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Breve notícia sobre fotos de índios em arquivos do (1)

José Ribamar Bessa Freire Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

Resumo: Esta comunicação apresenta aos pesquisadores da área um conjunto de informações sobre os acervos fotográficos existentes em 12 grandes arquivos, localizados no Rio de Janeiro, mas com cobertura de âmbito nacional, destacando dentro deles as coleções e fundos com imagens relacionadas à temática indígena. Identifica, localiza, descreve e contextualiza o conteúdo básico dos acervos selecionando, da massa expressiva de dados, algumas séries de documentos iconográficos, que tentam apreender as sociedades indígenas em suas especificidades e em suas relações com a sociedade nacional. O trabalho apresenta elementos da relevância dessa documentação histórica para a discussão de identidade, etnicidade e interculturalidade no contexto do processo de construção da memória nacional.

Palavras-Chave: Acervos fotográficos, Índios, História

COMUNICAÇÃO

No ano de 1865, o fotógrafo suiço, A. Frisch, montou uma laboratório fotográfico dentro de uma canoa e viajou nela ao longo do rio Amazonas. Em sua passagem por Manaus, documentou a presença de índios destribalizados na periferia da cidade e aí fotografou os últimos índios Passé, etnia hoje extinta. Subiu o rio Solimões na mesma canoa-estúdio e retratou guerreiros Amaúa paramentados com suas armas e ornamentos, um cacique ticuna em sua maloca, alguns Miranha carregando cachos de banana pacovã em Fonte Boa, além de cenas de caça protagonizadas por vários Kayuixâna. Tornou-se, assim, o primeiro fotógrafo a documentar os índios com uma perspectiva antropológica, registrando a diversidade étnica e as relações interculturais. 2

Neste mesmo ano, outro fotógrafo, Walter Hunnewell, integrante da expedição científica chefiada por Louis Agassiz, montou um ‘atelier’ em Manaus, onde tirou grande número de retratos de índios, negros e mestiços, que posaram de frente, de costa e de perfil; essas imagens estavam destinadas a servir de evidências empíricas para um estudo preliminar de antropologia física, já que realizar “um estudo aprofundado das diferentes nações e dos indivíduos de sangue mesclado, que habitam o vale amazônico exigiria anos de exame e observação paciente”. (AGASSIZ:1975:303) Milhares de imagens como essas, muitas delas inéditas, encontram-se arquivadas em instituições sediadas no Rio de Janeiro. No entanto, não mereceram ainda a devida atenção dos pesquisadores por muitas razões, incluindo aquelas de ordem teórica e metodológica. Em alguns casos, porém, as fotografias não foram suficientemente interrogadas, ou porque os pesquisadores freqüentemente desconhecem a sua existência e o seu potencial informativo, ou porque elas não foram ainda localizadas, identificadas, ordenadas e catalogadas. O objetivo dessa comunicação é dar uma breve notícia sobre a presença de índios nos acervos fotográficos de alguns arquivos do Rio de Janeiro, como contribuição para começar a preencher algumas dessas lacunas. Capital do Brasil desde o período colonial, na segunda metade do século XVIII, o Rio de Janeiro acumulou uma massa de documentos composta pelos registros administrativos que se referem às funções e operações do aparelho de estado e sediou ainda importantes arquivos particulares de diversas procedências, muitos deles absorvidos pelo Arquivo Nacional. Dessa documentação faz parte um rico acervo iconográfico, o mais importante de toda a América Latina, totalizando mais de 1.500.000 peças – desenhos, gravuras, estampas, fotos e imagens diversas - distribuídas por diferentes instituições. Vamos destacar aqui 12 arquivos que conservam, dentro do seu acervo iconográfico, fotos com valiosas informações de caráter etnográfico, documentando os objetos da cultura material, a vida política, econômica e religiosa de centenas de grupos indígenas e registrando em imagens as diferentes formas de contato com a sociedade nacional, a ação missionária e a reação dos índios. São eles: Arquivo Nacional, Biblioteca Nacional, Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Arquivo Histórico do Itamarati, Museu do Índio, Museu Histórico Nacional, Serviço de Documentação Geral da Marinha, Arquivo 3

Histórico do Exército, Museu Histórico do Exército-Forte de Copacabana, Mosteiro de São Bento, Museu de Arte Moderna e Casa de Oswaldo Cruz.

1. Arquivo Nacional

Material fotográfico expressivo pode ser encontrado em muitos fundos do Arquivo Nacional, merecendo destaque seis deles, três dos quais constituídos a partir de atividades jornalísticas: Agência Nacional, Correio da Manhã, TV Tupi, além do Tribunal Especial e das coleções Afonso Pena e História da Fotografia. · Agência Nacional Criada em 1945, a finalidade principal da Agência Nacional era exercer atribuições informativas: noticiar, fotografar, filmar, gravar, irradiar e depois televisionar atos e fatos da vida pública brasileira. Seus arquivos audiovisuais contêm 303.000 negativos fotográficos, 23.500 fotografias, 5.835 discos, 892 filmes e 19 vídeos, com imagens produzidas no período de 1935 a 1979, pois incorporaram documentação anterior pertencente ao DIP – Departamento de Imprensa e Propaganda e, posterior, da Empresa Brasileira de Notícias. Esta documentação deu entrada no Arquivo Nacional nos anos 70. Ela é composta de fotos e filmes sobre as relações dos índios com o estado nacional no período do Estado Novo até o governo do general Geisel. Contém muitas fotos, documentando a visita de índios a Vargas, Café Filho, JK, Jânio Quadros e aos governos militares de Castelo Branco, Costa e Silva e Médici e registrando outros eventos como as comemorações da Semana do Indio, na ABI, as atividades do Museu do Indio, do SPI, da Funai, da Missão Villas Boas, da Expedição Roncador-Xingu, da Fundação Brasil Central e do Correio Aéreo Nacional (FAB) junto aos índios da Amazônia. Há ainda fotos sobre o impacto da Transamazônica na vida de diferentes tribos e sobre variados aspectos culturais. Os grupos mais fotografados são: Xavante, Karajá, Tukano, Kayapó, Desana, Pakáa-Nova, Kamauyrá, Bororo e Tirió. O material está parcialmente organizado, em séries temáticas.

· Correio da Manhã O jornal ‘Correio da Manhã’, que circulou diariamente de 1901 a 1974, fazia parte da grande imprensa carioca. Seu arquivo, leiloado em 1975, foi adquirido pelo editor 4

Fernando Gasparian, que o doou ao Arquivo Nacional sete anos depois. Os registros visuais são constituídos por ampliações fotográficas de vários formatos, totalizando 430.000 fotografias, além de 370.000 negativos, cobrindo o período de 1930 a 1974. Estão organizados por tema, em ordem alfabética e de acordo com a procedência. Documentam a ação dos órgãos oficiais, sobretudo do SPI e da Funai, na execução da política indigenista nas área de educação, saúde e terra. Permanecem inéditas muitas fotografias, referentes às ações das Unidades Sanitárias Aéreas (SUSA) e ao trabalho missionário de diferentes igrejas. Outras, publicadas pelo jornal, cobrem as relações dos grupos indígenas com a sociedade nacional, as visitas de caciques a diferentes capitais brasileiras e ilustram reportagens sobre aspectos da organização social e política e sobre o cotidiano de muitas aldeias, sobretudo no período de 1950-1970. O acervo contém ainda a última foto do cacique xavante Urubueman dois dias antes de ser assassinado, fotos de muitos Xikrin mortos pela varíola transmitada por castanheiros, as imagens dos conflitos de terras com os Guaikuru, os Mekrontire e os Kren-Akore, os primeiros contatos dos Xavante com os salesianos, a arte plumária do Xingú e a escola Karajá da aldeia de Santa Isabel, entre outras.

· TV TUPI Documentos produzidos e acumulados pela TV Tupi foram doados aos Arquivo Nacional em dezembro de 1986 por dois funcionários da extinta emissora. Contém 587 filmes resultantes da cobertura jornalística diária, que foram ‘copiados’ em vídeo para torná-los acessíveis ao pesquisador. Entre eles, um filme sobre a exposição “Rondon, civilizador do sertão”, com imagens de vários índios, malocas, instrumentos musicais e peças de artesanato indígena.

· Tribunal Especial A documentação deste fundo, enviada em 1940 pelo Ministério da Justiça ao Arquivo Nacional, está constituída por inquéritos sobre fraudes eleitorais, uso do patrimônio público, desvio de verbas, chantagens e relatórios de comissões de sindicância, que ocorreram no período 1930-32. Nos inquéritos em órgãos públicos, destacam-se cinco volumes referentes ao SPI – Serviço de Proteção ao Índio, com relatórios das inspetorias no 5

Amazonas e no Acre. Apresenta um álbum com 315 fotos, que servem de suporte às denúncias contra um inspetor de índios, acusado de empregá-los na coleta da castanha e extração da borracha, em benefício próprio e de arrendar e usurpar as terras indígenas. A documentação textual registra o discurso da oligarquia local que pretende negar a existência de índios e resiste às demarcações das reservas em Borba, Itacoatiara e no município de Manaus. Os principais grupos fotografados são: Ipurinã, Jamamadi, Kulina, Kanamari, Jamináua, Arara, Waimiri, Mura, Mawé, Makuxi e Tariano, entre outros. O acervo estava apenas identificado, em fase de organização.

· Afonso Pena

A coleção dos documentos pessoais, de papéis oficiais e da correspondência de Afonso Pena (1847-1909), incluindo 490 fotografias, foi doada ao Museu Nacional pela família do ex-presidente em 1970. Contém registro de exploração do trabalho indígena no rio Juruá, conflito de terra entre os Bororo e fazendeiros de Goiás, no rio Mucuri e na aldeia do Itambacuri (MG). Do acervo de imagens, 54 fotos são de índios das missões salesianas do Mato Grosso, possivelmente Bororo. A coleção está totalmente organizada por séries temáticas e cronologicamente.

· História da Fotografia O Arquivo Nacional formou esta coleção, a partir de 1983, com o objetivo de reunir subsídios para a história da fotografia e retratar aspectos e costumes dos séculos XIX e XX, especificamente de 1839 a 1932, anos da invenção da fotografia e do surgimento da fotografia moderna com o lançamento da câmera 35 mm. Seu acervo inicial foi formado com coleções de fotografias dos Ministérios da Viação e Obras Públicas e da Agricultura, Comércio e Obras Públicas e de outras doadas ou compradas de particulares. Sobre a temática indígena, possui, entre outros, um álbum dedicado a Getúlio Vargas pelo General Rondon, com 161 páginas, repletas de imagens de índios das áreas de fronteiras com a Venezuela, Colômbia, Peru, Bolívia, Argentina e Paraguai, no período de 1929-30. Contém ainda fotos da expedição dirigida em 1911 pelo tenente Manoel Rabello, inspetor do SPI de São Paulo, para impedir uma impedir uma incursão organizada por “bugreiros” de Platina 6 contra os Kaingang do rio do Peixe, entre as quais a foto do índio Oti-Xavante, único sobrevivente do massacre. Há uma foto de homens, mulheres e crianças Guarani, que foram trazidos de San Pedro (Paraguai), ao lado de um militar fardado, de um padre e de um negro, além de muitas fotos de índios Kaingang. As fotografias estão organizadas em ordem alfanumérica, por ordem de entrada no acervo e de acordo com sua procedência.

2. Biblioteca Nacional

A Divisão de Iconografia da Biblioteca Nacional possui o maior e mais importante acervo iconográfico já reunido por uma instituição pública brasileira. Duas coleções, denominadas ‘Iconografia’ e ‘Coleção Farquhar’, reúnem fotografias relacionadas à temática indígena. · Iconografia . Com um número expressivo de exemplares únicos e originais, o acervo é composto por mais de 130 mil peças – estampas, desenhos, aquarelas, litografias, xilografias, e fotografias - inseridas em diferentes coleções. Das 40.000 fotografias da coleção, muitas documentam a variedade étnica, usos, costumes e instituições indígenas, com informações sobre aldeias, habitações, utensílios domésticos, canoas, cerâmica, urnas funerárias, indumentárias, máscaras, danças, ornamentos, arte plumária, objetos de fabricação indígena, tecidos com fibra e palha, armas, instrumentos musicais, equipamentos de trabalho, cenas de caça, pesca, agricultura, produção de farinha em suas diversas etapas e relações índios-missionários, além de resultados etnográficos e arqueológicos de expedições científicas. A organização do acervo é onomástica e por ordem alfabética.

· Coleção Farquhar

O empresário norte-americano Percival Farquhar (1864-1953), depois de reformar vários portos no Rio Grande do Sul e em Belém do Pará, formou no Rio de Janeiro a “ Railway” (1906), ampliou a Estrada de Ferro Sorocabana (1907) e construiu a Madeira-Mamoré (1906-1912). Estabeleceu fazenda de gado em São Paulo (1911) e fábrica de madeira no Paraná e Santa Catarina. Criou a “Itabira Iron Ore Co.” para explorar 7 manganês (1917-19), que depois daria origem à Cia. Vale do Rio Doce. Seus arquivos relacionados a esses empreendimentos foram doados à Biblioteca Nacional por Donald Farquhar em duas etapas: a primeira em 1953, e a segunda em 1965, numa operação intermediada pelo historiador José Honório Rodrigues. São 35.000 documentos, entre os quais se encontram muitas fotos, incluindo imagens de índios do vale do Rio Doce (MG e ES), especialmente os Krenak e vários sub-grupos dos Botocudo. Da coleção fazem parte ainda 15 fotos referentes a trabalhadores que participaram da construção da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, envolvendo índios da região e técnicos nacionais e estrangeiros; 17 fotos de diversos grupos indígenas do norte da Amazônia – Makuxi, Wapixana, Arekuna, Kayto, Parintintim e outros. Os documentos estão organizados por séries temáticas.

3. Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB)

A Seção Iconográfica do Arquivo do IHGB foi formada ao longo dos anos por doação e aquisição de originais e reproduções, algumas delas ampliadas, de fotos, retratos, desenhos, ilustrações e gravuras. São mais de 10.000 peças, contendo, entre outras, fotos de índios Caneka, Kaingang e outros grupos, doadas por Inspetorias do SPI; cópias fotográficas de gravuras e ilustrações de crõnicas, como as de Léry, Staden, Crévaux, Debret, Spix e Martius, com imagens de índios Tupinambá; imagens de tabas, armas, utensílios, enfeites, danças, canoas dos índios Cambeba, Caripuna, Guaikuru, Puri, Anambé, Apiaká; máscaras, enfeites, instrumentos musicais, cestarias, arcos, flechas, interior de malocas, de diferentes grupos indígenas que vivem em território brasileiro. A coleção está parcialmente organizada.

4. Arquivo do Itamaraty

A Coleção Iconográfica do arquivo do Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty) foi formada a partir do acervo do antigo Setor de Fotografias da Mapoteca, enriquecido fundamentalmente com as doações do Barão do Rio Branco e Joaquim Nabuco. Com a transferência de parte da documentação para Brasília, o acervo 8 iconográfico, até então confundido com outras peças, passou a fazer parte da Seção Iconográfica em 1972, cujas atribuições eram guardar, classificar e conservar o material composto majoritariamente por fotografias relacionadas com as atividades diplomáticas no Brasil e no Exterior. Destacam-se as coleções “Retratos” e “Rio Branco” e alguns álbuns fotográficos de Marc Ferrez, Leuzinger e outros. São mais de 18.000 fotos, organizadas tematicamente, cobrindo o período de 1850-1993. Além de desenhos e gravuras, contém fotos do SPI, da Comissão de Limites, dos Serviço Telephotographico da Inspetoria de Fronteiras, das missões salesianas do Rio Negro, dos jesuítas no Paraguai e dos capuchinhos no norte e nordeste. Possui ainda reproduções de fotos da Biblioteca da Universidade Católica da América (Washington D.C.) e de instituições européias. O destaque pode ser dado à foto de uma índia Amahuaca do alto Juruá, às fotos dos primeiros contatos dos Javaé da ilha do Bananal, ao álbum que pertenceu a Nilo Peçanha com fotos de índios da fronteira com a Bolívia, a alguns álbuns da Comissão Mista Brasileiro-Peruana chefiada por Euclides da Cunha, contendo 102 fotos de aldeias dos índios dos rios Purus e Juruá.

5. Museu do Índio

O Museu do Índio, criado em 1953, organizou em 1976 um Setor de Documentação (SEDOC), atualmente denominado Serviço de Arquivos, cujo acervo inicial foi composto com documentos recuperados do incêndio ocorrido em 1967 na sede do SPI em Brasília, que queimou grande parte de seu arquivo central, onde se encontrava documentação relevante para a história indígena, incluindo dados sobre demarcação, escrituras, registros e outros títulos, eliminando desta forma provas legais em questões de terra. A documentação recuperada recebeu um tratamento técnico e foi microfilmada, constituindo um total de 500.000 documentos textuais, abrangendo um período do final do século XIX até 1967. O Arquivo abriga ainda os fundos constituídos pela Comissão Rondon, pelo Conselho Nacional de Proteção aos Índios e pela Fundação Brasil Central, todos eles microfilmados. Quanto ao acervo audiovisual, ele contém fotos, diapositivos, filmes, fitas k-7 e discos oriundos dos fundos citados, num total de 50.270 unidades. No caso das fotos, destacam-se 1.800 negativos de vidro e acetato produzidos pela Comissão Rondon, além de séries 9 documentando o cotidiano dos índios e a ação do SPI em Postos Indígenas das Inspetorias Regionais. São registros de imagens que possibilitam acompanhar a política indigenista brasileira, abrangendo a formação do SPI, sua evolução e os conflitos com as oligarquias regionais, a atuação das missões, os problemas da sociedade brasileira em expansão e suas repercussões sobre as populações indígenas. O acervo está totalmente organizado.

6. Museu Histórico Nacional

O Museu Histórico Nacional, fundado em 1922 com a incorporação dos antigos museus Militar e Naval, possui um arquivo histórico com três valiosas coleções iconográficas, já inventariadas e organizadas. · Coleção Iconográfica Avulsa Reúne, entre outros documentos iconográficos, fotografias de procedências diversas, originais e cópias, adquiridas através de compra em leilões ou doação e agrupadas em função da espécie ou do formato. São mais de 4.000 fotos e 2.000 cartões postais, de autoria de José Ruhland, Christian Fritz, Bazar Alemão e outros, que cobrem o período imperial e republicano. Essas imagens registram os primeiros contatos com diversos grupos indígenas, a catequese, o processo de destribalização e a exploração da força de trabalho indígena. Apresentam cenas do cotidiano das aldeias, imagens de guerra, festas, danças, rituais religiosos, caça, pesca, agricultura, instrumentos de trabalho e objetos da cultura material. Destacam-se uma série de fotos de uma expedição às aldeias do Xingu, com tabas, canoas, armadilhas para capturar aves e peixes e instrumentos musicais; fotos de índios Makuxi no Posto indígena do Surumu e de homens e mulheres Parintitim no rio Madeira; fotos documentando o trabalho indígena no trançado de fibras, dos Karajá, Xokó e outros grupos; cenas de tatuagem, pintura corporal e festa no rio Putumayo.

· Coleção Sofia Jobim Sofia Jobim (1904-1967) participou das lutas pelos direitos da mulher, ao lado de Berta Lutz, com intervenções em vários congressos internacionais e publicação de artigos em jornais. Ocupou a cadeira de Indumentária Histórica, na Escola Nacional de Bels Artes. Organizou um arquivo de mais de 6.600 peças, que doou ao Museu Histórico Nacional, 10 incluindo fotografias e cartões postais sobre indumentária indígena dos grupos andinos, da América Central e da Amazônia. Na série relativa à Etnografia, existem 126 fotos de tamanhos diversos, com imagens de variados grupos étnicos, suas origens e costumes, ornamentos indígenas, cerâmica, armas e teares rudimentares. O material está totalmente organizado em séries e sub-séries temáticas.

· Coleção Miguel Calmon Miguel Calmon (1879-1935), engenheiro e político da Bahia, ministro da Viação e Obras Públicas no governo Afonso Pena (1906-1909), durante o período de construção das linhas telegráficas de Mato Grosso pela equipe de Rondon, ocupou mais tarde, no governo Arthur Bernardes (1922-1926) o cargo de ministro da Agricultura. Os seus arquivos, que incluem mais de 800 fotografias, foram doados por Alice Calmon em 1963. De interesse para a temática indígena, uma coleção de 124 fotos da construção das linhas telegráficas em Mato Grosso (1906), retratando aspectos da cultura regional, abertura de picadas, construção de acampamentos em territórios indígenas e inauguração das estações de Corumbá, Cuiabá e Aquidauana. Contém ainda álbum de 69 fotos da missão em Mato Grosso (1908), com imagens de aldeias e de índios Bororo. Essas fotos retratam também as várias atividades desenvolvidas pelos índios: plantação, colheita, religião, ensino e música. Apresentam ainda um conjunto de fotos das aldeias de Quejaré e Uaiau, acampamento no Bocadiguro, crianças indígenas e caciques Terena e cenas de trabalho e de catequese dos índios Bororo. Está organizada em séries cronológicas.

7. Serviço de Documentação Geral da Marinha – SDGM

O SDGM tem suas origens na Biblioteca da Marinha, criada em 1846, com o objetivo de reunir livros, documentos, mapas, relatórios, fotografias e demais papéis relacionados às atividades do Ministério da Marinha. Possui entre suas coleções um Arquivo Iconográfico, cuja organização foi iniciada recentemente, em 1986. São 325 álbuns, contendo cerca de 50.000 fotos. Em um dos álbuns, podem ser vistas 164 fotos oferecidas pelo general Rondon ao Ministério da Marinha(1927). O Álbum da área de fronteira com a Guiana Francesa apresenta fotos do 1º encontro da Comissão de Inspecção 11 com os Waiãpi da aldeia do rio Camopi; na fronteira com a Guiana Inglesa e Venezuela, fotos de mulheres e crianças Wapitxana do rio Tacutu, malocas Mayongong e Makuxi do rio Surumu. Meninas Taurepang da maloca do Contan, índios Maku do rio Uraricoera, ruínas do Forte São Joaquim, paisagens da Fazenda São Marcos, missionário inglês no rio Tacutu e o registro de festas e atividades de trabalho. Tem o registro da visita de Rondon ao túmulo de Koch-Grunberg, imagens de embarcações de diversas regiões do Brasil. Na Série “Diversos”, aparece a foto de um índio Kayowá, incorporado ao corpo de fuzileiros navais e imagens do cotidiano na Casa do Indio no Rio de Janeiro, com Bororo, Karajá, Urubu e outros. É um conjunto interessante para o estudo da construção naval indígena, as técnicas de calafetagem e navegação e a situação dos índios em faixa de fronteira.

8. Arquivo Histórico do Exército (AHE)

O AHE tem sua origem no Arquivo do Conselho da Índia, criado em pelo Governo Felipino (1604) e reestruturado posteriormente pelo Conselho Ultramarino. Parte do acervo foi trazido ao Brasil por D. João VI, formando o núcleo documental do Real Archivo Militar, fundado em 1808. A Seção de Iconografia foi criada recentemente (1993), por iniciativa do chefe da Seção de História que separou, das caixas de manuscritos, mais de 16.000 fotografias, 3.000 slides, álbuns e gravuras. Organizou-a em quatro séries: ‘Fotos e Gravuras Avulsas’ contendo desde gravuras do ano 1500 até fotos referentes ao golpe militar de 1964; ‘Álbuns’, com fotos originais de Marc Ferrez, entre outros; ‘Slides’ e ‘Fotografias em caixas’. Sobre a temática indígena, reúne imagens do arquivo fotográfico da Comissão de Inspeção de Fronteiras (1929-1931), documentando cenas do trabalho indígena em Mato Grosso, Bolívia e Paraguai; álbuns do arquivo fotográfico das expedições à bacia amazônica com fotos de índios em várias atividades e expressiva documentação iconográfica colecionada pela Comissão de História do Exército Brasileiro relacionada aos conflitos entre índios e portugueses no século XVI, às bandeiras paulistas do século XVII e a Guerra Guaranítica do século XVIII. 12

9. Museu Histórico do Exército (Forte de Copacabana)

O Museu Histórico do Exército (Forte de Copacabana) foi criado em 1987, recebendo os arquivos do Escritório Central da Comissão Rondon, incluindo a documentação produzida pela sua Seção de Photographia e Cinematographia, chefiada pelo tenente Luiz Thomaz Reis, que acompanhou e documentou as principais expedições, juntamente com os fotógrafos Luís Leduc, tenente Pyrineus, tenente Lyra, E. Amarante, Niebler, Roquette Pinto e outros. Registrou a primeira expedição ao rio Juruena (1907), as viagens à Serra do Norte (1908) e ao rio Sepotuba, afluente do Paraguai (1909), as quatro ulteriores expedições para reconhecimento dos cursos de vários afluentes do rio Madeira. Documentou ainda a visita de Rondon a São Paulo (1911), a denominada ‘pacificação’ dos Kaingang (1912) e a expedição Rondon-Roosevelt (1914). Recolheu em seus arquivos fotos dos trabalhos anteriores de Rondon na Comissão de Linhas Telegráficas (1890-92). Contém um volumoso conjunto de álbuns de fotos e foto-gravuras, muitas delas acompanhadas de texto-legenda, documentando as aldeias indígenas, festas, danças, rituais, atividades de catequese, trabalho agrícola, navegação, situação de contato e artefatos indígenas. Possui fotos sobre a pacificação dos Parintintim (1922), dos Waiãpi na fronteira do Amapá e de muitos outros grupos, sobretudo aqueles da região dos rios Madeira, Araguaia e Xingu

10. Mosteiro de São Bento

Os beneditinos belgas fundaram uma missão em Rio Branco, em área que é hoje o atual estado de Roraima, que ficou subordinada ao Mosteiro de São Bento, no Rio de Janeiro, desde 1907. O Arquivo do Mosteiro possui documentação relacionada à catequese dos índios, incluindo uma coleção com mais de 3.000 fotografias, muitas delas tiradas por fotógrafos profissionais e pelos próprios missionários, abrangendo período de 1890 a 1950. A maior parte permanece inédita As fotos registram a catequese dos beneditinos e dos franciscanos na Missão de Santa Helena, fronteira com a Venezuela. Documentam ainda a ação educativa das irmãs beneditinas, o trabalho indígena, o cotidiano das malocas, a ação do SPI e elementos da cultural material e religiosa dos povos de Roraima. Existe uma série 13 de fotos, mostrando índios em procissão ou assistindo missas em aulas do Patronato Agrícola; documentando o trabalho de índios-vaqueiros na Fazenda da Prelazia, serrando madeira, fabricando panelas, construindo malocas e pontes, produzindo nos seringais e balatais do baixo rio Branco, prensando massa de mandioca e fabricando farinha. Reproduzem imagens de malocas Taurepang, Makuxi, Ingarikó e Waptxina, de embarcações indígenas, de lanchas das missões e da residência dos missionários. O acervo está organizado por temas.

11. Museu de Arte Moderna (MAM- RJ) O MAM do Rio de Janeiro foi criado em 1952, com o objetivo de mostrar e incentivar as manifestações de arte contemporânea. Possui uma cinemateca com mais de 3.000 originais de filmes nacionais e estrangeiros. Em 1986 criou o Departamento de Fotografia e no ano seguinte adquiriu a coleção particular de José Carlos Guimarães, composta de cópias de época de fotos do suiço A. Frisch, que em 1865 viajou pelo rio Amazonas em sua canoa estúdio. No mesmo lote foram adquiridas reproduções fotográficas de gravuras de Franz Keller e fotos de seu discípulo Marc Ferrez, que integrou a Expedição Hartt(1875). Incorporou ainda trabalhos contemporâneos, entre outros, de Pedro Lobo, , Milton Guran e do repórter fotográfico José Medeiros, das revistas ‘Manchete’ e ‘Cruzeiro’. São mais de 5.000 fotografias, com imagens de índios Mojo cantando missa no rio Madeira (1870) de autoria de F. Keller; encontro com os Karipuna (1868); índios Purus caçando; interior de maloca Guarani no Paraná; resultados etnográficos e arqueológicos de expedição ao rio Madeira; fotos de Marc Ferrez com imagens de Munduruku, Apiaká, Jaupery, Botocudo e índios da Bahia e Mato Grosso. Fotos de indios que participaram da Guerra do Paraguai, extraídas de álbum que pertenceram ao mal. Deodoro e imagens que documentam a expedição Roncador- Xingu (1949)

12. Casa de Oswaldo Cruz O Instituto Oswaldo Cruz foi fundado em 1899 com o nome de Instituto Soroterápico e rebatizado em 1907 como Instituto de Patologia Experimental de Manguinhos, passando em seguida a denominar-se Instituto Oswaldo Cruz, em homenagem 14 ao seu primeiro diretor. O acervo engloba os arquivos institucionais, 18 arquivos particulares e um arquivo iconográfico, audiovisual e sonoro, produzidos e acumulados pela instituição ao longo de sua história, essenciais para a análise da situação sanitária e das ações das políticas de saúde no Brasil neste século. O Arquivo iconográfico, com cerca de 40.000 itens entre negativos e cópias, foi organizado a partir de 1986 com o apoio da FINEP e do INAMPS, com o objetivo de preservar a memória da saúde pública no Brasil. Incorporou ainda registros fotográficos do período 1934-1974 relativos aos trabalhos realizados no Brasil pela Fundação Rockfeller. Relacionadas à temática indígena, destacam-se fotografias da série ‘Atividades Científicas’, sub-série ‘Expedições’, com imagens da população rural, índios destribalizados e aldeados, suas habitações e condições de vida e trabalho. Fotos da expedição Carlos Chagas pelos rios Amazonas e Solimões, até o Acre, com registro de índios Karitiana do rio Jamary (1912), fotos de índios Guaykuru feitas durante a expedição à zona da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil (1941); índios Kayowá fotografados na viagem científica ao rio Paraná (1918); grupo de índios e índias na expedição pelo vale do São Francisco e Tocantins (1911-1912); fotos de índias armadas com espingarda na região da Madeira-Mamoré, do arquivo particular de Belisário Pena, onde podem ser encontrados também cartões postais com imagem dos índios Toba, da Argentina, de índios pescadores e do cacique Camari. Um sem-número de fotos registrando as culturas indígenas, em diferentes épocas, pode ser encontrado em outras instituições do Rio de Janeiro, como o Museu de Astronomia e Ciências Afins, o Museu da Imagem e do Som, o Arquivo Provincial dos Capuchinhos do Rio de Janeiro e o Arquivo Geral da Cidade. Esse conjunto constitui uma massa expressiva de dados sobre uma parte importante da história do Brasil, em que circulam as representações construídas sobre uma das matrizes formadoras da nacionalidade brasileira. São fotos, muitas delas testemunho único da história, por isso mesmo preciosas para a construção da memória. Ganham uma dimensão de registro documental, como fonte histórica, porque nos informam sobre as tentativas de apreender as particularidades de cada cultura indígena, os diferentes modos de vida, os conflitos, as tensões e as transformações sofridas por elas em contato com as sociedades regionais envolventes. Constituem, por si só, um registro do próprio contato e do processo de interculturalidade, evidenciando as multiplicidades de formas com as quais 15 as sociedades indígenas foram vistas em diferentes momentos. Os pesquisadores têm nesse material elementos que poderão contribuir para dar inteligibilidade à sociedade brasileira, com informações substanciais também sobre os que estavam do outro lado da câmara e sobre a sociedade a qual pertenciam. As preocupações de uma determinada época, o momento histórico, os conceitos sobre a alteridade, a concepção sobre os índios e sobre o contato, a noção de cultura – tudo isto pode ser reconstituído a partir de uma leitura da angulação, do recorte e do olhar que as fotos proporcionam.

NOTAS 1O mapeamento do material aqui apresentado foi realizado preliminarmente no âmbito de um projeto financiado pela FAPESP - Guia de Fontes para a história indígena e do indigenismo em arquivos brasileiros - concebido por Manuela Carneiro da Cunha, coordenado nacionalmente por John Monteiro e, no Rio de Janeiro, pelo autor da presente comunicação, resultando em duas publicações. (MONTEIRO:1994) e (FREIRE:1995-96). O levantamento foi complementado no âmbito de outro projeto – Os aldeamentos indígenas do Rio de Janeiro - que contou com o apoio financeiro do Convênio UERJ/MEC/FNDE (FREIRE: 1997) e concluído no primeiro semestre de 2.000.

Referências Bibliográficas Catálogos, guias, índices, inventários, fichários, listagens e outros instrumentos de pesquisas dos fundos e coleções dos arquivos citados. · AGASSIZ, Luiz e AGASSIZ, Elizabeth C. Viagem ao Brasil 1865-1866. Itatiaia/Edusp. Belo Horizonte, São Paulo. 1975 · FREIRE, José R. Bessa (coord.). Os Índios em Arquivos do Rio de Janeiro. UERJ. Rio de Janeiro. Volume I (1995), Volume II (1996) · FREIRE, José R. Bessa e MALHEIROS, Márcia. Aldeamentos Indígenas do Rio de janeiro. UERJ. Rio de Janeiro. 1997 · MONTEIRO, John Manuel (org). Guia de Fontes para a História Indígena e do Indigenismo em Arquivos Brasileiros. Acervos das Capitais. NHII/USP/FAPESP. São Paulo. 1994. · RONDINELLI, Rosely Curi. Inventário Analítico do arquivo permanente do Museu do Índio: documentos textuais 1950-1994. Museu do Índio. Rio de Janeiro. 1997 · RONDINELLI, Rosely Curi. Inventário analítico do arquivo do SPI. Museu 16

do Índio – Fundação Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro. 1995.