Participação Das Mulheres a Partir Da Formação De Grupos Produtivos Em Assentamentos Rurais Da Microrregião De Andradina (SP)
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Participação das mulheres a partir da formação de grupos produtivos em assentamentos rurais da microrregião de Andradina (SP) Participation of women through the formation of productive groups in rural settlements in the Andradina (SP) microregion Ana Heloisa Maia E-mail: [email protected] Engenheira Agrônoma. Doutorado em Agronomia/Sistemas de Produção. Docente da Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT, Campus de Nova Xavantina-MT Antonio Lázaro Sant’Ana E-mail: [email protected] Engenheiro Agrônomo. Doutorado em Sociologia. Docente da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP, Campus de Ilha Solteira-SP Flaviana Cavalcanti da Silva E-mail: [email protected] Engenheira Agrônoma. Doutorado em Agronomia/Sistemas de Produção. Docente da Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT, Campus de Sinop-MT Ana Paula Pinheiro Zaratim E-mail: [email protected] Engenheira Agrônoma. Docente da Escola Estadual Jaraguá, Água Boa-MT Revista do Programa de Pós-Graduação em Extensão Recebido em: 20/02/2018 Rural (UFV) Aprovado em: 03/05/2018 ISNN 2359-5116 | V. 7 | N.1 | JAN.-JUN.2018 RESUMO Este trabalho visa a relatar e analisar a participação das mulheres envolvidas em grupos produtivos de dois assentamentos rurais da microrregião de Andradina (SP), procurando enfatizar as experiências vivenciadas por elas, a formação dos grupos, suas estratégias e os desafios enfrentados. As mulheres envolvidas nos grupos têm desenvolvido ações que visam à geração de renda por meio da transformação e agregação de valor a produtos agropecuários ou tradicionais (pães, bolachas) e da confecção de diversos tipos de artesanatos. Essas ações têm permitido as trocas de experiência e a construção de novos espaços de convivência/socialização. Entre os principais desafios, está o reconhecimento do trabalho da mulher no meio rural. Palavras-Chave: Agricultura familiar; Agricultora; Cooperação; Gênero. ABSTRACT This aim of study is to report and analyze the participation of women involved in productive groups from two rural settlements in the Andradina (SP) microregion, seeking to emphasize the experiences of these women, the formation of groups, their strategies and the challenges faced. The women involved in the groups have developed actions aimed at income generation, through the transformation and aggregation of value to agricultural and traditional products (breads, biscuits) and the manufacture of various types of handicrafts. These actions have allowed the exchange of experience and the construction of new spaces of coexitence/socialization. Among the main challenges is the recognition of women’s work in rural areas. Keywords: Family farming; Farmer; Cooperation; Gender. 295 Introdução Os assentamentos rurais, como contexto de mudança social, são espaços rurais em construção, em sua maior parte, frutos de processos de mobilização social por meio de movimentos sociais e organizações sindicais, bem como da ação de diferentes atores, criados a partir de uma lógica de intervenção governamental sobre situações de conflitos, conforme a visibilidade e gravidade dos mesmos (MEDEIROS e LEITE, 2004). Na área rural, apesar da representação considerável do sexo feminino na esfera produtiva, o trabalho executado pelas mulheres tem pouca visibilidade nas estatísticas oficiais e elas formam um dos grupos mais esquecidos pelas políticas públicas (BRUMER e PAULILO, 2004). Boa parte dos estudos sobre mulheres rurais realizados no Brasil sempre tendeu a considerá-las a partir de seu lugar dentro da unidade de produção, focalizando sua condição de trabalhadoras não remuneradas e com baixa valorização. Ainda que esses estudos tenham revelado aspectos relevantes relacionados à situação de desigualdade enfrentada pelas mulheres, como a sua importância nas atividades agrícolas e o seu papel na reprodução social das famílias rurais, permanecem lacunas quanto às circunstâncias opostas e às alternativas a essa desigualdade (SILVA et al., 2010). As mudanças relacionadas à situação das mulheres do campo passaram a ser evidenciadas a partir das décadas de 1980 e 1990 com o movimento de mulheres camponesas, que intensificaram as discussões ligadas à suas condições de vida, buscando sua identificação como trabalhadoras rurais, com direito à terra, igualdade e outros fatores que foram determinantes para o reconhecimento público da mulher rural. Lavinas (1991) mostra que esses aspectos foram explicitados em slogans usados por elas durante os primeiros movimentos de mulheres camponesas na década de 1980: “Do lar, não! Mulheres Trabalhadoras Rurais” e “Mulher Trabalhadora Rural: declare sua Profissão”. As reivindicações das mulheres possibilitaram a preservação de direitos na Constituinte de 1988, o que lhes garantiu o acesso à terra e abriu portas para outras conquistas, como ter o nome na nota relativa à venda de produtos e ter acesso ao crédito rural, ao salário maternidade, à aposentadoria e a outros benefícios que passaram a colocá- las em uma posição de visibilidade social e produtiva (MENEGAT, 2008). Após muitas décadas de mobilização e articulação das mulheres rurais em torno do reconhecimento da sua profissão, do direito à sindicalização e da garantia de sua 296 autonomia financeira e produtiva, elas começam a identificar e a denunciar as diversas formas de violência também dentro das famílias rurais, que muitas vezes não é percebida, como: a proibição de ir a uma reunião; a falta de espaço na família para discutir as questões estratégicas da produção; a falta de acesso ao gerenciamento da propriedade e ao uso dos recursos comuns (tais como a terra, os instrumentos de trabalho, os recursos financeiros, etc.) (SILIPRANDI, 2009). Simião e Marchi (1995) afirmam que as mulheres, ao extrapolar as funções de dona de casa e assumir novos espaços no mercado de trabalho, põem em jogo uma série de imagens conflitantes entre o âmbito masculino e o feminino. Tradicionalmente, a função de sustentar a casa e a família tem um caráter simbólico eminentemente associado ao masculino. Dessa forma, quando a mulher começa a obter um rendimento, fruto de seu próprio trabalho, o marido sente que seu “espaço masculino” está sendo invadido. Segundo Yannoulas (2002), 20% da população feminina economicamente ativa concentrava-se em atividades agrícolas: 39%, entre elas, eram trabalhadoras sem remuneração alguma e 42% produziam para o próprio consumo, ou seja, 81% das mulheres envolvidas em atividades agrícolas não recebiam nenhum tipo de compensação financeira, sendo que o percentual de homens na mesma situação não atingia sequer 27%. A participação da mulher é significativa na produção, na construção de redes de sociabilidade via sistema de parentesco (fundamentais para consolidar as estratégias familiares) e em atividades de cunho político mais geral. Apesar disso, na maioria dos casos, o trabalho da mulher não é reconhecido, e elas acabam sendo excluídas de certos espaços decisórios, sendo-lhes negados (na prática) alguns direitos, como os de herança e sucessão na terra (WOORTMANN, 1995; TEDESCO, 1999; SANT´ANA, 2003). Alguns autores abordam que a invisibilidade do trabalho das mulheres na agricultura familiar está vinculada às formas como se organiza a divisão sexual do trabalho e de poder nessa forma de produção, em que a chefia familiar e da unidade produtiva é socialmente outorgada ao homem. Embora a mulher trabalhe efetivamente no conjunto de atividades da agricultura familiar (preparo do solo, plantio, colheita, criação de animais, entre outras, incluindo a transformação de produtos e o artesanato), somente são reconhecidas, porém com status inferior, aquelas atividades consideradas extensão do seu papel de esposa e mãe (preparo dos alimentos, cuidados com os filhos, manejo da horta doméstica e de pequenos animais do quintal). A interferência de alguns agentes externos nos assentamentos pode contribuir para ampliar a inserção das mulheres no contexto da reforma agrária, pois, embora a 297 participação feminina tenha aumentado nesse âmbito, os números revelam que ainda são poucas as mulheres que participam do processo de organização para possíveis ocupações de terras e também de determinadas decisões dentro do lote, como as referentes à comercialização (TRIGO, SANT´ANA e TARSITANO, 2009). As atividades executadas pelas mulheres são mais expressivas quando organizadas e desenvolvidas em grupos. Nesse sentido, Moser (1999) afirma que: (...) no empoderamento, há o reconhecimento de que suas estratégias não serão implementadas sem o esforço sustentado e sistemático das organizações de mulheres e grupos similares que podem utilizar não apenas as mudanças legais, como também a mobilização política, a conscientização e a educação popular. Aqui, se reconhece o triplo papel das mulheres e busca-se, através das organizações de mulheres de baixo pra cima, conscientizar as mulheres para que desafiem a subordinação (MOSER, 1999, p.55). A microrregião de Andradina, no estado de São Paulo, é fortemente marcada pelos processos de luta pela terra. A partir da década de 1980, acentua-se a concentração fundiária, gerando diversos conflitos por disputa de território, culminando na desapropriação de terras na região e na formação de diversos assentamentos rurais. Como consequência da manifestação de trabalhadoras rurais, denominada “Marcha das Margaridas”, realizada desde o ano 2000, a luta pela inserção das mulheres no contexto da reforma agrária tem estimulado os debates sobre os papéis desempenhados por homens e mulheres na família e no mundo do trabalho.