MEDRADO, A, Liberdade E Imoralismo.Pdf
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Universidade Federal de Minas Gerais Programa de Pós-Graduação em Filosofia da FAFICH/UFMG Doutorado em Filosofia Moderna Alice Parrela Medrado LIBERDADE E IMORALISMO EM NIETZSCHE Belo Horizonte 2021 1 Alice Parrela Medrado LIBERDADE E IMORALISMO EM NIETZSCHE Tese apresentada como requisito parcial para obtenção de título de Doutorado pelo Programa de Pós-Graduação em Filosofia da FAFICH/UFMG. Linha de pesquisa: Filosofia Moderna. Orientador: Prof. Dr. Rogério Antônio Lopes Belo Horizonte 2021 2 3 Tese intitulada Liberdade e imoralismo em Nietzsche, de autoria da doutoranda Alice Parrela Medrado, examinada pela banca constituída pelos seguintes professores: ______________________________________ Prof. Dr. Rogério Antônio Lopes (Orientador) ______________________________________ Prof. Dr. Olímpio José Pimenta Neto ______________________________________ Prof. Dr. William Mattioli ______________________________________ Prof. Dr. Ildenilson Barbosa Meireles ______________________________________ Prof. Dr. Oscar Augusto Rocha Santos _____________________________________ Prof. Dr. Wander Andrade de Paula (suplente) Belo Horizonte 2021 4 5 6 RESUMO MEDRADO, Alice Parrela, Liberdade e Imoralismo em Nietzsche. Belo Horizonte. 2020. 193 pp.. Doutorado em Filosofia Moderna – Programa de Pós-Graduação em Filosofia da FAFICH/UFMG. A tese parte da ideia de que, na contramão da tradição ocidental, Nietzsche não pensa a liberdade como uma condição de desimpedimento, mas como um tipo de disposição, em cuja base se encontraria algo identificado como instinto de liberdade. Esse instinto funcionaria como lastro para um compromisso valorativo capaz de fazer frente ao regime moral. Ao longo do texto, abordamos as diferentes etapas de elaboração da noção propriamente nietzschiana de liberdade e tomamos o tema da liberdade como fio condutor para o debate de algumas questões centrais de sua filosofia: a crítica à moral do livre-arbítrio e seus componentes; a revisão dos termos tradicionalmente usados para descrever a ação e atribuir responsabilidade; o programa de intervenção na cultura aos moldes de um abolicionismo penal; o confronto com o ponto de vista moral e o tema do cultivo de si. Palavras-chave: Nietzsche; imoralismo; liberdade Abstract: This work elaborates the idea that, contrary to western tradition, Nietzsche does not conceive of freedom as a condition of non-impediment, but rather as a type of disposition in whose roots one would identify the instinct of freedom. Such instinct is understood as the support for a commitment with the value of freedom, on which basis one may sustain an opposition to morality‘s regime. Along the text, we approach the different steps in the elaboration of a properly nietzschian concept of freedom and we follow the theme of freedom as a guide-line into the debate on some of the central issues of Nietzsche‘s philosophy: criticism of the morality of free-will; revision of the terms traditionally used for describing action and ascribing responsibility; the program of cultural intervention in terms of penal abolitionism; the confrontation with the moral point of view and the theme of self-cultivation. Key-words: Nietzsche; imoralism; freedom 7 SUMÁRIO Lista de Abreviações p. 9 Introdução p. 12 1. Contra a mitologia da liberdade p. 16 1.1 A realidade do devir p. 17 1.2 Os termos da ―mitologia‖ p. 26 1.3 A vida dos impulsos p. 38 1.4 O trânsito entre inconsciente e consciência p. 47 2. Determinismo, necessitarismo e abolicionismo p. 61 2.1 A tese da irresponsabilidade radical p. 62 2.2 Da utilidade à tradição, do prazer ao poder p. 77 2.3 Vontade de poder e necessitarismo p. 84 2.4 Vontade de poder e valoração p. 92 3. As figurações da liberdade p. 97 3.1 A liberdade do espírito livre p. 99 3.2 O indivíduo soberano e o tipo mais livre p. 112 4. Liberdade: uma porta de entrada e saída da moral p. 132 4.1 As motivações da crítica p. 133 4.2 Instinto de liberdade contra instinto de rebanho p. 139 4.3 Os valores segundo o instinto de liberdade p. 154 5. O cultivo de si, o cultivo da liberdade p. 162 5.1 Andarilho, na boa vizinhança das coisas próximas p. 163 5. 2 A justa desmedida p. 169 5.3 Liberdade pra quem? p. 178 Considerações finais p. 185 Referências bibliográficas p. 190 8 Lista de Abreviações HH – Humano, demasiado humano (1878) HH II, AS – O andarilho e sua sombra (1879) HH II, OS – Opiniões e sentenças diversas (1880) A – Aurora (1881) GC – A Gaia Ciência (1882) ZA – Assim Falou Zaratustra (1885) ABM – Além de Bem e Mal (1886) GM – Genealogia da Moral (1887) EH – Ecce Homo (1888 - publicado postumamente) CI – Crepúsculo dos Ídolos (1888 - publicado postumamente) KSA – Kritische Studienausgabe in 15 Bänden 9 Agradecimentos Agradeço ao Programa de Pós-Graduação em Filosofia da FAFICH/UFMG pelo acolhimento e pelo referencial de excelência. À CAPES/CNPq pelo apoio no primeiro ano de doutoramento. Aos meus colegas do departamento de Filosofia da Unimontes pela compreensão ao longo dos anos em que tive que dividir meus esforços entre o curso e a escrita da tese. Ao meu amigo e orientador, Prof. Rogério Antônio Lopes, pelos dez anos de parceria, apoio e inspiração. Sem o Rogério esta tese não existiria. Aos membros da banca, Prof. Olímpio Pimenta, Prof. William Mattioli, Prof. Ildenilson Meireles, Prof. Oscar Santos e Prof. Wander de Paula, amigos que fazem parte da minha história como pesquisadora e cujas contribuições vão muito além da gentileza de aceitarem participar da banca. Aos meus companheiros do Grupo Nietzsche da UFMG, cuja amizade deu um gosto todo especial a tantos anos de pesquisa e colaboração intelectual. À minha família, aos meus amores. 10 Aos virtuosos Também nossas virtudes devem ter os pés ligeiros: Como os versos de Homero, é preciso que venham e vão! (Nietzsche, A Gaia Ciência, ―Brincadeira, astúcia e vingança‖, §5) 11 Introdução Muito foi dito e escrito sobre Nietzsche como um filósofo da liberdade. Seus grandes personagens conceituais – o espírito livre, o além-do-homem, o indivíduo soberano – povoam o imaginário popular com promessas de uma postura potente e possível frente ao ocaso da moral. Sua retórica libertária foi assimilada e apropriada pelos mais diferentes leitores e grupos, desde liberais de direita até anarquistas, passando pela boemia europeia do começo do século 20, os filósofos parisienses de 68 e a contracultura americana. Frequentemente foi presa de interpretações um tanto kitsch, que trouxeram o seu ―tornar-se o que se é‖ para perto do ―faça o que lhe der na telha‖, pois afinal ―Deus está morto‖. O interesse por sua obra sobreviveu ao culto individualista do século 20 e parece ganhar um novo fôlego no começo do século 21, talvez devido à necessidade sentida de se elaborar formas não-morais de cultura comunitária. No campo acadêmico, por exemplo, na metaética contemporânea, sua obra continua sendo uma fonte de inspiração e desafios interpretativos, já que traz provocações e alternativas aos ideais de liberdade fundados na noção de livre-arbítrio ou às soluções humanistas sobre o tema. A radicalidade de sua crítica aos valores morais, combinada a um tipo de realismo político e uma sofisticada elaboração filosófica sobre as relações de poder – e ainda, sua insistência na possibilidade de liberdade em um mundo pós-niilista, fazem com que sua obra seja vista ora como um ponto alto da literatura filosófica ocidental, ora como um enigma e um incômodo. Esta tese parte da ideia de que um compromisso com o valor da liberdade, numa acepção própria, cumpre um papel estrutural na obra do filósofo e serve como um fio condutor para a leitura de seus grandes temas e questões. A pesquisa sobre a elaboração nietzschiana da liberdade nos levou a enfrentar aquelas que consideramos questões- chave da obra: sua visão de mundo mobilista, no interior da qual a agência humana deve ser repensada e redescrita; a denúncia da ―metafísica de carrasco‖ e o esboço de um proto abolicionismo penal; o coração de sua crítica à moral; o valor que move sua filosofia da vontade de poder; o horizonte de suas contribuições à filosofia do cultivo de si – entendemos que a questão da liberdade funciona como um ponto de partida ou de 12 chegada para cada uma dessas questões. Por conseguinte, essas são as questões que endereçaremos, percorrendo toda a obra publicada1, sempre em diálogo com a literatura secundária mais atualizada sobre o tema. As incursões de Nietzsche no debate em torno da noção de liberdade trazem redefinições importantes dos termos com que o problema foi tradicionalmente tratado, antecipam posições contemporâneas e são marcadas por esforços no sentido de reformar nossa compreensão da agência humana, e consequentemente, nossas práticas de avaliação da ação e atribuição de responsabilidade. Muito mais do que dar uma nova resposta à pergunta ―como pode o humano ser livre em um mundo de não-liberdade?‖, o que está em jogo para Nietzsche é explicar, primeiramente, os próprios mecanismos cognitivos e culturais que nos levaram a elaborar a questão nesses termos. Uma resposta nietzschiana à questão da liberdade passa, portanto, pelo entendimento de que o mundo natural foi descrito como excessivamente determinístico e não-livre, enquanto o mundo moral foi excessivamente descrito como o espaço da autonomia e liberdade em sentido pleno. Para chegarmos a uma compreensão mais sóbria e menos moralista da ideia de liberdade, portanto, seria preciso corrigir essa dupla distorção, readequando nossa visão da ação livre a uma visão igualmente reformada dos acontecimentos naturais. No primeiro capítulo, trataremos de como a compreensão nietzschiana da liberdade se insere numa ontologia naturalizada e numa reforma dos termos básicos usados para construir nossa autoimagem e descrição da ação, pois é com essas armas que Nietzsche pretende desconstruir o discurso dominante associado à noção de livre-arbítrio, que ele identifica com uma ―mitologia da liberdade‖. Quanto à ontologia nietzschiana, é seguro dizer que ela ganha seus contornos finais a partir da emergência do conceito de vontade de poder, com consequências importantes para o tema da liberdade.