CAMPOS DE ALTITUDE MUSEU DA OUTUBRO 2020 KITTY CASA BRASILEIRA ABRIL 2021 PARANAGUÁ APRESENTAÇÃO

MIRIAM LERNER GIANCARLO LATORRACA MUSEU DA CASA BRASILEIRA

O trabalho da fotógrafa Kitty Paranaguá traz ao público do museu um recorte es- pecial sobre a forma de habitar nos mor- ros cariocas. Por meio da documentação da paisagem projetada sobre os interiores das casas e de seus próprios moradores, ela provoca uma refl exão sobre a condi- ção precária das habitações em contra- ponto à exuberância da paisagem natural onde se encontram. Esse registro nos in- cita a refl etir sobre a ausência de políticas públicas de habitação, que excluiu da ci- dade formal grande parte de nossa popu- lação. Temos aqui documentado moradas fora do “asfalto”, relegadas à ocupação de territórios excludentes e ao mesmo tem- po privilegiados. Um retrato marcante so- bre este morar brasileiro, documentado justamente à partir do morro que abrigou a primeira do .

2 A PAISAGEM SE CONFUNDE COM A CASA

JULIA LIMA CURADORA

Campos de Altitude teve um início quase espontâneo em meio às pesquisas de Kitty Paranaguá sobre a pai- sagem do Rio de Janeiro, na região do Cais do Porto. Ao subir o Morro da Providência para fotografar a im- plosão do Elevado da Perimetral, no Centro, ela se deu conta da vista privilegiada que tinha de um restaurante local. A experiência dessa perspectiva a inspirou a pe- dir à proprietária para voltar e documentar também o interior de sua casa. A partir daí, começou a registrar as paisagens, projetá-las dentro das casas das comu- nidades de onde se tem essas vistas magnífi cas, e a fotografar a sobreposição resultante, sempre com a presença dos moradores no quadro. Mais que uma série fotográfi ca, esta é uma ação relacional que parte, primeiro, do contato da ar- tista com sua cidade, bairros, habitantes e habitações para, depois, tornar-se a elaboração de um gesto artís- tico que coloca em cheque a história, a urbanização, a geografi a, a política da violência, e tantas outras ca- madas que transbordam das fotografi as — sem lançar mão dos típicos clichês de representação da favela. Esse procedimento revela-se tão importante quanto a imagem fi nal. A dimensão relacional do trabalho ex- pande-se por meio do contato continuado da artista com seus retratados: todos receberam edições de suas fotografi as e recebem uma porcentagem das vendas das obras — afi nal, são seus corpos e seus lares que irão circular no assimétrico mercado de arte. Kitty também entrevistou as pessoas que re- tratou, e este áudio compõe a exposição ao lado de ora tomados de itens decorativos, ora mais vazios, qua- imagens que não são meros fl agras cândidos, mas si- se esperando essa presença estrangeira. A fi gura dos tuações construídas com o artifício da projeção e da residentes é essencial na ocupação desses espaços pose, enquanto carregam a singularidade espontânea paralelamente tangíveis e simulados, concretos e sim- dos moradores. Às vezes é difícil distinguir e identifi car bólicos, sendo talvez o elemento central que permita a o que é projeção e o que é real, a paisagem se confun- Kitty acessar o lapso entre o que se imagina e o que se de com o interior da casa e com seus habitantes. A luz tem de palpável — ainda que tudo que se possa imagi- do projetor cria um véu lavado dentro dos ambientes, nar seja, em alguma esfera, real.

4 A PAISAGEM, O HABITANTE E A MORADA

YARA SCHREIBER DINES

Para início de prosa, Campos de Altitude, que compõem alguns dos Campos de que título instigante para a exposição da Altitude presentes na mostra de Kitty fotógrafa Kitty Paranaguá, no Museu da Paranaguá, os quais são prenhes de Casa Brasileira — MCB, em São Paulo. significado para os seus moradores, Uma evocação de território montanhoso sendo que alguns deles aparecem nas para as elevações do solo, cobertas por fotografias. várias comunidades que povoam as alti- No decorrer do ensaio fotográfi - tudes da cidade do Rio de Janeiro — poé- co, Kitty Paranaguá criou um vínculo de tico, simbólico imageticamente. amizade com as pessoas fotografadas, Kitty foi fotógrafa de arquitetura e formando uma relação de troca com os de Interiores durante muitos anos, traba- moradores de diferentes comunidades lhando em diversas publicações deste na cidade — ela os visitou, conheceu meio. Em suas próprias palavras, “falar suas moradias, aproximou-se deles, (registrar) da (a) casa feita pelos pró- fez os retratos e devolveu-os, compen- prios moradores era um sonho antigo.” sou-os fi nanceiramente, além de tê-los Assim, ao fotografar a implosão do Ele- recebido no museu — ou seja, criou um vado da Perimetral, no centro do Rio de vínculo social, que é conhecido como Janeiro, tem um “clique” da deslum- dom, ou dádiva, na antropologia social, brante paisagem presente nas altitudes quando se estabelece um laço de reci- no Morro da Providência, ao lado desta procidade relevante entre pessoas ou via, inferindo que era o tempo de realizar grupos sociais. o sonho deste ensaio fotográfi co. Mirando as fotografi as da expo- A proposta do seu ensaio cria- sição, notamos, pelas expressões faciais tivo é registrar as vistas grandiosas que de seus moradores, que estão aprecian- os moradores de comunidades avistam do serem fotografados, sentindo-se valo- dos morros, projetando-as no interior de rizados, sabendo que serão visíveis em suas moradas, com as quais convivem “outro espaço” e percebendo-se como constantemente. A beleza da paisagem tendo pertencimento nesta metrópole. Ao adentrarmos o espaço expo- Para Kitty Paranaguá, “poder jun- da cidade adentra e ocupa estas mora- É importante também destacar sitivo, percorrendo-o e imergirmos na tar a casa, com a paisagem e o retrato foi das, dialogando com o espaço do coti- que a exposição mostra especifi cidades montagem, com a sua intensidade de um grande prazer”, o que constatamos e diano dos moradores e vivifi cando a sua e particularidades do espaço interno cores, formas, sobreposições, expres- usufruímos em sua narrativa expositiva, lida diária. A natureza na cidade está pre- das moradas, apresentando traços de sões dos moradores e a ordenação da que nos conduz além muros territoriais sente em suas casas. personalidade e de gosto dos seus habi- decoração, em algumas destas casas, é no Rio de Janeiro e bolhas tecnológicas Providência, Tavares Bastos, Pe- tantes, como no caso da casa de Gilson possível imaginar os habitantes, debru- de comunicação digital e exprime mo- reirão, , Babilônia, Chapéu e Thomás, primos, cujas paredes são ro- çando-se em seus panoramas através dos do morar na metrópole carioca e se , Tabajaras, Pavão-São Ro- sas cobertas por uma variedade grande das janelas, fruindo da paisagem e ab- sentir pertencente à ela. que, Cantagalo, Vidigal, , Ale- de relógios de diferentes tipos, formas e sorvendo-a em seu cotidiano, tornando- mão, Mata Machado — nomes sonoros cores, expondo o valor do colecionar. -o, quiçá, menos pesado. Yara Schreiber Dines é Antropóloga, Historiadora, Curadora e Pós-doutora em Fotografi a – ECA/USP

6 Dona Jovina Tavares BastosA

Campos de Altitude, em cartaz no MCB, conta com depoimentos em áudio dos moradores retrados, em entrevistas concedidas a Dona Jovina Kitty Paranaguá Tavares Bastos

8 Dona Antônia e Daktary Dona Jura Vidigal Providência

10 Gilson e Luca Santa Martha

Gilson e Luca Silmar Santa Martha Mata Machado

12 Célio e Vicente Vicente Rocinha Pereirão

14 Roque Mariluce e Noemi Pavão Alemão

16 Tomás Filhas da Lica: Diana, Julia e Agatá Babilônia Cantagalo

18 Salete Simone e Miguel Santa Marta Tabajaras

20 Adriana Dona Joana Chapéu Mangueira Mata Machado

22 GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO CAMPOS DE ALTITUDE

João Doria Kitty Paranaguá Governador do Estado de São Paulo Julia Lima Sérgio Sá Leitão Texto crítico Secretário de Estado de Cultura e Economia Criativa Janaina Torres Galeria Apoio Institucional Cláudia Pedrozo Secretária Executiva de Estado Fotografi as da exposição de Cultura e Economia Criativa Alisson Ricardo - MCB

Frederico Mascarenhas Agradecimentos Chefe de Gabinete de Estado Aos que foram retratados e não estão na de Cultura e Economia Criativa edição fi nal da exposição: Mauro, da Rocinha; Mariana e Leandro, do Vidigal; Walter, do ORGANIZAÇÃO SOCIAL Tabajaras; Agda e Márcia, da Tavares Bastos; A CASA MUSEU DE ARTES E ARTEFATOS Gabriel dos Santos Lima, da Tavares Bastos. BRASILEIROS A todos que estiveram ao meu lado no processo Conselho de Administração de trabalho: Adriana Fillardi, André Porto, Pieter Thomas Tjabbes — Presidente Carolina Piquet Carneiro, Diógenes Moura, Elisa Maria Americano Saintive — Vice-presidente Gab Meinberg, Felipe Braga, Janaína Torres, André Vainer, Auresnede Pires Stephan, Hélio Júlia Paranaguá, Lucas C. P.A.M. Müssnich, Rubens Ribeiro Costa, Marcos Cartum, Michel Mirian Fischer, Monica Ramalho, Paulo Marcos Fábio Brull, Meire Assami Yamauchi Mendonça Lima, Priscila Albuquerque, Rafael Rodrigues da Siva Junior, Taciana Abreu, Diretoria da Organização Social Thiago Barros, Raquel Galdino, Renata Cunha Bueno Mellão Renato Guimarães e Ubiratan Muarrek, Diretora-presidente Yara Schreiber Dines e equipe do MCB. Marta Villares Ribeiro Mata Maria Eudoxia Mellão Figueiredo Atkins

Conselho de Orientação Cultural Carlos Alberto Cerqueira Lemos — Presidente Maria Ruth Amaral de Sampaio — Vice-presidente Cristiana Nunes Galvão de Barros Barreto, Douglas Canjani de Araújo, Francisco Inácio Scaramelli Homem de Melo, Heloisa Maria Silveira Barbuy, Marcos da Costa Braga, Solange Ferraz de Lima (em nomeação)

MUSEU DA CASA BRASILEIRA

Miriam Lerner Diretora geral Giancarlo Latorraca Diretor técnico Marco Antonio Alves Diretor administrativo fi nanceiro

Realização

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