UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE ADMINISTRAÇÃO, CIÊNCIAS CONTÁBEIS E TURISMO

TECENDO OS FIOS DA MODERNIZAÇÃO DO FUTEBOL ALVIRRUBRO.

MATHEUS MARQUES FALLEIRO

RIO DE JANEIRO 2018

1

MATHEUS MARQUES FALLEIRO

TECENDO OS FIOS DA MODERNIZAÇÃO DO FUTEBOL ALVIRRUBRO.

Projeto de Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Administração da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial de avaliação da disciplina de Projeto de Trabalho de Conclusão do Curso.

ORIENTADORA: Prof. Elza Marinho Lustosa.

RIO DE JANEIRO 2018

2

3

MATHEUS MARQUES FALLEIRO

TECENDO OS FIOS DA MODERNIZAÇÃO DO FUTEBOL ALVIRRUBRO.

Projeto de Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Administração da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial de avaliação da disciplina de Projeto de Trabalho de Conclusão do Curso.

Aprovada em 16 de julho de 2018

BANCA EXAMINADORA

Prof. Elza Marinho Lustosa (Orientadora) UFF - Universidade Federal Fluminense

Prof. Frederico Lustosa UFF - Universidade Federal Fluminense

Prof. Sergio Montalvão UFF – Universidade Federal Fluminense

4

A minha mãe que me deu amor. Ao meu pai que me ensinou. A minha irmã que nos completou.

5

AGRADECIMENTO

Agradeço a professora e minha orientadora Elza Marinho Lustosa que me guiou e ensinou não só neste momento, mas durante a jornada universitária. Aos professores, Frederico Lustosa e Sergio Montalvão especialmente por fazer parte desta banca, e a todo corpo docente, administrativo e diretivo do curso de Administração da Universidade Federal Fluminense. E a UFF que me proporcionou um ambiente de ensino e desenvolvimento.

6

RESUMO

Este trabalho buscou estudar e entender os motivos pelos quais equipes que até a década de 1980 competiam na elite, agora não estão mais presentes no cenário nacional. Assim, tomando o Bangu Atlético Clube como caso a ser avaliado e discutido, a pesquisa conceitua o que seria a “elite” do futebol brasileiro, como se deu o processo de modernização a partir da análise das mudanças das leis que regem o esporte, e quais as relações destes pontos com a história do clube e do futebol em geral.

Palavras-chave: futebol, elite, modernização, Bangu.

7

ABSTRACT

This work sought to study and understand the reasons why teams that until the 1980s competed in the elite are now no longer present on the national scene. Thus, taking the Bangu Athletic Club as a case to be evaluated and discussed, the research conceptualizes what would be the "elite" of Brazilian football, how the modernization process affected thus clubs, based on the analysis of changes in the laws that govern sport, and what are the relationships between these points and the history of the club and the football in general.

Key words: football, elite, modernization, Bangu.

8

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ...... 10 1.2 REFERENCIAL TEÓRICO, NOÇÕES-CHAVE E METODOLOGIA ...... 12 2. DESENVOLVIMENTO ...... 18 2.1. O FUTEBOL BRASILEIRO ...... 18 2.2. PANORAMA GERAL...... 21 2.3. O FUTEBOL CARIOCA ...... 22 2.4. O BANGU ATLÉTICO CLUBE ...... 23 2.5. AS DUAS LEIS ...... 25 2.6. TECENDO OS FIOS DA MODERNIDADE...... 28 3. CONCLUSÃO ...... 31 4. BIBLIOGRAFIA ...... 34

9

1. INTRODUÇÃO

O futebol é a paixão do brasileiro, como disse Nelson Rodrigues, somos a “pátria de chuteiras”. O esporte passou por muitas transformações e fases desde que foi introduzido por Miller em nossas terras. Desde aquele início, grandes clubes surgiram, e com eles, a paixão foi sendo fortalecida. Contudo, alguns destes ficaram pelo caminho, sucumbiram ao processo de modernização e profissionalização, perdendo sua força, mas não sua grandeza. O futebol chegou ao Brasil, sabidamente, há mais de 100 anos, trazido pelo filho de imigrantes ingleses, Charles Miller. Mas, principalmente pelos altos custos para a compra do material, que era importado, o esporte, em seu início, era majoritariamente praticado pela elite, sendo, paulatinamente, apropriado por outros grupos sociais, muito por conta da ligação com as primeiras indústrias do país. Até o início dos anos 20 ainda era praticado de forma segregada e somente a partir dos anos 30 começou e se profissionalizar e internacionalizar. Não é o mesmo “molde”, “conceito”, de profissionalização que observamos hoje, mas já permite o surgimento dos primeiros ídolos da nação. Esse momento coincide com o início da caminhada da Seleção Brasileira nos campeonatos internacionais e culmina no histórico “1950”, em um gol uruguaio que ao mesmo tempo que destruiu um sonho, impulsionou uma paixão. A partir desse momento, até final da década de 1980, uma “arte” brasileira amplamente reconhecida pelo mundo era o futebol. Grandes nomes, incluindo o maior de todos os tempos, surgiram e desfilaram seu talento por aqui. Cada vez mais o brasileiro se envolvia com o esporte, os campeonatos regionais e nacionais se solidificavam e junto, cresciam os clubes, as torcidas, os estádios e a paixão por tudo isso que sempre foi mais que um jogo. No cenário do futebol do Rio de Janeiro, o esporte tem intima ligação com o desenvolvimento dos próprios times locais. Foi no Rio, em clubes com Vasco e Bangu, que o esporte passou a ser praticado por negros, e, sobretudo, passou a ser remunerado. Por outro lado, aqui também temos o exemplo da massificação do futebol através do Flamengo, o clube com a maior torcida do brasil hoje, que teve sua fundação como consequência de uma dissidência entre os elitistas dos Fluminense e aqueles que queriam popularizar o esporte. Além disso, não podemos deixar de

10 destacar também que no Rio foi construído o maior estádio de futebol do pais em 1950. E que equipes épicas de Botafogo, Vasco e Flamengo foram, por vezes, a base da Seleção Brasileira. Além dos quatro grandes clubes, Botafogo, Flamengo, Fluminense e Vasco da Gama, também podemos reconhecer outros clubes que até a década de 1980 tiveram seus momentos de glória, como América, Madureira, Bangu e outros. Isto porque neste momento, o futebol passou por mudanças estruturais as quais racionalizaram e contribuíram para a dessacralização do futebol (HELAL,1990). Agora o esporte, as leis e sua estrutura visavam garantir que economicamente o futebol pudesse se desenvolver, de forma que os clubes deixassem para trás suas tradições e construíssem métodos para acumular e ganhar mais dinheiro com a prática do esporte, transformando-o em um mercado. Desta forma, hoje, muito diferente do seu início no país, o esporte profissional de alta performance movimenta grandíssimas quantidades de dólares ao redor do mundo e é vendido como entretenimento, por meio de diversos canais de distribuição, a quase todos os países. Para manter toda esta rede em funcionamento é necessário, também, um alto investimento. Diversas partes interessadas se colocam como peças fundamentais para a realização dos projetos esportivos. Empresas privadas ou públicas que são patrocinadoras de clubes, investidores, empresas de material esportivo, redes televisivas e mídias em geral, empresas de comunicação e marketing e diversas outras agora também têm seu lugar no que podemos chamar de “novo mercado esportivo”. Com efeito, como resultado do alto investimento, as organizações esportivas e atletas são cobrados por cada vez maiores e melhores resultados. A alta performance, as vitórias e o alto grau de competitividade passaram a se colocar como uma “obrigação”. Com essa mudança, do “futebol arte” para o futebol “moderno”, “mercantilizado”, alguns clubes se fortaleceram e disputam a elite até hoje. Por outro lado, clubes como o Bangu Atlético Clube, em seu início “The Bangu Athletic Club”, fundamental na democratização do futebol, um dos primeiros clubes do Brasil, casa de , melhor jogador da Copa do Mundo Fifa de 1950, entre os melhores times da década de 1980, vice-campeão da “Série A” em 1985, década de ouro do futebol nacional, hoje sofrem para conseguir existir, pagar as contas básicas do dia a dia do clube social. Assim, o processo de mercantilização e modernização pode ter 11 marginalizado times tão tradicionais e ligados a história do desenvolvimento do futebol no Brasil, com a integração dos negros e a popularização do esporte, como o Bangu. Este trabalho, portanto, pretende discutir por que alguns clubes se fortaleceram no processo de modernização do futebol e, sobretudo, por que outros não conseguiram permanecer na elite, deixando de fazer parte do hall dos grandes times. Ou seja, pretende-se responder à questão de por que clubes como Bangu, que fizeram parte da elite, hoje não estão mais presentes no cenário nacional. Partindo da premissa de que há um processo de modernização que acaba por marginalizar alguns clubes que outrora tiveram papel fundamental neste meio, cabe a este trabalho, a partir da análise de um caso, o Bangu Atlético Clube, entender por que ele não consegue mais sustentar os investimentos necessários para disputar em alto nível. Assim o objetivo geral do trabalho é entender a partir do caso do Bangu Atlético Clube, quais os aspectos da modernização do futebol são ou foram determinantes para que alguns clubes tenham se mantido na elite do futebol e outros não. E especificamente, vamos analisar a história do Bangu Atlético Clube sob a ótica do processo de modernização do futebol; e buscar entender quais aspectos fizeram com que alguns clubes deixassem de participar da elite do futebol.

1.2 REFERENCIAL TEÓRICO, NOÇÕES-CHAVE E METODOLOGIA

O futebol como objeto sociológico é um tema amplamente discutido, com isso, este trabalho pretende utilizar dos fundamentos da sociologia do esporte para analisar e discutir, a partir do caso indicado – O Bangu Atlético Clube dentro e a modernização do futebol – em como esse processo atingiu o clube. Podemos observar a apresentação da discussão da relação entre futebol e sociedade em Lustosa da Costa e Marinho (2005), a partir da apresentação de duas valiosas noções: a secularização e a racionalização. Começando com as duas noções básicas: da secularização e da racionalização. A primeira está relacionada com a mudança de ótica do mundo mágico para o mundo racional. Dentro dessa visão, o futebol teria trocado seu caráter mágico, dando lugar ao profissional, mercadológico e regulado por normas internacionais. Já a racionalização, como processo, pode ser percebida através do próprio jogador brasileiro, antes o artista da bola, o mestre do futebol mais vistoso, reconhecidamente

12 o mais habilidoso do mundo, agora é impelido a treinar, saber e executar o futebol tático, físico. A racionalização do esporte se dá na medida que faz com que a habilidade inata seja suplantada por práticas científicas que melhoram a performance profissional, e torna o esporte em um produto do qual se espera alguns resultados pré-definidos. (HELAL, 1990) Além da apresentação destas noções-chave, é fundamental definir e conceituar temas como elite, mercantilização e modernização, para que seja possível analisar o objeto desse trabalho. Para isso, traremos uma breve discussão destes conceitos e a abordagem de alguns autores, dentre os quais serão utilizados como embasamento teórico para o decorrer do texto. Com o objetivo de discutir sobre a elite do futebol apresentaremos brevemente a discussão do tema, presente no âmbito da ciência política, a partir de um apanhado bibliográfico. Muito embora a discussão sobre este tema possa remontar a autores clássicos como Platão, Aristóteles e Maquiavel, começaremos em finais do século XIX, com o filósofo italiano Gaetano Mosca e o seu pressuposto de que desde as sociedades mais antigas e primitivas o poder está sob o controle de uma pequena parte da sociedade e que além disso, a maior parte não teria acesso a ele. Sendo assim, para ele, o grupo que detém o poder político seria dominante por ter simplesmente conseguido organizar melhor seus interesses e alinhar seus objetivos, enquanto os dominados ou governados não conseguiram por qualquer motivo, se articular. Portanto, mesmo existindo também o poder econômico e ideológico a “classe política” seria a elite pelo fato de ser detentora do poder político (GRYNSZPAN, 1996). Já para Vilfredo Pareto, outro pensador liberal, a formação da elite era o produto natural da desigualdade, e mesmo dentro da elite poderiam existir diferentes categorias e interações sociais entre as mesmas. Sendo assim, o processo de sucessão se daria pelos resultados destas relações e disputas sociais. Este seria o que ele chama de “degeneração da elite”, pois mesmo que alguns indivíduos pudessem alcançar a classe governante por hereditariedade, poder e influência política e ou econômica, a falta e habilidade poderia gerar a uma instabilidade social que somente seria reafirmada com uma nova estruturação da classe dominante, o que seria a “circulação da elite” (GRYNSZPAN, 1996). Outro autor que aborda o tema da formação da elite é Robert Michels. Este demonstrou através de estudos sobre a organização de partidos políticos que as 13 massas da organização dentro do processo de burocratização buscam construir um grupo diretivo, com uma hierarquia e regras a serem seguidas para que seja possível se organizarem de fato. Portanto, neste momento seria formada uma elite diretiva que se ocuparia de uma nova função – diretiva – dentro da organização (MICHELS, 1982). Assim, mesmo mantendo a ideia de “governantes e governados”, apontou-se para o fato de que mesmo em grupos que lutam por exemplo pela bandeira da democracia passam pelo processo da elitização. Por fim, para fazermos um contraponto entre a teoria clássica das elites e a visão marxista, convém que façamos como Saes (1994), estabelecendo o “núcleo duro” daquela teoria e depois apontando os desvios existentes. Portanto, ainda como o autor mencionado, o ponto em comum da Teoria das Elites é que existe uma minoria politicamente ativa, e essa minoria sempre fez parte da sociedade, desde tempos primitivos e fará parte eternamente. Com esta tese, como o autor a define, podemos fazer uma comparação com o pensamento marxista de elite. Isto o próprio cientista político faz em dois pontos:

Em primeiro lugar: enquanto na Teoria das Elites a dominação dos processos macro-políticos por minorias sociais é definida como um fenômeno universal, permanente e eterno, na teoria política marxista a existência de minorias dominantes é encarada como um fato histórico, relacionado com a existência da sociedade de classes (vale dizer: um fato inexistente nas sociedades primitivas e suscetível de ser liquidado na época contemporânea através da implantação do socialismo ou, mais precisamente, através da evolução da sociedade socialista para o comunismo). Em segundo lugar: a própria concepção marxista de “minoria politicamente dominante”, existente apenas nas sociedades de classe, é diferente da concepção elitista de “minoria politicamente ativa”, presente em toda e qualquer sociedade humana. A minoria politicamente dominante numa sociedade de classes — isto é, a classe politicamente dominante — é, segundo a teoria política marxista, a classe dos proprietários dos meios de produção (vale dizer, a classe economicamente dominante). (SAES, 1994, p. 9)

Desta forma, a partir de uma apresentação geral da discussão da teoria das elites e sua crítica, para que possamos manejar melhor os conceitos visando o objetivo

14 final do trabalho é imperativo propormos uma simplificação de conceitos. Ou seja, queremos dizer, ao final, que a Teoria das Elites não trata somente do conceito de elite, mas da sua formação, de forças que movem os grupos sociais dentre outras questões, assim como o pensamento marxista não trata da elite, mas sim da relação entre o capital e a força de trabalho, a partir da visão da disputa de classes. Fazer uma conexão da teoria das elites com a noção de elite no futebol Com isso, este trabalho, seguindo a visão de Saes (1994), vai entender como “Elite”, para os pensadores clássicos apresentados, a “minoria politicamente ativa”. E, por outro lado, do ponto de vista marxista, seria a “classe dos que detém os meios de produção”. Seguindo esta definição e trazendo-a para dentro do nosso universo de análise o futebol, o que seria então, a Elite do futebol brasileiro? Se estamos, a partir da ótica clássica, definindo o objeto em questão, seria igual dizer que a elite do futebol é composta pela minoria dos clubes que, por obterem de alguma forma uma força política diferenciada, conseguiram se destacar no cenário nacional, sendo, consequentemente, os tomadores de decisões comuns deste meio. Por outro lado, observando nosso objeto a partir do marxismo, a elite seria, então, o conjunto dos clubes que detém o capital (em substituição do termo “os meios de produção”). Antes de seguirmos para discussão da modernização, convém que discutamos o que entendemos com mercantilismo, que de certa forma guarda uma relação com o que vimos anteriormente. Em termos gerais, em seu sentido histórico, o mercantilismo faz parte de uma conjuntura na qual a Europa do século XV a XVII, passava por uma crise de metal, do ouro e prata o que afetava o bom andamento do comercio consequentemente a formação dos Estados-nacionais. Deste modo, a política mercantilista é baseada em três principais pilares: balança comercial favorável, protecionismo e o pacto colonial (HUNT, 2013). Explicando um pouco melhor o que seriam estes pilares, começamos com o objetivo do mercantilismo buscar uma balança comercial favorável. Assim, os governos, visando a acumulação de metais, tinham como principal objetivo aumentar suas exportações em detrimento das importações o que implica diretamente na retenção da riqueza. Para isso, eles utilizavam principalmente de duas “técnicas” a do protecionismo, que consiste simplesmente em taxações maiores a produtos importados, o que acaba por fazer o produto nacional ser mais barato e mais consumido, e ao pacto colonial, que, por sua vez, está relacionado ao monopólio do 15 escoamento de seus produtos às colônias que se viam obrigadas a consumir e, sobretudo, pagar a conta. Para além do sentido estritamente econômico, então, o nacionalismo e absolutismo são, portanto, as contrapartidas políticas do mercantilismo. O mercantilismo implica a formulação de políticas nacionais, e esse conjunto de doutrinas vislumbra a possibilidade e a necessidade do progresso econômico, que é criado pela ação política do Estado, como fundamento da consolidação do poder nacional. A riqueza, para o mercantilismo, só interessa como fonte de poder do Estado. Mas, diferentemente do pensamento medieval, a investigação sobre a origem da riqueza e as formas de incrementá-la são as principais questões no campo da teoria e da política. (GONÇALVES, 1998) Portanto a partir dessa visão podemos entender o mercantilismo, para além de seu sentido estrito de fato histórico, mas como um conjunto de práticas econômicas que guardam relação com o lado político, a qual seria a consolidação do poder nacional. Ou seja, o fortalecimento de certos Estados nacionais em detrimento de outros, a partir da acumulação de riquezas. Neste sentido o mercantilismo deixa de ser somente objeto da economia e passa a ser também da política. Relacionando, então, esta discussão ao tema do trabalho, concluímos que o mercantilismo seria a criação de uma lógica, uma “lógica de mercado”, na qual o indivíduo “a”, buscando garantir sua soberania em relação a outros indivíduos objetiva ser mais forte economicamente, a partir do processo de acumulação de riqueza. Desta forma, em última análise, tomaremos a lógica de mercado como a busca pela acumulação de riqueza de um indivíduo em detrimento de outros, a qual resulta em sujeitos com mais e menos poder. Por fim chegamos a modernização. Para discutir este tema, em relação ao objetivo do trabalho, primeiramente se faz necessário que sejamos capazes de definir de forma clara o que queremos dizer com isto. Além disso, cabe ressaltar que este é um tema de ampla discussão proveniente de diversos campos de estudo, como a História, a Sociologia, Filosofia entre outros, mas tentando simplificar a discussão podemos, por exemplo, partir da ideia de modernidade de Giddens (1991, p. 11): “O estilo, costume da vida ou organização social, que emergiam na Europa a partir do séc. XVII e que se tornaram mais ou menos mundiais em sua influência”. Sem olvidar que para o próprio o tema ainda é muito mais amplo do que este trabalho se propõe a discutir. 16

O primeiro ponto a destacar é que para este autor, não vivemos em uma época dita “pós-moderna”, mas sim em um momento extremo das consequências que a modernidade nos trouxe. Ou seja, para ele, estas consequências são produto de dois processos principais: as incertezas manufaturadas e a reflexividade. O primeiro tem relação com o fato de que a sociedade em que vivemos está sob um constante risco que é resultante da ação humana sobre a natureza e sobre a sociedade em si. E no segundo o autor traz a discussão de que na modernidade há uma quebra de “tradições” gerada pelo debate reflexivo, o qual deve ser entendido como um propulsionador de uma maior autonomia do sujeito individual. Por outro lado, podemos também nos apoiar em uma visão que distingue “modernidade” e “modernismo” (ANDERSON, 1999). Para ele os modernismos seriam um conjunto de práticas históricas que tiveram lugar no século XX e seriam bem distintas daquelas presentes nos séculos anteriores, mais clássicas ou realistas. Desta forma, é cabível entender que para Anderson a modernidade seria um período histórico no qual que está compreendido dentro de diferentes temporalidades, por assim dizer. De fato, este é um tema muito mais abrangente e rico a ser discutido, seja em termos mais liberais como Giddens propõe, ou com um olhar mais histórico marxista de Anderson. O que este trabalho pretende é tratar de modernidade ou modernização o processo pelo qual os clubes passaram a partir dos anos 50 a partir com a criação de organizações burocráticas governamentais do esporte no Brasil, leis e com o desenvolvimento do mercado de futebol, com o início das atividades de venda e compra de jogadores, e com os maiores investimentos externos, por exemplo da televisão na compra da transmissão de partidas. Assim, após toda a discussão sobre as noções básicas e os referenciais que serão base para este trabalho, nos importa discutir sobre o modelo de trabalho adotado. Deste modo, este trabalho pretende observar o fenômeno indicado anteriormente, a saber: a modernização no futebol que fez com que equipes, como o Bangu Atlético Clube, deixassem de participar da chamada elite do futebol brasileiro, e analisar como ele se deu. Assim serão consideradas algumas variáveis, bem como: variáveis que podem estar ligadas ao próprio clube, como decisões estratégicas ou gerenciais, ou podem estar relacionadas à estrutura do futebol nacional,

17

principalmente como leis, regulamentos e influência das federações e confederação nos clubes. Para isso, primeiramente buscaremos elucidar, a partir de pesquisa bibliográfica, os conceitos chave que se relacionam com o tema do trabalho e o contexto histórico tanto do clube Bangu, quanto do futebol brasileiro em geral. A partir desse momento, apoiado nos autores apresentados, buscaremos descrever o caso estudado e relacioná-lo com as hipóteses apresentadas, verificando a veracidade, ou não, das mesmas. Como fontes, além dos textos e trabalhos acadêmicos relacionados aos temas e conceitos chave, este trabalho se apoiará em documentos oficiais do Bangu Atlético Clube, quanto da Federação do Rio de Janeiro e da Confederação Brasileira que regulamentam o futebol nacional. Também buscaremos textos de leis que se relacionem com o tema proposto de forma que agreguem para a validação ou não das hipóteses testadas. Portanto, de forma qualitativa vamos contextualizar o caso estudado dentro da estrutura do futebol brasileiro e, sobretudo, entender o motivo pelo qual o Bangu não faz mais parte da elite, como fizera um dia, relacionando os conceitos abordados à realidade encontrada de acordo com a análise dos documentos disponíveis.

2. DESENVOLVIMENTO

2.1. O FUTEBOL BRASILEIRO

A “Época de Ouro”, também é abordada por Helal (2002). Ele utiliza esta expressão para recordar o futebol em nosso país entre as décadas de 1930, com o profissionalismo se colocando presente, até a década de 1970 com o tri campeonato mundial. Contudo, para entendermos o movimento de profissionalização de 1933, é necessário compreender que o futebol foi trazido ao país por imigrantes e filhos de imigrantes operários ingleses que chegavam aqui em um momento histórico no qual o Brasil havia recentemente se tornado uma democracia, abolido a escravidão e cada vez mais estava se urbanizando. A própria cidade do Rio de Janeiro passava por imensas obras de urbanismo, o conhecido o “bota-abaixo” de Pereira Passos. Assim, o país estava deixando de ser rural e mudando para ares citadinos. No âmbito do 18 futebol, desde finais de 1800 até, sobretudo 1923, existia um debate acerca do profissionalismo. A data de 1923 é importante porque foi o ano no qual, pela primeira vez, um time que pagava seus jogadores, sendo composto em sua maioria por negros, chegou a campeão do campeonato do Rio de Janeiro. A partir dos anos 30, no cenário nacional, muito mais do que profissional, o futebol começou a se tornar e a ser colocado como parte integrante da formação da identidade do brasileiro. Com a mudança para o Estado Novo, as leis protegendo os trabalhadores e uma nova visão sociológica sobre a miscigenação brasileira o futebol “viralizou” entre os brasileiros (HELAL, Ibid). Nesta época, também contribuiu muito para este resultado o jornalismo esportivo, sobretudo na pessoa de Mário Filho. Essa forma de comunicação através do futebol, que cada vez mais cresce, é acompanhado e amado pelo brasileiro tem reflexos até no governo federal, podendo ser notada no local escolhido para ser palco de um dos discursos de Getúlio Vargas então presidente em 1940, o Estádio de São Januário, casa do Vasco da Gama. (HELAL, Ibid) Mais um sintoma da importância do esporte para o governo é a criação do Conselho Nacional de Desportos, também datado da década de 1940. Assim o futebol se organizava burocraticamente, as equipes se organizavam em federações, que por sua vez estavam submetidas e supervisionadas pela então CDB (precursora da CBF), e esta era normatizada pelo CND. A CND deveria ser um órgão normativo do governo, mas na prática, de acordo com os interesses acaba por interferir nas decisões executivas dos clubes federações. (HELAL, Ibid) Chegamos na década de 1950. Aqui talvez seja o ponto auge da construção da ligação entre o brasileiro e o futebol. O país sediou uma Copa do Mundo, e para isso construiu o chamado “maior palco do mundo”, o Maracanã, oficialmente nomeado de Estádio Mário Filho. Chegou a final do campeonato, mas acabou sucumbindo ao vizinho Uruguai, um momento até hoje caro aos amantes do futebol, inclusive àqueles que nem nascidos eram. Um percalço em um caminho que seria de glórias. O futebol brasileiro começava a brilhar mundialmente, mitos e craques surgiam aos montes e dentre eles uma lenda, o maior de todos os tempos. Nas copas de 1958, 62 e 70 a seleção brasileira parecia demostrar ao mundo que nascemos para isso. Essa era a época de ouro, não só da Canarinho, mas dos clubes que faziam excursões internacionais, jogavam campeonatos fora do país e se sagravam campeões frente à equipes talvez mais poderosas economicamente, mas menos talentosas

19 esportivamente. O futebol nesse momento não era só um esporte como podemos observar na conclusão:

Portanto, a transformação do futebol em “esporte nacional” foi produto de um processo histórico realizado por agentes do universo cultural, político e esportivo, tendo como base uma forte presença do Estado e das ideias nacionalistas. Nesse período, a idéia de “modernizar” o futebol não significava apenas ultrapassar o elitismo amadorista que vigorou nas duas primeiras décadas do século, mas, sobretudo, associar o futebol a domínios mais inclusivos da realidade social brasileira: o Estado Nacional e o povo (HELAL, Ibid., p. 44).

Nas décadas 1950, 60 e 70, os campeonatos regionais se fortaleciam, cada vez um número maior de equipes participava. O que fazia o calendário esportivo ser repleto de partidas e datas ocupadas. Assim, o futebol movimentava mais custos, e demandava mais recursos. Uma saída para esse problema foi, na década de 1960, a criação da loteria esportiva, que visava justamente levantar fundos para a operacionalização do esporte, e também a criação do campeonato que conhecemos hoje como Campeonato Brasileiro, ou Brasileirão. A partir de 1970 o futebol brasileiro começava a passar por uma mudança estrutural. Novas leis que afetavam a organização das federações, como a Lei n˚ 6.251 que institucionalizava o voto unitário nas federações e concedia um poder grande a clubes sem expressão, resultando em uma disputa política pelos votos dos clubes do interior. Uma nova conjuntura de modernização do futebol internacional, em termos empresariais e o calendário inchado dos clubes, que participavam basicamente de dois campeonatos - os regionais e o nacional. Os campeões de um ano ainda jogavam de campeonatos internacionais no ano subsequente-. Isso tudo concorria para que o futebol, neste momento, começasse a viver uma crise. Assim, a partir deste momento os clubes começaram a ter que refazer suas contas, só jogar futebol não bastava mais, o clube precisava pagar as contas, os salários, os custos e tudo que fosse necessário para pudesse seguir competindo. Como consequência, a partir de 1980 nossos melhores jogadores começaram a ser contratados por times do exterior, e a principal matéria prima do espetáculo já não

20 estava mais em nossos domínios. Com isso, a média de público nos estádios caía sensivelmente, o que agravava ainda mais o cenário para os clubes. Na década de 80 também podemos destacar outras mudanças importantes para o futebol brasileiro, que tentavam mitigar os efeitos da crise: o início da transmissão, ao vivo, dos jogos, a publicidade nos uniformes e, sobretudo, a revisão da estrutura do futebol. A partir do fim do regime militar, muito se discutiu sobre a antiga falta de autonomia política dos clubes e dos conceitos presentes na legislação, constituída justamente em momento ditatoriais. Dessa forma 1990, o jogador reformado, foi chamado para Secretaria Nacional de Esportes e em 1993 foi aprovada a Lei n˚ 8.672, que visava alterar a organização dos clubes permitindo a profissionalização tanto dos dirigentes, quando dos próprios clubes a partir de uma diminuição da participação e presença do Estado nestas questões. Dos anos 1990 em diante algumas outras leis foram criadas para tentar proteger os cofres dos clubes brasileiros, formadores de talentos, mas esse movimento acelerou bruscamente, tanto do aumento dos custos, quanto da exportação dos talentos. Por outro lado, entravam em cena a televisão e direitos de transmissão dos jogos, algumas revisões de calendários para atender interesses coorporativos e a ascensão dos empresários dos jogadores. Com isso, o futebol era incorporado em uma lógica de mercado que já havia atingido a Europa e agora chegava em terras tupiniquins.

2.2. PANORAMA GERAL

Hoje o futebol brasileiro é organizado de modo que as federações estaduais sejam submetidas ao controle da CBF, órgão máximo do esporte. Dessa maneira, existem duas principais competições anuais no calendário dos clubes: o campeonato regional, conhecido, no caso do rio como e que geralmente ocorre no primeiro semestre, e o campeonato nacional ou “Brasileirão”, disputado no segundo semestre. Cabe ressaltar que nos regionais, os quais são organizados pelas federações estaduais, clubes de diferentes divisões se enfrentam. Este campeonato hoje é amplamente discutido e criticado, por ser ainda o resquício da tradição do futebol brasileiro e, sobretudo, por ser o culpado pelo chamado “inchaço” do calendário dos clubes. Entretanto, somente nestes campeonatos ainda é possível

21 assistir a jogos televisionados de times como Bangu, América e outros chamados “pequenos”. O “Brasileirão”, por outro lado, é dividido por divisões de 20 equipes (A, B, C e D). Contudo, em termos de mídia televisiva, somente as divisões A e B são transmitidas ao vivo, pela TV aberta hoje. E como esta é a principal fonte de renda dos clubes, o direito de imagem televisivo, não é por acaso que os maiores e mais ricos do país estão jogando nessas duas divisões. Os clubes mais ricos estão geograficamente localizados nas regiões sul e sudeste, são também os clubes de maiores torcidas, maiores receitas, patrocínios e formadores de jogadores. O futebol nacional, embora praticado em todo o território, como em outras esferas sociais, concentra sua riqueza nestas regiões, o que pode ser percebido por exemplo quando observamos tabela do “Brasileiro” de 2017, que dos vinte times participantes somente 4 não faziam parte do sul ou do sudeste. E destes quatro, três terminaram entre os últimos seis colocados da tabela1. Além disso, cabe destacar que a última equipe campeã que não faz parte dessas duas regiões foi o em 1988, portanto há 30 anos.

2.3. O FUTEBOL CARIOCA

O futebol no Rio de Janeiro se confunde com a história do esporte no Brasil. Hoje, temos quatro grandes equipes que fazem parte do cenário nacional, da elite como estamos discutindo, e que têm uma história riquíssima. Em termos de relação com o cenário nacional, o futebol carioca, por exemplo, somando os títulos de todos os clubes, ostenta 15 títulos brasileiros, somente ficando atrás do futebol paulista com 22, até o ano de 2017. O Botafogo de Futebol e Regatas, fundado oficialmente em 1942, como resultado a fusão Club de Regatas Botafogo (1984) e do Botafogo Footbal Club (1904)2, foi a casa de nomes como os de , Nilton Santos, Didi, , Amarildo, e Zagallo, e teve durante os anos 1960 seu auge, sendo a base da seleção brasileira, e talvez o único time a fazer páreo com o Santos de Pelé. O Flamengo, no início era um clube de remo, mas em 1911, quando alguns jogadores do Fluminense se desentenderam entre si, Alberto Borgherti propôs a

1 Informação do Site da CBF: https://www.cbf.com.br/futebol-brasileiro/competicoes/campeonato-brasileiro-serie- a/2017#.WzmAz30wjIU. 2 Fonte site do Botafogo Futebol e Regatas: https://www.botafogo.com.br/historia.php?cat=oclube 22 criação de uma seção de esportes terrestres no clube rubro negro, formando assim a parte de futebol do clube3. Hoje é reconhecidamente o clube com maior torcida no Brasil e, por isso, um dos mais ricos também. O Fluminense, fundado por Oscar Cox em 1901 é a expressão da tradição do futebol carioca, sendo o pioneiro dos grandes clubes a ser fundado. Em sua história, foi casa de grandes nomes, como Gerson e Rivelino, mas também passou por momentos sombrios como a disputa da série C em 1999. Por fim, no Rio de Janeiro destacamos o Vasco da Gama, o clube de regatas de mesmo nome foi fundado em 1898 por pessoas ligadas a colônia portuguesa na cidade. O futebol só foi institucionalizado em 19154. Contudo, a história do clube é muito ligada a inclusão social, e luta contra a desigualdade, tendo em vista que o Vasco foi o primeiro clube a aceitar jogadores profissionais negros, sendo também o primeiro time campeão, atuando com jogadores negros. Hoje, o clube passa por problemas econômicos e luta para se manter na elite do futebol. Assim, o futebol carioca, embora seja organizado em torno desses “grandes” clubes, é composto também, por equipes menores como o Bangu, Madureira, São Cristóvão, América, Olaria, e outros clubes de outras cidades do Estado como o Americano, o Boa Vista e o Goytacaz. Estes clubes somente participam do Campeonato Carioca, e dependem financeiramente dos recursos que são resultado desta competição, como rendas de bilheteria dos jogos contra os grandes clubes, os direitos televisivos e as possíveis vendas e empréstimos de jogadores à outras equipes. Embora hoje seja quase impossível um clube menor ganhar o Carioca, o Bangu já o fez por duas vezes e o América por sete. Mesmo assim, dos 119 campeonatos disputados 110 ficaram nas mãos dos ditos “grandes”, e talvez por isso mesmo eles sejam considerados de tal maneira e movimentem torcidas tão grandes.

2.4. O BANGU ATLÉTICO CLUBE

“Aos 17 de abril de 1904, na casa nº 12 da Rua Estevão, com a presença dos seguintes Senhores: John Starck, Fred Jacques, Clarence Hibbs, Thomas Hellowell, José Soares, William Procter, William Hellowell,

3 Fonte site do Clube de Regatas Flamengo: http://www.flamengo.com.br/historia 4 Fonte site do Clube de Regatas Vasco da Gama: http://www.vasco.com.br/site/conteudo/subcategoria/1 23

William French, Segundo Maffeu e Andrew Procter, fundou-se um Club Athletic sob a denominação de “BANGU ATHLETIC CLUB”. Foi convidado de presidir o meeting Sr. John Starck, servindo de Secretário o Sr. Andrew Procter. O Presidente expôs os fins do Club que serão os jogos de “Foot-ball”, “Cricket”, “Lawn Tennis” e outros jogos variados. Foi proposta pelo Sr. Jacques que a entrada de sócios seja de 2$000 e que a mensalidade é de 1$000 pagável no dia 1º de cada mês que foi adoptado unanimimente. Foi decidido que as cores serão branca e encarnado e o Sr. Stack foi convidado de falar com o Director da Fábrica, afim de arranjar o panno necessário para fazer o fardamento do Club. Foram eleitos para servirem na Directoria para o primeiro anno os seguintes Senhores: Presidente Honorário João Ferrer Presidente William French Vice Presidente Secretário e Thezoureiro. Andrew Procter Conselho Fiscal José Villas Boas, James Hartley e José Soares Cap of “Foot-ball” John Starck Cap of “Cricket” Thomas Hellowell Cap of “Lawn Tennis” Fred Jacques”5

Essa é a ata da fundação do Bangu Atlético Clube. Reproduzi-la com seu português de outra época é quase como se pudéssemos voltar ao 17 de abril de 1904, ano em que o clube estava sendo oficializou o que já era uma prática de muito antes, pelo menos desde 1895. Segundo o site do clube, o primeiro estádio foi construído ao lado da fábrica de tecidos de mesmo nome, para que o clube pudesse participar do primeiro Campeonato Carioca de 1906. Contudo, em 1936 o estádio foi vítima de um incêndio, sendo reformado e utilizado até 1944, quando a fábrica teve que vender o terreno. Um novo campo teve de ser construído, o qual ainda é utilizado e é conhecido no mundo do futebol sob a alcunha de “Moça Bonita” (Estádio Proletário Guilherme da Silveira).

5 Fonte: Revista Bangu e Suas Glórias – Ano I – novembro de 1981 24

Ainda nas décadas de 1920/30, enquanto o futebol não era profissional, o Bangu Atlético Clube foi o primeiro a aceitar a presença de jogadores negros no elenco, tendo recebido em 2001 a Medalha Tiradentes por sua luta contra o racismo no esporte, muito embora o “título” de equipe inclusiva fique com o Vasco da Gama, o qual foi o primeiro time campeão a ter jogadores negros no elenco. Na década de 1950 foi o primeiro clube brasileiro a ser campeão no Maracanã, recém construído para a Copa do Mundo daquele ano. A conquista se deu logo depois da derrota dolorosa da Seleção Brasileira no torneio. A partir da década de 1960 até os anos 80, o clube foi patrocinado por Castro de Andrade grande bicheiro do cenário carioca. Nestas décadas o clube esteve em alta no cenário esportivo, culminando no vice-campeonato nacional de 1985, sendo derrotado pelo Coritiba. A partir deste momento, final da década de 80 até os dias atuais o clube que teve jogadores como , Ademir da Guia, Zizinho (que era o ídolo de Pelé), entre outros, não tem participado mais dos grandes jogos, nem tampouco dos grandes campeonatos, como se fosse o fim de uma época de ouro. Atualmente o Bangu não está classificado para nenhum campeonato de abrangência nacional, participando na atual temporada do Campeonato Carioca, durante o primeiro semestre e da Taça Rio, no segundo. Estes dois campeonatos podem ser classificados como regionais, não tendo grande representatividade entre os grandes clubes, que por sua vez nem participam da Taça Rio.

2.5. AS DUAS LEIS

Como temos apresentado, o futebol brasileiro passou por dois processos de modernização, por assim dizer, um na década de 30 e outro na de 80. Entretanto, estes dois momentos tiveram objetivos e causas distintos, senão, antagônicos. O primeiro está compreendido em um momento no qual o futebol começava a ser utilizado como fator de formação de uma nação, de uma identidade, e tem o objetivo de se profissionalizar os jogadores, mantendo uma estrutura organizacional que está intimamente ligada às tradições deste esporte. Já a segunda, pelo contrário, quebra com essas tradições no momento em que o clube se transforma em uma empresa com fins lucrativos. Aqui o capital é quem decide e norteia as decisões. Essa é a modernização da secularização e racionalização do futebol.

25

Para efeito de uma melhor análise desses momentos é importante o bservar as bases legais das modernizações. Discutir as legislações do esporte nos ajuda a entender melhor o processo pelo qual os clubes passaram. Em 14 de Abril de 1941 foi publicada a Lei número 3.199, “a qual estabelece as bases da organização dos esportes em todo o país” . É dividida em sete capítulos que tratam desde formação e objetivos do Conselho Nacional de Desportos, até das organizações gerais dos clubes e ligas. Primeiramente, observamos que talvez o ponto principal desta lei esteja já no capítulo um, artigo primeiro, a criação do CND:

Art. 1º – Fica instituído, no Ministério da Educação e Saúde, o Conselho Nacional de Desportos, destinado a orientar, fiscalizar e incentivar a prática dos desportos em todo o país (Lei n˚ 3.199/41).

Com esse trecho, observamos o exemplo máximo do objetivo dessa lei, o fortalecimento do controle do Estado no esporte nacional. Cabe ressaltar, que ela não trata somente do futebol, mas de todos os “desportos” praticados no Brasil, sobretudo os que já estavam organizados em ligas e federações. Além disso, o texto faz uma diferenciação clara entre esportes amadores e profissionais. O que nos leva a concluir que o esporte profissional, sobretudo o futebol, já era um tema discutido e definido para fins legais. Por fim, a lei também nos indica que embora a atividade fim fosse, os atletas, fosse profissional, o clube e seus dirigentes não o poderiam ser. O primeiro não poderia ter fins lucrativos e o segundo não podia ser remunerado por essa atividade.

Art. 48 – A entidade desportiva exerce uma função de caráter patriótico. É proibido a organização e funcionamento de entidade desportiva, de que resulte lucro para os que nela empreguem capitais sob qualquer forma. Art. 49 – A função executiva, na administração de qualquer entidade desportiva, caberá ao respectivo presidente. Art. 50 – As funções de direção das entidades desportivas não poderão ser, de nenhum modo, remuneradas (Lei n˚ 3.199/41).

26

Em contraponto a esta lei, tomamos a lei n˚ 8.672/93. O primeiro ponto a destacar é: “Art. 65. Fica extinto o Conselho Nacional de Desportos.” Com isso foi criado o Conselho Superior de Desportos, que agora não tinha mais o caráter executivo, mas consultivo e normativo. Além de ser um texto muito mais específico, prevendo muito mais relações entre cubes, federações, atletas e patrocinadores, ele, principalmente traz um caráter democrático, sempre enfatizando a soberania das entidades esportivas, desde que se respeitem as leis vigentes.

Art. 18. Atletas, entidades de prática desportiva e entidades de administração do desporto são livres para organizar a atividade profissional de sua modalidade, respeitados os termos desta lei (Lei n˚ 8.672/93).

O ponto principal trazido por esta lei é a modernização do esporte, sobretudo o futebol, em termos de gestão empresarial. Neste sentido o texto nos traz questões de patrocínios, direitos televisivos e a questão do “passe” do jogador. Este seria um valor vinculado ao jogador e que era de direito do clube. Existente de 1976 (Lei n˚ 1.976), o “passe” era a valoração do jogador, sendo de posse do clube ao qual pagou pelo mesmo. Era a transformação do jogador em mercadoria, na medida em que o jogador poderia estar federativamente vinculado a qualquer clube, mas seu passe era de posse de um único dono que poderia vende-lo de acordo com seus interesses. Com essas mudanças, a lei de 1993, além de apontar para uma democratização do esporte em geral, visava a modernização deste meio. Isso se dava em termos organizacionais que estava representada pela implementação do caráter mercadológico. O objetivo principal era garantir a existência dos clubes em um ambiente de mercado, assim, regular patrocínios, formas de arrecadação, de circulação de mercadorias – os jogadores – e os custos, era fundamental. Em detrimento a essas mudanças o futebol se tornava mais como uma máquina, na qual cada parte tinha uma função predeterminada e um peso dentro da engrenagem. A paixão dos torcedores e as singularidades foram sendo colocadas a parte, de forma que as imprevisibilidades provenientes daquele sentimento dessem lugar ao controle gerencial estável que o mercado classifica como positivo para os negócios.

27

2.6. TECENDO OS FIOS DA MODERNIDADE

O Bangu Atlético Clube durante sua história não esteve alheio a todas essas mudanças movimentações. Como parte integrante do sistema, podemos afirmar que ele é um sujeito ativo do meio, recebendo e aportando considerações. Desde sua criação, esteve intimamente ligado as tradições do esporte, mas sem deixar de entender as mudanças que o tempo e contexto social traziam para este meio. Embora tradicional, o clube não era localizado nas partes ricas, ou valorizadas da cidade e, por consequência, sua formação gerou uma caracterização como time de bairro. Isto porque primeiro o clube estava diretamente ligado à fábrica que dava nome ao bairro, depois porque desde o início de sua história não fazia parte da elite. Assim, se a discussão sobre a elite tem a ver com um fato histórico – a disputa entre classes antagônicas -, sendo a elite composta pela classe dominante, ou seja, aquela que detém os meios de produção (SAES, 1994), o Bangu por definição já não faria parte deste grupo. O clube era ligado a uma fábrica e jogavam ali, aqueles que lá mesmo trabalhavam, os proletários. Podemos pensar que no início também jogavam os ingleses, mas vamos nos enganar se considerarmos que só por o serem, não eram também proletários. Além disso, Bangu é um bairro da zona oeste do Rio de Janeiro que mesmo hoje não faz parte da região valorizada da cidade. E se pensarmos em termos de início do século XX, podemos supor que, embora as distâncias físicas não tenham diminuído, a região era ainda mais distante do “centro” do poder da cidade. Isso fazia com que o clube também não recebesse o prestígio que Fluminense e Vasco da Gama, por exemplo, recebiam. Um terceiro ponto que destaca o Bangu Atlético Clube da elite do futebol, desde seu início em terras brasileiras, era a iniciativa da aceitação da participação de jogadores negros no elenco do clube. Aqui entramos em duas questões teóricas. A primeira diz respeito a elite, que por outro lado, era contra essa liberação e prezava por um futebol , tal qual a tradição havia determinado. Sendo esse o gancho para a segunda questão, a quebra da tradição, a modernização do modo de funcionamento do futebol banguense também era um fator que o colocava à margem. Por fim, antes de entrarmos da discussão da modernização propriamente dita, cabe ressaltar que muito embora estejamos destacando estes pontos com relação ao início da história do clube, se os observarmos em perspectiva, perceberemos que

28 também são aplicáveis em outros momentos históricos, talvez por consequência das origens. Queremos dizer que o fato de historicamente o clube não fazer parte da elite gerou consequências futuras. Tendo em vista que os grandes jogadores, os melhores, davam preferência por atuar nos clubes centrais, e em termos, sobretudo, de formação de uma torcida fidelizada e numerosa, não fazer parte da elite era um fator que gerava menos interesse por parte dos aficionados. Para discutirmos o lugar da modernização na história do Bangu, lembremos a discussão de que neste primeiro momento histórico, o da década de 1930, modernizar não era suplantar as tradições elitistas do futebol, senão o vincular à imagem do estado nacional brasileiro, da identidade do nosso país (HELAL, 2002). Assim, quando falamos em modernização do futebol, queremos nos referir, usando os clubes como objeto, à reformulação da lógica, desafiarem as tradições e se colocarem no centro do processo (GIDDENS, 1991). Isto é, às mudanças ocorridas a partir de fins de 70 e expressas com grande peso na Lei 8.672 de 1993. A partir deste momento podemos perceber uma mudança de lógica, a tradição dá lugar ao mercado. Os clubes dão lugar às empresas. É neste momento que novas práticas econômicas são criadas, discutidas e aplicadas, tanto por clubes, quanto federações e agentes governamentais. Práticas que visam relacionar o poder econômico ao poder político (GONÇALVES, 1998). As histórias, a identidade nacional, o futebol arte, o futebol brasileiro fica a margem de discussões políticas nas quais os fortes são aqueles que detém o poder econômico. A mercantilização do futebol, assim, é o momento no qual o voto dos clubes ganha um peso importante dentro das federações e, consequentemente, se tornam moeda de troca (HELAL, 2002). Neste mesmo momento o futebol começava a vivenciar uma “crise do metal”, por assim dizer, resultado do excesso de jogos, diminuição do público e do alto custo. Portanto, novas estratégias eram fundamentais para garantir a sobrevivência do esporte, dos clubes, e sobretudo, para aumentar as receitar. A acumulação de riqueza se da de forma desigual. A elite tinha mais peso para discutir mecanismos e angariar recursos que os times periféricos. A estes sobrava jogar o jogo, o político e o esportivo. Esta nova fase levou os clubes a questionarem o modelo anterior de organização do futebol. Aquele que sofria grande interferência do Estado, que era parte ativa da identidade do brasileiro e que mexia com a imaginação e as crenças de milhares de pessoas. Este modelo não mais servia aos propósitos mercantis. Era 29 necessário quebrar as tradições. Primeiro tirando o Estado do centro do controle e colocando os clubes e depois, desconstruindo a ideia de que o futebol era religioso, mas racional. Ele precisava ter um preço e gerar um valor. O futebol passou a ser visto não mais como um jogo de onze contra onze, mas como uma balança na qual o lado mais pesado era o comercial. Para o Bangu este foi o “turning point” (negativo) da sua história. Se, por um lado as leis da década de 30 tiveram, de certo modo, consequências positivas ao Bangu – e a todo o futebol brasileiro - pois davam ao futebol o que era necessário para o seu desenvolvimento, por outro a partir da década de 70, não fazer parte, historicamente, da elite, foi o fator fundamental para o futuro do Bangu. Até podemos pensar que não fazer parte da elite não foi um fator relevante porque em 1985 o clube teve o momento auge da sua história. Mas, analisando com mais cuidado podemos concluir que nesse momento, enquanto as regras do novo modelo ainda estavam em discussão, talvez a única coisa que o clube tinha era um dono. Um dos contraventores mais conhecidos da história do país. Neste momento de transição da tradição ao mercado, o Bangu teve alguns anos de glória esportiva, porque era objeto de investimento de um personagem carioca. Momento que logo se pintou de preto e branco, passou a ser história, junto com Castro de Andrade. Assim a riqueza não estava no clube, mas na pessoa que o dirigia, de igual modo a acumulação da mesma riqueza. Portanto, no momento da mercantilização e da modernização do futebol brasileiro, nos aspectos abordados por este trabalho, o Bangu Atlético Clube não teve uma gestão que buscasse o que era melhor para a nova “empresa bangu”, cujo produto era o futebol. O clube deixou passar o momento, e talvez não tenha conseguido construir as bases necessárias para se manter, simplesmente porque os objetivos não eram pensados visando o bem e o futuro do Bangu, mas sim os interesses pessoais de quem o dirigia. Soma-se a isso o fato do clube não contar com um amplo apoio popular, e, tampouco, ter forte peso político dentro do cenário do futebol. Chegamos a um cenário no qual, com a saída do dinheiro, não sobrava nada além da tradição. Logo a tradição que neste exato momento estava sendo suplantada pelo mercado. Podemos relacionar e observar esta transição sob a ótica dos processos da racionalização e dessacralização do futebol (HELAL, 1990). A tradição pode ser tomada como o momento no qual o futebol era sagrado, os jogadores eram magos 30

que faziam movimento, jogadas e gols que tinham o poder sobrenatural de movimentar um país, indivíduo por indivíduo. Além de ser o momento no qual o jogo não era baseado em uma movimentação predeterminada e treinada exaustivamente, os números não eram mais importantes que os dribles, e talvez, nem mesmo ganhar era mais importante que jogar bem, a lógica era deixada fora das quatro linhas. Agora, a partir de 1970, e com mais força em 80 e 90, os jogadores precisavam saber seus respectivos lugares no campo, precisavam estar atentos às estatísticas. Aquele caráter místico dava lugar as novas regras de dentro de campo e de fora dele. O espaço para o imaginário do futebol estava sendo deixado de lado, junto com tudo aquilo que fazia parte dessa história. Aqui se enquadra o Bangu. Um clube que não tinha mais do que mística de ter sido um dos pioneiros e de ter sido casa de grandes magos, mas que não tinha mais espaço dentro de um modelo cartesiano de futebol.

3. CONCLUSÃO

A história do nosso futebol é muito rica e, por vezes, é difícil até diferenciá-la da história do próprio Brasil. No início, um esporte elitista, que logo passou a fazer parte do imaginário e da vida diária das pessoas de diferentes classes. Passou a ser praticado e seguido de perto por gente de diferentes cores. E se tornou parte da identidade de todos nós. Tradições foram criadas, torcidas, músicas, hinos, estádios, heróis e vilões. Isso tudo existiu durante décadas. Décadas que culminaram não só tricampeonato mundial, mas na conquista do respeito mundial, conquistada dentro de campo. Este momento não foi glorioso somente para a seleção nacional, mas para os clubes, os torcedores, os jornalistas, os jogadores e todos os envolvidos que presenciavam mais do que um jogo, mas uma arte. Contudo, o verso e a prosa do futebol se transformaram em matemática. A partir de 1970 e 1980 novas leis e práticas mudavam o cenário do futebol nacional que passava a ser mais um mercado do que um jogo. O que estava em jogo não era mais quem fazia mais gol, e sim quem ganhava mais dinheiro com esses mesmos gols. Neste momento de ruptura alguns clubes acabaram sucumbindo, como é o caso do Bangu Atlético Clube. Assim estre trabalho, que tinha o objetivo de discutir por que clubes como o Bangu não disputavam mais campeonatos da elite do futebol brasileiro, verificou que 31 para ser possível responder de alguma forma a esta questão seria necessário entender o que é a elite do futebol e por quais processos de modernização este esporte passou ao longo da sua história. Deste modo, primeiramente, foi observado que o clube, na verdade, conceitualmente nunca teria sido parte de uma elite do futebol por assim dizer. Tendo em vista que, por elite, queremos dizer a classe dominante que tem os recursos de um meio específico (SAENS, 1994). Seria paradoxal que um clube essencialmente proletário fizesse parte da elite do futebol, embora não fosse impossível. Para além disso, ele não está localizado no centro valorizado da cidade, e até por isso, nunca conseguiu movimentar grandes torcidas, fieis as cores alvirrubra. Além disso, observando o processo de modernização, localizamos dois momentos de ruptura, através das leis que normatizavam o futebol nacional. Um primeiro momento entre as décadas de 1930 e 1940, que está ligado a lei 3.199/41 e ao processo de profissionalização do esporte como um todo, mas não em aspectos de gestão, mas de prática. E o outro momento entre as décadas de 70, 80 e 90, observados em diversas leis do período, em especial as leis 1.976/79 e 8.672/93, que tratam respectivamente da instituição do passe do jogador e de novas regras de gestão e organização descentralizada do futebol. Relacionando esses dois momentos aos conceitos de modernização discutido no trabalho, o qual guarda relação direta com a quebra de tradições como consequência do processo de individualização da visão de mundo (GIDDENS, 1991), percebemos que o primeiro momento não teve grande impacto para a estrutura dos clubes, inclusive, foi responsável, junto com outros fatores, pela popularização do futebol. De diferente modo, a modernização veio no segundo, justamente com a quebra das tradições, a racionalização e dessacralização deste esporte. Neste momento uma nova lógica – a mercantil – tomava lugar no meio do futebol. O futebol arte dava lugar ao futebol empresa. E novas práticas tomavam lugar neste cenário. O foco passava a ser dividido entre o esportivo e o empresarial, e, com isso, os clubes passavam a defender seus interesses econômicos e políticos. Chamamos este momento de mercantilização do futebol brasileiro, justamente por perceber uma relação entre o momento histórico no qual os Estado-Nação criaram novas práticas que visavam a acumulação de riquezas, tendo em vista garantir seu poder político no cenário internacional.

32

Relacionando este momento ao nosso objeto, o Bangu, observamos que o clube, além de não fazer parte da elite e não ter uma grande representatividade em termos de torcida, pode ter perdido a chance de conseguir criar maneiras de sobreviver a este novo cenário, porque justamente neste momento era dirigido por Castro de Andrade, grande contraventor do Rio de Janeiro. Assim, durante a transição, o clube não tinha uma gestão que estava pensando na perpetuidade da organização, nem tampouco estava preocupada com qualquer tipo de planejamento de curto, médio ou longo prazos para o clube. Neste momento crucial, o que o Bangu possuía era um dono que injetava e tirava dinheiro do clube de acordo com seus objetivos próprios. Desta forma, embora na década de 80 o Bangu esteve presente na elite, isso se deu, porque seu dono detinha os meios para tal. O que, com sua saída, não ficou de herança para o clube. Portanto, além de perder a oportunidade de ajustar a gestão de acordo com as novas regras, o Bangu sofreu com uma administração no mínimo descompromissada com o futuro da instituição, o que resultou, quando do momento da saída desta gestão, em um abismo entre o clube e o que chamamos de elite. O abismo talvez já existisse antes, mas agora ele se colocava como irremediável. É isso que vemos desde finais dos anos 80, um Bangu que ficou só com a tradição, que não conseguiu passar verdadeiramente pelo processo de modernização e que agora, talvez não tenha mais força para fazê-lo. A partir desses pontos nosso trabalho pretende responder à questão postulada incialmente, sem deixar de ressaltar que pesquisas mais minuciosas seriam fundamentais para entender tanto em questão de número e grandeza qual a distancia entre os clubes ditos pequenos, como Bangu, estão dos clubes da elite, por exemplo a partir da análise da DRE dos próprios clubes. Ou, principalmente para propor novas saídas a estes clubes que outrora foram importantes e agora somente sobrevivem no meio do futebol.

33

4. BIBLIOGRAFIA

ANDERSON, P. As origens da pós-modernidade. Editora: Zahar, 1999, Rio de Janeiro.

BRASIL, Decreto n. 3.199, de 14 de abril de 1941. Estabelece as bases de organização dos desportos em todo o país, Rio de Janeiro, RJ.

BRASIL, Decreto n. 8.672, de 06 de julho de 1993. Institui normas gerais sobre os desportos e dá outras providências, Brasília, DF.

GIDDENS, A. As consequências da modernidade. Editora UNESP, 1991, São Paulo.

GIMENES, E. R. Teoria das elites e as elites do poder: considerações sobre a relevância dos teóricos clássicos e de Wright Mills aos estudos de cultura política e democracia. Revista de Discentes de Ciência Política da UFSCAR, Vol. 2, núm. 2, 2014.

GONÇALVES, R. et al. A nova economia internacional. Uma perspectiva brasileira. Editora Campus, 1998.

GORDON JUNIOR, J. História social dos negros no futebol brasileiro. Revista do Núcleo de Sociologia do Futebol, UERJ, núm. 2, 1995.

GRYNSZPAN, M. A teoria das elites e sua genealogia consagrada. Revista Brasileira de Informação Bibliográfica em Ciências Sociais. Dumará,1996, Rio de Janeiro.

HELAL, R. O que é Sociologia do Esporte. Editora Brasiliense, São Paulo, 1990.

HELAL, R.; GORDON JUNIOR, J. A crise do futebol brasileiro: perspectivas para o século XXI. Revista ECO-Pós, Versão 5, núm. 1, 2002.

34

HUNT, E, K. História do pensamento econômico. Uma perspectiva crítica. Editoria Elsevier, Rio de Janeiro, 2013.

LUSTOSA DA COSTA, F; MARINHO, E. Fome de bola. O futebol no Brasil e os desafios da gestão esportiva. Revista Portuguesa e Brasileira de Gestão, vol. 4, núm. 1, 2005, Lisboa.

MICHELS, R. Sociologia dos Partidos Políticos. Editora da Universidade de Brasília, 1982, Brasília.

RODRIGUES FERREIRA ANTUNES, F. O Futebol nas fábricas. Revista USP, vol. 22, 1994, São Paulo.

SAES, D. Uma contribuição à crítica da teoria das elites. Revista de Sociologia e Política, núm. 3, 1994.

35

36