Dez. 2017 ISSN 1984-2155 Fundada em 2008 Edição 7

LaJedoS Volume 5 I Número 1 revista espeleológica nordestina www.espeleonordeste.org

- ESPELEOAMIGOS: ITUAÇU 2017 - BINAEL SOARES SANTOS - - ANTIGOS EQUIPAMENTOS PETZL - - PROSPECÇÕES E MAPEAMENTOS EM MARTINS/RN - Lajedos I Dez. 2017 I Volume 5 I Número 1 I Edição 7 I www.espeleonordeste.org Revista Lajedos I Dez. 2017 I www.espeleonordeste.org

Editorial A Espeleo do Nordeste em festa!

oda Espeleologia é festa. Pode ser estudo, descober- ta, exploração, até mesmo risco, perigo, surpresa, Editorial sorte, força, medo, suor, sujeira... Enfim, milhares Pág. 03 T de outras coisas também! Mas nada disso subsiste sem a Espeleoamigos: Ituaçu 2017 festa. Sem o prazer que somente se sente quando se ca- Por Daivisson B. Santos e Nei A. Gondim Jr. Pág. 04 verna, quando o encanto é inexplicável e aquela sensação Binael Soares Santos: Um professor, um – que só se sente na caverna – faz esquecer a dor física, o biólogo, um amigo cansaço ou as obrigações que existem lá fora. Por Elvis Pereira Barbosa Em 2017, a nossa espeleo comemorou a sexta edição Pág. 14 do Espeleoamigos. Essa enorme festa, que reúne as pessoas Le Système d´Éclairage: Antigos capacetes e mais caverneiras do Nordeste para, unicamente, celebrar a carbureteiras Petzl Capa: Lapa do Bode, Ituaçu/BA - Brasil. Por Solon R. Almeida Netto, David C. Cardo- amizade (e somente isso)! Consolidou, ainda, o evento que Imagem produzida durante o projeto Ca- so da Silva e Ericson Cernawsky Igual nasceu em /BA e hoje já se assenta como patri- Pág. 22 vernas da Chapada, em jul./2017 (capa). mônio de todos nós. Seu palco nesse ano não poderia ter sido Prospeções e Mapeamentos Autoria: Solon Almeida Netto. Acima, Espeleológicos: Serra de Martins/RN participantes do Espeleoamigos na entrada melhor escolhido: Ituaçu/BA, um lugar que cada vez se reve- Por Solon A. Netto, M. Kramer, Jan Pierre M. da Lapa do Bode, Ituaçu/BA. Ao lado, arte la a terra da mais genuína e melhor Espeleologia que se faz Araújo, Allison Santos, José Ayrton Silva, G. Szilagyi, J. das Virgens Neto e G. Basílio. digital produzida a partir de uma fotogra- em nossa região: simples, pé no chão, sem políticas ou brigas Pág. 44 fia de capacete Petzl fabricado na década motivadas por nada daquilo que não seja – essencialmente – Notas e Referências de 1970. espeleológico. E, para ser melhor, foi organizado pelo Grupo Pág. 84 Araras de Espeleologia – GAE, os caras que vão receber o IV Encontro Nordestino de Espeleologia, em 2018! LAJEDOS Lajedos é uma publicação eletrônica, criada Chegamos à sétima edição da Lajedos cheios de fé em Revista espeleológica nordestina em abril de 2008, à divulgação e preservação ISSN 1984-2155 do patrimônio espeleológico e do carste. É nós mesmos. Não temos certeza dos caminhos desses abis- [email protected] mantida pela ação voluntária de colaborado- mos que equipamos, mas nossa fé em nossos amigos caver- res. A opinião dos autores não reflete as posi- Comissão Editorial: neiros do Nordeste é absoluta. Verdadeiramente, sob nossos Espeleonordeste ções da publicação ou dos parceiros. Proibido Sociedade Nordestina de Espeleologia o uso desta publicação para fins comerciais, pés, há um único Nordeste! Juntos, somos um único grupo! sendo livre a divulgação, desde que citada a fonte. A violação dos direitos de autor é crime Pela Comissão Editorial, prevista no artigo 184 do Código Penal Brasi- Solon R. Almeida Netto leiro. Leia, critique, elogie, participe! ~ 2 ~ ~ 3 ~ Espeleoamigos: Ituaçu 2017 Revista Lajedos I Dez. 2017 I www.espeleonordeste.org

Espeleoamigos: Os pés molhados sobre a terra enxuta Ituaçu 2017 Chupando manga na beira do rio Sou natural da gruta da Mangabeira Texto Daivisson Batista Santos Sou de barranco, de beira de rio Espeleonordeste - Soc. Nordestina de Espeleologia Canto e assobio Archaios Logos Nei Alves Gondim Júnior Desabafo e Desafio (Moreira, 1975). Grupo Araras de Espeleologia - GAE

Fotos licença poética, em seu sentido Daivisson Batista Santos mais amplo, permite que opiniões, Espeleonordeste - Soc. Nordestina de Espeleologia Archaios Logos afirmações, teorias e situações, Nei Alves Gondim Júnior A que não seriam aceitáveis fora do campo da Grupo Araras de Espeleologia - GAE Célio dos Santos Andrade literatura, sejam concedidas aos artistas. O Grupo Araras de Espeleologia - GAE município de Ituaçu/BA, terra dos poetas Elvis Pereira Barbosa Departamento de Filosofia e Ciências Humanas e músicos Gilberto Gil e Moraes Moreira, Universidade Estadual de Santa Cruz - UESC inspira cultura, imaginação, devoção e fé, Mário André Trindade Dantas com o gosto de uma brisa leve que vem do Instituto Multidisciplinar em Saúde Universidade Federal da - UFBA alto da Chapada Diamantina. Com essas inspirações poéticas foi realizada a sexta edição do Espeleoamigos, em Ituaçu, entre os dias 01 e 03 de dezem- bro de 2017, que teve como premissa inicial compartilhar conhecimentos, afinar as ideias sobre a Espeleologia no contexto atual e pro- Espeleoamigos 2017. O evento reu- mover a integração dos grupos, além, é cla- niu grupos de Espeleologia em Itua- ro, da confraternização entre os apaixonados çu/BA, havendo servido para fomen- por cavernas, contando com a presença de tar laços e parcerias. Igualmente, foi espeleólogos cientistas, estudantes e aman- um período ao GAE - Grupo Araras tes das cavidades naturais subterrâneas. O - para testar a organização ao IV Grupo Araras de Espeleologia - GAE recep- ENE, que será realizado no mesmo cionou, com o carinho e a generosidade de local, entre jun./jul. 2018. sempre, os espeleólogos nordestinos.

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Mas de onde veio a motivação para levar o Espeleoamigos a Ituaçu? Ou me- lhor: por que escolher ao evento um lugar que, praticamente, ninguém da espeleo brasileira ouviu falar? A resposta a essa pergunta (e a todas que dela derivam) remonta a edição do III Encontro Nordestino de Espeleologia – Ira- quara 2016, quando houve a marcante pre- sença de uma delegação do Grupo Araras, oportunidade na qual uma parcela significa- tiva de pessoas, que vivencia a espeleo no Nordeste do Brasil, pôde conhecer (talvez) os mais entusiasmados caverneiros do mun- do! E quando esse pessoal invadiu , dizendo que havia um lugar especial no sul da Chapada Diamantina, cheio de novas ca- vernas, de abismos para equipar, de muita serra para subir e mato para cortar... Não! Hoje sabemos que eles estavam sendo mo- Rico patrimônio. O patrimônio es- destos, porque Ituaçu é muito maior do que peleológico de Ituaçu/BA é composto qualquer história que possamos contar. por cavernas muito ornamentadas, De início, deve-se entender que não nas quais é fácil encontrar fósseis se faz Espeleologia em Ituaçu dissociando e evidências de uma rica Biologia as cavernas da rica história de seus sítios. E Subterrânea. Para além de grutas isso não desmente a impressão inicial que muito visitadas, como a Mangabeira, fica a qualquer visitante que bate o primeiro há também sítios nunca explorados, spit por lá. A parte antiga da cidade é com- o que só reforça a necessidade de posta por uma estrutura bem preservada, conservação e aprofundamento de com rico casario colonial, assentado por estudos e documentação. (Imagem: ruas antigas e praças muito bem cuidadas e Solon Almeida Netto, jul. 2017). arborizadas. O patrimônio arquitetônico e

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cultural local é produto de épocas remotas, de agosto e começo de setembro, quando o em que a colonização se iniciou em fins do culto atinge seu ápice e as gotas que ema- séc. XVII, trazida pelo Rio das Contas, e in- nam dos espeleotemas e paredes da caverna vadiu um lugarejo chamado Brejo Grande, se confundem com a fé, assumindo todos os conforme se diz que foi o primeiro nome do elementos abióticos da cavidade um caráter lugar. Mais tarde, virou paço para assistir à santo perante os fiéis. passagem de colunas de viajantes, minerado- Por tudo isso, a sexta edição do Espe- res e todos os que invadiam aquela região do leoamigos foi idealizada como uma opor- centro-sul da Bahia em busca das riquezas, tunidade de conhecer a Sinclinal Cárstica que relatavam haver na Chapada Diaman- de Ituaçu. Teve como objetivos a troca de tina. Cresceram e se solidificaram fazendas experiências no campo da espeleometria e como Ribeirão, Riachão, Palmeiras e outras, das técnicas verticais aplicadas à Espeleo- até que se fez o local como cidade, em 1897, logia e ao autorresgate. Contudo, para mui- quando nasceu, oficialmente, Ituaçu. to além, também foi pensada com um mo- Para além de tudo isso, a diversidade mento para debater e afinar a organização arqueológica e cultural da região permeou a do IV Encontro Nordestino de Espeleologia Formação Salitre, estando presente no cal- – Ituaçu 2018, que vem sendo maturado cário aflorante de lá, para impregnar com pelo Grupo Araras de Espeleologia desde Beleza cênica e espeleotemas. As cavernas de Ituaçu/BA guardam ricos vestígios, marcas e lendas, suas tantas grutas o início de 2017. Assim, foram convidados espeleotemas, salões amplos e grande diversidade cênica. Dentre os e abrigos. Há sítios com pinturas e formas os agrupamentos mais ativos do Nordeste, sítios, destaca-se a Lapa do Bode, uma caverna muito expressiva, com variadas de grafismos coloridos, em tinta mas também, cientistas e pesquisadores de grande desenvolvimento de deposições minerais e volume das formas. ocre, que ilustram o potencial do conjunto universidades da região, pois da integra- Alternam-se estruturas muito frágeis com pesados escorrimentos e colu- espeleológico do qual tão pouco ainda se ção desses diferentes atores, espera-se que nas, o que compõe um valioso conjunto espeleológico ao carste da re- sabe. No tocante, igualmente, aos atributos resultados diversos sobejem a trabalhos gião (Imagem: Solon Almeida Netto, jul. 2017). culturais modernos, há locais como a Gruta que são de extrema importância ao co- da Mangabeira, que pode ser resumida, em nhecimento do carste ituaçuense, tanto ao poucas linhas, como um dos maiores tem- desenvolvimento do turismo local, como à plos católicos, situados em caverna, do Bra- criação de áreas de preservação. sil. A romaria anual ao Santuário do Sagrado O primeiro Espeleoamigos foi rea- Coração de Jesus, a denominação religiosa lizado em 2012, a partir da iniciativa do do lugar, atesta que dezenas de milhares de Grupo Mundo Subterrâneo de Espeleolo- pessoas atravessam seus condutos, no final gia - GMSE, sediado em Paripiranga/BA.

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Confraternização e troca de experiências. A grande virtude da proposta do Espeleoamigos é a troca de experiências de forma prática, em campo, além de, é claro, o fortalecimento das amizades. Trata-se de uma ação que beira o informal, o descontraído, em que o objetivo principal é reunir pessoas com o mesmo objetivo: cavernar. Na imagem, os participantes da edição 2017 no sítio arqueológico Caminho do Bode I (acima, à esq.).

Pensado como um intercâmbio anual e possibilitando aos presentes conhecer toda informal entre grupos espeleológicos pró- a extensão da Mangabeira. ximos, o evento foi, aos poucos, crescendo No segundo dia, o grupo se dirigiu à e continuou sendo realizado no mesmo Lapa do Bode, onde os participantes pro- município durante os anos de 2013 a 2015, moveram debates práticos e troca de conhe- quando os participantes entenderam a ne- cimentos espeleológicos, arqueológicos e cessidade de expansão da ação para outras paleontológicos. Também foi feita uma aná- regiões. Assim, em 2016, foi realizado pela lise sumária dos fósseis existentes no local. Sociedade Espeleológia Azimute - SEA, no À frente desses trabalhos, esteve o professor município de /BA. Mario Dantas, paleontólogo (UFBA – Vitó- Na edição de 2017, a abertura foi ria da Conquista) e sua equipe, que foram feita no salão de entrada da Gruta da acompanhados pelo, também paleontólogo, Mangabeira, onde foram também reali- Leonardo Morato (UFOB). Além da visita zadas as atividades de técnicas verticais, guiada pelos membros do GAE à Lapa do a apresentação do histórico dos trabalhos Bode, foi ainda realizada uma incursão ao espeleológicos em Ituaçu e a homenagem sítio arqueológico Caminho do Bode I. ao professor Binael Soares Santos (in me- A parte cultural do evento ficou a car- moriam), um dos pioneiros nos estudos da go da banda Pirilampos, composta pelos três quirópterofauna no município de Ituaçu. músicos da terra Batata, Amigo e Eduardo, Após, pôde-se fazer uma visita à gruta com contando com a participação especial de Ri- o guia credenciado William Santos Souza, cardo Marques e Chico Sá.

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Considerando as fragilidades e as peculiaridades que apresentam as cavernas do sul da Chapada Diamantina, tornam-se imprescindíveis ações de conservação do patrimônio espeleológico. Visando impul- sionar projetos voltados à conservação do arcabouço natural e cultural do município de Ituaçu, a sequência técnica de trabalhos do Espeleoamigos 2017, no período de 04 a 14 de dezembro de 2017, produziu mapas dos sítios arqueológicos conhecidos na re- gião da Serra das Araras. Esse trabalho só foi possível graças à parceria entre o Grupo Araras de Espeleologia - GAE, a Prefeitura de Ituaçu (através da Secretaria Municipal de Turismo, Cultura, Esporte e Lazer), o Projeto Cavernas da Chapada/Espeleonor- deste e a Archaios Logos Consultoria Cien- tífica. Como resultado final dessa etapa, foram trabalhados 07 (sete) sítios arqueoló- gicos na Serra das Araras. A herança deixada pelo VI Espe- leoamigos foi de momentos únicos e ines- quecíveis, de risadas e conversas cordiais que vivemos e que levaremos para sempre. Porém, para além disso, o legado foi de Troca de experiências e conhecimentos. O maior valor de reunir em campo pessoas com fortalecimento da Espeleologia nordestina formações tão distintas, mas interesses comuns e amor pelas formações cársticas, reside na e certeza que o IV Encontro Nordestino de fluência e troca de conhecimentos, que é possível pelos debates de natureza prática e aponta- Espeleologia, que ocorrerá entre os dias 28 mentos que surgem nas atividades. Nesses momentos, todos são alunos e professores, mutua- de junho e 01 de julho de 2018, será uma mente, fortalecendo amizades e saberes sobre o mundo em que vivemos. grande festa, como deve ser, qualquer reu- nião de gente que faz espeleo.

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Binael Soares Santos: Um professor, um biólogo, um amigo

Texto Elvis Pereira Barbosa Prof. Dep. de Filosofia e Ciências Humanas - DFCH inha experiência com a Es- Universidade Estadual de Santa Cruz - UESC peleologia vem desde 1992, M quando fui convidado por uma grande amiga, Maria Conceição Ramos de Oliveira, para fazer parte da equipe que estava preparando um projeto de pesquisa sobre cavernas no sul da Bahia. Até aquela data, falar de cavernas na nossa região era algo impensável. A única referência que possuíamos era o trabalho de Ivo Karman sobre o Lapão de Santa Luzia, caverna si- tuada na cidade de mesmo nome. A proposta era de localizar e identificar novas cavidades na Bacia Metassedimentar do Rio Pardo, até então pouco conhecida, e isso incluía as cidades de Santa Luzia, , Camacã, Pau-Brasil e Potiraguá, além de buscar in- formações a respeito de pequenas cavernas no litoral norte de Ilhéus. Conceição ficou responsável pela parte geográfica e eu pelos O pesquisador. Binael Soares San- aspectos históricos, culturais e antropoló- tos coletando morcegos na Gruta de gicos relacionados às cavernas. Assim sur- São Gotardo, em Teixeira do Pro- giu o projeto Mapeamento de cavernas da gresso, município de Mascote/BA. Bacia Metassedimentar do Rio Pardo e o (Imagem: acervo do autor). subprojeto O imaginário das grutas.

*Este texto não seria possível sem as contribuições de Antônio Jorge Suzart Argôlo e José Marcelo Oliveira Pimentel.

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Após a aprovação do Projeto, os tra- tos. Alegrei-me, afinal de contas, mesmo bre o mesmo haviam sido repassadas por balhos de Espeleologia na UESC deslan- distante, sabia que Conceição daria conta Conceição e também por Márcio Santana charam e viajávamos, praticamente, todos do recado, embora, por ter de acumular a Santos, na época, aluno do curso de His- os finais de semana para localizar e identi- atividade docente com a direção do recém- tória e membro do Grupo de Espeleologia. ficar novas cavernas. Inicialmente o traba- -criado Departamento de Ciências Agrárias Sabia que ele trabalhava com morcegos e lho ficou concentrado em Pau-Brasil, visto e Ambientais – DCAA, isso aumentaria a tinha se interessado pelas grandes popu- a grande possibilidade de localização de dificuldade e o trabalho da colega. lações que haviam sido encontradas nas novas cavidades. Houve naquele período, O tempo passou, as minhas aulas e a cavernas de Pau-Brasil. uma grande aceitação por parte dos alunos dedicação aos estudos arqueológicos segui- Ao retornar para a UESC em 1998, e tínhamos um volume significativo de ram ao longo daquele ano. Infelizmente, no muita coisa havia sido modificada. Novos voluntários interessados em participar do início de 1997 fui surpreendido com uma professores, o novo curso de História – ago- projeto e entrar em cavernas pela primeira trágica notícia: logo após uma confraterni- ra separado de Geografia, visto que antes vez. Isso consolidou a pesquisa e ajudou na zação próximo a Olivença, enquanto retor- era um curso de Estudos Sociais com ha- criação do Grupo Sul Baiano de Espeleo- nava para casa, a colega e amiga Conceição bilitação nas duas disciplinas – e acima de logia – GSBE na Universidade Estadual de perdeu o controle do carro e bateu contra tudo a oportunidade de retomar as pesquisas Santa Cruz – UESC, em 1994. outro veículo vindo a falecer, o mesmo em Espeleologia e também abrir uma nova Com o avanço das pesquisas, o passo acontecendo com duas outras pessoas que frente através de projetos em Arqueologia. seguinte foi amadurecer as nossas propos- estavam no carro. O ano começou de forma O primeiro contato com Binael foi tas de pós-graduação e isso me conduziu triste e violenta. Eu já havia voltado para algo “frio e distante”, afinal de contas éra- para a Arqueologia, muito embora a minha Salvador e seguia fazendo a análise dos mos até aquele momento “concorrentes” proposta de trabalho no Mestrado fosse materiais arqueológicos coletados por Va- e não o conhecia direito. Após a perda de totalmente diferente do que até então traba- lentin Calderón nas décadas de 1960/1970 Conceição, houve um novo direcionamen- lhava na Espeleologia. Em 1996 já estava durante os trabalhos do Projeto Nacional to dos estudos espeleológicos no GSBE/ no mestrado em História do Brasil com de Pesquisas Arqueológicas – PRONAPA UESC, concentrando-se mais nos aspectos Concentração em Arqueologia, na Pontifí- e que estavam na reserva técnica do Museu biológicos e poucos trabalhos de topogra- Atividades de campo. Primeira expe- cia Universidade Católica do Rio Grande de Arqueologia e Etnologia da UFBA – fia. Olhando agora para vinte anos atrás, dição do Grupo Sul Baiano de Espele- do Sul – PUCRS, em Porto Alegre, quando MAE/UFBA. O impacto foi duro, mas tive começo a entender a atitude tomada por ologia - GSBE a Patamuté, em Cura- Conceição mandou um e-mail informan- que assimilar a perda da grande amiga. ele: era necessário capacitar uma equipe çá/BA. (Imagem: acervo do autor). do que o GSBE/UESC possuía um novo O comando do GSBE passou, então, de topografia para que ela fosse eficiente membro. Tratava-se de um jovem professor para Binael, que eu pouco conhecia. As na coleta de dados topográficos e na ela- de Biologia chamado Binael Soares San- únicas informações que eu dispunha so- boração dos mapas, visto que houve uma

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certa redução do número de estudantes fora da nossa área de inserção. Eu havia pentes e nosso grande amigo. que participavam do projeto de pesquisa participado de um trabalho de Arqueolo- Portanto, sem deixar a Bacia Me- ao longo do tempo. Com uma equipe me- gia com alguns amigos que atuavam no tassedimentar do Rio Pardo de lado, se- nor e mais eficiente, o GSBE/UESC cres- MAE/UFBA e daí surgiu o convite a Bi- guimos conhecendo e abrindo novas áreas cia em produtividade. nael para explorarmos aquela região no de trabalho em cavernas, como foi o caso Dentro deste novo perfil, fui aos pou- norte da Bahia, fugindo um pouco da Ba- de Curaçá/Gruta de Patamuté, Morro do cos me inserindo no projeto e aproximando cia do Rio Pardo. Chapéu/Lapa dos Brejões e Ituaçu/Lapa da de Binael. Assim, descobri pontos que nos Mas isto não significava que os traba- Mangabeira. Em Pau-Brasil, passamos a aproximavam, como o gosto pela fotogra- lhos em Pau-Brasil tinham sido deixados de aprofundar os trabalhos de monitoramento fia, a paixão pelo mesmo time de futebol lado. No período entre 1999 e 2002, inten- de morcegos, fundamental para a conclu- – Esporte Clube Bahia, coisa rara numa sificamos as expedições de final de semana são do Mestrado de Binael no Programa região onde o normal é torcer por clubes e conseguimos topografar mais de vinte de Pós-Graduação em Desenvolvimento do Rio de Janeiro – e principalmente o cavernas na região. Também conseguimos Regional e Meio-Ambiente da UESC. gosto pela pesquisa espeleológica. Agora o expandir o foco para a cidade de Potiraguá, Participei de algumas expedições e fiquei GSBE/UESC já possuía sala própria, onde onde tivemos o apoio de um casal que foi horas na porta das cavernas de Pau-Brasil nos revezávamos na coordenação. Juntos, fundamental nesta cidade: Zura e Fernan- pegando, pesando e ajudando a identificar conseguimos a renovação e aprovação de do, que abriram as portas da sua fazenda e os morcegos que depois foram utilizados Pesquisa e prestação de contas à outros projetos dentro da UESC e, com a nos deixaram totalmente à vontade na sua na base de dados da pesquisa. comunidade. Binael Soares Santos chegada de novos estagiários, ficamos co- propriedade. Além disso, a fixação dos es- No âmbito acadêmico, a amizade foi um pesquisador muito intenso, nhecidos como o “homem das cavernas” e tagiários do GSBE/UESC proporcionou o com Binael se consolidava cada vez mais, conforme contam seus trabalhos na o “homem dos morcegos”. amadurecimento do grupo e consequente- uma vez que já havia se tornado rotina os Gruta de São Gotardo, em Teixeira Como fruto da interação entre o his- mente da pesquisa. Nomes como de Márcio trabalhos de campo nos finais de semana, do Progresso, município de Masco- toriador e o biólogo, começamos a publicar Santana Santos, Maristela Santana Santos, fosse em Pau-Brasil, Potiraguá ou Morro te/BA (acima). Na imagem seguinte, trabalhos em conjunto nos Congressos da Mariluce Santana Santos, Patricia Ferrei- do Chapéu, pois sempre havia uma viagem entrega de relatório de suas pesqui- SBE. O primeiro foi no Congresso Bra- ra Gomes, Ana Carolina Brasileiro, José no final de semana para o GSBE/UESC. sas em praça pública, nas cavernas sileiro de Espeleologia de Vinhedo, em Marcelo Pimentel, Khalil Nogueira, Gusta- Fora da academia, seguíamos a nossa ami- de Patamuté, durante os festejos da 1999, quando publicamos dois artigos: um vo Smith, Andreza Müller e Nadja Gleide zade, agora com a participação de Antônio Romaria da Gruta. (Imagens: acer- sobre caverna e tradição popular no sertão Neves, entre tantos outros, foram essen- Jorge Suzart Argôlo, amigo e compadre de vo do autor). da Bahia e outro abordando a topografia da ciais para que houvesse a consolidação do Binael. Um momento significativo dessa Gruta de Patamuté, em Curaçá, sertão baia- grupo. Outra pessoa fundamental também nossa amizade foi quando tivemos a opor- no. Esses foram os primeiros trabalhos pu- foi o biólogo Antônio Jorge Suzart Argôlo, tunidade de levar os filhos ao Estádio Má- blicados sobre as atividades desenvolvidas professor/pesquisador especialista em ser- rio Pessoa para assistir à partida entre Co-

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lo-Colo e Bahia. Levei minha filha Catarina seguidamente. A partir daquele dia eu disse nha quebrou bem em frente ao posto da e Binael levou os três filhos: João Emanuel, que não jogaria mais contra ele, pois o ha- Polícia Rodoviária da localidade do Ponto Ana Carolina e Brisa Terra. O interessan- via derrotado três vezes seguidas. do Astério e fomos todos para debaixo do te é que após a derrota, os torcedores do Como esquecer do episódio em pequeno ônibus ajudar Bigode no con- Colo-Colo ameaçaram invadir a área reser- Patamuté, quando na ida para a caverna serto e só saímos de lá com a Princesinha vada ao time visitante e fomos protegidos perguntamos ao dono de um bar qual o ho- pronta para enfrentar o restante da estrada pela BAMOR, torcida organizada do Bahia, rário em que ele normalmente fechava, ao até as nossas casas. visto que estávamos com as crianças. que ele falou que era por volta das vinte e Diversas situações lembram Binael, Falar de Binael, não é apenas falar três horas, mas que morava ao lado e não como o seu pavor – na verdade, era medo do grande profissional que nos deixou pre- se importava se no nosso retorno batêsse- mesmo – por bois, fosse em qualquer local, cocemente. É falar do amigo, tornar públi- mos à sua porta, pois ele abriria o bar para como os dos pastos de Pau-Brasil, ou do cas algumas lembranças como o momento bebermos algumas cervejas. Acho que ele seu apurado gosto pela cozinha, como as em que acompanhamos duas pesquisadoras se arrependeu quando percebi, às três horas “lambretas” ao forno e a berinjela recheada – uma da USP e uma estadunidense, que da madrugada o seu sono profundo sobre o com carne moída que ele sempre nos brin- fazia doutorado sobre morcegos de caver- balcão e tive de me dirigir à Binael para fa- dava entre uma aventura e outra, principal- nas e tinha se interessado por uma espécie lar: Bina, vamos pedir a saideira, pois o tio mente ao lado dos filhos e amigos. encontrada em Pau-Brasil. Naquela expe- já está dormindo sobre o balcão. Fechamos É impossível esquecer as piadas, os dição fazia frio na região e as duas nunca a conta e fomos embora, e o dono disse momentos de alegria, de frustrações e prin- Lembranças. Aniversário de Binael imaginaram que passariam uma noite com que aquela era a última. No dia seguinte, cipalmente do grande cara que era Binael Soares na fazenda de Fernando e uma temperatura tão baixa na Bahia, mes- voltamos ao bar por volta do meio dia para Soares Santos. Zura em 2004 (acima). Primeira ex- mo estando no interior de uma casa, neste bebermos algo antes do almoço e ao pedir- Ele foi um sujeito simples, que soube pedição do GSBE à Toca dos Ossos, caso, a casa dos Professores das Escolas mos uma cerveja o proprietário disse que aproveitar o bom da vida no seu melhor Ourolândia/BA (abaixo). (Imagens: Municipais de Pau-Brasil. estava tudo quente, pois havíamos consu- momento. Fez grandes amigos. Ainda hoje acervo do autor). Outro momento hilário foi quando mido todas as cervejas na noite anterior. quando entro em uma nova caverna, faço escolhi o Sr. Agenor (Bigode) – o motoris- Fazia parte da nossa ritualística, sempre uma homenagem a ele e também à Concei- ta do nosso micro-ônibus, apelidado cari- depois de uma cavernada comemorarmos ção, pois não estaria ali se não fosse a aju- nhosamente como “Princesinha do Agres- no primeiro boteco que encontrássemos no da e o incentivo deles. Na verdade, os dois te”, e que era companhia obrigatória nas caminho, todos com as marcas da caverna, deixaram saudades. nossas viagens – para ser o meu parceiro incluindo aí o barro e os odores de guano. Binael Soares Santos entrou na ca- numa partida de sinuca na fazenda de Zura Aquilo era como um troféu para todos nós. verna em 13 de dezembro de 1962. Saiu da e Fernando em Potiraguá. Naquele dia, Bi- É impossível esquecer do dia em caverna em 15 de dezembro de 2005. Dei- nael trocou de parceiro três vezes e perdeu que, retornando de Potiraguá, a Princesi- xou esposa, três filhos e muitos amigos.

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Le Système d'Éclairage: Antigos capacetes e carbureteiras Petzl

Texto Solon R. Almeida Netto Espeleonordeste - Soc. Nordestina de Espeleologia David Carvalho Cardoso da Silva Espeleonordeste - Soc. Nordestina de Espelologia Grupo Pierre Martin de Espeleologia - GPME alvez garotos de vinte e cinco anos Espeleo-Club Erebo Ericson Cernawsky Igual não entendam porque, ainda hoje, Grupo Pierre Martin de Espeleologia - GPME Thaja pessoas falando sobre lanter- Fotos nas de carbureto. Menos ainda compreen- Solon R. Almeida Netto dam a existência de gente com a barba Espeleonordeste - Soc. Nordestina de Espeleologia grisalha, por todos os cantos do mundo, gastando tempo e dinheiro para reunir car- bureteiras em expositores e coleções par- ticulares. Mas o que, às vezes esquecem, é que nós somos uma geração anterior, que aprendeu muito cedo a iluminar com a chama e a associar o cheiro do acetileno às melhores alegrias que a prática espe- leológica nos deixou. Assim, mesmo que inegavelmente tenha ocorrido uma pequena revolução com a introdução da iluminação Fernand Petzl. O francês Fernand fria produzida pelo LED – os diodos emis- Petzl foi um grande responsável pelo sores de luz – e que exista um consenso desenvolvimento de equipamentos irrefutável da atual superioridade dos siste- projetados especificamente para explo- mas elétricos, nada disso conseguirá afastar ração de cavernas. Suas criações inva- a boa lembrança que se misturou à fumaça diram o universo espeleológico a partir escura e ao clarão amarelado espraiado dos da década de 1970, especialmente mo- bicos de gás, a forma como se fazia espeleo delos de capacetes e sistemas híbridos até o início dos anos dois mil. Essa época, de iluminação (Fonte img.: petzl.com). se pudéssemos brevemente descrevê-la, ca-

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beria dizê-la como um período em que os sibilitou o surgimento, nos mais diversos mond, explorando a região do monte Dent sistemas de iluminação de carbureto atin- rincões, de gente com enorme capacidade de Crolles, um grande maciço calcário com giram o ápice da aplicação à exploração de evoluir ou adaptar objetos à progressão, mais de dois metros de altitude. A partir de cavernas, uma história evolutiva que sendo que, alguns desses, findaram por se daí, evoluiu muito tecnicamente, tornando- se intensificou na segunda metade do séc. converter em linhas comerciais. -se um dos mais conceituados espeleólogos XX e apresentou, aos caverneiros de todo Essa trilha foi fielmente traçada por da França, chegando a anotar um novo re- o mundo, equipamentos que se tornaram uma das principais marcas de produtos corde mundial de profundidade, em 1956. clássicos, especialmente nos anos oitenta esportivos para caverna e montanha: a Passada essa fase, já na década de sessenta e noventa (1980-1990). Petzl. Entretanto, longe de se mirar na longa (1960), Fernand Petzl começou a se dedi- Porém, para perfeita compreensão de história da empresa, deve-se entender que car, com mais afinco, à segurança e ao es- tudo isso, deve-se primeiramente entender a biografia de seu fundador, Fernand Petzl, peleorresgate, pois, no seu entender, eram que o carbureto se misturou à maior magia se confunde, em vários momentos, com a necessários equipamentos mais seguros e da Espeleologia: a descoberta; pois, na es- evolução da própria atividade espeleológica concebidos genuinamente à exploração de peleo, não se encontram passagens somente mundial, na segunda metade do séc. XX, e, grutas. Por ser uma referência na área, sua em condutos escuros, mas, igualmente, por tal motivo, mesmo hoje, onde houver produção artesanal de peças ganhou noto- por ideias e equipamentos, tantas vezes alguém entrando em grutas – ou que tenha riedade e dali só cresceu. caseiros e inovadores, únicos e geniais! entrado –, certamente haverá também equi- Sabe-se que a habilidade de Petzl o Muito dessa filosofia talvez tenha se per- pamentos Petzl, e, para muito além disso, levou, desde cedo, a adaptar sistemas de dido hoje, quando boa parte das respostas algum apaixonado por criações que remon- iluminação aos capacetes que, nos anos se resumiu a recursos pasteurizados pelo tam a essência daquilo que é a prática espe- cinquenta e sessenta (1950-1960), eram am- comércio eletrônico, vez que se tornou fá- leoesportiva. Na verdade, o grande sucesso plamente utilizados nas cavernas francesas. Antigos refletores. Durante as décadas cil pagar pela internet e receber produtos de seus produtos decorreu da inventiva ca- Modelos construídos para uso militar ou mi- de cinquenta e sessenta (1950-1960), oriundos de qualquer lugar. Contudo, du- pacidade de criar melhorias em objetos que neração, como o capacete francês Adrian ou havia uma variedade grande de equi- rante muito tempo, nada disso havia, até já existiam, como também, por ele próprio, o inglês Richard Bathgate, eram de uso cor- pamentos artesanais na França. Eram mesmo na Europa. Entrar em cavernas era ter pleno domínio da finalidade a qual esta- riqueiro na França, por essa época, sendo, comuns adaptações metálicas usadas uma coisa que dependia, essencialmente, va implementando suas ideias. inclusive, indicados em manuais clássicos, como suportes para bicos de gás, que da criatividade e habilidade que cada indi- Nascido durante a Primeira Guerra como os textos de Henry P. Guérin e Robert podiam ser fixadas diretamente no ca- víduo ou grupo de exploradores desenvol- Mundial, em 1913, a parte mais expressiva de Joly. Petzl passou, então, a desenvolver pacete ou presas por tiras de borracha via. Conceber ou construir mecanismos em da adolescência de Petzl se deu no Vale de sistemas híbridos, com refletores e queima- ou couro. Na imagem, um refletor fran- pequenas oficinas ou tornearias era a regra Grésivaudan, nos alpes franceses. No início dores de gás acetileno conjugados num úni- cês dessa época. comum a todos que queriam cavernar. Por da década de trinta (1930), descobriu a Es- co suporte com luzes elétricas, para serem esse motivo, a exploração subterrânea pos- peleologia, juntamente com seu irmão Ed- fixados nos mais diversos capacetes.

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Não se pode precisar com exatidão, porém, quando houve a transição entre o trabalho artesanal e a produção em maior escala, mas se sabe que, no início da dé- cada de setenta (1970), a família Petzl já estava trabalhando numa microestrutura de manufatura familiar, com peças adquiridas à montagem de kits padronizados, em espe- cial, os moldes plásticos da lanterna elétrica e a caixa de bateria na cor laranja, que foi a principal identidade visual de seus produtos até o início dos anos oitenta (1980). Essa experiência em montar lanternas elétricas em capacetes, levou ao desenvolvimento de um novo conceito, mais tarde chamado all-on-the-head, que incorporou a concep- ção moderna da headlamp, ou seja, que era preciso manter todas as partes da lanterna na cabeça. Nesse momento, nasceu a pri- Criações dos anos setenta. No início da meira criação de Petzl de extremo sucesso: década de 1970, Fernand Petzl e seus a lanterna Zoom, que aproveitou o chassi filhos, inauguraram um novo padrão plástico do sistema elétrico concebido para em sua produção artesanal, quando as luzes de cavernas, apenas adaptando-o a começaram uma rudimentar manufatu- uma banda elástica ajustável à cabeça. ra para criar equipamentos próprios. Por essa época, paralelamente, surgiu Nessa época, pode-se dizer que surgiu também a primeira geração de legítimos ca- o primeiro autêntico capacete Petzl, pacetes Petzl, mas é importante frisar que, sendo sua principal identidade, o siste- provavelmente, a empresa apenas adquiria ma de iluminação híbrido, que unia a componentes encomendados a terceiros chama do gás acetileno a uma lanterna e finalizava a montagem em sua linha de elétrica, feita em plástico laranja, que produção artesanal. A fabricação própria em alguns anos, tornou-se muito popu- deveria ser limitada às partes mais simples, lar na Europa (fig. à direita).

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como peças metálicas e suportes, ou proces- sos como furação e união dos segmentos. Isso porque, pela quantidade de pessoas trabalhando, é de se supor que os principais elementos do produto fossem terceirizados, como a já referida caixa plástica laranja da lanterna elétrica ou o próprio casco do capacete. De todo modo, o resultado final mostrava-se excelente, muito bem-acabado, com alças ajustáveis fixadas em três pontos e carneira em couro marrom. Petzl aprovei- tou a bateria de 4,5V para criar um sistema acendedor da chama por fagulha, alimenta- Equipamentos da década de setenta. do pelo curto-circuito de duas extremidades A década de setenta (1970) foi fértil à desprotegidas de fios rígidos ligados à pilha, criação de Petzl. O aspecto externo do que entravam em contato quando o bico de capacete da primeira geração (branco, gás era girado propositalmente, sobre o pró- à esq.) mudou pouco ao da segunda ge- prio eixo, para provocar a ignição pelo con- ração (vermelho, à dir.). As principais tato dos polos. E, assim, surgiu o primeiro modificações se deram no fagulhador, modelo, em meados de 1973! que passou ao sistema piezoelétrico, Esse primitivo capacete, porém, pelas e na estrutura interna da carneira e Novo sistema de ignição. O capacete condições de produção descritas, não foi fei- alças jugulares. A lanterna laranja e a pioneiro de Petzl agregou um sistema to em larga escala. Talvez tenha sido monta- caixa de bateria foram mantidas. de ignição do gás acetileno, que pro- do pelo curto período de meia década, pois, vocava a chama pelo curto-circuito de antes do final dos anos setenta, foi substi- dois polos da bateria de 4,5V (acima), tuído por um projeto mais moderno (cerca a qual alimentava também a lanterna de 1978). Essa cronologia é possível pela laranja. A rotação manual do cachim- evolução e registro de mudança da logomar- bo, fazia com que o queimador encos- ca que, no início dos anos oitenta (1980), tasse nos dois fios rígidos, que ficavam abandonou o antigo “F. Petzl” ou “Petzl”, alojados abaixo do refletor e por trás escrito com ou sem um contorno oval, para da lanterna (à esq.). a estilização atual do nome “Petzl”.

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O que é interessante frisar sobre a provavelmente no início dos anos oiten- segunda geração de capacetes, é que com ta (1980), Petzl iniciou as vendas de uma ela foi abandonado o sistema de ignição por segunda linha de suportes piezoelétricos, fagulhas elétricas de curto-circuito, sendo cuja a peça central foi projetada ladeando adotado o acendedor por mecanismo pie- um largo refletor em aço inox. Esse equipa- A segunda geração e o padrão "Junior". A segunda geração de capa- zoelétrico. Tratava-se de uma peça retrátil mento, que ficou conhecido comoJunior , cetes e suportes de iluminação híbridos data do final da década de 1970 e triangular, feita em alumínio e fixada porém, podia ser montado sem a lanterna (à esq.). Nessa mesma época, foi introduzido o padrão "Junior", que bem ao centro do conjunto. O seu movi- laranja, pois seu suporte no capacete foi basicamente dispensou a lanterna elétrica (à dir.). Esses dois suportes mento em pêndulo, possibilitava girar para desenvolvido para ser fixado diretamen- conviveram durante o início dos anos oitenta, sendo que o Junior passou encostar no bico de gás, permitindo a fagu- te, com ou sem uma luz elétrica de apoio. a equipar capacetes que, originalmente, não foram pensados especifi- lha iniciar a queima do acetileno. O supor- Esse modelo independente passou a equi- camente para Espeleologia, como a primeira geração do Ecrin (à dir.). te continuou parafusado à antiga lanterna par, especialmente, em livres adaptações, a Pode-se classificar o Junior como parte da segunda geração porque se elétrica de plástico laranja, que igualmente primeira geração dos capacetes Ecrin, que trata da mesma peça piezoelétrica, apenas em suporte diferente. trouxe, na mesma cor, a caixa de bateria, não saíam de fábrica montados à Espeleo- apenas sem o botão inferior para ejetar a logia, uma vez que o casco padrão da Petzl pilha. O capacete praticamente manteve sua para cavernas (segunda geração) já vinha dimensão e aparência arredondada (dimi- equipado com o acendedor sem o refletor. nuiu 1cm no comprimento), mas recebeu O modelo Junior foi bem recebido pela co- sequências de cinco furos bilaterais e uma munidade espeleológica, por ser muito ro- proteção emoldurada pelo contorno da ares- busto e agregar a vantagem de potencializar ta. As partes de couro foram restringidas à a luminosidade pelo reflexo. carneira e ao revestimento das alças jugu- A terceira geração de equipamentos lares, que passaram a ser feitas com fibras viria somente em meados de 1987, quando sintéticas mais resistentes à umidade. foi inaugurado um novo sistema de ilumi- O conjunto da segunda geração da nação elétrico. Dessa vez, a empresa evo- Petzl representou uma enorme evolução luiu o seu suporte do queimador do acetile- nos sistemas de iluminação espeleológicos, no incorporando um refletor ao acendedor pois houve incremento da resistência, da piezoelétrico, numa peça de alumínio, que confiabilidade do equipamento e a redução poderia inteiramente ser girada e fixada à do tamanho. Contudo, tinha um grave de- nova lanterna, feita de plástico escuro, sis- feito: a ausência de refletor, o que diminuía tema que foi chamado como Laser. Basica- o potencial da chama. Assim, logo a seguir, mente, o Laser agregou as melhores funcio-

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nalidades dos dois produtos anteriores ao modelo principal da Petzl à Espeleologia: suporte compacto, presença de um refletor central, piezoelétrico lateral e lanterna elé- trica incorporada à peça. O sistema Laser veio equipado com novas lâmpadas halógenas, que, mesmo consumindo mais da bateria, mantinham o padrão de alimentação 4,5V. Essas lâmpadas eram mais brilhantes e mostravam maior eficiência energética que as incandescentes simples (usadas nas antigas lanternas laran- jas), apesar de serem mais compactas, tudo isso associado à vida útil maior (2.000 até 4.000 horas). Essas características se molda- ram bem às necessidades da Espeleologia, não somente por permitirem a fabricação de luzes fisicamente menores e mais leves, mas, especialmente, por entregarem mais brilho com as mesmas baterias. Esse conjun- A inovadora "Laser". Por volta de to acompanhou de fábrica, ainda, um novo 1986/87, a Petzl substituiu a antiga capacete, chamado como Vertical, feito lanterna na cor laranja e seu queima- na cor vermelha, muito leve, com formato dor de acetileno por um padrão que ligeiramente alongado e saliências ondula- ficou conhecido como "Laser". O novo das no topo do casco, passando a ser esse o sistema trouxe uma lanterna com lâm- novo equipamento padrão da empresa para pada halógena, com maior luminosida- cavernas, no final da década de oitenta. de do que as luzes incandescentes co- Observe-se que, todos esses conjun- muns. Doutro lado, o Laser incorporou tos de iluminação, mantiveram, pelo menos o refletor de alumínio e o desentupidor até o final da década de oitenta, queimado- de cabo de aço, agregando as melhores res e presilhas de outros fabricantes. So- características dos suportes fabricados mente por volta do final dessa década – ou até então (acima e à dir.).

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início dos anos noventa – que são lançados bicos de gás e roscas personalizadas para fixação exclusiva em produtos da Petzl (os tradicionais bicos cerâmicos de 14 e 21 li- tros, produzidos na cor branca e vermelha). Assim, no início, os suportes Junior e Laser vinham equipados com queimadores de ou- tras marcas, como o inglês Bray, e eram en- caixados por uma rosca de alumínio. Mais tarde, os Laser passaram a ser vendidos com o bico cerâmico da Petzl, que passou a ser fixado por uma presilha sem pintura, mudando, por conseguinte, o encaixe da peça no cachimbo. A essa altura, no início da década de noventa (1990), a empresa Petzl já era mundialmente famosa, como um dos prin- cipais fabricantes globais de lanternas, alavancada pelo sucesso da Zoom e as evoluções seguintes. A criação e fabrica- ção dos produtos espeleológicos, há muito, Ecrin e Junior. A primeira geração deixara de ser o principal ativo financeiro de capacetes Ecrin, inicialmente, não da empresa, que agora focava em mercados focou no público espeleológico. Po- muito maiores, como o público praticante rém, logo esses cascos passaram a ser de montanhismo, de trabalho em altura ou amplamente utilizados em cavernas, já de corridas de noturnas. Por esses motivos, Evolução das peças. As modificações no design das peças, ocorreram, fortemente, que o suporte Junior podia ser adapta- a Petzl foi, gradativamente, abandonando no anos setenta e oitenta. Os antigos bicos de gás (1) passaram a ser cerâmicos e do a esse tipo de equipamento. seu laboratório principal nas cavernas, e os personalizados (2). Mais tarde, ganharam a referência da vazão inscrita (3). Igual- produtos originários de outras linhas come- mente, as roscas dos queimadores também evoluíram até o padrão alumínio ano- çaram a fazer o ciclo inverso, passando a dizado (4 e 5). Por fim, os parafusos dos cachimbos, sofreram alteração quando o ser adaptados para o uso em grutas. modelo Laser foi aposentado pelo Aceto. (Referência da escala: 1cm).

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Cachimbos. A peça que conecta a mangueira da carbureteira ao bico de gás é conhecida, popularmente, como "cachimbo". Houve, pelo menos, três padrões fabricados pela Petzl. Os dois últimos representam a maior parte da produção, já que a versão mais antiga somente equipou as primeiras lanter- nas da década de 1970. A mudança do padrão das roscas, trouxe um novo en- caixe, que se tornou mais encurtado, conforme os dois modelos que mostram Em 1994, chegou ao mercado uma tacado do capacete, pois havia só uma base a evolução dos anos oitenta aos noventa nova lanterna, chamada Duo. Tratava-se de plástica parafusada ao casco, enquanto a (1980-90) (respectivamente, esq./dir.) um conjunto elétrico compacto, relativa- peça metálica se prendia por encaixe em (ref. da escala: 1cm) (imagem à dir.). mente resistente a choques ou à água, capaz garra. Esteticamente, quase nada se intro- de operar com quatro pilhas AA. A vanta- duziu de novo no Aceto, que manteve de- gem da Duo era agregar duas lâmpadas, sign muito similar ao modelo anterior, com com foco aberto ou fechado, lado a lado, refletor central (um pouco mais achatado) e que podiam ser acionadas alternadamente, acendedor piezoelétrico lateral. Esse equi- conforme a necessidade. pamento, rapidamente foi alçado a um su- Caixas de baterias. A análise compa- Logo, o público começou a usar essa cesso de vendas e se tornou um clássico até rativa revela a evolução dos padrões e lanterna também em grutas e, em 1996, a o final do séc. XX. equipamentos ao longo dos anos. As cai- Petzl lançou sua quarta geração de sistemas No campo dos geradores de acetileno, xas de baterias, inicialmente pensadas voltados à Espeleologia, que foi chamada a Petzl foi menos variada. Na verdade, ao para pilhas únicas de 4,5V, na versão da como Explorer. O Explorer era equipado contrário do que houve com os suportes para lanterna Duo ganharam suporte para com a segunda geração do capacete Ecrin capacete com sistemas híbridos, tratando- quatro elementos AA e uma significativa Roc, plataforma sobre a qual eram monta- -se dos geradores, a supremacia da empresa melhoria no sistema antigo de fecha- das uma Duo parafusada e uma nova peça não foi tão expressiva, porque sempre hou- mento, que, basicamente, era feito, no para suporte ao bico de gás, que ficou co- ve uma larga (e acessível) oferta de antigas começo, como uma seção de câmara de nhecida como Aceto. O novo suporte era carbureteiras no mercado, especialmente no ar de borracha cortada (referência da bem similar ao antigo queimador Laser, europeu, onde existia abundância de equipa- escala: 1cm) (imagem à esq.). mas agregou a facilidade de poder ser des- mentos como a Arras ou Fisma, todos muito

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eficientes e populares. Além disso, a vida A segunda geração da Ariane, ba- útil média desse tipo de gerador feito de sicamente, conservou quase todas essas Ariane. A carbureteira Ariane chegou metal era muito longa – décadas e décadas – características, mas substituiu a janela do ao mercado após o desenvolvimento das sendo bem mais comum a troca do capacete reservatório de água por uma rosca sim- primeiras linhas de capacetes e ilumi- do que a da carbureteira. Assim, era muito ples e aumentou o recipiente, em formato nação híbrida, na década de oitenta. fácil encontrar um capacete Petzl alimenta- de tampa inferior, da câmara de carbureto, Destacam-se dois modelos principais, do por um gerador Arras, Fisma ou, até mes- possibilitando uma carga maior. Apesar de com variações pontuais. Sua construção mo, de fabricação artesanal. Contudo, não se ter sido criticada em alguns momentos, es- em material plástico favorecia a leveza e pode desprezar a linha de produção da Petzl, pecialmente por reclamações ligadas a va- ganhou adeptos, mas foi alvo de muitas que introduziu no mercado duas gerações da zamentos, em termos gerais, a Ariane mos- críticas também. carbureteira Ariane. trou-se um excelente equipamento, já que A carbureteira da Petzl destacou-se esquentava pouco e era muito leve. por ser um produto feito em plástico preto, Após mais de trinta anos de produção com apenas algumas partes metálicas (ros- de sistemas híbridos, adotando o carbureto cas, agulha e mola). A primeira geração se como système d'éclairage, a Petzl finalizou mostrava como um pouco menor do que essa linha de produção nos primeiros anos os geradores subsequentes. A principal ca- do séc. XXI. No período subsequente, o racterística era um fecho amarelo para a mercado ainda se manteve aquecido por janela de alimentação de água, que abria algum tempo, até o fim dos estoques e pelo pela mudança de posição, sendo ausente a comércio de usados. Contudo, a própria universal tampa rosqueada ou de encaixe. Petzl, por ter sido uma das pioneiras no A Petzl também introduziu um sistema pró- uso dos LEDs em lanternas tipo headlamp, prio de distribuição do gotejamento, que se no ano 2000, com o lançamento da Tikka, fazia por uma válvula em parafuso, na parte foi também responsável pela rápida subs- inferior da agulha, e entregava a água a uma tituição tecnológica, que, em poucos anos, canaleta plástica amarela, dentro do reserva- praticamente baniu o uso do carbureto da tório do carbureto. Essa canaleta era perfu- Espeleologia. Ocasionalmente, os últimos rada e tinha a função de uniformizar a água entusiastas insistem, ainda hoje, em quei- por toda a câmara inferior. A filtragem do mar acetileno e gritar que nada se compara gás era feita por uma peça composta de fibra à chama amarela ou ao calor do gerador sintética atrelada a material esponjoso. em grutas frias. Mas, temos que admitir:

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há passagens sem volta. Um dia, a corda substituiu a velha escada feita de madeira e cabos. Os capacetes de policarbonato apo- sentaram a fibra, o baquelite e o couro. O que sobrou dessa época é uma longa estra- da evolutiva de equipamentos e adaptações diversas, que motivaram muita gente a des- cobrir a Espeleologia. Deve-se considerar, ainda, que o final desse ciclo, também aliviou as cavernas da fuligem da fumaça, dos resíduos de hidró- xido de cálcio abandonados no ambiente endocárstico (aquele pó branco, que sobra Ariane. A evolução da carbureteira como borra da reação), bem como da pres- Ariane revela uma tentativa da Petzl de são da extração do calcário, já que a pedra, melhorar o volume do reservatório infe- na qual se molda a gruta, é também a maté- rior, destinado ao carbureto, que, na se- ria-prima essencial ao carbureto. gunda geração, teve sua tampa aumen- Assim, não há deuses eternos e a úl- tada. O antigo sistema de fechamento do tima chama a se apagar se chama saudade. tanque de água, que era acionado pelo Mas nunca se espere que, aqueles garotos giro da porta feita de plástico amarelo, de vinte e cinco anos, que hoje não nos na segunda versão adotou uma rosca compreendem, tenham o mesmo tipo de metálica simples, tradicional, porém sentimento saudosista, daqui a meio século, eficiente, muito semelhante a outros ge- por essas lanterninhas eletrônicas made in radores de acetileno concorrentes. Con- China. Ninguém cria amor por pilhas es- tudo, a alma do sistema foi mantida até touradas e sucatas de circuitos eletrônicos. o final da produção: corpo em policar- A modernidade, por fim, talvez seja a mais bonato preto e sistema de gotejamento autofágica de todas as ficções humanas. As equipado com canaleta para distribuir, grandes novidades de cinquenta anos atrás, por igual, o fluxo de água. hoje, só encantam em museus.

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Primeira geração (1973). Segunda geração (1978). Segunda geração (1980). Terceira geração (1987). Quarta geração (1996). A primeira geração de No final dos anos setenta, Entre o final da década de O final dos anos oitenta Os anos noventa apresen- capacetes e sistema ilumi- Petzl introduziu sua princi- setenta e início dos anos trouxe o "Laser", um novo taram um novo conjun- nação híbrido agregou o pal marca nos sistemas de oitenta, foi apresentado sistema que aposentou, em to para espeleo, que foi padrão "lanterna laranja", iluminação por gás aceti- um novo suporte, chamado definitivo, a tradicional batizado como "Explorer". que foi mantido até aproxi- leno: o fagulhador piezoe- como "Junior". Esse equipa- lanterna laranja. O equipa- A solução da Petzl agre- madamente 1978. A ignição létrico. A partir dali, seria mento ganhou muito espaço mento uniu o que havia de gou ao capacete "Ecrin por curto-circuito foi possí- possível acionar a chama, no mercado, por agregar melhor nas gerações ante- Roc" a lanterna "Duo" e vel graças ao aproveitamen- até mesmo, com o capace- um refletor de aço inox, o riores acrescendo uma lâm- o novel modelo de suporte to da bateria de 4,5V, que te molhado ou as baterias que potencializava o brilho pada halógena a um novo para chama de acetileno, sustentava uma lâmpada elétricas esgotadas. A estru- da chama do acetileno. Foi modelo de lanterna elétrica, nomeado como "Aceto". incandescente comum. A es- tura geral do casco mudou comercializado concomitan- que manteve da anterior, Mais tarde, no início dos trutura do casco foi feita em pouco, havendo sido intro- te ao equipamento padrão apenas, o design da caixa anos 2000, essa lanterna policarbonato, com carneira duzidas alças em material da segunda geração, como de bateria. Esse conjunto receberia luzes elétricas e alças de couro, além de sintético, o reforço embor- uma alternativa que poderia passou a ser vendido com de LED. Pouco tempo de- partes em tecido de algodão rachado contornando toda a equipar capacetes sem lan- um novo capacete, conheci- pois, a linha do carbureto e espuma de poliuretano. aresta e furos bilaterais. terna, como o "Ecrin". do como "Vertical". foi encerrada.

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Prospecções e Mapeamentos Espeleológicos: Serra de Martins/RN

Texto Solon R. Almeida Netto Espeleonordeste - Soc. Nordestina de Espeleologia Marcelo Augusto de Freitas Kramer Espeleonordeste - Soc. Nordestina de Espeleologia esmo o Rio Grande do Norte Jan Pierre Martins de Araújo sendo um dos menores (e me- Espeleonordeste - Soc. Nordestina de Espeleologia Allison Benedito dos Santos nos conhecidos) estados da Fe- Departamento de Geologia M deração brasileira, seu território guarda uma Universidade Federal do Rio Grande do Norte José Ayrton Vale da Silva enorme profusão natural, consequência da Espeleonordeste - Soc. Nordestina de Espeleologia diversidade geológica e de biomas que se Gustavo Szilagyi Espeleonordeste - Soc. Nordestina de Espeleologia inserem na multiplicidade geomorfológica, Joaquim das Virgens Neto produto de uma evolução que se transforma, CPRM - Serviço Geológico do Brasil Gustavo Henrique Nunes Basílio praticamente, desde o surgimento das ro- Espeleonordeste - Soc. Nordestina de Espeleologia chas que hoje compõem a superfície do pla- neta. Terrenos recentes e algumas das estru- Fotos Solon R. Almeida Netto turas litológicas mais antigas das Américas Espeleonordeste - Soc. Nordestina de Espeleologia modelam o universo potiguar, produzindo ricos cenários, capazes de contar histórias de épocas muito remotas. A região serrana situada ao sudoeste, uma faixa confinada entre o Ceará e a Paraí- ba, geograficamente tratada como Alto Oes- Serra de Martins/RN. Mármores te, guarda afloramentos rochosos muito an- aflorantes repletos de estreitas fen- tigos, geralmente uma matriz cristalina, que das, que se inserem no embasamento essencialmente é Pré-Cambriana. Lá, entre Pré-Cambriano, em serrotes que 2012 e 2016, espeleoesportistas e pesquisa- pontuam a macrorregião serrana dores estiveram documentando e estudando potiguar, surgem como áreas com aquele local. Desses trabalhos, nasceram alto valor espeleológico. vários produtos, dentre os quais, um extrato parcial da ocorrência de cavernas.

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Os Picos. Em meio à mata, há picos e afloramentos de mármores insulares, que se destacam em cotas mais elevadas, sendo essa a matriz espeleogenética na maioria esmagadora das ocorrências de cavidades naturais na região serrana de Martins/ RN. A exceção fica por conta de fissuras ou blocos acomodados da litologia encai- xante, em que se inserem as lentes carbonáticas, nos quais, ocasionalmente, surgem fendas capazes de dar passagem a uma pessoa. As condições de preservação da mata criam um ambiente único, em que o aporte bioenergético flui entre os meios epígeo e hipógeo, dando suporte ao rico patrimônio espeleológico.

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A lágrima sem fim, a lágrima pesada As primeiras visitas das quais há notí- - CERN, que houve um direcionamento de Que eternamente cai do alto desta gruta cias às grutas de Martins, provavelmente, fo- saídas ao campo à Serra de Martins, com Representa alguma alma estranha, desolada ram os registros inaugurais de incursões em alguma sistemática de exploração espeleo- Que mora a soluçar dentro da rocha abrupta? cavernas no Rio Grande do Norte. Em suma, lógica. O CERN, desde cedo, vislumbrou tratou-se de um movimento excursionista, o grande potencial da área, que mesmo não Esta alma quem será? Não sei! Mistério fundo... promovido por intelectuais e naturalistas, conglobando grutas volumosas ou com gran- Entretanto eu pressinto alguém que se debruça em fins do séc. XIX, que viam as cavernas des lances verticais, abrigava a existência de E baixinho me diz num gemido profundo: como ambientes exóticos e que motivavam centenas de pontos com possível entrada ao “Existe um coração na pedra que soluça...” passeios lúdicos. Nesse cenário, a passagem endocarste. O início desses trabalhos se deu (Enigma, Henrique Castriciano). do jurista, poeta e fundador da Academia no começo dos anos noventa, provavelmen- Norte-Rio-Grandense de Letras, Henrique te em meados de 1992/93, quando o grupo Castriciano, pela Casa de Pedra de Martins, estava no ápice de sua atividade e havia em 1895, que deixou grafados seus versos na vários associados promovendo expedições própria parede da cavidade – o poema Enig- espeleotopográficas. Desse momento, data o ma –, representa a síntese do pensamento de principal legado do CERN na região: a topo- sua época, de como os potiguares identifica- grafia da Casa de Pedra de Martins, uma das vam aquele tipo de ambiente natural. Daque- principais cavidades em mármore do Brasil. le período, restaram algumas fotografias, que Pelos dados que o grupo enviou ao atestam um fluxo de pessoas pouco expres- Cadastro Nacional de Cavidades – CNC, sivo, mas que serviu para, gradativamente, mantido pela Sociedade Brasileira de Espe- começar a incutir na sociedade a descoberta leologia, sabe-se que o CERN topografou do ambiente hipógeo. cerca de vinte cavernas naquela área. Contu- Vale destacar, que todo o conjunto do, tratava-se de um tempo em que o sistema espeleológico dessa área ganhou relevância de GPS ainda não estava dotado de precisão científica, pela primeira vez, nos trabalhos de mínima necessária para coleta de pontos com Luciano Jacques de Moraes, ainda na década exatidão, pelo que, as coordenadas aponta- de vinte (1924), havendo sido citado no livro das àquelas entradas, hoje pouco agregam “Serras de Montanhas do Nordeste”. para que se saiba sua correta localização. Belle Époque. Antigos grupos, desde fins do séc. XIX, passaram a visitar a Casa de Porém, somente bem mais tarde, com Os mapas, doutra sorte, a maioria se perdeu Pedra de Martins. O local era considerado "exótico" ou "lúdico" e foi citado por a organização da atividade espeleoesporti- com o esfacelamento da associação, havendo escritores e poetas. Na imagem, ilustres visitantes pousam para foto, provavelmente va norte-rio-grandense, pelo antigo Clube restado apenas uma reprodução da topografia no início do séc. XX. (Imagem cedida por Júnior Marcelino, autor desconhecido). de Espeleologia do Rio Grande do Norte original da Casa de Pedra de Martins.

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Mesmo assim, não se pode negar a relevância do trabalho do CERN, pois foi o início dos dados técnicos sobre as grutas de Martins. Das fotografias e dos relatos de seus associados, remonta-se uma sequência de viagens, ao longo da década de noventa, que, porém, teve seus produtos, conforme dito, extraviados pela passagem do tempo. A partir dali, seguiu-se ao CERN um movimento capitaneado por Joaquim das Virgens Neto (um ex-associado “cerniano”), que reuniu graduandos da UFRN e, com recursos daquela instituição de ensino su- perior, entre 1999 e 2001, fez algumas idas à Serra de Martins, dando continuidade às topografias. A forma de trabalho, nesse pe- ríodo, continuou a mesma: saídas esparsas, grupos pequenos, apoios em pequenos acam- pamentos nas proximidades das cavernas e concentração dos esforços nos mapas. A iniciativa rendeu alguns trabalhos em even- tos de iniciação científica e o incremento da mapoteca potiguar. Porém, novamente a co- leta de coordenadas geográficas foi precária e algumas cavernas trabalhadas pelo grupo nunca mais foram localizadas, consideran- do as condições difíceis da mata e o terreno Espeleoesportiva na década de noventa. Na década de noventa, os grupos espeleológicos potiguares, bastante acidentado. Algum tempo depois, foram se sucedendo na exploração e documentação das cavernas de Martins/RN. Nas fotos acima, o em 2004, Joaquim das Virgens concluiu seu grupo originário do CERN na topografia da Casa de Pedra de 1993. Ao centro-esquerda, novamente o trabalho de graduação sobre as cavernas da CERN acantonado na fazenda Picos, em 1996. No centro-direita, a expedição de Virgens, em abril de região, valendo-se da compilação de seus 1999. Abaixo, a incursão do ano seguinte, em abril de 2000, que topografou a Gruta das Pérolas anos de estudos e conhecimentos da área. (canto inferior direito). (Imagens cedidas por Virgens Neto, Ricardo Morais e Rostand Medeiros).

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O contexto geológico da Serra de Mar- cisalhamento e rochas plutônicas (G3), além Outros minerais como flogopita, diopsídio, O mapa do CERN. O Clube de Es- tins, que dá suporte a uma área com grande de corpos pegmatíticos. epidoto, zoizita, tremolita, diopsídio, es- peleologia do Rio Grande do Norte potencial espeleogenético, está diretamente À compreensão da gênese das caver- capolita e titanita também foram descritos - CERN, na década de noventa, tra- associado à presença de lentes carbonáticas nas, importa focar na Formação Jucurutu, em estudos mineralógicos feitos nessas ro- balhou ao menos, vinte cavernas na aflorantes em cotas superiores, que surgem que é composta por níveis intercalados, chas. Sua coloração é cinza claro, por vezes região da Serra de Martins. Essas em meio à mata nativa como pequenos ser- interdigitados ou lenticulares de paragnais- apresentando bandas composicionais, com atividades incluíram a produção de rotes. A Geologia Local se insere na Pro- ses, mármores, micaxistos e rochas cal- textura granoblástica, composta predomi- vários mapas topográficos das grutas. víncia Borborema, mais especificamente na cissilicáticas. Essa formação se insere na nantemente por calcita. Seu intenso grau de A maior parte desse material, infeliz- Faixa Seridó, que pode ser descrita como a porção basal do Grupo Seridó, sendo suas fraturamento e o posicionamento em cotas mente, perdeu-se, restando, apenas porção situada no extremo nordeste da Pro- rochas ricas em biotita, epidoto e anfibólio. elevadas, refletem a influência de um pro- uma versão digitalizada por Virgens víncia. As unidades litoestratigráficas dessa O mármore da Fm. Jucurutu aflora alon- vável falhamento NW que atingiu a região. Neto da topografia da Casa de Pedra faixa, constituem-se de litotipos diversos, gado segundo direção NW-SE, intercalado A granulação varia de média à grossa. Sua de Martins, produzida em novembro posicionados em unidades distintas. Primei- nos biotita-gnaisses e granitos. De acordo origem, possivelmente, está associada ao de 1993. No período, o CERN foi um ramente, tem-se o complexo do embasamen- com os estudos feitos por Virgens Neto, em metamorfismo de calcários e dolomitos pri- grupo bastante ativo, focando em to gnáissico-migmatítico Paleoproterozóico 2004, análises estruturais indicam que os mitivos, que apresentavam alternâncias na produções técnicas como prospecção e (Complexo Caicó). Seguindo-se, sobreposto mármores formam uma grande dobra com composição original, fato que refletiu nas mapamentos. a esse embasamento, discordantemente, es- plano axial vertical isoclinal, provocada faixas claras e escuras na rocha. O padrão tão as sequências supracrustais deformadas pela zona de cisalhamento que afetou os de acamamento, alongamento e faturamen- e metamorfisadas, representadas pelo Gru- sienogranitos. Os carbonatos são, essencial- to desses mármores, provocado na rocha po Seridó. O Paleoproterozóico é marcado, mente, compostos por calcita, com inclu- ao longo desse ciclo descrito, basicamente, ainda, por um intenso evento plutônico (G2) sões de magnetita e hematita, além de inter- condiciona a orientação dos condutos das representado por augen gnaisses. Por fim, no calações de finas lentes e nódulos estirados, cavernas, que se mostram bastante retilí- Neoproterozóico, destacam-se as zonas de dobrados e budinados de calciossilicáticas. neos e com mergulhos muito similares.

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O Projeto Cavernas de Martins se iniciou no primeiro semestre de 2012, como uma parceria entre a SEP - Sociedade Espe- leológica Potiguar e a Fundep/Universidade Potiguar. Nesse período, foram lançadas as bases das primeiras saídas ao campo, para estudos preliminares, que se inseriram na ação Monumento Natural Cavernas de Mar- tins, financiada por recursos do edital FUN- BIO - Tropical Forest Conservation Act. Mais tarde, a Espeleonordeste deu andamen- to aos estudos com recursos próprios, até 2016. Durante esse tempo, foram cadastra- das 92 cavidades naturais e produzidos 61 mapas topográficos desses sítios. Igualmen- te, estudos de Biologia Subterrânea foram mantidos na área, o que representou a maior iniciativa para documentação de cavernas na Serra de Martins já implementada. Dentre as grutas trabalhadas, destacam-se:

I. Casa de Pedra de Martins Caverna bastante conhecida no con- texto regional e que se consolidou como atrativo turístico, recebendo aporte estimado como da ordem de 5.000 a 8.000 de pessoas/ ano (dados não aferidos). O turismo, apesar Casa de Pedra de Martins. A maior e mais conhecida gruta, apresenta um padrão de regular, instalou-se de modo precário, de volume dos salões e condutos que não se repete noutras cavernas da região. sem que se possa identificá-lo como ativi- Centenas de anos de impactos antrópicos, praticamente alteraram todo o ambiente dade empresarial estruturada, constituin- interno da caverna. Mesmo assim, deposições e crescimento de espeleotemas conti- do, apenas, um fluxo constante ao atrativo nuam em atividade na caverna, a mais visitada no Rio Grande do Norte. natural que, minimamente, recebeu alguns

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equipamentos facilitadores ao acesso, por de Pedra de Martins. A estrutura geral do De modo sintético, a caverna é for- iniciativa do Poder Público municipal, que monte rochoso mostra-se fragmentada e mada por um conduto principal, que, pon- mantém escadas, placas de sinalização e em estado ruiniforme, recoberto por lapiás tualmente, dilata-se formando salões com lixeiras. Não há, porém, fiscalização, contro- serrilhados, blocos acomodados, fraturados pequenas passagens ou apêndices laterais, le de entrada ou cobrança de taxas. Por tal e bastante intemperizados no topo, enquan- divisões com gênese associada tanto a ele- omissão estatal, percebe-se que a visitação to que a base congrega matacões rolados, mentos tectônicos secundários, bem como se tornou bastante danosa ao ambiente, que, estando o serrote praticamente desprovido a fragmentações ou processos de incasão, hodiernamente, encontra-se muito alterado de qualquer solo residual sobre a aflorante, que revelam um estado senil de evolução (lixo, pichações, pisoteio e quebra de espe- sendo formado, apenas, pela matriz mar- cavernícola. Nesse lanço exemplificativo, leotemas), por decorrência direta da inexis- mórea que congloba as cavernas. pode-se apresentar o macro bloco central tência de ações de conservação. O desenvolvimento cavernícola foi que, abatido do teto, gerou o patamar que Fisicamente, a gruta situa-se em área condicionado pelas fraturas dominantes, dá acesso ao nível superior, logo após a tra- Casa de Pedra de Martins. Os traba- que fica ao sopé da Serra de Martins, em que, basicamente, cortam no sentido E-W, vessia do salão principal, situado a seguir lhos desenvolvidos durante 2012-2016 maciço de mármore (Fm. Jucurutu), que também se destacando sets NE-SW. Todos da entrada da caverna. A parte final, igual- na Casa de Pedra de Martins, inclu- se destaca como um serrote elevado, de esses vetores contribuem amplamente à mente, é bastante decorada, havendo muitas íram a produção de novo mapa topo- coloração acinzentada, bastante visível em formação do principal vão da caverna, que colunas, ponto em que o teto se torna mais gráfico, construído com estação total, meio à paisagem do distrito rural de Salva se apresenta como um amplíssimo salão, baixo, bem como há formação de grandes em iniciativa pioneira no Rio Grande Vidas. O acesso principal se dá através de bastante decorado, com várias deposições travertinos, comparáveis, somente, aos vis- do Norte, o qual representou uma estrada carroçável, em leito natural, a qual de espeleotemas associadas à tectônica que tos na Furna Feia, no município de Baraúna/ evolução, com relação à antiga carta permite o deslocamento por veículo até, ditou o desenvolvimento da gruta, vez que, RN, fazendo-se uma leitura comparativa ao do CERN, ao trazer novas passagens, praticamente, a entrada da caverna. Tal via, por tais pontos de infiltração, águas me- carste potiguar. Infelizmente, impactos an- maior detalhamento e precisão. parte da RN-117 e atravessa a zona rural de teóricas percolam o maciço e atuam, ainda trópicos degradaram boa parte do conjunto Martins/RN, podendo ser também acessada hoje, nas deposições químicas. Assim, há de espeleotemas da caverna e disseminaram pelo município de Umarizal/RN. A caver- grandes assembleias de estalactites (algu- lixo e pichações por toda parte. na mostra duas entradas principais, que mas atingindo até 4,0 metros de compri- Conforme comentado, a gruta apre- permitem o ingresso por caminhamento. A mento), bem como formas decorrentes de senta entrada secundária, na porção nordes- principal se situa à meia altura do paredão escorrimentos associados a estalagmites, te, local com vários pontos de agachamen- (lado sudoeste), ponto acessível por esca- que, por decorrência lógica, em alguns to. Na parte superior, há dois ambientes daria rústica de alvenaria. A segunda (lado pontos, formam enormes colunas (algumas opostos, distintos e separados, sendo que nordeste), está em ponto remoto, localizado atingem os 8,0 metros), criando um magní- ambos somente são acessíveis por via de por trás do serrote, não sendo visível, de fico conjunto de deposições suspensas, es- escalada, sendo esses os fragmentos mais imediato, ao visitante que aporta na Casa pecialmente na junção interníveis. conservados da gruta.

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II. Pérolas O aspecto interior da caverna é, ainda, Caverna com uma única entrada, si- marcado por dois domínios bastante distin- tuada praticamente no topo de grande ma- tos, em que pese a frequente intercomunica- ciço marmóreo (Fm. Jucurutu) conhecido ção ao longo de vários pontos. O primeiro como Serra dos Picos, de aspecto bastante é a descrita dolina, que está associada a ele- íngreme e localizado nas proximidades da mento biótico arbóreo, repleto de raízes aé- RN-117, na altura da ponte que corta o Ria- reas, blocos abatidos angulosos de dimensão cho Picos. O ingresso na caverna é feito por métrica e material orgânico vegetal acumu- uma passagem parcialmente encoberta pela lado nas paredes e na parte baixa. A segunda vegetação, vez que uma copa de árvore (Ta- dimensão da caverna é de aspecto afótico bebuia sp.) praticamente isola o acesso ao (incluindo várias zonas de transição), ha- interior da gruta, sendo necessário forçar o vendo predomínio de alta umidade (zona de caminho por entre os ramos vegetais. Exter- gotejamento), com relevantes espeleotemas, namente, há lapiás bem desenvolvidos (cen- dentre os quais se destacam oólitos, escor- timétricos), verticalizados, encobrindo toda rimentos, coraloides, estalactites e diversas a encosta do serrote. São formas básicas superfícies com cristalização evidente. O serrilhadas e dentadas. A dolina que domina grande destaque dessas estruturas são as pé- o vão de entrada pode ser considerada como rolas, situadas em travertinos em planos de de expressivo desenvolvimento aos padrões deposição calcítica (patamares), decorrentes locais, sendo fortemente condicionada por do preenchimento cíclico por sedimento are- elementos tectônicos e planos de acama- no-argiloso dos vãos da caverna. Posterior mento do mármore que, por abatimento, carreamento desse material clástico, está evi- abriu lateralmente a encosta do serrote. dente em vários pontos da gruta, quando se Internamente, a gênese se associa a percebem marcas recentes de gastrópodes in- processos de crescimento retilíneos, mas que crustados em vários locais do teto da caverna perdeu tal configuração pelo abatimento de e resíduos de antigos depósitos sedimentares. blocos e dissoluções posteriores. O principal Passagens por entre essas placas suspensas e Pérolas. Um dos sítios mais preservados e inacessíveis da Serra de Martins. Situada eixo de desenvolvimento do corpo alinha-se calcificadas dão a impressão de que há múl- praticamente no topo do monte Picos, sua entrada somente é atingida com escala- para NE-SW (acamamento), havendo, po- tiplos níveis, mas, em verdade, evidencia-se da. Internamente, há estreitos condutos, ricamente ornados. Trata-se de uma gruta rém, passagens endocársticas praticamente apenas um rearranjo de um único conduto muito interessante do ponto de vista biótico e abiótico. ortogonais a esse sentido de crescimento, retilíneo. A gruta está muito preservada, au- sendo, entretanto, menos expressivas. sentes quaisquer impactos antrópicos.

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III. Alto da Serra do, porém, uma condicionante diferente aos Cavidade de múltiplas entradas, que condutos de entrada, quando se toma que se situa no alto de serrote sem nome defi- estão dispostos a 260ºAz e 340ºAz. Todos nido, mas ocasionalmente citado na região esses vetores encontram-se na porção cen- como "Garrafão", parte do conjunto indi- tral da gruta, quando a morfologia interna cado como Serra dos Picos, em cota relati- dá lugar a formação de pequenos salões com vamente alta. Externamente, não se associa passagens verticais nos interníveis, dispostas qualquer vegetação às entradas. Há, apenas, como chaminés e que culminam em peque- uma ampla exposição de mármores, com nas claraboias. destacado lapiezamento, desenvolvido na Apresenta-se como uma das cavernas superfície de grandes matacões. mais decoradas da área, com a presença de Há duas passagens principais ao in- vários espeleotemas, especialmente, superfí- terior, sendo que, as demais podem ser cies perolizadas. Destacam-se formas de ex- classificadas como exíguas claraboias por sudação como coraloides, muito associadas entre fraturamentos. A primeira delas está às entradas, pequenas estalactites e largos na encosta rochosa quase no alto do maciço, escorrimentos, especialmente em grandes porção noroeste, enquanto que a segunda blocos angulosos abatidos, provenientes do se mostra como um declive decorrente de colapso de porções inteiras do teto da gru- dissolução pluviométrica, que formou um ta. Em que pese apresentar-se com uma das nítido sumidouro, localizado no topo do maiores cavernas de Martins (desenvolvi- Alto da Serra. Uma das mais extensas ca- afloramento. Destacam-se, de toda forma, mento linear), Alto da Serra não se configura vernas da Serra de Martins, situa-se em área como as mais promissoras passagens ao en- por condutos volumosos, mas, ao contrário, de difícil acesso, no topo de maciço, sendo docarste no alto do referido serrote, havendo está repleta de passagens muito estreitas, igualmente penosa a progressão por suas referências a essa caverna datadas ainda do geralmente condicionadas pelo alargamento passagens internas, que são formadas por Clube de Espeleologia do Rio Grande do do plano de acamamento. Os sedimentos estreitos condutos, com entradas com forte Norte – CERN e dos estudos de Virgens internos variam muito, havendo cascalho desnível e blocos soltos. Trata-se de uma Neto, entre 1998 a 2004. nas proximidades das entradas e material caverna conhecida desde as explorações do O desenvolvimento é condicionado areno-argiloso nas partes mais profundas, CERN, na década de noventa (1990). pelos alongamentos ocasionados pelas fratu- além de vários pontos com blocos abatidos. ras dominantes. É interessante constatar que As seções revelam formas elipsoidais, em o eixo principal da caverna se orienta para sua maioria associadas à livre circulação de NE-SW, aproximadamente 70ºAz, haven- água meteórica pelo acamamento.

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IV. Burra Leiteira no sentido NW-SE que, a noroeste, dá aces- A Burra Leiteira é uma gruta que se so a salão bastante decorado, especialmente destaca no topo do maciço de mármore (Fm. por formas perolizadas de travertinos, escor- Jucurutu), estando localizada na propriedade rimentos e cortinas, tudo divisado por uma do Sr. Aldo Guimarães, sendo caracterizada, porção da litologia encaixante residual, blo- externamente, por dois elementos bastante co anguloso, que restou suspensa ao teto. notáveis. O primeiro deles é a configuração É interessante, ainda, dizer que a mes- da entrada, que se mostra como uma dolina ma árvore provém muita serrapilheira ao de colapso, não muito profunda, repleta de ambiente, favorecendo a recarga energética blocos às margens de um paredão de apro- orgânica, o que, associada à umidade do ximadamente 5,0 metros de altura. Em sua local, ampara amplas condições ao desen- porção sudeste, o segundo elemento que a volvimento de diversos artrópodes. Ao final, individualiza, qual seja, uma grande árvore todo esse ambiente finda em sumidouro cen- conhecida popularmente como burra leiteira tral, não demonstrando condições ao acú- (Sapium glandulatum), que se destaca na mulo de água como empoçamento, em que paisagem do alto do maciço. pese ser um ambiente bastante úmido. Ainda Externamente, as demais característi- nesse mesmo poço, a sudeste, o vão vai-se cas assemelham-se às outras grutas daquela estreitando em sua largura, ao mesmo tem- Burra Leiteira. Trata-se de um sítio espeleológico que reúne as principais caracte- área, havendo grande quantidade de lapiás po em que crescem a altura e profundidade, rísticas das grutas identificadas na região dos Picos, em Martins: estreitas passa- recobrindo o afloramento e blocos erodidos elementos condicionados, todos, por uma gens, nas quais a vegetação árborea praticamente domina a recarga energética da circundando a prefalada entrada. O vão ex- fratura verticalizada e que, ao final, impede matéria orgânica que circula no ambiente endocárstico. Em termos físicos, o eixo terior apresenta consideráveis medidas, po- a passagem humana por estreitamento do principal de desenvolvimento da caverna está associado não ao acamamento da dendo-se indicar, aproximadamente, 16,00 conduto, apesar de se aparentar continuida- rocha, mas ao padrão de fraturamento NW-SE. metros por 4,00 metros, sendo a profundida- de espeleológica para a gruta. de da dolina 3,5 metros. No extremo oposto desse mesmo Internamente, o ambiente endocárs- corpo cavernícola, atravessando-se exter- tico floresce a partir da comentada Sapium namente a referida dolina de entrada, há glandulatum, sendo que, da árvore, avolu- outro poço que dá acesso a limitado salão ma-se um poço com aproximadamente 7,0 oval, em nível inferior, tratando-se, aqui, de metros de profundidade, que pode ser ven- ambiente de pouca continuidade e sem des- cido por simples escalada livre. Ao fundo taque cavernícola. Trata-se de uma caverna desse lance vertical, orienta-se um conduto importante no cenário local.

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V. Três Enxus A partir da entrada principal, desen- Dentre as cavernas situadas nos serro- volve-se uma parcela muito fótica e aberta, tes de mármore nas imediações da proprie- que culmina, a sudeste, com outra entrada dade do Sr. Aldo Guimarães, destaca-se a em dolinamento de colapso. O avanço a Três Enxus como a mais importante, espe- sudoeste, porém, revela a porção mais in- cialmente pelo potencial biológico e pelas teressante do corpo cavernícola, quando se dimensões. Externamente, não há elementos encontra um salão condicionado por uma que a diferenciem das demais grutas da área. grande Sapium glandulatum, árvore que Suas entradas estão conformadas a pequenas favorece o acúmulo de material orgânico passagens entre blocos, em região próxi- no interior da caverna. A partir dali, há ma ao topo do maciço, sendo que, algumas um pequeno salão, com entrada estreita, dessas, ocorrem como claraboias, das quais muito decorado, especialmente por escor- brotam vegetação arbórea nativa. O princi- rimentos, colunas, cortinas, estalagmites pal acesso ocorre por força do alargamento e estalactites, sendo o mais relevante con- do plano de foliação do mármore, sendo junto de deposição visto em todo o maciço. uma pequena passagem lenticular, formada Igualmente, o mesmo vão mostra vários por rasgo horizontal na rocha, em área co- pontos de deposição clástica, em que mate- Três Enxus. Não há registros que a caver- berta por lapiás serrilhados. rial conglomerado está preso ao teto, o que na conhecida como Três Enxus tenha sido Internamente, a caverna alinha-se no revela a existência de paleoníveis sedimen- trabalhada pelos grupos espeleológicos que eixo NW-SE, havendo pontos de comuni- tares associados à evolução da gruta. passaram pela área na década de noventa. É cação decorrente do cruzamento da disso- Na parte final, um longo e alto condu- composta por condutos bastante retilíneos e lução do acamamento com fraturas verti- to segue praticamente para leste, revelando pequenos salões decorados. A parte central, calizadas secundárias, o que favoreceu ao a presença de colônias de quirópteros e su- onde há grande claraboia, oferta serrapi- surgimento de acessos exteriores. O desen- midouros, em ambiente muito interessante lheira, que dá suporte a grande profusão de volvimento é retilíneo, sendo suas seções do ponto de vista espeleológico. Há zonas pequenos seres que habitam a gruta. transversais lenticulares semiverticais, con- afóticas, além de fauna composta por muitos dicionadas, essencialmente, por elementos aracnídeos e insetos. de diáclase. Não se trata de uma gruta com Essa gruta não foi citada nos trabalhos amplos salões (normalmente, pequenos e de Virgens Neto e se mostra como uma rele- fóticos), mas condutos alongados de forma vante caverna da Serra de Martins. Sua im- expressiva verticalmente, alguns podendo portância cênica e biológica é fundamental à chegar a 10,0 metros de altura. área, estando muito bem preservada.

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VI. Dorminhoco turas é diretamente responsável pelo alarga- A gruta foi inicialmente trabalhada mento de salões e surgimento de claraboias. pelo CERN, ainda nos anos noventa do séc. A gruta não é volumosa, em que pese sua XX. Contudo, como esses registros pionei- projeção ser consideravelmente expressiva, ros perderam-se, seus dados foram recon- em termos comparativos às demais da área. solidados somente pelo trabalho de Virgens A caverna se destaca por duas partes, Neto (2004), quando houve nova topografia. quase distintas. A primeira segue da entrada Situa-se na região dos Picos, à meia principal ao conduto NE-SW; enquanto a se- altura de serrote, na base de grande aflora- gunda, surge ao término desse mesmo vão, mento marmóreo (Fm. Jucurutu), distando quando, há passagem no teto que culmina aproximadamente 700 metros de caminhada em dolina de colapso bastante fótica, que, ao da sede do imóvel rural do Sr. Aldo Gui- seu turno, leva a espaços afóticos, onde há o marães. Destaca-se por apresentar vários desenvolvimento de colônias de quirópteros. acessos ao endocarste, mas apenas como Há trechos com deposições químicas, al- caminhamento, pelo qual há um rasgo semi- gumas perolizadas, destacando-se escorri- vertical na rocha, em formato lenticular, de- mentos, cortinas e travertinos. Nos condutos corrente do mergulho de aproximadamente laterais, foram vistos patamares calcíticos 40º do plano de acamamento do mármore. associados a travertinos, indicando pontos Dorminhoco. Gruta bastante conhecida, cuja catalogação inicial foi feita pelo As outras entradas, nesse contexto, surgem de preenchimento sedimentar e posterior re- CERN, ainda na década de noventa (provavelmente, entre 1993-1996). Seus domí- apenas como claraboias. moção do material. nios se apresentam como estreitos condutos, alongados NE-SW, condicionados pelo O entorno está em área de encosta de Em termos de ciclo energético, há am- mergulho da rocha (esq.). A morfologia dos condutos alinhados NW-SE é bem dife- serra, com mata nativa muito preservada, pla circulação de material orgânico pela ca- rente, com paredes verticais, sendo normalmente estreitos e altos (dir.). local de penoso acesso, com trilha muito ín- verna, não somente pelo produto oriundo do greme, o que torna a cavidade bem protegi- folhiço que invade a gruta por vários pontos, da por fatores naturais. mas também pela movimentação de morce- O desenvolvimento é retilíneo, condi- gos, havendo áreas de acúmulo de guano. cionado pela dissolução do plano de acama- As dimensões são bem expressivas, mento, alinhado a NE-SW. Fraturas verticais, sendo uma das principais cavernas, em ter- que cortam os condutos gerados a partir da mos de desenvolvimento, do município de foliação, promovem prolongamentos laterais Martins. Destaca-se o amplo desnível, de sem maiores continuidades a NW-SE. Em quase 30,0 metros, bem como vários pontos alguns pontos, esse tipo de encontro de fra- nos quais o teto atinge até 15,0 metros.

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Os estudos espeleológicos levados ao carste da Serra de Martins, representam, até o presente, a mais extensa e profunda iniciativa, feita por entidades não governa- mentais, voltada ao conhecimento e divul- gação do patrimônio espeleológico potiguar. Vieram para somar informações sobre uma área que sempre foi carente de ações siste- máticas. A evolução ocorreu ao passo que os trabalhos avançaram não somente sobre o meio físico, mas, igualmente, estudaram a Biologia Subterrânea das cavernas e abri- gos daquela região. Agregaram mais de uma dúzia de colaboradores, oriundos de áreas diversas. Mapas topográficos, prospecções em caminhamentos em setores e as coletas dos biólogos, são exemplos concretos desse avanço. A construção da base da dados de Martins, com coordenadas geográficas pre- cisas, pôde ser verdadeiramente inaugurada, além do que, fez-se tudo isso recuperando o pioneirismo de estudos como os do Clube de Espeleologia do Rio Grande do Norte e dos grupos coordenados por Joaquim das Virgens, o que possibilitou o reconhecimen- to e a valorização daqueles que, voluntaria- mente, dedicaram-se tanto, durante anos, ao entendimento dessa parcela do conjunto de cavernas do Brasil. Os trabalhos continuam e ainda há muito a se fazer nos serrotes de mármore. Martins continua sendo uma fron- teira espeleológica potiguar.

~ 80 ~ ~ 81 ~ Prospecções e Mapeamentos Espeleológicos: Serra de Martins/RN Revista Lajedos I Dez. 2017 I www.espeleonordeste.org

~ 82 ~ ~ 83 ~ Notas e Referências Revista Lajedos I Dez. 2017 I www.espeleonordeste.org

Notas e Referências

Le Système d'Éclairage: Antigos capacetes e carbureteiras Petzl

Pesquisar sobre equipamentos Petzl, no Brasil, é extremamente difícil, não somente pela ausência de textos em língua portuguesa, mas especialmente porque quase nada há sobre os produtos direcionados à Espeleologia, dentro de uma abordagem fabril-cronológica, que narre o processo de criação. Talvez por serem, ainda, parte de uma história recen- te, os espeleólogos parecem não ter despertado à necessidade de escrever sobre os capacetes e carbureteiras dos anos setenta do séc. XX em diante. O material apresentado, somente foi possível ser reunido, graças aos esforços do coautor David Cardoso, que atuou na Espanha, e também de uma amiga, chamada Bruna Misut e seu esposo, Almedin Misut, que auxiliaram na França, a quem seremos eternamente agradecidos pela enorme gentileza! Somos muito gratos a outros colaboradores, como Martin Jakob Hilty, que trouxeram equipamentos da Suíça e outros lugares da Europa. Acerca das informações, há muita coisa esparsa. Certamente se tívessemos recursos para fazer uma visita à fábrica da empresa em Crolles, França, haveria uma certeza maior sobre a exatidão das datas apresentadas, que foram con- seguidas por inferência e aproximação, a partir de várias fontes. Nesse sentido, foram fundamentais as considerações feitas pelo professor francês Gabriel Hez, bem como o e-book publicado pela Petzl em seu site, "From the Deep: The Petzl Adventure", obra de Sophie Cuenot e Hervé Bodeau, 272 p., disponível para download em https://www.petzl.com. De outra sorte, há outro material muito rico, que também esclarece sobre a cronologia das lanternas, o texto "La Mort Annoncée de la Lampe à Acétylène: et après?", de Fabien Fécheroulle, publicado eletronicamente na Cahier de l’EFS, n°17, mantida pela Escola Francesa de Espeleologia, ligada à Federação Francesa de Espeleologia (EFS/FFS).

Prospecções e Mapeamentos Espeleológicos: Serra de Martins/RN

O trabalho espeleológico feito na Serra de Martins/RN, iniciou-se na parceria da Sociedade Espeleológica Potiguar – SEP, com a Fundação para o Desenvolvimento Sustentável da Terra Potiguar – FUNDEP, em 2012. Mais tarde, com a assimilação da SEP pela Espeleonordeste – Sociedade Nordestina de Espeleologia, os trabalhos foram incorporados por essa última. A topografia da Casa de Pedra de Martins, bem como os relatos da expedição de 1993, estão em relatório do antigo Clube de Espeleologia do Rio Grande do Norte, mas o mapa original, feito em papel manteiga, foi perdido. O que chegou até o presente, trata-se de uma reprodução digital feita por Joaquim das Virgens Neto e que ilustrou vários de seus trabalhos entre 1998-2004. Por fim, o próprio Joaquim das Virgens Neto consolidou seu material sobre as grutas da área, quando da apresentação de seu trabalho de conclusão de gradução no Curso de Geologia da UFRN, "Mapeamento Geo-Espeleológico do Sistema Espeleológico Serra do Martins – Rio Grande do Norte", em 2004. Os estudos completos relativos à geoespeleologia e mapas topográficos estão no relatório da SEP, "Projeto Monumento Natural Cavernas de Martins - Diagnóstico Espeleológico de Cavernas e Abrigos no Município de Martins, Rio Grande do Norte", de 2014. Funda do Alto da Serra, Serra de Martins/RN.

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