ILUSTRAÇÃO DE MÀRIO CAMEIRA FOTOGRAFADA POR ENRIC VIVES-RUBIO ESTE SUPLEMENTO FAZ PARTE INTEGRANTE DA EDIÇÃO Nº 7274 DO PÚBLICO, E NÃO PODE SER VENDIDO SEPARADAMENTE www.ipsilon.pt 5 Março2010 Sexta-feira Assalto aos Óscares 20 anosdeprémios daAcademia

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A Com a morte do ayatollah Khomeini, milhares de iranianos saíram às ruas para pedir ao regime a continuação da “fatwa” aplicada nove anos antes a Salman Rushdie pela publicação de “Os Versículos Satânicos”

ooss muçulmanosmuçu a Rolling Stones ccumpriremumprir essa reeditam um “Exile ““fatwa”,fatwa”, obrigando on Main Street” Rushdie a iniciar uma década de vida subterrânea. aumentado O que o livro mostrará é O disco que os Rolling Stones como se sobrevive a isto, e lançaram em 1972, “Exile on Main se sobrevive criativamente, Street”, vai voltar a ser editado - porque Rushdie escreveu mas desta vez, com 10 temas, produzidos no mesmo ano, que o vários romances e ensaios mundo desconhece. durante esse período. A ideia não é propriamente inédita “Ele teve de lutar por cada - é a terceira vez que o disco é reeditado - mas o histórico disco de Flash milímetro, para ir ao cinema, à ópera, ao teatro”, 1972 aparecerá agora revisto e aumentado com faixas acabadinhas disse ao diário britânico de sair de um baú que Mick Jagger, “The Independent” Keith Richards e companhia Frances D’Souza, uma encheram na altura. amiga de Rushdie. “Os No princípio da década de 70, os responsáveis pela pesadelos causados pela morte de Sumário Brian Jones e pela tragédia de segurança teriam ficado Altamont já eram coisa do passado. Óscares 10 muito mais felizes em tê-lo No entanto, a banda precisava 20 anos não exactamente em casa fechado à chave. rapidamente de angariar fundos como os outros Mas ele pensou sempre em que lhe permitissem pagar os conservar relações muito impostos em atraso e concretizou dois dos discos mais bem-sucedidos Tim Burton 10 próximas com os seus da sua longa carreira: “Sticky O País das Maravilhas está amigos. Nunca cedeu a Fingers” (1971) e, no ano seguinte, o dentro de nós supostas ameaças. A gente disco que se tornou número um de da segurança dizia sempre: vendas um pouco por todo o Filipe Melo 22 ‘Não, não faça isso, não vá mundo. Apesar de já terem passado Rushdie vai escrever quase três décadas desde que as Pôs Lisboa no mapa da BD aí.’ E ele dizia sempre: canções que estamos prestes a ‘Tenho de’”. conhecer foram compostas, Nuno Ramos 28 um livro sobre os seus Em 2008, um ex-guarda- Richards revelou ao “The Guardian” “Ó”, a cosmogonia que costas escreveu um livro em que a banda não quer “interferir venceu o Prémio PT dez anos de “fatwa” que contava como ele e os com a Bíblia. [As canções] continuam a ter um grande som de colegas tinham trancado Desta história é possível em Atlanta, Estados Unidos base”. Jagger revelou que as Knife 32 Rushdie e ido a um “pub”. dizer, mesmo antes de estar da América. pequenas alterações a fazer agora Foram à ópera com Mas Rushdie impediu a passam por “um pouco de escrita: é uma grande O que é que Rushdie, 62 “Tomorrow, In an Year” publicação do livro ao listar percussão numas faixas, um pouco história. É mesmo uma das anos, está a fazer em 11 incorrecções, incluindo de guitarras noutras”. grandes histórias do nosso Emory? Uma temporada de A reedição de “Exile on Main Lourdes Castro 38 essa, e recebeu um pedido tempo de vida. E Salman cinco anos como professor Street” tem lançamento previsto Em Serralves, como na vida, de desculpas do autor. Rushdie vai escrevê-la pela convidado, que neste para 17 de Maio e estará disponível sempre com Manuel Zimbro Entretanto, o prémio pela em três versões: um CD com as 18 melhor das razões: foi ele momento vai a meio. E foi sua cabeça ia subindo (dois faixas originais, uma edição deluxe quem sobreviveu para a esta universidade que de Filipa César 42 milhões de euros), e várias com as dez faixas extra e um pacote contar. É oficial desde há alguma maneira deu um especial que também inclui vinil, Para além do Prémio BES cabeças caíram: o tradutor dias: os 10 anos que o empurrão ao livro, ao livro de coleccionador e um Photo japonês foi assassinado, um escritor inglês passou a organizar e digitalizar o documentário em DVD, “Stones in atentado contra o tradutor Exile”, que contará com imagens e fugir da “fatwa” lançada espólio que Rushdie lhe Rui Horta 48 turco levou à morte de 37 entrevistas exclusivas organizadas pelo ayatollah Khomeini entregou. “Se tudo estivesse Na tempestade das cidades intelectuais – e os tradutoresadutores pelo produtor oscarizado John vão mesmo dar um livro. em caixas nos armários e Battsek. italiano e norueguêss “É a minha história, e em em computadores mortos, escaparam por pouco.co. algum momento tinha de teria sido muito, muito Segundo D’Souza, Ficha Técnica ser contada. Esse momento difícil [escrever o livro], Rushdie disse aos aproxima-se, penso eu.” Foi mas agora está tudo Director Bárbara Reis amigos “que se Editor Vasco Câmara, Inês Nadais assim que Rushdie fez o organizado”, explicou não tivesse uma (adjunta) anúncio do futuro livro aos o escritor. vida interior [não Conselho editorial Isabel repórteres que Salman Rushdie foi Coutinho, Óscar Faria, Cristina teria sido possível] acompanhavam a abertura condenado por Khomeini Fernandes, Vítor Belanciano aguentar com de uma grande exposição em 1989. O líder religioso Design Mark Porter, Simon sanidade o tipo de Esterson, Kuchar Swara com cartas, e-mails, iraniano considerou que o vida” que foi Directora de arte Sónia Matos cadernos, fotografias, romance “Os Versículos Designers Ana Carvalho, Carla obrigado a ter. desenhos e manuscritos dos Satânicos” ofendia o profeta A nova reedição Noronha, Mariana Soares Alexandra Lucas Editor de fotografi a Miguel últimos 30 anos do escritor Maomé, decidiu que a pena de “Exile on Main Street” Madeira na Universidade de Emory, era a morte, e incitou todos Coelho incluirá uma série E-mail: [email protected] de faixas inéditas de 1972

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 3 Flash

No fi lme de Safy Nebbou, o escritor “negro de cabelos crespos” é o branco (e portanto muito polémico) Gérard Depardieu Penélope Cruz Depardieu no centro do aff aire Dumas troca von Trier Gérard Depardieu já foi Obélix, negro? E um mestiço? momento em que se discute a Jimmy Jean Louis fizesse de pelos “Piratas Rodin, Jean de Florette, Cyrano É disso que aqui se trata. O identidade nacional, é este. Emile Zola? A escolha dos das Caraíbas” de Bergerac e Tartufo, mas está papel que Gérard Depardieu A decisão de colocar um actor produtores do filme, Frank Le a ser mais difícil ser Alexandre interpreta no filme do Safy branco, Gérard Depardieu, com Wita e Marc de Bayser é grave”, Há dois anos, Penélope Cruz Dumas. A sua escolha para Nebbou (que tem ascendência uma peruca e uma espessa argumenta. revelou-se seguidora de Lars von protagonista do filme basca e argelina) é o de um camada de maquilhagem para Véronique Cayla, presidente do Trier. Em tom de resposta ao “L’Autre Dumas”, de Safy mestiço que descendia de parecer negro é Centre National de la piropo, o dinamarquês escreveu um Nebbou, gerou uma veemente escravos e nas suas memórias se “incompreensível e grotesca”, Cinématographie, veio também guião para um filme que, por polémica em França. Pode um descreveu a si próprio como escreve naquele jornal Patrick a público dizer que “a conflitos de agenda, a espanhola grande actor interpretar uma “um negro de cabelos crespos” Lozès, que é co-autor com mestiçagem, bem real, da acabou de rejeitar. Neste caso, não outra figura maior do imaginário que falava com “um sotaque Bernard Lecherbonnier do livro sociedade francesa não se se trata de abandonar, mas de saltar francês, Alexandre Dumas? ligeiramente crioulo”. Por causa “Les Noirs Sont-ils des Français à reflecte nem no cinema nem na para o barco: Cruz preteriu Pode uma mulher interpretar desse “casting”, o “Le Monde” Part Entière ?”. “Imaginar-se-ia televisão”. Os mais optimistas “Melancholia” em favor do quarto um homem, um homem escreveu que se há filme que alguma vez por um instante que esperam agora que, pelo episódio da saga “Piratas das interpretar uma mulher, um mostra que a França em 2010 a actriz negra Aïssa Maïga fosse menos, a polémica sirva para Caraíbas”. negro interpretar um branco ou tem dificuldades em aceitar a escolhida para interpretar aumentar a diversidade no O filme do realizador de um branco interpretar um sua própria diversidade, num Marguerite Duras ou que o actor cinema francês. “Anticristo” focará o comportamento dos humanos perante a catástrofe da colisão de um planeta enorme com a Terra. Segundo o “El País”, fontes Roseland Ballroom, o primeiro presentes nos primeiros próximas de Cruz garantem que a Atoms For Peace, concerto da digressão norte- visionamentos do filme, “When actriz fez tudo para poder conciliar a nova banda americana dos Atoms For You’re Strange” não traz ambas as rodagens. E também von Peace. praticamente nada de novo para Trier, dentro das limitações de Thom um amante dos Doors, a não ser impostas pelo compromisso de Yorke uma sequência de imagens inéditas apresentar o filme na edição de 2011 Os Doors captadas pelo próprio Jim Morrison do Festival de Cannes, tentou Thom Yorke criou uma têm novo enquanto aluno de cinema na contornar o imprevisto com novas nova banda e Universidade da Califórnia, em datas. baptizou-a Atoms For documentário 1969. Mas a inteligência A Buenavista, produtora das Peace. Os inúmeros fãs cinematográfica de DiCillo, diz a aventuras do capitão Jack Sparrow, dos Radiohead podem John Densmore, o “MoJo”, faz valer a pena ver a acabou por pôr um ponto final a dormir descansados, baterista dos Doors, diz história outra vez. E a narração todos estes esforços. O início da pré- pois trata-se de um que “todas as novas minimalista de Johnny Depp é a produção do filme foi antecipado projecto paralelo, um gerações têm um rito de cereja em cima do bolo. Densmore para que a actriz possa melhorar a supergrupo que irá tocar passagem dos Doors”. O rito diz que Depp “é um ícone como destreza em actividades como a temas originais e extraídos de passagem desta geração Jim”, e que por isso nos aproxima esgrima. Ainda assim, o maior de “The Eraser”, o álbum a chega a 9 de Abril: “When dele. DiCillo, por seu turno, espera culpado pelo imbróglio acaba por solo lançado em 2006 por Yorke. You’re Strange”, o novo que o seu documentário “permita ser Rob Marshall. Ao ser convidado Para os menos familiarizados com os Yorke chamou Flea, documentário sobre a mítica banda às pessoas ver melhor os Doors para dirigir o próximo “Piratas das termos do dicionário “musiquês”, dos Red Hot Chili Peppers, de Jim Morrison realizado por Tom como eles eram”: “Esqueçam a Caraíbas”, o coreógrafo convertido supergrupo é o termo utilizado para para o seu supergrupo DiCillo, estreia daqui a um mês nos parte do mito, das drogas, do sexo em director de cinema viu na nomear uma banda constituída por cinemas americanos. e do álcool, e olhem bem para a espanhola, pela qual não esconde elementos oriundos de diversos Segundo os jornais que estiveram banda e para o que ela alcançou”. admiração, a actriz ideal para projectos musicais. A prática não é suceder a Keira Knightley. O nova e já originou bandas como os “When You’re Strange” inclui uma sequência sentimento é recíproco e, entre dois Cream (Eric Clapton, Jack Bruce e de imagens inéditas captadas por Jim Morrison amoresamores,, Penélope Cruz escolheu Ginger Barker), os Traveling Wilburys enquanto jovem aprendiz de cineasta embarcar.embarcar. (Bob Dylan, George Harrison e Roy Orbison) ou os mais recentes Them Crooked Vultures (Dave Grohl, John Paul Jones e Josh Homme). No que toca aos Atoms For Peace, ao lado de Yorke reúnem-se o baixista Flea (Red Hot Chili Peppers), o baterista Jay Waronker (que já colaborou com Beck MARIO ANZUONI/REUTERS ou com os REM), o percussionista brasileiro Mauro Refosco e Nigel Godrich na guitarra, instrumento do qual já havia tomado conta aquando do lançamento de “The Eraser”. O novo projecto adopta o nome de um tema do mesmo disco, que também foi título de um discurso a favor da utilização da energia nuclear para fins pacíficos feito pelo A actriz espanhola presidente Eisenhower não vai poder conciliar em 1953, na sede das as fi lmagens do quarto Nações Unidas, em Nova episódio de “Os Piratas Iorque. Para a mesma das Caraíbas” com o fi lme- cidade está marcado, no catástrofe de von Trier dia 5 de Abril no APRESENTAÇÃO AO VIVO LANÇAMENTO EXPOSIÇÃO AGENDA CULTURAL FNAC entrada livre

LANÇAMENTO AS INCRÍVEIS AVENTURAS DE DOG MENDONÇA E PIZZABOY de Filipe Melo e Juan Cavia Uma novela gráfica que conta a história de um distribuidor de pizzas, um ex-lobisomem e um demónio. 06.03. 18H00 FNAC STA. CATARINA 10.03. 21H30 FNAC COIMBRA 06.03. 21H30 FNAC BRAGA 11.03. 20H00 FNAC CHIADO

APRESENTAÇÃO JIMI HENDRIX - 40 ANOS DEPOIS Com Álvaro Costa e Zé Pedro (Xutos&Pontapés) O jornalista Álvaro Costa e o músico Zé Pedro vão estar à conversa, no Fórum Fnac, com muita música e vídeos à mistura, sobre um dos maiores músicos de todos os tempos.

10.03. 22H00 FNAC NORTESHOPPING

AO VIVO CAFÉ ZIMMERMANN D.Quixote, Cantatas para Salão do Século XVIII Considerado um dos melhores agrupamentos de música clássica do Mundo, o Café Zimmermann vem à Fnac apresentar o seu último trabalho.

08.03. 17H00 FNAC CHIADO

AO VIVO LUFA LUFA Foledad Lufa Lufa é um projecto de música instrumental para concertina e percussão que percorre distintas linguagens musicais, com uma forte componente visual e cénica. 08.03. 21H30 FNAC ALFRAGIDE 09.03. 18H30 FNAC CHIADO 10.03. 21H30 FNAC COLOMBO

EXPOSIÇÃO NOCTURNOS Desenhos da trilogia As Aventuras de Filipe Seems Por António Jorge Gonçalves e Nuno Artur Silva O universo de Filipe Seems, um detective muito particular que é na realidade um programador de histórias, centra-se no espaço da Cidade – uma Lisboa futura que cruza épocas e referências literárias. 01.03. - 19.05.2010 FNAC NORTESHOPPING

Consulte a agenda cultural Fnac em

Apoio: Os Óscares têm pés de b É um ano crucial para os Óscares: pela primeira vez desde 1943 há dez candidatos a Melhor Filme, tentativa de abrir os prémios a fi lmes mais populares e “estancar” a hemorragia das audiências televisivas. À beira da cerimónia – dia 7 – olhámos para os últimos 20 anos de Óscares. O que é que mudou? Têm agora pés de barro? Jorge Mourinha

A 26 de Março de 1990, tinha lugar no pela Net, pela televisão por cabo, pe- hn Lee Hancock, é ambientado no Dorothy Chandler Pavilion, em la velocidade com que as imagens e A ambição é a de meio do futebol americano, temática Hollywood, a 62.ª entrega dos Ósca- as notícias viajam pelo mundo fora que tem peso nas bilheteiras dos EUA res da Academia. tornaram impossível chegarmos aos produzir em 2010 mas é problemática nos mercados Das cinco produções nomeadas Óscares ignorando o percurso que os uma cerimónia globais. E só depois da vitória de San- para Melhor Filme, os espectadores filmes fizeram até serem nomeados, dra Bullock como melhor actriz dra- portugueses apenas tinham ainda ti- as controvérsias que possam ter atra- dinâmica e sem mática nos Globos de Ouro é que o do oportunidade de ver três. “Clube ído, o sucesso ou fracasso que encon- filme entrou nos mapas de estreias dos Poetas Mortos” tinha sido o único traram nas bilheteiras. “palha”; o próprio internacionais, quando o estúdio per- Capa a estrear antes das nomeações. “Miss O próprio modo como a distribui- cebeu que tinha uma “âncora” a que Daisy”, o vencedor do ano, e “Nasci- ção e a exibição evoluíram significa sistema de votação foi se agarrar para vender o filme nos do a 4 de Julho” estrearam-se no mês que hoje já não podemos chegar “vir- revisto para procurar mercados estrangeiros. entre as nomeações e a cerimónia. Os gens” aos Óscares. As grandes produ- Dos restantes nove nomeados, três outros dois candidatos, “O Meu Pé ções passaram a chegar às salas de que os resultados estrearam-se em Portugal no mês que Esquerdo”, que valeria a Daniel Day- todo o mundo em simultâneo com a decorreu desde as nomeações e a en- Lewis o Óscar de Melhor Actor, e estreia americana, e o modo como os sejam mais trega – “Precious”, “Um Homem Sé- “Campo de Sonhos”, só se estreariam estúdios começaram a posicionar os rio” e “Uma Outra Educação” – e to- já depois dos prémios atribuídos. Mas filmes em função das eventuais no- representativos do dos os restantes já tinham chegado todos eles haviam chegado a Portugal meações e os agentes de vendas ne- alinhados com o lançamento interna- com uma “décalage” de semanas, goceiam os contratos de distribuição ano cinematográfico cional (dois deles, “Estado de Guerra” quando não meses, sobre a estreia passou a pesar no modo como o “ma- e “Distrito 9”, até já saíram em original americana. rketing” internacional é coordenado. DVD). Vinte anos depois, os Óscares já não Hoje, seria impensável que dois em Mas, mesmo que um ou outro filme têm os mesmos segredos que tinham cinco nomeados para melhor filme possa ter chegado mais cedo ou mais quando ainda só havia um canal pú- apenas se estreassem depois dos pré- tarde, a verdade é que já todos sabe- blico que exibia apenas o “compacto” mios já terem sido entregues. mos os detalhes sobre os nomeados. da cerimónia no dia a seguir e não Vejamos: a dois dias da entrega dos Já sabemos que os funcionários que sabíamos quem eram Daniel Day- Óscares 2010, que este ano retoma George Clooney despede em “Nas Lewis, Morgan Freeman, Denzel Wa- pela primeira vez em 60 anos dez can- Nuvens” são verdadeiros desempre- shington ou Julia Roberts, todos eles didatos a melhor filme, só um dos gados, que “Precious” levantou con- vencedores ou nomeados para pré- nomeados ainda não chegou às salas trovérsia nos EUA pelo retrato da co- mios em 1990. A globalização trazida portuguesas. “The Blind Side”, de Jo- munidade negra, que “Avatar” tem

6 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon barro? POR ENRIC VIVES-RUBIO FOTOGRAFADA DE MÁRIO CAMEIRA ILUSTRAÇÃO

Tarantino quando ainda era um “cão danado” para o “establish- ment”, situação que “Inglourious Basterds” tratou de corrigir; o Hannibal de Anthony Hopkins (Óscar em 1992)

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 7 Em 1990, Há vinte anos res como “o” prémio de cinema por “Miss Daisy” excelência. E à medida que começá- foi o grande chegávamos aos mos a saber cada vez mais sobre o vencedor dos processo, que começámos a compre- Óscares e a nomeados com outra ender o peso dos lóbis e da indústria cerimónia foi e do sucesso, a magia foi-se diluindo. vista por inocência: víamo-los Hoje, sabemos mais do que alguma 40,22 milhões vez soubemos sobre o modo como de pelo seu valor um filme chega às nomeações – e por espectadores enquanto filme, que é que um filme chega às nomea- ções. Acompanhamos todo o proces- alheios às so de antecipação, de aposta e previ- são e sugestão, que começa logo no controvérsias final do ano quando os estúdios po- sicionam o lançamento dos filmes que ou à sensação que gostariam de ver em Fevereiro nos sido chamado de antiamericano nomeados e se prolonga pelos galar- pelos conservadores mais renhidos. tivessem criado dões das associações de críticos e téc- Há vinte anos, não teríamos sabido internacionalmente. nicos e actores e jornalistas e realiza- nada disto. Chegávamos aos nomea- dores, e pelos Globos de Ouro que dos com outra inocência: víamo-los Víamo-los com um continuam a ser vistos como o melhor pelo seu valor enquanto filme, alheios “barómetro”. E quando as nomeações às controvérsias ou à sensação que outro distanciamento finalmente saem já todos vimos ou tivessem criado internacionalmente. ouvimos falar dos filmes, já temos a Víamo-los com um outro distancia- e um outro prazer, opinião formada ou concebida sobre mento e um outro prazer, sem agen- eles. No processo, perdemos o misté- das nem meses de cobertura mediá- sem agendas nem rio e a distância que nos permitiam tica que nos revelava os segredos das meses de cobertura olhar para os filmes enquanto fil- rodagens. mes. Mas, mesmo nessa altura em que mediática que nos sentíamos que os Óscares eram um A televisão comanda prémio que reflectia verdadeiramen- revelava os segredos Mas se já não conseguimos ver os Ós- te o grande cinema, não tínhamos cares nesse vazio que nos permitia conhecimento de toda a históriahistória.. PorPor-- das rodagens olhar apenas para o cinema, continu- queque o facto de recebermos a informa- amos, paradoxalmente, a achar que çãoção “filtrada”“filtrada” preservava a magia e o eles são a última palavra sobre os me- ““glamour”glamour” ddosos prémios. TínTínhamoshamos a lhores do ano, que o seu vencedor é ideiaideia dos ÓÓsca-sca- intocável, como se fossem a bitola global pela qual qualquer filme deve ser medido. Olhemos para os dez melhores fil- mes de sempre segundo o American Film Institute. O melhor filme de sempre é “O Mundo a Seus Pés” (1941), de Orson Welles, seguido de “O Padrinho” Em 1998, a vitória de “Titanic” (Francis Ford Coppola, 1972), “Casa- foi a cerimónia mais vista de blanca” (Michael Curtiz, 1942), “O sempre, 57,2 milhões de Touro Enraivecido” (Martin Scorsese, espectadores; dez anos mais 1980), “Serenata à Chuva” (Gene Kelly tarde, vitória para “Este País & Stanley Donen, 1952), “E Tudo o Não é Para Velhos”, audiências Vento Levou” (Victor Fleming, 1939), de 31,7 milhões, as mais baixas “Lawrence da Arábia” (David Lean, em 20 anos; no ano passado, 1962), “A Lista de Schindler” (Steven 36,9 milhões celebraram com Spielberg, 1993), “A Mulher que Viveu “Quem Quer Ser Bilionário” Duas Vezes” (Alfred Hitchcock, 1958) e “O Feiticeiro de Oz” (Victor Fleming, 1939). Filmes clássicos, unânimes. natória” de filmes seleccionados pelos Destes dez, apenas cinco recebe- seus países de origem). ram o Óscar de Melhor Filme. “O Os Óscares nunca tiveram, em su- Mundo a Seus Pés” foi nomeado, mas ma, pretensões a serem mais do que perdeu para “O Vale Era Verde” (1941), um prémio da indústria americana, de John Ford. “O Touro Enraivecido” atribuído às produções americanas foi nomeado, mas perdeu para “Gen- por um júri de pares, e dirigido prio- te Vulgar” (1980), de Robert Redford. ritariamente para aquilo que ficou “Serenata à Chuva” e “A Mulher que conhecido como “filme de prestígio”, Viveu Duas Vezes” apenas foram no- de tema sério e abordagem artística. meados para categorias técnicas (nes- E se ganharam importância global ses anos, ganharam “O Maior Espec- ao longo dos anos, isso deve-se à po- táculo do Mundo”, de Cecil B. de Mil- derosa máquina mediática dos estú- le, e “Gigi”, de Vincente Minnelli). “O dios, ao peso crescente que o cinema Feiticeiro de Oz” perdeu para “E Tu- americano foi ganhando na exibição do o Vento Levou”. global após a II Guerra, ao “star-sys- A verdade é que os Óscares nunca tem” que Hollywood impôs e que os foram um prémio da crítica. Nem países com indústrias mais resistentes nunca reflectiram os gostos das audi- foram decalcando à sua imagem. Num Era 1995, logo ências globais. Quem vota nos Ósca- “loop” de “feedback” que se foi refi- após “A Lista res são os membros da Academia de nando com o tempo, a popularidade de Schindler”, Artes e Ciências Cinematográficas de do cinema americano e a importância a Academia Hollywood, ou seja, os profissionais dos Óscares foram-se alimentando Michael precisou de do cinema americano (actores, reali- mutuamente, sobrevivendo à lenta Moore: Óscar um bálsamo zadores, argumentistas, directores de erosão do sistema de estúdios que para o Melhor à maneira fotografia, cenografistas, figurinistas, alimentou a indústria durante a pri- Documentário de James sonoplastas, técnicos), e os filmes ele- meira metade do século XX. E a pró- em 2003, mas Stewart, gíveis para as nomeações têm de ter pria televisão, que foi a certa alturta falhou a “Forrest tido exibição em sala nos circuitos “alvo a abater” pelo cinema, acabou nomeação Gump”, e fugiu americanos, com excepções pontuais por trazer o seu apoio à “festa do ci- para a sete pés de (o prémio de melhor filme estrangei- nema”, vendo na transmissão em di- “Fahrenheit “Pulp Fiction” ro é atribuído a partir de uma “elimi- recto da cerimónia a oportunidade 09/11”

8 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon de aproveitar o “star-system” em seu Os Óscares Perante estes dados, a Academia e os meus óscares favor. Ao ponto em que, hoje, é a te- viu-se forçada a repensar o sistema levisão que comanda os Óscares. continuam de nomeações. Sem filmes que o pú- iriam para... Há vinte anos, quando “Miss Daisy” blico reconheça, as audiências televi- ganhou, 40 milhões de pessoas assis- a procurar um sivas sofrem. Sem audiências, as re- 1. Qual foi o Óscar mais mal tiram em directo à cerimónia de en- ceitas da Academia caem a pique, entregue na história da trega. Em 1998, quando “Titanic” consenso que, nestes porque são essas receitas que mantêm Academia? ganhou, a transmissão teve 57 milhões a associação a carburar. E, como ex- 2. Qual a maior injustiça da de telespectadores. Em 2009, o ano dias intensamente plicou ao PÚBLICO o crítico britânico Academia, o Óscar que nunca foi da vitória de “Quem Quer Ser Bilio- mediatizados, talvez David Thomson, essas receitas man- dado e deveria ter sido? nário?”, apenas 37 milhões de espec- têm vivo um dos mais riquíssimos 3. Qual a sua aposta emocional tadores assistiram à cerimónia – e seja tão utópico como arquivos cinematográficos do mundo, para este ano? Quem ou que isto quando muitos países estrangei- possibilitam o restauro e o arquivo em filme gostaria ver receber um ros (Portugal inclusive) já exibem a a ideia de que ainda boas condições de obras clássicas do Óscar? transmissão em directo durante a ma- cinema americano, contribuem para drugada e cada vez mais gente sabe é possível reunir a construção do Museu do Cinema dos vencedores instantaneamente. que decorre actualmente em Los An- Victor Afonso, autor do blogue O Para onde foram os vinte milhões 50 milhões de geles. Logo, é no interesse da Acade- Homem Que Sabia Demasiado perdidos em dez anos, ainda por cima espectadores à volta mia que a transmissão televisiva tenha 1. Em 1981, o melodrama meloso de numa altura em que a audiência glo- audiência e ressonância pública, é no Robert Redford, “Gente Vulgar”, bal potencial da transmissão é maior de um ecrã televisivo interesse da Academia que os filmes arrecadou o Óscar de Melhor Filme. do que nunca? Para o cabo? Para a nomeados sejam conhecidos. Como foi possível ter sido o vencedor Internet? Para o DVD? Ou, tão-só, pa- para uma ocasião Evidentemente, isso depende tam- quando na ra a concorrência televisiva dos “re- bém do ano cinematográfico mas, de competição ality-shows”, das “sitcoms” ou do única e irrepetível repente, percebemos que aquilo que estavam obras desporto, desinteressados de uma está em jogo nos Óscares, este ano como “Raging Bull” ocasião que parecia apostada em pre- mais do que em anos anteriores, tal- de Scorsese e “The miar filmes que pouco ou nada ti- vez até mais do que nunca, não é, Elephant Man” de nham ressoado fora de um nicho de nunca foi, nunca será “o melhor filme Lynch? espectadores? Pianista” (Roman Polanski, 2002), do ano”, “a melhor actriz do ano”, “o 2. Jerry Lewis é um “Capote” (Bennett Miller, 2005), “Tra- melhor realizador do ano”. O que es- génio A busca do consenso ffic” (Steven Soderbergh, 2000), “O tá em jogo é, apenas, a relevância de subvalorizado. A verdade é que, ao longo dos últimos Segredo de Brokeback Mountain” uma cerimónia que se tornou num Recebeu em 2009 o vinte anos, Hollywood mudou mais (Ang Lee, 2005), “A Paixão de Shakes- “farol” à volta do qual se busca um “Jean Hersholt do que tínhamos reparado. Há vinte peare” ( John Madden, 1998), “Chica- consenso entre o êxito e o prestígio, Humanitarian anos, os estúdios estavam já a deixar go” (Rob Marshall, 2002), “Colisão” a qualidade e a quantidade, o “gla- Award”, mas de funcionar à imagem da sua “era de (Paul Haggis, 2004) ou “Quem Quer mour” e a seriedade. E, paradoxal- deveria ter recebido ouro”, em que ofereciam uma gama Ser Bilionário?” (Danny Boyle, 2008) mente, é dessa relevância mediática Jerry Lewis: também, e sobretudo, um “Honorary completa de produções de todos os vieram precisamente dessa “falsa in- que depende o prosseguimento de um génio Oscar” pelo conjunto da sua carreira géneros para todos os públicos, e co- dependência”. E os bons ofícios dos um trabalho historiográfico rigoroso subvalorizado como actor e realizador. O meçavam a concentrar-se nas “tent- irmãos Harvey e Bob Weinstein, fun- – é como se, mal comparado, o traba- compositor Danny Elfman foi poles” – os “blockbusters” cheios de dadores da Miramax, a pequena in- lho de restauro do ANIM estivesse nomeado 4 vezes na categoria efeitos visuais e/ou estrelas que ga- dependente que se tornou numa in- inteiramente dependente da audiên- Melhor Banda Sonora e nunca rantem um mínimo de sucesso global dústria de filmes de prestígio, foram cia dos Globos de Ouro da SIC. ganhou (e deveria ter ganho, pelo e que, por isso, precisam de ser redu- em simultâneo a melhor e a pior coi- Por isso, 2010 é um ano determi- menos, com a música que compôs zidos ao mínimo denominador co- sa que podia acontecer ao cinema nante para os Óscares. Pela primeira para “Eduardo Mãos de Tesoura”). mum – ou em ffitasitas de género de pro- americano,am revelando cineastas im- vez desde 1943, há dez candidatos a 3. Se é uma aposta “emocional”, duçãodução baratabarata que pupudessemdessem ser portantesp (Steven Soderbergh, Quen- Melhor Filme, numa tentativa de abrir então gostaria de ver Kathryn rentabilizadas ffacilmente.acilmente. tinti Tarantino) mas também conver- os prémios a filmes mais populares e Bigelow levar para casa o Óscar de O “meio termo” do fil-fil- tendote o “indie” num centro de for- de maior sucesso e assim prosseguir Melhor Realizador pelo excelente meme de prestígioprestígio ou do maçãom para uma futura carreira a subida de audiências que se sentiu “The Hurt Locker”, em detrimento do dramadrama adulto, diridirigidogido “mainstream”.“m em 2009, garantindo, como dizia fon- seu ex-marido James Cameron e do a um púpúblicoblico mais di-di- Ora, a maior parte dos filmes que te da Academia ao “New York Times”, próprio Quentin Tarantino por fícilfícil de convencer a ir a Academia escolheu nomear ao lon- que “havia um pouco de tudo para Gloria “Inglorious Basterds”. ao cinema,cinema, foi “cedi- gogo dos últimos anos vieram precisa- todos os gostos”. A ambição é a de Swanson no do” ppeloselos estúdios mentem dessa “segunda divisão” de produzir uma cerimónia dinâmica e seu “come Herman José, humorista àsàs divisdivisõesões subsi- obrasob aclamadas pela crítica mas com sem “palha” – os prémios honorários back”, “Sunset 1. No ano em que nasci, 1954, o Óscar diáriasdiárias ouou ààss resultadosre comerciais modestos. Já foram já despachados num jantar pri- Boulevard” para a melhor actriz foi para a frágil iindependen-ndependen- sabíamossa que há coisas que não se vado, e um dos produtores, Bill Me- Grace Kelly em vez testes amambiciosasbiciosas podemp esperar dos Óscares: as comé- chanic, disse ao “New York Times” de premiar o nascidas durante diasd raramente são nomeadas, os fil- que idealmente a entrega não deveria desempenho da a ascensão do cine- mesm de género e “blockbusters” dão durar mais de três horas – e o próprio Judy Garland em “A ma “indie” aamerica-merica- porp si cantonados às categorias técni- sistema de votação foi revisto para Star Is Born”. no, que começou por cas.ca Mas 2008, o ano em que a trans- procurar que os resultados sejam 2. A Gloria Swanson serser feitofeito à margem e mos- missãom teve a sua pior audiência de mais representativos do ano cinema- merecia o Óscar em trado no festival de SunSun-- semprese – apenas 30 milhões de teles- tográfico. Tudo em nome de “estan- 1950 pela sua dance.dance. Filmes osca- pectadoresp –, foi também o ano em car” a hemorragia das audiências que Norma Desmond no rizadosrizados comocomo “O quequ os cinco filmes nomeados foram ameaça o futuro da Academia e, por meu filme de culto, PacientePaciente In- os menos vistos de sempre (“Este Pa- extensão, dos Óscares. “Sunset Boulevard”. glês”glês” (An- ísís Não É para Velhos”, dos irmãos Co- Tudo porque os Óscares não mu- Ganhou uma tal de thonythony Min- en,en “Expiação”, de Joe Wright, “Ha- daram: insistem em premiar uma Judy Holliday. Já o ghella,g hella, veráve Sangue”, de Paul Thomas Ander- ideia de cinema popular de qualida- Óscar para o melhor 1996),1996), “O son,so “Juno”, de Jason Reitman, e de, acessível sem ser esotérico e co- filme desse ano “Michael“M Clayton”, de Tony Gilroy, mercial sem ser imbecil, um “meio calhou a uma outra obra prima, “All quasequ todos provenientes das subsi- termo” que consiga agrupar à volta About Eve”, com a genial Bette Davis. diáriasd independentes dos grandes uma larga faixa de espectadores. Con- 3. Adorei o “District 9”. Acho uma estúdios).es E, em 2009, um dos poucos tinuam a procurar um consenso que, obra-prima de ficção. filmesfil recentes a conseguirem conci- nestes dias intensamente mediatiza- liarlia o êxito comercial e o respeito dos dos onde quase já nem há tempo pa- João Tordo, escritor críticos,cr “O Cavaleiro das Trevas”, de ra pensar, talvez seja tão utópico co- 1. Quanto ao Óscar mais mal entregue, ChristopherC Nolan, não foi sequer mo a ideia de que ainda é possível vou já antecipar os resultados deste nomeadon para melhor filme. reunir 50 milhões de espectadores à ano e avanço com o Óscar de Melhor Como comentava Patrick Goldstein, volta de um ecrã televisivo para uma Filme para “Avatar”, uma estopada de colunistaco do jornal “Los Angeles Ti- ocasião única e irrepetível. Talvez te- No ano de duas horas e meia que quase me fez mes”,m “o que conta mais para os vo- nham razão. Mas a verdade é que os “Taxi Driver” vomitar por causa das três dimensões. tantesta nos Óscares é a aspiração ar- Óscares não mudaram. Nós, sim. ganhou Sobretudo num ano em que há um tística,tí não o aplauso dos espectado- “Rocky” filmezinho chamado “An Education” resre que enchem os multiplexes As datas indicadas dizem respeito ao que é brilhante e americanos”.am ano da carimónia, da efectiva entrega mereceria essa estatueta. Mas enfim. 2. A maior injustiça é evidente para todos, “Taxi Driver”, em 1976. Em vez deste ganhou “Rocky”, um filme

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 9 1. Qual foi o Óscar mais mal entregue na história da Academia? 2. Qual a maior injustiça da Academia, o Óscar que nunca foi dado e deveria ter sido? 3. Qual a sua aposta emocional para este ano? Quem ou que filme gostaria ver receber um Óscar? O Óscar no ba com um argumento decente mas que tinha a infelicidade de ter Stallone No ano de “Goodfellas” ganhou “Danças com Lobos”. Forrest Gump r como protagonista. “Rocky” melhor filme do que “Taxi Driver” é como na Lua”. Vamos a tribunal. Joana Amaral dizer que a novela da TVI é melhor que “Os Sopranos”. “Goodfellas”: 3. Uma vez mais: “An Education”. Um preterido em filme brilhante sobre uma rapariga favor de adolescente e um homem mais velho, “Danças com em Inglaterra, que tem um “twist” Lobos” - 1991 emocional magnífico e uma interpretação notável de Peter Saasgard e Carey Mulligan.

Lauro António, crítico e realizador 1. Julgo que se têm de perceber os Óscares por aquilo que são e não por aquilo que gostaríamos que fossem. Destinam-se a premiar os melhores numa dupla perspectiva: de arte e de indústria. Numa perspectiva de entretenimento, de espectáculo e também de cultura cinematográfica. Pedir outra coisa aos Óscares é como chegar a um consultório médico e pedir para nos defenderem na barra George W. Bush dizia que a História mistura de “Pulp Fiction”, e por isso 2004 o Óscar de melhor filme e rea- do tribunal. Ou se aceitam como são, se encarregará de o julgar (positiva- “Forrest Gump” tudo recebeu. “Pulp lizador foi para o derradeiro capítulo como a grande festa de Hollywood, mente, crê) pelos seus oito anos à Fiction” foi deixado para trás pela “O Regresso do Rei”. Reconhecimen- ou não se aceitam. Há muito por onde frente de um país e a correr atrás de sacarina “feel good” de Forrest. to avassalador (onze prémios; a certa escolher. Depois, cada atribuição de um punhado de outros – do Iraque ao Foi passar do preto ao branco. A altura o anfitrião Billy Crystal atestou: prémios, Óscares ou não, tem muito Afeganistão, do Irão ao Paquistão. Academia emergia do niilismo, do “É oficial. Já não resta ninguém a de circunstancial, depende do “estado Daqui a 20 anos, o mundo achará o “grunge”, do minimalismo e da cul- quem agradecer na Nova Zelândia”), do tempo”, da conjuntura, dos que bem entender do reinado de D. tura anti- “glamour” dos 90s. Em 1992 tudo pela adaptação de uma trilogia interesses que se jogam nesse “Dubia” I, embora se preveja que a premiara “O Silêncio dos Inocentes”, de “pedigree” literário e ressonância momento. Por mim, poderia dizer coisa não lhe saia como desejaria. É protagonistas e realizador. No ano mundial. Mais uma vez, o espectácu- que há dezenas e dezenas de Óscares o mesmo tipo de sentimento que ti- seguinte, o crespuscular “Imperdoá- lo televisivo recuperou o fôlego per- mal atribuídos, e depois? Fernando veram, já em 1991, os espectadores vel”, de Eastwood. Em 1994, o co- dido desde 2001 (43,5 milhões de Pessoa não foi preterido por um de uns Óscares mais agregadores de inventor dos “blockbusters” regres- espectadores). poeta de que hoje ninguém se massas, mais transversais e pré-Inter- sava às suas origens judaicas: “A Lis- Os Óscares de “Forrest Gump” fo- recorda? Algum mal resultou disso? net, ao perceber que, em ano de ta de Schindler” de Spielberg, ram os segundos mais vistos da déca- 2. O processo que leva à atribuição “Goodfellas – Tudo Bons Rapazes” ou comoveu o planeta com o íman dra- da (48,87 milhões de espectadores), dos Óscares – votação de membros da “O Padrinho III”, o grande vencedor mático, para as massas, que é o na- só suplantados pela cerimónia de Academia, por categorias, ou na foi “Danças com Lobos”. Há momen- zismo, o Holocausto e o preto e bran- 1998, campeã dos últimos 20 anos – globalidade (melhor filme do ano), ou tos assim, em que, mesmo sem a dis- co. Na mesma cerimónia, “Filadélfia”, 57,25 milhões, número tão impres- por comissão (melhor filme em língua tância ou o Google que nos dão pers- Óscar para Tom Hanks e laços verme- sionante como as onze estatuetas do não inglesa) – não permite o que se pectiva sobre as coisas, sabemos logo lhos anti-sida, discurso emotivo, e filme desse ano: “Titanic”, o iceber- pode chamar justiça ou injustiça. É o que estamos perante perversões da Holly Hunter seca e dorida em “O Pia- gue que bateu “Boogie Nights”, “Ja- resultado de uma soma, e a esta soma realidade. Que, um dia, serão tema no”. E foi assim que, depois disso, ckie Brown” e “O Futuro Radioso”. não pode ser assacada qualquer de compêndio. houve o tal Prozac para a Academia: “Titanic”, com vários barris de me- Num dos anos responsabilidade moral. Quanto Ora a História do cinema não se faz 1995, “Forrest Gump”, Óscares para lodrama a bordo, era também açuca- mais fortes, maior o número de votantes, menor de Óscares e prémios lustrosos pre- o filme, Tom Hanks e Robert Zeme- rado e o filme-mais-visto-de-sempre. 2000, “Beleza a responsabilidade individual, logo a cedidos por passadeiras vermelhas e ckis. Isto até o seu realizador reincidir (des- Americana” possibilidade de julgamento. Pode sessões de intensa preparação esté- ta vez em 3D) e dar “Avatar” ao mun- derrotou haver injustiças praticadas pelo tica. Mas se por vezes são sintomas A televisão e o DVD do, à Academia e à cadeia televisiva “Magnólia” inconsciente (ou consciente) colectivo, sociais, noutras são sinais de circuns- O problema está em nós, provavel- ABC – todas dependentes dele para mas acontecem. As deliberadamente tância, cataventos comerciais. Só as- mente, pelas expectativas criadas. tentar nova subida nas audiências do cometidas são muito mais graves. Stanley sim se explica que o melhor filme do Afinal, é só uma cerimónia de pré- espectáculo, para valorizar a cerimó- Mas que há lacunas graves, lá isso há. Kubrick: a ano 1999 tenha sido o “crowdpleaser” mios, é só uma linha numa capa de nia, para a tornar num evento global Falando só de realizadores norte- galeria dos “A Paixão de Shakespeare” (1998), DVD. Claro que há um efeito nas bi- em que todos podem dizer “Eu vi es- americanos, ou que, sendo notáveis sem feito para os domingos à tarde na te- lheteiras e nas vendas de DVD. Mas te filme” e agora partilho os seus lou- estrangeiros, trabalharam Óscares levisão mas que nem aí tem sido vis- uma lista de 20 anos de Óscares é ape- ros, como no desporto. Como só abundantemente to, num ano em que havia “A Vida É nas a soma das “respostas viscerais umas centenas de milhares viram nos EUA, houve Bela”, “Barreira Invisível” ou “Ho- de seis mil votantes” a cada ano, lem- “Um Homem Singular”, de Tom Ford, vários que nunca mem na Lua”. “Shakespeare” venceu bra Robert Thompson. O director do o filme não chega à lista alargada de receberam um numa América à beira de um “impe- Centro Bleier de Cultura Popular da dez candidatos a melhor filme? Óscar. São alguns achment” com o escândalo Lewinski Universidade de Syracuse frisa ao Íp- “‘Titanic’ não foi de forma alguma dos maiores nomes sobre Clinton e Gwyneth Paltrow, silon que estes prémios são “um fes- um dos melhores filmes de sempre”, da História do chorosa e cor-de-rosa, foi marcante tival sagrado de Hollywood” e que é comenta Thompson, e “o Óscar foi Cinema: Robert para a Academia. Mas é Jim Carrey difícil querer aferir tendências a par- para um enorme ‘blockbuster’ que Altman, Richard que fica para a posteridade – foi Ro- tir deles – são circunstanciais. E têm toda a gente foi ver seis vezes. Esses Brooks, Tim Burton, berto Begnini que venceu na catego- uma âncora fortíssima – são um dos Óscares são os menos úteis, porque John Cassavetes, ria de melhor actor. maiores eventos televisivos mundiais ninguém precisava de ser apresenta- Charles Chaplin, Anos antes, em 1995, o mesmo – e a Academia sabe que nos anos em do a ‘Titanic’. Se ‘Avatar’ receber os D.W. Griffith, acontecia com a caixa de chocolates que muito nomeia um filme popular, Óscares... se alguém ainda não viu Howard Hawks, que simbolizava a vida de um homem consegue belas audiências. ‘Avatar’, não serão os Óscares a con- Alfred Hitchcock, simples: era mais doce do que o ham- Um dos fenómenos do início do vencê-lo. Quem ainda não viu, obvia- Buster Keaton, burguer mal passado com cocaína à século foi “O Senhor dos Anéis” e em mente não quer ver”. Stanley Kubrick, Fritz Lang, Ernst Lubitsch, George Lucas, David Lynch, Terrence Malick, F.W. Murnau, Alan J. Pakula, Sam Peckinpah, Arthur Penn, Otto Preminger, Robert Rossen, King Vidor, Josef von Sternberg, Orson Welles, e tantos outros. Alguns foram compensados com Óscares de

10 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon 1. Qual foi o Óscar mais mal entregue na história da Academia? 2. Qual a maior injustiça da Academia, o Óscar que nunca foi dado e deveria ter sido? 3. Qual a sua aposta emocional para este ano? Quem ou que filme gostaria ver receber um anco dos réus Óscar? carreira, mas nunca um filme seu p roubou Quentin Tarantino. A Jim Carrey faltou o Óscar por “Homem justificou uma estatueta. Em vez dos Óscares que não deviam ter sido al Cardoso atribuídos, prefiro sublinhar os que deveriam e não foram. Mas a No ano de Academia, em muitos casos, corrigiu Roberto a aritmética, com os “Honorary Benigni (“A Award” ou os “Thalberg Award”. Vida é Bela”), 3. Há vários candidatos possíveis. havia Jim Julgo que o rei da noite vai ser Carrey e “Avatar” e, de alguma forma, com “Homem na justiça. É uma revolução no campo Lua”, uma do cinema e um grande filme. A interpretação indústria precisa de renovação, de de colocar nas trazer de volta os espectadores às alturas salas, e filmes como “Avatar” conseguem-no, com inteligência, sensibilidade e curiosas motivações políticas e ambientalistas. Ficará Uma lista de 20 anos como um dos símbolos da era Obama. Depois há filmes de que gosto muito, de Óscares é apenas “Estado de Guerra”, “O Laço Branco”, nalgumas categorias “Nas Nuvens”, a soma das “respostas “Sherlock Holmes”, “Nine”, “Julie & Júlia”, e entramos nos actores, Colin viscerais de seis mil Depois de “Titanic” (1998), as águas ainda assim, a leitura feita à época foi Firth, Jeff Bridges ou George Clooney, mudaram novamente. Aquilo que foi a de falta de coragem ou vontade dos Meryl Streep ou Sandra Bullock, votantes” a cada ano, filmado em 1999, em clima de fim de votantes em ver “Brokeback Moun- Christoph Waltz ou Vera Farmiga. E a lembra Robert milénio com medo do vírus Y2K, e tain” a triunfar como melhor filme. fotografia de Christian Berger, do aquilo que chegou às mãos dos mais Mas, lá está: a transmissão televisiva “Laço Branco”. Gostava de ver Thompson, director de seis mil membros da Academia foi foi das menos vistas de sempre. Não reconhecido o talento de Kathryn algo completamente diferente da sa- reflectia um ano de 2005 carregado Bigelow. do Centro Bleier fra da década anterior. Um mês antes de fantasia – os dez filmes mais vistos de serem conhecidas as nomeações, foram fornadas de “Harry Potter”, valter hugo mãe, escritor de Cultura Popular uns Rage Against The Machine em fim “Guerra das Estrelas”, “Nárnia” ou 1. Em 1976 o “Rocky” ganha o melhor de vida tocavam “Sleep Now in The “Charlie e a Fábrica de Chocolate”, filme contra o “Taxi Driver” de da Universidade Fire” em frente à bolsa de Nova Ior- “Guerra dos Mundos”, “Batman” e Scorsese. Parece uma anedota, pena de Syracuse que, em frente a câmara de Michael “Madagáscar”. O mundo, na ressaca que não seja. Moore. Em Abril do ano anterior, Co- dos atentados de Bali, do sismo em 2. Vários. Para considerar apenas a lumbine entrava no mapa do mundo Caxemira, da morte do Papa João categoria de melhor filme, o “Citizen pelo tiroteio que um dia Gus Van Sant Paulo II e do julgamento de Saddam Kane”, de Orson Welles (em 1941), a viria a reimaginar. O Napster tinha Hussein, pedia escapismo e a Acade- “Laranja Mecânica” meses de vida e a guerra no Kosovo mia, como diz Robert Thompson, do Kubrick (em e a intervenção da NATO ainda chei- terá votado no que achava que devia 1971), o “Taxi rava a fresco. Filmes para os Óscares ganhar. Driver” do Martin nesse ano de transição? A Academia E, claro, não se pode falar de “zei- Scorsese (em 1976) escolheu “Beleza Americana” (filme, tgeist” sem olhar para 2001 e dese- ou o “Pulp Fiction” actor, realizador), uma América de- nhar ali a barreira invisível que dis- do Tarantino (em generada mas ajardinada. Escolheu tingue o antes e o depois do 11 de 1994). também “Os Rapazes Não Choram” Setembro. Em 2002 era preciso ele- 3. O candidato mais (o primeiro Óscar para Hillary Swank), var ânimos, mostrar contenção e, valioso, para mim, “Vida Interrompida” (Angelina Jolie simultaneamente, mostrar que nin- é o “Inglorious a suplantar Winona Ryder) e, fora es- guém punha os EUA a um canto – e “Laranja Basterds” do Quentin Tarantino. tes ícones da exclusão, o resto foi pai- dois Óscares fizeram do país nova- Mecânica”, de Tarantino é um mestre da acção, sagem. Esse não foi o ano de “Mag- mente a terra dos livres e corajosos, Kubrick, como conseguindo criar uma fórmula nólia”, mas podia ter sido. Nomeado da igualdade, o prenúncio do início “O Toiro excelente que não perde nunca o para três estatuetas (actor secundário da era pós-racial assinalada pela elei- Enraivecido”, pendor mais inteligente do – Tom Cruise –, argumento original e ção de Obama em 2008: Halle Berry de Scorsese, argumento junto a uma componente canção original), Paul Thomas Ander- por “Depois do Ódio” e Denzel Wa- como “Citizen de grande entretenimento. Eu gostava son não conseguiu deixar a sua mar- shington por “Dia de Treino”. Kane”, de de o ver ganhar absolutamente. E ca na Academia. E o mesmo aconte- Welles Cristoph Waltz tem de levar a ceu ao “one off” de David Lynch, Condensado num momento estatueta de melhor actor secundário “Uma História Simples”. Os Óscares obedecem a critérios vo- para que está nomeado. O seu Em 2000 fizeram-se escolhas qua- láteis, pessoais, viscerais como diz desempenho é glorioso. Sem isto, os se tão sintomáticas quanto as do ano Robert Thompson. Por vezes coinci- Óscares serão, mais uma vez, uma passado, 2009, com “Quem Quer Ser dem com o que deixa marcas na cul- porcaria. Bilionário?” a enternecer um planeta tura popular e contribuem para o assustado pela recessão; ou quanto legado cinematográfico histórico. Albuquerque Mendes, artista as de 2006, com as “questões fractu- Outros prémios, como o de 2007 pa- plástico rantes” na mira da Academia: “Coli- ra “The Departed – Entre Inimigos”, 1. O Óscar mais mal entregue do são”, com o tema da discriminação nascem de outras circunstâncias, co- cinema vai para...em 1956 ano em racial, foi considerado o melhor fil- mo a qualidade aliada a uma longa que concorreu “Gigante” com James me, os vaqueiros “gay” deram o Óscar carreira, um elenco de prestígio e um Dean o Óscar foi para... “A volta ao do melhor realizador a Ang Lee (“O legado que tem de ser validado, final- mundo em 80 dias”. Segredo de Brokeback Mountain”) e mente. Scorsese levou o Óscar para 2.2. StanStanleyley KuKubrickbrick nunca teve um George Clooney pôs o Médio Oriente casa depois de ter perdido com “Toi- ÓÓscarscar em “Syriana” (melhor secundário) – ro Enraivecido” em 1981 para “Gen- 3.3. TarantinoTarantino semsempre...pre...

James Dean, “Gigante”

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 11 1. Qual foi o Óscar mais mal entregue na história da Academia? 2. Qual a maior injustiça da Academia, o Óscar que nunca foi dado e deveria ter sido? 3. Qual a sua aposta emocional “Os Ósc para este ano? Quem ou que filme gostaria ver receber um Robert Thompson, especialista em c Óscar? num mundo f

Bruno de Almeida, cineasta A cada ano, tenta-se fazer 1. “Dances” with Wolves”, Kevin uma leitura sobre os Óscares Costner (no mesmo ano que – a relevância, o que dizem “Goodfellas” e “The Godfather III”) sobre a América. “Continua a 2. “Ragging Bull”, Martin Scorsese ser uma cerimónia centrada 3. Tenho por regra te Vulgar” de Redford – quem se nos EUA. Quando alguém não ver os filmes lembra de um e quem se lembra de Sally Field expressou vê a cerimónia na China, é premiados aos outro? uma grande cerimónia de Óscares a não ser Há anos assim, em que convivem o que são os Óscares prémios americana”, diz muito depois candidatos fortes e a escolha é dispu- em 1985, quando Robert Thompson, director (geralmente tada: veja-se 2008, quando a conten- e fundador do Centro Bleier acabam por passar da entre “Este País Não É para Ve- aceitou o prémio por para a Cultura Popular da nos aviões e coisa lhos” e “Haverá Sangue” deu a vitória Universidade de Syracuse. do género). Prefiro aos Coen e deixou para trás uma be- “Um Lugar no “Não quero ser totalmente ir a um pequeno la lista de perdedores, com “Sweeney cínico. Os fi lmes de Hollywood cinema e descobrir Todd”, “No Vale de Elah” ou “Perse- Coração”: “Vocês são, desde há um século, uma um documentário polis”. E depois há outros em que das produções culturais mais que esteja a passar nada parece fazer sentido ou em que gostam de mim, neste versáteis do mundo”, explica em sala certos títulos atestam que não supor- momento, vocês este especialista na forma como taram o passar do tempo, a validação os produtos culturais moldam Dario Oliveira, da História: caem pelas brechas para gostam de mim!” a cultura contemporânea. director do o oblívio. Que memória, que marca “Hollywood lembra-me a Festival Internacional de Curtas “Toiro deixou o melhor filme de 2003, “Chi- É tudo condensado helenização da Europa e da Ásia de Vila do Conde Enraivecido” cago”, no ano de “O Pianista”, de Po- depois da morte de Alexandre, 1. Foram de facto lanski, “Inadaptado”, de Spike Jonze, num episódico o Grande, em que uma língua e vários mas o que ou “Gangues de Nova Iorque”, de momento uma cultura se espalharam por mais me incomodou Scorsese? Manteve aberto regato por uma parte do mundo. Hollywood pelo efeito bola de onde ainda hoje viaja o musical? Não, é consumível em grande parte neve que o género está morto, independente- porque nasceu quando o país proporcionou foi mente do sucesso comercial ou artís- estava cheio de recém-chegados entregar o Óscar ao tico de um filme em particular. E que que ainda não falavam inglês.” “Rocky” em vez de o imagens ficam desse ano: Adrien Bro- Agora, os Óscares podiam atribuir ao “Taxi dy e Day-Lewis? Ou Zeta Jones e perder o seu poder agregador, Driver”, vergonhoso Zellwegger? Talvez nenhum, talvez o seu brilho. Mas Thompson simplesmente. “Bowling for Columbine”, premiado acredita que, pelo contrário, eles 2. Também houve com o Óscar documental e promo- serão um farol, o nosso momento várias injustiças, vendo Michael Moore a porta-estan- de comunhão pop num mundo muitas vezes encobertas com a Alfred darte do que viria a ser a droga pre- em rápida mudança. entrega de prémios menores como o Hitchcock ferida da geração Y, os “webdocu- última vez que fora anfitrião dos Ós- Óscar pelas carreiras, em jeito de mentários” de teoria da cares – em 1993: “As coisas eram tão A caixa de Nos últimos 20 anos, a cultura consolação mas o mais estridente e conspiração. diferentes na altura. Sabem quão di- chocolates de popular mudou. O que signifi cam absurdo para mim foi o Alfred E, claro, estes olhares retrospecti- ferentes? O Presidente era Bush, a Forrest Gump os Óscares hoje? Hitchcock nunca ter recebido Óscares vos, com maior ou menor distância economia estava a afundar-se e tínha- era mais doce Primeiro há que dizer que o pelos seus filmes – como foi isto em relação a filmes, actores, argu- mos acabado uma guerra com o Ira- do que o principal papel dos Óscares é o de possível com obras próximas da mentistas, ícones, produzem redes- que.” Cíclico ou não, Sally Field ex- hamburguer dispositivo promocional. Há a ideia perfeição umas atrás das outras ao cobertas... curiosas. É ver Meryl Stre- pressou o que são os Óscares melhor mal passado de que é a indústria a reconhecer as longo da sua longa carreira? ep ano sim, ano não, ano sim como do que ninguém em 1985, quando com cocaína à criações dos seus pares. É verdade. 3. Sem sombra de dúvida o “Single candidata. É redescobrir que “O Por- aceitou, extasiada, o prémio por “Um mistura de E sabemos aquilo de que as pessoas Man” de Tom Ford, merece prémios quinho Babe” foi um sério candidato Lugar no Coração”: “Vocês gostam “Pulp Fiction”, comuns gostam porque vemos isso para Melhor Realizador, Melhor a melhor filme e melhor realizador de mim, neste momento, vocês gos- e por isso nas bilheteiras. Mas os Óscares Actor, Melhor Actriz, Melhor Filme, em 1995. E ver quão sábio é Billy Crys- tam de mim!” É tudo condensado Forrest tudo são sobretudo uma ferramenta Melhor Banda Sonora, Melhor tal quando, em 2004, recordava a num episódico momento. levou promocional da indústria. Guarda Roupa. Mas como habitualmente vamos ser surpreendidos pelo gosto mediano e ultraconservador dos membros da Academia, quem me dera estar errado!

Samuel Úria, músico 1. Consta que “O Vale Era Verde” bateu “O Mundo A Seus Pés” e “A Relíquia Macabra” em 1941. Um filme familiar do Ford a bater o vanguardismo do Welles e o carrossel do Huston. Nunca uma estatueta dourada foi tão mal entregue. Sem diamantes incrustados, sem banho de platina, sem cerimónia de Estado, sem feriado decretado. Ford merecia mais. 2. Falem-me em Hitchcok, falem-meem-me em Chaplin, falem-me em Caryry Grant, falem-me em Richard BBurton.urton. De acordo com tudo, mas a verdadeerdade é que os Óscares nunca ganharamam um Peter Sellers. 3. Literalmente emocional, digogo “Up - Altamente”, que só com balões coloridos me fez um verdadeiro “blitzkrieg” aos sacos lacrimais. Mas, quanto ao meu favorito, estou dividido entre os dois filmes de guerra nomeados: Peter Sellers

12 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon 1. Qual foi o Óscar mais mal entregue na história da Academia? 2. Qual a maior injustiça da Academia, o Óscar que nunca foi dado e deveria ter sido? scares organizam o caos” 3. Qual a sua aposta emocional para este ano? Quem ou que m cultura popular, acredita que os prémios da Academia serão um farol: o nosso momento de comunhão pop filme gostaria ver receber um o fragmentado, em constante mudança. Joana Amaral Cardoso Óscar?

poucos anos [1969] “Midnight “Sacanas sem Lei” e “Estado de Cowboy”, sobre um prostituto Guerra”. Arrisco o segundo, para que urbano, vence. Sabemos que nessa James Cameron se sinta um frágil altura a cultura estava a mudar. Mas paraplégico ao pé da ágil, magnífica, nem sempre é tão óbvio. Há tantas enorme, azul, extraterrestre e ex- coisas que informam essas listas mulher Kathryn Bigelow. – as mudanças culturais afectam o tipo de fi lmes que são feitos, que Miguel Esteves Cardoso, cronista respondem ao contemporâneo, e 3. “An Education” é um bom filme de daí há nomeações; e em segundo televisão. “District 9” é um bom filme lugar nunca sabemos o que passa de baixo orçamento, estragado pelo pela cabeça dos votantes. Existe final. “Avatar” é um assalto a sensação de que as pessoas tecnológico, que vai ser que votam não viram todos os tecnologicamente ultrapassado. “The nomeados e que votam no que Hurt Locker” [“Estado de Guerra”] é acham que devia ganhar e não bom por ser realista e por ter a na melhor actuação ou no melhor coragem de reconhecer a guerra - mas fi lme. “Gandhi” ganhou no ano de não é um grande filme. Os únicos bons “ET” [1982]. Era um bom fi lme, mas filmes nomeados foram “A Serious era sobre Gandhi. Acho que o ser Man”; “Inglorious Basterds”; “Up”, Os Óscares, Nos últimos 20 anos as coisas humano Gandhi é que ganhou “Das Weisse Band” (o melhor filme defende mudaram e nos últimos anos “Os Óscares já não o Óscar. [risos] E há os Óscares estrangeiro) e “Fantastic Mr.Fox”, o Robert tivemos fi lmes muito bons de que entregues aos nomeados que já mais original de todos. Gostei muito Thompson, a maioria das pessoas não tinha são o grande o foram muitos anos. Tudo isto se de “Up In The Air”, mas, se não fosse têm ajudado ouvido falar até serem nomeados. acontecimento de funde nessa tal forma amorfa da George Clooney, não tanto. Mostra pequenos Nesse sentido, os Óscares têm cultura num dado momento. que Ivan Reitman é muito inteligente. filmes como ajudado a dar a conhecer trabalhos antes, mas à medida E como é que se lida, mesmo “Nine” é a pior nomeação de sempre. “O Segredo de feitos fora dos EUA ou pequenos olhando para essa forma difusa, Os documentários são todos uma Brokeback fi lmes independentes. Mesmo “O que a cultura com o facto de no ano de “Pulp desilusão. Só não vi “Precious”, mas Mountain”: foi Segredo de Brokeback Mountain”: foi Fiction” se ver “Forrest Gump” a só por resistência familiar. Jeff Bridges visto por visto por muito mais pessoas graças se fragmenta, quando ganhar? em “Crazy Heart” é muito bom mas é muito mais ao facto de se ter saído tão bem nos há tantas opções, Só podemos olhar para isso assim: um Jeff Bridges que já conhecíamos pessoas por se Óscares. nesse ano, a comunidade de dos filmes de Peter Bogdanovich e dos ter saído bem Mas indissociável dos Óscares é filmes, televisão, Hollywood decidiu apostar num irmãos Coen. Quentin Tarrantino e nos Óscares a sua transmissão televisiva, e fi lme “feel-good”. Era 1995 [logo “Inglorious Basterds” são os mais nesses anos em que fi lmes menos cabo, produtos para a seguir à “Lista de Schindler”] e prejudicados. O pior filme nomeado é conhecidos são as estrelas da tinham um fi lme “avant-garde”, “The Imaginarium of Doctor cerimónia, as audiências são mais a Net, os Óscares inovador e comercialmente Parnassus”, do pior realizador de baixas... viável contra um fi lme à Jimmy sempre, Terry Gilliam. Isso não é surpreendente e por isso podem servir como Stewart. Escolheram o último e é que este ano temos dez nomeados penso que as bilheteiras são mais André Murraças, encenador, para Melhor Filme. É verdade que se um “Top Ten” conclusivas do que os Óscares dramaturgo e cenógrafo não conhecermos quatro dos cinco Robert Thompson [“Gump” foi o mais visto do ano e 1. Oh, há tantos. nomeados, sentimo-nos menos “Pulp Fiction” o décimo mais visto]. Preferências à parte, envolvidos. Mas as más audiências Nos Óscares teve mais votos. Se talvez a Gwyneth envolvem outros elementos. Em em 2004 “Fahrenheit 9/11” tivesse Paltrow no geral, se as audiências baixaram nos sido nomeado para melhor fi lme “Shakespeare in últimos 20 anos isso deve-se ao facto São votantes e por isso e tivesse ganho [ano de eleições Love” em vez da de passarmos de ter quatro canais à infl uenciados por muita coisa. presidenciais nos EUA], aí podíamos Cate Blanchett no escolha para 300 canais à escolha... E multiplique-se isso por dez dizer que havia uma mensagem “Elizabeth”. Ou o Assim, tudo perde audiências. por serem artistas, ainda mais agressiva. Quanto à “Lista de “Gigi” ganhar em Não acha que a net, enquanto mais propensos a coisas [risos]. É difícil Schindler”, era um bom fi lme e tinha vez do “Vertigo”... um fornecedor de informação fazer um cálculo. Olhando para um tema tão sagrado que produz 2. Terei de dizer: sobre celebridades, contribui para os últimos 20 anos, não acho que o efeito Gandhi. No ano seguinte, Montgomery Clift. a perda do brilho dos Óscares? se possam tirar conclusões sobre olhando para “Forrest Gump”, Ao longo da sua Não acho que esteja a causar a a qualidade artística real. O que será que era o sorvete de que Montgomery carreira foi nomeado três vezes para baixa das audiências – não nos esse olhar nos dá é uma silhueta, precisávamos para limpar o palato? Clift: Melhor Actor com “The Search”, o EUA. Mas tem razão numa coisa: delineada de maneira ampla e [risos] 4 nomeações. meu predilecto “A Place In The Sun” e nos anos 1960, por exemplo, não difusa, do que a cultura está a fazer. Há 20 anos ainda não 0 estatuetas “From Here To Eternity”, e ainda se sabia muito sobre as estrelas a Penso que é o mais próximo que conhecíamos alguns dos uma vez para Melhor Actor não ser quando iam ao programa conseguimos chegar. nomeados e o “hype” era muito Secundário naqueles minutos do Johnny Carson. Ver as estrelas Nos anos 1960 temos um ano [1965] maior. Hoje, sendo tudo tão perturbantes do “Judgment At na passadeira, nos discursos uma freira que canta a ganhar, com acessível, estaremos a caminhar Nuremberg”. 4 nomeações. 0 de agradecimento... era um “Música no Coração”, e passados para a irrelevância dos Óscares? estatuetas. acontecimento. Raramente víamos Não, acho que é possível que 3. Colin Firth porque gostei muito as estrelas fora das personagens. isso torne os Óscares ainda mais daquela contenção, num papel fora Agora, claro, não conseguimos relevantes. A cultura popular está das palhaçadas que ele costuma fugir-lhes. E metade delas têm tão fragmentada... Os Óscares já fazer. Este ano as minhas apostas “reality-shows”... Agora, não só não são o grande acontecimento de estão também no “Up in the Air” e no a proliferação de informação, antes, mas à medida que a cultura “Precious”. No primeiro pelo texto, no mas também a proliferação de se fragmenta, quando há tantas Gena segundo por aquelas duas mulheres cerimónias de prémios, tornou-nos opções, fi lmes, televisão, cabo, Rowlands: 2 monstrosamente perturbantes. um pouco cínicos. Apesar disso, produtos para a Net, os Óscares nominations, os Óscares continuam a ser a mãe podem servir como um “Top Ten”. 0 wins Raquel Freire, realizadora de todas as cerimónias – se só se Os Óscares organizam o caos 1. “Titanic” pudesse receber um prémio, era este dando pistas. E acho que o que mais 2. Gena Rowlands (2 que se quereria. RobertRobert mudou nos últimos anos na forma nominations, 0 Nos últimos 20 anos podemos ThompsonThompson como interagimos com os fi lmes foi wins) encontrar prémios e nomeações o vídeo. Agora, os Óscares tornaram- 3. Gabourey Sidibe - sintomáticos de um momento. se num gigantesco anúncio de melhor actriz -, por Mas também pode parecer tudo aluguer de DVD. É ver o que mais se “Precious: Based on aleatório, fruto dos votos distintos aluga ou se procura na Internet na the Novel ‘Push’ by de 6000 pessoas. manhã seguinte aos Óscares. Sapphire”. Realizadora: Kathryn Bigelow.

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 13 Diz-me quem e

UmUm casal pperfeitoe NomeadosNom para o Óscar de memmelhorl realizador e melhor actoraacto secundário por “Inglou- riousrir ou Basterds”

ChristophCChh Walz, no seu nazi refinadamenteree calculista e desapiedado, é genial nos “Inglourious Basterds”. Se há alguma renitência – por A guerra dos exemploe quando se escreve sobresoo o filme – em destacar a ex-cônjuges presençapre de Walz ela justifica-se ppeloelo risco de, removido do contexto, Nomeados para melhor o seseuu nazi ficar apenas um “boneco” realizador ((c(comom ccerteza, espectacular),lar), e dedesarticular-sesar o delicadodo O “hype” não podia deixar de pegar eqequilíbriouilíb maniqueísta (ouou nisto: dois ex-cônjuges em mmelhor:elho equilíbrio sobre o competição directa pelo Óscar de mmaniqueísmo)aniq que Quentin melhor realizador (e os seus filmes nonorteiarteia toda a competem na respectica categoria). constrconstruçãou do filme de Tarantino Foram só dois anos de casamento TTarantino.aranti Curiosamente, Christoph (entre 1989 e 1991), mas deve ser aaoo nomnomeá-loe para o Óscar inédito na história dos Óscares. A ddee memelhorlho actor Waltz relação profissional entre eles, pelo sesecundário,ecundd a Academia menos essa, retira alguma paparecer ter percebido iistosto “pimenta” ao potencial confronto: bbem e tratado um dos melhores filmes (se não o ““I“InglouriousI Basterds” como um melhor) de Kathryn Bigelow, fifilmel sem “protagonistas”, “Strange Days”, de 1995, teve assente em figurfigurasa trabalhadas para além da sua argumento e produção de James reressonânciassonâânciia “h“humanista”,uma em perfeita convulsão Cameron. Diferentes são as dodosos mecanismos de adesão do espectador. histórias do reconhecimento de DDitoit isto (mas até por isto), é claro que Walz é fabuloso. Como cada um. Ambos vieram de prprojecçãoro ou cristalização de um estereotipo de nazi “submundos” (Cameron formou-se ((“verdadeiro”“v ou “falso”, é irrelevante) tal como consagrado na“oficina” de Roger Corman, poporor dúzias de ficções cinematográficas ao longo de décadas; Bigelow no circuito da “avant- ouu como “incorporação” da miscelânea de repulsa e atracção garde”), ambos se fizeram notar poror ququeu estão na chave de todos os fascismos (é a questão do um gosto do cinema acção com ““carisma”cac do nazismo que a personagem de Walz põe). vários pontos em comum. Mas se JamesJames RResumindo:e Tarantino ou Walz? Os dois: um Óscar só para a Cameron nunca faltou público WaWWalz será tão justo como, digamos, superficial. L.M.O. – imediatamente conquistado Cameron pela saga do “Exterminador Implacável” – Bigelow teve Kathryn sempre mais estima crítica do Bigelow que bombas de bilheteira (pelo Colin contrário, encontrou alguns “flops”s” importantes). Se há um “confronto”o” Firth entre os dois nestes Óscares ele é menos significativo do que o facto O actoracto singular de “Avatar” e “Estado de Guerra” Nomeado pparaarar o Óscar de Melhor Actor simbolizarem duas mecânicascânicas por “Um HoHomemmem Singular” diferentes do processo de reconhecimento da “Toda““Toda a ggenteente sasabeb quem Colin Firth é. É o sr. Darcy.” Não somos nós que o dizemos, é Isabel Academia: Cameron e Lloyd, da revistrevistaa ““The Economist Intelligent Life”, referenciando a adaptação televisiva de “Avatar” (para este “Orgulho“Orgulho e Preconceito”Preco que tornou o actor inglês de 49 anos em objecto de desejo das efeito, como que um balzaquianas.balzaquianas. E continua, mais à frente: “Comparado com os seus contemporâneos – “Titanic 2”), o muito KennethKenneth BranBranagh,aga Rupert Everett, Daniel Day-Lewis – Firth passou a maior parte da sua grande e muito carreira a fugifugirr ddo seu próprio talento. Porquê?” megalómano, o filme Não deixa de ser vverdade que Colin Firth é um grande actor sério – sabe quem o viu em que se impõe pela “Valmont”“Valmont” ou ““RaparigaRaparig com Brinco de Pérola” - mas contam-se pelos dedos os filmes em que simples existência; e eexercitouxercitou os seus taltalentosen dramáticos. São as comédias “descartáveis” em que passeia a sua Bigelow e “Estado de elegância e reserva iidentificadasd com a expressão “actor inglês” que primeiro vêm à cabeça. Guerra”, a “miniatura” CoisasCoisas como “O“O Diário de Bridget Jones”, “O Amor Acontece”, “A Paixão de Shakespeare” ou que se impõe pela “Mamma“Mamm Mia!”. insistência, pela cauçãoo ddee É issoiss que torna “Um Homem Singular” tão singular: é um daqueles presentes qualidade e seriedade quequu qualquer actor só tem a espaços raros. O papel de uma vida, a garantida pela recepçãoo da oportunidadeopo de reconhecermos como Firth é um notável actor sério. “Um crítica e dos festivais. UmUmama HomemH Singular” pode ser o primeiro passo para deixar de ser o “actor coisa não é necessariamentemente inglês”in e ser, apenas, o grande actor que só a espaços vimos no grande écrã. melhor do que a outra. MMasas Mas,M logo este ano que podia ser de Firth, é Jeff Bridges que todos apostam “Estado de Guerra” é muitouito queq vai ganhar. Não é impossível que Colin leve o Óscar para casa – é apenas melhor filme do que “Avatar”.vatar”. improvável.i Haverá outra oportunidade assim? J. M. Luís Miguel Oliveira

14 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon está nomeado, dir-te-ei porquê Depois das últimas edições dos Óscares terem sido dominadas por fi lmes que, na sua maioria, os espectadores não viram, na edição 2010 o fi lme de maior êxito de sempre, “Avatar”, parte à “cabeça do pelotão” empatado com “Estado de Guerra”, de Kathryn Bigelow. Jorge Mourinha

“Avatar”, de Cameron, parte para a cerimónia à “cabeça do pelotão” empatado com “Estado de Guerra”, de Bigelow: nove nomeações cada, entre elas as de Melhor Filme e Melhor Realizador

São dez os nomeados para Melhor nhar mais com a vitória (mais ao nível papel simbólico do “filme inglês” do Filme nos Óscares 2010, pela primei- das vendas do DVD). São dez os nomeados ano, completo com nomeação para ra vez desde 1943. Para garantir que Com oito nomeações, segue-se “Sa- para Melhor Filme, melhor actriz, e “Up – Altamente!” a transmissão televisiva atrai o máxi- canas sem Lei”, de Quentin Taranti- (cinco nomeações), a mais recente mo de audiência possível, mas tam- no, igualmente repartido entre cate- pela primeira jóia animada da Pixar, torna-se no se- bém para possibilitar uma reconcilia- gorias técnicas e artísticas. Tarantino gundo filme de animação nomeado ção com os espectadores - depois das foi previamente ignorado pela Acade- vez desde 1943, para melhor filme após “A Bela e o últimas edições serem dominadas por mia (“Pulp Fiction” ganhou o prémio Monstro”. Mas “Up” parte favorito filmes que, na sua maioria, eles não de argumento, e foi só), e a sua aven- para garantir que para o Óscar de melhor longa anima- viram. tura revisionista sobre a II Guerra é o da, o que anula as suas hipóteses. E Nesse aspecto, saiu a “sorte gran- seu primeiro grande sucesso de bilhe- a transmissão “Uma Outra Educação”, cujos resul- de” à Academia de Hollywood: o filme teira – as nomeações surgem, assim, televisiva atrai o tados comerciais são modestos, está de maior êxito de sempre, “Avatar”, como uma espécie de “aceitação” do demasiado próximo dos “pequenos de James Cameron, parte para a ceri- cineasta na “primeira divisão” máximo de audiência filmes independentes” que domina- mónia à “cabeça do pelotão” empa- hollywoodiana. Mas o único prémio ram as nomeações em anos anteriores tado com “Estado de Guerra”, de Ka- que já lhe está garantido cabe ao aus- possível para ser candidato sólido. Finalmen- thryn Bigelow. tríaco Christoph Waltz, nomeado na te, a presença de “Distrito 9” (quatro Ambos somaram nove nomeações categoria de melhor secundário. nomeações), a fita de ficção científica e estão nomeados para Melhor Filme Dois outros filmes, ambos com seis de Neill Blomkamp sobre alienígenas e Melhor Realizador. Mas fora dessas nomeações: “Nas Nuvens”, de Jason tida como vencedora do prémio de em Joanesburgo, e de “The Blind Si- duas categorias-chave, “Avatar” está Reitman, comédia dramática que fala actriz secundária. Mas ambos podem de” (duas nomeações), o drama des- presente exclusivamente nas catego- de temas sérios com um sorriso nos beneficiar com vitórias, pois ainda portivo de John Lee Hancock com rias técnicas: as nomeações reconhe- lábios, transportada por uma vedeta estão em exibição em sala. Sandra Bullock, reconhece os grandes cem o êxito do filme e o perfeccionis- confirmada (Clooney) – podia ser um Sobram os outros cinco nomeados sucessos de dois filmes feitos com mo e a inovação técnicas, mas não o Capra dos velhos tempos; “Precious”, – e as suas possibilidades de sairem pouco dinheiro “à margem” do siste- consideram uma obra artisticamente de Lee Daniels, a “problem picture” do Kodak Theatre com a estatueta são ma de Hollywood. Mas “Distrito 9” “séria”. Já as nomeações de “Estado que gerou polémica e aborda uma in- quase (mas não inteiramente) nulas. pertence a um género (a ficção cien- de Guerra”, equitativamente distri- justiça social com um olhar melodra- A carta mais fora do baralho é “Um tífica) que a Academia costuma igno- buídas pelas categorias artísticas e mático e a redenção como horizonte Homem Sério”, dos irmãos Coen (du- rar e todas as suas outras nomeações técnicas, colocam-no na longa tradi- – podia ser uma produção de Stanley as nomeações), que parece ter resso- são técnicas. Por outro lado, os dra- Os dramas ção dos Óscares reconhecerem temas Kramer (ele de “Adivinha Quem Vem ado com os votantes da Academia mas mas inspiracionais desportivos têm inspiracio- sérios contemporâneos, e a unanimi- para Jantar”). “Nas Nuvens” ficou pa- não com o público nem com a crítica, tradição no cinema americano, sufi- nais dade crítica tornava quase impossível ra trás no pelotão quando “Avatar” e que parece estar na lista apenas de- ciente para que “The Blind Side” não desportivos que o filme não fosse nomeado. Difi- explodiu nas bilheteiras, “Precious” vido ao triunfo de “Este País Não É possa ser inteiramente posto de lado têm tradição cilmente um deles não sairá vencedor sempre foi considerado um “outsider” para Velhos” há dois anos. – sobretudo porque uma vitória dar- no cinema da noite, mesmo que dos dois seja - embora, tal como Christoph Waltz, “Uma Outra Educação”, de Lone lhe-ia um embalo para a estreia mun- americano, o “Estado de Guerra” quem pode ga- Mo’nique esteja praticamente garan- Scherfig (três nomeações), cumpre o dial que de outro modo não teria. que é suficiente para as hipóteses de Sandra Bullock em “The Blind Side”; Christoph Waltz terá a sua vitória garantida, embora Clooney seja Clooney...

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 15 Todos aderem a George Nomeado para o Óscar de Melhor Actor por “Nas Nuvens”

O escritor Nick Hornby, que está nomeado para o Óscar de Melhor Argumento por “An Education”, já recebeu em casa a papelada da Academia. Entre ela existe um formulário sobre os outros Gabourey nomeados que gostaria de conhecer. Sidibe “A minha mulher, depois de ter pensado nisso durante uns bons três e segundos, respondeu ‘George Mo’nique Clooney’. Com um ponto de exclamação a seguir ao nome dele. Algures em Los Angeles, um funcionário da Academia está a pôr todos os pedidos para conhecer George Clooney numa pilha Outras imagens monstruosa”, escreveu Hornby no Nomeadas para o Óscar de Melhor Actriz e seu blogue. Melhor Actriz Secundária por “Precious” A senhora Hornby não está só. Clooney é isto. A natureza deu-lhe algo que não se aprende no Lee “Numa altura em que Michelle, Sasha e Malia e Obamabama Strasberg Institute. No cinema, seja estão na Casa Branca, e numa era pós-‘Cosby Show’w’ [[aa qual for a personagem, aderimos a popular sitcom televisiva sobre uma família afro- Clooney. Ele está nesta gala por americana de classe média], já ninguém pode dizerer escolha dos votantes. E os motivos que as imagens negativas da comunidade afro- podem ir desde a interpretação num americana são as únicas visíveis. Os negros já podemdem filme feito à medida do biénio 2009 dizer que ‘Precious’ representa algumas das nossasas 10, sobre um homem que ganha a crianças, mas outros frequentam a universidade ddee Yale.Yale.”” vida a despedir trabalhadores, até ao Quem o diz é Sapphire, a autora do romance que inspirounspirou facto de Clooney ser um ingrediente “Precious”, de Lee Daniels. A controvérsia que o filmeillme temtem que tudo liga numa gala deste tipo. atraído deve-se precisamente à recusa dos estereótipos,ótipos, à A sua presença cinematográfica é insistência de que há uma realidade que escapa emm cada vez mais a do sorriso ao canto preferir as zonas cinzentas às dicotomias tradicionaisonnais e da boca, qual Cary Grant ou Gary mutuamente exclusivas. Daí que as suas actrizes ttambémambém não Cooper clássicos. A sua presença encaixem nos estereótipos. pública é a de uma estrela em tornoo Gabourey Sidibe, nova-iorquina de 26 anos, não tinhaininha a mmínimaínima da qual gravitam os “paparazzi” doo experiência de representação antes da sua audiçãoão para o universo. Depois do Óscar de actor papel de uma adolescente obesa escravizada pelaa sua secundário por “Syriana”, depois monstruosa mãe, mas trouxe-lhe um pouco da suaa própria auto- do prestígio de “Michael Clayton” George confiança. Mo’nique, comediante e apresentadoraa de talk- e depois de ter feito o seu “papel Clooney shows, 42 anos, que interpreta a mãe, não hesitouu emem aceitaraceitar feio” em “Irmão, Onde Estás”, traz um papel nos antípodas da sua imagem pública. aos Óscares um efeito nivelador. Hoje, os Óscares fizeram de mãe e filha heroínas dede uma Como um homogeneizador, história da Cinderela: Sidibe foi nomeada para Melhorellhor transforma “Nas Nuvens”, filme Actriz, Mo’nique para Melhor Secundária (e, segundo quase todos os observadores, já supostamente sobre a deprimente tem a vitória garantida, apesar de se recusar a fazer campanha pela vitória (“a interpretação actualidade, em algog como “Ocean’s está no écrã, que mais é preciso fazer para convencer as pessoas a votar em mim?”). Oito anos EEleven”.leven”. No ffundo,undo, depois da vitória de Denzel Washington e Halle Berry, já ninguém pode dizer que as únicas uumm infalível imagens negras que chegam aos Óscares são essas. J. M. eefeitofeito NNespresso.espresso. J.J. A. C.

Jeff O “Dude” Bridges Nomeado para o Óscar de Melhor Actor por “Crazy Heart”

Quando venceu o Óscar em 1992 por “Perfume de Mulher”, Al Pacino queixava-se: “Estãoão a quebrar a minha onda” [de derrotado], depois de sete nomeações sem vitórias. Quando Jeff Bridges recebeu o Globo de Ouro de melhor actor dramático por “Crazy Heart”, há semanas, queixou-se, perante uma plateia que lhe dava uma ovação em pé: “Estão mesmo a lixar o meu estatuto de subvalorizado”. Jeff Bridges tem 60 anos, nenhum Óscar, quatro nomeações, um Globo, trêsêsê outras nomeaç nomeações.õeess.. FFoioio “Starman” em 1984 (uma nomeação), um “Contender” (2000, outra nomeação),ção), um dos “Fabulosos Irmãos Baker” (1989) e esteve em dois filmes de culto – “Tron” (1982)(1982) e “O“O Grande Lebowski” (1998). O papel do “slacker” anestesiado Jeffrey Lebowskiski (que prefere ser chamado de Dude ou El Duderino) é parcialmente retomado esteste ano em “Homens que Matam Cabras com o Olhar”. Mas é “Crazy Heart”, a história de Bad Blake, cantor de country alcoólico em queda, que o coloca como favorito eemm 202010.10. O “underdog” é agora um opositor de estrelas (Clooney), vacas sagradas (MorganMorgan Freeman), nichos (Colin Firth) e semi-desconhecidos (Jeremy Renner, “Estadotado de Guerra”). O herdeiro da linhagem Bridges – Lloyd, Beau -, o actor que os outrosutros actores admiram mas que permanece sempre na segunda linha surge numama corrida que podia não ser a sua. O filme estava fadado a ir para DVD mas a Fox lá o estreou e de repente criou-se a vaga que começa a considerar que Bridgesdges pode ser o homem da categoria. Al Pacino recebeu um prémio de consolaçãoção em 1992. Bridges pode receber o prémio de consagração em 2010. É que oss Óscares também precisam destas coisas. J. A. C.

16 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon

Ser ou não ser Alice Aos olhos de Tim Burton “Alice no País das Maravilhas” é a história de uma rapariga desajustada q à procura de si própria. E é isso que fazem o realizador e a sua equipa favorita de desajustados, c Louco envenenado pelo mercúrio e Helena Bonham Carter numa Rainha Vermelha de c Alexandra Prado Coelho, em Londres

“Now you’re almost Alice”. Quando (Underland) – que precisam dela. O gestos disparados como se o corpo a Lagarta diz esta frase já estamos a Coelho é enviado à superfície para a não tivesse controlo sobre as extre- “A história é tão caminho do fim em “Alice no País das encontrar, mas é preciso saber se ele midades, explicava que Alice é mais Maravilhas”, o filme de Tim Burton. trouxe consigo a Alice certa. “És a ver- um universo do que uma história com episódica e abstracta Saber se a rapariga de 19 anos, cabelos dadeira Alice?”, perguntam-lhe. “Isso princípio, meio e fim. “Nunca senti que aquilo de que nos encaracolados e vestido azul, que au- tem sido objecto de alguma discus- que houvesse uma versão definitiva. menta e diminuiu à medida das ne- são”, responde, sinceramente confun- Mas [a história] faz de tal maneira par- lembramos melhor cessidades, é ou não a “verdadeira dida, a rapariga. te da nossa cultura – conhecemos o Alice” é uma dúvida que atravessa Terá a dúvida atravessado também mundo de Alice através de bandas, são as personagens. todo o filme. Desde que ela, a correr a cabeça de Tim Burton desde que de músicas, de artistas. Senti que era atrás de um Coelho Branco, cai por decidiu lançar-se a filmar – em 3D e um território aberto”. Por alguma razão um interminável buraco – e é um bu- para a Disney – o clássico de Lewis No entanto, acredita, para se trans- elas permanecem raco mais negro e inquietante do que Carroll (1832-1898), que junta “Alice formar num filme falta-lhe um fio nar- Cinema o de qualquer outra história de Alice no País das Maravilhas” e “Alice do rativo. “O livro é uma sequência de connosco” –, até esse momento perto do fim em Outro Lado do Espelho”? Terá o rea- acontecimentos e encontros. Precisa- que a Lagarta lhe revela que, final- lizador de “Eduardo Mãos de Tesou- va de uma âncora”. Quem haveria de Johnny Depp mente, ela é já “quase Alice”. ra” e “O Estranho Mundo de Jack” explicar melhor esta ideia seria Jo- Muitos anos depois da sua primeira pensado alguma vez “a minha Alice hnny Depp, o actor com quem Burton ida ao País das Maravilhas (o Wonder- será a verdadeira Alice?”. trabalha há 20 anos (desde “Eduardo land que ela esqueceu completamen- Há uma semana, em Londres, em Mãos de Tesoura”), numa conferência te), são os habitantes deste mundo – conversa com os jornalistas, Burton, de imprensa em Londres: “A história que afinal se chama País Subterrâneo óculos enormes, cabelo despenteado, é tão episódica e abstracta que aquilo

18 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon Chapeleiro Louco Johnny Depp

Quando leu o “Alice no País das Maravilhas”, Johnny Depp ficou intrigado com “pequenas coisas crípticas”. Por exemplo, no Chá Maluco as personagens estão fascinadas por “coisas que começam com a letra M”. “No livro nunca há uma resposta para isso”, constatou. Foi quando começou a in- vestigar sobre os chapeleiros na Inglaterra vitoriana que descobriu uma ligação que para ele fez sentido: para fazerem os seus chapéus, os chapeleiros usavam uma cola que continha mercúrio (daí o M) e que os envenenava lentamente e lhes dava um tom alaranjado. Foi a partir daí que compôs a personagem: o cabelo cor-de-laranja, as manchas alaranjadas nos dedos, o ar alucinado (os olhos, com lentes verdes, são aumentados artificialmente). Depp e Burton queriam que o Chapeleiro fosse alguém com as emoções à flor da pele, e por isso todas as suas (súbitas) mudanças de humor mani- festam-se em todo o corpo, no rosto, na roupa, na voz (quando fica zangado ganha um inquietante sotaque escocês).

Alice Mia Wasikowska

“Alice é uma figura tão icónica que quando dizemos o nome dela na cabeça da maioria das pessoas surge esta imagem de uma rapariga loura de vestido azul”, conta Mia Wasikowska, a australiana de 20 anos que Tim Burton escolheu para o papel por achar que havia nela “uma certa calma”. “Qui- semos retirar-lhe essa carga icónica e encontrar uma Alice adolescente com a qual as pessoas se pudessem relacionar”, explica Mia. “Ela está a enfrentar o mesmo que muitas raparigas da idade dela”. Sente-se “desconfortável na sua pele” e com “a sociedade a que pertence”. Sem maquilhagem e sem distorções, Alice é a mais “natural” de todas as personagens. Mia confessa que tinha inveja dos colegas que eram ajudados pelos efeitos especiais. Mas estava demasiado ocupada a perceber em que cenas era minúscula e em que cenas era gigante para se preocupar com isso.

Rainha Branca Anne Hathaway

A actriz tinha uma ideia muito clara do que queria que a sua personagem fosse: uma “punk-rock pacifista vegan”, inspirada em parte em Blondie. A Rainha Branca é boa, mas não totalmente – afi- nal não vem dos mesmos genes que a irmã, a Rainha Vermelha? “No País das Maravilhas ninguém é inteiramente bom ou mau e acho isso fantástico. Há gradações em todas as personagens”. Numa a que entra na toca de um coelho das cenas uma mosca voa em frente da cara da Rainha Branca e ela afasta-a gentilmente. “Nunca poderia fazer mal a uma criatura viva”, diz. Foi daí que Hathaway tirou a ideia dela ser vegan. Mas, , com Johnny Depp em Chapeleiro no fundo, acha que ela tinha vontade de matar a mosca, e que todo o seu espírito zen é resultado de um esforço sobre a sua própria natureza. “Vi muitos filmes mudos da Greta Garbo porque a minha e cabeça desmedida. personagem tem que se expressar muito por reacções”, revela. Um dia experimentou levantar as mãos, porque não as queria pousadas no colo como é habitual fazer-se com vestidos vitorianos. “Nunca mais as baixei”. Por isso a sua Rainha move-se como se flutuasse, e agita as mãos no ar “co- mo se estivesse constantemente a fazer poções e a lançar feitiços”.

de que nos lembramos melhor são as Rainha Vermelha Helena Bonham Carter personagens. Por alguma razão elas permanecem connosco”. “É sempre engraçado ser rainha, conseguirmos tudo o que queremos e sermos pagos para nos por- tarmos como uma criança mimada”. É assim que Helena Bonham Carter resume o papel que o ma- Salvar Underland rido, Tim Burton, lhe atribuiu “obviamente” (segundo ele). Ela fica preocupada por ter sido escolha Para o realizador, se só uma dessas tão óbvia – tal como fica preocupada quando os filhos a reconhecem imediatamente (“mamã, mamã”, personagens pudesse simbolizar o gritam quando a vêem vestida de Rainha Vermelha), apesar de a personagem, ao contrário dela, ter mundo de Lewis Carroll seria o Cha- uma cabeça desmedidamente grande e um temperamento irascível. Será afinal Helena mais pareci- peleiro Louco. Por isso desafiou Depp da com a Rainha Vermelha do que imaginava? Quando está em cena tem basicamente que gritar – para um papel que, ao contrário do “Cortem-lhe a cabeça!” é o seu grito favorito – e isso fê-la perder a voz. Confessa que a igualmente que acontece no livro, é central no colérica Rainha de Copas do filme original da Disney não foi fonte de inspiração. O que Burton a filme. Depp quis que o Chapeleiro aconselhou a ver, e que a inspirou, foi o retrato que Bette Davies fez de Isabel I em “A Rainha Virgem”, entrasse para a sua galeria de perso- e “Mommie Dearest”, a (pouco simpática) biografia de Joan Crawford feita pela filha adoptiva desta. nagens alucinadas, torturadas. “Que- E, claro, “crianças mimadas”. ria que ele fosse ‘damaged’”, explica – a tradução não é fácil mas percebe- se exactamente o que ele quer dizer. Tweedledee/Tweedledum Matt Lucas O Chapeleiro, cabelo cor-de-laranja, chapéu alto, dedos sujos, perturban- São os dois quase esféricos irmãos gémeos que falam numa linguagem que só faz sentido para eles. tes olhos verdes (artificialmente au- Com um corpo digital, os dois têm (em parte) o rosto do actor britânico Matt Lucas (da série “Little mentados, entre 10 e 15 por cento Britain”). Lucas diz que os imaginou como “duas crianças vitorianas mal comportadas, com a mão maiores do que os do actor, e dife- metida no pote do mel”.

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 19 Num filme em que uma parte das personagens são digitais, os actores tiveram que representar num espaço vazio, e verde, em que as outras figuras eram bolas de ténis ou simplesmente pedaços de fita autocolante

rentes um do outro), tem um pas- Burton só sabe filmar que com o coelho branco, de colete E agora também a estreante Mia realizador usou por achar que fazia sado e carrega uma dor. e relógio de algibeira, que acaba de Wasikowska, uma australiana plácida todo o sentido nesta história particu- No País Subterrâneo de Burton – e o que conhece, passar por ali a correr. que confessa que até há pouco tempo lar e com este material (o que não não era esse, afinal, o título da primei- “A viagem de Alice é muito pessoal se sentia igualmente desconfortável significa que se tenha rendido defini- ra versão que Lewis Carroll fez desta e se há coisa que e interior. É uma viagem que todos em situações sociais, que tinha ten- tivamente). história? – vivem muitas das persona- fazemos quando passamos de crian- dência para ficar sozinha e fugir de E Alice no meio de tudo isto? Terá gens mais conhecidas do livro: o Gato conhece é a sensação ças para adultos e estamos a tentar festas, e que andava, no fundo, à pro- ela perdido a sua “muiticidade” (“mu- Cheshire, com o seu sorriso que fica descobrir quem somos”, explica Tim cura da sua toca de coelho para fugir chness”), como receia o Chapeleiro a pairar no ar mesmo depois de ele de ser um jovem Burton. “Há sempre coisas a passar-se para outro mundo. Louco? Será que, passados vários se ter desvanecido, os irmãos Twee- desajustado. “Cresci no País das Maravilhas, mas no centro Não é por isso de estranhar que to- anos da sua primeira visita ao País das dledee e Tweedledum, a assustadiça de toda a história está esta viagem dos eles tenham mergulhado de ca- Maravilhas, agora à beira de se tornar Lebre de Março, a colérica Rainha com essa sensação de interior”. Burton só sabe filmar o que beça quando Burton lhes apresentou adulta, já não é a mesma Alice? Será Vermelha, a beatífica (ou nem tanto) conhece, e se há coisa que conhece é a oportunidade de passarem para o que, mais distante de Lewis Carroll e Rainha Branca, o interesseiro Valete categorização a sensação de ser um jovem desajus- País das Maravilhas – por muito sub- mergulhada no universo “burtonia- de Copas. tado, que não pertence exactamente terrâneo que este fosse. E o que en- no”, é outra Alice? Se calhar são per- Mas as cores da primeira versão e nunca gostei disso” ao mundo em que vive. “Cresci com contram do outro lado foi um mundo guntas que fazem tanto sentido como que a Disney fez esmoreceram e o que essa sensação de categorização e nun- verde. Ou seja, num filme em que a que o Chapeleiro insiste em fazer: Alice encontra desta vez é um mundo ca gostei disso. Quando numa fase das uma parte significativa das persona- “Em que se parece um corvo com cinzento e tristonho, em que todos nossas vidas nos sentimos assim con- gens são digitais e em que “nunca uma escrivaninha?”. vivem aterrorizados sob o domínio tinuamos sempre a sentir-nos assim. ninguém tem o tamanho certo”, como Se calhar, como diz Burton, não há da insuportável Rainha Vermelha. E Mesmo quando casamos, temos fi- diz Burton (Alice aumenta e diminui, uma Alice certa ou uma Alice errada se a Alice original é um total “nonsen- lhos, amigos, somos felizes, todas as a Rainha Vermelha tem uma cabeça – a história é “território aberto” e per- se”, em que a menina salta de uma coisas boas da vida, se alguma vez ti- muito maior do que o normal, etc.), tence a quem se apoderar dela. festa de “desaniversário” do Chape- vemos essa experiência ela nunca nos os actores reais tiveram que represen- Os problemas de identidade não leiro Louco, em que o chá é despeja- abandona. Tentamos que ela se vá tar num espaço vazio, e verde, em que são novos. Mesmo no livro, Alice so- do continuamente nos recipientes embora mas ela fica”. as outras figuras eram bolas de ténis freu sempre dúvidas desse tipo. “Se- mais absurdos mas raramente bebido, Os seus filmes são sobre isso – Alice ou simplesmente pedaços de fita au- rá que me modifiquei durante a noite? para um jogo de “croquet” com a Rai- “é uma espécie de resistência à cate- tocolante. Deixa cá ver!”, interroga-se depois de nha de Copas, com flamingos em vez gorização”, diz – e a equipa que junta “Johnny foi o único que realmente cair pela toca do coelho e quando ten- de tacos e porcos-espinhos em vez de à sua volta encaixa nesse desajusta- gostou das filmagens”, conta o reali- ta passar por uma porta pequenina bolas, neste filme Alice tem um ob- mento generalizado. Johnny Depp, zador. “Ele gosta de coisas estranhas, para o País das Maravilhas. “Ainda jectivo: salvar Underland e ajudar os para começar (e é o próprio que diz por isso achou piada representar pa- seria a mesma quando me levantei que nunca a esqueceram. E isso, ape- que “houve sempre um atalho” entre ra bolas de ténis verdes. E usou isso esta manhã? Tenho a vaga sensação sar da loucura das personagens, faz ele e Burton, e não esquece que quan- para a personagem. Para os outros foi de me ter sentido um pouco diferen- desta uma história bastante mais con- do era considerado “veneno de bilhe- trabalhar no vazio”. Helena Bonham te. Mas se não sou a mesma, então a vencional do que a que Carroll criou teira”, foi Burton quem insistiu contra Carter, por exemplo, não se podia es- pergunta seguinte será: - Quem serei no século XIX. tudo e todos que era ele o Eduardo quecer de que a sua cabeça era enor- eu, afinal! – Ai, esse é que é o grande Para salvar os amigos Alice tem que Mãos de Tesoura). me, e que “colidia com todas as coi- problema!”. lutar contra o terrível dragão Jab- Mas também Helena Bonham Car- sas”. Todos reconhecem que o am- Na verdade não é um problema. berwock, que está ao serviço da Rai- ter (a Rainha Vermelha), mulher de biente foi alucinado. Se formos fiéis ao espírito original da nha Vermelha. No livro Jabberwock Burton desde que ele a dirigiu em “O Burton, que nos últimos oito meses história e se, como Alice, de espada aparece apenas num poema de “Alice Planeta dos Macacos” (2001), e que trabalhou na montagem, descreve a Vorpal na mão frente ao Jabberwock, do Outro Lado do Espelho” – “Bewa- aparece para a conversa com os jor- experiência como a construção de um conseguirmos “pensar em seis coisas re of the Jabberwock, my son! The nalistas espreguiçando-se dengosa- “puzzle”. E os actores contam que só impossíveis antes do pequeno-almo- jaws that bite, the claws that cartch!”. mente, com um cabelo tão extraordi- na ante-estreia londrina conseguiram ço” e acreditar em todas elas, então No filme a argumentista Linda Wool- nariamente caótico como o do mari- finalmente ter uma ideia de como o também nós seremos já “almost Ali- verton transformou-o numa persona- do, e fazendo vozes para explicar que verde que os rodeou durante tanto ce”. gem muito mais importante. a filha de dois anos adora “monsss- tempo se transformou num País das tresss” e que nisso “é igual ao pai”. Maravilhas em 3D – tecnologia que o Ver crítica de filmes págs. 42 e segs Uma viagem interior Mas regressemos por um momento à superfície e ao início da história. De- pois da morte do pai, Alice sente-se ainda mais desajustada em relação ao mundo que a rodeia e às regras de comportamento da Inglaterra vitoria- na. O pai parecia ser o único capaz de lhe garantir, quando ela se interroga- va se seria louca por ver animais que falavam e outras coisas extraordiná- rias, que “todas as pessoas boas são loucas”. Agora mais ninguém parece acreditar nisso, e todos estão mais preocupados com a festa de noivado em que Alice vai ser pedida em casa- mento por um lorde emproado do

20 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon O que aconteceu com Alice? Raras vezes um sonho se terá afastado tanto da “chata realidade” para revelar esse outro mundo onde tudo parece poder acontecer e nada permite dizer ao certo o que aconteceu. Gustavo Rubim

Há dois tipos principais de preocupado com um atraso de acontecimentos nas narrativas dois dias no seu relógio que marca de Alice: físicos e de linguagem. o dia do mês mas, para espanto de No “País das Maravilhas”, Alice Alice, não marca as horas do dia. incomoda-se com ambos e ora Como poderia a velha exigência se queixa de já não saber bem aristotélica de uma história com o que é por ter mudado tantas princípio, meio e fi m, formando vezes de tamanho num só dia um todo coerente, fi car intacta (conversa com a Lagarta), ora se neste rebuliço temporal? Não queixa de que é terrível conversar admira que o Chapeleiro esteja com as criaturas que encontra tão preocupado com o atraso por causa da maneira como elas como com a sua causa, que para discutem: “É sufi ciente para dar ele só pode ser uma: a manteiga com uma pessoa em doida!”, que a Lebre de Março aplicou pensa ela durante a tentativa no mecanismo do relógio, até de falar com o criado-sapo que ao momento em que a Lebre lhe está sentado à porta da pequena responde que a manteiga era casa onde Alice quer entrar. Mas da melhor e, aí, o Chapeleiro a loucura, vendo bem, vem da desloca a causa para a faca do pão difi culdade de separar claramente que a Lebre usou para aplicar a os acontecimentos físicos dos manteiga. Não que a faca fosse a fenómenos de linguagem: o causa: a causa terão sido, sim, as difícil diálogo com a Pomba migalhas que a faca trazia. que qualifi ca Alice como uma O Chapeleiro e a Lebre de serpente por causa do seu Março são as personagens que pescoço, agora tão longo perguntam a Alice a adivinha e fl exível, é disso a melhor famosa: qual a semelhança entre demonstração. um corvo e uma escrivaninha? O que ao mesmo tempo intriga, Pomba, de que nada distingue E, perante a impotência de desconcerta e deslumbra os Alice de uma serpente? Alice para achar a solução, são leitores de Lewis Carroll é a Com efeito, a Pomba não é só também elas que declaram não desenvoltura alucinante com personagem na história de Alice: fazer a menor ideia de qual seja a que o escritor inglês trata essa é protagonista de uma história resposta. exigência mínima da narrativa dentro da qual Alice irrompe Esta interrupção da sequência que consiste em podermos como mais uma entre as criaturas convencional em que formular distinguir os acontecimentos uns compridas e perigosamente a adivinha pressupõe conhecer- dos outros e estabelecer com eles apreciadoras de ovos conhecidas lhe a solução é emblema de um uma sequência que lhes dê ordem como serpentes. Num encontro, mundo onde todo o verosímil foi e inteligibilidade. É certo que Alice casual ou procurado, nunca é só, substituído pelo imprevisível (o está no “País das Maravilhas” e portanto, uma personagem que se que não quer dizer que tudo seja que esse país se revelará, no fi m, encontra com outra personagem, ilógico ou irracional: a explicação ser o dos sonhos, como também mas uma história que se cruza da avaria do relógio do Chapeleiro é a sonhar que Alice vive as suas com outra num ponto arbitrário é até bastante lógica; o estranho aventuras “do Outro Lado do do desenvolvimento de ambas. é chamar relógio a uma máquina Espelho”, mas ainda assim raras Com um pescoço tão longo e que não indica as horas). Nesse vezes um sonho se terá afastado fl exível, o que se torna difícil se não género de mundo a linguagem tanto da “chata realidade” para impossível para Alice é defender existe como que em suspenso revelar esse outro mundo onde a sua identidade como “little sobre as coisas que designa. Alice tudo parece poder acontecer e girl”. E a conversa acabará pelo tenta moralizar a propósito deste nada permite dizer ao certo o que reconhecimento de que a diferença Na aventura de Alice, episódio dizendo que o tempo “não aconteceu. entre ser menina ou ser serpente é coisa que se gaste com adivinhas faz muito mais diferença para Alice o essencial é a que não têm solução”; e recebe Alice e o policial do que para a Pomba, que aliás uma notável lição fi losófi ca do À distância, Alice surge como acaba sobretudo ofendida quando transmissão do Chapeleiro: “Se tu conhecesses o o contraponto da outra grande Alice remata que de qualquer Tempo tão bem como eu, não te invenção narrativa do séc. maneira não gosta de ovos crus. próprio sonho e não referias a ele como uma coisa. É XIX, ou seja, o género policial. O que aconteceu, então, neste uma pessoa.” Ora, com as pessoas Onde o policial se governa pela encontro? A pergunta poderia é pouca coisa que um fala-se e foi exactamente porque ideia de determinar, por via repetir-se desde o princípio da sonho que inspirou teve uma quezília com o Tempo da análise, da dedução e da história, desde que Alice viu (durante um concerto da Rainha de aplicação de métodos científi cos, passar muito apressado um coelho um filósofo como Copas, em Março) que o Chapeleiro uma sequência factual única branco com olhos cor-de-rosa a deixou de poder contar com contraposta a todas as narrativas repetir para si mesmo “Valha-me Deleuze mereça da os seus favores – o que é outra que a encobrem ou falsifi cam, Deus! Valha-me Deus! Vou chegar explicação para a avaria do relógio, a fi cção de Carroll explora a atrasado!” (no original está “Oh própria sonhadora mas é sobretudo o que explica a possibilidade de fazer confl uir dear! Oh dear! I shall be too late!”, imobilização perpétua nas seis múltiplas histórias para o vértice o que talvez faça a sua diferença). este comentário ao horas (tea-time) do Chapeleiro, do de um acontecimento que, por isso O Coelho vai no meio de alguma acordar: “Oh! Tive um Arganaz e da Lebre de Março. mesmo, nunca é realmente único. coisa que Alice ignora de todo e Se uma adivinha pode não ter Quando, depois de encolher o que desperta a curiosidade da sonho tão curioso!” solução, uma história como o “País até o queixo lhe bater num pé, menina é vê-lo tirar um relógio das Maravilhas” pode ser uma Alice vê o seu pescoço fi car “de do bolso do colete porque “nunca Foi só isso que espécie de fábula sem moralidade um comprimento incrível”, a sua antes vira um coelho com um onde no entanto, como diz a reação é quase em simultâneo bolso do colete do qual tirasse um aconteceu com Alice? Duquesa, “tudo tem a sua moral, de satisfação e de susto. Não relógio”. Assim, o único sentido que se a conseguirmos encontrar.” Na consegue chegar com as mãos atribui àquele coelho é o de nunca aventura de Alice, o essencial é a à cabeça, mas tenta levar a antes ter visto um igual. Limita-se, transmissão do próprio sonho e cabeça até às longínquas mãos pois, a correr e depois a cair pelo não é pouca coisa que um sonho e descobre, “encantada”, que poço durante muito tempo, movida que inspirou um fi lósofo como “o pescoço se inclinava com pela curiosidade. Atraso e queda determinação da hora da morte Gilles Deleuze na escrita do facilidade em todas as direções, mostram o mesmo: a perturbação pode decidir a identifi cação de belo livro “A Lógica do Sentido” como uma serpente”. Quem lhe do sentido determinável é um criminoso (que não tenha um mereça da própria sonhadora este iria dizer que de imediato esta equivalente ao desarranjo do bom alibi para essa hora); no “País comentário ao acordar: “Oh! Tive analogia com uma serpente se sentido comum do tempo. das Maravilhas”, no capítulo do um sonho tão curioso!” Foi só isso convertia na evidência, para a Na fi cção policial, a lanche maluco, o Chapeleiro está que aconteceu com Alice?

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 21 Filipe e o destino d Quantas vezes, no cinema ou na BD, o destino do mundo se decidiu em Lisboa? Nunca. Filipe M e fi lho dos anos 80, acabou com essa falha. E meteu vampiros, zombies, l RUI GAUDÊNCIO RUI

mail’, mas eu, como sou assim para o magro e não tenho grande capaci- dade como pugilista, decidi não tra- balhar com ele”, recorda. É claro que se lhe aparecesse pela frente alguém como Steven Spielberg, Joe Dante ou John Carpenter, Filipe Melo “daria o dedo mindinho”. O filme nunca iria acontecer. Não havia euros suficientes para bancar uma superprodução de monstros, pelo menos não para fazer justiça ao filme que Melo tinha na cabeça. E fazia-lhe impressão perder o controlo criativo para outros. “O filme deixou de ser o objectivo. O plano B acabou por ficar muito mais próximo do que eu imaginei que alguma vez o plano A ficaria.” Pirata e pianista “Posso mesmo dizer que é a melhor No início dos anos 90, Filipe Melo novela gráfica portuguesa que alguma passava horas fechado no quarto em vez li.” Quantas novelas gráficas por- frente ao computador. Os pais pensa- tuguesas conhecerá John Landis? Pro- vam que era anti-social, mas os ami- vavelmente apenas uma, aquela que gos estavam ali, como ele, a tentar Filipe Melo lhe mandou pelo correio penetrar em sistemas de segurança. há uns meses para os escritórios da Entrou em empresas de cartões de Ealing Studios, em Londres. Uma no- crédito e descobriu uma forma de fa- vela gráfica com lobisomens, gárgu- zer chamadas telefónicas sem pagar. las, vampiros e zombies, em que o Até que foi apanhado pela Polícia Ju- futuro do mundo se decide em Lis- diciária, que lhe apreendeu o compu- boa, algo que nunca tinha acontecido tador. Sentiu-se “desempregado” e antes no cinema ou na BD. Invariavel- começou olhar de forma diferente mente, algo tão apocalítico decide-se para o piano lá de casa. em Nova Iorque, Los Angeles, Lon- A pirataria informática foi substitu- dres ou Tóquio. ída pelo jazz. Entrou para a escola do Não é o caso de “As Incríveis Aven- Hot Clube “como quem vai para as turas de Dog Mendonça e Pizzaboy” aulas de natação”. Prosseguiu os es- (já conseguem adivinhar quem é o tudos musicais em Boston e voltou a música, especialmente o jazz, que é putador militar? É que, antes de ser lobisomem?), a tal novela gráfica por- Portugal. Ganhou prémios, tornou-se música de diálogo, música improvi- “hacker” e músico, Filipe, que em tuguesa para a qual John Landis, re- professor e tem feito carreira a solo e sada, é o que eu mais gosto de fazer, 2010 tem 32 anos, foi um consumidor alizador de “Um Lobisomem Ameri- como acompanhante de vários músi- se não o fizer sou infeliz.” obsessivo de filmes e televisão, em cano em Londres” e “O Dueto da cos e cantores. A música, aliás, con- Quem sabe se ser pirata informáti- que viu tudo, desde “Taxi Driver”, a Corda”, aceitou escrever o prefácio. tinua a ser a sua maior fonte de ren- co nos anos 90 não era uma influência “As Aventuras de Jack Burton nas Gar- O ponto de partida: Lisboa, como lo- dimento e a sua maior paixão. “Sou de “War Games”, o filme em que Mat- ras do Madarim”, de “Tubarão” a cal de passagem da comunidade de pianista de profissão. É triste, não é? thew Broderick jogava às guerras nu- “Massacre no Texas”, o “Duarte e espiões durante a II Guerra Mundial, [risos] O que mais me preenche é a cleares com “Joshua”, um supercom- Companhia” e o “Dartacão”. Um ima- serviu também de refúgio para os monstros, uma minoria perseguida. Nesta história, os vilões são outros. Filipe Melo, o argumentista e aque- le que convenceu Landis a escrever o prefácio – “deve ter visto tanto tri- buto, que teve de assumir a culpa” –, já tinha a história na cabeça desde 2005 e queria fazer um filme. E che- gou a ter propostas portuguesas e uma que veio do estrangeiro, de Uwe Boll, o infame realizador alemão que gosta de adaptar jogos de computa- dor ao cinema e desafiar os seus crí- ticos para combates de boxe – foi assim que ganhou a alcunha de “Ra- ging Boll”. “Queria que fosse falado em inglês. Quem ler a banda desenhada, vai per- ceber que isto não é apenas portu- guês, é tuga. É muito lisboeta, é um tributo aos filmes fantásticos que vi e ao sítio onde cresci. A conversa com o Uwe Boll foi uma conversa por ‘e- Livros

22 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon 11 A 14 MAR 17 A 21 MAR SÃO PAGAGNINI 1OO% TRICICLE QUINTA A SÁBADO ÀS 21H00 QUARTA A SÁBADO ÀS 21H00 DOMINGO ÀS 16H00 DOMINGO ÀS 16H00 LUIZ SALA PRINCIPAL M/4 SALA PRINCIPAL M/4 MAR~1O m ESCONTO DE 20% uma gargalhada e D TES PARA OS do mundo NA COMPRA DE BILHE cada dez segundos! 2 ESPECTÁCULOS e Melo, ex-hacker, pianista de jazz, argumentista, realizador , lobisomens e nazis pelo meio. Marco Vaza

Filipe Melo, o argumentista, já tinha a história na cabeça desde 2005 – Filipe é apenas o argumentista porque, diz, desenha “muito mal”; a arte é da responsabilidade de um jovem argentino de 25 anos, Juan Cavia silva!designers

ditado e é um luxo eu poder ter essa opção, o que significa que, bem ou mal, eu ainda consigo dedicar-me o suficiente para poder dar aulas e con- certos que me permitam ter estes desvarios.” Filipe Melo sentou-se na cadeira de realizador para o seu projecto não- musical seguinte, “Um Mundo Cati- ta”, uma série de televisão de seis episódios uma biografia ficcionada de Manuel João Vieira mas já com ou- tro tipo de referências, como “O Sé- timo Selo”, de Ingmar Bergman – na abertura de um dos episódios, Vieira joga xadrez com a morte e fala sueco – ou “O Gabinete do Dr. Caligari”, de Robert Wiene – uma cena em que tam- bém entra João Manuel Serra, o “se- nhor do adeus” que cumprimenta as pessoas na zona do Saldanha, em Lis- boa, e com quem Filipe Melo mantém um blogue a relatar as suas idas ao cinema. “Foi uma experiência intensa para CO-APRESENTAÇÃO APOIOS o bem e para o mal. Foi o maior que fiz até agora”, conta. “Um Mundo Ca- tita” foi, no entanto, difícil de vender. Após a sua produção em 2007, a série andou num limbo em que não conse- 22 MAR guia arranjar um canal para o exibir, SÃO SWEET BILLY PILGRIM + WWW.TEATROSAOLUIZ.PT o que só aconteceu em 2009, na PORTICO QUARTET RTP2. Depois, Filipe Melo teve pro- SEGUNDA ÀS 21H00 LUIZ SALA PRINCIPAL M/3 postas para se manter como realiza- MAR~1O dor na televisão, mas nenhuma delas lhe agradou, porque as ideias não eram dele. Lobisomens e nazis ginário próprio de quem era criança Nas 120 páginas de “Dog Mendonça” “Quem ler a banda em Portugal nos anos 80. há provas das referências “eighties” desenhada, e fantásticas de Filipe Melo. Um exem- Clássico e “trash” plo: página 13, um cartaz de “The vai perceber que isto Para além do piano, Filipe Melo tinha Thing”, de John Carpenter e o boneco uma câmara de vídeo. Foi com ela que Marshmallow Man de “Ghostbusters”. não é apenas fez os primeiros filmes, com “violen- Um plágio assumido em forma de ho- tíssimas sequências ‘gore’”, que ti- menagem. “Vamos roubar, mas va- português, é tuga. nham como protagonistas os primos mos roubar aos melhores”, admite. e bonecos Playmobil. Ser realizador Até o tipo de letra do título encerra É muito lisboeta, é um era um sonho de criança e, depois das em si uma referência. Aquelas letras tributo aos filmes primeiras experiências caseiras, só coloridas não enganam: são de “Re- voltou a repetir a experiência em gresso ao Futuro”. Se quisermos ser fantásticos que vi 2003, como produtor de “I’ll See you mais rebuscados, diríamos que é rou- in My Dreams”, uma curta de 22 mi- bado a “Howard e o Destino do Mun- e ao sítio onde cresci” nutos e o primeiro (e único) filme de do”, um dos grandes “flops” da his- zombies alguma vez feito em Portu- tória do cinema, produzido por Ge- Filipe Melo gal, com Manuel João Vieira (Enapá orge Lucas. “Também lá moram 2000 e Irmãos Catita). tributos à banda desenhada e aos ‘co- Teve um gostinho de sucesso, com mics’, com duas referências em des- prémios conquistados em vários fes- taque, ‘Dylan Dog’, uma BD italiana tivais de cinema fantástico, como o de terror, e ‘Hellboy’, de Mike Migno- Fantasporto, mas também a experi- la, sobre um demónio que investiga ência de viver com um empréstimo assuntos paranormais.” bancário. Os pais ajudaram-no a pro- Filipe Melo é apenas o argumentis- O ponto de partida para esta duzir o filme com o dinheiro que ti- ta porque desenha “muito mal”. Na novela gráfica: Lisboa, como nham guardado para lhe comprar verdade, “Dog Mendonça” é uma pro- local de passagem da uma casa – o empréstimo bancário foi dução luso-argentina, em que a arte CO-PRODUÇÃO APOIOS

comunidade de espiões durante para a casa, que ainda está a pagar. é da responsabilidade de um jovem silva!designers a II Guerra Mundial, serviu “Fui aprendendo a gerir a minha argentino de 25 anos, Juan Cavia, que também de refúgio para os própria profissão de forma a gerir es- nunca tinha feito BD – foi director ar- SÃO LUIZ TEATRO MUNICIPAL BILHETEIRA DAS 13H ÀS 20H RUA ANTÓNIO MARIA CARDOSO, 38; 1200-027 LISBOA T: 213 257 650; [email protected] monstros, uma minoria sa renda e a renda da minha casa. Não tístico de “El Secreto de tus Ojos”, [email protected] / T: 213 257 640 BILHETES À VENDA NA TICKETLINE E NOS LOCAIS HABITUAIS perseguida me quero fazer de vítima, foi preme- filme argentino que está nomeado

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 23 Nas páginas de “Dog Mendonça” há provas das referências “eighties” e fantásticas de Filipe. Um exemplo: página 13, um cartaz de “The estee ano para o Óscar de melhor filmefilme estrangeiro - e que Filipe Melo Thing”, de Carpenter nuncanun conheceu pessoalmente. A comunicaçãocom era feita por Skype, e o boneco “e-mail”,“e-m tudo o que a tecnologia podepo fazer para juntar pessoas de Marshmallow Man continentesco diferentes. de “Ghostbusters”. Apesar da distância, Filipe Melo ficoufi contente com o resultado. “Vamos roubar, “A relação objectivo-resultado é o melhor do que qualquer coisa mas vamos roubar queq eu já tinha feito. Fico conten- te por ver qualquer coisa que aos melhores” não foi corrompida, em que não tivetive ded fazer concessões”, diz Filipe Melo,Melo, que já tem ideias para uma se- Não há um limite mínimo de ven- gundagund parte, cujo título será “Apoca- das para Melo avançar com a parte lipse”,lipse” maior em tudo, já que não tem dois de “Dog Mendonça”, mas não dede pensarpe como se fosse um filme – já deixa de ser uma aposta arriscada agora,agora quando “Dog Mendonça” ain- lançar um objecto com zombies, na- dada eraera um filme, Filipe Melo tinha du- zis, mutantes e lobisomens num país asas hihipótesesp para ser o João Vicente que nunca se distinguiu muito na pro- “Dog”“Dog Mendonça, investigador do dução de fantástico. “Acredito que há ocultoocult e adepto do Benfica: Nicolau uma grande paixão por este género

RUI GAUDÊNCIO RUI BreynerBreyn e Manuel João Vieira. cá que ainda não foi devidamente ex- MaisMa uma vez, foi Filipe Melo quem plorada. Nunca faltou imaginação aos bancou a produção do projecto e não portugueses e isso vai começar a ma- tem ilusões quanto a recuperar o in- nifestar-se agora, há uma geração que vestimento. “Não vou ganhar dinhei- está agora a trabalhar e que é uma ro com isto, juro! [risos] Queria contar geração que tem este imaginário, é uma história”, diz o autor, que chegou inevitável que haja uma revolução. a encarar a hipótese de lançar o livro Acho que as pessoas têm alguma von- em edição de autor depois de a sua tade de ver monstros, pelo menos primeira editora ter mudado de ideias tenho essa fé.” e antes de conseguir o apoio da Tinta Pergunta final: que monstro seria da China para a impressão, promoção Filipe Melo? “Júri do ‘Ídolos’. Haverá e distribuição. monstro mais arrepiante que esse?” a sawsx

24 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon

“Comportem-se com ou estão a abrir a porta A sua obra como escritor refl ecte o ritmo do cinema e das séries de acção. O seu herói é um “ Conversa com o britânico Lee Child sobre os seus t

Lee Child, pseudónimo de Jim Grant, cker” e “Prime Suspect” – que nhecimento de uma bombista suicida. é um autor britânico radicado em incluíram uma pesquisa alargada e “Os países ocidentais São 12 os pormenores que ele conhe- Nova Iorque que tem arrebanhado procura aturada de informação. Não ce de cor e que caracterizam os que prémios com os seus “thrillers”, on- é de estranhar que a sua obra como são patéticos como estão prontos a morrer, matando, e de não poupa esforços ao herói por escritor reflicta o ritmo do cinema de imitação de ele sente-se compelido a intervir. No si criado, Jack Reacher, ex-combaten- acção e das séries televisivas e que o entanto, algo não bate certo. te da Polícia Militar americana, duro herói tenha o mau humor de um John 3ª categoria da É a partir deste incidente que Child e solitário, de porte atlético e senhor McClane (Bruce Willis na série “Die compõe uma trama complicada em de infindáveis recursos físicos e psi- Hard”) ou a solidão de um Jack Bauer ex-Alemanha de Leste que entram bons e maus polícias, cológicos. (Kiefer Sutherland em “24 Horas”) nos seus esforços bons e maus espiões, maus – muito

Livros Child estudou na King Edward’s Em “Amanhã Será Outro Dia” Rea- maus – bandidos e boas – muito boas School em Birmingham – a “alma ma- cher apanha o metro em Bleecker – pessoas que o ajudam a vencer as ter” de outros escritores como J.R.R. Street em direcção à parte alta de Ma- de combate a um forças do Mal numa cidade frenética Tolkien e Enoch Powell – e iniciou a nhattan. Por deformação profissional problema [o terroris- e labiríntica onde tudo pode aconte- sua carreira na Granada Television, observa as poucas pessoas que se- cer, em cada esquina. onde fez parte das equipas que pro- guem na carruagem àquela hora tar- mo] estatisticamente Com mais dois títulos publicados duziram algumas das suas mais me- dia. Uma mulher chama-lhe a aten- em Portugal – “Rumo ao Inferno” e moráveis produções – “A Jóia da Co- ção: ele está treinado para reconhecer menor” “Do Fundo do Abismo” ambos pela roa”, “Brideshead Revisited”, “Cra- os sinais que apontam para o reco- Asa – e um público fiel, Lee Child JOHNATHAN RING JOHNATHAN

26 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon mo gente civilizada a a uma resposta brutal” m “cowboy” urbano solitário que, em “Amanhã Será Outro Dia”, fareja o terrorismo bombista. s temas de eleição. Helena Vasconcelos

ofereceu-se para responder a algu- legítimo afirmar que o seu espaços vazios e perigosos. As amea- livro trata-se de terrorismo, espionagem e informação. mas perguntas do Ípsilon. herói tem raízes mais fundas, ças são vencidas por um estrangeiro algo muito assustador, porque é Os Serviços Secretos não se O seu trabalho anterior, na ligadas ao mito do herói misterioso – o cavaleiro andante, o fácil de executar. Os terroristas saem nada bem nesta história. televisão, teve algum peso solitário, ao “cowboy”, ao xogun errante, o “cowboy” – que sal- podem actuar em qualquer Aquilo que surge nas notícias quando resolveu tornar-se estranho que chega à cidade va tudo e todos “in extremis”. lugar, são destemidos e não afecta-o? O que é que tem escritor? e faz o seu trabalho, partindo Numa época em que todos têm medo de morrer. Parece falhado realmente [no combate Não, nesse tempo sentia-me feliz com de seguida sem esperar pelas dependem da tecnologia, por defender a ideia de que para os ao terrorismo]? A comunicação o que estava a fazer e nem pensava honras inerentes ao facto de ter que razão criou um herói que combater é necessário utilizar defeituosa entre agências? Um tornar-me romancista. Quando se conseguido – com as próprias nem um telemóvel tem? tácticas de guerrilha – Jack recrutamento mal dirigido? A deu essa mudança, tive o cuidado de mãos – “limpar o lugar da Exactamente para enfatizar a ausên- Reacher é um Rambo largado na promiscuidade na política? não transpor demasiadas técnicas de escumalha”? cia de contacto de Reacher com o cidade sem recursos a não ser O maior problema reside no facto de televisão no meu novo trabalho de Absolutamente. Ele faz parte de uma mundo moderno, mantendo-o firme- a sua astúcia. Acredita que só é escolherem sempre o caminho mais escrita, uma vez que são linguagens tradição mítica que inclui os heróis mente dentro dos parâmetros da tra- possível combater o terrorismo fácil para se safarem. Os países mais diferentes. dos “westerns”. Mas tudo começou dição. utilizando as mesmas tácticas? “maduros” deviam utilizar meios Um livro que tenta ser um guião, ou anteriormente com as histórias escan- Enquanto o seu herói é, No mundo verdadeiro, não. Os países mais exigentes, se isso se coadunar vice-versa, acaba por se transformar dinavas da Idade das Trevas que in- digamos, convencional nos ocidentais são patéticos ao tornarem- com as suas tradições. De contrário, num mau exemplo de ambos. No en- vadiram a Europa na Idade Média e seus métodos, as mulheres são se imitação de terceira categoria da somos todos terroristas. tanto, a nível básico creio que manti- alcançaram a América no século XIX. inteiramente contemporâneas. antiga Alemanha de Leste nos seus O tema principal dos seus livros ve a noção de que a minha intenção É uma tradição de fronteira ligada a Não há “mulheres fatais” mas esforços de combate a um problema está ligado a uma força que é sempre a de agradar a uma audiên- sim mulheres inteligentes, que é estatisticamente menor. Mas impele as personagens para um cia que não é constituída por mim, corajosas, perspicazes. Não os livros não são o mundo real, são desejo de justiça e de verdade? pelos meus amigos, pelos críticos, mas “Ele [Reacher, se fazem de vítimas, não fantasias escapistas onde é possível Ou será de vingança? por homens e mulheres comuns. mostram sinais de fragilidade, fazer uso de instintos mais violen- O meu tema de eleição é este: com- Criou um herói que, para além a personagem dos são “sexy”, atraentes e agem tos. portem-se como gente civilizada ou de solucionar mistérios e de livros] faz parte em conformidade com essas Voltando ao livro: o herói estão a abrir a porta a uma resposta ter uma acção determinante, características. Concorda com não confia nos serviços de brutal e não civilizada. possui também uma biografia. de uma tradição esta análise? É um homem maduro, vivido – Bem, adoro mulheres que sejam for- sofrimento, viagens, experiência mítica que inclui tes, inteligentes e cheias de recursos erótica e historial de luta –, que e, por isso, tento retratá-las dessa for- não pertence a nenhum lugar, os heróis ma. Talvez seja a razão pela qual Re- MUSEU DO ORIENTE que sabe o que é o sucesso e o acher se tornou tão popular entre as falhanço. É uma personagem dos ‘westerns’. leitoras – ele gosta e respeita as mu- “humana”. É o seu alter-ego? Mas tudo começou lheres, não toma atitudes condescen- Creio que todos os heróis ficcionais dentes para com elas. se baseiam na autobiografia dos seus antes com as histórias Reacher é um ex-combatente que criadores. Reacher partilha algumas continua em missão. É muitas das minhas características. Mas a me- escandinavas vezes afirmado que a maior lhor maneira de responder à pergun- desvantagem das pessoas nessa ta será assim: eu faria o que Reacher da Idade das Trevas situação é terem uma família, faz, se tivesse a certeza que me safava alguém que amam e por quem sem ser apanhado. que invadiram são amados. A segunda maior Desde “Do Fundo do Abismo” a Europa na Idade fragilidade é terem um passado (“Killing Floor”, 1997), o que pode ser usado contra eles. primeiro dos seus “thrillers” Média e alcançaram Foi por essa razão que preferiu com Jack Reacher, até criar uma personagem que não “Amanhã É Outro Dia” (“Gone a América no tem ninguém e cujo passado está Tomorrow”, 2009), o seu herói envolto em mistério? parece menos motivado pela século XIX” Não há dúvida que é uma vantagem e`[ [c Z_W" \Wp[cei feh fh[i[hlWh e gk[ Wjƒ dŒi Y^[]ek$ J[hh_dWi" fhWjei" vez sem nunca lhe atribuir o Sutherland em “24 HHoras”)oras”) subterfúgiosubterf –, que se apoia Ôeh[_hWi[jhWl[iiWibWd‚Wh#dei#€edkcWl_W][cWekd_l[hieZWfehY[bWdW$ D[Y[ii|h_WcWhYW‚€eWjƒ((Z[CWh‚e$ efeito do envelhecimento ou do na perperspicácia,s na força e amadurecimento? na vanvantagem de um bom EhW‚[iWel[dje Tento que Reacher não mude de livro treinotreino é a melhor arma de para livro, porque acredito que os todastodas?? &+W&-7Xh_b meus leitores apreciam o encontro Diz-seDiz-se quequ a arma mais valiosa '&$&&#')$&&š'*$&&#'-$&& com uma experiência previsível e de dede umum soldado é o seu cére- ;cƒfeYWZ[\ƒh_Wi"lWb[Wf[dWl_W`WhWjƒfW_iW][difedjkWZWifehXWdZ[_hWiYebeh_ZWiZ_ifeijWi confiança. Mas é verdade que ele mu- brobro e eu tento mostrá-lo. Wel[dje"Yed^[Y[heicWdjhWigk[d[bWii[_cfh_c[c[jeZWkcWYkbjkhWfehZ[il[dZWh$ da um pouco, porque eu também JacJackk Reacher pode não D[Y[ii|h_WcWhYW‚€eWjƒ(/Z[CWh‚e$ mudo. Envelhecemos e tornamo-nos sserer realr – embora na Fh[‚e0Ð,&"&&%eÓY_dW1Ð+",&Wbce‚e%Z_W mais calmos e mais sábios, juntos. ssuaua página Web http:// F‘Xb_Ye#Wble0,#'(Wdei FWhj_Y_fWdj[i0C‡d$'&"C|n$'+ Embora a maior parte dos wwwww.leechild.comw seja c[Y[dWifh_dY_fWb c[Y[dWii[hl_‚e[ZkYWj_le críticos identifiquem Jack ttratadorata como tal, um Reacher com personagens ppoucoouc à maneira de saídas da imaginação de outros ShSherlocker Holmes. Mas 7l$8hWi‡b_W":eYWZ[7bY~djWhWDehj[ r')+&#)+(B_iXeWrJ[b$0(')+.+(&&r;#cW_b0_d\e6\eh_[dj[$fjrmmm$cki[kZeeh_[dj[$fj autores do género, como John ooss pperigos que enfrenta Le Carré e Len Deighton, será sãsãoo bem reais. Neste

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 27 Livros Ó E Nuno Ramos criou o mundo A arte fi cou dócil? Este artista brasileiro acha que sim. “Ó” é o seu “big bang”, o livro em que cria o mundo em vez de coincidir com ele. Lemos e não sabemos onde estamos. Ganhou o último Pémio PT de Literatura. Entrevista em Lisboa, um regresso às origens. Alexandra Lucas Coelho

“Ó” é uma cosmogonia de 220 páginas. Estar aqui é de algum modo viver es- comunismo menores do que os do a biblioteca paterna, kafkiana, e um riência com a matéria que nunca mais Em Novembro, chegou aos finalistas se fantasma. Começando pelo fim, o capitalismo. Minha avó não, era sec- lugar de maior facilidade erótica. E saiu. Eu tenho um impulso retórico do Prémio PT (e venceu) como uma meu pai morreu uma semana depois tária, doente, punha a bengala assim: eu tinha uma [máquina de escrever] forte, uma crença na linguagem meio espécie de estrangeiro. do 25 de Abril. “Não fale mal de Estaline!” Olimpus. Escrevia, relia. No dia se- religiosa. Enquanto isso não ganhou Porque o autor, Nuno Ramos, é conhe- Dia do aniversário dele. Era isso que o aborrecia, essa guinte acordava e achava aquilo ruim. um corpo, eu não sabia do que estava cido como artista plástico e desconhe- É. E ele morreu um pouco de alegria, ortodoxia? Uma coisa meio de Sísifo. Ainda tentei falando. No fundo era isso: escrevia cido como escritor (os seus livros an- acho. Era uma pessoa muito contida, É, nunca levei isso muito a sério. A di- canção, mas foi um desastre. A coisa e não sabia do que estava falando. Até teriores apareceram nas margens do e estava eufórico com o 25 de Abril. A tadura no Brasil foi muito feia dos meus com as artes plásticas foi um pouco hoje, o meu medo é não saber do que mercado, com tiragens pequenas). Mas casa ficou muito cheia de gente nessa oito aos 14. Quando fiquei um pouco por acaso, ganhei umas tintas numa estou falando. também, ou sobretudo, porque “Ó” semana, não paravam de entrar aque- mais velho foi uma distensão, os presos época em que estava tentando aliviar No “Ó” diz que trocaria toda a não se parece com nada. Julgamos re- les portugueses exilados, um clima políticos já não estavam apanhando. o meu juízo. matéria por um nome. Como se conhecer aqui Kafka e ali Proust (e Ba- eufórico. Foi uma morte muito trau- Mas os presos comuns apanham até Já estava a estudar filosofia? fosse capaz de dar a arte por um taille, Lispector, “Gilgamesh” ou Her- mática para nós, porque ele estava hoje. O Brasil tem uma violência social Acabando, talvez. Estudar filosofia foi bom livro. berto?). Mas na passagem seguinte já bem. Teve um AVC no banho e morreu. ímpar no mundo. entender que eu não era um intelec- É. Talvez. Não sei, não. não sabemos onde estamos. Puf. Era uma pessoa muito ligada à li- Agora, eu convivi pouco com meu tual, no sentido de um comentador. Agora que tem... quantos anos Poucos títulos serão tão perfeitos. “Ó” teratura. Dava aula de literatura fran- pai. Eu tinha colegas muito mais brilhan- como artista? é um big bang, o tempo circular em cesa, porque não conseguiu entrar na Falavam de livros? tes, os caras liam melhor, entendiam 25, 30. que tudo coexiste, a infância da terra cadeira de literatura portuguesa. Exi- Muito. Meu pai queria ser escritor e melhor, sabiam alemão. Pode ter do- Vê estas duas coisas como e a memória de um homem, a violência lado de Portugal no sentido mais pro- não foi. Tentou escrever e acabou sen- ído, entender esse limite, mas não alternativas, co-existentes ou de uma jaula e a epifania da mão que fundo, subjectivamente também. do um crítico. Ele me mimava muito, doeu tanto, porque o que eu queria inimigas? toca o corpo adormecido a seu lado. Era de onde? botava muita pilha, tudo o que eu fazia era ser artista. São coexistentes, embora a ideia de “Com as mãos devolvo ao mundo o De uma aldeia perto da Covilhã, e veio ele gostava. Por exemplo, qaundo eu Só não tinha certeza do meio, heteronimia me fascine desde peque- meu próprio tamanho”, diz o homem para Lisboa novinho. tinha uns 12 anos e saiu o “Cem Anos ainda? no. Há dez anos fiz uma retrospectiva de “Ó”. É um homem subversivo, que E era do partido comunista. de Solidão”, ele estava com uns colegas A coisa da literatura não estava rolan- no Rio, obras da vida toda, com um defende a imobilidade e vê como a sen- Foi sempre. de faculdade, todo o mundo elogiando, do. O fantasma de qualquer artista curador de Bordéus. E no final ele tença pode ser outra forma de crime. Exilou-se quando? e eu, aquele pirralha, falei mal do livro. não é a arte ruim, é a esterilidade. perguntou: “Quem é o outro artista?” Um homem sem deus, que a partir de Foi em 1951-52 para França, onde de- E me lembro que ele babava de orgu- Arte ruim é algo que você faz antes de Eu disse: “Como assim? Sou eu.” uma linguagem tão misteriosa como ve ter vivido três, quatro anos. Traba- lho. Acho que fui muito criado para ser dominar, algo a que vai chegar dentro Sempre tive uma certa dúvida se isso exacta cria o mundo: pele, pêlos, pis- lhou no “L’Express”, conheceu a mi- alguém com opinião forte. E tentei mui- de dois anos. Trabalho estéril é triste. era uma potência ou um defeito. Pro- tilos, fluidos, pedras, asas, cinzas. nha mãe lá, namoraram por carta, e to ser escritor na adolescência, ainda É parecido com brochar, sexualmen- curo muito habitar vozes diferentes, Não é um romance, mas tem uma es- ele foi para o Brasil em 1956-57. mais depois de ele morrer. Escrevi lou- te: não tem, não vem, não houve. Eu separar, não deixar a amálgama ga- pécie de protagonista do começo ao A sua mãe é brasileira. camente dos 12 aos 20 anos, todo o dia. estava-me sentindo assim, estéril. nhar. Agora, eu sei que não tenho um fim. Não é um livro de contos, mas es- Filha de pessoas ligadas ao partido Detestava aula de artes plásticas na es- Artes plásticas, comecei com nin- projecto intelectual que justifique tá dividido em capítulos que se podem comunista. Minha avó era muito co- cola. Até hoje não sei desenhar, não guém. Não sabia porra nenhuma. Não vozes, num sentido pessoano. O meu ler separados. O autor diz que é algo munista. O meu avô chegou a ser can- tenho habilidade nenhuma. E escrever, tinha pessoa próxima que tivesse esforço é não deixar juntar. Quando entre poesia e pensamento. didato a deputado pelo PC. escrevia muito, em vários géneros, po- qualquer capacitação nessa área. Eu escrevo, escrevo. Paulista, 49 anos, Nuno Ramos é filho Em que atmosfera cresceu? ema, ensaio, romance. Lia bastante. fazia trabalhos horríveis, mas fazia Está a falar de períodos? de uma brasileira e de um português Era o tempo da ditadura, e a ditadura Era uma coisa muito carregada pela dez por dia. Me animei assim louca- Não, de partes do dia. exilado, que morreu quando ele tinha emburrece tudo. Quando me dei por morte do meu pai. Mas não me sentia mente, e nunca mais parei. Lembro- Este livro foi trabalhado ao longo 14 anos. gente já achava tudo muito burro, as chamado [pela escrita]. Acho que virei me de pegar aquele papel, derrubar de seis anos. A palavra “exílio” é recorrente opções, as discussões. Minha mãe fa- artista plástico numa crise total com a a água, cair a tinta, e era uma coisa Mas juntamente com outro que sai neste livro, e no capítulo 16 diz: lava para mim: “Toda geração tem seu literatura. fora de mim. Era corpo. agora, e mais um que sai no final do “Há para todo o filho a sombra reaccionário, você é o da sua.” O meu Escrevia e depois não gostava? Precisou de ir para fora para ano. Eu escrevo bastante de manhã e projectada de um pai morto.” pai, quando estava de bom humor e Isso. Eu dormia na biblioteca do meu voltar para dentro? De agarrar a ao fim-de-semana. À noite, nunca. De Qual é a história do seu pai resolvia falar, subia o nível. Era um pai, que era um quarto fora de casa, matéria para ficar sem matéria? manhã gosto do que faço, à noite não. português? comunista que achava os males do então dava para levar a menina. Era Tem alguma coisa dessa minha expe- E tenho de desligar o telefone, por-

Hoje, o perigo é a arte coincidir com o que lhe pedem. Haver uma empatia tão grande que fi que todo o mundo de mão dada. Qualquer arte não coincide com a história.

28 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon ENRIC VIVES-RUBIO

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 29 que minha vida são as artes plásti- Segundo GH”, de Clarice mundo da lei, da forma como os “Cara, eu preciso parar com isso, não cem chineses escrevem a palavra cas, e chovem coisas. Então, desligo, Lispector, mas também nas homens se organizam. Uma re- vou fazer um livro de mil páginas.” improvável, etc, et). E diz que há e tem umas duas horas de manhã em cosmogonias do princípio da cosmogonia. Podia ter mil páginas. duas armas contra isso: memória que dá para escrever. Depois eu vou linguagem, no “Gilgamesh”. Uma escatalogia, quase. E onde po- Podia. Mas quis comprimir, voltar e epifania. Começando pela para o atelier e o mundo cai. É. E [Giambattista] Vico, um pouco. nho isso tudo? Estou escrevendo so- àquele homem no fim para dar uma memória, cita sempre Proust É um programa diário? Este homem, este gigante, este bre temas enormes, sobre os quais unidade ao livro. como um autor fundamental É. Quando estou muito envolvido, corpo em expansão, pode ser pessoas enormes escreveram. A mi- Quando narro, sinto uma linguagem para si. Aqui estamos, em 2010, especialmente para o lado do poema, visto como a sua criação do nha confusão adolescente era um mais impura, como se ela me estives- e aqui está Proust. Porque é que acontece em horas improváveis. Es- mundo. Faz sentido? pouco isso. Essa cosmogonia, ou o se dominando, e não eu a ela. Em continua a ser tão importante? crevo muito tomado. Quando vou Faz. Gosto de mais de cosmogonias, que seja, são os textos de que gosto troca, viajo numa coisa chamada nar- O que posso dizer com segurança é para o atelier, não escrevo, não dá. A até fujo um pouco delas. No “Cujo” mais. Falo que é poesia porque sinto rativa, fica legal, eu me deixo ir. Mas que acho a coisa mais bonita que já vida de artista plástico é muito práti- tem muito esse tema. que mando nas palavras. Quer dizer, [nos textos não-narrativos], me sinto li. O que procuro no meio da minha ca. Você bola uma coisa, tem que ver Em “Ó” está a desafiar tudo. não estou-me deixando usar pelas mais autoral. É uma voz mais próxima tralha é uma espécie de conexão in- a fundição, se o cara está conseguin- Todo esse clima do que era antes palavras para veicular uma narrativa. do poema. findável, em que tudo conecta como do, a galeria não sei quanto, o cara dos homens e do que era antes Acho que é a minha voz mais original, Em “Ó” escreve sobre a se a linguagem fosse vegetal, fosse não sei onde. É uma confusão. da linguagem, toda a evocação onde aparecem as coisas mais surpre- simultaneidade que cria jogando pistilos que vão fecundando Há esse lado para fora e de das matérias, das pedras, dos endentes, que acho mais bonitas. Mas um presente infindável (por em outros, aquela teia de relação que negociação, de espectáculo animais. Mas depois, também, o quando estava fazendo o “Ó”, pensei: exemplo, enquanto falamos, não permite que a frase feche, aqueles mesmo, nas artes plásticas. parágrafos que vão-se somando. E E o movimento da escrita é você começou naquele vestido da Ma- aparentemente contrário. dame Verdurin e termina numa falé- Artes plásticas, é o seguinte: a matéria sia da Normandia, e não sabe como cai. Agora vou fazer duas esferas passou do reino social para o reino enormes de areia socada no Museu ENRIC VIVES-RUBIO da natureza. Acho que essa conexão de Arte Moderna do Rio. Tecnicamen- infindável é o reino da arte. A arte não te é um cu. A gente está estudando, explica, ela é presença. E essa presen- tem uma negociação que é um pouco ça no Proust é muito dilatada. da ordem da arquitectura. Cria a realidade. Isso não é chato? Cria. Nada causa nada. A linguagem Não, é altamente inspirador. Eu ado- vai por analogia. Proust é analogia ro. pura, tudo é análogo. Então, isso pa- Porquê? ra mim é uma espécie de vingança Quando cai, você percebe. A matéria contra a asma dele, aquela falta de não está bem compactada. Tem sem- fôlego. pre esse desafio, tentativa e erro. Por Em “O Pão do Corvo” há exemplo, fui mexer com sabão. A pri- uma secura, enquanto “Ó” é meira vez, a gente quase morreu, caudaloso, muito mais essa coisa quatro toneladas, a gente fabricando proustiana. Ou seja, caminha da aquilo. Artes plásticas tem esse lado. secura para o caudaloso. É matéria, físico. Eu gosto de mais. Isso. “O Pão do Corvo” vem de uma Você descobre muita coisa quando influência grande do Beckett, que é o sai errado. Nunca delego, tenho de anti-Proust, tudo é contenção, a frase estar lá. Mas é uma negociação. A li- curta. Eu precisei disso, mas acho que teratura é uma coisa minha. Estou lá o meu elemento tem essa conectivi- sozinho, tentando entrar em contac- dade infindável. Os meus quadros- to com alguma coisa. relevos, de que gosto bastante, têm E há o momento no seu percurso essa conectividade infindável. Vou de artista em que regressa à juntando, juntando, vai passando pe- escrita. la cor, vai indo. De novo, a pergunta Eu tive um desenxabimento, uma de- é: quem é o outro artista? Onde é que sinibição quando virei artista plástico, juntam? Onde é que “O Pão do Corvo” inclusive no sentido de topar fazer junta com o “Ó”? coisa ruim. Não tinha muito claro o Mas por que tem de juntar? que era bom e o que era ruim. Porque talvez seja mais rico. O Pessoa Quando voltei a escrever, já estava no junta. O controle intelectual [dos he- meu trilho, que é o “Cujo” [livro de terónimos] é dele. estreia]. E o “Cujo” começa um pou- Sobre a epifania, tem esta frase co como uma prosa de atelier, eu des- no “Ó”: “Maravilha, exerce tua crevendo experiências. Tinha 28 navalha, degola o dia antes que anos, algo assim. São aforismos, frag- eu me conforme.” E liga-a ao mentos. No “Inferno” do Strindberg, erotismo. A linguagem escava a que eu li depois, tem algo assim, uma memória, e depois a epifania é alquimia com a matéria. Logo saltou o momento em que as coisas se disso para uma certa autonomia po- ligam todas? ética. O “Ó” é um “Cujo” expandido. É o contínuo. É o que Bataille fala do Vem de lá esse tom de falsos ensaios, erótico. O momento em que a vida mal intelectualizado. O “Pão do Cor- fica contínua, em que a descontinui- vo” [segundo livro] já é mais uma dade radical de tudo vai embora. narrativa, como vai ser esse novo, “O Acho uma ideia muito bonita. No ero- Mau Vidraceiro”, que vem de um con- tismo você passa de uma coisa para to dos pequenos poemas em prosa outra sem obstáculos. No “Ensaio Ge- do Baudelaire. ral” [livro que reúne ensaios, guiões, São várias narrativas? projectos] fiz um texto, uma espécie Muitas, 70. Também tem uns pensa- de teoria do futebol, em que usei essa mentos que não são bem narrativas. ideia. O golo é o momento descontí- O “Ó” é difícil de encaixar. nuo e a jogada é o momento contínuo, Descreveu-o como algo entre erótico. Então, quem gosta de futebol poesia e pensamento. Pode ser é lógico que torce pelo golo, mas o visto também como partes de tesão mesmo é a jogada. O golo ins- uma biografia. Mas se pensar na taura a descontinuidade radical, fica sua família, penso na “Paixão cravado, o “placard” final é quase

O golo é o momento descontínuo e a jogada é o momento contínuo, erótico. Então, quem gosta de futebol é lógico que torce pelo golo, mas o tesão mesmo é a jogada.

30 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon Nuno Ramos cristanismo? É. Mas eu não sou fran- veio a Lisboa ciscano nem cristão e aquilo foi pin- lançar a edição tado para mim, hoje. portuguesa O risco da arte, hoje, é que se de “Ó”, torne rapidamente irrelevante? publicado Que seja um momento de outra coisa na Cotovia que não ela. Qual é o lugar de deus na sua cosmogonia? Não está lá, ou está? uma lápide. Não há nenhum outro Acho que não. jogo no mundo em que haja uma se- Este seu homem está sozinho. paração tão grande entre “placard” Eu acho. Gostei dessa ideia do gigante e jogo. O “placard” nunca conta o jo- que fosse tudo. Queria muito fazer go. Acho que o futebol, que é das coi- algo que é o boneco de piche [betu- sas que mais amo na vida, tem essa me], em que tudo gruda, que vai fi- ambiguidade. Um time perde 20 go- cando uma bola. No próximo livro há los, e o outro faz um golozinho besta. várias coisas sobre o boneco de piche. Tem uma tragédia [nisto]. Não há co- Ele vai perdendo forma, e a resistência mo conciliar essas duas forças. é para dar forma de novo. Talvez em Acho que é por isso que o futebol não menino eu fosse só um boneco de pi- entra nos Estados Unidos. Eles preci- che, não conseguia isolar nada. Me sam quantificar tudo, e o futebol é sinto atraído por tudo, meu trabalho falha, o jogo é mais do que consegue tem muita influência. Muita coisa en- quantificar. tra nele. Nas minhas coisas de que gosto mais No “Ensaio Geral” tem guiões de esse aspecto desimpedido está mais filmes, de teatro. intenso, quando o texto pega uma Tenho usado muito teatro nas artes continuidade em que me surpreendo. plásticas, vozes diferentes. Vou Ao mesmo tempo, tenho de criar uma sendo atraído e isso é um pouco certa reacção, porque essa força vai monstruoso. Onde é que estou? ficando muito abstracta. Então, às ve- É o Ó. zes eu crio uma tralha, que é uma es- É. pécie de “placard”, para tentar ser O bom do Ó é que cabe lá tudo. coerente com esses dois impulsos. É um círculo. Como se o texto fosse uma Que leu de literatura portuguesa matéria que tem que domar. recente? É. Domar, lutar, conter. Escrevo mui- Precisava ler mais, tenho a maior ver- to por impulsos e preciso de dar um gonha. Gostei do Gonçalo [M. Tava- jeito nisso. res, um dos finalistas do Prémio PT No começo do “Ó”, quando fala vencidos por Nuno Ramos]. Li dois, do aparecimento da linguagem, “Aprender a Rezar na Era da Técnica” fala nos homens mudos com e “Jerusalém”. nostalgia, aqueles que podiam Dos portugueses finalistas [os continuar de cabeça erguida, outros eram Lobo Antunes, Inês como se a linguagem fosse uma Pedrosa e José Luís Peixoto] será capitulação, a nossa fraqueza. o que tem mais relação consigo. É isso mesmo. Os coitados que tenta- É um cara sem alívio imaginativo, que ram resistir acabaram sendo massa- é uma coisa de português, não tem crados pelos falantes que capitularam imaginação, fica dando volta, as per- e deram nome às coisas. sonagens não decolam. É um Kafka Tem uma admiração por esse misturado com “Livro do Desassos- tempo sem linguagem. sego”. É português para cacete. Tudo É o meu outro, porque tudo em mim pequenado, não voa. E esse enclau- é linguagem. Eu falo para cacete! suramento é que acho bonito. É o que faz o milagre do pôr-do-sol Leu Herberto Helder? não ser de um, mas de vários. A lin- Li, gostei muito. guagem comunica. O “Ó” lembra, por vezes. Aos 49 anos, diz que está a Sabe porquê? É porque tem o Drum- começar. Isso é de um grande mond. E o Drummond é Deus. Aí é optimismo. foda. Aí o Herberto entra como um A frase que me vem, andando sozinho, momento do fôlego drummondiano. é: “Eu ainda não comecei. Eu preciso Li só “Ou o Poema Contínuo”, gostei começar a fazer qaulquer coisa. Quan- de mais. Me identifiquei muito. do é que vou começar, caramba?” Lobo Antunes? Sinto essa coisa para a frente. Li dois do começo, “Os Cus de Judas”, É uma coisa jovem, de acreditar. e “Memória de Elefante”. Achei bom. Isso. Kierkegaard diz que trocaria tu- Tem uma raiva boa. Talvez uma difi- do, todo o dinheiro, todas as mulhe- culdade em transformar a raiva em res, pelo sentimento do possível, uma amor. Precisa gostar muito do mundo frase que eu adoro. A arte é isso, o para odiar tanto. Mas tem uma voz ali, sentimento do possível. Porque a vida não é? Talvez só tenha uma. Esse é o vai calcificando, vai ficando totalmen- grilo. O legal do Dostoiévski é que aque- te dominada. Ecologia, feminismo, le negócio vira 300 pontos de vista. minorias étnicas e sexuais, vai ficando E brasileiros? Nos últimos 15 um discurso de consenso. anos? O que há a fazer? Contrariar? [Pausa] Ninguém. Que eu tenha ama- Mas não directamente, porque é ridí- do, como gosto da Clarice? Nin- culo. A arte pode vir disso, mas não guém. pode ser a reprodução desse discurso, tem que ter uma alteridade. O artista Ver crítica na próxima semana ficou muito dócil. Hoje, o perigo é a arte coincidir com o que lhe pedem. Haver uma empatia tão grande que fique todo o mundo de mão dada. Qualquer arte não coincide com a his- tória. Tem um pé na história, mas tem um pé no signo. Hoje, é muito coin- cidente, muito ligada ao presente. Você vê uma capela do Giotto. Aquilo é sobre franciscanismo? É. É sobre

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 31 Música No princípio era a ópera Os suecos , um dos projectos mais marcantes da pop, ocompuseram uma ópera baseada em “A Origem das Espécies” de Darwin. O resultado é uma intrigante e fascinante electro-ópera: “Tomorrow, In A Wear.” Vítor Belanciano

No princípio, uma conhecida compa- nhia de teatro dinamarquesa, Hotel No caso dos The Knife Pro Forma, convidou-os para compo- rem uma ópera inspirada na vida e é como se fôssemos obra de Charles Darwin, a estrear em 2009, assinalando os 150 anos de “A transportados para Origem das Espécies”. O convite foi um sonho, onde existe endereçado no início de 2008. Os ir- mãos suecos The Knife hesitaram. um desejo de gritar, Nunca tinham escrito um libreto. A ópera era um universo distante. Karin mas nada sai. É um Dreijer Andersson, irmã mais velha, já havia iniciado o processo criativo universo de não ditos, em torno do projecto solitário Fever Ray, revelado o ano passado através de algo familiar de um álbum, e , o benja- e estranho, em mim, andava ocupado. Mas depois de alguma reflexão, aceitaram. Para os simultâneo, aquele ajudar convidaram o músico e cantor inglês e o americano que não se cansam Mt. Sims. Mais tarde, juntou-se-lhes a mezzo soprano Kristina Wahlin Mom- de propor, utilizando me, a actriz dinamarquesa Laerke Bo Winther e o cantor pop sueco Jona- música, símbolos than Johansson. e imagens como mais A ópera acabou por estrear em Se- tembro, em Copenhaga, estando ago- ninguém. Daqui até ra em circulação. O CD-duplo conten- do a música acabou de ser lançado, à ópera, o espectáculo suscitando as reacções mais desen- contradas, naturais sempre que um total, parece um objecto artístico é isolado da totalida- de para o qual foi imaginado. passo normal O grito e o sonho Os The Knife são uma das unidades criativas mais fascinantes do nosso tempo. Desde 1999 lançaram apenas três álbuns (“The Knife”, em 2001, Os irmãos “Deep Cuts”, em 2003 e “Silent Shout”, em 2006), tendo sido o últi- Andersson e mo aquele que lhes angariou culto. Olof Dreijer Percebe-se porquê. É um disco admi- rável, feito de uma música tão suges- tiva fisicamente quanto capaz de in- vocar estranhas projecções mentais. Canções feitas a partir de vozes des- figuradas, electrónica metalizada e ambientes neuróticos. Um som sinté- tico, mutante, pós-tecno e pós-pop. Mas são mais do que um projecto A dupla envolve-se totalmente nos musical, sendo muitas vezes compa- ouvimos diferentes estágios de sons tamente, a teoria para a música. Na forma muito atraente de descrever rados a Bjork na forma de operar. processos criativos de pássaros. verdade, todas as escolhas musicais aquilo que via.” Percebem-se os paralelismos. Como A segunda metade é mais calorosa, estiveram relacionadas com as suas No final do projecto, o duo diz ter a islandesa, também a dupla se envol- onde a sua música incluindo canções como “Annie’s teorias.” ficado a admirar Darwin. Uma das ve nos processos criativos onde a sua box”, sobre a relação de Darwin com O libreto tinha que reflectir uma dimensões que mais os surpreendeu música é sugerida: fotos, capas, víde- é sugerida: fotos, a filha, ou “Colouring of pigeons”, no linguagem vitoriana de 1800 e daí que foi a naturalidade com que foi capaz os, concertos ou internet. capas, vídeos, meio de divagações sobre biologia. Ms. Sims, com aptidões poéticas mais de modificar e acrescentar elementos Como nos dizia, em 2006, Olof Um dos pontos de partida para o clássicas, tenha sido convocado, con- à obra “A Origem das Espécies”, que Dreijer: “Não damos muita importân- concertos ou internet trabalho foram gravações de campo trapondo ao lado mais abstracto e teve seis edições, a última publicada cia à imagem, mas a partir do momen- efectuadas por Olof, numa viagem, contemporâneo de Karin, reflectindo 13 anos depois do original. “Na ciên- to em que sabemos que vão querer em Novembro dde 2008, pelo Ama- diferentes estilos líricos. Uma mistu- cia, como na arte, continuam a sub- utilizá-la, preferimos ser nós a pensar zonas.zonas. Um mergulhomerg na selva, mu- ra procurada em todos os planos da sistir ideias românticas sobre o que é nela. Preferimos que comunique qual- nidonido de gravador e mi- produção, de forma a que música e criar”, diz Karin, “como se existissem quer relação com a música.” crofone,c absorven- palavras reflectissem mudança, di- pessoas que fossem possuídas por Daí as fotos com máscaras. Os víde- do a biodiversidade versidade, ligados de forma não hie- inspiração divina. Darwin é o contrá- os, muitos deles concebidos pelo ar- da natureza, da rarquizada. rio disso. Leu, pesquisou, criou e foi tista visual Andreas Nilsson, com cria- qual resultam sons Alguns textos resultam de listas e readaptando o seu conhecimento.” turas belas e bizarras, ou os raros dede pedras, chuva, ven- descrições científicas. Aparentemen- Talvez inspirados por isso, os suecos concertos, de cenários envolventes. toto ou ddee aanimais.n te poderia existir alguma dificuldade colocaram o álbum no seu site para Nos espectáculos ao vivo há sombras, NNo princípioi í i fartaram-se de ler em interpretá-los. Poderia até não ser ouvido, remisturado, reinterpre- clarões, seres estranhos projectados também. “Lemos as mais variadas existir uma aproximação emocional. tado ou transformado por quem qui- em telas, gráficos ininteligíveis que coisas sobre Charles Darwin, desde “No início isso sucedeu”, já confessou ser, desde que numa base não-comer- parecem ter sido retirados de um la- livros, artigos, literatura de outros Karin, “mas depois de semanas a so- cial. No princípio, “Tomorrow, In A boratório científico, algo de profun- sobre ele, ou notas do próprio”, des- letrar as palavras, aquelas frases e Wear” era uma ópera do grupo de te- damente misterioso, mescla de reali- crevia Olof à publicação inglesa descrições, é como se elas começas- atro Hotel Pro Forma. Depois tornou- dade quotidiana elevada ao excesso “Fact”. “Foi muito excitante, come- sem a criar emoção por si próprias. se num álbum dos suecos The Knife. e matéria da ordem dos sonhos. çámos por fazer pequenos exercícios Charles Darwin trabalhou com ciên- Agora pode ser o que quisermos. O ano passado, em entrevista, musicais a partir das teorias que ía- cia, mas escrevia de forma bela, às aquando do lançamento do projecto mos lendo. Era como traduzir, direc- vezes até muito romântica. Tinha uma Ver crítica de discos págs. 68 e segs Fever Ray, a loira Karin Dreijer dizia- nos algo de muito expressivo a este propósito: “Os sonhos são sempre mais reais, no sentido de serem reveladores, do que a realidade. Nos sonhos não existe espaço para a censura. Ou para a auto-censura. A música, parece-me, pode ter esse poder também. Isto é, pode ser qualquer coisa que ilumina algo que não tínhamos consciência que estava lá, mas estava.” Alguma da melhor música popular é feita a partir do grito. No caso dos The Knife é como se fôssemos trans- portados para um sonho, onde existe um desejo de gritar, mas nada sai. É um universo de não ditos, de algo fa- miliar e estranho, em simultâneo, aquele que não se cansam de propor, utilizando música, símbolos e ima- gens como mais ninguém. Uma orquestra endoidecida Daqui até à ópera, o espectáculo total, parece um passo normal. Até porque, no seu caso, tudo se interliga. Na maior parte dos casos, partem de ideias pré-definidas. Neste caso, o motivo inicial era “A Origem das Es- pécies”, livro publicado em 1859. Pe- lo meio interrogaram ideias (origem, tempo, verdade, realidade) que não são novas neles. Algumas elucidadas, o ano passado, por Karin. Dizia-nos: “Gosto de trabalhar por aproxima- ções e sempre que me apetece alte- rando a ideia inicial. Não vejo duali- dades na minha música. Vejo coisas que se interligam. Como a ideia de tempo. O passado, o presente e uma ideia possível de futuro não têm que se contrapor. Pelo contrário, confun- dem-se. O mesmo com as ideias de verdade e realidade. Quando me pin- to, ou ponho uma máscara, posso ser mais verdadeira do que sem ela.” “Tomorrow, In A Year” reflecte também estas concepções, apesar do ponto de chegada ser diferente. Há temas que evocam o passado recente dos The Knife, mas na maior parte do tempo ouvimos música concreta, em particular sons da natureza, e um tipo de sonoridade que Olof já descreveu como o resultado de “uma orquestra clássica a tocar como se tivesse endoi- decido.” Qualquer coisa como um encontro entre música de vanguarda dos anos 40 e 50 com ruídos electró- nicos de 2010. A primeira metade da obra é mais impenetrável, com sons sobrepostos por ambientes coloridos que vão sen- do distorcidos por vozes e ecos da natureza – em “Variations of birds”

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 33 Música

“Jimi Hendrix Quando Jimi Hendrix aterrou em Lon- não tomou dres em 1966, tinha a seu lado Chas mais drogas Chandler, o antigo baixista dos Ani- do que Keith mals que lhe prometera uma carreira Richards ou em Inglaterra. Era um perfeito desco- John Lennon”, nhecido, mas isso duraria pouco tem- disse ao po. Ainda antes de gravar o seu pri- Ípsilon John meiro single, “Hey Joe”, já um rumor McDermott, percorria a “Swinging London”. A de jornalista com que o mais extraordinário guitarrista quatro livros chegara à cidade e que vê-lo ao vivo dedicados era uma experiência transformadora. a Hendrix Transformou, pelo menos, Eric Clap- e um dos ton e Pete Townshend, distintos heróis responsáveis da guitarra na capital inglesa - tornou- pela obra se imortal a exclamação do guitarris- do autor de ta dos The Who depois de ver Hendrix “Foxy lady” pela primeira vez: “Estamos acaba- dos!” Tal era o impacto do homem que, meros meses antes, lutava para pagar as contas do mês como músico acompanhante dos Isley Brothers, Lit- tle Richard ou Ike & Tina Turner. Em Londres, não tardou a causar impacto: “Hey Joe” e “Purple haze”, os singles, a fazerem-se ouvir por to- do o lado, e “Are You Experienced?”, o álbum, a revelar um músico que, como nenhum outro, transportou o blues para a era psicadélica. Ali, em Inglaterra, era impossível ignorá-lo: não era só a feitiçaria eléctrica da mú- sica, era também a sua imagem, de uma exuberância em contraste com a lendária timidez que exibia na inti- midade. Nos Estados Unidos, o seu país, foi necessário esperar um pouco mais. Porém, quando a ele regressou, não poderia pedir melhor cenário. Junho de 1967, pré-época do cha- mado “Verão do Amor”. Na Califór- nia, em Monterey, organizou-se o primeiro festival pop de alcance glo- bal. Estavam lá muitos dos grandes: os Byrds e os Buffalo Springfield, os Mamas & The Papas e Simon & Gar- funkel, os The Who na sua primeira grande apresentação americana. E, claro, um tal Jimi Hendrix que, de en- tre os presentes, poucos para além de Otis Redding e os Booker T & MGs, antigos companheiros de Jimi no cir- cuito r&b, conheceriam. Coube às olheiras de Brian Jones, dos Rolling Stones, a apresentação. Coisa sim- ples: “Senhoras e senhoras, The Jimi Hendrix Experience!” O que se seguiu foi tudo menos simples. Começou com uma versão de “Killing floor” que dilacerou e atirou para a estratosfera o original de Ho- wling Wolf. Apresentou “Purple haze” e “Hey Joe”. Homenageou Bob Dylan com uma reverente “Like a rolling sto-

34 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon No casulo de Jimi Hendrix

O álbum póstumo “Valleys of Neptune” é um retrato de Jimi Hendrix na intimidade. Em 1966, aterrara em Londres um perfeito desconhecido. Em 1969, o ano que o disco cobre, atingira o topo em Nova Iorque. E procurava um próximo passo que, tragicamente, nunca chegou a dar. Mário Lopes

ne” e, no final, não deixou espaço para Of Neptune”, apesar de conter um par do que lhe permitisse gravar durante estúdios, foi instalada uma campai- nada mais do que a prostração peran- “Dois anos antes [de de canções gravadas em Londres, re- a semana e dar concertos ao fim de nha e uma câmara para denunciar te a ferocidade do seu talento. A “Wild presenta o esquisso de algo que nun- semana – algo impensável nos dias de entradas indesejáveis. No casulo de thing” que ali se ouviu não se limitou regressar aos EUA], ca chegou a ser. hoje para um artista da sua dimen- Hendrix, passou a entrar apenas a amplificar o tom ameaçador do ori- Jimi era um músico Hendrix nunca gravaria um sucessor são”. quem ele desejava. ginal dos Troggs: numa vertigem de para “Electric Ladyland”. Morreria em Eis então Hendrix em 1969, nos Entre uma viagem até Inglaterra feedbacks e riffs ensurdecedores, com sem direito Londres, a 18 de Setembro de 1970, aos Electric Lady Studios. A gravar infati- para um concerto no Royal Albert Mitch Mitchell a atacar a bateria como 27 anos. Combinação letal: álcool a gavelmente, regravando e remisturan- Hall, no Inverno, e a entrada para a furacão destruindo tudo o que se lhe a holofotes. Era mais e comprimidos a mais. Combina- do e tentando integrar novos músicos, história em Woodstock, com a inter- atravessou pelo caminho, Jimi Hendrix ção perfeita para a mitificação: desde do baixista Billy Cox, o amigo de in- pretação de uma “Star Spangled Ban- não deixou pedra sobre pedra. Literal- considerado um então, a imagem que se retém de Hen- fância que substituíra Noel Redding, ner” corroída pelos ecos da guerra mente incendiário, o final da canção, guitarrista excêntrico drix é de alguém que representou co- membro fundador dos Experience, no Vietname, a rotina de Hendrix com ele ajoelhado frente à guitarra, mo poucos os excessos da sua época. aos músicos que encontrava no The fazia-se no circuito delimitado pelo fita no cabelo desgrenhado, camisa cujo amor pelo blues McDermott recusa-a por completo: Scene, o clube instalado numa cave, estúdio e pelo The Scene. “Levava lá amarela saindo do colete, a lançar-lhe “Tenho a certeza de que não tomou a dois passos dos estúdios, de que era o Billy Cox, que tinha ido buscar a fogo e a sacrificá-la, projectando-a ao parecia antiquado mais drogas do que Keith Richards, habitué, passando por gente que lhe Nashville, e viam bandas tão diversas chão, em chamas, repetidamente. É John Lennon ou qualquer outro artista cobrava favores de há anos ou pelo como os Doors ou os Sha Na Na, viam até hoje uma das imagens mais fortes perante daquela era. O seu comportamento de taxista simpático que, a meio da via- bluesmen, viam o Jeff Beck e ‘jama- da iconografia rock’n’roll. risco resultou por acidente na sua mor- gem, lhe confessava ter algum jeito vam’ noite fora”. Nascera uma estrela. “Voltar aos a popularidade te, e essa é a verdadeira tragédia”. para as congas. “Quando foste pobre, O perfeito desconhecido que, me- Estados Unidos e ser bem-sucedido do r&b. Um gajo Ao estudar o percurso de Hendrix, quando lutaste tanto durante a vida, ros três anos antes, aterrara em Lon- como americano significava muito John McDermott não viu qualquer é difícil não estender a mão aos ami- dres com Chas Chandler, atingira o para ele”, diz John McDermott, antigo porreiro para aceleração final para o abismo, não gos”, relembra McDermott. “Dois topo do planeta. Vivia entre dois mun- jornalista cuja obra inclui quatro li- encontrou um Jimi vivendo os últimos anos antes, Jimi era um músico sem dos: o mundo antigo dos blues em que vros dedicados a Hendrix e desde há contratar, nunca um meses como um acidente à espera de direito a holofotes. Era considerado se formara e o mundo novo da con- alguns anos um dos responsáveis, acontecer. Pelo contrário. Se havia um guitarrista excêntrico cujo amor tracultura que representava, dos so- juntamente com Janie Hendrix, meia ‘frontman’. Quando excesso, era na forma como fazia tan- pelo blues parecia antiquado perante nhos sci-fi que tanto admirava e que irmão do guitarrista, pela obra do au- to com tão pouco tempo: “A noção a popularidade do r&b. Um gajo por- traduzira em música. Desfeita a sua tor de “Foxy lady”. McDermott con- chegou o sucesso, de que tudo aquilo [o sucesso] podia reiro para contratar, nunca um ‘front- banda original, mudado de Londres tinua a falar-nos do Monterey Pop aproveitou para fazer acabar estava muito presente. Se nem man’. Quando chegou o sucesso, apro- para Nova Iorque, o homem que nun- Festival: “Era como que uma valida- o rock’n’roll era tido como garantido, veitou para fazer a sua volta de honra: ca se separava da guitarra tocava e ção do seu talento voltar a casa e mos- a sua volta de honra: o sucesso de Jimi muito menos. Por ‘Olhem para mim agora!’ E tinha mui- tocava. Procurava qualquer coisa. trar a todos que podia ser aquilo que isso a mentalidade, particularmente ta gratidão a pagar: pessoas que lhe “Valleys of Neptune”, onde se agru- sempre quisera: um músico por direi- ‘Olhem para mim a do seu manager, era a de aceitar to- tinham emprestado cinco dólares, pam novas canções como “Lullaby to próprio, não um mero acompa- do e qualquer concerto, onde quer uma guitarra ou um sofá para dor- for the summer”, velhas regravadas, nhante.” Falamos com McDermott agora!’” que se realizasse: ‘Não há problema, mir”. Durante a gravação de “Electric como “Stone free”, e ‘jams’ para ole- não pelo que aconteceu ali, mas pelo apanha um avião!’ Nunca houve pla- Ladyland”, todos eles tinham entrada ar os improvisos ao vivo, caso da ver- que aconteceu depois. John McDermott nos a longo prazo”. garantida nos estúdios. Depois, tudo são de “Sunshine of your love”, é um Hendrix, que aprendera com as des- se tornou demasiado. retrato de Jimi Hendrix na intimidade, Entre o estúdio e o clube venturas financeiras dos bluesmen que As groupies, os penetras, as sessões sem invenções de produção, despido “Valleys Of Neptune”, colecção de tanto admirava, era detentor da sua de gravações transformadas em festas à energia básica de baixo, bateria e canções gravadas em 1969 que será própria obra – algo quase inédito à al- intermináveis. “Pediu ao Eddie Kra- guitarra. lançada na próxima segunda-feira co- tura – e com o dinheiro que ela lhe de- mer [engenheiro de som] que assu- Um compasso de espera em busca mo álbum póstumo de Jimi Hendrix, ra a ganhar construíra em Greenwich misse o papel de ‘gajo mau’. Era ele de um próximo passo que, tragica- é a razão pela qual falamos com John Village os Electric Lady Studios. Ainda que mantinha o controlo da situação, mente, nunca chegaria a dar. McDermott. Em “Hendrix: Setting assim, como conta McDermott, “teve que tirava as pessoas do caminho”. The Record Straight”, biografia que de lutar [com o manager] por um acor- Com ajuda preciosa: à entrada dos Ver crítica de discos na pág. 68 e segs. editou em 1992, o percurso do músico é acompanhado semana a semana, dia a dia. Em “Valleys Of Neptune”, o álbum agora editado, acompanhamos Hendrix no seu casulo, em 1969. Desde Monterey, editara “Axis: Bold As Love” e o álbum duplo “Electric Ladyland”. Os dois discos, com can- ções como “If six was nine”, “Cross- town traffic” ou “Voodoo chile”, a par das digressões constantes, transfor- maram-no numa estrela de dimensão planetária. Radicado em Nova Iorque, construíra os Electric Lady Studios, o seu refúgio do estrelato, o laboratório onde pretendia desenvolver as suas cada vez maiores ambições. “Valleys

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 35 Toro Y Moi

Música dança sobre as ruínas da pop Chaz Bundick pega em canções pop e faz algo de novo e alinhado com o espírito do tempo. “Causers of This”, o seu novo disco, sintetiza algumas das tendências centrais da actual música indie. Pedro Rios

No seu blogue, Poor and Lonely, Chaz bum”. “Tive a ideia de mandar mp3 blogue), Madonna, Elvis Costello, “mui- ou detritos da pop. Não está sozinho Fazer de algo velho algo novo é impor- Bundick vai colocando fotografias dos para alguns blogues que seguia. Quan- ta new wave, nada muito obscuro”, na aplicação deste método: a parte ins- tante no meu processo de criação”. amigos, nas mais variadas circunstân- do vi que funcionava, avisei os meus tudo “coisas que eram populares na trumental de um dos hinos “indie” de Em “Causers of This” recorreu a cias. Bebem cerveja, dormem, andam amigos, como o Ernest [Greene, Wa- altura e que passavam nas rádios de 2009, “Feel It Around”, do seu amigo “samples” que encontrava no YouTube de bicicleta, deitam-se na relva, fitam shed Out] e, de repente, ele estava nos massas”. Mas não nega a influência dos Washed Out, consistia apenas num e noutras fontes. “Nem me lembro que a máquina fotográfica, vêem o tempo mesmos blogues.” Animal Collective – notória, sobretudo, “sample” de “I Want You”, de Gary canções usei. Tenho os títulos no meu passar. Fazem o que ele, Dundick, tam- na canção “Blessa”. Low, desacelerado e encharcado em computador. É uma decisão quase in- bém faz para ocupar o tempo. Não há Fantasmas A pop dos anos 1980 (com os seus reverberação. “O que faço é parecido”, consciente. Procuro canções até en- qualquer “glamour” de estrela pop, A música de Toro Y Moi ocupa um sintetizadores, batidas e guitarras de diz Bundick. “Ele transformou essa contrar algo que soe bem”, explica. qualquer fosso entre o artista e o ou- curioso lugar, algures entre a ética “in- funk branco) habita a sua música, não canção em algo melhor. Nas minhas Talvez seja natural, nestes tempos vinte: Bundick, 23 anos, músico, fotó- die” e a atracção irresistível pela pop. de forma explícita, mas como sugestão canções nem se consegue reconhecer em que toda a música gravada está grafo e designer gráfico, é um tipo nor- Bundick elege como heróis musicais (ou fantasma), através de retalhos pi- de onde vem”, acrescenta. “Gosto de disponível na Internet, que a música mal. Mas foi também um dos nomes Michael Jackson (fez até uma versão de lhados a canções alheias, muitas delas fazer referências a géneros e a canções baseada em “samples”, até aqui rela- mais citados na blogosfera em 2009, “Human Nature”, que ofereceu no seu desconhecidas, meras notas de rodapé do passado porque cresci a ouvi-las. tivamente confinada a géneros como enquanto Toro Y Moi. A memória de tempos mais simples (a infância, o Verão, o surf, as tardes “São canções muito passadas a ver televisão), evocada pe- las fotos cheias de grão e pelas canções terra-a-terra sobre de Bundick, é uma das narrativas do- pessoas com quem minantes no actual cenário indie - ar- tistas como Memory Tapes, Neon In- costumo falar. Por dian e Ducktails não têm feito outra coisa. “São canções muito terra-a- vezes, gosto de ir às terra sobre pessoas com quem costu- mo falar. Por vezes, gosto de ir às mi- minhas fotos buscar nhas fotos buscar ideias para as le- ideias para as letras” tras”, confessa, ao telefone, a partir de Columbia, no estado da Carolina do Sul, EUA. “Fartei-me de fazer refe- rências metafóricas e de ser poético nas letras. E comecei a cantar da for- ma que falo. Por vezes, gravava direc- Bundick elege to, sem ter as letras escritas, só para como heróis me ajudar a ter uma ideia do assunto Michael Jackson, que queria falar”. Madonna, Elvis Este lote de artistas (que mereceram Costello, “muita rótulos exóticos como “chillwave” ou new wave, nada “hypnagogic pop”) são, salvo raras ex- muito obscuro” cepções (como o mais obscuro James Ferraro), artistas totalmente adaptados o hip-hop, chegue com mais força à aos tempos modernos, em que blogues pop e ao rock independentes. “A nos- de mp3 como o Stereogum são tão ou sa geração está a ficar mimada por mais influentes que uma revista de mú- causa da tecnologia”, reconhece. “É sica. Porém, interessam-se pela pop de bom trabalhar num computador por- outros tempos, mesmo a mais duvido- que temos ali todos os instrumentos, sa, e fazem o culto de objectos obsole- mas no próximo álbum [será editado tos como as cassetes. ainda este ano] quero afastar-me o O burburinho do ano passado (Kanye máximo disso”, avisa. Ou seja: vai gra- West chegou a elogiá-lo no seu blogue) var guitarra, baixo e bateria, como se desenrolou-se sem que Bundick tives- fosse uma banda. se um álbum (chega agora e chama-se Os discos que lançou em micro- “Causers of This”). Meia mentira: já editoras ou por conta própria servi- tinha lançado vários registos, em CD-R ram de tubos de ensaio para “Causers ou cassetes, que distribuía pelos ami- of This” e para o que se seguirá. “De- gos. “Nem lhes chamava álbuns. Fazia morei este tempo a chegar à forma de 12 canções e punha-as num CD. Foi com isto funcionar, de ser algo que as pes- ‘Causers of This’ que tentei fazer um soas querem ouvir”, diz Bundick, que álbum. E foi um dos maiores desafios começou o projecto Toro Y Moi aos 15 que tive ao fazer música: como se es- anos, ainda no liceu. “Antes misturava creve um disco que tenha transições, as coisas folk e as coisas electrónicas diferentes estados de espírito? Mas foi no mesmo disco. Decidi agora fazer divertido e aprendi muito”, diz. um disco e depois outro que será o Em 2009, não havia álbum de Toro oposto. Gosto de música pop. Só que- Y Moi, mas já não espanta que um ar- ro fazer canções pop”. tista faça o seu caminho sem essa en- tidade tão século XX chamada “ál- Ver crítica de discos págs. 68 e segs

36 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon

No Museu de Arte Contemporânea de cemo-nos, eu estava no teatro; por- Serralves, no Porto, é hoje inaugura- tanto, já foi mesmo a dois: a sombra da a exposição antológica “À Luz da e a luz. Sombra”, que reúne trabalhos de Conheceram-se quando? Lourdes Castro (1930, Funchal) e Ma- Em Paris… 72, 73. Depois fomos para nuel Zimbro (1944-2003). A mostra, Berlim. comissariada por João Fernandes, A Lourdes nasceu em percorre a obra de dois artistas que Dezembro… partilharam parte das suas vidas: “A PIMENTA DE PAULO FOTOGRAFIAS Sim. Sou Sagitário, mas depois há o gente fez tudo juntos, nem que só fos- ascendente que conta. se fazer o almoço para o outro”, nota Qual é o seu? a madeirense, numa conversa acerca Peixes. Sou bicho, sou animal, sou de sombras em que também se fala gente, tenho uma flecha e ainda sou de amigos, de livros, da natureza. peixe: sou da água. Lourdes Castro é produtora de uma A flecha… vasta obra atravessada sobretudo pe- Estou sempre a ver para a frente. lo tema da sombra, e que pode ser O Manuel Zimbro tem um texto lida a partir da sua permanente trans- intitulado “A Sombra da Flecha”, formação. A sua actividade artística escrito em 1992… inclui a produção da revista KWY, 12 O Sagitário é metade cavalo, metade números realizados em Paris, entre homem – um centauro –, e depois a 1958 e 1963, em colaboração com Re- flecha é a direcção para a frente. Es- né Bertholo. A publicação, que nunca tou sempre a prever coisas. Tenho terá mais de 300 exemplares, incluiu esta tendência, mesmo para esta ex- outros nomes quer na sua concepção, posição. É o aceitar naturalmente as como Christo, Escada, João Vieira e coisas: se tu souberes onde é que an- Jan Voss, quer no elenco dos convi- das e o que é que estás a fazer. Não é? dados para cada edição. No início dos Nós pertencemos ao universo, não anos 60, surgiram os objectos: acu- estamos fora. A astrologia tem tanta mulações de “tralhas que já não ser- importância como outra coisa qual- vem para nada”, coladas sobre antigas quer. No fundo, se se separou as coi- telas e pintadas da cor do alumínio. sas foi para as estudar. Sucedem-lhes as sombras projectadas Pegando na ideia da flecha, um e os contornos: retratos de amigos dos livros que a marcou foi “Zen realizados sobre tela ou em coloridos e a Arte do Tiro com Arco”, de e recortados plexiglass. Mais tarde, Eugen Herrigel… no Verão de 1968, surgiram as “Som- Às vezes são bóias de salvação. Quan- bras deitadas” bordadas em lençóis. do o Ocidente já não estava a respon- Na Madeira, em 1972, Lourdes Castro der ao que se perguntava, foi muita irá reunir “O grande herbário de som- gente ao Oriente. E voltou; como o bras”: 100 sombras de espécies botâ- senhor Herrigel, que esteve lá, estu- nicas “tomadas directamente ao sol, dou e aprendeu o japonês. Essa troca sobre papel heliográfico”. O “Teatro aquelas coisas todas, mas nunca uma “À Luz da Sombra” não é uma vem responder a coisas, como a reli- de Sombras”, já experimentado des- retrospectiva exaustiva. retrospectiva exaustiva do gião: são respostas que a um certo de 1966, irá assumir um papel rele- Porquê “nunca uma trabalho de Lourdes Castro: “As momento batem certo, que nos ali- vante na actividade da artista a partir retrospectiva”? coisas todas que fizeste durante viam, que nos ajudam. Na Madeira, de uma estada em Munique, entre Porque é muito. Cansava-me eu, can- tantos anos... é demasiado para estive no Colégio Alemão desde o 1972 e 1973: “Durante o espectáculo sava-se o João, cansava-se toda a gen- uma exposição e mesmo para jardim-de-infância: foi a minha avó eu sou a sombra e o Manuel é a luz.” te e mesmo as pessoas para verem o um museu” que me ensinou a ler, a avó da Praia Tudo na direcção do nada, situação que se tem nas gavetas, os livros, as Formosa. Ela já sabia uma coisinha tornada visível através de “Peça”, um coisas todas que fizeste durante tan- de alemão, porque o professor de objecto desenhado em colaboração tos anos… é demasiado para uma ex- piano lhe ensinou. Ela também sabia com Francisco Tropa para a Bienal de posição e mesmo para um museu. O inglês e francês: foi a primeira aluna S. Paulo, em 1998. João dizia: fazemos uma exposição do liceu da Madeira. Nessa altura, a Quanto nasceu a ideia desta mais pequena das coisas do Manuel gente não percebia muito, a avó con- exposição? [Zimbro]. Comecei a pensar nisso: a venceu os meus pais que os pequenos Quando fiz as “Sombras à volta de gente fez tudo juntos, nem que só fos- tinham de ir para a escola alemã, que um centro.” Um dia, o João [Fernan- se fazer o almoço para o outro. dava uma certa organização. Ela lá des] foi à Madeira falar-me numa ex- Cada exposição era partilhada… sabia, porque era professora. posição com os plexiglass, os lençóis, O Manuel ajudou-me muito: conhe- Tudo isto levou-a a ler o livro… “A minha pintura é esta: o viver, o estar cá” Lourdes Castro está em Serralves, numa exposição antológica partilhada, como a vida, com Manuel Zimbro. A sombra e a luz. A inauguração é hoje. Óscar Faria

38 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon Exposições

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 39 O Colégio Alemão fechou quando Até bebemos um champanhe nesse Continuo, porque ainda me apare- No caso dos lençóis, ao contrário entras na galeria, não é com desprezo, começou a guerra, no início dos anos dia. Tinha uma garrafa pequenina e cem coisas. do que acontece com os mas entras muito mais à vontade. Não 40, sou pré-histórica… Ainda me lem- fizemos um brinde: pronto, a expo- Quantos volumes já realizou? plexiglass, os corpos retratados vais pedir nada: é muito bom. Liber- bro das professoras a tricotar coisas sição está feita. E o João disse: “Com 34… O Fidel de Castro, quando fumou são anónimos… dade: o manter-se desapegado, é mui- para os soldados. A minha avó disse: certeza”. um charuto da Holanda, disse: “Es Ao princípio, nos plexiglass, tomei a to importante… “Os pequenos devem continuar…” Não posso deixar de lhe paja”, é palha. Há coisas que são pa- decisão de só passados dez anos dizer O seu último trabalho, “Peça” Prossegui as lições com uma senhora perguntar o que significam os lha; mas é bom ver-se que nos álbuns quem é, porque senão começavam: (1998), foi feito em colaboração alemã, uma botânica que vivia sozi- caracteres japoneses impressos há alguma palha. “está parecida”, “não está parecida”, com o Francisco Tropa… nha e dava lições particulares. Tinha na sua t-shirt … Os álbuns são só acerca de “o nariz é tal e qual”. Nos corpos, co- O que estou a fazer agora, o filme da estado na América do Sul e um quar- É o “Sutra do coração” [um dos textos sombras? mo é nos lençóis, é mais íntimo: não Catarina [Mourão] toca nisso… to cheio de papagaios e um tucano. fundamentais do Budismo Mahaya- O Arp está lá, mas não é com uma ponho o nome, há o respeito pelas O cuidar do jardim? Depois, uma sobrinha dela, que es- na]. Tenho um amigo na Madeira que sombra. As formas dele já são muito pessoas. São amigos que disseram É aquilo tudo: as árvores… O filme tava na Alemanha, mandou-lhe um me diz: “Lourdes, quando pões essa puras, porque, no fundo, ninguém “ok, a gente deita-se; é muito confor- mostra um bocadinho. Depois do “Te- livro que tinha acabado de sair. Ela t-shirt é como a gente na escola quan- sabe o que é a sombra… O senhor Go- tável.” Estavam mais quentinhos: era atro de sombras” é difícil fazer coisas, leu-o e disse-me: “Empresto-te”. Era do punha a t-shirt para os exames”. ethe, na teoria das cores, fala em som- no chão do ateliê. Punha o papel, fazia porque era aquela hora efémera. Co- o “Zen e a Arte do Tiro com Arco”, O “Sutra do coração” é muito impor- bra colorida. E depois fazem-te com- o contorno, depois passava para o mo é que posso estar a fazer assim do Herrigel. Li-o em alemão: “En- tante. Há muitos sutras no “Prajnapa- panhia, tu não estás sozinha e perce- pano e bordava. Foi muito bom, de- coisas, materialmente, que durem, quanto não fores a flecha…” Tens que ramita” [escrituras budistas que tra- bes melhor. Ou tu és um pintor pois de trabalhar com a serra eléctri- quando o “Teatro de Sombras” pas- ser tu com o que fazes; se não, há tam do tema da perfeição da sabedo- primitivo, e estás no teu cantinho, ou ca, estar ali sossegada: lembro-me sava? Foi nessa altura que mudamos separação. ria; a mais antiga foi escrita por volta então, se estás de olhos abertos, trata estar a ouvir os carros. Foi na Rua des de casa, que fomos para ali [Caniço, Continuou a alimentar esse do ano 100 a.C.]. Não sou supersticio- de aprender tudo o que há por aí. Saints- Pères [em Paris]. Depois voltei Madeira]… interesse pelo zen? sa… cada um de nós tem sempre as- No fundo, para si, a sombra não a pô-las em movimento: o teatro. Quem projectou a casa? Não só o zen, mas também a Índia. O sim umas coisinhas… uma pedrinha tem uma conotação negativa… O “Teatro de sombras” são, de O Manuel desenhou casa toda. O Pe- [Rabindranath] Tagore, que também que põe no bolso. O sutra é uma coisa Sei que tirei as sombras da sombra. facto, três trabalhos distintos… dro [Morais] também ajudou, o irmão li em traduções alemãs… todo aquele que protege, “c’est ça”. Tens uma coi- Dei-lhes corpo, porque fiz os plexi- O primeiro programa eram três coi- do Pedro também e o Manuel Amado ar que vinha de lá, sem ser os desco- sa para o frio [um casaco] e depois glass, mas este é transparente, tem sinhas pequeninas: “Pic-nic à som- deu o plano para fazer a chaminé. O brimentos, o que vem na História. pões algo que protege. menos matéria. Os lençóis, não os ia bra”, “Contorno” e “Dia e noite”; o Manuel desenhou tudo conforme o Foi alguma vez à Índia ou ao Quando é que começou a fazer em plexiglass, porque a gente segundo programa, “As cinco esta- nosso viver dentro de casa: um ateliê Japão? realizar os “Álbuns de família”? não se deita em cima desse material ções”; e o terceiro programa, “A linha para um, outro para outro e tudo aber- Nunca fui. O Japão às vezes é como Quando comecei as sombras – há as e o plástico também não é agradável… do horizonte”. Não tinham história: to. As pessoas perguntam: “A Lourdes se lá estivesse… voltando um pouco silhuetas no século XVIII e depois sa- Não se trabalha só com a cabeça: tra- é como um quadro, uma coisa chama tem pintado, tem trabalhado muito?”. atrás, o João tinha-me dito que se fa- bes vagamente umas coisas, já viste. balho muito com os olhos e com aqui- a outra. O fio condutor era a transfor- “Tenho trabalhado muito.” O que é zia uma exposição do Manuel, com São, no fundo, para perceberes onde lo que se ouve: trabalha-se com tu- mação. Eram três coisas, depois pas- trabalho? O que é não-trabalho? Tenho as coisas dele, a “História Secreta da é que tu estás e o que é que estás a do. samos a um assunto só, sem interva- tanta coisa para fazer. A minha pintu- Aviação.” A gente sempre fez juntos; fazer. Acho que em 1965 acabei o pri- Os plexiglass são sobretudo lo, porque quando tu vês as sombras ra é esta: o viver, o estar cá. às vezes, pode não vir o nome no ca- meiro, mas foi em 1963 que comecei retratos de amigos… é tal o envolvimento, a magia, que é Há, na exposição, uma série de tálogo, mas foi ele que fez o desenho a colar naqueles álbuns. Eles tinham de me emprestar a som- uma pena ter intervalo. “As cinco es- pedras com frases escritas pelo deste [o catálogo de “Além da Som- O que coloca nesses álbuns? bra. Tinham de estar quietinhos, mas tações” e a “Linha do horizonte” du- Manuel Zimbro… bra”, CAM, Gulbenkian, 1992], escre- É pena, na exposição só vai estar uma às vezes era difícil. ravam uma hora. Nós nunca demos prendas; se fazía- veu o texto e escolheu os fragmentos página aberta. Se o chamei “Álbum Começava por realizar um Era a única pessoa em cena? mos uma viagem, podia-se trazer uma dos “Álbuns de Família”. A “Monta- de família”, é como se fosse uma fa- desenho? Sim, porque eram tantos ensaios… coisa maior, mas no Natal e isso tudo nha de Flores” [1988-…], foi o Manuel mília nossa, onde tens os primos che- Sim, sobre papel. Depois “passava-os Estávamos os dois em casa, portanto era um papelinho, uma coisinha. O que fez a instalação. É mágica, eu gados, os irmãos, os amigos: depois, a limpo” para o plexiglass. Com o sol fazia-se a qualquer hora: era quase Manuel uma vez deu-me uma pedra, nunca teria chegado ali: punha as flo- há os que estão mais longe, mais afas- é muito difícil também, porque a som- um ano para fazer uma peça nova. em que escreveu: “Faltam quatro ho- rinhas, caíam as pétalas. Disse ao tados. No fundo, só podes ver em ti e bra mexe imenso. Se pões um papel, Como é que podias estar com outra ras para a meia-noite”. Foi a prenda João: a exposição tem que ser Lour- é aí que deves chegar; mais nada. muda imenso. No fundo, a sombra é pessoa a exigir dela tudo o que podes de Natal. des e Manuel ou Manuel e Lourdes, Continua a fazer “Álbuns de a parte imaterial das pessoas: o espí- exigir a ti ou a quem está contigo? De- a luz e a sombra; não se pode separar. família”? rito, a alma... pois de ter contratos com teatros, Ver agenda exposições pág. 62

Disse ao João [Fernandes]: a exposição tem que ser Lourdes e Manuel ou Manuel e Lourdes, a luz e a sombra; não se pode separar. Até bebemos um champanhe nesse dia

40 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon O quadro em que Lourdes Castro habita Em “Pelas Sombras”, a realizadora Catarina Mourão fi lmou a artista no seu mundo, a casa que construiu com Manuel Zimbro na Madeira. Amanhã, primeira exibição no Auditório da Fundação de Serralves. Alexandra Prado Coelho

“O que é incrível nela é que é uma DANIEL ROCHA DANIEL pessoa que realmente vive o presente. Muitos de nós vivemos muito o futuro. Ela está a gozar o presente. Quando diz que ‘o importante é o respirar’, o que quer dizer é que é preciso que tudo o que fazes, desde a coisa mais simples como pôr a mesa, cozinhar,

regar, seja feito com as duas sobre o que poderia Este é também um fi lme sobre o mesma coisa com um recorte, um tempo que ser o fi lme (dois anos antes tempo. Mas não sobre o passado. uma carta que chega, um convite. Filipe Alarcão tinha fi lmado a Lourdes Castro não vive do Ela está sempre a alimentar o Escondidos em vários espaços permita tirar partido montagem da exposição “Sombras passado. “O que é incrível nela é arquivo, e ele alimenta-a a ela. da casa de Lourdes Castro, na Projectadas”, em Serralves, já com que é uma pessoa que realmente Não é uma coisa estática. Há uma Madeira, há pequenos recipientes do momento” o som feito por Armanda Carvalho vive o presente. Muitos de nós reciprocidade”. onde plantas crescem, longe que acompanhou todo o projecto). vivemos muito o futuro. Ela está Foi desse arquivo, de caixas dos nossos olhos, na escuridão. Catarina Mourão “A minha ideia”, conta Catarina, a gozar o presente. Quando diz antigas, que saíram as fotografi as Lourdes vai abrindo portas de “era um fi lme muito centrado que ‘o importante é o respirar’, o do avô de Lourdes, da família no armários e procurando nesses na casa e no jardim. Tinha que quer dizer é que é preciso que tempo em que moravam na Praia cantos silenciosos para mostrar, pensado que seria interessante tudo o que fazes, desde a coisa Formosa e em que a mãe era diante da câmara da realizadora acompanhá-la numa ida a Paris, mais simples como pôr a mesa, uma menina de vestido branco a Catarina Mourão, como, enquanto porque há muitos anos que ela cozinhar, regar, seja feito com um brincar com bonecas (fotos que andávamos distraídos, as raízes não ia lá. E tinha outra ideia, um tempo que permita tirar partido do Lourdes editou em 2009 com a dos bolbos se estenderam e bocado louca, de ir com ela a momento”. Assírio e Alvim). “O arquivo é um formam agora um emaranhado de Copenhaga para ver um quadro, Passado, presente e futuro são espaço de escuridão e silêncio elegantes fi os brancos. ‘Melancolia’, de Lucas Cranach, aqui algo orgânico. Aparecem mas onde as coisas estão a “Tem que ter assim mais ou pelo qual ela tem um fascínio. quando faz sentido, interceptam- acontecer”, explica Catarina. “Lá menos cinco centímetros antes Catarina Mourão (em cima) Foi sempre uma coisa que fi cou se, entrelaçam-se, entranham- porque há terra a cobrir as coisas de vir para o ar. Agora ainda está visitou pela primeira vez ‘vamos ver o Cranach juntas’”. se. “Se lhe pedir para falar do não signifi ca que elas não estejam às escuras. Às escuras é que Lourdes Castro em 1997: desde ‘Herbário’ [o trabalho ‘Grande vivas por baixo. E de repente ela se trabalha. E em silêncio”, diz os seus 14 ou 15 anos que tinha O momento é tudo Herbário das Sombras’, 1972] tira-as da escuridão, devolve- Lourdes. “É como todos nós, há na memória uma peça do O fi lme acabou por se centrar assim, descontextualizado, é as à luz, e as fotografi as do avô um trabalho que a gente faz na “Teatro de Sombras” que tinha na casa. Era também isso que difícil. Mas cada gesto que faz, seja ganham vida”. escuridão, que ninguém vê, e esse visto no CAM mais interessava a Lourdes mondar, regar, cortar legumes, Lourdes não fala muito sobre trabalho é a germinação do que (que Catarina colocou como co- está relacionado com alguma Manuel Zimbro, excepto quando depois se dá a ver”. autora, porque embora o ponto coisa do trabalho dela, seja o está a falar sobre o “Teatro de Foi assim também com este de vista seja o da realizadora ‘Herbário’, seja um recorte de um Sombras” que os dois fi zeram fi lme, “Pelas Sombras”, que se explica. Filipe Alarcão, namorado sobre a vivência da artista, o ‘Álbum de Família’. Tudo tem que juntos. “O Manuel... é como se ele estreia amanhã em Serralves (há de Catarina, já conhecia Lourdes envolvimento desta justifi ca que ser integrado de uma maneira estivesse lá”, diz Catarina. “Não sessões às 12h e às 18h, e depois e isso terá facilitado o contacto. assim seja). “Interessava-lhe muito natural no presente”. se está sempre a falar de uma permanece em exibição até 13 Mas a realizadora decidiu, para sobretudo o quotidiano”. A razão A certa altura Lourdes faz para pessoa que está aqui. Aquelas de Junho em horário especial primeira conversa, escrever uma veio a revelar-se ao longo das a câmara um pequeno teatro de pedras que aparecem [todas disponível no site da Fundação). longa carta a Lourdes. Depois fi lmagens – e para nós, quando sombras com um regador verde. pintadas com pequenas frases: Catarina Mourão percebeu desde houve um telefonema (esta é vemos o fi lme, surge também “À medida que ia fi lmando o ‘Importantíssimo’, ‘Faltam quatro cedo que “era preciso tempo”. muito mais uma história de cartas, como uma revelação: “A minha quotidiano dela na casa, cada horas para a meia-noite’, ‘eu’] são o Foi em 1997, ainda antes de ter de Lisboa para a Madeira, da pintura é esta”, diz Lourdes, vez mais o ‘Teatro de Sombras’ Manuel”. feito “A Dama de Chandor” (1998), Madeira para Lisboa), e uma visita. referindo-se ao espaço à sua volta. se tornava importante no fi lme. É E ainda a pedra que, para que visitou pela primeira vez Os anos foram passando e “Não a posso transportar. Ela nem a obra da qual ela se sente mais Catarina, resume aquilo que Lourdes na Madeira. Tinha visto o projecto foi crescendo na quereria mudar de sítio”. próxima hoje”, acredita Catarina. o fi lme quer mostrar. “Aqui na Gulbenkian a retrospectiva escuridão. Estava a amadurecer Perguntam-lhe muitas vezes “É a que está mais perto desta está tudo”, lê-se na letra “Para Além da Sombra”, sobretudo na cabeça de ambas, mas ainda que trabalho tem produzido nas ideia de arte como algo efémero, cuidadosamente desenhada. tinha-lhe fi cado na memória uma nem começara. No início Manuel últimas décadas. E aqui, neste muito relacionado com a vida”. Lourdes dirá a mesma coisa, peça do “Teatro de Sombras”, de Zimbro ainda era vivo, e o fi lme fi lme, ela responde: é isto. A O enorme arquivo em que de outra maneira. Aos que Lourdes e Manuel Zimbro, que seria com Lourdes, Manuel e a casa, o jardim, as plantas, as que guarda tudo, dos “Álbuns de perguntam em que é que ela tem vira quando tinha 14 ou 15 anos no casa dos dois na Madeira – não estão à luz e as que crescem na Família” aos convites e cartas estado a trabalhar, responde Centro de Arte Moderna (CAM). faria sentido separá-los, os três escuridão, os “Álbuns de Família”, dos amigos, e que a rodeia no seu simplesmente: “Vem ver a pintura “Essa peça marcou-me. Talvez eram uma história só. Mas Manuel 34 livros em que desde os anos 60 espaço de trabalho, é também que estou a fazer. Um bocado por ser uma coisa tão simples, o morreu em 2003 e Catarina reúne tudo o que tem a ver com como as plantas que germinam grande, não cabe em museu dia-a-dia de uma mulher. E talvez esperou para perceber se Lourdes as sombras, a água, as folhas, a na escuridão. “Tem a ver com a nenhum. E tão pequenina que isso tenha a ver com o cinema que queria que ela avançasse com o roupa a rodar dentro da máquina e ideia de guardar as coisas. Nada é todos os que passam por aqui nem faço, a importância do quotidiano, fi lme. depois a secar ao sol, os gestos do desperdiçado naquela casa, uma dão por isso [...] Continuo a pintar. dos gestos, dos rituais prosaicos Em 2005 começaram a fi lmar quotidiano. É isto. Não era preciso gota de água não é desperdiçada, Um quadro. Um só. E nunca estará que, no fundo, são a nossa vida”, algumas cenas, conversas entre irem a Paris ou a Copenhaga. vai para regar uma planta. A pronto”.

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 41 Filipa César e os fantasmas no p

“Memograma” “Le Passeur”

Vencedora da 6º edição do BES Photo, Filipa César levava a experiência do cinema ao espaço da arte, entre a fi cção e o real,, a montagem e memória. Retrato de uma artista que tem pensado, noo presente, certos passados da história portuguesa. José Marmeleirameleira

No momento em que tentávamos ini- também fundamental. Um processo 2003) ou “Letters” (2000),2000), e as ténues ciar, via “e-mail”, a conversa, Filipa de identificação por contacto: sou o fronteiras entre a fficçãoicção e o real em César (Porto, 1975) estava em Londres que vejo, ouço, gosto.” “Ringbhan” (2005)) ou nnoo seseuu “F fforor para assistir na Tate a um “screening” O cinema, central no seu imaginário, Fake” (2004) onde ass imagensimagens e asas pa-pa- de videoarte de Israel. Dias antes pas- não lhe tinha, contudo, chegado via lavras de pessoas queue comentamcomenttam o fil-fil- sara por Lisboa para receber o Prémio escola de arte. “Vinha da televisão”, me de Welles são associadasociadas aos pplanoslanos BES Photo (venceu a 6ª edição) e em revela. “Nos anos 80-90 havia ciclos da obra do cineasta,a, confundindo a breve partiria para Berlim, onde vive fantásticos na RTP, Bergman, Godard, adaptação com o original,riginal, a verdadeverdade e trabalha desde 1998. Pode parecer Truffaut, Orson Welles. Depois isso de- com a mentira. desnecessário evocar a condição de sapareceu.” Mais tarde já a viver na A pesquisa das propriedadesropriedades da alguém que viaja e vive fora de Portu- Alemanha, o interesse pelo cinema montagem enquantoo ddeterminaçãoeterminação gal, mas neste caso trata-se de um dado tornou-se mais consciente e estendeu- e associação de imagensgens continua relevante. É que a obra recente desta se a um “discurso metacinematográfi- entretanto a ser práticaática aaprofun-profun- artista portuguesa tem sido determi- co com a descoberta de uma aborda- dada. “As convençõeses cinemato-cinemato- nada pela relação entre a sua casa e gem mais experimental do documen- gráficas ou televisivasas sãsãoo lilimita-mita- atelier actuais (Berlim, Alemanha) e a tário: Alexander Kluge, Fassbinder, das”, explica. “O nossoosso pensa-pensa- sua identidade política e cultural. Ou, Harun Farocki, Robert Frank, Ivonne mento funciona numm registoregisto ddee se quisermos, entre o seu presente e o Rainer, Babette Mangolte, Frederick interligação, associaçãociaçção ddee seu passado. Por ora fiquemo-nos, de- Wisemann”. imagens, textos, conteúdos,onteúdos, Exposições finitivamente, pelo passado. Tratava-se de uma outra forma de sentimentos, que é muitomuito envolvimento, na qual ressoavam ques- mais livre e incontrolável.trolável. Sou o que vejo, ouço, gosto tões e problemáticas que Filipa já tinha Interessa-me [a montagem]ntagem] Filipa César surgiu em finais dos anos experimentado nos seus primeiros ví- exactamente porquee ppodeode 90,com uma obra onde era evidente a deos, em particular aqueles relaciona- tentar traduzir essee ppen-en- presença de elementos e referências dos com a observação e a montagem samento.” do universo e da linguagem do cinema: – e vale a pena sublinhar uma estratégia O lugar da obra prpro-o- a ficção e a ideia de montagem. Recor- que revemos nos vídeos “Berlin Zoo” posta por Filipa tam-am- de-se “Untitled (Twirler)”, de 1999, (2003) e “Untitled (Romance)” (2000- bém é outro que nãoo o vídeo onde uma sequência de quartos 2003) e nas primeiras sequências de da tradicional sala de e salas vazios (aparentemente apro- “F for Fake” (1974) de Orson Welles, cinema. Referimo-nosos priados de filmes de acção ou terror) que a artista convocaria posteriormen- ao espaço da arte e ddaa suspendia um desfecho sempre frus- te numa obra homónima: a apropria- instalação vídeo. É trado, ou “Letters” (2000), que ence- ção dos (não)actores do quotidiano. neste que existem “LeLe nava uma série de diálogos, conversas Da sociologia e da antropologia che- Passeur”, mostradoo e encontros em balcões dos correios. gavam também outras formas de fazer. em 2008 na Funda-a- Como nos trabalhos de João Onofre, “Interessavam-me não de forma aca- ção Ellipse. ou “Thehe João Pedro Vale, Francisco Queirós ou démica, mas pelos temas que aborda- Four Chambered HHe-e- Rui Toscano, manifestava-se na sua vam. O estudo de antropologia da arte art”, apresentado o anoano criação a presença de “textos” e me- e a forma como foi leccionado na Es- passado na Galeria CCris-ris- mórias de uma cultura de visual que cola de Belas-Artes do Porto, com a tina Guerra. O primeiroeiro excedia o campo da arte. Quase dez professora Eglantina Monteiro, abriu- consiste em dois filmeslmes nos depois, a artista sente-se pouco me plataformas de entendimento entre num ecrã duplo, o segun-egun- confortável para falar em nome dos uma prática artística e o seu contexto do solicitava, atravésvés ddaa outros, mas adianta leituras que apon- sociopolítico. E para um relacionamen- presença de uma sérieérie de tam para traços comuns: “Havia algo to com o outro no presente e no pas- cadeiras, a imobilidadedade do latente: como articular a percepção de sado.” espectador para o vivisiona-siona- uma cultura cinematográfica e musical. mento de um filme. “C“Comom a Tínhamos saído de cursos de pintura Livre e incontrolável instalação é possívell um tem- e achávamos artificial pintar, quando Estes seriam alguns dos “mecanismos” po diferente, um outrotro relacio- a nossa cultura estava relacionada com ou “materiais” que lhe permitiram in- namento com a imagemagem eemm movmovi-i- uma outra forma de construção da ima- terrogar a natureza do “medium” (do mento e uma autonomia.nomia. O esespecta-pecta- gem. A questão da apropriação era vídeo) em “Untitled (Romance)” (2000- dor move-se e os fotogramasfotogramas

42 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon presente

“The Four Chambered Heart”

A obra recente da “Na AAlemanha,lemanha, artista tem sido determinada pela pporqueorque o ddiscursoiscur relação entre a sua sosobrebre o ppassadoassado é casa e atelier actuais (Berlim, SÓNIA TAVARES, FERNANDO RIBEIRO, ppermanentementeermanenteme Alemanha) e a sua identidade política PAULO PRAÇA E NUNO GONÇALVES aarticuladorticulado e cultural no ppresenteresente cocomom um REVISITAM CANÇÕES DE AMÁLIA RODRIGUES NUMA VERSÃO POP. fantasma quotidiano,quoti Pensar em alemão a certa aalturaltura Nos últimos dois anos, furtando-se sempre ao conceito de documento tamtambémbém se começacom histórico ou investigação científica, o trabalho de Filipa César tem anda- CONCERTO DIA 26 DE MARÇO /// 21H a ppensarensar assim”assim do à volta de um passado; o passado de uma certa história política portu- guesa. Foi assim com os testemunhos dos indivíduos que, durante o Esta- /// ENTRADA LIVRE LIMITADA À LOTAÇÃO DA SALA do Novo, ajudavam outros a saltar a fronteira (“Le Passeur”) ou com “Me- mograma”, patente no Museu Berar- do. Este último teve como origem a história de Castro Marim enquanto local de degredo de homens e mu- lheres (e os ditos ou não-ditos, as sucedem-se.sucedem Os en- histórias que essa punição gerou) e controscontros que daí re- é constituído por uma série de foto- sultamsultam são mais grafias e dois filmes (“Insert” e “Me- inesperados.”inesper Para mograma”). alémalém ddesta relação As fotografias – forma de situar o no eespaço,sp emerge contexto – documentam em Portugal outraoutra rrelação: com o processo de censura sobre “As Lá- o tempotem histórico. grimas Amargas de Petra von Kant” “AA iimagemm em (1971), de Fassbinder; os filmes podem movimentomov per- ser vistos como fazendo parte de uma mitemite uma possi- mesma instalação, enunciando “Me- bilidadebili de ace- mograma” – um plano fixo de 40 mi- dederr ao passado nutos de um monte de sal em Castro atravésat do ci- Marim – a presença de alguém que neman ou da fala ou, como escreve a artista no ca- experiênciae tálogo, “imagens de um olhar contem- deste.”d Como plativo: quando a mente articula um assim?a “O ci- pensamento e os olhos perseguem neman e a psi- uma realidade paralela”. canáliseca surgi- Ocasião então para confrontar Fili- ramra simulta- pa com a sua identidade política e nneamente. cultural e o lugar que é a sua casa. “O AnalisarAn o cine- interesse num passado/presente sem- ma [do] passa- pre existiu, mas foi evoluindo com o dodo ccria uma es- trabalho. Na Alemanha, porque o dis-

ABÍLIO LEITÃO péciepéci de acesso curso sobre o passado é permanente- àsàs intençõesint que mente articulado no presente como levaramlevara à produ- um fantasma quotidiano, a certa altu- çãoção da imagemi e ao ra também se começa a pensar assim. // MORADA // HORÁRIO seuseu contexto.con Por O presente é sempre mais difícil de Praça Marquês de Pombal exemplexemplo,o o cinema discernir, porque nunca sabemos no Segunda a Sexta nº3, 250-161 Lisboa dede proppropagandaa pode que vai resultar, por isso procura-se das 9h às 21h serser analisadoanalisa segundo pistas no passado. Esta forma de pen- // TELEFONE // EMAIL umauma análiseanál do ‘sub- sar em alemão foi alterando os meus 21 359 73 58 [email protected] consciente’consciente do sistema automatismos de pensamento e da queque o produziu.”produzi leitura do presente.”

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 43 Esquisitos são os outros Mais do que uma peça, “Shoot the Freak” é um estado de espírito. A partir de quinta-feira, na Culturgest, há novo cadáver esquisito da Cão Solteiro. É um teatro de partilha de cumplicidades.dades. Mesmo que isso seja o gesto mais anti-teatral de todos.s. Tiago Bartolomeu Costa

A expressão é de Francisco Frazão, o mesmo vale para elementos conven- programador de teatro da Culturgest: cionais, como os figurinos, “que não “O teatro da Cão Solteiro é um para- fazem dos actores personagens”. Ou doxo”. Explica: “Não cabe em nenhu- para o cenário, que mostra o quadro ma das etiquetas que costumamos de Manet inspirado no conto, mas não utilizar. Usam um texto dramático mostra o flautista, anexado, em carne, mas não ligam grande importância osso e flauta à posteriori. “Isto somos ao texto. Estão mais perto da literatu- nós em processo”, diz-nos. Confuso? ra e, ao mesmo tempo, o teatro deles Nem tanto. não é sobre isso.” Ela está lá, a história do homem que Em “Shoot the Freak”, a primeira leva as crianças para fora da aldeia,

Teatro coprodução da Culturgest com o co- mas foi de tal forma esventrada por lectivo dirigido pelas irmãs Paula e músicas que foram sucessos em 2008 Mariana Sá Nogueira, com estreia e que dão à “coisa”coisa” um ar de musical marcada para a próxima quinta-feira, de quinta categoria,egoria, por personapersonagensgens entramos numa espécie de feira ma- que não o são porque os actores tamtam-- cabra, misto de fim de festa à lá filme bém não o são,o, por referên-referên- nostálgico norte-americano e de pre- cias que parativos para um ataque de zombies. misturam Onde em tempos houve uma história, Huckleber- ou um princípio que se assemelhava ry Finn com a uma história. Apollinaire, Calhou ser o Flautista de Hame- por uma lógi- lim, “que tem dado para todo o tipo ca de zapping de especulações, basta pesquisar na e acumulaçãoo Internet”, diz Paula Sá Nogueira, e digna de redess é por isso que a peça é “um cadáver sociais (Andréré esquisito”, diz André e. Teodósio, e. Teodósio diziz autor do texto. “E porque há dois que a peça “é anos ninguém se lembrou desta his- como os statustus tória, lembrámo-nos agora”, diz Sá no Facebook: vai Nogueira. E porque nada disto tem por aí fora”),), e a ver com a espectacularidade céni- por uma “resis-esis- ca mas com “um universo de afini- tência a esta cocoisaisa dades e de vozes que se materializam do palco” (palavrasavras em espectáculos”, diz Francisco Fra- de Sá Nogueira)a) que Uma comunidadecomunidade zão. se traduz numama desdes-- A genealogia desta peçape podia ir até Uma peça, portanto, que não é ape- sequenciaçãoão da 2006,2006 ano de “Sobre“Sobre a Mesa a Faca”, nas uma peça, mas “uma vontade de narrativa, numa am- peça onde os universos da Cão Soltei- resistir a fazer uma peça”, diz Sá No- putação das bengalas tradicionais e ro e do Teatro Praga, companhia da gueira. No início havia uma história, num jogo de esconde-esconde com o qual André e. Teodósio fazia parte, se dizíamos, e porque alguém teve que público. Poucas são as hipóteses de, cruzaram. Entrevistas de vida que sobreviver para a contar desta vez de facto, alguém poder dizer que es- eram misturadas com ficções biográ- cabe a uma criança contar o que se tamos perante uma peça de teatro. E ficas davam o mote para uma inven- passou, invertendo o protagonista e no entanto... ção dramatúrgica sobre as fronteiras a responsabilidade, num falso jogo “Cada vez mais o teatro, que é artificiais da referencialidade e da lúdico. As personagens compõem aquilo que fazemos, serve para pen- identificação. Depois podia seguir por uma família disfuncional e seus adja- sar aquilo que nos rodeia e para nos aí fora até “...”, peça de 2007 criada centes, numa espécie de alta comédia pensarmos. Antes de servir os ou- entre a Cão Solteiro e Teodósio, onde estafada porque, afinal, a história é tros, ou para pôr os outros a pensar, se começavam a afirmar os contornos só um artifício. “Interessa-nos, per- serve para nós próprios pensarmos desta relação de vida. manentemente, testar coisas através sobre o assunto”, argumenta Paula “Isto somos nós em processo”, diz dos espectáculos. É na feitura que Sá Nogueira. Paula Sá Nogueira. “Isto não são coi- testamos. Temos evitado imenso o A Cão Solteiro, acrescenta Francis- sas que nós, sentados à mesa e muito texto teatral mas, ainda assim, pelo co Frazão, fez “um caminho de expe- cerebralmente, esquematizemos. menos um quarto deste espectáculo, rimentação” assente na “recusa apa- “O teatro da Cão Mas, ultimamente temos verificado se não mais, é numa língua que não rente de uma montagem convencio- que há duas linhas que se têm manti- quer dizer nada, são sons. As pessoas nal”. E é por isso que falar do teatro Solteiro é um do. Uma determinação em trabalhar vêem a estrutura de uma persona- da Cão Solteiro é falar de uma comu- paradoxo. Não cabe com um número reduzido de pessoas gem, a estrutura de um texto, mas nidade. Para usar a citação de Mark com quem temos cumplicidade inte- estão a ouvir sons”, conta-nos Sá No- Twain explícita nos anúncios promo- em nenhuma lectual. Essas pessoas são, geralmen- gueira. A mesma coisa acontece com cionais desta peça, “quem tentar en- te, nossos amigos verdadeiros. Gosto quem interpreta: “Não há persona- contrar um motivo nesta narrativa das etiquetas que cada vez mais disso, é o que faz sen- gens no sentido teatral porque as pes- será processado; quem tentar encon- tido. E uma outra linha em que rece- soas não têm experiência teatral, ou trar nela uma moral será exilado; costumamos utilizar” bemos pessoas que não conhecemos, porque não são actores, ou porque quem tentar encontrar nela uma in- que nos são propostas normalmente saíram da escola recentemente”. O triga leva um tiro”. Francisco Frazão até por escolas, e que ficam se houver

44 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon Quaisquer semelhanças entre o espectáculo da Cão Solteiro e uma peça de teatro são (ou não são?) mera coincidência

Estamos an-an- testes peranteperante um exercí- cio de reflexão sob a forma de um texto aapesar de tudo dramático, que promovepromo a criação de um universo de referênciasreferê e cumplicidades. EssaEssa comunidade é feita não apenas pelas equipas responsáveis pelas pe- çasças – pela Cão Solteiro já passaram nomesnom tão diversos como os ence- nadoresnad Nuno Carinhas e Miguel Loureiro,Lou os artistas plásticos André GuedesGu e Vasco Araújo (este último centroce de “A Portugueza”, a cria- çãoçã anterior, co-produzida pelo MariaM Matos) ou o poeta Miguel MansoM (o senhor que se segue na peçap que estreia em Abril, com o título provisório “Santo Súbi- to”) –, mas também pelos espa- ços, e pelas memórias que es- tes deixam. E daí a sensação de um palco que não é nada porquep permite tudo. empatia A CãoCã Solteiro andou anos a fazer pessoal”,pessoal”, sublinha. Da teatro eem armazéns, como o do Ferro, empatiaempatia à criaçcriaçãoão nnãoão vai um passo, entretantoentreta destruído para dar lugar a vaiif uma forma dtttde estar, no teatro co- um parque de estacionamento em mo na vida. Santos, depois em palacetes, como o “Shoot the freak” vem na sequência da Estefânia (a utópica Casa dos Dias de outros textos co-assinados: “Super- da Água, que albergou durante um gorila” (com José Maria Vieira Men- tempo o sonho de Lúcia Sigalho, da des), “Supernova” (com André Godi- mesma geração, e hoje não é nada), e nho), e outras produções do Teatro está desde há uns anos numa loja ao Praga. Para este colectivo que gosta Poço dos Negros, com montra ampla se pensar como uma comunidade à virada para a rua estreita. É uma com- volta da qual gravitam nomes com os panhia que evita a espectacularidade quais vão, pela ordem natural das coi- cénica e busca, como dizia Francisco sas e da vida, fazendo espectáculos, Frazão, “um caminho diferente”. Es- Teodósio escreveu também sobre uma se caminho é o pretexto para contar, comunidade, mas daí não decorre que a quem fica, a sua história. “Shoot the Freak” possa ser visto co- mo um comentário autobiográfico. Ver agenda de espectáculos na pág. 50

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 45 Denise Stoklos, one-woman-showTeatro A brasileira Denise Stoklos está em Coimbra para mostrar dois dos mais radicais trabalhos a solo alguma vez feitos no teatro de língua portuguesa: “Mary Stuart” e “Calendário de Pedra”. O teatro pode não mudar o mundo, mas muda-a a ela – todos os dias. Inês Nadais

Denise Stoklos magníficas peças, a Europa descobria acredita no novos países. E aquelas duas repre- poder de um sentantes de um género tradicional- actor sozinho mente destituído do poder acabam-se com a sua voz, liquidando. Interessa-me muito colo- o seu corpo car em cena o poder como uma ques- e o seu tão perigosa – em qualquer momento, pensamento: em qualquer género”. “O performer Mas há mais questões “universais e solo não está só, inadiáveis” na figura de Maria Stuart. está com a “Ela viveu 44 anos: 22 anos em liber- plateia inteira” dade e 22 anos em prisão. Vejo isso como uma metáfora: vivemos metade da nossa vida em liberdade, mas na outra metade estamos obrigados a cumprir expectativas, a seguir conven- ções sociais. É só a gente pensar na nossa vida agora, com responsabilida- de, investigação e vontade de resolver as coisas”, sublinha Denise Stoklos. Teatro vivo “Calendário da Pedra” também é a nossa vida, agora, dia após dia. Co- meçou em cima de um poema de Ger- trude Stein, “A Birthday Book”, mas depois desviou-se dele (“É um texto maravilhoso, mas radicalmente lite- rário. Acho isso muito bonito e acabei respeitando”) para se tornar uma pe- Denise Stoklos acredita tão ferozmen- Stoklos, que em 1980 estreou em Lon- veis e, aí, políticos”. Isto que ela vem ça de Denise Stoklos, com algum De- te no teatro de um para um – no fenó- dres um espectáculo cujo título era já a Coimbra fazer “não é teatro de men- leuze no corpo. “Tem muito dessa meno não exactamente maior do que todo um programa político e perfor- tirinha, é de verdadona”: “Não há forma deleuziana de se ver o ser hu- a vida mas completamente do tama- mativo, “One-Woman-Show”. O teatro uma fantasia, nem sequer de figurinos mano como potência: acredito mais nho dela que resulta da fricção entre que construiu a partir daí – a que cha- ou de cenário. Para se fazer o Padre na certeza de vir a ser amanhã o que um actor sozinho em cima do palco mou, num manifesto que ainda hoje António Vieira, não vai ser preciso eu quero agora do que na esperança, e cada um dos espectadores presentes é estudado em universidades de todo usar uma roupa de padre, trejeitos que é escravizadora porque adia tudo naquela sala, naquela noite – que o o mundo e já deu umas quantas teses dos anos 1600 ou importações vocais para depois”, diz. Também tem mui- ciclo “Do Monólogo, Coisa Pública”, de doutoramento, “teatro essencial” da época. O actor estará tão conven- to do peso do dia-a-dia, desta coisa o programa de solos incluído na Se- – é um trabalho radicalmente solitário cido de que é o Padre António Vieira “cheia de caminhos, muito séria, que mana Cultural da Universidade de (sem “os valores parasitários” dos que o público vai ler que ele está ali. é o quotidiano”, e que é tudo na vida: Coimbra, não seria de todo o mesmo bastidores, do camarim, da cenogra- Aí o solo fica coisa pública, causa pú- “É nele que se pode actuar”. se ela não estivesse cá para o fechar. fia e dos figurinos, sem efeitos a não blica”, explica ao Ípsilon. Não vamos Esse trabalho é uma coisa que De- “O solo é uma forma de teatro maior ser os que resultam da maximização ver o Padre António Vieira de “Vozes nise Stoklos quer continuar a fazer que pede muito a responsabilidade dos recursos próprios do actor: voz, Dissonantes” em Coimbra, mas va- sozinha porque ela e o palco ainda do actor, uma responsabilidade que corpo, pensamento) mas não auto- mos ver Maria Stuart, a Rainha da têm muito que conversar. Mas o teatro ele tem de assumir sozinho e não po- suficiente: “Um solo de teatro essen- Escócia, e às tantas vamos vê-la a essencial, argumenta, também é uma de dividir com ninguém. É um com- cial só se realiza se o público ler, com- transformar-se na prima, Isabel I de via para todos os actores sem trabalho promisso enorme – não com o ence- pletar e decifrar aquilo que está sen- Inglaterra. Denise Stoklos interessou- sentados à espera de um telefonema: nador, não com a personagem, mas do dito”. As questões em cena, diz, se por elas (há muitos anos: “Mary “Gostaria que acreditassem que o ac- com o espectador. Se o espectador têm de ser cruciais tanto para o actor Stuart” estreou-se em 1987 no La Ma- tor pode escolher os seus textos e não estiver lá, com ele, será qualquer como para o espectador: “Se [o per- Ma, em Nova Iorque, e em 1994 ga- “Continuo esperando dirigir-se sozinho”. coisa, mas não será teatro”, diz ao former] não estiver em perigo, o es- nhou o Fringe First em Edimburgo) Quanto mais se diz que o teatro Ípsilon a propósito dos dois espectá- pectador desliga, não se sente neces- porque viu ali a história da corrupção ser arrebatada morreu, mais ela acredita que ele es- culos, “Mary Stuart” (hoje, às 21h30, sário (...). O performer solo não está do poder em todo o seu esplendor: tá vivo: “Continuo esperando ser ar- no Teatro Académico de Gil Vicente) só. Está com a plateia inteira”. “É um momento singular em que há e sinto-me mudada rebatada e me sinto-me mudada e “Calendário da Pedra (amanhã, às Além de ser “o autor, o encenador, duas mulheres à frente de dois países, quando vou ao teatro. Com cada es- 21h30, no Teatro da Cerca de São Ber- o coreógrafo e o dramaturgo de si numa época histórica: Leonardo da quando vou ao teatro. pectáculo de Pina Bausch, por exem- nardo), que integram o ciclo. mesmo”, o actor do teatro essencial Vinci começava a abrir os cadáveres plo, um mundo inteiro desaba sobre Poucos actores de língua portugue- tem um compromisso com os temas e a ver pela primeira vez o que havia Com cada espectáculo mim e começa outro”. Há quem te- sa se atiraram para o palco tão radi- mais radicais da experiência humana de concreto dentro dos homens, de Pina Bausch, nha dito exactamente o mesmo das calmente sozinhos como Denise – temas “portanto universais, inadiá- Shakespeare estava a escrever as suas peças dela. por exemplo, um mundo inteiro desaba sobre mim e começa outro”

46 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon

ANTÓNIO CARRAPATO A partir do livro de “As Cruzadas Saladino Vistas pelos Árabes”, de Amin Maalouf, está vivo Rui Horta criou “As Lágrimas de Saladino”, uma nas nossas cidades obra sobre a ética e a compaixão, o respeito pelo outro e a importância de sermos nós próprios. A estreia é hoje no Centro Cultural de Belém, em Lisboa. Depois a peça parte em digressão: Montemor-o- Novo, Guimarães, Leiria, Torres Novas, Portimão e Porto. Ana Dias Cordeiro

Os bailarinos da peça vêm de sete países diferentes e falam nas suas próprias línguas: “Não é para entender, é para sentir”, justifica o Dança coreógrafo

Rui Horta desaparece por uns mo- em Montemor-o-Novo, dias antes de rusalém, para acabar com um século de Jerusalém, uma cidade multicultu- mentos atrás do palco. O ensaio co- virem para Lisboa, num final de tarde de ocupação cristã. É um corpo, uma ral, uma pequena Babel – em pleno meçou e terminou à hora, foi intenso, de temporal. De portas fechadas à voz em cena, que fita quem o escuta. Alentejo. Sete corpos movem-se para em tempo real. Os bailarinos preci- chuva e ao vento, o tempo como que Diz Saladino que ele próprio é mais chegar aonde a palavra não chega. sam agora dele, o tempo de se refaze- parou para ali dentro nascer algo que forte do que uma tempestade – por- Abrandam nos momentos em que se rem da descarga emocional que os a tempestade, sempre presente, ins- que uma tempestade chega e destrói, exprimem pela voz. O cosmopolitismo assalta quando a entrega é total. E foi pirou. e ele tem o poder de escolher. E esco- passa nas falas dos actores e bailari- o caso neste ensaio da nova criação As primeiras palavras falam, aliás, lhe não destruir. Usa o poder não pa- nos, no som que produzem quando de Rui Horta, “As Lágrimas de Saladi- de uma tempestade. São palavras de ra vingar a ocupação, mas para pou- dizem nomes de ruas, praças e traves- no”, que estará em cena hoje e ama- Saladino, sultão do Egipto e da Síria, par as pessoas, as diferentes crenças sas de Lisboa, nos seus próprios idio- nhã no Grande Auditório do Centro senhor de poder ilimitado quando e religiões e os tesouros da esplendo- mas. As imagens destes lugares trans- Cultural de Belém, Lisboa. Foi o últi- chega, num dia de 1187, com os seus rosa cidade. portam-nos para a história da cidade, mo no Cine-Teatro do Curvo Semedo milhares de soldados e emires, a Je- Os movimentos dão corpo ao caos para a sua memória, as suas figuras.

48 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon SÃO silva!designers Pode ser Lisboa, ou Jerusalém. Em controlar tudo, como não se contro- Árabes”, do escritor libanês Amin Ma- checo, húngaro, italiano, espanhol e lam as tempestades. alouf. Este capítulo retrata a chegada outras das línguas das suas sete nacio- de Saladino a Jerusalém e as suas lá- LUIZ nalidades. “Nas suas vozes, com os Electrónica e fi larmónica grimas, no momento em que se reco- MAR~1O seus sotaques, nos seus idiomas, [o Ao juntar num mesmo palco intér- lhe junto dos que o seu exército ma- texto] não é decifrável do ponto de pretes de música contemporânea tou. São palavras de política e de vio- vista do entendimento, mas plastica- (misturando processamento de sons lência, questões ancestrais, memória, mente traduz as sensações que eu electrónicos com instrumentos de ética, compaixão. Alguns são discur- queria”, salienta Rui Horta. “Não é sopro, piano, guitarra eléctrica, per- sos inflamados. Também eles ditos e para entender, é para sentir.” cussão e uma “turn-table” de DJ) e a interpretados nas línguas dos actores. centenária Banda Filarmónica da So- Também eles pensados para serem Cidades sem fronteiras ciedade Carlista de Montemor-o-No- sentidos. Por vezes em estado de ira Suécia (Marcus Baldemar), Itália (Síl- vo, Rui Horta cumpriu “um velho ou desespero, ampliados por micro- via Bertoncelli), Espanha (ou País sonho”. E isso mesmo diz aos músicos fones que entram e saem de cena, Basco), (Noemí Barták), Polónia (Ka- presentes quando lhes agradece e pelo som de papel que se rasga ou tarzyna Sitarz), República Checa (Vít marca novo encontro para o ensaio queima, como um sonho ou uma me- Barták), França (Gilles Baron) e Hun- em Lisboa, já a meio da semana. mória que alguém desfaz ou espezi- gria (Milan Újvári) – os quatro bailari- É um sonho relacionado com o pro- nha. “É sempre difícil comunicar. Um nos e as três bailarinas de “As Lágri- jecto cultural que desenvolve em tem um sonho, que o outro manda mas de Saladino” deixaram os seus Montemor-o-Novo, mas também com sempre para baixo. E isso é sempre países de nascença ou de trabalho uma ideia de estética: “A estética de duro. Mas a comunicação é possível”, para passarem quatro meses no Con- uma banda filarmónica é extraordi- continua o coreógrafo. Por muito di- vento da Saudação, o Espaço do Tem- nária, é de uma autenticidade, de fícil que seja, “há espaço para todos po, centro multidisciplinar de pesqui- uma pujança, de uma vitalidade...”. e esse espaço é a cidade”. sa e criação que Rui Horta fundou há A Carlista junta músicos amadores, Dois corpos lançam-se em sincronia, dez anos na pequena cidade alente- “filhos da terra” que trabalham e re- e depois em confronto, entre eles e jana de Montemor-o-Novo. “Entrega- gressam a Montemor-o-Novo à noite com o som que os acompanha – de- ram-se”, resume. A peça gira à volta para os ensaios da banda. Também pois quatro, cinco ou sete. Umas ve- dessa dedicação, “desse lado de carne aqui há entrega. zes completam-se, outras anulam-se. viva, de gato selvagem” que só se con- “Fandango”, com que abre a peça, é Avançam seguros ou recuam enquan- segue “se as pessoas forem pessoas, um original do repertório da banda. to caem, invadidos ou alheios ao som estiverem próximas umas às outras e Duas obras, “Fanfarra de Saladino” omnipresente. Um microfone bate no se entregarem à obra”. e “World Tune”, foram criadas por chão como bate o coração, capta a Para a peça mais política que Rui Hor- João Lucas, compositor a quem Rui respiração de quem corre, foge, pára, ta criou até hoje – “há um grito dentro Horta pediu “para estar dentro da se encontra, afinal sempre soube de mim”, diz, um protesto contra “es- estética contemporânea sem limita- quem era. te momento” –, o coreógrafo fez a ções, e ao mesmo tempo saber criar selecção a partir de um grupo inicial para uma banda filarmónica”. “O Um fi m sem moral de 1400 candidatos, que passou a 180 grande desafio é juntar a tecnologia A peça fala-nos da “importância de numa audição em Paris. Em Lisboa, e os instrumentos de sopro tradicio- sermos nós próprios mesmo em con- estiveram 60 bailarinos. Um longo nais das bandas filarmónicas”, com- tacto com os outros, de não irmos processo, por ser o mais democrático pleta o maestro Sérgio Frazão. O mú- com o rebanho”, afirma o coreógrafo. e mais transparente, explica, mas sico lembra que poucos acreditavam E o fim, “amoral”, apenas nos mostra também porque tinha “uma enorme que esta fusão fosse possível. Mas todas essas pessoas, orgulhosas de ser necessidade de grandes intérpretes”. quando a banda foi convidada para quem são, resistindo à torrente avas- Escolheu-os “por serem quem eles o primeiro concerto no espaço do saladora de som que facilmente as são” e por concentrarem múltiplos convento, “as pessoas ficaram muito comprimiria, indiferenciando-as, ti- talentos. São bailarinos mas também admiradas” e começaram a acreditar rando-lhes a voz. Mas os sete bailari- actores, alguns acrobatas, vindos do que era possível. nos ali ficam, a olhar em frente, sozi- circo; alguns também começam a Quando e onde o corpo não chega, é nhos, como que a dizer: “Isto sou eu, emergir como coreógrafos, como cria- a palavra que vai. São textos recita- com a minha forma, a minha cara, a dores. E têm uma voz que por mo- dos, em fragmentos, ao longo da pe- minha barriga, o meu corpo, alto, gor- mentos se substitui ao corpo, na ex- ça, escritos por Rui Horta e Tiago do, magro, barbudo, branco, azul, pressão da inquietude, da incerteza, Rodrigues e inspirados no décimo preto, amarelo. Isto sou eu e, neste da fuga ou da afirmação. “Formam capítulo de “As Cruzadas vistas pelos fragmento de caos, tenho orgulho em uma equipa muito rica do ponto de ser quem sou. E tenho em mim uma vista criativo”, frisa Rui Horta. “E isso ética e valores em que acredito”. desafia-me a mim próprio”, diz o co- As colunas de som juntam-se em pal- reógrafo e bailarino, com uma carrei- “As Lágrimas co aos bailarinos e músicos que re- ra que passou por Lisboa, Nova Ior- gressam ao seu estado natural. A ba- que, Frankfurt e Munique. de Saladino” é uma tida que invade a cena pode ser de Os sete corpos em palco podem ser um coração, libertadora, ou de uma sete personagens. Ou muitas mais, se peça sobre máquina, destruidora. cada uma se desdobrar noutras. “São A esta hora em que o começo de noi- Com o Alto Patrocínio sete híbridos, personas, a meio cami- a metrópole, sobre te acalma o temporal, também o fim nho entre a personagem e eles pró- a grande cidade, do ensaio acalma a exaltação da peça. prios”, sugere. “E esta é a sua força, As palavras que o coreógrafo escreveu são eles mas também são personagens o único território sobre ela ecoam, quase silenciosas, que eu quero que eles sejam.” nos nossos ouvidos: “Mais tarde ou Com “As Lágrimas de Saladino” – se- “onde não há mais cedo o vento voltará a soprar. E gunda de três criações como artista fronteiras”,onteiras , e também voarão casas, árvores e os corpos dos associado do Centro Cultural de Be- mais leves e incautos. Voarão 13H ÀS 20H BILHETEIRA DAS 213 257 650; T: [email protected] lém, para esta temporada (a primeira em estilhaços os nossos foi “Talk Show” em Outubro, a tercei- sobrebre a iideiadeia de sonhos, bem como as ra será “Local Geographic”, em Maio) quee “as sociesociedadesdades portas que deixarão os –, Rui Horta esbate de novo a frontei- nossos celeiros vazios. ra entre dança, teatro e performance, maisais rricasicas são as Depois voltará a calma numa mistura que caracteriza o seu e o único ruído que se trabalho e que o fascina. “O que é ma- maisais anárquicas”anárquicas” ouvirá será a dança ravilhoso na dança é ser uma lingua- das moscas. Vai custar gem extremamente moderna, no sen- a perceber por que é que tido em que o público constrói a sua tanta coisa que amávamos peça, é transformador da peça.” E desapareceu sem deixar “As Lágrimas WWW.TEATROSAOLUIZ.PT conclui: “As pessoas vão ver coisas rasto.” MUNICIPAL TEATRO SÃO LUIZ 1200-027 LISBOA 38; ANTÓNIO MARIA CARDOSO, RUA 213 257 640 T: / [email protected] muito diferentes.” de Saladino” A haver um único tema capaz de de- é a peça mais Ver agen- finir esta obra, será o tema da metró- política da de es- pole, da grande cidade, o único terri- de Rui Horta: pectácu- tório “onde não há fronteiras”. E tam- dança de los na bém a ideia de que “as sociedades protesto, pág. 50. mais ricas são as mais anárquicas”. contra este Numa grande cidade, não se pode momento

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 49 aMauMaumMedíocreMedíocremmRazoávelRazoávelmmmmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

Nuno Lopes e Gonçalo Waddington em “Num Dia Igual aos Outros”, “A Louca...”, dos húngaros encenação de Marco Martins da Béla Pintér e Companhia, no Maria Matos

O “Vale” de Madalena Victorino vai às Caldas da Rainha

“A Chuva” é uma recriação de um texto de Jean Luc-Lagarce: três irmãs à espera, Agenda enquanto a vida passa Teatro Amor Solúvel De Carlos Tê. Encenação de Luisa Pinto. Direcção Musical de Helder Estreiam Gonçalves. Com Romeu Costa, Joana Shoot the Freak Manuel, Rui David, Cristina Cardoso e Jorge Loureiro. De e com Cão Solteiro e André e. Matosinhos. Cine-Teatro Constantino Nery. Avenida Teodósio, Paula Sá Nogueira, Mariana Serpa Pinto. Até 28/03. 4ª a Sáb. às 21h30. Dom. às Sá Nogueira, Vasco Araújo, Joana 16h. Tel.: 229392320. Dilão, Ana Santos, André Godinho. Lisboa. Culturgest. Rua Arco do Cego - Edifício da Le Jardin CGD. De 11/03 a 14/03. 5ª a Sáb. às 21h30. Dom. às De e com Jean-Paul Lefeuvre e Didier 17h. Tel.: 217905155. 5€ a 12€. André. Ver texto na pág. 44 e segs. Torres Novas. Teatro Virgínia. Largo São José Lopes dos Santos. Dia 07/03. Dom. às 16h. Tel.: 249839309. 10€. Num Dia Igual aos Outros Viseu. Teatro Viriato. Lg. Mouzinho Albuquerque. De John Kolvenbach. Encenação de Dia 05/03. 6ª às 21h30. Tel.: 232480110. 7,5€ a 15€. Marco Martins. Com Nuno Lopes, Gonçalo Waddington. Rei Édipo Lisboa. Teatro Nacional D. Maria II - Sala Estúdio. A partir de Édipo. Encenação de Jorge Pç. D. Pedro IV. De 11/03 a 18/04. 4ª a Sáb. às 21h45. Silva Melo. Com Diogo Infante, Lia Dom. às 16h15. Tel.: 213250835. 6€ 12€. Gama, Virgílio Castelo, entre outros. Lisboa. Teatro Nacional D. Maria II - Sala Garrett. Pigmalião Pç. D. Pedro IV. Até 28/03. 4ª a Sáb. às 21h30. Dom. De Pedro Mexia. Pelo Teatro Oficina. às 16h. Tel.: 213250835. 7,5€ a 30€. Encenação de Marcos Barbosa. Com Diana Sá e Emílio Gomes. Canção do Vale Guimarães. Centro Cultural Vila Flor - Pequeno De Athol Fugard. Pelo Teatro dos Auditório. Avenida D. Afonso Henriques, 701. De Aloés. Encenação de Jorge Silva. 10/03 a 14/03. De 4ª a Sáb. às 22h. Dom. às 17h. Tel.: Com Carla Galvão, José Peixoto. cujas emoções foram condensadas 253424700. 5€ a 7,5€. Coimbra. O Teatrão. Rua Pedro Nunes. Dia 06/03. A vida em três”, explica a encenadora Molusco Sáb. às 21h30. Tel.: 239714013. Laurinda Chiungue. À medida que as De Ricardo Freitas. Pelo Projecto Paisagens em Trânsito à espera cenas evoluem são expostas Ruínas. Encenação de Francisco De e com Patrick Murys. fragilidades da condição humana e, Campos. Com Miguel Antunes, Vila Real. Teatro de Vila Real. Alameda de Grasse. particularmente, do género Francisco Campos. Dia 05/03. 6ª às 22h. Tel.: 259320000. 7€. “A noite em que o pai feminino. A porta continua Montemor-o-Novo. Cine-Teatro Curvo Semedo. Lg. Dr. António José de Almeida. De 05/03 a 06/03. 6ª e Dança escorraçou” o irmão mais encerrada e revelam-se necessidades Sáb. às 21h30. Tel.: 266898104. de integração na sociedade e novo é o acontecimento carências provocadas pela falta de Continuam Estreiam fundador da vida das três atenção. A urgência de amor (nos As Lágrimas de Saladino dois sentidos: amar e ser amado) A Louca, o Médico, os Discípulos raparigas que esperam a e o Diabo De Rui Horta. Com Katarzyna Sitarz, para alcançar a felicidade, a vida. chuva no Teatro Municipal De Béla Pintér. Encenação de Béla Milán Újvári, Noemí Viana García, Vít Os relatos da “noite em que o pai Pintér. Com Hella Roszik, Éva Barták, Gilles Baron, Marcus de Almada. Luís Carlos o escorraçou” sofrem uma gradação Enyedi, László Quitt, Tünde Baldemar, Silvia Bertoncelli, Miguel progressiva de intensidade Szalontay, Szabolcs Thuróczy, Zsófia Moreira. Soares Lisboa. Centro Cultural de Belém - Grande conforme o desenrolar de “A Szamosi, Zoltán Friedenthal, Béla Auditório. Praça do Império. De 05/03 a 06/03. 6ª Chuva”. O drama aumenta em torno Pintér. e Sáb. às 21h. Tel.: 213612400. 5€ a 15€. A Chuva Lisboa. Teatro Municipal Maria Matos. Av. Frei dessa recordação, desculpa Ver texto na pág. 48 e segs. A partir de Jean-Luc Lagarce. Miguel Contreiras, 52. Até 05/03. 4ª a 6ª às 21h30. Encenação de Laurinda Chiungue. esfarrapada para vidas presas a Tel.: 218438801. 5€ a 12€. memórias passadas. Aparecem Continuam Com Ana Mota Ferreira, Helena Fragmentos de um Corpo Só Veloso, Tânia Leonardo. novas explicações para a partida do irmão mais novo. Fala-se em fuga, A partir de Gogol, Franz Kafka, Vale Fernando Pessoa. Pelo Crinabel Almada. Teatro Municipal de Almada. Av. Professor em abandono. Indiferença perante De Madalena Victorino. Com Ainhoa Egas Moniz. Até 07/03. 4ª a Sáb. às 21h30. Dom. às Teatro. Encenação de Marco Paiva. Vidal, Costanza Givone, João as três jovens mulheres que esperam 16h. Tel.: 212739360. Porto. Teatro Helena Sá e Costa (ESMAE). R. Vladimiro, Miguel Fragata, entre perdidas, desencontradas, inquietas. Alegria, 503 (entrada pela R. da Escola Normal, 39). Até 07/03. 5ª a Sáb. às 21h30. Dom. às 16h. Tel.: outros. Há três irmãs dentro de casa no Cada uma dessas irmãs exprime- Caldas da Rainha. Centro Cultural e Congressos das 225189982. Teatro Municipal de Almada. Ao se em monólogos, como num Caldas da Rainha - Grande Auditório. Rua Doutor Comédia Mosqueta Leonel Sotto Mayor. De 06/03 a 07/03. Sáb. às fundo, uma porta fechada separa-as confessionário. “Várias visões 21h30. Dom. às 17h30. Tel.: 262889650. 10€ a da sociedade, dos sonhos, da distantes mas que entram em De Angelo Beolco. Pela Companhia 12,50€. realidade. A “filha mais velha” choque”, explica Chiungue. Como se de Teatro de Almada. Encenação de Mário Barradas. Com Ivo Alexandre, Talk Show (Tânia Leonardo) começa a o irmão as estivesse a ouvir. A mais José Martins, Paulo Matos, Teresa De Rui Horta. Com Adriana Queiroz, desbobinar a noite que mudou as nova (Ana Mota Ferreira), submetida Gafeira. Miguel Moreira, João Martins, suas vidas. “A noite em que o pai o à autoridade das mais velhas, Almada. Teatro Municipal de Almada. Av. Professor Beatriz Pereira. escorraçou” e se fez ao caminho que continua a vê-lo como um herói que Egas Moniz. De 11/03 a 21/03. 5ª, 6ª e Sáb. às 21h30. Montemor-o-Novo. O Espaço do Tempo - Blackbox. desaparece na curva do bosque. A voltará para as salvar. A revelação Dom. às 16h. Tel.: 212739360. 6€ a 13€. Convento da Saudação. Dia 06/03. Sáb. às 14h30. Tel.: 266899856. noite em que começou a espera pelo dos sonhos desta dócil personagem Fora de Casa Por Agora irmão mais novo. A espera pela é constantemente interrompida pela De Gonçalo Alegria. Pelo Teatro do Nada do que dissemos até agora chuva que, quando começasse a cair expressão “não sei”. “Vai ser sempre Vestido. Com Pedro Caeiro, Joana teve a ver comigo sobre os bosques, as serenaria. A inocente”, considera a irmã do meio Craveiro. De Rita Natálio. Com António Júlio, chuva na qual depositavam a (Helena Veloso), a que passou a Lisboa. Instituto Franco-Português. Av. Luís Bívar, Cláudio da Silva, Nuno Lucas. 91. Até 13/03. 4ª a Sáb. às 21h30. Tel.: 213111400. 5€ Lisboa. Centro Cultural de Belém - Sala de Ensaios.

Teatro/Dança esperança de poder mudar todos os infância a desejar a morte e a a 7,5€. Praça do Império. Dia 06/03. Sáb. às 19h. Tel.: anos que perderam à espera. Até ambicionar passear o vestido 213612400. 5€. Blackbird que o irmão chega. vermelho que as irmãs ridicularizam De David Harrower. Encenação de O Aqui A partir de “Estava em casa e com o irmão desaparecido. Voltar ao Tiago Guedes. Com Custódia Gallego De Ana Rita Barata. Com António esperava que a chuva viesse”, peça baile que haviam abandonado. Para (voz off), Miguel Guilherme, Isabel Cabrita, Carolina Ramos, Catarina de Jean-Luc Lagarce, a equipa de “A as três, a vida é um círculo vicioso: Abreu. Gonçalves, Pedro Ramos. Chuva” construiu “um guião, todo sonho, impasse, inércia. Aqui não há Porto. Teatro Carlos Alberto. R. Oliveiras, 43. De Almada. Teatro Municipal de Almada. Av. Professor chuva, nem grandes demonstrações 05/03 a 14/03. 4ª, 5ª, 6ª e Sáb. às 21h30. Dom. às Egas Moniz. De 05/03 a 06/03. 6ª e Sáb. às 21h30. ele muito rico, muito desafiante, e 16h. Tel.: 223401905. 5€ a 15€. Tel.: 212739360. 10€. com cinco personagens femininas de amor.

50 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon música teatro

Ivanov(Anton Tchekov) Final Fantasy (Owen Pallett) Truta M/12 10 e 11 Março 22h00 M/6 19 a 27 Março 21h30 (Excepto dia 23)

música dança

palestra-performance

in pieces Susanna and the Fumiyo Ikeda & Magical Orchestra Tim Etchells 12 Abril 22h00 M/6 19 a 21 Abril 21h30 M/12 apresentações no âmbito da rede co-financiado por m enores 30 anos 5€ www.teatromariamatos.pt aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

Wim Vandekeybus, Cinema, Televisão, coreógrafo e Vídeo e Multimédia realizador belga, para orientar um cuja peça “NiewZart” workshop onde se esteve recentemente trabalhará o cinema digressão por e a dança. O mais Portugal, estará em destacado nome da work Julho no AVANCA’10 dança contemporânea -shop – Encontros europeia, após o Internacionais de desaparecimento

E as 3D? São usadas de maneira muito menos ostensiva do que em “Avatar” Cinema

Estreiam 00h20 Domingo 11h30, 14h20, 16h50, 19h20, 21h50, Lusomundo Ferrara Plaza: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª – à letra – numa das características 00h20; ZON Lusomundo Alvaláxia: 5ª 6ª 2ª 3ª 15h, 17h50, 21h20 (3D) 6ª Sábado 15h, 17h50, 21h20, do livro de Carroll, o facto de ele se 4ª 13h20 (V.Port./3D), 15h50, 18h30, 21h10, 23h45 23h50 (3D); ZON Lusomundo GaiaShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 10h45, 13h20 (V.Port./3D), 15h50, 2ª 3ª 4ª 13h (V.Port./3D), 15h30, 18h20, 21h10, dirigir primordialmente à Manicómio 18h30, 21h10, 23h45; ZON Lusomundo Amoreiras: 00h10 (3D) Sábado Domingo 11h, 13h (V.Port./3D), imaginação do leitor. E que é 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h20, 16h, 15h30, 18h20, 21h10, 00h10 (3D); ZON Lusomundo recorrendo à sua “imaginação de 18h50, 21h20, 00h10 (3D); ZON Lusomundo MaiaShopping: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 13h20, CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 16h05, 19h, 21h45 (3D) 6ª Sábado 13h20, 16h05, leitor” que Burton constrói a sua Isto é um País dos Horrores, 13h (V.Port./3D), 15h50, 18h40, 21h20, 24h 19h, 21h45, 00h25 (3D); ZON Lusomundo “Alice”. A imaginação de Burton, (3D); ZON Lusomundo Colombo: 5ª 6ª Sábado Marshopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª conhecemo-la bem, e seguramente a vivido (ou criado) no Domingo 2ª 3ª 4ª 13h20 (V.Port./3D), 16h05, 13h30, 16h, 18h40, 21h30, 00h10 (3D); ZON limiar suportável da 18h40, 21h15, 23h50; ZON Lusomundo Dolce Vita Lusomundo NorteShopping: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 13h10 reconhecemos aqui (donde, a Miraflores: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 15h30, 18h30, (V.Port./3D), 16h10, 19h, 22h, 00h45 (3D) Sábado impressão de familiaridade que já desagradabilidade. Luís 21h30 (3D) 6ª Sábado 15h30, 18h30, 21h30, 00h30 Domingo 10h40, 13h10 (V.Port./3D), 16h10, 19h, 22h, descrevemos). Surpresa? Surpresa (3D); ZON Lusomundo Odivelas Parque: 5ª 2ª 3ª 00h45 (3D); ZON Lusomundo Parque Nascente: 5ª Miguel Oliveira 4ª 15h30, 18h20, 21h20 (3D) 6ª 15h30, 18h20, 21h20, 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 12h45, 15h25, 18h15, 21h15, 24h nenhuma, ou só – se nos pusermos a 00h10 (3D) Sábado 13h, 15h30, 18h20, 21h20, 00h10 (3D) Domingo 10h20, 12h45, 15h25, 18h15, 21h15, 24h pensar nisso – que essa imaginação (3D) Domingo 13h, 15h30, 18h20, 21h20 (3D); ZON (3D); Castello Lopes - 8ª Avenida: Sala 1: 5ª 2ª 3ª trabalhe num diálogo directo com a Alice no País das Maravilhas Lusomundo Oeiras Parque: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 15h50, 18h50, 21h50 6ª 15h50, 18h50, 21h50, Alice in Wonderland 4ª 13h25 (V.Port./3D), 15h55, 18h35, 21h10, 24h (3D) 00h15 Sábado 13h30, 15h50, 18h50, 21h50, 00h15 fonte carrolliana, e surja imediada De Tim Burton, Domingo 10h45, 13h25 (V.Port./3D), 15h55, 18h35, Domingo 13h30, 15h50, 18h50, 21h50; ZON – mesmo “despoluída” – por outras 21h10, 24h (3D); ZON Lusomundo Torres Vedras: 5ª Lusomundo Fórum Aveiro: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª imaginações de “Alice”. Enfim, não com Mia Wasikowska, Johnny Depp, 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h10, 18h45, 13h30, 16h10, 18h50, 21h30 (3D) 6ª Sábado 13h30, Helena Bonham Carter, Christopher 21h40, 00h20 (3D); ZON Lusomundo Vasco da 16h10, 18h50, 21h30, 00h10 (3D); ZON Lusomundo conhecemos todas – há uma versão Lee, Anne Hathaway. M/12 Gama: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h25, 16h, 18h25, Glicínias: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h50 (V. de Jonathan Miller que anda por aí 21h20, 00h05 (3D) Domingo 11h, 13h25, 16h, 18h25, Port./3D), 16h30, 19h10, 21h50, 00h30 (3D) nas prateleiras dos DVDs de 21h20, 00h05 (3D); Castello Lopes - C. C. Domingo 11h, 13h50 (V.Port./3D), 16h30, 19h10, MMMMn Jumbo: Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h40, 18h10, 21h20 6ª 21h50, 00h30 (3D); importação – mas este é um filme 15h40, 18h10, 21h20, 23h50 Sábado 13h10, 15h40, Disney (uma produção Disney) que é Lisboa: Castello Lopes - Cascais Villa: Sala 5: 5ª 2ª 18h10, 21h20, 23h50 Domingo 13h10, 15h40, 18h10, Que Tim Burton pegue em Lewis o perfeito negativo da versão Disney 21h20; Castello Lopes - Fórum Barreiro: Sala 1: 5ª 3ª 4ª 16h, 18h40, 21h40 6ª 16h, 18h40, 21h40, Carroll não é por certo estranho que enformou, em tanta gente de 00h20 Sábado 13h10, 16h, 18h40, 21h40, 00h20 2ª 3ª 4ª 15h40, 18h15, 21h20 6ª 15h40, 18h15, Domingo 13h10, 16h, 18h40, 21h40; Castello Lopes 21h20, 23h50 Sábado 13h, 15h40, 18h15, 21h20, nem extraordinariamente tantas gerações, uma visão de “Alice - Londres: Sala 2: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 14h15, 23h50 Domingo 13h, 15h40, 18h15, 21h20; Castello inesperado, porque o universo do no País das Maravilhas”. Lopes - Rio Sul Shopping: Sala 4: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 16h45, 19h15, 21h45 6ª Sábado 14h15, 16h45, 19h15, escritor inglês sempre esteve à E é o negativo disso porque (para 21h45, 00h15; Castello Lopes - Loures 15h40, 18h30, 21h30, 24h (3D) Sábado Domingo Shopping: Sala 5: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 13h10, 15h40, 18h30, 21h30, 24h (3D); UCI distância de um espelho do do além de questões de invenção visual) 4ª 13h30 (V.Port./3D), 15h50, 18h10, 21h20, 23h50 Freeport: Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h50, 18h35, 21h25 realizador americano (“americano”, intensifica, em vez de atenuar, a 6ª 15h50, 18h35, 21h25, 23h45 Sábado 13h35, 15h50, (3D); CinemaCity Alegro Alfragide: Sala 2: 5ª 6ª mas em processo de anglicização, dimensão mais perturbante do Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 15h25 (3D); CinemaCity 18h35, 21h25, 23h45 Domingo 13h35, 15h50, 18h35, Alegro Alfragide: Cinemax: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 13h55, 21h25; ZON Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª como nos últimos filmes se vinha relato de Carroll. O absurdo daquilo 16h15 (V.Port./3D), 18h35, 21h35, 23h55 (3D) Sábado Sábado 2ª 3ª 4ª 13h (V.Port./3D), 15h50, 18h30, vendo e este não desmente, bem tudo, a loucura daquelas 21h10, 23h50 (3D) Domingo 10h30, 13h (V.Port./3D), Domingo 11h35, 13h55, 16h15 (V.Port./3D), 18h35, pelo contrário). Que Carroll se personagens todas. É evidente que 21h35, 23h55 (3D); CinemaCity Beloura 15h50, 18h30, 21h10, 23h50 (3D); ZON Lusomundo série ípsilon II Shopping: Sala 2: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 13h50, 16h25, Fórum Montijo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª ofereça assim à “burtonização” isto não é País das Maravilhas 18h50, 21h30, 23h50 (3D) Sábado Domingo 11h30, 13h10, 16h, 18h35, 21h30, 00h10 (3D); talvez seja mais digno de nota: nenhum, é um País dos Horrores, 13h50, 16h25, 18h50, 21h30, 23h50 (3D); CinemaCity Porto: Arrábida 20: Sala 20: 5ª 6ª Sábado Burton apropria-se de “Alice e do vivido (ou criado) no limiar Campo Pequeno Praça de Touros: Sala 4: 5ª 6ª 2ª Domingo 2ª 14h05, 16h30, 19h05, 21h50, 00h30 3ª País das Maravilhas” sem fricção, suportável da desagradabilidade. Sexta-feira, 3ª 4ª 13h50, 16h10, 18h30, 21h30, 24h (3D) Sábado 4ª 16h30, 19h05, 21h50, 00h30; Arrábida 20: Sala Domingo 11h30, 13h50, 16h10, 18h30, 21h30, 24h 12: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 14h30, 17h, 19h35, uma “ocupação” pacífica e Atenção, por exemplo, à paisagem dia 12 de Março, (3D); Medeia Fonte Nova: Sala 1: 5ª 6ª Sábado 22h15, 00h45 3ª 4ª 17h, 19h35, 22h15, consentida, sem precisar de disparar (algo inóspita, por vezes “lunar”, ou Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 17h, 19h30, 22h; Medeia o DVD “O Céu Gira”, 00h45; Cinemax - Penafiel: Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª um tiro. Tudo é orgânico e a lembrar um “pós-apocalipse”) ou King: Sala 1: 5ª Domingo 3ª 4ª 13h20, 15h30, 15h30, 21h50 6ª 15h30, 21h50, 24h Sábado 15h, de Mercedes Alvarez 17h40, 19h50, 22h 6ª Sábado 2ª 13h20, 15h30, 17h30, 21h50, 24h Domingo 15h, 17h30, harmónico, numa sobreposição às cores do céu (cinzento, muito 17h40, 19h50, 22h, 00h10; Medeia 21h50; Medeia Cidade do Porto: Sala 1: 5ª 6ª perfeita que torna inútil (ou pouco “bleak” – como a meteorologia Monumental: Sala 4 - Cine Teatro: 5ª 6ª Sábado Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 17h, 19h30, profícuo) o exercício de dissecação. inglesa?...). E ao modo como este Todas as sextas, Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 17h, 19h30, 22h, 00h30 22h; Nun`Álvares: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo (3D); Medeia Saldanha Residence: Sala 5: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 14h, 16h, 21h (3D); ZON Lusomundo Dolce Distinguir “isto é Burton” e “aquilo é tratamento “atmosférico”, em fundo por €1,95. Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, 16h30, 19h, 21h30 Vita Porto: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h, Carroll”: que importa, se a coisa se do tratamento das personagens, 20anos (3D); UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 9: 5ª 6ª 19h, 21h40, 00h15 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h30, faz una? Diríamos que Burton pega salienta o óbvio: como sempre em Sábado 2ª 3ª 4ª 14h20, 16h50, 19h20, 21h50, 16h, 19h, 21h40, 00h15 (V.Port./3D); ZON

52 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon Jorge Luís M. Mário Vasco As estrelas do público Mourinha Oliveira J. Torres Câmara Alice no País das Maravilhas mmnnn mmmmn nnnnn nnnnn Um Homem Sério nnnnn nnnnn mnnnn mnnnn de Pina Bausch, é “Blush” foi exibido em Um Homem Singular mmmmm nnnnn mmmnn mmmnn autor de uma obra Cannes 2005 e para cinematográfi ca este ano Vandekeybus Consultórios de Deus nnnnn mmnnn nnnnn nnnnn particular. “The Last prepara um novo O Mensageiro mmmnn mmmnn nnnnn mmmmn Words” foi premiado fi lme, para o qual está O Meu Amigo Eric nnnnn nnnnn mmnnn mMnnn no AVANCA’99 e a proceder ao casting o fi lme seguinte, fi nal, convidando Norte nnnnn mmnnn mmnnn nnnnn “Inasmuch”, famílias inteiras Uma Outra Educação nnnnn mmnnn mmnnn mnnnn esteve na selecção para participar neste Precious mmmnn nnnnn nnnnn mnnnn ofi cial do festival. trabalho. Shutter Island mmmmn nnnnn mmmnn mnnnn

Burton o “pesadelo” mal se Jumbo: Sala 2: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 15h20, 18h20, Sábado 12h50, 15h30, 18h30, 21h20, 24h Domingo distingue do “sonho”, e por muito 21h10 6ª Sábado 15h20, 18h20, 21h10, 24h; Castello 12h50, 15h30, 18h30, 21h20; ZON Lusomundo Fórum Lopes - Fórum Barreiro: Sala 2: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h30, Aveiro: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, 17h05, 21h10 6ª que a promoção de “Alice” pareça 18h20, 21h10 6ª 15h30, 18h20, 21h10, 24h Sábado Sábado 14h, 17h05, 21h10, 00h15; dirigir o filme a um público infantil, 12h40, 15h30, 18h20, 21h10, 24h Domingo 12h40, a quem Burton de facto se dirige é 15h30, 18h20, 21h10; Castello Lopes - Rio Sul Para ver com olhos de ver o último Shopping: Sala 2: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 15h50, 18h40, aos adultos. O outro lado do espelho 21h40, 00h30 Sábado Domingo 13h, 15h50, 18h40, filme de Martin Scorsese, “Shutter é um inferno, grotesco e distorcido. 21h40, 00h30; UCI Freeport: Sala 2: 5ª 2ª 3ª 4ª Island”, torna-se indispensável E as 3D? Digamos brevemente 16h05, 18h45, 21h35 6ª 16h05, 18h45, 21h35, 00h25 tentar escapar a duas tentações Sábado 13h25, 16h05, 18h45, 21h35, 00h25 Domingo duas ou três coisas: que são usadas 13h25, 16h05, 18h45, 21h35; ZON Lusomundo Almada maiores: andar a “pescar” citações de maneira muito menos ostensiva Fórum: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, cinéfilas de “Laura” de Preminger, do que em “Avatar” (muito menos 17h, 21h, 24h; ZON Lusomundo Fórum Montijo: 5ª “O Arrependido” de Tourneur ou 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h40, 15h35, 18h30, cansativa, também), e que se nota 21h25, 00h20; “Shock Corridor” de Fuller (o uma relação mais coerente entre o catálogo completo resultaria Porto: Arrábida 20: Sala 16: 5ª 6ª Sábado Domingo seu uso e a própria composição 2ª 3ª 4ª 15h10, 18h20, 21h30, 00h40; Cinemax - impossível e fastidioso), que estão lá, espacial. E ainda que, trabalhando Penafiel: Sala 3: 5ª 2ª 3ª 4ª 21h40 6ª 21h40, 00h15 mas inteiramente digeridas no mais sobre pintura (ou “como Sábado 21h35, 00h15 Domingo 21h35; Medeia Cidade conjunto; rejeitar atitudes do Porto: Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª pintura”) do que Cameron, Burton 14h45, 18h15, 21h30; ZON Lusomundo Dolce Vita nostálgicas mais graves, do tipo “ai o se diverte, nalguns momentos, a Porto: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, 17h05, cinema dos anos 70 é que era…”. anular o relevo, a transformar os “The Messenger”: Woody Harrelson e Ben Foster são portentosos, 21h20, 00h25 ; ZON Lusomundo Ferrara Plaza: 5ª Dito isto, não se pense que se trata comoventes, nestes dois inadaptados: derrubados e sempre de pé. Domingo 2ª 3ª 4ª 15h40, 18h35, 21h30 6ª Sábado corpos dos actores em silhuetas 15h40, 18h35, 21h30, 00h25; ZON Lusomundo de uma das obras fundamentais do planas, a fazer “2D” dentro do “3D”. uma “love story” entre dois homens Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 16h, 18h45, 21h40, GaiaShopping: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 17h, cineasta. Até porque se perde No mínimo, é divertido e inteligente. – uma história de amor entre dois 00h25; CinemaCity Alegro Alfragide: Sala 5: 5ª 6ª 21h20 6ª Sábado 13h30, 17h, 21h20, 00h30; ZON nalguns equívocos retóricos. No Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45, 16h35, 21h30, Lusomundo MaiaShopping: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª O frabjous day!. heterossexuais que se aproximam e 00h20; CinemaCity Alegro Alfragide: Sala 3: 5ª 6ª 13h40, 16h45, 21h10 6ª Sábado 13h40, 16h45, 21h10, entanto, o que se ressalta deste se descobrem para além do Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 16h, 21h15, 00h25; ZON Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª exercício de estilo (não protocolo, das poses, das máscaras e 00h05; CinemaCity Beloura Shopping: Sala 4: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, 17h30, 21h20, obrigatoriamente um defeito) passa Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45, 16h35, 21h25, 00h20; ZON Lusomundo NorteShopping: 5ª 6ª Continuam dos espartilhos emocionais com que 00h15; CinemaCity Campo Pequeno Praça de Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, 17h15, 21h20, por uma rarefacção irrespirável, por se defendem e se martirizam. Touros: Sala 2: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 15h, 17h50, 21h20, 00h40; ZON Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª uma claustrofobia que interroga o Woody Harrelson e Ben Foster são 00h15 Sábado Domingo 12h, 15h, 17h50, 21h20, Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 16h20, 21h35, cinema de Scorsese, rimando com O Mensageiro 00h15; Medeia Fonte Nova: Sala 2: 5ª 6ª Sábado 00h40; Castello Lopes - 8ª Avenida: Sala 3: 5ª 2ª 3ª The Messenger portentosos, comoventes, nestes Domingo 2ª 3ª 4ª 16h20, 19h, 21h45; Medeia 4ª 15h30, 18h30, 21h20 6ª 15h30, 18h30, 21h20, 24h os seus filmes maiores. M.J.T. De Oren Moverman, dois inadaptados: derrubados e Monumental: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª sempre em pé. Vasco Câmara 4ª 13h15, 16h, 18h45, 21h30, 00h15; UCI Cinemas - El com Ben Foster, Jena Malone, Corte Inglés: Sala 13: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 15h, Eamonn Walker, Woody Harrelson. 18h, 21h30, 00h20 Domingo 11h30, 15h, 18h, 21h30, M/12 Shutter Island 00h20; ZON Lusomundo Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45, 16h50, 21h20, 00h25; ZON MUSEU DO ORIENTE De Martin Scorsese, Lusomundo Amoreiras: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª MMMMn com Leonardo DiCaprio, Mark 3ª 4ª 13h50, 17h, 20h50, 23h50 ; ZON Lusomundo Ruffalo, Ben Kingsley, Emily Colombo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h30, Lisboa: CinemaCity Campo Pequeno Praça de 15h30, 18h30, 21h30, 00h30; ZON Lusomundo Dolce Touros: Sala 5: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª Mortimer. M/16 Vita Miraflores: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h55, 16h30, 19h, 21h45, 00h05; ZON Lusomundo 15h, 18h30, 22h; ZON Lusomundo Odivelas Parque: Alvaláxia: 5ª 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h20, 19h, 21h40 6ª MMMnnMMMnn 5ª Domingog 2ª 3ª 4ª 15h10, 18h10, 21h10 6ª Sábado Sábado Domingo 13h40, 16h20, 19h, 21h40,, 00h15; 15h10,15h10, 18h1018h10,, 21h1021h10,, 000h20;0 ZON Lusomundo Oeiras Parque: 5ª 6ª SábadoSábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h30, Porto: Arrábida 20: Sala 17: 5ª 6ª Sábado Lisboa:Lisboa: CasteCastellollo Lopes - 15h30,15h30, 1818h30,h30, 2121h30,h30, 000h30; ZON Lusomundo Torres Domingo 2ª 14h15, 16h50, 22h, 00h35 3ª 4ªª 16h50, CascaisCascais Villa: Sala 4: 5ª Vedras:Vedras: 5ª 6ª SábadoSábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 22h, 00h35; ZON Lusomundo GaiaShopping:g: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h30,15h30, 18h2018h20,, 17h45,17h45, 21h20,21h20, 00h30;00h30; ZONZ Lusomundo Vasco da Domingo 2ª 3ª 4ª 22h05 6ª Sábado 22h05,5, 21h2021h20 6ª 1515h30,h30, 1818h20,h20, Gama:Gama: 5ª 6ª SábadoSábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h45, 00h40; ZON Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª 21h20, 00h10 15h40,15h4015h40, 18h35, 18h3518h35, 21h30, 21h3021h30, 00h25; 000h25; Castello LopLopeses - C.C. C.C. Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 18h20, 223h50;3h50; Sábado 12h40,12h40, 1515h30,h30, 1818h20,h20, Não há outro filme assim, nestee 21h20, 00h10 momento, nas salas portuguesas,as, Domingo 12h40, com esta determinação de ir comom as 1515h30,h30, 1818h20,h20, 21h20; Castello LopeLopess personagens, de habitar a sua - Loures Shopping: SalaSala 1:1: gravidade. É a estreia na realizaçãoação 5ª 6ª SábadoSábado de Oren Moverman. O cineasta,a, em entrevistas, refere a influência de um filme como “The Last Detail”il” (1973), de Al Ashby, que era algogo próximo de um “road movie” existencial – é como podemos sintetizar “O Mensageiro”, quee até está mais próximo da deambulação urbana do filme de Ashby, e dessa coragem adulta do cinema americano dos anos 70, do que de “No GK7HJ;JE:;E8Ex;9EH:7I Vale de Ellah” (2007), de Paul Haggis, um dos filmes saídos IEB?IJ7I:7C;JHEFEB?J7D7 da guerra do Iraque com que '(CWh‚eš('$)&šÐ'&"&&Q+&Z[iYedjeW[ijkZWdj[i[4,+WdeiS a estreia de Moverman pode ser comparada por a guerra 8HOEDOC?::B;JEDE8Ex  também ser filmada em casa, nnaa 7:H?7D;J;IÀL;D:70CKI;K:EEH?;DJ;"EI7E[_hWiFWhgk[[9$9$ZeFehje [fedjeiC;=7H;:;$ Mensageiro” dois soldados têmm a tarefa de comunicar aos familiaresares e c[Y[dWifh_dY_fWb c[Y[dWiZei[if[Yj|Ykbei amantes de soldados em missãoão nnoo Iraque a morte dos seus entes queridos. Para além da guerra,, e 7l$8hWi‡b_W":eYWZ[7bY~djWhWDehj[ r')+&#)+(B_iXeWrJ[b$0(')+.+(&&r;#cW_b0_d\e6\eh_[dj[$fjrmmm$cki[kZeeh_[dj[$fj como no cinema clássico americano,ricano, “Shutter Island”: uma rarefacção irrespirável, por uma claustrofobia o que se filma em “O Mensageiro”ro” é que interroga o cinema de Scorsese

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 53 aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

Eastwood quqquee Mandela se persistência e resiliência. sofrimento e solidão com mostra-nos, em quebraqueb quando o Mas não são heróis todos os um poema oitocentista. Espaço “Invictus”, Mandela guarda-costasgua lhe dias, caem, o que comove e É muito reconfortante Público e Pienaar enquanto perguntaper sobre a reconforta. Ganham troféus, saber isto. Vemos também homens e não heróis fafamília. Vemos mas até quando recebem a que Mandela não será um

Cinema artifi ciais. Controlam-m- PPienaar como taça continuam nervosos e político dos nossos dias, se e são senhores de ssi,i, um homem surpresos com tudo aquilo. aprumado, bem vestido, mas também enfrentamam medroso, Eastwood fi lma a nossa de Moleskine na mão, de o medo e a solidão. Sãoão periclitante. fragilidade como ninguém. teleponto e com assessores líderes carismáticos, São dois Mas não se esquece da(s) de comunicação. É uma mas também homens que só nossa(s) força(s). O fi lme pena. fraquejam. É aatingem actos diz-nos que Mandela Nelson Bandeira, professor, comovente a cena emm heróicoshe com luta, salvou-se de trinta anos de 26 anos

“Consultórios de Deus”: cinema de inspiração sociológica os médicos e funcionários do centro. “Norte”: não é pretensioso, não comove, não irrita, mas também, Muito digno, e muito sério até na por vezes, soa a dispensável maneira como faz da palavra o seu veículo essencial. Apenas demasiado conformado com o seu dispositivo – que acaba por se tornar “indiferente”.LMO

Norte Nord De Rune Denstad Langlo, com Anders Baasmo Christiansen, Kyrre Hellum, Marte Aunemo. M/12 MMnnn

Lisboa: CinemaCity Classic Alvalade: Sala 2: 5ª 2ª 3ª 4ª 13h45, 15h40, 17h30, 19h20, 21h45 6ª 13h45, 15h40, 17h30, 19h20, 21h45, 23h40 Sábado 11h40, Consultórios de Deus Algo que parece fora de moda: um 13h45, 15h40, 17h30, 19h20, 21h45, 23h40 Domingo 11h40, 13h45, 15h40, 17h30, 19h20, 21h45; Les Bureaux de Dieu cinema de inspiração sociológica De Claire Simon, directa e sem camuflagem, de luto de um professor inglês, Sábado 2ª 3ª 4ª 14h10, 16h40, 19h10, 21h45, 00h15 construído num dispositivo de “falso É um facto que “Norte” traz à “recém-viúvo” do amante, com um Domingo 11h30, 14h10, 16h40, 19h10, 21h45, com Anne Alvaro, Nathalie Baye, 00h15; ZON Lusomundo Amoreiras: 5ª Sábado 2ª Michel Boujenah. M/16 documentário” minimal mas eficaz. memória “Uma História Simples”, certo cuidado, mas também com 3ª 4ª 13h30, 19h, 00h10 6ª Domingo 13h30, 00h10 “Os Consultórios de Deus” pega num um dos filmes mais atípicos de David alguma pretensão estilística, cedendo ; ZON Lusomundo Vasco da Gama: 5ª 6ª Sábado centro de planeamento familiar e, Lynch, cruzado com uma estética de à tentação de fazer artístico. No Domingo 2ª 3ª 4ª 12h55, 18h05, 23h45; ZON MMnnn Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª Sábado com base em registos verídicos, cartilha do cinema independente entanto, progressivamente, vamo- Domingo 2ª 3ª 4ª 12h55, 18h45, 00h05; Lisboa: Medeia King: Sala 2: 5ª Domingo 3ª 4ª reconstitui as conversas entre as norte-americano, mas feito por um nos apercebendo de que o realizador Porto: Arrábida 20: Sala 5: 5ª 6ª Sábado Domingo 13h40, 16h05, 18h45 6ª Sábado 2ª 13h40, 16h05, mulheres (sobretudo adolescentes) norueguês, com todas as angústias entendeu a essência do romance e 2ª 14h05, 16h30, 18h55, 21h25 3ª 4ª 16h30, 18h55, 18h45, 00h20; que recorrem ao aconselhamento e nórdicas condensadas numa história aceitou as coordenadas 21h25; ZON Lusomundo Dolce Vita Porto: 5ª 6ª limpinha e sem grandes atractivos melodramáticas que lhe subjazem: Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 18h, 21h, 23h45; de um ex-esquiador alcoólico em uma história de solidão extrema, É um filme simpático, realizado com viagem. Que dizer do filme? Que quase onírica de tão rarefeita e simplicidade e elegância pela regista com alguma tensão a reduzida a sinais mínimos; a dinamarquesa Lone Schertig, sobre a paisagem gelada? Que revê em preparação de um desesperado educação sentimental de uma jovem queda o “road movie” com laivos de adeus a uma vida de conforto adolescente dos subúrbios “western” descontextualizado? Há ilusório. Não se tratará de uma obra- londrinos, deslumbrada por um um congelamento da acção que o prima, mas possui uma incrível força “playboy” mais velho. Dito isto, e se torna um exercício simpático e bem que deixa um sabor amargo na boca exceptuarmos uma curiosa crítica de intencionado. Não é pretensioso, e um violento soco no estômago, costumes e alguns estereótipos da não pretende inventar nada, não para o que contribuem, vida na alta roda de restaurantes e comove, não irrita, mas também, decisivamente, os desempenhos clubes glamorosos e de uma Paris por vezes, soa a dispensável, sem notáveis de Colin Firth (nunca o turística, “Uma Outra Educação” que tal signifique rejeição. M.J.T. tínhamos visto tão bem) e de Julianne repousa inteirinho na espantosa Moore. Filme de argumento e de interpretação da britânica Carey Um Homem Singular actores, vale bem a pena vê-lo. M.J.T. Mulligan (séria candidata ao Óscar), A Single Man que muitos comparam à de Audrey De Tom Ford, Uma Outra Educação Hepburn, em “Férias em Roma”, com Colin Firth, Julianne Moore, An Education plena de frescura e de inteligência Nicholas Hoult, Matthew Goode. M/16 De Lone Scherfig, instintiva. M.J.T. com Carey Mulligan, Olivia Williams, MMMnn Alfred Molina. M/12 Precious De Lee Daniels, Lisboa: Castello Lopes - Cascais Villa: Sala 3: 5ª MMnnn Domingo 2ª 3ª 4ª 18h30, 21h50 6ª Sábado 18h30, com Gabourey Sidibe, Mo’Nique, 21h50, 24h; Medeia Saldanha Residence: Sala 8: 5ª Paula Patton, Mariah Carey. M/12 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 15h35, 17h40, Lisboa: CinemaCity Campo Pequeno Praça de 19h45, 21h50, 00h15; UCI Cinemas - El Corte Touros: Sala 7: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª MMnnn Inglés: Sala 14: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h15, 16h45, 13h45, 15h45; Medeia Monumental: Sala 3: 5ª 6ª 19h15, 21h50, 00h10 Domingo 11h30, 14h15, 16h45, Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h10, 16h40, 19h15, 21h50, 00h10; ZON Lusomundo Amoreiras: 5ª 21h40; UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 8: 5ª 6ª Lisboa: CinemaCity Alegro Alfragide: Sala 7: 5ª 6ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h10, 17h50, 20h50, 23h10; ZON Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h05, 15h30, 17h55, 21h05, 23h30; Porto: Arrábida 20: Sala 18: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 14h10, 16h35, 19h, 21h25, 24h 3ª 4ª 16h35, 19h, 21h25, 24h; Medeia Cidade do Porto: Sala 4: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, 16h30, 19h, 21h30;

A obra romanesca de Christopher Isherwood revela quase sempre uma forte componente autobiográfica e não teve até hoje a consagração que merecia, apesar da voga que conheceu aquando da adaptação de “Adeus a Berlim” para o sucesso retumbante de “Cabaret”. “Um Homem Singular”, romance tardio, amargo e melancólico, passa agora a filme pela mão do estreante Tom “Um Homem Singular”: fi lme de argumento e de actores, Ford, que pega no doloroso processo vale bem a pena vê-lo

54 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon O novo fi lme de James Mas parece já não ser norte-americanos e de Cameron pode estar em possível. Tudo porque os sobreviventes. Charles (Não?) risco, escreveve o jjornalornal edieditores do livro Pellegrino, o autor, rodagem espanhol “ElEl País”. DeDepoispois nnão conseguem admitiu que os seus O actor Matt Damon ano e estamos muito de “Avatar”,, Cameron ggarantir a entrevistados fi zeram quer interpretar animados”, diz Damon queria realizarzar um vveracidade de declarações falsas – um Robert F. Kennedy no à Reuters. O título fi lme sobre ooss aalguns factos. deles afi rmava ter estado Projecto próximo fi lme de Gary ainda não é conhecido, sobreviventestes O livro, “The no avião que lançou a Ross. “Ainda não vi o mas o guião, escrito da bomba LLasta Train from bomba e na verdade não guião, mas tenho por Steven Knight, atómica de HiHiroshima: esteve. E admitiu que as conversado será baseado na Nagasáqui, TTheh survivors personagens centrais sobre isso com biografi a “Robert em 1945. Já llooko back”, nem sequer existiram. o [realizador] Kennedy: His tinha título: aapresenta Pellegrino pediu desculpa Gary Ross desde Life”, de Evan “Nagasaki ddepoimentose e os editores vão retirar o há mais de um Thomas. Deadline”. ddee aaviadores livro do mercado.

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h35, 21h40, 23h50; CinemaCity Campo Pequeno Praça de Touros: Sala 7: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª Cinemateca Portuguesa R. Barata Salgueiro, 39 Lisboa. Tel. 213596200 19h55; Medeia Monumental: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 19h, 24h; UCI Cinemas - El Corte Pier Paolo Capponi. 93 min. Stevens, Olivia de Havilland. 108 min. Les Enfants Inglés: Sala 7: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h10, Sexta, 05 19h - Sala Félix Ribeiro 15h30 - Sala Félix Ribeiro De Marguerite Duras. Com Tatiana 16h30, 21h55 Domingo 11h30, 14h10, 16h30, Moukhine, Martine Chevalier, Pierre 21h55; ZON Lusomundo Amoreiras: 5ª 6ª Sábado A Lenda de Uma Estrela L’ Homme Atlantique + Dialogo di O Pecado de Cluny Brown Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 18h10, 23h30 ; ZON Arditi., Daniel Gélin, André The Legend of Lylah Clare Roma Lusomundo Colombo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª Cluny Brown Dussollier, Alexander Bougosslavsky. 3ª 4ª 13h30, 15h50, 18h15, 21h45, 00h05; ZON De Robert Aldrich. Com Ernest L’ Homme Atlantique 94 min. Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª Sábado Borgnine, Kim Novak, Peter Finch. De Marguerite Duras. Com Yann De Ernst Lubitsch. Com C. Aubrey Smith, Charles Boyer, Helen Walker, 19h - Sala Félix Ribeiro Domingo 2ª 3ª 4ª 13h35, 16h05, 18h55, 21h45, 15h30 - Sala Félix Ribeiro Andréa, Marguerite Duras. 41 min. 00h10; Jennifer Jones, Peter Lawford, 19h30 - Sala Luís de Pina Seduto Alla Sua Destra + Il O Retrato de Jennie Porto: Arrábida 20: Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo Reginald Gardiner. 100 min. Mercato Della Facce 2ª 13h50, 16h15, 18h45, 21h30, 00h20 3ª 4ª 16h15, Portrait of Jennie Quem Espera Por Sapatos de 19h - Sala Félix Ribeiro Seduto Alla Sua Destra 18h45, 21h30, 00h20; ZON Lusomundo Dolce Vita De William Dieterle. Com Ethel Defunto Morre Descalço De Valerio Zurlini. Com Woody Porto: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h25, Barrymore, Jennifer Jones, Joseph De João César Monteiro. Com Carlos Le Soldatesse 16h50, 19h15, 21h50, 00h10 ; ZON Lusomundo Cotten. 83 min. M12. Ferreira, Luis Miguel Cintra, Paula De Valerio Zurlini. Com Lea Massari, Fórum Aveiro: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 16h30, Valeria Moriconi, Tomas Milian. 120 19h - Sala Félix Ribeiro Ferreira. 34 min. M16. 19h10, 21h50 6ª Sábado 13h50, 16h30, 19h10, 21h50, min. 00h35; 22h - Sala Luís de Pina Agatha et les Lectures 19h30 - Sala Luís de Pina Ilimitées Sophia de Mello Breyner “Precious” funciona como um De Marguerite Duras. Com Bulle Andresen O Lado Selvagem daqueles filmes que aspira a jogar no Ogier, Yann Andréa. 90 min. De João César Monteiro. 19 min. Into The Wild tabuleiro das surpresas “outsider” 19h30 - Sala Luís de Pina 22h - Sala Luís de Pina De Sean Penn. Com Emile Hirsch, para os Óscares, politicamente Marcia Gay Harden, William Hurt. 140 impecável e correctíssimo, embora L’ Homme Atlantique + Dialogo Terça, 09 min. M12. di Roma 21h30 - Sala Félix Ribeiro sem voos que o recomendem: tudo se L’ Homme Atlantique esgota no argumento de interesse O Fosso das Víboras Recordações da Casa Amarela De Marguerite Duras. Com Yann The Snake Pit social (a obesidade e as crueldades Andréa, Marguerite Duras. 41 min. De João César Monteiro. Com João De Anatole Litvak. Com Glenn César Monteiro, Manuela de Freitas, que gera), nos meandros do 21h30 - Sala Félix Ribeiro Langan,g, Leo Genn,, tratamento de comportamentos Ruy Furtado.Furtado. 122 minmin.. Pugilatori MarkMark 22h22h - Sala LuísLuís de PinPinaa abusivos. E daí? Bastará o facto de ser De Valerio Zurlini. 10 min. M12. diferente do “mainstream”, de revelar 22h - Sala Luís de Pina Quarta,Quarta, 1010 preocupações realistas na representação da dor, de contornar Sábado, 06 OsOs OlhosOlhos da TestemunhaTestemunha estereótipos para o impor como filme? EyEyewitnessewitness Strode, Franco Citti, Jean Servais, Pier Paolo Capponi. 93 min. Temos dúvidas e, no entanto, não O Golpe de Misericórdia DeD Peter Yates. Com WiWilliamlliam Hurt, 19h30 - Sala Luís de Pina podemos deixar de ser sensíveis a um Der Fangschuß SigourneySigS ourney Weaver, CChristopherhristopher pungente olhar sobre o desespero de De Völker Schlöndorff. Com Plummer,Plummer, Morgan Freeman. 103 La Femme du Boulanger Margarethe von Trotta, Matthias min.min. viver nas margens. M.J.T. De Marcel Pagnol. Com Raimu, Habich, Rüdiger Kirschstein. 95 min. 15h3015h30 - SalaSala FFélixélix RiRibeirobeiro Ginette Leclerc, Fernand Charpin. 133 15h30 - Sala Félix Ribeiro min. A Grande Cidade 21h30 - Sala Félix Ribeiro Mahanagar A Comédia de Deus De Satyajit Ray. Com Anil Chatterjee, De João César Monteiro. Com Cláudia Madhabi Mukherjee, Jaya Bhaduri. Oliveira, Glicínia Quartin, João César 130 min. Monteiro. 160 min. 19h - Sala Félix Ribeiro 22h - Sala Luís de Pina A Viagem da Velha Krause Rumo à FelicidadeMutter Krausens Quinta, 11 Fahrt ins Gluck A Sombra do Caçador De Phil Jutzi. Com Alexandra The Night Of The Hunter Schmitt, Holmes Zimmermann, Ise De Charles Laughton. Com Billy Tratschold. 110 min. Chapin, Lillian Gish, Robert Mitchum, 19h30 - Sala Luís de Pina Shelley Winters. 90 min. M12. O Charme Discreto da Burguesia 15h30 - Sala Félix Ribeiro Le Charme Discret de La Marcados para a Morte Bourgeoisie Underworld U.S.A. De Luis Buñuel. Com Delphine De Samuel Fuller. Com Cliff Seyrig, Fernando Rey, Paul Robertson, Dolores Dorn, Beatrice Frankeur. 102 min. Kay. 99 min. “Precious” 21h30 - Sala Félix Ribeiro 19h - Sala Félix Ribeiro A Rua 42 Fado, História de Uma Cantadeira 42nd Street De Perdigão Queiroga. Com Amália De Busby Berkeley, Lloyd Bacon. Rodrigues, António Silva, Vasco Com Bebe Daniels, George Brent, Santana., Virgílio Teixeira. 106 min. Ruby Keeler, Warner Baxter. 89 min. 19h30 - Sala Luís de Pina 22h - Sala Luís de Pina Duelo ao Sol Segunda, 08 Duel In The Sun De King Vidor. Com Gregory Peck, A Carga da Brigada Ligeira Jennifer Jones, Joseph Cotten, Lillian The Charge of the Light Brigade Gish, Lionel Barrymore. 145 min. De Michael Curtiz. Com Errol Flynn, 21h30 - Sala Félix Ribeiro Henry Stephenson, Olivia de Havilland, Patric Knowles. 115 min. Branca de Neve 15h30 - Sala Félix Ribeiro De João César Monteiro. Com Ana Brandão, Diogo Dória, Luis Miguel Seduto Alla Sua Destra + Il Cintra. 75 min. M12. Mercato Della Facce 03, 22h - Sala Luís de Pina Seduto Alla Sua Destra De Valerio Zurlini. Com Woody Strode, Franco Citti, Jean Servais, Cesar Monteiro homenageado

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 55 Edição NumaNuma altura lido por Mafalda Castor e ilustrações de em queq Tim Lopes da Costa. É Zdenko Basic, editado BurtonBur revisita acompanhado por pela Arte Plural e Círculo o mundom fantástico um guia de A a Z e tem de Leitores. “Abre-me dede Alice chegam as ilustrações originais e descobre estranhas àsàs livrarias criadas por John Tenniel e estranhosíssimas portuguesaspo para a primeira edição surpresas” lê-se, e é um váriasv edições do de 1865. Outra maravilha daqueles livros em que clássicoc de Lewis (para os mais pequenos) ganham vida (quase a Carroll.C A 101 é o álbum “Alice no País 3 D). A Relógio D’Água Noites lançou das Maravilhas” numa e a Presença também um audiolivro, adaptação de Harriet reeditam o clássico.

Ficçãocção do sul-africano enquadrada num género híbrido, falta de identidade que nem Nelson J.M.Coetzee numa espécie de ensaio sobre a Mandela conseguiu resolver. conhece bem as autobiografia, visto que é impossível Coetzee tem a desfaçatez de fazer No lugar suas preocupações, escamotear o facto de Coetzee ser, troça de si próprio, ao descrever-se obsessivamente também, um extraordinário ensaísta através do olhar necessariamente recriadas de livro e conhecedor profundo da incompleto e “corrompido” dos do morto em livro: a defesa Literatura universal: Kafka está outros, jogando com a relação dos animais e do sempre presente, principalmente promíscua entre o autor e as suas Coetzee passa à condição de vegetarianismo, a quando se trata da utilização de personagens e confundindo para dificuldade das relações entre uma bizarra ironia, bem como os sempre a impossível realidade. O personagem da sua própria homens e mulheres e o conflito grandes romancistas russos, como título, “Verão”, parece querer ficção e imaginando-se como severo e trágico com implicações Tolstói, a quem foi buscar os títulos reflectir o tempo pujante da entrada objecto da atenção de quem linguísticas, rácicas, geracionais e “Infância” e “Juventude” e a na vida adulta mas o conteúdo nada com ele privou mais de territoriais, que mantém em relação inspiração para livros como “Diário tem de solar ou de lúdico. Para John à sua pátria de origem, a África do de Um Mau Ano” com ecos de “A Coetzee, a maturidade representa a perto. Helena Vasconcelos Sul. Em “Verão”, o último de uma Morte de Ivan Ilych”, e Dostoievski, aguda percepção da situação trilogia “autobiográfica”, Coetzee, autor que é, também, o tema central política, o fardo que é viver com o Verão misterioso e cioso da sua de “O Mestre de S. Petesburgo”. pai viúvo, a luta para escrever e a J.M. Coetzee privacidade, coloca-se no papel de Nesta trilogia, tão pouco passa incapacidade para o amor. John (Trad. J. Teixeira de Aguilar) morto, passando definitivamente à despercebida a referência a Flaubert Coetzee é uma figura trágica, um

Livros Ed. Dom Quixote, condição de personagem da sua – o subtítulo é “Cenas da Vida de idealista que persegue utopias mas ppprópria ficção ç e imaginando-se g Província” – com quem Coetzee que se encontra, simultaneamente, mmmmm como objectoobjecto dada atenatençãoção ddee quem partilha a misantropia e uma paralisado pela razão, que lhe com ele pprivourivou mais de perto.perto. Seria espécie de opacidade sentimental e fornece a fria constatação de que QuemQuem está familiarizado com a obra um exercício de ppurouro narcisismo afectiva que, no caso do escritor nada é possível. Num livro que é não fossefosse ddar-sear-se o ccasoaso de CCoetzeeoetzee francês lhe valeu ser objecto do essencialmente sobre o poder da ser um autor muito hábil qqueue longo estudo (inacabado) de Sartre escrita, fiquemo-nos com uma frase consegueconsegue a maior façanhafaçanha de um intitulado “O Idiota da Família”. lapidar: “toda a autobiografia é escritor,ese critor, o dede iludiriludir (Esta referência vem a propósito outra-biografia ou a biografia de completamentecompletamente o leitor,leitor, porque é assim que Coetzee se outrem. As definições de género levando-olevando-o a sesegui-logui-lo neste retrata através do olhar dos outros, como habitualmente são feitas por magistral embuste. principalmente das mulheres). leitores comuns são totalmente Os factosfactos descritosdescritos – Assim, Vincent, na primárias.” John Maxwell Coetzee emboraembora sursurjamjam como impossibilidade de recolher em dixit. entrevistasentrevistas e nnotasotas de um primeira mão dados pessoais de um tal Vincent queque preparaprepara autor tão esquivo que só deixou umauma biografiabiografia do famosofamoso para a posteridade, não um diário, O canto JohnJohn Coetzee, referênciareferência não uma correspondência dada Literatura munmundial,dial, reveladora, mas apenas fragmentos vencedorvencedor dede um NobelNobel e e notas – o livro começa com do cisne dede doisdois prémios BookerBooker – extractos de “cadernos de parecemparecem verídicos e apontamentos” datados de 1972-75 e Romance pungente e correspondemcorrespondem aos dados acaba com outros tantos, “sem queque aparecemaparecem nas data” – regista os depoimentos de elegante sobre a sufocante biografiasbiografias “o“oficiais”ficiais” do cinco pessoas que o conheceram: o nostalgia da beleza e da controversocontroverso autor. EmboraEmbora da psicoterapeuta Júlia que em juventude perdida. José ele já tenha feitofeito uso de alter- jovem manteve com ele uma egegosos – “Elizabeth“Elizabeth Costello”Costello” no relação, o da prima Margot cuja Riço Direitinho llivroivro dodo mesmo nome, o simpatia lhe inflamou a imaginação Bom Dia, Meia-Noite professor de “Desgraça”,“Desgraça”, o em criança, o da dançarina Jean Rhys ““senhorsenhor C.” de “Diário“Diário de um brasileira Adriana, objecto do seu (trad. por Manuela Madureira) MMauau Ano” – “ Verão”Verão”,, tal como os interesse erótico (ou, pelo menos, Bertrand aanterioresnteriores “Infância” (“Boyhood” ela assim pensa), os dos colegas - 1997) e “Juventude”“Juventude” (Youth - académicos Martin J e Sophie. Os mmmmn Seria um exercício de 2002), é claramente autobiográfico.autobiográfico. seus testemunhos contrariam a puro narcisismo não No entantoentanto,, como Coetzee (o(o autor)autor) admiração quase generalizada em Jean Rhys (1890- fosse Coetzee um autor não é de fiar,fiar, principalmente relação a tão grande figura das 1979), pseudónimo muito hábil que consegue quqquandoando faz de demiurgo,demiurgo, Letras e do pensamento, de Ella Rees levar o leitor a segui-lo quqqualqueralquer ddestasestas fornecendo uma visão intrigante e Williams, filha de neste magistral embuste obras poderápoderá tão retorcida como uma pintura de um médico galês e seserr Francis Bacon. Se o olhar de Martin de mãe crioula J. (cujas iniciais são as de Coetzee, descendente de ao contrário) é pouco revelador mas escoceses, nasceu “objectivo”, o das mulheres traem na ilha Dominica. sentimentos complexos que Passou a infância nas Caraíbas e reflectem desconforto, estudou em Londres. Foi manequim incompreensão e até irritação em e corista. O primeiro dos seus três relação a esse homem hesitante, infelizes e atormentados casamentos fechado e até medíocre, nada foi com um poeta holandês, com o dotado como amante, como filho, qual viveu durante dez anos uma como amigo, como professor, em existência itinerante em várias permanente conflito moral, cidades europeias, mas sobretudo afectivo, familiar e político, lutando em Paris. Foi durante esses anos de (em vão) para se reconciliar com a boémia (os seus problemas com o sua situação de branco africânder álcool começaram nessa altura) que num país que ele considera se relacionou com os meios marcado indelevelmente pelo modernistas da década de 20, colonialismo, o “apartheid” e uma incluindo Ford Madox Ford, seu aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

Jean Rhys: uma espécie de “canto do cisne” com evocações do amor perdido, da beleza que se esvai, da incompreensão dos homens, do abandono dos amantes

Episódios passado está à espera dela nos cafés, abandono dos amantes, da astracã: “Deverei mandá-lo para o biográficos da bares, restaurantes, hotéis, lojas de submissão e do desencanto perante diabo? Mas afinal, penso eu, talvez vida de Jean moda (em tempos ela fora modelo a vida. esta seja a minha oportunidade de Rhys emergem na “Maison Chose na Place Mas ao mesmo tempo ela parece retribuir. Fala-se com eles, finge-se também à Vendôme”), e ganha vida quando o preparar uma qualquer vingança simpatizar; então, no momento mistura com a leitor menos espera. Toda a motivada pelo ressentimento para preciso em que eles não estão à ficção: o vestido de narração, que se desenvolve num com todos os homens. À medida que espera, diz-se: Vá pró diabo.” Esta noiva comprado em ambiente claustrofóbico, é uma o romance se aproxima do fim, relação mutuamente torturante, Delft, o casamento em espécie de “canto do cisne” com começa a fazer sentido o que ela mas em que ambos se vão Amesterdão, o filho evocações do amor perdido, da pensou quando conheceu um consolando das dores do passado, morto cinco semanas beleza que se esvai, da ‘gigolo’ que a julgou uma mulher acompanha o leitor até um final depois do nascimento. O incompreensão dos homens, do rica por causa do seu falso casaco de singular e pungente.

“patrocinador” e mais tarde amante, que num prefácio se lhe referiu como “um instinto aterrador e uma paixão tremenda – e quase sinistra! – pela defesa da causa dos abaixo-de- cão”. Entre 1928 e 1939, Jean Rhys escreveu quatro romances, o último foi “Bom Dia, Meia-Noite”. Depois “Não estava à eclipsou-se durante duas décadas. Quando em 1959, a propósito da espera de adaptação radiofónica de um livro seu, a BBC a descobriu, ela vivia tanto riso.” quase na miséria, tinha passado Francisca Cunha Rego | JORNAL DE LETRAS algum tempo na prisão por ter roubado uns vizinhos, e estava dependente do álcool. Mas não tinha “Alia competência deixado de escrever, e um ano depois publicou a sua obra-prima, artística a “Vasto Mar de Sargaços” (Bertrand, divertimento 2009), por muitos considerado um dos grandes romances do século XX. popular e A sua escrita foi sempre profundamente autobiográfica, e inteligente.” deslocada da sua época, tanto nos Rui Pina Coelho | PÚBLICO assuntos tratados como no estilo. Em “Bom Dia, Meia-Noite” (verso de um poema de Emily Dickinson), dá- “Este é um nos conta das deambulações por Paris de uma mulher inglesa de Teatro Vivo.” meia-idade, desiludida, Rui Monteiro | TIME OUT pateticamente infeliz, que há alguns anos inventou para si própria o nome Sasha Jensen (“pensei que “Para grandes males, talvez a minha sorte mudasse se eu mudasse o meu nome”), que vive

© CLEMENTINA CABRAL o remédio do Teatro.” num quarto de hotel com dinheiro Rosário Anselmo | VISÃO emprestado, e que teve “a brilhante ideia de beber até morrer”. Ela foi para Paris (cidade onde vivera há “Espectáculo belo alguns anos) por quinze dias, financiada por uma amiga, numa e pertinente.” tentativa de recuperar da depressão Ana Maria Ribeiro | CORREIO DA MANHÃ em que caiu. “As pessoas falam da vida feliz, mas é a vida feliz quando já não nos importamos se vivemos CANTIGAS DE UMA NOITE DE VERÃO ARTISTAS UNIDOS ou morremos? Só se atinge ao fim de muito tempo e de muito infortúnio. uma peça de amores e desencontros de David Greig e Gordon McIntyre Assim que se atinge esse paraíso de 4ª a sáb às 21h45 e dom às 17h30 na Sala Estúdio M/12 indiferença é-se arrastado para fora dele. Do nosso paraíso temos de regressar ao inferno. Quando QUIXOTE estamos mortos para o mundo, o a partir de Vida do Grande D. Quixote de La Mancha e do Gordo Sancho Pança mundo salva-nos frequentemente, quanto mais não seja para nos de ANTÓNIO JOSÉ DA SILVA | dramaturgia | encenação JOÃO BRITES | composição musical JORGE SALGUEIRO ridicularizar.” uma criação O BANDO | co-produção TEATRO DA TRINDADE/FUNDAÇÃO INATEL e O BANDO O futuro já não existe para Sasha e o presente está fortemente ancorado ESTREIA em ABRIL num passado doloroso e perturbante. A narração linear é HAVIA UM MENINO QUE ERA PESSOA interrompida amiúde por “flash- backs” de lembranças que por vezes Fernando Pessoa para CRIANÇAS M/6 continua aos sábados e domingos às 15h lhe trazem algum conforto momentâneo, para logo depois funcionarem de modo contrário.

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 57 aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

Graça Lobo e Lisboa,LiL sb no Dia Mundial Livros Jorge Silva Meloo dad Poesia: 21 de Março, lerão vários 15h30,15h entrada é livre. Às Leitura poemas de 16h30161 será projectado Mário Cesariny o documentáriod no auditório da “Gravura:““G Esta mútua Fundação Arpadd aprendizagem”a de Jorge Szenes, no Jardimim SilvaS Melo. das Amoreiras, eemm

Poesia educação literária, técnica de honraria lhe resgatou aliás a sombra, Ciberescritas versificação e vocabulário poético. o isolamento que cultivava em Educação literária firmada com a Freshwater, a sua morada na ilha de Eles tomaram Um sombrio frequência no Trinity College de Wight, o seu lirismo suicida, “a Cambridge que abandonaria por vontade dividida”, inquietação dificuldades económicas. Aí espiritual que se vivia desde sempre conta disto cultor conheceu A.H. Hallan, um imenso nele, e numa época que oscilava amigo que morreu precocemente entre Deus e Darwin (de quem era e não fosse a Sara Figueiredo Costa, do blogue da beleza (1833) e cuja perda lhe acentuaria a amigo), e sustentava a dúvida. Caldeirão Voltaire, o que havia de ser de nós? melancolia, o desalento e iria Tennyson: emblema austero do Se não fosse o Pedro Vieira, do blogue Irmão Fora dos círculos inspirar anos a fio “In memoriam” homem contemporâneo . SLúcia, a vida não tinha graça nenhuma. (1850), reunião de pensamentos e Se uma palavra fosse pedida para Se o João Pombeiro não tivesse aqueles universitários, Tennyson é poemas elegíacos, glosas da definir a sua poesia, ela seria repentes em que lhe dá para alimentar o blogue da hoje pouco conhecido entre experiência da morte: talvez a mais “musicalidade”. Manipulação exímia “Ler”, não saberíamos a quantas andamos. nós. Não foi sempre assim, a bela das suas obras. do verso, exploração plena da Se o José Mário Silva, do Bibliotecário de Babel, não De 1830 a 1850 foram os anos prosódia: literatura enquanto tal, Isabel fosse pai, talvez tivesse estado todos os dias no Correntes sua curiosidade oitocentista sombrios, paralisantes, as provações ritmo da letra inebriante, Coutinho d’Escritas a tirar boas fotografi as e as que têm aparecido levou-o a vários pontos da mergulharam-no no silêncio, na arrebatador, a toada acelera-nos, por aí espalhadas nos blogues não estariam desfocadas, Europa, e a visitar Sintra solidão, na Natureza marítima e possui-nos, a matéria sensível do com aquele ar de que foram tiradas com telemóveis em enevoada que o abarca e cuja mundo à tona, trazida pelas imagens sítios com pouca luz. e Lisboa no Verão de 1859 atmosfera ele devolve em e mestria de recursos retóricos. Se o Paulo Ferreira e o – e ao que parece cheio de plasticidade, cor e minúcia qual pré- Estes servem um “pathos” que vai O Correntes d’Escritas, Nuno Seabra Lopes não moscas e mosquitos. Maria rafaelita quase precursor do ganhado forma, às vezes tivessem uma base de apoio simbolismo. interrompido por uma espécie de festival literário de em Lisboa, o blogue da Conceição Caleiro 1850 foi o seu “annus mirabilis”. micropoema, atmosfera que vinga a escritores de expressão edição Blogtailors não estaria, Alfred Tennyson Pôde finalmente casar-se com Emily meio da sequência narrativa durante os dias que dura este Poemas Sellwood. O sucesso de “In partindo de um puro traço de ibérica, era outra festival literário, em constante (Selecção, tradução, notação e memoriam” faz dele, a convite do paisagem esmiuçado. actualização (ai, que a inveja introdução: Octávio dos Santos) príncipe Alberto, “porta-voz da Recorrentemente, uma visão ou um coisa antes dos blogues cai sobre nós). Saída de Emergência nação britânica” (mais tarde seria sonho que regressa conduzem esse Se o Eduardo Pitta tivesse feito Lord), cargo que honraria até à “pathos” que sobrevoa o passado. terem tomado estado na festa no Bar da mmmmm morte em detrimento do Poder-se-ia até dizer que aí, nesse Praia, da Póvoa de Varzim, “afirmativismo viril” dos poemas intervalo, está a alma do sujeito conta disto onde foi lançado o livro Alfred Tennyson anteriores “para não chocar a lírico. inédito do Bolaño, o seu (1809-1892), poeta mediocridade convicta de uma Alguns exemplos do que vem relato do evento seria o “post” mais visitado do blogue da língua inglesa, rainha Victória que o admirava sendo dito, um poema curto de 1851, Da Literatura. poeta laureado da tanto” ( Jorge De Sena, “A literatura a força do curto verso final, o clímax Se o Luís Ricardo Duarte não tivesse um tempinho época vitoriana, Inglesa”). A seguir à sua morte foi de para que o poeta repentinamente Correntes e um bloquinho para apontar tudo, o novo site do “JL- outrora o mais bom tom desmantelar-lhe a conduz, por vezes a várias vozes, d’Escritas 2010 Jornal de Letras Artes e Ideias” não nos teria contado popular e importância e acentuar a aqui abreviada a sua modernidade, http: que Manuel da Silva Ramos transportava um capacete disputado, surge superficialidade do pensamento. “A Águia”: “Ela aperta o penhasco /www.cm-pvar- dentro da mala. agora traduzido, e Todavia, para além ou a par da com mãos retorcidas;/perto do sol zim.pt/go/corren- Se o Manuel Jorge Marmelo não andasse tão entretido bem, pela primeira vez em língua ortodoxia vitoriana, do em terras solitárias,/anelado com o tesdescritas/ na Póvoa, talvez o seu Teatro Anatómico tivesse tido portuguesa. Tradução que em nacionalismo e garbo imperial, nos mundo azul celeste, levanta-se. O mais histórias das Correntes d’Escritas. Mas embora prefácio declara os seus princípios: interstícios do revivalismo medievo mar enrugado debaixo dela rasteja;/ Blogtailors- blog sejam poucas, o blogue tem uma que vale a pena. É que “o mais literal possível (...).nunca e dos melodramas arturianos, tão ao Olha do alto das suas muralhas da da edição Manuel Jorge Marmelo foi protagonista de uma das cenas seria capaz de deturpar (...) apenas gosto do século XIX, ele voltaria a montanha, / e como um relâmpago http: mais surpreendentes deste festival, num dueto entre o para ‘soar’ bem”. Mesmo assim soa, ser consagrado como o grande poeta cai.” /www.blogtai- miúdo do Porto e Malangatana. “Enquanto inventava e a poeticidade é-lhe restituída. Fora que sempre terá sido, o precursor Peguemos em “As duas lors.blogspot. uma história que espantasse a audiência”, Malangatana dos círculos universitários, dos maiores por vir: Yeats, Joyce, Vozes”(1834): um sujeito dividido com/ arranjou forma de fazer com que Marmelo acabasse por Tennyson é hoje pouco conhecidocido Eliot.Eliot.t NenhumaNennhumama dialogadidiallogo a comcom o outroou dentro ler um dos seus poemas para o auditório a abarrotar. A entre nós. Não foi sempre assim,m, a ded si – a oobsessão de Irmão Lúcia seguir, o escritor português entusiasmou-se tanto que sua curiosidade oitocentista levou-ovou-oo mortemortr e sempre http: quando o pintor foi “instado a cantar a música islandesa a vários pontos da Europa, e a terter subliminarsubl e o /www.irmao- que tinha acabado de inventar” Marmelo ofereceu-se visitado, no rastro de Byron – seueu renovoreno na lucia.blogspot. para o acompanhar batucando na mesa. Conta ele: ídolo -, Sintra e Lisboa no Verãoo Natureza:Naat as com/ “Batuquei, pois, enquanto Malangatana cantava sons quente de 1859, e ao que parecee duasdua vozes guturais. Se a memória não me atraiçoar, esta há-de cheio de moscas e mosquitos. antitéticas,anti Cadeirão Voltaire ser uma coisa para contar aos meus netos: o irrepetível Pormenor de uma carta à mulher:her: “I presentesprese e em http: momento em que ajudei um velho buda moçambicano a continue pretty well and I havee todatot da eesta poesia, /cadeiraovoltai- cantar para uma audiência de trezentas pessoas.” not been bitten”. Em Lisboa, umauma subsumindosub a re.wordpress. Será que me estou a esquecer de alguém? Certamente. hospeda-se no Bragança, e nãoo outra altealternadamente,r com/ Muito mudou em dez anos. O Correntes d’Escritas, passa despercebido. “Tout elaselas não se (re)unem,( festival literário de escritores de expressão ibérica, era Lisbonne” o vem saudar: nenhumanenhuma se deixa Da Literatura outra coisa antes dos blogues terem tomado conta disto. “yesterday seizing my hand abafaraba afar e é desse http: Como se ouvia lá pelos cantos: “Se está na internet é and cryng out ‘Who does not instabilidadeinstabilid que /daliteratura. porque é verdade”. know England’s Poet Laureate?? advémadvém a blogspot.com/ I am the Duke of Saldanha’” necessidadenecessi (“Letters from Portugal”). poéticapoética – “Tal Teatro Tennyson era o quarto filho de pareciaparecia ser o Anatómico uma família de doze de um pai sussurrosussurr ao meu http: depressivo, pastor que nunca o quis lado./‘Olldado./‘O que é que /teatro-anatomi- ser. Daí, juntamente com tutu sasabesbe doce, co.blogspot.com/ dificuldades financeiras acrescidas voz?’, gritei./Umag [email protected] aquando da morte daquele, teria esperançaespep ranç JL talvez recebido um modo de ser Se uma palavra fosse pedida escondida’,escoondida’ a voz http: (Ciberescritas já é um blogue http://blogs.publico.pt/ melancólico e irritável, assim para defi nir a poesia de Alfred explicou...(...)explicou...( E pelos /aeiou.visao.pt/JL ciberescritas) como uma excelente Tennyson ela seria “musicalidade” camposcampos foraf eu

58 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon METROPOLITANA

Sexta-feira 5, 21h00 Auditório da Reitoria da Universidade Nova de Lisboa

Sábado 6, 21h30 Mosteiro de Alcobaça AMADEUS

Soojin Moon soprano Eduardo Rahn direcção musical Orquestra Metropolitana de Lisboa

Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) – Abertura da ópera La Clemenza di Tito, K. 621 – Ecco il punto ... Non più di fiori, ária da ópera La Clemenza di Tito (Vitellia) – Bella mia fiamma ... Resta, o cara, ária de concerto, K. 528 – Abertura da ópera Idomeneo, re di Creta – Martern aller Arten, ária da ópera O Rapto do Serralho (Constanze) – Sinfonia n.º 40 em Sol menor, K. 550

Mais informações em www.metropolitana.pt

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Solistas do Remix Ensemble Rafael Toral DJ King Bee SÁBADO 23:00

Álvaro Costa Pfadfinderei

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AsAs crónicascrónic que Alves, que foi directora o escritoescritorr José da revista. Juntou a EduardEduardoo Agualusa essas, fragmentos Ediçãoção pupublicoubl na de outros textos Livros rerevista “Pais publicados na revista & Filhos” PÚBLICA. O livro, “Um eestão agora Pai em Nascimento”, reunidas será lançado a 10 de em livro Março na Livraria Ler com um Devagar, em Lisboa. prefácio “Vou ser pai, eu, que de ainda estou a aprender LLaurinda a ser fi lho?”

fui,/ e o movimento vivente da 25 de Abril de 1974. Embora a neologismos, gozo vocabular e Natureza concedeu/ o pulsar da vocação inata de Rodrigo Emílio não vernáculo, temperado pelo lirismo esperança ao descontente. (...)E fosse política, a política tomou conta revisitado do grupo da revista Távola tudo tão variadamente trabalhado/ dos seus textos em 1968, em registo Redonda. Couto Viana surge como que eu admirei-me de como a mente bélico e patriótico. Na agonia do figura tutelar, e aliás assina o foi levada/ a ancorar-se a um Império, o poeta faz-se soldado. prefácio (em verso) desta antologia. pensamento desalentado.// Pelo que Emílio sentiu os “ventos da Compreende-se que as convicções eu preferi fazer a escolha/ de História”, só que os ventos da políticas de Emílio afastem bastantes comungar com aquela voz árida/ em História passada, não da futura. leitores, mas convém dizer nem só vez de com a que disse ‘Rejubila! Combate nos trópicos, nos matos, de política se faz esta obra, que em ‘Rejubila!’” entre baionetas e emboscadas, mas temas privados usa do mesmo júbilo Tennyson anima a Natureza de um em vez de contestação redige uma inventivo e da mesma angústia com modo que surrealiza o real, sentimos exortação da guerra. Há uma ideia o “fatum”. Alguns poemas da com os olhos de um paisagista (ao histórica e poética de Portugal vivida solidão, das saudades da infância ou acaso, um exemplo: “à noite, a de modo exaltado, como se a guerra da passagem do tempo lembram minha chalupa, farfalhando através/ permitisse ao sujeito andar ainda Nobre. Há agonias metafísicas dignas da baixa e florida folhagem, hoje por novas Aljubarrotas. de Gomes Leal. E a antologia é conduziu-me/ pelas flagrantes, Convencido da justeza do desígnio atravessada pelo tema da morte de cintilantes profundezas, e talhou/ as colonial português, Rodrigo Emílio uma filha recém-nascida, sombras de citrinos no azul”). fez da sua guerra uma odisseia de especialmente no pungente Único senão: não se ter optado idealismo, companheirismo e “Poemas acenados a uma criança por uma edição bilingue. heroísmo. longe” (1972). Muitos textos são nus Não admira que a Revolução e desossados, como este de “A tenha sido um golpe fatal. A data que segunda cegueira” (1973): “Dardeja / Finis Patriae para muitos representou uma às cegas / o sabre / da sombra / libertação, significou para Rodrigo Esquarteja / sonhos / que o sono / Emílio a queda num tenebroso descerra / Finda / a refrega / sobre Tristeza intimista e prosaísmo. Mais do que ferido, o saibro / soçobra / na glabra / gleba / indignação patriótica, por poeta ficou enojado. O nó na e crava um som / cavo / de onde / se garganta deu rapidamente lugar ao eleva / um travo / a treva” (pág. 107). um derrotado da História. nó no estômago, e quando Pressentimos muitas vezes que a Pedro Mexia chegamos a “Reunião de ruínas” tristeza é o tema fundamental de (1977) o tom é de sarcasmo e Rodrigo Emílio, uma tristeza Antologia Poética vitupério. A tropa que fez Abril é finissecular, pré-modernista. Mas o Rodrigo Emílio uma “troupe” e uma “trampa”, uma virtuosismo formal puxa os poemas Areias do Tempo “cambada” de “biltres”. Em todo o para outras direcções, pode por lado Emílio vê traidores, fariseus, exemplo escrever baladas mmmnn filisteus, vendilhões, uma “canalha domésticas comovidas: “Entre tais canora” feita de “gandulos e olhos fervilha, / foi de tal sorte Rodrigo Emílio galdérias”. É poesia de combate (de enfeitada / -com tanta seda e (1944-2004) caiu resistência, diriam alguns), e perde cedilha, / tanto colchete e prezilha, / no esquecimento, na caricatura o que ganha no génio tantos laços de fitilha, / tanta liga em grande da imprecação. Uma espécie de Ary acetinada - / que tudo, à roda, a medida por das direitas. rendilha; / e é de branco debruada, motivos Mais que o processo / que a figura que perfilha / brilha ideológicos. É um revolucionário em curso, dói ao por tudo e por nada, / à imagem de destino poeta a entrega das colónias. Para uma ilha / na escuridão emboscada” compreensível Rodrigo Emílio, o Portugal que (pág. 190). Outras vezes, é uma mas não irreversível. A poesia é um outros viam amordaçado deu lugar a boémia musical, hedonista mas trabalho com a linguagem, e não um “Portugal amortalhado”, um melancólica, em textos que foram distingue fascistas e democratas. país reduzido ao rectângulo, cantados por José Campos e Sousa. Enquanto isso, a obra poética de diminuído, decepado. Estes poemas, Veja-se o belo poema sobre uma Rodrigo Emílio estava necessitada de alguns escritos no exílio espanhol e mulher em Times Square ou o puro uma boa antologia. Caudalosa e brasileiro, são um valioso gozo bilingue deste divertimento desigual, carecia de arrumação. Esta testemunho de um derrotado. De parisiense não isento de cunho “Antologia Poética”, organizada por alguém que “nas ravinas da raiva” patético: “Quem o vê / de manhã / Bruno Oliveira Santos, cumpre fustiga uma “data negra e no Quartier / Latin, // com perfeitamente essa tarefa de negregada” que terminou com o Rembrandt / e Rimbaud / por representatividade, embora ficasse mundo tal como ele o conhecia e copains de bistrot…. // De manhã / mais bem defendida se fosse um concebia. Rodrigo Emílio quem no-vê / por Saint-Germain / pouco menos representativa. Isto considerava-se do lado da História, -des-Prés, // à demi- / mendiant, / à porque os poemas da década de considerava que estava ao lado de demi-/ -rigolo… // , a atacar / um 1960 aqui coligidos são basicamente Camões e de Nun’Álvares, contra os refrain, / a cantar / um couplet, / a juvenília, e porque as colectâneas facínoras. Uma espécie de Alegre tramar / um complot… // - pensará / póstumas, de tema religioso, pregam facho. com afã / (já se vê) / em Charlot: // aos convertidos. Só os inéditos e Bisneto do escritor romântico (…) um Charlot / com écran / num dispersos abrem um pouco o âmbito Tomás Ribeiro, Rodrigo Emílio portal / de metro! // - Só não sei / temático, nomeadamente com prosseguiu o ideário de poetas por que é / que ninguém / entrevê // alguns poemas de feição erótica. É, nacionalistas como Sardinha ou o elán / e a fé / em que, ao fim, / se em todo o caso, um ponto de Beirão, tomou emprestado o luxo quedou, // ali, ele, / de pé / - en partida. verbal dos decadentistas ou dos attendant / Godot!...” (pág. 198-199). O essencial da produção emiliana simbolistas como Eugénio de Castro, Admirado e detestado por causa vai de 1971 (“Paralelo 26 S: às e usou a propaganda musical de dos seus textos de intervenção, audições do Índico”) a 1982 Junqueiro. As ideias são cediças, mas datados e vibrantes, Rodrigo Emílio (“Poemas de braço ao alto”). O a oficina poética é pujante, às vezes ilustra também uma vocação segundo título é elucidativo. Homem admirável, com toda a espécie de ancestral na poesia portuguesa: a de convicções nacionalistas, o poeta empréstimos ao conceptismo e ao vocação de unir a tristeza intimista e defendeu um Portugal que acabou a concretismo, com arcaísmos, o luto “finis patriae”.

60 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon

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“Botanica Flesh”, de Clara Martins, em Lisboa

imagem (mesmo quando a imagem é The show apenas a dos outros visitantes) que se trata sobretudo, bem como da consciência do espaço como parte must go on integrante da obra de arte. Em geral, a exposição beneficia de Instalação, vídeo, fotografia uma montagem extremamente e uma arquitectura voltada sofisticada, como é habitual em artistas que trabalham sobretudo para o espectáculo: Judith com o filme e a instalação. Judith Barry está no Museu Barry tem a capacidade rara de Berardo. Luísa Soares de manipular com sucesso as mais modernas tecnologias informáticas Oliveira para os objectivos que se propõe, sem contudo deixar que a obra se Body Wihout Limits transforme numa demonstração De Judith Barry. aplicada das performances da máquina. É o que sucede em Lisboa. Museu Colecção Berardo. Praça do Império “Speedflesh”, uma instalação onde o - Centro Cultural de Belém. Tel.: 213612878. Até 25 04. 2ª a 6ª e Dom. das 10h às 19h. Sáb. das visitante manipula a imagem à 10h às 22h. maneira de um jogo de computador. “Voice Off ” resume algumas das linhas de força Vídeo, Instalação, Outros. Trabalhar o espaço e a imagem do trabalho de Judith Barry e em particular significa também, logicamente, mmmmn a sua boa relação com as novas tecnologias trabalhar o corpo e a percepção, bem como a imagem social do Uma das melhores peças desta tecnologias para produzir uma obra de Judith Barry na sua obra. A corpo. Judith Barry, que pertence à exposição, senão mesmo a melhor, forte e bem relacionada com os interrogação que ela supõe, a sua mesma geração de Cindy Shermann, já apresentada em Lisboa há alguns meios de comunicação. Luís Serpa, materialidade ou não, a sua por exemplo, não se foca como esta anos, consta de uma projecção vídeo que a traz a Portugal desde 1994 – realidade, enfim (no espaço última na exploração dos limites que sobre as duas faces de uma cortina. ano em que a artista participou na expositivo ou no espaço urbano, a imagem no espelho lhe revela. De um lado, um homem tenta colectiva “Múltiplas Dimensões”, onde a artista também interfere com Prefere, em contraste, analisar as escrever sentado a uma secretária. comissariada por este produtor frequência), são vias possíveis para a cada vez mais subtis fronteiras entre Entretanto, o ruído de fundo – vozes, cultural e ex-galerista –, assina a análise do trabalho desta artista. o vivo e o inerte, entre o virtual e o árias de ópera que acompanham um curadoria de “Body without limits” Há uma outra obra na exposição, presente, entre a vida e a morte. cenário teatral projectado na face no Museu Berardo. “Light fog room with chamber and “Imagination, dead imagine”, a peça oposta da instalação – torna-se Em “Voice Off”, como dizíamos, antichamber”, onde estas questões que integrou “Múltiplas Dimensões”, incomodativo, a ponto de, no final, o um actor encontra-se com as se exacerbam. Trata-se de um é um bom exemplo desta linha de homem abrir um buraco na parede memórias de algo que ouve e de um cubículo iluminado por uma luz trabalho, que possui a vantagem do escritório e surgir na projecção espectáculo que, racionalmente, verde, cheio de vapor de água, onde nada negligenciável de nos poupar à filmada do lado oposto, apenas sabe não estar a acontecer apenas cabem dois ou três visitantes senda mais do que batida da auto- encontrando o avesso das paredes realmente. Contudo, esta conclusão fechados. As condições do espaço representação nombrilista, tão do seu quarto. “Voice Off”, datada é ela própria posta em causa pela determinam uma visibilidade quase frequente na arte contemporânea de 98-99, resume algumas das linhas consciencialização daquilo que nula, a perda de referências e, feminina dos anos mais recentes. De de força do trabalho de Judith Barry, efectivamente o espectador vê: duas enfim, a percepção de um espaço resto, esta exposição é, em si, um artista que tem explorado a projecções de filmes, e um corpo avermelhado assim que se sai da autêntico espectáculo – o que nos performance, a instalação, o vídeo, que apenas possui realidade como peça por um efeito de óptica leva a interrogar sobre os custos as técnicas digitais de manipulação imagem. A natureza da imagem é conhecido. Aqui, mais uma vez, é reais e simbólicos a que a arte se da imagem e, em geral, as novas efectivamente uma das abordagens das condições de percepção da sujeita para se conseguir impor.

Agenda Exposições Inauguram Tel.: 213571167. Até 03/04. 2ª a 6ª das 11h às 20h. Sáb. Lugares Alentejanos Continuam das 15h às 20h. Inaugura 5/3 às 22h. na Literatura Portuguesa Lourdes Castro e Manuel Pintura, Desenho, Instalação. Porto. Centro Português de Fotografia - Cadeia da BES Photo 2009 Zimbro: A Luz da Sombra Relação do Porto. Campo Mártires da Pátria. Tel.: De André Cepeda, Filipa César, Pelo Buraco da Agulha 222076310. Até 18/04. 2ª a 6ª das 10h às 18h. Sáb., Porto. MuseuMuse de Serralves. Rua Dom João de Castro, De Rui Serra. Dom. e Feriados das 10h às 19h. Inaugura 6/3 às 16h. Patrícia Almeida. 210. TeTel.:l.: 2226156500.2 Até 13/06. 3ª a 6ª das 10h às Lisboa. Galeria Graça Brandão. Rua dos Caetanos, Fotografia. Lisboa. Museu Colecção Berardo. Praça do Império. 117h.7h. Sáb., DDom. e Feriados das 10h às 22h. Inaugura 26A (Bairro Alto). Tel.: 213469183. Até 09/04. 3ª a Tel.: 213612878. Até 04/04. Sáb. das 10h às 22h. 2ª a 5/35/3 às 22h. Sáb. das 11h às 20h. Inaugura 5/3 às 22h. Pleno 6ª e Dom. das 10h às 19h. Fotografia. Escultura,Escultu Outros. Pintura, Outros. De Fernando Roussado. VerVer textextot na pág. 38 e segs. Lisboa. Paulo Amaro Contemporary Art. Rua Ver texto na pág. 42 e segs. Exterior Capitão Leitão, 14. Tel.: 214544450. Até 10/04. 3ª a OtteveisktogenOttev ou o Recanto De Miguel Palma. Sáb. das 15h às 19h30. Inaugura 6/3 às 17h. Sem Rede Porto. Galeria Fernando Santos. R. Miguel Escultura, Instalação. De Joana Vasconcelos. dosdos Oito Caminhos Bombarda, 526/536. Tel.: 226061090. Até 10/04. 3ª a Lisboa. Museu Colecção Berardo. Praça do Império. DeDe RuiR Algarvio. 6ª das 10h às 19h30. 2ª e Sáb. das 15h às 19h30. Tel.: 213612878. Até 18/05. Sáb. das 10h às 22h. 2ª a Porto.Port MCO Arte Contemporânea. R. Duque Inaugura 6/3 às 16h. Entrevista Perpétua 6ª, Dom. e Feriados das 10h às 19h. dede PPalmela, 141/143. Tel.: 225102328 . Até Instalação. De Falke Pisano, Mariana Silva, 19/04.19/ 2ª a Sáb. das 14h às 19h. Inaugura Michele Di Menna, Pierre Leguillon, Instalação, Outros. 5/35/ às 21h30. The Film Series (Epilogue) - Von Calhau. And/Or Pintura.P Blitzforum #1 Lisboa. Cristina Guerra - Contemporary Art. Rua De Asier Mendizabal. Santo António à Estrela, 33. Tel.: 213959559. Até Os Homens Barro De Vasco Barata. Lisboa. Culturgest. Rua Arco do Cego. Tel.: 13/03. 2ª a 6ª das 22h às 00h. Sáb. das 17h às 00h. De Paulo Robalo. Lisboa. Alecrim 50. R. do Alecrim, 48-50. Tel.: 217905155. Até 18/04. 2ª, 4ª, 5ª e 6ª das 11h às 19h. 213465258. Até 13/03. 2ª a 6ª das 11h às 19h. Sáb. das Performance, Som, Outros. Porto. Galeria Arthobler. R. Miguel Sáb., Dom. e Feriados das 14h às 20h. 11h às 18h. Inaugura 6/3 às 16h. Bombarda,Bombarda 624. Tel.: 226084448. Até 10/04. 3ª a Escultura. Vídeo. Khora SSáb.áb. das 1515hh às 19h30. Inaugura 6/3 às 16h. Supervisão Pintura.Pintura. De Alberto Carneiro, Rui Chafes. Pedro Oliver Lisboa. Fundação Carmona e Costa. Ed de Espanha De Alexandre Estrela. BotanicaBotanic Flesh: Portraits Porto. Galeria Por Amor à Arte. R. Miguel Bombarda, - R. Soeiro Pereira Gomes L1 - 6º A Porto. Culturgest. Avenida dos Aliados, 104 . Tel.: De Claral Martins. 572. Tel.: 226063699. Até 10/04. 3ª a Sáb. das 15h às C/D. Tel.: 217803003. Até 21/05. 4ª a Sáb. das 15h às 222098116. Até 10/04. 2ª, 4ª, 5ª e 6ª das 11h às 19h. Rui Algarvio na MCO Arte Lisboa. Galeria António Prates - Arte 19h. Inaugura 6/3 às 16h. 20h. Inaugura 9/3 às 18h30. Sáb., Dom. e Feriados das 14h às 20h. Contemporânea, Porto Contemporânea. Rua Alexandre Herculano, 39A. Pintura. Desenho, Escultura, Outros. Desenho.

62 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon 13 MAR SÁB 22:00 SALA SUGGIA | € 25

Mark Turner saxofones Miguel Zenón saxofone alto Avishai Cohen trompete Robin Eubanks trombone Stefon Harris vibrafone, marimba Edward Simon piano Matt Penman contrabaixo Eric Harland bateria

Um dos ensembles mais importantes do jazz internacional revisita autores que assinaram capítulos da história do jazz moderno, impulsionando a nova música. Alberto Carneiro | Rui Chafes Nesta temporada, o tema será a música de Curadoria: Sara Antónia Matos Horace Silver, figura incontornável do hard-bop. Em tournée por todo o mundo, o Inauguração: Terça-feira, dia 9 de Março, às 18h30 octeto conta grandes nomes actualidade, estreando Mark Turner, Avishai Cohen e Exposição: de 10 de Março até 21 de Maio de 2010 Edward Simon. Horário: de quarta-feira a sábado, das 15h às 20h Por ocasião da exposição será publicado um catálogo, co-edição fcc / assírio & alvim Ciclo de conversas: Paulo Pires do Vale – dia 10 de Abril (sábado) às 17h00 www.casadamusica.com | T 220 120 Bernardo Pinto de Almeida – dia 17 de Abril (sábado) às 17h00 João Miguel Fernandes Jorge – dia 15 de Maio (sábado) às 17h00

fundação carmona e costa MECENAS CICLO JAZZ MECENAS CASA DA MÚSICA APOIO INSTITUCIONAL MECENAS PRINCIPAL CASA DA MÚSICA Edifício Soeiro Pereira Gomes (antigo Edifício da Bolsa Nova de Lisboa) Rua Soeiro Pereira Gomes, Lte 1 - 6.ºD, 1600-196 Lisboa (Bairro do Rego / Bairro Santos) Tel. 217 803 003 / 4 www.fundacaocarmonaecosta.pt Metro: Sete Rios / Praça de Espanha / Cidade Universitária Autocarro: 31 SEJA UM DOS PRIMEIROS A APRESENTAR HOJE ESTE JORNAL COMPLETO NA CASA DA MÚSICA E GANHE UM CONVITE DUPLO PARA ESTE CONCERTO. OFERTA LIMITADA AOS PRIMEIROS 10 LEITORES. aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

Será uma sessão com ainda mantém todo o seu Ainda na semana história. Durante cinco fulgor, infl uenciando passada aqui falávamos horas, a partir da 1h sucessivas gerações de dele a propósito de um de hoje, o americano melómanos. Ao lado de concerto, em Londres, na Tecnoo Carl Craig tratará de Juan Atkins, Derrick May companhia do alemão mostrar no Lux, em e Kevin Saunderson, o Moritz Von Oswald e Lisboa, porque é que, 25 americano foi um dos do pianista Francesco anos depois, a música pioneiros desse género Tristano, junção de tecno electrónica repetitiva musical, criando um com música clássica. originária da cidade campo seu em produções Mas, no Lux, a essência americana de Detroit, originais, remisturas ou da noite serão os 25 anos conhecida como tecno, inúmeras colaborações. da música tecno.

Pop Continua a cantar “We shall Seis anos depois de um concerto de culto overcome” ou “Sweet Sir Gallahad”. no Meu Mercedes, os Mono voltam ao Porto Continua a compor pouco e a ser o (mas antes disso passam por Lisboa) Cantar para que sempre foi: uma intérprete celebrada pela certeira escolha de repertório. O seu último álbum, que o mundo “Day After Tomorrow”, editado em 2008, aí está para o provar. Reúne mude versões de, entre outros, Tom Waits e Elvis Costello. A voz já não chega aos agudos Joan Baez, de viola em impossíveis como anteriormente, o punho, a continuar a política vibrato serenou em favor da por outros meios: não é gravidade da interpretação. De resto, diríamos que Joan Baez é a passado, é presente, no mesma de sempre. De viola em Porto e em Lisboa. Mário punho e com guitarrista, baixista, Lopes violinista e percussionista a seu lado, continua a cantar para que o mundo Joan Baez mude. Porto. Casa da Música - Sala Suggia. Pç. Mouzinho de Albuquerque. 2ª, 8, às 21h30. Tel.: 220120220. Owen Pallett 40€. Lisboa. Coliseu dos Recreios. R. Portas St. Antão, 96. 4ª, 10, às 21h30. Tel.: 213240580. regressa 20€ a 55€. Pensar em Joan Baez é pensar num a casa passado distinto. Ela foi a rainha da folk de Greenwich Village, Nova Iorque, nos anos 1960. A voz ampla e O canadiano vem a Lisboa, límpida que se destacava entre as onde passou umas semanas todas aquelas, inspiradas por Woody a escrever canções para Guthrie, que se empenhavam nas lutas sociais da década armadas com o novo álbum, para duas o cancioneiro popular americano. noites no Maria Matos. Vítor devolver a sua mais recente criação passagem pelo mítico O Meu Eis Joan Baez, a que actuará Belanciano à cidade onde tudo começou, com Mercedes é Maior do que o Teu, na segunda-feira na Casa da Música, no duas datas no Maria Matos em Ribeira do Porto, que apenas não Porto, e quarta no Coliseu dos Owen Pallett (Final Fantasy) Lisboa (10 e 11 Março) e uma passou despercebida aos fãs. Num Recreios, em Lisboa: a amante do incursão por Aveiro (12). bar com dimensões reduzidas, a Lisboa. Teatro Municipal Maria Matos - Sala jovem Dylan, a amiga e apoiante de Principal. Av. Frei Miguel Contreiras, 52. 4ª, 10, e O terceiro álbum – o primeiro em parede sonora alicerçada durante Martin Luther King, a voz da 5ª, 11, às 22h. Tel.: 218438801. 5€ a 15€. nome próprio, depois de dois cerca de uma hora pelos nipónicos consciência adulta em Woodstock, assinados com a designação Final foi a primeira marcação de um quando a geração que sucedeu à sua Nas duas entrevistas que o Ípsilon Fantasy –, sem perder o contacto território em expansão. Numa fase já tinha ligado às guitarras à fez ao canadiano Owen Pallett, este com as características nucleares dos em que o pós-rock ainda se

Concertos electricidade e a mente ao LSD. mostrou-se sempre encantado com registos anteriores, misto de restringia a um pequeno núcleo de PPensarensar em JoanJoan BaezBaez é pensar num LiLisboa,sboa, dizendodizendo que era a sua cidadecidade vocvocaçãoa pop, composição clássica e bandas encabeçado pelos Godspeed ppassadoassado distinto? Nem tanto. preferida.preferida. Podia ser téctécnicasn electrónicas, vai um pouco You Black Emperor! e pelos Mogwai, É certo qqueue actualmente edita apenasapenas um gesto de mamaisis além. É um disco mais e assombrado pelo legado dos Slint, ddee formaforma muito esesporádicaporádica e simpatia,simpatia, mas no seu aambicioso,mb de arranjos mais os japoneses seguiam um caminho qqueue não é faceface regularmenteregularmente caso pareceparece ser sosofisticados,fis sem perder o que se encontrava com as raízes do ppresenteresente na imprensa ou mesmomesmo verdade,verdade, até ppragmatismorag pop. Depois das seu país de origem. Liderada pelo televisão, mas, ao contrário porqueporque o seu último iinúmerasnúm colaborações encetadas guitarrista Takaakira “Taka” Goto, a do seu mmaisais ffamosoamoso álbum,álbum, “Heartland”, nnosos últimosú anos (Arcade Fire, Nico banda que desde o seu início comcompanheiropanheiro de estrada, o foifoi iniciado na cacapitalpital MuMuhly,h Beirut ou Grizzly Bear), desencadeou um culto em seu redor Dylan acima rereferido,ferido, não portuguesa,portuguesa, em OOwenwe Pallett está outra vez na subiu ao palco parca em palavras, mmudouudou nada.nada. Continua 2008.2008. “É“É verdade, estrestradaa e desta vez não vem sozinho. mas preenchida pela vontade de activista pela ecologia, pelos passei umas semanas A acacompanhá-lo em voz, pedal de comunicar através da via que melhor direitos sociais, contra a emem LisboaLisboa a escrever efeiefeitos,t “sampler” e sentido de conhece. A cadência da estrutura guerraguerra e contra a as cançcanções”,ões”, huhumor,m estará Thomas Gill (guitarra musical, que oscila entre as discriminação.discriminação. confessava-nosconfessava-nos em e ppercussões)e e, claro, um público paisagens sonoras de um clímax Janeiro,JaJ neiro, aquanaquandodo aansiosonsio por bater palmas a iminente e momentos de explosão dodo lançamentolançamento comcompasso. efectiva, transformaram o dodo discdisco.o. espectáculo do Mercedes numa AgoraAgA ora bolha temporal a visitar no futuro. vemvev m OsOs Mono na cápsula Com mais dois álbuns de do tempo originais, um dos quais editado no Os tempos ano passado, “Hymn to the mudaram MonoMon Immortal Wind”, os Mono mas não para regressam a Portugal, desta vez Joan Baez: Lisboa.Lisboa MusicBox. R. Nova do Carvalho, 24 - Cais do SoSodré.dré. 3ª, 9, às 22h. Tel.: 213430107. 16€. também com passagem por Lisboa. é a mesma Na terça. dia 9, tocam no MusicBox, cantora Porto.Porto. Museu de Serralves - Auditório. Rua Dom João dede CaCastro,s 210. 4ª, 10, às 22h. Tel.: 226156500. 7,5€ no Cais do Sodré, com os Löbo de protesto Owen Pallett a 15€.15€. como banda de abertura; no dia de sempre, apresenta seguinte estão no auditório de segunda-feira o primeiro Há sseis anos atrás, também no mês Serralves, Porto, sala que, pouco no Porto álbum pós- ddee Março,M os Mono, na altura com tempo depois de ter disponibilizado e quarta Final Fantasy doisdoi álbuns de originais e outro os bilhetes, esgotou a sua lotação. em Lisboa em Lisboa prestespre a ser editado, tiveram uma André Vieira DandoD continuidade ao jornalista Manuela Bach e Tchaikovsky a formatof de 2009, o Centro Paraíso e intitulados quatro mãos com Miguel CulturalC de Belém inicia Jogos Fantásticos. Henriques, e o pianista no próximo domingo, às Nesta primeira sessão, Jorge Moyano interpreta Ciclo 11h30, uma nova série de a pianista Ecaterina as Cenas Infantis, de Concertos à Conversa, Popa, com apenas 11 Schumann. Os bilhetes desta conduzidos pela anos, toca Kurtág, custam cinco euros.

instrumento de cordas de origem Albergaria (ex-Vicious 5), Hélio Depois de ter registado uma magnífi ca gravação indiana, e cumpre a sua parte. Cabe- Morais (Linda Martini), Makoto das Variações Goldberg, Staier interpreta lhe transportar a música para Sul e (Riding Pânico) e Shela (If Lucy Fell), a obra ao vivo na Gulbenkian Oriente, cabe-lhe trabalhar um praticam um rock sem filiação, exotismo que rapidamente se torna poderoso, intenso e selvagem. familiar - e a responsabilidade por Depois há ainda os Octa Push, essa transformação é toda dos projecto português próximo das Tigrala e das propriedades linguagens dubstep, e DJ Riot, um hipnóticas da sua música. dos membros dos Buraka Som Hoje e amanhã, no Pequeno Sistema. Isto é, noite libertina em Auditório da Culturgest, não perspectiva. V.B. teremos os Tigrala. Será Norberto Lobo, apenas ele, a ocupar o palco. Dele já sabemos tudo. Existe “Mudar Clássica de Bina” e “Pata Lenta”, álbuns maiores onde um guitarrista se aventura por americanices e A arte portuguesices, por dedilhados tocantes e crescendos da variação os seus estudos musicais pelo piano “Fandango” de Soler e a alguns dos arrebatadores. Como se o mundo moderno. Conforme contou em seus contemporâneos ibéricos — e o coubesse todo na destreza de dez por Andreas entrevista ao PÚBLICO de 12 de Maio Lied alemão, ao lado do grande dedos. de 2000, começou a tocar cravo por tenor Christhoph Prégardien. No ano passado, na apresentação achar que este se adequava melhor à de “Pata Lenta”, vimo-lo deixar em Staier música de Bach. Mais tarde, uma silêncio o público que lotava a Casa “masterclass”, na Bélgica, num Sassetti a três do Alentejo e que lhe seguiu cada O grande cravista alemão museu onde havia uma colecção de nota em suspenso. Hoje e amanhã, instrumentos antigos, despertou a iremos vê-lo novamente e iremos interpreta as magnífi cas sua paixão pelo pianoforte. Cravista Numa antevisão do recém continuar em silêncio. Não para o Variações Goldberg, de do lendário agrupamento Música gravado “Motion”, o sacralizar, que isso seria desrespeito Antiga de Colónia, com o qual Bach, no Ciclo de Música mais notável trio de jazz perante a humanidade da sua Antiga da Gulbenkian. colaborou entre 1983 e 1986, Staier guitarra. Antes porque a sua música, desenvolveu posteriormente uma português regressa aos Cristina Fernandes que não tem palavras, não nos deixa brilhante carreira a solo, sem nunca palcos. Rodrigo Amado palavras que dizer. Sentidos negligenciar a música de câmara, Silêncio para despertos, seguimo-la e sorvemo-la. Andreas Staier destacando-se a sua colaboração Bernardo Sassetti Trio Norberto Lobo É isso que nos espera na Culturgest. com o violinista Daniel Sepec e com Com Bernardo Sassetti (piano), Para onde, porque isto anda tudo Lisboa. Fundação e Museu Calouste Gulbenkian - o violoncelista Jean-Guihen Queyras. Grande Auditório. Avenida de Berna, 45A. 3ª, 9, às Carlos Barreto (contrabaixo), Norberto Lobo ligado, Norberto Lobo convocou 19h. Tel.: 217823700. 12,5€ a 25€. Na sua discografia combinam-se Alexandre Frazão (bateria). Guilherme Canhão e Ian Carlo Ciclo de Música Antiga. Obras de universos tão diversos como os Lisboa. Culturgest - Pequeno Auditório. Rua Arco do Mendoza, que o acompanharão num virginalistas ingleses do século XVI e Lisboa. Centro Cultural de Belém - Grande Cego - Edifício da CGD. Hoje e amanhã, às 21h30. Bach. Auditório. Praça do Império. 4ª, 10, às 21h. Tel.: Tel.: 217905155. 5€ a 10€ . par de músicas. M.L. as sonatas de Schubert, as tocatas de 213612400. 5€ a 20€. Em Maio do ano 2000, Andreas Bach e os concertos para piano de Há uma semana vimo-lo tocar no Staier apresentou uma memorável John Field, os ritmos do fandango Bernardo Sassetti é um dos músicos Museu do Chiado com os Tigrala, Libertinagem em interpretação das Variações espanhol — expressos num do jazz português com um percurso trio que o reúne ao guitarrista noite Enchufada Goldberg, de J. S. Bach, no Palácio electrizante CD que dedicou ao mais interessante, dedicando-se Guilherme Canhão, dos Lobster, e ao de Queluz, no âmbito dos concertos percussionista Ian Carlo Mendoza. Paus + Octa Push + DJ Riot Em Órbita/Portugal Telecom. Era a Nos Tigrala, Norberto Lobo não toca sua primeira visita a Portugal, à qual Porto. Plano B. R. Cândido dos Reis, 30. Hoje, às guitarra. Pega na tambura, 23h. Tel.: 222012500. 5€ a 7€. se seguiram muitas outras, tanto como intérprete de cravo como de A primeira festa foi ontem, no Lux, pianoforte. Passaram, no entanto, em Lisboa, com concerto dos Paus e quase dez anos até Staier se decidir a sessões DJ por J Wow e Macacos do registar em disco esta magnífica Chinês. Mas hoje, no Porto, há mais. obra de Bach, súmula das principais Falamos da sessão dupla de técnicas e estilos musicais do lançamento da compilação “É barroco e ponto supremo da arte da Spam”, pertencente à estrutura variação. A sua excelente gravação Enchufada, casa-mãe, entre outros, na Harmonia Mundi acaba de sair, dos Buraka Som Sistema. A mas no dia 9 teremos o privilégio de compilação reúne projectos ouvir Staier ao vivo na mesma obra oriundos de diversas famílias num dos recitais do Ciclo de Música estilísticas (Paus, Buraka Som Antiga da Gulbenkian. Esta será, de Sistema, Orelha Negra, Octa Push, DJ resto, uma semana de ouro para a A guitarra Znobia ou Youthless) e as noites música de Bach, uma vez que o de Norberto agoragg organizadas reflectem essa agrupamentogp Café Lobo vai voltar ddiversidade.iversidade. Os PausPaus,, novo e muito ZimmermannZimme realiza a ser um mundo, pprometedorrometedor projecto ddee tambémtambé na na Culturgest JJoaquimoaquim GulbenkianGulbe a integralinteg dos ConcertosCon BrandeburguesesBra (dias(di 7 e 11). Nascido em 1955,1 na cidade alemãa de Göttingen, O dubstep dos Octa Push é um dos ingredientes Andreas do “showcase” Enchufada no Plano B Staier iniciou

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 65 aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente Dona Chica, o novo projecto de Ana Deus, dá um “concerto performativo” no Villa Comunity, Porto

O “roque” dos Diabo na Cruz sobe ao Passos Manuel, no Porto Concertos

de corpo e alma a uma enorme edição de “Motion”, a editar de novo diversidade de projectos, entre eles pela portuguesa Clean Feed. Agenda o jazz, incluindo a música para Bernardo Sassetti no piano, Carlos cinema, de Leitão Barros a Anthony Barretto no contrabaixo e Alexandre Direcção Musical de Christoph Ana Moura Minguela ou José Álvaro Morais, ou Frazão na bateria: três músicos de sexta 5 König. Com Lisa Milne (soprano), Montemor-o-Novo. Cine-Teatro Curvo Semedo. Lg. ainda a busca recorrente de uma excepção que se complementam Tony Allen Birgit Remmert (meio-soprano). Dr. António José de Almeida, às 21h30. Tel.: Porto. Casa da Música - Sala Suggia. Pç. Mouzinho 266898104. Entrada gratuita. ligação consistente entre música e a melhor do que nunca neste trio, um de Albuquerque, às 18h. Tel.: 220120220. 20€. fotografia. No entanto, há algo de espaço privilegiado para a vida das Ressurreição - Obras de Mahler. Orquestra Regional Lira que muitos dos seus admiradores canções, aqui tratadas com Açoriana sentiam a falta, a magia da pura sensibilidade, imaginação e rigor, Tony Allen Direcção Musical de António Melo. Porto. Casa da Música - Sala 2. Pç. Mouzinho de Lisboa. Teatro Municipal de S. Luiz - Sala Principal. linguagem jazz registadastada em atratributosibutos a que se acacrescentar ainda Albuquerque, às 22h. Tel.: 220120220. 15€. R. Antº Maria Cardoso, 38-58, às 17h30. Tel.: “Nocturno”, disco históricohistórico editadoeditado aquiaquilolo que nnãoã é tangível, a 213257650. 5€. em 2002. Seguiram-se-se “Indigo”, magiamagia de uumam The Poppers Semana da Cultura Açoriana. Porto. Plano B. R. Cândido dos Reis, 30, às 0h. Tel.: “Ascent” e “Unreal: SidewalkSidewalk comunicaçãocomunicaçã musical 222012500. 12,5€. Cartoon”, e a músicaa nunca mais foifoi telepáticatelepática e de um trio que segunda 8 a mesma, estilhaçando-sendo-se em é muito mamaisi do que a Dona Chica Porto. Villa Community. Rua Doutor Magalhães Orquestra Polaca Sinfonia múltiplas direcções artísticas que simplessimp soma das Lemos, às 23h. Tel.: 912595882. 10€ a 15€. revelaram um músicoco inquieto, suassua partes. Iuventus Direcção Musical de Tadeusz sempre à procura dee novos João Coração Vila Nova de Famalicão - Café-Concerto. Casa das Tondela. Cine Tejá - Novo Ciclo ACERT - Auditório 1. Wojciechowski. Com Janusz desafios. Agora, oitoo anos Artes. Pq. de Sinçães, às 23h. Tel.: 252371297. 5€. R. Dr. Ricardo Mota, às 21h45. Tel.: 232814400. 15€. Olejniczak (piano). após “Nocturno”, o Lisboa. Centro Cultural de Belém - Grande Flak The Legendary Tiger Man Auditório. Praça do Império, às 21h. Tel.: trio de Bernardo Arcos de Valdevez. Casa das Artes. Jardim dos Lisboa. Cinema São Jorge - Sala 2. Av. Liberdade, 213612400. 5€ a 15€. Sassetti está de voltaa Centenários, às 23h. Tel.: 258520520. 12€. Bernardo Sassetti 175, às 0h. Tel.: 213103400. 10€. Obras de Beethoven, Chopin e aos palcos com dois Ciclo “Sexta, Meia Noite e uma Sons de Vez 2010. está de regresso Schumann. concertos, em Guitarra”. Lisboa Crónica Anedótica. a “Nocturno”, David Fonseca Solistas da Orquestra Lisboa (4ª, dia 10) e Oliveira de Azeméis. Cine-Teatro Caracas. Av. Dr. um álbum histórico Gulbenkian Porto (3ª, dia 16), Danças Ocultas António José de Almeida, às 21h30. Tel.: 256682408. do jazz português 15€. Lisboa. Fundação e Museu Calouste Gulbenkian - que antecedem a Guarda. Teatro Municipal da Guarda - Grande Auditório 2. Avenida de Berna, 45A, às 19h. Tel.: Auditório. Rua Batalha Reis, 12, às 21h30. Tel.: 217823700. 10€. 271205241. 7,5€. La La La Ressonance Guimarães. Centro Cultural Vila Flor - Café- Obras de Schumann e Martinú. Concerto. Avenida D. Afonso Henriques, 701, às 0h. Diabo Na Cruz Tel.: 253424700. 2,5€. Dany Silva + Maria Alice + Calú Porto. Passos Manuel. Rua Passos Manuel, 137, às Moreira + Ana Firmino 22h30. Tel.: 222058351. 10€. Ana Moura Lisboa. Maxime. Pç. Alegria, 58, às 22h. Tel.: Vila Real. Teatro de Vila Real - Grande Auditório. 213467090. 10€. Bunnyranch Alameda de Grasse, às 22h. Tel.: 259320000. 12€. Cabo Verde Aqui. Lisboa. Café Teatro Santiago Alquimista. R. Santiago, 19, às 0h. Tel.: 218884503. 6€. Construção Lisboa. Teatro Municipal de S. Luiz - Sala Principal. terça 9 Ana Moura R. Antº Maria Cardoso, 38-58, às 21h00. Tel.: Ovar. Centro de Arte de Ovar - Auditório. Rua 213257650. 8€ a 15€. La Traviata Arquitecto Januário Godinho, às 21h30. Tel.: Semana da Cultura Açoriana. Com Ópera Estatal Russa de Rostov. 256585451. 12,5€. Porto. Coliseu do Porto. R. Passos Manuel, 137, às Claudia Quintet 21h. Tel.: 223394947. 15€ a 48€. L’Occasione Fa il Ladro + Braga. Theatro Circo - Sala Principal. Av. Trouble in Tahiti Liberdade, 697, às 22h. Tel.: 253203800. 10€ (dia) a Direcção Musical de Moritz Gnann. 40€ (passe). quarta 10 Encenação de André Heller-Lopes. BragaJazz 2010. Com João Merino, João Oliveira, João The Cranberries + Outside Cipriano, Marco Alves dos Santos, Orquestra Angrajazz Royalty Raquel Alão, Ana Franco, Luisa Lisboa. Teatro Municipal de S. Luiz - Jardim de Lisboa. Praça de Touros do Campo Pequeno. Inverno. R. Antº Maria Cardoso, 38-58, às 23h30. Campo Pequeno, às 21h. Tel.: 217820575. 20€ a 36€. Francesconi. Tel.: 213257650. 5€. Lisboa. Teatro Nacional de São Carlos. Lg. S. Semana da Cultura Açoriana. Carlos, 17, às 20h. Tel.: 213253045. 5€ a 15€. quinta 11 Obras de Rossini e Bernstein. Soojin Moon e Orquestra Metropolitana de Lisboa PaGaGnini Álvaro Cabrera Barriola Direcção Musical de Eduardo Rahn. Com Ara Malikian (violino), Lisboa. Museu do Oriente - Auditório. Av. Brasília - Carcavelos. Auditório do Colégio Marista de Fernando Clemente (violino), Edifício Pedro Álvares Cabral - Doca de Alcântara Carcavelos. Av. dos Maristas, 175, às 17h. Tel.: Eduardo Ortega (violino), Gartxot Norte, às 21h30. Tel.: 213585200. 10€. 214585400. Ortiz (violoncelo). Viagem Musical na Viragem do Séc. Obras de Mozart. Lisboa. Teatro Municipal de S. Luiz - Sala Principal. XVII para o Séc. XVIII - De Ibéria a R. Antº Maria Cardoso, 38-58, às 21h. Tel.: Paris. 213257650. 12€ a 25€. domingo 7 Humores Cruzados. Soojin Moon e Orquestra Metropolitana de Lisboa OrchestrUtopica: Via Latina Carminho Direcção Musical de Joan Cerveró. Leiria. Teatro José Lúcio da Silva. R. Dr. Américo Direcção Musical de Eduardo Rahn. Cortez Pinto, às 21h30. Tel.: 244834117. 10€. Lisboa. Universidade Nova de Lisboa - Auditório da Com Grup Instrumental de València. Lisboa. Centro Culturalural de Belém - PePequenoqueno Reitoria. Campus de Campolide, às 21h00. Tel.: MelechMelech MMechayae 213715600. 10€ a 15€. Auditório. Praça do IImpério,mpério, às 1717h.h. TeTel.:l.: 213612400. 12,5€. Guarda.Guarda. TeaTeatrot Municipal da Guarda - Obras de Mozart. Obras de Orts, TinocoTinoco,, CCafé-Concerto.afé-Concer Rua Batalha Reis, 12, às Sotelo, Júlio Lopesopes e 222h.2h. Tel.: 2271205241. 4€. Jerry Bergonzi Trio CicloCicC lo dede Cultura Judaica da Matalón. Braga. Theatro Circo - Sala Principal. Av. Guarda.GuaG rda Liberdade, 697, às 22h. Tel.: 253203800. 10€ (dia) a Café Zimmermannrmann 40€ (passe). CaféCafé ZimmermannZ Direcção Musicalcal ddee BragaJazz 2010. DirecçãoDirec Musical de Pablo Valetti e CéCélineline CéCéline Frisch e Pablo Construção Frisch. Lisboa. Teatro Municipal de S. Luiz - Sala Principal. Lisboa. Fundação e MMuseuuseu ValValetti. R. Antº Maria Cardoso, 38-58, às 21h00. Tel.: Calouste Gulbenkiann - Lisboa.LisbL Fundação e Museu 213257650. 8€ a 15€. Grande Auditório. Avenidavenida CalousteCalo Gulbenkian - Grande Semana da Cultura Açoriana. de Berna, 45A, às 19h.h. Auditório.Audi Avenida de Berna, Tel.: 217823700. 20€€ a 45A, às 19h. Tel.: 217823700. 20€ 40€. a 40€.40€ sábado 6 Ciclo de Músicaa CicloCicl de Música Antiga. OObrasb de Bach. Orquestra Nacional do Porto e Antiga. Obras Ana Moura em digressão: Coro Gulbenkian de Bach. Ovar, Vila Real e Montemor-o-Novo

66 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon TOUR

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Pop como algo mais do que mero projecto musical, uma experiência total com um esqueleto de ideias e Os irmãos um imaginário visual próprios. Estão com um pé na cultura pop, no The Knife sentido de lhes interessar expor ideias sedutoras, mas ao mesmo tempo já estão noutra dimensão, na ópera onde o processo é tão importante como o resultado final. É daqueles discos que, O primeiro CD é mais desconcertante, sucessão de temas no mundo pop, costuma marcados por sons da natureza, ser mais debatido do que ambientes claustrofóbicos, vozes ouvido, mais admirado enigmáticas, investigação sónica que não cria muitas pontes com o ouvinte, do que amado. Vítor num primeiro momento, para de Belanciano seguida nos deixar entrever clarões, placidez, ruídos, gelo e ardor. “Get Yer Ya Ya’s Out”: documento perfeito dos Stones O segundo CD aproxima-se mais The Knife enquanto “melhor banda rock’n’roll do mundo” de algumas formas reconhecíveis na Tomorrow, In An Year música dos The Knife: ritmos álbum ao vivo da história do explicado no lento crescendo a meio

Discos Mute, distri. PopStock obsessivos em câmara lenta, rock’n’roll. Escreveu-o em 1970, um da viagem: Mick provocando o mmmmn sugestões plásticas metalizadas, ano depois do concerto a que ele se público, público respondendo à ambientes neuróticos, estranhas reporta, e para o caso interessa-nos provocação, e a banda a reconduzi-los Quem entrar em vozes vindas não se sabe bem de mais a sua argumentação que a ao trilho daquele riff sujo e “Tomorrow, In An onde, qualquer coisa onde proclamação. persistente, imenso. Year” à espera de coexistem impulsos maquinais e um Em 1970 – em 1970, note-se -, Bangs A reedição de “Get Yer Ya Ya’s Out!” reconhecer as torpor humano, tão fascinante defendia que, perante uma cena tem a inteligência de nos oferecer o vozes inumanas, a quanto inquietante. musical crescentemente anódina e quadro completo do momento. Para electrónica glacial É daqueles discos que, no mundo maneirenta, os Stones continuavam a além do CD com o alinhamento e a realidade pós-pop, pós-tecno e pop, normalmente pelas piores ser a banda capaz de transportar uma original, temos um curto DVD, pós-industrial erguida no álbum razões, costuma ser mais debatido noção de risco e de transgressão para recuperado dos arquivos dos irmãos “” (2006) pelos irmãos do que ouvido, mais admirado do um palco. A Bangs não interessavam Maysles (os realizadores de “Gimme suecos Olof e Karin Dreijer, sairá que amado. Não é obra para se ouvir reproduções tecnicamente perfeitas Shelter”), com cinco canções e, nelas, inevitavelmente defraudado da em fundo, exige que mergulhemos das canções que se conhecem dos para além de cenas nos bastidores, em experiência. nela, como quem olha e ouve uma discos ou os fogos de vista que, pouco sessões fotográficas ou em conversa Este não é o sucessor desse ópera, não com esperança de após escrever aquele texto, Bangs com Jimi Hendrix, fixa-se a dimensão fabuloso álbum, nem da experiência compreender, mas de sentir. veria irromper mundo dentro na visual da banda: o melífluo Jagger de solitária de Karin, o ano passado, figura de coisas como uns Emerson roupa preta, o incendiário Keith de com a designação Fever Ray. É outra Lake & Palmer, banda que apreciava camisola vermelho-sangue. Junte-se a coisa. Um projecto especial, que Um documento interpretar versões rockeiras de eles um CD extra com as cinco começou num convite endereçado perfeito Tchaikovsky enquanto disparava canções incluídas no DVD e um outro pelo grupo dinamarquês de teatro canhões alinhados nos extremos do dedicado aos que antecederam os experimental Hotel Pro Forma, que Rolling Stones palco. Stones aquela noite: “Ladies and desafiou Olof e Karin a criar uma Os Stones, filhos bastardos do gentlemen”, a elegância blues de BB Get Yer Ya-Ya’s Out! ópera contemporânea, inspirada na ABKCO; distri. Universal blues, perversos libertadores da libido King e sua Lucille e o furacão de Ike e vida e obra de Darwin. da sua geração, não tinham canhões, sua Tina Turner (pouco inspirados Criada em colaboração com Mt. mmmmn não tinham outros artifícios para além nesta gravação, um furacão ainda Sims e Planningtorock – a que se do poder da sua própria música. E, assim). juntaram três vozes convidadas, a Num dos textos em “Get Yer Ya Ya’s Out”, vêmo-los, “Get Yer Ya Ya’s Out”, o álbum, era mezzo soprano Kristina Wahlin incluídos no livro pela última vez, como catalisadores já uma representação inatacável dos Momme, a actriz Laerke Bo Winther e que acompanha a das profundas transformações sociais Rolling Stones enquanto “melhor O grupo de teatro Hotel Jonathan Johansson – a ópera foi luxuosa reedição que aconteciam à sua volta. Pouco banda rock’n’roll do mundo” – Pro Forma desafi ou Olof estreada em Setembro. Surge agora, a de “Get Yer Ya Ya’s depois do concerto gravado para a naquele preciso momento histórico, e Karin a criar uma ópera música, mais de 90 minutos, em Out”, o mítico posteridade em Novembro de 1969, eram-no certamente. Esta reedição contemporânea, inspirada formato CD-duplo. crítico musical Lester Bangs aconteceria Altamont, a violência e a torna o álbum um documento na vida e obra de Darwin Os suecos sempre se afirmaram defende que este pode ser o melhor morte de Altamont, e os Stones não perfeito. mais seriam os mesmos. O fogo que os alimentava não mais “Get Yer Ya-Ya’s Out!” mostra uma queimaria da mesma forma e Mick banda que funciona como ponte Jagger sabia-o: “Não podemos feérica entre dois mundos: o dos continuar a fazer isto para sempre, bluesman e dos pioneiros rock’n’roll somos tão velhos”. Tinha 26 anos. que gostariam de ter sido e aquele que Mário Lopes eles mesmos ajudaram a moldar na década de 1960. Ou seja, ao lado do lamento blues para guitarra slide de Adenda a uma obra “Love in vain”, de Robert Johnson, ou magistral das palpitações de “Carol”, de Chuck Berry, estavam a euforia de “Jumpin’ Jimi Hendrix jack flash”, a abrir o concerto, e a pose Valleys Of Neptune confrontante de “Street fighting man”, Sony BMG que o encerrou. Entre um e outro, a “Midnight rambler” definitiva, mmmnn infinitamente melhor que a versão de estúdio de “Let It Bleed”, longa de dez Chamar a “Valleys Of Neptune” um minutos e perfeição blues onde o álbum póstumo de Jimi Hendrix, o elo blues já é uma outra coisa. Tudo perdido entre “Electric Ladyland”, É o álbum sereno dos Gorillaz; e excessivamente discreto seria não se desse o caso de ser povoado de um par de sobressaltos Toro Y Moi: fantasmas da música popular, retalhados e transformados em algo de novo, novamente pop

Jimi Hendrix: não mais que adenda pop”pop” da carreira de Albarn seria tarefa há uma brincadeira descartável dos bicéfalo como é, obriga-nos a voltar a uma obra magistral virtualmente impossível). De La Soul com Gruff Rhys, chama- a ele uma e outra vez. Não tanto pelo Genericamente, “Plastic Beach” da “Superfast jellyfish”, que soa a prazer de o ouvir como pela necessi- é aquilo a que a banda virtual nos anúncio publicitário dos tempos de dade de desfazer uma dúvida. Esta: habituou – pedaços de hip hop, fumos “3 Feet High And Rising” – e temos “Plastic Beach” é intrigante ou sim- dub, refrães no sítio certo e espírito de Lou Reed a avançar meio trôpego plesmente frustante? M.L. festa no clube. A principal diferença por nova balada para piano: a doçura reside em tudo acontecer a um ritmo da melodia infantil de “Some kind of mais pausado (nada de bombas como nature” deve ter deixado confuso o Metapop “Dare” para êxtase comunal). velho resmungão. Antes, a música dos Gorillaz era “Plastic Beach” é o álbum sereno Toro Y Moi absurdamente imediata. Agora, na dos Gorillaz. E excessivamente dis- Causers of This insularidade de “Plastic Beach”, creto seria não se desse o caso de ser Carpark, distri. Flur exige mais (e, arriscamos, desapon- povoado de um par de sobressaltos. ta mais). Arranca em grande, com A saber: Mark E Smith a balbuciar mmmnn Snoop Dogg a espalhar o seu “flow” coisas incompreensíveis sobre uma narcótico sobre G-funk e órgão Far- cavalgada digital que entusiasma “Causers of This”, o fisa (primeiras palavras: “the revolu- (“Glitter freeze”) e Mos Def a surgir primeiro álbum de tion will be televised”) e com Bashy e em nuvem de fumo de marijuana pa- Chaz Bundick com Kano, em “White flag”, a irromperem ra libertar um “flow” infernal sobre maior exposição, com grime de grande orçamento pela a batida neurótica de “Sweepstakes”: sintetiza algumas último de originais considerar “Valleys Of Neptune” opulência da libanesa National Or- é a faixa-marada, faixa-maior do ál- das tendências editado em vida, e sequer próximo de essencial. chestra For Arabic Music – o encon- bum, com metais bêbados, baterias a dominantes da música independente “First Days Of The Além de haver aqui muito que já tro fluído entre esses dois universos entrar em convulsão breakbeat e Mos em 2009. “Chillwave”, “hypnagogic New Rising Sun”, o ouvimos (em versões diferentes, é origina uma das melhores canções Def a sobrevoar todo esse magnífico pop” e “glo-fi” foram alguns dos primeiro póstumo, certo, mas de quantas versões de do álbum. Depois, há Damon Albarn delírio. rótulos que os jornalistas aventaram aquele em que “Fire” precisa o mundo para girar?), como baladeiro pós-apocalíptico, com Não fossem pedaços como aqueles face a artistas que revolveram em trabalhava quando da sua morte, é falta-lhe uma dimensão essencial. A guitarra acústica substituída por de- e o relax introspectivo de “Plastic memórias fugidias da infância (os anos manifestamente exagerado. Certo que música de Hendrix não brotava tritos tecnológicos (“Empire ants”), Beach” seria uma desilusão. Assim, 80 da MTV, de Michael Jackson e é um disco de doze canções, nenhuma apenas do seu talento como das quais antes editadas, gravadas guitarrista, mas também de uma num período específico de tempo em imaginação transbordante e de uma 1969. Mas não é um álbum no sentido veia experimentalista que o levava a em que o são “Are You Experienced?”, utilizar o estúdio, e os sons que era “Axis: Bold As Love” ou “Electric possível criar em estúdio, como um Ladyland”. outro instrumento – tal estava “Valleys Of Neptune” agrupa um presente, de resto, desde o início, na par de inéditos (“Valleys of neptune” e fundadora “Are you experienced?” “Ships passing through the night”) a Como “Valleys Of Neptune” é, versões de Elmore James (“Bleeding essencialmente, uma crónica de 23 MAR heart”) e dos Cream (“Sunshine of ensaios, essa dimensão está TER 19:30 SALA SUGGIA | € 10 your love”) e a novas leituras de obrigatoriamente ausente. “standards” do catálogo Hendrixiano Num momento em que, PETER RUNDEL direcção musical (“Stone free”, “Fire”, “Red house”). paralelamente, vemos reeditada a RUI HORTA direcção cénica, desenho No fundo, trata-se de mais uma discografia de Hendrix, o “álbum de luz e multimédia compilação, sem nada de revelador. póstumo” será não mais que adenda a Guilherme Martins design multimédia Maxime Le Saux engenheiro de som IRCAM “Red house” surge em versão mais uma obra magistral. M.L. Martin Antiphon técnico de som IRCAM lenta, que já conhecemos de Roque Rivas realização informática milhentos álbuns ao vivo. “Stone musical IRCAM Free” mantém-se bastante próxima da Gorillaz bicéfalos canção editada como lado B de “Hey John Cage Sixteen Dances Carlos Caires All-in-one, para Joe!”, o primeiro single de Hendrix. E Gorillaz “Valleys of neptune”, anunciada como ensemble e electrónica ¹ Plastic Beach Roque Rivas About Cages, assemblage a grande pérola da colecção, é um EMI Music número blues sem particular para piano, ensemble e electrónica ² Bruno Mantovani ...2 7 3 ... ¹ inspiração (pelo ambiente sonoro e mmmnn John Cage/Christian Marclay pelo pendor cósmico da letra, (adaptação) 4’33’’ ¹ diríamos que poderia ser presença Damon Albarn James Dillon Torii ¹ discreta num alinhamento alternativo manifestou o desejo do épico “Electric Ladyland”). de fazer de “Plastic Co-produção Casa da Música, Festival Musica Claro que, falando de Hendrix, Beach” o álbum de Estrasburgo, IRCAM/Les spectacles vivants - Centre Pompidou e Ars Musica de Bruxelas génio absoluto, ainda para mais mais pop que no âmbito do Réseau Varèse:subvencionado pelo acompanhado pela Experience de alguma vez criou. Programa Cultura 2000 da União Europeia.

Mitch Mitchell e Noel Redding, a Mas um álbum pop, precisou, ¹Estreia mundial; encomendas da Casa da Música formação que mais potenciou o arrojo enformado pelo peso da experiência ²Estreia mundial; encomenda do IRCAM - Centre Pompidou e a liberdade da sua música, há espaço (41 anos) e por toda a música que Outras apresentações: para deslumbramento. Acontece descobriu desde que se abriu ao 25 MAR 19:00 | Paris, França IRCAM – Grande Salle du Centre Pompidou quando o coração é todo ele blues: na mundo (da música africana de Mali 27 MAR 19:00 | Bruxelas, Bélgica versão de “Bleeding Heart”, Music à investida pela China de Festival Ars Musica transformada em excitação funk que o “Monkey: Journey To The West”). O futuro, via Funkadelic, trataria de resultado não condiz com a intenção. MECENAS CASA DA MÚSICA APOIO INSTITUCIONAL MECENAS PRINCIPAL CASA DA MÚSICA aproveitar, e em “Hear my train a De resto, dificilmente poderia comin’”, presença habitual nos condizer. Basta olhar para os concertos do período e que é em convidados: Snoop Dogg, Bobby Hendrix a visão definitiva do blues Womack, Kano, De La Soul, Paul enquanto dor de vida erguida a Simonon e Mick Jones, Lou Reed e SEJA UM DOS PRIMEIROS A APRESENTAR HOJE ESTE JORNAL NA CASA DA MÚSICA E GANHE UM CONVITE DUPLO PARA poderosa arma sensual. Tal, contudo, Mark E. Smith (conseguir com esta 4’33’’ (TRIBUTO A JOHN CAGE). OFERTA LIMITADA AOS PRIMEIROS 10 LEITORES. é manifestamente pouco para conjugação de estrelas o “álbum mais

Ípsilon • Sexta-feira 5 Março 2010 • 69 aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente Discos

Chicago Underground duo: música directa e orgânica, que evoca a mais profunda espiritualidade jazz

LoneLady: uma sonoridade límpida e tonifi cante

“Miami Vice”) e um ideal de “Verão sacadas à “playlist” da VH1, mas distingue nono bateristabaterista pelopelo grupogrupo ddee eterno” (férias grandes, surf, amores desfiguradas suavemente por meio da que aqui se desdobra músicos inconsequentes) para criar música, Bundick, cujas técnicas de multidão de nos papeis de compositor e convidados pelo algures entre o sonho e a glorificação manipulação de “samples” lembram discos que todas as manipulador electrónico, sempre sob baterista. O da vida banal. Com esse material, há artistas hip-hop como Prefuse 73. Em semanas são postos a estruturação visionária de Mazurek, arranque acontece quem, como James Ferraro, faça “Low Shoulder”, os teclados pirosos na prateleira do também ele com um papel com “Tralhoada”, música desafiante; outros, como Toro encontram uma graciosa segunda vida supermercado da actualidade pop. É preponderante nas electrónicas do tema composto por Moniz com base Y Moi e Washed Out, preferem - coisa para meninos e meninas indie um álbum plano, sem nenhuma álbum. Construindo um universo num cante alentejano recolhido pelo produzir pop. Uma “metapop” poderem dançar sem vergonhas. canção que sobressaia, daqueles em futurista, fortemente pessoal, os dois etnólogo Michel Giacometti. É difícil (perdoem-nos o jargão teórico), já que Apesar dos bons atributos, que o ouvinte experimentado pode músicos apresentam um ficar indiferente ao trabalho de é habitada por múltiplos fantasmas da “Causers of This” nem sempre passar horas a identificar influências impressionante conjunto de 10 temas harmonização expresso nos acordes música popular, retalhados, mantém o nível (“You Hid” revela em (R.E.M. dos primórdios, B-52’s, New – 5 da autoria de Mazurek, 4 de do piano de Júlio Resende e ao modo revolvidos e transformados em algo demasia a fragilidade de Bundick Order, ESG, The Wire, Suicide ou Taylor, e ainda o clássico “Broken como o próprio cante é assim de novo, novamente pop. enquanto vocalista) e sente-se, por Gang Of Four), algumas delas Shadows” de Ornette Coleman. integrado na composição a que deu “Causers of This” não é um disco vezes, a falta de um fio condutor em assumidas pela própria, mas sem que Patilhando ambos uma linguagem origem. A nova melodia é depois revivalista. A faixa inaugural, “Blessa”, cada canção, que vivem, em demasia, chegue a uma conclusão plausível. fracturante e desassombrada, que exposta pelo roncante contrabaixo começa como se fosse uma canção de dos efeitos (como o omnipresente Numa primeira aproximação, é fácil evita sempre o óbvio, conduzem-nos de João Custódio e mais tarde “Person Pitch” de Panda Bear (um “reverb”) e de outros truques de conotá-la com a cultura anacrónica e por “grooves” poderosos, baladas desenvolvida pelo solo do guitarrista “loop” engolido pela reverberação, a estúdio. Pedro Rios derivativa vigente nos nossos dias. psicadélicas, duos de trompete e Mário Delgado. “Pacífico”, um mesma melancolia alegre de Noah Mas uma leitura mais atenta revela, bateria numa linguagem mais original do baterista que poderia ter Lennox), mas deriva, rapidamente, LoneLady afinal, um universo difícil de definir, assumidamente “avant jazz”, entre sido escrito por Carlos Paredes, para territórios pop. “Blessa” fixa logo algures entre a raiva controlada de PJ outros sons e ambientes que nos apresenta um solo fluído de Mário Nerve Up as características do resto do disco: a Warp, distri. Symbiose Harvey e a elegância idiossincrática de desafiam os sentidos e nos convidam Delgado, acompanhado com notável multiplicação da voz de Bundick em Grace Jones. É um disco solitário, feito a mergulhar fundo no seu universo musicalidade por Jorge Moniz, várias camadas e o prolongamento no mmmmn sem grandes recursos, rock que musical. Apesar de fortemente seguido de uma “cadenza” por Júlio éter das melodias simples que também é funk, nervoso mas sem baseada em “overdubbings” – Taylor Resende onde fica evidente a desenha nos teclados, no corta-e-cola Álbum estranho, o de estreia da chegar a ser dançável, feito de toca simultâneamente bateria e importância de Keith Jarrett e de de “samples” e na voz. “Lissoms” e britânica Julie Campbell, ou seja guitarras tensas, caixas de ritmo vibrafone ou mbira em algumas das Brad Mehldau na sua linguagem, “Fax Shadow” são canções pop sexy LoneLady. Aparentemente nada o minimalistas e uma voz eficiente que músicas, para além de todo o influências que o pianista aos poucos não se perde em maneirismos. processamento e sequenciação vai sacudindo após o regresso do Resultado? Uma sonoridade límpida e electrónica – esta é uma música contrabaixo e da bateria. Tocando tonificante. Vítor Belanciano directa e orgânica, que evoca a mais melódica e piano, Resende volta a profunda espiritualidade jazz. destacar-se naquele que é o único não original do disco, “La fuente e la Jazz campana”, de Federico Mompou, Deambula- tema marcado pelo guitarrista com aquele que é talvez o mais arrepiante Boca negra! momento improvisado de todo o ções com disco. Brilhante novo álbum Os convidados Hugo Alves e Carlos rumo Barretto contribuem com da constelação Chicago interessantes improvisações em Underground, projecto “Alburrica”, mas o contrabaixista Contrariando o título deste mutante liderado pelo brilha também, em solo absoluto, na registo, o baterista Jorge introdução de “Em viagem”, trompetista Rob Mazurek. Moniz estreia-se em disco composição com duas excelentes Rodrigo Amado improvisações, no piano e na com uma direcção musical guitarra, a primeira das quais clara e bem definida. Paulo Chicago Underground Duo enriquecida pelos efeitos texturais de Delgado. Embora contando com Boca Negra Barbosa Thrill Jockey, dist. Mbari uma notável prestação de Hugo Jorge Moniz Alves, “Arábico” será o tema menos cativante do álbum, mas já a mmmmn Deambulações Ed. Autor agitação de “Hora de ponta”, onde a Da mente guitarra e a bateria andam perto do caleidoscópica de mmmmn “groove” de John Scofield com os Rob Mazurek têm Medeski, Martin & Wood, traz mais saído alguns dos “Deambulações” é o resultado da uma prova de que, embora mais interessantes elaborada concepção musical de atraiçoando o título do álbum, Jorge projectos dos Jorge Moniz e do extremo cuidado Moniz tem propósitos bem definidos últimos anos. De todos, são aqueles com que esta foi colocada em prática para a sua música. associados à constelação Chicago Underground – em orquestra, quarteto, trio ou duo - os que têm maior notoriedade, talvez pelo notável equilíbrio alcançado entre jazz, rock alternativo, electrónica ou pura e simples experimentação musical. Mazurek, um dos compositores e trompetistas jazz que mais escapa a classificações, possui uma rara capacidade para incorporar elementos das mais variadas tipologias musicais, integrando-os num todo vibrante, elegante, e surpreendentemente consistente. É disso exemplo “Boca Negra”, Jorge Moniz tem propósitos bem defi nidos registado em duo com Chad Taylor, para a sua música

70 • Sexta-feira 5 Março 2010 • Ípsilon existente.

VENDA EXCEPCIONAL NO SçBADO 6 MAR‚O

sŽrie ’psilon II Filmes premiados para os amantes da sŽtima arte. S‡bado, dia 6 de Maro, o DVD ÒWe DonÕt Live Here AnymoreÓ, de John Curran. Sundance Film Festival 2004 Waldo Salt Screenwriting Award á Larry Gross

Por motivos alheios ao Pœblico, o t’tulo ÒTessÓ, com data prevista de lanamento para o dia 5 de Maro, In’cio da Colec‹o: 15/01/2010 á Fim da Colec‹o: 28/05/2010 á Preo total da colec‹o: Û39 Promo‹o limitada ao stock In’cio da Colec‹o: 15/01/2010 á Fim 28/05/2010 ser‡ substitu’do pelo filme WE DONÕT LIVE HERE ANYMORE, de John Curran.