UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE BIOLOGIA

LAÍS SOÊMIS SISTI

CARACTERIZAÇÃO DE FUNGOS ENDOFÍTICOS, GERMINAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DO PROTOCORMO DE POGONIOPSIS SCHENCKII COGN. (: )

CAMPINAS

2018

LAÍS SOÊMIS SISTI

CARACTERIZAÇÃO DE FUNGOS ENDOFÍTICOS, GERMINAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DO PROTOCORMO DE POGONIOPSIS SCHENCKII COGN. (ORCHIDACEAE: VANILLOIDEAE)

Dissertação apresentada ao Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do Título de Mestra em Biologia Vegetal.

ESTE ARQUIVO DIGITAL CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA ALUNA LAIS SOÊMIS SISTI E ORIENTADA PELA PROFA. DRA. JULIANA LISCHKA SAMPAIO MAYER.

Orientador: Profa. Dra. Juliana Lischka Sampaio Mayer

Co-Orientador: Pesquisadora Dra. Maria Letícia Bonatelli

CAMPINAS

2018

Campinas, 15/06/2018.

COMISSÃO EXAMINADORA

Profa. Dra. Juliana Lischka Sampaio Mayer

Profa. Dra. Samantha Koehler

Profa. Dra. Maria Carolina Quecine Verdi

Os membros da Comissão Examinadora acima assinaram a Ata de Defesa, que se encontra no processo de vida acadêmica do aluno.

Aos meus pais, Marilene e José Carlos, por sempre me incentivarem a seguir os meus sonhos.

AGRADECIMENTOS

À Profa. Dra. Juliana Lischka Sampaio Mayer, por ter aceitado me orientar, por me confiar um projeto tão desafiador, por todas as ideias e contribuições para o mesmo e para minha formação acadêmica, por estar sempre presente e pela amizade. À Dra. Maria Letícia Bonatelli, por ter aceitado me co-orientar, por todo o conhecimento e suporte fornecidos, por se colocar sempre à disposição para me ajudar, pelas conversas construtivas e pela amizade. À Profa. Dra. Sara Adrián Lopez de Andrade, pela parceria e contribuição, por proporcionar suporte às análises moleculares e pelas sugestões com o texto. À Profa. Dra. Samantha Koehler, por todo suporte, pelas contribuições e sugestões com o trabalho e com o texto. Aos Professores Dr. Fábio Pinheiro e Dr. João Lúcio de Azevedo, pela contribuição e pelas sugestões e dicas com o texto. Ao Dr. Carlos Eduardo Pereira Nunes, por ter localizado a espécie de estudo e pela ajuda em campo. Ao Sebastião Henrique Militão Jr., Técnico do Laboratório de Anatomia Vegetal da UNICAMP, por toda e qualquer ajuda durante o desenvolvimento desse trabalho. À Denisele Neuza Aline Flores Borges, por toda a ajuda com o trabalho e, em especial, com as análises anatômicas ultraestruturais, pela companhia durante os trabalhos de campo e congressos, por ter sido um exemplo de força e determinação, pelas conversas inspiradoras e pela grande amizade. À Marília Claudiano Tavares, por toda ajuda e apoio, por dividir comigo os desafios da vida na pós-graduação, por todas as conversas profundas, por ser essa pessoa tão especial e por sua linda amizade. Às amigas Larissa Rother e Thaina Lima, pela parceria e companhia, por todas as conversas e risadas e pela amizade. Aos alunos de iniciação, Andressa e Gabriel, por qualquer ajuda, pela companhia e, principalmente, por me proporcionarem a oportunidade de ensiná-los. A todos os amigos e colegas de laboratório e do departamento, por qualquer ajuda, pelo convívio, pelas conversas e, principalmente, por me acolherem com todo carinho e respeito durante esses anos.

Ao Laboratório de Anatomia Vegetal da UNICAMP, por me receber, ceder espaço, equipamentos e materiais. Ao Laboratório de Fisiologia Molecular de Plantas (LaFIMP) da UNICAMP e à todos os funcionários e alunos, pelo auxílio e por permitir o uso dos seus equipamentos e reagentes para as análises moleculares. À Microscopia Eletrônica da UNICAMP e aos seus funcionários, pelo auxílio prestado e por possibilitar o processamento e a análise das amostras para anatomia. Ao Parque Estadual da Serra do Mar e a todos os seus funcionários, pelas ajudas em campo e por permitir a coleta do material vegetal e, portanto, o desenvolvimento do presente estudo. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pela concessão da bolsa de mestrado e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), pelo financiamento do projeto (Processo: 2015/26479-6). A todos os moradores da república Casa Mil, pelo convívio sempre respeitoso, pelas conversas e por dividirem comigo um segundo lar. Ao meu amor, Leandro Carlos Ribeiro, por acreditar no meu potencial, por estar sempre ao meu lado, por me apoiar minhas escolhas, por sua dedicação e, principalmente, por sua amizade e companheirismo. Aos meus pais, Marilene Ferro e José Carlos Sisti, e aos meus queridos tios, Eunice Sisti e Mário Massoni, agradeço por estarem sempre presentes, por me apoiarem em cada fase da minha vida, pela dedicação e por todo carinho. Nada disso seria possível sem a participação de vocês!

RESUMO

Microrganismos endofíticos são aqueles que habitam o interior dos órgãos e tecidos de plantas sem causar danos ao hospedeiro. Sua função ainda é pouco conhecida, porém alguns endófitos já foram descritos como produtores de compostos benéficos para a planta, como antibióticos e fatores de crescimento. Os fungos que desenvolvem ao menos um complexo de hifas (pelotons) no interior das células vegetais são denominados de micorrízicos de orquídeas. Em condições naturais, as orquídeas são dependentes de associações micorrízicas durante seus estágios iniciais de desenvolvimento, na qual os fungos fornecem suporte nutricional para o embrião até o estabelecimento da plântula. No entanto, algumas espécies de orquídeas permanecem aclorofiladas, sendo totalmente dependentes de seus parceiros micorrízicos durante todo o seu ciclo de vida. Durante a germinação das sementes de orquídeas ocorre a formação de uma estrutura de formato coniforme, também denominada de protocormo. Pogoniopsis schenckii Cogn. é uma espécie rara, aclorofilada e mico-heterotrófica que se desenvolve sob matéria orgânica em florestas densas. Estudos com a espécie podem ajudar a compreender melhor o estilo de vida mico-heterotrófico, além de poder ser útil para planos de conservação. Os principais objetivos do presente estudo foram descrever a comunidade de fungos endofíticos de diferentes órgãos, avaliar seu papel na germinação e descrever o desenvolvimento do protocormo de P. schenckii. Deste modo, foram isolados os fungos endofíticos presentes nas raízes, haste floral e frutos da espécie e estes foram identificados através de sequenciamento de DNA. Além disso, os fungos isolados foram utilizados em ensaios de germinação simbiótica com as sementes da orquídea e a estrutura dos protocormos foi analisada por meio de diferentes técnicas. Foram identificados cerca de seis gêneros de fungos, todos pertencentes ao filo Ascomycota, e nenhum deles são conhecidos como micorrízicos. No entanto, alguns isolados dos gêneros Trichoderma, Fusarium e, especialmente, Clonostachys demonstraram potencial germinativo das sementes de P. schenckii, proporcionando o rompimento do tegumento externo das sementes aos 20 dias do início dos testes. Os protocormos analisados em microscopia eletrônica de transmissão não apresentaram formação de pelotons, mas hifas fúngicas foram observadas ocupando o interior das células vivas. Este é o primeiro relato da germinação de uma espécie de orquídea mico-heterotrófica e aclorofilada sendo estimulada pela presença de fungos endofíticos não micorrízicos isolados de raiz e de fruto.

Palavras-chave: fungos endofíticos, germinação simbiótica, planta mico- heterotrófica, protocormo, Orchidaceae.

ABSTRACT

Endophytic microorganisms are those that inhabit the interior organs and tissues of without causing damage to the host. Its role is still poorly understood, but some endophytes have been described as producing beneficial compounds for the , such as antibiotics and growth factors. Fungi that develop at least a complex of hyphae (pelotons) within plant cells are called mycorrhizal orchids. Under natural conditions, orchids are dependent on mycorrhizal associations during their early stages of development, in which fungi provide nutritional support to the embryo until the establishment of the seedling. However, some species of orchids remain achlorophyllous, being totally dependent on their mycorrhizal partners throughout their life cycle. During the germination of orchid seeds the formation of a coniform structure, also called protocorm, takes place. Pogoniopsis schenckii Cogn. Is a rare, achlorophyllous and myco-heterotrophic specie that grows under organic matter in dense forests. Studies with the species may help to better understand the myco- heterotrophic lifestyle, and may be useful for conservation plans. The main objectives of the present study were to describe the community of endophytic fungi present in different organs, to evaluate their role in germination and to describe the development of protocorm of P. schenckii. In this way, the endophytic fungi present in the roots, floral stem and fruits of the specie were isolated and these were identified through DNA sequencing. In addition, the isolated fungi were used in trials of symbiotic germination with the orchid seeds and the protocormos structure was analyzed by different techniques. About six genera of fungi, all belonging to the Ascomycota phylum, have been identified, and none of them are known as mycorrhizal fungi. However, some isolates of the genera Trichoderma, Fusarium and, especially, Clonostachys demonstrated germination potential of P. schenckii seeds, providing rupture of the outer seed coat 20 days after the beginning of the tests. The protocorms analyzed in transmission electron microscopy did not present peloton formation, but fungal hyphae were observed occupying the interior of the living cells. This is the first report of the germination of a myco-heterotrophic and aclorophyllous orchid specie being stimulated by the presence of non-mycorrhizal endophytic fungi isolated from roots and fruit.

Key words: endophytic fungi, symbiotic germination, mico-heterotrophic plant, protocorm, Orchidaceae.

LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Colonização da raiz de uma espécie de Orchidaceae, Cypripedium arietinum W.T. Aiton, por fungos micorrízicos. Pelotons intactos (cabeças de seta) e pelotons sendo degradados (setas) ocorrem na mesma raiz. Retirada de Peterson et al. (2004).

Figura 2: Desenvolvimento de protocormos e plantas de Oncidium flexuosum Sims a partir da inoculação da semente in vitro. As datas são referentes aos dias após a inoculação. Seta = folha. Barras: A-B = 100 μm; C = 200 μm; D = 0,05 cm; E-F = 0,1 cm; G = 0,125 cm; H-L = 0,5 cm. Retirado de Mayer (2009).

Figura 3: A. Pogoniopsis schenckii Cogn. em seu ambiente natural, vista geral da haste floral e em detalhe corpos de frutificação de basidiomicetos (setas). B. Detalhe das flores. C. Detalhe dos órgãos vegetativos subterrâneos, observar a gema apical caulinar (seta) e as raízes (*). Barra = 1 cm. Fotos: Juliana Mayer.

Figura 4: Árvore de Parcimony Jackknife para Vanilloideae baseada em sequências de genes nucleares 26S, 5.8S e 18S rDNA mais o gene atpA mitocondrial e sequências do intron nad1b-c. Retirado de Cameron (2009).

Figura 5: Localização espacial das três populações de Pogoniopsis schenckii Cogn. utilizadas no estudo (triângulos). Legenda: TG/NVG – Trilha do Garcez/Núcleo Vargem Grande; TP/NSV – Trilha do Pirapitinga/Núcleo Santa Virgínia; TPP/NSV – Trilha do Poço do Pito/Núcleo Santa Virgínia.

Figura 6: Isolamento dos fungos de porções de órgão subterrâneos e reprodutivos de Pogoniopsis schenckii Cogn. Desinfestação superficial dos órgãos (A), amostra vegetal (B) e fragmentos inoculados em meio de cultura BDA (C). ra – raiz; h – haste; fr – fruto. Barra de escala – 2cm.

Figura 7: Teste de germinação simbiótica. Frutos maduros de Pogoniopsis schenckii Cogn. (A), secções de frutos para exposição das sementes (B) e semente já desinfestadas e inoculadas sobre fragmento de papel filtro em meio de cultura Ágar- Aveia (C). Barra de escala: 1cm.

Figura 8: Instalação do experimento de semeadura e recuperação de sementes in situ (A), pacotes de nylon contendo frutos da espécie sendo selados (B) e pacotes enterrados e presos à estaca por fios de arame (seta) (C).

Figura 9: Diversidade morfológica dos isolados fúngicos da raiz (A), fruto (B) e haste floral (C) de P. schenckii.

Figura 10: Imagens de gel do produto de PCR de amostras de DNA extraídas dos isolados fúngicos. Primeiro gel com apenas 12/51 amostras amplificadas (A) e resultados do PCR de testes posteriores com amostras diluídas (B e C).

Figura 11: Primeiro experimento de germinação simbiótica. Placa com fungo F22 isolado de raiz (A) e sementes da placa com 20 dias apresentando rompimento do tegumento externo (B). Barra de escala - 200µm.

Figura 12: Placas apresentando crescimento fúngico exagerado no meio de cultura ágar-aveia 4 g/L. As sementes não são visíveis e projeções verticais das hifas formando estruturas aéreas podem ser observadas (A e B).

Figura 13: Sementes inoculadas com isolado fúngico F38, do fruto de Pogoniopsis schenckii Cogn., com cerca de 5 meses de incubação. Sementes apresentando inchaço e rompimento do tegumento externo (A e B) e posterior crescimento e desenvolvimento dos protocormos após rompimento da testa (setas) (C, D, E e F). Barra de escala - 200 µm.

Figura 14: Estrutura com crescimento vertical (A), possível início da formação do corpo de frutificação fúngico. Estrutura em corte transversal (B) e detalhe (C).

Figura 15: Fruto recuperado no início de janeiro de 2017 apresentando projeções em crescimento desde seu interior (A) e estrutura alongada retirada do interior do fruto enterrado (B). Barra de escala – 1mm.

Figura 16: Estrutura provinda do interior de fruto recuperado no final de março de 2017, após cerca de 330 dias da instalação do experimento (A), base arredondada apresentando tricomas abundantes, bastante semelhante a um protocormo (B), projeções laterais, onde haviam antigas gemas (C) e tricomas semelhantes à pelos absorventes próximos ao ápice afunilado (D). Barra de escala – 1cm.

Figura 17: Sementes de Pogoniopsis schenckii Cogn. em diferentes fases de desenvolvimento, na presença do fungo F38, em microscopia eletrônica de varredura. Início do desenvolvimento (A), sementes com tegumento externo começando a rachar (setas) (B e C) e detalhe da rachadura do tegumento da semente (D).

Figura 18: Protocormos inoculados com fungo F38. Tegumento externo rachado e protocormo recoberto por hifas fúngicas (A e C), detalhe do início da formação de tricoma tector (B). Visão do interior do tegumento externo da semente e tricomas tectores já formados (D). Legenda: hi – hifas; pt – protocormo; te – tegumento externo e tt – tricoma tector.

Figura 19: Interior de fruto com cerca de 100 dias de semeadura em campo. Sementes intactas, estruturas ovais ligadas às hifas (setas) e crescimento abundante de hifas na região funicular das sementes (asteriscos pretos) (A). Detalhe da região funicular das sementes, com aglomerado de hifas e detalhe do funículo rompido (asterisco branco) (B).

Figura 20: Amostra da estrutura encontrada em campo. Base arredondada com alguns tricomas (A) e superfície recoberta por longos tricomas podem ser observados (B). Corte transversal da amostra, onde é possível observar a presença de cilindro central (asteriscos) (C). Detalhe do cilindro central com feixes de fibras (seta) (D).

Figura 21: Sementes Pogoniopsis schenckii Cogn. após 20 dias em cocultura com o isolado F38 (Clonostachys sp.). Células vivas do protocormo e escarificações do tegumento externo podem ser observadas (A e B). Barra de escala: 20µm.

Figura 22: Emaranhado massivo de hifas crescendo desde o interior dos protocormos em cocultura com o isolado F38 (A e B). Em evidência, resquícios do tegumento externo que, anteriormente, envolvida as sementes (setas).

Figura 23: Protocormo de Pogoniopsis schenckii Cogn. em análise de microscopia eletrônica de transmissão. Visão geral da superfície do protocormo recoberto por hifas (A) e detalhe do tegumento externo rachado logo abaixo da superfície (B). Célula viva do protocormo (C), detalhe da célula com núcleo evidenciado e hifas em corte transversal em seu interior. Hifas em corte longitudinal e transversal (E), detalhe do septo de célula fúngica (F).

LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Resultados da Frequência de Isolamento (FI) de fungos endofíticos para as três populações de P. schenckii. Legenda: TG/NVG – Trilha do Garcez/Núcleo Vargem Grande; TP/NSV – Trilha do Pirapitinga/Núcleo Santa Virgínia; TPP/NSV – Trilha do Poço do Pito/Núcleo Santa Virgínia.

Tabela 2: Relação do banco de fungos isolados dos diferentes órgãos e populações de P. schenckii. Legenda: TG/NVG – Trilha do Garcez/Núcleo Vargem Grande; TP/NSV – Trilha do Pirapitinga/Núcleo Santa Virgínia; TPP/NSV – Trilha do Poço do Pito/Núcleo Santa Virgínia.

Tabela 3: Identificação dos fungos endofíticos isolados de P. schenckii.

Tabela 4: Fungos isolados de P. schenckii que proporcionaram o rompimento do tegumento externo da semente da orquídea.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...... 16

MICRORGANISMOS ENDOFÍTICOS ...... 16 MICORRÍZAS: CLASSIFICAÇÃO GERAL E MICORRÍZAS ORQUIDÓIDES ...... 16 AS ORQUÍDEAS E ESPÉCIES MICOHETEROTRÓFICAS ...... 18 GERMINAÇÃO E DESENVOLVIMENTO EM ORCHIDACEAE ...... 19 MODELO DE ESTUDO E JUSTIFICATIVA ...... 21 OBJETIVOS ...... 23 MATERIAL E MÉTODOS ...... 24

COLETA DO MATERIAL VEGETAL ...... 24 ISOLAMENTO DOS FUNGOS ...... 24 ANÁLISE DA FREQUÊNCIA DE ISOLAMENTO ...... 26 EXTRAÇÃO DE DNA FÚNGICO ...... 26 AMPLIFICAÇÃO DE FRAGMENTO DE DNA ...... 27 IDENTIFICAÇÃO DOS FUNGOS ...... 27 GERMINAÇÃO SIMBIÓTICA ...... 28 GERMINAÇÃO ASSIMBIÓTICA ...... 29 EXPERIMENTO DE SEMEADURA E RECUPERAÇÃO DE SEMENTES ...... 29 ANÁLISES ANATÔMICAS E ULTRAESTRUTURAIS ...... 30 MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE TRANSMISSÃO (MET) ...... 30 MICROSCOPIA DE LUZ (ML) ...... 31 MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE VARREDURA (MEV) ...... 31 RESULTADOS ...... 31

MATERIAL VEGETAL ...... 31 ISOLAMENTO DOS FUNGOS E ANÁLISE DA FREQUÊNCIA DE ISOLAMENTO ...... 32 EXTRAÇÃO DE DNA FÚNGICO ...... 33 AMPLIFICAÇÃO DE FRAGMENTO DE DNA ...... 34 IDENTIFICAÇÃO DOS FUNGOS ...... 35 TESTE DE GERMINAÇÃO SIMBIÓTICA ...... 36 TESTE DE GERMINAÇÃO ASSIMBIÓTICA ...... 40 EXPERIMENTO DE SEMEADURA E RECUPERAÇÃO DE SEMENTES ...... 40 MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE VARREDURA ...... 42 MICROSCOPIA DE LUZ ...... 45 MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE TRANSMISSÃO ...... 47 DISCUSSÃO ...... 48

COMUNIDADE ENDOFÍTICA E MICORRÍZICA ...... 48 ENSAIOS DE GERMINAÇÃO ...... 50 DESENVOLVIMENTO DO PROTOCORMO ...... 51 CONCLUSÃO ...... 52

REFERÊNCIAS ...... 53 ANEXO 1...... 58 ANEXO 2...... 59 16

INTRODUÇÃO

Microrganismos endofíticos Os microrganismos endofíticos, segundo definição de Petrini (1991), são todos aqueles que habitam o interior dos órgãos e tecidos de plantas, sem causar danos aparentes ao hospedeiro; e distinguem-se daqueles epifíticos, que habitam a superfície dos órgãos das plantas (Azevedo, 1998). Evidentemente, trata-se de uma definição puramente topográfica, não acusando qualquer característica da natureza do organismo (Petrini, 1991; Azevedo, 1998). Endófitos podem ser isolados de uma grande diversidade de plantas e tecidos, desde árvores de grande porte, palmeiras e até mesmo líquens (Hyde, 2008). Atualmente, é conhecido que endófitos podem apresentar diversas propriedades de interesse para a planta, como proteção contra patógenos, e também podem produzir compostos de interesse biotecnológico, como antibióticos e fatores de crescimento (Azevedo, 2008). Uma espécie de Trichoderma, gênero comumente isolado como endófito em orquídeas, que foi isolado de Cupressaceae, demonstrou possuir propriedades antimicrobianas (Mahdieh et al., 2014). Característica similar foi também observada em espécie pertencente ao gênero Xylaria, isolados da orquídea Anoectochilus setaceus Blume, que apresentou a produção de composto antibacteriano, que pôde ser extraído do isolado (Ratnaweera et al, 2014). É comum a classificação indevida da comunidade fúngica das raízes de orquídeas como integralmente micorrízica, portanto é importante ressaltar que nem todos os fungos que habitam as raízes de plantas são obrigatoriamente micorrízicos, podendo tratar-se apenas de endófitos mutualísticos ou mesmo patógenos latentes (Azevedo, 1998; Hyde, 2008). Segundo Azevedo (1998), não são comumente classificados como endófitos as bactérias fixadoras de nitrogênio e os fungos micorrízicos, tratando-se de grupos estudados separadamente, e dos quais na maioria das vezes diferem em sua composição taxonômica em relação aos puramente endofíticos (Arnold, 2007).

Micorrízas: classificação geral e micorrízas orquidóides Micorrízas são primariamente divididas em dois grupos, as ectomicorrízas e as endomicorrízas. As ectomicorrízas são caracterizadas pela formação de um 17

manto e uma rede de hifas intercelulares, denominada rede de Hartig, nas raízes de espécies arbóreas. Já as endomicorrízas são caracterizadas pela invasão das células radiculares pelas hifas fúngicas e são, ainda, subdivididas em outros seis grupos de micorrízas, dentre os quais encontra-se as micorrízas orquidóides (Peterson et al., 2004). As micorrízas orquidóides ocorrem apenas dentro da família Orchidaceae (Leake, 1994) e uma das suas principais características é a formação de um complexo de hifas, também chamado de pelotons, que se desenvolve dentro das células parenquimáticas nas raízes e rizomas dessas plantas (Figura 1) (Peterson et al., 2004; Rasmussen & Rasmussen, 2009). É considerada uma relação unilateral, onde apenas a orquídea se beneficia e todos os fungos conhecidos por estabelecer tal relação são capazes de sobreviver sem a planta (Rasmussen & Rasmussen, 2009).

Figura 1: Colonização da raiz Cypripedium arietinum. Pelotons intactos (cabeças de seta) e pelotons sendo degradados (setas) ocorrem na mesma raiz. Retirada de Peterson et al. (2004).

O isolamento de fungos endofíticos pode ser facilmente realizado a partir das raízes de orquídeas e a maioria consegue se desenvolver bem em diversos meios de cultura (Peterson et al., 2004). No entanto, diferentemente dos fungos puramente endofíticos, os fungos micorrízicos, geralmente excluídos dessa classificação, que são associados com orquídeas geralmente são mais difíceis de 18

isolar dos tecidos vegetais, sendo que alguns deles não são cultiváveis em meios de cultura convencionais além de serem muito menos abundantes que os primeiros (Zelmer et a., 1996).

As orquídeas e espécies micoheterotróficas A família Orchidaceae compreende cerca de 25.000 espécies (Dressler, 2005) e, a grande maioria, compreende plantas verdes e totalmente capazes de realizar fotossíntese (Smith & Read, 2008). Porém, a presença de clorofila não é suficiente para comprovar o completo autotrofismo das orquídeas verdes (Smith & Read, 2008) que podem se associar ou mesmo permanecerem receptíveis aos seus fungos micorrízicos durante toda a vida adulta (Rasmussen & Rasmussen, 2009). Aproximadamente 235 espécies de orquídeas permanecem aclorofiladas durante todo o seu ciclo de vida (Merckx, 2012), sendo totalmente dependentes de seus parceiros micorrízicos para a obtenção de compostos de carbono (Peterson et al., 2004). Essas plantas, também chamadas de mico-heterotróficas (MH), evoluíram independentemente em várias linhagens de plantas, adaptando-se ao sub-bosque sombreado, e representam uma das formas mais extremas de dependência micorrízica (Leake, 1994). As orquídeas podem se relacionar com uma grande diversidade de táxons de fungos e combinar diversas estratégias nutricionais (Rasmussen, 2002). Espécies de orquídeas verdes associam-se com diferentes espécies de fungos, quando comparado com as mico-heterotróficas (Peterson et al., 2004). Além disso, as espécies MH de regiões tropicais apresentam maior diversidade em suas associações simbióticas e diferentes níveis de especificidade quando comparadas com as de regiões temperadas (Martos et al., 2009). Espécies MH de regiões temperadas associam-se de maneira altamente específica com fungos ectomicorrízicos (ECM), os quais estabelecem relação com árvores ou arbustos próximos, extraindo desses os compostos de carbono que são passados para a orquídea, em uma simbiose tripla (Rasmussen, 2002; Peterson et al., 2004; Martos et al., 2009). Plantas dependentes de fungos saprófitas geralmente apresentam um baixo grau de especificidade e uma taxa relativamente alta de transitoriedade em relação ao micobionte, visto que estes apresentam uma fonte de nutrição menos estável do que os fungos ECM (Rasmussen, 2002). Apesar da maioria das espécies 19

MH ocorrerem em regiões tropicais, a maior parte das pesquisas foi desenvolvida com espécies provenientes de regiões temperadas. Até o momento poucos estudos abordaram orquídeas MH de clima tropical (África, Franke et al., 2006; Sudeste da Ásia, Austrália, Índia e Áfria, Yamato et al., 2005; Ilha de Guadalupe, Martos et al., 2009; Tailândia, Roy et al., 2009).

Germinação e desenvolvimento em Orchidaceae As sementes de orquídeas são pequenas, o embrião maduro é indiferenciado, não apresentando endosperma ou cotilédones. As reservas nutricionais, que são mínimas, encontram-se armazenadas nas células do próprio embrião (Harrisson, 1977). Em condições naturais, as orquídeas são completamente dependentes de associações micorrízicas em seus estágios iniciais de crescimento e desenvolvimento e, portanto, todas elas passam por uma fase mico-heterotrófica (McKendrick et al. 2000; Leake, 2004; Rasmussen & Rasmussen, 2009), na qual podem permanecer subterrâneas por longos períodos após a germinação (Rasmussen & Whigham, 1993). A associação com os fungos promove a germinação simbiótica, fornecendo suporte nutricional para o embrião até o estabelecimento da plântula ou, em muitos casos, durante todo o seu ciclo de vida (Smith & Read, 2008). Algumas espécies de orquídeas podem ser germinadas in vitro de maneira assimbiótica se carboidratos solúveis e outros compostos orgânicos forem fornecidos às sementes (Rasmussen & Rasmussen, 2009). Caso contrário, faz-se necessário o estabelecimento de uma associação simbiótica usando uma fonte orgânica complexa e o parceiro fúngico apropriado (Peterson et al., 2004). No entanto, a relação das sementes com os fungos demonstra ser pouco específica em experimentos in vitro, e a germinação pode ser estimulada por fungos que não necessariamente representem bons parceiros micorrízicos em situações naturais e que, além do mais, talvez não sejam capazes de suportar o desenvolvimento do protocormo em longo prazo (Rasmussen & Whighan, 1993; Rasmussen, 2002). Em resposta a essas questões, a germinação de sementes in situ permite acompanhar o desenvolvimento dos protocormos até o estabelecimento da plântula, em condições naturais (Rasmussen & Whighan, 1993). Durante a germinação, o embrião incha e promove o rompimento do revestimento da semente, formando então uma estrutura de formato coniforme 20

(Arditti, 1967), também denominada de protocormo (Bernard, 1909 apud Leroux, 1997). Tal estrutura é considerada como uma fase intermediária entre o embrião e a plântula (Leroux, 1997). Logo após, surgem pelos absorventes, o protocormo aumenta em tamanho e são formadas as primeiras folhas seguidas pelo desenvolvimento da raiz (Figura 2) (Arditti, 1967; Harrison, 1977). Segundo Cribb (1999) os protocormos são estruturas efêmeras e necessitam, em condições naturais, de uma apropriada associação com fungos micorrízicos antes da formação das primeiras folhas e raízes.

Figura 2: Desenvolvimento de protocormos e plantas de Oncidium flexuosum Sims a partir da inoculação da semente in vitro. As datas são referentes aos dias após a inoculação. Seta = folha. Barras: A-B = 100 μm; C = 200 μm; D = 0,05 cm; E-F = 0,1 cm; G = 0,125 cm; H-L = 0,5 cm. Retirado de Mayer (2009).

Nos protocormos, os fungos simbiontes pertencem geralmente a alguns táxons de Basidiomycota denominados de 'rhizoctonias', principalmente pertencentes à Ceratobasidiaceae, Tulasnellaceae e alguns a Sebacinales (Rasmussen, 2002) e diversos fungos isolados das raízes de orquídeas já foram 21

capazes de estimular a germinação das sementes de várias espécies de orquídeas (Rasmussen, 1995).

Modelo de estudo e justificativa O gênero Pogoniopsis pertence à subfamília Vanilloideae, tribo Pogoniae (Cameron, 2009). É composto apenas por duas espécies, Pogoniopsis schenckii Cogn. e Pogoniopsis nidusavis Rchb.f. & Warm., ambas mico- heterotróficas. As duas se desenvolvem sob a matéria orgânica em matas densas, são aclorofiladas, possuindo coloração amarelo pálido. As plantas do gênero são descritas como apresentando raízes curtas e fasciculadas, folhas modificadas em brácteas recobrindo o caule aéreo (Figura 3).

Figura 3: A. Pogoniopsis schenckii no ambiente natural, vista geral da haste floral e em detalhe corpos de frutificação de basidiomicetos (setas). B. Detalhe das flores. C. Detalhe dos órgãos vegetativos subterrâneos, observar a gema apical caulinar (seta) e as raízes (*). Barra = 1 cm. Fotos: Juliana Mayer.

P. schenckii é uma espécie pouco conhecida, com coletas descritas nos estados de Pernambuco, Bahia, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Santa Catarina (Pabst & Dungs, 1977; Cardoso & Queiroz, 2008; ZAPPI, 2015; Bittencour & Gasper, 2016). Apesar de ser amplamente distribuída, é considerava uma espécie rara, fazendo parte da Lista vermelha da flora do Paraná (1995), e foi 22

classificada como uma espécie vulnerável (VU), pela Lista vermelha da flora de São Paulo (2004) (CNCFlora, 2012). Além do mais, em estudo recente, projeções sobre as mudanças climáticas futuras indicou que, com o aquecimento global, P. schenckii poderá ter seu nicho ideal reduzido de 1 à 30% da sua extensão atual (Kolanowska, 2017). Portanto, estudos para compreender a germinação da espécie e seu estabelecimento in vitro podem ser de grande valor para futuros planos de conservação de P. schenckii. Sequências de DNA da região 18S rDNA e de duas regiões do DNA mitocondrial indicaram que Pogoniopsis é filogeneticamente próxima de (, Triphoreae, ) (Chase et al., 2015). Segundo Cameron (2009), o posicionamento filogenético de Pogoniopsis permanece incerto e estudos com gênero podem ser importantes para a compreensão da história evolutiva das Vanilloideae, principalmente pelo fato dessas espécies brasileiras compartilharem caracteres reprodutivos das suas duas tribos, tanto de como de Vanilleae (Figura 4).

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Figura 4: Árvore para Vanilloideae baseada em sequências de genes nucleares 26S, 5.8S e 18S rDNA mais o gene atpA mitocondrial e sequências do intron nad1b-c. Retirado de Cameron (2009).

Como dito anteriormente, fungos endofíticos podem ser encontrados em diversos órgãos das plantas (Hyde, 2008), porém pouco se sabe sobre o real papel desses fungos na germinação e no posterior desenvolvimento das orquídeas (Vujanovic et al, 2000). O que não é verdade para os fungos conhecidos como micorrízicos, onde diversos estudos já demonstraram sua importante e, no caso de espécies aclorofiladas, indispensável participação na germinação (orquídeas mico- heterotróficas: Umata, 1995; Bruns & Read, 2000; McKendrick et al., 2002; Leake et al., 2004; Yagame & Yamato, 2007; orquídeas verdes: Bidartondo & Read, 2008; Pereira et al., 2015; Hoang et al., 2016). Análises de microscopia eletrônica de transmissão dos órgãos de espécies MH são importantes para investigar e confirmar se as células vegetais com a presença de hifas permanecem vivas e com as organelas intactas. Além disso, essa análise permite verificar se as hifas possuem ansas (clamp-connections), doliporos ou parentossomos, características típicas de Basidiomycota (Roy et al., 2009). Estudos com orquídeas MH de regiões tropicais podem contribuir para uma melhor compreensão dessas plantas e suas interações (Martos et al., 2009).

OBJETIVOS

1. Investigar a comunidade cultivável de fungos endofíticos de diferentes órgãos de Pogoniopsis schenckii; 2. Identificar os parceiros micorrízicos da espécie; 3. Avaliar o papel dos fungos isolados na germinação simbiótica; 4. Determinar o potencial germinativo de P. schenckii em condição assimbiótica; 5. Investigar a eficiência de técnica de semeadura e recuperação de sementes (germinação in situ); 6. Descrever a morfologia e o desenvolvimento do protocormo de P. schenckii; 7. Compreender a ultraestrutura e o complexo de hifas das células infectadas dos protocormos.

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MATERIAL E MÉTODOS

Coleta do material vegetal Amostras de raízes, haste floral e de frutos de Pogoniopsis schenckii foram coletadas de duas populações isoladas localizadas na Trilha do Poço do Pito (TPP) e na Trilha no Pirapitinga (TP) do Núcleo Santa Virgínia (NSV) e em uma população da Trilha do Garcez (TG) no Núcleo Vargem Grande (NVG) (Figura 5). Todas as trilhas estão localizadas no Parque Estadual da Serra do Mar (PESM), nos arredores dos municípios de São Luiz do Paraitinga e Natividade da Serra, Estado de São Paulo (SP).

Figura 5: Localização espacial das três populações de Pogoniopsis schenckii utilizadas no estudo (triângulos). Legenda: TG/NVG – Trilha do Garcez/Núcleo Vargem Grande; TP/NSV – Trilha do Pirapitinga/Núcleo Santa Virgínia; TPP/NSV – Trilha do Poço do Pito/Núcleo Santa Virgínia.

Isolamento dos fungos Para investigar a comunidade de fungos endofíticos e micorrízicos de P. schenckii, foi feito o isolamento de porções da raiz, da haste floral e do fruto das três populações da espécie de acordo com metodologia proposta por Pereira et al. (1993) e Araújo et al. (2001), com modificações. As amostras vegetais sadias foram lavadas em água corrente, em seguida foi realizada uma lavagem em álcool 70% 25

por 1 min, seguido de lavagem em hipoclorito de sódio (2% de cloro ativo) por 5 min e lavagem em álcool 70% por 30 segundos. Por fim, foram realizadas duas lavagens em água destilada autoclavada, sendo que uma alíquota da água da última lavagem foi plaqueada em meio BDA comercial (Batata Dextrose Ágar) para verificar a eficácia da desinfecção superficial das raízes e frutos. Após a assepsia, foram seccionados fragmentos de cerca de 5 mm e estes foram inoculados em meio BDA com adição de ampicilina (75 µg/mL) e crescidos em temperatura ambiente no escuro por 5 dias (Figura 6).

Figura 6: Isolamento dos fungos de porções de órgão subterrâneos e reprodutivos de P. schenckii. Desinfestação superficial dos órgãos (A), amostra vegetal (B) e fragmentos inoculados em meio de cultura BDA (C). ra – raiz; h – haste; fr – fruto. Barra de escala – 2cm.

Em um segundo momento, a metodologia foi modificada quanto ao tempo de lavagem dos fragmentos em hipoclorito de sódio (2% de cloro ativo), seguindo o tempo estipulado por Araújo et al. (2001), de 3 minutos. Em seguida, os fragmentos foram inoculados em meio BDA com adição de ampicilina (75 µg/mL) e crescidos no 26

escuro em temperatura ambiente por 5 dias. Após o período de incubação, as hifas crescidas foram estriadas em meio AA (Ágar Água: 7 g/L de ágar) e mantidas em temperatura ambiente e no escuro. Após 3 dias, fragmentos do meio AA contendo o micélio fúngico crescido foram inoculados no centro de placas de BDA e incubados por 7 dias sob as mesmas condições anteriormente descritas. Os fungos isolados foram armazenados em óleo mineral e estocados.

Análise da frequência de isolamento Para calcular a frequência de isolamento (FI) de fungos foi realizado o cálculo descrito em Araújo et al. (2014) que consiste em avaliar o número de fragmentos vegetais que apresentaram crescimento fúngico em relação ao número total de fragmentos amostrados, como ilustrado abaixo:

FI = Número de fragmentos com crescimento fúngico Número total de fragmentos

Extração de DNA fúngico Para a identificação dos fungos isolados foram feitas extrações de DNA no Laboratório de Fisiologia Molecular de Plantas do departamento de Biologia Vegetal (IB - UNICAMP). Para tal, foi utilizada a metodologia de extração de DNA total de fungos descrita em Reader & Broda (1985), com modificações de Araújo et al. (2014). Inicialmente, os fungos do estoque foram crescidos em meio BD (Batata- Dextrose) em agitador sob 150 rpm à uma temperatura de 26 ºC por 3 semanas. Porém, em um segundo momento, a metodologia foi adaptada de Araújo et al. (2014) quanto ao meio de cultura utilizado. Os fungos passaram, então, a ser inoculados em meio BDA e crescidos por 14 dias em temperatura ambiente. O micélio fúngico crescido foi raspado da superfície do meio de cultura, triturado em nitrogênio líquido e aproximadamente 200 mg do micélio triturado foi transferido para tubo de 2 mL. Ao tubo, foi adicionado 1 mL de tampão de extração (1% de SDS, 25 mM de EDTA, 250 mM de NaCl e 200 mM de Tris-HCl [pH 8,0]), agitado em vórtex e incubado a 65 ºC por 20 min. A solução foi centrifugada a 10000 xg por 10 min a 4 ºC e o sobrenadante foi transferido para novo tubo contendo 800 µL de fenol. A suspensão foi homogeneizada por inversão e centrifugada a 10000 xg 27

por 10 min a 4 ºC. O sobrenadante foi transferido para novo tubo e a ele foi acrescentado 400 µL de fenol e 400 µL de clorofórmio (1:1). A solução foi homogeneizada por inversão e centrifugada a 10000 xg por 10 min a 4 ºC. A fase superior foi transferida para novo tubo contendo 800 µL de clorofórmio, homogeneizada por inversão e centrifugada a 10000 xg por 10 min a 4 ºC. O sobrenadante foi transferido para novo tubo e 450 µL de isopropanol foi adicionado. A solução foi homogeneizada por inversão, incubada por 5 min em temperatura ambiente e centrifugada a 10000 xg por 5 min a 4 ºC. O sobrenadante foi descartado e o precipitado (DNA) foi lavado com 500 µL de etanol 80%. Após ser centrifugado a 10000 xg por 5 min a 4 ºC, descartou-se o etanol, o DNA é seco a 37 ºC por 30 min e, finalmente, ressuspendido em 40 µL de água milliQ autoclavada por 12 h em geladeira (over night). A suspensão de DNA foi quantificada em espectrofotômetro (Nanodrop 2000c) e estocada em freezer à -20 ºC.

Amplificação de fragmento de DNA Para a amplificação do fragmento de interesse, foi realizada a amplificação da região ITS1-5,8S-ITS2 com o uso dos iniciadores ITS1 (5’- TCCGTACCTCAACCTGCGG-3’) e ITS-4 (5’-TCCTCCGCTTATTGATATGC-3’) (White et al. 1990). A reação da polimerase em cadeia (PCR) foi realizada com 3,7 mM de MgCl2, 1 mM de cada dNTP, 0,4 µM de cada iniciador, 2,5 U de Taq DNA polimerase, Tampão 1 X, 5 ng de DNA num volume final de 50 µL. A região ITS1- 5,8S-ITS2 do rDNA foi amplificada por 24 ciclos de reação do PCR com desnaturação inicial de 4 min a 94 °C, seguido de 24 ciclos de 30 seg a 94 °C, 1 min a 55 °C; 30 seg a 72 °C, e uma extensão final de 7 min a 72 °C em termociclador (Peltier Thermal Cycler 200, MJ Research). O produto das reações foi analisado em gel de agarose (1% p/v) juntamente com o marcador de peso molecular 1 Kb/100pb DNA (Invitrogen).

Identificação dos fungos Para identificação dos isolados, os fragmentos da região ITS1-5, 8S-ITS2 do rDNA amplificadas (400 pb) foram sequenciados na empresa Macrogen (Coréia do Sul) e as sequências obtidas foram utilizadas para identificação filogenética no banco de dados do NCBI (National Center for Biotechnology Information – www.ncbi.nlm.nih.gov), através do Blastn. 28

Germinação simbiótica Para os ensaios de germinação simbiótica, frutos de duas populações isoladas de P. schenckii foram superficialmente desinfetados de acordo com metodologia descrita em Pereira et al. (1993) e Araújo et al. (2001). Após desinfecção, os frutos foram seccionados e as sementes foram retiradas. As sementes foram desinfestadas por imersão em hipoclorito de sódio (1% de cloro ativo) por 7 minutos e 3 lavagens com água destilada autoclavada. As sementes foram inoculadas em placa contendo meio Ágar Aveia (OMA – Oat Meal Agar – 4 g/L de aveia triturada e 10 g/L de ágar [pH 6,0]), seladas e incubadas em temperatura ambiente no escuro. Em testes posteriores, as sementes passaram a ser inoculadas sobre fragmentos de papel filtro dispostos no meio de cultura, como sugerido por Zettler (1997), e a concentração do meio Ágar Aveia foi alterado para 2 g/L de aveia. Cada placa foi inoculada com o micélio de um fungo isolado da raiz ou do fruto de P. schenckii, as placas foram seladas e incubadas no escuro em temperatura ambiente. As sementes foram transferidas mensalmente para novas placas contendo meio Ágar-Aveia, analisadas periodicamente e o desenvolvimento do protocormo foi classificado de acordo com seu tamanho, em 5 fases (Figura 7).

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Figura 7: Teste de germinação simbiótica. Frutos maduros de P. schenckii (A), secções de frutos para exposição das sementes (B) e semente já desinfestadas e inoculadas sobre fragmento de papel filtro em meio de cultura Ágar-Aveia (C). Barra de escala: 1cm.

Germinação assimbiótica Para a germinação assimbiótica, foi utilizada a mesma metodologia de desinfestação das sementes descrita para o experimento de germinação simbiótica. O meio de cultura utilizado foi o MS proposto por Murashige & Skoog (1962), com modificações. A concentração de micro e macronutrientes foi reduzida pela metade e o meio suplementado com 30 g/L de sacarose e 0,5 mg/L de ácido nicotínico, 0,5 mg/L de piridoxina HCl, 0,1 mg/L de tiamina HCl, 2,0 mg/L de glicina e 100 mg/L de mio-inositol [pH 6,0]. As placas foram seladas, incubadas no escuro em câmara de crescimento a 27 ºC e analisadas periodicamente.

Experimento de semeadura e recuperação de sementes Para o teste de germinação in situ, foi utilizada metodologia proposta por Rasmussen & Whigham (1993). Vários frutos maduros de uma população de P. shenckii foram colocados dentro de pequenos pacotes confeccionados em nylon, cujos poros permitem a passagem de água e nutrientes e mesmo de alguns 30

organismos do solo, como bactérias e hifas de fungos filamentosos. Após serem devidamente selados, os pacotes foram amarrados a uma estaca fixada ao solo e enterrados superficialmente sob a serapilheira em uma região no NSV do PESM, na Trilha do Poço do Pito, próximos a mesma população de plantas de sua origem (Figura 8). Os frutos enterrados foram monitorados e recuperados periodicamente para análise da germinação das sementes.

Figura 8: Instalação do experimento de Semeadura e Recuperação de sementes in situ (A), pacotes de nylon contendo frutos da espécie sendo selados (B) e pacotes enterrados e presos à estaca por fios de arame (seta) (C).

Análises anatômicas e ultraestruturais Os estudos anatômicos foram realizados no laboratório de Anatomia Vegetal do Departamento de Biologia Vegetal da UNICAMP e os vouchers foram depositados no “Herbário UEC” da Universidade Estadual de Campinas (código do voucher: 196921).

Microscopia eletrônica de transmissão (MET) Amostras de protocormos em diferentes tamanhos, assim como amostras das estruturas enterradas em campo, foram fixadas em glutaraldeído 2,5 % em 31

tampão cacodilato de sódio 3% (pH 7,25) durante 24 horas a 4 °C. A pós-fixação foi realizada com tetróxido de ósmio (OsO4) 1,0 % aquoso por 12h a 4 ºC. Foram, então, realizadas lavagens em água destilada por três vezes e desidratadas em série etílica crescente. Após a desidratação, as amostras foram embebidas em resina acrílica hidrofílica LR White® “Hard Grade” (EMS) e polimerizadas em cápsulas de gelatina em estufa a 60ºC por 12h. As secções ultrafinas foram contrastadas com acetato de uranila (Watson, 1958) e citrato de chumbo (Reynolds, 1963) e examinadas ao microscópio eletrônico de transmissão Philips EM 100 operado a 60 Kv do Laboratório de Microscopia Eletrônica do Instituto de Biologia da UNICAMP.

Microscopia de luz (ML) Para análise das estruturas anatômicas dos protocormos, amostras de diferentes tamanhos foram processadas assim como nas análises de MET, as secções ultrafinas foram coradas com azul de toluidina 0,05% (Sakai, 1973) em tampão fosfato e citrato pH 4,5 e analisadas em microscópio de luz. Para a documentação dos resultados foi realizada a captura de imagens usando câmera de vídeo Olympus DP71 acoplada ao microscópio Olympus BX 51.

Microscopia eletrônica de varredura (MEV) Para investigar a ultraestrutura das amostras, protocormos em diferentes fases e frutos enterrados no campo foram selecionados e fixados em solução de Karnovsky (Karnovsky, 1965). Após a fixação, as amostras foram desidratadas em série etílica e secas pelo método do ponto crítico com CO2 no equipamento Balzers (Modelo CPD 030). Em seguida, o material foi montado em suportes metálicos e recoberto com ouro coloidal por 220 segundos no equipamento Bal-Tec (Modelo SCD 050). A análise e o registro eletromicrográfico foram realizados no microscópio eletrônico de varredura LEO (Modelo VP 435) operado a 20 kV, no Instituto de Biologia da UNICAMP.

RESULTADOS

Material vegetal 32

As plantas permanecem subterrâneas durante quase todo o seu ciclo de vida, com exceção de sua fase reprodutiva, quando ocorre o surgimento de haste floral acima do nível do solo e o posterior desenvolvimento das flores e dos frutos, que ocorre aproximadamente entre os meses de novembro e março. Durante a análise do material vegetal, hifas fúngicas puderam ser observadas no interior dos frutos maduros de Pogoniopsis schenckii, em contato com suas sementes. Tal relato forneceu embasamento ao isolamento de fungos endofíticos desse órgão, para investigar seu papel na germinação das sementes da planta.

Isolamento dos fungos e análise da frequência de isolamento Foi realizado um total de três experimentos de isolamento, em diferentes fases do desenvolvimento das plantas. Inicialmente, o material vegetal utilizado para o isolamento foram porções de raízes de duas populações de P. schenckii, TG do NVG e TP do NSV, utilizando a metodologia de desinfestação superficial modificada de Pereira et al. (1993) e Araújo et al. (2001), com o intuito de aumentar a eficiência da desinfestação (5 minutos em hipoclorito). No entanto, esse primeiro experimento resultou no isolamento de 15 fungos apenas da população da TG com uma frequência de isolamento (F1) de 12,5%. Portanto, em um segundo isolamento, foi utilizada a metodologia dos autores sem a modificação para o isolamento das raízes da planta (3 minutos em hipoclorito). Neste experimento foi obtida uma FI de 38,8% para a população da TPP e 41,6% para a TP, ambas do NSV, e um total de 18 fungos foram isolados das populações. Devido à maior frequência de isolamento (FI) obtida no segundo experimento, a metodologia sem modificação foi adotada para um terceiro isolamento. Neste isolamento, porções de fruto e haste floral de indivíduos do NSV foram utilizadas sem discriminar as populações, obtendo 100% de FI para ambos os órgãos (Tabela 1).

Tabela 1: Resultados da Frequência de Isolamento (FI) de fungos endofíticos para as três populações de P. schenckii. Legenda: TG/NVG – Trilha do Garcez/Núcleo Vargem Grande; TP/NSV – Trilha do Pirapitinga/Núcleo Santa Virgínia; TPP/NSV – Trilha do Poço do Pito/Núcleo Santa Virgínia.

Órgão Local Metodologia Frequência de Data de vegetal Isolamento (FI) Coleta Raiz TG/NVG Modificada 5/40 = 12,5% 08/12/2015 Raiz TP/NSV Modificada 0/20 = 0% 08/12/2015 33

Raiz TPP/NSV Original 7/18 = 38,8% 31/01/2016 Raiz TP/NSV Original 10/24 = 41,6% 31/01/2016 Fruto TP+TPP/NSV Original 6/6 = 100% 26/03/2016 Haste TP+TPP/NSV Original 8/8 - 100% 26/03/2016 Floral

Foram isolados 19 fungos dos frutos e 16 das hastes florais de P. schenckii. Nenhuma das metodologias apresentou contaminação fúngica na água da última lavagem. Os isolados fúngicos foram purificados e armazenados, somando um total de 68 fungos de todas as populações e diferentes órgãos vegetais (Figura 9; Tabela 2).

Figura 9: Diversidade morfológica dos isolados fúngicos da raiz (A), fruto (B) e haste floral (C) de P. schenckii.

Tabela 2: Relação do banco de fungos isolados dos diferentes órgãos e populações de P. schenckii. Legenda: TG/NVG – Trilha do Garcez/Núcleo Vargem Grande; TP/NSV – Trilha do Pirapitinga/Núcleo Santa Virgínia; TPP/NSV – Trilha do Poço do Pito/Núcleo Santa Virgínia.

Código do Isolado de Localidade Data de Coleta Fungo F01 até F15 Raiz TG/NVG 08/12/2015 F16 até F21 Raiz TPP/NSV 31/01/2016 F22 até F33 Raiz TP/NSV 31/01/2016 F34 até F52 Fruto TP+TPP/NSV 26/03/2016 F53 até F68 Haste Floral TP+TPP/NSV 26/03/2016

Extração de DNA fúngico 34

Ao serem crescidos em meio líquido BD, os fungos se mostraram como estruturas globulares disformes similares a grumos boiando no meio de cultura, não sendo possível comparar sua morfologia e sequer garantir a ausência de contaminantes do material. Portanto, os fungos passaram a ser cultivados em meio de cultura sólido BDA, onde puderam ser identificados e as placas analisadas em relação à contaminação externa. Tal modificação da metodologia não impossibilitou as extrações de DNA. Todos os 68 isolados fúngicos foram submetidos ao processo de extração de DNA e as amostras resultantes foram quantificadas em espectrofotômetro NanoDrop 2000. De acordo com as análises, as extrações geraram amostras com concentrações de ácidos nucleicos variando de 671,6 ng/µL até 20.558,4 ng/µL.

Amplificação de fragmento de DNA Amostras de DNA dentro dos parâmetros foram amplificadas através da reação em cadeia da polimerase (PCR - Polymerase Chain Reaction), porém sem sucesso para a grande maioria delas, ou 76,47% das amostras. Em um segundo momento, as amostras passaram a ser diluídas com base na concentração do DNA extraído. Tais diluições se mostraram promissoras e a intensidade na diluição das amostras foi diretamente proporcional ao sucesso na amplificação do fragmento do gene de interesse. Ou seja, quanto maior a diluição maior o número de amostras amplificadas na PCR e, no geral, diluições acima de 20:1 foram bem sucedidas. As diluições de 10:1, 20:1, 30:1 e 50:1 foram testadas em sequência crescente e algumas amostras não geraram resultados no PCR mesmo na maior diluição testada. Até o momento, cerca de 50 amostras foram amplificadas e novos testes serão realizados com diluições maiores (Figura 10).

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Figura 10: Imagens de gel do produto de PCR de amostras de DNA extraídas dos isolados fúngicos. Primeiro gel com apenas 12/51 amostras amplificadas (A) e resultados do PCR de testes posteriores com amostras diluídas (B e C).

Identificação dos fungos Foram identificados 45 isolados, todos pertencentes ao filo Ascomycota. Dentre os fungos isolados das raízes, foram encontrados os gêneros Xylaria sp. (7 isolados) e Coniochaeta sp. (4 isolados) como endofíticos em indivíduos de P. schenckii de população da TG do NVG e apenas o gênero Tricoderma sp. (14 isolados) para indivíduos das TP e TPP do NSV. Já para porções de haste floral e fruto de indivíduos das duas trilhas do NSV, foram reportados os gêneros Fusarium sp. (7 isolados), Clonostachys sp. (5 isolados) e Colletotrichum sp. (7 isolados) para ambos os órgãos (Tabela 3).

Tabela 3: Identificação dos fungos endofíticos isolados de P. schenckii.

Gêneros Isolados fúngicos identificados

Xylaria sp. F04, F05, F06, F07, F08, F09 e F15.

Coniochaeta sp. F10, F11, F13, F14. 36

Trichoderma sp. F16, F17, F18, F19, F23, F24, F25, F26, F27, F28, F30, F31, F32, F33.

Fusarium sp. F34, F35, F37, F40, F51, F55, F58.

Clonostachys sp. F38, F39, F43, F48, F60.

Colletotrichum sp. F41, F42, F45, F46, F49, F52, F53.

Teste de germinação simbiótica Em um primeiro teste, com início em abril de 2016, foram selecionados aleatoriamente um total de 18 fungos isolados das raízes e 13 fungos isolados dos frutos de P. schenckii para serem inoculados com as sementes de duas populações da espécie, TP e TPP do NSV. Após cerca de 20 dias de incubação das placas foi possível observar rompimento do tegumento externo das sementes de ambas as populações na presença de 4 isolados fúngicos das raízes de 6 dos frutos (Figura 11).

Figura 11: Primeiro experimento de germinação simbiótica. Placa com fungo F22 isolado de raiz (A) e sementes da placa com 20 dias apresentando rompimento do tegumento externo (B). Barra de escala - 200µm.

Aos 40 dias de experimento, outros dois fungos, um de raiz e outro de fruto, foram capazes de proporcionar o rompimento do tegumento externo das sementes também de ambas as populações (Tabela 4). Neste teste, foi utilizado o meio de cultura OMA com concentração de 4 g/L de aveia e as sementes não foram transferidas de placas em nenhum momento. Sob essas condições, os fungos cresceram de maneira acentuada, e os nutrientes do meio de cultura provavelmente 37

foram esgotados em pouco tempo (Figura 12). As sementes incubadas sob estas condições foram consumidas pelos fungos após cerca de 90 dias, restando apenas fragmentos do tegumento externo que puderam ser observados em lupa. E além do rompimento da testa, nenhuma outra evolução em seu desenvolvimento foi observada durante o período.

Tabela 4: Fungos isolados de P. schenckii que proporcionaram o rompimento do tegumento externo da semente da orquídea.

População de Fungos Efetivos Isolado de: origem

F16, F21, F22, F25, F32 Raiz NSV

F34, F37, F38, F39, F40, F43, Fruto NSV F44

Figura 12: Placas apresentando crescimento fúngico exagerado no meio de cultura ágar-aveia 4 g/L. As sementes não são visíveis e projeções verticais das hifas formando estruturas aéreas podem ser observadas (A e B).

Um segundo experimento foi realizado e a metodologia foi reajustada quanto à concentração do meio para 2g/L de aveia e as sementes foram transferidas a cada 30 dias. Esta metodologia modificada limitou o desenvolvimento dos fungos, permitindo seu crescimento de maneira controlada e garantindo fornecimento estável de nutrientes a eles. O experimento foi iniciado em outubro de 2016, também com as sementes superficialmente desinfestadas das mesmas duas populações anteriormente identificadas e utilizando apenas os fungos que proporcionaram 38

rompimento da testa das sementes no primeiro experimento. Foram mantidas placas com sementes em meio de cultura aveia sem inoculação de fungos para fins de controle. De um total de 12 fungos, 5 isolados de raiz e 7 do fruto, mudanças visíveis no desenvolvimento dos protocormos após o rompimento do tegumento externo ocorreram apenas na presença de 2 deles, F38 e F39, ambos fungos isolados dos frutos de P. schenckii. O experimento já alcançou os 13 meses, apresentando mudanças mínimas apenas no tamanho dos protocormos. A identificação molecular de 6 fungos efetivos na germinação já foi realizada, compreendendo os gêneros Trichoderma sp. (F16, F25 e F32), Fusarium sp. (F34, F37 e F40) e Clonostachys sp. (F38, F39 e F43). As sementes maduras de P. schenckii possuem formato arredondado, levemente afunilado em uma das extremidades. Seu tegumento externo é extremamente rígido e de coloração marrom escuro. Na fase inicial da germinação, a semente passa por um leve inchaço acompanhado do clareamento da coloração do tegumento externo, mudanças quase imperceptíveis. Após essa etapa, ocorre o rompimento da testa e o protocormo passa a aumentar seu tamanho a uma taxa de crescimento bastante lenta, assumindo um formato levemente alongado. As diferentes fases do desenvolvimento do protocormo de P. schenckii foram classificadas em relação ao seu tamanho de acordo com a Figura 13. 39

Figura 13: Sementes inoculadas com isolado fúngico F38, do fruto de P. schenckii, com cerca de 5 meses de incubação. Sementes apresentando inchaço e rompimento do tegumento externo (A e B) e posterior crescimento e desenvolvimento dos protocormos após rompimento da testa (setas) (C, D, E e F). Barra de escala - 200 µm.

Durante os testes, foi observado o aparecimento de estruturas disformes com crescimento vertical, possivelmente tratando-se do início da formação de corpos de frutificação do isolado fúngico em cocultura com as sementes (Figura 14).

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Figura 14: Estrutura com crescimento vertical (A), possível início da formação do corpo de frutificação fúngico. Estrutura em corte transversal (B) e detalhe (C).

Teste de germinação assimbiótica Nenhuma alteração foi observada nas sementes durante todo o período de incubação das placas, que levou cerca de 15 meses, sugerindo a ineficiência da germinação na ausência de fungos e sob tais condições de cultivo.

Experimento de semeadura e recuperação de sementes A instalação do experimento ocorreu no início de 2016, no final do mês de abril, e coincidiu com um longo período não convencional de baixa precipitação na região do PESM que compreende os NVG e NSV, e que durou até meados de outubro (observações do grupo de pesquisa). Tais condições climáticas podem ter comprometido os dados nos primeiros meses de experimento. Duplicatas dos pacotes de sementes foram recuperadas a cada mês e nenhuma alteração visível sob lupa foi observada até os 8 meses de experimento. Os últimos meses de coleta de pacotes, entre dezembro de 2016 e março de 2017, permitiram a visualização de estruturas alongadas surgindo desde o interior dos frutos enterrados (Figura 15). Tais estruturas apresentam epiderme de aspecto similar ao das raízes de indivíduos adultos de P. schencki e a presença de gemas laterais, com uma de suas extremidades afunilada e outra arredondada.

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Figura 15: Fruto recuperado no início de janeiro de 2017 apresentando projeções em crescimento desde seu interior (A) e estrutura alongada retirada do interior do fruto enterrado (B). Barra de escala – 1mm.

Próximo à extremidade afunilada é possível observar tricomas similares aos pelos absorventes em raízes e a porção arredondada possui muitos tricomas tectores de aparência rígida (Figura 16). Análises anatômicas da estrutura foram realizadas para a confirmação de sua origem e um novo experimento foi instalado em abril de 2017.

Figura 16: Estrutura provinda do interior de fruto recuperado no final de março de 2017, após cerca de 330 dias da instalação do experimento (A), base arredondada apresentando tricomas abundantes, bastante semelhante a um protocormo (B), projeções laterais, onde haviam antigas gemas (C) e tricomas semelhantes à pelos absorventes próximos ao ápice afunilado (D). Barra de escala – 1cm.

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Microscopia eletrônica de varredura As diferentes fases do desenvolvimento das sementes incubadas com o isolado F38 foram analisadas em microscopia eletrônica de varredura. As sementes possuem formato oval e tegumento externo ondulado, em seu estágio de germinação inicial é possível observar a proliferação de hifas fúngicas exclusivamente na região funicular das sementes, assim como visto na experimentação in situ. Em sequência, as sementes aumentam seu tamanho e o tegumento externo rompe (Figura 17).

Figura 17: Sementes de P. schenckii em diferentes fases de desenvolvimento, na presença do fungo F38, em microscopia eletrônica de varredura. Início do desenvolvimento (A), sementes com tegumento externo começando a rachar (setas) (B e C) e detalhe da rachadura do tegumento da semente (D).

O protocormo fica exposto, totalmente recoberto por hifas e inicia-se, então, o desenvolvimento de tricomas tectores. Nessa fase, o protocormo segue aumentando de tamanho, tomando uma forma alongada e escassos tricomas tectores podem ser observados (Figura 18). O crescimento de hifas permitiu apenas 43

a visualização parcial da grande maioria dos protocormos, dificultando a análise das amostras e coleta de dados.

Figura 18: Protocormos inoculados com fungo F38. Tegumento externo rachado e protocormo recoberto por hifas fúngicas (A e C), detalhe do início da formação de tricoma tector (B). Visão do interior do tegumento externo da semente e tricomas tectores já formados (D). Legenda: hi – hifas; pt – protocormo; te – tegumento externo e tt – tricoma tector.

Frutos recuperados em agosto de 2016, após cerca de 100 dias da instalação do experimento de germinação in situ, foram processados e analisados em microscopia eletrônica de varredura. Foram encontradas sementes com tegumento externo ainda intacto, sem nenhuma rachadura, assim como o crescimento de hifas fúngicas no interior dos frutos. A presença de pequenas estruturas ovais, várias vezes menores que as sementes, também foram observadas (Figura 19A). Tais estruturas encontram-se aparentemente ligadas as hifas, podendo tratar-se de estruturas fúngicas. Também é possível notar o crescimento preferencial dos fungos filamentosos em direção á região funicular das sementes, formando um aglomerado de hifas nesta região (Figura 19A-B).

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Figura 19: Interior de fruto com cerca de 100 dias de semeadura em campo. Sementes intactas, estruturas ovais ligadas às hifas (setas) e crescimento abundante de hifas na região funicular das sementes (asteriscos pretos) (A). Detalhe da região funicular das sementes, com aglomerado de hifas e detalhe do funículo rompido (asterisco branco) (B).

Nas amostras da estrutura alongada encontrada no interior dos pacotes mantidos em campo, foi possível analisar a base arredondada que, por sua vez, possui a superfície bastante irregular e apresenta alguns tricomas em sua extremidade e assemelha-se com as amostras de protocormos coletados das placas de germinação. Em algumas porções de sua extensão, a estrutura possui longos tricomas. Em corte transversal é observado a presença de cilindro vascular central, típico em raiz, com alguns feixes de fibras circundantes (Figura 20).

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Figura 20: Amostra da estrutura encontrada em campo. Base arredondada com alguns tricomas (A) e superfície recoberta por longos tricomas podem ser observados (B). Corte transversal da amostra, onde é possível observar a presença de cilindro central (asteriscos) (C). Detalhe do cilindro central com feixes de fibras (seta) (D).

Microscopia de Luz As análises de protocormos provindos dos ensaios de germinação simbiótica com cerca de 20 dias de incubação com o isolado F38, do gênero Clonostachys, permitiu a constatação de que as células vegetais estavam vivas e intactas, além de ser possível observar escarificações no tegumento externo das sementes. Porém não foi encontrado indício da formação de pelotons ou mesmo do crescimento de hifas no interior das células do protocormo. As células vivas, ainda na fase inicial de diferenciação, apresentam inúmeros vacúolos amplamente distribuídos em seu interior. Ademais, as secções transversais permitem constatar uma grande massa de hifas fúngicas ao redor das sementes (Figura 21).

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Figura 21: Sementes Pogoniopsis schenckii após 20 dias em cocultura com o isolado F38 (Clonostachys sp.). Células vivas do protocormo e escarificações do tegumento externo podem ser observadas (A e B). Barra de escala: 20µm.

Após a fase 5, não foi mais observado o crescimento do protocormo, que passou a ser degradado pelos fungos. No lugar, um aglomerado de hifas fúngicas foi encontrado ocupando todo o interior do protocormo e expandindo-se para além do tegumento externo das sementes, formando estruturas massivas (Figura 22). Acredita-se que em algum momento do desenvolvimento, as estruturas do protocormo foram degradadas e absorvidas pelo fungo inoculado, mesmo nas placas onde as sementes estavam sendo transferidas para novos meios de cultura mensalmente. Nesse período, os fungos iniciam a formação dos corpos de frutificação como descrito anteriormente.

Figura 22: Emaranhado massivo de hifas crescendo desde o interior dos protocormos em cocultura com o isolado F38 (A e B). Em evidência, resquícios do tegumento externo que, anteriormente, envolvida as sementes (setas).

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Microscopia eletrônica de transmissão Nas análises de microscopia eletrônica de transmissão dos protocormos resultantes dos testes de germinação simbiótica em diferentes fases, foi possível constatar a presença de células vegetais íntegras. Como observado em microscopia de luz, a superfície do protocormo fica recoberta por uma massa de hifas fúngicas (Figura 23A) e um pouco abaixo da superfície é encontrado fragmentos do tegumento externo rompido (Figura 23B). As hifas apresentam diversas estruturas com padrões distintos, sendo algumas hifas repletas de conteúdo citoplasmático denso e outras com aparente ausência de conteúdo. As células do protocormo encontradas possuem o núcleo e a parede celular intactos e estruturas fúngicas foram encontradas ocupando boa parte do interior das células, sendo inúmeras vezes menores que as primeiras (23C-D). Não foi observada a formação de pelotons pelo isolado fúngico do gênero Clonostachys, que foi inoculado em cocultura com os protocormos. Como esperado, não foi observada a presença de características comuns ao filo Basidiomycota nas hifas encontradas, sendo ausentes os clamp-connections e doliporos, assim como os parentossomos (Figura 23E-F).

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Figura 23: Protocormo de Pogoniopsis schenckii em análise de microscopia eletrônica de transmissão. Visão geral da superfície do protocormo recoberto por hifas (A) e detalhe do tegumento externo rachado logo abaixo da superfície (B). Célula viva do protocormo (C), detalhe da célula com núcleo evidenciado e hifas em corte transversal em seu interior (D). Hifas em corte longitudinal e transversal (E), detalhe do septo de célula fúngica (F). Legenda: hi – hifas; te – tegumento externo; nu – núcleo; pc – parede celular; se – septo.

DISCUSSÃO

Comunidade endofítica e micorrízica Neste estudo, foi caracterizada, pela primeira vez, a comunidade de fungos endofíticos da espécie mico-heterotrófica Pogoniopsis schenckii. Todos os fungos isolados tanto de raiz, haste floral e fruto são pertencentes ao filo Ascomycota e estão agrupados no táxon Sordariomycetes. Segundo Ma et al. 49

(2015), os fungos da classe Sordariomycetes são comumente encontrados como endófitos em orquídeas e cerca de 39 gêneros já foram reportados como endófitos não micorrízicos. De acordo com Oliveira et al. (2014), pode ser difícil especificar os papéis ecológicos de fungos endofíticos pertencentes a algumas ordens, como Hypocreales e Phyllachorales (Trichoderma e Colletotrichum), uma vez que existem várias possíveis relações entre essas ordens e suas plantas hospedeiras. Tais interações podem englobar relações de simbiose, mutualismo, antagonismo ou mesmo ligeiramente patogênicas (Arnold, 2007). Sendo assim, é necessário analisar cada fungo isoladamente para poder esclarecer seu verdadeiro papel na interação com a planta (Oliveira et al., 2014). Os gêneros isolados das raízes de P. schenckii demonstraram divergência entre a população do Núcleo Vargem Grande (NVG) em relação às populações do Núcleo Santa Virgínia (NSV), onde para o primeiro foram reportados os gêneros Xylaria e Coniochaeta e para o segundo, apenas Trichoderma. Segundo Ma et al. (2015), e como também foi observado neste estudo, a diversidade de fungos endofíticos não-micorrízicos de orquídeas estaria mais relacionada com as localidades de onde as orquídeas teriam sido coletadas do que com outros fatores fisiológicos ou fenotípicos, podendo variar de população para população em detrimento das diferenças geográficas entre elas. Análises com outras populações da espécie podem indicar se essa variação se mantém. Para orquídeas verdes da Mata Atlântica já foram encontrados fungos pertencentes ao filo Basidiomycota, como os potencialmente micorrízicos das ordens Sebacinales e Cantharellales e endófitos de Ascomycota, como Trichoderma sp. e Colletotrichum sp., descritos em Oliveira et al. (2014), além dos gêneros Ceratorhiza e Ephulorhiza reportados em estudo de conservação realizado por Pereira et al. (2005). Alguns fungos micorrízicos podem não ser capazes de se desenvolver em meio de cultura ou serem isolados com uso de técnicas convencionais, o que explicaria melhor a ausência deles dentre os fungos isolados de P. schenckii. Em seu trabalho, Zelmer et al. (1996) já havia relatado a dificuldade de isolamento dos fungos micorrízicos em Cypripedium acaule e Malaxis monophyllos e, apesar da presença de pelotons nos tecidos das raízes ter sido constatado, nenhum fungo micorrízico foi isolado em seu trabalho. Dentre os fungos não cultiváveis estariam aqueles não relacionados à rhizoctonia, cuja ocorrência seria mais frequente nas orquídeas totalmente micoheterotróficas (Zelmer et al., 1996). O uso de técnicas 50

moleculares com base em métodos independentes de cultivo (Sun & Guo, 2012) poderia solucionar o problema de identificação dos fungos micorrízicos e também dos endofíticos não cultiváveis, abrangendo até mesmo a identificação desses gêneros.

Ensaios de germinação Os isolados F34, F37 e F40, do gênero Fusarium, foram capazes de induzir a germinação das sementes de P. schenckii, o mesmo gênero também já foi reportado na literatura como capaz de proporcionar a germinação das sementes de três orquídeas verdes, Cypripedium reginae, C. parviflorum e Platanthera grandiflora (Vujanovic et al. 2000). Além do mais, outros táxons de Ascomycota também já foram relacionados com a germinação das sementes de orquídeas terrestres pertencentes às tribos Neottieae e Orchideae (Rasmussen, 2015). Apesar dos ensaios de germinação simbiótica in vitro demonstrarem apenas o desenvolvimento inicial do protocormo de P. schenckii, não sendo possível seu desenvolvimento até o estabelecimento da plântula, esse é o primeiro relato da germinação de uma espécie de orquídea mico-heterotrófica e aclorofilada sendo estimulada pela presença de fungos endofíticos não micorrízicos isolados de raiz e, especificamente, de fruto. Evidentemente, as estruturas encontradas dentro dos frutos nos experimentos de semeadura e recuperação de sementes provêm do exterior dos pacotes enterrados, possivelmente tratando-se de raízes de plantas circundantes. Visto que, os abundantes e longos tricomas presentes recobrindo sua superfície são totalmente ausentes nas raízes de P. schenckii, que apresenta poucos tricomas atenuados (dados não publicados - Flores-Borges, D.N.A.). Além do mais, a germinação em Orchidaceae, por via de regra, gera primeiramente o desenvolvimento do protocormo seguido pela formação de estrutura caulinar (Harrison, 1977), diferentemente das estruturas radiculares encontradas dentro dos pacotes de sementes ao longo do experimento. Nos ensaios de germinação in situ realizados por Rasmussen & Whighan (1993), nenhuma das cinco espécies de orquídeas terrestres germinaram antes dos seis meses de experimento e duas delas, Liparis lilifola e Tipularia discolor, não foram capazes de germinar no período de doze meses do experimento, assim como P. schenckii que não foi capaz de germinar em período superior a 18 meses. Durante esse período, as sementes permaneceram entremeadas por hifas dentro 51

dos frutos, mas sem apresentar aumento de volume ou rompimento da testa. Como esperado, a germinação assimbiótica de P. schenckii também não gerou resultados e, até o momento, nenhuma espécie de orquídea mico-heterotrófica foi capaz de germinar dessa maneira, na ausência de fungos (Umata, 1995; Bruns & Read, 2000; McKendrick et al., 2002; Leake et al., 2004; Yagame & Yamato, 2007).

Desenvolvimento do protocormo As interações micorrízicas dentro da família Orchidaceae ocorrem a partir da associação entre táxons específicos de fungos do filo Basidiomycota e as orquídeas (Peterson et. al., 2004). Tal interação pode ser constatada pela capacidade do fungo em proporcionar a germinação das sementes da planta somando-se à sua capacidade em formar pelotons no interior das células vivas da mesma (Peterson et al, 2004; Rasmussen & Rasmussen, 2009). Apesar de proporcionar a germinação das sementes de Pogoniopsis schenckii, não foi observada a formação de pelotons nas células do protocormo pelo isolado F38, do gênero Clonostachys, além de não pertencer aos táxons já relatados como micorrízicos, tratando-se de um Ascomycota. Portanto a interação entre ambos não poderia ser classificada como micorrízica. No entanto, orquídeas micoheterotróficas não são capazes de germinar ou mesmo desenvolverem-se de maneira independente (Rasmussen & Rasmussen, 2009), ainda menos na forma de cultivo no qual as sementes de P. schenckii foram submetidas, em meio de cultura com fonte de carbono complexa e de difícil assimilação (Zettler, 1997). Portanto, assume-se que, efetivamente ocorreu algum grau de associação entre alguns dos isolados fúngicos testados e os protocormos da orquídea, ainda que não seja de natureza micorrízica. Pode ser que, P. schenckii apresente uma forma diferente de associação com seus parceiros fúngicos daquelas já conhecidas até o momento, visto que a ausência de pelotons típicos também foi comprovada para as células das raízes e sistema subterrâneo da espécie (Dados não publicados – Flores-Borges, D.N.A). Além disso, não foram observadas hifas com ansas (clamp-conections), doliporos ou parentossomos, características típicas de Basidiomycota (Roy et al, 2009), tanto nos fungos presentes nas raízes (Dados não publicados – Flores-Borges, D.N.A.), como nos frutos de P. schenckii (Dados não publicados – Alves, M.F.). 52

Fica evidente por meio do presente estudo, a necessidade de mais investigações a respeito do real papel dos fungos endofíticos para as plantas, incluindo aqueles presentes em outros órgãos vegetais que não apenas nas raízes. É difícil, portanto, afirmar se o papel dos fungos endofíticos estudados limita-se ao suporte no desenvolvimento inicial da espécie apenas em curto prazo ou se tal limitação poderia ser corrigida por meio de adequação metodológica. Como, por exemplo, a transferência das sementes em períodos inferiores a 30 dias ou a combinação de mais de um fungo inoculado nas placas de cultivo. Assumindo-se que talvez os nutrientes se esgotem mais rapidamente do que o período testado, e que também possivelmente a planta se associe com diferentes fungos na natureza. Sugerem-se, então, novos estudos para compreender o papel desses fungos tanto na germinação como na manutenção da planta adulta.

CONCLUSÃO

Os fungos endofíticos isolados de diferentes órgãos e populações de Pogoniopsis schenckii pertencem exclusivamente ao filo Ascomycota, sendo que todos os gêneros reportados estão agrupados em Sordariomycetes. A espécie demonstrou ser incapaz de germinar sob a condição assimbiótica, ainda que compostos de carbono simples e diversos outros nutrientes fossem fornecidos às sementes. Os experimentos de germinação simbiótica in vitro mostraram-se promissores na germinação e desenvolvimento inicial do protocormo de P. schenckii onde apenas os fungos isolados dos frutos demonstraram potencial germinativo além do rompimento do tegumento externo das sementes. O desenvolvimento dos protocormos de P. schenckii é bastante lento em testes de germinação in vitro e in situ, assim como relatado para outras espécies.

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ANEXO 1

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ANEXO 2