeiro, a procurar modo de vida, levando em sua companhia sua mulher Maria Josefa e um filho do peito. — Maria Eugênia, da Terra-Chã, à cidade do Rio de Janeiro, para companhia de seu marido José Fagundes, que a mandara buscar e a sua filha Maria do Carmo. Serafina Mariana, viuva, de S. Bento, à mesma cidade, para a companhia de um seu filho, que a mandara buscar. — João Inácio Pereira, da Terra Chã, à cidade do Rio de Janeiro com sua mulher e filha, a procurar modo de vida. — Jacinto José de Freitas, da Agualva, à mesma cidade, a pro- curar modo de vida. — Francisco Machado Alves, da Agualva, à mesma cidade, a pro- curar modo de vida. — Leonarda Joaquina, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro, pa- ra a companhia de um seu tio que a mandara buscar. Simão Teixeira Flores, de S. Sebastião, à cidade do Rio de Janeiro, a procurar modo de vida, cmn sua mulher Delfina Plácida e sua filha Rosa, — Antonio Francisco Ramalho, da Vila da Praia, à cidade do Rio de Janeiro, a procurar o amparo de uns seus parentes em razão da sua pobreza, levando em sua companhia sua mulher D. Leonor Joaquina Tavares e seis filhos chamados, D. Mantildes Tomazia Joa- quina, D. Faustina Rosa de Medeiros, D. Tereza Joaquina de Medei- 46 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO ros, D. Maria Tereza de Medeiros, José Francisco Ramalho e Luiz Francisco Ramalho. — Manuel Simões, de S. Bento, à cidade do Rio de Janeiro, a procurar a companhia de uns seus parentes levando sua mulher Mariana Josefa e tres filhos Inácio Simões, Maria Joaquina e Aldina Vitorina. •— Manuel Rodrigues, da Terra Chã, à cidade do Rio de Janeiro, a procurar modo de vida, levando sua mulher Joséfa Mariana. Margarida Joaquina, da Agualva, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de seus irmãos, com seus tres filhos chamados Genoveva Rosa, Vitoria de Ascençâo e Manuel. José Nunes, de S. Sebastião, à mesma cidade, a procurar a companhia de seus irmãos. — Manuel Machado, de Angra, à mesma cidade, a procurar mo- do de vida, com sua mulher Leonarda Francisca e duas filhas Joséfa Clara e Maria do Amparo, Maria Antónia, da Vila da Praia, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de seus irmãos que a mandaram buscar, com seu filho José da Silveira e sua sobrinha Maria Joséfa. — Mateus Gonçalves Leonardo, da Ribeirinha, à mesma cidade, para procurar o amparo de um seu tio. Manuel Cardoso de Borba, da Casa da Ribeira, à mesma cida- de, para a companhia de seu irmão João Machado de Borba. José da Camara e Sá, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro, a procurar modo de vida, levando em sua companhia sua mulher D. Rita Izabel e uma sua filha D. Joana Helena e sua irmã D. Catari- na Lusiana. — José Joaquim Francisco, de S. Mateus, à cidade do Rio de Janeiro, a procurar modo de vida, levando em sua companhia sua mulher Gertrudes Margarida, sua sogra Catarina Joséfa, e seis filhos chamados Manuel, Diógenes, Severo, Florida, Francisco e Vi- ctoriano. — Silvestre Martins, de S. Bento, à cidade do Rio de Janeiro, a procurar modo de vida com sua mulher Leonarda Laurea Vitorina e dois filhos menores, Margarida e Antonio. — José Lopes, menor, de Angra, à mesma cidade, a procurar modo de vida na companhia de um seu cunhado. DA ILHA TERCEIRA 47

— Maria Perpétua, menor, de Angra, à mesma cidade, para a companhia de duas tias. — Antonio Ferreira Ormonde, de S. Sebastião, à mesma cidade, a procurar o amparo de seus tios João Ferreira Ormonde e João Vi- eira Borges. — Manuel Gonçalves Maduro, de S. Bartolomeu, :à mesma cida- de, a procurar modo de vida. — Dom Miguel Inácio do Canto Castilbranco, à cidade do Rio de Janeiro, a procurar modo de vida. — Manuel Gonçalves, das Pontinhas, à cidade do Rio de Janeiro, a procurar modo de vida, com sua mulher Mariana Felícia. — Francisco de Aguiar, das Pontinhas, à cidade do Rio de Janeiro, a procurar modo de vida, com sua mulher Catarina de S. Joaquim e tres filhos de menor idade Manuel, Francisco e Gertrudes. — Joaquim José de Sousa, de Angra, à mesma cidade, a procu- rar modo de vida, levando em sua companhia sua mulher Rosa Joa- quina da Silva, sua mãe Margarida Antónia de Vasconcelos, sua cunha- da Maria Micaela do Carmo e seis filhos de menor idade, Maria Ma- ximina, José foaquim, João, Ana, Eusébio e Agostinho. — António de Sousa, homem preto, de S. Bartolomeu, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de seu pai. — Maria Vitória, de S. Bartolomeu, à mesma cidade, com sua irmã Mariana de Jesus, a procurar o amparo de seus irmãos, que os mandaram buscar. — José de Sousa, de menor idade, de S- Mateus, à mesma cida- de, para a companhia de seu tio André de Sousa que o mandara buscar. — Francisco José Pinheiro, de Angta, à cidade do Rio de Janei- ro, a procurar modo de vida. — Rosa Feliciana, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de seu irmão Francisco Correia. — José António de Barcelos, das Lagens, à mesma cidade, a procurar modo de vida. —Francisco Machado de Azera, da Vila da Praia, à cidade do Rio de Janeiro, a procurar modo de vida. — António Machado Luiz, das Doze Ribeiras, à cidade do Rio de Janeiro, a procurar modo de vida, levando em sua companhia sua mulher Rita dos Anjos e três filhos Manuel, António e Josefa. BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

André de Sousa, da Viia da Praia, á mesma cidade, para a companhia de sua avó que o mandou buscar. José Aguiar, da Vila da Praia, à mesma cidade, a procurar a companhia de tres filhos. — Francisco Teixeira, escravo pardo, à cidade do Rio de Janeiro, por ordem do»seu senhor o Sargento Mór Francisco Pereira de La- cerda, de Angra. José Machado, de Angra, à mesma cidade, para a companhia de seu irmão, que o mandou buscar. José Roiz, das Lagens, à mesma cidade, para a companhia de seu tio Manuel de Aguiar Coelho. Antonio Ferreira Nunes, da Vila da Praia, à mesma cidade, para a companhia de um seu irmão, com sua mulher Maria Antónia, seu filho José Antonio Dutra e sua nora Maria da Conceição. Francisco Machado Azevedo, da Agualva, à mesma cidade, a procurar modo de vida. José Machado Toledo, de S. Barbara, à mesma cidade, a pro- curar modo de vida. José Nunes Simões, da Agualva, à mesma cjdade, a procurar modo de vida. Manuel Lopes, da Vila da Praia, à mesma cidade, a procurar modo de vida. — Manuel Nunes de Aguiar, das Lagens, à mesma cidade, para companhia de seu pai. — Dom Joaquim Inácio do Canto, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro, a negocio de sua utilidade. — José de Sousa Soares, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro, pa- ra procurar meio de sua vida, levando em sua companhia sua irmã Genoveva Vitoria.

Ano de 1787;

— Sebatião José de Lima, da Vilha da Praia, à cidade do Rio de Janeiro, a procurar modo de vida, levando em sua companhia sua mulher D. Antónia Vicencia e seus filhos Jacinto, João, Francisca e Rosa. Braz Correa, de Angra, à mesma cidade, a procurar modo de vida, levando sua mulher Maria do Amparo e um filho menor José. DA ILHA TERCEIRA 49

— José Francisco Pacheco, de Angra, à mesma cidade, a cuidar de certa dependência de sua utilidade, levando um filho menor José. — Francisco Xavier Cardoso, de Angra, à mesma cidade, a cuidar de certa dependência de uma herança. — José Coelho Machado de Melo, de Angra, ao Rio Grande, on- de tem seu estabelecimento. — Tereza da Conceição, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de sua filha e genro que a mandaram buscar. — José Gonçalves, de Angra, à mesma cidade, a procurar modo de vida, com sua mulher Inácia Joaquina e quatro filhos Maria, Fran- cisco, Fabrício e Gertrudes. — Florência Maria, de Angra, à mesma cidade, com sua filha, Mariana Francisca, e um filho menor chamado Francisco, para a com- panhia de seu filho Antonio Francisco Ferraz. — José Coelho Machado, de Angra, a Minas Gerais com seu filho Francisco Borges Coelho, natural de Minas. — Maria Joaquina, de Angra, à cidade do Rio do Janeiro, para a companhia de sua filha que a mandou buscar, levando um filho me- nor chamado Francisco. —José Freitas, de Angra, à mesma cidade, a procurar modo de vida. — Antonio Silveira de Bettencourt, de Angra, à mesma cidade, pa- ra a companhia de seu tio Francisco Silveira Bettencourt. — Manuel Cardoso Velho, de Santa Barbara, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de seus primos Vicente Romeiro e Fran- cisco Machado Velho, para o favorecerem em razão da sua pobreza, e ser anão, e falte de forças para trabalhar. — Manuel Machado de Aguiar, da Vila da Praia, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de seu irmão José Machado de Aguiar. — Catarina Josefa, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro, com suas sobrinhas Rosa Joaquina e Catarina Rosa, para a companhia de seu marido Jerónimo Silveira. Antonio Machado de Miranda, da Ribeirinha, à mesma cidade, procurar a companhia de um seu irmão. — Antonio Vieira Borba, da Vila da Praia, à mesma cidade, com seu filho, Inocêncio José de Borba, sua nora Catarina Luiza e dois netos menores chamados José e Inocêncio, a procurar a companhia de seu irmão Manuel Vieira de Borba, para lhes dar modo de vida. 50 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

— Eufemia Rosa, viuva, de Angra, à mesma cidade, com sua fi- lha DdfinaBemarda, para a companhia de sua prima Maria da Ascenção. — Joaquim José Furtado, de Angra, à mesma cidade, a procurar modo de vida. Domingos José Cardoso, viuve, de Angra, à mesma cidade, com seu filho José José Pacheco, dos , homem pardo, à mesma cidade, a procurar modo de vida, José Inácio, menor, de 14 anos, de Angra, à mesma cidade, para companhia de seu tio Manuel Pereira de Fontes, que o man- dara buscar. — Francisca Vitoria, de Angra, à mesma cidade, para companhia de sua tia Izabel de Jesus. — José Antonio de Oliveira, de S. Bento, à mesma cidade, com suas irmãs Maria Joaquina e Ana Maurícia, a procurar modo de vida. — Francisco Borges, da Casa da Ribeira, à cidade do Rio de Ja- neiro, para companhia de seu tio. Manuel Martins Machado, da Agualva, à mesma cidade, com sua mulher Maria Jacinta e uma filha chamada Maria, a procurar mo- do de vida. J0ão Pereira de Melo, da Agualva, à mesma cidade, com sua mulher Catarina da Anunciada e seus filfròs Frutuoso, José, Genove- va, Jacinta e Margarida, a procurar modo de vida. Francisco da Costa, da Ribeirinha, à mesma cidade, a procu- rar a companhia de um seu tio. — Úrsula Joaquina, de Angra, à mesma cidade, a procurar a companhia de alguns seus parentes. ~ Ana Joaquina, de S- Bartolomeu, à mesma cidade, a procurar o amparo de uns seus tios que a mandaram buscar. António Luiz de Sousa, da Vila da Praia, à mesma cidade, para a companhia de seu irmão José Luiz de Sousa. — Francisco Cardoso e António Vieira Vaz, da Casa da Ribeira, à mesma cidade, para a companhia de um seu irmão. — José António Cordeiro, da Agualva, cà cidade do Rio de Ja- neiro, com sua mulher Mariana de Jesus e dois filhos menores, Ma- nuel e Luiz, n procurar modo de vida. DA ILHA TERCEIRA 51

— Severino José da Camara, de Angra, á mesma cidade, com sua mulher Rosa Narcisa e uma filha menor chamada Maria. — António Fernandes, do Porto Judeu, á mesma cidade, a pro- curar a companhia de um seu tio, que o mandou buscar. André Rocha Evangelho, de São Bartolomeu, á cidade do Rio de Janeiro, para a companhia do seu irmão Pedro da Rocha Evangelho. — Manuel da Costa, de Angra, á cidade do Rio de Janeiro, a procurar a companhia de seus irmãos, com sua mulher Esperança Cla- ra, e dois filhos menores Agostinho e Maria. José Francisco de Barcelos, de São Sebastião, á cidade do Rio de Janeiro, a procurar a companhia dos pais. Hipólito Pereira, de São Mateus, á mesma cidade, a procurar o amparo de seu fio Jacinto Pereira Machado. Francisco Xavier de Sousa, de Angra, á mesma cidade, a pro- curar a companhia de seu tio José de Sousa. — João Ferreira Simões, do Porto Martins, á mesma cidade, a procurar a companhia do seu irmão José Simões- António Gonçalves Laranjo, dos Biscoitos, á mesma cidade, a receber a herança de seu pai. — José de Sousa, de Angra, á mesma cidade, a procurar modo de vida, com sua mulher Josefa Bernarda e filha Ana Joaquina. — José Caetano de Andrade e António Caetano de Andrade, da Vila da Praia, á cidade do Rio de Janeiro, a procurar a companhia de seu tio Manuel Fernandes de Aguiar. — José da Costa, de Angra, à mesma cidade, a procurar modo de vida. — José Domingos de Oliveira, de Angra, á mesma cidade, a pro- curar modo de vida, levando em sua companhia sua mulher Francisca Mariana, dois filhos menores, António e Francisco, sua sogra Rosa Mariana, sua cunhada Faustina Mariana. — Francisco Ferreira Brioso, da Vila da Praia, à cidade do Rio de Janeiro, a procurar modo de vida, levando seu filho Francisco Borges. Manuel Gonçalves, dos Biscoitos, à mesma cidade, a procurar modo de vida. — Francisco João Cardoso, de Angra, à mesma cidade, a procu- rar modo de vida. 52 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

— Frutuoso José de Aguiar, da Vila da Praia, à cidade do Rio de Janeiro, a procurar modo de vida, levando em sua companhia sua mulher Jacinta Maria e cinco filhos menores Ana, Maria, José, Jacinto e Mateus. José Caetano Pires, da Vila da Praia, à mesma cidade, a pro- curar modo de vida. José António dos Santos, de Angra, à mesma cidade, a procu- rar modo de vida, levando sua mulher Mariana Josefa, dois filhos menores, Luiz e António, sua tia Francisca da Encarnação, com um fi- lho menor António. — D. Flora de Merens. do Porto Judeu, à cidade do Rio de Ja- neiro, a procurar a companhia de seu irmão, levando suas três filhas D. Maria Merens, D. Rita Paim Pamplona e D. Clara Merens de Vasconcelos. Rosa de Jesus, viuva, de Angra, à mesma cidade, levando em sua companhia duas filhas chamadas Angélica Rosa, solteira, e Tomá- zia Miriana, casada, com tiês filhos de menor idade, chamados João, Mariana e Maurícia, para a companhia de seu marido Manuel Paim Fagundes. — Miguel do Couto, dos Biscoitos, à mesma cidade, a procurar modo de vida. Joaquim Luiz Arruda, da Vila da Praia, á mesma cidade do Rio de Janeiro, a procurar modo de vida. João Vieira Lopes, à mesma cidade, com sua mulher Feliciana Maria e dois filhos um de peito chamado José e outro António e um seu irmão Jacinto Vieira. — Joaquina da Rosa, viuva, de Angra, à cidade do Rio de fanei- ro, com seu filho João Inácio e três irmãs Josefa Teodora, Mariana Josefa e Rosa Narcisa, Francisco Machado, da Vila da Praia, à mesma cidade, a pro- curar a companhia de seus sobrinhos, para o favorecerem. — João Tavares, de Angra, à mesma cidade, a procurar a com- panhia de seus tios. José de Freitas de Aguiar e João Machado de Aguiar, da Vila da Praia, à mesma cidade, para a companhia de seu irmão Manuel Fernandes de Aguiar. — Jacinta Feliciana, de Angra, à mesma cidade, para companhia de um seu tio. DA ILHA TERCEIRA 53

— Maria da Soledade e António Martins, de Angra, à mesma ci- dade, na companhia de seu cunhado José Domingos, que vai procurar modo de vida. — José Pereira, de Angra, à cidade do Rio de Janeiro, para a companhia de um seu tio que o mandara buscar. RESUMO Masculinos Femininos Totalidades Maiores Menores Maiores Menores Ano de 1766; Ao Rio de Janeiro . . 1 1 À Baia 2 2 A Minas Gerais • • 2 2 2 1 7 Ano de 1767: 5 2 2 1 10 10 Ao Rio de Janeiro . . 3 — 7 3 13 A Baía 1 1 2 A Vila Rica 1 1 Ano de 1768: 5 — 8 3 16 16 Ao Rio de Janeiro . . 1 — 1 ÀBaía- 1 1 Ano de 1769: 2 — — — 2 2 Ao Rio de Janeiro • . 9 1 10 A Minas Gerais . . . 2 — 2 A Minas do Ferro Frio 2 — 2 Ao Sabará 1 1 Ano de 17?0: 14 — 1 — 15 15 Ao Rio de Janeiro . . 15 8 23 A Minas Gerais • ■ ■ 12 12 ACampos de Peroubela 2 2 Ao Sabará 1 1 1 6 9 30 1 9 6 46 46 A transportar 89 54 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Ano da 1776: Transporte 89 — Ao Rio cie Janeiro . . 4 6 10 A Baía . 1 — — 1 A Minas Gerais . . . 1 — — 1

Ano de 1778: 6 — 6 12 12 Ao Rio de Janeiro . 1 — 1 A Baia ...... 7 1 3 1 12 Ano de 1779: 8 1 3 1 13 13

Ao Rio de Janeiro . . 30 2 8 3 43 43 Ano de 1780:

Ao Rio de Janeiro . . 5 — — — 5 À Baia ...... 24 3 11 4 42 Ano de 1781: 29 3 11 4 47 47

Ao Rio de Janeiro . . 33 1 1 35 35 Ano de 1782:

Ao Rio de Janeiro . . 1 — __ ✓ 1 1 Ano de 1784:

Ao Rio de Janeiro . . 4 — 1 5 5 Ano de 1785:

Ao Rio de Janeiro . . 30 2 7 2 41 A Baia ...... 8 — 1 — 9 A Minas Gerais . . . — — 1 1 A Ilha de S. Catarina 2 — — 2 40 1 2 9 2 53 53 A Transportar . . . 298 DA ILHA TERCEIRA 55

Ano de 1786; Transporte 298 44 12 130 130 Ao Rio de Janeiro . 56 18 Ano de 1787: Ao Rio de Janeiro . 58 26 46 12 142 A Minas Gerais . . 2 — — — 2 Ao Rio Grande . . 1 1 61 26 46 12 145 145 573 CERVANTES ESTEVE NA TERCEIRA ?

Por J. AGOSTINHO

É tradição ameigada entre os historiadores nacionais, e até admitida por alguns de países estranhos, que Miguel de Cervantes veiu à Terceira com uma das expedições que Filipe II de Espanha enviou contra esta ilha, ou fosse na que terminou desastradamente na Salga, ou na mais afortunada empresa de D. Alvaro de Baçan, marquês de Santa Cruz. A comemoração do quarto centenário de Cervantes arrastou um recrudescimento de investigações sobre a vida do imortal autor e, entre pormenores que voltaram à balha, lá veiu de novo a questão da sua passagem por esta ilha. Abordou-a o catedrático espanhol de Geografia e História, Dr. Isidoro Escagiiés y Javierre, numa conferência pronunciada na Sociedade de Geografia de Lisboa, a 26 de Fevereiro de 1948, e reproduzida no Boletim da Sociedade, correspondente aos mêses de Março e Abril do corrente ano. Traduzimos aqui o que a tal respeito disse o Dr. Escagiiés :

« Não faltam também, nas obras cervantinas, referências a outras zonas lusitanas. Em numerosas ocasiões menciona a índia Portuguesa, Goa e outros pontos dolongíquo Oriente sob a soberania desta nação; e inclusivamente temos uma alusão às ilhas Terceiras, motivo pelo qual alguns escritores DA ILHA TERCEIRA 57

portugueses e até espanhóis (') tem sustentado a opinião de que Cervantes tomou parte na expedição militar contra os Açores. O Professor Lizon C) opina comnosco, que Cervantes não esteve nestas ilhas, «que foi seu irmão Rodrigo quem, no regresso, com a ânsia das ruas lisboetas, matizadas de ouro e maravilhas, devia ter tanta impaciência como o capitão do romance que insta o grumete com voz palpitante :

Sobe, sobe marujinho, acima ao mastro real, vê se vês terras de Espanha, areias de Portugal.»

Cervantes não esteve nos Açores, e, como mostra desta opinião, indicaremos aquilo que brevemente o escritor diz a respeito das ilhas Terceiras em uma das suas novelas O : « Seis dias navegaram os dois navios com próspero vento, seguindo a derrota das ilhas Terceiras, paragem em que nunca faltam, ou naus portuguesas das índias Orientais, ou algumas extraviadas das Ocidentais. E ao cabo de seis dias lhes deu pelo costado um rijíssimo vento, que no mar Ocea- no tem outro nome diferente do que lhe dão no Mediterrâneo onde se chama meio-dia, o qual vento foi tão durável e tão rijo, que sem deixar tomar as ilhas, lhes foi forçoso correr para Espanha. » Se Cervantes tivesse conhecido pessoalmente os Açores, teria descrito as ilhas com mais largueza e realismo do que faz no parágrafo anterior, sobretudo se recordamos as bele- zas naturais que possuem. E, se houvesse pisado estas ilhas,

t1) F. Caballero— «Perícia geográfica de Miguel Cervantes demostrada en a historia de Don Quijote de la Mancha». 2.a ed. Madrid, 1905, p. 23 (cit. pelo Dr. Escagiiés). (2) Adolfo Lizon. —«El viaje de Miguel Cervantes a Portugal». Conferencia pronunciada no Ateneu de Madrid em 12 de Julho de 1947 (idem). PJ La Esparíola Inglesa (idem). 58 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

seguramente que não teria caído no erro geográfico de supôr que nessas zonas «nunca faltam naus portuguesas das índias Orientais», pois é bem sabido que a rota marítima de Lisboa à índia não passava pelos Açores, mas sim pelas ilhas da Madeira; seguindo também a sua fantasia, e não uma impres- são pessoal, «o rijíssimo vento que no mar Oceano tem ou- tro nome diferente do que lhe dão no Mediterrâneo», «vento durável e rijo» segundo o escritor, é desconhecido naquelas latitudes, pois é bem sabido e são muito conhecidas e temidas pelos marinheiros as longas calmas dos mares açorianos e a placidez e quietação da sua atmosfera em todas as estações. Estes erros são filhos, na realidade, do desconhecimento absoluto daquelas latitudes. Se Cervantes tivesse conhecido as ilhas dos Açores, te- ria falado delas de forma diferente do que faz, pois que cons- tituem hma fonte permanente de inspiração para qualquer escritor por causa das suas belas paisagens. E disto pode- mos ter certeza absoluta, pois outras regiões da Terra que intervem nas suas obras, quando lhe eram conhecidas, descre- ve-as com absoluta perfeição. E inclusivamente, para dar mais força aos nossos argumentos, podemos assegurar que os dois erros geográficos que se encontram ao falar das ilhas Terceiras, são dos poucos e raros de toda a geografia cer- vantina».

Ha realmente na argumentação do Dr. Escagués uma afirmativa que nos dá que pensar, mas que só homens de letras, versados na obra cervantina, poderão esclarecer: é o facto de Cervantes ter pas- sado por alto sobre as belezas naturais destas ilhas, que tanta tinta tem feito correr a autores antigos e modernos. Eia Cervantes real- mente um paisagista ? Do que conhecemos do Quixote não o pode- mos afirmar. Haveria talvez uma razão para Cervantes não desejar alongar-se em descrições dos Açores : se veiu na expedição de D. Pe- dro de Valdez, ficou com certeza a amaldiçoar a Terceira e todo o pitoresco das suas encostas e ladeiras, muito principalmente aquela que de S. Sebastião desce para o Porto judeu. .. DA ILHA TERCEIRA 59

Se veiu na armada do marquês de Santa Cruz, deveriam também as remeniscências da ilha andar-lhe na mente tão misturadas com as cenas trágicas da tomada e do saque, que decerto a sua veia ge- nial preferiria desviar-se para outras paragens. Onde porem o Dr. Escagués é mais positivo é na sua argumen- tação geográfica e esta, valha a verdade, é toda a favor de Cervantes. Na verdade, nem na menção da derrota das naus da índia pelos Açores, nem nos pormenores sobre o vento do meio-dia (como se lhe chama no Mediterrâno) ou vento sul, como agora lhe chama toda a gente, o grande génio de Cervantes se enganou. As naus da Índia não tocavam nos Açores, na ida, mas sim na volta. E esta escala era quasi normal, porque, como tão bem tem de- monstrado o nosso grande geógrafo, o Almirante Gago Coutinho, os ventos do Nordeste, que predominam na zona subtropical, obrigavam os navios que singravam para o Norte, a bordejar até à latitude dos Açores, aproveitando depois daqui para Lisboa os ventos que são predominantemente do quadrante de Oeste Esta escala pelos Açores tinha ainda a vantagem de afastar os navms das costas africanas, infestadas de piratas, dando-Ihes aso a reumrem-se aqui e seguirem depois de conserva, às vezes mesmo acompanhados de um comboio de navios da Armada, até à metrópole. Esta escala pelos Açores pôde dizer-se que data das primeiras navegações para a índia, pois que nem o próprio Vasco da Gama escapou a ela. São bem conhecidas aliás as instituições existentes na Terceira, destinadas a socorrer do necessário as naus da índia, entre as quais avultava a Provedoria das Armadas; e as ordens reais, já o tempo de D. Manuel, sobre o que haveria a fazer-se aqui com re- lação a essas naus. Emquanto ao vento sul rijíssimo, que teria afastado destas para- gens os dois navios referidos na novela de Cervantes, é tudo quanto ia, senão de mais trivial, pelo menos de suficientemente frequente para que a asserção seja absolutamente veiossímil. O que não é veros- simil, mas está bem em oposição com a realidade, é a existência de calmarias nos Açores, terras das mais ventosas que ha por esse mun- o ora, infelizmente para quem cá vive, e para quem nos seus mares tem de navegar, sobretudo entre os mêses de Outubro e Abril. Parece pois que, se não ha outros argumentos a opôr à tradição 60 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO da passagem de Cervantes pela Terceira, não são os apresentados pelo Dr. Escagtiés os que vão abalar as nossas convicções a tal res- peito. Mesmo num catedrático de geografia e história não é aliás de admirar a falta de informação sobre os assuntos referidos, pois que não é muito abundante, sobretudo em idioma castelhano, a literatura referente aos Açores C). Se bem que um dos primeiros roteiros destas ilhas, por sinal muito consultado até ao levantamento hidrográfiCG do arquipélago pelo capitão Vidal, era o de Tofifio (5).

0) Destacamos o brilhante artigo publicado em 1932 na «Revista Generai de Marina^ pelo capitão de Fragata (hoje Almirante), Don Rafael Estrada, inti- tulado «Una visita a Ias islãs de la Madera y ». (5) Don Vicente Tofino y Don Antonio Valdez. — «Derrotero de las Costas de Espafia y Portugal y de las Islas Azores ó Terceras... 1789. (Corrigido e aumentado pela Direcção de Hidrografia, Madrid, 1849). A PESCA NA ILHA TERCEIRA

Felo Major FREDERICO LOPES

A industria da pesca nesta ilha nunca adquiriu o desenvolvimento que seria de esperar alcançasse, tratando-se dum povo genuinamente insular, como é o açoreano em geral. A razão da pouca tendência do Açoreano para as lides do mar (excepção feita ao homem do Pico) explica-se talvez pela instabilidade do tempo no Arquipélago, que não permite, durante longos períodos, que se demandem com relativa segurança os «mares» de longe onde mais abundam as espécies ictiológicas. Esta grande instabilidade meteorológica deriva de que as ilhas não são apenas afectadas pelas depressões vindas de Oeste, das cos- tas da América, mas também constituem, elas próprias, um centro de formação de perturbações que surgem quasi imprevistamente, violen- tas e rápidas. Não raramente também, são estas regiões atingidas por ciclones de origem tropical, nascidos a Leste das Antilhas e que, rompendo por um corredor de baixas pressões que caprichosamente se lhes fran- queia, veem precipitar-se sobre o Arquipélago ainda com parte da sua enorme violência inicial. Excluída a quadra do Verão — de meados de Junho até à primei- ra quinzena de Setembro — as mudanças de tempo e os ventos fortes rodeiros ocorrem com singular frequência em todo o resto do ano, 64 B0LP.T1M DO INSTITUTO HISTÓRICO

N." de emliaicações de pesca 0 Anos Tonelagem N. de maritimos Obs. (Vela e remos) matriculados Não estão 1900 148 907 incluídas 1947 154 120 750 as baleei- ras.

Outro factor -- o pequeno porte das embarcações — deve ter contribuído para o fraco desenvolvimento da pesca nesta ilha. Os barcos, sendo, como são, quasi sempre propriedade de pes- cadores, homens de poucas posses, nunca vão alem dos 35 palmos de comprimento de quilha. O mais vulgar porém, é oscilarem entre os 23 e 28 palmos, tamanho absolutamente impróprio, por deminuto, para as lides perigosas do mar. O «barco» ('), de duas proas e dois paneiros, arma quatro banca- das, sendo a primeira meio-fixa e as outras 3 volantes. Usa remos de tolete,tareados no punho com uma bola de ferro, um por cada bancada, geralmente. (Fig. 11. Outras embarcações, ainda móis pequenas, chamadas «lanchas», são de tipo idêntico, tendo porem a popa cortada. Uns c outros constroem-se em Angra, S Mateus e Vila Nova, onde se encontram bons calafates. Os maiores porem, quasi sempre são importados da Ilha do Pico. Tanto para os barcos como para as lanchas, a madeira empregada é o «pinh o-da-terra» (pinus insignis) sendo o cavername de cedro. São pintados a cores carregadas: vermelho ou verde, da quilha à linha de água, e verde, azul ou cinzento, daí até à borda, com falca pintada a côr diferente. Inteiiormente, do fundo até á draga, usa-se de preferencia o vermelho escuro, com faixa cinzenta daí para cima. A única armação (Velame) é a vela grande, traquete ou de espi- cha, e a giba ou «gibra». Para o aproveitamento de certos ventos

f) — Na ilha do Fico, ha 3 espécies de «barcos», a saber: Barco grande, barco de viagem, descoberto, de popa traçada e 2 mastros, com velas latinas e gibra ou, mais modernamente, com aparelho de iate e convés; Barco pequeno, é o barco de pesca, de boca aberta, armando tracpiete e gibra ; e Barco da cidade, o que navega para Angra e ícm as características do Barco grande. . ~ fí-*. íí . i ■n* ••I •I * / K* -s sm mé m çr*m>z r\ m -:>■ ' s#OSUÂ2íí mó Í .„ Fig. 1

Fig. 2

DA ILHA TERCEIRA 65

usam ainda a chamada «vara-da burra» que aplicam em diagonal no traquete (Fig. 2). Todavia, só os pescadores da Praia e alguns do Porto Judeu fa- zem uso mais frequente da vela. Os de S. Mateus, sendo embora os únicos verdadeiramente profissionais, só com vento muito de feição largam pano metendo os remos dentro. Os barcos são sempre bentos no varadouro antes de serem lan- çados ao mar, cerimónia a que chamam baptizar o barco, porque nessa ocasião lhe põem o nome e lhe dão padrinho ou madrinha. A embarcação, com o leito da popa coberto com uma toalha de rendas, tem sobre esta, durante o piedoso acto, uma imagem do Santo ou Santa da devoção do proprietário. Além do padre e do sacristão, as- sistem à cerimónia o dono, a família mais chegada e algum amigo con- vidado. Não é de uso porém fazcr-se qualquer festa, mesmo intima, comemorando o acontecimento. Os nornes mais vulgares são : S João, S- Pedro, St.0 António, St.0 Amaro, S. Mateus, St." Cristo, Espírito Santo e N.a S.a sob di- versas invocações, em especial da Boa Viagem e da Ajuda Raramente se encontram designações semelhantes às que são de uso corrente no Continente. De resto, também não seria fácil sabe-Ias, porque não é costume escreverem o nome no costado, nem sequer interiormente. A superstição leva-os a meterem no leito do barco uma palma benta em Domingo de Ramos ou a pregarem uma ferradura ou uma rodela de chifre de veado para afastarem o «quebranto» e os «maus olhados*- Cada barco tem a sua «companha» que é formada por um certo numero de pescadores, variável consoante a tonelagem, e pelo «mes- tie» que é geralmente o dono. Este vai ao leme e dirige a manobra e as pescarias- Os aparelhos pertencem-lhe também, na maior parte dos casos. Variam de lugar para lugar as condições de divisão do produto da pesca, sendo os quinhões, no geral, repartidos igualmente pelo barco, pelo mestre e pelos homens da companha, depois de pa- gos os impostos de pescado e municipal, este ultimo pertencendo ao «nabiça», (nome usado aqui para designar o vendedor ambulante ou arrematante do peixe) quando o pescador lhe faz a venda antes de ir ao mercado. 66 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

No caso da pesca ser feita de rede, cabe ao dono dela '/s 6o to- tal da pescaria. Ao enchelavar (') grande cabe quasi sempre uma sol- dada. Cada grupo ou núcleo de pescadores organisa uma irmandade ou confraria que desempenha papel importante na vida da comunidade e recebe uma soldada na divisão das pescarias. Em S. Mateus cobra 4 % sobre o valor do pescado e é dada de arrematação, ficando ao arrematante o encargo de cobrar a percentagem devida pelos pesca- dores. A confraria exerce funções de assistência, esmolando os pesca- dores inválidos e doentes, fazendo ou subsidiando o enterro dos ir- mãos, distribuindo donativos em épocas de prolongado mau tempo que não permitam a saída dos barcos, etc. É governada geralmente por 7 «mesários» dos quais um é «juiz» e outro «mordomo». Algumas dessas Confrarias são erectas em ermida própria e tem anexa uma Irmandade do Espírito Santo que pode ou não ter o edifício proprio denominado «império» ou «triato» (teatro). Em Angra a Confraria dos marítimos do Corpo Santo, tem sua igreja — a ermida da N.a S.a da Boa Viagem — e por patrono S. Pedro Gonçalves. O império denomina-se «dos Remédios» e tem coroa própria. Em S. Mateus, o patrono é Santo Antonio. A imagem foi adquirida em 1891 pela respectiva Confraria, cujos estatutos, feitos e aprovados pelo Bispo D. João Marcelino dos Santos Homem Aparício, datam de 1776. A Irmandade do Espirito Santo tem coroa própria, mas o império é comum à gente da terra e do mar. Fazem porem as festas independentemente, uma no Domingo de Pentecostes outra no Domingo da Trindade. A coroa do «Espírito Santo do Mar» foi adqui- rida com donativos de emigrantes naturais d'ali. Na Praia da Vitória, a Confraria tem por patrono N.a S.a da Boa Viagem, para cuja capela foi adaptado o edifício dum antigo Im- pério.

(') — Candido de Figueiredo, na Novo Dicionário 0899) escreve «enchelevar» (De encher + levar). DA ILHA TERCEIRA 67

Em Vila Nova, o patrono é N.a S,3 da Ajuda (') que se venera na ermida do mesmo nome, sobranceira ao porto. Não tem Confraria nem Irmandade do Espírito Santo. Em Porto Judeu existiu em tempos uma Confraria cujo patrono era S. Pedro Apóstolo. A antiga imagem foi em 1946 substituída por outra, adquirida pelos marítimos, para o que descontaram solda- da durante algum tempo. Não ha Irmandade nem coroa do Espírito Santo. Nos Biscoitos, o patrono é Santo Antonio, cuja imagem se vene- ra na ermida do mesmo nome, sita no lugar do Porto, e à qual todos os anos os marítimos, auxiliados por outros devotos, fazem a festa. Não tem Confraria nem Irmandade. A festa anual aos respectivos patronos consta geralmente de missa cantada e sermão com procissão que vai até ao varadouro onde se encontram os barcos enfeitados com bandeiras, colgaduras,flores, ramos de faia, etc., e estampas devotas na popa armada em altar, sendo cos- tume tocarem com o andor do patrono em todos os barcos. No fim do sermão — que antigamente, no Corpo Santo, era ao ar livre, junto ao varadouro — o padre pregador costumava proclamar os nomes dos novos mesários, escolhidos pelos mesários cessantes, no próprio dia da festa, em reunião feita na sacristia para esse fim exclu- sivo. A nova mesa toma posse no Domingo seguinte ao da festa, to- mando á mesa cessante as contas da gerência finda. O «juiz», na pro- cissão, leva uma vara de prata, conduzindo os «mesários» e o «mor- domo», ora os andores de maior devoção (N.a S.a da Boa Viagem, S. Pedro Gonçalves, etc.) ora pequenos círios enfeitados com raminhos de flores artificiais. Em Angra usam umas varas grandes de madeira polida, com ponteiras metálicas, e uma ancora, também de metal, en- crustada no terço superior da vara. Em S. Mateus, são os rapazes

(') — Na freguesia das também ha, junto ao porto, uma er- mida da mesma evocação que era muito venerada pela gente do mar, e da qual diz Cordeiro na sua «Historia Insulama» (Livro VI — Cap. XVI — Pag, 78 — N.0 150)! «.. .não só para o mar tem a dita Ermida de N.a S.a da Ajuda que dizem ali appareceo, e por ali vem à vista as naos da Índia, e salvão a esta Senhora, e lhes responde o Forte da terra, e manda logo nova á Cidade». 68 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO solteiros que conduzem o andor de Santo Antonio, enquanto os casa- dos naquele ano levam o de N.a S.a da Boa Viagem. As Confrarias, alem da festa do patrono, fazem também a festa do Espirito Santo segundo o uso tradicional, com terço, coroação, distribuição de esmo- las, arraial, iluminação, e ás vezes, como remate, toirada à corda. A-pesar porem de se conservarem, com certo grau de entusias- mo e fé, tantas das cerimónias tradicionais a que atraz nos referimos, mantem-se e avigoram-se até os sintomas de decadência. O mar não é já, para o Terceirense ao menos, aquela atracção e feitiço que a tantos levou para longes terras, no século áureo dos Descobrimentos. Daí a quadra popular tão conhecida, que ao mar acusa sem perdão:

O' mar, sagrado ladrão, Contra li dou minhas queixas : A quem has de levar não levas, A quem has de deixar não deixas.

E se não é de admitir carência de afoiteza nas lides perigosas da pesca porque todo o Açoreano, e o Terceirense em apreciável per- centagem, também fez e faz boa figura nas companhas de pesca da Terra Nova, quer bacalhoeiras quer de caça ao cachalote — é de constatar que, na sua terra natal, raro se sente com ganas de afrontar as fúrias do mar e do vento. E'talvez porisso que, quando entende por dever aconselhar alguém a que não se intrometa em questões alheias, costuma dizer:

Se ouvires roncar o mar, Deixa os outros embarcar.

E ele, por prudência. .. não vai no bote.

*

Os aparelhos de que se servem os pescadores da Ilha Terceira para captura das diferentes espécies ictiólogicas, são todos confeccio- nados por eles e podemos dividi-los em 3 espécies, a saber: DA ILHA TERCEIRA 69

A) — Aparelhos de rede B) — Aparelhos de anzol C) - Aparelhos de diversos utensílios

A) —APARELHOS DE REDE

Todos os aparelhos de rede usados nesta ilha são do tipo volan- te, e tem como principais os seguintes:

1) Rede de arrastar

Composta de «lados» e «centro» donde sai o «copo» ou «saco», de diâmetro na boca inferior à altura da rede, tem entre 80 a 90 bra- ças de comprido por 5 de igual altura em toda a sua extensão. Os «lados» teem redes de duas malhagens, os «ralos» e os «meios ralos», porfiando-se estes aos panos do «centro», «bastos» ou «meudeira», em que os da parte superior e inferior da «boca» do «copo» tomam o nome de «testas» («de cima» e «de baixo»), A malha dos «ralos» tem o dobro do tamanho da dos «meios ralos», do mesmo modo que esta é também dupla da dos panos do centro, O copo tem a mesma malhagem que os «bastos». A tralha de flutuação é chamada da «cor- tiça», e a da esteira, conhecida por tralha da «chumbada». Nos extremos da rede, «cabresteira», os chicotes dos cabos das tralhas hgam-se por meio de pé de galinha aos cabos que servem para alagem da icde para (erra, sendo mais curta a pernada que dá para a tralha da cortiça de modo a não permitir que a rede, ao ser arrastada, deixe de roçar o fundo. À tralha da cortiça e a meio da testa de cima, está ligada, por meio dum «fiel» de cerca de 3 braças, uma boia de cortiça chamada «vigia», que serve, não só para melhor dirigir a alagem da rede por igual, como para ajudar a safar o copo de algum bico de pedra em que se pegue ao arrastar. É feita de fio de algodão branco, excepto a rede do copo que é tinta, a «cor do Carmo» para que o peixe «acuda» de prefeiencia a ele. Antes da ultima guerra vinha quasi toda da Ale- manha, por ser mais barata. Os panos da rede de diferentes malha- gens eram importados em peça, aqui sendo armados e preparados depois pelos pescadores. BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Para largar a rede a embarcação aproxima-se da costa no lugar em que quer fazer o lanço, aí desembarcando a gente que ha-de ficar na mão com um dos cabos de alagem da rede. A embarcação rema de- pois para o mar arriando cerca de 60 braças de cabo, a seguir ao que começa a lançar um «lado» da rede, depois o «copo» e finalmente o outro «lado», ocasião em que já deve estar de novo aproada à terra. Entregue o outro cabo e desembarcando o pessoal disponível que irá aju ar os outros pescadores que se «chegam^, o mestre da embarca- ção toma a «vigia» à popa. para suspender o copo, passando a seguir a mandar a alagem da rede. Se ha pouco peixe a embarcação entrega a rede em terra: caso contrário, prolonga-se com a tralha da cortiça junto ao copo, a fim de receber o peixe que os pescadores, dentro de água quando possível, vão passando a cestos para dentro dela Ha- vendo rebentação na costa que dificulte o copejar da rede, então o barco reboca-a para o largo, depois de lhe ter fechado a boca do sa- co, ai tirando depois o peixe com o auxilio de cestos. _ Quando o fundo é de pedra, arrnsta-se a rede até que os ralos sejam colhidos cm terra, tomando-se o peixe de dentro da embarca- ção por meio de enchelavar. Para arrastar a rede são necessários em terra 8 a 10 homens (4 ou 5 por cada alar), ficando a embarcação pelo menos com 4 homens

Onde a água é funda, fazem-se, em geral, 3 lanços num dia; na Praia da Vitoria, onde o lanço é menos penoso, chegam a fazer 5 e 6 lanços seguidos. • ^ c u Esta rede é especialmente destinada à pesca da sardinha, embora com ela também se tome : salema miúda, salmonete, tainha, bicuda chi- charro, carapau, etc.

2 ) —- Estremalho

É uma rede plana em tudo semelhante à anterior, com rede de 3

mesmomod ^ ral0S>> 6 <- É entralhada do besteira ^ ^ ^ ' f,UCtUação e corrida de chumbada

C 0 eSfa red nã0 C0P0 nâ0 USa também or ria,ria a ««vigia».vTia Parap %efectuar ^ o lanço' procede-se ao . Pcerco desnecessá- do peixe semelhantemente ao que se faz com a chamada «rede-de-arrastar»' DÁ ILHA TERCEIRA 71

sendo o peixe tomado para a embarcação por meio de enchelavar. A rede é toda de fio de algodão branco, feito na Alemanha. Às vezes, num único lanço pode fazer-se boa pescaria, mas em geral, fazem-se 5, 6 e até 10 lanços num dia. É bastante usada em S. Mateus. Exige para a sua manobra tanto pessoal como a rede de copo.

3) — Rede de emalhar ou de bater

Com cerca da 45 braças de comprido, por 4 de altura, é uma re- de plana duma só malha, que tem, como a anterior, rodelas de cor- tiça na tralha de cima e é corrida de chumbada no «roçalho». Por meio de 2 cabos, que vão de tralha a tralha nas cabresteiras da rede, se apoitam os 2 pandulhos de pedra que a seguram enquanto se faz o lanço. Toda a rede é tinta de «cor do Carmo», para que o peixe, perseguido, se deixe emalhar com mais facilidade. A reda é aqui feita com fio de linho, importado de Lisboa. Para efectuar o lanço, procedem os pescadores do seguinte modo: a embarcação aproxima- se da costa o mais que pode e aí apoita uma das cabresteiras da rede, afastando-se em seguida para o mar até deitar fora cerca de 10 bra- ças de rede. Dá uma rotação curta, cerca de 110°, a fazer um engano chamado «talão», virando a seguir de 90° sobre o outro bordo, para lançar o resto da rede em rumo paralelo à linha da costa. Fundeada a outra poita, a embarcação mete-se entre a rede e a terra, começan- do então os pescadores a bater com es remos na água e a «espedre- jar» (atirar pedras) ao peixe que, para fugir, procura sair no engano em que se prende. Quando ha muita abundancia de peixe, muitos emalham também nos lados da rede, embora a maior parte caia no «talão». Para suspender a rede, começam os pescadores por colher a pri- meira poita que fundearam, isto é, a que fica mais junta à terra, des- emalhando o peixe à medida que ele chega à horda. O peixe toma- do no ultimo lanço é em geral desemalhado já em viagem. O nume- ro de lanços que se fazem em cada pescaria, depende, naturalmente, da maior ou menor fortuna, com que ela decorre, mas pode conside- rar-se como sendo de 12, o numero médio de lanços que efectuam num dia de pesca. Por este toma-sc: tainha, salema, veja, sargo, bicuda, etc. Às ve- BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

zes, quando as circunstâncias favorecem, esta rede é posta a «ama- joar» ficando no mar por espaço de tempo de uma noite. O lanço faz-se então do modo diferente, sem engano ou «talão^ aproveitando uma ponta de terra, mas mais geralmente uma enseada' que se saiba servir de passagem habitual do peixe. É indispensável porem, que o local escolhido seja também de «água mansa», pois que doutro modo, a rede, sob a força da corrente, seria obrigada a mer- gulhar, evitando o peixe de cair nela. O levantar da rede faz-se. em geral, de terra para o mar; quan- do, porem, ha rebentação ou muita resaca, procede-se inversamente omando-se a rede com a embarcação sob poita que se fundeou ao largo, de modo a aproveitar as jazidas do mar e assim suspende-la com mais segurança. De «amajoa», toma-se: tainha, bicuda, e também salema, sargo, etc.

4) —■ Enchelavar grande

Do tipo das redes de suspensão, é de forma cónica, com a oure- a Podada em 2 arcos de madeira com cerca de 10 braças no redon- ao, toda da mesma malha, sendo o fundo reforçado. Emendadas as «portas» (extremos dos arcos), procede-se do seguinte modo para

hnhashnhaV que ^suspendem Um.h0mem o enchelavar em Pé sobre ao extremoa embarcação, duma vara,amarra depois as 8 o que este e arriado até ficar suspenso da borda. Atraído o peixe com engodo larga-se o enchelavar que fica então suspenso da vara dispaiada pelo travez da embarcação. Quando convém, suspende-se o enchelavar com a vara que faz alçaprema, no outro extremo, de encontro ao dormente da bancada, tomando-se então o peixe que ele traz Em media, fazem-se 25 a 30 lanços; contudo, com muito peixe d borda pode fazer-se uma boa pescaria em 10 ou 12 lanços. Pescando com enchelavar grande, usado apenas para o chicharro a embarcaçaoívai seguindo sob remos, ao sabor da corrente, para to- mar o peixe que acudio ao engodo que se deitou.

A n0braS embarCa ;ao e pesca dar™ ^ ' exigem, pelo menos, 5 caruplrele1)1 ^ i"n,a"1en,e co"' " chicllarro, boga, sardinlm, DA ILHA TERCEIRA 73

5 ) — Enchelarar de peixe-reí.

Semelhante ao anterior, tem apenas cerca de 3 braças no redondo. Os arcos são de ferro zincado, suspensos por 4 linhas, que se ligam à «beta» que vem à mão do pescador. A's linhas prende-se uma boia de cortiça para que cias estejam levantadas do fundo e permitam ao pescador avivar a «beta" sem que o peixe desconfie. Arriado então para o fundo o enchelavar, o pescador mete dentro a «beta» muito de vagar até que sinta o peso do aparelho. O peixe é iscado com lapas, caranguejo, lagosta ou santola (o melhorj que vão espetando em arames que se cruzam e estão presos aos arcos. O suspender do aparelho exige muita ligeireza, porque o peixe-rei se escapa com muita facilidade. Dois homens, pescando apoitados entre 3 e 6 braças em fundo de pedra, fazem, em média, 30 a 35 lanços em cada pescaria. Juntamente com o peixe-rei, toma-se também: verdugo, castanhe- ta, rainha, bodião, garoupa, etc.

6) — Tarraía

Esta rede dc mão, de forma circular, com cerca de 7 braças no redondo é em tudo idêntica às que se usam no Continente, apenas variando um pouco o modo de se fazer o lanço. Presa a linha, «rabicho», ao pulso do braço esquerdo, o pescador colhe em pandeiro na mão do mesmo lado as 5 ou 6 braças que tem, de comprido, a referida linha, segurando também nela o centro da rede. A seguir abre esta em leque, estendendo-a no chão, tomando de novo na mão esquerda, uma dobra de tamanho conveniente, para que a rede, pendendo, fique reduzida à altura de se poder lançar. Feito isto, prende com os dentes o e/tremo da saia da rede que lhe fica mais proximo do corpo, fazendo depois uma toma na mão esquerda e finalmente outra na direita, de modo a que, com rápido movimento de rotação que imprime ao corpo e ao braço direito estendido quasi horizontalmente, a rede, no lanço, abra toda no ar, e abafe o peixe sobre que a tarrafa vai cair dentro de água. Para suspender a rede. ala-se o «rabicho» tomandn-se então o peixe que caiu, em geral, tainha, salema, sargo, etc. BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Uns pescadores usam-na na cor natural do linho, de cuio fio é sempre feita; outros, para pesca de dia, tingem-na com infusão de casca de loiro ou dc pinho resinoso Usada unicamente na pesca a pé, á beira do calhau.

7 ) — Gamaroeiro

Como todos, formado por um cabo ou mão que se liga ao arco de feno zincado em que está porfiado o saco dc rede, com cerca de 0,80 de diâmetro na boca, tinta da chamada «cor do Carmo». Usa-sc na pesca embarcado, para tomar chicharro e cavalinha miúda pela lua, cm pelo farol em noite escura. Especialmente empregado pelos pescadores de Angra. Enquanto os outros pescadores estão tornando peixe com linha ou cana, um deles vai lançando engodo e colhendo rniu o camaroeiro o peixe que acode. É pesca penosa.

S) -- «Cofres» ou «Potes»

São estas as designações por que aqui se conhecem os •■-covos» armadilhas destinadas a tomar lagostas e santolas. Ha-asde dois tipos: rede e madeira. Teem ambos forma cilíndrica de 1 m,00 a 1,30 de alto e cerca de 0,70 de diâmetro. Os de rede, são armados com 4 arcos de madeira que dão àquela a forma com que usam. As «bocas», tanto nestes como nos de madeira, são semelhantes às que se veem nas ratoeiras. Os de madeira, revestidos de ripas, teem uma «porta» que o pescador abre para retirar o producto da pes- ca. Presos aos «cofres» vão dois pandulhos dc pedra com que eles os fundeiam com o auxilio duma «beta». A «beta» do «cofre» é sustentada por duas ou três bóias de cor- tiça, a primeira colocada a uma distancia do cofre ligeiramente maior que a altura de água em que se o apoitou, seguindo-se as restantes com espalho de cerca de três braças entre si. DA ILHA TERCEIRA 75

B ) APARELHOS DE ANZOL

1 ) — Agulheira

O aparelho conhecido por este nomo, consta de uma linha de algodão que aguça na arça do loro do arame, com cero:! de 3/4 de braça de comprido cm que está empatado o único anzol que possuo. Toda a linha é corrida de chumbadas que se podem aproximar mais ou menos, regulando-se a distancia que as separa conforme a maior ou menor força da corrente. Quando a água corre com mais força, deslocam-se as chumbadas, aproximando-as de modo a que o anzol procure a profundidade a que se deseja pescar; quando, pelo contrário, a corrente é fraca, sepa- ram-se as chumbadas, para que a linha aproveite por algum tempo o engodo, que a água, no seu correr, vagarosamente, vai afastando da embarcação. Com este aparelho, íoma-se cavala grada e goraz.

2 ) - Briqxieira nu Barqueira

Este aparelho de 2 anzóis, tem a linha ligada pela «arça» a um arame com cerca de meio metro de comprido, que, no outro extremo sustenta pelo meio uma pequena vara de marmeleiro de cujas extre- midades pendem as «paradas» em que estão empatados os anzóis. A meio da vara e pelo lado de baixo vai suspensa a chumbada, neces- sária para fazer o aparelho ganhar o fundo que se deseja. Pou- co acima da «arça», vai presa a «manga» em que se coloca o engodo que o pescador obriga a espalhar-se na água, depois do aparelho ba- ter no fundo, com sacudidos movimentos de vai-vem que proposita- damente imprime então ã linha. Este aparelho usa-se para pescar goraz, carapau, besugo e bodeão.

3 j — Arame

Conhece-se por este mune o aparelho ccnstituido pelo arame propriamente dito, que é a linha que vem à mão do pescador e pela «jogada» que é o pesqueiro em que ha 2 anzóis, um de «cima» e o 7G BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

outro de «bnixo», desviados entre si de cerca dum palmo. Abaixo da «arça» ha a chumbada, sendo as «paradas» cm que se empatam os anzóis enroladas com arame fino, para que o peixe, ao abocar a isca, não as corte com os dentes. O aparelho trabalha-se com linha de arame que vem à mão do pescador. Conhecem-se as «jogadas» por números, conforme o tamanho dos anzóis que empregam. Com a jogada n.0 1 (a maior) toma-se congro, albafar e cherne. Com a n.0 2, congro, abrotea, bagre, boca negra e goraz. Com a n.' 3, besugo, bodeão e garoupa. A chamada pesca do «atambique», é feita com uma outra jogada ainda mais pequena que as anteriores, tomando-se com ela: peixe-rei, verdugo, bodeão pardo, bodeão azul e bodeão vermelho pequeno.

4 ) — Cangalhos

E um aparelho com linha de arame, aguçada numa madie com 3 «ladrões» empatando em cada um seu anzol, tendo no chicote um pandulho de pedra. Este aparelho é exclusivamente usado para a pesca do cherne.

5 ) — Gorazeira É um aparelho que pode ter 50 a 200 anzóis empatados nos «ladrões» que pendem do «estralho», ligando-se este por um extremo à «linha», composta de varias linhas de pesca — 2 a 7 — de cerca de 30 braças cada, e suspendendo no outro um aparelho de pedra que assenta no fundo durante a pesca. A linha usa-se suspensa, na pesca à cavala, chicharro grado e goraz; quando não «tópa» com peixe dêste, o pescador alivia então o aparelho deixando estender a gora- zeira no fundo para assim experimentar a pesca da abrotea, bagre e boca negra. Para evitar que os anzóis se enrasquem uns nos outros enquanto o aparelho está «apanhado» (colhido), os pescadores daqui entalam-Ihes as hastes — e não as «barbas» — no chanfro aberto num bocado de cana que designam por «canudo». Lançado o aparelho, só decorrida, em média, uma hora ou mes- mo hora e meia, é que o pescador o suspende para tomar o peixe que nele caiu. DA ÍLHA TFRCLíRA 77

Uma gorazeira de cem anzóis, sem as linhas de pesca, custava no ano findo, material e mão de obra, cerca de 30$00 escudos.

6 ) — Linha do corrico

Esta linha de reboque pode ser preparada de 2 modos : anzol «estorvado» num arame de cerca de 0m)07 de comprido, emendado em outro arame com cerca de 3 braças, tendo, no outro extremo, uma arça em que «aguça» a linha do corrico que vem à mão do pescador; no outro sistema, a haste do anzol prende-se ao «gigo», — peça de osso de baleia em forma de peixe, — tendo uma arça no extremo oposto ao do anzol, em que por sua vez «aguça» o arame. Com este aparelho, levado de reboque pela embarcação, toma-se bicuda, serra, enxova e bonito.

7 ) — Agaiilhadas. canas e caniços

São aparelhos «aviados» de modo semelhante, constando, essen- cialmente, duma vara segura num extremo pelo pescador, pendendo do outro a linha de arame com o respectivo anzol. Entre os 3 apare- lhos aqui citados, só a aguilhada tem a vara dc bambu, não sendo o arame preparado com chumbo; os outros dois, têm a vara de cana canavial—mais fraca no caniço—e usam chumbo no pesqueiro. O ca- niço, na pesca do carapau, trabalha com 2 anzóis; a aguilhada é para a pesca de serra, bicuda, lirio, bonito, enchareu, etc. A cana é usada na pesca da cavala grada, durante o dia, servindo o caniço para to- mar: chicharro, cavala miúda, boga, carapau, peixe-rei, salema miúda, etc.

8) — Jogada

Semelhante aos «cangalhos», mas apenas com dois «ladrões» ou pernadas.

9 ) — Aparelhos diversos e utensilios

Entre os muitos e variados aparelhos c utensilios que fazem parte dos equipamentos para a pesca, tiguram como principais os seguintes 78 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Arpão e Uinça usados na pesca do «marracho», servindo também aquele para tomar toninha e albafar. fisga — de 4 ou 5 dentes, destinada à pesca via bicuda, encha- reu e lirio, (hoje quasi desaparecida). 1 enaz de madeira, com 5 a 6 dentes de ferro em cada «boca» é destinada a «entenazar» o congro, ainda fora da borda, a fim de lhe poderem cortar a espiga. ficheiro gancho de ferro servido por um cabo de madeira, destinado a trancar o congro pela boca e a mete-lo dentro da embarcação. (*anastra ou «canoa», com a forma dum barco, de tábua aberta, destinada a conservar o isco vivo Tem 1 meti o de compri- mento, ou pouco mais, usando-se atracada à borda da embarcação, suficientemente suspensa da água para que o chicharro e o carapau não sc passem para fora dela. Maquina de moer - hoje usada em substituição do «navalhão» que servia para picar o engodo necessário à pesca. Jodavia, a lista que vai a seguir, por ordem alfabética, dá bem ideia do complexo de todo esse ferramenta! que, juntamente com o já anteriormente descrito, não ficará ainda assim completo :

Agulhas Croques Linhas diversas Agulheiras Dtstorcedor ou Des- Loros Anzóis trocedor Luleira Baldes Escoras Manga para engodo Bóias Estronca Navalhão Botadouros Espinel Negaças Bucheiros Estrovadura Pandulho Caixa dos aparelhos Facas Pau das moreias Camaroeiro Farol ou Lampião Pau de varar Celhas Ferramenta de calafate Peixes (de alumínio, Cepo de picar engodo Fiel de marfim, etc.) pa- Cerdas Gorateiro ra corricar Cestos Graveta Poitas Chumbetas Jogada Rabadela Cocha Laços Remos Cordas Lasca Tambica DA ILHA TERCEIRA 79

Tanofii i para a pesca Tarrafas Trol eai tra! dí) aibafar) Trancador (só baro) TrAxai

*

São bastante numerosas e relativamente abundantes as espécies 'etiológicas que se encontram nos mares da Ilha Terceira, se bem que nos últimos tempos se tenha notado uma apreciável diminuição de peixe, especialmente junto às costas. Não estão, ao que parece, devi- damente estudadas as causas dessa deseição. Fundamenta-as porem o maritiino no desusado movimento de aviões e navios de cruzeiro, durante os anos da guerra, executando vaiios bombardeamentos, quer ofensivos quer de simples treino, a poucas milhas ao largo desta ilha, o que julgo razão de pouco pêso. Longe vai o tempo em que os povoadores, «... sem pregos e sem anzóis, senão somente com as mãos, tomavam peixes que andavam á horda d'água» no dizer de Gaspar Frutuoso, mas o caso é que, há umas dezenas de anos, eram muito mais fartas as pescarias do alto e incomparavelmente mais abundantes os pesqueiros de calhau do que nas épocas que ora decorrem. Eis, por ordem alfabética, uma relação das principais espécies que nestes mares se encontram com relativa frequência :

Abrotea Buzios Congro Agarrador(=: Pegador) Cabaz Cornuda (= Agulha Cabra Corvina Agulhão Cação Craca Aibacora Camarão Dourado Aibafar Cantaro (= Bagre) Eiró (— Eng Aranha do mar Carapau Enxareu Bagre (— Cantaro) Caranguejos Enxova Besugo Castanheta Espada Bicuda Cavaco Folião Boca-negra Cavala Galo Bodeão Cherne Qaroupa Boga Chicharro Gata Bonito Coça Gora z 80 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Imperador Pegador (= Agarra- Santola Jimanta dor) Sapo do mar Labandeira Peixe-Rei Sardinha Lapas Polvo Sargo Lagosta Porco Serra Lírio Prombeta (Trombeta) Sôlha Lixa Raia Tainha Lua Raião Tintureira Lula Rainha Toninha Martelo (= Cornuda) Rato Trombeta (Prombeta) Mero Rocaz Tubarão (=Marracho) Mugem Roda Veja Murea Safio Viuva Mureão Salema Voador Pargo Salmonete

Os processos de pesca usados, relativamente a cada espécie, são os seguintes, com indicativo das profundidades a que se tomam e das iscas empregadas:

Espécies icíiológícas Profundidades Aparelhos usados Iscas

Abrotea Até 5 linhaslArame e Qorazeira Tula, Chicharro e Qo- i raz. Bagre nu 6 » ! » > Tula, Chicharro e Go- Cântaro raz. Bcsugn — » e Briqueira Sardinha, Chicharro, Lula, Polvo, Lagosta. Bicuda Rede de emmalhar, ca- Chicharro, Sardinha e na e corrico Boga, vivos. Boca Negra » 9 Arame e Qorazeira Lula, Chicharro e Go- raz. Bndião » 1 Arame e Briqueira Caranguejo, Lagosta, Camarão e Lula. Boga .Caniço e Enchelavar Perna de caranguejo Fidalgo, Lagosta e ova de lapa. DA ILHA TERCEIRA 81

Espécies ictiológicas Profundidades Aparelhos usados Iscas

Bonito Aguilhada Chicharro, Sardinha e Carapau, vivos Carapau Até 2 V2 lin- Caniço e Enchelavar Carapau e Minhoca Cavala Caniço, Arame, Agu- Cavala lheira, Camaroeiro.Bri- queira e Enchelavar Cherne 10 Arame com Cangalhos Lula, Chicharro e Go- raz. Chicharro Caniço e Enchelavar Chicharro. Congro Arame Lula, Chicharro e Go- raz. Qaroupa Arame e Briqueira Cavala, Chicharro,Sar- dinha, Carapau, Ca- marão, Lagosta, Lu- la e Caranguejo. Goraz Arame, Gorazeira e Chicharro, Sardinha, Briqueira Cavala e Goraz. Lagosta Arame e Covos ou Chicharro e Cavala no Cofres caso de arame; Con- gro, Raia, Salema, Moreia, nos cofres. Polvo Linha com anzol, ou Qualquer peixe, exce- Cana com uma «a- pto Moreia. mostra» de peixe Moreia Arame Lula, Chicharro, Boga, Carapau e Polvo. Pargo Arame Chicharro e Sardinha fresca. Peixe-Rei Arame, Enchelavar Minhoca e ova de La- Caniço pa. Salema Rede, Enchelavar Musgo da pedra. Caniço Sardinha Rede de Arrastar Não tem isca nem en- Enchelavar godo. Serra Redes de arrastar Chicharro e Sardinha, Cana vivos. Tainha Rede de emmalhar e Figos de figueira, Caniço guelra de Chicharro fresco, Caranguejo e Lagosta. 82 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Espccies ictiológicas Profundidades Aparelhos usados Iscas

Salmoncte — Redes ou Covos Pedaços de louça branca dentro do covo, é o bastante.

Reladvamente a «engodos» os nossos pescadores confeccionam- nos consoante as espécies a tomar e os recursos da estação do ano cm que as tomam, a saber:

1." Picando ou moendo, juntamente, sardinha fresca de dois sais ou seca, com chicharro fresco, carapau e batata doce cozida, prepa- ra-se o engodo próprio para tomar: besugo, boga, carapau cava- la, chicharro, moreia e pargo. 2.o Para pescar de noite o peixe do fundo usam peixe assado (ino- reia, raia, salema, etc.) moído com sardinha sêca. Toma-se com este engodo: abrotea (junto à costa), carapau, congro (na costa) e moreia. o v a; c 3.o Na chamada «pesca de marisco», só feita de dia, servem de en- g o : lagosta, caranguejo, lula, camarão e ouriço, para tomar ■ besugo, bodeao, boga. carapau, garoupa, moreia e peixe-rei 4.o Feixe-vivo (chicharro. sardinha, carapau, etc.), transportado na «canastra» atracada à borda do barco, usa-se para apanhar bicu- da, bonito e serra. 5.° O musgo da pedra, alem de isca, serve também de engodo para a salema. R F

60 a^ainha^38 ^ 6 abob0ra menina' seiveni de engodo para 7.o Moreia, raia salema, etc. assados, ou mesmo chicharro. cavala e sardinha fresca, usam-se como engodo para lagosta quando pescada a arame.

Na pesca do bagre ou cântaro, boca negra, clierne e congro nao se taz uso de engodo. ^ ' DA ILHA TERCEIRA 83

O quadro seguinte dá-nos, resumidamente, as diferentes épocas do ano em que se pescam determinadas espécies, tanto de dia como de noite:

MÊSES DO ANO ESPÉCIES DE PESCARIAS

De dia '■ Garoupas (a), bodiões (a), vejas, salemas, sargos (a), Peixe-rei, verdugos, rainhas, castanhetas, cara- Dezembro, Janeiro, paus (a), e besugos (êstes em pequenas quantida- Fevereiro e Março des) De noite : Congro (a), abrótea (a), bagre, bôca-negra, cher- ne e pargo.

De dia : Gorazes (de gorazeira) e cherne Abril e Maio De noite: Congro, abrótea, etc.

Junho e Julho Nestes mêses fazem-se as mesmas pescarias in- cluindo a albacora (atum), cavala e chicharro

Agosto Idem, incluindo os bonitos

Setembro, Outubro Idem. Também se faz a pescaria da cavala e do e Novembro chicharro, durante a noite, à luz artificial.

(a) — Aparecem todo o ano com relativa abundância. 84 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Ha no mar, longe ou perto, lugaies previlegiados onde o peixe abunda, aos quais os pescadores dão o nome de «Pesqueiros», «baixas» ou «baixos», designando alguns por nomes estravagantes que derivam de alcunhas de pescadores que os descobriram ou utilizaram, e da sua situação relativa a pontos da terra mais dominantes e visíveis. Uns sao preferidos para os chamados «peixes do cimo d'água», outros para «peixes do fundo». Todos porém são determinados pelas « mar- cas», designação que os marítimos dão às intercepções de linhas ou « enfiamentos » em terra que definem essas posições. * O quadro seguinte dá-nos a relação dos mais importantes pes- queiros para peixe do cimo de água : r f ■

Designações dos Pesqueiros Espécies que mais abundam Caracferisticas Obs.

Ilhéu grande Lirios, enchareus, chichar- I Carapau, boga, (dos das Ca- ro miúdo e bicudas. .tainha, serra, etc. bras) são peixes que jtse ornam em Limpo do Cavala e Chicharro. ílheu qualquer mar onde aparecem, Ilhéu pequeno Cavala, Chicharro, Bicudal Farto imas sempre mui- () e Goraz. to proximo da iterra. Baía da Ribei- Cavala e Cavalinha. i O bonito, em- ra Sêca bora malhe tam- ibém em qualquer Baia da Praia Cavala, Chicharro e Sar-,! — mar, toma-se sem i dinha. ! pre ao largo,entre í ! ;2 e 5 milhas de Pedra da FieirajCavalas. | p;SjK.ciai distancia à costa. Baixa da Ser- Todn o peixe de Verão, i Muito rico rcta ' i Baía do FanafCavah, Chicharro e Sar- Muito farto : dinha. 1 t j Baía de Angra|Chicharro, Besugo e Sar-! I dinha. ' j DA ILHA TERCEIRA 85

O quadro seguinte mosfra-nos os principais pesqueiros para pei- xes de fundo, com as respectivas marcas, dimensões aproximadas e sua situação :

Dimenções Designação Marcas dos Principais Espécies N." de pesqueiros ictiológicas linhas Situação Observações (Mil.)

Rochinha Igreja da Vila de S. Sebastião pelo Cherne, bagre, boca Ilhéu das Cabras com a Igreja de 1,50 x 0,7 negra, congro. 6 a 9 S.ta Luzia a apontar com o lado L. do . CU Braz Qonçal A «Popa do navio» (a) à vista -o Cherne, bagre, boca rs (a) Cabeço existente ves com a «Casa dapolvora» no Castelo 4 x 1,5 de S. J. Baptista a aparecer pela negra, congro. 6 a 9 na Vila de S. Se- Caldeira do Monte Brasil. o bastião. CX TJ Cabrão (da A "Casa do Comendador" (b) a T3 Abrotea, cherne, ba- terra) encostar à ponta de S. Diogo no 1 x V-, a> (b) Perto do si- gre, boca negra, 5 a 9 co Monte ^Brasil, com os Fradinhos a cu tio denominado r congro. «Aberta». Casar com a ponta das Contendas,; cu 1 o Restinga Casa do "Escomaredo" oelal p Congro, Cherne, Go- ponta do ML Brasil comosFradi-í 1 X '/í X raz. 5 a 9 nhos pela Casa do José Gorgita 1 cu do Porto Judeu. X.

António Sil- Fradinhos a enfiar com a Ribeiné Congro e cherne. cai— veira do Testo e a "Casa da muita porta''! 1 h X 1 ò£ 6 a 9 C pela ponta de S. Diogo. < 1

Dimensões! dos ! 0 Designação Marcas Principais Espécies N. de pesqueiros! linhas Situação Observações (Mil.) icfiológicas

A botar a j Igreja do Castelo por dentro do •OfJ o Goraz. 6 a 8 CO•

Rochinha A avistar o ilhéu das Cabras pela Abrotea, bagre e 3 a 5 (c) Vide nota ante- ponta da Mina, com a Matriz da 4 x 1 congro. rior Praia pela borda da "Serrinha", (c)

A botar ponta A avistar o ilhéu das Cabras pela lAbrotea, boca negra, 3 a 6 (d) Entre as Quatro por ponta ponta da Mina, com a Matriz da 3 x i 7* ! congro. Ribeiras e os Bis- Praia pelo Pico dos Louros, (d) coitos Cabecinho liheu das Cabras pela face do jMar muito extenso, Pico das Contendas, com a Matriz 6x3 j excepcionalmente da Praia pela Igreja das Pontinhas. I rico em cherne, 4 a boca negra, bagre, abrotea e congro. 1

Pedra da bai- Ponta das Quatro Ribeiras com as Mar muito farto de xa casas dos Biscoitos a abrir e o ilhéu 3x2 peixe, onde se to- 5 S o do Norte enfiado com a Queimada. ma abrotea, con- 3 a 7 gro, boca negra bagre. «Casa do Manuel da Silva» a en- Senhorinha Mar de pouco peixe, (e) Fábrica do ál- costar à ponta das 4 Ribeiras pelo 1 M? x mas onde pescam 3 a 4 cool, já demolida. «Engenho» (e) com a ponta da 0,005 boca negra, abro- Serra da Praia. tea e congro.

Cinco Picos O Pico D. Joana com a ponta Mar farto de congro, das 4 Ribeiras e a «chegar» os 2 x 1 cherne, bagre, bo- 5 a 7 Cinco Picos para o pico da Rocha.J ca negra e abrotea. DA ILHA TERCEIRA

Dimençõe s D esignação Marcas dos Principais Espécies N.0 de pesqueiro s ictiológicas linhas Siiuação Observações (Mil.) Espigão da «Granel» (a) a encostar para Mar farto de con- Mola fa) Nas 4 Ribeiras, ponta das Quatro Ribeiras, pela 3x3 gro, abrotea e bo- jigreja da Vila Nova a enfiar com a ■ 4 a 7 (b) Na Vila Nova. 1 ca negra. ^Casa do Toucinho» (b) Pedra da Fur- Igreja das 4 Ribeiras com a pon- Mar farto de congro na ta do mesmo nome, pela «Forcada» (c) Pedra que fica 3x3 abrotea e boca 3 a 7 (c) aberta a meio da baía da Vila junto à ponte do negra. Nova. mesmo nome. A emparelhar 2 casas notáveis no meio da fre- Mar abundante de as casas guesia das 4 Ribeiras com a ponta 4x4 congro, abrotea, do mesmo nome, pela ponta de 4 a 7 bagre e boca ne- Malmerenda a abrir da terra. gra. Norte d os B iscoitos Casteletes Ponta de Malmerenda à vista e Mar muito farto de farol da Serreta também à vista. Mar enor- me desde a cherne, congro, 4 a 8 costa até abrotea, bagre e

ao alto boca negra. Entre L este d a P onta e M almerenda o Biscoitos Uma golada que há no Pico dos Mar especial de Touros com a «Serra Queimada», 2 "2 x por uma ribeira que há nos Altares chernes, tomando- 2 Ma -se também abro- 5 a 9 enfiada com o Pico do mesmo nome.í tea, congro, bagre, boca negra, goraz, etc. | Melro Casas notáveis nos Altares, cha- Mar muito farto de madas «Silveiras», com o meio das | | grifas da Igreja do Raminho, pela cherne e também - 2 x I de congro, abrotea, urna dos Casteletes a abrir da pon- l 5 a 9 a do mesmo nome. boca negra, go- raz, etc. i da S erreta j Cacete «Serrinha» (d) avista pela terra Vlar especial de ( io Pico do Altar, com a Igreja das >d) Do Pico do Altar cherne, tomando-se 2 Ribeiras enfiada por uma «bala- e) Pequena elevação 3x3 também com abun- i ( que fica em cima 5 a 9 clef* oS.tafL Barbara. da Serra dância congro, bo- ca negra e goraz. Entre o N orte d os B iscoitos e L este | 88 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Dimensões Designação Marcas dos N." de pesqueiros Principais Espécies linhas Situação Observações (Mil.) ictiológicas

Nordeste Igreja do Raminho pelo meio da Mar farto de congro, mata do Estado, com o pico de N. 2 x 1 abrotea, bagre, bo- 2 a 7 S. da Ajuda à vista. ca negra e goraz.

Baixio A ponta da Galera à vista e uma Mar farto de congro, «balaia» (a) que aparece antes do 2 x 1 bagre, abrotea, bo- 2 a 7 pico de N. S. da Ajuda também à ca negra e goraz. (a) Pequena elevação vista. ! !

Alto v Pico das Cruzinhas a aparecer Mar farto de congro, de S . M ateus entre o pico do Facho e o do Zim - Faixa ex- tensa com bagre, abrotea, bo- breiro (b) pela igreja Velha de S cerca de 2 ca negra e goraz. 3 a 6 (b) Todos no Monte Mateus enfiada com um pico de milhas de Brasil. bagacina da chamada «Quinta do largo Contente». j E ntre o L este d a S erreta e ul ! Infernal «Casa da Maria Rosa» com o pi- Mar farto de congro, (c) Na encosta W. do co do Merens pelo caminho de S 3x3 bagre, abrotea, bo- 2 a 5 pico do Zimbreiro Diogo (c) enfiado com a igreja da ca negra e goraz. no Monte Brasil. Ribeirinha.

Restinga do Casa notável entre a Ribeirinha Mar pobre de con- (d) No Castelo de S. Fanal e Vale de Linhares, pelo pico do gro, bagre, abro- João Baptista do Facho com o Torreão dos Mosqui- 2 a 2 l tea, boca negra e 2 a 5 Monte Brasil. tos (d) à vista pelo pico do Zim- goraz. breiro. 1 Façanha do Apontar a igreja de S. Pedro pela Mar pobre de con- e o S ul d M onte B rasil Monte face W. do Monte Brasil, com o 4x2 gro, abrotea, ba- 3 a 6 Entre o S ul d e . M ateus (e) No Porto Judeu Pico dos Coelhos (e) a encostar gre, boca negra e para o Ilhéu das Cabras. goraz.

Mar longe 18 a 20 milhas para Leste da Bastante Congro, bagre, boca A Leste Pouco frequentado pe- Praia da Vitoria. extenso negra, abrotea e da Praia los pequenos barcos de da Vitória pesca geralmente usa- goraz. dos nesta Ilha, DA ILHA TERCRIRA 89

Alem destes há, evidentemente, muitos outros que, por serem de conhecimento restrito ou por terem designações semelhantes, são por vezes de muito difícil identificação. E se os pesqueiros do alto são tão numerosos como o provam os quadros atraz insertos, os pesqueiros denominados «de pedra» ou de calhau, atingem numero elevadíssimo, o que não é para admirar se pensarmos que se encontram numa terra que tem dezenas de quilómetros de costas permitindo pesca de cana. No entanto parece-nos interessante deixar relação dos principais, á volta da ilha, começando na baía de Angra c acabando na baía do Fanal.

RELAÇÃO DOS PESQUEIROS DE PEDRA

Espécies de peixes Nomes dos pesqueiros Sifuaçrio Observações De dia De noite

Cais Comprido Encosta Les- Peixe-rei, verdugo, Abrotea, polvo, mo- A pesca mais abundante é a do te do Mon- salema, satgo, reia, morião, sar- polvo, excepto nos mêses de Verão te Brasil castanheta, rai- go, lagosta, san- em que aparece com mais frequên- nha, cóça, cara- tola, cavaco, safio, cia o chicharro. pau, chicharro, imperador. tainha, veja, la- bandeira, etc. S. Benedito / Idem Idem Idem

Cagão Idem Bicuda, serra, en- Congro, mero, safio. De Novembro a Abril, abundam chareu, bodeão, etc etc. o bodião, a garoupa e especial- mente o sargo.

Cais da Figueirinha Baía de An- Sargo, chicharro, sa- Sargo, abrotea, mo- Pesca-se também com tarrafa, gra lema, garoupa, reia, safio, lagos- de dia e de noiie. É utilizável com bodeão, veja, pol- ta, espada, etc. qualquer maré. vo, peixe-rei, ver- dugo, etc.

Sapata até ao Cais Idem Idem Idem

Cais da Alfandega Idem Idem , Idem Tarrafa, de dia e de noite. Uti- lizável com qualquer maré.

Porto de Pipas Idem Idem Idem ! Idem. Idem. 90 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Espécies de peixes Nomes dos pesqueiros Situação Observações De dia De noite Ponta do Castelinho Baía d'Angra Idem Idem Baixas das Aguas Baía das Aguas Idem Idem Pôça da Sardinha Idem Idem Idem Pedra Alta da Sardi- Idem nha Idem Idem

Por baixo da rocha Idem do Dário Idem Idem

Grota do Vale ta P. d'Atalaia Idem Idem Timão Idem Idem Idem Pedra Rachada Serretinha Bodeão Abrotea Só é acessível na praia-mar. i . Rochinha » Carapau Sargo Sempre acessível. É melhor com o mar mechido. Palames Salema Abrotea e moreia » » Exige mar manso. Sono » Sargo Lagosta Utilizável com qualquer mar. Acesso fácil. Cais das Amoreiras » Peixe-rei e salema Abrotea e lagosta

Rochinha das Pontas Peixe-rei e verdugo Lagosta I Pontas i » Bicuda e carapau Lagosta e congro Mar fundo, utilizável em qual- quer estado, Morgado » Sargo e salema » » » » » » Boca da furna Porto Judeu Sargo Lagosta e congro Pouca profundidade. Utilizável com qualquer mar. Ponta de Manuel Di isl 1 » Salema Sargo -> » ♦ DA ILHA TERCEIRA 91

Espécies de peixes Nomes dos pesqueiros Situação Observações De dia De noite

Redondo de N a Se- Porto Judeu Salema e sargo Sargo Mar profundo. Utilizável com nhora qualquer mar.

Cruz do Canário » Carapau e peixe rei Sargo e lagosta » » »

Redondo Salema Abrotea e moreia Só utilizável com mar manso.

Pontinha Chicharro e bicuda Abrotea e moreia » » » »

Pedra alta » Bodeâo e salema Polvo e abrotea Só utilizável com mar manso.

Ponta do Veado » » « Moreia e abrotea » » » » »

Cavalinho » Carapau e bodeão » » Utilizável com qualquer mar.

» Pouco profundo. Utilizável mes- Pedra Grande Salema e bodeão » » mo com mar bravo.

Altinho » Peixe-rei e salema Abrotea e congro Exige mar manso. Mar profundo.

Ponta de Dias Váz V Chicharro e carapau » * )) » » » »

Sombreiro » Peixe-rei e verdugo Abrotea e moreia » » » .Pouca profundi- dade.

Rego da Cambada Salema e carapau Abrotea e congro » » * . Muito fundo.

Ponta dos Coelhos » Sargo e salema » » Aproveitável com qualquer mar.

Chiqueiro » Salema » » » » » »

Barrinha mansa » » Lagosta e congro Exige mar manso.

Cais da Salga S. Sebastião Bodião e chicharro Abrotea c moreia Só utilizável com a maré vazia.

Bilhafre » Chicharro Lagosta Grande profundidade. Acesso difícil. r ■ Cação i Sargo e veja Lagosta e congro » » » « . Requer mar manso. 92 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Espécies de peixes Nomes dos pesqueiros Situação Observações De dia De noite

Serrefas S. Sebastião Bodeão Lagosta e moreia Grande profundidade. Utilizável com qualquer mar.

Cavalas » Sargo e veja Sargo e lagosta Grande profundidade. Utilizável com qualquer mar.

Rojais » » e verdugo Abrotea e moreia Grande profundidade. Requer mar manso. Acesso difícil. » Ponta da Mina Bodeão e veja Lagosta Grande profundidade. Requer mar manso. Acesso difícil. Pedra de José Nunes % Salema Abrotea e lagosta Requer mar manso. Acesso difícil. Pedra das Covas Peixe-rei e verdugo Abrotea Acesso difícil. Requer mar manso.

Ilhéu da Mina » Chicharro Lagosta Grande profundidade. Requer mar manso.

Pesqueiro Largo » Carapau e bicuda Congro e mero Grande profundidade. Utilizável com qualquer mar.

Covetas Salema e peixe-rei Lagosta e congro Grande profundidade. Utilizável com qualquer mar.

Furado » Chicharro Lagosta e moreia Acesso difícil. Requer mar manso.

Cais da Corda » Tainha » » Requer mar manso. > Biscoitinho Salema Abrotea e moreia Utilizável apenas na praia-mar.

Salto do Cabrito » Sargo e chicharro » lagosta Acesso difícil, grande profundi- dade. Utiliza-se com qualquer mar. Pesqueiro dos Meninos » Lagosta » » » > » Ponta do Ganso » Bicuda e serra J * » > » » ( &

DA IlflA TF.RCFIRA 93

Espécies de peixes Nomes dos pesqueiros Situação Observações De dia ' De noite

Rocha Negra S. Sebastião Bicuda e serra Lagosta Acesso difícil. Grande profun- didade. Utiliza-se com qualquer mar.

Pesqueiro Novo » Peixe-rei e verdugo Abrotea » » » « c

Sombreiro » Carapau » Requer mar manso.

Poça do Arco » Salema Abrotea e lagosta » » » » Ponta Delgada Carapau e chicharro Lagosta Grande profundidade. Acesso dificil. Utiliza-se com qualquer mar. Furtados Carapau e sargo » » » » » » » Ponta do Gaspar PoitoMartins Bodeâo e sargo Requer mar manso.

Ponta do Padre Antó- > » » Abrotea e moreia » » » nio

Ponta da Côca * Bodeão e moreia Moreia e abrotea » » » - Curral | Sargo e salema Moreia e lagosta » » » » Cavalo Bodeão Bodeão e peixe-rei Requer mar manso. Acesso dificil. » Baixas » Não é utilizável durante a noite e requer mar manso.

Ponta da Maria » Salema Sargo e lagosta Utilizável com qualquer mar. Pesqueiro do Trigo L. da Igreja » » »

Curral Ponta Negra Salema « » » > » »

Porto Novo Forte de S. » » » » » » » Fernando 04 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Espécies d& peixes Nomes dos pesqueiros Situação Observações De dia De noite ! 1 Poção de S. Jorge i Forte de S. Salema Sargo e lagosta Alem das espécies mencionadas | Jorge dá bicudas em abundância.

Rego do Boi Idem Idem » » Abundante. Borreiro Estrada do Idem » » » P. Maitins

Arieiro Idem Sargo e carapau » » »

Balcão Idem Idem Abrotea e lagosta » » Calheta Idem » » »

Piquinhos » Idem » » »

Baixa das Patas » Idem » »

Outeirão » Idem > » j Engenho * Idem » » »

Apoio » Idem » » »

Cais da Vila Praia da Vi- Chicharro, carapau Sargo í tória e sargo

Enchova » Idem Só de dia.

Enchurradas Santa Rita Sargo, carapau, bodeao Moreia e abrotea Abundante. Pesqueiro Velho » Idem » » »

Caneiro » Idem » » »

Aleixo Serra de Chicharro » Santiago petingueiro

Espigão Idem Idem » » » DA ILHA TERCEIRA 95

Espécies de peixes Nomes dos pesqueiros Situação Observações De dia De noite

Caldeirinha Lages Chicharro e carapau Sargo Só de dia. Pedra de Saltar Vila Nova Chicharro, carapau, sargo, garoupa, bo- deão, etc. i Biscoitinho » Idem j i Laje da Fonte 1 Pesqueiro do Pau » » 1

Mesa » » ' ; ; ttii fi» Pôssas » »

Caneiro »

Morro Negro » !

Mulher » » 1 1 Grilho V »

Lavadouro » »

Pedra das Buracas » »

Pontinha Negra » »

Duas Pedras » »

Palame »

Burra » »

Rincão » » j i Canto do Portão « ! 90 BOLIiTIM DO INSTI TUTO HISTÓRICO

Espécies de peixes Nomes dos pesqueiros SituaçSo Observações De dia De noite

Bauricios 1 liVila Nova Chicharro, carapau, |i sargo, garoupa, bo- deão, etc. j j Rocha Calda » Idem í: Correia

Balieira » |

Ponte de José Vieira » i Trez Pedras )) s>

Pesqueiro do Rato »

Caneiro dos Charros »

Caneiro dos Sargos" » >

Cavalo •»

Espião

Homem 0 » i Í Craspiada ' i Canto >

Cagada

Tufe >

Galejo » :

Forcado » j

Crespo » > DA ILHA TERCEIRA

Espécies de peixes Nomes dos pesqueiros Situação Observações De dia De noite

Carreiro Vigário Vila Nova Chicharro, carapau, sargo, garoupa, bo- deão, etc. Tabuleiro » Idem

Alto Novo » »

Furna »

Canto dos Cagarros » »

Caldeirão Grande )) » D. Fernando Serreta Sargo, salema, bo- Moreia. Em pequena . Permanente. deão, garoupa, tai- quantidade, lagosta, nha, veja, verdugo, abrótea e congro. efe. Fundil » » Com meias marés e de enchente. Canto do Doido » » Com maré cheia. Pesqueiro da Greta » )) » 2.° » » » » » Com lua fraca. Bico da Ponte » Nas pôças, com maré cheia. Taboleiro » » Meia maré com lua. 1 Pesqueiro dos Manja- 1 » Ao sair da lua. ricães 1 i Pesqueiro do Meio » » Maré de enchente e ceu estrelado. » da Agua Azeda » Permanente. 98 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Espécies de peixes Nomes dos pesqueiros Situação Observações De dia De noite

Pesqueiro dos Verme- Serreta Sargo, salema, tai- Moreia, abrotea, la- Com enchente de marés, e de lhos nha, bodeão.veja.etc. gosta e congro. noite pelo escuro. Lage dos Bodiões (Ri- » » » » beira das Lapas)

Lage da Descida (Ri- » beira das Lapas)

Alto do Queimado > Chicharro, especial- Abrotea e congro. mente.

Pesqueiro dos Sargos Sargos, peixe-rei e Sargos. Com qualquer maré. bicuda

Passarião » Moreia e abrotea Lagôsta e abrotea. Com maré cheia.

Bem-feito » Salema e sargo Sargos. » » »

Lage do Bernardo » Sargo, salema, bo- Moreia, abrótea e » » » deão e garoupa congro.

Pesqueiro do Caracol » » » Com maré baixa. Ponte do Quarteiro » »

Calhau Entre-as-Pe- » » Maré cheia. dras

Maria Afonso > » » » Cabeça da Ponte Doze Bodeão, garoupa, Lagôsta, abrótea, Ribeiras sargo, peixe-rei, ver- congro, méro, mo- dugo, boga, chi- reia, moreão, cavaco, charro, carapau, be- e santola. sugo, salema, veja. ' - Alto da Ponte « Sargo e tainha. Sargo e tainha DA ILHA TERCEIRA 99

Nomes Espécies de peixes dos pesqueiros Situação De dia De noite

Virado-atraz Doze Tainha, sargo e sa- Sargo e tainha Ribeiras lema.

Gregório Bodeão, garoupa, Abrótea, moreia, mo- peixe-rei, verdugo, reão. chicharro, cara- pau, veja, sale- ma.

Rachada Bodeão, garoupa, Lagosta, moreia, peixe-rei, verdugo, moreão, abrótea, carapau, boga e santola e cavaco. salema.

Pedra Alta s> Sargo, tainha e sa- lema.

Pedra da Pôça Bodeão, garoupa, Lagosta, abrótea, peixe-rei, verdugo, moreia, morião, carapau, veja e sa- cavaco"e santola. lema.

Pedra do Canto » Bodeão, garoupa, Lagosta, abrótea, peixe-rei, verdugo, moreia e moreão. carapau, boga e salema.

Sombreiro Bodeão, garoupa, Lagôsta, abrótea,mo- peixe-rei, verdugo, reia, moreão, cavaco salema, veja, cara- e santola. pau e chicharro.

Môrro da Gata » Sargo, salema, e ^Nunca se pesca) algum peixe-rei e verdugo.

Lage das Onze (Ca- « Bodeão, garoupa, Lagôsta, abiótea, beça) peixe-rei, verdugo, santola, cavaco, salema, veja, chi- moreia e moreão. 100 BOLBTJM DO iNSTÍTUTO HISTÓRICO

Espúcies de peixes Nomes dos pesqueiros Situação De dia De noite

Lage das Onzeí Ca- Doze charro, carapau, bo- beça) Ribeiras ga e salema

Idem (Alto) (Tainha, sargo e sale- Tainha, sargo, abró- ma. tea. moreia e moreão

Idem(Virado-atraz) (Sargo e salema. ('Não se pesca)

Patacho das Onze Peixe-rei, verdugo, bodeão, garoupa, ca- rapau e boga. j

Patacho da Ribei- Idem, Idem. rinha i Cordeniz 1 » Idem, Idem. í Ladriz Bodeão, garoupa, Lagosta, cavaco, * peixe-rei, verdugo, santola, abrótea, sargo, salema, cara- moreia e morião pau, chicharro, bo- ga, veja e tainha.

Penedo Negro » Sargo.

Lage da Cova » Sargo, salema e tai- nha.

Laginha » Sargo, salema e ve- ja.

Pedra da Pôça » Sargo, salema, ve- Abrótea, morsia e ja, carapau, peixe moreão. rei. verdugo e tai- ! i nha.

Ponta Ruiva (Pô- » Bodeão, garoupa, Lagosta, abrótea, ço) peixe-rei, verdugo, carapau, chicharro, DA ILHA TERCB1RA 101

Espécies de peixes Nomes dos pesqueiros Situação De dia De noite

Doze boga, besugo, bicu- cavaco e cação. Ribeiras da, serra, liro e veja.

Ponta Ruiva (Poi- > Idem Idem so-de-Chicharro)

Idem (Poiso da » Idem Idem Areia)

Idem (Alto das » Sargo, tainha, cara- Sargo, tainha, mo- Pontas) pau, chicharro, bo- reia, mnrião e abm - ga, peixe-rei, verdu- tea. go, bodeáo, garou- pa e veja.

Idem (Escada) Bodeão, garoupa, Sargo, tainha, lagos- peixe-rei, verdugo, ta, cavaco, santola, chicharro, carapau, abrótea, moreia e boga, veja, sargo morião. e tainha.

Cana) da Ponte Sargo, salema, bo- deão c garoupa.

Estrado » Sargo, salema, veja, bodeão, garoupa, ca- rapau, peixe-rei e verdugo.

Jampires (Pôço •o Bodeão, garoupa, Lagosta, santola, ca- Alto e Buraco) peixe-rei, verdugo, vaco, congro, abró- carapau, chicharro, tea, moreia e morião. boga, veja, salema e tainha.

Calhau-lambudo Bodeão, garoupa, peixe-rei, verdugo, salema, sargo e veja. i 1 ROLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Nomes Espécies de peixes dos pesqueiros Situação De dia De noite Alcaides Doze Bodeâo, garoupa, Lagosta, abrótea, ca- Ribeiras peixe-rei, verdugo, vaco, moreia, mo- carapau, chicharro, rião e santola. boga, tainha, sale- ma e veja.

Salto-da-Pata Sargo e tainha Morrinho das Dez! Santa Sargo, salema, bo- Moreia, lagosta, Barbara deâo, garoupa, tai- congro e sargo. nha, veja, verdugo e chicharro.

Pedra do Almeida » | » : ! ; Pedra das Moças : » » >

Aguiltião das Dez » » »

Atravessada t » »

Pedra Nova » » »

Môrro do Gancho .. > »

Passadouro » »

Pedra da Traves- > » » sadinha

Pedra do Valadão » »

Pedra Redonda » » ...j-.ííel » 0 Berço »

Lage do Cota » » Buraco de N.a S.a y> DA ILHA TERCF.IRA 103

Espécies de peixes Nomes dos pesqueiros Situação De dia De noite

A Ladriana Santa Sargo, salema, bo-i Moreia, lagosta, con- Barbara deão, garoupa,taí-[ gro e sargo. nha, veja, verdugoi e chicharro. | 1 0 Caldeirão i »

Areia ■»

Roceiro >> »

Ponte de João dos » » » Santos

Lage » »

A Caixinha »

0 Trumedário * x> »

0 Canario das Seis » » >

Pedra da Pôça » »

Ponta Gôrda » »

Ponta das Cinco Cinco Sargo, salema,garou- Moreia, abrotea, sar- Ribeiras pa, bodeão, chicharro go e lagosta.

Ponta do Sacristão » » »

Canário )» s » 1 1 Cercado » » »

Pedra Alta » » >

Ponta do Pesquei- S. Mateus » ro 1 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Nomes Espécies de peixes dos pesqueiros Situação De dia De noite Ponta da Vigia S. Mateus Sargo,salema, garou- Moreia, abrotea, sar- pa, bodeão, chicharro go e lagosta Negrito » Idem »

Igreja Velha » y>

Cascalhinho » 19 Forte Grande » » Poço da Luz > » »

Mercês » Vila Maria > » » Alcaide Caminho » » de Baixo Pedra Furada

Rochinhas »

Lajinha » » —••• 1 Helena » | »

Varandinha » D S>

Pedra do Manuel » > » Tomé

Buraco do Comen- » » dador

Ponta da Grota J » » j » *1 Areias Brancas 1 i DA ILHA TERCEIRA 105

Espécies de peixes Nomes dos pesqueiros Situação De dia De noite

Preguiça de fora Caminho Sargo, salema, bo- Vloreia, abrotea, sar- de Baixo deão, garoupa e chi- go e lagosta. charro. Preguiça de dentro * » » Pedra Alta » Cais da Silveira » » Fanal S. Pedro » d'Angra Recanto Encosta Bodeão, garoupa,ve- Lagosta, cavaco, me" W. do ja, verdugo, sargo, ro, santola, abrótea. Monte pargo e cavala (pe- etc. Brasil quena).

Cais do|Castelo Idem, Idem. Idem, Idem. ■ ■ Pôças » Bicuda, serra, lírio, bodeão, sargo, cara- pau e goraz (muito raro).

Grota » Bodeão, garoupa, » rainha, verdugo, etc.

Guarita » Sargo, salema, taí' Abrótea, sargo, con- nha, muja, eíc. gro, saíio, etc.

Grotão » Tainha, salema, sar- go, veja, etc. Greta » Tainha (muito abun- » jdante), bodeão, sar- go, ele.

Cadeira do Padre jBicuda, serra, enxo- Congro, safio, abro- Inácio |va (rara), lírio, en- tea, cavaco, santola, chareu, chicharro, lagosta, sargo, etc. garoupa, etc. infi BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

A zona compreendida entre a Ponta da Lagoa, a W. de Vila No- va, e a Ponta do Raminho, a N, da Fajã da Serreta, é considerada como imprópria para a pesca, mas podemos e devemos exceptuar, por ser de certo modo notável, a parte de costa situada imediatamente a E. e W. da Ponta da Rua Longa, na Calheta dos Biscoitos

Sérvio de base a êste trabalho um extenso Relatório elaborado em 1933 pelo então Capitão do Porto de Angra, 1." tenente Liberal da Câmara, sóbre «A Industria da Pesca na Ilha Terceira», e um adita- mento àquele, elaborado também pelo mesmo distinto oficial, no ano seguinte, contendo principalmente indicações sobre as «marcas» dos «mares» mais conhecidos e procurados pelos nossos pescadores. Grande auxílio nos trouxe igualmente o magnífico estudo publi- cado pelo Dr. Luis Ribeiro no fase. III do Vol. I de «Açoreana». Á boa vontade daqueles a quem directa ou indirectamente soli- citámos informações e que tão prontamente no-las cederam, queremos também deixar aqui expresso o nosso melhor agradecimento. As (esfas do Espirito Santo

nos Altares

pelo Padre Inocêncio Enes

As festas populares do Espirito Santo, introduzidas no arquipé- iaf

com flores artificiais miúdas, quasi sempre brancas, em torno do aro e

pontas'3^5 e 0 Cetr0 tem amarr;!do um hço de fita branc'< 'arga com _ A bandeira é de damasco de seda vermelha bordado a aplica-

Domba vnS r"11 ^ Seda branCa' Uma COrÔa' POr CÍma ,Jma í voL/ e ra,n,nS qUat,0 ângUlnR- AS aPllcaÇões são oiladas orendr ./'r ' ' ^ ^ excepto no lado que P ' 3 ' d uma franÍa de seda também amarela. Encima a veimelhd,Íerme.h 013 amarrados ^por ^ baixo. ^ ^ hÇ0S de fÍta de seda branea e As insígnias são as varas que dantes levavam as pessoas que acomp.n avam a coroa nos cortejos, e hoje já se não usa^. de m"

tochls d H Ve™elh0 COm Uma C0nteira de meta, na P0"ta e as nia e ra anCaS 38 ertencentes Ías hLbandeiras, íhoje' todas so vermelhas, P mais àsgrossas coroas que e vermelhas as varas. as na folia ' 0 tamb0r ^ SerVe 110 ÍmpérÍ0' e 08 fo,iões tocam

à noín feSta nm Cada Caáa COnsiste em rezar 0 ^rço durante a semana dlingo"0 e"rr0 113 tarde de SeXta-f0Íra e na ^roação e jantar no Para a festa fazem-se convites. nerrfArHí,Samfnte '' """'h1""' ^ da CaSa' qUe tÍnIla 0 Espi"fo-Santo, dií, Pl r flCgl,'Sla "a quaresma. entrava nas casas e em cada uma cas-f tai 1 VL' 0 3 Saber que 0 EsPirito-Santo vai para nossa n aosais f'bocadinhos,3' Paía lrem quando esperar puderem, 6 rezar e0 notCrÇ0 domingo' de semana irem meao imnc-ajuàa- .e ,antar e mais a gente disso que Nosso Senhor der». Onde querin que lhe ajudassem a armar a casa acrescentava : — «F no sába- do, antes da semana da coroação, quero que me ajudem a armar a casa» para o que, todavia, só convidavam parentes ou vizinhos. a segunda-feira da semana da coroação, depois de ter o Espirito-

CaSa 13 ? llomem' ^^aclo e engravatado com uma vara enfeitada na mao, as casas onde a mulher já tinha estado, a convidar os homens e dizia; - «Eu venho dar a saber que tenho o Espirito San o em casa, para domingo me acompanharem e ao Senhor Espirito Santo e jantarem e mais nós disso que Nosso Senhor dere». Onde queria que o fossem ajudar nalgum serviço acrescentava o pedido. DA ILHA TERCEIRA 109

Hoje vão juntos, marido e mulher, duas ou três semanas antes da coroação. As pessoas convidadas visitam o Espirito-Santo e levam ovos» manteiga, assucar e leite em cabaças ou latas enfeitadas de flores, e1 quando saem, a dona da casa oferece uma merendeira com uma flor espetada na cabeça, ou uma rosquilha também enfeitada, a cada pes- soa. Se esta tem crianças oferece outras merendeiras mais pequenas para elas. No sabado antes da semana da coroação, depois do meio-dia, reunem-se as raparigas convidadas para armar a casa, afim de pre- parar o necessário. Umas fazem florinhas de papel, outras arranjam molhêtes de faias, que os homens foram buscar ao mato na vespera, destinados a fazer uma ramada de verdura nos tirantes do tecto, outras depenam fêno (rama verde de pinheiro) para juncar o chão, outras põem flores em jarras. Por cima do altar fazem o céo com um lençol apropriado de largos folhos em volta, cozido em canas por modo a ficar bem esticado, e nele pregam lenços de sêda vermelha, em triângulo e, pelo meio, flores de papel e hola* de casquinha, isto é, bolas de vidro de espelho. No resto do quarto o tecto é forrado com a ramada quanto mais tapada melhor, ornada de onde em onde por entre as faias com florões de papel em forma de repolho. As paredes ou frontais do quarto re- vestem-se de colchas vermelhas. Consiste o altar numa mêsa forrada com uma colcha branca e por cima uma toalha de paninho com renda em volta. Sobre o altar e em roda põem-se vasos ou jarras de flores e quatro castiçais com círios. Junta à porta de entrada, no caminho, cspeta-se um mastro onde toda a semana se hastea a bandeira feita de tiras de pano, uma ver- melha e duas brancas dos lados, ou quatro tiras longitudinais duas brancas, duas vermelhas alternadas, e um ramo de faia ou giesta na ponta do mastro, a indicar que na casa está o Espirito-Santo. No beirado, no intervalo das telhas, por modo ao vento os não levar, espetam-se ramos de giesta florida. Quando acabam estes trabalhos deita-se um foguete e come-se uma merenda constante de milho cozido ou pão de rala com queijo de cabra. BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Hoje ha quem forre todo o tecto do quarto com lençoes, em vez de faias, nos quais pregam as flores e bolas de casquinha, e galões a fazer arcos dum lado ao outro. O imperador do primeiro domingo, isto é, o que tem o Espirito- -banto em casa nessa semana, vai no domingo da Ressurreição à tar- de, com um cortejo de raparigas, buscar as corôas ao império, onde e as estão, que são levadas com todas as insígnias, estas distribuídas, «c preferência pelos parentes e depois pelos visinhos. Os portadores de algumas têm denominações especiais, e, como a festa e simulacro de festa real ou imperial, as denominações são as de antigos funcionários palatinos. Assim o que leva a coroa na salva chama-se pagem da coroa, o que leva a bandeira alferes, o que leva a vara vermelha enfeitada com uma conteira de metal na extremi- dade e uma fita de sêda viador ou irinehanle- Os portadores das tochas não têm designação especial, e para isso são escolhidos de preferência os imperadores dos outros domin- gos, ou parentes e visinhos e também pessoas de distinção. Se o cortejo passa na igreja o sino repica, mas só nas coroações, e ao chegar à porta da casa do imperador pára em duas alas conforme vem no caminho, e o pagem da corôa passa no meio delas sendo o primeiro a entrar com a bandeira e a vara. Á entrada da porta estão quatro pessoas, duas de cada banda, uma com uma bandeja de flores para atirar às corôas, outra com um círio acêso que acompanha estas até ao altar onde se metem no nicho. Depois de entrarem as corôas entram os portadores de outras insígnias e o resto das pessoas, que todas ficam a acompanhar o Es- pírito-Santo durante a tarde. Á entrada da corôa sobem ao ar dois ou três foguêtes. Á noite reza-se o terço. As raparigas sentam-se à frente, duro e outro lado do altar, em táboas apoiadas nos extremos em dua cadeiras, e os rapazes, no geral em pé por falta de espaço, ficam para o lado da porta. Se ha musica, violas, rabecas, etc., à frente dos rapazes põem-se cadeiras para os tocadores. Antes e depois do terço cantam em louvor do Espírito-Santo cantigas como as que seguem ; DA ILHA TERCEIRA 111

Ó Senhor Espirito-Santo, Que estais no vosso altar, Deitai vossa santa benção A quem vos vem visitar. Ó Senhor Espirito-Santo Lá da Casa da Ribeira, Cheira a cravo, cheira a rosa, Cheira a flor da laranjeira. ■Ó Senhor Espirito-Santo Que dais a quem vos vem ver ? Aos solteiros boa sorte, E aos casados bom viver. Esta casa está armada De madeira delgadinha, E dentro dela habita Aquela corôa divina. Esta casa está armada Por dentro e por fora não, Por dentro cravos e rosas, Por fora manjaricão. O cetro, divino cetro, Ó corôa, divina corôa, Vós no mundo sois pombinha No céo divina pessôa. Divino Espirito-Santo Tende de mim compaixão, Deparai-me um amorzinho Leal ao meu coração. Boa noite p'ró divino E p'rás flores do seu altar, E para todas as pessoas Que o terço lhe vem rezar. Dantes bailava-se também, mas as condenações da igreja tem le- vado, pouco a pouco, a abandonar o costume e hoje já se não baila. O terço actualmente rezado, cantava-se antigamente. 112 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

No primeiro dia escolhe-se um rapaz para tocar a campainha a cada Gloria Pafri, e uma rapariga para dizer a meditação e oferecer os mistérios. Nisso serve qualquer livro devoto, pois não ha texto próprio. O rapaz da campainha, depois de recitado o terço e rezada a Sal- ve-Kamha, pede vários Padre-Nossos pela sagrada morte e paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo, à Virgem Nossa Senhora para que valha a todos na hora da morte, pelos defuntos do Imperador e da Imperatriz, por todos os ausentes, pelos defuntos dos que rezam o terço, pelas almas do Purgatório, pelos que andam sobre as águas do mar para que Nosso Senhor os deixe chegar a porto de salvamento, e, em es- pecial, ao Espirito-Santo para que a todos faça seus devotos. A seguir toca a campainha e todos juntos dizem Espirito Santo Deus misericórdia I (três vezes) Virgem Mãe de Deus rogai por nós ! (três vezes), com que termina a reza. Depois a dona da casa ou a filha e, se não tem filha, uma rapa- riga a quem isso pede, vai dar o cetro a beijar às mulheres, e o dono da casa, o filho ou um rapaz se o não tem, faz o mesmo aos homens. Beijam a pomba e quase todos tocam com ela na festa para o Espi- nto-Santo dar juizo. Ha rapazes e raparigas que beijam ainda a fita amarrada no cabo do cetro afim de casarem cêdo. Uma promessa, que às vezes fazem, é rezar o terço com a corôa na cabeça c, nesse caso, põe-se uma almofada ao pé do meio do altar sobre a qual ajoelha quem faz a promessa, com a corôa na cabeça c o cetro na mão inclinado no braço. Durante a semana a Imperatriz nada faz senão receber visitas. Esta toda aperaltada, com grande avental branco com seu folho engo- mado e encanudadc. Para cuidar do serviço da cozinha tem uma mes- iia e uma cozinheira ajudadas pelas raparigas que estão convidadas para amassar e fazer qualquer trabalho necessário. A mestra e a cozi- nheira dormem na casa, bem como alguma outra mulher, para o tra- balho nocturno de cozer o pão quando a festa é tão grande que exija cozedura^ dia e noite. As que dormem em suas casas são chamadas de manhã por um foguete. A cada amassadura ou cozedura deiía-se uma bomba, a fora ou- ras que se atiram sem ser nessas ocasiões, pois as raparigas diver- tem-se com isso e, no geral, roubam-nas à dona da casa. DA ILHA TERCEIRA 113

Na quinta-feira ou no sabado, por ocasião do terço, a Imperatriz oferece a cada pessoa uma merendeira. As raparigas guardam as suas e dão-nas aos rapazes, os quais comem a que a Imperatriz lhes deu e metem a oferecida pela rapariga na algibeira do peito da jaquêta onde a conservam às vezes durante mais duma semana, e nunca a comem porque pode ter feitiços. As raparigas, que na semana ajudam a amassar, fazem da massa pequenas merendeiras que oferecem aos namorados. Os dias das visitas são terça e quarta-feira. Nos outros dias só vão parentes e íntimos da família. Se entre as visitas ha pessoa grada da freguesia deita-se um foguête. Todas, ao despedirem-se, beijam o cetro que a dona da casa lhes apresenta. Na noite da quinta para a sexta acabam de cozer-se as massas, e na sexta-feira é a festa do bezerro. Logo de manhã as raparigas preparam as fitas de papel de cores vá- rias para enfeitar o animal, e nessa ocasião faz-se uma tôsca coroa de madeira forrada de fitas e encimada por uma merendeira com uma flor espetada,bem como banas {do espanhol monas?) de papel, em forma circular, que se pregam, como as fitas, com breu no cabelo do bezerro. Havendo mais de um bezerro preparam-se ornatos para todos. A tarde juntam-se rapazes e raparigas e, com a folia, vão até onde está o bicho que enfeitam, em quanto, ao som de violas e rabecas, cantam fazendo estalar bombas e foguêtes. Enfeitado o bezerro põem-Ihe uma campainha ao pescoço e tra- zem-no consigo, no geral acompanhado por duas vacas enchocalha- das e os cornos enfeitados com um arco de vime forrado de papeis de côr. Atraz segue a folia a cantar e focar diversos instrumentos até casa do Imperador. Ao passarem pelas casas das pessbas mais importantes, pelo im- pério, igreja e casa do padre, a que sempre propositadamente se di- rigem, ainda que por lá não passem de caminho, calam-se os instru- mentos de metal e, acompanhados apenas por violas e rabecas, deitam cantigas de saudação improvisadas como as seguintes: Vosso marido é o sol Que alumia casa e rua Vossos filhos são estrelas. Vós, senhora, sois a lua. BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

A rainha no seu trono Ampara a sua bandeira, Também vós, real senhora, Amparais família inteira. São estas, improvisos de cantadores afamados, mas a par delas» em maioria, ha outras melhor ou peor arquitectadas;

O bezerro enfeitado Com boninas amarelas, E as meninas estão vendo Debruçadas às janelas. Diante da igreja as cantigas dirigem-se ao Santíssimo Sacramen- to, a Nossa Senhora ou aos Santos:

Salve! Salve casa santa Dos anjos acompanhada. Aonde Jesus habita Na hóstia consagrada. Louvo a Virgem Santíssima, Que nesta casa também mora, Peço-lhe p'ra nos valer Sempre e na ultima hora. Para mostrar que não sou Do tempo do paganismo, Louvo os santos que a habitam, Heróis do cristianismo. Diante de ti prostrado, Eu te saúdo, ó cruz, Onde por nós foi pregado O nosso amavel Jesús. Cumprimentos ao pároco : Vimos aqui cumprimentar-vos Por serdes nosso pastor, Guiai as vossas ovelhas No caminho do Senhor. DA ILHA TERCEIRA 115

Sois pastor das nossas almas, P'ra isso Deus vos escolheu, Abençoai-nos senhor Com o poder que ele vos deu. Sois corno o bom lavrador Que a sua terra semeia, Lhe deita a boa semente E ao encher metade é aveia. Na frente do Império :

Acabamos de chegar Deante do Espirito - Santo, Louvo-o porque ele sabe Com que alegria lhe canto. Vimos à vossa presença Tão pobres do coração, Ó divino rei d'amoi Deitai-nos vossa benção. Deitai vossos raios de fôgo. Que para nós serão ósculos, Alumiai nossas almas Como alumiaste os apóstolos. Apareceste em várias partes, Até no rio [ordão Quando João batisou Cristo E Cristo batisou João. Quando os apóstolos estavam No Cenáculo a orar. Baixaste em línguas de fôgo Para a ciência lhes dar. Agora vamos partir Que a hora vai avançada, Vossa benção nos acompanhe Até à última morada. 116 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Chegados a casa do Imperador, a mulher deste com o cetro aben- çoa as rezes destinadas ao sacrifício, fazendo com êle uma cruz na cabeça e outra no lombo. Segue-se a matança, que é feita pelo pessoal indispensável, e o resto da gente entra na casa onde passa a tarde a tocar viola e cantar. Acabada a matança vai para a mesa a ceia, servida a tempo de terminar antes de vir gente para o terço, que antigamente constava de pão de milho amassado com leite e assucar e queijo de cabra e hoje consta, geralmente, de alcatra de peixe ou carneiro, pão de trigo e vinho. No sabado de madrugada vai o marchante partir a carne e, se o Imperador dá esmolas, vem a mestra da função escolher o que precisa para o jantar, e o resto é partido para distribuir pelos pratos em que são dadas. Antes, porem, de mais nada, fazem-se quatro postas gran- des ou redondas, que colocadas em pratos travessas são levadas ao cair da noite, por quatro rapazes, cada um com sua travessa e todos juntos, poi sua ordem, ao pároco, ao sacristão, ao criador do bezerro e ao marchante, sendo a do pároco acompanhada dum pão de mesa ou rosquilha grande se é na semana do bôdo. A enfeitar cada posta ou esmola põe-se em cima um raminho de hortelã. Os pratos com as esmolas tendo ao lado uma merendeira, são postos em bancos ou táboas estendidas, e emquanto isto se faz, dois homens percorrem a freguesia, um para um lado outro para outro, a distribuir bilhetes com indicação da hora a que as esmolas serão en- tregues em troca do bilhete. Antes o padre benze as esmolas e assiste à distribuição, ofereccn- do-se a cada contemplado um copo de vinho. Ao mesmo tempo dois ranchos de raparigas andam pelas casas a pedir emprestada a loiça para o jantar, e uma delas, que saiba escre- ver, vai tomando nota do que recebe afim de evitar enganos na resti- tuição. Outras raparigas ficam em casa do Imperador a limpar talheres e panelas destinadas ao serviço no dia seguinte. O fim de cada um destes trabalhos é anunciado com um foguete. Nalgum tempo ia com a corôa para cada casa um pequeno tam- bor, ao ritmo do qual as raparigas bailavam a campona, a chamar- rila e a viraclinha. DA ILHA TERCEIRA 117

No domingo de manha muito cêdo, às vezes ainda todos dor- miam, chegavam à porta da casa do Imperador, a tocar e cantar, os foliões. Levantava-se êle e a mulher, para abrirem a porta e darem alguma cousa de comer aos foliões que, emquanto não chegava a hora da coroação, davam uma volta por outras casas a saudar, em quadras de improviso, na sua monótona cantilena acompanhada de tambor, os donos que lhes pagavam a amabilidade com alguma oferta, recolhida logo no saco que, para tanto levavam. Um dos foliões conduzia a ban- deira, igual à do Espirito-Santo, mas mais pequena, de lã e não de sêda, com a haste encimada per uma pomba de madeira prateada, o outro tocava no tambor. A quantos encontravam pelo caminho davam a pomba a beijar e a alguns deitavam a sua cantiga laudatória: Viva o senhor F.. . Nobre pessoa de bem, Deus lhe dê muita saúde E à família também. Bom dia senhora dona, Rainha da fidalguia, Deus dê saúde ao seu dono Para a sua companhia. Aqui tem na sua frente Estes dois pobrinhos juntos, Fazei-lhe uma esmolinha Por alma de vossos defuntos. O meu nobre benfeitor, Nós vimos cumprimentar, A vós e vossa família, Deus os queira abençoar. O senhor José Martins, A honra da freguesia, Sois a pessoa mais nobre, Sois o rei da valentia. O vestuário dos foliões era opa de chita vermelha enramada, com grande gola branca redonda, e na cabeça, amarrado com as pontas para traz, um lenço vermelho de barra branca. 118 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

A' hora da coroação regressavam a casa do Imperador para acompanharem o cortejo que abriam.

N0 0 organiza se 0 corte frpntren pe e ^"T-ud^fnbuem-se as * insígnias. Havendo,jo, homens como atraz geralmente e mulheres ha, à is de uma coroa a primeira é entregue ao criador do bezerro, ou seu representante, e as outras a pessoas de família ou distinção. As bandeiras dão-se a rapazes novos, parentes, afilhados ou vizi-

6 m Stra da fUnÇã0 0U 3 cozinheira te cortejo,cohL ' a ^este ^ pertence! uma das bandeiras de preferência^ algum a todos filho Asno tochas das coroas cabem aos Imperadores dos outros domingos ou seus representantes, e as que acompanham as bandeiras, uma de cada Lido, a rapazes novos parentes ou vizinhos. Como já se disse a vara o via or e entregue ao rapaz que tocou a campainha nos terços e vai no meio do cortejo endireitando as filas. Seguem todos para a igreja a cantar a Ave-Maria, Se a filarmó- nica acompanha não se canta. Á porta da igreja, da parte de dentro, está o pároco a aspergir com agua benta os que vão entrando. Começa então a missa e, dita ela, o pároco procede à coroação cantando o Vcm-Crealor. ^ Á entraaa e saída o pároco vai atraz das coroas a cantar a Aía- .qm/ical, terminada a qual os imperadores, voltados para ele, fazem- le uma reverencia e traçam no ar uma cruz com o cetro como se o abençoassem. ■ ■ ' u No gcr; coroam | '' 'mmens e não crianças, mas nem sempre o chefe . famiha. As vezes fazem-se promessas como a de coroar um filho que esteve doente e melhorou.

DeusDeu^n na3^ missa0 entr3 deitam-se CU sai três a coroa(foguetes^ ào custasino repica,do Imperador e ao levantar que de a coroa na cabeça, regressa a casa onde se observa complicado cerimo- os hi" ^ mCI0 de CantÍgaS 'mProv'Sadas pelos foliões, quando

O meu nobre imperador Faz favoi de ajoelhar, Aáeu nobre pagem da coroa Faz favor de o descoroar. DA ILHA TERCEIRA 119

Eu vou daqui para as ilhas, Das ilhas para a Madeira, Entregai o estandarte Meu alferes da bandeira. O meu nobre imperador Tomai o vosso lugar, P'ra daqui a instantinho Mandar-nos vir o jantar.

Vão todos então para a mesa. No meio da mesa do Imperador ha um pequeno trono onde se colocam as corôas, que ali permanecem até ao fim do jantar, e a ela se sentam os portadores das insígnias e os foliões que, depois de to- dos sentados, começam a pedir em cantigas as iguarias. O jantar consta de sôpa de carne, carne cozida, alcatra e pão de trigo feito com ovos e assucar, pão de mesa, de grandes dimensões (quatro por alqueire), regado com vinho alegrador e inspirador dos foliões. Começam as cantigas destes:

Minha nobre Imperatriz Botai pTa cá a sopinha. Para a gente a comer Saborosa e bem quentinha.

Venha a carne para a mesa Em travessas repartida, O pão dôce e mais o vinho, Que é uma bela comida.

Venha agora a alcatra assada Com seu molhinho bem feito, Com pimenta e pau de cravo, Que é coisa que tern geito.

Comida a alcatra termina o jantar. Os rapazes deitam então nos copos vinho e confeitos e mandam às raparigas. 120 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Nem todos, porem, o fazem ; só alguns que querem agradar às namoradas ou, por esse meio, encetar namôro. Antes de se levantarem o rapaz que nos terços durante a semana pediu Padre-Nossos, pede agora pelas mesmas intenções e todos re- zam de pé em voz alta, e os foliões, com suas cantigas, percorrem a mesa para lhes darem dinheiro. Organiza-se depois o cortejo. Os pagens das coroas, põem-nas na cabeça dos Imperadores que assim as vão levar à casa do Imperador do domingo seguinte, onde são recebidos pelo modo já descrito. Entrados ajoelham sobre almofadas e os pagens tiram-lhes as corôas, que entregam ao dono da casa; voltam depois para suas casas acompanhados dos foliões aquém oferecem uma alcatra e um pão de mesa. Nas semanas dos bôdos, Pentecostes e Trindade, tudo segue na mesma ordem pelo que respeita à coroação, mas ha mais os mordo- mos, oito para cada bôdo, cada um dos quais cose um saco (6 alquei- res) de pão destinado aos pobres que não podem coze-lo em suas casas. As esmolas de pão e carne são dadas no sabado no largo junto à igreja onde também está o imperador. ■ Nos dois sabados ha lugar à coroação, à tarde, dos mordomos que a sorte designa entre os oito. Para esse efeito vão os mordomos buscar as coroas a casa do Imperador, levam-nos à igreja onde são coroados e, acompanhados pelo pároco, dam uma volta em torno das esmolas estendidas em táboas ou bancos, por modo que os coroados fiquem à cabeceira Nesta altura o pároco benze as esmolas que são entregues por ele aos portadores de bilhetes, a cada um dos quais se oferece um pequeno copo de vinho. No cortejo só tomam parte mulheres. Bentas as esmolas os mordomos põem as corôas no império e as mulheres sentam-se nas varandas, e as raparigas, olhando os na- morados se os têm ou, se os não têm, procurando arranja-los pois é, por via de regra, neste dia que os namoros principiam, em quanto a filarmónica toca num coreto para isso armado. Quando por qualquer circunstância não ha concerto da filarmónica, tocam violas e cantam ao desafio. No domingo do bôdo tudo se passa como nos outros, mas as DA ILHA TERCEIRA 121 coroas, em vez de irem para casa do Imperador, vão para o ínipério depois de se distribuir o pão e o vinho, bentos pelo pároco na dis- pensa (anexo ou dependência do império destinada a arrecadar as comidas) a seguir a descoroar os imperadores, pois, nesse dia o páro- co acompanha as corôas e é quem as tira aos Imperadores. Estes para o jantar apenas levam processionalmente para casa os cetros, que são espetados em três copos cheios de trigo colocados na mesa em lugar das corôas. O jantar nesse dia tem mais arroz dôce de que se dá a cada conviva uma fatia espetada numa faca a seguir à alcatra. Depois do jantar o cortejo vai para o império e os homens das insígnias levam bandejas com rosquilhas grandes, travessas com carne assada e outras com arroz dôce, garrafas de licor e respectivos coposi garrafas e copos de vinho, para as mulheres que vão no cortejo come- rem e beberem durante a tarde e para a Imperatriz, que também está no império, mandar presentes às suas amigas que lá não tenham ido. Para estes ha lambem uma grande bandeja de dôces variados, nesperas, e uns pequenos pires de arroz dôce, que as raparigas trans- portam na palma da mão. A distribuição dos presentes faz-se do seguinto modo : Os ho- mens que levaram as bandeiras e as corôas, com umas toalhas bran- cas enfeitadas com fitas de várias côres, pregadas no ombro esquerdo e com lenços de seda na cabeça, acompanhados pelo viador com a vara e pelos foliões, andam toda a tarde a distribui-los. Cada presen- te consta de alguns dôces, um pires de arroz dôce, e fruta se a ha. Quando o distribuidor chega ao pé do destinatário, os foliões fazem o seu aranzel de saudações e só, findo ele, o presente é entregue. Para o transporte a Imperatriz arranja pequenos pratos de vidro. Se o presenteado não está no arraial, levam-lhe a casa o presente. O Imperador, por sua vez, sai de quando em quando ao arraial, a convidar os seus amigos a irem ao império comer e beber alguma cousa. Dentro do império tanto o Imperador como a Imperatriz estão sentados junto duma mesa e nada fazem. Alem desta mesa ha outra dos procuradores com aguardente e fatias de massa sovada para as pessoas que vão pagar promessas, às quais o Imperador também oferece alguma cousa da sua mesa. Os objectos oferecidos ao Espirito-Santo são arrematados nos intervalos da música. BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Ao cair da noite vão levar o Espírito-Santo a casa do Imperador do segundo bôdo (Trindade), no qual tudo se passa como no primeiro. Se são coroadas crianças deitam confeitos na corôa e às que acompanham o cortejo oferecem, às vezes, fatias de pão de mesa. Na segunda-feira de qualquer dos dois bôdos, o pão que restou é distribuído pelas casas pobres na proporção do numero de pessoas de família, e da distribuição se encarregam procuradores e mordomos da festa. O povo tem o conceito de ser o Espírito-Santo muito vingativo, pelo que põe o maior cuidado em pagar escrupulosamente as promes- sas que lhe faz e não ser castigado. Ern abono desta ideia conta vários casos. Um homem, por exemplo, tinha destinado um bezerro para a fun- ção do Espírito-Santo, mas gostou dele por ser bonito e substituiu-o por outro. Quando estavam a matar este, morreu aquele num cerrado proximo. Os foliões e os presentes acima referidos tem caído em desuso e quasi desapareceram já. Na freguesia ha, como já se disse, uma irmandade do Espírito-San- to na qual se inscrevem as pessoas que desejam fazer parte dela, cujos nomes são lançados num caderno. Não pagam quotas, mas os sócios ou irmãos obrigam-se a ser Imperadores e mordomos quando não haja quem voluntariamente a tanto se preste. Os Imperadores são os que corôam e fazem a festa em cada uma das semanas; os mordomos são os que tem à sua conta fazer os pe- ditórios para compra do vinho, cozer o pão para o bôdo e esmolas e dar a carne paia as esmolas. Os peditórios fazem-se separadamente pelos oito mordomos de cada bôdo. No dia aprazado vão lodos com um carro de bois pedir pelas casas da freguesia eiecebem cambadas de milho, aboboras, mogangos, batatas, que depois vendem em arrematação, ou dinheiro de quem não tem aqueles géneros. Com o producto da venda compram o vinho e se por luto ha fa- mílias que não vão ao bôdo e contribuiram para ele, levam-Ihe o vi- nho a casa Os carros do peditório são enfeitados com bandeiras e os bois trazem campainhas ao pescoço. DA ILHA TERCEIRA 123

Os Imperadores são designados à sorte para o que se faz uma porção de bilhetes e numeram-se tantos quantos os domingos. Um dos procuradores faz a chamada e o chamado mete a mão numa urna e tira um bilhete. A chamada repete-se tantas vezes quantas as preci- sas para sairem todos os bilhetes numerados. Ás vezes os sorteados fazem trocas entre si) conforme as suas conveniências. Os procuradores são verdadeiros gerentes da irmandade por ela eleitos. Para a eleição convocam-se todos os irmãos e são propostos os mais competentes. Nesse dia, antes da eleição, prestam-se as con- tas do ano findo e é esta a única vez que reúne a assembleia geral. Superstições comuns ao Brasil

e aos Aç ores

Comunicação apresentada ao Congresso de Florianópolis — Estado de Santa Catarina. Brasil

pelo Dr. Luís da Silva Ribeiro

Na «Revista da Academia Cearense» publicou, em 1910, Guilher- me Studart, 335 superstições do Ceará, reproduzidas por Luis da Ca- mara Cascudo a páginas 298 da sua Antologia do Folclore Brasileiro, Parte delas, algumas com pequenas variantes, existe nos Açores; mas do facto não pode concluir-se que tenham ido do arquipélago .para o Brasil, pois são comuns ao continente português. A-pesar-disso não será descabido o confronto entre umas e outras, como contribui- ção para o estudo comparativo do folclore dos dois países.

Água.

a) Não se dá o sobejo a beber a outra pessoa, porque esta fica a conhecer os segredos (Brasil). Superstição generalisada em todo o Portugal — Figueira da Foz (1-47), Guimarães (2-348), mencionada por Leite de Vasconcelos (10-68) e Luís Chaves (13-138). Segundo Lima Carneiro (11-132) se são duas mulheres e ambas amamentam, secará o leite à primeira, crença semelhante à que existe no Barroso (20-91). DA ILHA TERCEIRA 125

Na ilha Terceira a supeistição é idêntica à brasileira, mas é para notar-se que nos brindes dos jantares de casamento todos os convi- vas bebem pelo mesmo copo. h) Duas pessoas não devem lavar as mãos conjuntamente numa bacia, porque uma perde a felicidade em proveito da outra (Brasil). Na Terceira diz-se que haverá desavenças entre ambas, e o mesmo se diz no continente (5-109).

Amulêtos

а) A criança de peito deve trazer ao pesco, ou no braço, uma figa de ouro, prata, ou principalmente de coral para evitar o mau olha- do ou o quebranto (Brasil). A figa é amulêto infantil muito generalisado por toda a parte e que vem de antigos tempos (28-556 e 570; 31). Em regra nao se usa isolada, mas sim em companhia de outros (13-158), que, na Terceira, são a meia-lua, o sino-saimão, às vezes o peixe, uma rodela ou pedacíto de unicórnio, medalhas devotas c sím- bolos cristãos, a cruz, a ancora e o coração (fé, esperança e caridade). O mesmo se pratica em São-Miguel (24-10). A preferência dada ao coral deriva das virtudes mágicas da cor vermelha. Na Terceira che- gam a amarrar ao cordão, ou cadeia metálica, que suspende os amu- lêtos, um pedacinho de pano vermelho e o mesmo fazem nos animais. Igualmente usam o raminho ou galho de coral ou massa vermelha. б) Hm lojas e vendas encontram-se pregadas à parede ferradu- ras de cavalo, e isso para trazer felicidade no comércio (Brasil). A crença na virtude da ferradura está espalhada em Portugal. Existe na Figueira da Foz (1-49), Santo Tirso (17-255), Barroso (20-92), noutras localidades (10-100) e ainda no estrangeiro (26-205). Na Terceira, à semelhança do que se pratica noutras partes (13- -128^, pregam-a na face interna da porta de entrada da casa e preferem a ferradura do pé esquerdo, a qual, todavia, para ter virtude, deve ser encontrada por acaso no caminho c) Pregar uma moeda na gavêta do balcão é chamar a fortuna para o logista eu mercieiro. Do mesmo expediente usam os engraxates sobre o caixão de engraxar (Brasil). Na Terceira, alem disto, pregam-se as moedas falsas, sobre tudo BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

de cobre, inadvertidamente recebidas pelo comerciante, sobre o balcão da loja. Da moeda como amuleto em Portugal, tratou largamente Leite de Vasconcelos (28-111). d) Alguns donos de mercearia ou venda usam também do chi- fre para chamar freguesia (Brasil). Na Terceira, como no Barroso (2-92), o chifre é de carneiro preto. Poem a ponta pregada na armação da loja ou no descanço do re- lógio, as vezes dourada a purpurina e enfeitada com um pequeno laço de fita encarnada. O chifre, geralmente considerado como livrando do quebranto, é pieventivo aconselhado por antigos médicos contra a fas- cinação (30-8.3), dando felicidade a quem o traz.

Animais.

a) Canto de galo, ao anoitecer, é sinal de fuga de alguma moça (Brazil). Na Beira, antes da meia-noite, diz haver rapariga solteira grávida (8-160J, e comumente considera-se mau agouro. Nos Açores (Ter- ceira e São Miguel (23), antes da meia-noite, anuncia vinda de navio do Brasil ou de Lisboa. h) Canto de galo em noite escura é sinal de infelicidade (Brasil). Por todo o pais o mesmo (10-151), no Cadaval (3-105), Turquel ('21 -67), etc. c) Canto de galo junto de uma pessoa está a anunciar-lhe qual- quer cousa (Brasil). Na Terceira, proximo de casa onde se acha um doente, anuncia morte deste. d) Em casa onde a galinha cantou como galo haverá morte de alguém. Para preveni-lo mata-se logo a galinha (Brasil). E consequência da natural repugnância do povo pelos seres anor- mais (27-8), e existe por todo o pais (10-153, 29-1357) designada- mente na Figueira da Foz (1-53,1, Santo Tirso (17-40), Turquel (21-67) Barroso (20-30). Em São Miguel crê-se o mesmo (23) e por isso, diz-se na Ter- ceira, — «Galinha que canta como galo. torce-se-lhe o gargalo. e) Gato preto encaipora a casa (Brasil). DA IlHA TERCEIRA 127

Em Guimarães é bom agouro (2-126), e no Alentejo o agouro mau é com o cão preto (13-129). Diversas superstições com animais prêtos existem nos Açores (14-159) e, embora pouco generalisada, ha uma superstição terceirense idêntica à brasileira. f) O gato tem sete fôlegos, por isso custa tanto a morrer (Brasil). Crêem o mesmo no continente português (10-173) e, na Terceira, diz-se que, por esse motivo, pode cair de grande altura sem sofrer dano. g) Quem mata gato tem sete anos de atrazo (Brazil). De trabalhos diz-se cm Portugal — Turquel (21-41), Santo Tirso (17-41) e nos Açores — São Miguel (24-45, 25-96) e Terceira. Os mo- dernos condutores de automóveis fazem toda a diligencia para não matarem gatos com o carro, receando o agouro. h) Uivo de cão à noite é sinal de morte e, para fazer calar o cão, emborca-se o sapato (Brasil). Em Portugal considera-se mau agouro e, para conjurar os seus desastrosos efeitos, usa-se o mesmo meionO-168, 13-130), preferindo- -se o sapato do pé esquerdo. Em Santo Tirso é sinal de virem cães danados (Revista Lusitana, XIX-257), e noutias localidades simples- mente prenuncio de morte ou desgraça — Beira (7-161), Figueira da Foz (1-53), Cadaval (3), ilha de São Miguel (24-44, 25-96), Terceira, etc. i) Entrada de beija-flor preto ou borbolêta prêta numa casa é mau agouro ; a de uma esperança é felicidade (Brasil). Aqui o elemento principal é a côr, posto que, por si só, a borbo- lêta seja agourenta. Os franceses dizem — papilon au matin cha- gnn, au soire expoire. No Cadaval (3-105) e na Figueira da Foz (1-76) ha crença idêntica, mas no Barroso (20-97) como noutras ferras, (29-1264) é o besouro. Em Turquel (21-70) a borbolêta branca anun- cia boas noticias e só a prêta mau agouro. Em Santo Tirso (17-40) a borbolêta branca é bom persagio, e as aranhas prêtas mau. Em São Miguel borbolêtas à noite a queimarem-se na luz, sendo brancas pro- gnosticam boas novas, sendo prêtas, más (10-25, 94). ./) Cachorro urinar à porta é sinal de ventura (Brasil). O mesmo no continente (Barroso, 20-98) e na Terceira. k) Para fazer um cão acos(umar-se a uma casa basta enterrar no batente da porta do quintal alguns cabelos da ponta da cauda e ele não fugirá mais ^Brasil), 128 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

No continente (10-171), Turquel (21-71), Santo Tirso (17-36), untam as patas do gato com azeite, e o mesmo praticam na Terceira tanto no gato como no cão. Para conhecer bem o dono, este cospe- -ihe no focinho. I) Quando o calongo entra pela casa dentro é sinal de boas no- ticias cu de dinheiro (Brasil). No continente a entrada de mosca vareja prenuncia visitas (10- -136) e, mesmo em São Miguel (10-25 e 93). Na Terceira a entrada de zangão. m) Em casa em que ha pombal a fuga dos pombos é anúncio de desgraça próxima (Brasil). Na Terceira crêem o mesmo, por isso se diz—-«Casa de pombos, casa de tombos»; e em São Miguel ha igual preconcerito (24-46 e 25- -95). Quem os tem deve conserva-los sempre. Assim o julgam igual- mente na Beira (8-158) e na Figueira da Foz (1-53); mas em Gaia a casa que não tem pombos é que se considera desafortunada (10-157). As rôlas também são agourentas (13-128). n) De obra de execução muito demorada se diz que está enter- rada nela alguma caveira ou queixada de burro (Brasil). O mesmo no continente (10-176) e na Terceira, onde de qualquer trabalho intrincado ou moroso, se diz que tem caveira de burro ou dente de cavalo. o) Não se deve espanar teias de aranha para não espantar a fe- licidade (Brasil). São muitas entre nós as superstições com aranhas quase sempre mais ou menos ligadas a dinheiro. Na Terceira quanto mais pequenas são melhor e, segundo alguns, para o dinheiro vir, devem matar-se com o dêdo mínimo.

Astros.

a) Quem aponta as estrelas cria verrugas (Brasil). O mesmo na Terceira e em São Miguel (23), bem como por todo Portugal (10-26), na Beira (7-162), no Barroso (20-97), Turquel (21- -71), e ainda na Itália (26-266). b) Para fazer crescer a fortuna toma-se uma cédula ou uma moeda c, mostrando-a à lua diz-se três vezes : DÁ ILHA TERCEIRA 129

Deus fe salve, lua nova. Clara e resplandecente, Quando vieres de outra vez Traze-me desta semente.

Leite de Vasconcelos regista fórmulas semelhantes no continente (10-20) e nos Açores basta mostrar-lhe o dinheiro (23).

Casa

a) Para fazer com que se retire uma visita muito demorada, põe-se uma vassoura atraz da porta, ou sal dentro do fôgo, ou viram- -se as cadeiras de pernas para o ar. Se a visita tem hérnia, ao estalar do sal, a hérnia ronca (Brasil). Na Beira abrem também a tenaz do lume detraz da porta (8-157) e na Terceira uma tesoura, e a vassoura com a rama para cima, o que noutras localidades é sinal de haver desordem (Revista Lusitana, XXI-33), Não se conhece superstição semelhante à da hérnia. b) Quando alguém muda de uma casa para outra, a primeira cousa que deve enviar é um pouco de sal, e, ao entrar na casa, pisar com o pé direito e tratará de fazer logo fôgo (Brasil). No continente lenha e sal, mas no Porto azeite, pão, vinho, car- queja e carvão (10-252). Na Terceira mandam sal e fermento, o mes- mo fazendo em São Miguel (23), salvo em Vila Franca do Campo on- de mandam resteas de cebolas, fermento, sal e pimenta (24-36). A superstição de entrar com o pé direito é antiga. Dela fala São Martinho no De correctione rusiicorum, citado por Leite de Vasconcelos nas Religiões da Luzilania. c) Varrer a casa de noite é arriscar-se a morrer inchado (Brasih. Muitas são as superstições referentes ao varrer a casa de noite. Em Guimarães é isso mau (2-357) e na Figueira da Foz varrer para a rua. Na Beira (7-169), como em São Miguel (23,24-34) e na Terceira, deitar fora o lixo leva a fortuna. No Barroso (20-93), em Turquel (21- -71) e noutras partes (13-128) existem crendices semelhantes. d) Passar a vassoura, ao varrer a casa, pelos pés de um tran- seunte, é condena-lo ao celibato (Brasil). O mesmo nos Açores e no continente (10-224, 21-68, 24, 22, etc). BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

e) Velho que reedifica um prédio não chega a ver a sua con- clusão ou morre pouco depois de terminar a casa (Brasil). Nos Acôres dizem: — «Casa nova, tumba à porta». 1) Quebrar espelho é procurar infelicidades (Brasil). E superstição vulgarisadissima (10-241, 20-97, etc.) que, nalgumas partes, se estende a qualquer vidro (29-1265). Nos Açores, tanto em Sao Miguel como na Terceira, existe igualmente.

(Brasil). Abnr 0 CllaPé0 liC ^ dentr0 de CaSa é Cliamar 0 Santíssimo

de iImteC(8 au'n,"-,lcs (2-34!»' « Bolra é agouro rCe ra qua.to de cama levando, uma ' galinha, ("-- ■snesteeno caso,ato,,,,,, por como obra cm,arda assi- no

neiro.30 ^ ^ ^ "» c-cTÓ-

Casamento.

a grinalda,PrinaldrT^ atrai logo ^ casamentoalfÍnÔte (Brasil)." VeSÍid,, ^ 011 Pôr na Na Terceira os rapazes e raparigas solteiras guardam alfinetes

enfeite ZoZò h) Quem se levantar primeiro da cama no dia seguinte ao casa- mento e que morre piimeiro (Brasil). No continente o que primeiro se deita (10-221) e nos Açore* como la também, o que primeiro se deitar ou apagar a luz (24 30 31)'

n» pat,a mTasil) ' ^ ^ ^ CaSi"nen,0 Se di2 1,1,2 ^ n0Í™ ^ É sinal de felicidade em Portugal (10-224, 7-167, 20-90) e nos grimas.' ^ ^ ^ 'n0 de 0Utr0S mau' Por K' d) Dádiva de lenço ou anel é malquerença futura, para evifa-h e preciso retribuir a dávida com uma moeda de dez reis (Brasil) ' U lenço e o anel são, em geral, prendas de namorados (13-57 59), mas ha quem julgue a oferta do lenço mau agouro por servir p ra enchugar lágrimas e. por isso, aconselhe a trocador uma moeda pequeno valor, simulando compra (10-217). Nos Açores, como aliás DA ÍLHA TERCEIRA 131 também no continente (Revista Luzttana, XXV-70, 29-1348, 32), as raparigas bordam lenços para oferecerem aos noivos. e) Quatro pessoas, que se cumprimentam, cruzando as mãos, cortam casamento (Brasil). É superstição açoriana e continental, mas entre nós agoura morte (1-54, 2-330), o que melhor se coaduna com as ideias que o povo liga à cruz (29-593). f) Dois casamentos no mesmo dia numa casa trazem infelicida- de a um dos casais (Brasil). Nos Açores não é preciso serem da mesma casa, basta serem na mesma igreja. O que primeiro dela sair leva consigo a fortuna e tira-a ao outro.

Comida.

a) Deitar dinheiro em cima da mesa, na ocasião de estar posta para a refeição, chama pobreza e atrazo (Brasil). Também em Santo Tirso (17-50) e na Terceira onde, para con- jurar o agouro, havendo necessidade de pôr o dinheiro, se levanta a ponta da toalha para o colocar sobre a madeira. b) Quebrar sem querer um copo numa festa ou entornar a água ou o vinho sobre a mêsa do banquete, é bom agouro (Brasil). Entornar vinho ê sempre alegria (13-133, 20-98), mas em Santo Tirso água é mau agouro. Na Terceira entornar vinho em qualquer ocasião é bom agouro ; sal ou azeite mau.

Corpo humano

a) Quando se costura um rasgão do vestido que se traz no cor- po, deve dizer-se ; «Eu te cozo vivo e não morto». É superstição corrente (10-252). Na Terceira explicam que se coze conjuntamente a pessoa, e seresta for mulher grávida não poderá parir sem descozerem a roupa. b) Usa-se cortar um pouco de cabêlo e pô-lo no olho da bana- neira para crescer depressa (Brasil). O mesmo se pratica em Portugal, tanto continental como insular, sendo, porem, a planta escolhida ora a silva (Revista Luzitana, XXV- « BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

-33, XXV11I-254) ora a cana (Turquel, 21-73; illia Terceira). O costu- me integra-se nas tradições populares do São João. ^ c) Quando a orelha direita de uma pessoa está quente é que estão falando bem dela, se, porem, é a esquerda estão falando mal. No ultimo caso morde-se o falho da camisa, porque então o maldi- _ zento morde a língua e se cala (Brasil), A mesma crença na Figueira da Foz (1-47) e na Beira (7-166), Turquel (21-69), Barroso (20-97), Santo Tirso (17-49), mas nalguns lugares deve-se dar um nó no lenço (10-258) ou uma dentada na man- ga da camisa (24-35). Na Terceira ha a mesma superstição com chiar um ouvido. d) Sentir coceira na palma da mão é prenuncio de receber di- nheiro ou alguma dádiva (Brasil). Segundo o povo terceirense comichão no anus ou na ponta do nariz prognostica calote. e) Quem sua muito das mãos ficará curado se as esfregar nas paredes da igreja (Brasil). O remédio em Vila-Franca do Campo consiste em entrar e dizer: 'A primeira vez que nesta igreja entrei, o suor das minhas mãos aqui deixei». As palavras operam a cura sem necessidade de passar as maos na parêdc. O essencial é ser igreja em que nunca se tenha entrado.

Coima perdida.

ci) Para encontrar cousas perdidas promete-se gritar três vezes por São Dino. Achada a cousa diz-se: — São Dino é o santo mais milagroso da Corte-Celeste. Outros prometem dez reis a Santo Antonio (Brasil). Na crença popular portuguesa Santo Antonio é especialmente in- vocado para achar o perdido (32) e a forma de promessa é frequente noutros casos. São Dino é desconhecido na Terceira.

Criança.

a) Quando uma criança nasce com um sinal vermelho no corpo foi que a mãe pôs dentro da camisa alguma flor ou guabiraba (fruta). DA ILHA TERCEIRA 133

Se manchas brancas foi semente de laranja, se manchas prêtas foi pele de fumo (Brasil). Também em Portugal se relacionam os sinais no corpo da crian- ça com certos actos da mãe no período de gravidez. Na Beira atri- buem-nos a ter trazido colares (7-165), noutras localidades objectos ao pescoço (13-254). No Barroso (20-89), como na Terceira, basta cheirar flores para que as malhas vermelhas apareçam. b) Se uma mulher grávida põe ao seio uma chave, o menino traz o beiço tachado (beiço leporino), se uma medalha traz no corpo algum sinal (Brasil). O mesmo, quanto ao beiço, em Guimarães (2-263), Santo Tirso (17-30) e Terceira. A chave, segundo o parecer de outros, provoca também sinais no corpo da criança (10-201). c) Passar o pente sobre os seios faz secar o leite (Brasil). No Barroso mete-se um pente entre os seios (20-91) e na Terceira, para as ciadas, simulam pentear os seios cm quanto recitam um en- salmo. d) Para que o rccem-nascido seja feliz atira-se o umbigo nas ondas do mar (Brasil). O cuidado com o umbigo existe por toda a parte, principalmente para evitar que seja comido por algum animal, em particular o rato. (Revista Lusitana, X1X-233 e 85; 16-93,5-109). Ha todavia quem julgue que deve ser comido por um galo para a criança vir a cantar bem (Revista Lusitana, XIX-38). Em Vila-Franca do Campo queimam- -no (24-11), e na Terceira receiam que seja comido pelos gatos e atiram com ele para o telhado da casa, ou enterram-no na cozinha em lugar em que ninguém possa pôr os pés. e) A criança ao nascer é banhada em água morna com vinho do Porto, e põem na bacia uma moeda ou outro objecto de ouro para que o recem nascido seja rico e feliz (Brasil). O mesmo costume existe por todo o Portugal (10-69, 2-51, 17-30). Em Vila-Franca o dinheiro é deitado às escondidas pelos avós e fica pertencendo à parteira (24-12), e na Terceira botam mais louro para a criança cheirar bem. f) Menino ainda pagão não deve dormir às escuras (Brasil). O mesmo nos Açores e no continente (5-112, 7-159, 2-54, 17-30, etc.) Note-se a denominação pagão dada no Brasil como na Terceira 134 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

à criança antes de batizada. A designação mais frequente é mouro. g) Criança no leito a sorrir é que está a conversar em sonhos com outras crianças que morreram pagãos (Brasil). A superstição portuguesa diz que fala com os anjinhos (7-158, 16-96 etc.) h) Não se põe menino de peito deante do espelho sob pena de se lhe retardar a fala (Brasil). Existe esta superstição em Portugal (10-204), designadamente na Beira (7-158) e no Barroso (20-91), como na Terceira e em São Miguel (24-15). i) Menino que à noite brinca com fôgo, urina na rêde (Brasil). Comum em Portugal (10-35, 20-95) e na Terceira. J) Individuo que chorou no ventre materno ou nasceu implica- do, é por certo afortunado. E' também sinal de profeta (Brasil). Chorar ou falar no ventre materno torna o individuo adivinho, segundo a crença popular (Terceira e continente, Revista Luzitana, XXV-39, 17-45, etc.) O resto como no Brasil. Ic) Quem dá e torna a tirar/Vira a corcunda para o mar (Brasil). As crianças terceirenses dizem: «Quem dá e torna a tirar/Ao in- ferno vai parar», ou «Nasce-lhe uma giga nas costas», fórmula esta mais próxima da brasileira. /) Andar de costas agoura os pais ^Brasil). Em Portugal ensina o caminho ao diabo (Guimarães 2-284), Fi- gueira da Foz (1-66), Santo Tirso (17-50), Barroso (20-97). m) As unhas de uma criança devem ser aparadas pela primeira vez por pessoa que tenha boa voz, para que possua dote igual (Brasil). Em Guimaiães, (2-44), Barroso (20-91), Povoa de Varzim (16-95) e noutras partes, como na Terceira, devem ser roídas, porque corta-las Com tesoura retarda a fala. Na Beira é a madrinha quem as deve cor- tar (7-157). n) Quando se extrai um dente podre a uma criança, esta atira o dente ao telhado da casa, proferindo as palavras ; Mouro, Mourão, Toma teu dente podre, Dá cá o meu são. (Brasil) Na Terceira faz-se o mesmo, mas o dente atira-se de costas para o telhado e diz-se : DA ILHA TERCLIRA 135

Mouro, Mourão, Toma lá um dente podre E dá-me um são. Cousa semelhante se pratica por todo o país (10-205) invocando- •se nalgumas partes São João, na Beira Palheirinho Palheirão, ou Cinza Cinzão (7-160), deitando-se o dente para cima do forno em Santo Tirso (17-244). No Barroso (20-87) diz-se «Dente fóra, dente fo- ra ... na cova». Ainda cousa idêntica em São Miguel (24-16). o) Passar uma criança entre as pernas de alguém faz com que não cresça (Brasil). p) Passar por cima de nutrem traz-lhe enguiço CBrasil). q) Passar a perna sobre a cabeça de alguém paraliza o cresci- mento (Brasil). As três superstições estão intimamente relacionadas e existem nos Açores (24-16) e no continente (10-259) onde é enguiço. Quando na Terceira uma criança salta por cima de outra que está deitada no chão diz: — «Eu te enguiço, pela porta do carriço, que não cresças mais do que isso». Para desenguiçar salta de novo em sentido contrário. /•) Não se deve chamar bonita uma criança sem acrescentar Benza-a Deus (Brasil). Benza-te Deus é fraze que se destina a prevenir o quebranto, que pode resultar de inveja ou mau olhado. Na Terceira dizem também Deus te guarde e Gil Vicente emprega a forma Benza-te Deus na llubena

Dias neíaslos-

a) Ninguém empreenda negekio qualquer no 1.' de Agosto (Brasil). Também em Portugal é dia nefasto (29-1304) e na Terceira dizem : «Casamento em Agosto traz desgosto». h) Não se deve empreender viagem no dia de São Bartolomeu (24 de Agosto), porque nesse dia o demónio anda solto. Que o demónio, que na iconografia católica São Bartolomeu tem amarrado aos pés, se solta nesse dia durante algum tempo, é crença 136 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

generalisada no país que existe em São Miguel e na Terceira, 0-67 21-68*. c) Pagamento de conta em segunda-feira obriga a pagamentos durante toda a semana (Brasil.) Na Ferceira existe crença idêntica que se estende a outros factos alem das contas — contratempos, arrelias, ele.

Fôgo.

a) Cuspir no fogo faz secar a saliva (Brasil). O fogo é sagrado ; saiu da boca de um anjo (7-164, 10-36), por isso não se deve suja-lo (1-77, 17-50, 13-131). No Barroso dizem ser judeu quem cospe no lume (20 95), e na Terceira diz-se que cuspir no fôgo intesica. bi No fogão da cozinha, quando a lenha crepita, é sinal certo de alguém estar falando mal dos donos da casa (Brasil). É superstição generalisada em Portuga! (10-35, 2-93, 13-132, 20-69, etc.) Na Terceira significa o mesmo, e em São Miguel estalar a luz anuncia presente.

Morle

a) Baú ou gaveta aberta chama a morte para casa (Brasil). Na Terceira abrir qualquer caixa, quando se sai, abre a sepultura (12 310*, e o mesmo em São Miguel (24-45). b) Dormir com os pés para a porta é agouro de morte (Brasil). Como na Beira (9-219*, na Figueira da Foz (2-53) e por todo o continente (10-25); na Terceira acredita-se o mesmo e em São Miguel que faz morrer mais cêdo (24-32). c) Passar enterro à porta é mau agouro (Brasil). Quem estiver doente deve sentar-se na cama (8-169, 10-243, 17-49 e Terceira) por isso, em São Miguel, não é bom estar dormin- do. Ainda na Terceira agoura mal um cortejo de casamento encon- trar-se no caminho com enterro, ou passar por casa onde haja defunto. d) Havendo treze pessoas à mêsa, ou morre a mais velha ou a mais nova (Brasil). É superstição corrente por toda a parte. O numero treze é agou- DA ILHA TERCEIRA 137 rento (29-1343). No país encontra-se generalisada (10-228, 1-53, 7- -166, 3-107, 17-49) e nos Açores. Em São Miguel morrerá um qual- quer dos treze (23). e) Cair retrato ou espelho da parêde é morte do dono ou dona da casa (Brasil). E como a antecedente generalisada e liga-se à superstição já referida de partir espelho. Em Vila Franca se o retrato é de pessoa viva, cair significa morte ou doença dela; se é de pessoa falecida es- tar penando (24-34). f) Dizerem duas pessoas a mesma palavra ao mesmo tempo é sinal que não morrem naquele ano (Brasil). O mesmo em Portugal (Guimarães 2-348), Figueira da Foz (1-53) e na Terceira. Abrirem a boca ao mesmo tempo prenuncia que serão compadres (10-253), e nalgumas localidades as duas pessoas, depois de proferirem a mesma palavra, devem apertar as mãos (Revista Lusi- tana, XXVIII-256). g) A agulha com que se coze mortalha deve ir com o defunto para a cova (Brasil). São muitas as superstições com as agulhas. Na Terceira a que serviu para cozer mortalha guarda-se afim de ser pregada, sem ele sa- ber, na parte interna da gola do casaco que um rapaz levar à inspecção para o serviço militar, e ficar livre dele. h) Pessoa que morre em dia de chuva vai para o céo; se é em dia de grande ventania, para o inferno (Brasil). Na Vila Franca chover durante o enterro é bom, porque a chuva lava os pecados (24-46). i) Comer ou beber qualquer cousa com uma vela acêsa na mão chama a morte (Brasil). Em Portugal endoidece (9-222, 10-41, 20-95, 21-73, etc.) e o mes- mo nos Açores. j) Doente que muda de cabeceira na cama está para morrer (Brasil). Também entre nós (Revista Luzitana, XXV 33). Praga. a) O esconjuro ou praga rogada ao meio dia tem mais efeito do que em outra qualquer hora (Brasil). 138 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Nos Açôres, como no continente (7-171, 10-213, 21-69), é entre a elevação na missa da hóstia e do calixe, momento solene em que as súplicas são atendidas, propício a encantamentos diversos (26-153). A hora do meio dia é especialmente considerada pelo povo brasileiro, pois, segundo outra superstição cearense (6), nela se não deve sair de casa.

Sonho.

o) O sonho mau não se conta estando em jejum, sob pena de se realisar (Brasil). Na Terceira, como em São Miguel (25-61) o sonho mau deve dizer-se antes do sol nascer; e o bom deve guardar-se até ao dia se- guinte. />) Sonhar com dentes é morte, se com os da frente é morte de parente próximo (Brasil). Na Terceira e em São Miguel (25-60) sonhar que caem dentes, sejam quais forem, é morte de parente, e em Santo Tirso doença (17-50).

7 em/j o.

a) Cobrir os espelhos com vestidos de sêda evita a queda de raios (Brasil). Na Terceira cobrem-se com qualquer pano ou voltam-se com as costas para fora. b) Palma benta do Domingo de Ramos queimada acaba a tro- voada (Brasil). Em Guimarães basta tê-la em casa (2-174) e na Terceira, como na Povoa de Varzim (16-162), põem-na à cabeceira da cama. Também a metem no leito do barco. c) Chuva com sol é que a raposa está casando (Brasil). Nos Açôres é casamento de feiticeira (15-15) e na Terceira dizem : «Tempo a alforrar, feiticeira a se casar». Alforrar, diz-se chover e fa- zer sol, por favorecer a alforra dos trigos. DA ILHA TERCEIRA 139

NOTA BIBLIOGRÁFICA

1 M. Card oso Marília e Augusto Pinto. «Folclore da Figueira da Foz», vol. 2°. Esposende, 1913. 2 Alberto V. Braga. «De Guimarães». Esposende, 1924. 3 Ni. Cardoso Martha. «Folclore de Cadaval». Esposende, 1934. 4 P.e Firmino A. Martins. «Folclore do Concelho de Vinhais», vol. 1.°. Coimbra, 1928. 5 A. Lima Carneiro. «Algumas superstições comuns a Portugal e ao Brasil», na Brasilía, vol. 3.°, pág. 109 a 120. 6 Luís da Camara Cascudo. «Antologia do Folclore Brasileiro», São Paulo, s/d. 7 Jaime Lopes Dias. «Etnografia da Beira», vol. 1.', Lisboa, 1926. 8 Idem, vol. 3.°, Lisboa, 1929. 9 Idem, vol. 5.°, Lisboa, 1939. 10 J. Leite de Vasconcelos. «Tradições populares de Portugal». Porto, 1882. 11 A, Lima Carneiro. «A alimentação da criança na primeira infân- cia», no Congresso do Mundo Português, vol. 18.°, pág. 126. 12 P.e Inocêncio Enes. «Tradições populares da freguesia dos Alta- 0 res, da Ilha Terceira», no Boletim do Instituto Histórico, vol. 3. j pág. 289. 13, Luís Chaves. «O amor português». Lisboa, 1922, 14 P.e Ernesto Ferreira. «Ao espelho da tradição». Ponta Delgada, 1943. 15. Francisco Carreiro da Custa. «O tempo na linguagem popular micaelense», na Açoreana, vol. 3.° 16 A. Santos Graça, «O Poveiro». Povoa de Varzim, 1932. 140 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

17. A, C. Pires de Lima. «Tradições populares de Santo Tirso», na lievista Luzitana, vol. 18.°, pág. 17 e 282, 18. Cláudio Basto. «Falas e tradições do distrito de Viena do Caste- lo», na Revista Luzitana, vol. 17.°, pág. 55. 19. Gaudio Basto. «Silva Etnográfica», na Revista Luzitana, vol. 25. , pág. 148. 20. Fernando Braga^ Barreiros. «Tradições populares do Barroso» na Revista Lusitana, voi. 19.", pág. 77. 21 • Jose Diogo Ribeiro. «Turquel folclórico», na Revista Luzitana vol. 20.", pág. 54. 22. João de Vasconcelos. «Tradições populares», na Revista Luzi- tana, vol. 25.", pág. 29. 23. Francisco Maria Supico. «Almanach do Archipelago dos Açores» para 1868. Ponta-Delgada, 1867, pág. 106 24. Urbano de Mendonça Dias. «A Vila», vol. 4.". Vila Franca do Campo, s/d. 25. P.e Ernesto Ferreira. «A alma do povo micaelense». Ponta-Del- gada, 1927, 26. Paul Sebillot. «Le paganisme contemporain». Paris, 1908. 27. Joaquim Pires de Lima e Fernando Pires de Lima. «Tradições populares de Entre Douro e Minho». Barcelos, 1938, 28. J. Leite de Vasconcelos. «Opúsculos», vol. 5." Lisboa, 1938. 29. J. Leite de Vasconcelos. «Opúsculos», vol. 7." Lisboa,' 1938. 30. J. Leite de Vasconcelos. «Etnografia portuguesa», vol. 1 0 Lis- boa, 1933. 31. A. Tomaz Pires. «Amulêtos». 32. Armando de Matos. «Santo Antonio de Lisboa nas tradições po- pulares». Porto, 1938. Ensalmos e orações da Ilha Oraciosa

Colhidas por Manuel Machado de Avila

Para benzer a «Zírpela» bebido em azeite dôce e água fria, espargindo em cruzes ao mesmo Jesus ia pelo caminho e encon- tempo que recita a oração supra trou S. Paulo e preguntou; Depois, para evitar que a doença, — Donde vens, Paulo ? se repita naquela pessoa, corta-se — Venho de Roma, Senhor. um limão ao meio, passa-se no — Que se conta por lá ? local doente, escreve-se num pa- — Muita doença de Zirpela e pel o nome dêste e prende-se ao Zirpelão. limão. Em seguida uma donzela — Torna atraz, Paulo. Vai-te que se chame Maria (solteira e curar essa gente. virgem) toma-o e vai deitá-lo ao — Com quê. Senhor ? mar de costas para traz e diz : — Com azeite doce. «Vai-te e não voltes mais». Água da fonte, [Colhida nos Fenais) E alecrim verde do monte. * Rezarás uma Ave Maria Outra Em louvor da Virgem Maria. — Donde vens, Paulo ? «Sume-te» daqui! — Venho de Roma. N. B. — Qualquer pessoa que — O que há por lá ? tenha uso da razão pode benzer — Muita doença de Zírpela e a «Zirpela^. A cerimonia é feita Zirpelona. com um galhinho de alecrim em- —Vira atraz, Paulo, e vai curá-la. 142 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

— Com quê, Senhor ? Para que possas comer bem, Deus ■ - Com azeite doce te tire todo o mal que o teu cor- E áqua da fonte po tem. E alecrim do monte N. B. = Enquanto se diz esta Para que daqui não monte. oração, faz-se constantemente cru- N. B.Benze-se também com zes com a mão sobre a pessoa um galhinho de alecrim molhado aquebrantada ou, na falta desta, em azeite dôce e água, mas em sôbre uma camisa pertencente à vez das cerimonias com o limão, mesma. Qualquer pessoa pode corta-se o raminho de alecrim em benzer o quebranto, inclusivamen- tiês pedacinhos, cospe-se neles e te a mãe quando se trate de cri- afiram-se para traz das costas. anças. Ao cabo de três dias, juntam-se (Colhida no Carnpacho) e deitam-se no lume % Ao alecrim do monte chamam Outra também «Alecrim dos defuntos». Se tens quebranto No final da reza tome-se «monte» Eu to alevanto por equivalente a «aumente». Com a graça de Deus {Colhida na Fonte do Moto) E do Espírito Santo. * (Colhida na Fonte do Mato) Contra o quebranto * A gente que to deu, Deus que Outra to tire (benzendo) Pai, Filho c Fulano (nome inteiro) Espírito Santo, são três pessoas Nome que te puzeram na pia, da Santíssima Trindade. Santa Em nome de Deus e da Virgem Ana pariu Maria, Maria pariu Je- Maria, sus, Jesus baptisou Cristo e Cristo Eu te benzo e te persino baptisou João lá no rio Jordão. Com o sangue do justo Divino. Jesus preguntuu a João : Meu Senhor Jesus Cristo! Se é — Qual de nós está mais bem quebranto, olho mau, ramo de in- baptisado ? veja ou outra qualquer doença — Sou eu. Senhor, pela vossa que de ti se queiía tirar, naquele sagrada mão. mar se irá botar e do poder do Se tens quebranto ou ramo de vivo ou do morto eu não te pari inveja ou ar ruim, fica são e salvo nem te criei, êste mal te tirarei em como Deus te ^deu no mundo. nome do Padre, do Filho e do DA ILHA TERCEIRA 143

Espírito Santo. Arca fechada, pie- o pão da humanidade, quero dosa Senhora! Este corpo não que me digas a verdade». tinha perigo lá no vale do Jordão. Cristo baptisou João e João Depois reza-se o Credo três baptisou Cristo. — Qual de nós vêzes, fazendo cruzes sôbre a pe- está mais bem baptisado ? — Eu, neira com a mão direita aberta e Senhor, pelas vossas santas mãos. com o dedo polegar virado para Primeiro Deus nasceu do que cima e diz-se à peneira, por exem- este mal foi dado e pela graça plo : de Deus é de ti tirado. «Se Manuel pensa em casar com Um Padre Nosso, urna Ave a Maria, vira-te para mim ; se Maria e um Glória Patri. não pensar em casar vira-me {Colhida no Rebentão — S." Cruz) as costas». * Pouco depois as argolas da te- Contra o quebranto soura movem-se e assim a penei- nos porcos ra traça a sorte que está reserva- Se tens quebranto eu to ale- da. vanto. Dois olhos maus to deram Esta reza serve para adivinhar e com três to tiro, com três pes- tudo. soas da Santíssima Trindade: Pa- « dre, Filho e Espírito Santo. Para benzer o Côbro N. B. = Benze-se duas vezes Eu ia por um caminho, encon- por dia cm 3 dias seguidos. trei José e Maria e preguntei : (Colhida na Fonte do Mato) — Isto que seria ? Será fogo * ou será côbro ? Com que se «a- Deitar a peneira parcará» ? (aplacará ?). Quando se quere adivinhar uma — Com a bondade do Padre coisa, cspcta-se uma tesoura meia Eterno e do Filho da Virgem Ma- aberta no arco duma peneira, e ria. duas pessoas, cada uma de seu N. B. = Benze-se o côbro lado, seguram, com o dedo indi- com uma faca qualquer, fazendo cador colocado por debaixo da cruzes. Depois pregunta-se ao pa- «argola» da tesoura, a peneira ciente : — «Queres que o cor- que se conserva na posição verti- te ?» ao que êste deve responder: cal, e diz-se; «Tomara eu já /* Em seguida «Peneira que peneirarás todo enrta-se uma palha, dizendo si- 144 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO multaneamente estas palavras : — Para a Noite do Natal «Corto-fe a cabeça e o rabo Santa Maria do Natal para que não cresças nem en- Venho pedir e rogar verdeças co/7io a ama de Je- Que guiais o vosso filho sus Cristo não enverdeceu». Que me assente no seu livro {Colhida em Fenais) No seu livro de rezar, * Que a minha alma se não perca Oração contra as trovoadas Nem vá para mau lugar. Senhor S Jerónimo, {Colhida nos Fenais \ Santa Barbara Virgem, * Virgem gloriosa, Oração ao deitar Linda como uma rosa, Oh que noite tão escura, Quando Deus nasceu Ao rigor de todo o tempo. O mundo esclareceu. Onde foi expirar uma alma Saiva a mim, salva a ti, Sem levar o Sacramento ; Não salves moiro judeu O espírito caminhou Que matou o bom Jesus Foi ver a face divina : Lá ao pé da Cruz. — «Aqui estou a vossos pés, Se- * nhora, Outra Como uma ovelha desgarrada. Cristo Rei veio em paz e Deus Esperando que me ajunteis se fez homem ; o verbo foi feito Ao vosso santo rebanho». de carne ; Cristo nasceu da Vir- — «Eu ensinei-te a benzer, gem ; Cristo andava em paz no Tu não quizeste fazer; meio dos homens; Cristo foi cru- Eu ensinei-te a rezar, cificado ; Cristo foi morto ; Cristo Tu não quizeste uzar; foi sepultado ; Cristo ressuscitou; Eu ensinei-te a ir à missa, Cristo subiu ao ceu ; Cristo man- Não ias com devoção -. • da ; Cristo reina ; Cristo de todos Entre o cálix e a hóstia os raios nos defenda; Cristo ha- Sempre a dormir te achei ; bita conosco. Encheste-te de soberba, (Faça-se uma pausa e reze- A soberba não vai ao Ceu ; se um Padre Nosso, uma Ave Agora vai-te seguindo Maria e um Gloria Patri). O caminho do Inferno». {Colhida em Fenais) Nossa Senhora sc alevaniou Seu bento Filho chamou : DA ILHA TERCEIRA 145

— «Ó mê Fillio, ó mú Filho! Veio o Anjo da Guarda Pelo leite que mamaste Que é a minha guia, Dêstes meus sagrados peitos Que eu fôsse devota Na noite do alimenlo, Da Virgem Maria. Vai-te acudir àquela alma Que ali se vai perdendo ; Ó Virgem Maria, Alevanta-te, S. Miguel Vós não permitais Arcanjo, vai-te pesar Que eu viva nem morra Aquela alma infiel». Em pecados mortais. Os pecados eram tantos Que a balança foi ao chão ; Em pecado mortal Nossa Senhora se alevanlou Não hei de morrer. Sua benção lhe deitou ; Que a Virgem Maria Por milagre da Senhora Me ha de valer. A balança levantou. Quem rezar o rosário à Virgem Me ha de valer Reze-o com devoção, Na maior aflição, Que a Virgem é piedosa Chamando eu por ela P'ra de nós ter compaixão. De bom coração. {Colhida na Luz) v De bom coração Outra Hei de eu chamar A Virgem Maria Que a Virgem Maria Mandou-me recado Me ha de acompanhar. Que eu fosse cantando Bendito e louvado, Me ha de acompanhar De noite e de dia Bendito e louvado Louvemos a Deus Que estais na custódia, E à Virgem Maria. Estrela dos anjos, Amen. Rainha da gloria. [Colhida nos Penais) * Deitei-me na cama Outra Puz a considerar: Na cama dos vivos me vou deitar, Que farei à minha alma Jesus Cristo quero chamar, Para me salvar ? Que a minlValma está doente 146 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Porque pequei mortalmente. Não terei mêdo nem pavor Os pecados que fiz De coisa que má fôr. Ao confessor não disse, Senhor, dormir quero, Mas direi agora MinlTalma vos entrego ; A ti, Senhora. Se eu dormir velai-me ; Sabeis quantos eles são. Se eu morrer acompanhai-me, Quero pôr os meus oihos no ceu E assisti-me com as três pessoas E o coração na gloria da Santíssima Trindade : Padre, Para adorar a Jesus Cristo Filho e Espírito Santo. Amen. Que está na Custódia. (Colhida nos Fenais) Quero dizer três vezes * Porque não sei se morrerei: Outras — Jesus, Jesus, Jesus salvai-me. Deus em diente, (Colhida na Luz) Paz em guia. * Em nome de Deus Outra E da Virgem Maria Senhor Deus, deitar-me quero, Se deita em minha companhia. Minha alma e meu corpo vos en- Deus nos salve, trego. Filho de Deus Padre, Se eu dormir, velai-me ; Mãe de Deus Filho, Se eu morrer alumiai-me Esposa do Espírito Santo, Com as três candeias da Santís- Templo e arca sima Trindade, que são: Deus Da Santíssima Trindade. Pai, Deus Filho e Deus Espirito (Colhida na Fonte do Mato) Santo que no fim de contas é um * só Deus verdadeiro. Amen. Nossa Senhora da guia (Colhida na Luz) Chama-me : meu afilhado. * Ó minha rica madrinha Outra Trazei-me bem guiado. Com Deus me deito, (Colhida na Praia) Com Deus me levanto, * Com a graça de Deus Eu sou de Jesus E do Espírito Santo. E Jesus é meu. Nossa Senhora me cubra com o A minha alma e corpo seu manto. A Jesus dou eu. Se com ele coberto fôr, (Colhida na Fonte do Mato) DA ILHA TERCEIRA 147

Outra Bendito seja o anjo da minha Minha porta vou fechar guarda ; Com destino de me deitar. Bendito seja o Santo (ou Santa) do A Virgem Nossa Senhora meu nome ; Me venha acompanhar. Bendito seja S. Silvestre (Idem) E a camisa que êle veste ; * Bendito stja S. Simão Outra Que tem a vara de Adão ; Jesus vivo, Que amarre os inimigos Jesus morto, Que contra mim são. Jesus crucificado, (Colhida nos Fcnais) Sangue de Cristo, * Leite da Virgem Outra For aqui derramado. Eu me entrego a Jesus f Idem) E à sua santíssima cruz, Esta oração deve ser dita 3 Ao Santíssimo Sacramento vezes ao dia. E às três arreliquias que estão dentro ; Outra Ás três missas do Natal Senhor que vieste do Ceu PVa que não suceda nenhum mal; Benzer o vosso altar. A' Virgem Nossa Senhora Benzei a minha caminha Que seja sempre comigo Aonde eu me vou deitar. E me livre do perigo ; (Colhida na Fonte do Mato) E ao anjo da minha guarda Que me livre e guarde Outra Das astúcias de Satanaz. Amen. São Francisco benzeu o seu altar [Colhida nos Fenais) E eu também benzo a minha cama ijc Aonde me vou deitar. Outra Em nome do P., do F. e do E. S.to Anjo da guarda potente, (Colhida nos Fetiais) Levantai-vos comigo, * Andai cliente, Orações ao levantar Físpantai os inimigos Bendita seja a luz do dia ; Não ha alguém que me atente. Bendita seja quem a cria ; Corpo de Deus ardente, Bendita seja a Santa dêste dia ; Se quereis ser meu amôr 148 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Dareis conta da minh'alma a Deus Acompanhando a Virgem Maria Diante de Nosso Senhor. Quando seu parto seria ? (Colhida nos Fenais) Em pinos da meia noite * Nasceu rosa florida Oração a S. Marcos Bradando pelos pastores: São Marcos intermediário en- — Pastores, tenhais bons dias, tre mim e o inimigo ; Anjo da Filhos da Virgem Maria. minha guarda me livre a mim Quem souber esta oração, e meu marido, meu José, meu Quem a souber que a diga, Manuel (etc.) assim co- Quem a ouvir que a aprenda ; mo me livrastes e guardastes dos Lá no dia de Juizo perigos do dia, livrai-nos e guar- Verá o que eia defende- Amen. dai-nos dos perigos da noite, to- [Colhida nos Fenais) dos os maus pensamentos, to- * das as más imaginações e tenta- Oração para a Confissão ções do demónio. Nosso Senhor Aqui ajoelho, Senhor, nos tome à sua conta para bem Aos vossos dôces e amados pés ; das nossas alminhas quando elas Não repareis o meu tardar dêste mundo forem. Que eu venho para me confessar; {Colhida nos Fenais) Venho carregado de pecados » Que são; Oração Vícios, ódios, regálos, sober- a a N. S.a da Conceição bas, vaidades, loucuras, presun- Ó Virgem da Conceição ções, murmurações, falta de missa, Consolai meu coração confissões mal feitas, penitências Que está muito desconsolado mal cumpridas, de pecados mor- De pecados carregado; tais, de tudo emfim me acuso de- Ó Virgem, se eu vos tivesse ante da vossa soberana magesta- Sempre por minha advogada, de vos peço perdão de todos os Não teria mêdo nem terror de nada. meus pecados esquecidos e alem- Ó Anjo do Céu, ó Estrela do Mar, brados. Benditos são os anjos Pelo pêso da vossa cruz Que vos vem acompanhar. Dizei-me, ó amado Jesus, Lá nas casas de Belem Qual foi a emenda que nela puz. Aonde estão Santos e Santas Bem sei que tenho merecido o Com seus votos e orações. Inferno, DA ILHA TERCEIRA 149

Em não :imar os vossos dôces Fostes o caminho plano mandamentos. Que lá no ceu deu entrada. Refujo-me como posso no co- ração de Jesus. Quem me dera aos vossos pés, Jesus é o meu amôr, Senhor, Sôbre êle irá a minh'alma Como no monte Rendino, Quando dêste mundo fôr. Só para não gosar desgostos Como no louco inquilino. Meu Deus e meu Senhor, Morto fostes e vivo estais, O gôsto que ha em Deus Perdoastes a vossa morte Com sua cruz nos convida, Que foi tão cruel e tão forte. Quem a leva mais pesada E tão forte perdoais Nela tem melhor partida. Meus pecados esquecidos E todos os alembrados Pecador, olha que tens Aos pés do meu confessor. Muita queixa contra ti. Se êles não estão confessados Deus te deu uma alma, Me confesso a vós. Senhor, Se a perderes, ai de ti! Que sois o Rei da Verdade ; Na hora da minha morte, Não tomas a ver a Deus Tende de mim piedade. Nem acabas de penar; A morte te ha de procurar Meu Senhor Jesus Cristo, E olha que não o has de achar. Cristo do meu coração, Perdoai os meus pecados A musica dum anjo enche Que bem sabeis quantos são. Um mundo de alegria, Aqui tendes o penitente, Que fará os anjos todos Dai-lhe agora a absolvição, Com Jesus em companhia. Dai-lhe neste mundo graça E no nutro a salvação. Ó alma, desprésa o mundo, Este mundo de malícia, (Colhida nos Penais) Procura gosar a glória * Que é uma bonita delícia. Outra (Colhida nos Penais) Deus te salve, cruz sagrada, Porta do romeiro mano, * 150 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Outra Meu filho tão bem criado Á porta das almas santas Que nunca agravou ninguém. Bate Jesus toda a hora, As almas santas vieram ; Esse homem que aqui passou — Que quereis, Senhor, agora ? Com a cruz às suas costas Que, de pesada, fazia Quero que vades comigo Chorar pedras e vós, mulheres, Até à porta da glória. Bem sabeis que dores são. — Muito me pesa, Senhor, As das Mães e as da Maria Muito me ha de pesar Eram cruéis com razão. Por não estar preparada P'ra convosco caminhar. Seu filho vai osculando ; Cada passada que dava O loiro tão bonitinho, Seu sangue ia derramando Sacrario tão estimado, E a cada açoite ajoelhava Meu Senhor que estais lá dentro E aos algozes perdoava. Nove vezes encerrado. Lá vem Santa Madalena Com seu lenço alimpar. Meu Senhor que estais lá dentro. Ta mirem lá vai S. João Quem vos podesse adorar. Com tamanha devoção. Adorar o bom Jesus Para um dia me salvar. Quem esta oração souber E disser Se eu merecer o Inferno Todos os dias da Quaresma, Rogo que dareis perdão Portas do ceu achará Pelas vossas cinco chagas E as do Inferno não verá E dolorosa Paixão. Nem por elas passará. Com pecados perdoados Salvai-me, meu bom Jesus, salvai- Eternamente nos ceus -me. Viverá junto aos chamados (Colhida nos Fe na is) E sob a vista de Deus. Amen. Oração para todos os dias da Quaresma (Colhida nos Fenaís) — Viste meu filho lá dentro, Lá dentro em Jerusalém ? * DA ILHA TERCEIRA 151

Oração ã Virgem Vem cá meu serafim Entrai no meu coração, Maria puríssima Sustentai minha fraquesa Dos anjos rainha, Com o vosso divino pão. Formosa pombinha, Mãe do casto amor, Meu Senhor, eu não sou digno Estrela fulgida Que vós entreis na minha alma. No mar tormentoso Nem sequer na minha casa Do mundo maldoso. Devido ao espírito malino Destino e pavor Que me tem posto à raza. Da morada etérea {Colhida nos Penais) Por Eva fechada. * Tu és franca entrada Na hora da morte Para os servos teus, Avé Maria Dos grilhões desprende-nos Deus escolheu Que nos tem ligado, P'ra nossa Mãe Limpos do pecado Dela nasceu. Para o ceu nos leve, Sempre e hoje livrai-nos Dela nasceu De tantos escolhos, P'ra nos salvar, Volvei-nos teus olhos Nós pecadores Mãe de piedade. Sempre a pecar. Amen Jesus. Sempre a pecar {Colhida na Praia) * Sem emenda ter, Ninguém se lembra Oração para a Comunhão Que ha de morrer.

Aqui ajoelho, Senhor, Que ha de morrer A vossa mesa real. E contas dar Meu coração se alegra Ao Creador De receber tal manjar. Que ha de julgar.

Tal manjar tão excelente, Que ha de julgar Dado de tão boa mente. Do bem e do mal, Livre-o da culpa Concebido pelo Senhor, Do pecado mortal. Dado a todo o pecador. {Colhida nos Penais 152 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Oração ao entrar na igreja Oração ao tomar agua benta — Donde vens, pecados meus ? Os pecados que me acompa- Agua benta preciosa nharam até aqui, fiquem da banda Que lavaste os pés a Cristo de fora que eu palavras de Deus Lavai também a minh'alma venho ouvir. Já que eu vos digo isto. (Colhida na Fonte do Mato) (Colhida no Rebenlõn) Subsídio para o Cancioneiro Popular Açoreano

Cantigas da Ilha Oraciosa

Coligidas por Manuel Machado de Avila

Rua abaixo, rua acima, Se eu soubesse a certeza Mariquinhas à janela, Que tu me querias bem, Comendo figos passados, Fazia-te uma fineza Empachada morra ela. Que nunca fiz a ninguém.

Tenho fome não de pão, Tive um sonho esta noite, Tenho sede não de vinho, Um sonho bem atrevido : Tenho fome dum abraço, Sonhei que tinha na cama Tenho sede dum beijinho. A forma do teu vestido.

Mandei fazer um navio Tu vais abaixo e acima Com vinte e quatro janelas Como o retroz na balança. Para embarcar saudades Quem mais faz menos merece. Por já não poder com elas. Quem menos merece, alcança.

Andais abaixo e acima Se amor com amor se paga, Sem dizer o que quereis; Porque não pagas, amor ? Se eu fôr dar o sim a nutro, Olha que Deus não perdoa Então não vos aqueixeis. A quem não é pagador. 154 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Minha Mãe p'ra me casar Já vi olhos que por olhos Promcteu-me quanto tinha, Se deitaram a perder: Depois de eu estar casada Estes meus por esses teus Deu-me os trapos da cozinha. Assim ha de vir a ser.

Minha Mãe pVa me casar Tanta cantiga sabia, Prometeu-me três ovelhas : E tudo tenho esquecido, Uma cega, outra torta Só o nome do meu bem E outra sem ter orelhas. Trago sempre no sentido.

Senhor mestre da viola, O amor nasce de dadas, Diga-me se quer ou não Meu amor, que te darei ? Que eu cante uma cantiga O amor que não dispende Ao toque da sua mao. Por certo que não tem lei.

Tu és branca como o leite, Menina, quereis saber E o leite também se bebe ; Como agora se namora ? Mal empregado a menina E fechar o olho esquerdo Ter o juizo hão leve. E pôr a lingua de fora.

Tu és branca como o leite Os olhos dos namorados E o leite também se come ; Têm um certo não sei quê Mal empregado a menina Que serve de subscrito Dormir na cama sem home. Á carta que se não lê.

Lá vem a lua a sair Quatro com cinco são nove, Redonda como um botão ; Com meu coração são dez. Quem tem seu amôr à vista Se eu te menti algum dia Tem alegre o coração. Aqui me tens a teus pés.

Minha Mãe eu quero água, O meu amor é um cravo. Nossa Maria não vem. Flor que o meu craveiro deu. Ou ela quebrou o pote Ninguém se pode gabar Ou demora-se com alguém. De ter cravo como o meu.

Quem fala de mim, quem fala ? Pedíste-me a mão direita Quem fala de mim, quem é ? Mas nem a esquerda te dou, Quem fala de mim não chega A mão direita está dada Ao calcanhar do meu pé. A quem primeiro falou. DA ILHA TERCEIRA 155

Eu sempre simpatisei Meu coração fecha, fecha ; Com tua feição mimosa, Fecha com dois cadeados; Bem pudera Deus fazer Duma banda fecha amores, A nossa sorte ditosa. Doutra, penas e cuidados.

Sinto no coração ganas Não me atires com pedrinhas E a minha alma de gatinhas Que eu estou lavando a loiça, Por ver o galo entre as canas Atira-me com beijinhos A chamar pelas galinhas. De modo que ninguém oiça.

O vaidosa, vós pensais Ninguém se pode fiar Que não ha outra no mundo. Da formosura hoje em dia ; Não é pois caldo tão gordo Tudo hoje se vai comprar Que se não lhe veja o fundo. Numa qualquer drogaria.

Ó figueira dá-me um figo, Eu pedi a morte a Deus Ó silva, dá-me uma amora, Não foi para te matar. Ó menina dá-me um beijo A vida perderei eu. Que amanhã eu vou-me embora. Meu amor, pata te dar.

Vós dizeis, minha menina. Deixa-me bailar também Que só a mim quereis bem. Com êste meu sobretudo. Estais brincando comigo Hoje tudo fica bem Enquanto o outro não vem. Por ser no dia de entrudo.

Vós dizeis sempre, ó lindinha, Eu fui, tu foste, nós fomos, Que só a mim me quereis, Fiquei, ficaste, ficámos, Passais por mim e a outros Eu quiz, quizeste, quizemos, As mesmas festas fazeis. Amei, amaste e amámos.

O vigário deu no cura Quando eu era pequenina E o cura no tesoureiro, Antes de meu pai nascer, E o ladrão do sacristão Inda não engatinhava Partiu a cara ao coveiro. Já morria por você.

As pombinhas quando nascem Tenho dentro do meu peito Põem-se logo aos beijinhos ; Duas rodas a moer : Assim fazem os namorados Uma mne por saudades, Quando se apanham sosinhos. E outra por bem querer. líín BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Manuel, bonito nome. Meu amor quere que eu tenha Nome que Deus escolheu. Juízo, capacidade... Quando Deus te não deixou, Tenha êle que é mais velho, Como te hei de deixar eu ? Que eu sou de menor idade.

Adeus, ilha Graciosa, Ó meu amor, tu não sabes Adeus, ó lindos Penais, Glorias que eu arrecebi Adeus meu querido amor, Quando cheguei à janela Adeus para nunca mais. E derrepente te vi. Senhores não se admirem Senti a porta mecher, De eu cantar sem ser casada. Julguei seres tu, Joana. Eu canto com alegria Credo, meu Deus, que desgraça. De me achar bem empregada. Até o vento me engana. Senhores, não se admirem Tudo nesta vida cansa, Dum macaco fazer renda. Tudo no mundo tem fim. Eu já vi uma perua Só não cansa nem acaba Ser caixeira duma venda. A língua do cão ruim. Tua boca cheira a beijos. Ha quem diga que o pecado Já hoje beijaste alguém ? É natural nestas eras, Ó minha boca de prata, E admiram-se do mundo ser Eu nunca beijei ninguém. Uma gaiola de feras. Vai alto, o ceu vai alto, Deus! Dai-me um amor p'ra aquela, Mais alto vai o luar, Mas se o não tendes que mande, Mais alto vai o futuro Mandai- lhe um, que também serve. Que Deus tem para me dar. Daqueles de orelha grande. Quem me dera já morrer, Eu sou filha de casal Depois da morte ter vida, E também sou batizada ; Para ver quem te gnsava, Vai pescar noutro pesqueiro Prenda amada, tão querida. Que aqui não apanhas nada. O cabelo anelado Pareces, dessa maneira, Nem a todos fica bem, Discreto à laia de tolo ; Ao ladrão do meu amor Vai cantar para a Caldeira, Fica melhor que a ninguém. Não me tires o miolo. (Colhidas nos Fenóis) DA ÍLHA TERCEIRA 157

Se amor com amor se paga, Se eu chegasse a possuir Porque não pagas, amor ? Esses teus olhos de luzes, Olha que Deus não perdoa Muita gente ficaria A quem não é pagador. Na boca fazendo cruzes.

Rema para cá, lanchinha, Não tens grinalda florida Lanchinha dos quatro remos ; Nem fitas franjadas de oiro, Se me queres qualquer coisa, Mas tens somente um tesoiro Lá em terra falaremos. Que te torna apetecida.

Eu a remar não te alcanço, Fui à missa e nada ouvi, Deixa que te apanharei; Levantou a Deus, não orei; Se eu te apanho em meus braços Eu só via os teus olhos, Em que estado te porei ? Ai minh'alma que pequei!

Eu remando p'ra te ver, Esses teus olhos, morena, Tu a fugires de mim ; Tem um tom aveludado, Eu vejo que mais te quero Uma dor que me faz pena Do que tu me queres a mim. De não ser teu namorado.

Olha para mim direito. Queria era ser navio Não olhes atravessado. E tu a rosa dos ventos, Quantas carinhas mais belas Para, guiado por ti. Eu tenho já engeitado ? Findarem os meus tormentos.

Menina do chapéu alto, Atirei com uma laranja Cinturinha de marfim. Á mocinha da janela ; Ponha lá a chaleira ao lume Ela me chamou doidinho, A fazer café p'ra mim. Mas doidinha anda ela.

Esta noite fiz um roubo, Não finjas tanta tristeza Fiz um pecado mortal : A ver se tenho ciúme ; Roubei a filha a meu sôgro Os laços do amor são chamas Pela porta do quintal. E não se brinca com lume.

Esse teu peito, menina, Não ha peixe como o sargo É um pombal de pombinhas; Quando chega à água quente, Deixa-me eu ir com a mão Nem amor como o primeiro Apalpar se tem azinhas. Quando vem de boa gente. 158 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Borboleta que sempre andas, Quando te vi fiquei prèsa, Nem de noite tens socêgn ; Cativa, sem liberdade. Tu chegas à luz e morres, Sujeitei-me ser teu bem Eu morro porque não chego. Por minha livre vontade.

Tu trocaste-me por outro. Não sei que mal fiz ao sol Eu com isso não me importa, Que não dá no meu jardim. Mas gostava de saber Não sei que fiz ao meu bem Quanto ganhaste na troca. Que não olha para mim.

Teu coração me parece Saudades, quem pudesse Aqui andar a meu lado Impedi-las ao nascer. E por ser de pouco preço Onde não ha saudade Nunca anda desalugado. Não pode haver bem-querer.

Tu és a água da fonte. Se vais à fonte por água. Es a espuma do mar, Volta atraz, coração meu; Tu és a rosa do campo. Vai à fonte dos meus olhos, És a hóstia do altar. Agua clara choro eu.

Tenho jurado esquecer-te Quem quizer que a silva pegue Quinhentas vezes seguras, Faça um furo no valado. Mas em te vendo não posso Quem quizer o amor firme Lembrar-me das minhas juras. Traga-o escandalizado.

Dizem que a pulga, coitada, Ó morte, porque não vens Tem sempre a cabeça à morte ; Trazer teus dias fatais? Dorme na cama co'as môças. Vivendo, vivo em penas ; Eu até lhe invejo a sorte ! Morrendo, não peno mais.

Lá no alto daquela serra O peixe na água está vivo, Há um sino sem badalo. Chegando a terra, morreu. Já me doi o ceu da boca Vivo em casa de meus pais, De ensinar êsse cavalo. Ninguém está melhor do que eu.

Meu coração bate, bate, Quem tem amores não dorme Coisa que eu nunca senti. Nem conversa com ninguém ; Nunca morri por ninguém, Se dorme perde o sentido, Mas morro agora por ti. Se conversa não quere bem. DA ILHA TERCEIRA 159

Puz a mão no lado esquerdo, Eu ausente, tu ausente. Não senti meu coração. Eu de ti e tu de mim. De-repente me lembjei Permita Jesus do Ceu Que estava na tua mão. Que esta ausência tenha fim.

De baixo da malva rôxa Suspiros batem no chão, Trago o meu bem encoberto ; Fazem grande matinada ; Todos dizem que é verdade Bem sei quem os está dando. Mas ninguém o sabe ao certo. Mas sem lhe servir de nada.

Ó meu amor, se me desses Desanela o teu cabelo, Eu também te havia dar Não o tragas anelado; Beijinhos até morrer, Desengana o teu amor, E abraços até matar. Não o tragas enganado.

A tristeza chove em mim Se eu soubesse quem tu eras, Como a chuva miudinha. Da terra donde tu vinhas, Não sei para onde foi Com mil balas atirava Tanta alegria que eu tinha. Ao mau coração que tinhas.

O sol anda e desanda Aqui donde estou bem vejo Em voltinhas se vai pôr; Um junquilho a abanar; Eu não ando nem desando, Também vejo o meu amor Sou-te firme, meu amor. Mas não lhe posso falar.

Eu fui ao jardim dos cravos, Eu sou triste, vivo triste, No primeiro dei um golpe. A tristeza me convém ; Mais me custa a tua ausência Só no mundo vive alegre Do que a minha própria morte. Quem não estima ninguém.

Amar e saber amar, Já cantei uma cantiga, Amar e saber a quem, Já com esta fazem duas Amar ao bom Deus do ceu Nada me ha de matar E não amar mais ninguém. Senão as saudades tuas.

Mandei ladrilhar o mar O' malmequer mentiroso, Com pedras duma pedreira, Quem te ensinou a mentir ? Para ir ver o meu amor Dizes que me queres muito Quando fôr para a Terceira. Mas já sei que é a fingir. 160 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Se vires o meu amor, Eu fui ao mato à lenha Aquele que eu deixei de amar, Mas só encontrei orego, Diz-lhe que afinal já tenho E na grota uns namorados Um melhor no seu lugar. Julgando que eu era cego.

Trago dentro do meu peito Ó roseira, roseirinha, Duas escamas de peixe : Roseira num só botão, Uma diz que devo amar-te, Queira Deus que desabroches A outra diz que te deixe. Dentro do meu coração.

Esta casa é um vaso Talvez penses, por que canto, E o dono é uma flor, Que a vida alegre me corre. Dentro dela está um anjo Eu sou como o passarinho Que ha de ser o meu amor. Que até canta quando morre.

A Terceira é das touradas, Eu fui ao pico, piquei-me, Faial um jardim de flores, Piquei-me lá num picão, S. Jorge é a terra de inhames, O picão nasce da silva Graciosa dos amores. E a silva nasce do chão.

Quando digo que te amo, Um beijo dado na face Dizes, amôr, que eu te minto. Nunca ouvi de fazer mal. As maguas que por ti sofro De graça se pede e dá-se Deus as sabe e cu as sinto. Não deixa nenhum sinal.

Sabia tanta cantiga. Quer tu queiras quer não queiras, Todas o vento levou. Has de vir à minha mão, Só a do meu amorzinho Que eu tenho remédio'santo No coração me ficou. Que te abranda o coração.

(Colhidas na Ponte do Mato) DA ILHA TERCEIRA 161

Viola, minha viola, Meu raminho de cipreste, Comes comigo à mesa; Triste é a tua figura. Tu és a minha alegria Quando eu de ti me lembrei Quando eu sinto tristeza. Já meu mal não tinha cura.

Ó minha mãe, que trabalhos ! Se eu me fôr daqui embora Para quem trabalho eu ? Por ninguém hei de chorar. Eu trabalho noite e dia, Só se fôr pelo meu bem, Não tenho nada de meu. Se cu não o puder levar. (Coligidas na Praia da Graciosa)

Ingrato ! porque maltratas Se os meus suspiros voassem Esta alma toda tua ? Dava mil em cada hora. Se é por vingança já basta. Que fossem bater no peito Se é por amor continua. De quem me lembrou agora.

Se eu tivesse pena de oiro Eu suspiro, tu suspiras, Comprava papel de prata, A suspirar morrerei. Com sangue das minhas veias Eu suspiro só por ti, Escrevia-te uma carta. Por quem suspiras não sei.

Deitei iim papel ao vento, Meu amor, se tu me amas Pelo ar perdeu a cor. Com outro no pensamento, Por mais enredos que haja Haveras de ser corrido Não te deixo, meu amor. Como as canas são do vento.

Se eu tivesse o teu retrato Meu coração por ti anda Tua ausência não sentia, A vela como um navio. De duas em duas horas Pelo bem que eu te quero O teu retrato veria. Não te posso dar desvio.

Eu com vergonha não olho, Mesmo que a terra se abra Com vergonha não olhais, E eu viva caia dentro, Com vergonha não vos peço, Eu não quero outro amor, Com vergonha não me dais. Nem sequer tal pensamento. 162 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Tu foste o primeiro vidro Eu mandei vir do Brasil Que eu puz na minha vidraça, Um canivete doirado Sim, foste o primeiro amor Para partir a rosquilha Que logo caíste em graça. No dia do meu noivado.

Aquele sim que eu te dei Os teus olhos mais os meus Naquela sala escura, Não deviam de nascer, Antes eu tivesse dado Não se viam, não se amavam, O meu corpo à sepultura. Não tinham que padecei".

Semeei cravos na areia. O anel que tu me déste Não sei se eles nascerão Naquele dia do Senhor, Também o meu lindo amôr Fica-me largo no dedo Não sei se me é finne ou não. E apertado no amor.

Nossa Senhora da Ajuda, O sol quando nasce, inclina Nossa Senhora da Guia, Na pedra do meu anel. Depaiai-me um bom marido Eu" também quero inclinar Para a minha companhia. Nos teus braços, Manuel.

Não posso comer sem dar, Meu amor, tu não me deixes, Nem falar sem ser de ti ; Meu amor, tem dó de mim, Não posso fazer a cama Que eu hei de ser teu amor Sem dizer: deita-te aqui Para séculos sem fim.

Eu cheguei ao ceu sentei-me, Cantigas são meninices Duma nuvem fiz encosto. Que se deitam pelo vento. Dei um beijo numa estrela Quem acredita em cantigas E julguei ser no teu rosto. Tem fraco entendimento.

Ó quem pensasse na morte. Meu amor festeja os anos, Nos artigos que ela tem. Festeja-os bem festejados Fixava os olhos no ceu, Para daqui a um ano Não amava a mais ninguém. Não estarmos separados.

Eu mandei vir de Lisboa Meu amor dá cá a mão, Um canivete de prata Vamos até ao jardim. Para cortar uma língua Quem não aparece esquece, Que me parece ingrata. Mas não te esqueças ce mim. DA ÍLHA TF.RCEIRA 1fi3

Adeus, meu cravo encarnado, Quando eu te tenho à vista, Minha flôr do lírio branco. Prenda amada e tão querida, Adeus amor meu amado São as horas mais alegres Por quem eu suspiro tanto. Que eu tenho na minha vida.

Tu és aquele que se gaba Ó sô tolo, ó sô tolo, De ter três e quatro à escolha, Não andes a entolecer; Mas inda te quero ver Pensas que eu morro por ti. Como a figueira sem fôlha. Mas já nem te posso ver,

Dei um aí, tu não ouviste ; O meu amor me deixou Suspirei, não déste fé ; Para amar outra mais rica, O meu coração é teu, Bexigosa, feiticeira. ■. O teu não sei de quem é. Tudo em sua casa fica.

O F quer dizer fiel, Meu amor, não vivas triste Bem fiel te tenho sido, Nos dias que has de viver; E tu, por sorte cruel, Anda alegre como dantes, Perdeste-me do sentido. índa mais se pode ser.

Anjo que vais para a Gloria, Meu amor, não vivas triste Espera que eu também vou ; Que a tristeza chama a morte. Quanto te tenho à vista Vive alegre se puderes Penso que na Gloria estou. Que Deus é que talha a sorte.

Quem me dera ir contigo Eu jurei e tu juraste. Que eu contigo ia bem ; Ambos jurámos firmeza ; Não levava nem deixava jurei amar-te e sou firme, Saudades de ninguém. Mas falhaste, que tristeza.

A minha ceia foi peixe, Parte amor que lá vão balas, A sobremesa maçã; O chumbo também vareia. Senhores com quem bailei : Não posso mostrar carinhos Adeus, até amanhã. A quem a mim refalseia.

Quando eu chego à janela O meu amor me deixou, E não vejo o meu amor, Ó que grande tirania. E como quem vai ao ceu Minha paixão é cantar, E não vê Nosso Senhor. Cada vez mais alegria. 164 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

O meu amor diz que tem O anel que tu me déste Outras paredes mais altas. Ha de ser de oiro batido. Desengana-te, amor, de mim, O amor que é para mim Que eu não sirvo para faltas. Já o trago no sentido.

Já não tenho coração O meu amor é Jesus, Já mo roubaram do peito. Com isso estou contente ; No lugar onde eu o tinha Como Jesus nunca morre, Nasceu-me um amor-perfeito. Tenho amor eternamente.

Dizem que o chorar tira Palavras leva-os o vento. .. As penas do coração. Ai tão leves que elas são ! Chorei ontem, chorei hoje Assim o vento levasse E as mesmas penas estão. As penas do coração.

Eu jà não quero dormir O cravo depois de sêco Senão à sombra do trigo. Significa amor perdido. O meu dormir é sonhar, Antes que eu queira não posso O meu sonhar é contigo. Tirar-te do meu sentido.

Eu nasci entre as estrelas, Eu já não tenho a quem conte Entre as nuvens fui creada ; As mágoas do coração. Perdi-me na noite escura, Hei de fazer uma cova Nos teus braços fui achada. Para enterrá-las no chão.

Das estrelas miudinhas Ninguém descubra o seu peito Mandei fazer um cordão Nem ao próprio confessor ; P'ra prender minh'alma à tua Quem o seu peito descobre E a tua ao meu coração. Para si mesmo é traidor.

Alfinetes são amores Isabel e Agostinho E agulhas amisades ; Ainda aos arraiais vão : Amores fora da banda Ela sempre de cestinho São dobradas as saudades. E êle sempre de bordão.

Ha um ano que te amo, Os teus cabelos são lindos, Ha dois que te quero bem, Teus lábios lindos, rosados. Ha três trago-te em meu peito Teus encantos são infindos Sem dizer nada a ninguém. O mulher dos meus pecados. DA ILHA TERCEIRA 165

Com. teus carinhos me encantas O nosso amor para mim Adormeço em teu regaço. É tão dôce como amargo : As cantigas que me cantas Juntos é gôso sem fim, São cs versos que eu te faço. Amargoso mal te largo.

Prometi uma promessa Se a minha vida é feia, Á Senhora do Livramento Da minha sorte me queixo : Se visse entrar o meu amôr Contigo, alegria cheia, Da minha porta p'ra dentro. Tristeza assim que te deixo.

Confecei-me a Santo António Hei de amar-te com cantigas, Disse-lhe que andava amando ; Prender-te sem embaraços, Ele deu-me por penitência Em versos feitos de rimas Que eu fôsse continuando. E rimas feitas de abraços.

Dizem que o preto é luto Que ventura inesperada E que o branco é fantasia ; Se eu pudesse adormecer Se o verde é esperança E acordar na madrugada Hei de ser feliz um dia. Do dia em que te hei de ver.

Vem cá meu preto da China, Nunca o teu rosto mimoso Vem cá, queimado do sol: Pela minha rua assoma. Quanto mais preto mais firme. Se não sabes onde eu moro, Quanto mais firme melhor. Quem tem boca vai a Roma.

Se errar, não sou a primeira É bem verdade, Marin, Nas aventuras do mundo. Seres do meu coração. Hei-de abraçar a Terceira Sc o teu nome principia Se o vapor não fôr ao fundo- Na palma da minha mão -..

Dizem que é fácil amar Dei um ai entre dois bosques. Para quem bem considera. Rebentaram dois rochedos, Mas é custoso encontrar Se me juras de ser firme Amor firme nesta era. Eu te conto os meus segredos.

Prêso a êsse teu olhar. Menina, estás à janela Logo a teu lado fiquei; Mas tem cuidado não caias ; A vida passo a sonhar A janela é muito alta, E ainda não acordei. Podes romper tuas saias. 1G6 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Amor que estás à janela O meu coração é terra. Comendo pão com queijo : Hei de manda-lo lavrar, Faz da bôca uma pistola, Para semear desejos Atira para cá um beijo. Que eu tenho de te falar.

O meu amor foi-se e disse Desci um alto rochedo, Que por ele não chorasse, Duma silva fiz encosto. E apertando-rne a mão, tornou : Não me importa padecer Querida, quem te levasse. Tendo um amor a meu gôsto.

Na fôlha da rosa larga Daqui onde estou bem vejo Fiz a minha sepultura. Olhos a quem eu venero, Quem é firme no amor Olhos a quem eu quiz muito, No mundo não tem ventura. Olhos a quem quiz e quero.

Teus olhos, contas escuras, Há duas coisas no mundo São como a noite cerrada. Que não chego a compreender; São escuros mas deixa-lo, Um padre ir para o Inferno Sem êles não vejo nada. E um médico morrer.

O amor enquanto é novo Não me digais mais adeus, Ama com muito cuidado. Com esses adeus me matais : Mas depois de estar casado Adeus para toda a vida, Mostra cara de enfadado. Adeus para nunca mais. (Colhií n na Luz)

O ar é propagador, Eu fui pedir-tc a teu pai, Eleva o som das sereias. Ele me disse que não, O amor é como o sangue Tua mãe disse que sim, Que corre todas as veias. Qual deles terá razão ?

Na fita do meu chapéu Eu casei-me, cativei-me, Teu nome mandei gravar, Nunca o devia ter feito. Para que saibas, amor, Sempre pensei que p'ra mim Que me estás sempre a lembrar. Fosses de maior respeito. DA ILHA TERCEIRA 167

Eu plantei uma saudade Se eu fôsse rei neste mundo, P'ra de ti não me esquecer, Que feliz sorte era a minha ! Regada com as lágrimas Depois da gente casar Que choro de te não ver. Serias tu a rainha.

Tu foste a rosa mais linda Fui um dia ao cemitério Que neste jardim nasceu. P'ra falar com minha avó, Se eu cheirasse o teu perfume Estava ela e meu avô Que ditoso que era eu ! Jogando ao dominó.

Heide amar a saudade Amo a Deus que é meu pai, Apesar de roxa e triste, A Terra que é minha mãe, Porque dentro em meu peito A ti que és o meu amor. Uma saudade existe. Não quero amar mais ninguém.

(Colhidafi ncis Fonle.s)

Sou pequena, visto saias, Cravo branco, risca preta, Faço roda de mulher. Me causa admiração. Dizei lá ao meu amor ) S'inda não tens outro amor, Se assim pequena me quer. ' Descança o meu coração.

Quem morrer mal de amores Saudades me tem posto Não se enterra em sagrado, Delgada como uma linha. Enterra-se em campos verdes Nascemos um para o outro, Aonde se apastora o gado. Paciência, sorte minha.

A saudade encoberta Quem me dera um caminho E um vale de amargura : Por debaixo deste chão, Cantando choro o meu mal Para te poder falar Como quem não tem ventura. Sem haver murmuração.

No cofre das minhas penas (a) Na Terceira ha esta variante : Mais penas nenhumas cabe ; Assim mesmo pequenina Alguém ha que sabe algumas. E' que o meu amor me quer. Mas, todas, só Deus as sabe. 168 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Ai de mim tão pequenina, Ó minha mãe, minha mãe, Tão perseguida de amores Ó minha mãe, minha amiga, Que já nem forças eu sinto Quem perde êsse amor que tem Para suportar mais dores. Perde tudo nesta vida !

O ladrão do melro preto Minha mãe é uma santa, Toda a noite me tentou, Porisso foi batisada ; Mas, chegou-se à madrugada, Eu que sou filha dela, Deu às asas e voou. P'ra santa não falta nada.

Semeei no meu quintal Minha mãe é uma santa, A semente do melão, Meu pai um santarrão ; Nasceu-me um macaco torto Tenho dois santos em casa Coluna viola na mão. A quem faço oração.

Desde que o mundo é mundo Cantai-me uma cantiguinha Muita gente tem morrido ; Antes que seja resada ; Nem no mundo se acha falta, Quem é nobre, nobre fica. Nem o ceu se tem enchido. Quem canta não perde nada.

Eu não quero à minha porta, És a cara dum defunto. Sombra da tua aguilhada : Quem te vir reza o credo. Eu sou mulher, perco tudo. Tomar amores contigo És homem, não perdes nada. Só por um triste remédio. ( Colhidas Carapacho)

Eu era para ser padre. Os peixes que estão no mar, Paciência, Deus não quiz ; Mesmo os que estão bem no fundo, Dei um beijo numa môça, Todos têm os seus amores Foi o delito que fiz. Como a gente cá no mundo.

Eu bem sei que sabes, sabes, Canta boca da minha alma, Eu bem sei que sabes bem ; Tu não cantas, canto cu ; Eu bem sei que sabes dar Não posso estar calada, O valor a quem o tem. Foi signo que Deus me deu. DA ILHA TERCEIRA 169

Ah ! que voz seria esta Fui ao mar para ver água Que eu aqui ouvi agora ? E ao jardim para ver flores. Será a voz de algum anjo Fui ao ceu para ver estrelas Ou de alguém que o adora ? E aqui para ver amores.

Se tu fosses o meu bem Tu é que és o meu amôr Muito te havia de querer; Por quem penas eu padeço ; Nas palmas das minhas mãos Dentro do meu coração Te deveria trazer. Outro amôr eu não conheço.

Se eu soubesse de tu vires Vai-se chegando a noite, Aliviar minhas penas. Chega-se a mim a alegria, Teria a casa varrida Afim de ver meu amor E enfeitada de açucenas. Já que não o vejo de dia.

Graças a Deus que cheguei Eu puz-me a contar as horas, Ao jardim das cristalinas : (E os dias sempre a crescer!) Os cravos são dos melhores A ver quando chega a noite E as rosas são das mais finas. Meu amor, para te ver.

Se eu tivesse asas, voava, Puz-me a contar as estrelas Muitas vezes te ia ver, Só a do Norte deixei ; Mas como asas não tenho Por ser a mais bonitinha Bem vês que não pede ser. Contigo a comparei.

Fiz um A pela manhã Eu queria-te adorar E um M ao romper da aurora, Como o sol adora a terra ; Fiz um O ao meio dia, Dizem que tens outro amor, Fiz um R e fui-me embora. Não lhe quero fazer guerra.

Fiz um A — para te Amar, Tenho um amor que me ama, E um B — para Bem querer, Outro que me dá dinheiro, Fiz um D — Deixar-te, não, Tenho outro que me bate à porta. E um S — Só se morrer! Esse é que é o verdadeiro.

Coração que a dois adora, Ó coração de pombinha, Com êle não tenho fé; Ó asas de Primavera, Eu não quero amôr partido Quem pudesse adivinhar Porque o meu inteiro é. O teu sentido qual era. 170 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

O mar é vivo e não fala, Se tu visses o que eu vj, O rio corre e não cansa ; Pasmavas como pasmei. Quem me dera adivinhar De ver um bicho tão grande Se inda me tens na lembrança. Nas barbas dum peixe-rei.

O meu amor é cambado, Aí vem a Sapateia, Nas duas pernas tem geito. Aí vem a moda bum'a Ó cambado do diabo, Quem não canta a Sapateia Porque não andas direito ? Não canta moda nenhuma.

O amor é gato bravo Mariquinhas lá de baixo Que arranha a dois corações. Mandou-me um cestinho de ovos, Sape sape, bichaninho, E minha mãe logo disse Não me faças arranhões. Que eram amorzinhos novos.

Das estrelas miudinhas Eu fui ao fundo do mar Mandei fazer um cordão Apanhar uma açucena. P'ra prender minh'aima à tua Logo por desgraça minha Na raiz do coração. Apanhei a mais pequena.

O Santo Antonio é negrinho, Tu disseste a quem me disse E negrinho como a amora. Que não me querias ver. Quando vê moças bonitas Eu com isso não me importo. Deita a linguinha de fora. Mas emfim, gostei de saber.

Canta, minha amiga, canta, O beijo que tu me déste Canta que eu te ajudarei; Sem tua mãe o saber, Se te vires naufragada Agora podes dar-me outro, Chama por mim que eu irei. Que já lhe foram dizer...

Estas meninas não cantam, O limão que tu me déste, Que males serão os seus ? Não o comi nem o dei, Se calhar vem avisadas Guardei-o na minha arca Dos seus servinhos de Deus .. P'ra não lhe perder a lei.

Estas meninas não cantam, Quem tem amores não dorme, Louvado seja o Senhor. Eu também assim fazia, Cantando seu mal espantam Mas como já não os tenho, E afastam a maior dor. Durmo de noite e de dia. DA ILHA TF,RCCIRA 171

Se eu morrer sem te gosar Quero cantar, ser alegre, Hei de te vir perseguir; Não quero entristecer; De dia não vais andar, Quem é triste morre cedo De noite não vais dormir. E eu não quero morrer.

O anel que tu me déste No meio daquele mar Era de vidro, quebrou-se; Está um barco de pau O amor que me tiveste Onde o meu amor se assenta Era pouco, acabou-se. A pescar ao garapau.

Minha sogra tem-me raiva, Sabe Deus se de hoje a um ano Minha cunhada também, Sabe Deus se de hoje a um dia. Mas não me importo com isso, Eu aqui ou noutra terra Queira-me o seu filho bem. Desço à sepultura fria.

Lá vem a lua saindo, O amor que em ti puz Vermelha como uma brasa. Antes o puzesse n'água ; Quem tem a mulher ciosa Vem a água leva tudo. Tem o demonio em casa. Não deixa pena nem mágua,

O diacho leve os ratos Chamasto-me preta, preta, Mais os dentes das formigas, Sou preta mas sou airosa ; Que me roeram o saco Também a pimenta é preta Onde eu trazia as cantigas. Mas põe a sopa gostosa.

Não sei que cantigas cante A giesta é amarela Á vista de tanta gente ; E amargosa na raiz ; Tanta cara, tanto olho, Dizes que me não quizeste Tanto nariz, tanto dente. Mas fui eu quem te não quiz.

O meu cantar hoje em dia Ando triste, vivo triste Já não é como tem sido ; Por um bem que eu tanto adoro, É como pano lavado Chego à janela triste, Que o lustro traz perdido. Viro para dentro, choro. BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Com falares e promessas Rapariga tu não cases E com lérias e cantigas Com homem que já casou : É que os moços atrevidos Olha que vais criar pintos Iludem as raparigas. Que outia galinha chocou (').

Vai para a Caldeira bela E, para limpar o mundo, Atira-te ao lago dela E deixa-te ir para o fundo.

(CoUiídas em lugorefi não iclenlifiçados)

Dá-me a tua mão direita Meu amor me chamou doido, Unida palma com palma, Acho que assim que está bem ; Atraz da mão vem o corpo, Eu ando doido por ela, E atraz do corpo, a alma. E ela não sei por quem . .

Dá-me a tua mão direita Uma ingrata neste mundo E os teus dedos estendidos. Foi o meu primeiro bem ; Palpitam mimosamente Foi ela que me ensinou Nossos corações unidos. A ser ingrato também.

Tu julgas que eu não sei Ingrata, já te não lembras Das tuas rebeldarias. Da constância prometida, Se tu me quizesses bem Que juraste seres minha Fala a outra não darias. E eu teu para toda a vida. ( Colhidas na Feileira)

Ou «iirou». Viagem de Pompeo Arditi de Pesaro

h liíia da Madeira e aos Aç ores

(1567)

No dia 6 de Maio de 1567, terça-fcira, à tarde, saímos com a ma- ré do porto desta cidade de Lisboa, numa caravela armada, com des- tino à ilha da Madeira. Chegados ao mar navegamos toda a noite com leve brisa de leste ; na manhã seguinte, crescendo o vento, perdemos de vista a terra, e assim, sem a ver, navegamos quatro dias com belís- simo tempo, sempre com vento favorável ora de leste ora do norte. No quinto dia, que foi domingo, de manhã cêdo, avistamos uma pe- quena ilha chamada Porto-Santo, a qual, segundo dizem os marítimos, mede cinco léguas de circunferência, está a 33 graus e 1/3 e é muito fértil, abundante em ceriais e gados e abundantíssima de coelhos. Chegados à altura desta pequena ilha, deixamo-la à direita e princi- piamos a ver a ilha da Madeira, que por ser terra altíssima se vê de muito longe e dista quinze léguas da outra pequena ilha. Á mão es- querda da Madeira vimos depois três ilhotas, a mais próxima das quais está à distância de quatro léguas. Chamam-se estas ilhotas Desertas, porque numa habitam apenas seis ou sete pastores e as outras são deshabitadas. São tão pequenas que a maior não chega a ter uma légua de comprido e de largma um tiro de arcabuz, tão estreita nalguns pontos que não podem passar três pessoas a par. Cada uma dtdas é quase toda rocha viva, allíssi- 174 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO ma c escarpada, com uma única saída tão difícil que, ha três anos, como alguns ingleses tentassem desembarcar para roubar gado, um prêto que aí se tinha recolhido, defendeu sozinho à pedrada o lugar de desembarque, evitando-o e abatendo cinco dos assaltantes. Vêem-se nelas vacas, carneiros, mulas, muitas cabras, perus, galinhas e enorme quantidade de coelhos. Daqui, costeando parte da Madeira, chegamos à tarde ao Funchal, cidade sede do bispado, assim chamada porque, quando lá chegaram os primeiros povoadores, era um campo de funcho. Esta ilha da Ma- deira está situada a 32 graus e meio, dista da mais próxima das ilhas Afortunadas, que se chama Lançarote, 70 léguas, 100 léguas da costa de Africa e 150 léguas de Lisboa, é muito montanhosa, de costas altas, abundantíssima de fontes de belíssima água. Mede desoito léguas de comprimento e quatro de largura, só é habitada no litoral, porque na montanha, por causa da espessura do arvorêdo tão denso que se ca- minham duas e três léguas sem ver sol, e da grande quantidade de água, que aí brota, mesmo em Julho, faz um frio insuportável; mas no litoral, onde estão as povoações, o ar é tão temperado que em nenhu- ma época faz frio nem calor. Esta ilha deve ter mais de 13 a 14 mil almas e está dividida em duas capitanias, uma denominada do Funchal, nutra do Machico, as quais pertencem a dois senhores deste Reino, e são morgadios que se transmitem em herança e recebem a redízima do Rei, isto é, se o Rei tem dez mil escudos de rendas eles têm mil. A capitania do Funchal prodús a quase totalidade do açúcar; a do Machico, por não ser tão abundante de água, prodús menos, mas, em compensação, abunda em ceriais e gados. Toda a ilha dá grande quantidade de vinhos considerados excelentes, muito semelhante à malvasia de Cândia ; os ceriais que aqui se colhem são bons, mas em tão pequena quantidade que não chegam para um terço do consu- mo, o que obriga a ir busca-los às Canárias e aos Açores. A colheita é mais cêdo do que a nossa, pois em 12 de Maio comemos pão novo, uvas, figos e melões, e os homens da ilha diziam que desde Março começavam a comer pão novo. É muito abundante de frutas de todas as qualidades, em especial bananas iguais às que vem de Chipre e Veneza. E o solo é tão fértil que a arvore plantada num dia dá fruto passado um ano; alem do que tem a propriedade maravilhosa de não criar animais venenosos e fazer perder o veneno aos que para lá são DA ILHA TERCEIRA 175

levados de outra parte; nem se encontram animais nocivos a não ser ratos e pequenas rãs do tamanho de um dêdo ('). A cidade do Funchal é a maior povoação da ilha e deve ter cinco a seis mil almas ; está situada numa praia de milha e meia de compri- mento, voltada para o lado de Cabo-Verde, onde ancoram todos os navios que vem buscar açúcar, vinho e compotas, que nesta cidade se fazem excelentes e em grande quantidade. Tanto os que compram como os que vendem pagam direitos ao Rei à razão de dez por cento, de modo que o Rei, com isto e com o negócio do açúcar da gente da terra que lhe dá de cada cinco um, re- cebe por ano, sem despesa, uma média de cincoenta mil ducados. Desta ilha, depois de trinta e cinco dias de permanência, partimos a 13 de Junho para os Açores, e ainda não tínhamos andado duas lé- guas, quando o vento acalmou de tal sorte que todo n resto da noite até ao meio dia seguinte quase não andamos. Ao meio dia, passada a ponta voltada ao poente, com vento sueste perdemos de vista a ilha à noite, e assim navegamos com belíssimo tempo durante três dias de- pois de deixar a terra, ora com oeste ora com leste ; no quarto dia, quinta-feira à tarde, avistamos ao longe uma das ilhas dos Açores, assim chamadas pelo grande número deles que havia quando pela primeira vez foram reencontradas, mas agora nem um se vê, porque, segundo dizem, desapareceram de repente quando as ilhas principiaram a ser habitadas. Na manhã seguinte, ao romper do dia, achavamo-nos pró- ximo desta ilha, que se chama de Sanfa-Maria, de onde se avista São Miguel distante treze léguas. Santa-Maria fica a 38 graus, não é muito montanhosa e abunda em ceriais, gado e carnes, devendo ter de cir- cuito não mais de sete ou oito léguas. Navegando para dennte deixamo-la à esquerda e andamos em ro- ' da da ilha de São Miguel; antes do meio dia chegamos à ponta da ilha voltada a leste e d'aí costeamos a parte sul, entrando à tarde em Ponta-Delgada onde desembarcamos, demorando-nos na ilha quaren- ta dias e cavalgando-a nesse tempo quase toda ; porem mais clara- mente do que poderia e saberia descreve-la, contarei o que em grande parte vi e o que em parte ouvi à gente da terra digna de crédito. Esta ilha está a 39 graus, à distância de cento e cinquenta léguas da Madeira, e as suas dimenções são de desoito léguas de compri- mento por duas ou três de largura, orientando-se o comprimento de 176 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

leste para oeste. Do lado leste é montanhosissima e toda coberta de árvores, entre as c|uais muitos cedros do Líbano ; o resto é quase todo plano com colinas frutíferas que dão grande quantidade de ceriais e gados; ainda prodús pastel para tingir pano em tamanha porção que os ingleses a ela vem todos os anos compra-lo e carregam dez a doze navios grandes. O vinho não presta porque é tão fraco que não dura mais de três ou quatro meses, de modo que Deus deu todas estas ilhas a um Rei para uma socorrer as outras, pois sucede que todas estas ilhas dos Açores, que são nove — Santa-Maria, São Miguel, Terceira, São Jorge, Pico, Faial, Graciosa, Flores e Corvo —, têm vi- nhos ordinários, mas todas, excepto Pico e São Jorge, são abundantes em ceriais, e trocando com a Madeira cerial por vinho, todas comoda- mente se manlêem. Esta ilha de São Miguel é muito populosa e deve contar, segundo dizem, vinte mil almas ; é muito abundante em vacas, carneiros e porcos, e é tanta a quantidade de cordenizes que maravilha; não é muito abundante de água, embora não falte para os usos quo- tidianos ; os melões são os melhores de todas as ilhas e ha-os de quatro e cinco palmos de comprimento. Também é excelente o mel de abelhas, não me parecendo que possa haver melhor, nem sequer igual. Segundo os vestígios que se observam, a ilha já ardeu toda ; e no ano de 1563, dizem que na vespera de São Pedro, num lugar chamado Vila-Franca, começou pouco a pouco a terra a tremer e depois toda a ilha com grande força, terramoto que durou três dias seguidos, e no quarto correram três montes, dos quais nem um só vi, e deitaram fògo com tamanho estrépito que se ouviu em São Jorge, isto é, a cinco léguas de distância, com enormes nuvens de pedra pomes e tanta quantidade de escórias, que, soprando vento do poente, chegaram a Portugal a uma distância de duzentas e sessenta léguas. Estas escó- rias causaram grande dano às colheitas e cobriram toda aquela parte da ilha, por modo que só agora começa a produzir alguma cousa Deitou ainda o monte tão grande porção de pedra, em cinco dias que durou a erupção, que em dois lugares de uma e outra banda da ilha, voltados a norte e sul, fez no mar duas praias de duas a três milhas de comprido e meia milha de roda. Correram destes montes correntes de lava incandescente cuja passagem nem elevação nem na- da podia impedir, e eu vi uma que passou um grande monte e depois entrou no mar, tendo percorrido mais de uma légua de terra. DA ILHA TERCEIRA 177

Esta lava converteu-se em pedra durissima e nêgra que, à vista parece breu. Toda a ilha está cheia de montes abertos no cimo e rôtos por dentro, cuja terra é cinza, sinal evidente de serem devidos ao fôgo ; alem disto, por toda a ilha, cavando quatro ou cinco pés na terra, en- contra-se esta matéria queimada e convertida em pedra durissima. Da banda do norte, depois deste fôgo, encontrou-se a pedra de fazer alú- men, que aí se faz, embora em pequena quantidade. Dizem que a duas léguas do lugar chamado Vila-Franca, dentro da montanha, ha algumas furnas de enxofro de onde se escoam, quase no mesmo ponto, dois regatos, um tão frio que não se lhe pode meter a mão dentro, outro tão quente que, metendo-se nele um porco e tiran- do-o logo, lá deixa a pele. Dizem ainda que ha aí uma planície no meio da qual está um lago cuja água negríssima de continuo ferve, e exala miasmas por modo que, se lá vão cães ou outros animais logo morrem, e aos homens não causam dano ; cousas estas que, por ser perigoso e muito alagado o caminho, não tentamos ver. Ao lado da dita Vila-Franca, situado ao sul à beira da costa, de- para-se um maravilhoso ilheo quase redondo de meia milha de circuito, distante da terra outro tanto, fechado em volta de rocha viva muito alta, que parece talhada a escopro. A terra no meio vai-se pouco a pouco abaixando e forma no centro uma pequena bacia de quarenta varas (') de diâmetro, onde entra o mar por uma aberta, o que visto pela gente da ilha e conhecendo a comodidade que d'aí lhe po- dia advir, ha muitos anos abriu a parte voltada para terra, que é mais estreita e baixa, e fez uma entrada para barcos. Mas foi tão apertada que não entram embarcações de mais de uma tonelada, e porque, como disse, a abertura está voltada para terra, que a abriga do vento norte que podia prejudica-la, é porto seguríssimo com todo o tempo. Dentro do porto do ilhéo ha enorme quantidade de peixe de toda a qualidade, na rocha inúmeras pombas bravas, que se apanham com a maior facilidade, e o terreno, se fosse cultivado, daria ótimo vinho, pois, inculto como está, nele crescem vinhas de excelentes uvas. Assim este ilhéo, que creio em todo o mundo outro igual se não encontrará, tem estado ao abandono sem utilidade alguma para o Rei por talta de quem saiba demonstrar a Sua Alteza a necessidade de existir na ilha 178 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

um porto como este para a sua armada, tanto mais não havendo nela nenhum isento de perigo. Sua Alteza, porem, resolveu agora por con- selho do sr. Tomas (3) alargar a entrada por modo a passarem os na- vios que vêm da índia, e aí conservar a armada de guarda-costas da ilha, para não suceder o que no ano passado sucedeu à Madeira sa- queada pelos franceses. E como o fundo é insuficiente para flutuarem os ditos navios, forna-se necessário escava-lo, cousa fácil aliás. Até então, a fim de prevenir quaisquer acidentes, deve-se mandar construir uma fortaleza em qualquer parte do ilhéo, onde possa haver artilharia para defeza do porto, e uma casa para o capitão e os poucos homens necessátios, de forma que, fazendo-se uma bôa cisterna, por lá não haver água, e armazenando-se lenha e trigo com a possibilidade de o moer, os moradores ficarão habilitados, sem mais nada, à deteza do local contra todo o poder do mundo. Esta ilha de São-Miguel é toda capitania e morgadio dum fidalgo do Reino, e a sua principal povoação é a cidade de Ponta-Delgada assim denominada por estar na ponta mais estreita da ilha, cidade que poderá ter oito a nove mil almas e rende para o Rti, com toda a ilha, cerca de trinta mil ducados livres de despezas. Partimos daqui para a Terceira na segunda-feira 28 de Julho à oite, num pequeno barco dito da carreira por não fazer outras via- gens alem destas, e navegamos toda a noite com vento fraco do sul, que, ao romper do dia, acalmou totalmente ; mas pouco depois veio vento nordeste que nos era contrário, e, por não ser impetuoso, para não voltar para traz, tivemos de passar o tempo bordejando na espe- rança de em breve rodar, pondo-se de feição, o que, todavia, não suce- deu durante três dias, nos quais estivemos à vista da Terceira sern chegar a ela, a-pesar de, normalmente, se fazer o percurso dessas trinta léguas em menos de um dia e uma noite Ao quarto dia quis Deus que o vento torcesse para sul e entramos depois do meio dia no porto da cidade de Angra, no primeiro de Agosto. Esta ilha está na altura de Lisboa, isto é, a 39 graus e meio, chama-se Terceira por ter sido a terceira a ser encontrada, e dista de Lisboa 290 léguas. Não é muito grande, pois não excede 6 léguas de comprido e 4 de largo ; o maior comprimento está orientado, como em São-Miguel, do nascente para poente. O solo, parte de montes ásperos parte de colinas férteis e amenas, prodús muito trigo e nal- DA ILHA TERCH1RA 179

guns lugares tem correntes de água não tão grandes nem boas como as de São-Miguel. Abunda em bois, cabras, ovelhas, porcos, e tem grande quantidade de cordenizes. Ainda se notam vestígios de materiais petrificados que cozeram (la- vas solificadas), e muitos montes são furados como os de São-Miguel ; depois de ser habitada ha 140 anos, segundo dizem, não se deu ne- nhuma erupção. À ilha afluem muitos navios por ser mais cómoda à navegação do que qualquer das outras ; por isso nela tocam todos os vindos das índias orientais e ocidentais, do Brasil, São Tomaz, Mina e Cabo-Verde, a reabastecer-se de mantimentos, parecendo que Deus pôs milagrosamente esta ilha no meio de tão grande mar oceano para salvação dos míseros navegantes, que muitas vezes lá chegam sem mastros nem velas, ou sem mantimentos, e aí se fornecem de tudo. Está dividida em duas capitanias, uma dita de Angra, outra da Praia, que são morgados de dois gentis-homens do Reino. Os direitos reais, segundo dizem, são 7 a 8 mil ducados e a cidade de Angra, sede do bispado, cabeça das mais ilhas, é residên- cia do Corregedor do Rei, que governa. Esta cidade é muito populosa e, segundo dizem, poderá ter sete a oito mil habitantes, mais que todo o resto da ilha ; é muito bonita, com boas casas, ruas largas e direitas, e nela se fabricam ótimas mobílias de excelentes madeiras. Achando- -nos nós na Praia em 9 de Agosto, tivemos notícia de terem chegado tiês navios da Índia e a armada real se encontrar no porto de Angra, e um galeão e duas caravelas, deverem partir com ela, assim que os navios tivessem mantimento, a fim de os proteger dos corsários em tão grande numero nestes mares, que o Rei todos os anos se vê for- çado a mandar uma armada à ilha para defender e acompanhar os navios. Resolvendo nós seguir nessa armada, se fosse possível, logo saí- mos da Praia para Angra, cerca de quatro léguas distante, onde no mesmo dia embarcamos numa caravelinha para as ilhas de São Jorge e Faial, as quais, por ordem de Sua Alteza, era preciso ver, na espe- rança, porque então o vento estava de leste favorável a nós e contrário aos navios da índia, de regressar antes de partirem aqueles navios, que andavam bordejando e tomando mantimentos, sem ancorarem porque o Rei proibira fundearem no porto de 1 de Agosto em deante. 180 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

por ser ele pouco seguro nessa época e já se terem perdido navios por darem à costa. Mas, tornando a nós, digo que navegamos todo aquele dia e noite e de manhã cêdo nos achamos em São Jorge, no porto chamado das Velas, onde logo desembarcamos, e, visto o pre- ciso, nesse mesmo dia seguimos para o Faial num barco. A ilha de São Jorge dista da Terceira dez léguas terra a terra, e desoito porto a porto, tem de comprimento dez léguas e de largura apenas duas ; é muito montanhosa e esteril, tanto que poucos dos moiadores colhem o grão suficiente para seu consumo, abunda em lenhas e nela se fazem os melhores vinhos do arquipélago, inferiores contudo aos da Madeira- A sua largura é quase no sentido leste oeste, e tem ao lado, para o levante, à distância de cinco a seis léguas, outra ilha do mesmo com- primento e largura, ou com pequena diferença, formando ambas um canal. Esta ilha chama-se do Pico, por causa dum monte altíssimo e agudo que nela ha a que os naturais chamam pico ; e contam que, antes de rebentar o fôgo em São Miguel, sentiram fortíssimo abalo de terra que não só a agitou toda, como fez tremer São Jorge à distância de cinco a seis léguas, de modo que parece ambas as ilhas estarem ligadas no fundo do mar. Depois deste terramoto o cimo do pico abriu-se com grande ruido e começou a lançar enorme quantidade de fôgo, o que continuou até ao ano de 1565, mas agora já cessou, e da abertura saíram, dizem, sete regatos ardentes de matérias de igual qualidade às de São Miguel, que correram até ao mar e se acham convertidas em pedra. A ilha é toda montanhosa e selvática, e a lenha dela, na opinião geral, é a melhor de todas as ilhas. Habitam-na uni- camente pastores que vivem como selvagens e se alimentam de ani- mais que apanham na floresta, dos quais a ilha procria infinita quan- tidade, isto é, vacas, cabras, ovelhas, porcos e coelhos, pois em toda ela não se encontram outras espécies comestíveis de quadrúpedes. Navegando depois em frente, ora à vela ora a remos, conforme o vento permitia, chegamos ao Faial às 4 horas da noite, onde logo saltamos o melhor que pudemos, e ai, visto o que tínhamos a ver, nos embarcamos nesse mesmo dia já referido para voltar a São Jorge, tão grande era o nosso desejo de apanhar a armada. Esta ilha do Faial fica do lado sul ao fundo do canal formado por São Jorge e Pico, quase de forma redonda, distante oito léguas das Velas. Não tem ca- pitão porque, morlo sem herdeiros o que havia, reverteu à corôa. DA ILHA TERCEIRA 181

Nesta illia, como em todas as outras, ainda se vêem vestígios de fôgo, de modo que alguns pertendem que não só São Jorge e Pico, mas as demais, estão ligadas entre si, sendo que todas geralmente ar- deram, e que procedem de comum origem. Esta ilha é bastante povo- ada e dizem que o rendimento anual do Rei é de seis a sete mil duca- dos. As outras pequenas ilhas, que não vimos, Graciosa, Flores e Corvo, não lêtn nada de notável, c, alem de pequenas, são de pouca utilidade dando as três de rendimento ao Rei menos de dois mil ducados por ano. Partidos que fomos do Faial andamos à roda de São Jorge a remos por ser desfavorável o vento, e chegados aí anoiteceu a meio do canal, o vento, que nos era contrário, começou a crescer tanto que estivemos em perigo sem os marinheiros poderem avançar contra ele; mas por firn quiz Deus que, passado longo tem- po, o vento abrandasse e, porseguindo, chegássemos às quatro horas do dia ao porto das Velas onde dormimos o pouco da noite que ainda restava, e aí, depois de jantar, mudamos para um barco um pouco maior, a fim de chegar com mais segurança à Terceira, e, a remos todo o dia e toda a noite seguinte, andamos no canal ao longo da costa da ilha, até de manhã cêdo, alcançarmos uma pequena aldeia no extremo chairíada Topo, a oito léguas das Velas, onde pensávamos deixar o barco em que vínhamos por meter muita água e partir noutro maior que estava carregado para a Terceira por ser favorável o vento. Como porem passasse a soprar de leste, que nos era contrário, demoramos três dias sem pão e sem vinho não tendo levado manti- mentos por não cuidarmos serem precisos, e agora os não encontrá- vamos ; e aquela pobre gente, sem saber onde ir busca-los, via-se foiçada para comer e andar com uma faca pela costa a apanhar umas conchinhas que ha nas pedras como caracóis, a que chamam lapas e com elas cozidas na água se mantinha. Mas Deus socorreu-nos a tem- po fazendo chegar ali um amigo nosso com um barco muito veloz a remos, no qual embarcamos no sabado ao meio dia, e a remos anda- mos todo o dia e noite à roda da Terceira ; como prazesse a Deus de manhã, à hora do jantar, no domingo, desembarcamos na cidade de Angra donde no dia seguinte, 18 de Agosto, providos das cousas ne- 182 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

cessarias, para a viagem ao Reino, embarcamos numa caravela que andava em busca da armada, a qual, cessando o vento leste que tanto a tinha demorado e soprando mais ao norte, já havia partido de volta a Portugal. Como, porem, se não afastara muito e Íamos num navio mais ligeiro, chegamos na quarta-feira à vista de São-Miguel c, agra- decendo a Deus esta mercê, subimos para o galeão onde fomos muito bem alojados pelo capitão ; a assim, como refrescasse o vento, come- çamos a navegar alegremente, a fazer figura duma grande frota porque, alem dos três navios da índia e dos três da armada, vinham conosco de conserva para se livrarem dos pirátas vinte e cinco navios mercan- tes. Com tão bela companhia andamos cinco dias depois de sair da Terceira sempre com vento norte, aproados a levante, até que ao sexto dia, 23 do mês, rodou de novo o vento para leste e como não pudés- semos continuar com a prôa ao levante, vimo-nos obrigados a volta- la ao sul, de modo que durante dois dias, tomada a altura, conhecemos ter descaído um grau ; mas depois, como o vento virasse ao levante, e logo a sueste e sul, retornamos a nossa altura; desta forma navega- mos com ventos vários, ora à pôpa ora à proa, até 30 de Agosto sempre com bem mar. No dia último do mês, todavia, que foi domin- go, ao romper da manhã, começou a soprar do poente, ao princípio sem grande fúria, para mais tarde crescer, até que à noite amainamos todas as velas e voltamos a prôa ao vento com receio de dar à costa porque o piloto dizia estarmos muito próximos. Na segunda-feira primeiro de Setembro começou a cair uma chuva torrencial que durou três horas com grande cerração e o mar tão embravecido com o vento que levantava vagas que nos escondiam os navios da índia a pesar de estarem muito próximos, e se este mar houvesse rebentado como o nosso estaríamos em risco de tudo perder. Esta tempestade durou todo o dia e noite até que no dia seguinte, terça-feira, entrou o vento a amançar e a mudar-se para noroeste, pelo que, convencidos de irmos à costa, guindamos as vergas e levantamos as velas que tinham esta- do amainadas um dia e duas noites, e depois de jantar, clareando a atmosfera, com grande contentamento avistamos a terra próxima seis ou sete léguas, e às 3 horas da noite entramos e fundeamos no porto denominado Cascais, seis a sete léguas distante de Lisboa. Na manhã da quarta-feira, 3 de Setembro, à hora da maré, pro- vidos de piloto os navios da índia para passar a barra, que é muito DA ILHA TERCEIRA 183

perigosa por causa dum recife à entrada do porto de Lisboa, chegamos finalmente a ele, com grande alegria, dando graças a Deus Nosso Senhor por nos ter conduzido a porto de salvamento.

(Documentos para o estudo das relações culturais entre Portugal e !falia, 11-21).

NOTAS

( ) No texto ragancliiiu. Cremos referir-se ás pequenas rãs de cor verde e peito branco, hyla arbórea, que vivem nas arvores de alguns jardins do Funchal, ás quais se refere o «Elucidário Madeirense». ' ^ Vide a descrição dos {erramotos em Gaspar Frutuoso, Saudades da Terra, Liv. IV, Tomo II. Ponta Delgada, 1926, pág. 124 e 144. A catástrofe de Vila Franca foi em 1522. (3) Canne no texto, antiga :nedida de cerca de 2,m 25, que traduzimos por vara por nos parecer a antiga medida linear portuguesa mais aproximada da ita- liana. (') Tomazo Benedifto, engenheiro militar italiano ao serviço do Rei de Portugal que construiu os castelos de São Braz de Ponta-Delgada, o castelo de São Sebastião em Angra, etc. CENTENÁRIO

DO P.E JERÓNIMO E. DE ANDRADE

No dia 11 de Dezembro do ano findo, comemorou-se o primeiro centenário da morte do P.e Jerónimo Emiliano de Andrade. Notável professor e educador da mocidade. Comissário de Estu- dos e primeiro Reitor do Liceu, autor de numerosos e excelentes livros didáticos, não era ao Instituto que cumpria promover a comemoração daquela data. Tomou a iniciativa quem, entre todos, melhor a podia tomar, a Camara Municipal, que organizou uma romagem à campa do ilustre mestre no Cemitério de Nossa Senhora do Livramento e uma exposição bibliográfica na sua bibliotéca. O Re Jerónimo, contudo, embora não fosse historiador, ainda mercê da sua visão de pedagôgo, ocupou-se da história local e fê-lo por forma que bem merece aqui lembrar. «- Nada mais pode ser vergonhoso ao homem de educação que desconhecer as vantagens e as riquezas da terra que lhe deu o ser, e ignorar os acontecimentos heroicos que nela se passaram.» Como para tanto não houvesse um compendio, escreveu-o o P.e Jerónimo e em 1843 publicou o primeiro volume da Topngmphia ou descripção physica, política, civil, eclesiástica e histórica da Ilha Terceira, logo seguida em 1845 do volume segundo, inteira- mente consagrado à parte histórica, não chegando a publicar o tercei- ro, que devia abranger o período seguinte à denominação espanhola. DA ILHA TERCEIRA 185

por a morte ter posto termo à sua operosa e benemérita existência. Para este volume deixou, porem, felizmente, preciosos apontamentos que o seu discípulo, biógrafo e amigo, P.e Mariano Constantino Ho- mem, publicou em 1850 com o título — «Apontamentos Posfhumos do Padre Jeroni/mo Emiliano d'Andrade, para servirem de continuação á Topopraphia da Ilha Terceira». E digna de registo a sua noção de história e do papel do histo- riador, consignada na Prefação do volume segundo. * Lembrados que somos historiadores e não romancistas, o nosso principal cuidado foi transcrever com o maior escrúpulo e re- duzir a ordem os factos mais salientes que se acham espalhados nos diferentes escritos que pudemos conseguir, conservando as mais das vezes as pioprias palavras dos seus autores, temendo altera-las, dan- do-lhes diferente linguagem. Em obras históricas só se procura á ver- dade, e não a 01 iginalidade, e quando a não tenhamos alcançado pela inexatidão das peças, de que nos temos servido, ao menos podemos lisongear-nos de nada termos escrito de fantazia». Ao tempo ainda não tinha sido publicada a copiosa e excelente obra de Drumond, Annacs da Ilha Icrceira, cujo primeiro volume só saiu em 1850. As fontes de que se socorreu, segundo diz, foram Frutuoso, atravez de Cordeiro, a História Insulana deste, o Espelho Cristalino de Frei Diogo das Chagas, que todavia dá como anónimo, o Livro do Tombo do P.e Menezes e as Taboas Genealógicas do Dr. João Cabral de Melo, ambos como o Espelho manuscritos. Utilisou ainda documentos autênticos, memórias e anotações de particulares, e os livros antigos do Arquivo da Camara de Angra, trasladados por Drumond por iniciativa do Doutor Antonio Moniz Bar- reto Corte-Real, cujo valioso auxilio agradece, Alem destes consultou historiadores portugueses, designadamente Barros, Galvão, Candido Lusitano, Faria, Soares da Silva, não esquecendo a Crónica da Guiné recentemente publicada. Aproxima e critica essas fontes para delas tirar conclusões ainda, em muitos pontos, aceitáveis, não obstante os progressos posterior- mente feitos. Examina os motivos que teria o Infante D. Henrique para promo- ver a viagem aos Açores e entende que seriam notícias árabes, ou de 186 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO outra origem, sobre a sua existência. A seu ver, baseado nelas, proce- deu por calculo e não por súbita inspiração. Discorda de Cordeiro quanto à data do povoamento da Terceira que fixa entre os anos de 1444 e 1450. Provavelmente, na volta, os descobridores de Cabo-Verde teriam avistado os Açores, e isso só poderia ser depois de 1446, pois, segundo Barros, Galvão, Soares e Silva e Faria, foi nesse ano o descobrimento daquele arquipélago, como é confirmado pela Crónica da Guiné. Cordeiro supõe Cabo-Verde ao norte quando está ao sul c esquece que o Infante entregou a sua colonização aos descobridores, não sen- do portanto a falta de idoneidade a razão porque o mesmo não fez para os Açores. Sucessivamente vai criticando e pondo de parte diversas hipóteses, para concluir que, ao certo, nada se pode saber e afirmar. A data de 23 de Abril de 1445 para o descobrimento, com tanta precisão fixada por Soares de Albergaria, não é aceitável, pois não diz como a achou. Cordeiro oferece-Ihe noutros passos, como a época da vinda de Alvaro Martins Homem, fundados reparos. Nos Apontamentos analisa com imparcialidade e isenção notá- veis os estranhos episódios do Cerco do Castelo em 1641 e tenta explica-los. O estado da ilha, a acção do governo local depois da Restaura- ção, a situação da agricultura, o viver ostentoso da gente rica, os tumultos c desordens populares são narrados com escrúpulo e verdade- Notável é a crítica do Governo-Geral até Araujo, e nos Apon- tamentos encontram-se apreciações e notícias que ninguém mais nos dá. O talento e a superior cultura do distinto educador forneceram- -Ihe uma justa visão da história, e o modo como escreveu o seu pe- queno mas precioso livro, destinado a ser lido pela juventude, que ela ainda hoje pode e deve ler com incontestável proveito, confere-lhe o direito à nossa gratidão e a ser relembrado pelo Instituto que em particular se dedica ao estudo da história local. Homenagem ao Dr. Henrique B raz

Palavras do Presidente do Instituto na sessão de homenagem à memória do Dr. Henrique Braz, no aniversário do seu falecimento, cuja acta vai publicada noutro lugar.

Meus Senhores:

Não era a mim que cabia falar nesta sessão do nosso saudoso consócio Dr. Henrique Braz. Rasões, porem, a todo o ponto atendíveis, que certamente mais do que a nós a ele penalizam, impediram o nosso consócio sr. Dr. Elmiro Mendes de se desempenhar do encargo que lhe fôra confiado e, por força das circunstancias, em mim veio cair. Sinto o facto por V. Ex.as que ficarão privadas de ouvir o sr. Dr. Elmiro Mendes com a sua linguagem elegante e castiça a que se alia a excelencia duma primorosa dição; por mim, que nunca poderei substitui-lo; e pela memória de Henrique Braz que não terá a merecida consagração por todos nós desejada Ha na personalidade multímoda do Dr. Henrique Braz vários aspectos a considerar: — o político, o administrador local, o parlamen- tar, o profissional ; a par do homem culto, poeta, prosador, estilista, oiador, jornalista, sempre esteta, enamorado de beleza e ansioso de perfeição. Embora todos se harmonisem e completem dando a visão integral 188 BOLFTIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

do homem, e n justa medida do seu altíssimo valor, só dos últimos aqui me ocuparei. Cedo começou a manifestar decidida vocação literária. Ainda es- tudante liceal estreou-se com um pequeno livro de versos — Vogidos. A maioria dos escritores, quando atingem a plenitude do seu desenvolvimento, icpudia os escritos da mocidade. Coram perante as inevitáveis deficiências e incorrecções que lhes notam, e julgam-nos indignos de si. Não sei se fazem bem se mal. Sei, e isso me basta, que quem qui- ser estudar a obra que nos legaram, precisa te-los em conta, pois é ne- les que geralmente se revelam as tendências naturais do seu espiíito e muitas vezes se manifestam as qualidades mais características do ho- mem c do seu labor intelectual. Se perdem em perfeição e equilíbrio, ganham infinitamente mais em sinceridade. Não têm ainda a cultura e a ponderação dos trahadios de outra idade, a abafar o que é natural e expontâneo. Isto sucede com os Vagidos. Ao lê-los impressiona-nos logo a falta da influência saliente, de- cisiva, dum autor favorito tomado para modêlo, Junqueiro, por exem- plo, tão querido já então dos jovens poetas, o grande sedutor tido como ideal de perfeição, não o avassalou. E isto não é porque o poeta manifeste uma originalidade vincada. Ha influências evidentes, mas não de um, de muitos poetas lidos com entusiasmo, assimilados e fundidos no seu espírito. Henrique Braz já era, não o homem dum só livro, mas o homem de muitos livros. Supreende numa obra poética de^streia o cuidado com a forma. Não ha versos frouxos nem errados, deslizes de metrificação, dureza, esforço visível, e, sem embargo de leves hesitações técnicas, tudo pa- rece fluente, expontâneo, sonoro, musical, bem ritmado. Sirva de exem- plo a pequena poesia — As Nuvens :

Vão as nuvens pelo espaço, Cerúleas, nêgras, sombrias, Austeras voando a passo Como tristes cotovias, Vão as nuvens pelo espaço. DA ILHA TERCEIRA 189

Atrnvez esse negrume O céo azul é tão lindo, Tão lindo que em si resume Um canto de amor infindo, Atrnvez esse negrume.

Não ha irrupções líricas nem paixão dominante, imagens que cho- quem pelo inesperado, exageros sentimentais, estados de alma desor- denados, tudo é equilíbrio. Mais visual que sentimental, mais objectivo que subjectivo, o poeta encontra inspiração no que o cerca, ou em situações em que se encontra. Canta o amor, mas nunca é o cantor petrarchiano duma Laura ou dantesco duma Beatriz ; obedece a solicitações de momento e torna-se impossível identificar a inspiradora que parece variar com a ocasião. É um amor indefinido e vago, volúvel, talvez um pouco egoísta, mas sempre sincero. Tudo isto se encontra na obra subsequente do escritor. Henrique Braz não era um poeta no verdadeiro sentido da pala- vra. A sua sêde insaciável de beleza arrastou-o naturalmente para a poesia sem obedecer contudo a um imperativo categórico do seu es- pírito, e daí trocá-la em breve pela prosa, se bem que no intimo, ocultamente, a cultivasse toda a vida. Aos ritmos estreitos do verso preferiu os ritmos largos duma prosa expressiva, cantante e sedutora, de formas amplas e variadas, capaz de traduzir os sentimentos e as ideias com a beleza que não dispensava em nada. Orador alia a frase elegante e correcta, clara e insinuante, a um alto poder de sugestão. A sua figura simpática, atraente, a sua voz bem timbrada quase de cantor, a sua dicção perfeita, o convencimento pes- soal daquilo que queria transmitir aos outros, dava-lhe ascendente formidável sobre o auditório e domínio das almas. Escritor seduzia pelo estilo que atinge a culminância da perfeição no Longe do meu horizonte, impressões de viagem pela Europa, que foi levado a empreender, porque «viajar é um acto de cultura, de gosto artístico». Poder-se-a notar-lhe certa artificialidade proveniente da rebusca de harmonia e equilíbrio, uma sobreposse de cuidado formal, em pre- juízo da expressão das ideias. Talvez dele se possa dizer o que os 190 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

gregos diziam dos discursos de Demóstenes, cheirarem ao oleo com que tinham sido polidos. Mas que encanto nessa prosa perfeita, plás- tica, sonora, bela por si só como um poema, onde existe «alguma cou- sa de cristalino, de aveludado de ondeante, de marmoreo, que só por si plasticamente realizasse uma absoluta beleza»; «uma prosa como ainda não ha». (Fradique Mendes). A semelhança dos simbolistas, as palavras têm para Henrique Braz uma beleza própria imanente da sua sonoridade sem relação com o significado ; por isso a sua linguagem se esmalta de vocábulos raros, luzindo como preciosas gêmas, cascalhando alácres como garridas em toque de pingentes sinos. Pela sonoridade se explica o emprego de palavras como estorce- gar, liniforme, pútrido, juncado, horridamente, pandemónico, garrula, cm vez dos sinónimos vulgares e correntes, e frases como «figurinha esbelta de irreal formosura, irradiando alento, amor, vitalidade». Quem souber a sua predilecção pela música terá a justificação do facto. Sem ser executante, educou-se por modo a tornar-se ouvinte es- clarecido capaz de sentir e compreender o que ouvia. Não era exclu- sivista. Procurava descobrir os progressos da arte e o esforço dos modernos compositores para enriquecerem o património herdado de novos meios expressivos. O mesmo em pintura, em escultura, em literatura campos por on- de passeava o seu espírito de esteta. As mais belas páginas do Longe do meu horizonte são, pelo menos para mim, aquelas em que nos fala de arte, sobre tudo quando a obra contemplada desperta as recordações históricas armazenadas na memória pela vasta e polimórfica cultura. Um dia, fervoroso leitor de história, Henrique pensou faze-la e pôs-se em contacto com os historiadores locais. Convidado para uma conferência na Camara Municipal da Praia da Vitória, tomou o tema dos sacrifícios, por vezes heroicos, que a ilha tem feito pela nação e os pequenos benefícios deproporcionalmente deles advindos. Sob o signo do sacrifício. . se intitulou o opús- culo. As fontes de informação de que se socorreu foram os Anais de Drumond e a História do P.e Cordeiro. Lou-as atentamente e logo n DA ILHA TERCEIRA 191

seu espírito arguto deu conta das hesitações e lacunas encontradas. Assim sentiu a necessidade de, por novas investigações, refazer o já feito completando-o, e ir mais alem. Começaram então as suas peregrinações pelos arquivos. Henrique Braz trazia para a história todo o seu enorme poder expressivo verbal, a faculdade rara de vivificar e animar o que estava morto e inanimado, uma dialéctica segura afinada no exercício da advocacia, ininuciosidade e honestidade de processos lógicos impostas pelo seu caracter e pela sua ponderação, tudo vendo, pesando, medin- do antes de tirar conclusões, nada afirmando sem cautela ou mesmo conjecturando sem base sólida. E trazia mais a posse dos métodos históricos adquiiida em atentas e diuturnas leituras dos mestres histo- riadores A boa estrela dos que sabem investigar — quem bem procura sempre encontra dizia D. Carolina Michaelis — deparou-lhe novos elementos e novos documentos. Esludou-os, criticou-os, comparou-os, e eles revelaram-lhe factos e aspectos nunca dantes suspeitados. Leve a felicidade de encontrar, e de quanto ela o alegrou sou testemunha, os testamentos de Pero de Barcelos e Inez Gonçalves, in- frutífera e afanosamente já procurados por muitos, analisou-os, inter- pretou-os e caiu na época confusa dos descobrimentos. Leu tudo o que havia, cronistas, historiadores, documentos, descobriu por seu turno cousas novas, corregiu e emendou erros, tirou conclusões, João Fernandes Lavrador, Diogo de Teive, os Cortes-Reais juntaram-se ou- tra vez a Pero de Barcelos nas viagens e explorações para oeste. Surgiram-lhe contraditores e dos mais temíveis, mas garbosamente, com a segurança de quem sabia o que tinha dito, manteve os seus pontos de vista. Não lhe faltaram igualmente os aplausos e os estímu- los dos competentes, entre todos o do egrégio Dr. Joaquim Bensaude que sobremaneira presava. Ponto nubeloso da historia terceirense é o cerco do Castelo e a Restauração, e se aí não fez investigações tão profundas procurou compreende-lo e esclarece-Io. Tendo reunido quantidade inacreditável, assombrosa até, de ele- mentos inéditos, escreveu as /iuas da Cidade, onde a propósito dos nomes delas nos surge a vida do burgo desde o seu inicio. Para mim é este o seu melhor trabalho histórico. 192 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Sobre história citadina é o melhor, poderia talvez dizer o único, que temos e poucas cidades, incluindo Lisboa, possuirão no género obra tão completa, tão copiosamente documentada, tão viva e colorida. Bem sei que um leitor exigente poderá notar certa dispersão es- cusada, excorsos e digressões afastadas do principal assunto. Isso, todavia, se por um lado pode ser defeito, por outro é virtude, visto animar o conjunto e, quando escrito na linda prosa do autor, é um encanto, um autêntico regalo espiritual, Henrique Braz comprazia-se na descrição de episódios aventurosos. Observava-os, reconstituia-os, explicava-os, mas erra quem suponha nisso uma feição sensual e libidinosa do seu espírito. A sua vida mo- rigerada, sem aventuras, desmente-o completamente. Ha apenas um requinte estético, uma curiosidade benevolente, uma tendência a bem compreender para bem justificar e desculpar. Não é um moralista rígido e às vezes, como tantos outros, postiço. É um cronista benigno, um esteta em busca do sentimento que foi, é e será sempre o maior gestor das grandes obras de arte. E maravilha como o seu espírito equilibrado e afeiçoado pela cultura pôs o seu incontestável e brilhante talento literário ao serviço da história, valorizando-a, sem que uma só vez a imaginação desfigu- rasse a verdade. Investigou com o escrúpulo e rigor dum homem de ciência, ani- mou o resultado com as qualidades do homem de letras. Foi no nosso Boletim que sairam as Ihias da Cidade e alguns dos seus mais profundos estudos, e bastaria o facto para justificar a homenagem do Instituto à sua memória. Outras razões ha, porem, a acrescentar. Desde a primeira hora Henrique Braz deu-lhe um esforço, uma dedicação, uma actividade, que mesmo os que melhor o conheciam estavam longe de esperar. Já doente, enfraquecido, não faltava a uma reunião ainda com o mais desabrido tempo, e por sua vontade rtuniamo-nos todos os mêses ou até todas as semanas. Falava-nos dos seus estudos, queria saber opiniões sobre assun- tos que, aliás, conhecia melhor que ninguém, ouvia atento o que lhe diziam, aceitava contraditas e sugestões, fazia-as por seu turno num raro espírito de colaboração. DA ILHA TTiRCP.IRA

Segundo o seu justo critério o Instituto não consagrava, fornecia elementos de trabalho e dava possibilidades de publicidade. Pertencer a ele não representava uma honra, mas um encargo e um compromis- so. Aberto a todos quantos quizerem trabalhar só lhes exige honesti- dade de processos e desejo de ir mais alem do que antes se tenha ido. Assim como pensava assim procedia; e preferiu a investigação à sínteze, a monografia à obra vasta de conjunto. Muito lhe ficamos devendo. Não se pode aplicar-lhe o lugar comum de que a sua vida fosse ceifada em verdes anos. Entrara já na casa dos sessenta; mas muito podia ainda utilmente viver, pois, embora o corpo alquebrado, enfer- miço, lhe não permitisse grandes esforç-os, o espírito moço e vivaz que albergava muito podia de bom e util produzir no campo sereno da investigação para onde fugia nas horas de ócio. Morreu quando ia dar vida e forma a numerosos elementos pa- cientemente reunidos. As Haas da (.idade quedam incompletas; artigos e ensaios já delineados sem a redacção definitiva que cuidadosamente lhes daria. Fica-nos o que escreveu e publicou, e se é infelizmente pouco em quantidade, é muito, muitíssimo na qualidade. Fica-nos mais o seu espírito orientador, o exemplo da sua dedi- cação ao Instituto, a dôce recordação da sua amisade, a lembrança saudosa da sua convivência, da sua colaboração nunca regateada, da sua figura insinuante e superior, da sua afabilidade reservada, da dis- tinção das suas maneiras, da sua alma bondosa de eterno enamorado da beleza. Fica e ficará na memória de quantos algum dia trabalharam com ele nesta casa, e para afirma-lo solenemente, se reúne hoje o Instituto nesta descolorida mas sincera homenagem. 194 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Palavras do sócio 1'encnle-coronel José Agoslinho :

O falecimento do Dr. Henrique Braz coincidiu com um período em que os meus deveres profissionais me obrigaram a deslocar-me com frequência daqui, e por isso, nem pude assistir ao seu funeral, nem estive presente na reunião do Instituto em que foram tomadas resoluções sobre o modo de levar a cabo uma justa homenagem à sua memória E, que rnais não fosse senão para explicar a minha ausên- cia, eu não deveria ficar hoje calado. Ha porem outros motivos para que eu diga alguma coisa, embora pouco — muito menos do que aquilo que teria vontade de dizer. É que por circunstâncias várias esta sessão não pode ter, nem o brilho, nem a amplitude, que os amigos que o Dr. Braz tinha no Instituto, desejariam dar-Ihe e eu não devo deixar de secundar, de maneira bem ostensiva, os esforços que o nosso pre- sidente, Dr. Luis Ribeiro, tem feito para que ela se não apague de todo. O elogio do Dr. Luís Ribeiro, só por si, teria aliás contentado o espirito do nosso saudoso consócio, se ele pudesse ouvi-lo, porque ele era muito especialmente sensível à sinceridade e à amizade vincada na alma 0 não simplesmente nas palavras. Seria por outro lado atrevimento demasiado da minha parte que- rer acrescentar mais qualquer coisa ao que o nosso presidente já disse, tanto mais que uma boa parte da actividade do Dr. Henrique Braz se desenvolveu num campo que me é totalmente extranho. Isso não impede no entanto que eu pague aqui o meu tributo à sua memória, embora duma maneira bem modesta, que de modo algum se coaduna com o que merece um homem que era estruturalmente um esteta, um cultor da perfeição, a quem repugnava fundamentalmente tudo o que fosse imperfeito e improvisado. Mas não me esqueço por outro lado do apreço que ele tinha pe a sinceridade e pela justiça, a repugnância que lhe causavam os elogios a ordem e os salamaleques de encomenda. E foi isso que me animou a vir ler-vos estas breves linhas, em que pús sobretudo a in- tenção de ser fiel tanto quanto possível às minhas reminiscências. Dr' H^rique Braz era mais adeantado d» que eu em idade e DA ILHA TERCEIRA 595

em estudos. Quando fui para o liceu, ali em S. Erancisco, ele ora já crescido. Teria uns dosásseis anos, mas tinha já o porte de um homem feito. Sempre vestido com esmero, falando mansamente, mas com de- cisão, merecia a atenção dos mais novos e dos mais velhos. Nem enfatuado, nem pretencioso. Aquela linha esmeradamente correcta, que nós lhe conhecemos até à morte, ele já a tinha quando era aluno do liceu. Nunca ninguém o viu retouçar como os outros, nem dizer palavrões. Contudo nao era um tímido, nem um contempo- rizador. Débil de forças, defendia-se com o brilho do seu espírito, com a mordacidade da sua ironia, flagelando sem piedade a estupidez ar- rogante e a injustiça. Voltámos a encontrar-nos no liceu de Lisboa. Ele brilhava entre os duzentos e tantos alunos da sua classe e ainda hoje, entre os nos- sos contemporâneos do liceu de S. Domingos, aparece, uma vez ou outra, quem por ele me pregunte. Nas aulas de literatura ele destacava- -se com outros alunos, que depois vieram a ter nome nas letras naci- onais. Colaboiava assiduamente na «Alma Académica», um dos mais bem feitos jornais de estudantes que tem aparecido neste país. As suas qualidades de orador suave e delicado, mas sempre im- pressivo e preciso, faziam dele porta-voz dos estudantes. E era já então um gosto ouvi-lo, ordenando as ideias com a sua inteligência fulgiu ante, esmerando-se nas imagens, ritmando as palavras, num brotar sereno e cadenciado de ideias. Apartámo-nos durante alguns anos, seguindo rumos totalmente diferentes. Ele foi para Coimbra, tirar o curso de direito, eu para a Escola Politécnica Topámo-nos dois anos mais tarde, por ocasião da greve académica do tempo de João Franco, em que ele marcou a sua atitude digna e inti ansigente, mantendo-se fiel à atitude anteriormente tomada pela Academia e saindo limpo daquela crise que deixou mal ferido o prestígio de uma parte da mocidade coimbrã daquele tempo. Só volvidos bastantes anos é que tornámos a ter um contacto mais apertado.Não esquecerei no entanto que após a primeira guerra mundial, quando eu e outros, que em França havíamos sofrido as inclemências duma campanha duríssima, andavamos quasi esquecidos, o Dr. Hen- rique Braz não perdia oportunidade de manisfestar o seu apreço e a sua admiração pelo nosso esforço, A sua delicada sensibilidade não podia ficar indiferente perante aquilo que, aos seus olhos se afigurava 196 BOLF.TIM DO INSTITUTO HISTÓRICO a cuníimiidadc das tradições lieróicas da nossa ilha, efectivada pelos combatentes tcrceirenses da França e da Africa. Foi porem ha oito anos, quando ambos aceitámos fazer parte da Junta Geral do distrito, que começámos de novo a viver mais em contacto. Um motivo comum nos levara a ambos a aceitar tal função : aproveitar da boa maré, em que havia entrado a administração do país, para procurarmos alcançar um quinhão dessa prosperidade, para a nossa terra, para o nosso distrito. Trabalhámos aqui em cooperação com o Dr. Ramiro Machado, com o Dr. Candido Pamplona c com outros patrícios, igualmente ani- mados do mesmo fervor de promover o ressurgimento do distrito. Todos nós conservamos a melhor recordação desse período de cola- boração elevada, orientada quasi acadcmicamente para um estudo dos problemas do distrito, em que tudo era apontado, medido e discutido, sem que em qualquer de nós se pudesse discernir o menor vislumbre de um intuito reservado, sem que algum estivesse a apontar ao alvo que a ambição pessoal traiçoeiramente estivesse a mostrar-lhe para alem do puro interesse das nossas terras e da nossa gente. O Dr. Henrique Braz muito contribuiu para o bom êxito dos nos- sos esforços, coioados sempre por resoluções tomadas por unanimi- dade e que incontestavelmente libertaram a Junta Geral da atmosfera de desconfiança em que até ali havia vivido. Injustamente, acredito, em homenagem à honestidade e às boas intenções dos que até ali haviam feito parte deste corpo administrativo, Mas pura verdade- O conselho, o conhecimento desenvolvido das questões, relacio- na com a administração da Junta Geral, e o prestigio pessoal do Dr. Henrique Braz, contribuiram muito para mudar o rumo à administra- ção da Junta, encaminhando este corpo administrativo para uma nova orientação que sem dúvida é que preparou o terreno para todos os grandes benefícios que através dela mais tarde começaram a chegar para o distrito de Angra. Algumas vezes em interinidade exerceu o Dr. Henrique Braz a presidência da Junta Geral. E, como membio da comissão executiva, tive ocasião de apreciar o escrúpulo que ele punha no estudo de to- das as questões que vinham à discussão, a sua meticulosidade, o seu cuidado em que tudo fosse deliberado por forma a ficarem salvaguar- dados os interesses da Junta, a cumprirem-se todos os preceitos da DA ILHA TERCEIRA 197 lei, de modo que não houvesse justos motivos para queixas nu recla- mações. Isso estava aliás dentro do seu espirito de homem de leis e do seu feitio de pessoa que ambicionava sempre a perfeição, desde o es- tilo que empregava nos seus escritos até à encadernação das obras da sua biblioteca. O seu último interesse e a tarefa a que ele concedeu o resto da sua fé não desiludida, foi a este Instituto Histórico, onde hoje lhe es- tamos prestando homenágem. Havia anos já que o Dr. Henrique Braz ocupava parte do seu tempo em compilar apontamentos sobre o passado da nossa gente. Esta gente da Terceira tem sido refervida em episódios de aventura, de romance, de piedade, de heroismo, desde os seus fundamentos. Quem quizer, hoje mesmo, ter as provas disso, bastar-lhe-á abrir os olhos e observar. E felizmente não nos falta quem o faça. Quem preferir mergulhar no passado, embrenhar-se nos papeis velhos, terá a vantagem de achar os episódios já despidos da vulga- ridade e terá ainda a seu favor o facto de poder suprir e alindar com a imaginação aquilo que a tinta dos documentos não conservou e so a tradição ou o ambiente deixam entrever. Este aspecto da nossa vida quadrava admiravelmente ao feitio de Henrique Braz, que era a par de tudo, um sonhador e um poeta. Daí o brilho das conferências que sobre assuntos do nosso passado heróico ou romanesco, ele fez na Sociedade Recreio dos Artistas, para só citar as mais recentes. Por isso ele tinha especial estima pelos documentos antigos e constante preocupação pela sua conservação, um receio quase doentio de que fosse perder-se qualquer coisa que apagasse algo da nossa vida agitada ou subtil do passado. Nesse desejo, que ele não perdia ocasião de formular e que mui- tas vezes repetia em reuniões da Junta Geral, veiu em grande parte a fundamentar-se a criação do Instituto Histórico, nascido por geração espontânea no seio da Junta Geral, quando ele já não fazia parte desta corporação, mas a que ele deu imediatamente o melhor acolhi- mento. E através do Instituto com base no mesmo intuito veiu afinal a criar-se agora o Arquivo Distrital, que o Dr. Henrique Braz já não poude ver instituido, mas que ora uma das suas mais acalentadas as- pirações. 198 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

O quu o Instituto deve ao Dr. Henrique Braz di-lo com mais au- toridade do que ninguém o nosso Presidente. Todos nós recordamos com saudade a sua presença, a finura das suas observações, a clareza e brilho com que nos trazia aqui o produto das suas investigações. E até a veemência com que repreendia a falta de assiduidade de muitos dentre nós, o seu anseio para que a nossa vida fosse mais preenchida de actividade, que se multiplicassem as reuniões. O Instituto nestes últimos tempos era para ele uma preocupação preponderante, emquanto que para nós — excepção feita do Dr. Luís Ribeiro — ele não pôde passar de um violino de Ingres, que as exigências da nossa vida não deixam tocar senão de raro em raro. Se a alta inteligência do Dr. Henrique Braz e o brilho do seu espí- rito, a par com o grande amor à sua terra, são um motivo de grande admiração para nós todos, esta dedicação pelo Instituto, que proposi- tadamenie deixei para ultima menção, constitui grande motivo de res- peito pela sua memória e o exemplo que neste momento mais opor- tunamente podemos apontar aos nossos consócios e a todos quantos estão interessados na nossa tarefa. Di.sse. Carfas de Filipe I e Filipe II

ao Bispo D. Pedro de Casfilho

Pelo Di. Manuel Coelho Bapfisla de Lima

No dia 19 de Março de 1576 faleceu repentinamente, quando se encontrava na sua Catedral, o Bispo de Angra D. Gaspar de Faria. (') A escolha do sucessor deste prelado que se nos apresenta como homem prudente, apaziguador e virtuoso, parece não ter sido muito fácil. Foi pelo menos demorada, pois só em 4 de Julho de 1578 foi D. Pedro de Castilho confirmado nesta Diocese pela Bula de Gregório xni (Iratie divine premiam. (') Era D. Pedro de Castilho filho de Diogo de Castilho e de D. Isabel Ilharco. Seu pai era neto de João de Castilho, espanhol que viera rezidir para Portugal e descendente da casa nobre de Castilho Pedrozo, nas Astúrias. O mesmo acontecia com sua mãi, que era filha de João Ilharco, biscainho que viera com a sua barca vender ferro ao Porto e aqui sc fixara. (') Eram ambos de condição modesta e

(') Cf. Francisco Ferreira Drumoml, Animes da Il/ia Terceira, Tomo I, pág. 108. Angra do Heroísmo, 1850. (2) Corpo Diplomático Português, vol, X, pág. 541, Transcrevemos adiante este documento, sob o número (I). (') Felgueiras Gayo, Nobiliário de Famílias de Portugal, vol. IX — Braga, 1939. Cristóvão Alão de Morais, Pedafura Tusitana, Tomo III vol, 2,' pág. 405 Porto, 1945. 200 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Diogo de Castilho exercitava o oficio de mestre das obras em Coim- bra, onde parece ter nascido seu filho Pedro, a julgar pelos registos universitários. Em data anterior a 15G1 malriculou-se em Artes na Universidade de Coimbra, pois neste ano provava já ter o tempo requerido para Bacharel. Com efeito este grau foi-lhe conferido a 24 de Fevereiro de 1561 e o de Licenciado a 30 de Abril do ano seguinte. Matriculou-se depois um Cânones, apresentando provas dos cur- sos de 1565 a 1570. Foi Bacharel nesta Faculdade em 1568 e Licenci- ado em 1572. (') Segundo D. Antonio Caetano de Sousa teria obtido o grau de Mestre em Artes e teria estado matriculado em Teologia, antes de in- gressar na Faculdade de Cânones. Não encontrámos, porém, na rápi- da busca a que procedemos, os termos correspondentes, nos respec- tivos livros de registo. (') Exerceu depois os cargos de Prior da Igreja de S. Salvador de Ílhavo c deputado do Santo Ofício da Inquisição de Coimbra, por mercê do Cardeal D, Henrique, sendo nomeado em 16 de Fevereiro

f1) Arquivo da Universidade de Coimbra, livros dos Autos Grãos e Prouas de Curso, dos anos de 1561 a 1572. Para melhor elucidação do leitor sobre a acti- vidade académica de D. Pedro de Castilho, damos o quadro cronológico dos seus estudos universitários ; Faculdade das Artes 1561 — Provas para Bacharel. 1561 — Maio, 24 — Grau de Bacharel. 1562 — Abril, 23 — Provas para Licenciado. 1562 — Abril, 3U — Licenciatura. Faculdade de Cânones 1565 — Outubro, 1 a 1570 — Julho, 31 - Prevas de Curso. '567 — Novembro, 18 — Conclusões do 6.° Ano. 1568 Junho, 25 - Grau de Bacharel 1572 — Fevereiro, 7 ~ Lição de Suficiência 1572 — Maio, 27 — Repetição 1572 — Junho, 23 — Exame Privado 1572 — Junho, 29 — Licenciatura. (T Cf. D. Antonio Caetano de Sousa, Catalogo dos Bispos da Igreja de S. Salvador da Cidade de Angra, in "Collecção dos Documentos e Memorias da Academia Real da Historia Portuguesa». 1722, Tomo I. Lisboa, 1722. DA ILHA TERCEIRA 201

de 1575 visitador da Diocpse de Coimbra, de que era Bispo D. Ma- nuel de Menezes. (') Embora D. Antonio Caetano de Sousa diga que passou à Ilha Terceira «pelos annos de 1577» (-') e Ferreira Drumond anote a sua chegada em 1578, C) podemos agora precisar, confirmando o Dr. Gaspar Fructuoso ("i, que ela oconeu depois de 18 de Janeiro de 1579, pois um alvará régio desta data, passado pela Chancelaria da Ordem de Cristo diz : ».. .q dom p.0 de Castilho bpo dangra tenha e aja em cada hum Anno do dia q partir desta cidade de Lx.a p.a o seu bpdo .» (■•) Por não nos parecerem completamente desprovidos de interesse para a história da Igreja nos Açores, transcrevemos, no fim desta intro- dução, este alvará e tres outros em que o Rei, como Governador da Ordem de Cristo, fixa os ordenados e os direitos do novo prelado. (6) Trouxe D. Pedro de Castilho na sua companhia o virtuoso padre. Frei Jorge, da regra de Santo Agostinho, que no dizer do Dr. Gaspar Frutuoso, era tam puro na religião, como versado nas letras. Precisamente no ano anterior, e por carta regia de 15 de Maio, foi provido no cargo de Corregedor o Dr. Ciprião de Figueiredo de ' Lemos e Vasconcelos (7) a quem foi dado regimento com alçada so- bre todas as Ilhas dos Açores, contendo nos seus desasseis capítulos poderes mais amplos dos que haviam sido conferidos aos seus ante- cessores.

(') Idem, ibidem. P) Idem, ibidem. l3) Francisco Ferreira Drumond, Ob. cif., Tomo I, pág. 177. Angra do Heroísmo, 1850. O Saudades da Terra, in «Dois açoreanos no Governo Interino» por Antonio Ferreira de Serpa, in Arquivos da Universidade de Lisboa, vol. IV, pág. 263. Lisboa, 1917. (5) Chancelaria da Ordem de Cristo, Livro 4.°, fols. 116. Transcrevemos este documento sob o n.0 (V). (c) Vid. adiante, documentos n.0s (II), (III), (IV) e (V). (7) Era natural de Aveloso e filho de Sebastião Gomes de Figueiredo e de sua mulher D. Antónia Fernandes de Vasconcelos. Seu pai fora familiar do Bispo de Lamego D. Fernando de Vasconcelos e Menezes e ele próprio parece ter per- tencido à criação do Conde de Vimioso. Cf. Cristóvão Alão de Morais, Pedatura Lusitana, Tomo 1, vol. 2 °, pág. 202 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Era Ciprião de Figueredo magistrado íntegro, zeloso e observador inflexível da lei que fazia cumprir sem esquecer a prudência e a bon- dade sempre necessárias ao bom juiz. D. Pedro de Castilho aparece-nos, a julgar pelos documentos conhecidos, como um prelado zeloso, grande defensor dos interesses da sua Diocese, mas impulsivo e por vezes obstinado, embora Gaspar Frutuoso, que parece ter-lhe tributado sincera afeição ou reconheci- mento, nos diga que «foi sempre muito manso e recolhido, dando mostras de bondade e virtude». () O seu temperamento levava-o com frequência, não obstante a sua formação jurídica, a uma interpretação errada das leis, invadindo a jurisdição do ordinário. Daqui a luta sem tréguas entre o Prelado e o Corregedor, que logo se inicia no ano de 1579. A primeira questão ori- ginou-se no facto do Bispo ter mandado prender no Aljube Simão Afonso, Manuel Gonçalves Machado e Diogo Afonso, contra os quais mandou instaurar cinco processos no tribunal eclesiástico, por adulté- rios e outros casos de mixti fori. O corregedor estranhou-lhe o pro- cedimento e fez-lhe notar que pelos delitos apontados não os poderia mandar prender sem prévia admoestação, como determinava o Cap. 8.", sessão 24 do Concílio de Trento. Depois duma troca de alegações mútuas, em que o Bispo e o Corregedor pretendiam defender os seus direitos e privilégios, foram os autos enviados por este ao desembargo do Paço, onde depois de tudo visto se determinou que o prelado só poderia proceder à prisão dos réus, através do ordinário, e depois de proferidas as sentenças condenatórias, «e não o querendo fazer (o que de vos se não espera) eu proverei no caso como for justiça». Sobre outras infracções e vio- lações da jurisdição ordinária advertia-se : «nem outrossim vos intro- mettereis nas fintas das obras das egrejas pellas ditas cousas vos não pertencerem : e não o querendo vos bispo fazer (o que de vos se não espera), mando às justiças nom cumpram vossas sentenças, cen- suras, nem procedimentos; e o dito corregedor tera muito cuidado,

(') í)r, Gaspar Fruhioso, Saudades da Terra, loc. cit. pág. 251. DA ILHA TERCEIRA 203 em saber como vos dito bispo e officiaes, usam da jurisdição ; e não consentira que se intrometam na minha», (i) Ainda este acordão não fora proferido, já novo litígio se esta- belecera entre as duas autoridades. D. Pedro de Castilho por várias vezes procurara obrigar os ofici- ais da justiça secular a revelar-lhe os segredos do seu foro, recorrendo para este efeito a vários meios, desde a excomunhão à prisão no alju- be. Desta violação da jurisdição secular o corregedor havia já feito agravo em 29 de Março de 1579. Porem, a mais grave de todas suce- deu com o tabalião da Vila da Praia, Francisco Lagarto Lobo, a quem obrigou com várias ameaças a vir à cidade para lhe revelar a matéria confidencial dos autos que levantara com o juiz daquela Vila, foão Cardoso Machado, intimando igualmente a este para idêntico fim, ao que ele se recusou. Perante a recusa deste magistrado o Bispo não hesitou em man- da-lo excomungar na sua própria Vila, no domingo seguinte, depois da missa e, na cidade, por anúncios, pregões e notificação ao próprio Corregedor. Perante estes acontecimentos o corregedor organizou um proces- so de que mandou dar vista ao Prelado, solicitando ao mesmo tempo a sua justificação, se ele assim o entendesse, para com os outros do- cumentos remeter ao desembargo do paço. Escusou-se D. Pedro de Castilho do conhecimento deste agravo, declarando que isso pertencia ao tribunal eclesiástico, do que se fez assento e tudo foi enviado ao juizo dos feitos da coroa. No dia 6 de Agosto de 1580, ainda D Antonio se encontrava em Lisboa, novamente o desembargo do paço se pronunciava contra o Prelado, pelo acordão de que transcrevemos o seguinte período : — «o que tudo visto c o mais dos autos, mandei que se passasse carta, por que vos rogo e encomendo, não queiraes compellir ao dito cor- regedor supplicante e mais officiaes, vos mostrem os autos e segredos de justiça, e levanteis vossos procedimentos e censuras, e não o que- rendo vós Bispo fazer, o que de vós se não espera, mando às justiças

(') Francisco Fcrreita Dinmnnd, Oh. cit. Tomo I, pág. 668. Angra do Heroísmo, 1850 204 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

seculares não obedeçam a vós dito Bispo nesta parte, nem cumpram vossas censuras e excomunhões». (') Não ficaram por aqui as discórdias entre as duas autoridades pelo contrário agravaram-se ainda com o célebre caso de Margarida Alvares. Tendo havido denúncia contra esta mulher, que era leiga e sol- teira, no tempo do corregedor Diogo Alvares Cardoso, mandou este magistrado proceder a uma devassa de alcouce, alcoviteiras, aman- cebadas, feiticeiras e outros casos, mas nada se tendo provado foi a acusada posta em liberdade, sendo-lhe passada carta de seguro. Margarida Alvares temia, porem, ser encomodada pelas justiças eclesiásticas, por isso requereu que se fizesse notificação ao respectivo juizo. Mas, como esta demorasse e entretanto tivesse notícia que as referidas justiças tinham ordem para a prender, recorreu à protec- ção do corregedor declarando que havia quebrado os termos da carta de seguro. Esta autoridade não fez esperar as suas providências e logo passou mandado de captura contra a declarante, tendo encarregado desta deligência o escrivão Braz Nogueira qne se fez acompanhar dos oficiais Francisco da Mota e Álvaro Pires, E tendn-a estes prendido na sua própria residência, encontraram-se à porta com a justiça ecle- siástica, que ali ia para o mesmo fim, sob as ordens do escrivão Ma- nuel Bastos, o qual invectivou e desrespeitou a justiça secular, alegan- do que a presa lhe pertencia e que já andavam em sua procura. Depois de se alegarem de parte a parte muitas razões e invocarem muitos direitos, o prelado excomungou e condenou o corregedor na multa de mil cruzados para a Santa Sé, condenando igualmente em duzentos cruzados cada um dos oficiais acima referidos. Perante a gravidade desta deliberação, que separava as duas autoridades superiores das Ilhas dos Açores, num momento em que a união de todas as forças e energias se impunha para fazer face ao es- trangeiro que já se preparava para absorver o velho reino enfraqueci- do, o corregedor organizou mais um volumoso processo que remeteu ao juizo da coroa.

(') Francisco Ferreira Drumond, OIí. cif. Tomo I. páç;. 184. Aniíra do Heroísmo, 1850. DA ILHA TERCEIRA 205

O acordão, firmado pelo juiz dos feitos da coroa, Dr. Manuel da Fonseca, vem datado de 21 de Julho de 1580 c, depois de transcrever e resumir as peças do processo diz ; «acordei etc.: Que vistos os au- tos que o supplicante tirou de vós bispo das ilhas e como se mostra, sendo corregedor por bem de seu officio mandar prender uma parte' por culpas que em seu juizo tinha, e estando presa os officiaes do ecclesiastico a quiseram tomar por força ; e por o dito corregedor a não mandar entregar, procederdes contra elle.e o condenardes em mil cruzados não mostrando culpas do dito prezo por que ao juizo eccle- siastico houvesse de ser entregue: e que visto como vós bispo neste caso não podíeis proceder, e procedestes contra o direito e em caso em que não tínheis jurisdicção : mandei passar esta carta para vós dito bispo pela qual vos rogo e encomendo nom procedais neste caso, nem em outros similhantes nesta forma ; e não o querendo vós fazer (o que de vós nom espero) mando as minhas justiças nom cumpram vossas sentenças, nem censuras, nem procedimentos, nem evitem ao supplicante, nem a seus officiaes, nem lhes levem penas do excominun- gado , e eu pioverei nisso como for justiça, e meu serviço ; e por es- ta mando ao dito corregedor faça prender os culpados officiaes do ecclesiastico que por força quizeram tomar a presa, e não a entregue a vos bispo, nem a vossas justiças, não lhe sendo mostrado como ten- des culpas taes por que por direito possa ser presa no dito juizo etc.» (') J Este documento, que Orumond transcreveu do Livro de Regislo da Camara da Praia, foi. 52, levanta um problema. A sentença aparece homologada por Filipe i e vem datada de 21 de Julho de 1580. Mas a este tempo encontrava-se ainda em Lisboa D. António, que só daqui partiu no dia 25 de Agosto depois da batalha de Alcantara. Talvez que esta incompatibilidade se possa explicar admitindo que o documento tenha ficado pendente e aguardando a assinatura rial e que por consequência só tenha tido despacho depois da entrada em Lis- boa de Filipe i. , Convém ainda acentuar que a primeira sentença contra o Bispo

(') tTancisco Ferreira Drumnad, Ob. cit, Tnmo r. ná". F75 — An^ra do Heroísmo, ISííO, 20G BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

D. Pedro de Castilho a que nos referimos, traz a mesma data. Porém, Drumond quando a extraiu do mesmo Livro de fíegisto da Cama- ra da Praia, foi. 51, não copiou a introdução do documento, ou por que ela não tivesse sido trasladada ou porque a julgasse sem interesse. Compreende-se perfeitamente que, mesmo antes da chegada à Ilha Terceira dos tres acordãos a que nos acabamos de referir, o esta- do de tensão entre o corregedor e o Prelado era insustentável. Isto e as cartas de D. Antonio Prior do Crato e da Camara de Lisboa dando noticia da sua aclamação como Rei de Portugal, chegadas em fins de Julho, devem ter determinado D. Pedro de Castilho a abandonar An- gra, onde os ânimos se mostravam muito pouco favoráveis a admitir outro Rei Não estranharemos muito a simpatia do Prelado por Filipe i, se nos recordarmos da sua ascendência espanhola. Ela explica melhor do que uma concepção jurídica da sucessão, como a de D. Jerónimo Osório, puramente intelectual, a sua atitude combativa, levando as ilhas de S. Miguel e Santa Maria a obedecer ao rei estrangeiro e levantando tropas e animando-as na resistência às forças do Prior do Crato, como se fosse não um Bispo mas um general. O certo é que no dia 12 de Setembro de 1580, desembarcava em Ponta Delgada, ido de Angra, o futuro Vice-Rei de Portugal e lugar- -tenente de Filipe i. (l) Até agora pouco se conhecia das relações que o Bispo mantivera com a corte espanhola, durante a sua permanência em S. Miguel. Sa- bia-se que apoiando Ambrório de Aguiar, que Filipe r despachara co- mo governador dos Açores cm 20 de Abril de 1581, havia desempe- nhado papel importante, senão decisivo na submissão das Ilhas de S. Miguel e Santa Maiia ao rei estrangeiro. C) Os seus revelantes serviços

(') Gaspar Fructuoso, Saudades da Terra, Ob. cit. loc. cif. pág. 'A5\, D. Pedro de Castilho permaneceu nos Açores, ou melhor em S. Miguel até ao dia 31 de Agosto de 1582, data em que embarcou em Ponta Delgada na Armada que o Marquês de Santa Cruz organizara para servir de comboio para Lisboa às naus da índia, Gaspar Fructuoso, Saudades da Terra, Livro iv, vol. 3.°, Cap. 100,, pàg. 85. Ponta Delgada, 1931. C) P.e Antonio Cordeiro, Historia Insulana vol. II, Livro vi, Cap. XXV, pág 141. Lisboa. 1806- DA ILHA TERCFIRA 207

haviam-!he grangeado a simpatia e o reconhecimento do monarca, que logo após a sua chegada a Lisboa o propôs para o Bispado de Leiria nomeando-o depois Inquisidor Geral do Reino. D. Prior da Colegiada de Guimarães, Presidente do Paço e Esmoler Mór. Tal era a confiança que depositava na sua fidelidade e devoção à causa de Es- panha, que duas vezes o nomeou Vice-Rei. p) Mas como haviam começado estas relações, qual fora a corres- pondência trocada entre o «Demonio do Meio-dia» e o mais alto repre- sentante da Igreja dos Açores, ignorava-se até agora. Ora, quando metodicamente percorríamos o inesgotável e precioso tesouro documental da Biblioteca da Ajuda, deparámos no vasto espó- lio de D. Pedro de Castilho, com algumas cartas que se nos afigura- ram de interesse para um mais perfeito conhecimento desta época. (G São em primeiro lugar as missivas dirigidas por Filipe r a D. Pedro de Castilho, então Bispo de Angra e residente na Ilha de S. Miguel, que logo lhe oferecera os seus serviços. Por elas se verifica o cuidado

(') Foi-confirmado nesta Diocese pela Bula de Gregório x'11 Oratie divine de 3 de Junho de 1583. Cf. Corpo Diplomático Português, vol. 12, pág. 13. (-) Foi Vice-Rei de 1605 a 1608 e de 1612 a 1614. Embora D. Antonio Caetano de Sousa na transcrição da lápide tumular que outrora esteve na capela de S. Tomás da Igreja de S. Domingos de Lisboa, apre- sente — 31 de Março de 1613 parece ter falecido em data posterior, pois são conhecidos documentos, com a sua assinatura, de 1614 Cf. Afonso Zúquete, Leiria, Subsídios para a historia da sua Diocese mm 172. Leiria, 1945. ' ^ l' D. Antonio Caetano de Sousa, Ob. cit. loc. cif. (') Esta magnifica colecção compõe-se de 23 volumes (5l-vu-5 a 22) de fo- lio pequeno, todos encadernados em pergaminho, contendo cartas e documentos originais e cópias de cartas e documentos oficiais de reis, piincipes, duques, mar- queses, condes, Vice reis, altos dignitários da corte, governadores, Arcebispos, Bispos, Priores e Abades, etc.; todas dirigidas ao Bispo D Pedro de Castilho, entre os anes de 1580 e 1613 Além destes documentos, que andam por alguns milhares, encontram-se ainda minutas e cópias de cartas escritas por este Prelado- toda a vida pública de D. Pedro de Castilho e podemos mesmo dizer, grande parte da vida pública da Nação durante este período, acha-se aqui retratada. Como complemento desta vasta colecção guardam-se ainda na Biblioteca da Ajuda cinco livros de registo das Consultas do Desembargo do Paço, relativos aos anos de 1587 a 1597 (Códs, 44 — xiv — 9 a 141. 208 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO que o Prelado pôs na apologia e defesa da causa de Espanha, a acti- vidade prodigiosa que desenvolveu e a sua ingerência em todos os negócios políticos da Ilha de S. Miguel. Destas cartas se conclui, sem sombra de dúvida, que o Rei o considerava como seu principal repre- sentante nestas Ilhas. O próprio Ambrósio de tudo lhe deveria dar parte e em tudo deveria com ele acordar.' Alem destas cartas outras encontrámos de algum interesse para a Ilha Terceira, enviadas por Filipe ri ao Prelado, quer durante o tempo em que desempenhou as funções de Presidente do Paço, quer durante os períodos em que foi Vice-Rei. Com a publicação destes documentos outro objectivo não tivemos que o de fornecer aos historiadores açorianos mais alguns elementos para os seus trabalhos.

Lisboa, Dezembro de 1948.

Baplifila de Lima. DA ILHA TERCEIRA 209

(D

Bulla do papa Gregorio XIII a el-Rei 1578 — Julho 4

Gregorius episcopus servus servorum Dei Charissimo in Christo filio Sebastiano Portugallie et Algarbioium Regi Illustri Salutem et Apostolicam benedictionem. Gratie divine premium et humane laudis preconium acquiritur si per seculares Príncipes ecclesiarum Prelatis presertim Pontifical! dignitate preditis opportuni favoris presidium et honor debitus impendatur Hodie siquidem ecclesie Angrensis tunc per obituni bone memorie Gasparis olim Episcopi Angrensis extra Roma- nam Curiarn defuncti Pastoris solatio destitute de persona dilecti filii Petri Electi Angrensis nobis et fiatribus nostris ob suorum exigentiam meritorum accepta de fratrum eorundem Consilio apostólica auctoritate providimus ipsumque ílli in Episcopum prefecimus et Pastorem curam et administrationem ipsius ecclesie sibi in spiritualibus et temporalibus plenarie committendo prout in nostris inde confectis literis plenius con- tinetur. Cum itaque fili Charissime sit virtutis opus Dei ministros beni- gno favore prosequi ac eos verbis et operibus pro Régis eterni gloria venerari Maiestatem tuam Regiam rogamus et hortamur attente quate- nus eundem Petrum Electum et prefatsm ecclesiam sue cure comissam habens pro nostra et apostolice sedis reverentia propensius commen- datos in ampliandis et conservandis iuribus suis sic eos benigni favo- ris auxilio prosequaris quod ipse Petrus Electus tue celsitudinis fultus presidio in commisso sibi cure Pastoralis officio possit Deo propitio prosperari ac tibi exinde a Deo perennis vite premium et a nobis con- digno proveniat actio gratiarum. Datum Rome apud Sanctum Petrum 210 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Anno Incarnationis Dominice Millesimo quingentesimo septuagesimo octavo Quarto Nonas Julii Pontificatus nostri Anno Septimo.

Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Maç. 35 de Bulias, num. 33.

dl)

Bpdo dangra

Eu el Rej como g.dor etc. faço sab aos q este alu™ virem que eu ej por bem e me praz pelo asj sentir por serviço de nosso snnor e por desejar q ho carguo pontifical se exerçite com majs autoridade e as dignidades Benefficios e outros carguos ecclesiasticos do bpdo dangra se provejão com facilidade e certa informação como convém a 0 / des/carguo de minha cõsciencia e bom governo do dito bpdo e pela myta cõfiança q tenho de dom p.o de Castilho bpo do dito bpdo e por lhe fazer merçe q daquj em diante com seu parecer e emformação som.te da calidade vida e custumes e suficiência da p.a ou p as q se ouveram de prover das ditas dignidades benefícios e cargos se pase as taes pesoas suas cartas dapsentações em forma ou as prouisões ne- cesarias seg.0 ordenança sem preceder acerq.a dese caso ou esame nem deligencia algfia porq tudo o q tocar ao provim.1" diso espero que o dito bpo fara tam cõpridam.te como delle confio notefico asi aos deputados do despacho da mesa da cõsciencia e ordõs e lhes mando q cõ emformação do dito bpo sem mais esame como dito he façam pasar carta dapresentações ou prouisões em forma as p.as q se ouuerem de prouer de dignidades e benefficios e cargos no dito bpdo dangra na man.ra sobredita e cumprão e guardem e façam intr.a in.te cumprir e guardar este meu alu.a como se nele côthem o q.ai se registara no 1. dos pareceres da dita mesa da cõsciençia e ej por bem que valha e tenha força e vigor como se fose carta f.ta em meu nome p mi asinada e p.da p.ia ch.da da dita ordem sem embargo de qualquer prouisam DA ILHA TERCEIRA 211 ou Regim.t0 em cont.0 M.el franco o fez 6 Lx.a a xxviiij de nouembro de b:c Lxxviij lopo roiz camelo o fez escrever.

(A. N. T. T. Chancelaria da Ordem de Cristo, Livro 4.°, fo!s. 115 e 115 v.").

Eu el Rej como g.or etc. faço saber aos <] este aluara virem q eu ej por bem e me p az cj dom p.0 de Castilho bpo dangra do meu C,0 vença e aja os dozentos mil rs í] sam ordenados ao dito bpdo do dia em íj faleceo o bpo dom gaspar de faria seu antecesor em diante e lhe sejam pagos acusto de minha faz.da no feytor delia da jlha ter- ceira asj e da man.ra q se pagafía ao bpo dom guaspar de faria pia carta de dote e comforme a ella descontando se lhe dos deposites do dito Dote prim.1"0 q deles lhe seja pago cousa algiia quatrocentos Mil rs q p outro meu alu.a Mandej pagar ao dito bpo dom p.0 de Castilho em Rey Gomez de carualhosa meu th.r' moor pa ajuda das desp.as da expediçam de suas letras e se sagrar e fazer prestes pio q mando ao feytor de minha faz.da da jlha terceira q hora he e pio tempo for q de e pague ao bpo dom p.0 de Castilho os ditos dozentos Mil rs de seu dote em cada hfi Anno do tempo em q faleceo o bpo seu anteçe- sor em diante descontando lhe prim ro dos depósitos delles os ditos quatrocentos mil rs q lhe a esa ccnta Mandej pagar como acima he declarado o íjl. pagam.to lhe fara pia carta do dito dotte asj e da man.ra q por ella e p outras prouisões do sfior Rej meu sobrinho q ds tem se paguauam ao bpo Dom gaspar de faria e pio treslado da dita carta e deste aluara q se Registara no 1.° de sua dêsp.a pio escri- uão do seu cargo e c.4» do bpo m.do q lhe sejam os ditos dozentos Mil rs leuados em conta cada Anno q hos asj pagar depois de feito o dito desconto e este alu.a q." valha como se fose caita f.ta em meu nome p mj asinada e aselada com o sello pendente da dita ordem 212 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

sem embargo de qlq.er prouisam ou Regim.t" em cont." Symão boRa- Iho o fez S Lex.a aos dous dias do mes de dezembro de bc Ixxbiij eu bertolameu froes o fiz escreuer.

(A. N. T. T. Chancellaria da Ordem de Cristo, Livro 4.°, fols. 116 v.0 — 117).

(IV)

Eu el Rej como go.or etc. faço sab aos q este alu.» virem c] eu ej poi bem e me praz p fazer merçe a Dom p.0 de Castilho bpo dangra q ele tenha e aja de minha faz.da p a pagam.to dos ordenados do pro- uisor e vig.rs q ade ter na cidade dangra da jlha terceira e da cidade da ponta delguada da jlha de sam Miguel cem Mil rs em cada hum An- no q Reparteram co elies como lhe bB parecer e serão pagos e entre- gues ao dito bpo p.er esta m.ra ps. cincoenta Mil rs no feytor de minha faz.da da pa terceira e os outros cincoenta Mil rs no feytor da jlha de sã Migel (sic) aos quaes feytores da jlha de sã Migel (sic) digo q ora sam e pello tempo forem Mando q se dem e paguem em cada hum Anno asj e da man.ra q se pagavam ao bpo seu anteçesor q os pia mesma man/a tinha e isto do prim/o dia do mez de jan.ro deste p sente Anno de bc Ixxix em diante o qual pagam.to lhe façam p este aluara geral sem Mais outra provisâ e pio treslado dele q sera R.do nos l.os da desp.a dos ditos feytores pios escriuães do seu cargo e conhecim.to do bpo Mando q sejam leuados em conta a cada hii deles os L.ta niil rs cada Anno q assy ande pagar e este alu.3 se asentara no L.0 da faz.da da ordem e q.1-0 q valha como carta f.ta em meu nome e asellada com o selo pendente da dita ordem sõ embargo de qiq pro- uisã ou Regim.to g cõtr.o Symão boRalho o fez 6 Lx.a ao xbj dias do mes de jan.ro ano de bc Ixxix.

(A. N. T. T. Chancelaria da Ordem de Cristo, Livro 4°, fols. 116). DA ILHA TERCEIRA 213

(V)

Eu el Rej como g.or & faç0 s^er aos c] este alu.a virem q eu ej por bem e me praz q dom p.o de Castilho bpo dangra tenha e aja em cada hum Anno do dia q partir desta cidade de Lx.a p.a seu bpdo em diante os dozentos Mil rs q o s.or Rej meu sobrinho que ds tem acre- çentou e ouueram os bpos seus antecesores p hfía sua carta cõforme a ella q foy f.ta em sintra aos vinte nove dias do mes de julho do ano de mil e quinhentos sesenta e oito e isto emquanto elle Residir no di- to bpdo e com as obriguações e lemitações cõtheudas na dita carta q se cuprira e guardara intrãm.te como ô ellas se contem e como se a elle bpo dõ p.0 p.te e concedida e lhe seram p ella pagos os Ditos dozentos mil rs no feyíor da minha faz.da da Ilha de sam Miguel on- de estam asentados e o declara a mesma carta alem dos quatro centos Mil rs. q majs tem p duas prouisões minhas de seu dotte e merçe pio q mando ao dito feytor q hora he e pello tõpo for lhe dee e pa- gue hos ditos duzentos Mil rs dacrecentam.to do dia q o bpo partir

desta cidade em diante aos topos e da man.™ q se contem na dita carta e comforme a ella e pello treslado delia e deste alu.a q se regis- tara no l.o de sua desp.a pio escriuam de seu cargo e conhecim.to do bpo mando q lhe sejam os ditos dozentos Mil rs leuados 6 conta cada Anno q haja q pagar e aos veedores de minha faz.da q façam o esca-

rinbo da faz.da da ordem este alu.a q qr0 q va|ha tenha força e vigor como se fose carta D4 em meu nome e p my asinada e p.da pj a ch.ria da ordem sem embagro de qualquer prouisam ou Regim.to em contr." Simão boRalho o fez õ Lx.a aos xvm dias do mes de jan/o de bel Ixxix eu bertholameu froes o fiz escreuer.

(A. N. 1. 1. Chancelaria da Ordem de Cristo, Livro 4.o, fols 116 e 116 v.o). 214 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

I

R.do Bpo Amigo, Eu El Rey vos envio muito saudar. Eu envio ora Ambrosio daguiar Coutinho do meu Conselho a Es- sas Ilhas dos Açores por capitão mor E governador delias, por estarS sem capitaõs neste tempo em q he tam necessário guardarBse e defen- derese dos Cossarios q a Elias vão, e por nisso ter a cõta que he razão cõ as mesmas Ilhas, E por outros Respeitos, Encomendo vos muito q em tudo o que for necessário E entenderdes delle q conve a meu ser.ço lhe deis toda a ajuda E favor q Vos pedir E façaes de Vossa parte nas cousas q Vos comunicar o que pera bem delias comprir co- mo de Vos cofio E espero, Scripta õ Elvas a 24 de fevereiro de 1581.

liei]

Para o Bpo dAngra (Original) (Biblioteca da Ajuda, Cód. 51 — vn — 6, foi. 167).

II

Reverendo Bispo amiguo. Eu El Rey Vos Envio muito saudar. De- pois de ser partido para Essas Ilhas Ambrosio d'Aguiar, que tenho mandado por Capitão mór E governador delias, como por Elie Vos escrevy com aquella confiança que de Vos sempre tive (como tereis entendido por a minha carta) Recebi agora a Vósa de 16 d'AbriI, sen- dome dada á muy.t" poucos dias outra Vóssa de Jan.1", E por ambas DA ILHA TERCEIRA 215

Vy quam bem proçedeis õ Vossa obrigação Em meu serviço, que vcs agradeço muito, E bem creo que com Vossa ajuda e Conselho Esta- rão todas as causas dessas Ilhas no Estado Em que convê para me Eu haver por bem servido dos moradores delias, E Ambrosio d'Aguiar poder ter Inteiramõte feito ó a que o mandey, E Vos Encomendo muito que a sy ó façaes, E me Escrevaes tudo o que Vos parecerde que Eu deva ser avisado. E depois que Eu ouvir o Padre da Cõpa- nhia a que Vós Remeteis (que Jnda não he chegado a minha corte por estar doente) Vos Escreverey o mais que ouver por meu serviço./ E sobre os Pregadores que dizeis que não cuprõ o que por Vós lhe foy mandado, se proverá// de que sereis avisado por via do Bispo e Ca- pellão mor que entende nesta matéria por autoridade apostólica. Scrita em Tomar a cinquo de maio de 1581. liei] Para o Bispo dAngra (Original) (Biblioteca da Ajuda, Cód. 51 — vji — 6, foi. 125 v.0).

Ill

R.do Bpo Amigo ; Eu El Rey enuio m.to saudar, recebi agora a vossa carta de-12-de Junho passado, E por ella entendi o que passou o Arcediago na Ilha - 3.a - E o mais que ne cscreuestes. No que toca a Armada E gente que nella vay, me remeto ao fj sabereis com sua chegada a essas Ilhas, assi acerca da ordem que leua, como de todas as mais dependências; E com os Moestr.os de q me fazeis lembrança mando ter a côta

Rey Para o Bpo d'Angra. (Biblioteca da Ajuda, Cód. 51 -- vn — 5, foi. 39). 216 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

IV

R.do Bpo Amigo, Eu El Rey vos envio muito saudar. Recebi duas cartas vossas, E em hfia delias respondeis a hfía minha, E me fazeis Lembrança de algíias cousas das Igreias dessas Ilhas que correm pela mesa da Consciência, onde tenho mandado que se vejam, E provejam. E por via da mesma mesa sereis avisados do que sobre isto se faz. E quanto ao mais que me escreveis na outra carta de 18 - do passado sobre as culpas da Ilha - 3.a E prisam daquellas tres p.as que a ella foram : Pesa me disso como he razam, E quererá Ds que tudo tenha a emenda que mais convém. Scritta em Lisboa a — 9 — d^gosto de 1581.

liei/

Para o Bpo d'Angrn. (Original). (Biblioteca da Ajuda, Cód. 51 — vn - 6, fo|. 187).

V

R d0 Bpo Amigo, Eu El Rey vos envio muito saudar, por este Caravelão escrevo ao Governador Ambrosio d'aguiar sobre a matéria q vos Elie comunicará da minha parte, E encomendovos muito q nella. E em de tudo o q mais se offereçer Ele meu serviço façaes o que te- nho por muy certo, conforme ao muito que de vós cõfio E espero: E cõ Ambrosio daguiar praticareis os particulares desta matéria, E o ajudareis em tudo. E porque sou informado q ontre Elie E os officiaes da Camara dessa Cidade da Ponta delgada ouve algíis descontenta- mõtos em q tenho provido cõ escrever a Ambrosio daguiar E á Ca- mara o que me pareceo que caminha para se isto remediar: Vos en- comendo agora que tomeis a cargo fazerdes nisto todos os bons of- ficios como sabeis que cumpre em tal matéria, E Escrevermeeis tudo o que nisto passar. Escrita em Lisboa, a 10 - de Novr.0 de 1581 — E o que me escrevestes sobre cousas da vossa obrigaçam pastoral, man- DA ILHA TERCEIRA 317

dey que se visse na mesa da Consciência onde pertencem, pata por aquella via serdes respondido.

fíei/

(Original) (Biblioteca da Ajuda, Cód. 51 ~ vn - 6, foi, 164). (A segunda via deste documento encontra-se no Cód. 51 — vn — 5, foi. 89, desta Biblioteca).

VI

R.dc Bpo Amigo. Eu El Rey Vos Envio muito saudar. Receby a Vossa carta de 12 do pasado, E pesoume m.to do mao Estado (de q me daes cõta) Em que Estão as cousas Eclesiásticas E seculares da Ilha tercera, E tambe sinto muito ser forçado q o Remedio destes mal- les seja tanto á custa daquella terra, como não poderá deixar de ser, indo cõtra Ella o exercito q para isso tenho mandado fazer prestes, E bem creo quanto da Vossa parte aveis de trabalhar por se não che- gar a isto (se for possível), cõ como o Eu desejo, por çima de quam mal aquella gente mereçe Usar com Ella de minha clemência./ E quã- to á licença q me pedis para Vos Virdes dessas Ilhas, Eu confio de Vos que Inda q Volla desse não Usaríeis delia, antes creo polia conta Em que vos tenho, E por quã bem tendes procedido em meu serviço, qne se agora Estivésseis neste Reino Vos Embarcareis para essas Ilhas. Pello q Vos Encomendo muito prosigaes o q nellas fazeis com aquelle cuidado q sey que disto tendes, 6tendendo q de Vos tenho E terey sempre a lembrança q he Razão/. Scrita S Lx.a a 15 de dez.bro de 1581.

Rey

(Original/ (Biblioteca da Ajuda, Cód - 51 - vu - 6, foi. 143). 218 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

VII

R.do Bispo Amiguo. Eu El Rey Vos Envio muito saudar, Vy a Vosa carta de 27 de Fevereiro, E por ella Entendo o cuidado com q fazeis as cousas de meu serviço q Vos agradeço, E foy bem feito suspender- se a Ida dos guardiãos E do Arcediago á Ilha 3.a para se fazer de- pois em tpo E ocasião mais conveniente como apontaes, E foiguey de saber a conformidade que ha antre o governador Ambrosio d'aguiar, E a camara da Cidade da Ponta delgada, E creo que vos fazíeis nisto todo o bom officio como confio que sempre o fazeis ê tudo. E quanto aos Autos E patente de que me daes conta, Eu mando ver tuia cousa E outra pa Em tudo se prover como for justa E Razão. Scrita S Lisboa a xy d'Abril de MDLxxxy.

Reii (Original) (Biblioteca da Ajuda, Cód. 51 — vu — 6, foi. 159).

VIII

R.do Bpo Amigo, Eu El Rey vos envio muito saudar. Tendovos mandado responder ás outras vossas cartas Recebi as ultimas q me escrevestes de 21 de Março E primeir.0 d'Abril. Ena matéria da 3.a parece (como dizeis) q não ha iá que tratar per meyos suaves, de q aquella gente está tam incapaz de entender a sua obrigação de todos, E o q particularmente cada híi interessa em côprir com ella, Mas ainda percima de tudo isto desejo a sua re- duçam E que se escuse o seu castigo, sobre que torno a escrever ao Governador Ambrosio d'aguiar o q vos Elie comunicará, a q me re- meto : E também ao q vos dirá sobre a partida do Marquez de Santa Cruz, E sobre as mais cousas depêdentes destas matérias. E acerca do q me dizeis sobre as cartas q vos vieram da 3 a, não ha q tratar soposta a muita cõfiança que de vos tenho, crendo q em todo tempo comprireis cõ a vossa obrigaçam em meu serviço. Eencomen- DA ILHA TERCEIRA 219 do vos q do q toca aqlle caso que passou na Igreja de Sam Sebastiam de q vos avisou o Comissário, me escrevais o q mais tiverdes sabido. E o trateis com Ambrosio d'Aguiar : porq inda q estas cousas sejão de menos momBto q outras, todas se devem prevenir para q de pe- quenas não vensam a mayores. /Folguey de saber (como iá o tinha entendido) q ha a cõformida- de q deve aver antre Ambrosio d'aguiar E os officiaes da Camara. E sobre o caso do Sacerdote E do Mostr.0 de Santo Andre, vos tenho ia respondido. Scrita em Almeiry a 5 de Maio de 1582.

Rei/

(Original) (Biblioteca da Ajuda, Cód. 51 — vu — 6, foi. 174).

IX

R.do Bpo Amigo. Eu El Rey vos envio muito saudar. Receby as vossas cartas de 24 — E 26 de Mayo/, Enoque dizeis sobre a peleja q o Capitão Mor Pero Peixoto teve cõ os navyos franceses não há que dizer por ser o mesmo sobre q Elie ho Governador Ambrosio daguiar me Escreverão largamBte aos quoaes Respondo sobre esta matéria, E Recebj-o cõtentameto que he razão do q nisso se fez por meu Serv.e em q Vos sempre fazeis o q o q de Vos cõfio E espero; como se En- tende de Vossas lembrãças, q vos agardeço, E em tudo tenho manda- do prover como la sabereis, E pesoume de entender pella Vossa Ul- tima carta q ficáveis doête E prazerá a Ds que tereis ja a saúde neçes- saria pera comprir cõ vossa obrigação, Quanto ao que dizeis sobre os negocios (a que aveis de ser respondido pella mesa da Consciência) E tenho mandado que nella se trate disso. Scrita Em Lisboa, a 22 de Junho de 1582.

Rey (Original) (Biblioteca da Ajuda, Cód. 51 — vu — 6, foi. 214). 220 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

X

R.do Bispo Amigo, eu El Rey vos enuyo muito saudar. Depois de vos ter mãdado responder ás vossas Cartas de mayo per hu Carauelão q há quoatro dias q daqui partio Receby agora a de 8 de Junho, E noq toca ás naos da índia, do Gouernador Ambrosio daguiar sabereis o q nysso Ey p meu ser.ço cõforme ao q Escrevo aElle E ao capitão mor Pero Peixoto/. E acerqua de aver dyr o Goardiam fr. Pedro E o Arce- diago á Ilha terçeira na Armada do Marques de Santa Cruz comunica- reis este Caso a Elie p.a se fazer o q maisconuem, E ao Arcediago di- reis q vy sua Carta e Resposta da q lhe escreuy, E que creo delle que 8 tudo me servirá como confio. E quoanto ao que dizeis sobre a vesi- taçâo dessas Ilhas E do que pera isso tendes necessydade, por via da mesa da Consciencya (onde esta materja pertence,) sereys a Ella res- pondjdo, scripta 8 Lx.a a 26 de Junho de 1582.

Hei/

(Biblioteca da Ajuda, Cód. 51 — vn — 5, foi. 171).

XI

R.do Bispo Amigo, Eu El Rey Vos envio muito saudar. Tendo en- tendido pellas Cartas que me escrevestes quando vos recolhestes na fortaleza dessa Cidade E per outras Vias, quam bem compristes no sucesso q vos obrigou a Isso) cõ Vossa obrigação, E o animo, E prompto Zello de meu Serviço q mostrastes naquelle trabalho na obra E nas palavras, me pareceo significarvolo logo por esta minha Carta, E que de Vossos serviços E pessoa tenho muita satisfação E conten- tamSto, E alembrança delles q he razão/ E per outras Cartas vos es- creverej sobre as cousas de meu serviço, porque esta hé somSte pera entenderdes o q vos nella digo, E q Vos agradeço m.to o q tendes feito/ Scrita 8 Lisboa a 30 d'Agosto de 1582.

(Original) (Biblioteca da Ajuda, Cód. 51 — vn —6, foi. 166). DA ILHA TERCEIRA 221

Xil

El Rey R.do Inxpo padre (o bispo donpedro dei Castillo rmi Virrey y In- qui or general ê nel rren o de Portugal êimro de campo don p.o Sar- miento escrive dela Isla terçera que se han continuando las fabricas y rreparos dei cast.0 de santph.6 dei monte dei brasil de que Es castelella- no pero que dentro de muy poços dias sele acabava lacai con que era íuerza çesar hasta q se leproveysse delia y rrepresenta dela importân- cia q Es proseguir Estas fabricas como aca se tiene êntendido q assi ha parescido advertires dello y encargaros y mandaros como lo hago que conel dinero q proçede delarrenta delas terçias q Esta aplicado para fortificasiones^ é nese rrei.0 deis (orden q se tome alguna buena ppd.a de cal y se envie a aquella Isla conla mayor brevedad q se pu- diere como se ha hecho (otras vezes p.a que por falta deste material, no paren Ias dhas ffabricas y dei cuidado q enesto pusierdes meten- dre por Servido de Vos ylo sere ên q me aviseis Io q se hiciêre por q comui.e tenerlo éntendido de Aranjuez a vij de Mayo de 612.

Yo El Rey

Por Mand0 dei Rey nro Senor Anahayas

(Original) (Biblioteca da Ajuda, Cód. 51 — vn — 6, foi. 2).

XIII

R.do Bpo ettc. conformandome cõ o q se contem em hua consulta do desembargo do passo nomeo a Ant.o ferr.a carreg.or q agora he de miranda p.a a correyção das Ilhas terçr.as e hey por bem de lhe fazer as mesmas mi q maodaua fazer a Roq dasilueira com // com declara- 222 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

ção q não aceitando me não seruirey mais delle e se tomará em lem- brança p.a não ser mais prouido como se fez ao dito Roq dasilueira; encomendouos mto q nesta conformidade lho fassaes logo a saber e ordeneis q se despachem as prouizões neçess,38 e me Venhão p.a eu as assinar/, escrita a 11 de Jan/o de 1605.

(Biblioteca da Ajuda, Cód. 51 — vn — 7, pág. 22 v.0—23).

XIV

Com esta seiá aVs. hu lanço q Sua Mag.dejmão dou açertar a gabriel Ribr.o da costa na renda das jlhas dos asores eprouim.t' d'Ma- zagão como Vs. verá por elle E pl.as copias ao de Jorge Diaz craslo e Manoel gomez da costa aq se refere oquai Vs. mandará pôr em pre- gão e qfi andeinelle dez dias contados do em q chegar aessa çid.e e auendo que melhore enuiará Vs. os lanços/. Nosso s "r Etts de Valh.e a 19 de feur.0 de 1605.

(Biblioteca da Ajuda, Cód. 51 — vn — 7, foi. 56).

XV

R.do Bpo Etts. Vi hua Carta do Bpo de Coimbra VisoRej q foi desses Reinos de 21 de nou.ro do anno passado ehua consulta da jun- ta deminhafaz.d sobre as pertençeis de Ant.o Caldr.a Contratador das jlhas dos açores E prouim> de mazagão E vistas as Rações dadila Con- sulta ey porbem e mando q odito Ant.0 Caldr.a pague logo oq deue de- prasos corridos ate trinta deMarço deste anno eqt0 a se fazer composisão com elle sobre odano do trinta por çento assi no q toca adita Renda das jlhas como ao prouiment.10 de mazagão me conformo como parecer da dita consulta, E vos encomendo ordeneis a dita Junta faça orçamento DA ILHA TERCEIRA 223 do q pode montar este desconto para ser executado portanto menos ate se tomar Resoluçam na dita composissão E no outro ponto sobre jntereses q diz tomou para prouer o dito lugar de mazagão por lhe faltarem com os pagamen.tns não Ej por meu serviço q será ouuido. por parecer q não tem sem embargo de q por sua parte se diz na dita consulta escrita a 15 de Abril de 1605. E faz na dita junta o dito orçam.t» do q pode montar o dano dos trinta por cento con os pareceres dos menistros delia mo enuiareis escreuendome sobre/tudo con uosso parecer por uia de luis de figd.0 meu secretarjo.

(Biblioteca da Ajuda, Cód. 51— vn — 8, foi. 15).

XVI

El Rey Reverendo ynxpo padre (o bispo don Pedro dei Castillo que ser- vis de mi Virrey de los Reynos de Portugal por Vra carta de los nue- ve dei pasado que da entendido que en conformidad delo que os mande èncargar sobre que hiciese desproveer de cal ala terçera para las fabricas y Reparos dei Castillo de Sant phelipe distes luego, orden para que se êxecutase y quedava cargada una caravela para partir con primer buen tiempo y tengo me por servido dei cuydado que én esto haveis puesto y Io sere én que lo continueis de manera que se énbie otras caravelas com buena cantidad de cal y ên quanto alo demas que deçis delia deligençia que haveis ' hecho sobre los éncuentros que tie- nem las Justicias dela tierra con los ministros de Ia guerra lo que con- viene és que se éscusen guardando las ordenes que estan dadas y holgare que esto quede assentado y establecido en Vrõ tiempo por él cuydado y buen çeto con que acudis alas cossas que se ofrecen de mfserviçio de Madrid — A ij — de Julio — de míll y seis cientos y doze anos. fícij

Anayas 224 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

(Original — e tem o sêlo régio e endereçado: Por El Rey ao R do Dom P.# dei Castillo Bispo de Leiriea, Presidente do Desembargo do Paço do seu Conslh0 &.

(Biblioteca da Ajuda, Cód. 51 — vn — 6, foi. 126).

XVII

El Rey Reverendo Inxpo Padre obpo Dom Pedro dei Castillo Virrey y Inquisidor General de mis Reynos de Portugal, dei Mro. de campo don Pedro Sarmiento mi Castellano dei Castillo de Sr PH.e dei Monte dei brasil se ha entendido la orden que haveis dado para que de Ia consignacionq. Esta hecha para fortificacíones se provean con efecto algunas sumas de mrs para q continue la dei dho Castillo y que assi mismo haveis hecho proveer Ultimamente duçientos moyos de cal de que Gavia mucha necesidenel, ytengome por servido dei cui- dado, con que Haveis acudido alo Referido ylo sere enque lo conti- nueys pues sáveis quanto importa ami servicio y al bien de aquellas Islas apresurar. aquella fortificacion y yrmeeis avissando lo que enesto se fuere Haziendo porque Golgare de saverlo de Madrid — a xx iiij —- de deziembre de 1612 pues sabeis cuanto importa esto para mi servicio y bien de aquellas Islas, no tengo mas q deçir sin hgolgare de todo lo q enesto hizierdes.

) o El lieij

Anayas (Original) (Biblioteca da Ajuda, Cód. 51 — vu — 6, foi. 48). DA ILHA TERCEIRA 22b

XVIII

El Rey Rdo Inxpo padre (o bispo don pedro dei Castillo mi Virreey In- quidr Genel. ênlos rreinos de portugal hase entendido que los feitores q ênla Isla terzera cobran algunas demis rrentas, porfines particulares Suyos no solo se Escusan de dar satisfazíon ala gente de guerra que me sirve enaquella Isla dela consignazion q le ésta heçho peroquequan- do cumple su tiempo se bienem con mucha suma de mis en que son alcanzados queriendo mas pagarlos en mi contaduria mayor de ese rreino que darlos ala dha gente de guerra afin de molestaria y de gran- xear Ellos conel dinero mediante la dilazion q interponende que ha pa- escido advertires y encargaros y mandaros como Io hago q deis (orden para q se rremedie Este abuso y para esto mirareis sisera bi en que antes q salgan los dhos feitores tengan (obIig.m de dar Untanteo de suquenta ai provee.or de mi hazienda en aquella Isla y alpersona acuyo cargo Estubiere La g.te de guerra delia para que dexen alli El alcanze q se les hicere de Madrid axviij dehen.ro de 1613.

Yo El liei/

Por Mnd.0 dei Rey nosso Senor Anayas

(Original) (Biblioteca da Ajuda, Cód. 51 — vu - 6, foi. 121).

XIX

el Rey Reverendo Incristo padre donpedro dei Castillo obispo dei mi consejo Virrey Inquisidor general delos reynos de portugal enten- diendose ha que lo bispo de Ia Isla tercera se ha escusado de dar pila de bautismo y declarar por parrochia La yglesia que ay en aquel Castillo haviendo en eila el sanctissimo sacramento y estando 226 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

(ordenado que se haga lo que se haçe enel castillo de S. gian y que assi mismo no ay enla dhã yglesia retablo nilos (orna- mentos decentes para çelebrar misa ni acudir al culto divino y porque como Veis es justo que se atienda a esto Ga pareçido advertires que sere meey servido que sele ordene al (o bispo haga poner pila en la yglesia de aquel castillo y la declare por parrochia dela gente de guerra que enel sirve y que asi mismo se ponga en eila rretablo decente y ornamentos com que se pueda acudir al culto di- vino que de toda Ia diligençia. y cuidado que nesto pusieredes de mas deser obra dei servizio de dios La recíuré de vos y avisareis delo que se hiciere porque conviene tenerlo entendido de Madrid a xxx de Henero de 1613. Yo El Hei] Por Mand.0 dei Rey nro senhor Anayas (Original) (Biblioteca da Ajuda, Cód, 51 — VII — 6, foi, 122).

XX

R.do Inxpo Padre obíspo Don Pedro dei Castillo dei mi Conss.0 mi Vírrey y Inquisidor general - enlos mis Reynos de Portugal. Por Vra carta delos 19 dei passado, se ha entendido la orden que distes para saver silos feitores de hacienda enla Isla tercera se escusavam de dar satisfaçion ala gente de guerra que alíi sirve y que aunque fue siniestra la Relaçion que se me havia hecho de q no cumplian con sua obligacion. Todavia para que lo hagan mejor se dava nu.1 orden al provedor de Ia hacienda enla dha Isla para que se diese satisfaçion ala dha gente de guerra. Conla mayor puntualidad que se pudiere y assi sere servido q se haga como los oy de Vro cuidado y os encargo que lo continueis yme haviseis siempre lo que se hiçiere de Md. Avij de no.re de 1613. Yo El Rey Por Manda." dei Rey nro Senor Anayas (Original) (Biblioteca da Ajuda, Cód. 51 — tu — 6, foi. 130). "Relaçam das couzas sucedidas

em a perseguiçam da Cristandade de Japam"

( Cod. 49 — IV— 60 Biblioteca da Ajuda )

Por se referir ao mártir terceirense B. João Baptista Machado, transcrevemos da Refaçam acima mencionada o capítulo 38, que jul- gamos inédito:

De como faze buscar o Tono de Vomura aos relig.osj prende a dous delles e martiriza-os. Decla — / Declarando com a pesquiza passada, q em Nangazaqui havia Pa- dres, e dito se lhe aos Gouvernadores do Império em suas barbas nam podendo já dissimular, deram sobre elie huã grande reprehençam ao Tono de Vomura q a tarde estava em a Corte, dizendo lhe que co- mo havia tido tanto descuido a embarcar os relig.0®, pois se haviam ficado tantos, pelo qual temendo o Tono nam lhe viesse algum traba- lho, p.a remediar o descuido, de entam tratou de fazer buscar, e pren- der os religiosos q pudesse, e assim baixando se logo para sua terra, em chegando q foi p.r Abril, enviou a seu Tio Jenjinrodono com al- gfia gente a Nangazaqui para q cõ dessimulo, dando a entender q hia a outra couza procurasse prender alguns delles; e assim andou alguns dias lançando redes, porem os Christaõs logo entenderam ao q vinha, e passando a palavra fizeram esconder aos religiosos de maneira q se houve de tornar sem fazer nada, o qual visto pelo Tono, despachou logo já a hum gram privado seu chamado Jiribeoye renegado cõ maõ armada e muita gente a prender^alguns religiosos, ou fazer q os tiras- 228 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO sem de rasto, cuja vinda taõ pouco sérvio de nada, mais ij de alvora- çar a cidade; e assim se voltou muy enojado, levando frimas das ca- beças delas calles, de cj nam os ter nenhum, protestando-Ihes de q se andando o tempo se soubesse q os haviam escondido, se procederia contra elles como contra rebeldes a Emperador, e com isto se voltou a Vomura. E visto o Tono q tam pouco se havia feito nada, e que em Nangazaqui nam havia remedio, deu praça como se buscasse pelas Aldeãs donde se haviam sahido alguns aquelles dias com o alvoroço, e ouvindo q o P.e Fr. P." de Assumpçam da ordem de S. Francisco andava p r ali perto em sua terra de Vomura compe- nando lhe enviou a prender, e foi em hum povo charnado Cuquitzu do Reyno de ligero, donde estava, e o qual vendo o q passava, se ajoe- lhou, e deo muitas graças a Deós pela grande merce q lhe fazia, em q fosse prezo p.r seu Santo Nome; e logo foi levado/vado a Vomura, e posto em hum cárcere. Vendo se pois o Servo de Deós, em o cárcere ajoelhado cõ hum Crucifixo pequeno em as mãos, q sempre trazia consigo disse cõ muita devoção : Senhor quando mereço este mizera- vel peccador estar prezo por vosso amor, pues a mi P.e Sam Francisco a hum lhe foi concedido cõ haver lhe dezejado tanto, e voltando a outra parte da Cruz em q estava a imagem da Virgem lhe pedio en- tercedesse p.r elle, e com isto se puzou a cantar Psalmos. Era este P.e Fr. Pedro antes q o prendessem já santo, e conhecido p.r tal, muy grande trabalhador, e fiel minystro, acudia huas vezes a Nangazaqui, e outras ás Aldeãs circunvizinhas por acudir lhe a todos. Foi esta prizão aos últimos de Abril. E logo primeiro de Mayo prenderam também hu Padre da Companhia chamado Joam Baptista Tavora, (] se havia sahido no alvoroço de Nangazaqui, e se hia embarcado para a Ilha de Go- to, porem levando lhe os de Vomura espiado, lhe foram seguindo, e assim lhe prenderam pouco depois de chegado estando actualm.te confessando, e com elle a hum dojueu seu chamado Leon, levaram lhos a Vomura ao cárcere donde estava o P.e Fr. Pedro os quaes ven- do se juntos prezos pelo Evangelho se abraçaram e deram muitas graças a Deós por tam grande benefício, e merce como lhes fazia. Era o P.e Joam Baptista muy gram Minystro, e trabalhador, e sabia também acudir dentro e fora de Nangazaqui, era muy afavel, e amigo de todos as religioens. Quando prenderam este P.e andaram também os de Vo- DA ILHA TERCEIRA 229

mura em seguimento da embarcação em q hia o Padre Fr. Thomas de Sumarega, q também se havia sahido entam de Nangazaqui p.r esta occaziam, e de caminho para hir a consolar os Christaõs de Pirando, q haviam vindo a pedir religiozo, porem nam alcançaram a embarca- çam, e assim se lhes foi. Dali a alguns dias que estiveram prezos os Christaõs com as guardas, e o Tono q tam bem dissimulou para meter lhes hum recado de Alina, e assim lhes disseram dia da Santíssima Trindade e o dia seguinte pela tarde lhes martirizaram, picando se Leam, e esse Leam he/era do jucu do P.e Joam Baptista no cárcere; e ao sahir os dous Padres viram encima dhua serra hum fogo, p.r q isto foi anoite- cer, e perguntando o P.e Fr. Pedro, que luz era aquella, e responden- do lhe que aquelle era o lugar donde haviam de ser mortos, disse el- le; desde ali hiremos diretos ao Paraizo. Pelo caminho levava o P.e Fr. Pedro seu Crucifixo, e o P.e Joam Baptista o diurno, e entre am- bos o rosário. Chegados ao posto, começaram a prègar aos circusfan- tes, e em particular fez isto o P.e Fr. Pedro muito tempo, dezenganan- do a todos q nam havia salvaçam em outra ley senam em a dos Christaõs. e q para ensinar lhes isto haviam vindo os religiosos desde sua terra, padecendo tantos trabalhos, e q agora morriam elles com muito gosto, e alegria p.r essa ley p.r saber de certo q essa era a ver- dadeira : e vendo os Bugros q isto hia a la larga, deram presa ; e as- sim ajoelhando se lhe hum de fronte do outro lhes foram cortadas as cabeças p.r diversos verdugos quazi a hum mesmo tempo : a de Santo Fr. Pedro foi de hum golpe, e a de Santo Joam Baptista de dous, p.r que nam acertava o verdugo. Foi este martyrio a vinte e dous de Mayo deste ano de 17, e de muita consolaçam para os demais religio- sos vendo q a mesma sentença estava dada para elles se lhes colhiam, por q antes sempre se entendeo quais haviam de embarcar, e assim depois já não se escondiam tanto. Os q se achavam prezentes, assim bons Christaõs, como renegados, e ainda alguns gentios depois de hido o Tono, q se quiz achar alli, tomaram todo o sangue que pude- ram em panos, e papeis q molhavão nelle p.a relíquias; e os santos corpos puzeram cada híi em sua caixa das q uzam os Japoens para guardar seus vestidos, e os enterraram pondo guardas p.a q nam os furtassem. Era o P.e Fr. Pedro de Assumpção natural de Cuerba jun- to a Toledo, e o Santo Padre Joaõ Baptista da Ilha Terceira. Uma carfa da Duquesa de Manfua

Do artigo do sr. Prof, Dr. Mário Brandão, Alguns documentos relativos a Í580, publicado no Boletim da Biblioteca da Uni- versidade de Coimbra, vol. XVI, pág. 1, transcrevemos a seguinte carta da Duquesa de Mantua para Felipe IV, por nos parecer impor- tante para a história da Terceira:

Sefior

El Maestro de Campo Boca / Negra me traje esta tarde a / un fraile de la orden de S.t0 / francisco natural cj dize ser / de una de las Islas terceras / Cj ha estado en el Brasil y / Viene en Compartia dei M.ro / de Campo el qual fraile me / dixo íj en el Capitulo interme / dio q su religion hauia heche / hauia elegido por uno de los / custó- dios a un religioso q se / llama frai Pedro dei Desierto / el qual dize ser hijo dei Prior / de ocrato Don Antonio y íj se / crio en el Brasil y viniendo // Por Ia tercera fue alli muy / agasajado y q hauiendo tomado / el habito ha residido mucho / tiempo en Euora y su prouin / ciai tiene resuelto de embiarle / a las mismas Islas Terceras con / el ministério de Custodio / y dize q no solo ay este hijo / de Don Antonio sino q otro íj / esta q en Olanda íj se llama D. / Manuel Casso con deuda dei / Conde Mauricio de quien tiene / hijos y q DA ILHA TERCEIRA 231 otro hermano deste / q se llama D. Christoual esta / en francia. / po- ne em Consideraciõ / este fraile los trances de Guerra // q por occa- sion de D. Antonio / passaron en Ias tercera al principio de la Vnion desta Corona / a la de Castilla y de la manera / q aquelos Moradores se hauian / declarado por D. Antonio y el / inconueniente q podria tener / Voluer ally Cossa suya particularte: / en los tiempos presen- tes. // y pareciendome puncto / considerable Ilamare manana / al Prouincial de Jobregas / a quien toca q no lo he podido / hazer hoy por darse me el auisso / tarde y le ordenare no deje salir / dei Reyno al fray Pedro dei Desierto // y q siendo necessário embiar / Custodio a las Islas vaia otro y q / en esto se aya con toda pruden3 / y recato y me auisse de hauerlo / executado pero no le dire Ia / causa a q obliga esto Am... (1) parecido dar Cuenta desto a / V. M. pera q teniendolo enten / dido mande lo q mas fuere / de su seruicio q yo por Conue / niente tendria tenerle apar / tado de los lugares marítimos / en un conuento la tierra adentro / cercana a la de Castilla dissimu / lada- mente y sin q entienda q se haze / casso de recelar nada dei yo Cer- ti / fico // a V. M. q hasta el dia de hoy / no hauia oido nada de los hijos de / Don Antonio pero este fraile / lo affirma por Cosa liana y / notoria. / Guarde Dios la / Catholica R:' persona de / V. M. como la Chris,tad ha / menester y yo lo desseo. / lisboa 12 de xbre 1637. Senor Bessa Ia mano a V. M. su muy humilde y obed.te Prima Margarita iVrt capa + (2) Lisboa A su Mg d 1639 La sr.a Princesa Marg.ía en 12 x.re Con razon de lo q le escriue / Vn frayle de la orden / de 83 fran.co de las Islas Terceras. N12 (3) Biblioteca da Universidade de Coimbra—Ms. 1511.

(1) Faltam umas três ou quatro letras por o papel neste ponto ter sido corroído pela tinta. (2) A partir daqui aditamento em letra do século XVII. 232 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

(3) Em letra do século XIX.

Na breve introdução aos Documentos, comentando esta carta, diz judiciosamente o sr. Prof. Dr. Mário Brandão : «E a carta da Duquesa de Mantua escrita em 1637 àcerca de um filho real ou suposto de D. Antonio, não se pode ler sem comoção. Bastava afinal um pobre e velho franciscano, de quem o pai ao mor- rer nem sequer se recordava do nome, para preocupar a regente, já quando havia mais de 40 anos o Desterrado repousava ao abrigo do túmulo na igreja do convento de S. Francisco de Paris... O espectro do grande vencido de Alcantara projecta-se na vida da nação escravi- sada como um memento perene dos dominadores. Mas sobretudo o que reconforta ao ler essas páginas amarelecidas é adivinhar nas en- trelinhas a vontade ferrea da nação real em manter-se independente. Podem a nobreza corrupta e o alto clero deixar-se seduzir pelo ouro e benesses, ou por mesquinhos escrúpulos de ordem moral ou jurídi- ca, a massa da nação, antes e depois da catástrofe, mantem-se inte- meratamente fiel, a despeito do deslumbramento das promessas e da crueza dos castigos, à Terra e ao Sangue», Orações do pão na Ilha Terceira

Pelo Dr. Luís da Silva Ribeiro

Como base da alimentação popular — tudo com pão faz o homem são diz um ditado, o pão constitui a grande preocupação de toda a gente de poucos teres, isto é, da grande maioria, o homem no de- sejo de que não falte em casa a farinha, a mulher no de que saia bem feito e em quantidade suficiente para todos comerem. Hoje na Terceira predomina o pão de milho e este cereal é o pa- drão do salário do trabalhador do campo. Até à introdução do maiz e desenvolvimento da sua cultura, comia-se pão de trigo com ou sem mistura de centeio ; mas depois, pouco a pouco, foi decaindo a cultura deste, quase abandonada no presente, e o pão exclusivamente de mi- lho generalisou-se. A actual melhoria de condições de vida de parte da população rural, por vezes o desvio da actividade da mulher para outras ocupa- ções lucrativas com prejuízo da árdua tarefa de fabricar o pão para a família, tem levado a maior consumo de pão de trigo das padarias, todavia o pão de milho continua a ser preferido. O povo quer que falte tudo menos o pão. Ele é a principal con- dição da vida de família e até da paz e harmonia no seu seio : — «Ca- sa onde não ha pão, todos brigam e ninguém tem razão». 234 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Por via de regra, em cada lar, a mulher coze o pão ao sábado para toda a semana. Varre e acende o forno, peneira a farinha, escalda-a num algui- dar, tempera-a de sal, amassa-a, deita-lhe o fermento feito de massa que se deixou azedar e a que se vai sempre juntando mais massa (crescentes) e se guarda numa tigela, adiciona-lhe uma pequena porção de farinha de trigo, mais ou menos segundo se quer, para adoçar. A amassadura, normalmente, leva 20 a 30 minutos. Quando a massa começa a abrir fendas deixa-se de amassar e agasalha-se, cobrindo-a com roupa até levedar. Lêveda tende-se o pão que vai para o forno. «O nosso povo, diz Leite de Vasconcelos (3-1235), não confia jamais nos próprios recursos e, por isso, em todos os acidentes da vida invoca a protecção sobrenatural». Daí a existência de práticas e orações inherentes ao fabrico do pão destinadas a obter a protecção divina para ele. «A alma popular, acrescenta o mesmo escritor (4-888), vive em ambiente muito seu onde a observação da realidade, o sentimento poético, a influência do ritmo, o automatismo da linguagem se misturam a antigas ideias místicas transmitidas inconscientemente pela tradição ; de tudo isto resultam obras às vezes na aparência incoerentes ou in- compreensíveis, cuja significação só por análises pacientes e estudos comparativos se poderá encontrar (quando pode!)». De tudo isto ha nas orações do pão, espalhadas pelo país, com forma e carácter semelhante, muitas vezes esteriotipado como notou Messerschmidt (6-122), e de lá foram trazidas para os Açores onde se mantiveram sem fundamental e sensível modificação. Vem de recuados tempos. Em Roma os padeiros tinham Vesta por patrono e no dia 9 de Junho celebravam a sua festa com ritos particulares. Alem dela havia a deusa Fornax, padroeira dos fornos, àqual também festejavam (23-467). Vesta assumiu essas funções por ordem de Júpiter.

Vesta, fica a teu cargo o figurares que em vez de fome em víveres abunda. Não largues tua estância ; o grão que resta que se pize, se amasse, emfim se coma. (23-135) DA ILHA TERCEIRA 235

Da sua origem pagã e do recurso à magia para alcançar a inter- venção de poderes sobrenaturais, resultaram práticas que, embora cris- tianisadas, não desapareceram contudo, fundindo-se numa amalgama nem sempre compreensível. Paul Sehillot, que num livro — Traclilions el superslilions de la boulangerie — reuniu grande número de práticas e orações se- melhantes às nossas, diz (8-288): «Orações e gestos fazem que a massa levede bem e destinam-se, igualmente, a neutralizar a acção de influências externas e maléficas. Ao forno respeitam normas mesmo anteriores à sua construção, escolha de certa época do ano ou de certa fase da lua, interdição de nela entrarem mulheres. Na Alemanha dirigem orações ao forno e fazem-lhe oferendas. Ha dias em que se não deve cozer, e alguns actos, como murmurar ou jurar, são rigorosamente proibidos. Longas rezas acompanham na Sicília o deitar cada pão no forno». De uma dessas rezas, por sinal afim das nossas, dá-nos Leite de Vasconcelos (2-231, n.) a seguinte amostra :

Pani crisci Come Diu te benedissi Crisci pani'nta lu furnu Come Diu crisciu a lu munnu. San Franciscu Pani friscu ! San Cantauru Pani cauru, etc.

. Na Terceira colhi as orações que seguem, às quais junto breves notas comparativas e explicativas:

1

Em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo. Nosso Senhor te acrescente no forno como a benção de Deus acrescentou o mundo todo. Padre, Filho, Espírito Santo. Deus te acrescente como trigo de semente. 236 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Emquanto isto se diz traçam-se cruzes com a pá na bôca do forno. Altares.

Tanto cresças tu no forno como a graça de Deus pelo'mundo todo. Em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo. Biscoitos.

Em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo. (Benze-se a porta do forno com a mão) Amen. Continua-se a benzer e vai-se dizendo : — Que tu cresças no forno como a graça de Deus cresce no mundo todo. Senhor Santo Amaro ponha o que lhe falta. Quando se acaba de amassar faz-se uma cruz na massa e diz-se : Em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo. Doze Ribeiras.

Santa Marta dê o que lhe falta ; é côdea, é sôlo, é miôlo, em nome da Virgem Maria. Lameirinho.

Em nome de Deus seja e do Santíssimo Sacramento. O que é ruim saia para fora, o que é bom entre para dentro. Nossa Senhora te cresça como a graça no céo. Padre, Filho, Espírito Santo. Porto-Judeu.

Assim cresças no forno como a graça de Deus pelo mundo todo. A benção do Pai Eterno, Virgem da Graça acrescentai a massa. Porto Martins. DA ILHA TERCEIRA 237

Padre, Filho e Espírito Santo. Nosso Senhor te acrescente como o trigo da semente, e Santa Marta te ponha farta (ou te ponha o que falta). Ribeirinha.

8

Em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo. Nossa Senhora te cubra c'o a sua santíssima virtude, que eu da minha parte fiz o que pude. Reguinho.

Padre, Filho, Espírito Santo. Assim cresças no forno como a graça de Deus pelo mundo todo. Santa-Barbara, 10

Padre, Filho, Espírito Santo (3 vezes), A benção de Deus te cres- ça como a graça de Deus pelo mundo todo. Santa Barbara. 11 Depois de amassar: São Mamede te levede, São Vicente te acrescente. Ao deitar o pão no forno: Em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo. Deus te acres- cente como a sua graça por esse mundo todo. São Bento.

12

Em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo. Nosso Senhor te acrescente e te livre da má gente, e me dê o forno cheio. São Mateus, 238 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

13

Padeira de Jesus Cristo, vinde botar a benção ao pão para que ele cresça no forno como a graça de Deus pelo mundo todo. Em quanto se vai deitando o pão no forno reza-se o Credo. São Sebastião. 14

Em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo. Deus te acres- cente, como o trigo da semente, que dá de comer a muita gente. Vale de Linhares. 15

Deus te levanto, Deus te acrescente, por obra e graça do Espírito Santo. Vila-Vova. 16 Padre, Filho, Espirito Santo. Nosso Senhor te acrescente Como o trigo na semente E a graça de Deus Por esse mundo todo. Lages. 17 São Vicente te acrescente. São Mamede te levede. Fiz-te o que pude, Nosso Senhor te ponha A sua santa virtude. Lages. 18 Senhor São Marcos, Que cozeste o pão a Jesus, Cozei este meu no forno Como a graça de Deus Pelo mundo todo. Lages. DA ILHA TERCEIRA 239

19

Senhora Santa Marta, Que cozeste o pão a Jesus Cristo, Cozei-me este meu Que está no forno, Fazei-m'o belo e formoso Como a graça de Deus. Lages. 20

Padre, Filho, Espirito Santo. Abençoai-me este pãozinho E fazei-me a mercê de o cozer Em forma de se não perder.

Geralmente, em quanto recitam esta oração, fazem uma cruz com a mão ou com a pá, e alguns deitam uma mão de sal sobre as brazas à boca do forno. Lages (*) A maior parte das orações começam ou terminam com a invoca- ção das Três Pessoas da Santíssima Trindade, a que corresponde o gesto de benção ou traçado da cruz no ar, sobre a massa ou na pró- pria massa, feito com a mão (Vila-Franca, São-Miguel, 15-30 e 17-52 • Madeira, 7-306; Santo Tirso, 10-52; Monsanto, 9-17; Ourique, 26-185); ou na bôca do forno com a mão ou a pá (Guimarães, 5-215 • Marco de Canavezes, 24-40). Em Vale de Lobos (9-17) a cruz é feita de can- to a canto da masseira ; em Idanha-a-Nova (9-17) fazem-se cinco cru- zes, quatro nos cantos da massa e uma no centro; em Viena do Cas- telo, em vez da cruz, traça-se o sino-saimão e, como em Vila-Franca espeta-se um alho na massa (25-255). A grande preocupação de quem amassa é que a massa levede bem, o pão fique fôfo e cresça no forno com o calor. Isso pede a Deus, aos santos e à Virgem.

( ) Muitas destas orações foram me amavelmente comunicadas pelo meu amigo sr. Major Frederico Lopes, que as recolheu, e a quem aqui as agradeço. 240 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Para melhor firmar e definir a súplica faz comparações : — como a graça de Deus pelo mundo todo, como a graça de Deus ou as almas no céo, como o trigo da semente, etc., comparações estas que apare- cem tanto nos Açores como no continente e na Galiza. Em Vinhais roga-se a Deus que acrescente o pão como a paz pelo mundo todo (22) Pede-se mais que acrescente o pão fora do forno para muita gen- te poder comer dele e chegar paia todos sem faltar. «Para amparo de muita gente» diz-se em Turquel (11-287);«Nós a comer e tu a crescer, todos seremos cheios com bem pouco comer» (2-230); »Tu a crescer, nós a comer, que nunca te possamos vencer» (24-40). A-pesar-disto em Guimarães, ha quem diga : «E o meu vizi- nho, ou quem não te merecer, que coma um corno» (5-215), o que deve considerar-se gracejo. Na Galiza ha a mesma preocupação de abundância e até de baixo preço: — «Que Io alce en el horno y Io baje en el mercado», «Dios lo aumente en los agros y lo baje en los mercados» (29-147). O povo tem a ideia do aumento das almas no céo. Como este é, em seu entender, espaço definido e limitado, um lugar, pasma de se não encher.

Desde que o mundo é mundo Muita gente tem morrido ; Nem o mundo acha falta, Nem o céo se tem enchido. diz uma quadra ouvida na Terceira. Alem de Deus (Nosso Senhor, o Santíssimo Sacramento) invocam a Virgem e diversos santos. A invocação da Virgem explica-se pelo desenvolvimento do culto mariano nas ilhas, como em todo o país, e ser medianeira entre os homens e Deus. «Cheia de graça» é forma muito popular aqui ainda pedida pela rima com massa. Á semelhança do Porto Martins, diz-se em Unhais da Serra (6-122): «Nosso Senhor te acrescente em massa como a Virgem em graça». Nas orações terceirenses encontram-se Santa Marta, São Vicente, São Mamede, Santo Amaro, e nas do continente todos, menos o ulti- mo, e mais São João, São Simão, Santo Antão, Santa Clara, São Cie- DA ILHA TERCEIRA 241

mente, São Gonçalo, São Tomé. Em Vila-Franca, São Miguel, invo- com Santa Suzana a quem chamam, como noutras localidades a Santa Marta, padeira de Jesus Cristo. A existência do nome dum santo numa fórmula ou numa supers- tição pode provir de uma das seguintes causas: — analogia do nome com um nome pagão (Elias e Hellios, Mamede e Mohamed, Romão e romano), popularidade do santo, analogia com o objecto (São Mansos e amanse, São Marcos e marcar), analogia com objecto ou ideia ligada ao santo (São Lourenço livra de incêndios porque morreu queimado) influência da rima (3-605). Da popularidade do santo, cujo culto se estende a todas as ilhas, deve provir a menção de Santo Amaro na oração das Doze Ribeiras. Manifestamente, por influência da rima são invocados São Vicen- te, São Mamede, São Clemente, São Tomé, e Santo Antão, São João, São Simão em formulas terceirenses e continentais (20); — São Mamede te levede», «São Vicente, te acrescente», e mais, no continente, «São João te faça pão». São Clemente substitui São Vicente numa fórmula de Vinhais (22* -29), Santo Antão substitui São João no Alentejo (12-45) São Simão em Viana do Castelo (25-255), e em Guimarães diz-se «São Tomé te levede» (5-215). Na Galiza ha — «San Justo dei poco que haja mucho y a San Pantaleon que lo saque bom», a par de São Vicente (29-147). São Gonçalo entra em Guimarães na reza ao salgar a massa: Em nome de São Gonçalo Que não saias ensoço nem salgado (5-215), e Santa Clara numa oração de Trinta (Serra da Estrela) com o pedido te clare (6-122), nomen numen, como na fórmula infantil terceiren- se para cessar a chuva — «Santa Clara esclareai». Nomen-numen é ainda a substituição de São Vicente e São

830 Crescente e Sâ0 Levede na seguinte oração do Dou- São Leve te levede, São Crescente te acrescente, São João te faça pão. 242 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

A invocação de Santa Marta, padeira ou cozinheira de Jesus Cris- to, explica-se pelo episódio narrado no Evangelho de São Lucas refe- rente a Santa Marta de Betânia quando hospedou Jesus Cristo toda se afadigar no arranjo da casa e da comida (18-215). Por isso em Vinhais é advogada do pão bem cozido (22-388). Acresce que o nome é ainda muito popular embora o tivesse sido mais em tempos antigos, talvez ligado a uma crença pagã, figurando em certos modos de dizer — «Morra Marta, mas morra farta», «Lá se foi tudo quanto Marta fiou», «Em louvor de Santa Marta, quem comeu que parta», etc. (4-672). A invocação de São Marcos, que se encontra numa oração das Lages (18), deve provir de confusão com Santa Marta, que figura nou- tra oração da mesma localidade (IQ), por defeito de audição. De resto aquela oração parece em tudo ser corrupção desta. Mais difícil é encontrar o motivo da invocação de Santa Suzana na oração micaelense de Vila Franca do Campo :

Ó minha Santa Suzana, Padeira de Jesus Cristo, Deitai-lhe a vossa benção Em nome do Padre, do Filho E do Espírito Santo (15-30)-

Ha mais de uma Santa Suzana no Martirológio, mas de nenhuma delas se referem factos relacionados com o fabrico do pão ou a cozi- nha. São Santa Suzana mártir com Marciana e Paládia, mulheres de soldados romanos de Melicio (24 de Maio), outra mártir em Roma (20 de Setembro), outra ainda, também mártir em Roma, sobrinha do Papa São Caio (11 de Agosto) (28). Da Suzana bíblica nada se diz em igual sentido (30-127), e Santa Suzana não figura como patrono de qualquer profissão (27). Na devoção popular é pouco conhecida. Fes(ejam-na em Turquel como protectora dos bois, mas o facto deriva de se realisar a feira de Landal junto a uma ermida que lhe é dedicada (11-233). Em São Miguel não ha igreja ou capela da sua invocação (16) nem lugar com o seu nome (21). DA ILHA TERCEIRA 243

A falta de explicação não deve, porem, causar surpreza, pois, observa Leite de Vasconcelos (4-673), nem sempre se pode dar razão da existência do nome de um santo numa lenda ou superstição. Nas fórmulas ou orações de São Mateus e Vale de Linhares diz- -se : — «e te livre de má gente»-. Deverá entender-se por tal a gente invejosa susceptível de deitar mau olhado à massa, e lhe dar quebranto. A crença na fascinação, cientificamente admitida ainda no século XVIII, é muito viva no espírito popular e abrange pessoas, animais e cousas. Nalgumas localidades do continente, por exemplo em Monsan- to (9-17), diz-se o mesmo. Na oração do Reguinho a padeira pede a Nossa Senhora que lhe ponha a sua virtude, pois, por sua parte, fez a possível diligência pa- ra o pão ser bom, como em Turquel onde igualmente se afirma — «Eu da minha parte fiz o que pude» (11-287). Em São Sebastião reza-se o Crédo. Rezar nessa altura é prática seguida no continente. Na Idanha a Nova (9-17), no Barroso (12-234), em Vinhais (22 16) recita-se o Padre-Nosso e a Ave Maria. Em Santo Tirso pede se pelas almas (10-234). Nalguns lugares pede-se a Deus que acrescente os bens ao dono do pão, ou lhe dê paz e saúde (10-234); mas na Terceira não encon- trei o costume, como não encontrei rezas para quando a massa des- cai e tem de se amassar de novo. No Alentejo, neste caso, diz-se três vezes :

Em louvor de Nossa Senhora, Com esta faca Este pão venho capar. Foge, pão que te capo (12-45). e em Vinhais:

Senhora Santa Marta, Forneira do Senhor, Fazei que cresça o pão, O pão do meu suor (22-39).

É evidente na primeira das duas rezas, a reminiscência mágica. 244 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

NOTA COMPARATIVA

ORAÇÕES DAS ILHAS

•S. Miguel:

Faz-se uma cruz na massa e diz se :

Marta cozinheira Filha de Jesus Cristo, Pelo caminho que andaste Com Jesus Cristo te encontraste. Assim como cresceu a graça De Deus pelo mundo todo, Assim cresça este pão Até ao cimo do forno.

Ao deitar o pão no forno: Deus te guie e te acrescente e tenha à sua conta, em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo. Acabada a operação sacode-se à boca do forno a toalha que co- briu a massa (17-52).

Vila Franca do Campo :

Ó minha Santa Suzana Padeira de Jesus Cristo, Deitai-lhe a vossa benção. Em nome do Padre, do Filho E do Espírito Santo.

Faz-se uma cruz sobre a massa com a mão e mete-se no meio um dente de alho (16-30).

Madeira '•

Acabada de amassar faz-se uma cruz na massa com a mão e diz- -se: DA ILHA TERCEIRA 245

Assim cresças na massa Como a Virgem está em graça. E assim cresças no pão Como Deus te fez grão. Assim cresças no forno Como Deus no mundo todo. Padre, Filho, Espirito Santo (7-306).

ORAÇÕES DO CONTINENTE Vinhais :

Ao fazer a massa :

São João ts faça pão, São Mamede te levede, São Vicente te acrescente, Em nome de Deus E da Virgem Maria, Um Padre-Nosso Cuma Ave-Maria

Ao meter no forno :

Cresça o pão no forno E a saúde a seu dono, E a paz pelo mundo todo Em honra de Deus E da Virgem Maria, Um Padre-Nosso C au.a Ave-Maria (22-16).

Outras fórmulas ;

São João te faça pão São Clemente te acrescente. Santa Maria te ponha a guia Em honra de Deus 246 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

ou : A Senhora Santa Marta Cresça o pão no forno E o bem e a paz Pelo mundo todo (22-29).

Se a massa descai torna-se a amassar e diz-se :

Senhora Santa Marta Forneira do Senhor, Fazei que cresça o pão, O pão do meu suor (22-39). Barroso : São Vicente Te acrescente São João Te faça pão. Pela graça de Deus E da Virgem Maria, Padre-Nosso Ave-Maria. ou ; São Mamede Te levede São João Te faça pão (31-232). Monsanto : Deus te acrescente Para amparo de muita gente. Fazem cruzes. ou :

Deus te acrescenp, às almas no céo para sempre e nos livre da má gente (9-17).

Vale de Lobos :

Faz-se uma cruz de canto a canto da masseira e diz-se: DA ILHA TERCEIRA 247

Em nome do Padre, do Filho e do Espirito Santo. Pelas almas que te acrescentem. P. N. A. M. (9-17).

Idanha a Nova:

Fazem cinco cruzes, quatro nos cantos, uma no centro e dizem : Deus te acrescente e às almas no céo para sempre. P. N. Ao meter no forno dizem : Com Deus na frente. Rezam pelas almas (9-17).

Marco cie Canavezes:

Antes de enfornar faz-se com a mão uma cruz no ar deante da boca do forno, e depois de enfornar diz-se : Deus te acrescente Dentro do forno E fora do forno, Espalhado por esse mundo todo. Tu a crescer, nós a comer, Que nunca te possamos vencer (24-40). Douro: O Senhor te acrescente Como o fole da semente. Dentro do forno E fora do forno, Como acrescentou o mundo todo. Nós a comer, E tu a crescer, Todos seremos fartos Com bem pouco comer (2-230). Ao deitar o sal: Em louvor de São Gonçalo Que não saias ensosso nem salgado.

Quando se acaba de amassar fazem-se com a mão direita três cruzes na massa e diz-se ; 248 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

l.a Cruz — O Senhor te acrescente, O Senhor te levede. 2 a Cruz — São Mamede te levede. 3.a Cruz — São Vicente te acrescente.

Quando se mete no foi no :

O Senhor te acrescente Como o fole da semente Dentro do forno E fora do forno Como acrescentou o mundo todo. Nos a comer, E tu a crescer Todos ceremos cheios Com bem pouco comer. ou : São Levede Te levede São Crescente Te acrescente nu mais: São João Te faça pão. e : Santa Maria Madalena Te bote a absolvição (2-229). Minho: São Mamede te levede. São Vicente te acrescente. ou : São João te faça pão E te dê a sua benção. ou : São João te faça pão, São Vicente te acrescente. A Virgem Maria Ave-Maria (R. L XXVI-38). DA ILHA TERCEIRA 249

Deus te abençoi Dentro e fora do forno, E o meu vizinho Que coma um corno.

Depois de amassado o pão faz-se uma cruz: Em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo (1-93).

Viana do Cautela ;

Para a massa levedar espeta-se nela um alho, traça-se o sino-sai- mão e diz-se;

São Simão te faça pão, São Vicente te acrescente, São Mamede te levede (25-255).

Guimarães :

Deus te acrescente No forno e fora do forno, Assim como vieste A este mundo todo.

Em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo. Faz-se com a pá uma cruz no forno antes de o fechar.

Ha quem diga por gracejo

E o meu vizinho Que coma um corno (5-215).

San/o Tirso — Paradela

Creça o pão no forno E os bens em casa de seu dono, E a graça de Deus pelo mundo todo.

Quem puder reze um P. N. e uma A. M. pelas almas (10-234). 250 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Cervos : Creça o pão no forno. Saúde a seu dono, E paz pelo mundo todo. P. N. A. M. pelas almas (10-234). Pedronelos : Creça o pão no forno, E os bens pelo mundo todo, E os cuscalhos que nunca saiam do forno (10-234). Padroso ; Creça o pão no forno E os bens a seu dono, E saúde pelo mundo todo.

Reze um P. N. e uma A. M. pelas almas aquele que puder e qui- zer (10-234).

Santo Tirso — Arcos :

Creça o pão no forno, Salvação pelo mundo todo

Reze um P. N. A. M. pelas almas quem quizer e puder (10-234).

Santo Tirso — Toarem :

Creça o pão no forno, E o bem pelo mundo todo, E a fazenda a seu dono. Rezem um P. N. pelas almas (10-234).

Santo Tirso — Montalegre :

Creça o pão no forno E os bens pelo mundo todo. Paz e saúde ao seu dono. Rezemos pelas almas. P. N. A. M. (10-234,). DA ILHA TERCEIRA 251

San lo Tirso — Fiães do liio :

Creça o pão no forno, Os bens pelo mundo todo, Paz e saúde a seu dono. Ele a crescer, E nós a comer Que não possamos vencer. P. N. A. M. pelas almas (10 234).

Santo Tirso — Areias :

Para o pão levedar faz-se uma cruz e diz-se ;

São Vicente (e acrescente.

Quando se fecha a porta do forno diz-se;

Deus te abençoi Dentro do forno E fora do forno Assim como Dcusando.i Pelo mundo todo. Em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo (10-52).

Figueira da Foz :

O Senhor te acrescente Como o saco da semente, Que é para comer muita gente (13-28). Trancoso : São João te faça pão, São Vicente te acrescente, E a Virgem Maria te deite também a divina benção Em louvor da sagrada Morte e Paixão De Nosso Senhor Jesus Cristo. P. N. A, M. (6122). 252 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Malpica ; Deus te acrescente (6-122). Vilar Formoso : Só se diz o P. N. (6 122).

Cortiço da Serra ;

São João te fez em grão Que te faça também em pão (6-122). Maçainhas: São Levede te levede, São João te faça bom pão, São Vicente te acrescente, Santa Maria te traga a riba. E Nosso Senhor te deite a benção.

Faz-se uma cruz : Em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo. P. N- A. M. (6-122).

Trinta : Santa Clara te clare, São João te faça pão, Em louvor da sagrada Morte e Paixão De Nosso Senhor Jesus Cristo (6-122). Alentejo :

Ao deitar a ultima água na massa :

Lá vai em louvor de Santo Antão, Para que cresça mais um pão ou Lá vai em louvor de Santo Antão Para que cresça agora em massa Como cresceu no grão.

Faz-se com a mão de cutelo uma cruz na massa e diz-se: DA ILHA TERCEIRA 253

Deus te acrescente E às almas no céo para sempre ; Assim como a Virgem é pura Assim Deus acrescente A minha amassadura.

Também fazem cinco pontinhos na massa dizendo : Em louvor das cinco chagas de N. S- Jesus Cristo. Se a massa leveda de mais ou descai e tem de se amassar de novo, diz-se três vezes: Em louvor de Nossa Senhora, Com esta faca Este pão venho capar. Foge, pão, que te capo.

Chama-se capar o pão fazer cruzes com a faca na massa (12-45).

Baixo Alentejo (Ourique) :

Faz-se uma cruz na massa com a mão em cutelo :

Cresça o pão no alguidar Como o Senhor subiu ao altar ou : Deus te acrescente E as almas no céo para sempre.

Ao enfornar fazem-se cruzes. Fazem uma cruz no fermento e deitam sal no prato por causa das bruxas e também porque conserva (26-185).

Turquel:

Depois de amassar faz-se sobre a massa uma cruz com a mão em cutelo e diz-se : São Mamede te levede, São Vicente te acrescente, São João te faça pão. 254 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO ou : São Bento e São Vicente te acrescente. ou: Deus te acrescente Para amparo de muita gente. ou : Deus te ponha a virtude Que eu fiz o que pude (11-287). Cadaval ; Nosso Senhor te acrescente E te livre da mã gente (14-99L

São Vicente te acrescente ; São Mamede te levede ; São Freigii te faça vir; Santo Abraão te faça pão. E nós a comer e tu a crescer ; Tudo Deus Pode fazer (31-300). Algarve : Cresça o pão no forno e as almas no paraizo (31-302).

ORAÇÕES DA GALIZA

Pan enhornado sea Dios alabado, que lo alce en el horno y Io bajs en el mercado DA ILHA TERCEIRA 255

Va al pan al Iiorno va la vida de Dios todo. Dios lo aumente en los agros y lo baje en los mercados

ya el pan al horno va la gracia de Dios por el mundo todo. Dios lo baje en el mercado y lo alce en el horno alguns acrescentam Com el poder de Dios y la Virgem Maria.

San Pantaleon que lo saque bueno. San Justo dei poco que haja mucho. San Vicente que lo acreciente.

San Vicente que lo acresciente y a San Pantaleon que lo saque bom.

San Pantaleon que dé medra al pan dei horno y a dei mondo todo.

Dios conserve el pan dei horno y dei mondo todo.

Nombre dei Padre, dei Hijo y dei Espirito Santo Dios le recalente en Ia casa y en el horno, y el Santíssimo Sacramento dei altar.

El pan por la pala y Ia pala por el horno, y la gracia de Dios por el mondo todo. (29-147) 256 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

NOTA BIBLIOGRÁFICA

!■ Dr. José Leite de Vasconcelos. «Ensaios Etnográficos», vol. II. Espozende, 1903. 2. Dr. José Leite de Vasconcelos. «Tradições populares de Portugal», Porto, 1882. 3. Dr. José Leite de Vasconcelos. «Opúsculos», vol. V. Lisboa, 1938. 4. Dr. José Leite de Vasconcelos. «Opúsculos», vol. VII. Lisboa, 1938. 5. Alberto Vieira Braga. «De Guimarães». Espozende, 1924. 6- Hellmuth Messerschmidt. «Haus und Wirtschaft in der Serra da Estrela», na Volkstum und Kulhir der fiomanen, 1V-72. 7. Kate Brudt Madeira. «Estudo Etnográfico». Lisboa, 1938. 8. Paul Sebillot. «Le Folk-Lore. Paris, 1913. 9. Jaime Lopes Dias. «Etnografia da Beira», vol. III. Lisboa, 1929. 10 A. C. Pires de Lima. «Tradições populares de Santo Tirso» na Revista Luzitana, XVI1 e XVIII. 11 José Diogo Ribeiro. «Turquel folclorico», na Revista Luzitana, XX e XXI. 12 Prof. Joaquim Roque. «Rezas e benzeduras populares». Beja, 1946. 13 Cardoso Martha e Augusto Pinto. «Folclore da Figueira da Foz», vol. I. Espozende, 1911. 14 Cardoso Martha. «Folclore do Cadaval». Espozende, 1934. 15 Urbano de Mendonça Dias. «A Vila», vol. IV. Vila Franca do Campo, 1919. 16 Urbano de Mendonça Dias. «Historia dos Açores». Vila Franca do Campo, 1424. 17 Lígia Maria da Camara Almeida Matos. «Ilha de S. Miguel. Seu dialecto e literatura popular». Ponta-Delgada, s/d- DA ILHA TERCEIRA 257

18. Padre Bellester. «Os quatro Evangelhos e os Actos dos Aposto- los». Lisboa, 1916. 19. Fernando Braga Barreiros. «Tradições populares do Barroso», na /teoista Luzitana, XVIII-223. 20. João da Silva Correia. «A rima e a sua acção linguistica», n' O Instituto, LXX1X-79 e 203. 21. Gaspar Frutuoso. «Saudades da Terra». L. IV, T. 3.°. Ponta-Delga- da, 1931. índice toponímico 22. P. Fermino A. Martins, «Folc-lore de Vinhais», vol. II. Lisboa. 23. «Os Fastos de Publio Ouvidio Nasão». Tradução de Antonio Feli- ciano de Castilho, vol. III. Lisboa, 1862, 24. João de Vasconcelos. «Tradições populares», na Revista Luzi- tana, XXV-29. 25. Afonso do Paço. «Usos, costumes, contos, crenças e medicina popular», na Revista Luzitana, XXVIII-245. 26. Maria da Conceição Dias. «Tradições populares do Baixo Alen- tejo» (Ourique) na Revista Luzitana, XVI-18. 27. Emanuel Ribeiro. «Como os nossos avós aprendiam uma profissão». Gaia, 1930. 28. P.e Croiset. «Ano Cristão». Tradução do P.e Matos Soares. Porto (1923). 29. W. Ebeling und F. KrUger. «Lândliches Leben ais Motiv des gali- zíschen Volksliedes», na Volkstam und Kultur det Romanen, X-Í29. 30. J. 1. Roquette. -Historia Sagrada». Tomo l.o. Paris, 1850. 31. Guilherme Felgueiras. «O povo e o fabrico do pão», na Revista Luzitana, XXXVII-300.

Nas citações no texto o primeiro numero indica a obra e o segun- do a página. BIBLIOGRAFIA

P.e Leonardo de Saa Soto Mayor—Alegrias de Portugal ou lagrimas de castelhanos na feliz aclamação de El-Rei D. João o Quarto. Publicação do original com introdução e apên- dice por Manuel Coelho Baptista de Lima, Bibliotecário da Assem- bleia Nacional. Lisboa, 1947, 121 pág.

É separata dos tomos VI, Vil e VIII da revista Independência. Este curioso manuscrito da Biblioteca Nacional foi editado com todo o esmero e rigor científico, pelo nosso ilustre patiício sr. Dr. Bap- tista de Lima, competentíssimo bibliotecário, cuja dedicação ao Institu- to nunca é de mais encarecer e aquém o nosso distrito, ainda ha pouco ficou devendo altíssimo serviço, pelo modo como procedeu à encorpo- ração dos primeiros núcleos documentais no recencriado Arquivo Distrital. O livro do P.e Soto Mayor, testemunha presencial dos aconteci- mentos, pois era ao tempo capelão da Sé de Angra, absolutamente fidedigna, escrito com isenção e belo estilo, é um documento do maior valor e préstimo para a história da Restauração na Terceira, esclare- cedor de muitos pontos obscuros, com bastantes novidades e porme- nores, e não nos parece exagêro considera-lo a mais perfeita relação dos factos que se conhece. Em apêndice insere o sr. Dr. Baptista de Lima fotocópia e sua leitura da Capitulação do Castelo do Monte-Brasil. DA ILHA TERCEIRA 259

José Bruno Carreiro. Antero de Quental. Subsídios para a sua biografia. Lisboa, 1948, 2 volumes.

Em cuidada edição do Instituto Cultural de Ponta-Delgada, de que é depositária a Livraria Morais de Lisboa, acaba de aparecer este notabilissimo trabalho do sr. Dr José Bruno Carreiro, verdadeiro e imperecível monumento ao maior poeta português depois de Camões, que os Açores têm a felicidade de contar entre os que neles nasceram. Estudo profundo, exaustivo, tão documentado que bem se pode afir- mar nada relativo à vida de Antero ter sido esquecido, elaborado com extrema imparcialidade e isenção, é um livro único na literatura portu- guesa, e, a nosso ver, só se pode comparar aos admiráveis e esgotan- tes trabalhos da saudosa D. Carolina Michaelis de Vasconcelos, desi- gnadamente o Sá de Miranda, embora concebido e realisado nou- tros moldes. Nessa penetrante investigação o autor anotou, com impecável ló- gica e método, tudo o que a Antero se referia: — correspondência, artigos, críticas, notícias de contemporâneos que com ele conviveram, retratos, por forma a reconstituir-lhe a vida e dela aproximar a obra. E, caso extraordinário, o sr. Dr. José Bruno, tão apaixonado pela gran- de e nobre figura de Antero, que consagrou anos e anos de trabalho a recolher e sistematisar tão abundantes materiais, nem uma só vez se deixa arrastar pela paixão e os seus juizos são sempre objectivos e imparciais. Tamanho escrúpulo e respeito pela verdade é digno da maior admiração e louvor. Sem nunca se desviar do fim principal, a obra é ainda excelente repositório de factos que nos habilita a bem conhecer a sociedade do tempo de Antero e a envergadura moral dos que foram seus amigos. Este livro, honrando o seu autor e a memória do genial poeta filósofo, honra igualmente as nossas ilhas e a cultura açoreana, que nele encontra a sua mais elevada expressão. Bem se pode dizer que biógrafo e biografia estão à altura do bio- grafado. 260 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Carreiro da Costa—A cultura do pastel nos Açores. Subsí- dios para a sua história. S. Miguel (Açores). 1946, 37 pág. O inhame. Apontamentos para a história da sua cultura. S. Miguel (Açores), 1948, 24 prrg. + 1 n/n.

Estes dois opúsculos são separatas dos n.os 4 e 8 do excelente Boletim da Comissão Reguladora dos Cereais do Arquipélago dos Açores, e neles o distinto escritor e etnógrafo micaelense, sr. Dr. Car- reiro da Costa, em linguagem clara e elegante, com ótimo método de exposição, reúne abundantes informações. No primeiro, socorrendo-se de todos os elementos dispersos, faz a história da importante cultura e preparação do pastel, principal fonte de riqueza das ilhas, sobre tudo de São Miguel, nos primeiros tempos após o início do povoamento. O segundo é ao mesmo tempo história e economia agrícola, pois tanto se ocupa do passado como do presente, e bem merece esse es- tudo o tubérculo que é, como diz o autor, «entre os tubérculos cultiva- dos e consumidos no Arquipélago dos Açores, um dos que mais gosa da preferencia dos açorianos.» Ao contrário do pastel que por volta de 1700, ao que parece, deixou de ser cultivado, o inhame cêdo introduzido nas ilhas continua a sè-lo, nalgumas até com certo desenvolvimento constituindo apreciá- vel produção, segundo se vê do artigo do sr. Dr. Carreiro da Costa. Como a história económica insular está, a bem dizer, por fazer, estes dois excelentes trabalhos ocupam primacial lugar, e oxalá o au- tor, para isso tão solidamente preparado, nos dê em breve outros se- melhantes, tanto mais que encara os assuntos em todo o arquipélago e não apenas na sua ilha.

Luís Bernardo Leite d^tahioe — Etnografia micaelense. Trechos da vida rústica regional. Ponta-Delgada (S. Miguel), Açôres. 1948. 239 pág. -f 1 n/n. A urbanisação de Ponta-Delgada c a sua arquitétura. Ponta-Delgada. 1948 — 29 pág.

Estes dois volumes, saídos das oficinas Artes Gráficas, são mais DA ILHA TERCEIRA 261 um ótimo serviço prestado à etnografia e história da arte micaelense pelo seu ilustre autor. O primeiro é a reunião de parte dos artigos que. com inalterável regularidade e constante interesse, tem publicado no jornal A Ilha. Escritos no sedutor estilo do sr Dr. Luís Bernardo, com nítido recorte literário, neles se descrevem costumes e tipos populares, se recordam lendas e episódios históricos e se reproduzem modos de di- zer, palavras e frases do povo micaelense. Embora destinados ao grande público, mercê da alta cultura e do rigoroso método de investigação do autor, constituem excelente ele- mento de estudo para quem queira faze-Io ; e só nos é licito desejar que em breve se reunam em volume os outros muitos artigos, que quedam nas colunas do jornal sempre de difícil consulta. No segundo trabalho mencionado, o sr. Dr. Luís Bernardo serve- -se principalmente das suas especiais qualidades de sagacíssimo críti- co e historiador da arte micaelense, a quem tanto já se deve. A-pesar-das suas pequenas dimensões é, pelo que ensina, pelas novidades que a cada passo nos dá, pelo profundo conhecimento do assunto que revela, contribuição valiosíssima para o estudo da habi- tação açoriana, ainda tão pouco versado, e, aproximado do não menos importante opúsculo — Ermidas Micaelenses, dá-nos assaz com- pletas informações sobre arquitetura regional.

Oswaldo R. Cabral — Assuntos Insulanos. Contribuição ao estudo do povoamento de Santa Catarina pelos casais açorianos e madeirenses. Florianópolis, 1948. 98 pág. + 5 n/n.

Em elegante brochura composta nas oficinas da Imprensa oficial do Estado de Santa Catarina, mandada imprimir para distribuição pela Prefeitura Municipal de Florianópolis, o autor que foi grande animador da comemoração centenária da ida dos ilhéos para Santa Catarina, e, por assim dizer, a alma do congresso de história a que noutro lugar fazemos referência, reuniu vários artigos e discursos de circunstância. Embora trabalho mais de vulgarização do que de investigação original, como será o que sabemos prepara, constitui excelente serviço prestado aos dois arquipélagos atlânticos, pois muito contribuirá para 262 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO difundir o seu conhecimento naquele florescente Estado do Brasil, sobre tudo nos lugares onde maior foi a acção e influência de açoria- nos e madeirenses; e se o papel que desempenhamos é por muitos títulos sumamente honroso, não é menos cativante a forma como está sendo estudado e apreciado pelos brasileiros de hoje.

«Insular porluguese pronunciation : Porto Santo and eastern Azores*, por Francis Millet Rogers. Híspanic-fíeniew, volume XVI, Janeiro de 1948. N.0 1.

Como já dissemos no anterior volume deste Boletim, o distinto professor de filologia românica da Universidade de Harvard, sr. Dr. Francisco Millet Rogers, vem publicando na IIíspanic-Reinew uma série de artigos sobre a pronuncia portuguesa nas ilhas, resultado da sua viagem de estudo à Madeira e Açores em 1938-39. O primeiro artigo, que saiu no n.o 3 do vol. XIV, Julho de 1946, a pág. 233-253, abrange a parte relativa à ilha da Madeira, e o acima mencionado o falar das ilhas do Porto Santo, Santa Maiia e São Mi- guel. A alta e especialíssima competência do autor, a seriedade e minu- ciosidade do seu trabalho, o método de investigação seguido dão a esses artigos lugar de excepcional importância na bibliografia açoreana, infelizmente ainda tão restrita pelo que respeita ao falar da gente do povo. Em sua opinião o dialecto de Santa Maria, sob o aspecto fonético, oferece oito características : '•0 A substituição do a tónico normal português por um a anterior, tendendo para o aberto, como em gado ; 2-0 — A adição de a ao ou tónico final, como em passou ; 2-0 A nasalaçâo de vogais tónicas seguidas pelos intervocálicos m, n ou nh ; 4-° A substituição do a tónico normal, quando seguido por m, n ou nh, e do e tónico normal, quando seguido de nh, pelo a ante- rior nasalado, como em cama e tenho ; 5-0 — A substituição do ã tónico normal pelo som mencionado no numero 4, como em irmã; DA ILHA TERCEIRA 263

6.° — O frequente emprego do i para quebrar um hiato, com em ha anos; 7.o — O uso de um / especial, como em janela; 8.° — A substituição do em normal tónico português por ai na- salado, com em vem. As características da pronuncia micaelense são, em resumo: I.o — Substituição do u tónico português por il como em tudo; 2.o — Substituição do a normal tónico por um a anterior, tenden- do para aberto, como em vaca ; 3.° — Substituição do oi normal por õ, como em noite ; 4.o — Substituição do ô tónico ou átono, mas somente quando escrito com ou, por õ como em Sousa; 5.o — Substituição do ô tónico normal, mas somente quando es- crito ó, por u, como em povo; 6.o — A nasalação de vogais seguidas pelos intervocalicos m, n ou nh, como em pena ; 7.° — Substituição do a normal tónico, quando seguido de nh, por um a anterior nasalado, como em lenha; 8.o — Substituição do ã normal tónico ou átono, pelo som men- cionado no n.o 7.o como em irmã e francês ; 9.o — Omissão do i nos ditongos tónicos finais terminados em i, como pai ; lO.o — Omissão do u nos ditongos tónicos finais terminados em u, como morreu ; II.°— Omissão do a final átono, como em Virgínia-, 12.o — Substituição da última silaba átona am por ê, como em falavam ; 13.o —O uso de um l especial, como em janela ; 14 o _ Substituição do Ih normal pela semivogal /, como em pa- lha ; 15.o — Flutuação na qualidade os ê, ó, o, e, S, normais. L. li. Publicações Recebidas

Por oferta e por troca com o Boletim do Instituto, receberam-se e muito se agradecem as seguintes publicações :

♦Boletim da Junta de Província do Douro Litoral». Vol. VIII — 1947. «Estudos Etnográficos, Filológicos e Históricos» por Augusto Cesar Pires de Lima — Junta de Província do Douro Litoral. Vol. I.0 — 1947. «Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa». N .OS 7 e 8 - 1947— 65.a série. «Boletim Municipal da Perfeituria Municipal de Porto Alegre»—Brasil Vol. X — 1947 - N.o 27. «O Instituto» Revista Científica e Literária — Homenagem à memó- ria de Eugénio de Castro. Vol. 109.o — 1947. «lhe Library of Congress» — Quarterly Journal. Vol. 4 — 1947 — N.o 3. «Revista de História» — Universidade de La Laguna (Islas Canarias) Vol. 79 — 1947.

«Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa». N.os 9 e jq - 1947 — 65.a série «Alocuções escolares e outros escritos» por João H. Anglin — 1947. «Geographical Review». Vol. XXXVI — 1946 - N.os 1 a 4. «Geographical Review» — The American Geographical Society of New

lork. Vol. XXXVII — 1947 — N.os ] a 4. * DA ILHA TERCEIRA 265

«Geographical Review» — The American Qeographical Sociely of New lork. Vol. XXXVIII — 1948 — N.o 1. «Boletim da Comissão Reguladora dos Cereais do Arquipélago dos Açores» N.o 7 — 1948, «Revista de História» — Faculdade de Filosofia e Letras - Universi- dade de La Laguna. Vol. 80 - 1948. «Azurara» (Concelho de Vila do Conde). Edição da Junta de Provín- cia do Douro Litoral — 1948. «Revista de Guimarães»— Sociedade Martins Sarmento. N.os 1 e 2 — 1947. «Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa». N.os n e 12 — 1947 — 65.a série. «Boletim da Junta de Província do Douro Litoral». Vol. IX — 1947. «Na morte de Júlio Brandão» por Vasco Cesar de Carvalho — 1947. «Causa invulgar» por Vasco Cesar de Carvalho — 1942. «Pedras Soltas» por Vasco Cesar de Carvalho — 1942. «Aspectos de Vila Nova» por Vasco Cesar de Carvalho — 1944. «Servindo Calendário» por Vasco Cesar de Carvalho — 1946. «Hoje, como ontem» — O Estado Novo — Doutor Marcelo Caetano — 1946. «Algumas inscrições medievais do Douro Litoral» por Armando de Matos — 1947. «Agronomia Lusitânia» — Estação Agronómica Nacional. Vol. 7. N.0 3 — 1945. «Arquivo do Distrito de Aveiro». Vol. 49 a 51 — 1947. «Ecos da Praia da Vitória» por Costa Júnior — 1946. «Quarterly Journal» — The Library of Congress. Vol. 5 — 1947 — N.o 1. «Boletim da Junta de Província da Estremadura». Vol. XV e XVI — 1947 — Série 11. «Aspectos de Vila Nova» — «A Justiça» por Vasco Cesar de Carvalho — 1947. «O Instituto» — Coimbra. Vol. 110 — 1947. «Quarterly Journal» — The Library of Congress. Vol. 5— 1948 — N.0 2 «Geographical Review». Vol. XXXVI11 — 1948 - N.o 2. 266 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Revista de Guimarães» — Sociedade Martins Sarmento — Vol. LVH — 1947 — N.os 3 e 4- Insulana» — Órgão do Instituto Cultura! de Ponta Delgada — Vol. III — 1947 — N.o 2. Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa* — N.os 1 e 2 — 1948 — 66.a série- Crónica inédita e clandestina do infeliz Rei D. António I, Prior do Crato», por Pero Rodrigues Soares — l.a, 2 ae 3.a partes- :Arquivo do Distrito de Aveiro». N.o 52 — 1947- Insulana» — Órgão do Instituto Cultural de Ponta Delgada. Vol. III — 1948 — N.os 3 e 4. Boletim da Comissão Provincial de Etnografia e História» — Junta de Província do Douro Litoral. Vol. I — 1948. Revista de História — Universidade de La Laguna. Vol. 81 — 1948. Boletim da Junta de Província da Estremadura». Vol. XVII — 1948. — série II. «Revista Portuguesa de Filologia» — Separata de notas bibliográficas. Vol. I — 1947 - Tomo 1 e II. «Dois anos na Direcção da Sociedade Martins Sarmento» por A. Sil- vio de Macedo — 1948. «A Instrução Pública e São Leopoldo» por Walter Spalding — Sepa- rata;.— 1947. «Rio dos Sinos» por Walter Spalding — Separata — 1947. «Boletim da Comissão Reguladora dos Cereais do Arquipélago dos Açores». Vol. 8 — 1948 — 2.° semestre, «Estudos Etnográficos, Filológicos e Históricos» por Augusto Cesar Pires de Lima. Vol. 2 ° — 1948. «Índice Cultural Espanhol» — Ministério de Assuntos Exteriores — Vol. 111 — N.»s 27 e 28 — 1948. «Espanha» — Edição da Oficina Informativa Espanhola — 1947. «Seleccion» de Notícias — Edição da Oficina Informativa Espanhola N.os 25 a 29 ~ 1948. «Oeographical Review» — Publicação da American Geographical So- ciety of New lork. Vol. XXXVIII — 1948 - N.0 3.

«Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa» N.os 3 e 4 _ 1943 — 66.a série. «Arquivo do Distrito de Aveiro», Vol. 53 — 1948. DA iLHA TERCEIRA 267

«Revista Portuguesa de História», pelo Dr. Julião Soares de Azevedo — Tomo III — 1945. «Um filho de D. Pedro II na Universidade de Évora», pelo Dr. Manuel C. Baptista de Lima — 1947. «índice Cultura) Espanhol» — N." 29 — Ano III. «Antero de Quental» — Subsídios para a sua biografia, por Dr. José Bruno Carreiro — Vol. I e II — 1948. «Revista de Guimaiães» — Sociedade Martins Sarmento — Vol. LVI1I — 1948 — N.os i e 2. «Os Açores e o Rei D. António, Prior do Crato» por A- Virgínio Bap- tista — 1932. «Silhuetas Biográficas e Históricas», por A. Virgínio Baptista — 1931. «Guia do viajante na Praia da Vitória», por A. Virgínio Baptista — 1929. «Madeira e S. Miguel, no passado, no presente, no futuro», por J. Silva Júnior — 1948. «Boletim da Junta de Província» do Douro Litoral« — Vol. I — 1948. — 3 a série. «Convénio Hispano-Filipino de Derechos Civiles» — 1948.

«índice Cultural Espanhol» — N.os i( 29 e 30 — 1948 — Anos 1 e 111. «Arquivo do Distrito de Aveiro» — N.0 54 — 1948. «Geographical Revitw» — 1948, «A cidade de Évoie» — Biktim da Câmara Municipal — Anos III, IV e V — 1945, 1946 e 1947 — N.os 9 a 14. «Arquivo de Beja» — Boletim da Câmara Municipal — Vol. IV e V — 1947 e 1948. «Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa» — N.os 5 e g _ 1943. - 66.a série- «Beja», por Abel Viana — 1943. «Paleolítico dos arredores de Beja e do literal algarvio» por Abel Vi- ana — 1947. «Origem e evolução histórica de Beja» por Abel Viana — 1944. «Alguns exemplos paleolíticos de Cordoba la Vieja», por Abel Viana — 1946. «Museu Regional de Beja*, por Abel Viana — 1944 e 1946. «Escultura Infantil no Algarve», por Abei Viana — 1944- «Restos de caminhos romanos nas Caldas de Monchique», por Abel Viana, José Formozinho e Octávio da Veiga Ferreira — 1948. 268 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

«Trabalhos de Antropologia e Etnografia da Sociedade Portuguesa de Antropologia e Etnografia», — Vol. XI — 1943 — Fase. 3-4. «Revista de História» — Faculdade de Filosofia e Letras — La Laguna — n.os 82-83 — 1948. «Boletim da Junta de Província da Estremadura» — Vol. XVIII — 1948 — série II. «Quarterly Journal» — The Library of Congress —Vol. 466 — 1947 — n.o 4- «Assuntos Insulares» — Contribuição ao estudo do povoamento de San- ta Catarina pelos casais açoreanos e madeirenses, por Oswaldo R. Cabral — 1948. «Saitabi» — Revista de História, Arte e Arqueologia — Valencia — n.0 28 — Ano VIII — 1948 — Tomo VI. «índice Cultural Espanhol» — Ministério de Assuntos Exteriores — n.os 32 e 33 - 1948. «Boletim do Museu Nacional de Arte Antiga» — Vol. 1 — 1946 -- n.os 1, 2 e 3 «Prosa Sadia», por Ferreira da Rosa — Rio de Janeiro — Vol. 8.o — 1946. VIDA DO INSTITUTO

ACTA DA PRIMEIRA SESSÃO ORDINÁRIA REALIZADA EM 20 DE MARÇO DE 1948.

Presentes os sócios Dr. Luiz da Silva Ribeiro (presidente), Dr. Francisco Lourenço Valadão Júnior, Raimundo Belo, Francisco Coelho Maduro Dias, Major Miguel Cristóvão de Araujo, Major Frederico Lo- pes Júnior, Dr. Manuel Cardoso do Couto, Dr. Francisco Garcia da Rosa, Dr. Manuel de Sousa Menezes e Tenente-Coronel José Agostinho (secretário). Aberta a sessão pelas 20 h. 30 m. O Presidente congratulou-se com a presença de Sua Ex.a o1Go- vernador do Distrito, Dr. Cândido Pamplona Forjaz, sócio efectivo do Instituto, que fez uma exposição do centenário do povoamento da Ilha Terceira, a que mais adiante se faz referencia. Deliberações tomadas : 1) — Manter em vigor o orçamento de 1947 até que se conheçam os encargos que por ventura advenham para o Instituto da organiza- ção do Arquivo e do Museu. 2) — Colaborar no Congresso Luso-Brasileiro de Folclore, bem como no Congresso Histórico comemorativo do segundo centenário da ida de açoreanos para a Ilha de Santa Catarina (Brasil). 3) — Procurar obter cópia da correspondência do General Antó- nio de Saldanha e Capitãis-Qenerais recentemente encontrada em ar- 270 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO quivos de Lisboa, e cartas ao General Prego existentes na Biblioteca da Universidade de Coimbra, bem como de quaisquer documentos respeitantes aos Açores existentes nos arquivos de Sevilha. 4) Encarregar o sócio Snr. Major Araujo de dar parecer, para efeitos de publicação, do artigo apresentado pelo Snr. Capitão José Raposo «Organização Militar da Ilha Terceira». 5) — Dividir por dois números do Boletim a publicação da co- lecção de canções populares organizada pelo sócio Snr. João Moniz, em vista das dificuldades que surgiram na publicação. 6) Agradecer aos Ex.mos Governador do Distrito Autónomo, Presidente da Junta Geral e Deputado Dr. Teotónio Machado Pires, toda a boa vontade e diligencia empregadas na criação do Arquivo Distrital e .Museu, bem como ao Snr. Major Frederico Lopes o cui- dado e atenção que sempre este último lhe tem merecido com o pedi- do de continuar a dispensar a sua colaboração ao Museu. 7) — Cessar toda a actividade quanto ao Museu até que oficial- mente sejam fixadas as directrizes a observar. 8) — Agradecer ao Professor da Universidade de Harvard, Snr. Dr. F. Millet Rogers as lisongeiras apreciações feitas aos trabalhos do Instituto. 9) — Agradecer ao Dr. Manuel Coelho Baptista de Lima, Biblio- tecário da Assembleia Nacional, a simpatia e preciosa colaboração até agora prestada ao Instituto, em particular na criação do Arquivo Dis- trital. 10)— Procurar estabelecer troca do Boletim com a revista brasi- leira «Lingua e Linguagem». G) — Centenário — O Instituto tendo conhecimento, pela expo- sição do Ex.mo Governador do Distrito, Snr. Dr. Candido Pamplona Forjaz, de que ele pretende promover a comemoração centenária do povoamento da Terceira em 1949 de acordo com a conjectura formu- lada pelo Snr. Dr, Manuel de Menezes, embora reconheça que a fixa- ção do ano preciso do início do povoamento fica sujeita a controvérsia, resolveu associar-se àquela iniciativa. 12) — Deliberado admitir como sócios contribuintes os Snrs. Enge- nheiro Manuel Rodrigues de Miranda e Isaias Enes Barcelos, residen- tes nesta cidade, Vasco Cesar de Carvalho, residente em Vila Nova de DÂ ILHA TERCEIRA 271

Famalicão (Minho), Manuel Machado Avila, residente na Ilha Graciosa e Livraria Portugal, Rua do Carmo, 70, Lisboa. ^ — Sócio efectivo —Foi eleito, por unanimidade de votos, só- cio efectivo do Instituto, para preenchimento de uma das vagas existen- tes, o Rev.0 Padre Inocêncio de Sousa Enes. 14) Sócio correspondente — Foi eleito, por unanimidade de votos, sócio correspondente do Instituto, o Snr, Salvador Dias Arnaud, residente em Coimbra. Encerrada a sessão pelas 22 h. 45 m.

(assinados) — Luiz da Silva Ribeiro José Agostinho

ACTA DA REUNIÃO ORDINÁRIA DE 7 DE JUNHO DE 1948.

Presentes os sócios: Dr. Candido Pamplona Forjaz, Dr. Luiz da Silva Ribeiro (Presidente), Dr. Teotónio Machado Pires, Dr. Manuel de Sousa Menezes, Raimundo Belo, Major Miguel Cristóvão de Araujo, Major Frederico Lopes Júnior e Tenente-Coronel José Agostinho (se- cretário). Aberta a sessão pelas 20 h. 30 m. Lida e aprovada a acta da sessão anterior. Tomadas as seguintes resoluções: 1) Congratulações peia criação do Arquivo Distrital. — Por proposta do sócio Dr. Candido Pamplona Forjaz (Governador do Dis- trito), foi aprovado por unanimidade um voto de agradecimento ao só- cio Dr. Teotónio Machado Pires, pelos esforços empregados para a criação do Arquivo Distrital. 2) — Congresso Internacional de Geografia em Lisboa. — Tomou- -se conhecimento de vários documentos referentes a este Congresso, enviados pela Comissão Promotora do mesmo, resolvendo-se que não estão no âmbito das actividades do Instituto Histórico os assuntos que ali vão ser tratados. 272 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

3) — Congresso de História do Brasil. — Rccebeu-se igualmente um pedido de colaboração para esse Congresso, da parte do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil, verificando-se que o Instituto não dispõe de elementos para assegurar a colaboração solicitada. 4) — Trabalho do Dr. Millet Rogers sobre a linguagem Açorea- na. — Autorizado fazer-se a tradução do mesmo para publicação do Boletim de Estudos Filológicos. 5) — Dr. Rogers. — Resolvido enviar congratulações ao açorea- nista americano, Dr. Millet Rogers, professor na Universidade de Har- vard, pela sua designação para director do Departamento de línguas românicas da mesma Universidade. 6) — Nome a dar ao futuro Museu Regional. — Resolvido soli- citar oportunamente que o Museu Regional venha a ter o nome de «Almeida Garret» (proposta do sócio honorário, prof. Doutor Vitorino Nemésio). 7) — Livro das Fortalezas. — Aprovar o procedimento do Presi- dente ao mandar tirar fotocópias do relatório do General Saldanha (1641) e Livro das Fortalezas de Angra, do século XV1I1, descobertos em arquivos do continente pelo sócio honorário Dr. Manuel Coelho Baptista de Lima. 8) — Resolvido que se procure coleccionar os registos de santos, espalhados pela ilha, para figurarem no Museu. 9) — Centenário do Padre Jerónimo Emiliano de Andrade. — Resolvido que o Instituto se associe às comunicações do centenário deste erudito professor e pedagogo terceirense. 10) — O Snr, Presidente fez um relato dos trabalhos já reunidos para publicação no Boletim e instou com os sócios para que apresen- tem mais contribuições para o mesmo. 11) —Arquivo Distrital. — Aprovada a proposta do sócio Dr. Teotónio Machado Pires para que se procure obter que sejam provi- soriamente arrumados em dependências da casa de escola «Infante D. Henrique» os documentos que hajam de ser incorporados no Arquivo Distrital, solicitando-se da Junta Geral do Distrito, que procure obter facilidades para a vinda a Angra do Dr. Manuel Coelho Baptista de Lima, Director da Biblioteca da Assembleia Nacional, que se ofereceu para dar inicio aos trabalhos de organização do Arquivo. DA ILHA TERCEIRA 273

12) — Sócios contribuintes - Admitidos como sócios contribuintes os Senhores Isaias Enes Barcelos, residente em Angra do Heroísmo, Dr. Alvaro de Sampaio, professor Liceal em Aveiro, Manuel Machado Avila, residente na Ilha Graciosa, Engenheiro Civil Manuel Rodrigues de Miranda, Director de Obras Públicas em Angra do Heroísmo, Li- vraria Portugal, Rua do Carmo, 70, Lisboa e Dr. Martim Machado de Faria e Maia, Secretário da Legação de Portugal em Haia (Holanda). Encerrou-se a sessão pelas 22 h. 45 m.

(assinados) — Laiz da Silva Ribeiro José Agostinho

REUNIÃO EXTRAORDINÁRIA DE HOMENAGEM Á MEMÓRIA DO SÓCIO DR. HENRIQUE BRAZ.

No dia 11 de Agosto de 1948, primeiro aniversário do falecimento do sócio Dr. Hemique Braz, reuniu o Instituto sobre a presidência do Dr. Luiz da Silva Ribeiro, comparecendo a maioria dos sócios efecti- vos e achando-se também presente o filho do falecido, Dr. Henrique da Costa Braz e várias outras pessoas que quizeram com a sua pre- sença associar-se a esta homenagem. Usou da palavra o presidente do Instituto, que fez o elogio do sócio falecido, devendo o seu discurso ser inserido no Boletim. Usou também da palavra o sócio José Agostinho, que igualmente fez elogiosas referências à personalidade e aos méritos do homena- geado. Os sócios presentes aplaudiram as palavras dos dois oradores, manifestando o seu pesar pela perda que o Instituto sofreu com o fa- lecimento de um dos seus mais dedicados sócios que deixou uma lacuna difícil de preencher.

(assinados) — Luiz da Silva Ribeiro Jusé Agostinho 274 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

REUNIÃO EXi RAORDINARIA DE 16 DE OUTUBRO DE 1948

No dia 16 de Outubro de 1948 reuniu-se o Instituto em sessão extraordinária, sob a presidência do Dr. Luiz da Silva Ribeiro, compa- recendo a maioria dos sócios. Abriu a sessão pelas 20 h. 30 m. Lida e aprovada a acta da sessão anterior, foram tratados os se- guintes assuntos : 1) — Tendo cessado as suas funções de Presidente da Junta Ge- ral de Angra do Heroísmo o Snr. Coronel Feliciano Antonio da Silva Leal, o Instituto resolveu por unanimidade, sob proposta do Snr. Pre- sidente, exprimir um voto de agradecimento ao mesmo Snr. pelo inte- resse que sempre manifestou pelo Instituto e pelas facilidades que lhe dispensou. 2) — Agradecimento — Ao Ex."10 Governador do Distrito o Ins- tituto agradece o interesse que tomou pela aquisição de um aparelho de gravação de som. — Ao sócio. Senhor Major Frederico Lopes, o Instituto manifesta igualmente o seu reconhecimento pelos esforços que tem empregado para juntar elementos para a organização do Mu- seu Regional, cuja criação está em vias de solução. 3) — Foi aprovado o regulamento respeitante ao uso do aparelho de gravação adquirido para o Instituto, que é do teor seguinte: — «O aparelho de gravação de som, adquirido pelo Instituto com o subsídio extraordinário da Junta Geral, destina-se exclusivamente à recolha e gravação de canções populares e elementos para o estudo do falar do povo do distrito. — O seu uso, para qualquer outro fim, terá de ser autorizado especialmente pela assembleia geral, em vista das razões que porventura o justifiquem. — O Instituto assegurar-se-á a colabo- ração de pessoa idónea para trabalhar com o aparelho, a qual ficará responsável por qualquer avaria resultante da sua imperícia ou des- cuido, bem como pela nitidez e boa gravação do som desde que o aparelho funcione normalmente. — O operador escolhido prestará o seu serviço nas condições e mediante retribuição, por cada vez que tiver de trabalhar, a fixar. — Escolhida essa pessoa e assentes as con- dições e remuneração, ninguém mais, em circunstancia alguma, poderá DA ILHA TERCEIRA 275

trabalhar com o aparelho. — O aparelho será guardado no Instituto e aí deve, em regra, funcionar, salvo quando circunstancias especiais exijam a sua deslocação a qualquer ponto. — A gravação de canções e formas dialectais será feita de harmonia com as normas a estabele- cer dentro das indicações fornecidas pelas entidades cientificas compe- tentes. Na sede do Instituto será organizada uma discoteca com os discos que se forem gravando, os quais, em caso algum, poderão sair dela. Esses discos poderão, todavia, ser reproduzidos e vendidos por conta do Instituto, ou trocados com outros de instituições semelhantes que se tornem necessários para estudos comparativos. — Logo que as circunstancias o permitam iniciar-se á a gravação de canções e ele- mentos de estudo dialectal, nas duas outras ilhas do Distrito. — A Direcção do Instituto fica autorizada a contratar o operador nas con- dições que entender mais convenientes dentro das directrizes acima indicadas, promover a aquisição e gravação de discos, elaborar as com- petentes instruções técnicocientificas e praticar o mais que seja preci- so para utilização do aparelho». 4) — Foi resolvido que, em vista do estado de saúde do Snr, Presidente, seja o Instituto Histórico representado na Comissão de Turismo da Ilha Terceira pelo sócio Dr. Teotonio Machado Pires. 5) - Foi eleito sócio honorário, por aclamação, o Senhor Dr. Manuel Coelho Baptista de Lima, Bibliotecário da Assembleia Nacional, que se achava presente e cujo elogio foi feito pelo Snr. Presidente, re- ferindo-se em especial à sua notável acção na organização do Arquivo Distrital, que graças ao seu esforço está já iniciada por uma forma que merece os mais rasgados elogios e o agradecimento do Instituto. 61 Havendo fres vagas de sócio efectivo, o Instituto resolveu eleger para preencher uma delas o Rev.0 Senhor Padre Inocêncio Enes, Vigário dos Altares, cuja colaboração na actividade do Instituto é já notável. 7) — Resolvido apresentar os agradecimentos do Instituto ao Se- nhor Vasco Cesar de Cai valho, proprietário da Boa Reguladora, fá- brica de relógios de Famalicão, pelo desejo manifestado de oferecer ao Instituto um relógio de pêndula. 8' Constando que o edifício onde está funcionando a Estação Telegrafo-Postal desta cidade, cedido para instalação do Arquivo Dis- trital e do Instituto Histórico, vai ser brevemente despejado foi resol- 276 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO vido oficiar ao Ex.mo Presidente da Junta Geral solicitando que seja mandado proceder ao projecto de reintegração, adaptação e possível ampliação do mesmo edifício, por forma a pô-lo em condições de ser utilizado para os fins a que se destina. 9) — Congresso Catarinense. — O Instituto congratula-se pela realização do congresso Catarinense, em que foi posto em notável destaque a colonização açoreana no Estado de Santa Catarina. 10) — Colecção para o Museu de Arte Antiga. — Resolvido enviar uma colecção do Boletim ao Museu de Arte Antiga. 11) — O Instituto resolveu saudar o Grupo dos Amigos da Terceira e oferecer-lhe a sua cooperação. 12) — Eleito sócio correspondente, por unanimidade, o Senhor Vir- ginio Baptista, actualmente residente no continente, que apresentou a sua candidatura, como autor de vários trabalhos sobre a Ilha Terceira. 13) — Sócios contribuintes — Admitidos como sócios contribuin- tes os Senhores Dr. João Cunha da Silveira, residente em Lisboa e Padre Edmundo Manuel Pacheco, residente em Angra do Heroísmo. 14) — Usou da palavra o Senhor Dr. Manuel Baptista de Lima, que agradeceu a sua eleição para sócio honorário do Instituto e fez uma larga exposição sobre os trabalhos que realizou para dar inicio à actividade do Arquivo Distrital, provisoriamente instalado em uns com- partimentos do edifício da Graça. Ali se acham já encorporados nu- merosos documentos e livros, que estavam dispersos por vários arqui- vos de repartições públicas, estando já devidamente arrumados. Fica assim extremamente facilitada a missão do funcionário que vier a ser nomeado para as funções de director do Arquivo.

O Senhor Presidente congratulou-se com o trabalho extremamen- te valioso feito pelo Snr. Dr. Baptista de Lima, que com a sua alta competência neste assunto e com uma dedicação e carinho que mere- cem especial relevo, lançou as bases do Arquivo Distrital, reunindo documentação que desde já pode começar a ser consultada. Agradeceu o Snr. Presidente, com aplauso do todos os presentes, tudo o que tem feito a bem do Arquivo Distrital, solicitando-lhe futuras visitas, que muito contribuirão para a eficiência da missão incumbida ao Arquivo Distrital. Agradeceu ainda ao Senhor Dr. Baptista de Lima a colabora- ção que tem prestado ao Instituto, indicando numerosos documentos DA ILHA TERCEIRA 277 livros e publicações que tratam de assuntos referentes à história da Terceira e encarregando-se de obter cópias de vários desses dccumen- tos.

Encerrou-se a sessão pelas 23 h. 00 m.

(assinados) — Luiz da Silva fíibeiro José Agostinho

t VÁSSÍ A

2.o CENTENARIO DA COLONIZAÇÃO Populares de Teófilo Braga, que merece AÇORIANA NO SUL DO BRASIL. breve comentário. Em Florianópolis celebrou-se com Não quero que à minha porta excepcional brilho o segundo centená- Ponhais o pé da aguilhada, rio do inicio da colonização açoriana Eu sou mulher, perco muito, no Estado de Santa Catarina. Vós, homem, não perdeis nada. Constou a comemoração de duas partes, a primeira em que foi assente a Na forma e no conceito é seme- pedra fundamental dum monumento a lhante a cantigas continentais. eregir no Jardim Oliveira Belo, soleni - dade a que assistiu o elemento oficial, Não me ponha a mão na cinta, proferindo o deputado Dr. Oswaldo Ro- Que o meu amor não quer, drigues Cabral um notabilíssimo dis- Não perde, você, que é homem, curso de exaltação da actividade dos Perco eu, que sou mulher. colonos ilheos, um concerto da Socie- dade de Cultura Musical, no Teatro (Pires de Lima, Cancioneiro de Enire- Alvaro de Carvalho, uma conferência -Douro e Minho, 81). do deputado Dr. Anónio Nunes Varela, no Clube Doze de Agosto e Te-Deum Tire o pé da minha saia, na Catedral em que orou o Arcebispo De longe diga o que quer; D. Joaquim Domingues de Oliveira. A Não perde; você, que é homem, segunda parte foi constituída por um Perco eu, que sou mulher. congresso de história catarinense em que os Açores tiveram larga parte. (C. Martha e A. Pinto, Folc-lore da O Instituto Histórico da Ilha Ter- Figueira da Foz, 11-67). ceira associou-se de bom grado a tão significativa festa, enviando uma men- Não me mêta a mão no seio, sagem, que os jornais de Santa Catarina De lonee diga o que quer ; publicaram com grande relêvo, e um O senhor não peide, que é homem, álbum de fotografias com aspectos e Perco eu, que sou mulher. costumes da ilha, alem da comunica- ção enviada ao Congresso pelo seu (Albino Bastes, Folk-lore lanhozense, presidente, atraz inserta 49). Nestas quadras apenas varia o ges- A PROPOS1TO DE UMA CANTIGA to condenado por inconveniente : — pôr o pé na saia, pôr a mão na cinta Na Terceira recolhi a seguinte ou no seio, e, na Terceira, apoiar o pé cantiga, incluída também nos Cantos da aguilhada na porta. DA ILHA TERCEIRA 279

A cantiga supõe que um rapaz, nente, e o seu uso é antigo. Vêem-se a- levando uma aguilhada na mão, pára guilhadas na mão dos carreiros em de- a falar à janela, ou à porta, com uma senhos romanos e portugueses de dife- rapariga, sem, todavia, ser ainda noivo rentes épocas e localidades. (Vergilio ou namorado, e apoia o pé da aguilhada Correia, O carro rural na Terra Por- na soleira. tuguesa. 11-193; Alberto de Sousa, O O povo, como noutro lugar já dis- trajo em Portugal nos séculos XVI e se (Revista Luzitana, XXX-258), liga XVII). Ao falar do carro de Amarante, grande importância ao namoro à jane- diz o sr. Dr. Armando de Matos (O la, e considera-o sinal aparente de carro amarantino, 12) : — «O carreiro noivado. A mulher, se depois disso não traz sempre o seu aguilhão de lôdo ou chega a casar com o namorado, dificil- carvalho, com pequena choupa de me- mente arranja outro homem que a tal». queira. «Aquele que a deixou algum Na Madeira (Kate Brudt, Madeira, defeito lhe achou», diz o povo. Por is- 314), no Alentejo (Dr. Cunha Gonçal- so a mulher a falar com um rapaz à ves, A vida rural. 21), na Serra da Es- janela sem serem namorados, isto é, trela, onde em Unhais, segundo Mes- sem esperança de sabssquente casa- serschmidt (Haus und Wirtschaft in mento, perde muito. der Serra da Estrela), como em Ama- O homem quando regressa do rante (Opúsculos citados, 11-470), ao trabalho no campo, ao entardecer, le- aguilhão chamam ferrão, existe a va ao ombro ou na mão a enxada, o aguilhada, à qual também na Galiza se sacho ou outra alfaia agrícola de que refere a seguinte quadra : serviu e, se andou com os bois a lavrar ou a gradar, depois de os ter metido Quando pongo los bueyes al carro no curral ou no palheiro para passarem siempre digo i Dios adelante ! a noite leva a aguilhada. Con la aguijada en Ia mano «As cantigas populares, diz o Dr. j anda, gallardo, adelante ! Leite de Vasconcelos (Opúsculos, VII- -771), estão frequentemente recheadas (Volkstum und Kultur der Romanen, de significação. O seu conteúdo presta- X-129). se a muitas observações, não só de ca- racter estilístico, mas de caracter etno- Em São Miguel fazem-na de nes- gráfico (psicológico, etc.), porque a al- pereira, cana da índia, medonho e ma do povo existe nelas com todos os madeira do Brasil, com ponteira de me- seus sentimentos, ideias, aspirações, tal ligeiramente decorada, ou de folha lembranças». de Flandres e antigamente de chifre de Nelas se reflecte, por tanto, o meio cabra, encaixada na ponta da vara. O e a vida do poeta popular. seu comprimento, em 1705, foi fixado Morais no Dicionário (ed. de 1813) numa correição em 12 palmos (Carrei- define : ro da Costa, Alfaia agrícola, no Bole- «Aguilhada ; — vara com pua ou tim da Comissão Reguladora dos Ce- ferrão para picar os bois». reais, N.0 7, pág. 100). Usa-se nos Açores como no conti- Na Terceira ha a aguilhada de lu- 280 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO xo, de madeira do Brasil ou de buxo, pé da aguilhada, como aliás de qual- com ponteiras de metal, e a aguilhada quer outro objecto, às vezes a chave- de trabalho ou vulgar, de eucalipto, lha do arado, para o limpar, não al- faia ou nespereira, de cerca de 2 me- cancei noticia de existir a arrilhada. tros de comprimento, com o aguilhão, A palavra aguilhada designou tam- quáse sempre um prégo, cravado na bém medida agrária, equivalente, no madeira. As aguilhadas de luxo já, a termo de Coimbra, segundo Morais, a bem dizer, se não fazem, e só se usam 18 palmos de craveira ou 6 côvados ; nos carros do Espírito Santo ou que mas na Terceira não se fala hoje nela conduzem a família do lavrador a al- nem creio se tenha empregado, pois guma festa ou arraial, trazendo os bois nunca a encontrei em velhos documen- colares com campainhas e cangas en - tos e não foi indicada por Costa No- feitadas ou lavradas. ronha no estudo das antigas medidas, Embora sem ponteira, a parte infe- a que procedeu oficialmente na primei- rior da aguilhada (pé) é sempre aguça- ra metade do século XIX. (Revista dos da. Açores, 1-159). O comprimento do aguilhão foi fi- Em sentido figurado o povo chama xado nas posturas da Camara de An- aguilhada a uma pessoa alta e delga- gra de 1655 em uma polegada, e nas da, e também ás pernas grandes, sen- de 1788 em meia polegada. do estas, no geral, assim designadas Segundo refere Drumond nos na ilha das Flores. (Revista dos Aço- Anais (11-215), em 1691, determinou se res). em correição que as aguilhadas tives- Na toponímia ha aguilhada em São sem aguilhão proporcionado com o Miguel e aguilhão na Calheta de São anel de metal para segurar o pequeno Jorge. ferro, pois os homens serviam-se de Na Terceira chamam aguilhão à las como lanças e feriam-se e mata- courela ou cerrado em forma triangular vam-se uns aos outros. na extrema de um prédio e, em sentido Nalgumas localidades, no Alentejo análogo, usam a palavra em Elvas (J por exemplo, encabam na base da a- A. Pombinho Júnior na Revista Lusita- guilhada «uma raspadeira chamada ar- na, XXXVII-153). rilhada, com a qual se desembaraça o A linguagem da cantiga oferece arado do excesso de lama ou terra hú ainda uma particularidade digna de mida que lhe empece o trabalho.» (Dr. atenção ; o tratamento na segunda pes- Cunha Gonçalves). soa do plural com o pronome vós. Es- Morais regista arrilhada «instru- sa forma de tratamento, hoje cada vez mento com que o arador pica os bois mais em desuso, era corrente, sobre e alimpa o arado,» e o seu uso é anti- tudo nas povoações rurais, mesmo en- go como se vê de uma gravura do sé- tre marido e mulher ou entre irmãos. culo XVI reproduzida no Boletim de Na terceira pessoa era raro e mui- Etnografia, n.0 2, pág. 16, onde se fa- to respeitoso. la no instrumento semelhante chamado Empregavam-no os filhos para os pelos romanos rulla ou rallum. pais e avós, com a palavra senhor ou Embora na Terceira se sirvam do vocemecè. DA ILHA TERCEIRA 281

A forma você só modernamente se On, meu rosto d,alfeni vai generalisando, principalmente na Que en forte ponto vos vi cidade, talvez por influência continental, Neste pomar. e era tida como depreciativa ou inju- riosa. Você é súcia, explicava o povo. Jerónimo Ribeiro no Auto do Físico :

L. Ribeiro. Dizei-me, senhora filha, Este moço he dalfenim, Derrete-se em estar aqui. ALFENIM

Jorge Ferreira de Vasconcelos na A Terceira, como no geral, todo o Eufrosina — «Pois um destes de cabe- país, é abundante em variedades de linho, doce novo na ferra, que quebra dôces finos, na sua maioria, se não todo como alfenim». totalidade, de origem conventual; mas, Fabrica-se, ou fabricou-se, noutras a par destes, ha a doçaria popular em ilhas dos Açores alem da Terceira. Em que tem a primasia o alfenim. Vila Franca do Campo, São Miguel, Emanuel Ribeiro (O dâce nunca oferecem a Santo Amaro, em cumpri- amargou, pág. 79) diz alfenim a «mas- mento de promessas, bonecos, corações sa de assucar que se leva ao ponto em e argolas de alfenim (Mendonça Dias. que se torna branca e com a qual se A Vila, IV-103) e é corrente a compa- formam diferentes figuras.» ração «branco como alfenim» (D. Lígia Semelhante ao alfenim ha a alféola, de Almeida Matos, Ilha de São Miguel, «pasta de melaço em ponto forte de 88). maneira que fica alva depois de mani- No Faial lia notícia das freiras do pulada, reduzindo-se ao feitio de umas Convento da Glória na Horta, até 1870, varetas torcidas. Era uma espécie do mandarem de presente aos membros caramilo actual» (ibidem). da Colegiada da Matriz, no dia de São Viterbo, no Elucidário, confunde as Marcos, uma corôa formada de peque- duas formas e define alféola dôce de nos cornos de alfenim (Coronel Fran- assucar ou melaço posto em ponto. cisco A Chaves As Festas de São No glossário da sua edição das Marcos. 5). Obras de Gil Vicente (Coimbra, 1907) Na Madeira, embora a alféola pre- Mendes dos Remédios dá a palavia dominasse como era natural dado o alfenim como de origem árabe, al-fe desenvolvimento da indústria sacarina, nid, e diz significar certa massa de as- fez-se alfenim. Gaspar Frutuoso nas sucar misturada com amêndoas dôces; Saudades da Terra (edição Rodrigues e, em sentido figurado, pessoa efemi- de Azevedo, pág, 189) fala no sacro pa- nada. iácio e os cardiais feitos de alfenim e Neste sentido, e ainda no de pes- oferecidos ao Papa, e o mesmo douto soa mimosa, emprega-a o povo tercei- editor em nota, a pág, 685, refere-se a rense e empregaram-na Gil Vicente no um documento de 1490 onde se men- Velho da Horta (Obras, 1-30). ciona alfenim diagargante. 282 BOLETIM DO INSTITUTO HISTÓRICO

Um códice manuscrito do Conven- (Citações do Dr. José Perez Vidal). to da Esperança do Funchal, publicado em 1937 no Arquivo Histórico da Ma- Com alfenim fazem na Terceira fi- deira citado por Eduardo Pereira nas guras zoomórficas e antropomórficas, Ilhas de Zargo (11-705), menciona a flores e ornatos diversos, especialmente alféola. destinadas ao pagamento de promessas Fez-se alfenim (alfefiique) nas Ca- ao Espírito Santo, São João e Santo nárias onde, como nos Açores, houve Amaro, mas que durante todo o ano no século XVII larga exportação de se vendem nas confeitarias e outros dôce para Espanha, de que dão noticia estabelecimentos da cidade de Angra. D. Luis de Gongora e Guzman de AI- Eis uma receita de alfenim : farache (José Perez Vidal, Conservas, «Para meio quilo de assucar um y dulces de Canáris, separata da Re- quartilo e meio de água, meia colher vista de Diatectoíogia e Tradiciones de chá de manteiga e uma colher de Populares, vol, III, Madrid, 1947. sôpa de vinagre, forte e bom, de vinho «Era Monsenor aficionado a unos branco. Põe-se o assucar. com o mais, pipotillos de conservas almibaradas ao lume num tacho a ferver até tomar que sueien traerse de Canarias o de Ias ponto bem dto, o que se conhece tiran- íslas de Ia Tercera».— Guzman de AI- do uma gôta com uma colher para den- farache gdic. Gili Gaya, II, 267. tro duma chávena de água fria. Se ao cair faz um pequeno ruido no fundo da Convalesci a oocos dias chávena e se tira com a mão estando y granyeé fuerzas dobles, duro atingiu o ponto preciso. Tem-se porque registro mi mesa ao lado um tacho de cobre, dos que quanto vuela i quanto corre. servem para fazer dôce de fruta, un- Sê de paces las Canarias tado de manteiga, e deita-se-lhe den- tributaban sus pipotes, tro a massa sem mecher e deixa-se de guerra (ocaban caxas escorrer bem. Este tacho está dentro Ias islãs de los Azores. de um alguidar com água fria, para o D, Luis de Gongora, Obras, I, 367. conteúdo ir arrefecendo e com a ponta de uma faca vão-se virando os bordos Damaso Alonso interpreta por este da massa para o centro, isto só e.a modo os últimos quatro versos ; — quanto se não pode pegar na mas, a «Queriendo cuidarme mis amigos me com as mãos ; logo que se pode vaí-se daban las cosas mas esquisitas, las puchando com elas a massa a fazer conservas almibaradas de los tonelillos uma meada. de Canarias y dulce de las cajas de las Quando está branca e um pouco Azores, si bien Gongora, atraído (co - dura dão-se-lhe a forma que se quer mo siempre en casos semejantes) por — pombas, flores, rosquilhas, etc. É el doble sentido de la caja («tambor» necessário ter cuidado em não mecher y «caja de dulce») y por el contraste o assucar com colher em quanto toma de paz e guerra, dice donosamente que ponto e, ao virar a massa com a fa- las cajas de dulce venien locando a ca, nunca tocar com esta no meio». guerra,» DA ILHA TERCEIRA 283

KORTÕES mado por duas colunas de ferro crava- das no chão sobre um prato ou disco As casas grandes da cidade de An- também de ferro, com 10 a 20 cm. de gra, na sua maior parte construídas nos altura, à distância uma da outra de 20 a séculos XVII e XVIII, mas sempre com 30 cm. com uma lamina de ferro verti- certo predomínio arquitectónico daquele cal entre ambas as colunas, presa a século, tem amplas entradas ou portões, elas. Aí, quem vinha de fora com o onde se reflectiam costumes hoje de- calçado enlameado, antes de subir a saparecidos, o que levou a modernisa- escada, para não sujar a casa, limpava -los, poucos conservando o antigo as- as solas das botas esfregando-as con- pecto. tra a lâmina. Como a operação obrigas- O chão era lageado, com grandes se a arrastar os pés e a fazer involun- lages regulares, ou empredado com tárias e descompassadas mesuras, o miúdos seixos brancos e prêtos, arre- povo deu a estas, em sentido figurado, dondados, arrojados pelo mar em gran- de quantidade às costas arenosas da quando exageradas ou deselegantes, o nome de rapa-pés. ilha, formando mosaicos de desenhos Num sítio meio escondido, por for- simples, mas artísticos e de bom efeito, ma a não se ver da rua, havia o uri- costume este que devia ter sido relati- nol ; pequeno alguidar ou tigela de vamente moderno, como se infere das barro com um furo no fundo, encaliça- datas de alguns que ainda existem, — da na parede, melhor ou peor ligada segunda metade do século XIX, — ten ao esgoto do prédio em péssimas con- do sido as lages o modo mais antigo dições de limpeza e higiene. de revestimento do solo. Mictórios públicos só ha relativa- Como elemento decorativo os em- mente poucos anos se construíram. pedrados eram muito superiores aos Quem passava e sentia necessidade de actuais tijolos de duas cores ou ao mo- urinar, entrava no portão e aí a satis- derníssimo cimento colorido de pés- fazia. simo efeito. Sem água corrente, feitos de ma- A um lado do portão havia a ban- terial poroso, os urinóis empestavam quêta de pedra, cerca de 70 centímetros os portões e às vezes as casas, por is- elevada do chão, mais ou menos com- so, hoje um amanhã outro, foram de- prida conforme o espaço disponível, saparecendo. para a qual se subia por um degrau de Parece incrível a rezistência do metade d'aquela altura, posto num dos olfato de nossos avós. Suportavam, topos. Â banqueta encostava-se a bur- sem aparente incomodo, o mau cheiro ra com albarda ou cadeira, onde as de tais mictórios, das cavalariças insta- senhoras se assentavam, subindo à ladas nas lojas, das ruas, e, ainda por banqueta. Como o burro era o meio ' ima, da alfazema, do incenso ou as- mais usado de transporte, em quasi m r queimado pelas salas em bonitos todos os portões existia a banquêta, fogareiros portáteis de metal amarelo mesmo nalguns mais acanhados. arrendados e lavrados, para .. purifi- No baixo da escada, junto ao pri- car ar. meiro degrau, estava o rapa-pés for- L. Ribeiro.

ÍNDICE

Autores

4f;cstinhr (Jose) Cervantes esteve nos Açores ?..... 05 Avila (Manuel Machado de) Ensalmos e orações da Illia Graciosa .... 141 Subsídios para o Cancioneiro Popular Açoriano : — Cantigas da Ilha Graciosa ■ . .... 153 Azevedo (Dr. Julião Soares de) Nota e documentos sobre o comercio de La Rochelle com a Terceira no século XVII ..... 1 IPelo (António ttaimunde) Relação dos emigrantes açorianos para os Estados do Bra- sil extraída do livro de registos de passaportes da Capita- nia-geral dos Açores ...... 29 Enes (P.e Inocêncio) As festas do Espírito ífanto nos Altares ■ 197 Lima (Pr. Manuel Coelho Paptista de) Cartas de Filipe I e Filioe 11 ao Bispo D. Pedro de Castilho 199 286 BOLETIM DO 1NSTJTUTO HISTÓRICO

Lcpcs (Majcr Frederico)

A pesca na Ilha Terceira 61 Foz (Dr. Francisco Mendes da) Um manuscrito da Biblioteca Nacional de Madrid interes- sante à história dos Açores no século XVII ... 24 Ribeiro (Dr. Foiz da Silva) Superstições comuns ao Brasil e aos Açores . . 124 Orações do pão na Ilha Terceira 233 Vária : A propósito de uma cantiga 278 Alfenim 281 Portões . . , 283

Af-Turitos

Artigos : Nota e documentos sobre o comércio de La Kochelle com a Ilha Terceira no século XVII, pelo Dr. Julião Soares de Azevedo 1 Um manuscrito da Biblioteca Nacional de Madrid interessante à história dos Açores no século XVII, pelo Dr. Francisco Mendes da Luz 24 Relação dos emigrantes açorianos para os Estados do Brasil extraída do livro de registos de passaportes da Capitania-geral dos Açores, por António Raimundo Belo .... -29 Cervantes esteve nos Açores ? por J, Agostinho 56 A pesca na Ilha Terceira pelo Major Frederico Lopes 61 As festas do Espírito Santo nos Altares pelo P.e Inocêncio Enes 107 Superstições comuns ao Brasil e aos Açores, pelo Dr. Luis da Silva Ribeiro 124 Ensalmos e orações da Ilha Graciosa, por Manuel Machado d'Avila . 141 Subsídios para o Cancioneiro Popular Açoriano : — Cantigas da Ilha Graciosa, por Manuel Machado d'Avila ... 153 DA ILHA TERCEIRA 287

Viagem de Pompeo Arditi de Pesaro à Ilha da Madeira è aos Açores (1567) 173 Centenário do P.e Jerónimo E. de Andrade . . . . ,84 Cartas de Filipe I e Filipe II ao Bispo D. Pedro de Castilho, pelo Dr. Manuel Coelho Baptista de Lima ... . ,gg Relaçam das couzas sucedidas em a perseguiçam da Christandade de Japam ...... 227 Orações do pão na Ilha Terceira, pelo Dr. Luís da Silva Ribeiro 233 Cocumenlcs : Uma carta da Duqueza de Mantua ...... 231 Eiblicgrafia ; Publicações recebidas ...... 259 Vida dc Institutc : Homenagem ao Dr. Henrique Braz ...... ,87 Actas das reuniões ...... 269 Vária ; 2.6 Centenário da colonização açoriana no Sul do Brasil . . . 278 A proposifo de uma cantiga — L. Ribeiro .... , 278 Alfenim — L. Ribeiro ...... 281 Portões — L. Ribeiro ...... 283