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UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

DACEC – DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS, CONTÁBEIS, ECONÔMICAS E DA COMUNICAÇÃO

CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL – HABILITAÇÃO: PUBLICIDADE E PROPAGANDA

FILIPE REICHERT FREITAS

MAIS DO QUE OS OLHOS PODEM VER: UM ESTUDO DE CASO SOBRE A FRANQUIA E O SEU FANDOM

Ijuí – RS 2019 1

FILIPE REICHERT FREITAS

MAIS DO QUE OS OLHOS PODEM VER: UM ESTUDO DE CASO SOBRE A FRANQUIA TRANSFORMERS E O SEU FANDOM

Trabalho de Conclusão de Curso de Comunicação Social – Habilitação: Publicidade e Propaganda – Departamento de Ciências Administrativas, Contábeis, Econômicas e da Comunicação da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUÍ, como requisito parcial para a obtenção do título de bacharel em Publicidade e Propaganda.

Orientadora: Prof.ª M.ª Rúbia Beatriz Schwanke

Ijuí – RS 2019

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FILIPE REICHERT FREITAS

MAIS DO QUE OS OLHOS PODEM VER: UM ESTUDO DE CASO SOBRE A FRANQUIA TRANSFORMERS E O SEU FANDOM

Monografia apresentada ao Curso de Comunicação Social – Habilitação: Publicidade e Propaganda da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

Data de aprovação: ___/___/_____

Banca Examinadora:

______Prof.ª M.ª Rúbia Beatriz Schwanke (Orientadora)

______Prof.ª Marcia Formentini (Banca)

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente à minha mãe, Neiva, por tudo que já conquistei na vida.

Agradeço também a todos os meus professores e colegas da Unijuí que me apoiaram e estiveram ao meu lado durante meus cinco anos de graduação.

Por fim, quero agradecer aos meus amigos de todo o Brasil que compartilham da minha fascinação por Transformers e que participaram da minha coleta de dados. Em especial, a um dos membros mais importantes e influentes do fandom brasileiro, Wagner Regis, que nos deixou após a conclusão deste trabalho. Obrigado por todas as boas lembranças, meu velho amigo.

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“You know what I did this morning? I played the voice of a . Some terrible robot toys from that changed from one thing to another. The Japanese have funded a full-length animated cartoon about the doings of these toys, which is all bad outer-space stuff. I play a planet. I menace somebody called Something-or-other. Then I’m destroyed. My plan to destroy Whoever-it-is is thwarted and I tear myself apart on the screen.” – Orson Welles, sobre o seu papel em The Transformers: The Movie (1986).

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RESUMO

Estabelecer uma marca bem-sucedida exige a oferta de um produto que atenda uma necessidade ou que desperte um desejo no consumidor. Para isso, é importante aplicar o estudo de brand equity que irá definir a identidade e o valor da marca e saber quando é o momento certo para se expandir ou mudar de estratégia. Portanto, o primeiro capítulo deste trabalho apresenta conceitos e definições de autores como Aaker (1998) e Tavares (1998) sobre os cuidados durante todo o processo de criação da marca. No segundo capítulo, é explorada a condição humana não apenas de consumidor, mas de amante de uma marca – um fã – através do neuromarketing, segundo autores como Gonçalves (2013) e Silva (2014). Para o terceiro capítulo, foi aplicada a metodologia de estudo de caso com observação e coleta de dados, definida por Yin (2001), visando realizar uma análise da franquia Transformers e das atividades do seu fandom. Como resultados deste trabalho, destacam-se a notória expansão da marca para diversos tipos de públicos e produtos diferenciados, a presença de muitos consumidores adultos em suas comunidades on-line, e as mudanças na interação entre marca e cliente ao longo das décadas.

Palavras-chave: brand equity, cultura da convergência, lovemark, marca criativa, narrativa transmídia.

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ABSTRACT

Establishing a successful brand demands the offering of a product that meets the needs of the consumer or that arouses the desire inside of them. It is important to apply the study of brand equity to define the identity and value of the brand and to know when is the right moment to expand or change strategies. Therefore, the first chapter of this paper presents the concepts and definitions of authors such as Aaker (1998) and Tavares (1998) about the essential cares during the whole process of creation of the brand. The second chapter explores the human condition of being not only a consumer, but a lover of the brand – a fan – through the study of neuromarketing according to authors such as Gonçalves (2013) and Silva (2014). For the third chapter, the methodology applied was that of a case study with observation and data collection, as defined by Yin (2001), aiming to analyze the Transformers brand and the activities of its fandom. The highlighted results of this paper include the notable expansion of the brand to multiple types of products and audiences, the presence of a large number of adult consumers online and the changes in the relationship between brand and client over the decades.

Keywords: brand equity, convergence culture, creative brand, lovemark, transmedia storytelling.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Esquema de brand equity por Aaker ...... 18

Figura 2 – Divulgação da linha ...... 56

Figura 3 – Divulgação da linha Car Robo ...... 57

Figura 4 – Capa da revista em quadrinhos The Transformers #1 ...... 58

Figura 5 – Cena da série animada The Transformers ...... 60

Figura 6 – Divulgação da linha The Transformers ...... 61

Figura 7 – Exemplos de redeco e retool ...... 62 Figura 8 – Ficha do personagem ...... 63 Figura 9 – Pôster do filme The Transformers: The Movie ...... 64 Figura 10 – Capa da revista Transformers: Generation 2 #1 ...... 65 Figura 11 – Comparação entre o Megatron G1 e o Megatron G2 ...... 66 Figura 12 – Pôster da série animada Beast Wars: Transformers ...... 67 Figura 13 – Divulgação da linha Beast Wars: Transformers ...... 68 Figura 14 – Pôster da série animada Transformers: Car Robots ...... 70 Figura 15 – Divulgação da linha Transformers: Armada ...... 71 Figura 16 – da linha The Transformers: Masterpiece ...... 72 Figura 17 – Pôster do filme Transformers ...... 73 Figura 18 – em cenas do filme Transformers ...... 74 Figura 19 – Comparação entre várias figuras do Optimus Prime ...... 75 Figura 20 – Pôsteres dos quatro filmes lançados entre 2009 e 2017 ...... 75 Figura 21– Pôster da série animada Transformers Animated ...... 76 Figura 22 – Pôster da série animada Transformers: Prime ...... 77 Figura 23 – Segunda abertura da série animada Transformers: Rescue Bots ...... 78 Figura 24 – Comparação entre duas versões de uma mesma figura ...... 79 Figura 25 – Típica embalagem da linha Transformers: Studio Series ...... 80 Figura 26 – Pôster do filme Bumblebee ...... 81 Figura 27 – Comparação entre duas figuras com dez anos de diferença ...... 82 Figura 28 – Comparação entre duas figuras do ...... 83 Figura 29 – Arte promocional da série animada Transformers: Cyberverse ...... 84 Figura 30 – Divulgação da linha Transformers: BotBots ...... 85

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Figura 31 – Versão brasileira da capa da revista Transformers #1 ...... 86 Figura 32 – Alguns produtos da linha Transformers da Estrela...... 87 Figura 33 – Relógio Transformers da Grendene ...... 88 Figura 34 – Divulgação da linha ...... 90 Figura 35 – Cena da revista The Transformers: Megatron Origin #2 ...... 91 Figura 36 – Comparação entre um produto original e um item falsificado ...... 92 Figura 37 – Exemplo de produto não-licenciado ...... 93 Figura 38 – Interface do site Seibertron ...... 95 Figura 39 – Fotografia tirada durante o evento HasCon 2017 ...... 97 Figura 40 – Postagens no Instagram oficial de Transformers ...... 98 Figura 41 – da linha Generations: War for Cybertron...... 100 Figura 42 – Exemplo de customização ...... 101 Figura 43 – Exemplo de revisão em vídeo de uma figura Transformers ...... 102 Figura 44 – Exemplo de produto com defeito de fabricação ...... 114 Figura 45 – Comparações entre Frenzy e Rumble ...... 118

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Ano do primeiro contato com a franquia Transformers ...... 104 Gráfico 2 – Primeiro produto de Transformers que consumiu ...... 104 Gráfico 3 – Período de afastamento antes de retornar à franquia ...... 105 Gráfico 4 – Produtos de Transformers são mais consumidos pelo fandom ...... 106 Gráfico 5 – Alternativa que melhor descreve o que sentem por Transformers...... 106 Gráfico 6 – Personagens favoritos ...... 107 Gráfico 7 – Meios mais usados para consumo de mídias de ficção ...... 108 Gráfico 8 – Questão sobre colecionismo ...... 109 Gráfico 9 – Objetivos da coleção ...... 109 Gráfico 10 – Quantia de itens oficiais na coleção ...... 110 Gráfico 11 – Quantia de itens não oficiais na coleção ...... 110 Gráfico 12 – Opinião sobre a existência de figuras não oficiais ...... 111 Gráfico 13 – Comportamento em relação à compra de Transformers ...... 112 Gráfico 14 – Compras por impulso e arrependimentos ...... 112 Gráfico 15 – Principais meios de aquisição de Transformers...... 113 Gráfico 16 – Serviço de atendimento da Brasil ...... 115 Gráfico 17 – Como são vistas as ações da Hasbro no Brasil ...... 116 Gráfico 18 – Principais atividades dentro do fandom ...... 116 Gráfico 19 – Interações e amizades entre fãs na internet ...... 117 Gráfico 20 – Discussão sobre Rumble e Frenzy ...... 118 Gráfico 21 –Opinião sobre o estado atual da franquia ...... 119 Gráfico 22 – O que acreditam que irá melhorar na franquia nos próximos anos .... 119

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Esquema de metodologias por Yin ...... 53

Tabela 2 – Resumo das eras da franquia Transformers ...... 85

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...... 13

1. GESTÃO DE MARCAS ...... 15

1.1 Conceito de marca e definição do nome ...... 15

1.2 Brand equity e criação de valor ...... 17

1.3 Enfrentando a concorrência ...... 21

1.4 Fabricação do produto e métodos de expansão ...... 24

1.5 Marcas criativas ...... 28

1.5.1 Storytelling e narrativa transmídia ...... 30

2. INTERAÇÕES ENTRE MARCA E CONSUMIDOR ...... 35

2.1 Comportamento e fidelização do consumidor ...... 37

2.2 Definição de neuromarketing ...... 40

2.2.1 Familiaridade e apelo emocional ...... 41

2.2.2 Consumo compulsivo ...... 44

2.3 Cultura da convergência ...... 46

2.3.1 Coleções e trocas residuais entre membros do fandom ...... 49

2.3.2 Controvérsias no fandom e aversão à mudança ...... 51

3. ESTUDO DE CASO SOBRE A FRANQUIA TRANSFORMERS ...... 53

3.1 A concepção da franquia Transformers ...... 54

3.1.1 Takara: a origem japonesa ...... 55

3.1.2 Hasbro: a origem americana ...... 57

3.2 Os 35 anos de história ...... 59

3.2.1 Lançamento e sucesso imediato (1984-1985) ...... 59

3.2.2 Primeiras controvérsias e período de estagnação (1986-1995) ...... 64

3.2.3 A inesperada era dos animais (1996-2000) ...... 67

3.2.4 Co-produções japonesas e o surgimento da nostalgia (2001-2006)...... 69

3.2.5 Produções de Hollywood e expansões constantes (2007-2017) ...... 72

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3.2.6 O presente e o futuro da franquia (2018-2021) ...... 80

3.3 A franquia Transformers no Brasil ...... 86

3.4 Principais concorrências no passado e no presente...... 89

3.5 O fandom de Transformers e a sua relação com a Hasbro ...... 94

3.5.1 Principais ações da Hasbro direcionadas ao fandom ...... 96

3.5.1.1 Campanha HasLab Unicron ...... 99

3.5.2 Principais atividades do fandom de Transformers ...... 101

3.6 Análise da coleta de dados do grupo “Nova Cybertron ATB” ...... 103

CONCLUSÃO...... 120 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...... 122 ANEXO – FORMULÁRIO DE COLETA DE DADOS ...... 128

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INTRODUÇÃO

Em uma era onde os consumidores estão cada vez mais conectados e são capazes de influenciar uns aos outros com mais força do que anúncios publicitários, uma marca precisa trabalhar a sua identidade e sua reputação para manter-se relevante e preservar seus clientes fiéis. Atender a todos os nichos de mercado que seu produto pode abranger e se aproximar dos clientes através de meios virtuais podem ser soluções encontradas para esses problemas, mas não haverá garantia de estabilidade se a empresa não souber se adaptar a cada nova tendência e mudança nas atitudes dos consumidores. O presente trabalho tem como objetivo analisar a franquia Transformers, visando o entendimento de como a marca se adapta às novas tendências do mercado e mantem-se relevante a um crescente grupo de fãs de consumidores, que, por sua vez, dedicam-se a preservá-la com suas próprias ações. Para tanto, serão apresentadas as diferentes etapas da criação de uma marca. No primeiro capítulo será apresentada a definição do que constitui uma marca a partir de autores como Tavares (1998) e Aaker (1998). Também será introduzido e explorado o conceito de brand equity de Aaker (2001) e como é possível criar valor à marca, de acordo com Dooley (2012) e Zanna (2015), assim como a importância de proteger-se da concorrência com métodos apresentados por Kinsella (2011). No segundo capítulo, o uso de criatividade por marcas será explorado conformado Catmull (2014), trazendo conceitos de como desenvolver uma narrativa levantados por Parente (2016) e da narrativa transmídia, que levou ao surgimento da cultura da convergência definida por Jenkins (2009, 2016). Esta também é responsável pela aproximação entre marca e consumidor, como denota Strunck (2012). O comportamento e a fidelização do consumidor são descritos por Kahneman (2012) e Silva (2014) e ampliados pelo estudo do neuromarketing como observado por Gonçalves (2013). Este embasamento objetiva suportar um estudo de caso, conforme definido pelos conceitos de Vergara (1998) e Yin (2001), realizado sobre a franquia Transformers, uma marca que adapta-se aos seus diferentes públicos e procura alinhar-se cada vez mais com os desejos e vontades de seus consumidores. O estudo visa também analisar o lado dos clientes, entender o que os leva a consumir e como ocorrem as interações entre si e com a marca que seguem, mediante

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observação de suas atividades on-line em sites criados por fãs e no grupo brasileiro de Facebook, “Nova Cybertron ATB”; neste último serão apresentados os resultados de uma coleta de dados para dar suporte à análise do comportamento do fandom da franquia. Com uma história que se estende por mais de três décadas e diversas gerações, a franquia Transformers e seus fãs podem ensinar muito a estudiosos de marketing e publicidade.

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1. GESTÃO DE MARCAS

Em um mundo cada vez mais industrializado e repleto de produtos tão semelhantes, o conceito de marca elevou-se como algo extremamente importante para estabelecer o diferencial de cada fabricante, baseando-se na imagem e nos valores que pretendem transmitir ao público consumidor. É assim que Silva (2014) define a presença das marcas na atualidade. Elas conferem alma e personalidade aos seus produtos e, por causa disso, incentivam as corporações a investir bilhões de dólares em seus nomes.

1.1 Conceito de marca e definição do nome

Segundo Tavares (1998), marcas já existem há muitos séculos. No antigo Egito, fabricantes de tijolos costumavam identificar seus produtos com símbolos e, na Europa Medieval, a marca era usada para garantir qualidade ao consumidor e conferir proteção ao fabricante. Já no século XVI surgiram as marcas registradas, conceito que corresponde ao direito exclusivo do proprietário de usar os bens e serviços aos quais a marca se aplica. Mas foi no século XVIII que o conceito evoluiu ao propósito de associar o nome do produto à marca, com o intuito de tornar tanto o produto quanto a marca mais fáceis de serem lembradas. Aaker (1998) complementa que, embora existentes por todo esse tempo, os conceitos de branding e associações de marca tornaram-se centrais para os fabricantes apenas no século XX, quando a estratégia de marketing voltou-se à diferenciação de marcas concorrentes.

Uma marca é um nome diferenciado e/ou símbolo (tal como um logotipo, marca registrada, ou desenho de embalagem) destinado a identificar os bens ou serviços de um vendedor ou de um grupo de vendedores e a diferenciar esses bens e serviços daqueles dos concorrentes. Assim, uma marca sinaliza ao consumidor a origem do produto e protege, tanto o consumidor quanto o fabricante, dos concorrentes que oferecem produtos que pareçam idênticos (Aaker, 1998, p. 7).

Tavares (1998) define marca como um nome, signo ou símbolo associado a bens e serviços que aumenta o valor dos mesmos além de seus propósitos funcionais, podendo ser combinado com a promessa de vantagens e benefícios. Empresas que utilizam marcas para diferenciar suas ofertas procuram ser as únicas

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a atender expectativas de consumidores específicos. Elas devem fazer isso de forma rápida e consistente, proporcionando benefícios funcionais, experienciais e simbólicos sob condições economicamente viáveis. Essa estratégia pode levar à lembrança, preferência e lealdade por parte dos consumidores. Para isso, é importante compreender a diferença entre o que é marca e o que é produto. “O produto é o que a empresa fabrica, o que o consumidor compra é a marca. Os produtos não podem falar por si: a marca é que dá o significado e fala por eles. O produto tem um ciclo de vida, a marca não” (TAVARES, 1998, p. 17). É comum que marcas novas que oferecem apenas um produto inicial sejam confundidas com o que produzem, mas a tendência é que haja uma mudança nessa percepção conforme a marca estabelece sua própria identidade e passa a oferecer novos produtos. A identidade de marca, para Tavares (1998), é um conjunto único de características nas quais a empresa deve se apoiar para satisfazer consumidores e seus próprios membros. Ela é normalmente construída a partir do contexto dos seus primeiros produtos e por meio de ações deliberadas, e deve estabelecer um relacionamento entre marca e cliente a fim de gerar uma proposição de valor. A sua construção tem início pela escolha do nome da marca. O nome, também conhecido como marca nominal, é a parte da marca que pode ser verbalizada e escrita, independente de um símbolo de identificação, podendo ser um conjunto de letras, uma sigla ou uma ou mais palavras. É preferível que o nome seja fácil de compreender, pronunciar, soletrar e memorizar; é preciso, porém, evitar nomes descritivos demais que possam transformar a marca em sinônimo de um produto genérico. Quando a marca dá um passo além e começa a batizar cada um de seus produtos com nomes próprios, eles se tornam marcas nominais individuais.

Os nomes são importantes porque denotam significados e informações e se prestam a muitas funções. O nome dá status legal, confere distinção e consolida a reputação. Identifica pessoas, coisas e objetos, permitindo que o ser humano estabeleça comunicação que os envolva (TAVARES, 1998, p. 4-5).

Segundo Aaker (1998), a criação do nome é importante demais para ser decidida em uma única sessão de brainstorming1 entre poucas pessoas. Além disso, o nome é muito mais permanente do que a maioria dos outros elementos da marca;

1 Brainstorming, ou brainstorm, refere-se à reunião de diversas pessoas para gerar ideias e contribuições espontâneas a fim de solucionar um problema de modo criativo.

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uma embalagem, um preço ou uma campanha podem ser alterados com muito mais facilidade do que o nome. Por isso, um dos aspectos mais importantes da decisão é evitar associações a concorrentes; algumas marcas até podem tentar tirar proveito disso gerando confusão nos clientes, mas o ideal é criar uma marca que seja distinta das demais do mercado. Um critério primordial é que o nome possa ser registrado. Para isso, ele deve ser suficientemente diferente de outros nomes já existentes e precisa ser mais do que simplesmente descritivo do produto ou serviço oferecido pela marca. Assim que um nome é registrado, ele se torna protegido e não pode ser utilizado por outras marcas que competem pelos mesmos clientes; até mesmo palavras parecidas mas que não são idênticas podem se tornar proibidas, para evitar que sejam usadas para confundir o consumidor. Portanto, é necessário checar a concorrência antes de definir o nome de uma nova marca. Para muitos, o nome da marca e o que ele representa são o seu ativo mais importante, a base da vantagem competitiva e de ganhos futuros; mas uma boa marca nominal não se sustenta sozinha. Tavares (1998) afirma que é preciso desenvolver outros aspectos da identidade que resultam dos esforços de pesquisa, inovação e comunicação que são agregados durante o processo. Esse estudo sistematizado da construção de identidade e valor de uma marca é chamado de brand equity.

1.2 Brand equity e criação de valor

Segundo Aaker (1998), o brand equity é um conjunto de ativos e passivos ligados a uma marca que se somam ou se subtraem do valor proporcionado por um produto ou serviço para uma empresa e seus consumidores. Esses ativos e passivos podem variar dependendo do contexto no qual a marca está inserida, mas comumente se agrupam em cinco categorias: lealdade à marca; conhecimento do nome; qualidade percebida; associações em acréscimo à qualidade percebida; e outros ativos da empresa, tais como patentes, marcas registradas, relações com os canais de distribuição etc. O conceito de Aaker (1998) é demonstrado por uma representação gráfica (figura 1) que explica como ocorre a geração de valor de uma marca através do brand equity e todas as suas associações.

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Figura 1 – Esquema de brand equity por Aaker (1998).

Fonte: Adaptado de AAKER, 1998, p. 18.

O brand equity pode ajudar o consumidor a interpretar, processar e acumular grande quantidade de informações sobre marcas e produtos; podem também afetar a sua confiança na decisão de compra devido às suas experiências passadas ou à sua familiaridade com a marca. Mas o mais importante é que, tanto a qualidade percebida quanto as associações da marca, podem aumentar a satisfação do consumidor com a experiência de utilização. Mesmo quando não sejam centrais na escolha da marca, podem dar segurança e reforçar a lealdade na hora da compra.

O brand equity pode dar novo impulso ao canal de distribuição. Tal como os consumidores, o comércio é menos inseguro quando lida com uma marca que já tenha conquistado reconhecimento e associações. Uma marca forte terá a vantagem de ganhar tanto o destaque na gôndola quanto a cooperação na implementação de programas de marketing (AAKER, 1998, p. 19).

Além da importância da marca nominal, outros ativos que dão valor à marca incluem símbolos ou logos, slogans, jingles, atributos e diversos benefícios. Strunck (2012) descreve símbolo como um gráfico ou desenho que, com o uso, passa a identificar a marca visualmente. Qualquer desenho pode ser considerado um símbolo se um grupo de pessoas o entender como a representação de algo além dele mesmo; no caso, deve explicitar por meio de suas formas e cores o conceito da marca. Também é comum empresas adotarem personagens que se movimentam e possuem “vida própria” para representá-las, por serem distintos o suficiente e

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diferentes do símbolo, que é uma versão única e estática do desenho. Estes podem ser um mascote2 ou uma persona3; Para Tavares (1998), os símbolos precisam ser deliberadamente escolhidos para refletir a personalidade da marca, protegê-la e promover os seus produtos; algumas vezes, porém, precisam ser revitalizadas para se adaptar às mudanças dos tempos. De acordo com Aaker (1998), o símbolo pode criar conhecimento, associações e sentimentos que afetam a lealdade e a qualidade percebida pelos consumidores. É também mais fácil aprender a marca visual do que a marca nominal, o que torna o símbolo um ativo indispensável para a consolidação da marca.

Um símbolo poderoso pode proporcionar coesão e estrutura a uma identidade, facilitando a obtenção de reconhecimento e a recordação. Sua presença pode ser um componente fundamental do desenvolvimento de uma marca e sua inexistência pode constituir uma deficiência substancial. A elevação dos símbolos ao status de componente da identidade reflete seu poder potencial (AAKER, 2001, p. 97).

O slogan, segundo Tavares (1998), é uma frase ou sentença usada repetidamente na propaganda de uma empresa, produto ou serviço; é o comando para relações internas e externas. Aaker (1998) acredita que o slogan pode fazer uma grande diferença; o elo com o consumidor pode ser mais forte porque envolve uma característica do produto que pode ser visualizada, assim, vale a pena estabelecer uma sentença fortemente aliada à marca. Uma poderosa fonte de slogans é a metáfora, que denota um conceito no lugar do outro, sugerindo uma semelhança entre eles; é uma forma compacta de comunicar uma ideia complexa. No referente a jingles4 e efeitos sonoros, Dooley (2012) observa que a maioria das empresas não está disposta a mudar sua identidade corporativa, com logos que frequentemente duram décadas com apenas pequenos ajustes, ao mesmo tempo em que poucas conseguem resistir à tentação de trocar suas marcas sonoras a cada poucos anos ou com cada produto. Essa pode não ser a mais correta atitude, visto que um bom audio branding pode se tornar verdadeiramente

2 Mascote é o desenho de uma pessoa, animal ou objeto – geralmente antropomorfizado nos dois últimos casos – criado para servir como representante visual da marca, mas que pode ter uma personalidade distinta bem desenvolvida. 3 Persona é a representação fictícia de um cliente da empresa, criado com base em dados demográficos reais e usado para guiar os processos de criação de marketing da marca. 4 Jingle é uma produção musical publicitária de curta duração, criada para uso exclusivo da marca e desenvolvida para ser lembrada com facilidade.

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reconhecido pelos consumidores; o segredo está na constante repetição do som, que gera a familiarização. “Alguns sons têm a capacidade de fazer recordar, em milionésimos de segundo, uma situação, uma pessoa, um produto ou marca, um filme, uma mensagem” (ZANNA, 2015, p. 19). Zanna (2015) descreve o audio branding, também conhecido como sound branding, como uma ampla categoria responsável por traduzir em sons as características diferenciais da marca em uma identidade sonora, que será aplicada em múltiplas plataformas, como rádio, televisão e internet. Essa identidade é, muitas vezes, composta por três etapas distintas: o logo sonoro, os sons incidentais e uma seleção de músicas associadas. O logo sonoro, segundo Zanna (2015), é uma melodia marcante, que pode ou não conter vocais, com duração de cerca de três segundos, usada como assinatura em toda comunicação da marca. Já os sons incidentais, conhecidos como sound design, são sons característicos usados com exclusividade pela marca em diversas ocasiões, e se tornam identificadores de seus produtos. Por fim, o music branding é uma seleção de músicas que definem a abrangência dos estilos musicais alinhados à personalidade da marca, ou seja, as músicas que sempre tocam em associação à marca e seus pontos de venda. Dando continuidade aos ativos de brand equity, temos os atributos, que são aspectos descritivos responsáveis por caracterizar o produto. Tavares (1998) menciona que os atributos podem assumir uma variedade de formas, podendo ser relacionados ou não ao produto. Os relacionados podem ser definidos como os ingredientes necessários ao seu desempenho. Os não relacionados são os aspectos externos relativos à sua compra ou consumo, tais como preço, embalagem, informações sobre o produto e a imagem de uso, que demonstra onde e em qual situação o produto é usado. Os benefícios, por sua vez, são valores pessoais que o consumidor vincula aos atributos e, segundo Tavares (1998), podem ser classificados em três tipos. O primeiro é o benefício funcional, baseado em atributos que proporcionam utilidade funcional ao consumidor; correspondente às vantagens intrínsecas relativas ao consumo do produto e frequentemente ligado a motivações básicas como necessidades fisiológicas, de segurança e de aceitação. Esse benefício pouco diferencia o produto, dificultando a sua proteção contra a concorrência.

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O segundo, ainda de acordo com Tavares (1998), é o benefício experimental, que se refere ao sentimento de uso ou consumo do produto e aos atributos a ele relacionados, tais como os prazeres sensoriais. Refere-se a um sentimento positivo que o produto proporciona ao consumidor, podendo também ser de natureza emocional. O terceiro e último é o benefício simbólico, que corresponde às vantagens mais extrínsecas ao consumo, como as necessidades de aprovação social, expressão pessoal e autoestima. Refere-se aos vários papéis desempenhados pelos consumidores, que, por sua vez, podem valorizar prestígio, exclusividade ou modernidade, à medida em que a marca legitime e dê visibilidade aos seus conceitos.

Os valores podem ser sociais ou pessoais, ambos influenciando a compra e consumo de produtos. Os valores sociais definem o comportamento aceito por um grupo ou sociedade. Os pessoais definem o comportamento aceito por um indivíduo. Em sua dimensão social, aflora a pressão de conformidade exercida pelo grupo. Já o nível pessoal reflete as escolhas que um indivíduo faz em meio a uma variedade de valores sociais ou sistema de valores aos quais é exposto (TAVARES, 1998, p. 111).

Abordando a questão do valor da marca, Aaker (2001) revela que empresas japonesas em geral encaram suas estratégias de forma muito diferente de outros países, pois se preocupam obsessivamente com sua imagem e colocam suas marcas em uma ampla variedade de produtos, tornando-as uma grande marca guarda-chuva. Por se interessarem muito pela forma como são percebidas pelas pessoas, estas empresas se preocupam com o impacto de suas identidades sobre seus funcionários tanto quanto sobre seus clientes. Suas prioridades máximas são a inovação, o sucesso e a responsabilidade social; elas não se preocupam tanto com reputação de qualidade porque, no Japão, esse já é o mínimo esperado de todas as empresas.

1.3 Enfrentando a concorrência

Um dos maiores obstáculos para o sucesso de qualquer empresa é a concorrência. Segundo Aaker (2001), novos e vigorosos concorrentes aparecem de várias formas, deixando menos lacunas a serem exploradas no mercado. Além disso, concorrentes desesperados podem assumir riscos ou experimentar abordagens incomuns que podem desestabilizar a dinâmica competitiva.

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Tavares (1998) coloca que o acirramento da concorrência, a maior semelhança entre produtos em um espaço de tempo cada vez menor e a crescente sensibilidade do consumidor ao preço, levam a uma pressão contínua para a redução de custos no preço final do produto. Os concorrentes também apresentam um grau de incerteza muito elevado em relação ao mercado; enquanto alguns são extremamente inovadores em certos aspectos, como práticas mercadológicas, outros oferecem produtos sem diferencial significativo, que enfatizam baixos preços e promoções ao invés do valor da marca, e não buscam se tornar mais fortes. A motivação para se copiar qualquer coisa bem-sucedida, observa Aaker (2001), existe porque os riscos da cópia compensam pela dificuldade de se criar novas alternativas.

Existe um incentivo para se conservar estático o campo de batalha competitivo; qualquer modificação seria não apenas custosa e arriscada, mas também poderia fazer com que o investimento anterior tivesse um retorno muito reduzido (ou até mesmo torná-lo obsoleto). O resultado é a vulnerabilidade aos concorrentes agressivos que podem vir de outras áreas, com pouco a perder e com nenhuma das inibições que pesam sobre os participantes do ramo (AAKER, 2001, p. 43).

Strunck (2012) menciona que um dos maiores problemas enfrentados por marcas valorizadas são as falsificações, cópias de baixa qualidade que se aproveitam dos valores da marca e dão grande aborrecimento aos consumidores, que por sua vez podem ingenuamente culpar as marcas verdadeiras pelas falhas de suas imitações. Até mesmo embalagens podem ser criadas à semelhança de outras marcas, o que pode resultar em processo. Para Tavares (1998), a tentativa de criar um produto idêntico ao de uma marca pode fracassar e acabar reforçando a preferência dos consumidores pelo produto original. Tavares (1998) adiciona ainda que saber como os concorrentes são percebidos é importante para a constatação de pontos de distinção entre eles e a própria empresa, podendo contar com indicações de posicionamento estratégico. A concorrência também é afetada por inovações tecnológicas que influenciam a estrutura de custos para novos produtos e podem até mudar os hábitos do consumidor. Os distribuidores podem funcionar em apoio à busca de informações, uma vez que dispõem de estatísticas e de dados que derivam do comportamento de compra do consumidor. Os consumidores, por sua vez, são a melhor fonte da imagem atual da concorrência.

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O segredo para combater o avanço da concorrência está na lealdade. De acordo com Dooley (2012), a mente é programada para querer fazer parte de um ou mais grupos; marcas que se propõem a reunir seus consumidores em um grupo descobrem que seus esforços são alavancados pela necessidade de pertencer dos próprios consumidores. Por essa razão, os consumidores muitas vezes cultivam antipatia por outras marcas e seus grupos. “Algumas vezes, a melhor coisa para a marca é ter um inimigo: uma marca concorrente que possa ser alvo de animosidade dos anúncios e dos clientes” (DOOLEY, 2012, p. 67).

A lealdade da base de consumidores reduz a vulnerabilidade da ação competitiva. Os concorrentes podem ver-se desencorajados a investir recursos para atrair consumidores satisfeitos. Uma alta lealdade implica, ainda, melhores negócios com o comércio, uma vez que os consumidores leais esperam que a marca esteja sempre disponível (AAKER, 1998, p. 19).

Kinsella (2011) define quatro métodos legais que podem e devem ser utilizados para proteger suas criações contra o uso ou a imitação por concorrentes: 1) A lei da marca registrada, que previne os competidores de usarem palavras e símbolos similares em seus produtos. Uma marca registrada precisa ser renovada a cada 10 anos; 2) A propriedade intelectual, que abrange diversos direitos legalmente reconhecidos sobre algum tipo de criatividade. Em suma, é o direito sobre ideias conforme expressas ou materializadas em uma aplicação prática; 3) Direitos autorais, que concebem ao autor de um trabalho original o direito exclusivo de reprodução, derivação e apresentação pública de sua obra. O direito autoral tem duração automática de toda a vida do autor mais setenta anos após a sua morte, mas protege apenas a forma de expressão das ideias e não as ideias em si; 4) Patente, o direito sobre invenções que desempenhem uma função considera “útil”. A patente garante ao inventor um monopólio limitado de uso e venda do produto por até vinte anos, quando deixa de ser protegida. Para Aaker (1998), patentes, marcas registradas e canais de distribuição são muito valiosos no impedimento de ações dos concorrentes. A marca registrada pode proteger o brand equity contra aqueles que tentarem confundir os consumidores mediante o uso de nomes e características semelhantes. Uma patente forte e relevante ao consumidor pode impedir a concorrência direta. Um canal de distribuição pode ser controlado por uma marca em função do histórico de sua performance. Uma vez que uma marca desenvolva seu produto e tome as devidas

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providências para protegê-lo, o mesmo precisa passar pelo processo de fabricação em massa a fim de ser distribuído em um mercado, seja ele nacional ou internacional, em grandes quantidades, de modo a cobrir a demanda por parte de comerciantes e consumidores, evitando assim que se crie uma escassez ou mesmo uma brecha para concorrentes.

1.4 Fabricação do produto e métodos de expansão

Catmull (2014) relata como a indústria japonesa transformou-se de uma das mais precárias e inferiores existentes para a mais avançada e influente no planeta. Após os danos causados pela Segunda Guerra Mundial, o Japão foi deixado com uma infraestrutura decadente e estigmatizada por produtos de qualidade extremamente duvidosa. Enquanto isso, a indústria norte-americana prosperava graças ao modelo revolucionário de linha de montagem desenvolvido pela pioneira Ford Motor Company5, que garantia a produção de seus automóveis em grandes quantidades através da prática de levar o produto de um trabalhador para outro por meio de máquinas transportadoras.

O mantra da produção em massa passou a ser: manter a linha de montagem em movimento, apesar de tudo, porque assim a eficiência era mantida alta e os custos, baixos. Tempo perdido equivalia a dinheiro perdido. Se um determinado produto na linha estivesse com defeito, era tirado dela imediatamente, mas a linha era sempre mantida em movimento. Para se certificar de que os produtos restantes estavam perfeitos, você confiava em inspetores de controle de qualidade. A hierarquia prevalecia. Somente altos gerentes dispunham de autoridade para interromper a linha (CATMULL, 2014, p. 57-58).

A mudança teve início quando, em 1947, o estatístico americano W. Edwards Deming, especializado em controle de qualidade, chegou ao Japão e envolveu-se com o esforço de reconstrução do país, ensinando à população suas teorias de como melhorar a produtividade. Com o tempo, afirma Catmull (2014), as técnicas de Deming receberam alcunhas como “manufatura just-in-time” e “controle total da qualidade”. A diferença fundamental entre o modelo original de linha de montagem da Ford e o modelo revisado de Deming era que, enquanto o primeiro só podia ser

5 Ford Motor Company é uma das maiores e mais populares fabricantes de veículos automotivos do planeta. Foi fundada em 1903 por Henry Ford nos Estados Unidos.

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interrompido por membros da alta gerência e não parava nem mesmo devido à presença de produtos defeituosos, o segundo encorajava que a produção fosse interrompida a qualquer momento e por qualquer funcionário. Essa pequena mudança de atitude permitia que até mesmo o operário de mais baixo cargo envolvido na montagem pudesse identificar problemas e sugerir correções antes de retomar a produção, o que levou a indústria japonesa a atingir um nível inédito de qualidade, produtividade e participação de mercado. “Em outras palavras, a linha de montagem japonesa tornou-se um lugar em que o empenho dos trabalhadores fortaleceu o produto resultante. E isso acabaria por transformar a manufatura no mundo inteiro” (CATMULL, 2014, p. 58). Além do processo de fabricação em si, existem estratégias que vêm sendo usadas pelas empresas a fim de oferecer produtos que não apenas cumpram as necessidades dos consumidores, mas que também sejam viáveis para públicos diferentes. Em outras palavras, o produto precisa “caber no bolso” do consumidor. Ao mesmo tempo, é preciso ter consciência de que um consumidor com mais poder aquisitivo pode estar disposto a pagar por um produto mais caro, desde que o mesmo seja melhor do que um produto equivalente que possa ser adquirido por um consumidor menos favorecido. “O pressuposto de que os custos definem os preços já não é verdade universal. Hoje, a questão é saber quanto os consumidores estão dispostos a pagar pelo que lhes é oferecido” (STRUNCK, 2012, p. 52). A solução encontrada pelas fabricantes, segundo Dooley (2012), tem sido oferecer vários níveis de um mesmo tipo de produto. É possível, por exemplo, produzir uma versão básica, menor ou mais simples, e uma versão mais elaborada, maior ou com mais funções, além de talvez uma outra versão que seja “a melhor de todas”. O truque está em descobrir o número certo de opções; o suficiente para que cada consumidor consiga encontrar a versão de maior custo-benefício para seus interesses, mas não tantas que possam confundir e desmotivar o consumidor. Opções demais também correm o risco de não vender bem, pois certas versões podem nunca ser escolhidas e assim acabam sobrando nas prateleiras das lojas. Em geral, cada versão do produto recebe preços de níveis variados, que podem ser resultado dos diferentes custos de fabricação ou mesmo uma tentativa de valorizar uma versão mais que outra. De acordo com Silva (2014), o grau de exclusividade é um fator importante para tornar um produto bem mais valorizado do

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que ele seria se fosse mais fácil de adquirir. Quanto menos compartilhado for o objeto, maior é o seu valor e o status de quem o possui. Após a fabricação e a introdução no mercado, o produto terá um ciclo de vida relativamente curto. O principal motivo, segundo Aaker (1998), é devido a muitas empresas, em especial as americanas, serem fortemente influenciadas por acionistas a obterem resultados financeiros trimestrais. Essa pressão tem levado as empresas a desenvolverem novos produtos que substituem os seus antecessores a velocidades cada vez maiores. Mas outra razão também pode ser identificada para justificar mudanças a longo prazo: como Aaker (2001) descreve, o mercado não é estático, ou seja, os contextos podem se modificar, os gostos dos clientes podem evoluir e a tecnologia pode apresentar novos desafios, entre outros fatores. É fundamental compreender essas mudanças de paradigmas, pois uma execução de sucesso pode se tornar insuficiente em novos ambientes.

A marca está vinculada a gerações. As pessoas adultas continuam a preferir as marcas de que gostavam na infância. Estruturalmente, a marca pode variar de geração para geração, mas tende a tornar-se íntima e permanente. A marca revela o significado e a direção dos antigos e dos futuros produtos. Ela, por assim dizer, explica por que eles existem, de onde vieram e para onde vão. Refere-se a uma construção feita diariamente, que precisa se adaptar às mudanças ambientais e de comportamento dos consumidores. A permanência de uma marca precisa estar vinculada à manutenção de valores duráveis (TAVARES, 1998, p. 20).

A oferta de diferentes versões de um mesmo produto somada às mudanças a curto e longo prazos são fatores que dão início às chamadas extensões de linha. Aaker (2001) adverte que esse modelo de execução pode tornar a marca menos concentrada e mais difícil de ser comunicada, mas, em contrapartida, pode ampliar a base de usuários, proporcionar variedade, energizar a marca, criar inovação e bloquear ou inibir os concorrentes. Tavares (1998) descreve extensão de linha como o uso da marca para uma nova oferta ou classe de produto. Ela utiliza características da identidade do produto anterior e adiciona ou elimina outros aspectos relevantes ou irrelevantes ao novo produto. O lançamento de extensões é uma decisão natural para o crescimento de qualquer empresa, visto que os novos produtos refletem seus esforços para conquistar novos consumidores e manter-se relevante no mercado.

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Um caminho óbvio para produzir crescimento é entrar numa área nova de mercado com potencial de crescimento adicional. Até então, esse mercado pode não ter estado pronto para o produto, ou porque o preço era excessivo, ou porque, talvez, nenhuma empresa tivesse sequer pensado nesse mercado. De qualquer forma, ele pode representar o potencial de vendas inexploradas para a indústria (AAKER, 1998, p. 262).

Strunck (2012) afirma que existem dois tipos de extensão: vertical, quando a marca é aplicada a um novo produto da mesma categoria do anterior, porém com qualidades e características diferentes; e horizontal, quando a marca é aplicada a um produto de outra categoria. Na extensão horizontal, é preciso muito cuidado para que a nova categoria seja capaz de transmitir a mesma identidade da marca presente em seu produto original, garantindo uma transferência direta das qualidades que lhe são atribuídas. Para Aaker (1998), o valor da extensão dependerá da atração da nova categoria e de como a marca se ajustará a esse novo ambiente. Uma nova tendência que pode ajudar as marcas a expandirem, ao mesmo tempo em que potencialmente reduzem a concorrência, é caracterizada por Tavares (1998) como a marca compartilhada. Essa alternativa consiste em unir duas marcas para aumentar o benefício para os consumidores. Os ativos e as competências entre as empresas são “somados” para o lançamento de novos produtos ou desenvolvimento de sinergias das suas habilidades mercadológicas. Uma das maneiras de desenvolver marcas compartilhadas é fazer um ingrediente ou componente de uma das marcas tornar-se parte de um produto de outra marca. Outra maneira consiste em unificar uma marca habilidosa na fabricação com uma marca especializada na comercialização.

As marcas compartilhadas são um caso típico de busca de sinergia, em que os gastos e os riscos no lançamento de novos produtos são compartilhados e a probabilidade de seu sucesso aumenta. Há, ainda, as economias de custo. Cada organização já possui seu próprio custo de manufatura e propaganda, minimizando, assim, o custo incorrido na inovação (TAVARES, 1998, p. 55).

Aaker (2001) também defende a união de marcas como uma busca por sinergia. As marcas conjuntas partilham de investimentos para lançar novos produtos, mas também correm os mesmos riscos. Essa combinação ainda pode trazer pontos de diferenciação para a marca compartilhada. É preciso “encontrar o entrosamento correto e solucionar os problemas de implementação gerados pelo

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trabalho conjunto de duas organizações com sistemas e culturas diferentes” (AAKER, 2001, p. 322). Uma forma menos complexa de sinergia entre marcas e que vem ganhando uma enorme importância é o licenciamento. Strunck (2012) o define como a autorização do uso da propriedade intelectual de uma marca por outra, normalmente de um setor diferente da indústria. Além do objetivo de gerar lucros extras, esse acordo propicia a expansão da imagem da marca para outros segmentos do mercado. O licenciamento teve origem em Hollywood, onde personagens de filmes e desenhos animados começaram a ser licenciados para serem estampados em produtos de diversas categorias e múltiplas fabricantes. A influência do licenciamento de personagens do cinema e da televisão para a divulgação de marcas e produtos revelou um potencial até então pouco explorado, mas que viria a se concretizar como uma das estratégias mais poderosas e propagadas da atualidade: o uso da criatividade para contar histórias e conquistar o consumidor.

1.5 Marcas criativas

Silva (2014) acredita que só o que precisa ser feito é “batizar” os produtos com marcas poderosas e desejadas para que recebam um significado extraordinário. Semelhantemente, Dooley (2012) afirma que o nome pelo qual chamamos um produto influencia nossa percepção de suas características e suas vendas. Tais afirmações, porém, podem não se tornar realidade em casos de marcas que falhem em causar um impacto positivo em seu público-alvo e, para evitar que isso aconteça, é preciso saber usar e abusar da criatividade na hora de estabelecer uma marca de sucesso.

Em empreendimentos criativos, é preciso enfrentar o desconhecido. Mas se o fizermos com viseiras – se afastarmos a realidade em nome de manter as coisas simples –, não iremos nos distinguir. Os mecanismos que nos mantêm a salvo de ameaças desconhecidas foram embutidos em nós antes de os nossos ancestrais estarem combatendo tigres-de-dentes-de-sabre com varas. Mas quando o assunto é criatividade, o desconhecido não é nosso inimigo (CATMULL, 2014, p. 155).

Para levar o consumidor a realizar a compra efetiva, Gonçalves (2013) sugere o uso da criatividade para desafiá-lo e fidelizá-lo à marca e a seus produtos. A forma mais simples de obter uma reação cerebral é através do uso de emoções

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em suas mensagens publicitárias. Expressões de humor, amor, revolta e drama enriquecem o discurso deliberativo dos anúncios e incentivam o envolvimento dos consumidores. É aí que entram as pessoas criativas responsáveis pelo desenvolvimento dessas marcas, em especial o gerente de criação, como descreve Catmull (2014). O gerente tem a função de tomar decisões por meio de boas razões que, por sua vez, provocam outras decisões. Muitas vezes, problemas podem surgir em que a solução se torna um empreendimento de várias etapas, ou seja, podem causar danos colaterais que também terão de ser corrigidos mesmo após a remoção do erro original. Esses imprevistos, porém, são parte fundamental do processo criativo. Segundo Dooley (2012), o escritor Herbert Wray (2009) acredita que, quando lemos, nosso cérebro não está passivo; ele ativa “roteiros” com base em experiências do mundo real, ou seja, expressa sensações semelhantes a lembrar ou imaginar um acontecimento real. Para Catmull (2014), escritores talentosos são capazes de descobrir maneiras de atrair a atenção dos leitores e descreve a importância de uma equipe criativa de forma clara: “se você der uma boa ideia para uma equipe medíocre, ela irá estragá-la. Se der uma ideia medíocre para uma equipe brilhante, ela irá consertá-la ou jogá-la fora e propor algo melhor” (CATMULL, 2014, p. 80). Mas nem tudo que se planeja pode ser executado. Catmull (2014) comenta que todo e qualquer empreendimento criativo possui uma longa lista de características que disputam entre si pelo pouco espaço, enquanto nos esforçamos para incluir o máximo possível. Mas há sempre um momento em que essa lista precisa ser refinada e alguns planos, descartados. A aplicação de um prazo final pode ser determinante para forçar a tomada de decisões entre o que é absolutamente necessário e viável para a realização do projeto.

Para envolver a mente dos consumidores em potencial, escreva uma história realista incluindo seu produto ou marca. Adicione ação, movimento, diálogo e outros aspectos que ativarão diferentes partes do cérebro de seus clientes. Essa abordagem funcionou para os melhores redatores publicitários e para os anúncios mais bem-sucedidos da história, e pode funcionar para você (DOOLEY, 2012, p. 175).

Apenas uma história interessante, porém, pode não ser o suficiente para sustentar uma marca de entretenimento no mercado atual. Sabendo disso, Jenkins

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(2009) relata que um experiente roteirista de cinema lhe explicou certa vez que, no começo de sua carreira, uma boa história era tudo para se ter um filme de verdade. Depois, com a popularização das sequências, era preciso criar um personagem que fosse capaz de protagonizar mais de uma história. Hoje já é necessário elaborar um universo inteiro habitado por dezenas de personagens que vivenciam múltiplas histórias paralelas através de várias mídias diferentes que vão além dos filmes. Esse novo modelo de contar histórias, que se popularizou rapidamente, é chamado de narrativa transmídia.

1.5.1 Storytelling e narrativa transmídia

Para compreendermos como uma história pode ser expandida através de diferentes mídias, precisamos antes entender como a mesma é transmitida. Parente (2016) descreve que uma história pode ser contada de várias maneiras, seja através da palavra, da escrita, de imagens ou de uma combinação do todo, desde que siga certas estruturas que cativam o interesse. Esse processo é chamado de storytelling. Segundo Parente (2016), a estrutura mais comum aplicada a narrativas envolventes costuma responder às seguintes perguntas: “o quê?”, a ação que será narrada; “quando?”, em que tempo acontece o fato; “onde?”, local onde se passa a história; “quem?”, os personagens participantes; “por quê?”, causa ou razão pela qual ocorre o fato; e “como?”, o modo no qual o enredo se desenrola. Enredo é o termo que descreve a sequência de eventos narrados, que geralmente se divide em quatro momentos: apresentação, onde são introduzidas informações básicas como personagens, tempo e cenário, enquadrando o público ao seu ambiente; desenvolvimento, onde os personagens são colocados em frente a um conflito que precisa ser solucionado; clímax, o expoente máximo do conflito, onde a trama atingirá o seu ponto mais dramático; e desfecho, a parte final que revela o resultado do conflito, se houve solução ou não, e as suas consequências, sejam elas boas ou ruins. Além da estrutura, existem também diferentes gêneros que podem ser utilizados e mesclados para dar o tom certo à narrativa e chamar a atenção do público desejado, como drama, aventura, romance, terror e comédia, entre outros.

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Nesse universo multiconectado que vivemos, o storytelling é uma das ferramentas mais poderosas para a conquista de atenção e empatia na gestão de marcas. Quando bem aplicado, ele adiciona valores humanos às marcas, sem a necessidade de superexposição, anúncios ou mesmo exibir o produto (PARENTE, 2016, p. 4).

O uso de storytelling por marcas criativas vem levando muitos consumidores a desenvolverem um forte apego aos produtos e ao que eles representam; esses consumidores passam a ser identificados como fãs. Jenkins (2009) observa que, em resposta, as corporações vêm buscando novos meios e artifícios que envolvam ainda mais a participação do público, dentre eles: a extensão, uma forma de expandir mercados potenciais movimentando conteúdos por diferentes sistemas de distribuição; a sinergia, que representa a oportunidade econômica em se possuir e controlar todas essas manifestações; e a franquia, o empenho coordenado em inserir a marca em conteúdos ficcionais seguindo as mesmas condições. Esses esforços corporativos resultaram no surgimento da narrativa transmídia, que faz uso de extensão, sinergia e franquia além de trazer novas exigências aos consumidores. Para Jenkins (2009), a narrativa transmídia é a arte da criação de um universo, onde a história se desenrola por meio de múltiplas plataformas de mídia, com cada novo texto contribuindo de forma distinta para o todo. Em outras palavras, ela é como um quebra-cabeça em que cada peça representa uma mídia diferente e todas são igualmente importantes para se obter uma imagem completa. Para se aproveitar ao máximo a experiência do universo transmidiático, os consumidores assumem o papel de caçadores de informações, explorando os diferentes canais em busca de partes da história que se encaixem. Essa dedicação pode levar os fãs a se reunirem em grupos de discussão, a fim de ajudar uns aos outros a ter uma experiência mais rica.

Na forma ideal de narrativa transmídia, cada meio faz o que faz de melhor – a fim de que uma história possa ser introduzida num filme, ser expandida pela televisão, romances e quadrinhos; seu universo possa ser explorado em games ou experimentado como atração de um parque de diversões. Cada acesso à franquia deve ser autônomo, para que não seja necessário ver o filme para gostar do game, e vice-versa. Cada produto determinado é um ponto de acesso à franquia como um todo (JENKINS, 2009, p. 139-140).

A redundância pode acabar com o interesse dos fãs e provocar o fracasso da franquia; por essa razão, oferecer novas experiências pode renovar o interesse e sustentar a fidelidade. Cada mídia atrai nichos de mercado diferentes, sendo que

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filmes e televisão tendem a possuir públicos mais diversificados, enquanto jogos e quadrinhos são mais restritos. Entretanto, é possível que haja material suficiente para sustentar todos os nichos e expandir ainda mais o potencial da franquia. “Uma boa franquia transmídia trabalha para atrair múltiplas clientelas, alterando um pouco o tom do conteúdo de acordo com a mídia” (JENKINS, 2009, p. 140). Franquias não são exatamente uma novidade, e podem se originar a partir de um filme popular, uma revista em quadrinhos ou uma série de televisão, entre outros. Mas existe uma diferença entre a franquia tradicional baseada em licenciamento e os esforços modernos da narrativa transmídia. O licenciamento é um acordo onde a empresa detentora da marca vende os direitos para uma terceira, permitindo que ela fabrique produtos baseados em personagens e elementos originais da marca, mas com certas limitações a fim de proteger a propriedade original. Jenkins (2009) usa como exemplo os bonequinhos disponíveis no “McLanche Feliz” do McDonald’s6, que, apesar de serem produtos oficiais, são facilmente esquecidos. Na narrativa transmídia, por outro lado, o licenciamento com limitações de franquias abre espaço à cocriação, processo no qual todas as empresas envolvidas trabalham juntas desde o início para desenvolver conteúdos adequados aos diferentes setores, permitindo que cada meio ofereça o seu melhor e aumentando os pontos de acesso à franquia. O que não mudou são as motivações econômicas da integração entre marketing e entretenimento, que criam fortes ligações emocionais ao mesmo tempo que as utilizam para aumentar as vendas.

Cada vez mais, as narrativas estão se tornando a arte da construção de universos, à medida que os artistas criam ambientes atraentes que não podem ser completamente explorados ou esgotados em uma única obra, ou mesmo em uma única mídia. O universo é maior do que o filme, maior, até, do que a franquia – já que as especulações e elaborações dos fãs também expandem o universo em várias direções (JENKINS, 2009, p. 155).

Em sua reflexão sobre a lógica de mercado por trás da construção de universos, Jenkins (2009) menciona o cineasta americano George Lucas como um dos pioneiros da narrativa transmídia. Lucas é conhecido por ter dirigido o filme (Guerra nas Estrelas, 1977), no qual apresentou uma galáxia inteira recheada de personagens interessantes e planetas a serem explorados. O filme se tornou um

6 McDonald’s é uma franquia de restaurantes norte-americana fundada em 1940, famosa por vender brinquedos licenciados de centenas de outras marcas em conjunto com seus hambúrgueres.

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sucesso instantâneo, que até hoje possui um dos maiores fandoms7 do mundo e, mesmo quarenta anos depois, continua recebendo continuações em forma de novos filmes, séries de televisão, jogos e histórias em quadrinhos. Mas não foi apenas na indústria cinematográfica que Lucas causou uma revolução com sua pequena aventura espacial repleta de efeitos especiais e técnicas inovadoras; Lucas sempre acreditou no potencial de seu filme em se tornar uma franquia multimídia e, por essa razão, licenciou sua marca para a fabricante de brinquedos Kenner8. Mesmo com um atraso de sete meses entre o lançamento do filme e das pequenas figuras de plástico baseadas em seus personagens, os brinquedos se tornaram um sucesso de vendas tão grande quanto o próprio filme. Jenkins (2009) ainda recorda o caso do personagem Boba Fett, que surgiu como uma misteriosa figura na linha de brinquedos muito antes de aparecer no filme The

Empire Strikes Back (O Império Contra-Ataca, 1980), a primeira sequência de Star Wars. Outro responsável pelo crescente envolvimento do público em modelos narrativos transmidiáticos, segundo Jenkins (2009), é o Japão. O país oriental vêm influenciando a cultura do ocidente, em especial a partir da importação de franquias como Pokémon (1996) e Yu-Gi-Oh! (1996) na virada do milênio, devido à forte presença multimídia agregada a suas criações. As franquias mencionadas, por exemplo, são compostas por histórias em quadrinhos, séries animadas de televisão, jogos eletrônicos, cartas colecionáveis, linhas de brinquedos e toneladas inimagináveis de todo tipo de merchandising. Essa forte relação entre diferentes mídias de um mesmo texto tem levado os fãs a se tornarem caçadores de informações, tendo prazer em rastrear as conexões existentes entre cada formato da franquia. “Muitas crianças ocidentais, hoje, estão mais familiarizadas com os personagens da série japonesa Pokémon do que com personagens de contos de fadas europeus” (KAPUR, 2002 apud JENKINS, 2009, p. 177). Segundo Jenkins (2009), o fluxo de bens asiáticos no ocidente foi moldado pela união da convergência corporativa, promovida pela indústria, com a convergência alternativa, criada por fãs e imigrantes. A mescla de culturas pode resultar em hibridismo, que ocorre quando a indústria midiática de um país absorve e

7 Fandom é a denominação de um grupo de fãs que reúnem-se e interagem entre si. 8 Kenner foi uma empresa norte-americana fundada em 1947. Em 1987, foi comprada pela também fabricante de brinquedos, , fundada em 1945.

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transforma elementos vindos da indústria de outro, resultando em uma estratégia corporativa que procura remodelar o material estrangeiro em seu próprio material. Essa expansão multinacional é vista pelas corporações como um valioso potencial de ampliar o alcance de seus produtos e de distinguir-se do que já existe no mercado. Apesar de todas as qualidades experimentais e inovadoras da narrativa transmídia, ela não é inteiramente nova; seus modelos remetem à Grécia Antiga, época em que os gregos contavam histórias sobre deuses e heróis, como a Odisseia de Homero, que mesclava informações preexistentes transmitidas por meio oral entre as populações. O mesmo pode ser observado nos dias de hoje, aponta Jenkins (2009), quando personagens já conhecidos são retrabalhados através de diferentes meios, como quando uma história em quadrinhos é adaptada para o cinema.

Muitas vezes, personagens de narrativas transmídia não precisam ser apresentados ou reapresentados, pois já são conhecidos a partir de outras fontes. Assim como o público de Homero se identificava com os diferentes personagens, [...] as crianças de hoje entram no filme com identificações preexistentes, pois já brincaram com bonequinhos articulados ou os avatares dos games (JENKINS, 2009, p. 160).

Podemos dizer, de forma figurada, que a narrativa transmídia anda de mãos dadas com outro conceito descrito por Jenkins (2009): a cultura da convergência. Enquanto a narrativa transmídia surgiu devido ao interesse das corporações em ampliar o alcance de suas marcas, estampando-as em todos os tipos de mídias e produtos possíveis, de forma a levar o público a se sentir no dever de consumir todas as variações em ordem de ter uma experiência completa, a cultura da convergência é o reflexo desse mesmo interesse do ponto de vista dos consumidores. Mas para entendermos como esse fenômeno conquistou tanto espaço, precisamos antes analisar as interações entre marca e consumidor que resultaram em seu surgimento.

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2. INTERAÇÕES ENTRE MARCA E CONSUMIDOR

A busca por um relacionamento mais direto com os consumidores na atualidade tem levado muitas marcas a investirem no marketing digital. Essa nova abordagem à divulgação de conteúdo envolve o uso da internet e de seus canais de comunicação, em especial as redes sociais, que são utilizadas cada vez mais por indivíduos em todo o mundo. Segundo Strunck (2012), os meios digitais utilizam-se de armazenamento de dados dos usuários para com eles trabalhar a sua fidelização. É muito comum que marcas internacionais sofram adaptações para se adequarem a locais diferentes; o mesmo ocorre quando elas procuram satisfazer um pequeno grupo ou até mesmo um único indivíduo adaptando-se aos seus interesses com base nos dados coletados.

Se seu cliente em potencial tiver uma base sobre o assunto abordado, você poderá aplicar argumentos mais ricos, fazendo que seu interlocutor acompanhe seu raciocínio e absorva sua mensagem. [...] O oposto também pode acontecer. Se você aplicar palavras-chave muito didáticas, em um nível muito básico para tentar atingir o público que ainda não conhece o tema, poderá ser jogado para escanteio pelo consumidor que já tem uma base sobre o assunto abordado (GONÇALVES, 2013, p. 116).

Outras vantagens também estão sendo encontradas por marcas que apostam no marketing digital. Como Dooley (2012) explica, lojas virtuais podem oferecer uma variedade muito maior de produtos do que as lojas físicas e podem se aproveitar de recursos que facilitam a busca do consumidor, como ferramentas de recomendação, classificação, avaliações e críticas de outros usuários, sugestões de produtos similares e muito mais. Um site na internet é uma janela para o mundo que muitas empresas usam para aumentar sua visibilidade. Nele, a empresa pode contar a sua história, apresentar as propostas da sua marca, divulgar as últimas notícias sobre as suas atividades e anunciar seus mais novos produtos. O próprio site também pode oferecer os produtos para serem comprados virtualmente ou então direcionar os internautas aos sites de lojas que os oferecem. Para Gonçalves (2013), é importante em campanhas de marketing digital que todas as peças possuam argumentos de call-to-action, ou seja, que deixem realmente claro quais ações você espera que sejam feitas pelos usuários do site, a fim de ampliar exponencialmente a

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participação dos mesmos e o seu tráfego on-line. “Direcione-o a preencher um cadastro, navegar em suas páginas, conhecer seus produtos, tirar dúvidas em seu atendimento on-line e comprar efetivamente seus produtos ou serviços” (GONÇALVES, 2013, p. 13). A conexão por meios digitais facilita a criação de clubes de clientes, que Aaker (2001) descreve como sendo capazes de promover um nível de lealdade potencialmente maior. Esses clubes proporcionam evidências visíveis de que a empresa realmente se importa com a sua clientela e fornecem caminhos que aumentam o seu envolvimento, diminuindo a passividade na sua forma de interagir. O clube de clientes oferece um veículo por meio do qual o consumidor pode se identificar com a marca, expressar suas próprias percepções e atividades e compartilhá-las com pessoas que pensam de forma semelhante. Segundo Jenkins (2015), as empresas ganham valor econômico ao oferecer seus produtos por meio de catálogos eletrônicos, que podem ter seu acesso cobrado ou serem disponibilizados gratuitamente atrelados a anúncios de terceiros. Um dos mais populares meios para tal é o maior site de compartilhamento de vídeos da internet, o YouTube, que é utilizado tanto por marcas para fazer anúncios e divulgações oficiais quanto pelo público que compartilha o conteúdo entre si.

Desde o seu início, o YouTube assina acordos de compartilhamento de receitas com produtores corporativos para distribuir os vídeos deles, desde os mais recentes trailers de filmes até vídeos de música, junto com conteúdo criado pelo usuário, e para fornecer licenças para alguns dos usos variados desses textos (JENKINS, 2015, p. 57).

Além do YouTube, existem outras redes sociais, como o Facebook, o Instagram e o Twitter, que são usadas pelas empresas não apenas para se promover, mas também para estabelecer um contato mais direto com os seus consumidores. “Atualmente, as empresas encaram uma pressão crescente para usar sua presença on-line não somente para comunicar suas próprias mensagens, mas também para responder às exigências de clientes insatisfeitos” (JENKINS, 2015, p. 35). Para Jenkins (2015), enquanto as empresas tratarem os problemas de serviço ao consumidor com algum grau de preocupação pelo fato de os clientes serem formadores de opinião em potencial, eles receberão níveis diferenciados de resposta com base em como é percebida a sua ameaça em casos de decepção com

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a marca. Enquanto isso, muitas pessoas envolvidas com o serviço de atendimento ao cliente o consideram um modelo a ser seguido por todas as empresas que desejam responder às perguntas do cliente e se empenhar na comunicação com aqueles que se queixam. Em sua tentativa de se aproximar de seus consumidores, porém, as marcas podem se deparar com uma série de obstáculos que são, em muitos casos, resultado dos diferentes interesses entre ambas as partes. Jenkins (2015) coloca que os interesses corporativos nunca irão se alinhar completamente com os da cultura participativa, que por sua vez possui olhares controversos em relação às empresas. O público quer cada vez mais ser reconhecido pelos fornecedores de seus produtos e serviços de consumo, ao mesmo tempo que se preocupam com as consequências de uma participação mais ativa dessas mesmas entidades dentro de suas comunidades. Outro receio sentido pelos consumidores é que eles só receberão o apoio das corporações em práticas que as proporcionem mais lucros; ninguém quer se sentir menos importante do que o seu próprio dinheiro.

Para qualquer negócio, é dispendioso conquistar novos consumidores e é relativamente barato manter os existentes, especialmente quando estes últimos estão satisfeitos com a marca, ou até mesmo gostam dela. [...] Assim, uma base instalada de consumidores tem o seu investimento de aquisição baseado amplamente no passado. Além disso, alguns consumidores atuais proporcionam a exposição da marca e a confirmação para novos consumidores (AAKER, 1998, p. 19).

Se para Aaker (1998) é imperativamente importante a conquista de consumidores por parte das empresas, é preciso analisar o comportamento e os hábitos do cliente em potencial para então compreendermos o seu relacionamento com as marcas que o proporcionam bens e serviços no dia a dia.

2.1 Comportamento e fidelização do consumidor

Comprar faz parte da vida de todos nós. Segundo Silva (2014), existem dois tipos básicos de consumo: o consumo necessário à satisfação de nossas necessidades essenciais que nos garantem sobrevivência e conforto vital; e o consumo ligado ao nosso imaginário, que tem por objetivo suprir os desejos socialmente valorizados de um sistema econômico criado por nós mesmos. O

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segundo pode nos levar por caminhos tortuosos de sedução, insaciabilidade e manipulação, que visam o ter individual. Nos tempos pré-históricos da humanidade como caçadores-coletores, o cérebro já interpretava a obtenção de carne através da caça e de frutos e verduras por meio da colheita como uma forma de recompensa; e com o consumo moderno não é diferente. A necessidade imaginária de buscar alguma coisa é interpretada por nosso cérebro como uma missão a ser cumprida que, se bem sucedida, irá ativar uma região denominada “sistema de recompensa” liberando neurotransmissores que nos darão a sensação de prazer, alívio e satisfação. Todas as coisas que nos despertam anseios e expectativas acionam esse sistema; quanto maior for a expectativa, mais satisfação sentimos. Essas necessidades são extremamente pessoais e variam de acordo com nossos sonhos, desejos e vontades.

Em casos extremos, o que um indivíduo consome passa a ser sentido como uma demonstração da sua identidade e da sua capacidade frente a seu grupo social. Algo ao estilo: “Sou o que consumo, e o que consumo estampa aos outros o que sou” (SILVA, 2014, p. 23).

Kahneman (2012) complementa que, já há décadas, psicólogos se mostram interessados em classificar a nossa mente em dois modos de pensamento, os quais são responsáveis pelas nossas percepções de acordo com o que estamos mais adaptados a fazer e a pensar. Adotando os termos originalmente propostos pelos psicólogos Keith Stanovich e Richard West (2000), Kahneman (2012) identifica os modos como: Sistema 1, que opera de forma rápida e automática, exigindo pouco ou nenhum controle voluntário da nossa parte; e Sistema 2, que necessita de atenção e concentração às atividades mentais que o requisitam. Em outras palavras, o primeiro sistema está acostumado a realizar deduções baseadas em experiências passadas, enquanto o segundo precisa de um esforço maior para determinar suas conclusões. O Sistema 1 aprende associações entre ideias, como, por exemplo, o nome da capital de um país. É ele também que aprende habilidades como ler e compreender nuances de situações sociais. Algumas habilidades são amplamente compartilhadas pelas pessoas, enquanto outras são adquiridas apenas por aquelas que dedicam-se para se tornar especialistas. Encontrar movimentos decisivos no xadrez, por exemplo, é uma tarefa que para muitos exige o esforço do Sistema 2,

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enquanto um perito tem muito mais facilidade por já ter memorizado as jogadas possíveis em seu Sistema 1.

À medida que você se especializa numa tarefa, a demanda de energia diminui. Estudos do cérebro revelaram que o padrão de atividade associado com uma ação muda à medida que a habilidade aumenta, com menos regiões do cérebro envolvidas (KAHNEMAN, 2012, p. 40).

Contextualizando as ideias de Kahneman (2012) à questão do consumo, quando um consumidor precisa escolher quais produtos comprar em uma série de opções, essa decisão será tomada cautelosamente pelo Sistema 2. Contudo, isso muda no momento em que ele se apega a uma marca específica, por quaisquer vantagens percebidas, e o processo passa a ser realizado pelo Sistema 1, que realiza inconscientemente a compra baseando-se em experiências passadas e muitas vezes sem novos julgamentos. Quando isso ocorre, o consumidor se torna fiel à marca.

Fidelidade é uma ferramenta incrivelmente potente quando usada para reduzir as despesas com marketing – reter um consumidor fiel é muito mais barato do que tentar conquistar novos compradores. E o que é mais importante: um consumidor realmente fiel pode tornar-se um forte defensor da marca e estender seu alcance de marketing (DOOLEY, 2012, p. 97).

Mas nem todas as pessoas veem as marcas do mesmo jeito e, consequentemente, nem toda fidelização ocorre da mesma forma. Aaker (1998) define a existência de cinco níveis de lealdade que, apesar de nem sempre serem absolutos, servem como uma base de análise para compreender a variedade de formas que a mesma pode assumir. O nível mais inferior é o consumidor não-leal, que é completamente indiferente a qualquer marca e comprará a que estiver disponível ou que seja a mais conveniente ao momento; O segundo nível é o consumidor habitual, que está satisfeito com a marca ou, pelo menos, não levanta qualquer insatisfação e não sente necessidade de troca, mas está vulnerável à concorrência caso esta consiga convencê-lo a mudar. Já o terceiro nível contempla o consumidor leal, que está satisfeito mas ainda considera questões como preço e performance, atrativos que podem levá-lo à mudança caso sejam superados pela concorrência. No quarto nível, continua Aaker (1998), encontramos o consumidor que é denominado como amigo da marca, aquele que verdadeiramente gosta dela e tem

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uma preferência muito grande pela mesma, baseada em associações com símbolos, experiências ou qualidade percebida. Por fim, o nível mais elevado refere-se ao consumidor comprometido, para o qual a marca é motivo de orgulho e é muito importante funcionalmente ou como uma forma de expressão. Em muitos casos, essa intensa relação com a marca tem início cedo na vida do consumidor e pode ser explicada através do neuromarketing.

2.2 Definição de neuromarketing

O neuromarketing é o estudo da neurociência, ou seja, do comportamento do cérebro humano, em relação aos seus hábitos de consumo. Segundo Gonçalves (2013), a todo momento, o cérebro desenvolve e lapida seu próprio universo. É ele quem decide quais informações são dignas de atenção e quais podem ser descartadas de imediato; quem adiciona imagens e mensagens impactantes às nossas recordações e, por fim, quem sentencia a hora de tomar uma atitude. Devido a essas razões, apelos mais eficazes em anúncios publicitários conquistam uma maior atenção cerebral e proporcionam, por consequência, a concessão do público a uma determinada marca, produto, promoção ou mesmo experiência.

Outra descoberta do neuromarketing comprova que os consumidores realmente se tornam fiéis a algumas marcas. Eles não apenas experimentam os produtos, valorizam o bom atendimento e julgam suas decisões como ótimas compras. Além de tudo isso, os consumidores fidelizados se identificam com a logomarca pelos sentimentos e associações que o cérebro construiu através de experiências passadas, armazenadas em seu subconsciente. Essas associações são conhecidas como marcadores somáticos (GONÇALVES, 2013, p. 37).

O inconsciente armazena uma marca ou mensagem publicitária após a informação da mesma ter passado por diversas partes do cérebro, compondo uma memória; são essas memórias que moldam as sensações que temos ao interagir com a marca e seu produto. Através de frases, imagens e experiências acumuladas, nos identificamos positivamente com a marca e passamos a decidir mais facilmente por seus produtos ou serviços. É por isso que muitas marcas se caracterizam com uma grande carga de lembranças.

Um dos conceitos mais intrigantes do neuromarketing é a predisposição: influenciar o comportamento de um indivíduo com a apresentação de várias

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sugestões sutis. Isso frequentemente acontece de maneira subliminar; ou seja, o indivíduo fica inteiramente inconsciente de que está recebendo sugestões de qualquer natureza ou que seu comportamento foi afetado de algum modo (DOOLEY, 2012, p. 238).

Para Dooley (2012), o neuromarketing nos ensina que uma experiência consistente ficará inseparavelmente conectada à marca. Se um consumidor for consistentemente satisfeito pelo seu produto ou serviço, aquela experiência prazerosa continuará presa à marca. Por outro lado, experiências ruins também pegam; uma vez que essas associações são estabelecidas, é muito difícil mudá-las.

2.2.1 Familiaridade e apelo emocional

De acordo com Gonçalves (2013), uma vez que se entende o funcionamento da mente humana durante as decisões de compra, torna-se menos complexo desenvolver peças e argumentações textuais que atingem o público correto. Não basta tentar convencê-lo a experimentar seu produto; o que importa é conseguir chamar a atenção, conversar, interagir e se manter no seu subconsciente, tornando- se parte de suas memórias. Essas memórias, quando positivas, liberam dopamina e promovem sensações prazerosas mesmo quando apenas nos lembramos delas. Quando, por exemplo, lemos certas palavras em uma peça publicitária, nosso cérebro faz associações subconscientes entre a mensagem que captamos com lembranças relacionadas que guardamos, sejam elas imagens, sons ou mesmo aromas.

A presença de coisas familiares, mesmo quando não estamos conscientes da exposição, nos faz sentir melhor. [...] Esse efeito está relacionado à fluência, a facilidade com que nossa mente processa as coisas mais familiares. E [...] não é um grande salto sugerir que a exposição inconsciente a símbolos de marcas poderia funcionar do mesmo modo (DOOLEY, 2012, p. 64).

A formação de memórias, em boa parte inconscientes, é um dos principais processos no desenvolvimento humano desde o início da infância; não é nenhuma surpresa, portanto, que sejamos muito mais suscetíveis a anúncios neste período de nossas vidas. Para Parente (2016), a falta de paradigmas permite que as crianças tenham uma capacidade criativa muito superior aos adultos, sendo capazes de criar histórias extraordinárias que fazem sentido apenas em seus próprios universos.

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Durante a infância, continua Parente (2016), nos acostumamos a ouvir e a nos encantar com histórias narradas por meio de livros, quadrinhos, filmes, desenhos animados e músicas, que são, cada vez mais, ligadas a personagens comerciais e franquias, efetivamente entrelaçando anúncios às histórias. Estas então se enraízam em nossas mentes e ativam gatilhos mentais quando são lembradas. À medida que crescem, muitas crianças têm sua criatividade desconstruída e substituída pela padronização de percepções e comportamentos sociais, mas não necessariamente perdem a familiaridade que possuem com certas memórias. Complementando, Silva (2014) considera que muitas coisas nos remetem à infância por já estarem carimbadas em nosso cérebro desde aquela época, quando ainda somos muito mais ávidos por conhecimento e capazes de aprender mais rapidamente do que na fase adulta. Usar elementos que lembram a infância em propagandas é um artifício já antigo que visa criar uma associação emocional com um sentimento saudosista; o mesmo também gera nas próprias crianças a noção de que podem adquirir quase tudo que desejam através da compra.

O aprendizado que as crianças adquirem nos primeiros anos de vida tende a ocorrer de maneira bem intensa [...]. Durante essa fase de desenvolvimento da linguagem, não podemos esquecer outros elementos que são repassados a elas, como os personagens de desenhos animados, que costumam ser utilizados como ferramentas de marketing infantil. Como tais personagens estão presentes nessa etapa marcante do aprendizado das crianças, eles ficarão “impressos” definitivamente na memória delas. E quando elas chegarem à fase adulta, tais imagens acionarão, com frequência, sentimentos daquela época, mesmo que isso não seja percebido de maneira consciente (SILVA, 2014, p. 64).

O nosso querer não é um processo lógico ou racional, afirma Silva (2014), e sim totalmente emocional, ainda mais em crianças. A maioria das coisas que queremos não obedecem a nenhum raciocínio lógico; gostamos por causa das suas cores, do seu formato ou do seu estilo, nos imaginamos usando ou decorando nossas casas com aquele objeto, e criamos uma intimidade quase imediata com ele, que nos leva ao desejo de possuí-lo. Segundo Gonçalves (2013), anúncios que transmitem emoções fazem o público relembrar cenas de seu passado e associá-las aos produtos e serviços oferecidos. Quando um espectador é atingido pela mensagem de uma história, ele se coloca no lugar do personagem e se torna parte da cena, como se sentisse as mesmas emoções daquele personagem. Com isso, entram em ação os marcadores

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somáticos que estabelecem uma conexão entre a memória e a mensagem, conduzindo o cérebro à escolha final. Em outras palavras, as emoções são de suma importância e influenciam diretamente a decisão de compra.

Não é possível separar a razão da emoção, ou seja, por mais que seu consumidor acredite, conscientemente, que toma decisões apenas racionalmente, a ciência afirma o contrário. As emoções sentidas são parte absolutamente indispensável durante os processos racionais de decisão (GONÇALVES, 2013, p. 77-78).

Dooley (2012) acredita que criar anúncios com base emocional pode ser mais difícil, mas vale o esforço. Marcas que estabelecem ligações emocionais com seus consumidores e se tornam as mais desejáveis passam a ser chamadas de marcas apaixonantes ou lovemarks. Elas inspiram a evangelização em seus consumidores fiéis, que as recomendam entusiasticamente a seus amigos e ficam decepcionados com os que não seguem suas recomendações. Jenkins (2009) vê nas lovemarks a importância do envolvimento e da participação do público em conteúdos de mídia. É comum que hoje os roteiristas pensem em narrativas que criem oportunidades para a participação dos consumidores, que estão sempre utilizando novas tecnologias midiáticas para se envolverem com o conteúdo de suas marcas favoritas.

O que torna um comercial de televisão interessante? Se você acha que são os atrativos de imagem e áudio – ação, som, música, pessoas, cor, entre outros –, você estaria certo. Idem para grandes produções. Um local exótico também poderia ajudar. Todos esses recursos explicam por que os anunciantes adoram a mídia em vídeo, particularmente para criar uma reação emocional no observador (DOOLEY, 2012, p. 177).

Ainda há, porém, uma lacuna entre as concepções das empresas sobre o que constitui uma participação adequada dos fãs e a sensação que eles têm de posse moral sobre a propriedade. Jenkins (2009) relata que as empresas, em sua maior parte, tratam os fãs das propriedades cultuadas como lovemarks como consumidores inspirados, cujas iniciativas ajudam a gerar interesses mais amplos por essas marcas. Consolidar a fidelidade dos fãs pode significar diminuir os controles tradicionais exercidos pela empresa sobre suas propriedades intelectuais, abrindo um espaço mais amplo para a expressão criativa alternativa. Como podemos observar, o estudo do comportamento do consumidor traz vantagens significativas para as empresas que investem em apelos emocionais e

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sociais em suas campanhas de marketing, visando a fidelização de seus clientes desde a formação de suas primeiras memórias no decorrer da infância. Porém, enquanto as empresas apenas se beneficiam de seus status e do incentivo desenfreado ao consumo que proporcionam, são os próprios consumidores que estão sujeitos a sofrer as consequências dessas atitudes, tornando-se dependentes e consumistas.

2.2.2 Consumo compulsivo

Um dos maiores malefícios que a diversificação do mercado trouxe para a nossa sociedade foi dar espaço a um fenômeno chamado de consumo compulsivo. Como o termo sugere, trata-se do impulso por parte do consumidor de comprar exageradamente, consumir muito mais do que o necessário para o seu sustento e gerar gastos que vão além da sua condição financeira. Segundo Gonçalves (2013), a neurociência explica que, quando passamos por períodos estressantes ou livres de motivação, estamos sujeitos a buscar conforto em marcas e objetos de consumo, de modo a nos assegurar de que algo está funcionando corretamente em nossas vidas.

Já pensou na sensação de conquista ao comprar um bem de consumo que você tanto queria? Aos poucos, essa sensação prazerosa parece se dissolver, mas aí logo vem outra compra e uma nova realização, um novo estímulo, como se seu corpo pedisse bis ao ato consumista. Essa é a mais pura verdade. A cada compra realizada, a plateia cerebral enlouquece, com milhões de neurônios gritando bis em coro e avassaladoramente (GONÇALVES, 2013, p. 43).

Segunda Silva (2014), a compra impulsiva é realizada sem nenhum planejamento prévio, de maneira totalmente irracional, e seu único objetivo é a satisfação imediata de uma vontade que é momentânea e passageira. Muitos dos itens adquiridos nem sequer chegam a ser usados antes de serem esquecidos, pois o grande prazer vem do ato da compra e não necessariamente da posse. Nos piores casos, os consumistas fazem de tudo para esconder suas aquisições impulsivas de outras pessoas, atitude semelhante à de pessoas que sofrem de outros transtornos. É possível também que o consumo excessivo se dê pelo motivo inverso: mostrar às outras pessoas o que você possui. Nesse contexto social, o poder aquisitivo torna-se uma ferramenta de elevação de status. “Quando não compramos

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coisas que são validadas pelo marketing como necessárias à felicidade, nos sentimos excluídos e até mesmo fracassados e deprimidos” (SILVA, 2014, p. 25). Pouco após o ato desenfreado de consumo e a realização de suas consequências, é comum que o consumidor desenvolva um sentimento de arrependimento denominado por Silva (2014) como ressaca. Trata-se da sensação desagradável que ocorre depois de um momento de diversão que acabou custando caro demais; um sentimento de culpa, vergonha, frustração. A ressaca pode evoluir para uma fissura crescente, resultando em um novo descontrole ou ainda em uma síndrome de abstinência, caso o desejo por consumo não seja realizado.

Arrependimento é uma emoção, e é também uma punição que impingimos a nós mesmos. O medo do arrependimento é um fator considerado em inúmeras decisões tomadas pelas pessoas (“Não faça isso, você vai se arrepender” é uma advertência comum), e a experiência real de arrependimento é familiar (KAHNEMAN, 2012, p. 368).

Dooley (2012) observa que dedicar tempo demais pensando na compra e realizar muitas pesquisas pode provocar remorso no comprador; mesmo quando você acredita ter feito a escolha certa, ainda está ciente dos defeitos no produto que comprou e das vantagens oferecidas pela concorrência. Consumistas tendem a aproveitar muito mais ofertas e promoções em comparação a pessoas mais regradas; mesmo assim, a maioria dos consumidores compra apenas produtos simples por impulso enquanto decide por produtos mais complexos com muita reflexão. Silva (2014) conclui que, apesar de sofrerem as consequências de sua forma de consumo, os compradores abusivos não vivem apenas em função disso; eles conseguem manter um grau de funcionalidade em suas vidas pessoais, sociais e profissionais. Há também as pessoas que são capazes de transformar seus impulsos por consumo em algo positivo; uma forma de se aproximar de outras pessoas e compartilhar experiências com quem sente os mesmos desejos e interesses. Essa mudança na atividade do consumidor, que pode ser resultado da ação de uma lovemark ou mesmo da força de vontade dos próprios consumidores, é um dos princípios que deu origem à cultura da convergência.

2.3 Cultura da convergência

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Segundo Jenkins (2009), a convergência pode ser observada tanto como um processo corporativo quanto um processo gerado pelo consumidor. As empresas estão aprendendo a acelerar o fluxo de distribuição de mídias para conseguir acompanhar a crescente demanda de novos conteúdos por parte do público. A convergência exige que as empresas repensem suas antigas suposições sobre como consumimos seus produtos; se os consumidores de antigamente eram tidos como passivos, previsíveis e isolados, os consumidores de hoje são bastante ativos, barulhentos e conectados uns aos outros. É a vontade que sentimos de explorar, conhecer e analisar todos os aspectos de uma marca ou franquia que nos conquista. “É onde as velhas e as novas mídias colidem, onde mídia corporativa e mídia alternativa se cruzam, onde o poder do produtor de mídia e o poder do consumidor interagem de maneiras imprevisíveis” (JENKINS, 2009, p. 28).

A convergência está ocorrendo dentro dos mesmos aparelhos, dentro das mesmas franquias, dentro das mesmas empresas, dentro do cérebro do consumidor e dentro dos mesmos grupos de fãs. A convergência envolve uma transformação tanto na forma de produzir quanto na forma de consumir os meios de comunicação (JENKINS, 2009, p. 42).

Por convergência, Jenkins (2009) se refere ao fluxo de conteúdos através de múltiplas plataformas de mídia, à cooperação entre diversos mercados midiáticos e ao comportamento migratório dos públicos dos meios de comunicação, que vão a qualquer parte em busca das experiências que desejam. Ela representa uma mudança no modo como nossas relações com as mídias são encaradas, e pode definir transformações tecnológicas, mercadológicas, culturais e sociais.

Você liga o notebook. [...] Ao entrar na página de seu provedor de e-mail, [...] você confere os e-mails e não se surpreende mais com as inúmeras propagandas; algumas, inclusive, podem incentivá-lo a visitar o site da marca e, quem sabe, continuar sua coleção de bens de consumo. Nas redes sociais, [...] você aproveita para conferir a fanpage de sua marca favorita e compartilhar as promoções com seus conhecidos que, assim como você, se identificam com a logomarca. Quem sabe você não consegue um número extraordinário de “curtidores" e ganha a chance de participar de sorteios ou mesmo levar brindes incríveis para casa? (GONÇALVES, 2013, p. 17-18).

Mas a convergência não se originou apenas dos aparelhos que ampliam nossas conexões. Para Jenkins (2009), ela já vem de dentro dos cérebros de consumidores individuais e de suas interações sociais. Cada um de nós possui sua própria mitologia pessoal, criada a partir de pedaços de informações que

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armazenamos e transformamos em recursos através dos quais compreendemos nossa vida cotidiana. Por existir uma quantia de informações maior do que qualquer cérebro individual pode coletar sozinho, somos incentivados a interagir com outros consumidores das mesmas mídias que nós para transmitir e adquirir novas informações; em outras palavras, ninguém sabe absolutamente tudo, mas cada um de nós sabe alguma coisa e, quando juntamos as peças, formamos o que é definido como inteligência coletiva. “Um número crescente de consumidores talvez esteja escolhendo sua cultura popular pela oportunidade de explorar mundos complexos e comparar suas observações com outras pessoas.” (JENKINS, 2009, p. 168) Isso não quer dizer que a convergência dos meios de comunicação não teve um impacto vital no nosso modo de consumir, especialmente no que se refere aos fandoms. Os fãs sempre foram os primeiros a se adaptarem às novas tecnologias; a fascinação por universos ficcionais não é de hoje, mas as possibilidades oferecidas pela internet aumentaram a sua visibilidade de maneira excepcional. O processo de criação se torna muito mais divertido e ganha um novo significado quando pode ser compartilhado com outros. Fãs de um seriado de televisão podem, por exemplo, capturar imagens ou trechos em vídeo, reproduzir diálogos, resumir episódios, discutir sobre roteiros, escrever suas próprias versões da história – conhecidas como fan fictions ou fanfics – e distribuir tudo isso na internet. Em sites criados por eles mesmos e grupos em redes sociais, os fãs acumulam informações, procuram por referências, especulam sobre o significado de tudo e teorizam sobre o futuro. Conteúdos midiáticos que despertam o interesse de fãs são muitas vezes referidos como cults, que Jenkins (2009) descreve como universos enciclopédicos ricos em personagens, momentos memoráveis e informações que possam ser estudadas e interpretadas por consumidores dedicados. Uma obra cult não precisa ser necessariamente bem feita ou mesmo coerente em uma ideia central, mas sim deve permitir que os espectadores construam suas próprias fantasias a partir dela, que possam fragmentá-la para lembrarem-se apenas de partes descontextualizadas, e que proporcione o maior número de experiências diferentes possível. Jenkins (2009) cita novamente Star Wars, desta vez para demonstrar a capacidade criativa de um fandom em expandir um universo usando aquilo que lhes foi dado. No passado, os brinquedos baseados na saga espacial poderiam ser considerados banais, mas isso mudou quando deixaram de ser apenas brincadeira de criança e passaram a ser usados por fãs dedicados para contar suas próprias

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aventuras por meio de fotos e vídeos. A popularização dessas criações amadoras aumentou significativamente o envolvimento dos fãs com produtos como os brinquedos, que por sua vez passaram a ter uma relevância muito maior para a franquia como um todo. O reposicionamento de uma mídia e a alteração de seu significado denota outro conceito descrito por Jenkins (2015): o da propagabilidade. “A ‘propagabilidade’ se refere ao potencial – técnico e cultural – de os públicos compartilharem conteúdos por motivos próprios, às vezes com a permissão dos detentores dos direitos autorais, às vezes contra o desejo deles” (JENKINS, 2015, p. 16). Quando um material é produzido e atinge as mãos da sua audiência, ele pode ser reformatado para melhor atender às suas necessidades, seja através do uso em contextos diferentes do que foi originalmente idealizado, a sua inserção em conversas em andamento, ou ainda reconstruções mais literais, como em uma remixagem9.

A “propagabilidade” se refere aos recursos técnicos que tornam mais fácil a circulação de algum tipo de conteúdo em comparação com outros, às estruturas econômicas que sustentam ou restringem a circulação, aos atributos de um texto de mídia que podem despertar a motivação de uma comunidade para compartilhar material e às redes sociais que ligam as pessoas por meio da troca de bytes significativos (JENKINS, 2015, p. 16).

Jenkins (2015) observa que, quando fãs interagem entre si, eles não apenas consomem, mas recomendam o que gostam aos amigos, que por sua vez recomendam a outros amigos, criando uma corrente cultural que recompensa aqueles que dela participam. Entretanto, o oposto também pode acontecer; um dos amigos pode se recusar a passar a corrente adiante se esta deixar de atender a seus próprios interesses, gerando um bloqueio que consequentemente reduz o alcance daquele conteúdo. O mesmo pode ser feito pelas próprias empresas quando estas restringem, por questões legais ou técnicas, a circulação de seus materiais, ação que usualmente gera dois resultados: uma grande perda de interesse por parte do público que não tem mais acesso a esse material; e um oposto, crescente interesse vindo de um nicho do público que encontrará meios alternativos de ter acesso ao conteúdo restrito.

9 Remixar é a ação de alterar, customizar ou personalizar algo previamente existente através de trocas e acréscimos ao material original.

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Os torrents representam apenas um dos vários mecanismos possíveis por meio dos quais uma pessoa pode acessar ilegalmente o conteúdo da televisão. [...] Muitos espectadores ilegais provêm de países onde um seriado é exibido com a programação atrasada em relação ao cronograma original. Esses fãs querem sincronizar a sua visualização com as discussões internacionais on-line sobre programas, mas não podem participar facilmente da conversa se tiverem de esperar até que os programas estejam disponíveis localmente. Por outro lado, outros espectadores são de países onde um seriado não está disponível em nenhuma programação, seja atrasado ou não, e os downloads ilegais são sua única chance de acessar o conteúdo (JENKINS, 2015, p. 112).

Historicamente, os produtores de mídia agem como se precisassem proteger suas franquias da manipulação dos fãs, vendo-os como potenciais depreciadores do valor de suas propriedades intelectuais, alterando o seu significado na percepção popular. Jenkins (2015) afirma, no entanto, que suas investigações sobre o apelo residual sugerem o contrário, ou seja, os fãs que gostam da propriedade a tratam como especial e se investem emocionalmente nela. Devido à ação da comunidade, o conteúdo distribuído em massa por produtores comerciais é muitas vezes customizado por seus membros antes de atingirem o restante do fandom. Com isso, fãs são capazes de evangelizar o conteúdo que querem que os outros desfrutem, atribuindo um novo significado a modalidades existentes, mensurando o valor de diferentes propostas e ajudando a educar os outros sobre conteúdos que consomem de outras partes do mundo. “O compartilhamento da mídia além das fronteiras culturais aumenta a oportunidade de ouvir outras perspectivas e de desenvolver empatia por perspectivas diferentes da nossa” (JENKINS, 2015, p. 282). A propagação desses conteúdos nos ajuda a expressar quem somos, a fortalecer nossas relações uns com os outros e a conscientizar mais pessoas dos assuntos com os quais nos preocupamos.

2.3.1 Coleções e trocas residuais entre membros do fandom

Historicamente, colecionadores deixavam de utilizar os produtos que adquiriam apenas para mantê-los intactos e preservados em suas coleções, se orgulhando de seus papéis de “historiadores”. Desde o surgimento das mídias digitais, porém, muitos deles vêm mudando de atitude quanto à exclusividade de suas coleções. Colecionadores estão digitalizando materiais raros e os postando na internet como forma de aumentar a sua visibilidade, permitindo que mais pessoas interessadas tenham acesso a eles. O YouTube é um dos meios mais utilizados

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pelas comunidades de fãs para compartilhar esses materiais em formato de vídeo, podendo ser uma digitalização direta de algo previamente analógico ou então uma gravação feita pelo colecionador que mostre detalhadamente um objeto em sua posse.

Se os colecionadores tradicionais eliminam o valor de uso quase completamente em favor do valor sentimental, esses fãs de mídia retrô recuperam o valor de uso pela descoberta de novos usos para materiais esquecidos. Assim, a disponibilidade imediata dos textos de mídia antigos pode inspirar novos atos de criação e execução, levando não apenas à realização de novos significados, mas também à criação de novos textos e ao surgimento de novas comunidades subculturais (JENKINS, 2015, p. 100).

Jenkins (2015) observa que, cada vez mais, as pessoas têm se interessado em vasculhar o passado e reavaliar artefatos residuais que ainda tenham a capacidade de estimular o desejo. Residual diz respeito ao valor econômico de objetos materiais e performances de mídia que despertam interesse sentimental e simbólico e ainda podem gerar lucro muito tempo depois de seu intercâmbio original. Estimar o valor econômico e determinar o mérito cultural ou sentimental são noções cada vez mais vinculadas à avaliação de artefatos residuais, sejam eles objetos físicos ou conteúdos midiáticos, que percorrem uma série de intercâmbios. Muitas vezes, “os termos da troca não estão fundamentados no valor material dos objetos, que podem ser descartáveis ou de feitio barato, mas no valor sentimental ou simbólico atribuído a eles” (JENKINS, 2015, p. 92). Especialmente no que se refere a antiguidades e itens de colecionador, “essas ‘velharias’ podem ter perdido muito de seu valor econômico e de seu papel central em termos culturais, mas ainda carregam um valor sentimental enorme para alguns entusiastas” (JENKINS, 2015, p. 88).

O residual pode permanecer na memória popular, tornar-se o objeto de desejo nostálgico, ser usado como um recurso para dar sentido à vida presente e à identidade de alguém, servir como base de uma crítica às instituições e práticas vigentes e desencadear conversas. Em resumo, o conteúdo residual pode se tornar um forte candidato à propagabilidade (JENKINS, 2015, p. 97).

Jenkins (2015) cita Desjardins (2006) em sua observação de que, em comunidades de colecionadores, os membros muitas vezes possuem vínculos sociais extremamente limitados e frequentemente competem entre si pela posse de itens desejados sendo ofertados por outros membros. Uma vez que uma transação é

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concluída, porém, ela deixa um vestígio social que influencia a reputação de ambas as partes em negociações futuras. Além disso, a repetição constante de trocas entre alguns membros pode torná-los mais próximos, levando-os a se conhecerem a níveis mais pessoais e a se considerarem amigos. Uma característica marcante de uma cultura criativa sadia é o fato de as pessoas sentirem-se livres para trocar ideias, opiniões e críticas, sem medo de serem sinceras. Para Catmull (2014), o entrelaçamento de muitas visões é uma parte inevitável de qualquer grupo, mas, se não houver cautela, podem surgir conflitos entre pessoas presas a pontos de vista muito restritivos que as impedem de aceitar as preferências de outros, mesmo que ainda estejam abertas a novas ideias.

2.3.2 Controvérsias no fandom e aversão à mudança

Segundo Catmull (2014), à medida que mais pessoas são acrescentadas a qualquer grupo, existe uma tendência à inflexibilidade em relação às diferentes opiniões que vão se acumulando. Embora uma comunidade precise ser flexível para resolver problemas, viver de acordo com esse princípio pode ser extremamente difícil. Algumas pessoas são determinadas de forma rígida a defender sua visão como a única correta, assim como também são propensas a tomar conclusões apressadas devido às lentes através das quais veem o mundo.

Todos passamos por épocas em que outras pessoas veem o mesmo evento que nós, mas se lembram dele de maneira diferente. (Normalmente achamos que nossa visão é a correta.) As diferenças surgem devido às maneiras pelas quais nossos modelos mentais separados moldam aquilo que vemos. Vou repetir: nossos modelos mentais não são a realidade. São instrumentos, como os modelos usados para se prever o tempo. Mas, como todos nós sabemos, às vezes a previsão diz que vai chover e o sol aparece. O instrumento não é a realidade (CATMULL, 2014, p. 183).

Mas desentendimentos entre os membros não são o único motivo que pode levar a controvérsias em uma comunidade de fãs. Mudanças causadas à marca ou franquia por seus proprietários podem gerar uma aversão generalizada entre as pessoas que não estão abertas ao novo ou à reestruturação daquilo que elas têm como verdade absoluta. Catmull (2014) observa que as pessoas se agarram ao que funciona para elas e, quanto mais organizada e reforçada for essa abordagem, mais resistente à mudança elas se tornarão. Todos nós iniciamos nossas vidas como

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crianças abertas a aceitar tudo o que aprendemos, mesmo que seja por falta de opção, e, em algum momento, muitos tornam-se adultos com medo de surpresas e que pensam já saber todas as respostas. Do ponto de vista das empresas, mudanças devem acontecer para impedir a estagnação das vendas; com o passar do tempo, é natural que as tendências de mercado e os gostos dos consumidores mudem. De acordo com Jenkins (2015), é comum que as pessoas acreditem que, uma vez que um conteúdo entra em declínio, ele não tem mais nenhum valor cultural; o resultado desse modo de pensamento é a necessidade das marcas de se renovarem caso queiram continuar relevantes nos próximos anos. Segundo Aaker (1998), revitalizar uma marca é, em geral, menos arriscado do que lançar uma nova, que pode custar milhões a mais e tem maior possibilidade de fracassar do que ser bem-sucedida. Tal operação frequentemente envolve melhorias do conhecimento, aumento da qualidade percebida, mudança de associações e expansão da base de consumidores.

Os interesses dos fãs e dos produtores nem sempre estarão alinhados. E, talvez o mais importante, a disfunção do presente sistema está se tornando mais óbvia em nosso ambiente de mídia cada vez mais complexo. O foco da indústria de classificação em medidas passivas de resposta do público, e a nossa aceitação da lógica delas, mostra que as empresas menosprezam os esforços dos espectadores empenhados em demonstrar ativamente o valor de seu engajamento (JENKINS, 2015, p. 123).

Segundo Tavares (1998), nem sempre as suposições das empresas sobre o que o público pensa delas estão corretas. Por isso, é importante um acompanhamento constante da relação entre ambos para que se possa manter uma sintonia. É possível identificar sinais no mercado que indiquem a necessidade de mudanças; mesmo assim, a empresa não deve tomar decisões prematuras. É preciso avaliar o impacto que uma mudança pode causar no público leal e satisfeito da marca, para que, na melhor das hipóteses, todas as partes se satisfaçam com o resultado final. Adquirida a compreensão teórica de como marcas são criadas, evoluem e se relacionam com seus consumidores, iremos aplicar os conceitos abordados durante o primeiro e o segundo capítulos desta monografia em um estudo de caso referente à uma franquia midiática específica.

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3. ESTUDO DE CASO SOBRE A FRANQUIA TRANSFORMERS

A presente monografia foi estruturada conforme o modelo de relatório descrito por Vergara (1998), que objetiva relatar o desencadeamento da pesquisa, a metodologia utilizada, os resultados obtidos e as conclusões alcançadas. Antes da realização de uma pesquisa ser colocada em prática, é necessário determinar qual metodologia será aplicada para o desenvolvimento da mesma. Com o objetivo de auxiliar nesta tomada de decisão, Yin (2001) apresenta uma estrutura (tabela 1) composta de cinco estratégias – experimento, levantamento, análise de informações em arquivos, pesquisa histórica e estudo de caso – categorizadas por meio de três condições: o tipo de questão a ser respondida; o controle do pesquisador sobre eventos comportamentais efetivos; e o foco em fenômenos históricos ou contemporâneos.

Tabela 1 – Esquema de metodologias por Yin (2001).

Fonte: Adaptada de YIN, 2001, p. 24.

Para Yin (2001), questões dos tipos “como?” e “por quê?” são mais explanatórias, pois o pesquisador tem pouco controle sobre os seus eventos. É provável que essas questões levem ao uso de estudos de caso, pesquisas históricas ou experimentos, em que o pesquisador tem pouco controle sobre os eventos e lida com ligações operacionais que são traçadas ao longo do tempo. O estudo de caso é definido como uma investigação empírica cujo foco é um fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto da vida real. A investigação faz uso de proposições teóricas

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previamente desenvolvidas para conduzir a sua coleta de dados e pode enfrentar muitas variáveis de interesses, que resultam em múltiplas fontes de evidências que precisam convergir em seus dados.

Como esforço de pesquisa, o estudo de caso contribui, de forma inigualável, para a compreensão que temos dos fenômenos individuais, organizacionais, sociais e políticos. [...] Em todas essas situações, a clara necessidade pelos estudos de caso surge do desejo de se compreender fenômenos sociais complexos. Em resumo, o estudo de caso permite uma investigação para se preservar as características holísticas e significativas dos eventos da vida real – tais como ciclos de vida individuais, processos organizacionais e administrativos, mudanças ocorridas em regiões urbanas, relações internacionais e a maturação de alguns setores (YIN, 2001, p. 21).

Ainda segundo Yin (2001), o estudo de caso é a estratégia que examina acontecimentos contemporâneos quando não há manipulação de comportamentos relevantes. O método utiliza-se de muitas das mesmas técnicas da pesquisa histórica, mas acrescenta duas fontes de evidências que usualmente não fazem parte dela: observação direta e uma série sistemática de entrevistas. Em algumas situações, no entanto, pode ocorrer manipulação informal, como em uma observação participativa. Dadas as devidas definições, a pesquisa apresentada nesta monografia foi realizada como um estudo de caso com observação que busca explorar e analisar os 35 anos de existência da franquia Transformers, sua concepção, a evolução de sua marca e de seus produtos, os seus maiores erros e acertos, a sua atual situação e a sua relação e envolvimento com a comunidade de fãs e consumidores. Visando compreender a relação do fandom com a franquia Transformers, foi realizada uma coleta de dados com o grupo brasileiro de Facebook, “Nova Cybertron ATB”, que possui aproximadamente 3270 membros. Os participantes do fandom foram convidados a responder um questionário constituído de 44 questões que abordavam a relação pessoal dos participantes com a franquia Transformers desde que a conheceram, suas opiniões sobre diferentes aspectos da franquia, seus hábitos de colecionismo e suas relações com a Hasbro e com os demais membros.

3.1 A concepção da franquia Transformers

A franquia Transformers é, acima de tudo, uma marca conjunta pertencente a duas empresas especializadas em brinquedos e entretenimento: a Hasbro, que opera nos Estados Unidos e na maior parte do mundo, e a TakaraTomy, exclusiva

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ao Japão e alguns locais da Ásia. As origens da franquia estão intrinsecamente atreladas à relação e influência que ambas as empresas exerceram uma na outra ao longo de duas décadas, antes mesmo de unirem suas forças. É provável que, sem a participação de qualquer uma delas, a franquia nunca tivesse sido concebida. Fundada em 1923 como Hassenfeld Brothers nos Estados Unidos, a Hasbro mudou seu nome para o atual em 1968. Seu primeiro brinquedo de sucesso foi o “Sr. Cabeça de Batata” (Mr. Potato Head)10 em 1952, mas a sua criação que mais revolucionou a indústria foi o G.I. Joe (conhecido no Brasil como Falcon) em 1964, a primeira “figura de ação”11, que representava homens das mais variadas áreas do exército e algumas outras profissões; a linha foi o carro-chefe da empresa por mais de uma década, quando caiu em popularidade. A solução foi encontrada em 1982 com uma completa reinvenção da linha em uma nova escala, com novos brinquedos, novos personagens, um desenho animado na televisão e uma série de histórias em quadrinhos para promovê-la; essa nova versão foi chamada de G.I. Joe: A Real American Hero (Comandos em Ação no Brasil). Enquanto isso, durante a década de 1950, a parceria entre os governos dos Estados Unidos e do Japão auxiliava o país oriental a se recuperar dos danos causados pela Segunda Guerra Mundial. Utilizando-se de materiais descartados por bases militares, a empresa Sato Vinyl, criada em 1955, ganhou popularidade produzindo carrinhos de brinquedo e robôs de corda; essa empresa mudou de nome para Takara em 1960. Em 2005, a Takara se fundiu com outra fabricante de brinquedos japonesa, a Tomy, que já existia desde 1924; juntas, as empresas passaram a ser conhecidas como TakaraTomy.

3.1.1 Takara: a origem japonesa

Durante a década de 1960, a Takara havia mudado seu foco para a fabricação de bonecas para meninas. Procurando por um brinquedo que pudesse ser direcionado aos meninos, a empresa teve o seu primeiro contato com a Hasbro ao comprar dela a licença para fabricar e vender a linha G.I. Joe no Japão; porém, a

10 A versão original do “Sr. Cabeça de Batata” era constituída apenas por peças, como olhos, boca e nariz, para serem encaixadas em batatas reais não incluídas. O corpo em formato de batata de plástico foi introduzido apenas em 1964. 11 O termo “figura de ação”, ou “”, foi criado para atrair a atenção do público masculino e diferenciar os G.I. Joe de bonecas consideradas femininas. O termo é utilizado até hoje para se referir a qualquer brinquedo articulado.

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temática de homens militares não foi bem recebida pelo público japonês, que ainda se sentia desconfortável com o assunto. Após observar as tendências no mundo dos desenhos animados e quadrinhos do momento, a empresa percebeu que robôs ainda estavam em alta, e assim decidiu modificar o molde do G.I. Joe de um ser humano para uma figura robótica com peças metálicas, batizando-o de Henshin Cyborg12. Devido a uma crise de petróleo em 1973, a fabricação do Henshin Cyborg encareceu, o que levou a Takara a substituí-lo por uma linha de robôs menores, chamada Microman (figura 2). No decorrer da década, as primeiras características transformáveis começaram a surgir, com alguns robôs podendo assumir formatos veiculares. Com o sucesso de Microman, em 1980, a Takara lançou uma linha paralela de robôs ainda menores, com cerca de três centímetros de altura, mas que pilotavam naves espaciais capazes de se transformar em verdadeiros robôs “gigantes”; essa linha chamava-se Diaclone.

Figura 2 – Divulgação da linha Microman, 1974.

Fonte: EdailyTV. . Acesso em 01/12/2019.

Em 1982, o interesse por naves espaciais e carros futuristas havia desaparecido, o que levou a Takara a reinventar suas linhas mais uma vez, dando origem à Diaclone Car Robo (figura 3), com robôs que se tornavam carros, caminhões e aviões realistas em escala 1:16 (um centímetro do brinquedo equivale

12 “Henshin” significa “transformação” em japonês. Por coincidência, é possível que o uso da palavra não tenha servido de influência para o nome da franquia Transformers alguns anos mais tarde.

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a 16 centímetros do tamanho real do veículo), e à Micro Change, com robôs que se tornavam “objetos do cotidiano” em escala 1:1, como relógios, toca-fitas, carrinhos de brinquedo e até mesmo revólveres. Tantas novidades garantiram à Takara mais um ano de vendas bem-sucedidas.

3.1.2 Hasbro: a origem americana

Em 1982, a Hasbro desfrutava do lançamento de G.I. Joe: A Real American Hero e já estava pronta para aplicar as mesmas estratégias à uma nova linha. Em uma visita a uma feira de brinquedos japonesa no mesmo ano, representantes da empresa ficaram surpresos com a popularidade de robôs transformáveis no oriente, visto que muitas fabricantes além da Takara estavam apostando em brinquedos do tipo. Acreditando no potencial de vendas que os robôs teriam no mercado ocidental, os americanos tiveram a ideia de comprar todos aqueles produtos; a Takara, se mostrando muito mais interessada na proposta do que as outras fabricantes, ofereceu à Hasbro um acordo de longo prazo. Com isso, as duas fecharam um negócio pela segunda vez, dando início à uma parceria permanente.

Figura 3 – Divulgação da linha Diaclone Car Robo, 1982. (Todos os produtos nesta imagem foram relançados pela Hasbro).

Fonte: TransformerLand. . Acesso em 01/12/2019.

O acordo entre as empresas resultou na Hasbro adquirindo todas as figuras das linhas Diaclone Car Robo e Micro Change, apesar de algumas poucas terem sido

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excluídas do lançamento americano. As primeiras mudanças determinadas pela Hasbro, de forma quase imediata, foram a exclusão dos pilotos de Diaclone, reforçando a ideia de que os robôs teriam “vida própria”, e a união das duas linhas em uma única, batizada finalmente de The Transformers (“transformadores” em inglês), nome que, apesar de simples, provou-se forte e memorável entre os consumidores. Contudo, a Hasbro sabia que os brinquedos não iriam se vender sozinhos, e nada era mais garantido do que reutilizar a mesma estratégia que revitalizou G.I. Joe: contar a história dos personagens através de desenhos animados e quadrinhos. Porém, tendo descartado o pouco de ficção que acompanhava Diaclone e Micro Change, a empresa precisava criar seus personagens do zero, baseando-se apenas na aparência dos brinquedos que havia adquirido, e criar uma história que funcionasse para o público americano, pois este não tinha a mesma familiaridade com figuras de robôs que o público japonês tinha. Para essa tarefa, foi terceirizado o serviço da Marvel Comics13, a qual também ficaria responsável pelos quadrinhos (figura 4).

Figura 4 – Capa da revista em quadrinhos The Transformers #1, 1984.

Fonte: TFWiki. . Acesso em 01/12/2019.

Em 1983, com um prazo de menos de uma semana para apresentar resultados, o escritor e ilustrador Bob Budiansky, com ajuda de alguns poucos colegas, criou nomes e perfis para os primeiros personagens que teriam seus brinquedos lançados no início de 1984 e estrelariam as revistas em quadrinhos e o desenho

13 Marvel Comics é uma das mais populares editoras de revistas em quadrinhos do mundo, sendo a dona de super-heróis famosos como o Homem-Aranha, os Vingadores e os X-Men.

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animado. A história criada para a ficção da franquia apresenta os Transformers como robôs alienígenas do planeta Cybertron, divididos entre os heroicos e os malignos , que lutam pela posse dos últimos recursos do planeta antes de virem parar na Terra em busca de novos recursos. Chegando ao nosso planeta, eles usam suas habilidades de mudar de forma para se disfarçarem e não serem percebidos pela humanidade. Seguindo essa premissa, a primeira edição da revista foi lançada nos Estados Unidos em maio de 1984, enquanto o primeiro episódio da série animada (figura 5) foi lançado em setembro do mesmo ano.

3.2 Os 35 anos de história

Em 2019, Transformers completou 35 anos de uma história repleta de altos e baixos, estagnações e revitalizações, apelos a diferentes públicos e uma quantia incalculável de produtos que carregam a sua marca. Este tópico tem como objetivo trazer para a discussão desta monografia os momentos mais marcantes desses 35 anos, analisando seus erros e acertos somados à franquia como um todo, visando o embasamento teórico para a coleta de dados realizada com a comunidade de fãs brasileiros. Para facilitar a compreensão e leitura deste estudo, a história da franquia foi dividida em “eras” baseadas nas mudanças mais significativas que podem ser observadas no decorrer de diferentes períodos de tempo durante as décadas.

3.2.1 Lançamento e sucesso imediato (1984-1985)

Os dois primeiros anos da franquia foram um verdadeiro sucesso comercial, e várias estratégias se tornaram conhecidas por serem as razões por trás disso. A Hasbro havia criado uma marca poderosa, com uma rica identidade visual que apelava para as maiores tendências da época. Dois slogans foram criados e usados extensivamente já no primeiro ano: “More than meets the eye” (Mais do que o olho pode ver) e “Robots in disguise” (Robôs disfarçados). A rima entre os dois é intencional, pois ambos foram usadas como versos do jingle ouvido nos comerciais de televisão e, eventualmente, na música-tema de abertura da série animada. Além do jingle, muito cuidado foi tomado na criação do “som de transformação” emitido pelos robôs toda vez que eles mudam de forma; as cinco notas – em ritmo crescente

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na mudança de veículo para robô e decrescente, de robô para veículo – tornaram-se o som incidental mais lembrado e adorado entre fãs e espectadores casuais.

Figura 5 – Cena da série animada The Transformers, 1984.

Fonte: TFWiki. . Acesso em 02/12/2019.

Tanto o jingle quanto o som de transformação continuam em uso em quase todas as mídias audiovisuais produzidas até hoje, com uma melodia instrumental baseada no ritmo de “More than meets the eye” tornando-se também uma espécie de marca sonora da franquia. Outros slogans já foram usados no decorrer dos anos, como o semelhante “Change before your eyes”, mas os dois originais continuam sendo os mais frequentes, inclusive também sendo usados como subtítulos de algumas mídias da franquia. Cada facção, como são chamadas as equipes do bem e do mal, possuía sua própria insígnia, que era estampada por todos os lados nas embalagens, nos brinquedos e em todos os produtos licenciados, tornando-as facilmente reconhecidas; a insígnia dos Autobots, em particular, tornou-se equivalente ao logo oficial da própria franquia. A popularidade desses símbolos é tamanha que, até hoje, é comum o seu uso em diferentes contextos por pessoas que os admiram, especialmente em tatuagens no corpo e adesivos em carros. Uma identidade visual mais sútil, mas que constantemente se faz presente em embalagens e catálogos de divulgação, é a associação dos Autobots com a cor vermelha, enquanto os Decepticons são associados à cor roxa (figura 6).

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Figura 6 – Divulgação da linha The Transformers, 1984. (Todos os produtos na imagem são relançamentos de Diaclone Car Robo e Micro Change. Note o uso da cor vermelha para destacar os Autobots e da cor roxa para os Decepticons).

Fonte: Botch the Crab. . Acesso em 01/12/2019.

Uma estratégia envolvendo os brinquedos em si, que favoreceu muito o crescimento da linha, foi a reutilização de moldes para criar mais de um personagem (figura 7); ou seja, lançar uma mesma figura em duas ou mais variações de cores, dando nomes e perfis diferentes para cada uma, essencialmente resultando em mais produtos individuais que o consumidor sentirá a necessidade de comprar. Se comprar duas figuras do mesmo molde, ele não sentirá que possui uma repetida, pois cada uma tem seu próprio nome, sua própria personalidade, sua própria vida; ele precisa do produto “repetido” para completar a sua coleção, ou simplesmente para ter os seus personagens favoritos. Na maioria dos desenhos animados e quadrinhos, os personagens parecem ser cegos ao fato de serem “idênticos” a um ou mais de seus colegas, ou simplesmente preferem ignorar esse detalhe; mas existem exceções, como no caso do esquadrão de jatos Decepticons, os “Seekers”, em que todos os membros têm a mesma aparência como uma espécie de “uniforme”. Apesar de levantar discussões frequentes entre consumidores que questionam a moralidade da estratégia de reutilizar moldes, a mesma sempre se provou eficiente e lucrativa para a Hasbro, pois é muito menos custosa do que a criação do zero de um novo molde para cada novo personagem. Existem diferentes níveis de reutilizações de moldes, cada um identificado por um termo diferente: redeco, quando duas ou mais figuras são produzidas com plásticos ou outros materiais

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de cores diferentes; repaint, quando a diferença de cores é apenas na pintura, não no plástico (muitos fãs ainda confundem redecos com repaints); e retool, quando uma ou mais peças do molde são modificadas de uma figura para outra, como a adição de uma cabeça diferente ou uma alteração feita ao modo veículo. Em anos mais recentes, as técnicas de retool da Hasbro e da TakaraTomy vêm se tornando cada vez mais sofisticadas, levando fãs a se surpreenderem quando descobrem que uma nova figura é, na verdade, uma versão bastante modificada de outra previamente lançada.

Figura 7 – Exemplos de redeco e retool. (Starscream, à esquerda, e Thundercracker, ao centro, de 1984, são redecos um do outro, sendo idênticos além das cores e adesivos. Já Ramjet, à direita, de 1985, é um retool, pois possui novos pares de asas e acessórios, enquanto reaproveita o restante do molde).

Fonte: Adaptado de TFWiki. . Acesso em 02/12/2019.

Mas uma das estratégias mais importantes, se não a mais importante de todas, para que a franquia se tornasse tão apelativa a muitos consumidores, foi a criação dos personagens pela Marvel Comics. Dentre os mais populares e inesquecíveis estão: Optimus Prime, o nobre líder dos Autobots que vira um caminhão; Bumblebee, o melhor amigo dos humanos que vira um fusca; Megatron, o maníaco líder dos Decepticons que vira um revólver; e Starscream, o traiçoeiro segundo-em-comando que vira um jato; além de dezenas de outros personagens. Essas características permitiam que o público se identificasse diferentemente com cada robô e tornava as suas interações na ficção mais realistas e expressivas. Todas as embalagens dos brinquedos vinham com uma ficha completa com a personalidade, a função e as estatísticas de cada robô (figura 8), que eram seguidas

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de acordo por suas encarnações na série animada e nas histórias em quadrinhos, com algumas exceções; o Shockwave, por exemplo, era leal ao seu líder Megatron na animação, mas o odiava nos quadrinhos.

Figura 8 – Ficha do personagem Megatron, presente na embalagem de seu brinquedo de 1984.

Fonte: Seibertron. . Acesso em 02/12/2019.

Em 1985, a linha de brinquedos seguia firme e forte nas prateleiras das lojas, já tendo triplicado a quantia de produtos disponíveis. Dezenas de novos modelos vindos do Japão foram lançados nos Estados Unidos; alguns haviam sido originalmente planejados para a linha Diaclone, mas, no lugar, foram lançados diretamente na linha The Transformers, levando a sua precursora a ser descontinuada. Nesse período, foram introduzidos dois novos tipos de Transformers, que se tornaram extremamente populares: os “Triple Changers”, que possuem três modos, um de robô e dois de veículos diferentes; e os “Combiners”, equipes de cinco a seis robôs que podem se unir e formar um robô maior. Essas características se tornariam cada vez mais constantes nas linhas de brinquedos da franquia com o passar dos anos. Buscando ainda mais expansão à sua oferta, a Hasbro adquiriu diversos moldes de robôs transformáveis criados por outras empresas e adicionou todos eles ao catálogo de The Transformers; felizmente, essa atitude não abalou as suas relações com a Takara, que apenas optou por não incluir os robôs terceirizados em sua versão da linha, lançada a partir de 1985 com o nome Tatakae! Chō Robotto Seimeitai Transformers (“Lutem! Super Formas de Vida Robóticas Transformers”). Enquanto isso, o desenho animado já estava em sua segunda temporada e acrescentava novos personagens a cada episódio; até então, todos vinham sendo bem recebidos pelos espectadores e consumidores, mas essa receptividade estava prestes a mudar devido a uma das decisões mercadológicas mais equivocadas da história da franquia.

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3.2.2 Primeiras controvérsias e período de estagnação (1986-1995)

Em agosto de 1986, foi lançado nos cinemas norte-americanos o longa- metragem de animação The Transformers: The Movie (Transformers: O Filme, figura 9), a mais ambiciosa estratégia de marketing promovida até então. O filme, ambientado no “distante futuro de 2005”, apresentou inúmeros personagens inéditos em seu elenco e trouxe duas novidades à linha de brinquedos: pela primeira vez, os personagens haviam sido criados primeiro para a ficção e só depois foram adaptados em brinquedos; e, também pela primeira vez, a própria Hasbro desenvolveu as novas figuras do zero. Desde então, a empresa nunca mais reaproveitou moldes terceirizados, e passou a trabalhar em conjunto com a Takara (hoje, TakaraTomy) para co-produzir todos os seus lançamentos. Quanto à questão de qual interação de novos personagens é criada primeiro – se é o brinquedo ou a ficção – é bastante relativa e varia extensivamente conforme os anos e as diferentes linhas.

Figura 9 – Pôster do filme The Transformers: The Movie, 1986.

Fonte: TFWiki. . Acesso em 02/12/2019.

Mas o lançamento de The Transformers: The Movie mascarava o verdadeiro plano da empresa: descontinuar todos os produtos de 1984 e 1985 para dar espaço unicamente à linha de 1986. Como consequência, os personagens introduzidos no filme não iriam se juntar aos outros, mas sim efetivamente substituí-los. Para piorar, a maioria dos personagens preexistentes é morta durante uma intensa batalha que

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ocorre nos primeiros trinta minutos do longa, incluindo até mesmo Optimus Prime. O que a Hasbro falhou em perceber era que os fãs já se sentiam muito apegados a todos aqueles personagens e não aceitariam vê-los sendo mortos e descartados por motivos puramente comerciais; segundo relatos, muitas crianças foram embora dos cinemas chorando antes mesmo do fim da sessão. Décadas depois, os fãs passaram a reavaliar o filme, apreciando seus pontos positivos e o considerando como um verdadeiro clássico cult que ajudou a moldar a franquia como a conhecemos hoje; no entanto, isso não muda o dano causado na época. Estrelando os personagens introduzidos no filme, a terceira temporada da série animada não manteve a popularidade dos anos anteriores, o que a levou ao seu cancelamento em 1987. A linha de brinquedos e os quadrinhos resistiram até 1990 e, apesar de continuarem introduzindo novos personagens todos os anos, gradualmente abriram espaço para o retorno de personagens antigos com figuras completamente novas – em especial, é claro, Optimus Prime, o mais pedido pelos fãs. Enfim, a Hasbro havia aprendido a lição de que nem todo novo produto deveria ser sinônimo de um novo personagem; os fãs estavam mais dispostos a comprar novos brinquedos de seus personagens favoritos do que personagens novos e desconhecidos. Mesmo assim, a linha não resistiu às quedas nas vendas e foi cancelada. No Japão, desenhos animados exclusivos continuaram a ser produzidos até 1990, mas a franquia já havia perdido a sua popularidade no oriente também.

Figura 10 – Capa da revista Transformers: Generation 2 #1, 1993.

Fonte: TFWiki. . Acesso em 02/12/2019.

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Depois de dois anos em hiato nos Estados Unidos e se mantendo pouco ativa no Japão e no restante do mundo, a franquia passou por sua primeira tentativa de reintrodução em 1993, com o lançamento de Transformers: Generation 2. A nova fase da franquia era constituída por uma linha de brinquedos, dividida entre relançamentos de figuras antigas em novas cores e moldes completamente novos, e uma nova série de histórias em quadrinhos (figura 10); mas não foi produzido um novo desenho animado e, em vez disso, reprises de episódios seletos da série original foram exibidas na televisão com o novo título. A G2, como é abreviada, trouxe duas mudanças significativas para o nome da franquia: primeiro, o “The” se tornou obsoleto em “The Transformers”; e segundo, a linha de brinquedos original, junto de seus desenhos e quadrinhos, passou a ser retroativamente chamada de Transformers: Generation 1, ou apenas G1. Uma importante mudança também ocorreu ao Megatron (figura 11): seu modo alternativo de revólver já havia causado incidentes na vida real e, por essa razão, sua nova figura transformava-se em um tanque de guerra; desde então, o tanque se tornou o seu modo mais usado pela Hasbro e mais aceito pelos fãs.

Figura 11 – Comparação entre o Megatron G1, 1984 (esquerda), e o Megatron G2, 1993 (direita). (Além da mudança no modo alternativo, note como a versão G1 possui cores muito realistas enquanto a G2 tem uma pintura mais fantasiosa. As imagens não estão em escala real).

Fonte: Adaptado de TFWiki. . Acesso em 02/12/2019.

Mas as mudanças trazidas pela G2 não foram suficientes para restaurar a popularidade que a franquia um dia teve. Muitos consumidores criticaram as cores

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extravagantes e irrealistas aplicadas aos brinquedos, e a ausência de uma série animada inédita desanimou muitos fãs. Com poucas vendas, a linha foi cancelada em 1995, quando a Hasbro decidiu tomar uma atitude drástica, com o que poderia ter sido sua última tentativa de manter a franquia viva.

3.2.3 A inesperada era dos animais (1996-2000)

Em 1991, a Hasbro comprou uma de suas maiores rivais no ramo de brinquedos, a Tonka, que, por sua vez, já havia comprado a Kenner em 1987; como resultado, ambas se transformaram em subdivisões dentro da Hasbro. Já em 1995, quando a Generation 2 foi cancelada e Transformers parecia irrecuperável, a Hasbro decidiu apostar todo o futuro da franquia na Kenner, dando à sua subsidiária liberdade total para inventar e experimentar à sua vontade.

Figura 12 – Pôster da série animada Beast Wars: Transformers, 1996.

Fonte: TFWiki. . Acesso em 02/12/2019.

O resultado do trabalho da Kenner foi a criação da linha Beast Wars: Transformers (figura 12), lançada em 1996, que pegou a todos de surpresa com a sua nova premissa: os Transformers agora se disfarçavam de animais com aparência puramente orgânica e não mais veículos ou aparelhos eletrônicos. Para acompanhar a linha de brinquedos (figura 13), foi lançada uma série animada para televisão que, sendo uma sequência da série original, buscava explicar as razões por trás dessa mudança radical. Para evitar a repetição de alguns erros do passado,

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uma nova encarnação do Optimus Prime – renomeado para Optimus Primal, por se transformar em um gorila – foi introduzida, assim como uma nova versão de seu arquiinimigo, Megatron, agora em forma de tiranossauro. Mesmo assim, o restante do elenco era formado majoritariamente por personagens inéditos. A reação imediata dos fãs da Geração 1 à Beast Wars foi extremamente negativa; para eles, a mudança na estética dos robôs era absurda e inadmissível. Em pouco tempo, porém, muitos perceberam que haviam se precipitado em seus julgamentos. A trama do desenho animado passou a ser bastante elogiada e, para o alívio da Kenner e a satisfação da Hasbro, a linha de brinquedos estava lentamente se tornando um sucesso de vendas.

Figura 13 – Divulgação da linha Beast Wars: Transformers, 1996.

Fonte: BWTF. . Acesso em 02/12/2019.

Os consumidores haviam percebido novidades revolucionárias nas figuras de Beast Wars, que tornaram-se o padrão seguido por praticamente todas as linhas posteriores: graças aos avanços na engenharia de brinquedos desde a última década, as figuras passaram a ser muito mais articuladas e a integrar movimentos básicos – como joelhos e cotovelos – em suas transformações, tornando-as mais dinâmicas. Durante a G1, as figuras eram extremamente limitadas em articulações e, normalmente, possuíam apenas os movimentos necessários para mudar de forma – mesmo que isso significasse dobrar os joelhos apenas para frente. Outra novidade foi a introdução das classes de tamanho; todas as figuras pertenciam a uma das quatro classes, facilitando a determinação de preços e a escala correta entre os personagens

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conforme vista na animação. Apesar de passar por diversas alterações ao longo dos anos, o sistema de classes provou-se muito eficiente e continua em uso atualmente. Durante a exibição de Beast Wars, foram produzidas mais duas séries exclusivas no Japão e, em 1999, foi lançada a sequência direta Beast Machines: Transformers. O conjunto dessas séries passou a ser conhecido pelos fãs como Beast Era, a “era dos animais”. Atualmente, Beast Wars continua sendo um dos maiores focos de discussão entre o fandom no mundo inteiro; muitos fãs a consideram como um dos melhores momentos da franquia, enquanto outros a veem como uma mancha na sua história, e poucos são os que não se encontram em um dos extremos. Mas independente da falta de consenso, é difícil imaginar que a franquia teria sobrevivido até a virada do milênio sem esta inusitada reinterpretação. Beast Machines, porém, não agradou nem mesmo aos fãs de sua antecessora, sendo duramente criticada por seu roteiro e seus brinquedos, o que levou ao seu rápido cancelamento no ano 2000. Mais uma vez, era necessário renovar a franquia para mantê-la relevante.

3.2.4 Co-produções japonesas e o surgimento da nostalgia (2001-2006)

A partir dos anos 2000, a franquia entrou em um ciclo de renovação constante, que se repete a cada um a três anos em média, ao mesmo tempo em que alguns de seus “pilares” são mantidos quase inalterados mesmo através de tantas mudanças. O motivo é simples: o público infantil, que é o público primário de todos os produtos da Hasbro, está sempre se renovando e gerando novas tendências no mercado, que a empresa faz questão de seguir para não ficar para trás. Por outro lado, apelar aos fãs já existentes, que muitas vezes se tornam adultos colecionadores, também é vantajoso; por isso é importante manter personagens como Optimus Prime perpetuamente disponíveis em lojas de brinquedos. A distância entre novos lançamentos também passou a ser cada vez mais curta; as linhas não são mais renovadas uma vez por ano, mas sim a cada três meses em média. Em 2000, a Hasbro fechou a sua subsidiária Kenner, cancelando os planos para uma sequência de Beast Machines e sem ter certeza de qual seria o futuro da franquia. Enquanto isso, a Takara lançava mais uma curta série animada exclusiva, chamada Transformers: Car Robots (figura 14), que trazia de volta os modos alternativos tradicionais de carros e caminhões. Convenientemente, desde o final da

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década de 1990, os animes – desenhos animados japoneses – estavam se tornando cada vez mais populares na América, o que incentivou a Hasbro a, pela primeira vez, importar e adaptar uma animação da Takara para o ocidente. A série passou a se chamar Transformers: Robots in Disguise (Transformers: A Nova Geração no Brasil) e foi ao ar em 2001, junto com o lançamento da sua linha de brinquedos.

Figura 14 – Pôster da série animada Transformers: Car Robots, 2000.

Fonte: RIDForever. . Acesso em 02/12/2019.

As satisfatórias vendas de Robots in Disguise comprovaram para a Hasbro que valia a pena apostar em animes, o que a levou a trabalhar em conjunto com a Takara para produzir a sua próxima série animada japonesa, intitulada Transformers: Armada (figura 15), que seria exibida simultaneamente nos Estados Unidos e no Japão em 2002. Aproveitando-se do sucesso da franquia nipônica Pokémon e da sua famosa mentalidade de que “temos que pegar todos”, plantando na mente de milhares de crianças a ideia não apenas de colecionar, mas de realmente “capturar” as suas centenas de personagens, Armada introduziu Transformers em miniatura chamados Mini-Cons, que eram cobiçados tanto pelos Autobots quanto pelos Decepticons devido a suas propriedades especiais. Isso foi refletido na linha de brinquedos, em que as figuras de tamanhos normais, quando interagiam com os Mini-Cons através de botencaixes, tinham vários mecanismos secretos ativados, aumentando a diversão na hora da brincadeira e também incentivando a compra tanto das figuras grandes quanto das pequenas.

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Figura 15 – Divulgação da linha Transformers: Armada, 2002. (Observe que cada figura de tamanho padrão vinha acompanhada por um Mini-Con, que também eram vendidos separadamente).

Fonte: NTFA. . Acesso em 02/12/2019.

A história de Armada foi continuada em mais dois animes co-produzidos pela Hasbro e pela Takara: Transformers: Energon em 2004 e Transformers: Cybertron em 2005. As suas linhas de brinquedos não contavam mais com os Mini-Cons, mas os substituíram por novas formas de interações entre as figuras. Os três animes em conjunto são referidos pelos fãs como a “trilogia Unicron”, nome derivado do vilão principal presente nas três etapas da trilogia, mas que já havia sido introduzido em The Transformers: The Movie. Mas apesar do sucesso de Armada, as sequências não foram bem recebidas devido a críticas à qualidade de suas animações, com Energon sendo citada por grande parte do fandom como a pior série animada já produzida na franquia, e as linhas de brinquedos foram bastante modestas em suas vendas. Enquanto a trilogia Unicron sustentava a franquia no mercado de produtos infantis, a Hasbro e a Takara davam seus primeiros passos para reconquistar os antigos fãs da Geração 1, agora adultos. Em 2003, foi lançada a linha The Transformers: Masterpiece (figura 16), criada exclusivamente para colecionadores adultos capazes de investir valores muito mais altos em um único produto de qualidade excepcional; o primeiro lançamento foi, naturalmente, a maior e mais complexa figura do Optimus Prime até então. Também em 2003, a linha Transformers:

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Alternators foi a primeira a adquirir a licença de fabricantes reais de automóveis para produzir réplicas perfeitas de seus veículos, todos em uma escala de 1:24.

Figura 16 – Optimus Prime da linha The Transformers: Masterpiece, 2003.

Fonte: TFW2005. . Acesso em 02/12/2019.

Outras linhas dedicadas aos consumidores nostálgicos foram lançadas nos anos seguintes, mas a que se destacou foi a Transformers Classics em 2006, que, semelhante à Masterpiece, se baseava no visual dos personagens de 1984, mas obedecia às classes de tamanho estabelecidas em Beast Wars e era vendida a preços mais acessíveis. Classics foi um sucesso maior do que o previsto pela Hasbro e deu início a uma contínua série de “releituras da G1” que tornaram-se uma das partes mais importantes da franquia no decorrer da década seguinte. Adicionalmente, uma nova editora chamada IDW Publishing adquiriu a licença de Transformers e passou a publicar seus próprios quadrinhos baseados na Geração 1 a partir de 2005.

3.2.5 Produções de Hollywood e expansões constantes (2007-2017)

Durante os primeiros anos do século XXI, a franquia se sustentava de forma relativamente estável, mas não era o suficiente para a Hasbro. A empresa acreditava que o momento estava chegando para que a franquia retornasse às telas de cinemas, mas não com um desenho animado tradicional, e sim com uma produção milionária em live-action, ou seja, com atores reais. Tecnicamente, os robôs continuariam sendo animações, criadas através da tecnologia mais avançada de

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CGI14 disponível em Hollywood, que os tornaria tão verossímeis aos nossos olhos quanto os próprios veículos que seriam filmados na vida real para interpretá-los.

Figura 17 – Pôster do filme Transformers, 2007.

Fonte: TFWiki. . Acesso em 02/12/2019.

Lançado mundialmente em 2007, o primeiro filme live-action da franquia, intitulado apenas Transformers (figura 17), foi dirigido pelo famoso diretor americano Michael Bay e produzido pelos estúdios de Hollywood, Paramount e Dreamworks. Carros e veículos militares de diversas marcas foram usados como os modos alternativos dos Transformers no filme, mas uma parceria especial com a General Motors15, mantenedora da Chevrolet, garantiu a participação da fabricante na produção e divulgação do filme (figura 18). Para a linha de brinquedos, foi seguido o exemplo de Alternators e as licenças da maioria das fabricantes dos veículos reais foram adquiridas. O filme causou a maior divisão na opinião dos fãs desde Beast Wars, com alguns elogiando os seus efeitos especiais de última geração e o novo patamar de reconhecimento e sucesso atingido pela franquia, enquanto outros criticaram ferozmente a nova estética dos robôs e a qualidade duvidosa de outros aspectos da produção, em especial a direção de Michael Bay, que se tornou alvo de muita

14 CGI, ou computer-generated imagery (imagens geradas por computador), é um recurso comumente utilizado no cinema desde a década de 1990 para criar cenas impossíveis ou muito difíceis na realidade. 15 General Motors é uma fabricante de automóveis norte-americana fundada em 1908. Criou a sua subsidiária mais conhecida, a Chevrolet, em 1911.

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comoção no fandom. Por ser um lançamento de Hollywood, milhares de pessoas de todas as idades e de fora do fandom assistiram à produção, incluindo críticos profissionais de cinema, que em sua maioria tiveram as mesmas opiniões encontradas entre os fãs. Mas o importante, especialmente para a Hasbro, é que o sucesso de bilheteria do filme e das vendas de seus brinquedos tornou a franquia bilionária, e é graças a esse impulso que os outros setores da franquia, como os desenhos animados e as linhas para colecionadores, são capazes de sustentar seus custos de produção.

Figura 18 – Bumblebee em cenas do filme Transformers, 2007. (No topo, seu modo robô, mostrando a complexidade da nova estética visual e a qualidade do CGI. Embaixo, seu modo alternativo de Chevrolet Camaro, mostrando a parceria da produção com a fabricante de veículos).

Fonte: Adaptado de TFWiki. . Acesso em 02/12/2019.

Devido ao novo visual extremamente detalhado dos robôs, diferente de qualquer interpretação no passado, os brinquedos também se tornaram mais complexos em seus mecanismos, e passaram a preencher um nicho do mercado antes pouco explorado: adolescentes e jovens adultos, mais velhos para os brinquedos dos desenhos animados e ainda muito novos para as figuras destinadas aos colecionadores adultos. A linha manteve o uso das classes de tamanho, mas popularizou outra estratégia que favoreceu ainda mais as suas vendas: lançar um mesmo personagem em duas classes ou mais (figura 19), dando assim uma maior opção de escolha ao consumidor. A menor figura do Optimus Prime pode ser a única acessível ao bolso de alguns fãs, enquanto outros podem e querem investir na figura maior, mais cara e que possui recursos eletrônicos. As classes também permitem ao

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personagem que esteja disponível em diferentes níveis de complexidade; podem haver uma versão mais fácil e rápida de converter para as crianças, e outra versão mais bem elaborada que desafie até os adultos. O importante é fornecer a todos os públicos a chance de possuir cada personagem em suas coleções.

Figura 19 – Comparação entre várias figuras do Optimus Prime, todas da linha de 2007. (Cada uma pertence a uma classe diferente, que define características como tamanho, complexidade e preço).

Fonte: Adaptado de Seibertron. . Acesso em 04/12/19.

Durante os 10 anos seguintes, Michael Bay dirigiu quatro sequências do filme (figura 20): Transformers: Revenge of the (Transformers: A Vingança dos Derrotados, 2009); Transformers: Dark of the Moon (Transformers: O Lado Oculto da Lua, 2011); Transformers: Age of Extinction (Transformers: A Era da Extinção, 2014); e Transformers: The Last Knight (Transformers: O Último Cavaleiro, 2017).

Figura 20 – Pôsteres dos quatro filmes lançados entre 2009 e 2017. (Da esquerda para direita: Revenge of the Fallen, Dark of the Moon, Age of Extinction e The Last Knight).

Fonte: Adaptado de TFWiki. . Acesso em 02/12/2019.

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Apesar das críticas ficarem mais negativas a cada lançamento, a bilheteria manteve-se em um crescimento constante, até atingir seu ápice com a quarta produção, que obteve o maior arrecadamento mundial de 2014. O quinto longa, porém, foi um verdadeiro fracasso de bilheteria, além de receber as mais duras críticas por seu roteiro incompreensível, o que causou o diretor a abandonar a franquia. Durante esse período, cada filme recebeu sua própria linha de brinquedos, com a linha de Revenge of the Fallen sendo a maior em número de produtos e a mais elogiada. No entanto, cada linha subsequente foi trazendo menos produtos ao mercado, chegando ao ponto de a linha do quinto filme ser encerrada como uma das menores de todas as eras da franquia. Sofrendo o mesmo destino do filme no qual foi baseada, a linha The Last Knight foi a mais decepcionante em termos de vendas e satisfação dos consumidores. A influência que a série de filmes teve na franquia como um todo não pode ser ignorada. Bumblebee, um personagem completamente ausente desde Generation 2, fez seu grande retorno como o principal no elenco, agora transformando- se em um Chevrolet Camaro de última geração. A sua popularidade com o público de dentro e fora do fandom levou ao lançamento de centenas de brinquedos baseados em sua imagem (muitas vezes mais do que qualquer outro personagem), garantiu a sua presença com relevância em todas as mídias subsequentes da franquia e ainda colaborou com a popularização e o sucesso de vendas do novo Camaro.

Figura 21 – Pôster da série animada Transformers Animated, 2008.

Fonte: TFWiki. . Acesso em 02/12/2019.

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Em 2008, foi lançada a série Transformers Animated (figura 21), que se aproveitou de muitos temas e conceitos apresentados ou popularizados pelo filme de 2007, apesar de possuir uma estética muito diferente e estilizada de acordo com as tendências em animações da época. Animated foi bem recebida e é considerada por uma parcela do fandom como a melhor encarnação da franquia, mas sofreu um fim prematuro em 2009, quando foi cancelada devido a mudanças nos planos da Hasbro. Desde o princípio, a ficção de Transformers funciona como um “multiverso”, ou seja, se divide em múltiplas narrativas que não são conectadas. O desenho animado e os quadrinhos da Geração 1, por exemplo, não se encaixam em uma única linha do tempo, pois possuem eventos inconciliáveis; logo, cada mídia constitui um universo diferente dentro do multiverso. Do mesmo modo, nem todas as séries animadas compartilham do mesmo universo, e a maioria delas possui adaptações em jogos e quadrinhos que contam versões alternativas de suas histórias. Durante a década de 2010, porém, a Hasbro decidiu experimentar com uma nova estratégia de narrativa transmídia: o plano visava acabar com as múltiplas encarnações e unificar todas as mídias em um único universo, uma única linha do tempo.

Figura 22 – Pôster da série animada Transformers: Prime, 2010.

Fonte: TFWiki. . Acesso em 02/12/2019.

Essa nova encarnação da franquia, apelidada pelos fãs de “Aligned” (alinhado, em inglês), contou com as seguintes mídias: dois jogos de múltiplas plataformas, Transformers: War for Cybertron em 2010 e Transformers: Fall of Cybertron em 2012; três séries animadas, Transformers: Prime de 2010 a 2013

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(figura 22), Transformers: Rescue Bots de 2011 a 2016 (figura 23), e Transformers: Robots in Disguise de 2015 a 2017 (não relacionada à série de mesmo nome de 2001); quatro livros, Transformers: Exodus em 2010, Transformers: Exiles em 2011, Transformers: The Covenant of Primus em 2013 e Transformers: Retribution em 2014; e algumas histórias em quadrinhos. Mesmo que cada produto midiático tivesse seu próprio público-alvo – com Rescue Bots sendo criada especificamente para crianças pré-escolares, enquanto Prime direcionava-se a um público adolescente –, todos foram idealizados para poderem se encaixar em uma grande narrativa contínua. Apesar dessa unificação, porém, muitos fãs se recusam a aceitar as conexões ou são simplesmente ignorantes à existência delas; para eles, os jogos não ocorrem antes dos eventos de Prime, que por sua vez não deveria ter ligação com Rescue Bots e assim por diante, mesmo quando existem evidências na ficção e declarações oficiais da Hasbro que corroboram com as conexões.

Figura 23 – Segunda abertura da série animada Transformers: Rescue Bots, 2016.

Fonte: TFWiki. . Acesso em 02/12/2019.

Durante todo esse período, a IDW continuou publicando a sua encarnação da Geração 1 em seus quadrinhos, ganhando uma enorme popularidade com o lançamento do título The Transformers: More than Meets the Eye em 2012. A saga chamou a atenção de leitores de quadrinhos que tiveram seu primeiro contato com a franquia através dela, mas também se tornou alvo de críticas por “humanizar” demais os Transformers, especialmente através de relacionamentos românticos

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entre robôs. No entanto, nem todos os fãs foram contrários às novas ideias, levando muitos a considerá-la como a sua interpretação favorita da franquia. Enquanto isso, as linhas de brinquedos focadas em colecionadores adultos não pararam de crescer; Classics foi seguida pela linha Transformers Universe em 2008 e depois por Transformers Generations em 2010, que continua desde então. Semelhantemente, a linha Masterpiece teve um crescimento significativo, produzindo um número cada vez maior de figuras por ano. Nesse período, os brinquedos se tornaram o foco principal da TakaraTomy, que, muitas vezes, lançava versões consideradas superiores em comparação às suas contrapartes produzidas pela Hasbro (figura 24); muitos fãs passaram a preferir tanto as pinturas mais detalhadas das versões japonesas que começaram a importá-las direto do Japão para suas coleções, sem se preocupar com os preços elevados, evitando consumir as versões americanas. Além dos brinquedos, o Japão passou a produzir pouco conteúdo para a franquia, limitando-se a apenas uma curta série animada em 2013 e alguns quadrinhos esporádicos.

Figura 24 – Comparação entre duas versões de uma mesma figura do personagem Blurr, de 2016. (À direita, a versão Hasbro, lançada na linha Generations. À esquerda, a versão TakaraTomy, considerada por muitos a versão superior devido à sua pintura muito mais elaborada).

Fonte: TFormers. . Acesso em 04/12/2019.

A partir de 2007, houve um reposicionamento visando a globalização por parte da TakaraTomy. Tradicionalmente, muitos nomes eram modificados para melhor se adaptarem à língua japonesa; Optimus Prime era chamado de “Convoy” e

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Bumblebee, de “Bumble”, por exemplo. Para o filme de 2007, porém, o país oriental manteve os nomes americanos, se referindo ao “Convoy” como Optimus Prime pela primeira vez. Desde então, a TakaraTomy passou a usar os nomes americanos em todas as novas encarnações da franquia; no entanto, tudo que se refere ao que veio antes de 2007, como a Geração 1, ainda preserva os antigos nomes japoneses.

3.2.6 O presente e o futuro da franquia (2018-2021)

2018 começou com o anúncio de mais um reposicionamento da TakaraTomy: a partir desse ano, todos os seus produtos passaram a ser idênticos às suas contrapartes produzidas pela Hasbro, encerrando a era das “pinturas japonesas superiores”. A notícia desagradou aos fãs que preferiam as versões orientais, mas ainda não há informações sobre se a mudança está afetando as vendas da empresa japonesa. Desde então, todos os produtos de ambas as fabricantes se tornaram indistinguíveis, com exceção, é claro, de quando um produto é lançado apenas por uma delas. Com o objetivo de tornar seu nome mais reconhecido fora do Japão, a TakaraTomy está atualmente inserindo o seu próprio logo, em conjunto ao logo da Hasbro, em todas as embalagens americanas de Transformers (figura 25).

Figura 25 – Típica embalagem da linha Transformers: Studio Series, 2018, uma das primeiras a conter ambos os logos da Hasbro e da TakaraTomy. (Círculos em cor-de-rosa adicionados digitalmente para destacar a presença dos logos).

Fonte: Adaptado de Seibertron. . Acesso em 02/12/2019.

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Com o fracasso na bilheteria de The Last Knight, diversos filmes que estavam sendo planejados foram cancelados, com apenas um deles sobrevivendo por já estar com a sua produção em estado avançado. O filme, entitulado Bumblebee (figura 26) e dirigido pelo novo diretor Travis Knight, se passa no ano de 1987, antes dos eventos de seus antecessores, e foca no personagem homônimo, que já havia se tornado praticamente a mascote da franquia, de volta ao seu clássico modo alternativo de fusca, como era na Geração 1. Lançado no final de 2018, Bumblebee teve a menor bilheteria da saga, vítima do desinteresse do público gerado pelo filme anterior, mas foi extremamente bem recebido pelos fãs e pela crítica; elogios foram feitos à sua trama mais simples e contida, sua reimaginação do visual dos vários Transformers que aparecem nele, e a direção mais coesa de Travis Knight comparada à de Michael Bay. No entanto, mesmo com o status de melhor filme da franquia, a pouca bilheteria não animou os estúdios a apostarem em novos lançamentos e, até o presente, não existem informações oficiais sobre quando um novo filme será lançado, apenas rumores e hipóteses.

Figura 26 – Pôster do filme Bumblebee, 2018.

Fonte: TFWiki. . Acesso em 02/12/2019.

Contudo, esse não foi o fim dos filmes para a Hasbro. No início de 2018, foi lançada a linha Transformers: Studio Series, focada em trazer figuras completamente novas dos seis filmes live-action para um público de crianças mais velhas até colecionadores adultos. A linha está sendo bem sucedida, se expandindo durante 2019 e já tendo diversos lançamentos anunciados para 2020, sem previsão

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de acabar. Os principais elogios à Studio Series têm sido a sua dedicação à escala mais próxima da realidade entre os veículos e o avanço na fidelidade dos robôs aos visuais que vemos nos filmes. Em contrapartida, alguns colecionadores ignoram a tentativa de escala realista e optam por criticar a notável redução de tamanho que pode ser observada nas figuras atuais (figura 27); um item lançado hoje em uma determinada classe, quando comparado a um item da mesma classe lançado dez anos atrás, é geralmente menor em alguns centímetros de altura e possui menos material aplicado, enquanto os preços tendem apenas a subir.

Figura 27 – Comparação entre duas figuras com dez anos de diferença. (Ambas representam o personagem Barricade do filme Transformers, e ambas pertencem à mesma classe de tamanho. À esquerda, a figura lançada na linha de 2007. À direita, a figura da linha Studio Series, de 2018. Note como a versão de 2007 é maior, enquanto a versão de 2018 é mais detalhada).

Fonte: YouTube. Emgo316. . Acesso em 02/12/2019.

Enquanto isso, a linha de produtos baseados na Geração 1 chegou à uma nova fase em 2019, intitulada Transformers Generations: War for Cybertron (não relacionada ao jogo homônimo de 2010). A linha possui uma narrativa própria que reconta a clássica história de origem dos Transformers, e é dividida em três partes (figura 28): Siege, de 2019, em que todos os robôs transformam-se em veículos “cybertronianos”, ou seja, do seu planeta-natal; Earthrise, de 2020, em que os robôs adquirem modos terrestres ao chegarem na Terra; e uma terceira parte ainda não revelada, que potencialmente será lançada em 2021. Uma série animada inspirada especificamente em Siege será lançada a partir de 2020 na Netflix, com a possibilidade de também adaptar Earthrise e a terceira parte da linha nos próximos

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anos. Em 2018, a IDW concluiu a sua saga de quadrinhos iniciada em 2005, mas, já em 2019, deu início a uma nova saga inspirada na trama e nos brinquedos de Siege; até o momento, não houveram mudanças significativas nas reações dos leitores ao recomeço dos quadrinhos.

Figura 28 – Comparação entre duas figuras do Starscream lançadas na linha War for Cybertron. (À esquerda, a versão Siege, que se torna um “jato cybertroniano”. À direita, a versão Earthrise, que assume a sua clássica forma de jato na Terra. As figuras estão próximas da escala real).

Fonte: Adaptado de TFWiki. . Acesso em 02/12/2019.

O setor da franquia dedicado ao público infantil também continua forte na atualidade. Em 2018, estrearam a série animada e a linha de brinquedos Transformers: Cyberverse (figura 29), uma espécie de amálgama da Geração 1 com elementos inspirados em todas as outras encarnações ao longo dos anos; um reflexo da atual mentalidade de “apelo à nostalgia” presente em toda a franquia, até mesmo em um produto criado para atrair crianças e novos consumidores. O protagonista da animação é Bumblebee, capitalizando em sua contínua popularidade com as crianças e no recente lançamento de seu próprio filme. Apesar de ter sido criada para televisão, a série também está sendo disponibilizada gratuitamente no canal oficial de Transformers no YouTube. Em paralelo, foi lançada também outra série animada, Transformers: Rescue Bots Academy, uma sequência direta de Rescue Bots que continua sendo direcionada a crianças pré-escolares; apesar de tecnicamente fazer parte do universo Aligned, aquele conceito não é mais explorado desde 2017 e parece ter

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sido abandonado pela Hasbro. Devido a novas tendências no mercado de animações infantis, tanto Cyberverse quanto Rescue Bots Academy possuem apenas 11 minutos de duração por episódio, ao contrário da tradicional duração de 22 minutos usada por todas as séries anteriores.

Figura 29 – Arte promocional da série animada Transformers: Cyberverse, 2018.

Fonte: TFWiki. . Acesso em 02/12/2019.

Mas a novidade mais inusitada introduzida em 2018 foi a linha Transformers: BotBots (figura 30), em que centenas de novos robozinhos foram introduzidos e transformam-se em objetos inesperados, como alimentos, plantas, materiais escolares e até mesmo um rolo de papel higiênico. As figuras, que não medem mais do que cinco centímetros, são vendidas de três formas diferentes: em embalagens individuais e “secretas” que não revelam qual figura você está comprando, exceto por um código minúsculo que os colecionadores aprenderam a decifrar; em pacotes com cinco figuras; e em pacotes com oito figuras. Devido à organização pré-determinada dos pacotes, porém, é impossível adquirir todas as figuras sem acabar com algumas repetidas; de acordo com a Hasbro, isso é intencional e busca incentivar as crianças a realizar trocas entre si. Em um ano, a linha já ultrapassou a marca de 200 figuras, e ainda mais lançamentos já foram anunciados para 2020. BotBots foi muito bem recebida por uma pequena parcela de fãs devido à sua originalidade, mas a maior parte do fandom simplesmente ignora a sua existência – afinal, como muitos justificam, o público primário é crianças muito pequenas, não colecionadores adultos.

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Figura 30 – Divulgação da linha Transformers: BotBots, 2018.

Fonte: TFWiki. . Acesso em 02/12/2019.

Para garantir a compreensão das diferentes eras da franquia ao longo de sua existência, conforme analisado detalhadamente acima, foi elaborada uma síntese (tabela 2) que apresenta de modo compacto os acontecimentos mais importantes de cada período, permitindo um olhar mais alinhado e direto de como as mudanças de cada era se agregaram e moldaram a franquia como ela é hoje.

Tabela 2 – Resumo das eras da franquia Transformers.

Fonte: Elaborada pelo autor, 2019.

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Diversas outras linhas de menor presença e que se destinam a nichos muito mais específicos do mercado continuam a ser vendidas, incluindo a ainda bem- sucedida Masterpiece. A franquia também segue recebendo inúmeros produtos licenciados por outras fabricantes, uma grande variedade de jogos on-line e, mais recentemente, um jogo de cartas colecionáveis chamado Transformers Trading Card Game, cuja relevância para o seu futuro ainda é incerta.

3.3 A franquia Transformers no Brasil

Transformers possui uma trajetória um tanto única no que diz respeito à sua presença no Brasil. Em geral, os lançamentos brasileiros sempre seguiram os passos dos Estados Unidos, mas houveram mudanças significativas em alguns períodos, em especial na primeira década.

Figura 31 – Versão brasileira da capa da revista Transformers #1, 1985.

Fonte: Nível Épico. . Acesso em 03/12/2019.

A série animada original chegou ao Brasil em 1986, dois anos após a sua estreia na América do Norte, e foi exibida na Rede Globo até meados de 1989. Por motivos nunca esclarecidos, os três primeiros episódios não foram trazidos para cá e a exibição começou pelo quarto episódio. Transformers: O Filme não estreou nos cinemas e, em vez disso, foi dividido e exibido como cinco episódios na televisão. Os quadrinhos da Marvel já eram publicados em português desde 1985 pela editora Rio

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Gráfica (figura 31), que substituiu os nomes de quase todos os personagens: Optimus Prime, por exemplo, se tornou “Supremus Absolutus”, e Bumblebee se tornou “Furão”. No desenho animado, apenas Optimus Prime teve seu nome adaptado para “Líder Optimus”. Em algum momento, a publicação dos quadrinhos foi transferida para a Editora Globo, que a cancelou em 1987. Mas a maior diferença em comparação às versões americana e japonesa da franquia durante a década de 1980 estava na linha de brinquedos (figura 32). A licença para fabricar e vender Transformers no Brasil foi adquirida pela Estrela16, que trouxe apenas uma quantia de menos do que dez moldes para o país, dentre eles o molde do Bumblebee; figuras importantes como Optimus Prime, Megatron e Starscream não vieram para o Brasil. Mesmo utilizando alguns moldes disponibilizados pela Hasbro, nenhum lançamento brasileiro fazia uso dos personagens americanos; ao invés disso, nomes mais genéricos eram utilizados, como “Volks” no lugar de Bumblebee.

Figura 32 – Alguns produtos da linha Transformers da Estrela, 1986: “Volks” (esquerda superior) é idêntico ao Bumblebee da Hasbro; “Pick-Up” (esquerda inferior) também é um molde da Hasbro, mas em cores diferenciadas; Já o “Bat-Robô Turbo” (direita) é um molde exclusivo da Estrela.

Fonte: Adaptado de Toy Archive. . Acesso em 03/12/2019.

No primeiro ano da linha, os robôs não eram divididos entre bons e maus; já no segundo, novas facções com suas próprias insígnias chamadas “Optimus” e “Malignus” foram adicionadas. Para reforçar o tamanho de sua linha – enquanto

16 Estrela é uma fabricante de brinquedos brasileira baseada em São Paulo e fundada em 1937.

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seguia o exemplo da própria Hasbro na época –, a Estrela adquiriu diversos moldes de robôs transformáveis vindos de outras fontes e os lançou em Transformers; o resultado foi uma linha bem diferente da americana, lembrada com muito carinho pelos fãs brasileiros que eram criança na época. Atualmente, a antiga linha da Estrela é desejada por colecionadores de todo o mundo, devido à sua extrema raridade e pela sua curiosidade histórica. A partir da década de 1990, os lançamentos brasileiros passaram a se alinhar muito mais com os americanos, tendendo sempre a atrasos de alguns meses e com quantidades muito menores de produtos disponíveis. As séries Beast Wars e Beast Machines foram exibidas na TV Record, enquanto A Nova Geração e Armada foram ao ar na Rede Globo até aproximadamente 2007, e Animated entrou na sua programação em 2008. Já a série Prime foi exibida na Rede Bandeirantes e Rescue Bots, na TV Cultura. Cyberverse é atualmente disponibilizada com dublagem em português no canal oficial de Transformers no YouTube. Por fim, todos os filmes live- action foram lançados nos cinemas na mesma época de seus lançamentos mundiais. Apesar da série Cybertron não ter sido exibida por aqui, sua linha de brinquedos foi trazida para lojas brasileiras novamente pela Estrela, que desta vez apenas distribuiu os produtos diretamente da Hasbro e não os modificou de forma alguma; em geral, existem poucos registros de como foi a distribuição de outras linhas durante o espaço de 1996 a 2006 no Brasil, tornando a apuração sobre esse período a mais imprecisa.

Figura 33 – Relógio Transformers da Grendene, 2008. (Um dos únicos produtos exclusivos do Brasil nos últimos 20 anos).

Fonte: Fotografia tirada pelo autor, 2018.

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Desde 2007, diversas lojas brasileiras, tanto físicas quanto virtuais, vêm trazendo as principais linhas da Hasbro para o Brasil, mas sempre em quantias significativamente pequenas; não há registro de nenhuma linha que tenha tido todos os seus produtos disponibilizados por aqui. Outras mídias são ainda mais raras no nosso país, com algumas delas, como os quadrinhos da IDW, nunca tendo recebido traduções nem lançamentos oficiais. Da mesma forma, produtos exclusivos ao Brasil tornaram-se cada vez mais raros, mas não inexistentes; em 2008, a fabricante de sapatos Grendene produziu um sapato infantil baseado no filme de 2007, licenciado pela Hasbro, e oferecia como brinde da compra um robô que se convertia em relógio de pulso (figura 33). Esse robô é uma versão exclusiva de um molde da Hasbro que só foi lançado em outras cores nos Estados Unidos. Outro exemplo são os ovos de Páscoa temáticos da franquia, vendidos no Brasil quase todo ano, que carregam de brinde miniaturas exclusivas baseadas em seus personagens.

3.4 Principais concorrências no passado e no presente

Desde a sua origem, a franquia Transformers sempre enfrentou a típica concorrência de outras marcas destinadas ao público infantil, que produzem seus próprios brinquedos e desenhos animados. No entanto, um concorrente em particular chamou muita atenção durante os primeiros anos da década de 1980, devido à sua curiosa relação com Transformers: os GoBots (figura 34). GoBots foi uma linha de brinquedos composta por robôs que mudavam de forma e se tornavam veículos como carros e aviões. A linha havia sido originalmente produzida pela empresa japonesa com o nome de Machine Robo, e foi eventualmente levada para os Estados Unidos pela Tonka, onde foi renomeada. Os brinquedos foram lançados em 1983, cerca de seis meses antes do lançamento de The Transformers, mas o seu desenho animado, batizado de Challenge of the GoBots, estreou apenas em outubro de 1984. No Brasil, a linha era chamada de Mutante e foi distribuída pela empresa Glasslite, então concorrente da Estrela. Na trama da série animada, os GoBots viviam em seu próprio planeta antes de chegarem à Terra e dividiam-se em duas equipes, uma do bem e outra do mal. Em 1986, um filme animado baseado em GoBots foi lançado nos cinemas norte- americanos.

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Figura 34 – Divulgação da linha GoBots, 1984.

Fonte: Ghost of the Doll. . Acesso em 03/12/2019.

A semelhança gritante entre as duas franquias levou a muitos debates entre os consumidores da época, tanto adultos quanto crianças. Os que defendiam GoBots o faziam principalmente por serem a opção mais barata, motivo que os tornou preferidos pelos adultos que compravam para seus filhos. A maioria das crianças, no entanto, preferia Transformers, devido à maior complexidade de suas transformações em comparação, a maior variedade de tamanhos e modos alternativos entre as figuras e a qualidade superior de seus materiais, além de também preferirem os personagens e o desenho animado da franquia da Hasbro. Em 1987, mesmo com Transformers já não sendo tão forte no mercado quanto era nos primeiros anos, GoBots já havia desaparecido; consequentemente, naquele mesmo ano, a Hasbro comprou a Tonka e tornou-se proprietária dos GoBots, acabando de vez com a sua concorrência. Atualmente, a franquia GoBots é raramente explorada pela Hasbro, mas o seu nome já foi incorporado em algumas linhas de Transformers desde a sua aquisição, em especial para se referir a brinquedos criados especificamente para crianças muito pequenas; setor hoje ocupado unicamente por Rescue Bots. Recentemente, em 2018, a IDW adquiriu a licença de GoBots e lançou uma curta série em quadrinhos baseada na franquia. Seus personagens também fazem constantes aparições especiais em diversas mídias de Transformers (figura 35), fenômeno que levou muitos fãs a apreciarem a relação de “amor e ódio” preservada entre as franquias.

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Figura 35 – Cena da revista The Transformers: Megatron Origin #2, publicada em 2007 pela IDW. Nela, o líder dos vilões da franquia GoBots, Cy-Kill (direita), é assassinado por Megatron (esquerda), em uma breve participação especial.

Fonte: TFWiki. . Acesso em 03/12/2019.

Algumas décadas se passaram sem que a franquia Transformers tivesse qualquer concorrência direta; de fato, outras franquias sobre robôs – que mudam de forma ou não – são especialmente comuns no Japão, mas algo tão parecido como GoBots nunca mais existiu. O que surgiu há cerca de dez anos, no entanto, é um tipo menos tradicional de concorrência, pouco analisado até mesmo por especialistas, que se tornou motivo de fervorosos debates entre diversos círculos de colecionadores dentro do fandom e já causou algumas dores de cabeça para a própria Hasbro. Trata- se de figuras não licenciadas ou, de forma mais direta, pirateadas de Transformers. Existem dois tipos de figuras não licenciadas que se popularizaram entre colecionadores na última década. O primeiro tipo (figura 36) são as cópias diretas de produtos da Hasbro e da TakaraTomy, aqueles popularmente conhecidos no Brasil como brinquedos “de camelô” ou “do Paraguai”; dentro do fandom, é mais comum o uso do termo em inglês knockoff para se referir a eles, abreviado para KO. Por anos, esses produtos foram vistos como insignificantes por serem de qualidade muito inferior aos originais; nos dias de hoje, porém, é possível encontrar cópias quase indistinguíveis dos produtos verdadeiros, inclusive em quesitos como qualidade de pintura e de materiais. Algumas versões pirata passam por modificações que são consideradas, por parte dos fãs, como melhorias ao modelo original; dentre elas,

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costumam estar o aumento no tamanho da figura, a aplicação de materiais e pinturas vistos como superiores, e a adição de articulações não presentes no modelo original.

Figura 36 – Comparação entre um produto original e um item falsificado. (À esquerda, a figura oficial do personagem Scorn, lançada na linha The Last Knight em 2017. À direita, um knockoff da mesma figura, produzida por uma fabricante chinesa chamada “Black Mamba” em 2019. Note como o item KO é várias vezes maior do que o original e possui cores totalmente diferentes. Além disso, o produto pirata possui luzes eletrônicas que não estão presentes no original).

Fonte: YouTube. Emgo316. . Acesso em 03/12/2019.

O segundo tipo de falsificação (figura 37) ocorre quando uma suposta fabricante, popularmente chamada de “third party”17 ou simplesmente 3rd, cria seu próprio produto do zero, mas que é claramente baseado em um determinado personagem da franquia Transformers sem possuir a devida autorização; logo, o produto está infringindo uma propriedade intelectual que pertence à Hasbro. Muitos colecionadores vêm adicionando esses itens não licenciados às suas coleções, argumentando que os consideram superiores a qualquer oferta da Hasbro, ou então porque elas realizam um desejo de consumo específico até então não atendido, como, por exemplo, um personagem específico em um tamanho ou visual nunca produzido oficialmente. Enquanto alguns desses itens não-oficiais buscam preencher demandas deixadas em aberto, alguns são produzidos com a clara intenção de competir diretamente com contrapartes oficiais já existentes.

17 Third party é a expressão normalmente usada para se referir a uma empresa terceirizada através de um licenciamento. Neste caso, o uso da expressão está incorreto, pois os produtos em questão não são licenciados, mas a maioria dos consumidores a utiliza mesmo assim, por simples costume.

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A popularidade desse fenômeno é tamanha que muitas dessas fabricantes se tornaram reconhecidas por nome, levando alguns consumidores a se fidelizarem a elas e a defendê-las abertamente. Alguns colecionadores já chegaram ao ponto de abandonarem completamente os produtos oficiais e consumirem apenas os não- licenciados. É importante notar também que existem muitos produtos third party são várias vezes mais caros que qualquer produto oficial, devido a suas produções mais limitadas e maior gasto de matéria-prima por unidade, demonstrando que muitos consumidores estão dispostos a pagar qualquer valor por uma figura que acreditam que irá satisfazer suas vontades, mesmo quando as mesmas não são legalizadas.

Figura 37 – Exemplo de produto não-licenciado. (O personagem Kaon, originalmente criado para os quadrinhos da IDW e que vira uma cadeira elétrica, nunca recebeu uma figura oficial. Isso facilitou a popularização deste item third party criado pela suposta fabricante “Mastermind Creations”).

Fonte: TFSource. . Aceso em 03/12/2019.

A atitude da Hasbro em relação a essas falsificações tem sido bastante discreta ao longo dos anos, mas ela já reconheceu a existência do problema. Alguns representantes da empresa, quando entrevistados, já solicitaram aos fãs que não apoiem essa prática criminosa. Em várias ocasiões, notícias de fontes duvidosas espalhadas dentro do fandom diziam que a Hasbro estaria acionando a justiça – tanto nos Estados Unidos quanto na China, país de origem da maioria desses produtos – para combater todo e qualquer plágio de suas propriedades intelectuais; no entanto, essas informações nunca foram confirmadas e nem seus efeitos foram sentidos. Um caso notável ocorreu no segundo semestre de 2019 quando, após o

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anúncio de uma nova figura do Unicron pela Hasbro, uma fabricante ilegal chamada “Zeta Toys” revelou imagens de seu próprio produto baseado no mesmo personagem. Segundo relatos, a concorrência desleal chamou a atenção da Hasbro, que teria entrado com um processo e obrigado as imagens da Zeta a serem removidas da internet. Até o momento, não existem provas de que a Hasbro tenha mesmo tomado essa atitude, mas o “Unicron” que estaria sendo produzido pela impostora realmente desapareceu de todos os sites que o estavam divulgando. Apesar de não conseguir impedir que a aparência de seus personagens seja plagiada, a Hasbro toma alguns cuidados especiais para proteger os nomes dos mesmos e também o da própria franquia. Devido à sua enorme popularidade desde a década de 1980 e também pela simplicidade da palavra na língua inglesa, “Transformers” tornou-se sinônimo de qualquer robô que muda de forma no vocabulário popular; o que é muito preocupante para a Hasbro, pois quando uma palavra torna-se descritiva, ela não pode mais ser registrada. Para evitar que o pior aconteça, a empresa parou de associar o nome Transformers com o verbo “transformar”; no seu lugar, “converter” é usado por todos os meios oficiais para se referir à mudança de forma dos robôs, especialmente nas instruções dos brinquedos. Quanto aos personagens, a empresa busca registrar seus nomes sempre que possível; mas nem todos podem ser registrados, por serem palavras genéricas ou por já não estarem disponíveis. Nesses casos, o registro é feito acompanhado de um prefixo, normalmente baseado na facção do personagem, que torna o nome mais distinto; por exemplo, o personagem está registrado como “Autobot Jazz”, enquanto Brawl é legalmente chamado de “Decepticon Brawl”. Outra alternativa é criar um novo nome que seja semelhante ao original, como nos casos de Shrapnel e Reflector, que tiveram seus nomes alterados para “Skrapnel” e “Refraktor”, respectivamente.

3.5 O fandom de Transformers e sua relação com a Hasbro

Durante a década de 1980, ainda não existia um fandom de Transformers bem estabelecido, mas era claro que muitas pessoas já haviam se tornado fãs desde o lançamento inicial da franquia. Os mais antigos registros de envolvimento direto dos fãs com a franquia encontram-se nas cartas publicadas nos quadrinhos da Marvel, que eram sempre respondidas por editores das revistas. Uma das primeiras

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ações da Hasbro para mobilizar os consumidores mais ávidos foi disponibilizar alguns produtos da linha de brinquedos exclusivamente através de compras pelo correio, que funcionavam de forma semelhante às atuais compras pela internet. O consumidor precisaria comprar outros produtos Transformers, recortar de suas embalagens “pontos cumulativos”, e enviá-los por correio diretamente para a Hasbro junto de uma determinada quantia em dinheiro, para então receber essas figuras especiais algum tempo depois.

Figura 38 – Interface do site Seibertron. (À esquerda, a página inicial, com algumas notícias em destaque e sugestões de galerias. À direita, uma das suas mais recentes galerias, mostrando em detalhes uma figura da linha War for Cybertron).

Fonte: Adaptado de Seibertron. . Acesso em 03/12/2019.

Na década de 1990, com a popularização da internet, os primeiros fandoms on-line começaram a surgir e a se organizar, principalmente nos Estados Unidos. Fóruns foram criados para que os membros pudessem compartilhar suas experiências e discutir todos os aspectos da franquia. No início da década de 2000, esses fóruns evoluíram para sites de notícias e passaram a acompanhar muito mais de perto as novidades divulgadas pela Hasbro e pela Takara. Dois dos maiores sites de fóruns e notícias sobre a franquia que surgiram nessa época, e que continuam sendo os mais acessados até hoje, são o Seibertron (figura 38) e o TFW2005. O Seibertron também é famoso por suas galerias com centenas de fotos detalhadas da maioria das figuras de Transformers já lançadas.

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Um dos mais ambiciosos sites já criados por fãs, a Transformers Wiki, teve início em 2006 e tem como objetivo catalogar absolutamente todas as informações oficiais existentes sobre a franquia. Desde a sua criação, o site nunca parou de ser atualizado e consta com mais de 26 mil páginas, que detalham a história fictícia de cada personagem, a trama de cada episódio de cada série animada, cada figura já lançada de cada personagem, e assim por diante. Esse massivo acúmulo de informações só é possível porque o site é aberto para ser editado por qualquer usuário da internet, o que incentiva fãs do mundo inteiro a colaborarem com o seu crescimento. A TFWiki é atualmente um dos sites mais importantes não apenas para o fandom, mas também para a própria Hasbro; muitos representantes e associados da empresa já assumiram que utilizam o site para manterem-se informados sobre a franquia e tirarem dúvidas sobre a mesma sempre que necessário. No Brasil, o primeiro site criado por fãs de Transformers que se tem notícia chamava-se “Luna’s Transformers/Beast Wars Page”, de 1999. Dois anos depois, o site evoluiu para um fórum e foi renomeado para “ATB - Aliança Transformers Brasil”. O fórum permaneceu em uso por fãs brasileiros até 2011, quando foi substituído por um grupo de Facebook. Em 2016, o grupo foi renomeado novamente, desta vez para “Nova Cybertron ATB”. Em dezembro de 2019, o grupo encontra-se com cerca de 3.270 membros e é a maior comunidade brasileira de fãs de Transformers da internet.

3.5.1 Principais ações da Hasbro direcionadas ao fandom

Desde a década de 1990, a Hasbro realiza ações, campanhas e eventos com a franquia Transformers visando o engajamento do público consumidor, em especial dos fãs. Começando em 1994, a empresa passou a promover uma convenção oficial dedicada ao fandom chamada BotCon. Cada edição do evento era marcada com exposições das mais diversas linhas de brinquedos da franquia, vendas entre colecionadores, produções de fãs, anúncios, entrevistas com representantes da Hasbro e artistas que já trabalharam na franquia, e lançamentos de figuras oficiais exclusivas que só poderiam ser adquiridas no local do evento. Com a frequência de um a dois eventos por ano, foram realizados um total de 23 BotCons nos Estados Unidos, três no Japão e dois no Reino Unido até o seu encerramento em 2016.

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Em 2017, o BotCon foi substituído por um novo evento chamado HasCon (figura 23); este, porém, não era exclusivo aos fãs de Transformers e promovia outras franquias pertencentes à Hasbro, como G.I. Joe e . A união desagradou grande parte dos fandoms de todas as franquias, levando ao cancelamento da segunda edição que havia sido anunciada para 2019; atualmente, não existem planos de uma nova convenção oficial de Transformers. Nas últimas décadas, a Hasbro também tem promovido a franquia em eventos mais famosos e abrangentes da cultura popular, como a San Diego Comic-Con, a New York Comic Con e, mais recentemente, a Comic Con Experience, realizada anualmente no Brasil desde 2014.

Figura 39 – Fotografia tirada durante o evento HasCon 2017.

Fonte: TFWiki. . Acesso em 03/12/2019.

Outro método usado pela Hasbro para se aproximar do fandom durante vários anos foi o “Transformers Collectors’ Club”, um fã-clube oficial que funcionava como um serviço por assinatura. Os membros do clube ganhavam o direito de receber conteúdos exclusivos, como quadrinhos e textos em prosa que contavam histórias direcionadas especificamente a fãs com um conhecimento mais aprofundado da franquia. Assim como o BotCon, o clube também ofertava diversas figuras exclusivas que não podiam ser adquiridas por outros meios, apesar de todas elas serem meros redecos e retools de figuras mais comuns. Eventualmente, o clube foi encerrado em 2016, sem planos para retornar ou ser substituído por algo parecido. Desde o fim do BotCon e do Collectors’ Club, a Hasbro começou a investir mais tempo às suas redes sociais para promover a franquia de forma mais ampla.

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No Facebook, a página oficial de Transformers possui mais de 2,3 milhões de curtidas, enquanto a conta oficial no Instagram (figura 40), @transformersofficial, agrega cerca de 198 mil seguidores. As mesmas postagens são compartilhadas nas duas redes sociais, e geralmente possuem um dos seguintes conteúdos: revelação das primeiras imagens de produtos que serão lançados em breve; trailers e propagandas dos filmes e desenhos animados; notícias e outras informações relevantes para a franquia; e memes, ou seja, imagens humorísticas criadas usando brinquedos e cenas de outras mídias da franquia. No decorrer de 2019, uma série de vídeos com as mais diversas personalidades que já trabalharam na franquia, incluindo artistas de cinema, desenhistas de quadrinhos e designers de brinquedos, foi publicada para comemorar os 35 anos da franquia.

Figura 40 – Postagens no Instagram oficial de Transformers. (Em sentido horário: Divulgação de pranchas licenciadas; Meme criado com uma cena da animação da Geração 1; Foto comemorativa dos 35 anos da franquia; Uma criança fantasiada de Unicron para o Halloween; Meme criado usando uma figura Transformers; Dois vídeos da série comemorativa de 35 anos; E uma cena de Cyberverse).

Fonte: Instagram. . Acesso em 04/12/2019.

No YouTube, o canal oficial de Transformers possui mais de 321 mil inscritos. Como já mencionado, novos episódios de Cyberverse são publicados regularmente e a série é dublada em diversos idiomas, mas o canal usa um sistema de bloqueio regional para permitir que cada país tenha acesso apenas ao seu idioma, ou seja, no Brasil só é possível assistir aos episódios dublados em português, enquanto norte-americanos só podem assistir ao idioma original. O canal

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também conta com tutoriais de como converter algumas figuras, clipes de episódios de séries antigas, propagandas de brinquedos e outros vídeos de variedades. O site oficial da franquia é personalizado para cada país e possui informações sobre as principais linhas de brinquedos do momento. Já o Twitter oficial, @transformers, possui mais de 260 mil seguidores, mas não faz postagens frequentes; suas últimas atualizações ainda são sobre o lançamento do filme Bumblebee. A Hasbro também possui serviços de atendimento ao cliente específicos para cada país que abrange, incluindo o Brasil, que podem ser contatados por consumidores para tirar dúvidas e solucionar problemas.

3.5.1.1 Campanha HasLab Unicron

Em 2018, a Hasbro realizou um experimento inédito de engajamento com seus consumidores através da criação de um serviço de crowdfunding (financiamento colaborativo) chamado HasLab, hospedado em sua própria loja virtual, a Hasbro Pulse. Nesse serviço, foi anunciado um enorme item de colecionador baseado em uma das naves da franquia Star Wars, da qual a empresa é a atual detentora da licença de fabricação de brinquedos. Mas para que esse produto se tornasse realidade, era preciso que ele atingisse o valor de 5 mil pedidos antecipados dentro de um prazo determinado. A campanha foi uma grande aposta para a Hasbro, mas que no fim foi bem sucedida; a meta foi atingida e o produto, fabricado. Já em 2019, foi a vez dos fãs de Transformers serem mobilizados pela segunda campanha da HasLab. Em 15 de julho de 2019, foi anunciada a mais nova figura do clássico vilão Unicron (figura 41), divulgada como parte da linha Generations: War for Cybertron e baseada diretamente em sua aparência no longa The Transformers: The Movie. A figura teria cerca de 69 centímetros de altura no modo robô e 76 centímetros de diâmetro em seu modo alternativo, um monstruoso planeta metálico, efetivamente fazendo dela a maior figura Transformers de todos os tempos; recorde apropriado a um personagem que, semelhantemente, é o maior que já existiu em toda a ficção. O anúncio surpreendeu a todos os fãs e se tornou um dos assuntos mais discutidos durante meses. Apesar de ser instantaneamente desejado por grande do fandom, porém, uma série de fatores levou muitos a desistirem de sonhar com a posse do produto. Para começar, o custo de um único pedido na pré-venda era de

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575 dólares americanos; para dificultar ainda mais, o pagamento deveria ser realizado à vista e seria descontado do comprador imediatamente após o fim da campanha, que precisava de 8 mil pedidos até o dia 31 de agosto de 2019 para se concretizar. A campanha teve início sendo exclusiva a moradores dos Estados Unidos e do Canadá, mas se expandiu ao Japão e eventualmente ao restante do mundo antes de seu encerramento. Muitos também criticaram o curto período de tempo da campanha, o que incentivou a Hasbro a ampliá-lo até o dia 6 de outubro do mesmo ano. Mesmo assim, parte do fandom acreditava que a meta não seria atingida, com algumas pessoas até mesmo torcendo contra, por acreditarem que a Hasbro estaria se aproveitando dos fãs ao realizar essa ação.

Figura 41 – Unicron da linha Generations: War for Cybertron, 2019.

Fonte: Hasbro Pulse. . Acesso em 05/12/2019.

Os debates e as especulações continuaram fortes entre os que defendiam a campanha e os que se opunham a ela até o dia 5 de outubro, um dia antes do fim do prazo, quando a meta de 8 mil pedidos foi atingida. Atualmente, o projeto está em fase de desenvolvimento e a figura está prevista para lançamento em 2021. O sucesso da campanha serve para comprovar que o relacionamento entre a Hasbro e os seus consumidores ainda é majoritariamente positivo, com grande parte do fandom ainda satisfeita o suficiente com a empresa para investir em uma aposta tão arriscada para ambas as partes. Ainda assim, uma minoria bastante expressiva dos fãs se mostrou oposto à campanha; foi durante esse momento que ocorreu o já mencionado conflito entre a Hasbro e uma empresa “third party”, o que gerou ainda

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mais debates e dividiu as opiniões de quem defendia a Hasbro e de quem condenava as suas atitudes.

3.5.2 Principais atividades do fandom de Transformers

Os fãs da franquia Transformers estão entre os mais expressivos e criativos que se podem encontrar na internet. Em seus grupos e comunidades, é comum o compartilhamento de trabalhos e produções nos mais diversos níveis de amadorismo e profissionalismo. Dentre as atividades mais comuns estão a escrita de fan fictions, nas quais os fãs narram suas próprias aventuras com os personagens da franquia em forma de texto, e a criação de fanarts, ou seja, ilustrações e histórias em quadrinhos. Uma das atividades mais específicas ao fandom de Transformers é a customização de figuras (figura 42). Os “customs”, como são chamados, são figuras que passam por um processo de personalização, que podem ser de diferentes níveis: os mais simples apenas adicionam detalhes a mais à pintura do produto original, enquanto outros refazem totalmente o seu esquema de cores, muitas vezes transformando-as em um novo personagem. Customizações mais complexas podem envolver mudanças físicas na figura, como a troca de algumas peças. Em essência, são repaints e retools realizados pelos próprios consumidores.

Figura 42 – Exemplo de customização. (À esquerda, a figura Skullsmasher da linha Generations. À direita, uma customização da mesma figura, criada para representar um novo personagem).

Fonte: Fotografia tirada pelo autor, 2017.

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Fotografias são parte da rotina dos colecionadores. Além de tirarem fotos simples de suas coleções para serem exibidas ao seu círculo de amigos, algumas pessoas se dedicam a registrar imagens mais bem produzidas. Um método comum é a manipulação digital, que permite ao fotógrafo adicionar efeitos especiais às suas imagens; outra forma é a construção de dioramas, ou seja, cenários reais em miniatura feitos sob medida para interagir com as figuras que participam da sua composição. Fotos também podem ser transformadas em vídeos por colecionadores mais pacientes. A técnica de stop motion é comumente usada para criar animações onde as figuras parecem se mover sozinhas e possuir vida própria. Para atingir esse efeito, é preciso tirar dezenas de fotos em que a figura é movida apenas alguns milímetros por clique; quando exibidas em alta velocidade, essas fotos criam a ilusão de movimento. Editores de vídeo mais experientes são capazes de mesclar as fotos com efeitos especiais digitais para tornar a animação ainda mais dinâmica. Revisões em vídeo de figuras Transformers (figura 43) também são bastante populares. Muitos colecionadores possuem canais no YouTube e dedicam-se a gravar vídeos onde mostram uma figura em detalhes, ensinam o espectador a mudá- la de forma passo a passo, fazem comparações de tamanho com outras figuras e dão suas opiniões sinceras sobre o produto. Muitos consumidores hoje confiam mais nas revisões gravadas por fãs do que em qualquer informação provida pela Hasbro, e se baseiam nelas para tomarem suas decisões de compras.

Figura 43 – Exemplo de revisão em vídeo de uma figura Transformers. (No vídeo, Thew Adams, um dos colecionadores mais conhecidos no YouTube, revisa a figura Long Haul da linha Studio Series).

Fonte: Youtube. Thew Adams. . Acesso em 05/12/2019.

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Se referindo a compras, é muito comum em grupos de colecionadores que alguns membros coloquem itens de suas coleções à venda; os motivos podem ser os mais variados, como perda no interesse por uma figura específica, falta de espaço físico para guardá-la na coleção, necessidades financeiras, aquisição de um produto repetido etc. O que importa é que sempre existirão outros colecionadores interessados em adquirir as figuras que estão sendo desapegadas; pode ser que aquele item seja justamente o que o outro está há anos procurando, ou pode ser que ele simplesmente decida aproveitar um preço que considere justo para aumentar sua coleção em mais uma unidade. Sejam quais forem os motivos para as vendas, compras e trocas, elas sempre serão uma parte essencial e indispensável na vida de um colecionador.

3.6 Análise da coleta de dados do grupo “Nova Cybertron ATB”

Trinta e seis membros do grupo “Nova Cybertron ATB” responderam ao formulário, sendo todos brasileiros do sexo masculino; o que não significa que não existam mulheres ou alguns estrangeiros no grupo. Dentre eles, 47%, quase a metade dos respondentes, estão entre os 41 a 50 anos de idade, com a outra metade mais concentrada entre os 15 a 40 anos. 15 deles, ou 42%, já possuem ensino superior completo, com os demais já possuindo no mínimo o ensino fundamental completo. As suas profissões variam principalmente entre professores, designers gráficos, administradores de empresas e vendedores, com alguns estudantes e desempregados. 56% deles vivem na região sudeste do Brasil; 19% vivem na região nordeste e outros 19%, na região sul; apenas 6% localizam-se na região norte e nenhum participante reside na região centro-oeste. É importante ressaltar que, dos respondentes que optaram por se identificar, foi observado que todos encontram-se entre os membros mais participativos dentro da comunidade, ou seja, que mais compartilharam informações, postam imagens, curtem, comentam e interagem entre si; apesar do grande número de membros, é possível observar que muitos deles não interagem com tanta frequência. Nas questões sobre como e quando descobriram a franquia (gráfico 1), 58% afirmaram que a conheceram entre 1984 e 1995, ou seja, na época da Geração 1, com os demais tendo a conhecido entre 1996 e 2013, não mais recentemente do que isso. Todos se encontravam na faixa de 3 a 13 anos quando tiveram seus

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primeiros contatos, estando a maioria com 7 anos na época do ocorrido. Podemos observar que, conforme Silva (2014) havia colocado, estes fãs foram conquistados quando crianças e, agora que estão na fase adulta, lembram-se das memórias de infância com tanto carinho que procuram revivê-las, conectando-as com uma das marcas que mantém vivas essas lembranças.

Gráfico 1 – Ano do primeiro contato com a franquia Transformers.

0%

19% De 1984 a 1995. De 1996 a 2000. De 2001 a 2006. 20% 58% De 2007 a 2013. De 2014 a 2019.

3%

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

47% dos participantes conheceram Transformers através dos desenhos animados; 36%, dos brinquedos; 14%, dos filmes; e os últimos 3%, dos jogos (gráfico 2). Segundo os relatos deixados, a maioria conheceu assistindo à série da Geração 1 ou através das propagandas de brinquedos sendo exibidas na televisão; aqui podemos observar os resultados da narrativa transmídia, como descrita por Jenkins (2009), na proliferação da marca por diferentes mídias contemporâneas.

Gráfico 2 – Primeiro produto de Transformers que consumiu.

0% 3%

14% Brinquedo. 36% Desenho animado. Filme. História em quadrinhos. 47% Jogo.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

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De todos os participantes, 92% gostaram da franquia imediatamente após conhecê-la, sendo os principais motivos a fascinação pelo conceito de robôs que mudam de forma e as suas personalidades variadas; os outros 8% passaram a gostar apenas depois de algum tempo. Mesmo assim, a maioria afastou-se da franquia em algum momento de suas vidas (gráfico 3), com 11% chegando a passar de 21 a 30 anos afastados. Os principais motivos dados pelos membros para os seus afastamentos foram o desaparecimento da franquia durante boa parte das décadas de 1980 e 1990 no Brasil e devido à perda de interesse ao atingirem a adolescência. O que proporcionou o retorno à franquia para a maioria foi a popularização da internet e a facilitação da busca por informações, assim como os lançamentos de Beast Wars, do filme de 2007 e, mais recentemente, da linha Studio Series; este resultado remete à importância da expansão de linha e de se assumir riscos para gerar mudanças, como trazido por Aaker (1998). Apenas 36% afirmaram nunca terem se afastado da franquia desde que a conheceram.

Gráfico 3 – Período de afastamento antes de retornar à franquia.

Sim, me afastei por um período de 5 anos ou menos. 11% Sim, me afastei por um período de 6 a 10 anos.

36% Sim, me afastei por um período de 11 a 20 anos. 20% Sim, me afastei por um período de 21 a 30 anos.

Sim, me afastei por um período de 31 anos ou 11% 22% mais. 0% Não, nunca me afastei da franquia desde que comecei a gostar.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Quanto aos produtos que os fãs consomem com maior frequência, em uma questão de múltipla escolha (gráfico 4), 35 dos 36 participantes responderam que consomem os brinquedos; 22 consomem os filmes; 16, os desenhos animados; 11, os jogos; e 9 dizem consumir as histórias em quadrinhos. Novamente, os conceitos transmidiáticos e convergentes de Jenkins (2009) podem ser observados, desta vez com uma presença ainda maior no cotidiano dos consumidores. Referindo-se especificamente à franquia Transformers, torna-se evidente como os brinquedos são o seu principal produto, seguido pelas suas produções de filmes e animações.

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Gráfico 4 – Produtos de Transformers mais consumidos pelo fandom.

Brinquedos. Filmes. Desenhos animados. Jogos. Histórias em quadrinhos.

35 22 1 16 11 9

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Quando questionados sobre qual alternativa melhor representa o que sentem por Transformers, 36% dos participantes afirmaram que amam a franquia e a têm como seu hobby favorito, enquanto 42% adoram a franquia e a têm como um de seus hobbies favoritos; 17% alegam que gostam muito de Transformers, mas preferem outros hobbies, e os últimos 5% afirmam ter apenas um pequeno interesse pela franquia. (gráfico 5). Aqui podemos observar, na prática, os quatro níveis de fidelização elaborados por Aaker (1998).

Gráfico 5 – Alternativa que melhor descreve o que sentem por Transformers.

5% Amo Transformers, é sem dúvidas o meu hobby favorito. 17% 36% Adoro Transformers, é um dos meus hobbies favoritos. Gosto muito de Transformers, mas tenho outros hobbies que gosto mais. 42% Gosto um pouco de Transformers, tenho apenas um pequeno interesse ou curiosidade.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Para analisar a relevância dos personagens da franquia para os fãs (gráfico 6), foi pedido para que cada participante mencionasse os nomes de até cinco de seus favoritos e, ao fim da coleta, 40 personagens foram citados no total. Optimus Prime, o líder dos Autobots, foi o mais lembrado, considerado um dos favoritos por

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29 participantes; Em segundo lugar, foi o líder dos Decepticons, Megatron, citado por 17 participantes; Em terceiro lugar ficou Bumblebee, especificamente em sua encarnação vista nos filmes live-action, com 13 menções; Em quarto lugar, Starscream com 9 menções, e, empatados em quinto lugar, Shockwave e , com 7 menções cada. Os seis personagens mais votados como favoritos estão entre os mais presentes na ficção da franquia desde a sua concepção em 1984 e continuam recebendo destaque nos filmes, desenhos animados e quadrinhos mais recentes, comprovando a noção de Jenkins (2009) de que personagens memoráveis são mais importantes do que suas próprias histórias.

Gráfico 6 – Personagens favoritos.

Optimus Prime; 29 Megatron; 17 Bumblebee; 13 1 Starscream; 9 Shockwave; 7 Soundwave; 7

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Convidados a se expressar livremente sobre as diferentes versões da franquia e seus produtos midiáticos, a maioria dos participantes afirmou ter a série animada da Geração 1, incluindo o seu longa animado, como uma de suas favoritas, ou então a tratam com admiração por ser o início da franquia. Um dos participantes esclareceu sua resposta, dizendo: “Mesmo não sendo um sortudo de ter nascido nos anos 80, é o universo mais rico de Transformers na minha opinião”. A segunda animação preferida foi Prime, seguida por Animated e algumas menções a Beast Wars, Robots in Disguise (2001) e Armada. Os filmes Transformers (2007), Dark of the Moon e Bumblebee foram os melhor avaliados pelos fãs, enquanto alguns também destacaram os jogos War for Cybertron e Fall of Cybertron e os quadrinhos da IDW como suas mídias preferidas. Um dos participantes expandiu sua resposta com a seguinte afirmação: “Uma das coisas que mais gosto na franquia é quem em

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cada desenho/jogo/filme, as coisas podem ser diferentes. Não existe um cânone obrigatório a ser seguido, o que dá liberdade de fazer algo novo”. Por outro lado, quando citaram as versões que menos gostam, um maior número de participantes revelou desaprovar a série Beast Wars e a sua sequência, Beast Machines. Um dos participantes foi bastante direto em sua resposta, escrevendo: “Beast Wars foi um erro”. Entre os filmes, Age of Extinction e The Last Knight foram unanimemente os mais criticados, com um dos participantes afirmando que eles “fizerem de personagens como Optimus e Megatron coisas que eles não são”. Alguns respondentes desprezaram todas as produções cinematográficas, levantando novamente a questão da expansão e mudança de Aaker (1998) e como elas podem não ser bem recebidas por todos e causam divisão entre os consumidores. Já a maioria das séries de animação japonesas, além de séries mais recentes como Robots in Disguise (2015), Cyberverse, Rescue Bots e Rescue Bots Academy, julgadas como as mais infantis da franquia, são as mídias que menos despertam o interesse e a opinião dos membros do grupo analisado.

Gráfico 7 – Meios mais usados para consumo de mídias de ficção. Downloads da internet. YouTube. Serviços de streaming e jogos (Netflix, Steam, etc). CDs / DVDs / Blu-Rays. Canais de televisão. Revistas impressas. Não consumo mídias de ficção de Transformers.

22 20 17 1 16 7 2 2

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Quando questionados sobre quais métodos mais utilizam para consumir as mídias de ficção da franquia (gráfico 7), 22 dos 36 participantes responderam que realizam downloads pela internet para ter acesso a essas mídias. Esse é um efeito da cultura da convergência que, como Jenkins (2015) coloca, causa a união dos fãs para distribuir e compartilhar esses conteúdos entre si, mesmo quando não estão legalmente disponíveis em seu país ou em seu idioma. O YouTube vem em segundo lugar, com 20 participantes afirmando utilizá-lo; isso se deve ao crescente aumento

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de conteúdos sobre a franquia disponibilizados no site, tanto por canais oficiais quanto por fãs, incluindo até mesmo episódios completos das séries animadas. Outros métodos utilizados também incluem serviços de streaming, como a Netflix, canais de televisão, mídias físicas como CDs, DVDs e Blu-Rays, e revistas impressas. Apenas 2 participantes alegaram não consumir a ficção da franquia.

Gráfico 8 – Questão sobre colecionismo.

0% 3% Sim, já possuo uma grande coleção. 11% Sim, mas a minha coleção ainda é pequena.

Não, mas possuo algumas figuras mesmo assim. 53% 33% Não possuo nenhuma figura, mas tenho vontade de começar a colecionar. Não, e não tenho interesse em colecionar.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Na categoria sobre colecionismo (gráfico 8), 53% se consideram colecionadores e acreditam que possuem uma grande coleção; outros 33% também se consideram colecionadores, mas ainda dizem possuir coleções pequenas; 11% não se consideram colecionadores, mesmo possuindo algumas figuras; e apenas 3% afirmam não ter interesse em colecionar.

Gráfico 9 – Objetivos da coleção. Sou focado em uma linha ou universo específico e não adquiro nada fora do meu foco. 5% Sou focado em um ou mais objetivos, mas possuo alguns itens fora do meu foco. 28% Metade da minha coleção possui um foco, mas a outra metade não. A maior parte da minha coleção é desfocada, mas 8% 53% recentemente determinei meu foco. Coleciono um pouco de tudo pois quero 3% experimentar todas as épocas e versões da franquia. 3% Não possuo foco algum e coleciono de forma aleatória.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

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Quanto ao objetivo de suas coleções (gráfico 9), 53% dos participantes afirmam ter um foco bem definido para o que desejam – por exemplo, colecionar apenas uma determinada linha ou encarnação da franquia –, mas também possuem algumas figuras que fogem a esses objetivos; 28% afirmam colecionar de forma totalmente aleatória; 5% afirmam nunca sair do foco; 3% dizem ter um foco em apenas metade da coleção; e outros 3% afirmam ter adquirido um foco apenas recentemente. 8% alegam que colecionam um pouco de tudo, não de forma aleatória, mas sim porque desejam experimentar todas as versões diferentes.

Gráfico 10 – Quantia de itens oficiais na coleção.

0% 3% De 1 a 10 figuras. De 11 a 50 figuras. 6% 6% 19% De 51 a 100 figuras. 3% 5% De 101 a 200 figuras. De 201 a 300 figuras.

19% De 301 a 400 figuras. 28% De 401 a 500 figuras. De 501 a 1000 figuras. 11% Mais de 1000 figuras. Nenhuma

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

O tamanho da coleção de produtos oficiais de cada participante é bastante variado, como observado nas respostas da coleta de dados (gráfico 10). 19% dos participantes possuem de 1 a 10 figuras; outros 19%, de 11 a 50 figuras; 11%, de 51 a 100 figuras; e 28%, de 101 a 200 figuras. O restante 20% afirmam possuir acima de 200 figuras, e apenas 3% não possuem nenhuma figura.

Gráfico 11 – Quantia de itens não oficiais na coleção.

De 1 a 10 figuras. 25% De 11 a 50 figuras. 42% De 51 a 100 figuras. 8% Mais de 100 figuras. Nenhuma. 3% 22%

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

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Quanto a produtos não oficiais (gráfico 11), 42% possuem até no máximo 10 itens; 22% afirmam possuir até 50 figuras; 3%, até 100 figuras; e 8%, mais de 100 figuras. Por outro lado, 25% alegam não possuir nenhuma, mostrando que, apesar da crescente presença desses produtos na comunidade, muitos membros ainda preferem não obtê-los e manterem-se leais às fabricantes oficiais. No entanto, quando questionados sobre o que pensam dos itens não licenciados que se popularizaram nos últimos anos (gráfico 12), 28% dos participantes afirmam que preferem sempre as figuras oficiais, mas às vezes recorrem a esses itens; 25% dos participantes alegam que não veem nada de errado neles e até os preferem, enquanto outros 25% colecionam igualmente figuras oficiais e não oficiais; 8% são indiferentes à existência delas; 6% afirmam que não gostam, mas que entendem a opinião das pessoas que gostam; e os últimos 8% não souberam responder. É importante observar que nenhum dos participantes optou por respondeu que não gosta e nem mesmo apoia esses produtos, mostrando que nenhum deles acredita totalmente que essa concorrência desleal não deveria existir.

Gráfico 12 – Opinião sobre a existência de figuras não oficiais. Não vejo nada de errado e até prefiro elas do que as oficiais. 8% Coleciono igualmente figuras oficias e não oficiais. 0% 8% 25% Prefiro sempre as oficiais, mas às vezes quero algo 6% que só uma não oficial oferece. Não gosto, mas entendo quem gosta.

Não gosto e não apoio, por serem cópias e plágios 28% 25% criminosos de propriedades intelectuais da Hasbro. Sou indiferente à existência de figuras não oficiais.

Não sei responder.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Em relação ao seu comportamento durante as compras (gráfico 13), 44% afirmaram que são muito cautelosos e pensam muito bem em cada item que desejam antes de comprar, enquanto 17% são cautelosos apenas com itens mais caros; 28% afirmam que geralmente só compram o que os interessam, mas às vezes aproveitam promoções e descontos fora dos planos; 8% compram qualquer figura que conseguem e não resistem a promoções; e os últimos 3% não

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colecionam. Este resultado nos permite observar que, apesar do consumo compulsivo descrito por Silva (2014) se fazer presente em algumas compras, a maioria dos membros do fandom mostra-se cuidadosa para evitá-lo.

Gráfico 13 – Comportamento em relação à compra de Transformers.

3% Sou muito cauteloso, penso muito bem em cada item que desejo adquirir antes de 8% comprar. Sou cauteloso com itens caros, mas itens mais baratos compro sem me preocupar. 44% 28% Geralmente só compro os que me interessam, mas às vezes aproveito promoções e descontos fora dos planos. 17% Compro qualquer figura que conseguir e não resisto a promoções.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Como colocado por Dooley (2012), arrependimentos podem acontecer quando compramos por impulso, ou mesmo quando passamos muito tempo comparando o que compramos com outras opções no mercado. Apenas 8% dos participantes afirmam ter comprado várias vezes por impulso sem nunca terem se arrependido; já 39%, dizem já ter se arrependido após várias compras impulsivas. 20% alegam que ainda compraram poucas vezes por impulso e sem arrependimentos; enquanto 14%, mesmo tendo comprado poucas vezes por impulso, já se sentiram arrependidos. 19% dos respondentes, por outro lado, defendem que nunca compraram por impulso, por sempre pensarem duas vezes antes de realizar a compra (gráfico 14).

Gráfico 14 – Compras por impulso e arrependimentos.

Várias vezes, mas nunca me 8% 19% arrependi. Várias vezes e já me arrependi. 14% 39% Poucas vezes, mas nunca me arrependi. 20% Poucas vezes e já me arrependi.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

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Entre 32 dos 36 participantes, o principal meio de aquisição de figuras para suas coleções são lojas físicas localizadas no Brasil (gráfico 15). Outros meios populares são lojas virtuais brasileiras e internacionais, com 23 e 24 menções respectivamente, sites de vendas entre usuários brasileiros e internacionais, com 23 e 21 menções respectivamente, e grupos de vendas entre amigos e colecionadores, com 24 menções. Apenas 8 afirmaram já ter comprado em lojas físicas no exterior. Adicionalmente, 19 dos respondentes já ganharam figuras de presente ou brinde, e 7 já ganharam figuras em concursos ou sorteios.

Gráfico 15 – Principais meios de aquisição de Transformers. Lojas físicas no Brasil. Lojas físicas no exterior. Lojas virtuais brasileiras. Lojas virtuais internacionais. Sites de vendas entre usuários brasileiros (Mercado Livre, OLX, etc). Sites de vendas entre usuários internacionais (eBay, Aliexpress, etc). Grupos de vendas entre amigos e colecionadores no Facebook. Já ganhei Transformers de presente ou brinde. Já ganhei Transformers em concurso ou sorteio. 32 8 23 24 1 23 21 24 19 7

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Podendo comentar livremente sobre quais ações e processos de expansão promovidos pela Hasbro ou pela TakaraTomy mais agregaram valor à franquia, muitos concordaram que a expansão para os cinemas foi uma decisão certeira, pois tornou a franquia muito mais conhecida e lucrativa ao redor do mundo. Um dos participantes comentou: “Os filmes live-action levaram a franquia para o mainstream. Nada teve tanto impacto na franquia quanto isso”. Em especial, a linha Studio Series recebeu diversos elogios, por ser considerada a melhor linha de brinquedos baseada nos filmes até o presente. Outra ação que acreditam ter sido positiva foi o lançamento das linhas direcionadas aos colecionadores adultos, como Masterpiece e Generations, permitindo a eles que continuem conectados à franquia mesmo após a infância. Outro participante acredita que a franquia “apela ao fator nostalgia dos fãs

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mais antigos, mas busca refinar a engenharia dos seus produtos para não espantar os fãs mais novos”. No entanto, quando comentam sobre as ações que mais prejudicaram a imagem da franquia, os filmes são mencionados novamente; todos acreditam que Michael Bay não foi uma boa escolha para o cargo de diretor. Um dos participantes escreveu: “Os filmes têm qualidade duvidosa e fazem muitas pessoas se afastarem da franquia em geral.” Outro comentou: “É necessário focar a história nos próprios Transformers e não nos humanos”, referindo-se aos roteiros dos filmes. Um dos momentos mais infames da franquia, segundo alguns relatos, foi a breve linha Transformers: Kiss Players de 2006, que apresentava em seus quadrinhos cenas eróticas e perturbadoras entre os Transformers e um grupo de meninas humanas; naturalmente, muitos fãs preferem ignorar a existência desta curta fase da franquia. Outras críticas deixadas pelos participantes foram feitas às reduções de tamanho nas classes dos brinquedos enquanto os preços aumentam gradativamente, e a crescente quantidade de defeitos de fabricação passando pelo controle de qualidade da Hasbro (figura 44).

Figura 44 – Exemplo de produto com defeito de fabricação. (Um Barricade da linha The Last Knight, 2017, apresentando dois braços direitos).

Fonte: Fotografia tirada pelo autor, 2019.

Sobre as interações entre a Hasbro Brasil e o fandom (gráfico 16), 86% dos participantes afirmaram nunca ter entrado em contato com o serviço de atendimento da empresa. 8% dizem que entraram, foram bem atendidos e tiveram suas situações bem resolvidas; já 3% afirmam que foram bem atendidos, mas não tiveram suas

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situações resolvidas, enquanto outros 3% alegam que não foram bem atendidos e também não obtiveram resolução.

Gráfico 16 – Serviço de atendimento da Hasbro Brasil.

3% Sim, fui bem atendido e a situação foi bem 8% 3% resolvida. Sim, fui bem atendido mas a situação não foi resolvida. Sim, não fui bem atendido mas a situação foi bem resolvida. Sim, fui mal atendido e a situação não foi resolvida. 86% Não, nunca entrei em contato.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Dentre os que já entraram em contato, dois deles relataram tê-lo feito em 2014, quando questionaram o porquê da ausência de revistas em quadrinhos que deveriam ser inclusas como brinde dentro da embalagem de algumas figuras da linha Generations; a Hasbro Brasil respondeu que, por lei, as revistas deveriam ser traduzidas para serem vendidas no Brasil, o que implicaria em mais custos para a empresa além da importação. Para a surpresa dos fãs que entraram em contato, porém, a empresa possuía as revistas avulsas guardadas em sua sede brasileira, na cidade de São Paulo, e as ofereceu gratuitamente a quem comprovasse que já havia comprado as figuras que as acompanhavam originalmente. Outro participante relatou que entrou em contato no começo de 2019 para trocar uma figura defeituosa; a empresa falhou em mencionar que não possuía o mesmo modelo para troca antes de o cliente enviá-la pelo correio, mas ofereceu outras figuras em seu lugar. O cliente aceitou a troca porque, segundo ele, a figura escolhida pertencia a uma classe maior e mais cara que a figura trocada, o que foi visto como vantajoso. Sobre as ações da Hasbro no Brasil (gráfico 17), a empresa promove muito mal a franquia, de forma a prejudicar a sua imagem, para 25% dos participantes, com um deles considerando a sua presença “inexistente”; 11% também acreditam que a empresa promove mal a franquia, mas não veem problema nisso. Apenas 5% acreditam que a Hasbro a promove muito bem, enquanto 17% concordam, mas ainda acreditam que isso poderia melhorar. Um maior número de participantes,

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compondo 42%, acredita que a presença da franquia no Brasil é dividida em algumas áreas boas e outras nem tanto.

Gráfico 17 – Como são vistas as ações da Hasbro no Brasil.

Muito bem, estou satisfeito com 5% tudo. Bem, mas pode melhorar. 25% 17% Mais ou menos, algumas áreas são boas e outras nem tanto. 11% Mal, mas não vejo problema. 42% Muito mal e está prejudicando a imagem da franquia.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Quando questionados sobre as atividades que mais praticam dentro do fandom (gráfico 18), 30 dos 36 participantes afirmaram expor suas coleções em estantes. Outras atividades populares incluem criar stop motions, com 10 menções, customizar figuras, com 9 menções, editar fotos de figuras, com 8 menções, vender figuras, com 7 menções, montar dioramas, com 6 menções, e desenhar fanarts, com 4 menções. Escrever fanfics e gravar revisões em vídeo receberam apenas 2 menções cada.

Gráfico 18 – Principais atividades dentro do fandom. Expor a coleção em estantes. Fotografar e editar vídeos em stop motion. Customizar figuras. Editar fotomontagens e/ou histórias em quadrinhos com fotos. Vender figuras em grupos de colecionadores. Montar dioramas. Desenhar fanarts e/ou histórias em quadrinhos. Escrever fanfics. Gravar revisões em vídeo das minhas figuras. 30 10 9 8 1 7 6 4 2 2

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

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Referindo-se às interações entre fãs na internet (gráfico 19), 36% afirmam já ter muitos amigos dentro do fandom; 22% dizem ter mais conhecidos do que amigos; 31% alegam que apenas conhecem algumas pessoas; e 11% dizem que ainda não conhecem ninguém realmente. Fora da internet, apenas 14% dos participantes afirmam ter muitos amigos que também gostam de Transformers, enquanto 45% dizem ter poucos desses amigos e 41% alegam não ter nenhum.

Gráfico 19 – Interações e amizades entre fãs na internet.

Sim, tenho muitos amigos no 11% fandom. 36% Tenho muitos conhecidos, mas poucos amigos de verdade. 31% Apenas conheço algumas pessoas. Ainda não conheço ninguém. 22%

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

De todos os participantes da coleta de dados, 58% afirmaram já ter participado de discussões on-line causadas por opiniões contrárias sobre Transformers entre membros do fandom. Os motivos de desentendimentos mais recorrentes, segundo as respostas, são novamente aspectos de Beast Wars e dos filmes live-action, assim como a existência de itens não oficiais, interpretações errôneas de histórias e informações oficiais, fãs que julgam uns aos outros se baseando apenas no quanto conhecem sobre a franquia, e questões controversas como humanização e a sexualidade dos Transformers na ficção. Um dos participantes deixou a sua opinião sobre o que pensa dessas discussões: “De vez em quando há alguma discussão, ou até mesmo desavença por besteiras, mas sempre procuro me esquivar desse tipo de situação, não é saudável para ninguém”. Para ilustrar uma típica discussão dentro do fandom, a seguinte pergunta foi incluída no questionário: “Qual das alternativas abaixo está correta?”, sendo elas: a) “O Frenzy é azul e o Rumble é vermelho” e b) “O Frenzy é vermelho e o Rumble é azul”. No entanto, não existe uma única resposta, porque os dois personagens já inverteram seus esquemas de cores em uma infinidade de ocasiões, tanto na ficção quanto em seus diversos brinquedos já lançaram (figura 45).

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Figura 45 – Comparações entre Frenzy e Rumble, em cena do filme The Transformers: The Movie e nos brinquedos originais de 1984. (Em ambos, Rumble está à esquerda e Frenzy está à direita).

Fonte: Adaptado de Seibertron. . Acesso em 07/12/2019.

Consequentemente, fãs discutem há décadas sem que haja uma resposta definitiva, e o resultado da pesquisa corrobora isso (gráfico 20): 53% optaram pela primeira opção, enquanto 47% optaram pela segunda, em uma divisão quase simétrica de opiniões. Esta pequena experiência foi realizada para demonstrar o quanto o fandom é facilmente dividido por detalhes que podem até mesmo passar despercebidos por espectadores e consumidores casuais.

Gráfico 20 – Discussão sobre Rumble e Frenzy.

O Frenzy é azul e o 47% Rumble é vermelho. 53% O Frenzy é vermelho e o Rumble é azul

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Sobre o estado atual da franquia, 56% dos respondentes acreditam que o mesmo está muito bom e possuem apenas algumas críticas; 25% acreditam que está bom, mas já esteve melhor; já 11,1% acreditam que está ruim, mas que ainda pode melhorar; e apenas 8% afirmam que está melhor do que nunca.

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Gráfico 21 – Opinião sobre o estado atual da franquia. 0% Está melhor do que nunca, estou satisfeito com tudo. 11% 8% Está muito bom, tenho poucas críticas.

25% Está bom, mas já esteve bem melhor. 56% Está ruim, mas acredito que pode melhorar. Está pior do que nunca.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Quando questionados sobre os próximos anos da franquia (gráfico 22), 26 dos 36 participantes disseram acreditar que os brinquedos irão melhorar; 22 deles também acreditam que os filmes podem melhorar, caso voltem a ser produzidos; 18 acreditam na melhoria dos desenhos animados; 8, dos jogos; e 4, dos quadrinhos. Apenas 2 participantes expressaram que nada irá melhorar no futuro próximo.

Gráfico 22 – O que acreditam que irá melhorar na franquia nos próximos anos. Os brinquedos. Os filmes. Os desenhos animados. Os jogos. As histórias em quadrinhos. Nada. 26 22 18 1 8 4 2

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Como podemos observar através das respostas adquiridas pela coleta de dados, o fandom brasileiro pertencente ao grupo estudado e, por extensão, os demais fãs de Transformers ao redor do mundo, reúnem-se por meios digitais e, quando possível, presenciais para compartilharem de seu apreço pela marca. Como Jenkins (2009) afirmava, vivemos na era da cultura da convergência, que facilita aos consumidores essa união, assim como os aproxima da própria marca que os une.

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CONCLUSÃO

O presente trabalho teve como objetivo aplicar conceitos de criação de marca e engajamento com o consumidor às estratégias usadas pela empresa Hasbro em sua franquia de produtos transmidiáticos Transformers no decorrer de 35 anos. Para que pudéssemos compreender a evolução da marca e todas as suas expansões e mudanças ao longo dos anos, foi preciso fragmentar a sua história em seis eras, compactando nelas as informações mais relevantes que ocorreram durante cada período. A partir desta análise constatou-se que a franquia está sempre evoluindo e se adaptando aos novos tempos. O que começou como uma única linha de brinquedos apoiada por uma série animada e uma série de revistas em quadrinhos, se expandiu para centenas de linhas acompanhadas por dezenas de animações e quadrinhos, além de um crescente número de outras mídias como filmes e jogos. Além disso, a marca, inicialmente destinada somente ao público infantil evoluiu, para agregar a todos os públicos possíveis; novos produtos destinados aos fãs e colecionadores adultos são produzidos ano após ano, sem interferir na produção de novos conteúdos ainda direcionados ao público infantil, que não deixou de ser o consumidor mais numeroso da franquia. Foi possível também compreendermos a relação da Hasbro com os seus consumidores. Durante um longo período, a empresa dedicou parte de seus esforços para gerar engajamento especificamente com os seus clientes mais ávidos, através de eventos e clubes de fãs oficiais; no entanto, em anos recentes essa estratégia parece ter sido deixada de lado, e o foco da empresa tornou-se puramente em atingir a um público mais amplo por meio do uso das redes sociais. Mas independente das ações da Hasbro e da sua parceira japonesa TakaraTomy, é notável o esforço dos próprios fãs em manter a franquia viva em suas vidas e em seus grupos sociais, com dezenas de atividades diferentes sendo praticadas diariamente por eles já há décadas, demonstrando a sua dedicação e o seu afeto pela franquia. Por outro lado, uma parte do fandom se sente muito apegada aos personagens de Transformers, mas não necessariamente à sua marca – e muito menos à sua fabricante; devido a isso, concorrentes desleais que infringem a propriedade intelectual da Hasbro estão se tornando cada vez mais populares, e a empresa parece não estar sabendo como enfrentá-los, ou então prefere ignorá-los.

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É importante notar que a franquia Transformers é muito maior do que o relatado neste trabalho; existe uma quantia incalculável de linhas de brinquedos e outros produtos, especialmente licenciados por empresas terceirizadas, que atendem a nichos muito mais específicos e que não se adequaram à narrativa apresentada nesta análise. O que foi apresentado, porém, é o que pode ser considerado o essencial, o básico para a compreensão da marca; e o mesmo também vale para o seu fandom. Para concluir, podemos afirmar que a Hasbro têm em sua posse uma das marcas criativas mais poderosas da atualidade, que se fortalece a cada ano e não apresenta sinais de desgaste. Finalizo com uma popular frase originada na última linha de diálogo de The Transformers: The Movie, que se tornou uma espécie de grito de guerra entre os Autobots e também entre os fãs: “Até que todos sejam um”.

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ANEXO – FORMULÁRIO DE COLETA DE DADOS

Questões respondidas pelos membros do grupo de Facebook, “Nova Cybertron ATB”.

Diga seu nome ou apelido (Deixe em branco se preferir responder de forma anônima):

1. Selecione a sua faixa etária atual: 10 anos ou menos. De 16 a 20 anos. De 26 a 30 anos. De 41 a 50 anos. De 11 a 15 anos. De 21 a 25 anos. De 31 a 40 anos. 51 anos ou mais.

2. Selecione o seu gênero: * Masculino. Feminino.

3. Selecione a sua escolaridade atual: * Ensino fundamental incompleto. Ensino médio incompleto. Ensino superior incompleto. Ensino fundamental completo. Ensino médio completo. Ensino superior completo.

4. Profissão atual:

5. Nacionalidade: * Brasileiro. Outros:

6. Em qual região do Brasil ou em qual país você reside atualmente? * Região Centro-Oeste do Brasil. Região Norte do Brasil. Região Sul do Brasil. Região Nordeste do Brasil. Região Sudeste do Brasil Outros:

7. Em que ano você teve o seu primeiro contato com a franquia? (Caso não lembre, marque a opção que acredite ser a correta) * De 1984 a 1995 De 2001 a 2006 De 2014 a 2019 De 1996 a 2000 De 2007 a 2013

8. Qual era a sua idade quando você teve o seu primeiro contato com Transformers? (Caso não lembre, escreva a idade que acredite ser a correta): *

9. Qual foi o primeiro produto de Transformers que você consumiu? (Caso não lembre, marque a opção que acredite ser a correta) * Brinquedo. Filme Jogo. Desenho animado. História em quadrinhos. Outros:

10. Conte como foi a sua primeira experiência com Transformers:

11. Você passou a gostar da franquia já no seu primeiro contato? * Sim, gostei imediatamente. Não, passei a gostar apenas depois.

12. Explique em suas palavras o que o levou a gostar da franquia: *

13. Depois de conhecer e gostar da franquia, você já passou por um período afastado dela antes de eventualmente voltar a consumi-la? * Sim, me afastei por um período de 5 anos ou menos. Sim, me afastei por um período de 6 a 10 anos. Sim, me afastei por um período de 11 a 20 anos. Sim, me afastei por um período de 21 a 30 anos. Sim, me afastei por um período de 31 anos ou mais. Não, nunca me afastei da franquia desde que comecei a gostar.

14. Conte os motivos que o levaram a se afastar da franquia:

15. Agora, conte os motivos que o levaram a retornar à franquia:

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16. Quais são os produtos de Transformers que você mais consome? (Evite marcar os que você já consome muito pouco) (Múltipla escolha) * Brinquedos. Filmes. Jogos. Desenhos animados. Histórias em quadrinhos. Outros:

17. Entre as alternativas abaixo, qual delas melhor representa o que você sente por Transformers? * Amo Transformers, é sem dúvidas o meu hobby favorito. Adoro Transformers, é um dos meus hobbies favoritos. Gosto muito de Transformers, mas tenho outros hobbies que gosto mais. Gosto um pouco de Transformers, tenho apenas um pequeno interesse ou curiosidade.

18. Quais são os seus personagens favoritos de Transformers? Cite no máximo cinco (especifique a versão se quiser): *

19. Quais meios você mais usa para consumir os produtos de ficção da franquia Transformers? (Múltipla escolha) * CDs / DVDs / Blu-Rays. YouTube. Canais de televisão. Revistas impressas. Serviços de streaming e jogos (Netflix, Steam, etc). Downloads. Não consumo mídias de ficção de Transformers, apenas os brinquedos.

20. De todos os desenhos animados, filmes, histórias em quadrinhos e jogos da franquia, quais são os seus favoritos? Cite no máximo dez deles e explique em poucas palavras os motivos: *

21. E quais você menos gosta ou não tem interesse em consumir? Cite no máximo cinco deles e explique os motivos:

22. Você se considera um colecionador de Transformers? * Sim, já possuo uma grande coleção. Sim, mas a minha coleção ainda é pequena. Não, mas possuo algumas figuras mesmo assim. Não possuo nenhuma figura, mas tenho vontade de começar a colecionar. Não, e não tenho interesse em colecionar.

23. Das opções abaixo, qual melhor representa a sua coleção? * Sou focado em uma linha ou universo específico e não adquiro nada fora do foco. Sou focado em um ou mais objetivos, mas possuo alguns itens fora deles. Metade da minha coleção possui um foco, mas a outra metade não. A maior parte da minha coleção é desfocada, mas recentemente determinei meu foco. Coleciono um pouco de tudo pois quero experimentar todas as épocas e versões da franquia. Não possuo foco algum e coleciono de forma aleatória.

24. Quantas figuras Transformers oficiais da Hasbro, TakaraTomy ou licenciadas você possui atualmente na coleção? (Considere customs criados a partir de figuras oficiais como parte da contagem) * Nenhuma. De 101 a 200 figuras. De 401 a 500 figuras. De 1 a 10 figuras. De 201 a 300 figuras. De 501 a 1000 figuras. De 11 a 50 figuras. De 301 a 400 figuras. Mais de 1000 figuras. De 51 a 100 figuras.

25. Quantas figuras não oficiais ("third parties", knockoffs/piratas, customs criados a partir de outros materiais etc) você possui atualmente na coleção? Nenhuma. De 11 a 50 figuras. Mais de 100 figuras. De 1 a 10 figuras. De 51 a 100 figuras.

26. Por quais meios você já adquiriu Transformers? (Múltipla escolha) * Lojas físicas no Brasil. Lojas físicas no exterior. Lojas virtuais brasileiras. Lojas virtuais internacionais. Sites de vendas entre usuários brasileiros (Mercado Livre, OLX etc) Sites de vendas entre usuários internacionais (eBay, Aliexpress etc)

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Grupos de vendas entre amigos e colecionadores em redes sociais. Já ganhei Transformers de presente ou brinde. Outros: Já ganhei Transformers em concurso ou sorteio. Não coleciono.

27. Como é o seu comportamento em relação à compra de Transformers? * Sou muito cauteloso, penso muito bem em cada item que desejo adquirir antes de comprar. Sou cauteloso com itens caros, mas itens mais baratos compro sem me preocupar. Geralmente só compro os que me interessam, mas às vezes aproveito promoções e descontos fora dos planos. Compro qualquer figura que conseguir e não resisto a promoções. Não coleciono.

28. Você já comprou Transformers por impulso? * Várias vezes, mas nunca me arrependi. Poucas vezes, mas nunca me arrependi. Várias vezes e já me arrependi. Poucas vezes e já me arrependi. Nunca, sempre pensei duas vezes antes de comprar.

29. Qual é a sua opinião sobre figuras não licenciadas de Transformers? * Não vejo nada de errado e até prefiro elas do que as oficiais. Coleciono igualmente figuras oficias e não oficiais. Prefiro sempre as oficiais, mas às vezes quero algo que só uma não oficial oferece. Não gosto, mas entendo quem gosta. Não gosto e não apoio, por serem cópias e plágios criminosos de propriedades intelectuais da Hasbro. Sou indiferente à existência de figuras não oficiais. Não sei responder.

30. Quais ações, novas ideias e processos de expansão promovidos pela Hasbro/TakaraTomy você acredita que mais agregaram valor à franquia Transformers desde a sua concepção? *

31. E quais você acredita que mais prejudicaram a imagem da franquia? *

32. Você já entrou em contato com o serviço de atendimento da Hasbro? Qual foi a sua experiência?* Sim, fui bem atendido e a situação foi bem resolvida. Sim, fui bem atendido mas a situação não foi resolvida. Sim, não fui bem atendido mas a situação foi resolvida. Sim, fui mal atendido e a situação não foi resolvida. Não, nunca entrei em contato.

33. Relate como foi a sua experiência ao entrar em contato com a Hasbro:

34. Como você acredita que a Hasbro promove a franquia Transformers no Brasil? * Muito bem, estou satisfeito com tudo. Bem, mas pode melhorar. Mais ou menos, algumas áreas são boas e outras nem tanto. Mal, mas não vejo problema. Muito mal e está prejudicando a imagem da franquia.

35. Descreva, com suas palavras, o que você acha das ações da Hasbro no Brasil:

36. Há quanto tempo que você participa de comunidades on-line de Transformers? * Há menos de 1 ano. De 3 a 5 anos. De 11 a 20 anos. De 1 a 2 anos. De 6 a 10 anos. Há mais de 20 anos.

37. Das atividades de fã abaixo, quais você mais gosta de realizar? * Expor a coleção em estantes. Escrever fanfics. Montar dioramas. Customizar figuras. Desenhar fanarts e/ou histórias em quadrinhos. Editar fotomontagens e/ou histórias em quadrinhos com fotos. Fotografar e editar vídeos em stop motion.

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Gravar revisões em vídeo das figuras. Vender figuras em grupos de colecionadores.

38. Você tem amigos no fandom? * Sim, tenho muitos amigos no fandom. Tenho muitos conhecidos, mas poucos amigos de verdade. Apenas conheço algumas pessoas. Ainda não conheço ninguém.

39. Você possui amigos fora da internet que também gostam de Transformers? * Sim, tenho muitos amigos que também gostam. Tenho apenas poucos amigos que gostam. Não tenho amigos fora da internet que gostam.

40. Você já participou de discussões on-line por causa de opiniões contrárias sobre Transformers? * Sim, muitas vezes. Sim, apenas uma vez. Sim, algumas vezes. Não, mas já presenciei discussões. Não e nunca presenciei discussões.

41. Relate os principais assuntos das discussões das quais já participou (Por favor, não divulgue os nomes de quem discutiu com você!):

42. Qual é a sua opinião sobre o estado atual da franquia? * Está melhor do que nunca, estou satisfeito com tudo. Está muito bom, tenho poucas críticas. Está bom, mas já esteve bem melhor. Está ruim, mas acredito que pode melhorar. Está pior do que nunca.

43. O que você acredita que irá melhorar nos próximos anos da franquia? (Múltipla escolha)* Os brinquedos. Os desenhos animados. Os jogos. Os filmes. As histórias em quadrinhos. Nada.

44. Questão final: Qual das afirmativas abaixo está correta? * O Frenzy é azul e o Rumble é vermelho. O Frenzy é vermelho e o Rumble é azul.

* Questão obrigatória.