Universidade de Lisboa Faculdade de Letras Departamento de História

CONTRIBUTO PARA O CONHECIMENTO DAS ELITES OLISIPONENSES

Júlia Almeida

Mestrado em História Antiga 2011

Universidade de Lisboa Faculdade de Letras Departamento de História

CONTRIBUTO PARA O CONHECIMENTO DAS ELITES OLISIPONENSES

Júlia Almeida

Orientada pelo Prof. Doutor Amílcar Guerra

Mestrado em História Antiga 2011

Índice

1 Introdução ...... 1 2 Metodologia ...... 4 3 Revisão da Literatura sobre o tema ...... 8 4 Instituições fundamentais do sistema de funcionamento dos municípios . 14 4.1 Populus ...... 14 4.2 Senatus (ou ordo decurionum ) ...... 15 4.3 Magistratus ...... 23 4.3.1 Duúnviros ...... 26 4.3.2 Edis ...... 28 4.3.3 Questores ...... 29 5 Iulia Olisipo e as suas elites ...... 31 5.1 civium Romanorum ...... 41 5.2 Elites locais ...... 45 5.2.1 Magistrados municipais ...... 50 5.2.2 Flâmines ...... 62 5.2.3 Flamínicas ...... 69 5.2.4 Augustais ...... 71 6 Evergetismo em Felicitas Iulia Olisipo ...... 81 7 Considerações finais ...... 98 Bibliografia ...... 101 Siglas e Abreviaturas ...... 119 Índice de Figuras ...... 120 Índice de Fotografias ...... 120 ANEXOS ...... 121 Anexo 1 ...... 122 Anexo 2 ...... 127

1 Introdução

Lisboa, charneira entre o Atlântico e o Mediterrâneo, é possuidora de atractivos inquestionáveis e que a tornaram ponto de chegada desejado por muitos. O que Lisboa é hoje, uma cidade multicultural, é reflexo de uma passagem de povos, de culturas assimiladas ao longo de séculos. No percurso que aqui faremos, em que deambularemos entre os séculos I e IV d.C., e sobretudo entre os séculos I e II d.C., observaremos esta Olisipo como produto de um conjunto de marcas acumuladas ao longo dos tempos. Integrada no Conventus Scallabitanus , um dos conventus da província da , Olisipo emerge como porto economicamente atractivo, activo e vivo, onde se cruzam romanos e indígenas. A boa situação geográfica de Olisipo , no estuário do Tejo, conferia-lhe uma posição estratégica para o escoamento de produtos próprios, como o , ou para a redistribuição de produtos, como o azeite da Bética, actuando como porto de escala das rotas entre o Mediterrâneo e o Atlântico, fazendo dela, a partir do último quartel do século I a.C., uma verdadeira capital litoral da Lusitânia (Mantas, 1997, p. 22). Em 197 a.C. a Hispânia é dividida em duas províncias, a província Hispania Ulterior e a província Hispania Citerior , designadas numa perspectiva desde Roma, governadas por praetores normalmente com o título de pro consules (D’Ors, 1953, p. 136). Interpretando um passo de Díon Cássio (LIII, 12, 4-5), muitos autores consideram que em 27 a. C. a Hispania Ulterior é dividida em Hispania Ulterior Baetica , com capital em Corduba , e em Hispania Ulterior , com capital em Emerita Augusta , constituindo o Guadiana o limite entre as duas províncias (Alarcão, 1988 a, p. 33). Ainda que seja consensual que esta divisão foi levada a cabo por Augusto, a data em que ocorre suscita contudo dúvidas, apontando a maioria dos autores para uma data entre 27 e 12 a.C. e mais provavelmente próxima de 12 a.C. (Guerra, 1995, p. 46). A Lusitania e a Hispania Citerior ou Tarraconensis, com capital em Tarraco , ficam dependentes directamente do Imperador, governadas através dos seus enviados, legati Augusti propraetores , dependendo a Bética, dado o seu nível de pacificação e o facto de ser uma área mais romanizada, do Senado, através de um proconsul (Balil, 1975, p. 42).

1 As fronteiras das províncias ter-se-ão apenas tornado fixas entre 7 e 2 a. C, com Augusto (Moita, 1994, p. 36). São assim então estabelecidos limites à província da Lusitânia, ocupando a região a sul do Douro, tendo grosso modo como fronteira oriental, a sul, o rio Anas (Guadiana) e avançando na região central pelas actuais regiões de Cáceres e Mérida (Moita, 1994, p. 37). No âmbito de cada província surgem, logo desde a época de Augusto, demarcações de carácter jurisdicional para facilitar a sua administração, os conventus (D’Ors, 1953, p. 138). De acordo com Plínio ( NH , 4, 117) a Lusitânia divide-se em três conventus, o Conventus Scallabitanus, com a capital Scallabis Praesidium Iulium , sede da circunscrição jurídica romana da qual Felicitas Iulia Olisipo depende, o Conventus Emeritensis , que tinha por capital , e o Conventus Pacensis , com a capital Pax Iulia ou Colonia Pax Iulia . Na capital do conventus , o governador da província julgava as causas que ultrapassavam a jurisdição dos magistrados municipais. O conventus tinha uma assembleia, com representantes das cidades que o integravam, e era um órgão consultivo do governador. Nas províncias podem-se distinguir dois tipos de núcleos privilegiados, as colónias e os municípios. As colónias podiam ser tanto de cidadãos romanos, constituindo coloniae civium romanorum , como de cidadãos latinos, designadas coloniae civium latinorum . Tradicionalmente os municípios distinguem-se igualmente entre municipium civium romanorum, como é o caso de Olisipo , e os de direito latino , assunto tratado com maior detalhe no âmbito do capítulo referente a Felicitas Iulia Olisipo e as suas elites . A vida provincial regulava-se essencialmente pelo edito provincial e pela Lex provinciae da Hispania , supondo que esta existiria. Regia-se ainda pelas decisões do governador, senado ou imperadores que a ela dissessem respeito, bem como pelas leis coloniais e municipais (Mentxaka, 1993, p. 34). Desde o teatro às termas, desde o forum aos templos, o município de Olisipo receberá as marcas identificativas de uma urbs romana. Nesta Olisipo emergente, as elites movem-se ao estilo romano, constituindo o posto avançado de Roma neste município. São no fundo o garante da estabilidade e da romanização da cidade, assegurando o poder local. Duúnviros, edis, os ascendentes do que é hoje o corpo executivo da cidade, deles temos registos epigráficos que nos dão a conhecer um pouco do que era a vida social e política deste município.

2 Na presente dissertação, pretendemos definir quem constituía a elite deste municipium e que por esse mesmo motivo fornecia os personagens da sua vida política. Desde logo haverá que analisar as grandes famílias aqui presentes, pois eram estas as que governavam a cidade. Porque tinham elevado poder económico e aliado a esta situação viria o poder. Não nos esqueçamos que inicialmente a vida política apenas estava aberta a quem tinha capacidade económica suficiente para a exercer. Como materiais de apoio a este esforço de reconstituição de um pedaço da história, recorremos desde logo ao conjunto epigráfico referente a Olisipo , já objecto de análise por parte de vários investigadores. Se assim é, que interesse haverá então num novo trabalho que abordará temas e epígrafes já tratados? Pois a motivação surgiu-nos exactamente de nos termos deparado com uma dispersão e fragmentação da informação existente pelo que uma reconstituição que desse uma imagem de conjunto da elite política e social de Olisipo nos pareceu impor-se. Para que este trabalho se tornasse possível, foi essencial o apoio de várias pessoas, às quais aqui agradeço. Desde logo, ao Prof. Doutor Amílcar Guerra, orientador desta dissertação, a quem agradeço as correcções, os comentários e a motivação transmitida que apoiaram no caminho até à conclusão desta dissertação. A montante, gostava de agradecer ao Prof. Doutor Nuno Simões Rodrigues e ao Prof. Doutor Luís Manuel de Araújo, que em cursos prévios ao mestrado me motivaram e solidificaram o meu interesse em frequentar o Mestrado em História Antiga. Uma palavra de agradecimento igualmente aos meus colegas de mestrado, pela amizade e partilha durante estes quatro anos, em particular à Alda Delicado, a quem agradeço igualmente os comentários e a revisão deste trabalho, bem como à Aurora Mocho, à Maria Fernandes, ao Iúri Vieira Martins, ao André Silva e à Joaquina Carita. Finalmente, um agradecimento especial à minha família, sobretudo ao Carlos, pelo incentivo e apoio na revisão deste trabalho, bem como à Dra. Cristina Rocha, pelo apoio e disponibilidade laboral, sempre que necessário.

3 2 Metodologia

Como referido anteriormente, para a reconstituição das elites de Olisipo , recorremos desde logo ao conjunto epigráfico existente para Olisipo, que constitui a base dos trabalhos. Tratando-se de uma informação coetânea, torna-se por isso particularmente relevante para compreender a realidade social. Através dos registos epigráficos, podemos assim identificar estatutos, cargos públicos e conhecer manifestações de forte conteúdo político. Para além dos registos epigráficos, são igualmente recolhidas informações sobre Olisipo em algumas fontes literárias antigas, como seja em Plínio e Estrabão, nomeadamente no que se refere a dados de natureza geográfica e económica, ou no Itinerário Antonino, particularmente no que às vias respeita. Tratam-se de importantes documentos que nos ajudam a compreender a relevância da posição estratégica da cidade no mundo antigo. Constitui igualmente base do nosso trabalho a diversa literatura que sobre a Olisipo deste período existe e que será analisada em maior detalhe no capítulo 3, referente à Revisão da Literatura sobre o tema. Já a numismática, importante referência para a reconstituição histórica, não será no presente caso, até ao momento, fonte a considerar, dado que não existem registos numismáticos referentes a Olisipo em qualquer moeda cunhada na Hispania . Para além disso, mesmo as moedas que se conhecem são poucas e pouco relevantes para o assunto que aqui tratamos. Em termos cronológicos, o nosso trabalho acompanha as epígrafes a que temos acesso. Ainda que a datação das inscrições nem sempre seja fiável, são normalmente integradas num período correspondente aos séculos I e II d.C.. No entanto, alguns monumentos são mais tardios, chegando ao século IV d.C.. Com efeito, uma epígrafe datada de 336 d.C., de renovação das thermae Cassiorum , permite observar uma cidade em movimento num tempo de crise muito referida, dinamismo talvez justificável por se tratar de um município com inúmeros recursos económicos. Pretendendo esta dissertação constituir um contributo para o conhecimento das elites deste município, convirá, antes de avançarmos, precisar o que consideramos como elite para efeitos do nosso trabalho. Será de salientar que a própria noção de elite está desde logo associada ao próprio facto de a sociedade romana, e por associação, as

4 comunidades indígenas que, conquistadas, assumem os valores romanos, como é o caso de Olisipo , serem bastante hierarquizadas. Nesta dissertação, incluímos na noção de elite todos os elementos pertencentes às camadas altas da sociedade, sobretudo a pertencente à elite política. Com efeito, o exercício de magistraturas conferia-lhe prestígio e notoriedade na sociedade, estando o desempenho de cargos públicos estreitamente relacionado com o poder económico que os indivíduos que a compunham detinham. Podemos igualmente estabelecer laços entre esta elite política e as funções ditas religiosas, em boa parte com cariz que hoje designaríamos como político. Integramos desde logo a elite pré-romana, nem sempre fácil de identificar, ainda que em alguns casos a onomástica se revele clara. Esta elite, romanizada, será o condutor da romanização no município e o modelo a seguir. A sua fonte principal de riqueza deverá ter sido a agricultura, a propriedade fundiária, encontrando-se com efeito no ager Olisiponensis vestígios das suas villae . Na cidade, desempenhariam as funções associadas ao decurionato, às magistraturas e aos sacerdócios. Consideramos assim todos os elementos do senado local ou ordo decurionum , os decuriões, no qual estariam representadas as famílias mais poderosas do município, que dominavam tanto a esfera da cidade como do campo. Incluímos igualmente os magistrados municipais, que de resto passavam a pertencer a este ordo a partir do momento em que eram designados para o desempenho das magistraturas. Os magistrados detinham um poder considerável, sobretudo os duúnviros, ainda que controlado pelo senado local, sendo olhados com respeito pela sociedade A sua função permitia um contacto privilegiado tanto com o populus , que os havia eleito, como com elementos de outras comunidades, com a administração provincial e central ou mesmo, em determinadas situações, com o imperador e a família imperial. Os flâmines, bem como as flamínicas, estão igualmente inseridos neste conceito de elite. Estes sacerdotes do culto imperial são de resto da mesma extracção social que decuriões e magistrados municipais, assumindo, tanto por questões económicas, políticas e religiosas, um elevado estatuto na sociedade olisiponense. Para além deste grupo de ingenui , incluímos igualmente os augustais, que ainda que tradicionalmente libertos, pela sua capacidade económica e acção evergética dão um relevante contributo para a vida da comunidade. A elite considerada neste trabalho será a pertencente ao território olisiponense, pelo que haverá que defini-lo. A circunscrição territorial do município compreenderia a

5 cidade propriamente dita ( oppidum , urbs ) e uma zona em torno, o ager Olisiponenis , cujos habitantes dependiam da cidade. Estes dois elementos formavam uma unidade: na cidade encontravam-se os edifícios públicos e nela se concentrava a actividade política, religiosa, e comercial; no ager encontravam-se os recursos agrícolas, onde as elites tinham as suas propriedades e villae, que constituíam o reflexo das cidades. As villae seriam o principal elemento da valorização económica do solo e vector essencial de transformações culturais enquanto modelo romano de habitação e de produção. Contribuíam para a romanização e para o desenvolvimento dos campos, tanto mais quanto maior fosse a distância face à cidade e às vias de comunicação, sendo que a sua relevância neste aspecto estaria também igualmente relacionada com a importância económica da villa (Gorges, 1990, pp. 92-93). De acordo com Alarcão, o território do município de Olisipo abrangia uma área que ia, a norte, até ao paralelo de e iria Tejo acima até Alenquer. A sul abrangia parte da península de Setúbal, que partilhava com Salacia , não sendo fácil, no entanto, determinar se a nascente a fronteira corria pelo Tejo ou integrava terras da margem esquerda do Tejo (Alarcão, 1994, p. 61). Cardim Ribeiro coloca algumas dúvidas relativamente ao limite avançado por Jorge de Alarcão, sobretudo no que respeita às fronteiras leste e sul, propondo que, no que respeita aos limites orientais, que toda a área da suposta civitas do Vale do Soraia, incluindo o lado ocidental do Tejo, ou pelo menos uma faixa abarcando a várzea do rio até à Póvoa de Santa Iria, pertenceria a Scallabis . Relativamente ao limite sul, crê que englobaria a faixa costeira hoje denominada «Outra Banda», prolongando-se desde a Costa da Caparica a Alcochete abrangendo a «Borda de Água»; o seu extremo iria talvez até Equabona e a leste alcançaria o esteiro de Alcochete, até Rio Frio (Ribeiro, J, 1994c, pp. 79-82). Ao aproximar-nos do tema, resolvemos dar início a esta dissertação pela abordagem de quem já se debruçou sobre esta questão, seja sobre Olisipo no seu todo, seja da elite olisiponense propriamente dita. No capítulo 4 passaremos em revista as instituições base do sistema de funcionamento dos municípios, nomeadamente o populus , o senatus ou ordo decurionum , e os magistratus , o que nos dará a base para a compreensão das funções desempenhadas por cada um destes grupos e da sua contribuição para a vida do município. Como forma de enquadramento da actividade da elite no espaço urbano, faremos uma incursão, no capítulo dedicado a Felicitas Iulia Olisipo, nos vestígios

6 arqueológicos romanos mais relevantes do município, procurando relacionar, sempre que possível, as elites com as marcas deixadas por elas na cidade. Focaremos igualmente a questão do título de municipium civium Romanorum atribuído a Olisipo , tema que provocou polémica entre os académicos e cujos contributos abordaremos. Após este enquadramento, passaremos então ao tema central deste nosso trabalho, apresentando os registos conhecidos de quem compunha a elite deste município. Haverá que abordar desde logo quais as gentes que integravam a elite olisiponense, que forneciam os decuriões, os magistrados e os sacerdotes. Será então a oportunidade para listar os magistrados conhecidos, bem como quem desempenhou cargos religiosos, não só os flâmines e as flamínicas, pois se o desempenho de cargos políticos estava vedado às mulheres, o mesmo não se passava no campo religioso, mas também os augustais, que com o seu poder económico sobressaíram na sociedade olisiponense. Dados os diversos gastos a que o município estava sujeito, desde o funcionamento dos banhos públicos aos gastos com apparitores ou escravos públicos ao serviço da comunidade ou da administração municipal, o contributo das elites, através de actos de benemerência, era particularmente importante. Por este motivo, os principais actos evergéticos registados em Olisipo serão igualmente apresentados no capítulo 6 desta dissertação. Realçamos aqui que não nos iremos debruçar sobre os documentos que apresentam os personagens da elite deste município com preocupações de carácter epigráfico, mas sim como documentos que permitem uma reconstituição histórica da elite. Por último, gostaríamos de salientar que apesar do interesse de que se revestiria uma comparação dos dados sobre a elite de Olisipo com a de outros municípios, pela impossibilidade de, neste trabalho, abrangermos tão vasta documentação, cingir-nos- emos apenas a este município, ainda que se trate de estudo certamente interessante no futuro.

7 3 Revisão da Literatura sobre o tema

Ao propormo-nos discorrer sobre as elites de Olisipo dedicamo-nos, certamente, a abordar um tema já por muitos analisado. Cabe-nos assim fazer referência a quem, quer a nível nacional, quer a nível internacional, se dedicou ao estudo, não só do tema que aqui em primeiro lugar nos traz, o dos notáveis deste município, mas também do município no seu conjunto, enquanto um todo feito de partes diversas: das gentes que frequentavam o fórum, dos que se moviam no agitado porto, dos que se dedicavam ao cultivo dos campos. Cabe naturalmente fazer aqui desde já a ressalva sobre a impossibilidade de que esta abordagem seja exaustiva, visando tão só apresentar de forma sucinta nomes e obras que nos parecem essenciais. Assim, um vasto conjunto de autores, desde o Renascimento aos nossos dias, debruçou-se sobre o tema. Os seus contributos tornam-se particularmente relevantes quando, como referido, as inscrições epigráficas constituem a base para a construção da imagem da Lisboa romana e foram base das nossas leituras e investigações. Ainda que não seja, como referido, nosso intuito fazer uma revisão intensiva de quem contribuiu para o conhecimento deste município romano no seu todo 1, seja de uma forma específica sobre Olisipo ou integrado numa obra de maior amplitude espacial, alguns nomes se impõem desde logo. André de Resende, estabelecido em Évora desde 1533, será o grande iniciador dos estudos arqueológicos em , inventariando e recolhendo os textos epigráficos romanos nos livros De antiquitatibus Lusitaniae (Lambrino, 1953, p. 25). Ainda que nesta obra André de Resende apenas refira uma inscrição de Lisboa (EO 13), que Hübner considera falsa (CIL II 25*), terá recolhido um número substancial de epígrafes de Olisipo num manuscrito perdido, Monumenta Romanorum in Lusitanis Urbibus . Como avança Justino Mendes de Almeida (1992, p. 32), surgem já nos inícios do século XVI nomes de estrangeiros ligados ao conhecimento e transcrição de

1 Sobre os contributos para o conhecimento do município romano de Olisipo, vide Justino Mendes de Almeida, 1992.

8 inscrições do aro de Olisipo , nomeadamente o alemão Conrad Peutinger, o impressor Valentim Fernandes, da Morávia, o qual ainda que levante dúvidas sobre se efectivamente editou as inscrições, transmitiu-as a diversas pessoas, particularmente a Peutinger, e o italiano Mariangelo Accursio, ainda que sem a sistematização levada a cabo por André de Resende. No século XVII vários autores produzem obras com interesse epigráfico, como seja António Coelho Gasco, com a sua obra Antiguidades da mui Nobre Cidade de Lisboa, Empório do Mundo e Princeza do Mar Occeano , de cerca de 1630, ou Luís Marinho de Azevedo, com a sua obra Fundação, Antiguidades e Grandezas de Lisboa , de 1652. Realça-se igualmente o contributo do padre D. Thomaz Caetano de Bem, numa Carta a um seu amigo acerca de uns monumentos descobertos no sítio das Pedras Negras (Almeida, J, 1992, pp. 33-35). De relevo para os estudos epigráficos foi a passagem pelo nosso país na altura de três estrangeiros, nomeadamente de Sebastián Sánchez Sobriño, que deixou informações sobre a primeira colecção organizada em Lisboa por Frei Manuel do Cenáculo Villas Boas; Francisco Pérez Bayer, que copiou as inscrições que este deixou em Lisboa e outras que haviam sido adicionadas à colecção por Frei Vicente Salgado; e D. José Cornide, enviado a Portugal pela Academia Espanhola para estudar as antiguidades de Portugal (Almeida, J, 1992, p. 35). Já no século XIX, em Instruções e Cautelas Práticas sobre a Natureza das Águas Minerais de Portugal , de Francisco Tavares, estão transcritas algumas inscrições de Olisipo , bem como na Dissertação Critico-Filologico-Historica (…) do Antigo Theatro Romano , de Luiz António de Azevedo, nas Dissertações Chronologicas e Criticas , de João Pedro Ribeiro, e no livro do Visconde Juromenha, Cintra Pituresca . Em Descripção Historica e Economica de Torres Vedras , Manuel Agostinho Madeira Torres integra por seu turno notícias de inscrições desta área. Em 1859, Levy Maria Jordão editou as Portugaliae inscriptiones Romanas , que traduz uma primeira tentativa de organização de um corpus inscriptionum Romanorum Lusitanum (Almeida, J, 1992, p. 36). Como refere Justino Mendes de Almeida (1992, p. 36), da segunda metade do século XIX até aos nossos dias, intensificaram-se os estudos epigráficos, sendo de salientar, a nível de estudiosos estrangeiros, o alemão Emílio Hübner, ligado à publicação, em Berlim, em 1869, do Vol. II e Suplemento do Corpus Inscriptionum

9 Latinarum (CIL), onde se reúnem as inscrições da Hispânia conhecidas na altura, que assinalam o início dos estudos modernos de Epigrafia, em moldes científicos, em Portugal (Almeida, J, 1992, p. 36) e Scarlat Lambrino, com contributos importantes por exemplo ao nível da análise das inscrições de São Miguel de Odrinhas (1953). Será com base no trabalho de Emílio Hübner, ao qual acrescenta novos dados arqueológicos, que Júlio de Castilho elabora uma descrição de Olisipo , no vol. I de Lisboa Antiga – Bairros Orientais ( Moita, 1994, p. 42). Outro investigador estrangeiro a salientar será Robert Etienne, importante marco nomeadamente no que ao estudo do culto imperial diz respeito (1958, 2002). Referência incontornável é José Leite de Vasconcelos, podendo destacar-se as Religiões da Lusitânia (1897-1913), os volumes da 1ª série de O Archeologo Português e o folheto Lisboa Arcaica (Moita, 1994, p. 42). Muitos outros deram um importante contributo para o estudo da epigrafia lusitano-romana, contribuindo por associação para o melhor conhecimento da história de Olisipo . Tal é o caso de Mário Cardozo, com o seu importante contributo para o estudo das inscrições lapidares do Museu Arqueológico de S. Miguel de Odrinhas (Cardozo, 1956, 1958), D. Fernando de Almeida, com o seu contributo, por exemplo, para o conhecimento da barragem romana de Olisipo e seu aqueduto (Almeida, 1969), Jorge de Alarcão, notável pelas diversas obras sobre o domínio romano em Portugal (Alarcão, 1988, 1994, 2004), Justino Mendes de Almeida (1992), Irisalva Moita, incontornável pelo trabalho desenvolvido no âmbito do actual Museu da Cidade, pelo seu contributo para O Livro de Lisboa e pelos diversos trabalhos sobre os achados no subsolo de Lisboa que levou a cabo (Moita, 1968, 1994), e Clementino Amaro, com os seus contributos por exemplo a nível dos trabalhos arqueológicos no claustro da Sé de Lisboa (Amaro, 1996). Para a história epigráfica de Olisipo é documento de monta, sem dúvida, a obra de Augusto Vieira da Silva, Epigrafia de Olisipo , datada de 1944. Nesta obra apresenta os materiais epigráficos existentes na altura, encontrados na área do actual concelho de Lisboa, bem como os referidos a Olisipo ou a Olisiponenses, às quais se têm vindo a juntar outras encontradas em escavações posteriores em diversos locais, desde a Praça da Figueira à Igreja de São Vicente de Fora, desde o Castelo de São Jorge ao Convento de São Francisco de Xabregas. Em particular para o tema que aqui nos traz, são importantes os contributos colhidos em vários autores. Destacamos desde logo o nome de Vasco Mantas, que

10 desenvolveu diversos estudos de particular relevância para o conhecimento da Lisboa Romana. Dos seus trabalhos destacamos a análise dos «Magistrados Olisiponenses do Período Romano» (Mantas, 2005), das «Inscrições Romanas do Museu Municipal de Torres Vedras» (Mantas, 1982), «Olisipo e o Tejo» (Mantas, 1997), «A população da região de Torres Vedras na Época Romana» (Mantas, 2002) e «Olisiponenses: epigrafia e sociedade na Lisboa romana», que integra o catálogo da exposição Lisboa Subterrânea, (Mantas, 1994). Este catálogo integra de resto diversos contributos de grande relevância para o estudo da Lisboa romana, nomeadamente os de Jorge de Alarcão, Carlos Fabião, Clementino Amaro, Suzanne Daveau e Theodor Hauschild, sendo igualmente de realçar o trabalho produzido por José Cardim Ribeiro sobre o mesmo, «Felicitas Iulia Olisipo : Algumas considerações em torno do catálogo Lisboa Subterrânea» (Ribeiro, J, 1994c). Destacamos igualmente o contributo de Amílcar Guerra, nomeadamente o seu trabalho sobre achados epigráficos do Castelo de S. Jorge (Guerra, 2006), de José Cardim Ribeiro, com o seu contributo para a discussão sobre a datação da atribuição do estatuto de municipium civium Romanorum a Olisipo (Ribeiro, J, 1994c), com os seus comentários e propostas relativas ao «criptopórtico» de Olisipo , com as suas abordagens ao tema da consagração de aras a Soli et Lunae por legados e procuradores imperiais na Província da Lusitânia (Ribeiro, J, 2002), e com o relevante trabalho sobre um dos membros da elite da Lisboa romana, L. Iulius Maelo Caudicus , «Estudos histórico- epigráficos em torno da figura de L. Iulius Maelo Caudicus », (Ribeiro, J, 1982-1983), igualmente referido no seu trabalho de 1974-1977. Importantes são também os contributos colhidos em Carlos Fabião, como seja no que respeita à questão do posicionamento da Lusitânia no quadro do Império Romano, e naturalmente de Olisipo no seu contexto (Fabião, 2009), e no contributo para o conhecimento do monumento romano da Rua da Prata (Fabião, 1994), em Luís da Silva Fernandes, que de entre os seus estudos destacamos a análise das inscrições romanas do termo de (Fernandes, 1998 e 2003), os estudos sobre figuras relevantes de Olisipo como C. Heius Primus e Q. Iulius Maximus Nepos (Fernandes, 2005 e 2000, respectivamente), em António Marques de Faria, com a sua análise sobre a atribuição do estatuto de municipium civium Romanorum a Olisipo (Faria, 1995 e 2001) e em Guilherme Cardoso, sobretudo para a área de , em colaboração com José d’Encarnação (Cardoso; Encarnação, 1990; 1991). Dos trabalhos deste último autor realçamos a sua abordagem às «Termas dos Cássios» (Encarnação, 2009), o contributo

11 para a análise do decreto decurionum (Encarnação, 1993), e o estudo de CIL II 182, em conjunto com Catarina Quinteira (2009 a e 2009b) . Outro importante contributo para o estudo da população de Olisipo foi dado por Andreia Almeida (2006), na sua tese de mestrado sobre «A antroponímia na epigrafia romana de Felicitas Iulia Olisipo : contributo para o estudo social, político e económico do municipium na época imperial». Para o estudo das elites deste município surgem-nos, por seu turno, nomes internacionais de relevo, desde logo com obras de enquadramento geral, como é o caso de Juan Manuel Abascal-Palazón, cuja obra La ciudad hispano-romana. Privilegio y poder é sem dúvida uma referência nesta matéria (1989), o de José Manuel Roldán Hervás (2001), com a sua obra Historia Antigua de España I, Ibéria prerromana, Hispânia republicana y alto imperial , o de Patrick Le Roux (1997) , com o seu estudo Romains d’Espagne, Cité & politique dans les provinces. IIème siècle av. J.C. – IIIème siècle ap. J.C. Relativamente aos contributos de maior especificidade, realçamos nomes como o de Leonard Curchin, com a sua obra The local magistrates of Roman Spain, publicada em 1990, que elenca os magistrados locais da Hispânia Romana, o de Caballos Rufino, com o seu trabalho Los senadores hispano-romanos y la romanización de Hispania – siglos I-III , de 1990, e o de Julián de Francisco Martín, com o seu artigo «Los magistrados municipales en Lusitania durante el Alto Imperio», de 1997. Por vezes estudaram-se de uma forma aprofundada algumas figuras relevantes em Felicitas Iulia Olisipo . Para além dos já referidos L. Iulius Maelo Caudicus , estudado por José Cardim Ribeiro (1982-1983 e 1974-1977), C. Heius Primus e Q. Iulius Maximus Nepos, analisados por Luís da Silva Fernandes (2005 e 2000, respectivamente), salientamos o trabalho de Marie-France Loyzance, «A propos de Marcus Cassius Sempronianus. Olisiponensis, Diffusor Olearius », de 1986. Incontornáveis são também os nomes de Francisco Javier Andreu Pintado, nomeadamente no que respeita ao tema da munificência e promoção política das elites (Andreu, 1999, 2004), e o de Enrique Melchior Gil, também sobre este tema, salientando-se artigos como «Elites municipales y mecenazgo cívico en la Hispania Romana» (Melchior, 1999) ou «Summae honorariae y donaciones ob honorem en la Hispania Romana» (Melchior, 1994 c). Juán Francisco Rodríguez Neila será outro dos nomes a salientar, com as suas considerações sobre a vida municipal (Rodríguez Neila, 1989, 1996, 2003, 2009). Para as questões relacionadas com as magistraturas religiosas,

12 realçamos os nomes de Marta González Herrero, de cujos trabalhos salientaríamos, pela sua pertinência, o artigo no qual coloca a questão sobre se o flaminato cívico poderá ser considerado o cargo de maior prestígio no quadro das carreiras municipais conhecidas na Lusitânia (González Herrero, 2002), e o estudo sobre «El abogado olisiponense Lucceius Albinus y familia» (González Herrero, 2005), e o de José Delgado Delgado (1999 e 2000 a e b). Dos contributos de Milagros Navarro Caballero, destacaríamos os relacionados com a questão da emigração itálica na Lusitânia costeira (Navarro, 2006), realçando os nomes de Julián González, sobretudo no que às leis municipais flávias respeita (González, 1989; 2001), e de Julio Mangas Manjarrés, referência sobretudo ao nível da análise das leis coloniais e municipais da Hispânia Romana (Mangas, 1989; 1996 e 2001). Uma menção em particular para Jose Carlos Saquete Chamizo, cuja obra Las elites sociales de Augusta Emerita (1997) nos serviu de pedra de toque para a realização desta dissertação. Vários foram assim os autores que contribuíram para a criação de um vasto repertório de informação sobre a população de Olisipo , sobre a sua vida pública e sobre algumas das figuras de relevo desta sociedade, pelo que, tal como referido, o nosso intuito com este trabalho será o de sistematizar e analizar a diversa informação dispersa que sobre este município romano existe até ao momento.

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4 Instituições fundamentais do sistema de funcionamento dos municípios

As cidades eram o elemento fundamental da estrutura do Império Romano (D’Ors, 1953, p. 140). Ainda que as cidades tivessem estatutos diferentes 2, constituíam comunidades unidas pela lei, com instituições próprias, com magistrados eleitos pelo povo a quem eram atribuídos poderes limitados pela lei. Apesar da existência de diferenças entre colónia e município, os dois regiam-se pelo mesmo modelo de instituições, magistraturas, cargos e ordem social, sendo o reflexo da ordem romana (Abascal e Espinosa, 1989, p. 42). Relativamente à diferenciação entre colónia e município, realça-se principalmente o facto de no primeiro caso se tratar de uma fundação romana, ou pelo menos de um aglomerado urbano em que a maior parte dos que aí passavam a residir serem cidadãos romanos que aí se instalam como colonos, com frequência na condição de veteranos legionários, e de no segundo caso se tratar de elevar a município um núcleo de povoamento pré-existente, conquistado pelos romanos. Os municípios regiam-se pelo direito romano, mas mantinham usos e especificidades herdados da tradição indígena (Le Roux, 2006, p. 120) 3. Assim, tanto num caso como no outro, os elementos fundamentais seriam o populus , o senatus e os magistratus .

4.1 Populus O conjunto de habitantes da cidade estava organizado em dez ou mais cúrias, circunscrições com fins eleitorais, tal como na organização itálica inicial (D’Ors, 1953, p. 148). Esta distribuição em curiae está presente, por exemplo, na Lei de Urso , 101 (Mangas, 2001, p. 50). Tendo em conta o que se conhece do caso de Urso , é viável considerar que em Felicitas Iulia Olisipo existissem realidades idênticas. Formalmente o populus estava acima do senado e dos magistrados, mas de facto estava à margem do governo efectivo das comunidades locais. Elegia os magistrados

2 Sobre o assunto vide 5.1. 3 Sobre as diferenças entre colónias e municípios vide Abascal e Espinosa, 1989, pp.40- 42 e Roldán Hervás, 2001 , p. 402-404

14 (Abbot e Johnson, 1926, p. 85) e tinha o direito a ser informado sobre todas as decisões relevantes tomadas pelos decuriões. Sujeitavam-se a taxas públicas ( munera ) (Roldán Hervas, 2001, pp. 411-412, Abascal e Espinosa, 1989, p. 113) e os indivíduos que tivessem entre quinze e sessenta anos de idade deveriam prestar à cidade onde residiam cinco dias de trabalho por ano (Abascal, 1998, p. 204). Nem todos os habitantes da comunidade pertenciam ao populus. Com efeito, apenas a ele pertenceriam os que estavam incluídos no censo de cidadãos, que detêm direitos políticos. Para além dos cidadãos de pleno direito, os cives , a comunidade envolvia igualmente os residentes ou incolae , alguns deles libertos, outros forasteiros com estatuto de ingenuitas, que detinham residência na cidade e aos quais era permitido participar na vida pública do município apenas para efeitos de eleições (Abascal e Espinosa, 1989, p. 112). Tal como os cives , os incolae do município devem obedecer à lei, como referido na Lei de Irni , 94 (Mangas, 2001, p. 51). Para ser considerado civis ou municeps de uma comunidade haveria que preencher os requisitos de naturalidade, origo nessa cidade, dada automaticamente a filhos nascidos de pais que fossem cidadãos legítimos, ou por adopção ( adlectio inter cives ), manumissão e de residência ( domicilium ) (Roldán Hervás, 2001, p. 411).

4.2 Senatus (ou ordo decurionum ) Era composto por decuriões, sendo que o seu número num determinado município dependeria da quantidade de famílias que pudessem fazer face aos encargos e obrigações inerentes à pertença a este órgão. Alguns autores apontam um número de 100 membros para os senados locais, ainda que não exista uma norma quanto a este aspecto 4. Não é conhecido o número de decuriões que compunha a curia de Felicitas Iulia Olisipo , sabendo-se, no entanto, pela Lex Irnitana , que um município pequeno como Irni , que Júlio Mangas crê que não ultrapassasse os 10000 habitantes, incluindo os habitantes da cidade e do seu território, contava com 63 membros, o que significaria um elevado número de representantes no senado local (Mangas, 2001, p. 46). Atendendo a que Olisipo tinha uma dimensão superior a Irni , poder-se-á supor que a composição da cúria fosse superior a Irni , eventualmente próximo dos 100 membros.

4 Vide por exemplo Abascal e Espinosa, 1989, p. 116

15 O ordo decurionum constitui uma ordem própria da esfera política local à qual pertenciam as elites de uma cidade e desta podiam ascender à ordem equestre, normalmente depois de alcançar o flaminato provincial. As competências das assembleias de decuriões eram vastas. Entre elas encontravam-se a confirmação do resultado de eleições, a nomeação e o sancionamento das iniciativas e decisões dos magistrados, a designação de escravos públicos para diferentes tarefas, a atribuição de honras e privilégios, a designação dos sacerdotes municipais e dos responsáveis pelo culto imperial, a atribuição dos locais no teatro, a administração da defesa da cidade, a ordenação do calendário das festas e a celebração dos ludi . Para além disso, fiscalizavam as obras públicas, a alteração dos limites do território e as alterações urbanísticas (Abascal e Espinosa, 1989, pp. 123-127, D’Ors, 1953, p. 146). Fiscalizavam igualmente as finanças locais e atendendo a que muitas vezes nem os decuriões nem os magistrados tinham conhecimentos específicos sobre este tema, apesar dos conhecimentos adquiridos ao longo do desempenho dos seus cargos, contavam com o apoio de funcionários, nomeadamente apparitores , entre os quais os scribae , que seriam os mais relevantes destes funcionários. De acordo com a Lex Ursonensis , 62, estes últimos receberiam um pagamento superior (Rodríguez Neila, 2003a, p. 143). É de entre os membros do senado local que são escolhidos os representantes da cidade ao governador provincial, ao concilium provinciae ou ao imperador. Seria também do senado local que sairiam as embaixadas ao imperador, como a embaixada de olisiponenses enviada ao Imperador Tibério, relatada por Plínio-o-Velho. Esta embaixada ter-lhe-á dado conta de que tinha sido visto e ouvido, numa gruta, tocando búzio, um Tritão, bem como uma Nereide, avistada na costa em agonia e cujo canto triste os habitantes ouviram ao longe 5, talvez um expediente para chamar a atenção deste Imperador pelo litoral atlântico, como salienta Vasco Mantas (2005, p. 28). Durante o Império, as embaixadas seriam actividades políticas que poderiam trazer benefícios para a cidade e honras para quem as integrava, podendo ter vários fins. Entre eles se encontram os de apresentar petições ao imperador ou ao governador provincial, como seja de carácter fiscal ou administrativo, obter arbitragem para

5NH , 9, 9. Para tradução de Plínio, foi consultado Guerra, 1995 , p. 39

16 conflitos de comunidades sobre limites fronteiriços, participar como testemunhas nas nomeações de patronos e nos pactos de hospitalidade, homenagear imperadores e transmitir-lhes a lealdade da comunidade que representam. Estas embaixadas representavam um custo para as cidades, dado que os que a integravam tinham uma diária estabelecida pelo senado local, tal como consta na Lex Irnitana , 46, ainda que em determinadas ocasiões os participantes tenham assumido os seus custos (Melchior, 1999, pp. 248-249). Como referem Abascal e Espinosa (1989, p. 176), em princípio todas as embaixadas eram uma necessidade para as cidades dado que quase todas pretendiam obter benefícios fiscais. No entanto, com o passar do tempo tornaram-se um privilégio dado que quem as integrava podia tirar partido de tal, ao contactar com outras elites ou até mesmo com o imperador, como seria aqui o caso, o que poderia levar a que determinados notáveis quisessem assumir os custos dessa embaixada, contando como acto evergético. Durante a época júlio-claúdia, as embaixadas integravam vários indivíduos. No período de Nero as embaixadas são interrompidas e com Vespasiano passam a integrar até três pessoas ( Dig . 50.7.5.6). Era usual que a cidade que recebia a embaixada assumisse os custos de manutenção enquanto estivesse na cidade, o que seria um custo significativo para Roma, dado que recebia continuamente embaixadores de vários pontos do império. Nos três primeiros séculos d.C., a maior parte das embaixadas viriam da Grécia e do próximo Oriente, ainda que viessem também do Ocidente (Abascal e Espinosa, 1989, p. 176). A partir da Lex Irnitana , 45, pode-se igualmente verificar quem não poderia actuar como legado, nomeadamente quem tivesse sido duúnviro, edil ou questor no ano anterior ou que o fosse na altura de enviar representantes; os magistrados que geriam fundos públicos e que ainda não tivessem prestado contas da sua gestão; todo o munícipe que tivesse sido encarregado pelo senado de efectuar negócios públicos e que ainda não tivesse prestado contas dessa gestão e finalmente todo o munícipe que tivesse dinheiro público, não tendo ainda prestado contas dessa gestão (Mentxaka, 1993, p. 125). O senado local reunia várias vezes por ano na cúria, sendo que, tal como consta na Lei de Irni , 40, nem todos os decuriões seriam do mesmo nível, prevendo as leis uma ordem de intervenção dos decuriões nas sessões (Mangas, 2001, p. 48).

17 A assembleia era convocada pelos duúnviros, como veremos adiante, presumindo-se que o que presidia a assembleia tivesse elaborado a agenda da reunião, procedendo-se ao tratamento e debate dos temas que eram submetidos ou pelos magistrados, ou pelos decuriões. Para que os temas pudessem ser tratados, era necessário que estivesse presente um determinado número de decuriões, consoante o tema, sendo o número exigido pela lei consoante a matéria tratada. Com base na análise das leis Irnitana, Malacitana e Salpensana , Rosa Mentxaka avança que o quórum mais repetido nas mesmas seria a de dois terços da assembleia (Mentxaka, 1993, p. 103), seguindo os decuriões uma ordem própria na votação. Algumas das suas decisões têm reflexo público na epigrafia, nomeadamente no que respeita à referida atribuição de honras e privilégios em prol de notáveis, assumindo nesse caso a designação de decretum ordinis ou decretum decurionum . São exemplo disso a concessão de honras a ex-magistrados municipais, a membros da família imperial ou ao próprio imperador. Tal ocorreu em Olisipo , existindo registos de diversas homenagens aos imperadores romanos e a elementos da sua família neste município. Estas são levadas a cabo pelos duúnviros que desempenhavam o cargo na altura, por augustais, ou pelo município. Destacamos assim as dedicatórias em Olisipo , no século I d.C. , ao Divino Augusto pelos augustais C. Arrius Optatus e C. Iulius Eutichus (CIL II 182 e EO 74), ao Imperador Nero e ao Imperador Vespasiano, por Felicitas Iulia (CIL II 184/EO 79 e CIL II 185/CIL II 5.217 e EO 80 e ILER1078, respectivamente). Já na transição para, ou no século II d.C., encontramos homenagens à sobrinha do Imperador Trajano, Matidia Augusta , por Felicitas Iulia Olisipo através dos duúnviros Q. Antonius Gallus e T. Marcius Marcianus (CIL II 4.993 e EO 82, ILER 1265) , ao Imperador Adriano e à sua mulher Sabina Augusta , por Felicitas Iulia Olisipo através dos duúnviros M. Gellius Rutilianus e L. Iulius Avitus (CIL II 186 e EO 91, ILER 1104 e CIL II 4.992 e CIL II 5.221 e EO 72, ILER 1268, respectivamente). Salienta-se igualmente a homenagem ao Imperador Cómodo, por Felicitas Iulia Olisipo através dos duúnviros Q. Coelius Cassianus e M. Fulvius Tuscus 6 (CIL II 187 e EO 23, ILER 1144).

6 Sobre as possíveis leituras do nome deste duúnviro, vide 5.2.

18 Pertencendo ao século II - século III, existe igualmente referência, no ager Olisiponensis, à homenagem ao Imperador Septímio Severo (CIL II 259). No século III d.C. Felicitas Iulia Olisipo homenageia igualmente o Imperador Marco Júlio Filipe (EO 93, ILER 1181). Salienta-se igualmente a epígrafe de homenagem da cidade, no século I d.C., a L. Cornelius L. f. Gal. Bocchus, notável Salaciensis , encontrada nas escavações realizadas no edifício situado no Palácio do Correio-Mor, onde se situariam as Termas dos Cássios 7. L. Caecilius Celer Rectus é outra figura particularmente notável que é igualmente homenageado por Felicitas Iulia Olisipo (CIL II 190, EO 28), tendo esta figura sido questor, pretor e tribuno da Província da Bética. Quanto à datação desta inscrição, Alarcão considera-a dos inícios do séc. II d. C. 8 (Alarcão, 1994, p. 62). Vieira da Silva, com base em Emílio Hübner, avança o ano de 108 d. C. No estudo que Ángel Jordán Lorenzo desenvolve (2002) sobre as homenagens senatoriais na Península Ibérica, coloca a homenagem na época de Trajano, possivelmente após ocupar o posto de questor da Bética. Considera que o senador é originário de Olisipo , sendo possível que se trate do Cecilius Celer amigo de Plínio citado numa das suas cartas, Ep., I, 5,8. (Jordán Lorenzo, 2002, p. 158). Salienta-se ainda o comentário deste autor de que o ordo decurionum , ao eleger o momento inicial da carreira dos senadores para o homenagearem, dá a impressão de que das poucas vezes em que opta por erigir uma estátua a um senador do século II d.C. se dirige a indivíduos que ainda não se haviam desligado delas, situação que parece voltar a desaparecer no século III d.C., quando se retoma a tendência do século I d.C., de honrar legados imperiais como patronos das cidades, ainda que com maior concentração nas capitais de província (Jordán Lorenzo, 2002, pp. 162-163). Ainda que não haja confirmação que L. Caecilius Celer Rectus tenha sido patrono desta cidade, poder-se-á, no entanto, supor que actuasse na defesa dos interesses deste município em instâncias superiores, nomeadamente a nível senatorial e da administração romana.

7 Inscrição nº 275 do Ficheiro Epigráfico, 60, 1999. Sobre L. Cornelius Bocchus , vide Fernandes, Luís, 2002, pp. 155- 171 8 Para a leitura da epígrafe, vide anexo 2

19 A designação do patrono da cidade caberia assim igualmente ao senado, situação expressa, por exemplo, na Lex Malacitana , 61, que refere expressamente que apenas por decreto da maioria dos decuriões será eleito publicamente patrono para os munícipes do Município Flávio Malacitano (Pino Roldán, 2001, p. 58). O patrono seria recompensado com honras, com a cidadania local honorífica, com um lugar de destaque nas cerimónias e espectáculos, com a oferta de uma tabula patronatus que continha o compromisso entre o patrono e a cidade, bem como com estátuas e inscrições honoríficas (Roldán Hervás, 1989, p. 422). Das decisões tomadas pelo Senado eram elaboradas actas que deviam ser lidas em público e posteriormente arquivadas. De acordo com a Lex Irnitana, 41, os duúnviros tinham a obrigação de as depositar até ao 10º dia seguinte no arquivo comum dos munícipes (Mangas, 2001, p. 47). O ordo decurionum era assim a classe governante dos municípios e das colónias, nela se integrando os grandes proprietários de terras e de escravos destas cidades, mantendo uma relação próxima entre o campo, onde detinham as suas villae , e as cidades, onde participavam nas sessões da curia ou exerciam a sua magistratura. Depois do seu contributo para a vida política da cidade, o magistrado regressaria possivelmente ao campo, à sua villa no ager Olisiponensis , conceito introduzido pelos romanos. Delas temos notícia através dos resultados das campanhas arqueológicas. As villae de Freiria, do Alto do Cidreira e dos Casais Velhos, em Cascais, e as villae de Frielas e das Almoinhas em Loures, entre outras, serão marcas da vida da elite nos campos, onde o gosto romano se poderia vislumbrar sob diversas formas, fosse por exemplo a nível dos mosaicos nelas empregues, fosse a nível das importações de produtos requintados. A fertilidade dos solos permitiria boas condições para a exploração agrícola, uma ocupação digna da elite, ficando as actividades comerciais entregues aos libertos. A este propósito refere Cícero que nihil est agricultura melius, nihil uberius, nihil dulcius, nihil homine libero dignius (De off. I, XLII). Este solo fértil permitiria a produção de cereais, vinho e azeite, para consumo próprio, mas também para consumo, em parte, pela população da cidade, fomentando o comércio, actividade que em muito impulsionará a riqueza da cidade 9.

9 Para além do comércio, emerge em Olisipo uma indústria de monta, a da preparação do garum (molho de peixe) e de conservas, como o comprovam as várias cetárias encontradas neste município (Alarcão, 1994, p. 61), como abordado no capítulo 5.

20 Os decuriões deveriam ter certamente elevadas posses económicas. Num sistema em que a riqueza e notoriedade se mediam pela quantidade de terra que um indivíduo possuía e onde os lucros do comércio eram investidos na terra, poder-se-á assumir que grande parte do território próximo das cidades pertenceria aos membros do senado local. Um exemplo significativo surge na Lex Irnitana , K, que menciona que os duúnviros e decuriões podiam adiar por sessenta dias os assuntos públicos por causa de colheitas ou vindimas, o que traduz a ideia de que haveria tantos membros envolvidos nestas actividades agrícolas que impediria a realização das reuniões do ordo decurionum (Curchin, 1990a, p. 275). Outro exemplo interessante encontra-se na Lex Malacitana , LX, que determina que apenas os cidadãos proprietários de terras poderiam aceder a magistraturas locais (Mantas, 1990, p. 152, nota 14). Apesar da possibilidade de ascensão, o carácter local do ordo normalmente mantém-se através dos munera , dos actos de benemerência em prol da cidade e das redes clientelares locais, à semelhança do que acontecia em Roma, promovendo a romanização ao impulsionar a imitação pelas classes inferiores das suas condutas religiosas e a adesão à casa imperial (Salina de Frias e Rodríguez Cortés, 2000, p. 17). Existiam vários requisitos de ingresso no ordo decurionum . Um deles seria ser ingenuus , ou seja, ter nascido de pais livres e nunca ter sido escravo. Salienta-se, no entanto, que em meados do séc. I a.C, na Lex Coloniae Genetivae Iuliae (Lex Ursonensis), 105, o facto de ser liberto não constituía um caso de indignidade susceptível de impedir o acesso à condição de decurião. Deverá ser com Tibério que os libertos são afastados dos senados locais, através da Lex Visellia de 24 d.C. (Fabre, 1976, pp. 421-422). Outros requisitos seriam a dignidade, prestígio social e nunca ter cumprido uma pena infamante. Relacionado com este requisito estaria o facto de existirem algumas profissões que estariam desde logo associadas ou que impediam a entrada no senado; era por exemplo o caso dos gladiadores, dos lanistas, dos comediantes, dos coveiros ou dos que se dedicavam ao lenocínio (Mentxaka, 1993, p. 91). Era também requisito ter um nível mínimo de rendimento e possuir património, sendo pedido em algumas cidades a summa honoraria , montante entregue pelos que obtinham um cargo nos municípios ou colónias, nomeadamente magistrados, sacerdotes e membros da cúria, utilizado para gastos em prol da comunidade. De todo o modo, não é claro que este montante revestisse obrigatoriamente a forma de numerário. É possível que inicialmente fosse paga através da realização de jogos e que a partir do século I d.C.

21 fosse entregue em numerário para os cofres municipais (dado que a fórmula pro ludis desaparece por essa altura), ou através de construções/edifícios necessários para a cidade (Melchior, 1994c, pp. 193-212). É assim que José d’Encarnação interpreta, por exemplo, uma epígrafe de Myrtilis (CIL II 5178) que terá sido parte de um edifício construído por M. Bruttius Marcellus (?), e que teria assim constituído a summa honoraria (Encarnação, 1984, p. 166). O pagamento deste montante pelos decuriões está atestado em Itália desde os finais da República, ainda que, segundo Melchior (1994c, p. 195), não se deverá ter generalizado nas províncias até ao século II d.C., altura em que temos confirmação desse acto, tanto para a Hispania (CIL II 5232), em Collippo , como para a África (CIL, VIII, 7963 de Rusicade , por exemplo), parecendo a sua implantação avançar em paralelo com a municipalização. O mesmo autor realça ainda que os montantes entregues seriam diferentes consoante o cargo desempenhado, pagando os flâmines mais do que quem desempenhava as magistraturas municipais, à excepção do duúnvirato quinquenal, pagando os seviros sensivelmente o mesmo que magistrados e decuriões (Melchior, 1994c, p. 199). Aparentemente a importância exigida a um decurião representaria apenas uma décima parte da sua fortuna (Andreu Pintado, 2004, p. 35). A entrada no ordo decurionum decorria de cinco em cinco anos, mediante uma lectio ordinis , levada a cabo pelos quinquennales iure dicundo , após a qual os duúnviros apresentavam a nova lista de conselheiros, o album decurionum , apresentada nas tabulae publicae (Roldán Hervás, 2001, p. 419). Apesar de o povo constituir a maior parte da população de um município, não intervinha na eleição dos novos decuriões, como o fazia para os magistrados; eram os membros do senado local que elegiam os novos decuriões (Rodríguez Neila, 2003b, pp. 167). No que respeita à sua idade, estariam entre os 25, a partir de Augusto (González, 1989, p. 140), e os 50 ou 60 anos, devendo viver na cidade ou num raio de uma milha. A condição de decurião era vitalícia, salvo se o indivíduo fosse acusado de indignidade. Os membros do senado local ostentavam vestes diferentes, os ornamenta decurionalia , marca de dignidade bastante pretendida pelos libertos endinheirados, e contavam com vários privilégios, entre eles, com um lugar reservado nos jogos circenses e no teatro. Tinham igualmente precedência nos actos solenes e detinham vantagens na repartição dos sportulae (distribuição de dinheiro) e no aproveitamento gratuito do serviço municipal de águas (D’Ors, 1953, p. 146).

22 Com a perda progressiva de poder por parte dos magistrados ao longo do século II d. C., a administração municipal tendeu a concentrar-se no ordo decurionum , acabando por anular as assembleias populares até chegar a nomear directamente os magistrados da cidade.

4.3 Magistratus Os magistrados são eleitos anualmente pelo corpo de cidadãos votando em comitia (Curchin, 1990b. p. 28). Estes indivíduos são elementos destacados da cidade e ao assumir as suas funções passam a representar o povo e a deter os direitos de soberania durante o desempenho da sua magistratura. Funcionam de forma colegial e devem realizar o desejo do povo e tomar as medidas necessárias para o desenvolvimento da cidade e para o bem estar dos cidadãos (Roldán Hervás, 2001 , p. 413). Algumas cidades elegeram por vezes o imperador ou membros da família imperial como duúnviros, contendo claros fins políticos, sendo que neste caso o eleito desempenharia as funções através de um suplente, o praefectus , situação prevista, por exemplo, na Lei de Irni , 24 (Mangas, 2001, p. 34). Ainda que os magistrados pertencessem ao ordo decurionum , possuíam funções diferentes das dos restantes decuriões durante o exercício da magistratura. Enquanto representantes do povo, possuíam direitos e privilégios honoríficos, que iam desde sinais de respeito por parte dos seus concidadãos, como por exemplo levantarem-se na sua presença, dar-lhes passagem nas ruas ou destapar a cabeça na sua presença. Possuíam também atributos externos, como o direito a usar a toga praetexta , ou manto com uma faixa de púrpura, cujo uso na Hispânia, segundo Estrabão (III.2.15), foi a prova do triunfo da romanização, ou a sella curulis , cadeira de marfim utilizada na cúria ou no teatro. Estes cargos não eram remunerados, como os seus similares actualmente são; a recompensa que os magistrados tinham pelo desempenho do seu cargo era de carácter honorífico, sendo que a principal honra para os magistrados municipais, no que respeita às comunidades de direito latino, seria a recepção da cidadania romana, extensível aos pais, mulher e filhos, no termo do mandato. Para que fosse possível a candidatura a uma magistratura municipal, à semelhança do que acontecia para a entrada no ordo decurionum , a que pertenciam a partir do momento da sua designação, haveria que cumprir determinados requisitos, entre eles o nascimento livre, o correspondente direito de cidadania, possessão de

23 capacidade jurídica e de todos os direitos de cidadania e uma boa situação económica, dadas as contribuições que os magistrados deveriam fazer. Deviam igualmente ter uma idade mínima para o desempenho das magistraturas, fixada com Pompeio nos 30 anos e que com Augusto passou a 25 anos (Abascal e Espinosa, 1989, p. 130). Deveriam igualmente ter um domicílio dentro da cidade ou até uma milha de distância, como já referido, obrigatoriedade presente, por exemplo, na Lex Ursonensis , 92 (Mangas, 2001, p. 35). Na busca por uma magistratura, os candidatos poderiam prometer uma soma para benefício da comunidade, fosse para jogos, obras públicas ou outros fins. Sendo eleitos para um cargo municipal, era habitual, como referido para a entrada no senado local, contribuírem com a summa honoraria , que variava de acordo com a magistratura e a cidade (Abbot e Johnson, 1926, p. 87). A Lex Ursonensis , 70, por exemplo, é clara quanto a esta matéria, referindo que cada um dos duúnviros contribuirá com 2000 sestércios, podendo gastar outros 2000 sestércios dos dinheiros públicos para os jogos de quatro dias em honra de Júpiter, Juno e , deuses e deusas (Mangas, 2001, pp. 34-35). De todo o modo, a questão de os decuriões terem ou não de pagar a summa honoraria tem vindo a ser debatida, dado que, por exemplo, em Collipo , existe uma inscrição em que a assembleia de decuriões liberta o decurião Q. Talotius Allius Silonianus do pagamento dos honorários relacionados com a sua condição de decurião (Andreu Pintado, 2004, p. 43). Para Melchior, o facto de algumas assembleias populares concederem a gratuitidade indica que o pagamento da summa honoraria seria obrigatório para magistrados, sacerdotes e decuriões, mas que as normas poderiam ser variáveis de cidade para cidade (Melchior, 1994b, p. 43). Para Rosa Mentxaka (1993, p. 95), apenas deveriam pagar esta quantia os decuriões que tivessem acedido ao conselho por adlectio , dado que os que tinham acedido à ordo decurionum após terem desempenhado outras magistraturas já teriam entregado essa soma. Segundo Andreu Pintado, Q. Talotius Allius Silonianus , de Collipo , seria um membro do ordo adlectus , dado que fora isento de entregar a soma (Andreu Pintado, 2004, p. 44). Pela informação que nos chega das leis flávias, é possível saber que eram organizadas duas eleições diferentes: uma para entrada no senado, para manutenção de um determinado número de decuriões nesta assembleia, outra para obtenção das magistraturas, promovida anualmente (Abascal e Espinosa, 1989, p. 139). No que

24 respeita ao procedimento de eleição, a convocatória era feita pelo duúnviro mais velho, o qual fixava por edital o dia da convocatória e dava-a a conhecer publicamente através de arautos. Os cidadãos interessados na magistratura apresentavam ao duúnviro a sua declaração de candidatura. Comprovada a possibilidade de os candidatos serem eleitos, o duúnviro organizava a lista oficial de candidatos, transcrita para tábuas afixadas em locais públicos (Roldán Hervás, 2001, p. 414). Se o número de candidatos fosse igual ou superior ao número de lugares vagos no senado local, o procedimento prosseguia, os nomes eram anunciados e o dia das eleições era fixado; nos casos, porém, em que não existia um número suficiente de candidatos, ou em que não existia qualquer candidato, cabia ao duúnviro nomear automaticamente o número de indivíduos necessários para o desempenho das magistraturas, mesmo que estes não o pretendessem. Ainda que estes pudessem nomear outro indivíduo para o desempenho do cargo, que por sua vez podia ainda nomear outro, este último indivíduo teria de o desempenhar efectivamente (Abascal e Espinosa, 1989, p. 139). Após a publicação do edital e até à convocatória efectiva decorria o período de propaganda eleitoral (ambitus) . Nesse período, os candidatos, in toga candida (de onde deriva a palavra candidato), i.e., com uma toga branca, tentavam atrair os eleitores, acompanhados pelos amigos, clientes e partidários (Roldán Hervás, 2001, p. 414). A propaganda seria também escrita nas paredes das casas, a «epigrafia do momento», como lhe chama José d’Encarnação (2009b, p. 15), mencionando o nome do candidato e o cargo que pretendiam obter, muitas vezes acompanhada de contra- propaganda. Havia, no entanto, limites à propaganda, como era o caso, patente na Lex Ursonenis , 132, sobre a proibição de o candidato dar banquetes públicos, dinheiro, presentes e festas desde dois anos antes de apresentar a candidatura. No dia das eleições, o magistrado que presidia a assembleia chamava o povo à votação através do arauto, tendo, antes disso, confirmado que os augúrios eram favoráveis. Depois de solicitar o favor dos deuses, o presidente lia a lista de candidatos e convidava as secções ou cúrias em que os eleitores estavam divididos a votar. As mesas deveriam estar localizadas num local privilegiado da cidade, possivelmente na basílica ou perto do forum (Roldán Hervás, 2001, p. 414, Abascal e Espinosa, 1989, p. 143). Os magistrados eram, como referido anteriormente, eleitos pelo populus . Para poder votar, o indivíduo deveria então ser cidadão livre, aqui incluindo tanto os cives , possuidores da cidadania local, como os incolae , cuja integração jurídica tinha sido efectuada noutra

25 localidade, mas que residiam, por razões comerciais ou de posse de terra, no município. No que respeita à idade, o indivíduo teria provavelmente de igualmente ter 25 anos (Abascal e Espinosa, 1989, p. 142). Salienta-se que ao aceder ao cargo, os magistrados deviam proceder a uma declaração completa dos seus bens, devendo informar sobre o eventual aumento patrimonial ao deixar o cargo. Não podiam mudar de domicílio nos cinco anos seguintes ao desempenho do cargo, dado que só após esse período prescreviam eventuais delitos que tivessem cometido no exercício da magistratura (Mangas, 1996, p. 74). No topo da comunidade de cidadãos surgem então em regra quatro magistrados em dois colégios, nomeadamente os duúnviros, em alguns textos designados duumvri iure dicundo , e os edis, também designados duumviri , por vezes reunidos num só colégio de quattorviri , aos que em algumas cidades se juntavam dois questores. O conjunto destas magistraturas constituiria uma carreira, o cursus honorum , normalmente de questor, edil e duúnviro, que culminava no duúnvirato quinquenal. Com efeito, a cada cinco anos os duúnviros contavam com o poder especial para elaborar as listas do census dos cidadãos, recebendo a designação de duumviri quinquennales (Abascal e Espinosa, 1989, p. 129, D’Ors, 1953, p. 143). Salienta-se, no entanto, a opinião de Leonard Curchin que realça que ainda que se tenha pensado que existia uma progressão fixa dos cargos municipais no Ocidente Romano, nomeadamente de questor para edil e de edil para duúnviro, o número de cursus municipais que não cumprem esta norma é suficientemente substancial para lançar a dúvida sobre este esquema (Curchin, 1990b, p. 29).

4.3.1 Duúnviros Os duúnviros eram os magistrados municipais de mais alto cargo. O duúnvirato representava o culminar da magistratura municipal, tendo superioridade sobre os questores e os edis, na medida em que teriam poder de veto (intercessio) sobre as decisões por eles tomadas, como se verifica na Lex Irnitana , 27 (Mangas, 2001, p. 39; Rodríguez Neila, 2003b, p. 173). Desenvolviam a administração municipal em conjunto com os outros magistrados e com a cúria municipal. Os primeiros duúnviros do município teriam algumas tarefas iniciais quando a lei era recebida no município, nomeadamente, de acordo com a Lex Irnitana , distribuir os membros do senado local em três grupos ou cúrias, dos quais sairiam os legados que fariam a representação sucessiva do município (44); fazer a distribuição do populus por

26 curiae , para organização para efeitos de eleições municipais (50) e ordenar para que a lei fosse publicada no local mais frequentado pela população (95) (Mentxaka, 1993, p. 70). Os duúnviros tinham diversas competências, algumas delas já aqui abordadas nomeadamente no que se refere à eleição de novos magistrados. No que respeita às tarefas de representação da comunidade a nível interno, poderemos salientar (Roldán Hervás, 2001, pp. 416-417; Abascal e Espinosa, 1989, pp. 134-135, D’Ors, pp. 143- 144): - Funções religiosas: vigilância do cumprimento das obrigações da cidade para com os deuses, supervisionando as funções dos sacerdotes e celebrando jogos anuais em honra dos deuses; - Convocatória e presidência das assembleias legislativas e da cúria municipal, bem como a supervisão dos magistrados de cargos inferiores; - Administração das finanças municipais: as receitas provinham do património da cidade, de taxas e impostos locais, de multas, e das contribuições dos magistrados eleitos. Administravam igualmente os gastos, controlados pelos decuriões ( Lex Irnitana , 79). Atendendo aos diversos gastos da cidade, o contributo privado tornava-se essencial para o cumprimento das actividades necessárias, como veremos no capítulo dedicado ao evergetismo em Felicitas Iulia Olisipo ; - Proposta de manumissão dos escravos públicos ( Lex Irnitana , 72) e da nomeação de funcionários subalternos para apoio na administração local ( Lex Irnitana , 78); - Proposta da revisão e fixação anual dos limites do territorium (Lex Irnitana , 76) e de construção e reparação de obras de infraestrutura ( Lex Irnitana , 82); - Jurisdição municipal a que faz referência o título de iure dicundo ou repartição da justiça. O imperium jurisdicional aplicava-se a todos os residentes, de forma temporária ou permanente, no território da cidade, nomeadamente munícipes, incolae e peregrini , ainda que limitado com o tempo pela cúria municipal. No que respeita à representação da comunidade a nível externo, os duúnviros actuavam sempre em nome do ordo decurionum , de acordo com as suas decisões, sendo que as suas principais tarefas seriam (Roldán Hervás, 2001, p. 418): - Condução da correspondência administrativa e jurídica da comunidade com as instâncias provinciais e do poder central; - Assinatura de tratados e de acordos públicos com outras cidades;

27 - Recepção do imperador e dos membros da família imperial ou de altos funcionários a partir da fronteira do município.

4.3.2 Edis Para que um indivíduo fosse eleito edil teria de cumprir, tal como os duúnviros, determinados requisitos, como seja ter nascimento livre, ter um mínimo de 25 anos e ter uma fortuna mínima, provavelmente de 5000 sestércios, tal como requerido para os juízes, como adiante veremos (Abascal e Espinosa, 1989, p. 136). Os edis tinham várias tarefas ou curae , nomeadamente a cura urbis , a cura annonae e a cura ludorum (Roldán Hervás 2001, p. 418, Abascal e Espinosa, 1989, pp. 136-137, D’Ors, 1953, pp. 144-145). A cura urbis respeitava ao policiamento da cidade e à segurança pública, sendo que neste contexto cabia supervisionar os edifícios públicos e privados, o pavimento das ruas e a livre circulação nas mesmas. Estavam também sobre seu cuidado as termas públicas, no que respeita à salubridade e horários de funcionamento, os lupanares, hospedarias e tabernas 10 . No âmbito das tarefas relacionadas com a segurança pública encontravam-se a fiscalização dos forasteiros e a protecção contra incêndios. Por seu turno a cura annonae incluía o aprovisionamento e vigilância sobre o mercado desde a qualidade dos produtos à venda, respectivos preços, pesos e medidas, e a cura ludorum implicava a disposição dos jogos públicos, função que lhes poderia assegurar o apoio da comunidade no caso de pretenderem seguir o cursus honorum (Roldán Hervás, 2001, p. 418). Atendendo a que não geriam os fundos públicos, não estavam obrigados a prestar qualquer juramento de boa gestão, exigido, contudo, tanto a duúnviros como a questores. Tanto os duúnviros como os edis contavam com funcionários subalternos para os apoiarem no desempenho das suas funções, com a designação de apparitores (D’Ors, 1953, p. 145). De acordo com a Lex Irnitana , 73, o montante correspondente ao pagamento destes funcionários estaria a cargo da decisão do senado (Mentxaka, 1993, p. 134).

10 Algumas destas funções podem ser encontradas na Lex Irnitana , 19.

28 4.3.3 Questores Os questores estavam encarregados especificamente da administração e gestão dos fundos públicos ( Lex Irnitana , 20), pelo que, como acima referido, teriam de prestar juramento de correcta gestão dos fundos municipais (Abascal e Espinosa, 1989, p. 138, D’Ors, 1953, pp. 145). Tal como sucedia nas magistraturas anteriores, para desempenharem esta magistratura deveriam ter nascimento livre, ter pelo menos 25 anos de idade e possuir rendimentos (Abascal e Espinosa, 1989, p. 138). De acordo com Roldán Hervás (2001, p. 418), estes são raros na Hispânia. A figura do questor ganhou nova importância com os Flávios, dado que uma das suas preocupações seria a regularização das finanças das cidades e evitar abusos dos magistrados a nível económico. As suas funções e poderes estão por exemplo expressas na Lex Irnitana , 20 (Mangas, 1996, p. 73). Para além dos cargos acima mencionados, na ausência de um dos duúnviros por mais de um dia, era nomeado um praefectus , que o substituía até ao seu regresso, sendo eleito de entre os membros da cúria municipal com mais de 35 anos de idade e detendo poderes iguais. Caso os dois magistrados estivessem ausentes, seria designado um praefectus pro duoviris . Nos municípios existiriam igualmente sacerdotes, sobre os quais nos debruçaremos no capítulo 5, e juízes para assuntos privados. No que se refere aos juízes, trata-se de um cargo sobre o qual não existe muita informação; apesar de tudo, de acordo com Abascal e Espinosa (1989, p. 145), o colégio judicial deveria contar com pelo menos 15 elementos, com idades compreendidas entre os 25 e os 65 anos de idade. Os juízes teriam um estatuto social equivalente ao dos duúnviros e ser-lhes-ia exigido uma fortuna mínima de 5000 sestércios 11 . Em Olisipo , podemos constatar as marcas deixadas por cada um destes elementos que compunham o sistema de funcionamento dos municípios. Verificamos a presença de elementos do populus em diversas epígrafes e observamos a acção dos decuriões, por exemplo, em EO 15, 27, 36, 60. No que respeita à sua gestão, este município contaria com dois duúnviros e dois edis (Moita, 1994, p. 60), havendo actualmente registo de nove duúnviros e seis edis, como veremos em 5.2.1..

11 Sobre o tema, vide Abascal e Espinosa, 1989, p. 145.

29 Deles temos registos quer em lápides funerárias, como em EO 33, 42, 75, 87, quer em memórias que lhes são dedicadas, como é o caso da inscrição dedicada ao edil, duúnviro e flâmine do culto imperial Quintus Iulius Plotus (EO 41), quer no desempenho das suas funções. É o caso, por exemplo, das inscrições de homenagens a imperadores ou a outros membros da família imperial, em que a cidade Felicitas Iulia Olisipo oferece ou dedica através dos duúnviros, registando os respectivos nomes. Relativamente ao cargo de questor, à semelhança do que sucede na maioria das cidades hispânicas, não existe referência segura da existência de um questor em Olisipo , sugerindo que a questura não terá existido em muitas delas, talvez por ser um munus pessoal e não um honor (Mantas, 2005, p. 27). O mesmo se passa, por exemplo em Emerita Augusta (Saquete Chamizo, 1997, p.120). Neste caso, os duúnviros ocupar-se- iam dos assuntos financeiros de Olisipo , com o apoio dos edis (Mantas, 2005, p. 28). Fazemos contudo breve referência a Marco Varrão, identificado como questor, referência que surge em lápide dedicada por seus pais, Lúcio Varrão e Fúlvia Élia. Ainda que seja apresentada por Vieira da Silva (EO 29), o mesmo refere que segundo Emílio Hübner a lápide será falsa pelo facto de ser semelhante a uma descoberta na cidade de Parma em 1524, baseando-se talvez no padre Tomaz Caetano de Bem (Silva, A.V., 1944, pp. 128-129).

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5 Felicitas Iulia Olisipo e as suas elites

De acordo com Estrabão (III, 3,1) Decimus Iunius Brutus, governador da Hispânia Ulterior, ocupou Olisipo em 138 a.C., tendo procedido à fortificação deste município. Na altura em que é conquistada pelos romanos, a cidade pré-romana deveria restringir-se ao povoado indígena do alto da colina do Castelo e à zona ribeirinha. Através dos vestígios que se vão encontrando nas escavações, vislumbra-se que nesta área conviveriam indígenas, indivíduos de vários pontos do Mediterrâneo, incluindo romanos ou romanizados, que mantinham os seus entrepostos de produção e comercialização. A cidade deverá ter-se desenvolvido de uma forma rápida, dado que é possível verificar, com base na cronologia dos principais monumentos, que no século I a.C. os romanos já deveriam ter povoado toda a parte sul da colina do Castelo (Moita, 1994, p. 43). A área urbana de Olisipo estendia-se do Castelo à Rua dos Bacalhoeiros e da Rua Augusta ao Chafariz d’El Rei, ficando as necrópoles fora desta área, como sucedia nas urbs romanas (Alarcão, 1994, p. 60). De acordo com Vasco Mantas (2005, p. 25), Olisipo ocuparia uma área de 35 hectares. Jorge de Alarcão estima a população de Olisipo , em época de Augusto, entre 30 a 40 000 habitantes (Alarcão, 1990, p. 396). Irisalva Moita (1994, p, 45), por seu turno, ainda que não avance um número mas considere que deveria ser elevado, refere que atendendo à área da cidade e ao elevado número de habitantes, dado o grande número de lápides encontradas e o facto de apenas uma minoria poder tê-las, Olisipo deveria ter sido uma cidade bastante populosa, mais do que Pax Iulia a que Alarcão atribui em torno de 30 000 habitantes. A importância de Olisipo surge desde logo associada ao Tejo, pela relevância das actividades que lhe estão associadas, pelos contactos entre povos e culturas que permite, pela dimensão que por estes motivos adquire. O rio Tejo será, desde períodos muito anteriores ao domínio romano, uma grande via de comunicação que permite tanto o acesso ao interior peninsular, como a comunicação marítima com o exterior, sobretudo como escala da rota atlântica dos minérios desenvolvida e controlada por Fenícios e Cartagineses (Mantas, 1997, p. 16).

31 O dinamismo de Olisipo sobressai sobretudo nos séculos I e II d.C., o que é demonstrado pelos vestígios arqueológicos, e estará assim associado ao facto de ser um local de recepção e de distribuição dos produtos que chegavam por via mediterrânica. Entre os produtos locais produzidos e com possibilidade de exportação seria de salientar sobretudo o já referido garum , de relevo para a economia de Olisipo , ainda que como referido anteriormente este tivesse de concorrer com o garum de Gades, que era preferido no Império Romano. Em complementaridade a esta produção desenvolveram- se uma série de outras actividades e indústrias, nomeadamente a pesca, a olaria, para a produção de ânforas para o transporte do produto, a produção de sal e a construção de redes. No ager Olisiponensis haveria igualmente produção de vinho, existindo indícios de cultivo da vinha com eventuais raízes já em épocas pré-romanas (Fabião, 1998, p. 174), e do azeite, no entanto estes não conseguiam concorrer com os produtos similares de outras províncias do império, como era o caso do azeite da Bética, por serem considerados de qualidade inferior. Atendendo à relevância de Olisipo , resulta curioso, como refere Maria Graciana Dias Marques, que nunca tenha sido identificado o seu nome em qualquer moeda cunhada na Hispania . A autora admite como hipótese para esta situação o facto de Olisipo se encontrar afastada das grandes zonas mineiras de exploração de cobre e prata, mais favoráveis à produção de moeda comum, usufruindo, por seu turno, dada a sua posição estratégica, enquanto centro de circulação viária e portuária, de moedas locais e regionais, bem como romanas, nomeadamente através de legionários 12 . A história das elites fica associada às marcas registadas na cidade a nível de monumentos, pelo que antes de analisarmos quem constituía a elite de Olisipo e qual o estatuto deste município, abordaremos brevemente os seus mais significativos vestígios arqueológicos, contribuindo, desta forma, para traçar um breve perfil da própria cidade enquanto estrutura urbana. Lisboa assemelha-se, como referido anteriormente, a Roma enquanto urbs . Recebe teatro, termas, circo, monumentos que, num ou noutro caso, podemos associar a indivíduos de relevo na cidade. No que respeita aos vestígios do período romano em Lisboa, têm sido identificados em vários locais, entre eles a Sé, o Castelo de São Jorge,

32 a Praça da Figueira, a Casa dos Bicos, a Rua das Pedras Negras, a Rua de São Mamede ao Caldas, a Rua da Madalena, ou a Rua Augusta.

Figura 1: Felicitas Iulia Olisipo (in Mantas, 1990, p. 166, Fig. 2)

Ainda que brevemente, podemos então identificar entre os mais significativos vestígios arqueológicos de Felicitas Iulia Olisipo os seguintes:

- O teatro Situado na Rua de São Mamede ao Caldas, as suas ruínas são descobertas em 1798, quando se procedia à urbanização da zona. A descoberta é tradicionalmente atribuída a Francisco Xavier Fabri, que terá efectuado nesse ano os primeiros levantamentos gráficos 13 .

12 A autora coloca ainda a questão contrária, i.e., questiona sobre se seria exactamente essa larga exposição ao exterior por parte de Olisipo um obstáculo à produção de moeda. Cf. Marques, 2008, p. 10 13 Sobre este equipamento vide Fernandes, Lídia, 2007, pp. 28-39

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Figura 2: Levantamento das ruínas do teatro romano de Lisboa, de Francisco Xavier, c. 1798 (in Fernandes, Lídia, 2007, p. 29).

Esta estrutura de lazer surge desde logo relacionada com a figura de Caius Heius Primus , augustal perpétuo, que no ano 57 d. C. manda fazer obras de renovação e ornamentação do monumento, com uma repavimentação da orchestra e a renovação do proscaenium , com a utilização de pedras marmóreas. Esta «marmorização da arquitectura», como refere Lídia Fernandes (2007, p. 37), surge com Augusto no centro do Império e vai-se alastrando depois às províncias, sendo este acto de benemerência disso um exemplo. A obra é dedicada a Nero 14 , como consta na inscrição do muro do proscenium (CIL II, 183, EO 70) que hoje se encontra no Museu do Teatro Romano, e coincide com a data em que é inaugurado em Roma o anfiteatro de Nero. A remodelação do teatro de Olisipo por Caius Heius Primus visaria enaltecer o imperador e integrar o município nos ludi romani que decorriam em Roma (Fernandes, Lídia, 2007, p. 38). O monumento deverá ser, no entanto, anterior, possivelmente do tempo de Augusto ou pouco posterior.

14 Stylow contesta que a inscrição seja dedicada a Nero, parecendo-lhe mais lógico que a titulatura imperial sirva como datação, propondo assim a correcção da leitura de NERONI para um ablativo de datação – NERONE. Há igualmente referência a C. Heius Primus em CIL II 196 e EO 71. Para além disso, terá sido recentemente detectada uma inscrição incompleta que documenta uma outra doação deste augustal, inscrição reutilizada num edifício moderno próximo do teatro. Cf. Fernandes, Luís, 2005, pp. 31-32.

34 Terá sido abandonado/demolido nos finais do século IV, inícios do século V d. C. (Diogo e Trindade, 1999a, p. 87). Para além da inscrição do muro do proscenium em que consta o acto benemérito de Caius Heius Primus , realçamos outras duas peças encontradas no local do teatro, nomeadamente os dois silenos encontrados nos primeiros trabalhos de descoberta, um deles hoje no Museu do Teatro Romano e o outro no Museu Nacional de Arqueologia. A presença em Olisipo de um teatro, seria um símbolo do poder de Roma e da romanidade e contribuiria para o aprofundar do modus vivendi romano.

- As Termas da Rua das Pedras Negras – «Termas dos Cássios» As ruínas são descobertas em 1771, quando se construía o Palácio do Correio- Mor, depois conhecido por Palácio Penafiel. As «Termas dos Cássios» situar-se-iam, de acordo com Vieira da Silva (1944, pp. 48-49, 114), pelos números 14 e 16 da Rua das Pedras Negras. A sua construção datará possivelmente do século I d.C e delas temos de novo notícia aquando da sua renovação por Numério Albano, vir clarissimus e praeses provinciae Lusitaniae, como é atestado em CIL II 191 e EO 22 . Na própria inscrição é mencionado o nome dos cônsules, Nepociano e Facundo, o que permite assim datar a renovação de 336 d.C. Nela são designadas por « Thermae Cassiorum », o que levou arqueólogos a atribuírem a sua construção a Quintus Cassius Longinus , Propretor da Hispânia Ulterior em 44 a. C., e a Lucius Cassius , seu irmão e seu legado ou lugar- tenente, donde lhe ser atribuída uma data anterior a 49 a. C., ano em que faleceu o primeiro dos irmãos Cássios. Ainda que esta possa ser uma hipótese, dada a quantidade de vezes em que aparece o nome Cassius em inscrições de Olisipo , os Cássios referidos na inscrição poderão não ser os irmãos aqui acima referidos (Moita, 1994, p. 48). Terão sido abandonadas/demolidas nos finais do século IV, inícios do século V d. C. (Diogo e Trindade, 1999a, p. 87).

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Figura 3: Inscrição publicada por Vieira da Silva na sua Epigrafia de Lisboa , correspondente a “copia dum desenho da pasta s/n.o de inscrições lapidares de Cenáculo (Biblioteca regional de evora)” (Silva, A. V., 1944, p. 114, n.o 22). (in Fernandes, Lídia, 2009, p.198).

- O criptopórtico O monumento do subsolo da Rua da Prata foi reconhecido em 1770, tratando-se de uma estrutura que se estende a sul até à Rua de São Julião, a oriente termina no início da rampa que sobe para a Madalena, a norte atinge a Rua da Conceição e a poente aproxima-se da Rua Augusta. Na altura é designado de «Termas Romanas da Rua da Prata», atendendo ao facto de nela se ter encontrado uma epígrafe, possivelmente do tempo de Tibério, dedicada pelos augustais M. Afranius Euporio e L. Fabius Daphnus ao deus Esculápio, divindade protectora da saúde e da medicina, que aparece frequentemente junto de monumentos termais. De todo o modo, não se sabe exactamente onde se encontrava esta epígrafe nem se originalmente estaria no criptopórtico ou na parte superior (Fabião, 1994, p. 68).

36 A designação na altura atribuída e a sua função foi sendo posta em causa, estando hoje o monumento identificado como criptopórtico (Ribeiro, J, 1994 b), sendo clara a semelhança estrutural com outras estruturas idênticas (Guerra, 1995, p. 92) 15 . Não estão no entanto identificadas quais as construções das quais o criptopórtico seria a base. Jorge de Alarcão (1988b, p. 125) sugeriu que se trataria de um criptopórtico em que assentariam umas termas, tendo sido sugerido por Cardim Ribeiro que poderia tratar-se da base do fórum corporativo de Olisipo , um fórum secundário destinado simultaneamente a funções socioeconómicas e religiosas (Ribeiro, J, 1994 a, pp. 193-194 e 1994 b, p. 323).

- Necrópole da Praça da Figueira/Largo de S. Domingos/ Calçada do Garcia Destaca-se esta necrópole por se tratar do maior local de enterramento conhecido até ao momento em Olisipo , abrangendo uma cronologia entre os séculos I e III d.C. (Alarcão, 1988a, p. 125). Tal como acontecia em toda as cidades romanas, as necrópoles de Olisipo ficavam na saída da cidade, fora do seu pomerium , ao longo das vias que iam para norte, noroeste e oriente. Era assim o caso da necrópole que ocuparia uma área a sudoeste da cidade, junto à via que levava à capital conventual, e o da necrópole que se implantava numa área ao longo desta mesma via, entre o campo de Santa Clara e a Calçada da Cruz da Pedra. Na área da civitas foram já recolhidas lápides funerárias em vários outros pontos, como seja em Chelas, Ajuda ou na Avenida da República (Moita, 1994, p. 54). Através da análise da origem dos antropónimos patentes nas inscrições poder-se- á ver, no que respeita à composição da população deste município, que ainda que na maior parte dos casos os antropónimos tenham sido alatinados ou substituídos por outros de origem latina, para além de romanos ou itálicos, havia um número importante de indivíduos de aparente origem oriental, em particular grega, como o revelam os nomes de Filocalo (EO 12), Tyche (EO 25), Thymele (EO 39) e Filogeno (EO 47), entre outros.

15 Sobre o monumento, vide por exemplo Ribeiro, J, 1994 a e b, Fabião, 1994 e Moita, 1994, pp. 48-50.

37 - Circo 16 O circo situava-se na zona do Rossio, com uma datação provável de construção na 2ª metade do século III d.C., para cuja datação contribui o estudo da terra sigilata encontrada na escavação arqueológica do Rossio, bem como outros factores, como seja o facto de circos com euripus serem apenas conhecidos a partir das alterações de Trajano no Circus Maximus . O circo encontrava-se em terrenos ocupados ou adjacentes à necrópole da Praça da Figueira, a qual terá funcionado entre os séculos I e III d.C., tendo a sua desactivação permitido que o espaço fosse dedicado a uma nova função. É assim avançada como bastante plausível a hipótese da sua construção após o desactivar da necrópole, reforçada pelos materiais encontrados nas escavações, em que alguma cronologia vai até ao século IV d.C., pelo que a sua construção deverá ser a partir da segunda metade do século III ou mesmo nos inícios do século IV d.C. (Sepúlveda et alii, 2002, pp. 250-259). Os circos necessitavam de uma área considerável e que fosse de preferência plana, com fáceis acessos e que ficasse próximo da cidade; para além disso o euripus necessitaria de uma quantidade de água considerável, para encher as suas bacias. Tal só seria possível tendo a cidade um abastecimento de água constante (Sepúlveda et alii, 2002, pp. 258-259), o que no caso de Lisboa terá sido construído no século III d.C. (Almeida, F, 1969, p. 179). Ainda que o século IV d.C. não seja tradicionalmente um século de grandes obras públicas, o facto é que em Olisipo contamos igualmente com uma obra importante neste século, tendo as «Termas dos Cássios», como referido anteriormente, sido igualmente renovadas no século IV d.C..

- Templos Augusto Vieira da Silva (1944, p.81 e pp. 120-123, EO 25 e 26) considera a possibilidade de existência de um templo dedicado à Mãe dos Deuses, junto ao local onde duas lápides lhe são dedicadas, uma delas (EO 25) pela cernófora Flavia Tyche . As ruínas deste monumento romano surgem quando João de Almada construía o seu prédio, situado entre a Rua das Pedras Negras, Travessa do Almada e Largo da Madalena, em 1753, e pelo facto de se terem então encontrado nelas as duas referidas

16 Sobre o circo de Olisipo vide Sepúlveda et alii, 2002, p. 245-275.

38 inscrições dedicadas à grande Mãe dos Deuses, Idae Phrygiae . O edifício acaba por passar a ser conhecido como um templo dedicado à deusa Cíbele, hipótese que, como refere Irisalva Moita, se não for certa constitui de todo o modo uma possibilidade (Moita, 1994, p. 40). Existe um número significativo de registos epigráficos referentes a divindades romanas cultuadas em Olisipo , como seja em monumentos consagratórios e votivos – bases de estátuas ou ex-votos - o que revelará que mesmo que não tenham tido templos próprios, foram de todo o modo objecto de culto neste município. Há assim registos de culto a diversas divindades, entre elas a Júpiter, que temos conhecimento por exemplo através de uma ara dedicada a Iovi Optimo Maximo (EO 127), a Baco, referido em ara em que é designado por Patri Libero (EO 144-F), ao deus Mercúrio, a Esculápio desde logo conhecido pela lápide encontrada no monumento da Rua da Prata e já aqui referido (EO 103), a , culto documentado numa ara encontrada no Castelo de São Jorge em 1939 (EO 1). O culto a Apolo é também conhecido através de uma base de estátua que lhe é dedicada, com uma inscrição consagrada pelo augustal M. Iulius Tyrannus (EO 101). É conhecido igualmente o culto à deusa Concórdia, a quem se refere uma ara encontrada perto ou incrustada na antiga igreja de São Mamede (EO 24). Foi também avançada a possibilidade de existirem outros monumentos, como é o caso do templo dedicado à deusa Tétis, colocado no local onde se encontra hoje a Igreja de São Nicolau, o que para Mantas é de autenticidade duvidosa (Mantas, 1994, p. 73). Uma breve nota para o facto de que, como avança Robert Étienne, se dever entender o templo como um complexo arquitectónico que integra o edifício religioso, com pórticos que desenham os percursos das procissões onde as estátuas de sacerdotes e sacerdotisas são instaladas em território sagrado, o temenos do templo. Étienne realça que a revolução flávio-trajânica transformou o fórum tradicional num fórum de tipo imperial, com o templo rodeado por três pórticos, onde a circulação se faz de forma idêntica à do pronaos e à da cella do templo; uma segunda praça, diante da primeira, é também rodeada por pórticos e acolhe os devotos (Étienne, 2002, pp. 101-102).

- Barragem romana e aqueduto Olisipo terá tido também um aqueduto, de que Francisco de Holanda, no século XVI, dá conta. Associada está também a construção de uma barragem, no século III

39 d.C., que teria servido para a formação da albufeira de onde partia o aqueduto que levava a água até Lisboa, até à Porta de Santo André (Almeida, F, 1969, pp. 179-189). De acordo com Alarcão (1994, p. 60), a barragem será possivelmente bastante mais antiga do que o século III d. C.

- Unidades de preparados piscícolas Foram encontrados diversos vestígios destinados a preparados piscícolas neste município. A actividade possivelmente seria já pré-existente à chegada dos romanos, sendo possível que no actual território português a actividade de conserva de peixe se tenha desenvolvido a partir do século V a.C., em locais onde com o domínio romano veio a crescer (Amaro, 1994, p. 71). Dada a quantidade de cetárias encontradas na margem do rio, tal revelará uma produção em larga escala, que deverá ter constituído o principal produto exportado por Olisipo (Moita, 1994, p. 61). Foram assim encontradas cetárias em vários locais, como seja no interior da Casa dos Bicos, Rua dos Fanqueiros/Rua da Conceição, Rua dos Douradores, Núcleo Arqueológico da Rua dos Correeiros, Casa do Governador 17 . Esta produção de preparados piscícolas teria no entanto de concorrer com o garum de Gades e de Carthago Nova , que era o mais apreciado no Império Romano.

- Outros vestígios A localização exacta do forum , centro nevrálgico da cidade romana, não foi ainda confirmada, sendo avançadas várias hipóteses. Jorge de Alarcão (1994, p. 58) considera que a localização mais provável será o Largo da Madalena, colocando-o Vasco Mantas (1994, p. 73) entre o Largo da Madalena e a Sé. Para Irisalva Moita (1994, p. 45), a partir do século I, o centro da cidade e o seu forum , situavam-se na plataforma situada nas imediações da Sé, sucessora de algum monumento desta estrutura, talvez um templo ou uma basílica. O forum é colocado nesta área com base em vários indícios, como seja a hipótese de a Porta de Ferro poder ser o aproveitamento de um seu antigo Arco do Triunfo, bem como a proximidade da localização dos principais edifícios públicos de Olisipo cuja localização se conhece, como seja o teatro e

17 Sobre o tema, vide por exemplo Bugalhão , J, 2001 e Fabião, 2009, pp. 25-26, Amaro, 1994 a, pp. 76-79 e b, pp. 69- 74

40 as «Termas dos Cássios» e o facto de a maior parte das inscrições honoríficas dedicadas a imperadores ou a membros da família imperial terem sido encontradas nesta zona. Esta área situa-se igualmente na convergência dos principais arruamentos urbanos e vias de saída da cidade, tendo sido identificada nas escavações arqueológicas nos claustros da Sé, uma via de sentido norte-sul datada do século I d. C., construída por patamares lajeados (Amaro e Matos, 1996, pp. 215-217). Este espaço contudo revelou igualmente um grande espólio datado da Idade do Ferro, revelando características eminentemente orientalizantes (Arruda et alii, 2000, p. 48), apoiando a presença fenícia em Olisipo antes do domínio pelos romanos. A história de Lisboa está inevitavelmente associada ao porto, ponto de entrada de novas influências e culturas. No que respeita à sua localização, o indício conhecido é constituído por uma plataforma inclinada de opus signinum descoberto em 1922, próximo e na descida para o Arco Escuro, antiga Porta do Mar (Moita, 1994, p. 45). É possível que o município tivesse igualmente anfiteatro, pois Olisipo seria suficientemente importante para receber um monumento deste tipo, contudo não foi ainda encontrado. De Lisboa partiam algumas vias fundamentais para o funcionamento da rede urbana e para o relacionamento entre as cidades, desempenhando importantes funções nomeadamente económicas e administrativas. Destacam-se as estradas de comunicação com a capital da província, Emerita Augusta , e com as sedes conventuais mais próximas, Scallabis , Pax Iulia e Bracara Augusta , percursos principais que eram complementados por outros, como seja a estrada que seguia para , por Eburobrittium e Collipo (Mantas, 1998, p. 18).

5.1 Municipium civium Romanorum Segundo Plínio (23/24 d. C. – 79 d.C.), a província da Lusitânia divide-se em três conventos, o Emeritense, o Pacense e o Escalabitano; tem no total quarenta e cinco povos, dos quais cinco são colónias, sendo elas Emerita Augusta , Metellinum , Pax Iulia , Norba Caesarina e Scallabis Praesidium Iulium , um é município de cidadãos romanos, Olisipo , cognominado Felicitas Iulia, outros três são de direito latino antigo, Ebora

41 Liberalitas Iulia , Myrtilis e Salacia , e trinta e seis são civitates stipendiariae 18 . Esta distinção traria realidades financeiras e jurídicas diferentes. Plínio dá-nos então a conhecer a denominação romana de Lisboa, Felicitas Iulia Olisipo , designação que surge em algumas inscrições encontradas neste município, como é o caso, por exemplo, da homenagem ao imperador Adriano (CIL II 186) 19 . Este autor informa-nos igualmente que esta cidade tinha o estatuto de municipium civium romanorum, a única referida com este estatuto . É provável que Olisipo tenha tomado o partido cesarista aquando das guerras civis do final da república, o que poderá explicar a atenção dada por Júlio César ou Augusto a este município (Mantas, 1990, p. 161). Os seus cidadãos pertenciam à tribo Galeria , a mais frequente, de resto, na Península Ibérica (ILER, p. 698). Para além da Galeria , atribuída por César e/ou Octaviano, na Hispânia , as tribos são essencialmente a Sérgia (César e Augusto), a Papíria (Augusto) - apenas em Emérita Augusta, e a Quirina (talvez a partir de Cláudio)20 . Ao ser promovido a municipium , ao topónimo Olisipo (pré-romano) 21 , são acrescentados os termos Felicitas Iulia , os quais seguem a ordem dos tria nomina antroponímicos. O estatuto que Plínio atribui a Olisipo, o de municipium civium Romanorum , suscitou grande debate entre os académicos. De acordo com António Marques de Faria, a Olisipo foi atribuído o estatuto municipal entre 31 e 27 a. C. e em conjunto com o estatuto ter-lhe-ão sido atribuídos os cognomenta Felicitas Iulia (Faria, 2001, p. 354). De acordo com Moita (1994, p. 63, nota 1), o mais antigo documento em que encontramos registado o cognome de Olisipo, Felicitas Iulia , é num cipo dedicado a Vespasiano, de 73 d.C., no entanto, é possível que a distinção honorífica remonte a uma

18 NH , 4, 117. Para tradução de Plínio, foi consultado Guerra, 1995, p. 35 19 Para a leitura da epígrafe, vide Anexo 2 20 A tribo Galeria constituía uma das 35 circunscrições em que o território de Roma foi dividido, e nas quais os cidadãos eram inscritos, de acordo com a região em que habitavam. A partir de meados do século III a.C., a distribuição definitiva dos cidadãos numa tribo passa a ter sobretudo uma função administrativa. A partir do século I d.C. a designação da tribo deixa de ter um carácter geográfico, sendo um título pessoal hereditário, atribuído apenas a cidadãos. Com Caracala a designação da tribo deixa de ter significado pessoal, dado que estende o direito de cidadania romana a todos os habitantes do império e acaba por desaparecer com Diocleciano (século III-IV). Cf. Cardozo, 1956, p. 507, nota 40. 21 Olisipo poderá identificar-se como oppidum dos Túrdulos, origem ibérica não indo-europeia, devido à terminação em ipo. Cf. Alarcão, 1988, p. 66. Apesar de haver razoável consenso sobre este aspecto, a cronologia do topónimo apresenta maiores problemas. Sobre o tema vide Vasco Mantas, 1997 pp. 17-18.

42 das estadas de Júlio César na Península Ibérica, mais provavelmente à segunda, entre 61 e 62 a.C., ou à terceira, em 44 a.C., durante as guerras contra os seguidores de Pompeio. Vasco Mantas (2005, p. 26, 1994, p. 70), por seu turno avança que se a denominação Felicitas Iulia Olisipo pode ser anterior a 27 a.C., pertence a um grupo de topónimos que se enquadra melhor na ideologia política de Octaviano, como Liberalitas Iulia Ebora e Pax Iulia , do que na de Júlio César, para além de que os cidadãos das fundações de César foram inscritos na tribo Sérgia e não na Galéria, à qual pertencem os olisiponenses. José Cardim Ribeiro (1994b, pp. 76-77) realça por seu turno que actualmente supõe-se viável a atribuição a Olisipo do estatuto de municipium civium Romanorum enquadrado num programa esboçado por Júlio César e aplicado por Octaviano, cerca de 30 a. C. (1994, p. 77). Alarcão coloca, por seu turno, a dúvida entre Júlio César e Augusto antes do ano 27 a.C. (Alarcão, 1994, p. 76). Para Vieira da Silva (1939, p. 8) terá sido elevado a município romano com Júlio César, tal como para Lambrino (1953, pp. 32 e 44). Este estatuto poderá eventualmente ter sido precedido de outro, sendo proposto por Vasco Mantas a possibilidade de um anterior oppidum civium Romanorum (1991, 353) , hipótese igualmente partilhada por Cardim Ribeiro (1994c, p. 77) e contrariada por António Marques de Faria (1995, pp. 91-93, 2001, p. 353), que considera que a expressão oppidum empregue por Plínio corresponde noutros registos, como sejam os numismáticos, ao termo municipium . Cardim Ribeiro realça porém que enquanto que o municipium implicava a administração de um território dependente da urbs , o oppidum civium Romanorum diria respeito apenas à urbs . O estatuto seria, no entanto, atribuído à urbs propriamente dita (ou oppidum ) e não apenas à comunidade de cidadãos que nela vivia, o que poderia ter acontecido eventualmente com Decimus Iunius Brutus , no âmbito da figura jurídica conventus civium Romanorum , ou seja «assembleia de cidadãos romanos». Desta forma, considera teoricamente viável supor a existência de um conventus civium Romanorum em Olisipo já na segunda metade do séc. II a. C., a promoção como oppidum civium Romanorum em meados do séc. I a. C. ou mesmo um pouco antes, e a elevação a municipium civium Romanorum com Octaviano (Ribeiro, J, 1994, p. 77). De acordo com Plínio, Olisipo era então o único município de cidadãos romanos na província da Lusitânia. Com efeito, os municípios de cidadãos latinos eram mais frequentes, oferecendo menos direitos aos novos cidadãos.

43 Há que distinguir então entre os municípios de direito romano ( municipium civium Romanorum ), como Olisipo , e os municípios de direito latino ( municipium iuris Latini ). Quanto a estes últimos, há ainda que distinguir os municípios com ius Latii maius (maior), e os com ius Latii minus (menor). Em 73 ou 74, Vespasiano outorga, como é transmitido por Plínio ( NH , III, 30), o direito latino ( ius Latii ) a toda a Hispania (ius Latii, universae Hispaniae ). Passa assim a haver nesta província três tipos de cidades: colónias e municípios de direito romano e municípios de direito latino, passando a haver, no que respeita aos cidadãos, cives latini e cives romani . O ius Latii era Latium minus , obrigando a passar por uma magistratura ( honos ) para que um indivíduo pudesse converter-se em cidadão romano. Logo, só as elites alcançam esse estatuto (Abascal e Espinosa, 1989, pp. 42-44). De todo o modo, no século II o benefício de se tornar um cidadão romano aumenta pelo facto de passar a haver equiparação do cargo de decurião ao de magistrado (D’Ors, 1953, p. 150). Os municípios romanos como Olisipo eram antigas cidades não romanas, cujos habitantes eram colectivamente honrados com o direito de cidadania romana, obrigando a cidade a dotar-se das instituições inerentes à sua categoria de município de cidadãos romanos, como observamos no capítulo dedicado às instituições fundamentais do sistema de funcionamento dos municípios, renunciando ao seu esquema de administração próprio. O município é sobretudo um conceito político, em que existe um vínculo de sujeição à capital do Império, e com autonomia na sua constituição interna. Para além disso, é também uma entidade jurídica, enquanto conjunto de cidadãos que se regem por leis próprias, que possui património, e que tem direito a eleger os seus magistrados, a exigir munera e a administrar bens próprios. Dada a sobrevivência de algumas leis até aos nossos dias, é possível conhecer o funcionamento da administração municipal e das suas instituições, sendo de destacar quatro leis procedentes da Bética, nomeadamente de Urso (Osuna), que constitui o texto mais antigo, Salpensa (próximo de Utrera), Malaca (Málaga) e Irni (província de Sevilha). Estas leis, promulgadas pelo imperador com carácter permanente, reuniam as disposições legais pelas quais as cidades deviam organizar-se (Roldán Hervás, 2001 , p. 407). Ainda que todas aparentemente tenham a sua base na Lex Iulia Municipalis , cada uma delas terá as suas especificidades (D’Ors, 1953, pp. 167-343).

44 5.2 Elites locais Dada a escassez de documentos escritos que nos possam dar informações concretas na busca do conhecimento das elites locais, a informação que nos chega através da epigrafia torna-se fundamental, permitindo-nos vislumbrar a evolução das elites locais hispano-romanas. As inscrições permitem-nos ver diversos aspectos da sociedade; assim é que pelos antropónimos podemos ter uma ideia da composição da sociedade, podemos por outro lado analisar a organização administrativa e jurídica da cidade, atendendo a que nelas estão representados cargos tanto civis como religiosos. A evolução das elites locais hispano-romanas é muitas vezes vista a partir dos descendentes romanizados das antigas aristocracias locais, sendo muitas vezes difícil determinar se os magistrados são indígenas romanizados ou descendentes de famílias itálicas que vieram para a Hispania , dado que já antes da promoção municipal e da adopção da cidadania latina ou romana, vários membros da aristocracia indígena ostentavam nomes romanos. Do mesmo modo, antes da promoção municipal existiam igualmente magistraturas com nomes romanos como consta na Lex Irnitana , 19, 20 e 49, referindo-se respectivamente aos edis, questores e duúnviros (Salina de Frias e Rodríguez Cortés, 2000, p. 18). A criação de uma oligarquia local de tipo romano na Hispania acontecerá então depois de terminada a conquista do território e do domínio da população, com Júlio César, e está estreitamente relacionada com a criação de cidades em moldes romanos, como sejam colónias e municípios. Por seu turno, as civitates e oppida peregrinos excluíam os peregrinos da promoção política e social que o cidadão romano podia alcançar em função da sua posição censitária e de determinadas funções ligadas com a administração local e provincial (Salina de Frias e Rodríguez Cortés, 2000, p. 18). A gestão pública da cidade era, como já observámos, levada a cabo pelos magistrados municipais, eleitos com carácter anual e que desempenhavam as suas funções de forma gratuita, e pelo ordo decurionum , também ele honorífico, pelo que apenas os cidadãos que tivessem tempo livre e capacidade financeira podiam desempenhar estes postos dirigentes. Era sobretudo desta «classe política» que os habitantes do município esperavam contributos para o funcionamento da vida da comunidade e actos evergéticos, incluindo situações tão diversas quanto a promoção de ludi , o abastecimento de água, o fornecimento de bens de primeira necessidade ou distribuições de dinheiro. 45 A busca do prestígio social, e com ele de poder político, levava as famílias ricas a cumprir estes serviços em prol da comunidade. Como refere Roldán Hervás, a história dos municípios nas províncias do Império Romano está ligada à história das suas elites locais, sendo que a sua prosperidade significará a prosperidade da cidade, bem como o inverso (Roldán Hervás, 2001, p. 409). As elites olisiponenses, dotadas de poder económico considerável, beneficiariam da posição privilegiada de Olisipo enquanto município portuário, particularmente no contexto do comércio atlântico. Os membros do ordo decurionum , os magistrados municipais e os sacerdotes, desempenhando as suas funções municipais na cidade, regressariam muito provavelmente ao campo, à sua villa , onde poderiam dedicar-se a actividades agrícolas, como seja ao cultivo da vinha, da oliveira, de cereais. Desta elite faria parte um certo número de famílias, destacando-se de entre elas, desde logo, a Iulia , que revela maior representatividade neste município. Outras famílias seriam de destacar, desde a Caecilia à Cassia , à Antonia , à Gellia , à Coelia , à Marcia , à Fulvia , à Gavia , à Cantia todas elas representadas a nível de magistraturas municipais, bem como famílias como a Lucceia , a Pompeia , a Fabricia ou a Rutilia (Alarcão, 1994, p. 62). São as principais famílias que fornecem os decuriões, distintos membros da cúria, bem como os magistrados municipais e os sacerdotes, muitas das vezes com relacionamentos familiares entre eles. De todo o modo, apesar da possibilidade de os indivíduos que têm o mesmo nome de família poderem ser efectivamente da mesma gens, podendo nomeadamente existir, por exemplo, associações de membros da família Iulia de Olisipo e da desta cidade com um outro município Lusitano, parece-nos que deverá haver, no entanto, alguma prudência nesta questão, dado que tratando-se de uma possibilidade/especulação poderá na realidade não ser confirmada por descobertas futuras 22 . A gens Iulia é, como referido, a mais atestada em Olisipo , nomeadamente em termos dos magistrados olisiponenses, tal como sucede na Lusitânia em geral (Salina de Frias e Rodríguez Cortés 2000, p. 20), situação relacionada com o facto de César e Augusto terem agregado à gens Iulia várias famílias de origem étnica e social variada (Mantas, 1982, p. 11).

22 Sobre a questão vide Encarnação, 1984, p. 773-779 e Andreu Pintado, 2004, pp. 178-180

46 Para além dos magistrados da gens Iulia , que adiante apresentaremos, salientamos aqui Q. Iulius Maximus Nepos, orator , de quem temos notícia pelo seu epitáfio, sendo o dedicante o seu pai, Q. Iulius Maximus (CIL II 354 e EO 116). Trata-se de um indivíduo de possível origem africana e integrado na tribo Galeria 23 . Luís da Silva Fernandes, ao analisar esta inscrição, sugere uma datação de meados do século II d. C., com base na estrutura onomástica, na indicação da tribo Galéria, e na utilização do adjectivo superlativo piissimus ( Fernandes, Luís, 2000, p. 207). Para além do interesse de per si da inscrição, facto relevante e que corroborará a importância de Olisipo é a circunstância de se tratar de um professor de retórica, essencial para o homem da elite e para a sua vida pública. A gens Cassia surge igualmente como uma das principais famílias de Olisipo , a qual estará muito provavelmente relacionada com as thermae Cassiorum 24 . A. Vieira da Silva avança a possibilidade da sua construção no ano de 49 a.C., ano em que, de acordo com Apiano ( Bel. Civ . II, 43, 197) 25 , Quinto Cássio Longino recebe de César o governo da Hispania Ulterior . De acordo com Marie-France Loyzance, será de salientar o facto de vários dos Cássios de Olisipo terem como prenome Quintus , avançando que o magistrado romano que aquando da sua passagem pela Lusitânia distribuiu o direito de cidadania a notáveis locais deverá ter estado na origem deste núcleo de Cássios a quem deixou o seu nome (Loyzance, 1986, p. 276). A esta família se poderá associar M. Cassius Sempronianus , diffusor olearius , o qual, originário de Olisipo , terá promovido a construção de um edifício de natureza desconhecida, registada num documento epigráfico aparecido na actual Tocina (Sevilha) 26 , estando envolvido principalmente na distribuição de azeite. José d’Encarnação e Guilherme Cardoso colocam a questão sobre de que azeite seria M. Cassius Sempronianus diffusor, concluindo que tal não poderá ser assegurado, tanto poderia ser o da Bética como o da península de Lisboa, nas suas villae ( Encarnação, e

23 A referência à tribo, frequente nos séculos I e II d. C. começa a entrar em desuso após o Édito de Caracala, de 212, na medida em que a cidadania é alargada a todos os habitantes livres do Império Romano, omitindo-se totalmente com Aureliano (270-275) Cf. Encarnação, 2002-2003, p.127. 24 Encontra-se referência às termas em C.I.L. II 191 e I.L.E.R. 2049. De acordo com José Cardim Ribeiro, é possível que os votos consagrados a Asclepius e a Aesculapius a que se referem C.I.L. II 173 e 174 tenham pertencido a estas termas. Cf. Ribeiro, J,1983, p. 19. 25 Cf.Loyzance, 1986, p. 276, com base em Apiano, Bel. Civ ., II, 43, 197 26 AE 1984, 526.

47 Cardoso, 1993, p. 210). Para Carlos Fabião, M. Cassius Sempronianus estaria associado à circulação do azeite bético. 27 Existem ainda registos de a sua acção chegar a Roma, indicação que nos é dada pela marca laterícia surgida em Óstia 28 . Marie-France Loyzance refere que entre os grandes nomes da República romana existentes na Península Ibérica, o dos Cássios ocupa um lugar de destaque ao lado de nomes como os dos Fabii , Aemilii ou Licinii . A mesma autora realça que, tomando em conta a repartição geográfica dos Cassii na Península Ibérica, denota-se que residem de preferência nas capitais de província, em zonas portuárias como Olisipo , Balsa , Gades , Cartago Nova , Tarraco , Barcino , ou ao longo dos grandes rios, particularmente do Guadalquivir, locais marcados por uma actividade económica evidente, atraindo portanto todos os que se dedicam à actividade comercial, como é o caso de Marcus Cassius Sempronianus (Loyzance, 1986, pp. 275-279) . De acordo com Mantas, é possível que Iulia Cassiana , possivelmente oriunda de Castra Caecilia e pertencente à ordem senatorial (CIL II 4994) se relacione com os Cassii e pela mesma razão será de considerar a hipótese de relacionamento com L. Cassius Reburrus (CIL XIV 4139), que foi duúnviro em Óstia e que apresenta um cognomen tipicamente hispânico, com particular representação na Lusitânia (Mantas, 1996, pp. 343-370). São vários, de resto, os Cassii que podemos encontrar em Olisipo , de que nos dão conta epígrafes como por exemplo EO 81, 95, 105, 106, 107 e 127. Loyzance e Julián González relacionaram os Cassii de Olisipo com L. Cassius Celer que pagou parte do podium do circo de Balsa (1986 e 1983). Andreu Pintado, por seu turno, considera que será possível que exista alguma relação entre eles, mas apenas porque os Cassii de Olisipo estão relacionados com a rota do comércio de azeite e Balsa estaria nessa rota, realçando, de todo o modo, não existirem provas conclusivas sobre esta questão (Andreu Pintado, 2004, p. 178). A gens Caecilia encontra-se igualmente bem representada em Olisipo (Silva, A.V., 1944, p. 277). A esta gens pertenceria o já referido L. Caecilius L. f. Celer Rectus ,

27 Fabião, 1993-1994, p. 240. Carlos Fabião realça aqui a proposta de G. Chic de chamar a atenção para a relação entre os C assi de Olisipo e o abastecimento de azeite à Britannia (CHIC 1994, p. 9). 28 Guerra, 2006, p. 281, apud Taglietti, 1994, p. 157-193.

48 olisiponense que entre outros cargos exerceu o de questor da província da Bética e a quem a cidade homenageou com um monumento, como observámos em 5.2. 29 .

Fotografia 1: L. Caecilius Celer Rectus, CIL II 190

De acordo com Alarcão, dado que o comérico de Olisipo se deveria efectuar preferencialmente com Gades , esta inscrição honorífica poderá ser um testemunho de gratidão pela protecção dada na Bética aos comerciantes deste município (Alarcão, 1994, p. 62). Caballos Rufino considera que esta figura será muito provavelmente originária de Olisipo , município que conta com vários representantes desta gens (Caballos Rufino, 1990, p. 92), hipótese igualmente partilhada por Cardim Ribeiro (Ribeiro, J, 1994c, p. 85). A esta gens pertencem igualmente os edis olisiponenses C. Caecilius Q. f. Gal. Gallus (CIL II 192) e Q. Caecilius Q. f. Gal. Caecilianus (CIL II 261), possivelmente aparentados, e o filho deste último, M. Caecilius Avitus . No que respeita à gens Lucceia, a epigrafia demonstra que esta gens tinha uma posição social destacada em Olisipo , conhecendo-se a identidade de dois dos seus libertos (EO 37 e EO 47).

29 CIL II 190, EO 28, datada de cerca de 108, de acordo com Emílio Hübner (Silva, A.V., 1944, p. 126).

49 A esta gens pertenceria o advogado Q. Lucceius Albinus , originário de Olisipo e que teria seguido para Roma 30 . A gens Pompeia inclui representantes da elite olisiponense, à qual deverá pertencer Sextus Pompeius Scapula, a quem os libertos homenageiam (CIL II, 244) (Guerra, 2006, p. 284). Desde logo, destaca-se a pertença a à família Coelia do duúnviro Q. Coelius Cassianus (CIL II 187). Mantas avança a possibilidade de Coelia Mascellina, negotiatrix olearia ex Baetica , estar relacionada com a gens Coelia de Olisipo , dadas as relações entre o porto de Olisipo e a Baetica , principalmente no Alto Império (Mantas, 2002, p. 137). A gens Sempronia está igualmente representada no município, marcada pelo alto nível económico e social, atestado na inscrição funerária de Sempronia Rufina , construtora de um mausoléu (CIL II 214, EO 35).

5.2.1 Magistrados municipais No que se refere a Olisipo , são conhecidos quinze magistrados municipais, integrando nove duúnviros e seis edis, ostentando nomes latinos. Estes indivíduos são normalmente citados em textos honoríficos, sendo que a tipologia destes monumentos é semelhante por todo o Império, tratando-se normalmente de cipos paralelepipédicos a colocar no forum , centro cívico da cidade, sendo o mais corrente o cipo sem qualquer ornato singular (Encarnação, 1995, p. 258). No caso em apreço, temos notícias dos membros da elite tanto em textos honoríficos como em epígrafes funerárias, sendo que todos os registos epigráficos que conhecemos de magistrados até ao momento pertencem ao Alto Império. Apresentamos então de seguida os magistrados conhecidos até ao momento 31 , iniciando pela enumeração dos que alcançaram o cargo de duúnviro e seguidamente os edis. Os magistrados estão igualmente enumerados no anexo 1, constando as inscrições

30 Sobre o advogado Q. Lucceius Albinus, vide Gonzélez Herrero, 2005, pp. 243-255. 31 Para além destes magistrados atestados em Olisipo , e tal como referido anteriormente, existe igualmente uma referência a Marco Varrão, questor. A inscrição é apresentada por Vieira da Silva (EO 29, in 1994, pp. 128-129), ainda que refira que segundo Emílio Hübner a lápide será falsa por ser semelhante a uma outra descoberta na cidade de Parma em 1524, baseando-se talvez no padre Tomaz Caetano de Bem.

50 do anexo 2. A ordem apresentada observa, na medida do possível, a cronologia relativa das inscrições:

1. Q. Iulius Plotus – aedilis, IIvir, flamen Germanici Caesaris, flamen Iuliae Augustaape in perpetu (u)m. O facto de Q. Iulius Plotus ter ocupado vários cargos de relevo, tendo sido edil, duúnviro, flâmine de Germânico César e flâmine perpétuo de Júlia Augusta, nome que Lívia usou depois da morte de Augusto, atesta desde logo a relevância deste elemento da gens Iulia . Tendo em conta que Germânico morreu em 19. d. C. (Tac. Ann . 2.72) e que Lívia só se tornará Iulia Augusta após 14 d. C., quando em testamento Augusto assim o dispõe (Suet. Aug. 101), Curchin (1990b, pp. 174-175) data a carreira de Q. Iulius Plotus dos anos iniciais do reinado de Tibério, tal como R. Étienne, que data a epígrafe entre 14-19 d.C. (Étienne, 1958, p. 199). Curchin realça ainda que a pretensão de Francisco Martín de que Lívia poderia ter sido Augusta antes de 14 d. C., i.e. , da época de Augusto (De Francisco Martín, 1977, p. 236) contradiz os termos do testamento de Augusto (Curchin, 1990b, pp. 174-175). Salinas de Frías e Rodríguez Cortés colocam- no entre 19 e 37 (Salinas de Frías e Rodríguez Cortés, 2000, p. 28) e José d’Encarnação coloca-o como flâmine de Calígula e de Agripina Minor (Encarnação, 1995, p. 258). González Herrero realça a importância da datação desta epígrafe para o conhecimento da difusão do culto imperial nas cidades da Lusitânia, pois dado que Q. Iulius Plotus fui eleito flâmine para o culto de Germânico César em vida, tal significa que um membro vivo da família imperial era venerado em Olisipo antes de 19 d.C., contando com um culto municipal organizado. Dada a cronologia, considera igualmente que Iulia Augusta terá sido cultuada em Olisipo antes da sua morte, em 29 d. C., na medida em que actuou como seu flâmine após o sacerdócio que obteve antes de 19 d. C. (González Herrero, 2002, p. 49). Realça-se aqui o facto de Q. Iulius Plotus ser flamen Germanici Caesaris e flamen Iuliae Augustae não havendo ainda, portanto, separação de tarefas rituais entre flâmines e flamínicas. No que respeita à expressão in perpetuum , corresponderá a uma distinção honorífica, talvez por ter sido o primeiro a encarregar-se do culto destes dois elementos da família imperial. Mantas apresenta-o como provável representante da colonização itálica, talvez oriundo da Úmbria (Mantas, 2005, pp. 29-30, Kajanto, 1982, p. 242).

51 O prenome Quintus é frequente, como se pode verificar desde logo pela recolha levada a cabo por Vieira da Silva em 1944 (pp. 276-283). Já o cognome é muito raro, sendo relacionado por Kajanto com os cognomina relacionados com particularidades físicas (1982, pp. 241-242). A epígrafe foi encontrada na muralha junto à Porta de Ferro, demolida entre 1758 e 1763 e integrada na colecção de Cenáculo, no Convento de Nossa Senhora de Jesus, em Lisboa, onde há dela notícia até 1798 (Silva, A.V., 1944, p. 143).

2. Q. Antonius Gallus – IIvir Desempenhou funções de duúnviro em conjunto com T. Marcius Marcianus (nº 3), tendo dele nota através da inscrição honorífica a Matídia Augusta, sobrinha do Imperador Trajano, homenageada por Felicitas Iulia Olisipo através destes duúnviros. Vieira da Silva (1944, p. 193), com base em Hübner (Supl., pág. 1.114) coloca-o cerca do ano 114 d.C.. Mantas (2005, p. 30) situa este magistrado por volta de 107 d.C., associado ao facto de Matídia ter recebido o título de Augusta pouco antes de 107. Salinas de Frías e Rodríguez Cortés (2000, p. 29) colocam estes dois magistrados entre 98 e 107. O gentilício deste duúnviro está bastante bem representado na Hispânia, o que poderá estar relacionado com as clientelas de Marco António, que concretizou diversas medidas de César após o assassinato deste (Mantas, 2005, p. 31), estando igualmente representado em Olisipo (Silva, A.V., 1944, p. 277). Kajanto apresenta o cognome Gallus 32 como de origem geográfica, em relação com a Gália Cisalpina, maioritariamente associados a homens livres e frequentemente de elevado estatuto social (Mantas, 2005, p. 31, Kajanto, 1982, p. 45 e 195-196). A epígrafe, que constitui um possível pedestal de estátua, encontrava-se nos finais do século XVI na Igreja de São Vicente de Fora, não havendo qualquer referência directa após a que se encontra no Anónimo Napolitano. As epígrafes deste tipo eram usualmente colocadas no centro nevrálgico da cidade, o forum , sendo que neste caso estaria distante do mesmo, quando comparado com a posição que se presume que o mesmo ocupasse.

32 Representação do cognome Gallus em Untermann, 1965, mapa 41, p. 111.

52 Atendendo a que esta zona se encontra sobre um dos grandes eixos viários de Olisipo , que entronca com a via para Scallabis depois do Campo de Santa Clara, poder- se-á colocar uma possibilidade de ter existido na zona um monumento importante. Para além disso, a existência de epígrafes do mesmo tipo em S. Vicente, nomeadamente a inscrição honorífica a Vespasiano (EO 80 e CIL II 185/CIL II S 5.217) e de uma outra epígrafe junto à desaparecida Igreja de São Tomé (CIL II 184) nas proximidades, dedicada a Nero, sugerem a possibilidade de ali ter existido um santuário do culto imperial. Para além disso, uma outra inscrição encontrada na área refere uma flamínica, [..] lia Vegeta (CIL II 197, EO 83), o que poderá ser significativo (Mantas, 2005, p. 30).

3. T. Marcius Marcianus – IIvir Desempenhou funções de duúnviro em conjunto com Q. Antonius Gallus (nº 2) e, em conjunto, são dedicantes de uma inscrição, homenageando Matídia Augusta, sobrinha do Imperador Trajano (CIL II 4993; EO 82). Por este motivo, aplica-se o anteriormente mencionado para o magistrado com o nº 2, à excepção das características onomásticas. No que respeita ao praenomen, Titus , e apoiando-nos em Vieira da Silva (1944, pp. 276-283) é pouco frequente; por seu turno Marcius ocorre sobretudo em regiões muito romanizadas da Hispânia, onde está razoavelmente representado (Mantas, 2005, p. 31).

4. M. Gellius Rutilianus, IIvir Do duúnviro M. Gellius Rutilianus temos conhecimento através de duas inscrições em que é dedicante, em conjunto com L. Iulius Avitus (nº 5). Uma delas homenageia o imperador Adriano (CIL, 186, EO 91), outra homenageia a sua mulher, Sabina Augusta 33 (CIL II 4992, CIL II 5221 e EO 72, ILER 1268, Curchin 369, 370). Curchin (1990b, p. 175) data de 121- 122 d.C. e Salinas de Frias e Rodríguez Cortés (2000, p. 29) colocam estes dois magistrados igualmente entre 121-122 d.C..

33 Esta inscrição encontrava-se em meados do século XVI no Beco do Bugio, havendo dela nota até 1773. Mantas (2005, p. 32) considera que esta inscrição, em conjunto com a inscrição que os duúnviros aquí registados dedicam ao imperador Adriano, estariam colocadas em conjunto, o que explica a não colocação dos títulos imperiais nesta inscrição (vide anexo 2). Sobre os problemas que se levantam quanto à cronologia e atribuição desta epígrafe, vide Guerra, 2006, p. 280.

53 Mantas (2005, 32) data de 121 d.C., dado que Adriano deteve o poder tribunício pela quinta vez entre 10 de Dezembro de 120 d.C. e 9 de Dezembro de 121 d.C., ano a que pertencem os miliários hispânicos deste imperador com indicação do quinto poder tribunício. A datação levanta no entanto problemas. Tal como refere Amílcar Guerra (2006, p. 280), atendendo a que se tratam de dedicatórias pelos mesmos duúnviros, as mesmas teriam sido coevas, ponto que levanta problemas relacionados com a cronologia atribuída à titulatura destas figuras. Atendendo à referência ao quinto poder tribunício de Adriano, tal situa a dedicatória nos anos 120-121 d.C.; já no que respeita a Sabina , o epíteto Augusta implicaria uma datação mais tardia, possivelmente no ano de 128 d.C.. De todo o modo, a leitura do Anónimo Napolitano refere o seu décimo primeiro poder tribunício; aceitando, tal como Hübner (CIL, p. 692), que apenas o Anónimo Napolitano e Accursio efectivamente viram a inscrição e que os autores posteriores dependem deste último, a epígrafe dataria de ente Agosto de 126 d.C. e Agosto de 127 d.C. 34 . A inscrição encontrava-se no século XVI num muro junto ao Tejo, frente ao convento de Xabregas, perdendo-se talvez ainda nesse século. O facto de a inscrição ter sido encontrada a alguma distância do centro de Olisipo , poderá estar relacionado com a possibilidade de neste local ter existido uma villa ou outro monumento romano, ou com a mudança e reutilização da pedra, que em muitos casos encontramos, o que parece ser corroborado pelo facto de se ter encontrado a epígrafe dedicada à imperatriz Sabina no Beco do Bugio, no centro da cidade, sendo de esperar que estivessem juntas (Mantas, 2005, p. 31). O prenome Marcus está bem representado em Olisipo (Silva, A.V., 1944, pp. 276-283); o que não sucede com o gentilício Gellius , pouco representado na Península Ibérica, onde apenas conta com 12 representações, mesmo quando incluída a variante Gelius . O mesmo sucede com o cognome, Rutilianus , raro na Península Ibérica. (Mantas, 2005, p. 32). A mulher deste duúnviro, [..] lia Vegeta , terá sido flamínica em Olisipo ( CIL II 197 e 5218; ILER 4453, EO 83); M. Gellius Rutilianus poderá ter sido igualmente flâmine mais tarde, ainda que não se possa falar de uma situação de causa-efeito 35 .

34 Sobre o tema, e nomeadamente sobre o problema colocado relativamente às datas das epígrafes, vide Guerra, 2006, p. 280. 35 González Herrero, 2005, p. 248. No mesmo sentido, Delgado Delgado (2000, pp. 126).

54 5. L. Iulius Avitus, IIvir Desempenhou funções de duúnviro em conjunto com M. Gellius Rutilianus (nº 4), pelo que a descrição sobre as epígrafes de que são dedicantes e cronologia se lhe aplica igualmente. No que respeita ao prenome, existem várias referências em Olisipo ; por seu turno, em relação ao seu gentilício, encontra-se largamente representado nesta cidade (Silva, A.V., 1944, pp. 276-283). Avitus é um cognome frequente na Península, tendo uma boa representação em Olisipo 36 . É referenciado em todos os estratos sociais, ainda que pouco frequente entre libertos, e poderá recobrir por vezes um nome indígena, podendo derivar de um substrato itálico pré-latino (Mantas, 2005, p. 45, Kajanto, 1982, p. 18, 80).

6. Q. Coelius Cassianus – IIvir Temos notícia deste duúnviro e do seu colega referido no nº 7, M. Fulvius Tuscus, através da homenagem que fazem ao imperador Cómodo, ainda em vida de Marco Aurélio. Atendendo a que esta epígrafe se perdeu, não é possível confirmar a versão correcta, encontrando-se no anexo 2 a sua leitura, considerada por Hübner a mais correcta. O seu gentilício, Coelius , tem alguma representação na Hispânia, menor na Lusitânia, tendo um cognome que o associa à gens Cassia , de provável origem itálica. Neste contexto, de acordo com Mantas, é possível que L. Cassius Reburrus (CIL XIV 413), duúnviro de Óstia, tenha aqui sido um representante do ramo lusitano (Mantas, 2002, pp.136-137). Do seu filho Q. Coelius Aquila temos registo em CIL II 284, inscrição achada em Dois Portos, Torres Vedras. A epígrafe reflecte a existência de uma villa nesta zona, ainda não localizada, e será um sinal representativo da presença de elementos itálicos no termo de Torres Vedras (Mantas, 2002, pp. 136-137). Para Guilherme Cardoso (Cardoso et alii, 2008, p. 5), Q. Coelius Cassianus seria certamente o proprietário da villa de Dois Portos, Torres Vedras.

36 Referências em EO 72, 91, 102, 106, 115, 121, 131; Untermann, 1965, mapa 14, pp. 65-66

55 Relacionado com esta questão está a epígrafe da ermida da Serra de S. Julião, perto de Dois Portos, onde se regista o nome Mascellius , também presente numa inscrição da Quinta da Portucheira. Para Vasco Mantas (2005, p. 35), a sua ocorrência na região de Torres Vedras pode indicar relações com os Coelii de Olisipo , tal como sugere uma inscrição de Roma mencionando uma Coelia Macellina, negoatatrix olearia ex Baetica . Antes de 1755, a epígrafe estava na de uma das casas da Rua da Madalena, próximo portanto do local onde se poderia situar o fórum da cidade, de onde poderia ter sido deslocada (Silva, A.V., 1944, p. 117). Emílio Hübner (Silva, A.V., 1944, p. 116), Julián de Francisco Martín (1978, p. 236), Curchin (1990b, p. 175) e Salinas de Frías e Rodríguez Cortés (2000, p. 29) colocam estes dois magistrados entre 178-180 d.C.. De acordo com a titulatura, Mantas (2005, p. 34) situa a homenagem em 176 d.C., dado que indica os títulos de germânico e Sarmático, recebidos em 172 d.C. e 175 d.C., não mencionando outros títulos assumidos em 177 d.C. ou ainda no final de 176 d.C., quando aos 15 anos de idade toma o título de Imperator , enquanto sucessor presuntivo de Marco Aurélio, com quem governa entre 176-180 d.C..

7. M. Fulvius Tuscus - IIvir Desempenhou funções de duúnviro em conjunto com Q. Coelius Cassianus (nº 6), pelo que as informações relativas à cronologia se lhe aplicam igualmente. O facto de a epígrafe se ter perdido permite várias leituras do nome deste duúnviro, sem possibilidade de confirmação. Assim, é apresentado por Vieira da Silva (1944, p. 116) como M. Fulvius Tuscus , encontrando-se em Curchin (1990b, p. 175) como M. Fabricius Tuscus . Julián de Francisco Martín (1977, p. 236) apresenta-o com M. Fabricius Turcus (?). De acordo com o levantamento efectuado por Vieira da Silva (1944, pp. 277- 283), trata-se da úníca referência, em indivíduo masculino, em Olisipo .

8. |Se|x(tus) Iulius Avitus e 9. [.]Cassius […] , duúnviros Os duúnviros surgem numa inscrição numa ara, em que em nome de Felicitas Iulia Olisipo consagram a uma entidade divinizada de natureza abstracta associada ao

56 imperador, Liberdade Augusta. Trata-se de dois elementos pertencentes a duas das mais conhecidas famílias de Olisipo , nomeadamente a gens Iulia e a gens Cassia .

Fotografia 2: |Se|x(tus) Iulius Avitus e [.]Cassius […], in Guerra, 2006, p. 281

Tal como avança Amílcar Guerra, existe desde logo uma associação de |Se|x(tus) Iulius Avitus a L(ucius) Iulius Avitus , que surge como duúnviro, com M. Gellius Rutilianus , em duas dedicatórias, nº 5 e 4, respectivamente. Apesar do cognomen ser igual, dado os cognomina serem repetidos com frequência nas grandes famílias, não será possível estabelecer maior relação entre estas duas personagens que não seja o facto de ambos pertencerem à gens Iulia (Guerra, 2006, p. 281). A inscrição insere-se no culto imperial provincial, introduzido por Tibério, possuindo um carácter religioso e sobretudo político, sendo proposta por Amílcar Guerra uma cronologia no âmbito do século II d. C. (Guerra, 2006, p. 282).

10. C. Caecilius Q. f. Gal. Gallus – aedilis O seu nome surge em homenagem que lhe faz sua mulher Peticia Tusca , a qual figura igualmente na inscrição EO 53, CIL II 292 e ILER 2195. A inscrição encontrava-se no muro da Porta do Ferro, sendo que após a demolição do muro, a pedra, visível em 1768, foi levada para a colecção de Cenáculo, onde há testemunhos de estar pelo menos em 1798 (Silva, A.V., 1944, p. 184). 57 Atendendo ao facto de a Porta do Ferro se encontrar no centro urbano de Olisipo , Mantas (2005, p. 36) julga poder atribuir-se esta pedra à necrópole que se situava na zona da antiga igreja de S. Nicolau. Julián de Francisco Martín relaciona-o com o edil Q. Caecilius Q. f. Gal. Caecilianus (nº 13), como familiar, sugerindo igualmente um inter-relacionamento entre os dois edis e L. Caecilius Celer Rectus , ainda que, dada a frequência do gentilício Caecilius , comporte alguma dúvida (De Francisco Martín, 1977, pp. 238-239). Mantas (2005, p. 36) propõe igualmente como hipótese a possibilidade de considerar outras relações prováveis, nomeadamente com um T. Caecilius Gallus , registado em S. Miguel de Odrinhas, , bem como com L. Caecilius Gallus, tio de M. Fulvius Caecilianus (CIL II 193; IRCP 446), registado em inscrição funerária encontrada no Redondo, próximo de Évora. O seu cognome encontra-se sobretudo em zonas mais romanizadas (Untermann 1965, mapa 41, pp. 111-112). Segundo Mantas (2005, p. 37), é quase certo tratar-se de mais um testemunho de emigração itálica para a Hispânia, propondo uma datação do século I d.C..

11. C. Iulius C. f. Gal. Rufinus – aedilis designatus Trata-se de um novo representante da gens Iulia , o qual morre antes de exercer as funções de edil para a qual havia sido designado como referido na sua inscrição fúnebre. A epígrafe foi descoberta no século XVII nos alicerces da muralha da Porta do Ferro, tendo sido extraviada e posteriormente redescoberta, em 1922, numa escavação de um armazém da Rua das Canastras. Actualmente, encontra-se no Museu da Associação dos Arqueólogos Portugueses, no convento do Carmo (Silva, A.V., 1944, p. 145). Os C. Iulii estão bem representados em Olisipo (Silva, A.V., 1944, p. 280) , contando tanto com ingénuos como com libertos, como são disso exemplo os augustais C. Iulius Euthicus e C. Iulius C [atulinus?], que apresentaremos adiante. A associação Caius e Julius , indica uma relação bastante provável com os estatutos adquiridos nos finais da República, início do Império. De acordo com Mantas, será talvez do século I (Mantas, 2005, p. 39).

12. L. Iulius L. f. Caler(ia) Iustus, aedilis - Bucelas, Loures

58 O nome e magistratura surgem numa epígrafe funerária datável de finais do séc. I d. C.-inícios do séc. II d. C, actualmente presente no adro da igreja paroquial de Bucelas, no concelho de Loures, no ager Olisiponensis .

Fotografia 3: L. Iulius Iustus , CIL II 313 (fotografia de J. Cardim Ribeiro, in Fernandes, Luís, 2003, p. 53)

Esta epígrafe transmite-nos a informação de que o edil morreu aos 28 anos de idade, dando-nos igualmente a conhecer o nome dos seus pais, dedicantes, Lucius Iulius Reburrus e Iulia Iusta 37 . O edil está identificado com os tria nomina , com a indicação da sua filiação e com a sua tribo, a Galéria, denotando a sua condição de cidadão romano, já os seus pais não indicam de forma clara o seu estatuto. Assim é que o seu pai indica os tria nomina mas não faz referência nem à filiação nem à tribo, podendo assim tratar-se de um liberto. Por seu turno, a sua mãe omite igualmente a filiação e tem o mesmo nomen que o marido, pelo que se poderá tratar de um casal de libertos (Fernandes, Luís, 2003, p. 31). O prenome Lucius está bem representado em Olisipo , sendo Iustus um cognomen latino associado a qualidades morais e sociais. Em Olisipo encontram-se

37 Para maior informação sobre a epígrafe, vide Fernandes, Luís, 2003, pp. 28-33 e Ribeiro, J, 1994c, p. 85

59 registos tanto em cidadãos romanos como em libertos (Silva, A.V., 1944, pp. 277-283). No que respeita ao cognomen do pai, Reburrus , trata-se de um antropónimo indígena, não estando atestado no meio servil. Salienta-se que a omissão da filiação e da tribo é comum nos dedicantes masculinos aparentados com cidadãos romanos, em Olisipo e seu ager , pelo que o pai poderá ter sido um cidadão romano de origem indígena (Fernandes, Luís, 2003, p. 32). Possuiria certamente propriedades agrícolas na zona de Bucelas, onde foram encontrados vestígios arqueológicos atribuíveis ao final do século I. d.C. e ao século II d.C.. Como sugerido por Luís da Silva Fernandes (2003, p. 47), o cultivo de cereais e eventualmente de vinho deveria constituir uma das suas fontes de rendimentos.

13. Q. Caecilius Q. f. Gal. Caecilianus, aedilis – Serra de São Julião

Fotografia 4: Q. Caecilius Caecilianus , CIL II 261 38

A inscrição CIL II 261 encontra-se no Museu Municipal de Torres Vedras, tendo sido objecto de estudo por parte de Vasco Mantas, que a data de meados do século II d.C. (Mantas, 1982, p. 78). Trata-se de uma tampa de arca cinerária proveniente de uma parede do pátio da Quinta da Rainha que para aqui havia sido levada, após 1633, estando anteriormente na ermida da Serra de São Julião, concelho de Torres Vedras, pertencente ao ager olisiponensis , onde servia como pedra de altar. A epígrafe pertenceria a um mausoléu, com qualidade e dimensões de acordo com uma família da

38 Agradecemos ao Dr. Carlos Anunciação, do Museu Municipal de Torres Vedras, o facto de nos ter permitido realizar esta fotografia.

60 ordo decurionum , constituindo um bom indício da riqueza e cultura desta família (Mantas, 1982, p. 71, e 2002, p. 136). Trata-se de uma dedicatória feita pela mulher, Iulia M. f. Marcella , ao edil e ao filho, M. Caecilius Avitus (CIL II 261; ILER 5550; Curchin 376). Julián de Francisco Martín apresenta este edil como provavelmente aparentado com o edil C. Caecilius Q. f. Gal. Gallus, relacionando-os com L. Caecilius Celer Rectus , ainda que a abundância do gentilício permita alguma margem de dúvida (De Francisco Martín, 1977, p. 239). Mantas relaciona ainda os dois edis, como provavelmente aparentados com L. Caecilius Gallus, tio de um M. Fulvius Caecilianus , que constam numa inscrição funerária recolhida no Redondo, próximo de Évora (CIL II 193). Q. Caecilius Caecilianus será possivelmente de origem itálica, apesar de o cognomen do filho, Avitus , poder reflectir parentesco com indígenas romanizados. Ainda que a epígrafe não explicite em que município o magistrado exerceu as suas funções de edil, atendendo à vocação olisiponense da região de Torres Vedras, bem como à referência à tribo Galeria, à distribuição do gentilício Caecilianus e do cognome Avitus , Vasco Mantas (1982, pp. 74-78) inclui-o nos magistrados de Olisipo, atribuindo- lhe uma datação de meados do século II.

14. C. Gavius C. f. Gal. Rectus – aedilis Pela inscrição que o dá a conhecer, ficamos a saber que morreu com a idade de vinte e nove anos, sendo que, como referido anteriormente, a idade mínima para ter um cargo municipal era a de 25 anos A inscrição foi encontrada num quintal junto ao mosteiro de Chelas nos inícios do século XVII (Silva, A.V., 1944, p. 199). Dado que Chelas se situava bastante afastada da área urbana de Olisipo , Mantas propõe que o monumento deveria estar numa necrópole à margem da via para Scallabis . A existência da necrópole é apoiada pelo facto de se terem encontrado duas outras inscrições funerárias nas paredes do mosteiro (CIL II 290 324), que indicará a existência de uma villa (Mantas, 2005, p. 38). Dada a escassez do nomen apresentado por este edil, Julián de Francisco Martín relaciona-o com os Gavius da Tarraconense, nomeadamente de Tarraco e de Barcino, onde todos os portadores deste nomen terão exercido cargos de relevo. Este autor crê que será deste núcleo que os Gavius terão saído para Olisipo onde teriam possivelmente propriedades (De Francisco Martín, 1977, p. 239). No que respeita ao cognome, Rectus , de eventual origem céltica, latinizado (Mantas, 2005, p. 38, Kajanto, pp. 16-17, 252),

61 encontra-se igualmente num dos importantes homenageados por Felicitas Iulia Olisipo, o já referenciado L. Caecilius Celer Rectus . Será de realçar o facto deste cognome não ter sido encontrado na Bética, permitindo assim formular a hipótese de que o questor pertencesse aos Caecilii de Olisipo (Mantas, 2005, p. 38). Mantas (2005, p. 39) situa este magistrado muito possivelmente no século II d.C., sendo provável que se trate de um representante de uma família resultante de elementos indígenas e itálicos.

15. L. Cantius L. f. Gal. Marinus – aedilis Através da inscrição conhece-se o nome de uma das suas avós, Vibia Maxima, e da sua mãe, Maria Procula, que assumem os custos desta homenagem póstuma. A epígrafe encontrava-se em meados do século XVII numa parede do palácio dos Castros, próximo da igreja de S. Tiago, onde se encontra actualmente o Largo do Contador-Mor (Silva, A.V., 1944, p. 185). Perto do local encontraram-se igualmente outras duas inscrições consagradas por augustais, uma a Divo Augusto (CIL II 182), e outra a Mercurio Augusto (CIL II 25), sugerindo a existência de um santuário do culto imperial nesta área (Mantas, 2005, p. 37). No que respeita a Cantius , trata-se de um gentilício pouco vulgar, de origem céltica (Lambrino, 1953, p. 39), que encontramos por exemplo também em C. Cantius Modestinus (CIL II 401 e 402), que pagou e dedicou dois templos em Bobadela-Midões, um ao génio do município e outro à deusa Vitória e que Francisco Martín (1977, p. 239) relaciona com o edil de Olisipo . O gentilício terá particular representação no Norte de Itália, onde no porto de Aquileia se reúne o maior número de representantes da gens Cantia (Mantas, 2005, p. 37). Mantas (2005, p. 38) propõe uma datação no século II d.C, relacionando este edil com o grupo de notáveis envolvido nas actividades económica da mineração e do comércio marítimo, neste caso com outras regiões da Península e com a Itália.

5.2.2 Flâmines Outros cargos de destaque nas elites locais seriam os sacerdócios, estando os sacerdotes encarregues dos cultos públicos e do culto imperial. Os municípios mais antigos da Hispânia seguiam a estrutura religiosa existente em Roma, onde se encontravam pontifices , oficiantes dos cultos públicos e supervisores de tudo o que

62 respeita à religião, augures e haruspices , que interpretavam a vontade dos deuses (Abascal e Espinosa, 1989, p. 148). No que respeita aos sacerdócios de âmbito local, os mesmos poderão enquadrar- se em quatro categorias fundamentais: os sacerdotes de tradição romana, em que os mais características são os pontífices e os augures ; os sacerdócios de tradição romana vinculados ao culto imperial, cujo título mais representativo é o de flamen e de flaminica, ainda que na Bética se encontrem também os títulos de pontifex e de sacerdos , exclusivamente aplicado a mulheres; os sacerdotes de tradição oriental, ligados ao culto de Cibele 39 , Ísis, ou Mitra, entre outros, organizados de forma distinta; e os sacerdotes de tradição indígena, associados aos cultos pré-romanos (Delgado Delgado, 2000b, pp. 50-54). Os sacerdócios eram igualmente desempenhados por elementos das gens mais notáveis do município, muitas das vezes tendo já desempenhado magistraturas municipais. Dedicavam parte do seu tempo ao desempenho destas funções que lhes davam prestígio e notoriedade. Desde logo há que distinguir estas práticas religiosas das que vamos encontrar no âmbito da prática de tradição cristã ocidental, onde por exemplo o sacerdote é encarado como um líder espiritual e moral. No caso que aqui nos traz, o âmbito de actuação dos sacerdotes era público, actuando, em nome da comunidade, em questões relativas ao culto público, consistindo a prática religiosa na pratica comunitária dos cultos de cada cidade, desenvolvidos de acordo com regras definidas (Delgado Delgado, 2000b, pp. 12-13). Eram eleitos por um ano, sendo o processo de eleição semelhante ao dos magistrados (Abascal e Espinosa, 1989, p. 148). No âmbito deste estudo, realçamos em Olisipo o registo de quatro flâmines e de duas flamínicas, uma municipal e uma provincial, pelo que, antes de passarmos à enumeração dos mesmos, abordaremos de forma resumida a implantação e evolução do culto imperial, ao qual estão associados.

39 Realçamos em Olisipo o registo de Flavia Tyche (CIL II 179, EO 25, ILER 376), apresentada com o título- dignidade de cernófora. As cernóforas eram sacerdotisas, ministras ou acólitas que transportavam nas procissões e actos de culto os vasos sagrados com os frutos a oferecer aos deuses. Flavia Tyche consagra à grande mãe dos deuses da Frígia, na qual menciona também possivelmente um sacerdote e uma sacerdotisa do culto à deusa, respectivamente Marco Júlio Cassiano ( ?) e Cássia Severa (?). A consagração é feita em 108 d. C., no consulado de Marco Atílio e Ânio Galo. Como refere Delgado Delgado, o título desta liberta de origem oriental será extremamente raro na epigrafia do culto da deusa, apenas se conhecendo uma outra mulher relacionada com o culto de Cíbele com este título em CIL X, 1803 (Delgado Delgado, 2000a, p. 128.).

63 A implantação do culto imperial na Península Ibérica terá acontecido em época de Tibério. González Herrero salienta que o início da construção de templos para o culto imperial antes da morte e divinização de Augusto leva a pensar que seriam já eleitos flâmines para supervisionar o seu culto, no entanto, até ao momento, pelos dados epigráficos existentes, não é conhecido nenhum antes de 14 d.C. (González Herrero, 2002, p. 50. No mesmo sentido, Étienne, 1958, p. 200 e 378). Vespasiano será o responsável por uma reorganização do culto, passando a haver, para além dos flâmines, encarregues de supervisionar o culto imperial, flamínicas para o culto das Divae e das Augustae. Robert Étienne divide a evolução do conteúdo do culto imperial em três etapas: de 15 a 42, quando se regista o culto apenas do divus , praticado desde a criação do culto provincial, denominando-se o sacerdote flamen Augustalis ; de 42 a 54, passando a existir o culto tanto do divus Augustus como da diva Augusta , quando Cláudio leva o Senado a declarar a defunta imperatriz Iulia Augusta , Lívia, esposa de Augusto, diva 40 ; e sob os Flávios, registando-se o culto do imperador vivo e um culto discreto de Roma. Étienne realça que esta terceira evolução se dá quando o concilium faz acto de devoção a Tito, filho de Vespasiano, possivelmente em Julho de 77, sendo que nas procissões do culto imperial, um busto de cada um deles seria oferecido à veneração das massas de acordo com uma das claúsulas da Lex Narbonensis . A mudança de dinastia terá eclipsado o culto do divus Augustus e da diva Augusta (Étienne, 2002, pp. 99-100). O cargo de flâmine era marcadamente urbano e atingia-se normalmente cerca dos 30 anos (Étienne, 1958, p. 217 e 238), tendo em conta que, como referimos, a idade mínima para alcançar a magistratura definida por Augusto era a de 25 anos. Os flâmines eram eleitos anualmente pelos decuriões, sendo que só os membros do ordo decurionum podiam ascender a este cargo (Mantas, 2005, p. 29), devendo ser cives romani , portanto. Existe contudo, até ao momento, um caso que foge a esta regra, nomeadamente Albinus, Albui f. , cuja onomástica sugere um estatuto peregrino e não cidadão. A justificação para tal poderá ser ou o facto de que no início da organização do culto imperial e em

40 Javier del Hoyo salienta que se aceitar que a inscrição de Tucci, dedicada por uma mulher de que apenas se conhece o seu cognome, Laeta , CIL II 1681, é a mesma Iulia. C. f. Laeta que está registada como flamínica em CIL II 1678, o inicio do sacerdócio feminino a nível local deverá entao ter começado ao mesmo tempo que o masculino, em época de Tibério Cf. Hoyo, 2003, p. 133

64 províncias com menor romanização, como é o caso da Lusitânia face à Bética, a necessidade de cidadania não fosse tão rigorosa, ou que apenas incluiu parte do seu nome na dedicatória (Delgado Delgado, 2000a, p. 116). Será igualmente de salientar a existência do título de flamen perpetuus . Neste caso, ainda que os dados existentes permitam considerar que se trata de um cargo de carácter anual, a atribuição do título de perpétuo consistiria numa honra dada a alguns flâmines no final do desempenho da sua função (Delgado Delgado, 2000a, p. 123). A obra de Robert Étienne de 1958, Le culte imperial dans la Péninsule Ibérique d’Auguste à Dioclétien, fundamental nesta temática, registava 12 testemunhos na Península, tendo José Delgado (2000a, pp. 113-114), mais recentemente, efectuado um estudo sobre os sacerdotes municipais na Lusitânia, registando 22 testemunhos. Dadas as evidências epigráficas, o flaminato cívico poderá ser alcançado tanto antes como depois do duunvirato, a mais alta magistratura civil, ainda que seja mais frequente o desempenho de funções no âmbito civil antes do desempenho no âmbito religioso 41 . O cargo de flâmine é apresentado por académicos como J. Delgado Delgado como uma posição importante relativamente aos outros cargos públicos para determinar o prestígio e importância do sacerdócio. Constituía o cume da hierarquia religiosa do município, facultando o acesso à carreira equestre. Em regra, o exercício do cargo de flamen a nível local era exercido antes do desempenho de cargos superiores ao da ordem local, nomeadamente no que respeita ao flaminato provincial, ao desempenho do cargo de praefectus fabrum e ao de tribuno militar, sendo que, face aos outros cargos locais, o flaminato terá sido para Delgado Delgado provavelmente mais prestigiante que os outros cargos locais, nomeadamente o de duúnviro (Delgado Delgado, 2000a, p. 120). González Herrero comenta sobre este tema que cada cursus honorum constitui uma

65 trajectória única, sem que exista uma sucessão hierárquica de cargos comparável, por exemplo, à rigidez do cursus senatorius ou das militiae equestris , nada permitindo supor que as honras obtidas no âmbito cívico num determinado momento tinham maior prestígio e importância do que em altura anterior. González Herrero realça que poder- se-á identificar os percursos mais frequentes na recepção das honras civis e religiosas, mas não se poderá estabelecer uma hierarquia de prestígio entre eles (González Herrero, 2002, p. 56). Não existem registos de flâmines provinciais de Olisipo 42 , havendo no entanto que salientar aqui o caso de L. Cornelius Bocchus , flamen provincial, que ainda que seja originário de Salacia , é homenageado por Olisipo . Em Olisipo , registamos quatro flâmines, aqui apresentados por ordem cronológica de desempenho do cargo:

1. Q. Iulius Plotus, aedilis, IIvir, flamen Germanici Caesaris, flamen Iuliae Augustae in perpetu (u)m - Olisipo Referimos aqui de novo Q. Iulius Plotus, que para além de edil e duúnviro foi também flamen Germanici Caesaris, flamen Iuliae Augustae, salientando-se aqui de novo o facto de, como a epígrafe o demonstra, nesta altura não haver ainda a separação de tarefas rituais entre flâmines e flamínicas. De acordo com José Delgado, terá exercido o cargo de flamen entre 14-19 d.C. (Delgado Delgado, 2000a, p. 113). R. Étienne (1958, p. 222) coloca-o igualmente entre 14-19.

41 González Herrero, 2002, p. 55. Cardim Ribeiro realça que os cargos geralmente anteriores ao flaminato cívico, nomeadamente os cargos de Aedilis e de Duumvir , são normalmente indicados nas epígrafes quando se trata de inscrições mais longas (Ribeiro, J, 1974-1977, p. 299). J. Delgado Delgado avança por seu turno que ainda que o cargo de flâmine se apresente bastante vinculado ao exercício de outros cargos públicos, tal não permite concluir que o exercício de magistraturas locais fosse um requisito imprescindivel para o acesso ao sacerdócio, como outros académicos o fizeram, como seja Étienne (1958, p. 236) e Curchin (1990b, p.43). Realça que se conhecem carreiras em que todos os cargos desempenhados foram exercidos após o de flamen bem como casos de individuos cujo cursus apenas integra o cargo de flâmine, como é o caso de P. Staius Exoratus , sobre o qual afirma haver alguma segurança de apenas ter desempenhado um único cargo público na sua vida, nomeadamente o de flamen Divi Vespasiani . Cf. Delgado Delgado, 2000a, pp. 117-118.

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2. L. Iulius Maelo Caudicus, flamen Divi Augusti - Armês

Figura 4: Fonte de Armês ( in Ribeiro, J, 1982-1983, p. 169)

L. Iulius Maelo Caudicus, flamen Divi Augusti foi responsável pelo pagamento de uma fonte em Armês, Sintra, no ager Olisiponensis , figura estudada em particular detalhe por Cardim Ribeiro (1982-1983, pp. 151-476). O exemplo de L. Iulius Maelo Caudicus constitui um bom exemplo da associação entre as elites urbanas e o ager Olisiponensis . O flâmine parece ter estabelecido uma villa própria próximo de Armês, provavelmente por volta de 15 a 25 d.C. periodo durante o qual terá erigido igualmente o fontanário (Ribeiro, J, 1982-1983, pp. 400). José Cardim Ribeiro sugere que o nome da actual povoação Godigana esteja ainda ao cognomen Caudicus (Ribeiro, J, 1982-1983, pp. 400-402). De acordo com Mantas (2005, p. 41), a gravação desta epígrafe será do principado de Tibério, nos primeiros tempos do culto imperial, situando-o na mesma época e ambiente social que Q. Iulius Plotus (CIL II 194). R. Étienne situa-o igualmente na época de Tibério, 14-37 (Étienne, 2002, p. 100), tal como Andreu Pintado (2004, p. 86). De acordo com José

42 No que respeita ao cargo de flamen provincial, os indivíduos atingiriam então este cargo a partir dos 30 anos, sendo eleitos possivelmente pela assembleia provincial, com sede em Emerita Augusta , formada pelos representantes das diversas cidades da província, por um período de um ano. Sobre os flâmines da Província da Lusitânia, vide Delgado Delgado, 1999, pp. 433-461.

67 Delgado, terá exercido o cargo de flamen em época de Tibério ou Cláudio (Delgado Delgado, 2000a, p. 113) . Encontramos aqui mais um indivíduo de uma família indígena romanizada, com o nome Iulius , e com origem indígena, como o denuncia o seu cognome Maelo (Ribeiro, J,1982-1983, p. pp. 218-226). No que respeita a Caudicus , seu segundo cognome, existem propostas de origem itálica e de uma origem céltica (Ribeiro, J,1982-1983, pp. 211-214). O seu nome consta igualmente de uma epígrafe achada na Granja dos Serrões (ILER 127), em que consagra a Júpiter. Esta epígrafe permitiu a leitura correcta da epígrafe, permitindo ler CAUDIC não como abreviatura de cauducarius , armador de embarcações fluviais, mas como Caudicus . Atendendo a ter desempenhado o cargo de flamen será muito provavelmente de nascimento livre, dado que se fosse liberto deveria estar entre os seviri augustales , ainda que existam excepções de seviri de nascimento livre e mesmo de um caso de possível admissão de um destes sacerdotes, [Iu]nius Cornelianus , no ordo decurionum de Carissa , na Bética (Curchin, 1990b, nº 39).

3. Flamen augustalis (não identificado) - Faião Realça-se igualmente a epígrafe de Faião, estudada por José Cardim Ribeiro, que menciona igualmente um flamen augustalis , não permitindo, no entanto, a sua identificação. É contudo avançado que a datação desta construção funerária do ager Olisiponensis será da primeira metade do terceiro quartel do séc. I d. C., tendo por isso exercido as suas funções sob o domínio de Nero (Ribeiro, J, 1974-1977, p. 302). José Delgado coloca igualmente a hipótese de ter exercido o cargo de flamen na segunda metade do século I (Delgado Delgado, 2000a, p. 114).

4. P. Staius Exoratus, flamen Divi Vespasiani - Lourel Encontramos igualmente como flamen P. Staius Exoratus , estudado por Cardim Ribeiro (1982-1983, pp. 226-234). A ara funerária onde se encontram registados o seu nome e cargos está no Museu de S. Miguel de Odrinhas, tendo sido utilizada por muito tempo como suporte da pedra de altar da capela de S. Romão, em Lourel. O seu praenomen não é frequente em Olisipo , sendo o seu gentilício, Staius , muito raro, o que leva José Cardim Ribeiro (1982-1983, p. 232) a relacionar este flâmen com o liberto P. Staius P. lib. Meridianus (CIL II 120; IRCP 406), sepultado em Évora .

68 Quanto ao cognome, Exoratus , é possível que denuncie alguma relação com África, como igualmente sucede com o cognome Meridianus do seu possível liberto (Ribeiro, J, 1982-1983, p. pp. 232-234, 295-297). José Cardim Ribeiro (1982-1983, p. 231) data a inscrição do período flaviano, provavelmente do imperialato de Domiciano. Étienne e Delgado delgado colocam igualmente o exercício do cargo de flamen em época de Tito ou Domiciano (Étienne, 2002, p. 101; Delgado Delgado, 2000a, p. 114) .

5.2.3 Flamínicas Se os cargos de magistraturas municipais estavam vedados às mulheres, tal não era o caso no que respeita aos cargos religiosos, nomeadamente no que ao cargo de flamínica dizia respeito, como já referido. Ainda que não existam muitos dados sobre a forma como eram eleitas, deveriam ser todas cidadãs romanas, não parecendo haver a necessidade de cumprir uma idade mínima de 25 anos, como para o acesso às magistraturas municipais locais pelos homens, para desempenhar este cargo dado que Postumia C.f. Aprulla, flaminica em Saetabis (CIL II 3272) morre aos 19 anos. Deveria, no entanto, ser condição para acederem ao cargo de flamínica a pertença a uma das principais gens do município e terem posses, dado que, à semelhança dos magistrados, era igualmente esperado que promovessem acções evergéticas43 (Hoyo, 2003, p. 135). Relativamente à sua eleição, tendo por base CIL II 5488, seria pelo senado local, onde se atesta que Valeria C.f. Situllina foi sacerdos perpetua d(ecreto) d(ecurionum) m(unicipii) C(artimitani) f(acta) 44 . Em Olisipo registam-se duas flamínicas, uma municipal e uma provincial. No que respeita à flamínica municipal, encarregue do culto às Divae e Augustae, trata-se de [...] lia Vegeta, já mencionada na inscrição que lhe é dedicada pelo marido, M. Gellius Rutilianus . Dada a sua designação, e ainda que nesta epígrafe não apresente qualquer cargo, será muito possivelmente o duúnviro nº 4, que desempenhou estas funções em

43 Sobre o evergetismo em Olisipo , vide o capítulo 6. 44 Javier del Hoyo salienta a diversidade de denominações dos sacerdócios femininos locais na Bética, onde tanto existe a variante flaminica como a variante sacerdos . Alguns autores identificam estes dois cargos sacerdotais, opinião que não é contudo partilhada por este autor. Sobre o tema vide Hoyo, 2003, p. 134.

69 Olisipo em conjunto com L. Iulius Avitus . (CIL II 197 ou CIL II S 5.128; EO 83, ILER 4453). A inscrição, monumento funerário, esteve no Arco por cima da Porta ou Postigo do Arcebispo, que fazia parte da muralha fernandina, localizado não muito longe do Campo de Santa Clara, o qual foi demolido no século XIX. Após a demolição, foi encravada num muro da cerca do mosteiro de São Vicente de Fora, tendo sido levada em 1922 para o Museu Nacional de Arqueologia (Silva, A.V., 1944, p. 195). A epígrafe não está completa, o que tem permitido várias leituras do antropónimo patente na linha 1: Mantas (2005, p. 33) considera que se deverá ler Iulia ; Vieira da Silva (1944, p. 195) coloca a hipótese de [Cae?] lia, onde avança as hipóteses de Hübner, Gelliae , e de Leite de Vasconcelos, Aeliae. José Delgado Delgado data o desempenho do cargo da época de Adriano (Delgado Delgado, 2000a, p. 123), correspondendo de resto à época em que M. Gellius Rutilianus desempenhou funções de duúnviro neste município . O número de flamínicas conhecidas na Lusitânia é bastante reduzido, conhecendo-se, para além da flamínica identificada em Olisipo agora analisada, Iulia Modesta , em Bobadela, Laberia Galla , em Évora, e Flavia Rufina , em Alcácer do Sal (Mantas, 2005, p. 33). Encontramos igualmente referência a uma flamínica da província da Lusitânia: Servilia , filha de Lúcio. A inscrição foi encontrada na antiga Porta do Ferro, ou Arco de Nossa Senhora da Consolação, já demolida em 1763, estando em 1977 integrada na colecção Cenáculo, no claustro do convento de Nossa Senhora de Jesus, onde ainda se encontrava em 1798 (Silva, A.V., 1944, p. 137). Atendendo aos problemas de interpretação das fórmulas onomásticas das inscrições que lhe dizem respeito, Servilia foi apresentada como mulher de Albinus Albui filius , flâmine provincial no período de Cláudio, após 42 d. C. 45 Robert Étienne (2002, p. 100) não considera Servilia como a filha do sacerdote provincial Albinus , aceitando, no entanto, que se trate da esposa de um Albinus. Por seu turno, González Herrero apresenta-a como mulher de Lucceius Albinus , advogado colega de Plínio,

45 Delgado Delgado, 1999, p. 446. Proposta igualmente partilhada por Hoyo Calleja (1987, pp. 120-123).

70 considerando que Lucceia Quinti filia Albina , igualmente homenageada em CIL II 195, seria filha de ambos ou irmã de Lucceius Albinus 46 . De acordo com José Delgado Delgado (1999, p. 457), não será anterior a Vespasiano . No que respeita ao relacionamento entre os cargos de flâmine e de flamínica e a possível relação marital entre estas duas figuras, é de realçar que se tratariam de cargos independentes, sendo que o próprio facto de existirem tarefas rituais diferentes entre flâmines e flamínicas poderá apoiar esse facto (González Herrero, 2005, p. 248 e Delgado Delgado, 1999, p. 437).

5.2.4 Augustais No âmbito religioso, salientamos ainda os augustales . São provenientes de um meio social diverso dos flâmines e das flamínicas, tratando-se de um colégio constituído normalmente por libertos 47 , geralmente comerciantes ricos ligados ao serviço ao imperador por uma espécie de juramento e cujo colégio intervém na organização de jogos e sacrifícios, apoiando o culto imperial. Em finais do século I d. C. passa a contar com seis membros ( VI viri Augustales ) (Mangas, 2001, p. 39). Atendendo a que em princípio não poderiam aceder às magistraturas municipais 48 nem aos sacerdócios oficiais, dada a sua origem normalmente servil, encontram aqui o meio de se distinguirem socialmente, contribuindo para a vida da comunidade onde se inserem, tendo inclusivamente um certo papel político.

46 Sobre o tema vide González Herrero, 2005, pp. 243-255. Cf. Étienne, 1958, p. 166. 47 Sobre a origem dos libertos vide Serrano Delgado (1988, pp. 98-99). Aqui, o autor aponta as opiniões divergentes em certos autores sobre a origem social dos augustais, se seriam apenas libertos, ou também ingenui. Estas diferenças derivam da existência de algumas inscrições, maioritariamente provenientes de municípios do centro e norte da Itália, onde existe uma situação complexa pela juxtaposição de instituições como os Augustales, seuiri Augustales, magistri Augustales , entre outras, com outras instituições de fundo sociológico diferente como os seuiri municipais. O autor julga, de todo o modo, que os ingenui com aspirações, contactos sociais e riqueza, tenderiam a enquadrar-se no sistema municipal aristocrático, integrando os cargos que aos libertos estariam vedados, como seja o senado municipal e o desempenho de magistraturas e sacerdócios. 48 Tal como já referido anteriormente, em meados do século I a.C., na Lex Coloniae Genetivae Iuliae (Ursonensis) , 105, é previsto que o facto de ser liberto não constitui um caso de indignidade susceptível de impedir o acesso à condição de decurião. Deverá ser com Tibério que os libertos são afastados dos senados locais, através da Lex Visellia de 24 d.C. Cf. Fabre, 1976, pp. 421-422.

71 Relativamente à sua função cultual, estariam associados ao Genius e Numen Augusti e aos lares Augustorum , sendo variadas as divindades objecto das dedicatórias dos Augustales da Hispania : ao imperador, às virtudes imperiais divinizadas, às divindades do panteão romano, entre outras divindades preferencialmente cultuadas em cada cidade. Em Olisipo , por exemplo, para além das dedicatórias ao Divino Augusto, observamos as dedicatórias efectuadas a Apolo, por M. Iulius Tyrannus (EO 101), a Esculápio, por M. Afranius Euporio e L. Fabius Daphnus (CIL II 175 e EO 103) e a Mercúrio, divindade associada ao comércio, actividade que possivelmente teria permitido o enriquecimento dos libertos, por C. Iulius C [atulinus?] (CIL II 181, EO 78) . No estudo de Serrano Delgado de 1988, Status y promoción social de los libertos en Hispania Romana , este autor considera surpreendente a escassez de dedicatórias ao imperador, que seria o âmago do culto imperial, sendo de compreender que o culto que os augustais lhes prestam o é de forma indirecta, através do culto dos lares Augustorum , do Genius , das virtudes imperiais, etc. (Serrano Delgado, 1988, pp. 106-107). Os augustais eram nomeados pelo ordo decurionum , sendo o seu cargo igualmente anual. Relativamente à existência de uma idade mínima, alguns autores falam de um mínimo de 25 anos para aceder a este cargo, ainda que tenha sido encontrado registo de um seuir que morre com 23 anos, pelo que pode haver variantes locais. Para além disso, existem igualmente registos de augustais que desempenharam o cargo em várias cidades (Serrano Delgado, 1988, p. 109). Tal como sucedia na ordo decurionum , haveria igualmente hierarquias entre os augustais. Os libertos com maior poder económico e social e com vontade de se destacarem na vida política do município, procurariam distinguir-se na sociedade em que se inseriam. Tal poderia ser levado a cabo, por exemplo, através da promoção de actos evergéticos de relevo, que adiante veremos em pormenor no capítulo dedicado ao evergetismo, ou da obtenção dos ornamenta decurionalia , atribuídos pelo ordo decurionum, que lhes permitia uma certa equiparação, em termos de dignidade, com este ordo (Melchior, 1999, p. 225). Ainda que apenas uma minoria dos libertos da Hispania os tenham alcançado, sobretudo os Augustais, mais bem posicionados pela sua notoriedade para tal , a sua obtenção permitir-lhes-ia ter os mesmos benefícios dos decuriões, sem pertencer efectivamente ao ordo . Assim, tinham, por exemplo, lugar

72 entre os decuriões nos espectáculos e banquetes, bem como direito a receber o mesmo que os decuriões nos sportulae (Serrano Delgado, 1988, pp. 207-212). Tal como para aceder a uma magistratura, haveria lugar ao pagamento de uma summa honoraria , realçando-se aqui uma certa semelhança com as magistraturas e instituições do governo municipal, pois não o sendo, inspiram-se na ordo decurionum . São inclusivamente frequentes as inscrições em que é utilizado o termo ordo (de ordo Augustalium ), encontrando-se no entanto entre o povo e o ordo decurionum (Serrano Delgado, 1988, p. 110). Contudo, existem igualmente notícias de que pudessem ser isentados da entrega de uma quantia para entrada no colégio, dado que por exemplo em Lacippo (CIL II 1934), C. Marcius December, sevir 49 , foi isentado da entrega de quinhentos denários, tendo-se encarregado da erecção de uma estátua a Fortuna Augusta , que por seu turno teria um valor de cerca de setecentos denários (Andreu Pintado, 2004, p. 45). Para além da summa honoraria, e à semelhança do que sucedia no acesso às magistraturas, promoveriam os já referidos actos evergéticos, muitas vezes prometidos para acesso ao cargo ou realizados por ocasião de início de funções (Taylor, 1914, p. 232). Apresentamos então de seguida os augustais conhecidos em Olisipo até ao momento 50 , seguindo na medida do possível uma evolução cronológica, seguida das epígrafes sem datação. Os augustais estão igualmente enumerados no anexo 1, constando as epígrafes do anexo 2.

1. C. Arrius Optatus Deste augustal temos notícia devido à dedicatória que faz, em conjunto com o augustal C. Iulius Eutichus, nº 2, ao Divino Augusto.

49 Sobre a distinção entre sevir Augustalis, Augustalis e sevir vide Lily Ross Taylor (1914, pp. 231-253), Carmen Castillo García (2003, pp. 73-89) e Serrano Delgado (1988, pp. 105-106). Aqui é apontada como a tese mais sólida a tese de Von Premerstein, que parte do principio que inicialmente existiria variedade nesta instituição, sendo Augustales e seuiri Augustales organizações distintas, os augustais mais próximos de um colégio sacro e a segunda com uma grande semelhança com as magistraturas municipais. Na primeira metade do século II, produz-se uma reforma que regula a situação e estabelece praticamente uma única instituição de carácter colegial, ainda que se conserve a diversidade na titulatura. 50 José Cardim Ribeiro (1974-1977, p. 328, nota 196) menciona outro possível augustal no ager Olisiponensis (CIL 265), patente numa inscrição actualmente perdida proveniente da Zona W do município, da qual apenas resta um cópia bastante má. Apesar de Emílio Hübner a ter reconstituído em CIL II 265, Robert Étienne não a incluiu na sua obra, possivelmente pela razão supracitada. Optamos igualmente por não a elencar neste trabalho.

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Fotografia 5: CIL II 182 – (in Quinteira e Encarnação, 2009b, p. 145

A inscrição, pedestal de mármore, foi reencontrada em Outubro de 2009 nas obras de requalificação do edifício situado no Largo do Contador-Mor, nº 3 e 4, na freguesia de Santiago, Lisboa (Quinteira e Encarnação, 2009 b, p. 143). A inscrição é datável de pouco depois da divinização de Augusto, que morreu em 14 d.C., devendo estar colocada em local de destaque, muito possivelmente no templo do forum municipal (Quinteira e Encarnação, 2009b, p. 143). Vieira da Silva (1944, p. 188) coloca igualmente no primeiro quartel do séc. I d. C., Andreu Pintado (2004, p. 136) coloca sob Tibério. O cognome Optatus é, segundo Mantas (1982, pp. 24-25), romano e frequente na Hispânia não indo-europeia, sobretudo na Bética, sendo que na Lusitânia uma boa parte dos testemunhos epigráficos pertence às elites locais, como é o caso ora em apreço. Kajanto inclui este cognome no grupo associado às circunstâncias de nascimento, com um significado aproximado de agradável, com concentração, na Península Ibérica, na bacia do Guadalquivir e em alguns grandes portos hispânicos, o

74 que faz realçar uma intervenção em actividades marítimas e comerciais, tradicionalmente apontadas como estando nas mãos de libertos (Mantas, 1982, pp. 24- 25, Kajanto, 1982, p. 73-75).

2. C. Iulius Eutichus Em conjunto com C. Arrius Optatus, nº 1, C. Iulius Eutichus , é autor de dedicatória ao Divino Augusto abordada supra. Este augustal apresenta o nomen mais frequente em Olisipo, Iulius , denotando o facto de não só a gens Iulia estar bem representada a nível das magistraturas, mas também a nível da augustalidade.

3. M. Afranius Euporio Temos igualmente notícia dos augustais M. Afranius Euporio e L. Fabius Daphnus, nº 4, pelo monumento que consagram a Esculápio, possivelmente do tempo de Tibério, 14 a 37 d. C.(Silva, A.V., 1944, p. 217). O augustal apresenta um cognome de origem grega (Martineau, 2003, p. 197) e alguns autores identificam-no, tal como a C. Iulius Firmus, em marcas anfóricas do Testaccio (CIL, XV, 5696, 3894). Cardim Ribeiro contesta, contudo, a identificação de M. Afranius Euporio com o nome patente em ânforas do Testaccio dado que a epígrafe CIL XV 3696 permite outra reconstituição do nomen , nomeadamente como Aemilius . Considera igualmente que a identificação de C. Iulius Firmus com o navicularius patente em CIL XV 3894-3896 assenta de novo apenas em confrontos onomásticos discutíveis (Ribeiro, J, 1994, p. 88). A epígrafe foi encontrada em 1770 quando se faziam escavações para a construção dos prédios n. 63 a 77 e 79 a 91 da Rua dos Retrozeiros e n. 53 a 65 da Rua da Prata, os quais assentam sobre o criptopórtico, tendo permanecido na parede da loja nº 83 da Rua dos Retrozeiros até 1915, altura em que é levada para o anterior Museu Etnológico (Silva, A.V.,1944, p. 218).

4. L. Fabius Daphnus No que respeita a L. Fabius Daphnus, que em conjunto com o augustal referido supra consagra a Esculápio, ostenta um cognome que sugere uma relação com Daphne , relevante subúrbio marítimo de Antioquia (Mantas, 1998, p. 214 e 2005, p. 33) .

75 5. C. Heius Primus Este augustal perpétuo do tempo de Nero sobressai em Olisipo pela sua importante acção evergética. Liberto endinheirado, possivelmente devido às actividades comerciais e marítimas que a importância de Olisipo como centro portuário proporciona, C. Heius Primus é o mecenas da renovação do teatro de Olisipo , oferecendo a renovação do proscenium e da orchestra , e respectiva decoração. Esta oferta, constatada em inscrição dedicada a Nero 51 , em muito teria contribuído para a notoriedade e destaque do augustal na sociedade olisiponense, lembrando-nos um pouco aqui do liberto Trimalquião, uma das principais figuras do Satyricon de Petrónio. Esta inscrição foi encontrada no teatro romano de Olisipo 52 , descoberto em finais de 1798, por ocasião de escavações para a construção de um prédio no local, com porta para o nº 13 da rua da Saudade e os números 2 a 8 da Rua de S. Mamede (Silva, A.V., 1944, p. 175), como referido anteriormente. Atendendo ao gosto que Nero tinha pelo teatro, tratar-se-á de um gesto de claro significado político, como refere José d’Encarnação (1995, p. 258). Dado o facto de nesse mesmo ano ser inaugurado na capital do Império o anfiteatro de Nero, esta remodelação reveste-se, como realça Lídia Fernandes (2007, p. 25), de uma dupla intencionalidade: por um lado, enaltecer o Imperador e, por outro lado, inserir Olisipo nos ludi romani que decorriam em Roma. No que respeita ao nomen do augustal, Heius , trata-se de um gentilício itálico pouco presente no mundo romano, encontrando-se em importantes centros portuários. Na Hispânia, onde é igualmente raro, há registo do duúnviro L. Heius Labeo (CIL II 3541, Múrcia) (Fernandes, Luís, 2005, p. 33). Os Heii eram uma poderosa família em Cumae , cerca de 200 a.C., cuja riqueza se deveria muito possivelmente ao comércio marítimo, bem como à produção de cerâmica de construção. É possível que os Heii sicilianos, presentes em Messina e posteriormente em Lylybaeum, cuja riqueza advirá igualmente muito provavelmente do comércio marítimo, derivem desta gens de Cumae (Fernandes, Luís, 2005, p. 33). Para além dos Heii de Cumae , onde se regista o maior

51 Andreu Pintado (2004, p. 165) data a epígrafe de 37 d.C.. Por seu turno, Stylow contesta que a inscrição seja dedicada a Nero, parecendo-lhe mais lógico que a titulatura imperial sirva como datação, propondo assim a correcção da leitura de NERONI para um ablativo de datação – NERONE. Cf. Fernandes, Luís, 2005, p. 31.

76 número de testemunhos, existem poucos testemunhos dos Heii em solo itálico, predominando os Caii Heii fora da Itália. Existem assim registos sobretudo na Sicília e no Mediterrâneo Oriental, onde actuariam como negotiatores e magistrados locais em relevantes portos do Mediterrâneo, sobretudo em época de Augusto. Atendendo à relevância de Olisipo no quadro do comércio marítimo, Luís da Silva Fernandes coloca a possibilidade de ser este augustal agente de um desses negotiatores ou de um dos seus libertos (Fernandes, Luís, 2005, pp. 34-35).

6. M. Iulius Tyrannus Do augustal M. Iulius Tyrannus temos notícia pela homenagem que faz a Apolo, possivelmente no séc. I (Silva, A.V., 1944, p. 214), dando-nos a conhecer ser liberto de Marco. Trata-se de outro augustal com o nomen Iulius e de cognomen de origem grega (Martineau, 2003, p. 198). A inscrição foi encontrada em 1935 em escavação para construção de um armazém subterrâneo efectuada na Rua das Canastras, nº 3, tendo sido levada para o anterior Museu Etnológico (Silva, A.V., 1944, p. 215).

7. Iulius Italicus No ager Olisiponensis , em Loures, registo para monumento funerário que dá conta de outro augustal, Iulius Italicus , liberto de Mún(… ?). Quanto ao nomen , de novo encontramos a relação dos Iulii ao culto imperial. No que respeita ao patrono, poderá ter origem indígena, havendo várias proposta de reconstituição do seu nome, como seja de Munnius , por Cardim Ribeiro (1974-1977, p. 310) e como Munnus , por Luis Fernandes da Silva (2003, p. 43). De acordo com este autor, atendendo à ausência da consagração aos deuses Manes e ao registo do nome do defunto em nominativo será datável do século I d.C. Avança ainda que este augustal poderá ter estado ligado ao comércio fluvial, dada a existência do seu epitáfio em Unhós, onde existiram instalações portuárias antes do assoreamento da área 53 . A epígrafe encontra-se actualmente perdida.

52 O augustal surge ainda numa outra inscrição, CIL II 196, EO 71,e recentemente terá sido detectada uma inscrição incompleta que documenta uma outra doação de C.Heius Primus , inscrição reutilizada num edifício moderno próximo do teatro. Cf. Fernandes, Luís, 2005, p. 32. 53 Fernandes, Luís, 2003, p. 43 e 47-48, apud Carvalho e Almeida, 1996, p. 140.

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8. C. Iulius C [atulinus?] C. Iulius C. [atulinus?] , dedica um monumento sacro a Mercúrio, tratando-se de novo elemento apresentando o nome Iulius. A inscrição encontrava-se em meados do século XVII no muro da cerca moura, fora da Porta do Sol, junto de uma janela das casas do Prior de Santiago (Silva, A.V., 1944, p. 188).

9. Nemetius Firmus De Nemetius Firmus temos notícia através da dedicatória que lhe é feita pelos filhos, mencionando ter vivido 70 anos. A epígrafe foi encontrada no Castelo de São Jorge em 1940, por ocasião de obras de restauro, tendo sido depositada na ocasião no museu organizado numa sala do Castelo (Silva, A.V., 1944, p. 104).

10 - EO 8, que menciona um augustal na dedicatória de um monumento a Matulla . A epígrafe foi encontrada no Castelo de São Jorge por ocasião de obras de restauro, em 1940, tendo sido depositada na ocasião no museu organizado numa sala do Castelo (Silva, A.V., 1944, p. 101).

Após a apresentação dos magistrados municipais, sacerdotes e augustais registados em Olisipo , verificamos que os testemunhos epigráficos se concentram no período do Alto Império. No que respeita aos magistrados municipais, as inscrições são honoríficas e funerárias, pertencentes aparentemente em maioria ao século II. Os magistrados, nove duúnviros e seis edis, apresentam nomes latinos, estando a família Iulia em preponderância, em consonância com o que se passa no município, contando com cinco representantes, seguida da Caecilia , com dois representantes. Realça-se o facto de não estar atestado nenhum magistrado da gens Cornelia , e escassos a nível da Lusitânia, estando esta bastante presente na Tarraconense e na Bética a nível de magistrados locais (Salinas de Frias e Rodríguez Cortés, 2000, p. 21). Poderá avançar-se uma possibilidade de relação entre alguns destes magistrados, que desempenhavam as suas funções na cidade, e a sua presença no ager do município.

78 Essa possibilidade poderá ser colocada relativamente aos Coelii de Dois Portos (CIL II 284), possivelmente proprietário da villa de Dois Portos (Cardoso et alii, 2008, p. 5), a Q. Caecilius Caecilianus , da Serra de São Julião (CIL II 261), bem como ao edil L, Iulius Iustus , cuja inscrição foi encontrada em Bucelas. Relativamente aos quatro flâmines registados em Olisipo até ao momento, concentram-se aparentemente no século I d.C.. Dos quatro flâmines, dois pertencem à gens Iulia , ainda que um deles, Q. Iulius Plotus , esteja igualmente contabilizado enquanto magistrado municipal. Trata-se de uma situação particularmente interessante, na medida em que nos permite vislumbrar que magistrados municipais e flâmines seriam muito possivelmente da mesma extracção social. Tal como para os magistrados municipais, poder-se-á igualmente supor o relacionamento dos indivíduos que desempenhavam o flaminato com o ager , relacionando a riqueza das elites com a exploração agrária.Este relacionamento é apresentado, por exemplo, por Cardim Ribeiro para o flamen L. Iulius Maelo Caudicus , responsável pela doação de uma fonte em Armês e possivelmente proprietário de uma villa próxima da actual Godigana (Ribeiro, J, 1982-1983, pp. 396-398). O número de registos epigráficos de mulheres em tarefas rituais é bastante baixo, como observámos, ainda que nos pareça significativo a existência de uma flamínica da província da Lusitânia registada em Olisipo . Como pudemos observar, alguns dos augustais ostentam cognomes de influência grega, o que poderá denotar uma origem oriental, ainda que o facto de escravos e libertos apresentarem cognomes de influência greco-oriental possa igualmente representar uma devoção religiosa ou uma questão de «moda» (Martineau, 2003, p. 195). Os augustais deveriam assumir uma relevância económica e social importante, não sendo demais relembrar o impacto que o acto evergético de C. Heius Primus deveria ter tido na sociedade olisiponense. Considerando que o desempenho dos cargos era anual e que no período em que se concentram as epígrafes, nos séculos I e II d.C., em cada ano desempenhando as suas funções duúnviros, edis, flâmines, ainda que possivelmente o mesmo indivíduo pudesse desempenhar vários cargos ao longo do seu cursus honorum , e augustais, o número de registos que conhecemos é ainda reduzido, esperando-se que novas descobertas arqueológicas possam trazer nova luz aos conhecimentos actuais. Numa análise da vida pública da cidade de Olisipo , denota-se de todo o modo uma plena romanização administrativa, sendo as magistraturas municipais

79 desempenhadas por membros de famílias indígenas romanizadas, o que se denota pela sua designação para a qual será relevante a boa presença de indivíduos da gens Iulia , bem como indivíduos de origem itálica. Os libertos, augustais, assumem igualmente um papel relevante em termos económico e sociais, em muito beneficiando da posição estratégica de Olisipo .

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6 Evergetismo em Felicitas Iulia Olisipo

O evergetismo foi uma prática comum por todo o Império Romano, nele se integrando naturalmente Olisipo . Ao longo deste trabalho utilizaremos sobretudo a palavra evergetismo, devida a André Boulanger e Henri Marrou e forjada a partir dos decretos honoríficos pelos quais as cidades honravam os que beneficiavam a cidade através do seu dinheiro ou da sua acção (Veyne, 1976, p. 20) mas também os termos benemerência e munificência. Paul Veyne, na sua obra Pão e Circo , faz a distinção entre dois tipos de evergetismo, ainda que indique desde logo, que se trata de uma distinção superficial 54 , nomeadamente evergesias praticadas fora de qualquer obrigação definida, i.e. o evergetismo livre, e evergesias praticadas por ocasião da sua eleição para um cargo público, magistratura ou função municipal i.e, ob honorem , moralmente ou mesmo legalmente obrigatórias (Veyne, 1976, pp. 20-21; 281-283) 55 . O evergetismo consiste no acto pelo qual os membros das elites, fundamentalmente urbanas e possuidoras de grandes fortunas, entregavam parte delas em benefício da comunidade. Os actos eram promovidos sobretudo de forma individual, havendo no entanto também casos de evergetismo de forma colegial. Os actos podiam ser praticados sob diversas formas, como seja através da organização de festas públicas e de jogos ( ludi), de construções públicas (opera

54 Cf. Paul Veyne, 1976, p. 21, onde avança que o evergetismo livre pode ser por vezes o resultado de uma luta de classes latente; o evergetismo obrigatório será por seu turno o seguimento e codificação, na época romana, do evergetismo livre que surge no mundo grego no início da época helenística, replicado pela elite no mundo romano. 55 Enrique Melchior (1999, p. 224), autor que se debruçou largamente sobre o tema, segue esta distinção de Paul Veyne, distinguindo, no que respeita ao evergetismo associado ao desempenho de cargos políticos, entre as doações ob honorem , decorrentes de promessas eleitorais ou realizadas na altura de tomada de posse dos cargos públicos de magistrados e sacerdotes, (distintas assim da summa honoraria ), e os actos de evergetismo político que os magistrados e sacerdotes levavam a cabo no desempenho dos seus cargos para corresponder a uma necessidade da comunidade ou como forma de agradecimento de quaisquer honras, distinção que se baseia na existência ou não de um compromisso legal no cumprimento do acto benemérito, como seria o caso decorrente de uma promessa eleitoral (Rodríguez Neila e Melchior, 2003, pp. 211) Andreu Pintado (2004, pp. 40-41) não partilha totalmente, no entanto, desta classificação/distinção entre ob honorem e ob liberalitatem , sobretudo por falta de apoio epigráfico das doações ob liberalitatem em comparação com as ob honorem e porque muitas das doações ob liberalitatem poderiam estar relacionadas com o interesse em desempenhar uma magistratura ou com uma promessa eleitoral e não apresentem a fórmula ob honorem .

81 publica), da distribuição de alimentos e de dinheiro (epula e sportulae), do apoio à distribuição gratuita de trigo ( annona) , e visavam a obtenção de prestígio e de honras, contribuindo para a promoção social e política de quem os praticava ou da sua família. Através dos seus actos em prol da cidade, granjeavam poder e reconhecimento por parte dos seus concidadãos e o controlo da vida política, distanciando-se dos grupos sociais de menor capacidade económica. Vários terão sido os motivos que levaram a estes actos. Poderemos assim apontar o orgulho cívico, onde se poderá incluir, por exemplo, o contributo dado a nível de construções públicas. Tal terá sido o caso da doação de uma fonte no ager Olisiponensis pelo já referenciado flamen Lucius Iulius Maelo Caudicus, doação que será abordada adiante . Motivo para a benemerência terá sido igualmente o desejo de glória, de honras e de reconhecimento, muitas vezes com fins eleitorais, perpetuando a memória do benemerente na vida da cidade; o desejo de promoção política ou social; o desejo de ostentação da sua riqueza e a da sua família, como vemos por exemplo em actos evergéticos por parte de mulheres; o agradecimento de favores políticos ou o reconhecimento para com a comunidade de origem. Dado que se trata de uma prática associada ao modo de vida romano, subentendendo uma implantação da estrutura social e do sistema económico e político romano, a mesma não existiria portanto no Ocidente antes de ser conquistado por Roma. Para o desenvolvimento do evergetismo seria assim necessário, por um lado, que as elites locais tivessem assumido as condutas sociais do modelo romano que promoviam esta prática, nomeadamente a filotimia (i.e. , o desejo de glórias e honras), o desejo de perpetuar a sua memória, a existimatio (i.e. . estima, reputação), a aemulatio (i.e. , a ambição, competição ), o orgulho cívico e o desejo de promoção social e política; e por outro, que o processo de municipalização se tivesse desenvolvido, permitindo que um cidadão pudesse aspirar a uma promoção social através do desempenho de cargos políticos ou religiosos (Melchior, 1994b, pp. 33-39 e 1999, p. 220). Daqui se pode verificar que o grau de romanização, de municipalização e de integração das elites locais no modelo social romano teria influência no desenvolvimento desta prática. Numa primeira fase, os actos de evergetismo terão sido promovidos pelo próprio imperador para que as cidades, em especial as colónias, tivessem o equipamento urbano necessário, nomeadamente em termos de grandes construções, obras de engenharia, que exigiam sempre montantes avultados, e que constituiriam uma das importantes despesas da administração central nas províncias romanas na Hispânia (Balil, 1975, p. 49).

82 Ainda que em Olisipo não tenhamos registo epigráfico desta situação existem registos noutros locais, como por exemplo, na capital provincial lusitana, Emerita Augusta , com a construção do anfiteatro por Augusto. Na Lusitânia, os comportamentos de benemerência por parte da elite começam a desenvolver-se em época júlio-cláudia, e atingem, à semelhança do que se passa em toda a Hispania , o seu maior desenvolvimento nos séculos I e II d.C., quando a extensão do ius Latii e o processo de municipalização melhora o estatuto de muitas cidades (Andreu Pintado, 1999, p. 57). Aliado a este processo, surgirá toda uma elite que pretende mover-se ao gosto romano, envolvendo-se em actos de evergetismo procurando a promoção sócio-política. Para a Lusitânia, por exemplo, o caso mais antigo de que existe registo reporta-se à oferta de um orarium por Q. Tallius aos Igaeditani , em 16 a. C., sendo que em Olisipo, no entanto , só temos registo, até ao momento, de datações já do século I d. C. Deveremos, no entanto, realçar que os testemunhos de actos benemerentes, no que à Lusitânia enquanto província respeita, são bastante menores quando comparados, por exemplo, com a Bética, seja pela descoberta aleatória de vestígios arqueológicos ou pelo grau de envolvimento das elites na vida pública, seja pelo número e grau de desenvolvimento das estruturas urbanas ou por uma mais lenta romanização. De todo o modo, é possível encontrar na Lusitânia todos os tipos de doações, como nas restantes províncias hispanas 56 . O reconhecimento público dos actos dos benemerentes era geralmente patenteado em espaços públicos da cidade, com especial destaque para o forum , através de monumentos honoríficos, como estátuas, e de inscrições, ou, por exemplo, através da atribuição de um lugar gratuito para sepultura. Todos estes actos aumentavam a reputação, desde logo, do homenageado, mas também da sua família e dos seus descendentes, dado que o prestígio que esse indivíduo alcançava promovia igualmente um bom início da carreira política dos seus filhos e contribuía para a sua continuação no governo das cidades.

56 Andreu Pintado, 2004, p. 197. De acordo com os dados disponibilizados por este autor em 2004, registavam-se na Lusitânia, 89 doações imperiais e 76 de particulares, sendo que em vários casos não existe datação cronológica. Dentro da província da Lusitânia, as doações de particulares concentram-se sobretudo no Convento Emeritensis e no Pacensis (Andreu Pintado, 2004, p. 185).

83 O contributo que estes indivíduos davam para a manutenção da vida pública da cidade seria bastante relevante, oferecendo por vezes serviços que as administrações não asseguravam aos municípios, podendo distribuir, por exemplo, dinheiro e alimentos. Os seus contributos revelavam-se importantes, dado que seriam, com efeito, muitas as despesas dos municípios, entre elas assegurar os gastos associados à administração, ao funcionamento dos banhos públicos, à construcção de edifícios públicos decretados pela curia , e à organização das cerimónias religiosas (Roldán Hervás, 2001, p. 417). Atendendo a que os registos epigráficos são escassos, não é possível quantificar as despesas e as receitas anuais de um município ou colónia na Hispânia. A cólonia de Urso é a que nos proporciona maiores detalhes quanto a estas matérias. Assim, em termos de despesas com a vida administrativa, sabe-se, por exemplo, que o pagamento aos 30 indivíduos que serviam a administração ascendia a 16 800 sestércios por ano e que a manutenção dos oito escravos públicos seria de cerca de 1000 sestércios no total. Contribuía igualmente com 6000 sestércios para os ludi (Abascal e Espinosa, 1989, pp. 176-177). As receitas do município, por seu turno, viriam da summa honoraria normalmente paga por magistrados, sacerdotes e decuriões, do montante auferido pelo arrendamento de terras e de edifícios públicos, como sejam por exemplo as termas, das taxas aplicadas a actividades comerciais e artesanais, das multas e de doações de indivíduos particulares (Melchior, 1999, p. 228). Os investigadores distinguem tradicionalmente três tipos de doações: a já referida summa honoraria , que constituirá o montante entregue por um indivíduo pelo desempenho de uma magistratura, ainda que se trate de uma entrega de carácter eminentemente obrigatório 57 ; as pollicitationes , ou promessas de indivíduos particulares de realizar um acto ou obra, seja durante o processo eleitoral ou ao tomar posse do cargo, muitas vezes largamente superiores ao montante da summa honoraria , seja em testamento; e as ampliationes ou adlectiones, que consistiria em complementar a soma de dinheiro ou em ampliar os gastos numa obra que havia sido prometida à comunidade (Abascal e Espinosa, 1989, p. 184).

57 Tendo em conta os registos epigráficos, Rodríguez Neila e Melchior Gil salientam a impressão que fica de que, por exemplo, muitos decuriões terão contribuído para a vida da civitas apenas com a summa honorária (Rodríguez Neila e Melchior GIL, 2003, pp. 231-232).

84 São várias as possibilidades de classificação dos actos de evergetismo, optando nós por seguir a proposta de Andreu Pintado, que os classifica de acordo com o seu resultado, i.e., da categoria do objecto doado. Verifica-se que os actos praticados na Lusitânia abrangeram desde as necessidades de construção e ornamentação pública (teatros, templos, termas, edifícios cívicos, estátuas), de lazer, como seja a organização de espectáculos públicos ( ludi ), de alimentação básica ( annonae ), e de distribuição de presentes e alimentos ( sportulae e epula ). Este autor considera contudo pertinente individualizar os actos beneméritos que podem ser identificados epigraficamente, como seja as doações ob honorem, relacionadas com promessas eleitorais , e as doações ex testamento , relacionadas com disposições testamentárias (Andreu Pintado, 2004, pp. 39- 41 e pp. 101-192). A maioria das inscrições relacionadas com actos de evergetismo não faz alusão ao montante dispendido na doação. De qualquer forma, por comparação com outras áreas do mundo romano em que tal está apresentado, poderemos saber, por exemplo, que a doação de estátuas estaria entre os 2 000 e os 8 000 sestércios (Abascal e Espinosa, 1989, p. 185), nas sportulae , seriam dispendidos uma média de um a três denários por cada indivíduo beneficiário, e no auxílio à annona , cerca de 600 000 sestércios. Quanto aos ludi , existe, por exemplo, registo de um gasto de 200 000 sestércios na Gallia , em Arles (CIL, XII, 670), e para construções públicas registam-se montantes diversos, desde contribuições modestas a contribuições de 2 000 000 sestércios, como na construção de um aqueduto em Bordéus (CIL, XII, 596) (Andreu Pintado, 2004, p. 37). A munificência seria desde logo praticada pelas famílias notáveis, sobretudo homens livres que desempenhavam uma magistratura ou sacerdócio ou que os aspiravam, mas também por outros grupos sociais, como os libertos, fosse para promover a ascensão social dos seus descendentes ou para aceder aos sacerdócios que lhe estavam reservados. Desta forma, ainda que os libertos não pudessem integrar o senado local ou desempenhar uma magistratura, através dos seus actos de evergetismo obtinham o reconhecimento por parte dos seus concidadãos, podendo, para além de alcançar o sevirato, obter os já referidos ornamenta decurionalia , que lhes permitia uma certa equiparação com o ordo em termos de dignidade (Melchior, 1999, p. 225). Neste aspecto, Ségolène Demougin considera que a terceira geração descendente de libertos seria a que teria maior possibilidade de ocupar as magistraturas da sua cidade, caso

85 mantivessem uma importante situação económica (Melchior, 1999, p. 226, apud Demougin, 1994, p. 359, 365, 373, 376). A participação dos libertos na vida pública da cidade traria benefícios tanto para o próprio, como observámos, como para os munícipes e para as cidades. Para que pudessem concretizar as benemerências, teriam de ter um certo grau de riqueza, tradicionalmente tida como acumulada na actividade comercial que era deixada pelas elites nas mãos dos seus escravos, e que em Olisipo , urbs de pendor marcadamente comercial, poderiam desenvolver. Enquanto libertos, possuidores de riqueza, poderiam então promover actos evergéticos que ajudariam na sua promoção social e política e na dos seus descendentes, tendo sido certamente os libertos mais ricos a alcançar a augustalidade. Para além de Olisipo , na Lusitânia apenas existem registos de doações por parte de augustais em urbs portuárias, como Balsa ou Ossonoba , locais de pendor comercial aonde chegariam vários escravos (Andreu Pintado, 2004, p. 158). No que respeita a actos de evergetismo praticados por membros do ordo equester , em Olisipo apenas temos um registo, nomeadamente o relativo à renovação das «Termas dos Cássios» por Numério Albano, praeses provinciae Lusitaniae (CIL II 191). O facto de apenas existir um registo de acto benemerente por parte do ordo equester poderá estar relacionado com o facto de os indivíduos que alcançavam um cargo desta ordem estarem já a exercê-lo fora do seu local de origem e por isso desvinculavam-se da vida pública desse local, levando a cabo actos de evergetismo na província onde desempenhavam funções. Tal deverá ter sido o caso de Numério Albano que, oriundo de outro local, sendo o seu gentilício raro na Península, teria chegado à Lusitânia para desempenhar as funções de governador (Andreu Pintado, 1999, p. 54). De todo o modo, na Lusitânia enquanto província, são muito poucos os registos de actos de munificência da parte da ordo equester registando-se com segurança, para além do caso de Olisipo , a doação por L. Cornelius Bocchus , em Salacia , de um edifício à sua comunidade após terminada a sua carreira política como forma de reconhecimento aos concidadãos e à cidade onde a sua carreira política teve início (CIL II 2479-5617) (Andreu Pintado, 2004, p. 147). Se é certo que às mulheres estaria vedado o acesso a cargos políticos, a participação na vida pública da cidade não lhes era estranha. Assim é que as mulheres com poder económico financiaram também actos de evergetismo, procurando obter reconhecimento social para si e para a sua família, visando a promoção da carreira do marido e dos filhos. Assim, a epigrafia regista mulheres fazendo doações ou recebendo

86 honras municipais (Melchior, 1999, p. 251). De acordo com Rodríguez Neila e Melchior Gil (2003, p. 213), as mulheres associadas aos decuriões e seviros augustais teriam bastante relevo no que respeita à benemerência relacionada com a distribuição de alimentos e dinheiro, epula e sportulae . Registam-se igualmente actos de evergetismo de indivíduos livres que não indicam a sua posição social, como se constata em Olisipo em CIL II 173, correspondente à erecção de estátua a Esculápio por C. Licini[us] Decimi[anus?], em tempo indeterminado, sendo igualmente as suas acções meios para a promoção social. A maior parte dos actos de evergetismo teria lugar na cidade, ainda que as populações do campo deles beneficiassem igualmente, por exemplo através da entrada gratuita nos banhos ou na assistência aos espectáculos que se promoviam na urbs . De todo o modo, eram igualmente promovidas benemerências fora das cidades, como foi desde logo o caso da já referida oferta de uma fonte em Armês, Sintra, pelo flamen L. Iulius Maelo Caudicus , actos que contribuíam para o aproximar das vivências do campo e da cidade. Para além de, como já referido, os actos de evergetismo contribuírem para promover o reconhecimento público ou para perpetuar a existência do indivíduo na memória colectiva da cidade, poderiam igualmente dar o seu contributo, em termos de progresso no cursus honorum, em particular na conhecida sequência da carreira pública de provinciais duovir – flamen – ordo equester (Andreu Pintado, 1999, p. 55). De qualquer forma, atendendo às doações dos magistrados e sacerdotes, observa-se que na sua maioria terão sido efectuadas após o término das suas carreiras, o que sugere que os actos de evergetismo serviriam sobretudo de agradecimento pelas honras obtidas e não como meio para as obter (Melchior, 1999, p. 250), passando-se o mesmo com as munificências dos libertos, que em grande parte eram também realizadas após serem designados augustais 58 . As honras públicas aos benemerentes eram concedidas pelo senado local, através da emissão de decretos dos decuriões, os quais poderiam surgir com algumas variantes epigráficas, como seja « decreto decurionum », ou d.d., ou « locus datus decreto decurionum », « huic ordo…decrevit », ou « ex decreto ordinis » (Melchior, 1999, p. 222). De qualquer forma, haveria situações em que o homenageado ou seus descendentes

87 devolviam o montante dispendido pelo Senado local nessas honras públicas, como por exemplo através da restituição pelos descendentes do montante referente ao local de sepultura que lhe tivesse sido atribuído gratuitamente. Como indícios da prática do evergetismo em Olisipo , cujo auge terá sido igualmente atingido em época júlio-claúdia (Andreu Pintado, 1999, p. 36), em termos de doações de opera publica, e a nível de edifícios de espectáculo, poderemos realçar desde logo o embelezamento e renovação do proscenium e orchestra do teatro, por Caius Heius Primus , em 57 d.C.. Este augustal paga portanto uma parte do edifício de espectáculos, prática de resto usual no mundo romano, dado que pelo valor avultado deste tipo de edifícios eram habitualmente assegurados pelo imperador. Esta situação verifica-se por exemplo também em Balsa, em que C. Licinius Badius e L. Cassius Celer pagam cada um cem pés do pódio do circo (CIL II 5165 e 5166). Dada a relevância do acto de evergetismo de C. Heius Primus presume-se que teria uma boa capacidade económica. Os dados recolhidos por Richard Duncan-Jones na sua obra de 1974, The economy of the , na qual inclui montantes dispendidos em diversas obras nas províncias africanas, permitem-nos uma melhor compreensão do que representa este acto. Em termos comparativos, apresenta, por exemplo o montante de 500 000 sestércios para a reconstrução do proscenium e scaenea frons do teatro de Leptis Magna (Duncan-Jones, 1974, pp. 92-93), montante que de acordo com Andreu Pintado seria excessivo para o teatro de Olisipo , ao qual estaria mais adequado montantes como 5 000 ou 2 000 sestércios (Andreu Pintado, 2004, p. 79). Realça-se, no entanto, o facto de ser difícil quantificar precisamente o contributo do imperador e do município e o dos benemerentes para as construções públicas das cidades. Para além disso, o próprio facto de muitos dos evergetas serem magistrados, colocaria a questão sobre se se trataria de um acto decorrente da sua função ou enquanto benemerente (Goffaux, 2001, pp. 258-259). As thermae Cassiorum são igualmente um bom exemplo do evergetismo a nível de opera publica , estando a sua designação associada a uma das grandes famílias de Olisipo . Esta situação, a de que o benemerente atribuísse o seu nome à construção cujo pagamento assumia, era frequente e a própria legislação romana proibia uma alteração da designação do monumento, mesmo quando nele eram efectuadas intervenções

58 De acordo com o estudo de Enrique Melchior (1993, p. 469), na Hispania os libertos financiaram 16,4% dos actos

88 posteriores 59 . Tal foi o caso das Termas dos Cássios, que mesmo sendo renovadas em 336 d.C. possivelmente com uma forte alteração da estrutura, dado serem apresentadas como renovatae a solo por Numério Albano mantiveram o seu nome. Como refere Enrique Melchior, o facto de ser um governador provincial a promover a renovação deste equipamento, e não a elite local, permite considerar que o evergetismo pelas elites locais estaria no século IV d.C. em decadência (Melchior, 1993, p. 453). Para além disso, atendendo a que a epígrafe que regista este facto não menciona o imperador, tal poderá indicar que a obra foi financiada a título particular, possivelmente existindo alguma relação com a comunidade (Melchior, 1999, p. 256). Ainda que a construção de termas por iniciativa privada esteja bem documentada na Hispânia, como seja, além do caso de Olisipo , por exemplo em Barcino (CIL II 4509) ou em Tarraco (CIL II 6102), notícias sobre a sua renovação não serão tão frequentes, ainda que esteja igualmente documentada intervenção em reparações das Thermae Montanarum , em Tarraco, por M. Aurelius Vicentius, vir perfectissimus y praeses provinciae Tarraconensis (CIL IL 4112) (Andreu Pintado, 2004, p. 85). Realça-se igualmente a anteriormente referida doação de uma fonte no ager Olisiponensis pelo flamen L. Iulius Maelo Caudicus (CIL II 260), mais especificamente em Armês, acto que regista o orgulho cívico e a promoção social de L. Iulius Maelo Caudicus, ocupando o prestigiado cargo de flamen (Ribeiro, J, 1982-1983, pp. 151- 476). De acordo com a análise efectuada por Andreu Pintado (2004, p. 96) sobre os actos de evergetismo de iniciativa privada em termos de construção de edifícios, sobressai o facto de as mesmas estarem concentradas, em cada conventus , em poucas cidades, sendo que, para o convento Scallabitanus , destacam-se Olisipo e a Bobadela, beneficiando, neste caso Olisipo do seu dinamismo económico e social, contando com iniciativas de augustais, e a Bobadela do benefício da municipalização. A doação de estátuas era o acto benemérito mais frequente na Lusitânia a nível de opera publica . O mais frequente seria a dedicação de estátuas a particulares pagas por outros particulares, como se encontra, por exemplo, em CIL II 196, em que C. Heius Primus é homenageado pela sua família, em especial pelos seus filhos e libertos,

de evergetismo epigraficamente atestados, enquanto que os senadores financiariam 3,4% e os cavaleiros 3,6%. 59 Dig ., L, 10, 7, in Andreu Pintado, 1999, p. 39

89 registando-se igualmente doações de estátuas dedicadas ao imperador ou à família imperial e a divindades. No que respeita a estátuas dedicadas a divindades, registamos, por exemplo, em Olisipo a inscrição dedicada a Esculápio pelos augustais M. Afranius Euporio e L. Fabius Daphnus , possivelmente no tempo de Tibério (14 a 37 d. C.), bem como por C. Licini[us] Decimi[anus?] , em tempo indeterminado, e a Apolo, pelo augustal M. Iulius Tyrannus , possivelmente no séc. I, de acordo com Augusto Vieira da Silva (1944, p. 214). Em termos de homenagens à família imperial por iniciativa de particulares, que regista poucos casos, de resto, na Lusitânia (Andreu Pintado, 2004, p. 133), temos por exemplo o caso da dedicatória ao Divus Augustus pelos augustais C. Arrius Optatus e a C. Iulius Eutichus . Uma das razões pelas quais as homenagens à família imperial por particulares eram reduzidas prende-se com o facto de que geralmente as homenagens a imperadores e à família imperial eram promovidas pelas cidades, por corporações profissionais, unidades militares e funcionários imperiais (Rodríguez Neila e Melchior, 2003, pp. 221/222). Assim, encontramos Felicitas Iulia homenageando o Imperador Vespasiano e Felicitas Iulia Olisipo homenageando a sobrinha do Imperador Trajano, Matidia Augusta , através dos duúnviros Q. Antonius Gallus e T. Marcius Marcianus. Encontramos igualmente homenagens ao Imperador Adriano e à sua mulher Sabina Augusta , pelos duúnviros M. Gellius Rutilianus e L. Iulius Avitus . Salienta-se igualmente a homenagem ao Imperador Cómodo, através dos duúnviros Q. Coelius Cassianus e M. Fulvius/Fabricius Tuscus e ao Imperador Marco Júlio Filipe por Felicitas Iulia Olisipo. No ager Olisiponensis regista-se igualmente homenagem ao Imperador Septímio Severo. Apresenta-se de seguida resenha dos principais actos de evergetismo identificados em Felicitas Iulia Olisipo: Nome Data Acto Benemerente Referência Título/Cargo 57 d.C. Caius Heius Primus Embelezamento e CIL II 183 1 renovação do EO 70 Imperador Augustalis perpetuus proscenium e orchestra Nero do Teatro Opera publica 90 Edifício de espectáculos Século I d.C. Gens Cassia Construção das thermae Opera publica 2 Cassiorum 336 d.C. Numerius Albanus Renovação das thermae CIL II 191 3 Imperador Cassiorum Constantino praeses provinciae Opera publica Lusitaniae Tibério L. Iulius Maelo Pagamento de uma CIL II 260 4 (Étienne,2002, Caudicus fonte no ager p. 100) Flamen divi Augusti Olisiponensis Opera publica Possivelmente C. Heius Nothus e Homenagem a Caius CIL II 196 5 em 57 d.C. Heia Elpis e filhos Heius Primus EO 71

Libertos de Caius Opera publica Heius Primus Doação de estátua Homenagem de particulares a outro particular

Possivelmente M. Afranius Euporio e Erecção de estátua CIL II 175 6 no tempo de L. Fabius /homenagem a EO 103 Tibério (14 a Esculápio 37 d. C., Silva, Augustales Opera publica A.V., 1944, p. Doação de estátua a 217) divindade Em tempo C. Licini[us] Erecção de estátua CIL II 173 7 indeterminado Decimi[anus?] /homenagem a EO 73 Esculápio Opera publica Doação de estátua Homenagem a divindade

91 Possivelmente M. Iulius Tyrannus Erecção de EO 101 8 no séc. I estátua/homenagem a (Silva, A.V., Augustalis Apolo Opera publica 1944, p. 214) Doação de estátua Homenagem a divindade Tibério C. Arrius Optatus e Homenagem/dedicatória CIL II 182 9 (Andreu C. Iulius Eutichus a Divus Augustus EO 74 Pintado, 2004, p. 135 e 136 Augustales Opera publica Doação de estátua Homenagem a imperador 73 d.C. Felicitas Iul. Homenagem ao CIL II 185/ 10 (Andreu Imperador Vespasiano CIL II 5.217 Pintado, 2004, EO 80 p. 138) ILER1078

Opera publica Doação de estátua Homenagem ao imperador Imperador Fel. Iul.Olisipo, Homenagem à sobrinha CIL II 4.993 11 Trajano através dos duúnviros do Imperador Trajano, EO 82 (Entre 98 e Q. Antonius Gallus e Matidia Augusta ILER 1265 107, Salinas T. Marcius Marcianus de Frias e Opera publica Rodriguez Doação de estátua Cortés, 2000, Homenagem à p. 29) família imperial (114 d.C., Andreu Pintado, 2004, p. 138) 92 Imperador Felicitas Iulia Olisipo, Homenagem ao CIL II 186 12 Adriano através dos duúnviros Imperador Adriano EO 91 M. Gellius Rutilianus ILER 1104 121-122 d.C. e L. Iulius Avitus (Curchin, Opera publica 1990b, p. 175) Doação de estátua Homenagem ao imperador Imperador Felicitas Iulia Olisipo, Homenagem a Sabina CIL II 4.992 e 13 Adriano através dos duúnviros Augusta , mulher do CIL II S 5.221 M. Gellius Rutilianus Imperador Adriano EO 72 121-122 d.C. e L. Iulius Avitus ILER 1268 (Curchin, 1990b, p. 175) Opera publica Doação de estátua Homenagem à família imperial Imperador Fel. Iul. Olis. através Homenagem a Cómodo CIL II 187 14 Cómodo dos duúnviros Q. EO 23 (possivelmente Coelius Cassianus e ILER 1144 entre 178-180, M. Fulvius/Fabricius de acordo com Tuscus Opera publica Emílio Doação de estátua Hübner, Homenagem ao Salinas de imperador Frias e Rodríguez Cortés, 2000, p. 29)

Imperador Homenagem no ager Imperador Septímio CIL II 259 15 Septímio Olisiponensis em ara Severo Severo consagrada por Opera publica Valerius (ou Iulius , ou Doação de ara 93 Iunius ) Coelianus, legatus Augustorum 245 d.C. – Fel. Iul.Olisipo Homenagem ao CIL II 188 16 Homenagem Imperador Filipe EO 93 de Olisipo ao Opera publica Imperador Doação de estátua Filipe Homenagem ao imperador Andreu Pintado coloca Filipe I, 244- 247 d.C. (2004, p. 138) Imperador Imperador Nero CIL II 184; EO 79 17 Nero De acordo com Emílio Hübner será de 57 (Silva, A.V., 1944, p. 189) Século I d.C. Homenagem por L. Cornelius Bocchus FE, nº 275 18 decreto dos decuriões Século II d.C. Homenagem de L. Caecilio Celer CIL II 190 19 – inícios Fel. Iul.Olisipo Rectus EO 28

Tabela 1: Principais actos de evergetismo identificados em Felicitas Iulia Olisipo

Da análise dos actos de evergetismo em Olisipo , poder-se-á verificar que as doações de que temos conhecimento até ao momento se situam a nível de opera publica, não tendo registos seja de auxílio à anonna , de distribuição de alimentos e de dinheiro (epula e sportulae) , ou de organização de festas públicas ou jogos ( ludi) .

94 Com base nestes dados epigráficos, sobressai desde logo a construção de umas termas por uma das gens mais notáveis do município, a Cassia , associada à gestão da cidade. Outra das doações que igualmente se destaca e que em muito terá contribuído para a notoriedade do seu benfeitor, de resto até aos nossos dias, terá sido a renovação do teatro por C. Heius Primus . Encontramos aqui assim um liberto, augustal perpétuo, que através da sua doação granjeia reconhecimento por parte da comunidade onde se insere, tendo inclusive uma estátua erigida por elementos da sua família, em especial pelos seus filhos e libertos. Este acto deixa perceber a importância da participação dos augustais nos actos de evergetismo em Olisipo , à semelhança do que se passa na Lusitânia enquanto província. Esta não é, de resto, a única doação por parte deste grupo social. Registam-se, como observámos, outras doações, nomeadamente de estátuas, seja a divindades seja ao imperador. Com efeito, das 19 benemerências acima apresentadas e nas quais é possível identificar o grupo social a que o dedicante pertence, quatro são promovidas por augustais. Em termos de culto imperial no seu conjunto, ou seja, se juntarmos os actos de flâmines e de augustais, Olisipo destaca-se, tal como Salacia , como as cidades que registam maior número de actos de evergetismo na Lusitânia (Andreu Pintado, 2004, p. 158). Realce igualmente para os duúnviros, que surgem representados em quatro situações, sendo eles os magistrados com maior actividade registada a nível de actos de evergetismo na Lusitânia, no âmbito municipal. Esta situação estará relacionada com as possibilidades de promoção social no decurso do cursus honorum duovir-flamen-ordo equester (Andreu Pintado, 2004, pp. 149-151). A este respeito, refira-se contudo que Enrique Melchior considera que a importância dos actos de evergetismo no que respeita à promoção da elite municipal para o ordo superior seria limitada, sendo que outros factores, como a sua riqueza, características pessoais ou a política de alianças e casamentos entre famílias poderiam ser mais determinantes neste aspecto (Melchior, 1999, pp. 226-227). Realçamos aqui de novo a questão da dificuldade em estabelecer se os actos dos magistrados o são enquanto actos de evergetismo pessoal ou promovidos no âmbito do desempenho das suas funções (Goffaux, 2001, pp. 258-259). Temos portanto representada, a nível de evergetismo, a elite da sociedade olisiponense, incluindo desde magistrados municipais, nomeadamente duúnviros, sacerdotes, incluindo flâmines e augustais, e libertos, entidades na sua maioria, de alguma forma, ligadas ao desempenho de cargos políticos ou preparando uma promoção

95 social e política. Para além dos notáveis com carácter local, contamos ainda em Olisipo , como observámos, com um acto produzido por um elemento do ordo equester, de renovação das Termas dos Cássios, no século IV d.C. O evergetismo irá entrar em declínio no século III d.C., decaindo os registos epigráficos com os últimos imperadores da dinastia dos Severos (Melchior, 1999, p. 252). Na Lusitânia, a quase totalidade das doações desta época concentram-se no convento Pacensis , devendo estar relacionado com a riqueza gerada pela exploração do do garum nesta zona, e talvez também do azeite, em particular em Balsa e em Ossonoba 60 . Em termos gerais, no entanto, é de um declínio que frequentemente se fala e como explicações para esta decadência foram avançadas a crise económica do século III e o empobrecimento de boa parte da elite municipal, tese combatida posteriormente por vários autores, considerando-se que na realidade os notáveis deixaram de investir nas cidades para passar a investir, por exemplo, em actos privados como seja a construção de villae . Nos séculos IV e V d.C. continua a haver indícios de actos de evergetismo ainda que de forma limitada, o que poderá indicar que as cidades possuíam já as construções públicas necessárias, e que ocorrera uma alteração de mentalidades (Melchior, 1993, p. 461). Neste século se inscreve, por exemplo, a renovação das Termas dos Cássios por Numério Albano, confirmando o facto de que neste século as doações na Hispânia eram feitas ou por imperadores ou por membros da administração imperial, não sendo assim construções ex novo mas restaurações do já existente 61 . Os vestígios epigráficos e arqueológicos dos actos de benemerência em Olisipo que até nós chegaram são, como observámos, em número bastante reduzido, pelo que deverão representar uma parte diminuta de todos os que foram promovidos neste município. Novas escavações arqueológicas poderão, no entanto, alterar a situação que

60 Sobre esta questão vide Andreu Pintado, 2004, pp. 185-186, quadro XIV. 61 Atendendo a que os actos de evergetismo melhorariam a vida da plebe, pode supor-se que a decadência da benemerência terá tido a sua influência na vida dos grupos sociais mais pobres das cidades. Convém no entanto realçar que as práticas do evergetismo seriam diversas do conceito de caridade cristã ou solidariedade. O motivo normalmente seria a promoção social e política do indivíduo, não a ajuda ou apoio aos mais carenciados, o que se pode comprovar pelo facto de, por exemplo, nas distribuições de dinheiro, sportulae , serem os membros do ordo e os do corpo cívico ( cives ) frequentemente os mais beneficiados, dado que teriam uma palavra a dizer na promoção social e na eleição do benemerente. Desde o século IV as práticas cristãs de caridade vão substituindo a benemerência cívica, as quais criam novas formas de gastos das elites com poder económico (Melchior, 1999, p. 257).

96 actualmente se apresenta para Olisipo , uma vez que os dados sobre os quais trabalhamos estão sempre dependentes de eventuais progressos e descobertas que se façam neste âmbito e da casualidade da descoberta.

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7 Considerações finais

Antes da chegada dos romanos, Olisipo poder-se-ia já considerar um centro de actividade económica, naturalmente associado ao seu porto, à exploração dos recursos marinhos, à exploração dos solos. Mas a chegada dos romanos induz importantes mutações, que se fazem sentir a diversos níveis. Talvez se possa ver esta mutação como um renascimento. No fundo, uma nova cidade surge, imitando em certa medida Roma. Será assim ao nível político, mas essa transformação situa-se igualmente no plano religioso, administrativo, económico e social. Quanto a este aspecto, um novo mundo de «classes sociais» se cria em Olisipo , à semelhança dos outros municípios romanizados. Ao nível político, é implantada uma estrutura de governo que replica a de Roma. Roma refunda-se uma e outra vez, repetem-se as estruturas, a organização, o método. Olisipo surge com uma organização marcadamente romana, à semelhança das restantes cidades conquistadas, com a sua cúria, com os seus magistrados, com os seus locais de culto e responsáveis pelo mesmo. Observámos até que ponto a nossa informação sobre as estruturas políticas é deficitária. De todo o modo, dada a vitalidade de Olisipo, este município teria certamente uma cúria dinâmica nos primeiros dois séculos d.C.. No modelo romano, as elites locais controlavam o poder político nos seus municípios e asseguravam uma ordem social que lhes permitia a continuação da sua posição social e da sua riqueza. A imagem da elite de Olisipo que aqui se apresenta assenta, como referido, nas epígrafes encontradas, e por isso mesmo, será uma amostra documental que subsistiu, reduzida e aleatória. Da análise dos registos epigráficos e literários, fica-nos, no entanto, a imagem de uma cidade que ocuparia um lugar relevante na Hispania , pela sua localização enquanto charneira do atlântico e do mediterrâneo e pelo seu papel como centro distribuidor de produtos. Em termos de dimensão populacional Alarcão (1990, p. 396) considera, como anteriormente referido, a possibilidade de Olisipo ter 30 000 a 40 000 indivíduos. Não havendo confirmações quanto à população, parece-nos no entanto que uma cidade com um porto activo e bastante frequentado, que permitia não só a circulação dos homens e dos produtos mas também das ideias, com um ager com vários registos de villae , cujos produtos, para além de consumo próprio seriam certamente vendidos e pela urbs

98 eventualmente passariam, alcançaria certamente uma população considerável e, sobretudo, dinâmica. Com base nos registos epigráficos vislumbramos uma população heterogénea que integra indígenas, muitos deles já com nomes alatinados, indivíduos de origem itálica, bem como de origem oriental. A aristocracia dos municípios seria desde logo constituída pela elite local romanizada, denotando que esta perpetua a elite pré-romana, mas é também constituída por novos elementos que acorrem à cidade, membros da comunidade extensa dos habitantes do Império Romano. Para o conhecimento das elites de Olisipo são importantes os dados da urbs , o que é lógico, mas também os elementos provenientes do seu ager , onde os magistrados teriam as suas villae. A vida dos decuriões, da elite que se envolvia na política, seria assim passada entre a cidade, onde participaria nas reuniões da assembleia, onde desempenharia o cargo de duúnviro, edil ou flâmine, e o campo, onde possuiria a sua propriedade agrícola. Os decuriões, magistrados e sacerdotes deveriam ter certamente elevado poder económico e posse de terras, podendo-se assumir que grande parte do território próximo das cidades pertenceria aos membros do senado local, como se viu por alguns dos exemplos apresentados, nomeadamente o famoso flâmine L. Iulius Maelo Caudicus , responsável pelo pagamento de uma fonte no ager Olisiponensis , em Armês, Sintra. Apesar do factor aleatório da descoberta, o número de referências epigráficas a magistrados é interessante, contando com um total de quinze magistrados municipais, nove duúnviros e seis edis, uma das mais elevadas de toda a Lusitânia. Contamos ainda com o registo de quatro flâmines, duas flamínicas, uma delas provincial, e de dez augustais. Analisada a lista de magistrados municipais conhecidos até ao momento em Olisipo , verifica-se que ostentam uma antroponímia essencialmente latina, sendo que a gens mais registada a nível de magistrados é a Iulia , com cinco magistrados, fazendo jus à maior expressividade desta família em Olisipo . A família Caecilia regista duas ocorrências, havendo um representante das famílias Antonia, Marcia, Gellia, Coelia, Fulvia, Gavia, Cantia e Cassia , situação que pode mudar com a descoberta de novos achados arqueológicos. Todo este conjunto de inscrições referentes à elite corroborará uma vida política municipal activa, profundamente arreigada à cultura romana. As diversas inscrições de homenagem ao imperador e a membros da família imperial reforçam exemplarmente a importância político-administrativa de Olisipo . Jorge de Alarcão e Vasco Mantas

99 salientam mesmo, nos seus contributos para o catálogo Lisboa Subterrânea (1994, p. 60 e p. 71 respectivamente), a preponderância de Olisipo a nível político, económico e cultural sobre Scallabis , sua sede conventual, sendo inclusivamente colocada a questão da possibilidade de transferência da sede do conventus de Scallabis para Olisipo (Alarcão, 1994, p. 60). Vasco Mantas (1997, p. 22) sugere igualmente que a partir do último quartel do séc. I a.C., Olisipo poderá ser considerada como capital litoral da Lusitânia, eclipsando a capital conventual Scallabis . José Cardim Ribeiro (1994 b, pp. 77-78) considera, contudo, que apesar da grande concentração de inscrições em honra de imperadores e seus familiares e as referências aos governadores provinciais em Olisipo , não existem razões concretas que levem a supor que Scallabis não tenha cumprido regularmente a sua função como centro administrativo regional. Atendendo a que a documentação de Scallabis é muito escassa, registando-se pouco mais de uma dezena de inscrições e apenas uma delas relacionada com a elite, não permitirá determinar a real dimensão desta questão, nem a da sua elite. Apesar da muito referida crise do século III d.C., Olisipo continua , aparentemente activa , com a sua actividade comercial, registando-se no século IV d.C. reconstruções, como das «termas dos Cássios», referenciada no capítulo relativo ao evergetismo em Olisipo . Para além disso, o circo terá sido também construído muito depois do processo de municipalização , sendo igualmente possível que a villa romana de Frielas tenha sido estabelecida em meados do século III – inícios do século IV d. C. (Silva, A.R., 2000, p. 81), podendo-se assim observar uma continuidade da cidade, sendo possível que novas escavações nos tragam mais informações que corroborem este facto. Nas últimas décadas, muitas estruturas arqueológicas foram sendo postas a descoberto. A nossa janela para o passado abriu-se por essa via, permitindo-nos conhecer um pouco mais de quem por aqui passou. Mesmo assim, trabalhou-se sobre uma informação muito fragmentária e que pode ser algo ilusória. Certamente que o futuro trará novos e mais esclarecedores contributos que permitirão completar o quadro aqui delineado.

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118 TAYLOR, Lily Ross (1914) - Augustales, Seviri Augustales, and Seviri : A Chronological Study. In Transactions and Proceedings of the American Philological Association , vol. 5. The Johns Hopkins University Press, pp. 231-253

Siglas e Abreviaturas

AE = Année Épigraphique . Paris. CIL = Corpus Inscriptionum Latinarum EO = Epigrafia de Olisipo, Silva, Augusto Vieira da Silva (1944). Lisboa FE = Ficheiro Epigráfico . Coimbra. ILER = VIVES, José (1971) - Inscripciones latinas de la España romana. Barcelona IRCP = ENCARNAÇÃO, José d’ (1984) - Inscrições romanas do conuentus Pacensis . Coimbra NH – Naturalis Historia, Plínio-o-Velho

119 Índice de Figuras

Figura 1: Felicitas Iulia Olisipo (in Mantas, 1990, p. 166, Fig. 2) ...... 33 Figura 2: Levantamento das ruínas do teatro romano de Lisboa, de Francisco Xavier, c. 1798 ( in Fernandes, Lídia, 2007, p. 29)...... 34 Figura 3: Inscrição publicada por Vieira da Silva na sua Epigrafia de Lisboa , correspondente a “copia dum desenho da pasta s/n.o de inscrições lapidares de Cenáculo (Biblioteca regional de evora)” (Silva, A. V., 1944, p. 114, n.o 22). ( in Fernandes, Lídia, 2009, p.198)...... 36 Figura 4: Fonte de Armês ( in Ribeiro, J, 1982-1983, p. 169) ...... 67

Índice de Fotografias

Fotografia 1: L. Caecilius Celer Rectus, CIL II 190 ...... 49 Fotografia 2: |Se|x(tus) Iulius Avitus e [.]Cassius […], in Guerra, 2006, p. 281 57 Fotografia 3: L. Iulius Iustus , CIL II 313 (fotografia de J. Cardim Ribeiro, in Fernandes, Luís, 2003, p. 53) ...... 59 Fotografia 4: Q. Caecilius Caecilianus , CIL II 261 ...... 60 Fotografia 5: CIL II 182 – (in Quinteira e Encarnação, 2009b, p. 145) ...... 74

120

ANEXOS

121 Anexo 1 i. Magistrados municipais

a. Duúnviros Data Nome Cargo Referências Tibério (inícios) (Curchin, 1990b, pp. 174-175) Q. Iulius Plotus Aedilis, IIvir, flamen CIL II 194; EO 41; ILER 5534; Germanici Caesaris, Curchin 366 1 flamen Iuliae Augustae in perpetu (u)m. Trajano Q. Antonius Iivir (com T. Marcius CIL II 4993; EO 82; ILER 1265; 2 - Cerca de 107 d.C. (Mantas, 2005, p. 30) Gallus Marcianus ) Curchin 367 - Entre 98 e 107 d.C. (Salinas de Frias e Rodríguez Cortés, 2000, p. 29) Trajano T. Marcius IIvir (com Q. Antonius CIL II 4993; EO 82; ILER 1265; 3 - Cerca de 107 d.C. (Mantas, 2005, p. 30) Marcianus Gallus) Curchin 368 - Entre 98 e 107 d.C. (Salinas de Frias e Rodríguez Cortés, 2000, p. 29) Adriano M. Gellius IIvir (com L. Iulius CIL II 186; EO 91; ILER 1104; 4 - 121-2 d. C. (Curchin, 1990b, p. 175) Rutilianus Avitus) Curchin 369 - 126-127 d.C. (Guerra, 2006, p. 280)

122 Adriano L. Iulius Avitus Iivir (com M. Gellius CIL II 186; EO 91; ILER 1104; 5 - 121-2 d. C. (Curchin, 1990b, p. 175) Rutilianus) Curchin 370 - 126-127 d.C. (Guerra, 2006, p. 280) Cómodo Q. Coelius Iivir ( com M. Fulvius CIL II 187; EO 23; ILER 1144; 6 - 178-80 d. C. (Silva, A.V., 1944, p. 116, Francisco Cassianus Tuscus) Curchin 371, De Francisco Martín, 1978, p. 236, Salinas de Frias e Rodríguez Cortés, 2000, p. 29) Cómodo M. Fulvius IIvir (com Q. Coelius CIL II 187; EO 23; ILER 1144; 7 - 178-80 d. C. (Silva, A.V., 1944, p. 116, Francisco Tuscus Cassianus) Curchin 372, De Francisco Martín, 1978, p. 236, Salinas de Frias e Rodríguez Cortés, 2000, p. 29) - Séc. II d.C. (Guerra, 2006, p. 282) |Se|x(tus) Iulius IIvir ( com [.]Cassium Guerra, 2006, p. 282 8 Avitus […]) - Séc. II d.C. (Guerra, 2006, p. 282) [.]Cassium […] IIvir (com |Se|x(tus) Guerra, 2006, p. 282 9 Iulius Avitus)

b. Edis - Séc. I d.C. (Mantas, 2005, p. 37) C. Caecilius Aedilis CIL II 192; ILER 5548; Curchin 375 10 Gallus - Séc. I d.C. (Mantas, 2005, p. 39) C. Iulius Rufinus Aedilis designatus CIL II 225; ILER 6381; Curchin 374 11

123 - Finais do séc. I d. C.-inícios do séc. II d. C. L. Iulius Iustus Aedilis CIL II 313 12 (Fernandes, Luís, 2003, p. 47) - Meados séc. II d.C. (Mantas, 1982, p. 78) Q. Caecilius Aedilis CIL II 261; ILER 5550; Curchin 376 13 Caecilianus - Séc. II d.C. (Mantas, 2005, p. 39) C. Gavius Rectus Aedilis CIL II 262; ILER 5549; Curchin 373 14 - Séc. II d.C. (Mantas, 2005, p. 38) L. Cantius Aedilis CIL II 193; ILER 5547; Curchin 377 15 Marinus

ii. Flâmines Data Nome (cursus) Cargo Referências Tibério Q. Iulius Plotus Flamen Germanici CIL II 194; EO 41; ILER 5534; Curchin 1 - 14-19 d.C. (Delgado Delgado, 2000, p. 113) (Q. Iulius Q. f. Caesaris, flamen Iuliae 366 Gal. Plotus) Augustae in perpetu(u)m Tibério L. Iulius Maelo Flamen Divi Augusti CIL II 260; ILER 1584 2 - 14-37 d.C. (Étienne, 2002, p. 100) Caudicus, flamen - Tibério ou Claúdio (Delgado Delgado, 2000, p. Divi Augusti 113)

124 Nero Não identificado Flamen augustalis ? Ribeiro 1974/77 3 - Primeira metade do terceiro quartel do séc. I d. C. Epígrafe de Faião (Ribeiro, J,1974-1977, p. 302) - Talvez da 2ª metade do século I d.C. (Delgado Delgado, 2000, p. 114) Tito/Domiciano P. Stai. G. f. Gal. Fla. Divi Vesp. Ribeiro 1982/83 4 - 79-81/81-96 d.C. (Delgado Delgado, 2000, p. 113) Exoratus M.A.S.M.O. XCII - 79-96 d.C. (Étienne, 2002, p. 101) Epígrafe de Lourel

iii. Flamínicas

c. Flamínica municipal Data Nome Título / cargo Referência Adriano (Delgado Delgado, 2000, p. 123) [..] lia Vegeta Flaminica CIL II 5218/197; EO 83; ILER 4453; 1

d. Flamínica provincial Data Nome Título / cargo Referência Não será anterior a Vespasiano (Delgado Delgado, Servilia Flaminicae provinciae CIL II 195; EO 36; ILER 1660 2 1999, p. 457) Lusitaniae

125 iv. Augustais

Data Nome Cargo Obs. 1 Possivelmente do 1º quartel do séc. I d. C. (Silva, C. Arrius Optatus Augustalis CIL II 182; EO 74; ILER 1033 A.V., 1944, p. 183) 2 Possivelmente do 1º quartel do séc . I d. C. (Silva, C. Iulius Eutichus Augustalis CIL II 182; EO 74; ILER 1033 A.V., 1944, p. 183) 3 Possivelmente do tempo de Tibério (14 a 37 d. C.) M. Afranius Augustalis CIL II 175; EO 103 (Silva, A.V., 1944, p. 217) Euporio 4 Possivelmente do tempo de Tibério (14 a 37 d. C.) L. Fabius Daphnus Augustalis CIL II 175; EO 103 (Silva, A.V., 1944, p. 217) 5 Período de Nero ( Fernandes, Luís, 2005, p. 30) C. Heius Primus Augustalis CIL II 183; EO70 e 71; ILER perpetuus 2062 6 Possivelmente do séc. I d.C . (Silva, A.V., 1944, p. 214) M. Iulius Tyrannus Augustalis EO 101 7 Possivelmente do séc. I d. C. (Fernandes, 1998, 2003) Iulius Italicus Augustalis CIL II 264; FERNANDES, 1998, 2003 8 s.d. C. Iulius C Augustalis CIL II 181; EO 78 [atulinus?] 9 s.d. Nemeti[us] Firmus Augustalis EO 11 10 s.d. Sem designação Augustalis EO 8

126 Anexo 2

Epígrafes i. Magistrados

a. Duúnviros

1 – Q. Iulius Plotus, aedilis, IIvir, flamen Germanici Caesaris, flamen Iuliae Augustae in perpetuum CIL II 194; EO 41; ILER 5534; Curchin 62 366

Q( uinto ). IVLIO. Q( uinti ). F( ilio ). GAL( eria ). PLOTO / AED( ili ). IIVIR( o). FLAMINI /GERM( anici ). CAESARIS FLA/MINI IVLIAE AVG( ustae ) IN PERPETV( um )

In Mantas, 2005, p. 29,

2 – Q. Antonius Gallus – IIvir 3 – T. Marcius Marcianus – IIvir CIL II 4993; EO 82; ILER 1265; Curchin 367 e 368

MATIDIAE / AVG( ustae ) / FEL( icitas ). IVL( ia ). OLISIPO / PER / Q( uintum ) ANTONIVM GALLVM / [ET] T( itum ). MARCIVM MARCIANVM / IIVIR( os )

In Mantas, 2005, p. 30,

62 As referências a Curchin reportam-se à sua obra de 1990b, pp- 174-175

127 4 – M. Gellius Rutilianus – IIvir 5 – L. Iulius Avitus , – IIvir - CIL II 186; EO 91; ILER 1104; Curchin, 369 e 370

IMPE( eratori ). CAESAR / TRAIANO HADRIANO / AVG( usto ). DIVI. NERVAE NEP( oti ) / DIVI.TRAIANI. DAC(ici ). PAR( thici ). FIL( io ) / CO( n)S( uli ). III TRIB( unicia ). POTEST( ate ). V / FELICITAS IVLIA OLISIPO / D( ecreto ). D( ecurionum ) / PER. M( arcum ). GELLIVM. RVTILIANVM / ET. L( ucium ) IVLIVM AVITVM. IIVIR( os ).

In Mantas, 2005, p. 301

- CIL II 4992; CIL II 5221; EO 72; ILER 1268; Curchin 369

SABINAE. AVG( ustae ) / IMP( eratoris ). CAES( aris ). TRAIANI / HADRIANI. AVGVSTI / DIVI. NERVAE NEPOTIS / DIVI. TRAIANI. DAC( ici ). PARTH( ici ). F( ili ). D( ecreto ). D( ecurionum ) / FELICITAS. IVLIA. OLISIPO / PER / M( arcum ). GELLIVM. RVTILIANVM / ET. L( ucium ). IVLIVM. AVITVUM. IIVIR( os ).

In Mantas, 2005, p. 32

6 – Q. Coelius Cassianus – IIvir CIL II 187; EO 23; ILER 1144; Curchin 371

IMP( eratori ). CAE( sari ). IMP( eratoris ). / M( arci ). AVREL( ii ). ANTONIN( i). / AVG( usti ). F( ilio ). DIVI. PII. NEP( oti ). DIV[I] . / HADR( iani ). PRON( epoti ). DIVI. / TRAI (ani ).PARTHICI ABNEP(oti). /L(ucio). AVRELIO COMMOD[O]. / AVG( usto ). GERMAN( ico ). SARMAT ( ico ) / FEL( icitas ). IVL( ia ). OLIS( ipo ). PER. Q( uintum ). COELI/VM. CASSIANVM. ET. M( arcum ) FVLVI/VM. TVSCVM. IIVR (os)

In Mantas, 2005, p. 33, considerada por Hübner a mais correcta das versões existentes. Dado que a epígrafe se perdeu, não é possível confirmar a versão original.

128 Relacionada com esta inscrição, encontra-se CIL II 284 / ILER 4173 que faz referência a Q. Coelius Aquila , filho de Q. Coelius Cassianus :

D( is ). M( anibus ) / Q( uintus). COELIVS / AQUILA /ANN( orum ). XVI / HIC / H( ic ). S( itus ). E( st ) / Q( uintus ). COELIVS / CASSIANUS / FILIO. PIISSIMO / F ( aciendum ). C( uravit )

7 – M. Fulvius Tuscus - IIvir CIL II 187; EO 23; ILER 1144; Curchin 372

IMP( eratori ). CAE( sari ). IMP( eratoris ). / M( arci ). AVREL( ii ). ANTONIN( i). / AVG( usti ). F( ilio ). DIVI. PII. NEP( oti ). DIV[I] . / HADR( iani ). PRON( epoti ). DIVI. / TRAI (ani ).PARTHICI ABNEP(oti). /L(ucio). AVRELIO COMMOD[O]. / AVG( usto ). GERMAN( ico ). SARMAT ( ico ) / FEL( icitas ). IVL( ia ). OLIS( ipo). PER. Q( uintum ). COELI/VM. CASSIANVM. ET. M( arcum ) FVLVI/VM. TVSCVM. IIVR (os)

In Mantas, 2005, p. 33, considerada por Hübner a mais correcta das versões existentes. Dado que a epígrafe se perdeu, não é possível confirmar a versão original.

8 –|Se|x(tus) Iulius Avitus, IIvir 9 – [.]Cassius […] , IIvir

LI[bertati]/ AVG (ustae)/ [F] ELICITAS IVLIA OLISIP [o]/ PER /[Se] X(tum) IVLIVM AVITVM /[.] CASSIVM […]/[IIvir/os)] In Guerra, 2006, p. 279

129

b. Edis

10 – Caius Caecilius Gallus, aedilis CIL II 192; ILER 5548; Curchin 375

C( aio ). CAECILIO. Q( uinti ). F( ilio ) / GAL ( eria ). GALLO. AED( ili ) / PETICIA. P( ublii ). TVSCA / VXOR

In Mantas, 2005, p. 36

11 – C. Iulius C. f. Gal. Rufinus – aedilis designatus CIL II 225; ILER 6381; Curchin 374

C( aius ) IVLIVS /C( aii ) F( ilius ). GAL( eria ) / RVFINVS /AED( ilis ). DESIG( natus ) / H( ic ) S( itus ) E( st )

In Mantas, 2005, p. 39

12 – L. Iulius Iustus, aedilis

D( iis ) M( anibus ) / L( ucii ) IVL( i) L( ucii ) F( ilii ) GALER( ia tribu ) / IVSTI AEDILIS / AN( norum ) XXVIII / L( ucius ) IVLIVS REBVRRVS PATE[R] / ET IVLIA IVSTA MATER / FILIO PIISSIMO

In Fernandes, Luís, 2003, p. 29

130 13 – Q. Caecilius Q. f. Gal. Caecilianus CIL II 261, ILER 5550; Curchin 376

[DIS . MANIBVS] / Q( uinti ) . CAECILI Q( uinti ) . F( ilii ) . GAL( eria tribu ) CAECILIANI . AEDILIS/AN ( norum ) . XXXX/ M( arci ) . CAECILI . Q( uinti ) . F( ilii ) . GAL( eria tribu ) . AVITI/ AN ( norum ) . XVIII/IVLIA . M( arci ) . F( ilia ) . MARCELLA . MARITO . OPTVMO/ FILIO . PIISSIMO . DE . SVO . FECIT

In Mantas, 1982, p. 71

14 –C. Gavius Rectus CIL II 262; ILER 5549; Curchin 373

C( aio ). [G]AVIO. C( aii ). [F( ilio ).] GAL( eria ) / REC[TO] /AEDIL[I] / ANN( orum ). XXVIIII In Mantas, 2005, p. 38

15 – Lucius Cantius Marinus CIL II 193; ILER 5547; Curchin 377

D( is ) [M( anibus )] / L( ucio ). CANTIO. L( ucii ). F( ilio ) / GAL(eria). MARIN[O] /AEDILI / VIBIA MAXIMA / AVIA ET / MARIA PROCVL[A] / MATER HONOR[E] / CONTENTAE /D( e). S( ua ). P( ecunia ).

In Mantas, 2005, p. 37

131 ii. Flâmines

1 – Q. Iulius Plotus, aedilis, IIvir, flamen Germanici Caesaris, flamen Iuliae Augustae in perpetuu)m CIL II 194, EO 41, ILER 5534, Curchin 366

Q( uinto ). IVLIO. Q( uinti ). F( ilio ). GAL( eria ). PLOTO / AED( ili ). IIVIR( o). FLAMINI /GERM( anici ). CAESARIS FLA/MINI IVLIAE AVG( ustae ) IN PERPETV( um )

In Mantas, 2005, p. 29,

2 – L. Iulius Maelo Caudicus, flamen Divi Augusti

CIL II 260; ILER 1584 L( ucius ). IVLIVS. MAELO. CAVDIC( us ). FLAM( en ). DIVI AVG( usti ) DE S( uo ) F( ecit )

In Ribeiro, J, 1982-1983, p. 173

3 – flamen augustalis (não identificado) - Faião In Ribeiro, J, 1974-1977, 296

4 – P. Staius Exoratus, flamen Divi Vespasiani

DIIS MAN( ibus ) / P( ublii ) STAI( i) G( aii Staii ) F( ilii ) CAL( eria tribu ) EXO/RATI FLA( men ) DIVI/VESP(asiani ) ANN( orum ) XXXIIII

In Ribeiro, J, 1982-1983, p. 231

132 iii. Flamínicas

a. Flamínica municipal

1 – [...]lia Vegeta CIL II 197 ou CIL II 5218; EO 83; ILER 4453

[IV ]LIA[ E] / VEGETA [E] / FLAMINIC[AE] / M( arcus ). GELLIVS /RVTILIANVS[S] /MARITVS

In Mantas, 2005, p. 33

b. Flamínica provincial

2 – Serviliae CIL II 195; EO 36; ILER 1660

(na frente) FLAMINICAE PROVINCIAE LVSITANIAE SERVILIAE. L. F. ALBINI. D.D. (no lado) LVCCEIAE Q. F. ALBINAE TERENTIANI D.D.

In Silva, A.V., 1944, pp. 137-138 iv. Augustais

1 – C. Arrius Optatus 2 – C. Iulius Eutichus CIL II 182, EO 74, ILER 1033,

DIVO. AVGVSTO / C( aius ) . ARRIUS. OPTATV[ S] / C( aius ) . IVLIVS. EVTHICVS / AVGVSTALES In Quinteira e Encarnação, 2009, p. 145

133

3 – M. Afranius Euporio 4 – L. Fabius Daphnus CIL II 175; EO 103

SACRVM AESCVLAPIO. M( arcus ) AFRANIVS EUPORIO ET L( ucius ) FABIVS DAPHNV[ s] AVG( ustales ), MVNICIPIO D( ono ) D( ederunt )

In Silva, A.V., 1944, pp. 217-219

5 – C. Heius Primus CIL II 183; EO 70 e EO 71; ILER 2062 a) EO 70

NERONI CLAVDIO DIVI CLAVDI F( ilio ) GER( manici ) [ --- ]AESARI [ --- ] / [ --- ]AESARIS [--- ] AVG( usto ) GERMANICO / PONT( ifici ) MAX( imo ) TRIB( unitia ) POT( estate ) III IMP( eratori ) III CO( n)S( uli ) II DESIGNATO III / PROSCENIUM ET ORCHESTRAM CVM ORNAMENTIS / AVGVSTALIS PERPETVVS. C( aius ) HEIUS PRIMVS [--- ]

In Fernandes, Luís, 2005, p. 30 b) EO 71

[Aug ]STALI PERPETVO C( aio ) HEIO. C( aii ) L( iberto ). PRIMO. C( aius ) HEIVS. PRIMI LIB( ertus ) NOTHVS. ET HEIA, PRIMI L[ib ]( erta ) ELPIS. HEIA NOTHA [S]ECVNDA. C(aius ) HEIVS. NOTHI F(ilius ), C (=G?)AL( eria?) [ tribu ]. PRIMVS. CA( i=t?) O HEIA [ e?] NOTH[ ae?] F(ilius). CHELIDO. [ .?. ][ H]EIU[ s]. NOTHI F( ilius ). C ( =G?)AL( eria?) [tribu ]. GLAPHYRVS NOTHIAN[us? ]…

In Silva, A.V., 1944, pp. 176-178

134

6 – M. Iulius Tyrannus EO 101

APOLLINI SACRVM. M( arcus ) IVL( ius ). M( arci ) LIB( ertus ). TYRANNVS. AVGVSTA[ lis]. D( edit ) D( edicavit )

In Silva, A.V., 1944, pp. 101-102

7 – Iulius Italicus CIL II 264; Fernandes, Luís, 2003, p. 42, nº 5

[.] IVLIVS . MVN (…?) LI/B( ertus )? ITALICVS / AVGVSTAL( is ) . H( ic ) . S( itus ) . E( st )

In Fernandes, Luís, 2003, p. 42

8 – C. Iulius C [atulinus?] CIL II 181, EO 78

MERCVRIO AVG( usto ) SACRVM. C( aius ) IVLIVS C[ a]TVLI( nus? ). AVGVSTALIS. D( edit ) D( edicavit ) In Silva, A.V.,1944, p. 188

9 – Nemetius Firmus EO 11

NEMETI[ us ] FIRMVS. AV[ g? ]( ustalis ). V( ir ) E( gregius ) R( omanus ). VI( xit ) LXX. HER( edes? ) [D? ]( e) S( uo ) F( aciendum ) [ C? ] ( uraverunt ). In Silva, A.V.,1944, p. 104

135 10 – Denominação desconhecida EO8

Matulla H( ic ) S( epulta ) E( st ). [Aedi? ]lis Augustal( is ), [ Et? ] [Iu?] l( ia? ) Gadilla [F? ]( aciendum ) [ C]uraverunt.

In Silva, A.V., 1944, p. 101

136