VINHOS Vinho Na Índia?
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VINHOS Vinho na Índia? Há muito que já se foi o tempo da França, Itália e alguns outros poucos países europeus serem considerados como os únicos produtores de bons vinhos. Hoje, grandes produtos podem ser encontrados nos quatro cantos do mundo, da Califórnia até a Nova Zelândia, passando pela América e África do Sul. Todas essas regiões já fazem produtos conheci- dos, muitos deles de excelente qualidade, muitas vezes superiores aos produtos franceses e merecedores de medalhas e reconhecimento oficial pelos mais altos profissionais do setor. Outros países também começam a ingressar nesse mundo encantador de Baco e Dionísio. A China, segunda área de viticultura do mundo, está trabalhando fortemente e bons produtos não deverão demorar a aparecer. Até a Etiópia já possui alguns vinhos razoáveis! Em recente viagem, fomos conhecer o mercado vitivinícola da...Índia. 96 ITALIAN-FOOD Nº 34 - 2019 A VITIVINÍCOLA INDIANA Um pouco de história. Acre- dita-se que a viticultura tenha (1) Os xátrias, kshatriya, chátrias ou sido introduzida na Índia pelos chatrias (em híndi क्षत्रिय, transl. kṣat comerciantes persas em algum riya, do sânscrito क्षत्र transl. kṣatra) for- momento do quarto milênio a.C. mam uma das quatro castas no hinduís- Os primeiros plantios foram usados mo. Constituem a ordem dos altos postos principalmente para uvas de mesa militares e na sua maioria governantes do ou suco de uva e não na produção tradicional sistema social védico-hindu e de uma bebida alcoólica. Durante o suas famílias, tal como definido pelos Ve- período védico do 2º e 1º milênios, das e pelo Código de Manu. Os Senhores as tribos arianas da região eram Krishna, Buda e Mahavira pertenceram conhecidas pela sua indulgência a esta casta. na bebida e parece provável que o vinho fosse uma bebida corrente. A primeira menção conhecida de vinhos à base de uva foi nos escritos de Chanakya, também chamado de Vichnugupta (371 a.C. - 283 a.C.), um estadista e filósofo india- no dos séculos IV e III a.C., que Chandragupta Máuria serviu como primeiro-ministro de Chandragupta Máuria (340 a.C. - tiveram recepção favorável. A indústria 298 a.C.), o fundador do Império Máu- vinícola indiana estava atingindo um ria. Em seus escritos, Chanakya condena pico no momento em que a epidemia o uso do álcool, enquanto registra que o de filoxera(2) chegou ao país e devastou imperador apreciava um estilo de vinho seus vinhedos. de uva conhecido como Madhu. Foi um longo caminho para a in- (2) Filoxera é o nome comum do hemípte- Nos séculos que se seguiram, o dústria vitivinícola indiana se recuperar ro da família Phylloxeridae, da espécie vinho tornou-se a bebida privilegiada da da devastação no final do século XIX. A Daktulosphaira vitifoliae (Fitch, 1854), nobreza indiana ou classe Kshatriya(1), opinião pública e religiosa desfavorável por vezes designada pelo seu sinônimo ta- enquanto a casta inferior bebia tipi- sobre o álcool se desenvolveu e culminou xonômico Phylloxera vastatrix (Planchon, camente álcool feito de trigo, cevada na década de 1950, quando muitos dos 1868). A partir do último trimestre do e painço. Sob o domínio do Império Estados da Índia proibiram o uso do século XIX, a filoxera constituiu-se como muçulmano Mughal, o álcool era álcool. Os vinhedos foram arrancados ou a praga mais devastadora da viticultura proibido de acordo com as leis dieteticas incentivados a se converterem para a pro- mundial, alterando profundamente a islâmicas. No entanto, há relatos escri- dução de uvas e passas. Algumas áreas, distribuição geográfica da produção tos sobre, pelo menos, um governante como Goa, continuaram produzindo vinícola e provocando uma crise global Mogol, Jahangir (1569 - 1627), nome vinho, mas o produto era normalmente na produção e comércio dos vinhos que imperial de Nur-ud-din Mohammad muito doce e altamente alcoólico. O duraria quase meio século. O vocábulo Salim, governante do Império Mogol en- ponto de virada da moderna indústria filoxera é usado indistintamente para tre os anos de 1605 e 1627, que gostava vinícola indiana ocorreu no início dos designar o inseto e a doença dos vinhedos de vinho de conhaque. No século XVI, anos 80, com a fundação do The Tonia que é causada pela infestação. De origem os colonos portugueses de Goa introdu- Group, no Estado de Goa. Com a assis- norte-americana, a filoxera está hoje pre- ziram o vinho do tipo porto e a produção tência de produtores franceses, o Grupo sente em todos os continentes, sendo um de vinhos fortificados logo se espalhou Tonia começou a importar variedades de dos exemplos mais marcantes do efeito para outras regiões. Sob o domínio uvas vitis vinifera, como Cabernet Sau- humano sobre a dispersão das espécies, britânico durante a era vitoriana, a viti- vignon, Chardonnay, Pinot blanc, Pinot já que, em poucas décadas, esta espécie cultura e a vinificação foram fortemente noir e Ugni blanc, e começou a fazer evoluiu de um habitat localizado para encorajadas como fonte doméstica para vinhos e espumantes. Outras vinícolas uma distribuição global, com uma rapidez os colonos britânicos. Os vinhedos foram logo se seguiram à medida que o sur- que, ainda hoje, não deixa de surpreender. plantados extensivamente nas regiões de gimento da crescente classe média da Baramati, Caxemira e Surat. Em 1883, Índia impulsionou o crescimento e o na Exposição Internacional de Calcutá, desenvolvimento da indústria vinícola os vinhos indianos foram exibidos e indiana. Hoje, as duas principais viní- 2019 - Nº 34 ITALIAN-FOOD 97 VINHOS colas indianas são a Sula Wines e a Grover Vineyards. Geologia e clima. Embora uma grande parte do subcontinente indiano não seja ideal para a viticultura, a grande diversidade de clima e geologia cobre algu- mas áreas com terroir adequado para a viticul- tura prosperar. O verão na Índia tende a ser muito quente e propenso a monções. Muitas das regiões vinícolas também se enquadram na faixa climática tropical. Os vinhedos são, então, plantados em altitudes mais elevadas, ao longo de encostas, para se beneficiar do ar mais fresco e de alguma proteção contra o vento. A altitude dos vinhe- dos da Índia normalmente varia de 200 metros em Karnataka, 300 metros em Maharashtra, 800 metros ao longo das encostas do Sahyadri e 1.000 metros na Caxemira. A temperatura de verão pode ficar tão alta quanto 45°C e as mínimas de inverno podem cair até 8°C. Durante o pico da estação de crescimento, entre junho e agosto, a preci- pitação média é de 625 a 1.500 mm. Os vinhedos na Índia variam desde o clima mais temperado do Estado de Punjab, no Noroeste, até o Estado de Tamil Nadu, no Sul. Algumas das maiores áreas produtoras estão localizadas em Maharashtra, Karna- taka, perto de Bangalore e Telangana, perto de Hyderabad e no vilarejo de Titari (Distrito de Ratlam, no Estado de Madhya Pradesh), onde se encontra a Ambi Vineyard. Dentro As principais regiões vinícolas da Índia estão ao Norte - Kashmir e Punjab - e ao Sul - da região de Maharashtra, os vinhedos são Maharashtra, Andhra Pradesh, Tamil Nadu, Karnataka e Goa. encontrados no Planalto do Decão (Deccan Plateau) e ao redor de Baramati, Nashik, amplamente utilizada. As condições tropicais ser usadas na produção de vinho, sendo Pune, Sangli e Solapur. A cidade de Nashik, geralmente promovem altos rendimentos, Anabeshahi, Arkavati e Arkashyam as mais no Estado de Maharashtra, passou a ser o que requer podas frequentes durante comuns. As uvas populares não nativas in- chamada de Capital do Vinho da Índia. todo o ano. A colheita normalmente ocorre cluem o Bangalore Blue (Isabella) e o Gulabi O alto calor e a umidade da metade em fevereiro e geralmente é feita à mão. (Black Muscat). A uva turca Sultana é a mais oriental do país limita a atividade vitícola. Nas regiões vitivinícolas muito quentes de amplamente plantada na Índia, cobrindo O calor e a umidade da região vinícola da Tamil Nadu, Karnataka e Andhra Pradesh, mais da metade dos 148.000 hectares plan- Índia ditam muitas das escolhas as videiras podem produzir uma cultura duas tados no país. Além das variedades francesas, vitícolas que são feitas nos vezes por ano. inicialmente importadas pelo Grupo Tonia, vinhedos. A irriga- O Sul da Índia é o lar de variedades de pode-se também encontrar hoje a Sau- ção é essencial e uvas de mesa indígenas que também podem vignon blanc, a Zinfandel, a Chenin blanc e 98 ITALIAN-FOOD Nº 34 - 2019 a Clairette Blanche. Nashik. Antiga cidade sagrada na região Noroeste de Maharashtra, Nashik é situada nas margens do rio Godavari e é mais conheci- da por ser um dos locais de peregrinação hindu, o de Kumbh Mela. O Khumba Mela ou Kumbh Mela é o principal festival do hinduísmo, que ocorre quatro vezes a cada 12 anos na Índia, rodando por quatro cidades: Allahabad, Uj- jain, Nashik e Haridwar. Localizada a cerca de 190 km ao Norte de Mumbai, a capital do Estado ainda é chamada de Capital do Vinho da Índia, já que metade dos vinhedos e viníco- las da Índia estão localizados em Nashik. Fica, em média, a 584 metros do nível do mar, o estação fria de novembro a fevereiro. registrado pelo Controlador Geral de Patentes que lhe confere variação de temperatura ideal, A estação fria apresenta temperaturas amenas de Design e Marcas Registradas sob o título particularmente em invernos. Nashik tem de cerca de 28°C durante o dia, mas noites Nashik Valley Wine. Sob as estipulações de um terreno montanhoso exuberante e fica na frias, com temperaturas médias de 10°C e ar proteção, pelo menos, 80% das uvas usadas borda ocidental do Planalto de Decão, uma extremamente seco.