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Esporte Interativo: Em Busca da Maior Comunidade Brasileira de Apaixonados por Esporte

Autoria: Paula Castro Pires de Souza Chimenti, Rafael Salomão Moraes da Silva, Marco Aurelio de Souza Rodrigues, Luiz Felipe Hupsel Vaz

Resumo: O presente caso de ensino aborda a situação atual do Esporte Interativo, um grupo de mídia esportivo com cerca de cinco anos de idade, composto por uma TV aberta, , distribuída principalmente pela Banda C (parabólica), um portal de Internet e conteúdo para celulares. O caso é real e discute o planejamento estratégico do Esporte Interativo frente a inovações tecnológicas disruptivas que têm o potencial de reconfigurar a indústria de TV Aberta no Brasil, incluindo transformações relevantes no modelo de negócios e no comportamento do telespectador. Ele é pensado na perspectiva de Edgar Diniz, presidente da empresa, que tem como missão definir a melhor forma de posicionar sua empresa frente às mudanças geradas por novas tecnologias e novas mídias, como internet e celular. O caso foi elaborado a partir de entrevistas com os diretores da empresa, além de fontes secundárias como pesquisas sobre o mercado brasileiro de mídias e artigos sobre mídias, novas mídias e estratégia. São abordados os temas de novas tecnologias, bem como ferramentas e novos modelos estratégicos para o planejamento de uma empresa. Por tratar de temas como reconfiguração e convergência de indústrias, planejamento com cenários e definição do negócio, o presente caso de ensino está voltado principalmente para utilização em cursos de estratégia.

1. Introdução O pontapé inicial decretava o começo da pelada na praia de Ipanema. Embora estivesse acompanhando sua família num passeio pela orla carioca, a paixão pelo futebol por vezes deslocava o olhar do presidente do Esporte Interativo de suas crianças para a peleja disputada a poucos metros de distância. Enquanto a bola rolava, Edgar Diniz se via imerso nos desafios que sua startup brasileira dedicada aos aficionados pelo esporte ainda teria que driblar. Debaixo de um calor escaldante, a visão do empreendedor era clara: sua empresa seria a maior comunidade de amantes do esporte do Brasil. Ainda que ambiciosa, esta meta parecia amparada nos notáveis acontecimentos dos últimos anos. De uma empresa dedicada à aquisição dos direitos de transmissão de campeonatos estrangeiros e à exibição dos mesmos em horários comprados junto às redes de TV tradicionais, o Esporte Interativo evoluíra para um grupo de mídia que distribuía entretenimento através de celulares, da Internet e de uma Rede de TV com transmissão por antena parabólica, atingindo mais de 20 milhões de domicílios. Em cerca de doze meses, o Esporte Interativo, abandonou uma rotina com apenas duas transmissões por semana para um cotidiano baseado na produção de sessenta horas de programação semanal para a TV, bem como de conteúdo para seu portal na Internet e para celulares. Onde antes trabalhavam 20 amantes do esporte em 100m2, hoje quase 200 colaboradores ocupam um prédio de quatro andares: a sede do Esporte Interativo. Em meio a tantas mudanças, um fator se manteve constante em toda esta trajetória: interatividade. Desde os tempos em que a marca Esporte Interativo respondia apenas por um pedaço das grades de outras emissoras, a empresa investia no desenvolvimento de formas criativas e simples de promover a interação entre seus espectadores e seu conteúdo, iniciativa materializada no intenso uso de promoções baseadas em mensagens de texto. Esta proximidade com seus espectadores cultivou uma base fidelizada que atraiu gradativamente anunciantes ávidos por mídias capazes de aferir o resultado de suas campanhas; diferencial que apenas a interatividade do Esporte Interativo oferecia no ramo das emissoras de TV. A pelada prosseguia sem gols, enquanto Diniz refletia sobre os desafios que o rápido crescimento da empresa trazia para a organização. Os custos da empresa sofreram um aumento considerável, e a chegada repentina de um grande contingente de novos

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colaboradores dificultava a disseminação da cultura empreendedora dos fundadores ao restante da organização. Além disso, o próprio sucesso do Esporte Interativo ajudou a inflacionar o custo de uma de suas principais matérias-primas: os campeonatos de futebol estrangeiros. A visibilidade alcançada com programas antes relegados na TV aberta brasileira – tais como a Liga dos Campeões da UEFA e o Campeonato Inglês de Futebol – os tornou cobiçados por TVs abertas concorrentes, fazendo com que a manutenção destes na programação ficasse cada vez mais onerosa e difícil. A diversificação da oferta também trazia grandes dificuldades relativas à manutenção da coerência e da integridade da comunicação da empresa junto aos seus stakeholders. Finalmente, o novo modelo do Esporte Interativo com interatividade, novos conteúdos e distribuição via parabólica, que tanto atraía espectadores e anunciantes comprometia a entrada do Esporte Interativo no plano de mídia de agências de publicidade, não habituadas com a estas novidades.. A bola rolava, e com ela os pensamentos de Diniz. Se a necessidade de crescer era uma unanimidade, a maneira de fazê-lo ainda não parecia clara. A interatividade via SMS e o lançamento do Portal Esporte Interativo tinham estimulado o surgimento de uma comunidade com cerca de 700 mil aficionados cadastrados, com enorme capacidade de crescimento. Num panorama de grande concorrência por conteúdo e por anunciantes, os espectadores fiéis do Esporte Interativo poderiam constituir comunidades de aficionados capazes de se transformarem em fontes de receitas estratégicas para o grupo de mídia. Ao presidente, restavam dúvidas: como crescer de forma sustentável, diversificando a oferta sem comprometer a integridade e coerência da comunicação? Como vencer a resistência das agências de publicidade? De que maneira expandir e rentabilizar a comunidade de aficionados por esporte? Qual é a melhor forma de integrar mídias para estar sempre próximo de anunciantes e espectadores? No jogo, havia um pênalti a ser cobrado, e todos na praia olhavam com expectativa para ver o que o futuro guardava: uma bola fora ou um gol.

2. TV Aberta no Brasil A TV Aberta, que é disponibilizada gratuitamente para o telespectador, é hoje a grande formadora de opinião pública no Brasil, levando informação e entretenimento a 98% dos domicílios. Além disso, um brasileiro gasta, em média, mais de cinco horas na frente da televisão diariamente. Existem três formas pelas quais um telespectador por ter acesso a um canal de TV Aberta: • Sinal VHF – Sinais de emissoras que podem ser acessadas por uma antena tradicional. É onde se encontram os maiores players do mercado. Tem sua audiência auferida pelos principais institutos de pesquisa. Atingem 30 milhões de domicílios • Sinal UHF – Sinais de emissoras menores, em geral segmentadas e/ou regionais. Atingem uma parte pequena da cobertura VHF. • Banda C – São emissoras que possuem sinal acessado por antenas parabólicas. Estão presentes em 20 milhões de domicílios e também não possuem qualquer tipo de medição de audiência. Por ser a principal mídia de comunicação do país, o setor de Televisão Aberta apresenta uma forte atuação do governo, através de agências reguladoras e de uma forte legislação, principalmente no que tange os sinais VHF e UHF. Desde o início, para esses tipos de sinal, foi escolhido o modelo de concessões públicas estabelecendo um limite de dez estações de TV nacionais, não podendo exceder o limite de duas por Estado. O mercado de parabólicas no Brasil começa quase que por acaso. Por conta do sinal VHF não conseguir atingir a totalidade do território nacional, descobriu-se que alinhando uma antena parabólica ao satélite de retransmissão de sinal utilizado pelas emissoras VHF e UHF,

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se conseguiria uma melhor imagem. Por outro lado, se perdia a transmissão regional, visto que pelo sinal da parabólica era transmitida a programação nacional, em geral referente às cidades de São Paulo e . Além disso, abriu-se a oportunidade para a entrada de novos canais exclusivos da parabólica, já que bastava o aluguel de um transponder do mesmo satélite para ter seu sinal transmitido para todo o Brasil. Assim, devido a uma solução técnica foi criado um novo mercado, onde a entrada não passaria pela difícil concessão governamental.

2.1. Modelo de Negócios O modelo de negócio original da televisão consiste em intercalar conteúdos de informação e entretenimento com mensagens publicitárias patrocinadas por um anunciante interessado na atenção que determinada programação desperta num público-alvo, ou audiência. Uma das principais características da indústria de entretenimento é a concentração dos players (Reis, 2004). Com base nos dados brasileiros de concentração de investimentos de mídia na televisão aberta e comparativos de redes comerciais feito por Lima (2003 apud Reis, 2004), pode-se dizer as redes de televisão aberta operam em um modelo semelhante ao oligopólio. A Televisão Aberta Brasileira é um exemplo de concentração dentro da indústria de entretenimento internacional como percebido na Figura 1, garantindo a maior parte do investimento publicitário (Mattos, 2007).

Investimento em Mídia 2004-2005

100% Cinema 80% Internet TV assinatura 60% Guias e Listas Rádio 40% Mídia Exterior Revista 20% Jornal TV aberta 0% 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Figura 1 – Investimento em Mídia no Brasil (Fonte: Pesquisa Intermeios, 2006)

O tamanho da receita publicitária de uma rede irá depender de sua audiência, já que o objetivo dos anunciantes é direcionar sua mensagem para o público com maior potencial de compra dos bens ou serviços que estão sendo oferecidos. Por essa razão, a medição de audiência se torna fundamental para a sobrevivência nesse setor. Uma rede de televisão é composta por um grupo de estações que leva a mesma grade de programação para os telespectadores, alcançando audiências locais, regionais ou nacionais. A Figura 2 ilustra os principais atores relacionados à indústria de televisão aberta.

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Figura 2 – Relacionamento entre Atores na Indústria de Televisão Aberta (Fonte: Reis, Proença & Proença Jr., 2003)

Na televisão aberta é crucial atingir a maior audiência possível através da exibição de um programa a fim de atrair novos anunciantes, logo é importante ter seu sinal disponível no maior número de casas possíveis. Visto que a legislação impõe um limite no número de licenças próprias, foi criado o sistema de rede afiliadas, que são concessões regionais que se afiliam às grandes redes para a transmissão de uma programação. É uma relação simbiótica, onde as redes conseguem aumentar o alcance do seu sinal, e as estações locais obtêm uma programação, já que não possuem capacidade produtiva para preencher toda a programação ou saúde financeira para produzir seu próprio conteúdo (Mattos, 2007). As redes nacionais separam espaço publicitário para que suas afiliadas busquem anúncios regionais. Assim, empresas de uma determinada região conseguem ter sua propaganda direcionada para a sua região de atuação e entre programas de grande audiência.

2.2. Cadeia de Valor No Brasil, as redes de televisão costumam a adotar uma cadeia mais verticalizada do que em outros países como os Estados Unidors. A maioria das redes de TV aberta brasileiras possui estúdios de gravação próprios, fazendo contratos temporários com toda mão de obra necessária para a realização da obra (parte técnica e artística). Entretanto, como os principais autores, diretores, jornalistas, apresentadores e atores são responsáveis pela geração de audiência e conseqüentemente atraem os investimentos dos anunciantes, estes geralmente possuem contratos fixos com as redes de televisão, caracterizando o modelo de pagamento de salários mensais. O Projeto Sistema Brasileiro de Televisão Digital da FUNTTEL mapeou a cadeia de valor do setor brasileiro de televisão aberta, com o objetivo de identificar a participação e a inter-relação dos diferentes atores no mercado. Segundo o relatório, a cadeia de valor da televisão aberta pode ser divida em quatro etapas seqüenciais, visualizadas na Figura 3.

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Produção de Conteúdo Programação Distribuição/Entrega Consumo

Criação Entrega Produção Distribuição Organização Organização Processamento Processamento Armazenamento Armazenamento

Produtora de Programadora Prestadora Geradora Usuários Conteúdo Telecom Repetidora Geradora Local Retransmis- sora

Figura 3 – Cadeia de Valor e Atores da Indústria de Televisão Aberta (Fonte: Relatório CPqD, 2005)

2.3. Novas Mídias e Potencial de Reconfiguração

Nos últimos anos, a quantidade de mídias (meios de comunicação) disponíveis tanto para os anunciantes e profissionais de propaganda quanto para os consumidores aumentou consideravelmente. Produtos e serviços anunciados durante décadas nas mídias tradicionais, como jornais e televisão, começaram também a ser veiculados na internet no final da década de noventa. Eventualmente, com a convergência e disseminação da banda larga, tecnologia móvel, aparelhos portáteis e conteúdo gerado pelo usuário, um novo mundo surgiu obrigando os profissionais de marketing a experimentos como podcasts (arquivos de áudio que podem ser baixados e ouvidos pela internet, celulares ou tocadores de áudio), vídeos online e blogs (sites de conteúdo gerado pelos próprios usuários. A partir da implantação de um sistema de televisão digital no Brasil, a convergência se torna ainda maior, visto que além do aumento da definição de imagem e qualidade de som, há a possibilidade de transmissão de TV em dispositivos móveis como celulares, e também a interatividade através do televisor, uma interface já conhecida do grande público. Neste sentido, tanto a internet quanto celulares se tornam tecnologias chaves no futuro da indústria da TV, já que parece existir uma tendência de convergência de tecnologias e mídias. O mercado publicitário parece já ter olhado para essas novas mídias, e a receita em propaganda na internet vem aumentando a cada ano. O mesmo acontece no mercado mobile, com novas formas de propaganda via SMS (mensagem de texto), MMS (mensagem multimídia), WAP (rede de internet móvel) e Bluetooth. Em 2007, o faturamento no Brasil foi de apenas US$106 milhões, mas estimativas dão conta de que o valor possa chegar a US$ 5 bilhões em 2012, graças à expansão do uso da internet em dispositivos móveis. No mundo, o mercado publicitário móvel movimentou US$1,8 bilhão em 2007 e a expectativa é que alcance US$24 bilhões em 2013, segundo o Teleco e a ABI Research.

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3. Esporte Interativo O Esporte Interativo nasce como TopSports em 1999, em um momento de profissionalização do esporte no Brasil. A Lei Pelé acabara de entrar em vigor, e a exigência que clubes se transformassem em empresas era uma oportunidade para que houvesse uma nova leva de investidores em clubes brasileiros. Assim, a empresa criada por Edgar Diniz, Carlos H. Moreira Jr. e Leonardo Lenz Cesar se propunha a ser o elo entre os investidores e os clubes brasileiros. Munidos de um mandato para captar investidores para o Esporte Clube Vitória, eles propuseram ao clube duas linhas de trabalho. A primeira era simplesmente captar recursos, e a segunda era auxiliar na elaboração de uma estratégia de marketing mais eficiente para o clube. Como conseqüência do trabalho, contratos de patrocínio foram renegociados, novas ações de marketing foram realizadas e se conseguiu um investidor para o clube, um fundo argentino que comprou 51% do Vitória. A experiência com o Vitória mostrou a dura realidade de um clube de futebol. Durante todo o primeiro semestre, os clubes não possuíam grandes receitas já que estavam comprometidos em competições estaduais que não geravam receitas de propaganda e até mesmo de bilheteria. Enquanto no segundo semestre, com a disputa do campeonato brasileiro, as receitas publicitárias e da venda de direitos de transmissão eram imensas. Essa era a realidade de maior parte dos clubes médio e pequenos, principalmente aqueles do Nordeste. Dentro deste cenário, a equipe da TopSports teve a idéia de criar um novo torneio, que reunisse os clubes do nordeste em uma disputa no primeiro semestre, deixando os campeonatos estaduais em segundo plano. Era criado o Campeonato do Nordeste, um torneio que tinha maior apelo de público e também de patrocínio, já que jogavam entre si os grandes clubes do Nordeste do Brasil. Cabia a TopSports a busca e a negociação de patrocínios e direitos de transmissão. A fórmula de disputa foi um sucesso e em 2002, esse modelo se espalhou por todo o Brasil com a criação do Rio-São Paulo e o Sul-Minas. No entanto devido à mudança no sistema de disputa do Campeonato Brasileiro para turno e returno, com o intuito de acompanhar o calendário europeu, esses campeonatos tiveram que ser extintos. Não havia mais datas disponíveis para a disputa desses campeonatos, e os velhos estaduais foram trazidos de volta a vida. A TopSports perdia então uma grande fonte de receita, e a capacidade de inovação de sua equipe foi colocada a prova. A luz no fim do túnel veio da Rede Globo que contratou a empresa para desenvolver uma estratégia de marketing durante os jogos no novo Campeonato Brasileiro. Iniciava-se aí um relacionamento profundo entre a maior emissora do país e a pequena empresa de marketing esportivo. Apesar da situação confortável aparente com o relacionamento com a Rede Globo, a TopSports começava a se sufocar em tal relação. As receitas da empresa estavam quase todas comprometidas com um grande cliente, e isso deixava a TopSports em uma situação complicada, caso a Globo decidisse deixá-los, a empresa poderia morrer. Assim é tomada uma grande decisão: terminar a parceria com a Globo e perseguir a própria transmissão esportiva. Arrecadando mais de um milhão de dólares com investidores angels, a renomeada Esporte Interativo, compra os direitos de transmissão em TV Aberta do Campeonato Inglês de Futebol, da Liga dos Campeões da Europa e da NBA. Com um acordo com a Rede TV!, o Esporte Interativo realiza transmissões semanais desses três eventos esportivos. Além de trazer um conteúdo que estava apenas na Tv por assinatura, o Esporte Interativo lança mais uma inovação: a interatividade. Durante os jogos, os espectadores eram convidados a interagir com a transmissão através da internet e do celular, via SMS. Em troca da participação, o espectador concorria a prêmios como viagens para assistir os jogos na Europa, videogames, camisas dos times e outros produtos relacionados à esporte. O SMS

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passou a ser uma fonte de receita da empresa e uma forma de atrair anunciantes, visto que era possível mostrar resultado. Enquanto no IBOPE é medida a audiência, isto é, a quantidade de aparelhos ligados naquele determinado canal, o Esporte Interativo entregava resultado, ou seja, quantas pessoas realmente estão assistindo aquela programação, era uma informação nova e valiosa para os anunicantes. O acordo com a Rede TV! durou até 2004, quando a programação do Esporte Interativo se mudou para a Bandeirantes. O sucesso das transmissões atraiu competidores na busca pelos direitos, e para piorar os detentores dos direitos (UEFA, Ligas Nacionais) estavam mais preocupados com quem adquiria seus conteúdos, eles queriam a garantia que o conteúdo seria exibido e por isso davam preferência à redes de televisão. A realidade é que esse modelo havia funcionado por uma miopia de mercado e que a partir do momento que as redes de tv aberta olhassem para esse conteúdo, o Esporte Interativo teria sua existência comprometida, era preciso dar mais um passo, era preciso ter um canal próprio em tv aberta. Olhando para a estrutura no setor de TV aberta no Brasil, era praticamente impossível conseguir uma concessão pública para um sinal de VHF, ainda mais porque o mercado estava configurado em um oligopólio e era bastante restrito. Então se viravam para outro mercado: a Banda C. A Banda C era a que oferecia o melhor custo benefício, atingiria um grande número de casas e o custo era apenas o aluguel de um transponder no satélite da empresa Star One. Assim que surgiu uma vaga no line up, o Esporte Interativo adquiriu esse espaço e se preparou para fazer sua própria progamação. Como a Cadeia de Valor da indústria é toda verticalizada, cabia a empresa criar seu próprio conteúdo, para isso, inicialmente foi contratada uma produtora onde foram produzidos os primeiros programas da nova TV. Após três meses, o Esporte Interativo começou a criar sua própria programação em seus próprios estúdios. O modelo de negócios da empresa seguia a linha de todas as outras redes de televisão, oferecendo conteúdo sem ônus para o espectador e obtendo receitas de anunciantes, além é das receitas com interatividade advindas da participação do público. Em relação aos anunciantes havia uma grande barreira. O mercado se comportava da seguinte maneira: propagandas eram feitas a partir da audiência, contudo a Banda C não possui medição da audiência, logo como atrair anunciantes? A resposta estava no marketing de resultado já estabelecido anteriormente. Com os resultados da interatividade era possível mostrar aos potenciais anunciantes que havia pessoas dando atenção a programação, o que poderia significar que a propaganda poderia ser realmente vista por aquelas pessoas. Com esse modelo, o Esporte Interativo conseguia sair do modelo agência-instituto de pesquisa, e entrava em contato direto com os potenciais anunciantes da programação. No entanto a visão da empresa não se restringe apenas a ser um canal de TV aberta, a empresa se define como um grupo de mídia multiplataforma e tem o objetivo de ser a maior conexão entre aficionados por esporte do Brasil. Para isso, além do conteúdo de TV, estão sendo produzidos e cada vez mais trabalhados conteúdos para o portal de internet e também para os celulares, que são vistos como um grande inclusor digital no Brasil. Assim, a empresa buscará entregar para seus anunciantes não apenas o contato com o telespectador, mas também com o internauta e porque não os que fazem do celular seu portal de conexão com o mundo.

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Notas de Ensino O presente caso é real e foram utilizadas fontes primárias e secundárias para a sua elaboração. Como fonte primária, foram feitas entrevistas com os três fundadores da empresa e com todos os diretores, num total de nove entrevistas, realizadas entre janeiro e fevereiro de 2009. Os dados secundários podem ser encontrados na bibliografia.

1. Objetivos de Ensino e Aprendizagem O caso Esporte Interativo foi criado para ser utilizado em cursos de programa de pós- graduação focados em estratégia e novas tecnologias. A idéia é dar aos alunos a oportunidade de pensar de forma ampla e elaborar como as novas tecnologias impactam um setor e ainda refletir sobre como o planejamento estratégico pode ajudar a lidar com esses impactos. Além do foco principal, o caso pode ser utilizado como exemplo de novos negócios que se aproveitam da miopia de empresas já estabelecidas, criando uma nova oferta para seus consumidores. Ainda é possível utilizar o caso para mostrar escolhas estratégicas criativas em um ambiente altamente regulamentado e de difícil entrada como é o caso do setor de TV Aberta no Brasil.

2. Foco do Caso e Relevância do Tópico Davis & Meyer (1998) apontam para uma sociedade em transformação. Uma transformação tão fundamental que afeta as três dimensões básicas do universo: tempo, espaço e matéria. Para os autores, novas forças estão transformando estes conceitos tradicionais. A primeira força é a Velocidade, que transforma e encolhe o tempo. Esta velocidade é causada pela computação e comunicação quase instantânea e faz com que a nossa noção de tempo, e o que consideramos rápido ou lento, seja totalmente alterada. Para exemplificar, pode-se pensar nas cartas que eram enviadas às empresas há 10 anos e podiam levar um mês até serem respondidas. Hoje, enviamos um email para uma empresa e esperamos um retorno imediato ou no máximo, em 24h. A Conexão atua sobre o espaço, causando seu encolhimento e a queda das barreiras entre países. Com todas as pessoas online, estamos cada vez mais próximos, cada vez mais em contato. Hoje, um adolescente conectado e com uma webcam já é considerado como um participante de uma festa no Japão. Pode parecer estranho, ou pode ser uma tendência para o futuro. A terceira e última força é a intangibilidade. A importância da massa tangível diminui com a valorização de novos atributos intangíveis, como a marca, a informação e os serviços. Os mundos, comunidades e redes de relacionamento virtuais são grandes exemplos desta “virtualização” da realidade. Estes conceitos encontram eco em outros autores. Toffler (1990) destaca a divisão de mundo entre os rápidos e os lentos, mostrando que para estar dentro da economia rápida é necessária muita agilidade. Muitos serão desligados, pois há um hiato informacional e eletrônico entre os lentos e os rápidos. Do lado rápido, há investimento constante em infra- estrutura para a hiper-velocidade e num sistema neural eletrônico para a economia. Diante dessas tendências, os desafios estratégicos para as empresas são enormes e um ferramental estratégico robusto é indispensável para auxiliar os executivos na elaboração de seus planejamentos.

3. Questões para Discussão • Qual a oferta que o Esporte Interativo entrega a seus clientes e como ela se diferencia dos seus concorrentes? • Quais as Tendências e Incertezas desse setor para os próximos cinco anos? • A partir das Tendências e Incertezas listadas, crie cenários e dê recomendações para cada um dos cenários criados.

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4. Análise do Caso e Dinâmica de Discussão 4.1. Qual a oferta que o Esporte Interativo entrega a seus clientes e como ela se diferencia dos seus concorrentes? O primeiro passo para o planejamento estratégico é a definição do negócio da empresa. É uma decisão criativa que afeta fundamentalmente a saúde do negócio e influi na escolha das estratégias que serão adotadas (Abell, 1980). Quando tratamos de indústrias convergentes, nas quais as fronteiras estão cada vez mais fluidas e menos definidas, tal exercício passa a ser fundamental. Neste sentido, o modelo desenvolvido por Abell & Hammond (1979) e apresentado na Erro! Fonte de referência não encontrada. pode ser extremamente útil, ao buscar uma definição do negócio de acordo com três dimensões: • Grupos de Clientes que estão sendo atendidos (QUEM) • Funcionalidades e necessidades atendidas (QUAIS) • Tecnologias ou modo pelo qual a oferta é entregue (COMO)

Figura 4 – Gráfico Tri-Dimensional de Definição de Negócio (Fonte: Abell & Hammond, 1979)

Ao mapear estrategicamente um negócio segundo este modelo, podemos identificar oportunidades e concorrentes que seriam invisíveis dentro das fronteiras pré-estabelecidas de uma indústria. Diversos autores (Day & Schoemaker, 2006) (Christensen, 1997) (Markides, 1997) falam da importância de ampliar a visão periférica, pois muitas vezes as inovações que vão transformar uma indústria ocorrem fora das suas fronteiras. Exemplos não faltam, como o fim da indústria das máquinas de escrever, que foram substituídas pelos computadores pessoais da IBM e não por uma concorrente da Remington ou da Olivetti. Recentemente, a indústria fonográfica viu uma empresa de fora, a Apple, dominar o negócio da música virtual, conquistando 88% do mercado online em 2006 (Wells & Raabe, 2007). Isto posto, a observação do negócio do Esporte Interativo sob a ótica do modelo de Abell & Hammond (1979) sugere pontos relevantes para a análise estratégica da empresa, especialmente quando confrontada contra às concorrentes. Ao comparar, por exemplo, ofertas, tecnologias e públicos do Esporte Interativo e da Rede Globo, surgem mais semelhanças do que diferenças à primeira vista. Entretanto, um olhar mais atento permite a identificação de dois fatores primordiais para o posicionamento e para a diferenciação do Esporte Interativo: a oferta de aferição objetiva de resultados e a entrega da atenção do consumidor. Embora ambos estejam relacionados com o fator interatividade que tanto Globo como Esporte Interativo conferem aos seus stakeholders, a maneira como estas duas empresas encaram o momento de interação entre conteúdo e espectador é radicalmente diferente. Enquanto na Rede Globo a interatividade tende a assumir apenas seu papel de oferta de entretenimento para os espectadores, este mesmo fator é abraçado como métrica de desempenho de campanhas veiculadas no Esporte Interativo. Recentemente, a Sky, empresa no ramo adjacente de transmissão de canais de TV fechados via satélite, elaborou uma campanha cujo resultado era medido através do número de vendas conquistadas por meio de

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um número de telefone específico presente apenas nos filmes veiculados nos comerciais do Esporte Interativo. A cada venda efetuada, o Esporte Interativo recebeu um comissionamento pré-acordado. O exemplo, ainda que bem ilustrativo, não é pontual; anunciantes como TIM, e Gilette já executaram campanhas com monitoramento baseado em interatividade onde a receita do Esporte Interativo esta atrelada à performance da comunicação e da mídia. Além do compromisso com resultados, a percepção do negócio do Esporte Interativo segundo o modelo de Abell & Hammond (1979) também sugere que, ao contrário das demais concorrentes onde a audiência é a métrica de desempenho e valor, na start-up em estudo o objetivo é obter a atenção de quem assiste sua programação. Toda a programação do Esporte Interativo é criada baseada em atividades dependentes da interatividade entre espectador e conteúdo, seja por telefone celular, por telefone convencional ou pelo portal hospedado na Internet. Ao incentivar e obter esta participação ativa de quem a está assistindo, o Esporte Interativo pode garantir com relativa segurança o engajamento, o vínculo emocional e a assimilação efetiva das mensagens veiculadas por parte do seu público. Portanto, é possível dizer que ao trazer resultado e atenção – métricas típicas de mídias eletrônicas digitais interativas – para uma emissora de TV aberta – símbolo maior de mídia eletrônicas de massa analógica – o Esporte Interativo esteja muito próximo de entregar para anunciantes e agências de publicidade uma inovação capaz de posicionar a empresa de forma singular em sua indústria. Essa visão vai de encontro ao que defende Markides (1997), que mostra que empresas podem superar líderes de mercado tradicionais com a inovação estratégica, assim, ao invés de jogar melhor, essas empresas inovadoras mudam completamente as regras do jogo. O caminho é identificar gaps não atendidos pelas empresas atuais e preenchê-los. Neste sentido, o tipo de inovação trazida pelo Esporte Interativo pode ser considerado disruptivo (Christensen, Johnson, & Rigby, 2002), visto que ao entregar resultado a seus clientes, a empresa está perto de mudar as normas da indústria, acostumada a trabalhar com a medição de audiência. Agora, anunciantes e agências de publicidade podem ter dados sobre a atenção de telespectadores e não apenas dados sobre o número de aparelhos ligados, o que lhes dá uma melhor informação sobre quem está realmente dando atenção à programação.

4.2. Quais as Tendências e Incertezas desse setor para os próximos cinco anos? Lidar com a complexidade e com inovações requer, ainda, outras transformações na forma como as empresas elaboram suas estratégicas. Schoemaker (1995) apresenta o planejamento de cenários como um método para imaginar futuros possíveis e simplificar a avalanche de dados sobre uma empresa em um número fixo de estados possíveis. A idéia não é cobrir todas as possibilidades, mas circunscrevê-las, eliminando os dois erros mais comuns no processo decisório: superestimar ou subestimar mudanças. O método desenvolvido pelo autor compreende a identificação das tendências e incertezas relativas a um negócio e a combinação destas em um número limitado de opções de futuro possíveis. Este processo, além de ampliar a visão de futuro dos empresários e evitar as “adivinhações” quanto ao futuro, permite a identificação das competências necessárias para uma empresa competir no futuro. O objetivo é desenvolver as competências que serão efetivas para múltiplos segmentos em diferentes cenários (Schoemaker, 1995) Ao resgatar a importância de desenvolver competências críticas, Schoemaker (1995) retoma conceitos de Prahalad & Hamel (1990), que destacam a importância de manter sempre em vista quais as competências básicas da organização ao inovar estrategicamente. Com a competição cada vez mais acirrada num cenário globalizado, a tarefa crítica da gerência é criar uma organização capaz de introduzir produtos com funcionalidades irresistíveis ou que os clientes necessitem sem jamais terem sabido disto. Para os autores, o sucesso está em adquirir as competências necessárias para tal, já que a competitividade baseada simplesmente

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em preço e desempenho, anterior à globalização, não asseguram vantagem competitiva. Para ter vantagem real é necessário consolidar tecnologias e habilidades de produção em competências que permitam aos negócios se adaptar rapidamente às oportunidades. Na mesma linha de argumentação, Garvin & Levesque (2005) incorporam um elemento importante ao planejamento de cenários: os sinais de alerta antecipados (early warning signals). Para os autores, faz parte do processo de elaboração de cenários a definição de alguns indicadores de que o futuro está se encaminhando para um determinado cenário, melhorando a visão estratégica da empresa sobre o que acontece à sua volta e tornando-a mais ágil para responder aos futuros possíveis. Outra aplicação estratégica do planejamento de cenários é o gerenciamento de opções reais, descrito por Day, Schoemaker & Gunther (2006). No âmbito financeiro, opções criam a oportunidade, mas não a obrigação, de realizar um investimento futuro. Da mesma forma, as opções reais são aplicadas a investimentos em tecnologias emergentes, criando a possibilidade estratégica de utilizar uma determinada tecnologia no futuro, sem, entretanto, representar um comprometimento pleno no momento atual. Mantendo a analogia com o mercado financeiro, o “preço” da opção é o custo de desenvolvimento ou aquisição da nova tecnologia, “exercer” a opção significa decidir comercializar a nova tecnologia, e o “preço de exercício” é o custo envolvido no lançamento e comercialização da nova tecnologia. É importante ressaltar que, usando opções reais, a empresa mantém sua flexibilidade estratégica e a opção de expandir, modificar ou eliminar projetos. A identificação das possíveis tecnologias-chave do futuro e a criação de competências internas para utilizá-las caso se estabeleçam está intimamente ligada ao planejamento de cenários e pode representar o sucesso de uma empresa no futuro. Assim, com o objetivo de melhor entender a configuração da indústria em estudo e as possibilidades futuras para o Esporte Interativo, serão descritas a seguir as tendências que podem gerar forte impacto nas empresas que atuam no setor. Também serão apresentadas algumas incertezas que podem auxiliar a compreender os grandes desafios que a empresa pode enfrentar nos próximos anos. Em seguida, utilizando o modelo de Garvin & Levesque (2005) as tendências e incertezas serão combinadas na elaboração de cenários futuros. • Tendências o Convergência – fenômeno emergente do mundo moderno, a convergência está presente em diversos campos. Nos âmbito dos negócios, é cada vez mais comum empresas se associarem ou entrarem em processos de aquisições para formarem grandes grupos que atendem diversos segmentos, o que pode ser visto nas indústrias de cinema, games, música e também na televisão, entre outras. Também é possível falar em aparelhos convergentes, uma vez que as tecnologias vêm se aglomerando nas últimas décadas, criando dispositivos capazes de desempenhar inúmeras funções, como o iPhone, por exemplo. o Maior oferta de conteúdo e capacidade de transmissão de dados – o acesso crescente à rede via banda larga se justifica pelas inúmeras revoluções tecnológicas na indústria de telecomunicações, principalmente na rede wireless – 3G, Wifi, WiMax e 4G são algumas das opções. É possível transmitir uma quantidade maior de dados e em maior velocidade do que era feito cinco anos atrás. Considerando a tendência de que o acesso à internet venha a tornar-se uma commodity dentro de poucos anos, haverá um número crescente de pessoas conectadas no mundo o que pode representar uma excelente oportunidade para ampliação do alcance de qualquer conteúdo. o Mobilidade – hoje, já é possível acessar conteúdos digitais nos mais diversos dispositivos e a tendência é que haja cada vez mais opções de aparelhos móveis que possam se conectar com a rede. Isso significa que os indivíduos poderão se

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conectar à rede a qualquer hora e em qualquer lugar, tendo o mundo muitas vezes guardado no bolso. Tanto para as emissoras de TV quanto para anunciantes, estar disponível nestes devices é ter a possibilidade de entrar em contato com dezenas de milhões de brasileiros no momento em que eles desejam, ou seja, quando se encontram mais dispostos a receber suas informações o Customização e fortalecimento do consumidor – as novas tecnologias têm permitido que os indivíduos tenham a possibilidade de participar mais das decisões sobre que informações irão receber. Newsletters enviadas por e-mail, por exemplo, já trazem uma seleção de informações selecionadas pelo usuário, de acordo com seu ponto de vista. Em algumas rádios da internet, é possível escolher o que se ouve, quando se ouve e onde se ouve. O mesmo acontece com alguns canais de televisão via rede, em que o usuário cria sua própria programação para acessá-la na situação que lhe for mais conveniente. Se, antes, os produtores de conteúdo decidiam o que chegava até os consumidores, hoje esse poder está se encaminhando para o elemento final da cadeia e o consumidor. o Conteúdo auto-gerado - houve um tempo em que toda informação a que se tinha acesso se originava em produção realizada por um jornal, revista, rede de televisão, rádio, cinema, etc. Atualmente, as regras mudaram, o papel do consumidor mudou. As novas tecnologias permitem que qualquer um seja capaz de criar uma música, vídeo ou texto e possa disponibilizá-lo na internet. O número de blogs, flogs e vídeos amadores (em sites como o YouTube) vem aumentando nos últimos anos e deve continuar a crescer. o Redes sociais – acredita-se que as primeiras redes sociais surgiram quase que juntamente com a internet, mas foi recentemente, com as inovações em velocidade de transmissão e possibilidade de acesso à web, que fenômenos como o Second Life, Orkut, MySpace, Facebook, foram criados. O uso de redes sociais pela internet vem crescendo a cada ano, gerando grande impacto nos meios de comunicação tradicionais. Se as pessoas desejam socializar-se, cada vez menos um veículo como a TV aberta que conhecemos fará parte do interesse dos consumidores. o Interatividade – a possibilidade de interagir com as mídias ganhou destaque desde o advento e disseminação da internet. As novas gerações estão cada vez mais habituadas a “dialogar” com as mídias, selecionando opções, criando conteúdos, enviando opiniões e, até mesmo, mergulhando em realidades virtuais. o Mídia no conteúdo – o movimento “Madison&Vine” refere-se a uma esquina fictícia, criada na junção das avenidas Madison (onde estão as grandes agências de Nova Iorque) com a Vine (na qual se localizam os estúdios de Hollywood). O termo designa, assim, a união das indústrias de propaganda e entretenimento, que precisam convergir para sobreviver segundo Donaton (2007), criador do termo e editor da revista “Advertising Age”. Mídia no conteúdo significa a inserção das marcas dos anunciantes dentro dos conteúdos de entretenimento. Ao invés de interromper, a palavra de ordem é unir. o Internacionalização e “mercantilização” do esporte – nos últimos anos, o esporte de forma geral tem consolidado uma posição de destaque como conteúdo de entretenimento. Por outro lado, com a globalização, o trânsito deste conteúdo entre países é cada vez mais comum. Por exemplo, é comum observar crianças que torcem para um time no Brasil e um time internacional, usam camisas destes times internacionais e cultuam seus craques – que muitas vezes são brasileiros. Este fenômeno cria oportunidades de negócio crescentes, exigindo dos players cada vez mais profissionalização e visão estratégica do negócio.

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o Proliferação de modalidades esportivas e esporte como estilo de vida – num século que parece cultuar cada vez mais um estilo de vida saudável e sustentável, o esporte ganha importância. É crescente a quantidade adeptos de esportes, como corrida, e também de novos esportes que surgem, como patinação in-line e bungee-jumping.

• Incertezas o Regulamentação da TV aberta – esta incerteza diz respeito à regulamentação para a disponibilização de concessões de TV aberta, o que é de vital importância para o Esporte Interativo. Para os executivos da empresa, a obtenção de uma concessão de TV aberta VHF ou UHF é muito importante e isso depende em grande parte de como será a regulamentação dos novos canais de TV Digital, que poderão ser disponibilizados a partir de 2010. o Regulamentação dos Direitos –Hoje, os direitos são negociados um a um. Apesar de haver uma tendência para que o detentor disponibilize para um único player os direitos de TV, web e móbile, não se sabe se isso ocorrerá. o Digital Rights Management (DRM) e “comoditização” da distribuição – com tantas novas formas de propagação de conteúdo, é preciso saber se haverá algum mecanismo de proteção de direitos para os produtores de conteúdo ou se a veiculação e cópia dos materiais será irrestrita e legal em qualquer meio. Uma dúvida em relação aos direitos é se estes direitos serão reforçados ou se a distribuição pela internet e celular acabará causando algo semelhante ao que ocorreu com a música, com um acesso amplo ao conteúdo, oriundo de uma distribuição absolutamente disseminada. o TV aberta ou IPTV – com tantas opções de conteúdo e tecnologias, fica difícil definir quanto tempo os consumidores irão dedicar a cada mídia. Não se sabe os reais impactos da mobilidade e acesso em grande escala à internet, se isso irá modificar o comportamento dos consumidores frente a uma tela de TV tradicional ou até que ponto as novas mídias irão substituir as tradicionais em sua preferência. o Privacidade, propaganda e conteúdo pago – A relação entre as TVs abertas e os anunciantes se mantém sustentável porque até muito recentemente, a única forma conhecida de se fazer propaganda era colocando o consumidor de forma passiva frente ao veículo e o submetendo ao turbilhão de informações que se desejasse transmitir. Com o advento da internet e de novas tecnologias que permitem a interatividade, surge a possibilidade de este mesmo consumidor passar a ter um papel ativo na relação com as empresas. As inovações que têm ocorrido nas telecomunicações viabilizam a criação de propagandas interativas e personalizadas, mais sofisticadas e adaptadas aos meios. Entretanto, a contrapartida disto é a liberação de uma quantidade relevante de informações pessoais a empresas como Google ou Apple. Não se sabe ainda qual o nível de privacidade desejado ou qual o mínimo aceitável para os indivíduos. O que se deseja saber é se o modelo de subsídio cruzado evoluirá para formas cada vez mais elaboradas de propaganda personalizada, ubíqua e relevante, ou se será substituído por outro em que o consumidor paga exatamente por aquilo que deseja assistir.

4.3. A partir das Tendências e Incertezas listadas, crie cenários e dê recomendações para cada um dos cenários criados. Combinando as incertezas chegou-se a cinco cenários diferentes, representados aqui, entre inúmeras possibilidades, por cinco times do Rio de Janeiro (Flamengo, Fluminense, Botafogo, Vasco da Gama e América).

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Flamengo – neste cenário, a TV é predominantemente aberta, massificada e com canais de variedades. Cabe ressaltar que não há emissoras especializadas em determinado assunto, como esportes ou filmes, mas grades segmentadas por horários e diversidade de programação. Quanto aos anúncios, predomina a forma tradicional de trinta segundos, onde a venda é feita por audiência medida por empresas como o IBOPE e sem nenhum tipo de customização. Os direitos de transmissão, por sua vez, são extremamente valorizados e vendidos com exclusividade para determinadas emissoras. Não há transmissões via internet, tudo é concentrado na TV aberta. Um early warning para tal cenário seria um comunicado, por parte da UEFA, que as transmissões da Liga dos Campeões não mais seriam transmitidas online, apenas via parceiros em TV aberta. Algumas recomendações para o Esporte Interativo são fundamentais em um cenário como esse. A primeira delas é a obtenção, junto ao governo, de uma licença para transmissão em TV aberta nos espectros VHF ou UHF. Outro ponto de suma importância seria a obtenção de financiamento para fomentar o crescimento substancial que a empresa necessitaria para sustentar uma transmissão aberta e para a obtenção dos direitos de transmissão, muito valorizados e exclusivos para uma emissora apenas. Uma forma de realizar tal tarefa seria o estabelecimento de parcerias com outras empresas, a fim de sustentar tal impacto ou através de linhas de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Por fim, deve-se estabelecer programas de recrutamento e seleção para alimentar o crescimento da empresa. Fluminense – o conceito fundamental por trás deste cenário é o fato de os canais de TV aberta predominarem de forma fragmentada. Isso significa que existirão emissoras especializadas em determinados assuntos operando em TV aberta, o que possibilita a transmissão de anúncios segmentados por público, ou seja, em um canal de esportes, por exemplo, serão vinculados comerciais que abordem tal assunto. Os direitos de transmissão são valorizados, contudo, são negociados com diversos parceiros ao redor do mundo, mas sem exclusividade, como no cenário anterior. Um early warning para tal cenário seria a entrada de novas emissoras especializadas em segmentos específicos na TV aberta. As principais recomendações para o Esporte Interativo neste cenário seriam três. Primeiramente, deve-se obter uma licença para operar em TV aberta. Em paralelo, busca-se financiamento para fomentar os altos investimentos necessários em pessoal e equipamento para manter uma TV aberta em funcionamento, bem como recrutamento e seleção de pessoal. Como os anunciantes já buscam uma oferta segmentada, é possível iniciar processos de Customer Relationship Management (CRM), a partir do cruzamento das informações dos canais de interatividade, comunidade online e TV. Para tal, a empresa precisa aperfeiçoar suas competências em multichannel marketing. Botafogo – neste cenário, uma nova tecnologia, a IPTV, começa a ganhar massa crítica, ameaçando o modelo de negócios tal qual conhecemos hoje. O consumidor não aceita mais propagandas que não são do seu interesse, e está em busca de uma oferta customizada, de forma que suas necessidades sejam atendidas plenamente. Neste sentido, as propagandas passam a ser pessoais, e a segmentação da televisão se intensifica, com o espectador tendo oportunidade de escolher a oferta que mais se encaixa em seu perfil. O modelo de subsídio cruzado ainda perdura, mas o foco agora não é mais na audiência e sim na atenção do espectador, ou seja, resultados passam a ganhar mais importância. Em um cenário desse, a ferramenta fundamental será o CRM, conhecer o seu consumidor passa a ser o principal diferencial entre sucesso e fracasso. Além disso, tem-se um grande número de ambientes colaborativos, quase como o espectador fazendo parte da criação da programação. Aqui, faz todo o sentido investir em uma estratégia de marketing multicanal, de forma a acompanhar o consumidor em todos os momentos de consumo. Para

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tanto, é necessário uma sinergia entre diversas mídias e um conteúdo multiplataforma, isto é, adaptável para qualquer mídia. Vasco – no cenário batizado de Vasco da Gama, o ambiente de negócios torna-se mais inóspito. A cultura deflagrada por tecnologias tais como o DVR e a própria IPTV transferiram o controle da programação dos produtores de conteúdo para os consumidores, fazendo com que estes deliberadamente optassem por ignorar comerciais. Como resultado, o modelo de subsídio cruzado foi seriamente comprometido, inviabilizando uma das bases do modelo de negócios do Esporte Interativo. Ao resistir à publicidade, um novo consumidor surge: aquele disposto a pagar para receber conteúdo de qualidade, desde que o mesmo chegue de forma rápida e fácil. Ainda assim, posto que a Internet possibilitaria o contato direto entre o consumidor final e os proprietários dos direitos de transmissão (no caso, as ligas regionais), a venda do conteúdo poderia se dar diretamente pelo website destes. A fim de manter sua sobrevivência e proteger o tráfego do seu site, o Esporte Interativo poderia agregar valor ao oferecer versões exclusivas localizadas às preferências brasileiras, com grande capacidade de customização. Para tanto, o desenvolvimento de competências de CRM e sistemas wikis seriam de grande valia. Possibilidades como a transmissão paga da final da liga dos campeões no site da UEFA, ou quem sabe, na iTunes surgem como pertinentes early warnings. Deve-se levar em conta, neste cenário, que parte relevante do conteúdo da TV é ao vivo, o que representa um diferencial para a publicidade, já que a maior parte das pessoas que assistir um jogo na hora em que ele acontece. Há, ainda, possibilidades para a propaganda, especialmente a inserida no conteúdo, como a empresa já faz. América – aqui, o Esporte Interativo encontra-se numa realidade marcada pela resignação de toda indústria de entretenimento digital para o fato de que não há meios para se controlar a distribuição de conteúdo eletrônico. Assim, num movimento análogo ao iniciado pelos artistas da indústria fonográfica, cujo pioneirismo reside na iniciativa de distribuir suas canções gratuitamente como promoção para sua principal fonte de receita, seus shows; as ligas regionais de esporte (como a UEFA) distribuem os direitos de transmissão sob licenças do tipo copyleft para promover o consumo presencial de seus produtos. Desta maneira, a principal fonte de receita das Ligas Regionais de esporte passam a ser ações de marketing de experiência, como a apreciação de uma partida especial in-loco. Aqui, as competências de promoção de eventos oriundas dos trabalhos para a Rede Globo e a capacidade de customizar conteúdo distribuído no portal Esporte Interativo seriam fundamentais. A primeira responderia pela habilidade de se organizar e viabilizar eventos de grande porte, ações de marketing de experiência como amistosos entre estrelas internacionais em solo brasileiro. A segunda ofereceria ao portal as ferramentas de CRM necessárias para se promover eventos desta natureza mediante conteúdo gratuito e customizado. Conceber que um dia a receita dos estádios seja bem superior à venda de direitos de transmissão consiste num poderoso early warning para este cenário.

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