A Revista Illustrada E Os a Iversários Da Abolição Dos Escravos Os a Os 1890
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COMEMORADO A LIBERDADE: A REVISTA ILLUSTRADA E OS AIVERSÁRIOS DA ABOLIÇÃO DOS ESCRAVOS OS AOS 1890 Aristeu Elisandro Machado Lopes1 Considerações iniciais Em janeiro de 1876 Angelo Agostini, um dos caricaturistas atuantes na imprensa ilustrada do Rio de Janeiro, lançava o periódico Revista Illustrada. Agostini já havia dado demonstrações de seu talento para o desenho de humor com ilustrações em outros periódicos. Iniciou em São Paulo com os periódicos Diabo Coxo (1864-1865) e Cabrião (1865-1867). Já na capital do Império, logo após sua chegada em 1867, contribuiu em O Arlequim, transformado em A Vida Fluminense. Neste periódico se manteve até 1871 quando, então, seus desenhos passaram a surgir em O Mosquito, do qual se retirou para lançar a Revista. O novo periódico de Agostini logo alcançou sucesso e se manteve circulando no Rio de Janeiro até 1898. Ao longo de sua atuação como caricaturista Agostini se dedicou a campanha pela Abolição dos Escravos veiculando ilustrações que tratavam da situação dos escravizados no Brasil2. Atuou ao lado de importantes abolicionistas como Joaquim Nabuco, o qual declarou ser a Revista uma bíblia abolicionista3. Em seguida, Agostini se mudaria para Paris, uma viagem de aperfeiçoamento e descanso, conforme noticiava o periódico; contudo, o caricaturista deixava a esposa no Brasil e viajava com a sua estudante de desenho Abgail de Andrade, que era sua amante e estava grávida4. 1 Doutor em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Professor Adjunto do Departamento de História e do Programa de Pós-Graduação Mestrado em História da Universidade Federal de Pelotas. E-mail: [email protected] 2 Um exemplo da atuação de Agostini pode ser conferida na ilustração “De volta do Paraguai” pública em O Mosquito em 11/07/1870. Uma excelente análise da ilustração no que se refere as condições dos escravos na Guerra do Paraguai foi realizada por BALABAN, Marcelo. Poeta do Lápis. Sátira e política na trajetória de Angelo Agostini no Brasil Imperial (1864-1888). São Paulo: Editora da UNICAMP, 2009, p.108. 3 A declaração de Nabuco sobre o papel da Revista Illustrada foi analisada por BALABAN, Marcelo. Poeta do Lápis. Sátira e política na trajetória de Angelo Agostini no Brasil Imperial (1864-1888). São Paulo: Editora da UNICAMP, 2009, p.52 e seguintes. 4 A viagem de Agostini para Paris foi tratada em: LOPES, Aristeu E.M.. Dois caricaturistas entre a memória e o esquecimento: Angelo Agostini (1843-1910) e Eduardo Chapon (1852-1903). Revista Estudios Históricos. 1 Já a outra campanha que teve seu desenvolvimento, sobretudo, no final dos anos 1880, aquela pela República, não mereceu do caricaturista o mesmo destaque dado a abolicionista5. No entanto, a campanha republicana surgiu nas páginas do periódico ao longo de todo o período em que circulou. Até a Abolição dos Escravos adotou uma postura moderada e em certos momentos simpática a causa dos republicanos. No final dos anos 1870, por exemplo, Agostini confeccionou ilustrações que homenageavam os principais propagadores republicanos, Quintino Bocaiúva e Joaquim Saldanha Marinho. Tal posição amigável se modificou com o fim da escravidão uma vez que o periódico passou a criticar os republicanos. O tom ameno e simpático se tornou combativo, sobretudo, aos “republicanos de 14 de maio” denominação dada pelo periódico aos adesistas republicanos descontentes com o fim da escravidão6. O Partido Republicano foi assim descrito por Julio Verim, pseudônimo de Luiz de Andrade, redator e um dos proprietários do periódico, em janeiro de 1889: Vemos ainda o partido republicano pulando de um alçapão, como um diabo de mágica, tomar a lei de 13 de maio e colocá-la como uma isca numa ratoeira de adesões, falando ao ódio, ao despeito, as vinganças e apontando aos adversários – a guilhotina. Vemo-lo engrossar as suas fileiras e os seus rendimentos, com o enxurro das senzalas, sem escrúpulos de se nivelar com os capitães do mato de ontem, não escolhendo meios para chegar aos seus fins, numa palavra, um partido que se nutre do ódio a liberdade. (Revista Illustrada, 26/01/1889) A Revista Ilustrada somente se tornou simpática da causa republicana com a Proclamação da República em 1889 quando, então, passou a defender a nova situação política do Brasil: “Quem não quiser se conformar procure algumas das monarquias temporárias que existem sobre a terra, instale-se e seja muito feliz” (Revista Illustrada, 07/12/1889). A posição republicana adotada pelo periódico não impediu que os aniversários da Abolição dos Escravos fosse comemorada em suas páginas. As ilustrações relativas a data constituem o objetivo deste trabalho. Em outras palavras, pretende-se analisar como o periódico abordou, nos primeiros anos da República, uma conquista protagonizada pela Monarquia. Os desenhos dedicados a data, contudo, procuravam associá-la com a República ao mesmo tempo que a enalteciam. É possível considerar que a forma de abordar a Abolição, relacionando-a com a República, foi uma maneira encontrada pelos Rivera/Uruguay, nº3, dezembro de 2009, p.01-23. Disponível em: www.estudioshistoricos.org Acessado em: 18/02/2011. 5 A campanha republicana iniciou oficialmente no Rio de Janeiro com a fundação do Partido Republicano em 1870. No início dos anos 1880 refreou devido ao retorno dos liberais ao poder para, então, ser retomada no final dos anos 1880. BOEHRER, George C. A. Da Monarquia à República: história do partido republicano no Brasil. Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 2000. 6 As mudanças nas abordagens direcionadas à questão republicana veiculadas na Revista Illustrada foram analisadas em: LOPES, Aristeu E. M.. A República e seus símbolos: a imprensa ilustrada e o ideário republicano. Rio de Janeiro, 1868-1903. Porto Alegre: UFRGS, 2010. (Tese de Doutorado em História) 2 redatores do periódico de associar o seu passado abolicionista com um outro – inventado – republicano. As comemorações da liberdade dos escravos veiculadas nas ilustrações da Revista Illustrada nos anos 1890 analisadas no desenvolvimento deste trabalho, demonstram essa tentativa7. A Revista Illustrada, a República e os aniversários da Abolição dos Escravos A Revista Illustrada adentrava a década de 1890 ressaltando os feitos do governo provisório liderado pelo Marechal Deodoro da Fonseca já no seu primeiro número de janeiro. A crônica de Julio Verim da página dois destacava a separação da Igreja e do Estado e o aumento dos soldos dos militares. O texto colocava que as promoções dadas aos oficiais do exército eram consideradas uma contemplação ao mérito pelos serviços prestados à República. O texto finalizava com “Um bravo à República pelo modo intrépido e desassombrado com que vai caminhando em conquista ao futuro” (Revista Illustrada, janeiro de 1890). Ele passou a adotar em suas crônicas uma posição diferente daquela defendida até pouco tempo nas linhas de sua coluna como visto na passagem citada acima e publicada um ano antes dessa. Se antes aproveitava o espaço para criticar os republicanos, posição que somente mudaria com a Proclamação da República, agora ele passou a enfatizar no seu texto os feitos e as conquistas dos republicanos. Ainda, contrariam aqueles que eram desfavoráveis ao novo regime: “Proclamando-se a República, esses sebastianistas8 de todos os tempos, ontem escravocratas e hoje imperialistas, põem a boca no mundo e dizem que estão sem garantias, que isto não é governo e que se eterniza o governo da ditadura”. Julio Verim destacava em seu texto novamente a questão da Abolição da Escravatura e acusava os ex-escravocratas de agora, perante o novo regime republicano, de se tornarem imperialistas. O texto é importante por demonstrar a mudança nas posições do redator, o que também direcionavam as ilustrações e a opinião do periódico. Na época do Império, depois da Abolição da Escravatura, o jornal passou a recriminar os republicanos por aceitarem, em suas fileiras, ex-senhores de escravos que faziam suas adesões somente para 7 A Revista comemorou o primeiro aniversário da Abolição dos Escravos em maio de 1889, no entanto, optou-se por tratar somente dos aniversários nos anos 1890 durante o regime republicano. 8 Sebastianismo se refere ao rei português Dom Sebastião (1554-1578) que desapareceu durante uma expedição contra os muçulmanos do norte da África. Como o corpo do rei nunca foi encontrado, acabou proporcionando o mito que ele retornaria para ocupar o seu lugar. Sobre o sebastianismo no Brasil ver: GODOY, Marcio Honório de. Dom Sebastião no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 2005. Assim, o termo “sebastianistas” empregado no texto do periódico fazia uma referência aos que defendiam o retorno da Monarquia no Brasil. Já em relação aos defensores da Monarquia nos primeiros anos da República consultar: JANOTTI, Maria de Lourdes Mônaco. Os subversivos da República. São Paulo: Brasiliense, 1986. 3 se contraporem à Monarquia e exigirem o pagamento de indenizações pela liberdade dos ex-escravos9. Na nova situação política, na época da República, o tom da crítica do jornal mudou: se antes os escravagistas eram admoestados por apoiarem a República, agora foram rechaçados por se colocarem como seus opositores. A Revista, assim, mantinha uma parte de sua crítica anterior, em outras palavras, antes eram os republicanos escravocratas os criticados, agora, eram os monarquistas escravocratas. Já a defesa da forma atual de governo, a República, se mantinha, mas os seus adversários imperialistas eram rechaçados da mesma forma que antes os adeptos republicanos oriundos dos meios da escravidão o foram, por apoiarem a campanha republicana e serem contra a Monarquia. Assim, a crítica aos escravocratas foi mantida, enquanto à dirigida a forma republicana de governo mudou. É provável que uma parte dos chamados de imperialistas pelo jornal era a mesma que antes cobrava providências da Monarquia em relação aos pagamentos de suas indenizações. Sob a República, os mesmos se posicionavam contrários a ela, especialmente pelo medo de perderem outros privilégios além dos escravos que o regime anterior tinha lhes tirado.