A Criação Do Museu De Arte Contemporânea De Niterói: Contextos E Narrativas
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A criação do Museu De Arte Contemporânea de Niterói: contextos e narrativas Carlos Douglas Martins Pinheiro Filho1 Resumo: O texto pretende apresentar a pesquisa realizada na tese homônima que analisa as relações sociopolíticas entre os atores sociais enredados no processo criação do Museu de Arte Contemporânea de Niterói (MAC-Niterói). O recorte temporal da investigação compreende a fundação do museu, de 1991 a 1993; a construção do edifício, até 1996; e o momento posterior a sua inauguração, em 1996, até o ano 2006, quando a instituição completou dez anos. O estudo traz a reflexão de que a construção do edifício foi justificada pela Prefeitura de Niterói/RJ como a aquisição de um patrimônio duplo para a cidade: um projeto de Oscar Niemeyer, arquiteto consagrado internacionalmente; e o comodato de uma soma da coleção de objetos de arte de João Leão Sattamini Neto, reconhecido colecionador brasileiro de objetos de arte. Assim, após o término das obras, o colecionador firmou um contrato de comodato onde emprestou uma quantidade significativa de objetos de arte de sua coleção para o acervo básico do museu, podendo os mesmos serem doados permanentemente ao poder público após o falecimento do proprietário. Neste sentido, a investigação pretendeu compreender como o projeto do MAC-Niterói foi possibilitado durante as décadas de 1990 e 2000, no contexto de vigência da Constituição de 1988, pela associação entre diferentes atores sociais, principalmente, o arquiteto Oscar Niemeyer, o colecionador Joao Sattamini e o prefeito Jorge Silveira. Palavras-chave: Público e Privado; Política cultural; Museus; Museus no Brasil; Museus de Arte Contemporânea. 1 Professor da Fundação de Apoio à Escola Técnica (FAETEC), doutor em Sociologia pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia da UFRJ (PPGSA-UFRJ), mestre em Comunicação e Cultura pela Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura da Escola de Comunicação da UFRJ e licenciado em Ciências Sociais pela Universidade Federal Fluminense (UFF). The Museum of Contemporary Art of Niterói: contexts and narratives Abstract: The study intends the conformation process of the Museum of Contemporary Art of Niterói (MAC-Niterói) to understand the sociopolitical relations between the different social actors. With the purpose of analyzing the discourses, trajectories and networks of the different social actors, produced questions who are the subjects and how they acted in the realization of the museum project, it was sought to cut newspaper articles, catalogs, official documents, legislations and other writings. The temporal cut of the investigation comprises the foundation of the museum, from 1991 to 1993; the construction of the building, until 1996; and the subsequent realization of the museum activities, from 1996 to 2006, when the institution completed ten years. In the case study, the building designed and donated by Oscar Niemeyer to the city of Niterói/RJ was built with justification in the acquisition of a double heritage: a building designed by Niemeyer, architect internationally consecrated, and the lending part of the collection of art objects of João Leão Sattamini Neto. To become the basic collection of the museum, the collector signed a loan agreement in which he lent a specific amount of art objects from his collection and they could be donated permanently to the public power after death of the owner. Occurred during the administration of the mayor, Jorge Roberto Silveira, of the Partido Democrático Trabalhista (PDT), for the initiative of the collector to seek the city public power to lend your collection beginning the association between João Sattamini and the city of Niterói/RJ. The research sought to understand how the MAC-Niterói project was made possible during the 1990's and 2000's, in the context of the 1988 Constitution, by the association between different social actors, especially the architect Oscar Niemeyer, the collector Joao Sattamini and Mayor Jorge Silveira. Keywords: Public and Private; Cultural policy; Museum; Museums in Brazil; Museums of Contemporary Art. 1) O Museu de Arte Contemporânea de Niterói: A presente investigação propõe analisar as relações sociopolítica que deram origem ao Museu de Arte Contemporânea de Niterói (MAC-Niterói), destacadamente, entre a Prefeitura do município de Niterói/RJ e a rede do colecionador de objetos de arte, João Leão Sattamini Neto2. Desde 1991, quando o museu foi projetado, até a 2006, a instituição foi agenciada pelos arranjos decorrentes da associação entre o poder público municipal e o proprietário privado, que, por vezes, a depender do contexto, era uma relação conflituosa. O museu tornou-se uma política pública municipal pela iniciativa do Prefeito Jorge Roberto Saad Silveira3, do Partido Democrático Trabalhista (PDT)4, e de seu secretário de cultura Ítalo Campofiorito5, devido a oferta empréstimo da coleção privada de João Sattamini. Portanto, ao adotar como questão de pesquisa a relação entre os atores sociais privados e o Estado, retoma-se nessa monografia uma questão fundamental da sociologia: a relação entre indivíduo e sociedade (WEBER, 2009; SIMMEL, 2006; ELIAS, 1994; BOURDIEU, 2007). 2 João Leão Sattamini Neto nasceu na cidade do Rio de Janeiro, em 1936, e faleceu na mesma cidade no dia 20 de novembro de 2018. João Sattamini cresceu em Ipanema, mas sua família tem origem gaúcha: é filho de um funcionário público do Ministério da Fazenda; e de uma professora de piano. Sattamini é economista e foi executivo do extinto Instituto Brasileiro do Café, em Milão – Itália. No retorno de Milão, em 1971, comprou o apartamento, no Jardim Botânico, onde viveu com Sylvia Sattamini, sua terceira mulher, e a filha Paula, que é designer. Em sua residência, possuía cerca de quarenta quadros e esculturas, “selecionados por critério afetivo”. Sattamini tem duas filhas de casamentos anteriores, a cantora Valéria e a historiadora Paula (GARCIA, PIMENTA, 2009). 3 Jorge Roberto Saad da Silveira, nasceu na cidade de Niterói, em 9 de setembro de 1952. É filho do ex-governador do Rio de Janeiro, Roberto Silveira, e sobrinho do também ex-governador Badger da Silveira. Foi prefeito de Niterói por quatro mandatos (1989-1992, 1997-2000, 2001-2002 e 2009-2012). Em 2002 foi derrotado por Rosinha Garotinho (PMDB), na eleição para Governador, ficando em terceiro lugar (17% dos votos válidos) e, ao seu candidatar, deixou o cargo de prefeito para seu vice na época, Godofredo Pinto (PT). Promoveu a candidatura de João Sampaio em 2004, que foi derrotado no segundo turno pelo candidato do PT, o então prefeito Godofredo Pinto, vice da chapa de Jorge em 2000. Foi eleito prefeito de Niterói, novamente, nas Eleições municipais de 2008, em primeiro turno, com 60,80% dos votos válidos, totalizando 168.465 votos. 4 É um partido político brasileiro de ideologia trabalhista, fundado por políticos e intelectuais brasileiros, no final da década de 1970, logo após o início do processo de abertura política do regime militar. O PDT é o único partido brasileiro a integrar a 2ª Internacional Socialista. 5 Nascido na cidade de Paris, França, no ano de 1933, tornou-se arquiteto, em 1956, pela Faculdade Nacional de Arquitetura da Universidade do Brasil, atual Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Trabalhou no escritório de Niemeyer, entre 1958 e 1961, época de construção de Brasília, e foi chefe do Serviço de Urbanismo Metropolitano de Brasília, entre 1961 e 1963. Foi professor professor associado e secretário executivo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (UnB), entre 1962 e 1965. Atuou como diretor do Patrimônio Histórico e Artísitico do INEPAC/SEEC-RJ, a partir de 1979; como assessor técnico e gerente do projeto Implantação do Corredor Cultural, na Fundação Rio, nos anos de 1970 e 1980. Na década de 1990, foi secretário de cultura de Niterói, período da criação do Museu de Arte Contemporânea (MAC-Niterói). Foi diretor executivo do museu, entre os anos de 1996 e 2004 e, posteriormente, membro do seu Conselho Deliberativo. Segundo definição expressa do prefeito Jorge Silveira, político em seu primeiro mandato no executivo municipal (1989-1993), o projeto do museu deveria ser encomendado especificamente com Oscar Niemeyer6. Ao aceitar o pedido do poder público e o doou a Prefeitura do Niterói/RJ. O arquiteto finalizou o projeto em julho de 1991, dois meses após o encontro para definição do local de construção. A Prefeitura construiu a edificação integralmente com recursos públicos durantes os anos 1991 a 1996. Antes mesmo de inaugurado, quando foi concluída as obras de concretagem, a silhueta do museu passou integrar o imaginário popular na cidade: em 1992, tornou-se símbolos da Prefeitura e, em um curto período de tempo, converteu-se em uma referência mais ampla para toda cidade. A potência simbólica do museu, testada após sua inauguração, incentivou a Prefeitura a realizar outras parcerias com Oscar Niemeyer, dando origem, em 1997, ao projeto Caminho Niemeyer7, política urbanística de “modernização” da região de orla do centro da cidade, que constituiu o principal projeto de gentrificação8 da cidade de Niterói/RJ. Enquanto instituição museal, o MAC-Niterói foi fundado em virtude do empréstimo da propriedade privada de João Sattamini para o município, cujos objetos de arte se tornaram o acervo básico da instituição, chamado de Coleção Sattamini. A associação foi instituída legalmente pela a assinatura de um contrato de comodato9, documento que formalizou a tutela dos objetos de arte, visando dar garantias do trânsito