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Esta é a primeira de cinco partes de uma série sobre uma viagem pelo arquipélago e pela história cultural do Japão. Cada ensaio explora diferentes paisagens e intervalos históricos marcados por obras e autores cruciais para definir a memória cultural desse território. Cada ensaio tem uma componente fotográfica, cujas imagens expandem a constelação de associações apresentadas no texto. Decidimos utilizar o título Primavera Tardia em homenagem à obra de Yasujiro Ozu, e por termos viajado em Junho — o incrível mês da chuva — na transição entre a Primavera e o início do Verão de 2019, num mundo pré-apocalíptico em que a pandemia ainda era uma ameaça distante. Visões do futuro Tecno- distopias Utopias metabolistas de um modo orgânico ao longo do tempo, consoante novas necessidades funcionais, aímos da linha de metro Hibiya tecnológicas e sociais. Em Nakagin o em Higashi Ginza e princípio metabolista consistia na caminhamos para oeste ao possibilidade de cada cápsula poder ser longo das ruas de traçado substituída regularmente — como se fosse de Tóquio regular de shitamachi — a zona uma peça de um enorme Lego —, algo que, baixa de Tóquio. Gradualmente apesar de planeado, nunca chegou a o topo ferrugento e o perÆl acontecer. irregular da Nakagin Capsule Da rua notamos que muitas das cápsulas Tower (1972), desenhada por Kisho mostram através dos seus óculos os detritos SKurokawa, começa a separar-se do resto do acumulados ao longo de décadas de Primavera Tardia Ensaio Uma viagem contexto urbano. À medida que nos abandono, ao mesmo tempo que outras aproximamos, notamos que a torre está foram renovadas e são utilizadas como pelas ruas e ilhas de Tóquio, onde envolvida por uma rede, como se tivesse pequenos escritórios ou apartamentos de sido arrastada do fundo da baía de Tóquio ao Æm-de-semana. Apesar de ser um ícone da arquitectos, cineastas e escritores Æm de anos debaixo de água. Vêem-se tubos arquitectura japonesa do pós-guerra, Çexíveis que descem ao longo da torre a existem planos para a sua demolição e um encenaram as suas visões de um futuro partir de várias dezenas de cápsulas ligadas a grupo de activistas está a organizar uma um núcleo central de 11 andares. Cada uma campanha para salvar Nakagin, Ænanciada entre o sonho e a catástrofe. Tange, das 140 cápsulas é um paralelepípedo (2,5 x através da organização de visitas guiadas e 2,5 x 4 metros) pré-fabricado em aço, com publicações. Murakami, Oshima, Otomo e Shinohara. um enorme óculo num dos lados, que No interior de uma das cápsulas vemos o originalmente servia de habitação mobiliário e o equipamento Sony originais, Lugares que revelam a metrópole como temporária para os salaryman nos dias em assim como a engenhosa mesa desdobrável, que não podiam regressar à sua casa nos em dez metros quadrados onde só cabem um laboratório de utopias e distopias subúrbios de Tóquio. uma cama e uma casa de banho, uma janela Nakagin é talvez a mais icónica obra dos circular e uma televisão, tudo ultrafuncional metabolistas, um grupo de jovens e confortável — a versão arquitectónica do arquitectos japoneses que, nas décadas de walkman. Seria admirável que a campanha Por Eliana Sousa Santos texto 1960 e 70, apresentaram propostas radicais para salvar Nakagin tivesse sucesso. No para edifícios e espaços urbanos, cuja ideia entanto, é irónico que, para isso, se tenha de Tiago Silva Nunes texto e fotografia central era a possibilidade de se adaptarem transformar um edifício metabolista — logo Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público. Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.

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Radicalismo e austeridade À esquerda, pormenor da Nakagin Capsule Tower (1972), de Kisho Kurokawa. Nakagin é talvez a mais icónica obra dos metabolistas, um grupo de jovens arquitectos japoneses que, nas décadas de 1960 e 70, apresentaram propostas radicais para edifícios e espaços urbanos. Em baixo, campus de Toyama da Universidade de Waseda, onde fica a Faculdade de Letras. Aqui sucedem-se os edifícios austeros do pós-guerra

de Hillside Terrace, o projecto que Fumihiko Maki — outro jovem metabolista — começou nesta rua em 1969, a convite dos proprietários desta área, a família Asakura. Atrás de Hillside ainda se vê o perÆl curvo do telhado da antiga residência de Torajiro Asakura que sobreviveu ao terramoto de 1923, aos bombardeamentos de 1945 e ao À medida que nos crescimento urbano dos anos 1980. em constante transformação — num Conference (WoDeCo) de Tóquio, em Maio Ao caminhar por Hillside, vemos um monumento, rígido e cristalizado no tempo. desse ano. aproximamos, conjunto de edifícios cinzentos claros dentro Voltamos para a linha Hibiya e emergimos A maioria dos metabolistas tinha estudado do cânone formal modernista, todos em Roppongi, sob uma das muitas no Tange Lab da Universidade de Tóquio notamos que diferentes mas semelhantes, adaptados ao auto-estradas elevadas que atravessam com Kenzo Tange — o mais importante contexto topográÆco e à escala humana, Tóquio e que aqui ensombra uma avenida de arquitecto japonês do pós-guerra. Nos meses Nakagin está como numa pequena vila no Mediterrâneo. edifícios altos cobertos por anúncios que precederam a WoDeCo, Tange leccionou Depois do Tange Lab, Maki continuou os publicitários. Viramos numa perpendicular e um semestre nos EUA, tendo desenvolvido o envolvida por seus estudos e carreira nos EUA, e a partir de subitamente — numa transição urbana e Boston Harbor Plan com alunos do MIT — um 1958 passou vários anos a investigar cidades espacial abrupta que é comum em Tóquio — exercício que foi um laboratório uma rede, como se por todo o mundo. A versão do metabolismo estamos numa pequena rua calma, onde por experimental para o Plan for 1960, um proposta por Maki em Investigations in cima dos muros se adivinham escolas plano urbano radical e utópico que se tivesse sido Collective Form (1964) — group form — é mais privadas, embaixadas e museus, ocupando estendia pela baía de Tóquio, que Tange subtil, discreta e Çexível do que a de Tange e lotes urbanos cuja escala só resiste em áreas apresentou durante uma emissão televisiva arrastada do Kurokawa — megastructure — e, apesar de onde, no período Edo, havia residências de de uma hora na NHK, a 1 de Janeiro de 1961 — não ter a intensidade formal, nem a clareza samurai. Paramos em frente de um muro no num momento em que os protestos fundo da baía icónica de Nakagin, a soÆsticação e subtileza qual está inscrito The International House of estudantis, de Maio e Junho de 1960, contra compositiva de Hillside fazem com que seja (I-House), um edifício modernista a ratiÆcação do Tratado de Cooperação e de Tóquio ao fim de ainda hoje um dos lugares mais elegantes, escondido num grande jardim, que foi Segurança (Anpo Joyaku) entre o Japão e os confortáveis e comunais de Tóquio. Ænanciado pela Rockefeller Foundation em Estados Unidos, dividiam a sociedade anos debaixo 1955, três anos após o Æm da ocupação japonesa. Norwegian Wood americana, e desenhado por um grupo de Deixamos o jardim da I-House com arquitectos que tinham trabalhado com Le relutância e voltamos à linha Hibiya. Saímos de água Na manhã seguinte, subimos a alameda de Corbusier em Paris — Kunio Maekawa, Junzo na estação de Ebisu em yamanote — a zona cedros do campus de Toyama da Sakakura e Junzo Yoshimura. alta de Tóquio — onde, ao contrário de Universidade de Waseda, onde Æca a Passamos as portas de vidro e shitamachi, não existem quarteirões com Faculdade de Letras, e vagueamos pelos sentamo-nos nas cadeiras confortáveis ao traçados rectos, mas ruas orgânicas que edifícios austeros do pós-guerra até lado da biblioteca — a olhar para o jardim e seguem a topograÆa e os limites das antigas descobrir um jardim elegante com um para as árvores impecavelmente podadas — propriedades dos senhores feudais do pequeno lago rodeado pelos lírios da onde os metabolistas se reuniram em 1960 período Edo. Caminhamos por pequenas Primavera tardia — hanashobu (Iris ensata). O para preparar o seu livro-manifesto, ruas secundárias até Daikanyama (yama, campus está deserto, até que pelas nove Metabolism: The Proposals for a New como em yamanote, signiÆca “montanha”) horas os primeiros estudantes chegam Urbanism, apresentado na World Design onde vemos o perÆl discreto da primeira fase sozinhos com o olhar introspectivo e c Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público. Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.

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ausente de Toru Watanabe, o estudante de deambulações errantes de Toru e Naoko em como palco jardim do clã Maeda — o lago, construído em letras de Norwegian Wood (1987) — a obra de Norwegian Wood. Viramos “à direita em Em cima, rampas que fazem a 1638, no início do período Edo, foi mais Haruki Murakami cujo título evoca a canção Iidabashi,” passamos pelas livrarias do ligação à praça da saída oeste da tarde renomeado Sanshiro, em homenagem homónima dos Beatles que começa com os “cruzamento em Jinbocho,” com os seus Estação de Shinjuku, um dos palcos à obra de Soseki. Olhamos em volta para as versos “I once had a girl / Or should I say, she livros protegidos da chuva por plásticos dos protestos de 1969. Em baixo, paredes altas de vegetação no coração da once had me.” Toru é um jovem assombrado transparentes, “subimos as colinas em dupla página do livro Shinjuku, de universidade e parece-nos um lugar pelo passado, dividido entre a ausência Ochanomizu” e paramos em frente da Hitomi Watanabe separado do mundo e separado do tempo, e, espectral de Naoko, uma amiga do liceu em Akamon (1827) — a porta vermelha — do Osaka, e a energia alegre de Midori, uma campus de Hongo da Universidade de nova colega de Waseda. Tóquio, que se estende por toda a área do Deixamos Toyama e seguimos uma longa que, até 1877, era a propriedade do clã Æla de estudantes que saem do metro até ao Maeda na capital — os detentores do maior campus central da universidade, onde domínio feudal do período Edo. passamos rapidamente sob as árvores Ao passarmos pela Seimon (1912) — a porta monumentais que enquadram os edifícios principal —, lembramo-nos de que imponentes das faculdades de Direito e Norwegian Wood tem como modelo e Economia. Quando chegamos ao rio Kanda, antecedente literário Sanshiro (1910) de reconhecemos a sua curva em Sekiguchi — Natsume Soseki. São duas obras representada numa das One Hundred Famous semiautobiográÆcas, que documentam a Views of Edo (1857) de Utagawa Hiroshige — e solidão de um jovem que vem do Sul do a escada longa e íngreme que permite subir a Japão para estudar em Tóquio, em que se colina de Tsubakiyama. No topo lança um olhar crítico sobre a inÇexibilidade encontramos os edifícios tristes e sombrios da estrutura social japonesa, assim como se de Wakeijuku, o dormitório universitário revela uma profunda admiração pelas onde Toru lia “John Updike [e] Scott culturas europeia e americana. Fitzgerald” — o que “não era algo que se Caminhamos sob a “dupla Æla de gingkos,” pudesse fazer em 1968,” devido ao que coroavam Sanshiro de amarelo no sentimento antiamericano dos protestos Outono, mas em Junho nos envolvem de estudantis —, enquanto no jardim todos os verde e nos protegem da chuva que cai sobre dias ao nascer do sol alguém içava a bandeira o pavimento reluzente. Abrigamo-nos sob os japonesa ao som do hino nacional que “arcos em ogiva” dos edifícios neogóticos do ecoava de um rádio Sony. Entre as folhas da Departamento de Letras, que evocam os zelkova, vemos a cobertura e recordamos a campus universitários ingleses, onde Soseki noite em que Toru libertou um pirilampo na estudou depois de deixar a Universidade de “escuridão pálida, que desenhou um arco Tóquio. Descemos um caminho até veloz […] como se tentasse trazer de volta encontrar uma passagem escondida por um intervalo perdido no tempo,” enquanto árvores centenárias, e, ao percorrer os o seu olhar vagueava sobre “as luzes de degraus de uma escada estreita, vemos Shinjuku [que] brilhavam à direita e de gradualmente a superfície de um lago à esquerda”. perfurada pela chuva intensa, onde tudo é Seguimos o curso do rio Kanda em verde e brilhante, as folhas, a água, as direcção a sul para acompanhar uma das pedras, como se tivéssemos regressado ao Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público. Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.

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Fortaleza impenetrável geração. Ao entrar e sair em cada piso, ao À esquerda, Tokyo Metropolitan vaguear entre as estantes desertas numa Government (1988), de Kenzo Tange, procura sonâmbula povoada de imagens e uma fortaleza impenetrável revestida de memórias do Ælme, o espaço começa a por uma superfície semelhante a um adquirir uma dimensão fantasmática que microprocessador, com um gradualmente se substitui à realidade. panóptico metropolitano no topo, Quando chegamos ao piso térreo, saímos que nos lembra o laboratório militar para a noite brilhante de Shinjuku, mas não liderado pelo coronel Shikishima da encontramos consolo na Çuorescência BD Akira (em baixo), de Katsuhiro sedutora e ameaçadora que nos invade de Otomo todas as direcções. Percorremos as ura-dori (ruas secundárias) de Shinjuku, salpicadas de bares e clubes de jazz, e, como Torio e Umeko, vagueamos sem destino na solidão da paisagem urbana, até que paramos em frente de uma torii (entrada para o recinto de um santuário shinto) esquecida num intervalo estreito entre dois edifícios altos. Passamos sob a torii com circunspecção e seguimos o caminho sombrio sob as árvores cujas copas tentam escalar os edifícios que as conÆnam. Quando paramos em frente do honden (altar principal), vemos o céu cristalino, e, sob as árvores distantes, um clarão vermelho. À medida que nos aproximamos, reconhecemos a estrutura improvisada da tenda vermelha do grupo de teatro experimental de Juro Kara no santuário de Hanazono, onde termina a acção de Diary of a Shinjuku Thief. Hoje lembramos com surpresa este encontro — tão improvável como impossível de ignorar — como um vestígio de uma outra era, quando Shinjuku era o centro da cultura experimental de Tóquio, em vez de uma vasta área comercial iluminada por néones. Na manhã seguinte, passamos em frente do Isetan — o mais antigo depato (armazém tal como Sanshiro aqui, não pensamos mais superfície dos edifícios lembram as imagens comercial) de Shinjuku — e lembramo-nos do “sobre eléctricos, ou Tóquio, ou o Japão, de Blade Runner (1982) de Ridley Scott. lugar onde Hitomi Watanabe fotografava os [pois] a impressão de algo distante e remoto Lembramo-nos de que Toru trabalhava tumultos de Shinjuku de Outubro de 1968, tinha tomado o seu lugar”. numa loja de discos em Shinjuku e quando “um homem que estava ao [seu] Ao sairmos do espaço contido do lago, decidimos ir de Disk Union em Disk Union — lado se virou e disse: ‘A polícia avançou subimos um trilho até ver o perÆl do um conjunto de espaços espalhados por primeiro, não?’ E, olhando melhor, [ela se Auditório Yasuda (1925) e lembramo-nos das estas ruas com uma vasta colecção de LP de apercebeu] que era Nagisa Oshima”. imagens de Hitomi Watanabe em Tokyo vinil — até chegar à Kinokuniya Books (1964), Seguimos o percurso desse protesto pelas University 1968-69 (2015), que documentam uma livraria que ocupa todos os nove pisos A revista Provoke ruas desertas até à estação de Shinjuku, e os vários meses da ocupação estudantil de de um majestoso edifício desenhado por atravessamos do lado este para oeste da 1968 até à intervenção brutal da polícia para Kunio Maekawa — um dos arquitectos da revelou as visões de estação numa maratona de vários níveis, desmantelar as barricadas, em Janeiro de I-House. passagens subterrâneas, centros comerciais 1969. Em Norwegian Wood, Toru não Ao percorrer esta livraria saída de um uma geração e linhas de comboio. Apesar de ser participa nestes eventos, mantendo uma Ælme — com uma sucessão interminável de Æm-de-semana, a maior parte das pessoas posição de distanciamento, porque olha com estantes cobertas de capas salpicadas com abandonada entre vai pelo túnel que está ligado directamente desconforto para os líderes dos protestos, caracteres kanji —, imaginamos Midori, a às torres de escritórios das keiretsu japonesas pois estes, quando são “Ænalistas, cortam o nova amiga de Toru, a percorrer os seus os detritos deixados — como a Mitsui e a Sumitomo — num Hades cabelo e marcham obedientemente para a corredores intermináveis, enquanto pensava interminável povoado de orfeus de fato e Mitsubishi”. no que os colegas de liceu lhe tinham dito, pela ocupação gravata, enquanto nós saímos na Shinjuku Deixamos a Universidade de Tóquio, e, que “poderia ler todos os livros que Nishiguchi Hiroba (praça da saída oeste da sob os chapéus de chuva transparentes, quisesse,” pois quando viram “proprietário americana, numa Estação de Shinjuku) de Junzo Sakakura — “caminhamos em frente, como se andar de livraria” como “proÆssão do pai” nos um dos arquitectos da I-House —, um vasto fosse um ritual religioso para recuperar o formulários da escola, só conseguiram cidade espaço subterrâneo aberto para o céu, ligado nosso ânimo,” até ao lugar onde termina o imaginar que fosse o dono de “uma livraria por duas elegantes e monumentais rampas passeio de Toru com Naoko. “Quando enorme como a Kinokuniya,” em vez da fragmentada entre curvas, inaugurado pouco antes dos chegámos a Komagome, o sol afundava-se e pequena loja de revistas de “Kita-Otsuka em protestos de 1968. o dia tinha-se transformado numa suave Toshima, onde vivia”. o comercialismo Hoje, estas rampas são utilizadas por noite de Primavera.” Por cima do muro, carros, mas nessa altura foram vemos o contorno das árvores do Rikugi-en Diários de Shinjuku transformadas num espaço público de (1695), um dos mais célebres jardins do e a tradição discussão e permanência — um tipo de lugar período Edo, restaurado em 1878 pelo Descemos os nove andares de escadas da quase inexistente em Tóquio — que foi o fundador da Mitsubishi. Kinokuniya Books à procura dos degraus palco de ocupações e performances das folk Entramos na linha circular Yamanote, onde Torio e Umeko se encontravam em guerrillas, durante todos os sábados entre vemos os bairros de Otsuka e Ikebukuro a Diary of a Shinjuku Thief (1968) de Nagisa Fevereiro e Julho de 1969. As imagens do passar numa névoa luminosa através das Oshima, um Ælme que acompanha dois último destes encontros, em 12 de Julho, janelas do comboio, até que emergimos jovens — que podiam ser colegas de Toru e mostram mais de sete mil pessoas a ocupar a dentro do labirinto urbano da estação de Midori de Norwegian Wood — mergulhados praça e as rampas, numa assembleia popular Shinjuku. Caminhamos pelas ruas do lado no caos cultural e político do Ænal da década raramente vista, o que levou as autoridades a este da estação entre centenas de pessoas de 1960 em Tóquio, ao mesmo tempo que alterar o nome deste espaço de hiroba com chapéus de chuva que se movem como regista a contracultura de Shinjuku, (praça) para tsuro (passagem), criando assim um grupo de animais marinhos documenta os protestos estudantis desse um enquadramento legal para a polícia Çuorescentes e onde as luzes que brilham na ano e revela a inÇuência dos Beatles nessa poder dispersar a multidão pacíÆca c Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público. Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.

14 • Público • Domingo, 27 de Setembro de 2020 passados poucos dias. À superfície, desconhecida. Durante esse tempo, a cidade descobrimos o lugar onde Watanabe foi gradualmente reconstruída em ilhas fotografou uma rapariga de cabelo rapado artiÆciais sobre a baía de Tóquio como em frente das duas rampas, com uma Neo-Tokyo — uma Æcção que tem como expressão de desaÆo e independência, onde modelo o Plan for Tokyo 1960, que Tange foi “empurrada com a multidão, [e] a guerra apresentara na televisão em 1961 —, no Vietname e as suas consequências se enquanto Old Tokyo permaneceu em ruínas tornaram uma realidade tangível que sofreu com acesso restrito por causa da com o [seu] corpo,” como escreve no radioactividade. No primeiro volume de posfácio de 1968 Shinjuku (2014). Akira, Neo-Tokyo prepara-se para receber os Permanecemos algum tempo a olhar para XXXII Jogos Olímpicos em 2020 — uma esta praça subterrânea a ver as pessoas a coincidência surpreendente que foi alterada passar num movimento contínuo e pelo adiamento dos Jogos Olímpicos devido lembramo-nos de uma fotograÆa de Yutaka à actual pandemia —, apesar do Takanashi — publicada em Towards the City & descontentamento com o governo, a crise Notebook People of Tokyo (1974) — onde, no económica e as ameaças de ataques meio de uma multidão, uma mulher de terroristas. kimono, uma rapariga de casaco e uma Subimos mais de 50 andares até ao criança de uniforme escolar descem uma das observatório sul do Tokyo Metropolitan rampas que vemos. Takanashi fazia parte de Government e vemos a cidade estender-se um grupo de jovens fotógrafos — com sem limite em todas as direcções, até que os Takuma Nakahira e Koji Taki, aos quais se edifícios mais distantes se dissolvem na juntaria mais tarde Daido Moriyama — que neblina. Das janelas do lado este, vemos a lançaram uma provocação estética e política área de construção do novo Estádio através de uma revista-manifesto, a Provoke: Olímpico (2020) de Kengo Kuma — que na Provocative Materials for Thought (1968-69), história esconde a câmara criogénica de porque vivendo “num mundo em que as Akira — e as torres distantes de Marunouchi, palavras perderam as suas fundações atrás das quais se estende a vasta área plana materiais e se desligaram da realidade,” de shitamachi e o rio Sumida. Do lado sul aquilo que eles “podiam fazer, tinham de identiÆcamos o perÆl escultórico do Yoyogi fazer, era captar com os seus próprios olhos National Gymnasium — que na manga foi aqueles fragmentos da realidade que eram transformado no templo de Lady Miyako — e totalmente impossíveis de captar através de as torres de , atrás das quais se palavras”. estendem as colinas de yamanote e as ilhas O grupo da Provoke revelou as visões de artiÆciais que salpicam a baía de Tóquio. Tal uma geração abandonada entre os detritos como numa das vistas aéreas sobre deixados pela ocupação americana, numa Neo-Tokyo de Akira, não só reconhecemos o cidade fragmentada entre o comercialismo imaginário metabolista na cidade, mas grotesco e uma tradição que tinha perdido parece que as páginas da manga se abrem à um ou dois edifícios, só o curso do rio esfera suspensa no vigésimo andar, vemos a toda a autoridade. Nakahira interroga-se no nossa frente. Sumida até à baía de Tóquio é reconhecível. norte a foz do Sumida e a vasta área que foi posfácio do primeiro número da revista Deixamos o Tokyo Metropolitan Se uma destruição tão absoluta, tão total, destruída em Março de 1945, de Koto a Taito, sobre “como a Provoke irá mudar dentro do Government e atravessamos a cidade de permanece incompreensível, conseguimos e lembramo-nos com estupefacção e horror processo histórico e o que lhe irá acontecer comboio em direcção a este até começar a perceber a ansiedade e a obsessão de que a origem do Plan for Tokyo 1960 de quando os anos 1970 passarem”. A revista atravessarmos o rio Sumida, e, ao sairmos na de Otomo com a representação da catástrofe Tange foi o plano Yamato (1958), de Hisaakira acabou ao Æm de três números, mas plataforma em Ryogoku, vemos o perÆl urbana de Tóquio ao longo dos seis volumes Kano, o director da Japan Housing revolucionou a fotograÆa no Japão e foi o pixelizado do Museu Edo-Tokyo (1993) de de Akira, em que Old Tokyo e Neo-Tokyo são Corporation, que propunha um vasto aterro motor que conduziu à publicação de um Kiyonori Kikutake — um dos metabolistas — repetidamente destruídas, naquelas que são “utilizando uma bomba atómica para conjunto de livros que se tornariam muito como se um space invader do jogo Supesu talvez as páginas mais assustadoras e destruir uma montanha,” e assim gerar “a inÇuentes — For a Language to Come (1970), Inbeda (1978) tivesse saído do computador fascinantes da série. terra necessária para encher [a baía de de Nakahira, e Bye Bye Photography (1972) de Atari e aterrado sobre a paisagem plana de Apanhamos a linha de metro Oedo para Tóquio].” Como escreve Rem Koolhaas em Moriyama — nas décadas seguintes. Sumida. Mesmo no centro de shitamachi, sul até Shiodome e mudamos para o Project Japan: Metabolist Talks (2009), pouco esta era a área onde, até à II Guerra Mundial, Yurikamome — um comboio cujas linhas mais de uma década depois de Hiroxima, Panópticos metropolitanos se concentravam as nagaya (becos) com as elevadas ligam as ilhas artiÆciais da baía de “Kano imagina a bomba atómica como uma lojas e as casas dos artesãos e mercadores, Tóquio. Através da janela vemos o jardim ferramenta para criar uma cidade, em vez de Deixamos a hiroba e caminhamos por um numa vasta zona de pântanos que, tendo Hama-rikyu, onde era o início do Hibiya Irie, a destruir”. Tóquio, em Akira e na realidade, labirinto de pequenas ruas comerciais sob a sido reclamada à baía de Tóquio durante o um canal natural que se estendia desde a revela-se a cidade do excesso e da ansiedade chuva leve, até que entre os sinais luminosos período Edo, era frequentemente inundada baía até às portas do castelo de Edo, que existencial, um sonho tecnológico marcado se revela o perÆl majestoso e bizantino do pelo rio. Ieyasu Tokugawa — o primeiro shogun — fez pelo trauma das catástrofes que pontuaram Tokyo Metropolitan Government (1988) de Caminhamos pela sombra do Museu desaparecer em 1592 sob um aterro que a sua história. Kenzo Tange, o arquitecto que já tinha Edo-Tokyo até ao parque de Yokoamicho, arrasou a colina de Kanda, inaugurando um desenhado os principais projectos onde vemos o exterior tradicional do Tokyo longo processo de criação de aterros e ilhas Superfícies brilhantes simbólicos do novo Estado japonês do Memorial Hall (1930) de Chuta Ito — o mais artiÆciais que continua até hoje. pós-guerra — o Peace Memorial Park (1955) inÇuente arquitecto do Japão imperial —, um Ao atravessar a Rainbow Bridge, Na manhã seguinte emergimos do metro em em Hiroxima e o Yoyogi National enorme mausoléu que marca o lugar onde lembramo-nos das páginas iniciais do Aoyama-dori — a avenida que atravessa um Gymnasium (1964) para os Jogos Olímpicos dezenas de milhares de pessoas morreram primeiro volume de Akira — em que Tetsuo, dos bairros mais aÇuentes de Tóquio, de Tóquio. Visto da Citizen’s Plaza parece na noite de 1 de Setembro de 1923, durante o Kaneda e o seu gang atravessam de mota a Aoyama — no centro de yamanote. Deixamos uma fortaleza impenetrável revestida por incêndio causado pelo Grande Terramoto de ponte que dá acesso à área restrita de Old uma multidão que se dirige ao Meiji Jingu uma superfície semelhante a um Kanto. Também foi neste parque que foram Tokyo —, enquanto vemos Odaiba, a versão Stadium — onde vai haver um jogo de microprocessador, com um panóptico enterradas as cinzas das vítimas dos raids real, e banal, da Neo-Tokyo de Otomo, um basebol, o desporto mais popular no Japão — metropolitano no topo — dois observatórios aéreos da Operação Meetinghouse da Força eco do Plan for Tokyo 1960 de Tange, a e caminhamos sozinhos numa área de que quase tocam as nuvens — que nos Aérea Americana, durante a qual morreram aproximar-se no outro lado da baía. pequenas casas, sob o habitual emaranhado lembra o laboratório militar liderado pelo cerca de cem mil pessoas — mais do que em Ao sair na plataforma elevada em Daiba, de Æos que balouçam dos postes de coronel Shikishima da manga (banda Hiroxima — na noite de 9 de Março de 1945, vemos imediatamente o edifício da Fuji TV electricidade. Entramos num beco luminoso desenhada) Akira (1982-89), de Katsuhiro sob as vagas de bombas de fragmentação (1996) de Tange, um projecto monumental e vemos ao fundo a Small House (2000) de Otomo. incendiárias que caíram sobre shitamachi e concluído depois de a bolha do imobiliário Kazuyo Sejima, com uma fachada angular e Os seis volumes de Akira mostram Tóquio geraram uma conÇagração que se espalhou do Ænal da década de 1980 rebentar e de a anónima revestida de metal e vidro num futuro pós-apocalíptico no ano de 2019 de Sumida até Taito e Koto. crise económica se ter instalado. Passamos translúcido, cuja única abertura é uma porta — tal como no mundo Æccional de Blade Olhando hoje para as fotograÆas aéreas por uma vasta escadaria deserta sob uma elevada acessível por uma pequena escada. Runner, outra obra de 1982 —, três décadas que foram tiradas sobre as ruínas em 1945, estrutura espacial que parece construída Esta casa é um dos primeiros e mais depois de a cidade ter sido destruída por vemos uma paisagem apocalíptica de livro com peças de Lego Technic e subimos ao celebrados exemplos do novo paradigma da uma explosão nuclear de origem de Æcção cientíÆca, em que, para além de observatório. Das janelas desta enorme arquitectura residencial em Tóquio — Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público. Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.

Público • Domingo, 27 de Setembro de 2020 • 15

Placidez e catástrofe arquitectura. Deixamo-la, frágil e triste, sob a À esquerda, House in Uehara (1976) de chuva leve. Kazuo Shinohara. Através de uma das Ao Æm da tarde, atravessamos Suginami janelas, vemos uma sala coberta de livros, em direcção a sudeste, para regressar ao uma luz quente e confortável sob o céu centro da cidade, num comboio da linha pálido de fim de tarde reflectido na rua Keio-Inokashira. Ao passar pela estação de brilhante. As suas formas exuberantes e Kugayama, olhamos pela janela e pensamos austeras registam a passagem do tempo, que Kazuo Shinohara construiu a sua mas mantêm a clareza das suas ideias e a primeira casa aqui perto, em 1954. Quando ironia das suas intenções. Em baixo, dupla saímos em Yoyogi-Uehara, continua a chover página de um dos seis livros Akira, onde levemente, caminhamos pelas ruas Katsuhiro Otomo representa a catástrofe pequenas e brilhantes que, apesar de não o urbana de Tóquio, onde Old Tokyo e serem, parecem pedonais, como as de uma Neo-Tokyo são repetidamente destruídas pequena vila onde raramente passam carros. Numa rua inclinada, encontramos a House in Uehara (1976) de Shinohara, uma casa robusta e fechada, com uma abóbada com dois óculos pousada sobre uma caixa de betão com quatro janelas triangulares — a antítese da House NA. Através de uma das janelas, vemos uma sala coberta de livros, uma luz quente e confortável sob o céu pálido de Æm de tarde reÇectido na rua brilhante, e, de repente, a casa fechada torna-se transparente. As suas formas exuberantes e austeras registam a passagem do tempo, mas mantêm a clareza das suas ideias e a ironia das suas intenções. Do topo da colina onde estamos, vemos a paisagem urbana de Tóquio e temos a sensação de que esta metrópole de 15 milhões de habitantes, que ainda parece uma colecção de aldeias interligadas por uma vasta rede de comboios e auto-estradas, é um sistema complexo de forças e variáveis impossível de compreender na sua totalidade, e lembramo-nos das palavras de Shinohara: “Eu posso projectar edifícios especialmente depois do colapso do de Tadao Ando, construído pela Mori individuais, mas não posso desenhar uma mercado imobiliário e do índice Nikkei no Building, que marcou o Ænal simbólico da cidade. Na minha opinião são duas coisas Ænal de 1989 — que consiste em construir transformação de Omotesando ao demolir e completamente separadas. As pessoas, a casas em lotes residuais com áreas abaixo tomar o lugar dos Dojunkai Aoyama cultura e o clima geram as cidades, não um dos cem metros quadrados. Apartments (1926), um dos primeiros indivíduo. Esse foi o maior erro do Por causa dos preços inÇacionados e da edifícios modernistas de Tóquio. A Dojunkai modernismo.” constante subdivisão das propriedades em — uma organização do Ministério do Interior Saímos na estação de Shibuya e lotes cada vez mais pequenos, há uma Japonês — tinha sido estabelecida nos anos atravessamos o celebrado cruzamento necessidade de aproveitar todos os espaços Tóquio, em Akira que se seguiram ao Grande Terramoto de diagonal — uma conÇuência de disponíveis, o que, segundo Momoyo Kanto de 1923 para construir habitação infra-estruturas de transporte, densidade de Kaijima e Yoshiharu Tsukamoto do Atelier e na realidade, colectiva de betão armado mais resistente a pessoas e painéis publicitários animados — Bow-Wow, gerou “uma ‘fobia ao vazio’ em sismos e incêndios, e, se todos os seus que se tornou a epítome, o centro simbólico Tóquio” e conduziu ao desenvolvimento de revela-se a cidade edifícios sobreviveram aos e a imagem da complexidade urbana de um vernacular urbano fascinante, bombardeamentos da II Guerra Mundial, Tóquio. Shinohara achava que esta área documentado nos seus livros Made in Tokyo do excesso e da nenhum sobreviveu à Mori Building. apresentava uma negociação entre forças (2001) e Pet Architecture Guide Book (2002). Andamos até Harajuku para entrar na urbanas independentes dentro de um Os edifícios e espaços representados nesses ansiedade linha Chuo-Sobu, e, à medida que a linha sistema aberto de enorme complexidade, inquéritos à arquitectura comercial e elevada do comboio atravessa Nakano — no em oposição à cidade modernista, em que se residencial de Tóquio são “anónimos” — existencial, um limite oeste do centro de Tóquio —, é como procura a unidade formal de um sistema “arquitectura da-me (no good)” — em que “a se passássemos sobre um vasto mar urbano fechado. Para Shinohara, “depois da II prioridade é a resposta ao contexto e aos sonho tecnológico de pequenos edifícios, de dois ou três pisos, Guerra Mundial, Tóquio tinha-se tornado um requisitos do programa, sem insistir na pois as coberturas das casas adjacentes monte de cinzas, e muitos arquitectos imagem e na forma”. Também a Small House marcado pelo passam tão próximas que quase se podem japoneses progressistas pensavam que partilha as condições que conduziram ao tocar. podiam transformar completamente a aparecimento da Pet Architecture, apesar de trauma das Saímos em Koenji, e caminhamos à chuva cidade usando o Plan Voisin de Le não ser Pet Architecture. por uma área de pequenas ruas sem passeio, Corbusier”. E conclui: “Sonhavam.” Voltamos para Aoyama-dori e catástrofes até que vemos, entrincheirada no meio de atravessamos a avenida em direcção a sul, dezenas de outras casas, a estrutura delicada No próximo texto — a publicar no último entrando no labirinto de ruas secundárias de e geométrica da House NA (2010) de Sou domingo de Outubro — seguiremos o Minami-Aoyama, formado por uma longa que pontuaram Fujimoto — um ícone da arquitectura arco da baía de Sagami, reflectindo sobre sucessão de casas minúsculas mas japonesa mais recente —, uma pequena casa as representações do Japão ao longo da sumptuosas. Atrás de uma teia de Æos a sua história composta por 21 plataformas distribuídas Tokaido, desde Kita-Kamakura, uma eléctricos e outras infra-estruturas urbanas, por vários níveis, cobertas por paredes de paisagem povoada pelo imaginário de avistamos o topo do perÆl triangular da vidro. Na realidade, a transparência Yasujiro Ozu, até à península de Izu. Prada Aoyama (2003) de Herzog & de se transformaram numa superfície habitada metafórica e literal que propõe está Meuron. Foi esta loja, de cinco pisos, coberta por símbolos comerciais, a antítese do totalmente escondida por cortinas, a A série Primavera Tardia recebeu o apoio de losangos de vidro côncavos e convexos, vernacular urbano de Made in Tokyo e da Pet estrutura branca e elegante está salpicada de de uma bolsa de curta duração da que transformou Omotesando — a pacata Architecture. ferrugem, o Citroën dois-cavalos azul que Fundação Oriente avenida que era o acesso principal do Meiji Subimos Omotesando na sombra das suas serve de arrecadação está coberto de poeira Jingu, o santuário shinto dedicado ao keyaki (Zelkova serrata) imemoriais, entre as — como um adereço esquecido desde a Eliana Sousa Santos é investigadora no imperador Meiji — num ícone do excesso da multidões de domingo à tarde carregadas de sessão fotográÆca — e os seus habitantes Centro de Estudos Sociais da Univ. arquitectura global da primeira década do sacos de compras. Passamos por parecem os sobreviventes de um cerco, os Coimbra e professora auxiliar convidada século XXI, em que a cidade e a arquitectura Omotesando Hills (2005), o centro comercial prisioneiros involuntários de uma imagem de no DAU ISCTE