Sexta-feira 6 Agosto 2010 www.ipsilon.pt

Uma nova geração de escritores, uma nova geração de causas A luta continua, depois de Saramago ESTE SUPLEMENTO FAZ PARTE INTEGRANTE DA EDIÇÃO Nº 7428 DO PÚBLICO, E NÃO PODE SER VENDIDO SEPARADAMENTE DO PÚBLICO, EDIÇÃO Nº 7428 INTEGRANTE DA PARTE FAZ ESTE SUPLEMENTO VÍTOR FERREIRA FERREIRA VÍTOR

Jack DeJohnette Malcom Gladwell Francisco CamachoThe Books Roman Paska Leva chocolate. Leva ovos. Leva leite condensado. S— n‹o leva uma coisa: tempo.

DOCES COM LEITE CONDENSADO NA BIMBY. 3» FEIRA, 17 DE AGOSTO, POR APENAS MAIS Û7,50 Descubra mais de 60 receitas de doces para a Bimby onde o leite condensado NestlŽ é o ingrediente estrela. O USIV Surpreenda todos lá em casa com um Pudim Flan feito EXCL em dois tempos, um Cheesecake ou um Bolo Brigadeiro. Tudo isto e muito mais numa edição exclusiva do Público.

EDI‚ÌO LIMITADA AO STOCK EXISTENTE. FA‚A Jç A RESERVA NO SEU PONTO DE VENDA. Pausa nos Animal Collective para um álbum a solo, o primeiro de Tare, para sair a 26 de Outubro

Avey Tare, enfim só Já sabíamos que Panda Bear gosta de se colocar em causa de três em “Void” é a instalação com que a dupla três anos lançando álbuns a solo – o de arquitectos portugueses Manuel e Francisco novo, “Tomboy”, vai sair em Aires Mateus participa em Veneza Setembro. Agora é o outro membro fundador dos Animal Collective, Avey Tare (ou seja Dave Portner), que não quer ficar para trás e se decidiu pelo lançamento de uma obra solitária. O álbum, o seu primeiro a solo, será editado a 26 de Outubro na editora Paw Tracks e terá nove temas. Um disco que se anuncia misterioso e do qual Flash apenas se conhece o título – “Down There” – e a capa. Mas existe uma informação importante: ao que parece será um álbum influenciado por crocodilos. Pelo menos constam da capa. Os crocodilos são os animais preferidos de Avey Tare.

O Principezinho regressa à Terra Sumário maquetas incluídas Há casas portuguesas representam projectos reais. Literatura e ideologia 6 “Alguns esperam apenas A nova geração de autores no que os proprietários iniciem ano da morte de Saramago em Veneza a construção, outros já estão Quatro projectos de espaço vazio no interior de terminados. São casas com Malcom Gladwell 12 habitação. Quatro filmes. E Campo de Ourique, de escalas diferentes, para Ele viu o futuro do jornalismo uma instalação feita de Ricardo Bak Gordon. “No contextos variados. E são casas. Conta-se assim a place like - 4 houses, 4 privadas.” Jack DeJohnette 16 presença portuguesa na 12.ª films” completa-se com Ao lado dos irmãos Mateus Um dos últimos grandes da Filme 3D, série televisiva, Mostra Internacional de filmes de João Onofre, Julião em “People meet in bateria jazz em Lisboa jogo de vídeo e toda uma Arquitectura da Bienal de Sarmento, Filipa César e Architecture”, estão nomes nova bibliografi a Veneza, que começa a 29 de João Salaviza. Os artistas consagrados da António Pires 20 Agosto e termina a 21 de trabalharam, arquitectura (Rem A “world music” explicada às Vão em breve poder matar Novembro. respectivamente, os espaços saudades do Principezinho todos Koolhaas, Christian Kerez, criancinhas, de Sines para o aqueles que nunca mais Os quatro projectos são dos de Ricardo Bak Gordon, Ryue Nishizawa, que faz mundo conseguiram ver o desenho de um arquitectos Álvaro Siza João Luís Carrilho da Graça dupla com Sejima na firma chapéu sem se interrogarem se não Vieira, Manuel e Francisco e Siza Vieira, enquanto o SANAA) e outros mais 26 estarão, afinal, a olhar para uma Aires Mateus, João Luís cineasta ficcionou os “jovens”, como Tom de jibóia que acabou de engolir um Mais um álbum dos Carrilho da Graça e Ricardo lugares da dupla Aires Paor, o duo espanhol Amid coleccionadores compulsivos elefante. Para o ano que vem estão já anunciados um filme de Bak Gordon, e fazem parte Mateus. Cero 9 ou Junya Ishigami. animação em 3D, uma ambiciosa de “No place like - 4 houses, E chegamos, extra Mas também artistas América Latina 26 série televisiva em 52 episódios e 4 films”, exposição que representação oficial, a plásticos com afinidades Histórias de vida ou morte, um jogo de vídeo. E a editora chega à Universidade Ca’ “Void”, instalação da com o tema proposto num ciclo de documentários Gallimard anunciou que planeia Foscari no âmbito da autoria dos irmãos Aires publicar uma centena de títulos (Thomas Demand, relacionados com o livro de Saint- representação oficial Mateus, convidados pela Jane Cardiff, Roman Paska 30 Exupéry, que, desde o seu portuguesa. comissária geral da bienal, a Olafur Eliasson, AFP/SHAUN CURRY AFP/SHAUN Somos todos marionetas lançamento em 1943, já vendeu A casa como redenção para arquitecta japonesa Kazuyo Tom Sachs, Fiona cerca de 80 milhões de cópias. a arquitectura, e lugar de Sejima, a participar em Tan ou Cerith Ficha Técnica Por trás deste regresso multimédia pertença e regresso, foi o “People meet in do simpático habitante do asteróide Wyn Evans) e Directora Bárbara Reis B612 está Olivier d’Agay, sobrinho- tema escolhido e orientou a Architecture”. Francisco duas presenças Editor Vasco Câmara, neto do escritor e presidente da escolha dos projectos: o Aires Mateus revelou ao um pouco mais Inês Nadais (adjunta) fundação que gere os direitos da sua Bairro da Bouça, no Porto, Ípsilon a peça: “É uma “inesperadas”: Conselho editorial Isabel obra. Agay está empenhado em de Siza Vieira; as instalação que tem ver Wim Wenders e o Coutinho, Óscar Faria, Cristina reciclar o Principezinho (“Le Petit construções nas dunas da com a ideia de espaço e Fernandes, Vítor Belanciano Prince”, no original) para as curador e Design Mark Porter, Simon crianças do século XXI. Daí que, Comporta, dos irmãos vazio na arquitectura. historiador de arte Esterson, Kuchar Swara como conselheiro dos produtores Mateus; a casa que parece Os espectadores podem Hans-Ulrich Obrist. Directora de arte Sónia Matos da série televisiva, tenha concebido flutuar na paisagem do Alto circular à sua volta e José Marmeleira Designers Ana Carvalho, um Principezinho empenhado em Alentejo, de João Luís confrontar-se com as Kazuyo Sejima, a comissária geral Carla Noronha, Mariana Soares causas que sejam familiares aos Carrilho da Graça; e a topografias e o Editor de fotografi a jovens de hoje, como a ecologia ou da bienal e da exposição “People meet Miguel Madeira o desenvolvimento sustentado. Na habitação construída num espaço”. Todas as in Architecture”, com nomes que vão E-mail: [email protected] sua versão actualizada, o de Rem Koolhaas a Wim Wenders

Ípsilon • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • 3 Antony Gormley is watching us, a 2000 metros de altitude, nos Alpes austríacos Flash

rapazinho loiro, de cachecol e Gormley, que já foi replicado de De 9 a 19 de Setembro, viramo- calças à boca de sino, vai salvar uma Londres à Austrália, passando pela Todo o cinema, nos para o Canadá para ver série de planetas, ajudando os Calábria, diz que esta será a última actores a pegar nas câmaras: respectivos habitantes a resolver os aparição dos seus duplos. E que Robert Redford (“The problemas que os afligem. E, claro, está ansioso: “A obra em si é muito de Veneza a Toronto Conspirator”, a ressaca do voltará à Terra, ainda que, na sua menos importante do que o que o assassinato de Lincoln com primeira incursão, não tenha público fará com ela. O olhar, o James McAvoy, Robin Wright simpatizado nada com os encontrar, o não encontrar...”. (passando pelo ou Kevin Kline), Emilio terráqueos adultos. Estevez (quatro anos depois Agay admite que adaptar a Facebook) de “Bobby”, e dirigindo aqui personagem “foi uma dor de Quatro álbuns Martin Sheen) e (rufar de cabeça”. Os responsáveis da série, inéditos nos Não se vira uma pedra sem se de Trompeta”), Takashi Miike tambores) Philip Seymour pelo que dela se sabe, parecem ter falar do Facebook e lá está ele a (“13 Assassins”), Pablo Larraín Hoffman com “Jack Goes procurado um compromisso, segundos “Archives” imiscuir-se na programação (“Post Mortem”), François Boating”. E também para ver mantendo algumas personagens de Neil Young dos festivais de cinema da Ozon (“Potiche”, com Deneuve 12 filmes britânicos, entre os essenciais da história, como a rosa, “rentrée”. O muito esperado e Depardieu), Julian Schnabel quais a estreia mundial de a serpente ou a raposa – que, no Primeiro o mundo desesperou. filme de David Fincher - que (“Miral”) ou Monte Hellman “Never Let me Go”, de Mark livro, ensina ao Principezinho o Ainda nos anos 80, Neil Young, anda encantado com “all things (“Road To Nowhere”), todos Romanek. “Mistérios de sentido da palavra “cativar” –, mas arquivista compulsivo, revelou que pop”, já que a seguir se lança em competição. Fora dela, na Lisboa”, de Raul Ruiz, também tornando o protagonista um herói trabalhava na edição do material que na adaptação cinematográfica secção Horizontes, a estreia de passa por Toronto. “Last but de aventuras um pouco mais guardara ao longo da sua carreira e americana da trilogia João Nicolau nas longas com “A not the least”, Toronto vai vendável. Talvez por recearem que em que o público nunca havia posto “Millenium”, de Stieg Larsson - Espada e a Rosa”, “Painéis de estar carregado de estrelas - de as filosóficas indagações do a vista em cima. Continuou a falar sobre a dita rede social que une São Vicente de Fora, visão Kidman a Portman, de Affleck Principezinho original em torno da ocasionalmente do projecto, que 500 milhões dos habitantes da poética”, os 16 minutos de a De Niro. Kidman está em amizade e da sabedoria pudessem, continuou a ser adiado. A dada Terra, “The Social Network”, já Manoel de Oliveira a convite da “The Rabbit Hole”, de John digamos, não cativar os pequenos altura, mesmo o fã mais crente tem dois “trailers” online e Fundação de Serralves, mais o Cameron Mitchell, De Niro e espectadores actuais. começou a descrer. Até que no ano estreia-se no Festival de Nova regresso de dois Affleck: Ben a Edward Norton reúnem-se em passado o primeiro volume dos já Iorque a 24 de Setembro, dias realizar “The Town”, Casey a “Stone”, um thriller de John míticos “Archives” saiu e, aberta a antes da estreia comercial nos co-protagonizar “I’m Still Curran, Kevin Spacey larga o Antony Gormley nu caixa de Pandora, todos podemos EUA, a 1 de Outubro. “É Here”, o documentário que teatro para fazer “Casino (vezes 100) nos Alpes rejubilar. O volume 2 ainda não tem excepcionalmente raro marca o regresso de Joaquim Jack”, Dustin Hoffman e Paul data de edição, mas está a ser descobrir um filme que capta Phoenix. Por falar em Giamatti contam “Barney’s Antony Gormley anda nu outra vez preparado (o “manager” de Young de forma tão poderosa o documentário, eis Martin Version” e até Yves Saint- pelo mundo, mas a pergunta não é refere que haverá um hiato de dois, espírito do seu tempo”, diz Scorsese pós-”Shutter Island” a Laurent assombra Toronto “e daí?”. O que ele acaba de fazer é três anos entre cada lançamento). quase desnecessariamente o escrever “A Letter to Elia”, uma com a estreia mundial do uma visão e tanto: uma centena de Depois de coberto o período inicial director do festival, Richard obra sobre o “bright side” do documentário “L’Amour Fou”, réplicas do escultor britânico da sua carreira, entre 1963 e 1972 Peña, embriagado com tanto cineasta e histórico delator na de Pierre Thoretton. estrategicamente distribuídas pelos (nos desconhecidos Squires e nos “zeitgeist”. era McCarthy. Veneza abre a 1 Para já, Locarno terá Bruce Alpes austríacos, sempre a 2039 históricos Buffalo Springfield), em Mas (felizmente) não é só de de Setembro com “Black Labruce a dirigir actores metros de altitude, algumas em dez discos Blu-Ray, gravações vídeo Facebook que se fala a partir de Swan”, de Darren Aronofsky, e porno no calor de Agosto. pontos fáceis de encontrar até por e registos de imprensa, esta épica Setembro. Veneza apresentou “Machete”, de Robert Mas, em Setembro, Veneza, alpinistas frustrados, outras tão “off cronologia da carreira de Young um programa ambicioso: os Rodriguez, e fecha dia 11 com Nova Iorque e Toronto já serão the beaten track” que são revelará quatro álbuns nunca novos de Sofia Coppola “The Tempest”, de Julie olhados à luz dos Oscars. É o praticamente impossíveis de editados – em edições de vinil, para (“Somewhere”), Vincent Gallo Taymor. Mas sistema. alcançar (ou então tarefa para um que vejam a luz como inicialmente (“Promises Written in Water”), ainda Joana Amaral Cardoso João Garcia). previsto. É só a primeira revelação Abdellatif Kechiche (“Venus Veneza “Horizon Field”, assim se chama a do que aí vem, claro. Noir”), Alex de la está a invasão, é um dos trabalhos de Sabemos para já que no “Archives - Iglesia acabar e campo mais ambiciosos do artista: Volume 2” conheceremos (“Balada já demorou cinco anos a concretizar- “Homegrown”, posto de lado para Triste Toronto, se, e a logística foi aparatosa, dar lugar ao negríssimo “Tonight’s do outro exigindo uma maratona de The Night” (1975), “Chrome lado do audiências com proprietários, Dreams”, perdido em favor do Atlântico, caçadores, botânicos, “folky” “American Stars’n Bars” arrancou. ambientalistas, políticos, (1977), “Oceanside-Countryside”, esquiadores, militares, socorristas e de 1978, e o álbum ao vivo “Odeon- residentes, além de várias séries de Budokan Live”, gravado com os descolagens, aterragens e outras Crazy Horse entre Londres e o manobras perigosas a cargo dos Japão em 1976. helicópteros fretados para depositarr

REUTERS/FRED PROUSER cada uma das cem estátuas nos pontos previamente assinalados. É toda uma outra sala branca: a área em que Antony Gormley interveio, nas montanhas de Vorarlberg, compreende 150 quilómetros quadrados de terreno acidentado e particularmente exposto aos jogos de sorte e azar daa meteorologia. Embora ainda não tenha nevado, uma das estátuas já apareceu de casaco. O plano, explicou o artista há uma semana, na inauguração oficial de “Horizon Field”, é que as estátuas fiquem Mais material do artista Sofi a Coppola, com “Somewhere”, Vincent Gallo, no terreno por dois anos. “Mas se quando jovem na calha com “Promises Written in Water”, e François Ozon, fosse possível [ficarem para com “Potiche”: eles já estão de malas feitas para Veneza sempre], também não seria mau”.

4 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon

VÍTOR FERREIRA VÍTOR A nova gera de escrito no ano da morte de José A morte de José Saramago é o fi m simbólico de uma geração p Como é que os novos escritores lidam com a ideologia? O Í vir a ser os herdeiros do Nobel português. Por Raquel Ribeiro

A literatura pode viver até de uma rico e da história, um ano implacável, Num artigo publicado pelo “Le tor é a liberdade ideológica; é ser um forma conflituosa com a ideologia. um ano de princípios e de fins”. Monde Diplomatique” de Julho, em A figura de José homem livre. Várias vezes tive a sen- O que não pode é viver fora da ideo- Esse(a) escritor(a) pode ainda não homenagem a Saramago, João Tordo, Saramago é uma sação de que Saramago era um escri- logia. ter nome, mas não significa que este 34 anos, escreveu que a morte do No- tor aprisionado dentro de um homem José Saramago ano, este Portugal, esta crise, este bel “marca o fim de uma era na lite- “montanha na livre nas suas opiniões, no sentido em mundo em que vivemos não preocu- ratura portuguesa”, mas, ao mesmo que o homem era mais livre do que o A morte de José Saramago em Junho pem os nomes da nova literatura por- tempo, “deixa o caminho aberto a paisagem dos autores escritor, mais livre do que a ficção que representou o fim de uma geração tuguesa. E também não significa que, uma nova geração que deve agora escrevia. Há um programa e há uma politicamente comprometida, de uma apesar de lidarem de outra forma assumir-se, não como os ‘herdeiros’, portugueses. E a sua obrigação política na ficção do Sara- literatura de causas, herdeira da luta com o comprometimento ideológico mas como os viajantes nessa mesma mago. Isso comporta a qualidade da contra o fascismo e a censura, do fim na literatura, estes jovens escritores estrada que o Nobel logrou abrir”. sombra acaba por ser coerência física, mas tem o grande da ditadura, do colapso do Império, não tenham ideias muito próprias Tordo afirma que “é responsabilidade problema da qualidade criativa.” da transição para a democracia e da (ideológicas, até) sobre a função so- dos que ficam (...) não deixar que es- ampla” É essa liberdade que talvez Sara- adesão à Europa. cial (ou política) da literatura. se caminho termine, abruptamente, José Luís Peixoto mago tivesse no princípio, antes dos Este é o ano da morte de José Sara- num beco sem saída”. “Ensaios”, explica Dulce Maria Car- mago. No seu obituário, no “Expres- À sombra da montanha Nem todos querem percorrer essa doso – antes dessa “acção totalitária so”, Clara Ferreira Alves escreveu que A figura de José Saramago é uma estrada. Pedro Rosa Mendes, 42 anos, de que todos temos de fazer o mes- pode ser que “um dia um escritor ain- “montanha na paisagem dos autores reconhece que vai criar inimigos em mo, de pensar como a massa, de votar da sem nome se sinta tentado a escre- portugueses dos últimos 40 anos. E a Portugal por dizer que, “enquanto em branco”. Saramago era “uma es- ver um livro com este título”, ecoan- sua sombra acaba por ser ampla”, diz leitor, humildemente, o grande ro- pécie de autoridade moral, como se do “O Ano da Morte de Ricardo Reis”. o escritor José Luís Peixoto, 35 anos. mancista contemporâneo português dissesse ‘agora está tudo errado e eu Porque, tal como nesse ano (1936), É à sombra da montanha Saramago é o [António] Lobo Antunes”. Explica: vou mostrar como isto dever ser fei- “este é um ano em que estão a acon- que a nova literatura portuguesa terá “O que o Lobo Antunes tem a mais to’. Tinha ideias muito claras acerca tecer muitas coisas, é um ano histó- de viver (para o bem e para o mal). do que o Saramago como grande au- do mundo: havia os bons e os maus.

6 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon ração tores é Saramago o politicamente comprometida. O Ípsilon falou com aqueles que podem o (texto) e Vítor Ferreira (ilustrações)

É tudo muito mais complexo. A maio- ria dos activistas acha que é preciso um fundamentalismo para mudar as coisas. Quando isso acontece, cega- mos. É perigoso.” Peixoto foi Prémio José Saramago em 2001. valter hugo mãe em 2007. João Tordo em 2009. Pedro Rosa Men- des nunca venceu um Prémio José Saramago – nem pode porque tem Capa mais de 35 anos. Dulce Maria Cardoso, 45, também não. É, aliás, crítica da “obsessão com a juventude desta so- ciedade”, e admite que isso também é uma contradição no prémio de que Saramago era patrono: “Ele é uma espécie de mito, a prova de que a for- ça do trabalho e do talento resulta: nasceu pobre, nunca pertenceu à

Ípsilon • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • 7 [‘Peregri- nação de Enmanuel Jhesus’] é profundamente político porque todas as vozes são as de um projecto elite privilegiada e prova que, se nos esforçarmos e trabalharmos mui- de sociedade to, chegamos lá. Começou a escrever muito tarde. Mas é o patrono de um ou de uma postura prémio a que só se pode concorrer até aos 35 anos. Isso mostra o quão filosófica perante difícil é pôr a teoria em prática.” Ten- do em conta a idade com que come- aquele mundo. çou a escrever regularmente, Sara- mago não teria podido concorrer ao Não são as seu próprio prémio. minhas, lá está. Políticos apartidários Para valter hugo mãe, o mundo mu- Isso faço dou. Este já não é o tempo da escrita de Saramago, ideológica, política e noutro lado socialmente comprometida. Acima de tudo, o que estes escritores não Pedro Rosa querem é pertencer a um partido: “O nosso tempo não se compadece com grandes paixões partidárias. O com- Mendes promisso com o PCP do Saramago é mais do que uma preocupação polí- tica, é partidária. Perdemos a euforia pela construção de uma democracia que as pessoas da geração do Sarama- go tinham.” Aqui, política e partidarismo não se confundem, tal como não se con- fundem o escritor com o cidadão. No caso de Saramago, o compromisso ideológico do escritor esteve sempre ligado ao marxismo (“Serve-me para compreender o mundo”, disse o No- bel numa entrevista a Carlos Reis, em “Diálogos com José Saramago) e o compromisso político do cidadão es- teve sempre ligado ao Partido Comu- nista. Destes novos escritores não se po- de dizer que sejam apolíticos. Pelo contrário: valter hugo mãe faz parte da comissão de honra da candidatura de Manuel Alegre à Presidência da República. Aceitou o convite, pela se- gunda vez, “porque além de estar convicto de que ele é o Presidente ideal, é também o único candidato que poderá derrotar Cavaco” - “E eu não seria um saramaguiano convicto se não quisesse que Cavaco saísse”, sublinha. José Luís Peixoto já esteve ao lado do Bloco de Esquerda e participou activamente em campanhas eleito- rais. Não é filiado. Mas separa essa participação da tarefa de escritor: “É uma forma de participação cívica que qualquer cidadão pode escolher ter. Não me inibo de a ter, mas acredito que os meus livros existem noutra dimensão.” Considera-se “politica- mente de esquerda”: “Nunca me con- siderei de direita e não consigo com- preender o que é o centro e como se é do centro. As minhas ideias sempre se inclinaram para esse lado esquerdo e pela forma como ele vem sendo de- senhado desde os ideais da Revolução Francesa. Vejo as coisas de diferentes perspectivas: muda o próprio mundo e eu com ele.” PAULO PIMENTA PIMENTA PAULO

8 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon ‘Livro’ [sai no Outono] traça um retrato de Portugal dos anos 40 até aos nossos dias. Não sendo um manifesto Pedro Rosa Mendes, Dulce Maria Para Tordo, a literatura não tem de Cardoso ou João Tordo, por nunca “ter um dever cívico”: “Não acho que social, tem uma terem militado, não são necessaria- seja para propagar causas. Posso até mente menos politizados. Mendes fazer isso num livro, mas longe de dimensão explica que nunca lhe “passou pela mim educar alguém. Qualquer escri- ENRIC VIVES-RUBIO cabeça fazer política” e que os parti- tor que o faça intencionalmente cai dos políticos “são mais plataformas no risco de se tornar um demagogo”. sociológica e aparelhos que determinam o que O seu próximo romance sai no final fazer para fazer política, e menos fó- do mês. Chama-se “O Bom Inverno” José Luís runs de ideias e de debate”. Inscre- e, explica Tordo, “não tem nada de veu-se numa juventude partidária causa social, nem ensina nada a nin- Peixoto quando era estudante de Direito, mas guém: são 12 pessoas fechadas num nunca foi às reuniões. O jornalismo sítio, num bosque isolado. Não é um também pode ter tido um papel nes- policial, nem é uma história de crime. sa não-pertença. “Sou uma pessoa É um estudo de personagens.” Mas muito politizada. Interesso-me por Portugal preocupa-o, porque “esta política. É politicamente que olho pa- crise é a nossa ditadura”. Está a pre- ra a realidade e isso determina e in- parar um romance que só sairá em fluencia a forma politizada como es- 2011 “sobre um acontecimento que crevo e a ficção que faço.” marcou a história política portuguesa, Dulce Maria Cardoso concorda. Co- nos anos 50”. O seu objectivo é “bus- mo cidadã (e como escritora), tem car um sentido para tudo isto, para a uma opinião política (“só um cidadão situação estranha que vivemos neste lobotomizado não a tem”), mas diz momento”. que “a obra é uma coisa, a pessoa é Tal como Tordo, Dulce Maria Car- outra”. Na classe política, não confia: doso sente-se incomodada com os “Há tão pouca sinceridade que é mui- abusos de poder, mas “tornar isto to difícil pensar seriamente na activi- matéria literária não me interessa, e dade partidária. Não há responsabi- a literatura não serve para isso, serve lização pelos erros cometidos, há um para criar ficções, criar mundos”. desvio da coisa pública em função de Nesse “apenas” que é a escrita de um interesses privados.” Isso não quer livro está “a ambição toda do mun- dizer que a ficção não seja uma leitu- do”. O seu segundo romance, “Os ra política do mundo. valter hugo Meus Sentimentos”, reflecte sobre o mãe: “Tudo o que escrevo há-de ter “desencanto com a forma como a Re- uma profundidade política subjacen- volução acabou”, e há “bufos do an- te, mas não estou disponível para tigo regime que transitaram pacifica- abraçar partidariamente nenhuma mente de uma para a outra situação”. orientação. Frustra-me, não me iden- Eles andam aqui, entre nós. A ideo- tifico rigorosamente com ninguém, logia, explica Cardoso, “está na esco- enquanto não se resolver este modo lha das personagens”: “Não é ao aca- inquinado de governar.” so que te surgem personagens com Há aqui um tom de profunda desi- aquelas vidas: uma depiladora, um lusão. E estas ideias vão ao encontro jornalista, um político.” da eterna discussão sobre o divórcio Cardoso diz que se há uma “causa” entre os cidadãos e a política. João nos seus livros, é a do sofrimento. Tordo é um céptico convicto, descon- “Alguém atento aos meus livros fiado de toda a bondade humana: “Tenho uma permanente dúvida acerca de tudo. Sou incapaz de dog- ma, não posso ser partidário. Não tenho ortodoxias. Não sou inconfor- mista nem sou rebelde. Voto, mas não participo em manifestações. Certas vezes reconheço que foi por desinte- resse, grande parte das vezes foi por não acreditar.”acreditar. Mais ddoo qqueue ppolíticosolíticos aapartidários,partidários, estes escritores são cépticoscépticos politiza-politiza- dos.dos. MundosMundos nenegros,gros, ououtrastras ccausasausas Há uum tom de Mas a iideologiadeologia popodede ser, nesta geragera-- pprofundarofu desilusão ção,ção, outro tipo de compromisso. João TordoTordo afirma que esta crise económi- nnesteseste escritores. ca o “preocupa pessoalmente”: “En-“En- quantoquanto escritor, escreves sempre em MaiMaiss do que políticos resposta a aalgumalguma coisa. O mundomundo estáestá a passar por um momento negro. aapartidários,par eles são Espero que as obras sejam uma refle- xão ssobreobre ississo”.o”. ccépticosépti politizados

[‘Apocalipse[‘Apocalipse dos Trabalhadores’] é uma moção de sobrevivência no limiar da dignidade laboral.laboral. É a história de duas mulheres-a-dias aquém do sistema. A mulmulher-a-diash é uma excrescência do tecido laboral valter hugo mãe

Ípsilon • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • 9 Alguém atento aos meus livros notará que sou contra o sofrimento animal. Mas não quero fazê-lo enquanto activista. Sou

A ideologia não morreu GAUDÊNCIO RUI sensível ao As notícias da morte das ideologias na literatura parece ser sofrimento de um grande exagero. A ideologia está nestes jovens autores, “não está é da mesma maneira”. Raquel Ribeiro todas as formas, dos animais, dos Quando se fala de literatura parece ver no compromisso portuguesa recente, diz Ana ideológico a saída feroz para injustiçados, Paula Arnaut, professora na as injustiças do mundo, já as Universidade de Coimbra, “não novas gerações fazem política dos que podemos contar apenas com por outros meios. A ideologia a nova geração”, mas também está nestes jovens autores, diz têm fome com autores como António Lobo Ana Paula Arnaut, “não está é da Antunes, por exemplo. “A obra mesma maneira”. Dulce Maria de Lobo Antunes tem sido pouco A notícia da morte das explorada em relação à dimensão ideologias na literatura foi um Cardoso ideológica que comporta. Toda a grande exagero. Para Arnaut, gente fala das questões da guerra o problema está “na tendência colonial, da relação com África, para relacionarmos ideologia mas os investigadores acabam com política”. Ideologia é mais por só fazer isso em relação aos do que isso: “Ideias, julgamentos, primeiros romances de 1979 e juízos de valor que servem 1980.” Ao ler um Lobo Antunes para interpretar a situação de de 2007, “essas preocupações um determinado indivíduo ou mantêm-se em conjunto com toda grupo. No caso do Gonçalo M. uma dimensão de preocupações Tavares, por exemplo, os seus sociais mais recentes, ‘Livros Negros’ servem para decorrentes da questão de África, interpretar este mundo cruel e e do período pós-colonial.” violento em que vivemos, literal Paulo de Medeiros, professor ou enviesadamente.” O Ípsilon universitário em Utrecht, dá Lídia tentou falar com Gonçalo M. Jorge como exemplo: “Todos os Tavares para este trabalho, mas o seus livros são directamente escritor não estava disponível. relacionados com questões políticas e, embora se possa dizer que existe neles uma forte Hoje ideologia tem preocupação com a condição das mulheres, tratam de outros menos a ver com assuntos, desde a revolução alinhamento político à guerra colonial e às sua memórias, passando pelos novos do que com questões migrantes e as condições duma [nova] classe de despojados.” de identidade A serem herdeiros de alguém, os autores da nova geração Hoje a ideologia tem menos a vêm igualmente beber a estes ver com um alinhamento político- autores e não só a Saramago, partidário do que com questões portanto. Os romances de valter de identidade. O género, a raça, o G hugo mãe, por exemplo, “são pós-colonialismo, a imigraçãoo R É obras directamente políticas são “posicionamentos sobre AZENHA SÉRGIO S e com uma força expressiva o mundo em que vivemos, capaz de rivalizar com o e, nesse sentido, todas as melhor de Lídia Jorge e Lobo questões de identidade Antunes”, nota Medeiros. “mãe se tornam ideológicas”, demonstra como a literatura argumenta Arnaut. Para actual portuguesa continua a Medeiros, também não oferecer uma crítica mordaz à faz sentido falar no fi m da sociedade portuguesa. A questão ideologia: “Portugal e a línguaa da infl uência da ditadura na portuguesa continuam a mentalidade portuguesa, uma ter autores com um grande certa ‘pequenez’ como José Gil poder expressivo e com tem dito, é bem observada nos uma consciência profunda seus romances.” da humanidade e do dever Se Saramago, herdeiro do neo- intelectual de testemunhar, dee realismo e escritor na transição expor a podridão e de ansiar da ditadura para a democracia, por uma liberdade mais livre.””

Ana Paula Arnaut diz que há uma tendência (errada) para associar ideologia a política

10 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon ‘O Bom Inverno’ [sai este mês] não tem nada de causa social, nem ensina nada a ninguém: são 12 pessoas notará que sou contra o sofrimen- mas “é sobre muitas mais coisas”. to animal. Mas não quero fazê-lo en- Quando o tempo narrativo chega à fechadas num quanto activista. Gosto mais de his- actualidade, “confronta-se a visão que tórias. Mas sou sensível ao sofrimen- os imigrantes têm de Portugal e, atra- sítio, num bosque to de todas as formas, dos animais, vés dela, tenta-se reflectir sobre o dos injustiçados, dos que têm fome”. país. Não sendo um manifesto social, isolado. Não é um No livro que está a escrever, reflecte tem uma dimensão sociológica”, sobre o retorno de Angola (de onde diz. policial, nem é saiu na infância, via Ponte Aérea), o fim do Império e as suas consequên- O real social uma história de cias no Portugal contemporâneo. valter hugo mãe admite que é em li- Mais do que ideologia, diz José Lu- vros como “O Apocalipse dos Traba- crime. É um ís Peixoto, “é a convicção que alimen- lhadores” que faz a sua política. Esse ta o livro”. “A ideologia é, à partida, livro é uma “moção de sobrevivência estudo de um sistema social e/ou político, a con- no limiar da dignidade laboral. É a vicção pode ser outra coisa. O escri- história de duas mulheres-a-dias persona- tor, pela natureza do que faz, integra aquém do sistema. Nem se pode falar essa condição de uma forma implíci- [aqui] da precariedade dos recibos gens ta, não a escolhe. Acaba por comuni- verdes, porque a mulher-a-dias é uma car sempre com a sociedade”. Mas excrescência do tecido laboral.” O não deve “delinear a papel químico livro mostra como, dentro dessa es- João Tordo as suas convicções políticas”: o livro tigmatização, aquelas mulheres con- deverá ser “o mais completo e huma- seguem atingir “uma utopia da felici- no possível, e o humano é constituído dade”. É essa a “perspectiva útil da por muitas e complexas vertentes”, literatura” em que mãe acredita. “Não argumenta. Aliás, “Nenhum Olhar” é a literatura esgotada numa função, exemplo de como Peixoto não acre- tem de ter sempre uma componente dita que “os textos devam ser uma estética, mas uma literatura que sirva fotocópia de convicções do autor”: o leitor. Interessa-me que os livros aquelas personagens “não encontram sejam contra a indiferença, contra a uma saída, deixam-se abater perante desmobilização. Esse era o bastião de as dificuldades”, explica. Para Peixo- Saramago, incitar as pessoas à cons- to, a escrita é bondade, o altruísmo ciencialização.” O mesmo se passa em “é um órgão essencial ao seu funcio- “A Máquina de Fazer Espanhóis”, por namento”. “Se partir logo sem essa exemplo, sobre a estrutura das novas bondade, é vazio. Com isto não quero famílias, o desprezo pela terceira ida- dizer que não tenha lá, explícita, uma de ou a herança histórica de uma ge- ideia social ou uma utopia. Mas que- ração de portugueses. ro que tenha uma bondade, e que a Para Pedro Rosa Mendes, a ficção esperança nessa bondade se multipli- “não é uma forma de fazer política”. que”. No seu novo romance (sai no Sente, aliás, uma desconfiança em Outono), “Livro”, Peixoto traça um “relação à politização da ficção”. Mas retrato de Portugal dos anos 40 até há algo que lhe interessa: “Uma di- aos nossos dias. É sobre a imigração, mensão política da realidade.” Em “Peregrinação de Enmanuel Jhesus”, Rosa Mendes não está “ali a defender nada, não há um programa político, não há um a favor e um contra. No entanto, o livro é profundamente po- lítico porque todas as vozes são as vozes de um projecto de sociedade ou de uma postura filosófica perante aquele mundo”. Não são as dele, lá está: “Isso faço noutro lado.” O jor- nalismo dá-lhe a realidade. Essa ideia de real é que é importante. “O real é “Interessa-me que os essencial: não estou a escrever sobre o meu mundo ou a minha depressão”, livros sejam contra sublinha, para logo acrescentar: “Os meus botões são infinitamente menos a indiferença, contra importantes do que as coisas que eu vi.” a desmobilização. “A criação portuguesa”, lamenta, Era esse o bastião “é muito virada para si própria, oní- rica e introspectiva”. Nesse sentido de Saramago, incitar há “um défice de real”, e a realidade torna-se “sempre aquilo que estamos as pessoas à a viver dela”. Mas há outra, há outras. “A política é isso: um exercício de ima- consciencialização” ginação apartir da realidade, uma utopia, e isso faz a história do indiví- valter hugo mãe duo com o mundo.”

Ípsilon • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • 11 Há uma pergunta que Malcolm Gla- do que já tinha acontecido com outros à “transição demográfica” de há 100 “Existe hoje um tros, transformá-las. Por isso a manei- dwell detesta: como surgem as ideias métodos contraceptivos “naturais”, anos atrás. Ou seja: o que é “natural” ra como entendemos o plágio e o di-

JERRY BAUER JERRY para as suas histórias? Detesta não como o do calendário. Só que o que é ter o período 100 vezes durante a volume avassalador reito de propriedade intelectual tem porque a resposta contenha algum Rock pensava ser “natural” afinal não vida. Ter 400 multiplica, como Gla- de mudar. Se construirmos uma cer- segredo, alguma fórmula que não o era. Foi esse o seu erro. dwell confirmou e explicou em entre- de informação. E um ca em torno das nossas ideias, isso queira revelar, mas porque não sabe “O ponto de partida para esse texto vistas com outros cientistas, as pro- inibe a criatividade e o progresso”, a resposta. Não se lembra. E irrita-o foi uma informação que me chegou babilidades de contrair cancro do jornalista (...) tem de argumenta. que alguém esteja interessado no que de que as mulheres nas sociedades útero, do endométrio e da mama, Ou seja, a originalidade de Gladwell não tem importância nenhuma: no tradicionais tinham, durante a vida, além de outras doenças. Ou seja, mi- cruzar várias é saber conjugar as ideias de outras caso das suas histórias, o que impor- quatro vezes menos períodos mens- lhões de mortes por cancro poderiam disciplinas, para pessoas. “Existe hoje um volume avas- ta é o ponto de chegada, não o de truais do que as mulheres modernas”, ter sido evitadas se John Rock não ti- salador de informação. E o que um partida. diz-nos Gladwell. “A partir daí, come- vesse, para agradar ao Papa, obrigado produzir um discurso jornalista deve fazer é descobrir as “Eu definiria este género como ‘his- cei a explorar todas as implicações as mulheres a menstruarem desne- narrativas e as teorias que dêem sen- tórias de aventura intelectual’”, ex- disso, e cheguei a John Rock”. Que se cessariamente todos os meses, por se que seja útil. É uma tido às coisas. Temos de cruzar várias plicou Malcolm Gladwell ao Ípsilon, tornaria o protagonista da história. pensar que isso era “natural”. disciplinas, para produzir um discurso numa entrevista por telefone. “Sigo Gladwell foi investigar a história do Malcolm Gladwell nunca chega a função que há 50 que seja útil. É uma função que há 50 exactamente as mesmas regras de médico, que já era uma sumidade na expor a conclusão desta forma explí- anos não era necessária, nem possível. uma história de aventuras, em que se sua área quando inventou a pílula. O cita. Deixa que o leitor a formule ape- anos não era Penso por isso que os jornalistas são pretende um relato emocionante, que novo medicamento foi aprovado nos nas na sua cabeça. “Eu não tenho necessária, nem mais importantes e úteis no mundo prenda o leitor, conduzindo-o por um EUA em 1960, mas em 1968, na encí- nenhum propósito de persuasão. Não moderno do que alguma vez foram”. percurso físico. A diferença é que eu clica “Humanae Vitae”, o papa Paulo exijo que o leitor concorde comigo. possível. Os Num dos artigos (“Segredos Conhe- o guio através de um percurso inte- VI proibiu os contraceptivos orais e Levo-o até um certo lugar, porque cidos de Todos”), Gladwell questiona, lectual. Outros escritores apresentam- todos os outros métodos “artificiais” acho interessante ir até lá. Depois ele jornalistas são mais aliás, a natureza da própria investiga- nos sequências de cenários exóticos. de controlo da natalidade. que decida. Fico satisfeito apenas por ção jornalística. Analisa o caso da fa- O que eu pretendo é explorar ideias, A partir daí, a luta de Rock foi de- ele me acompanhar na viagem. Não importantes e úteis lência da empresa Enron e o facto de de uma forma excitante”. monstrar que o seu método era “na- preciso de mais. O que pretendo é ninguém o ter previsto. Ou melhor, Mas analisemos o processo de cons- tural”. “Na mulher saudável, é a pro- levar as pessoas a explorar assuntos no mundo moderno de ninguém com poder de decisão o trução de uma das histórias do livro gesterona que impede a ovulação e que de outra forma não lhes interes- do que alguma vez ter previsto. Na realidade, um grupo “O que o Cão Viu”, agora publicado estabelece o período seguro pré e pós- sariam. Sabe, algumas das ideias que de estudantes fez um trabalho em em Portugal pela Dom Quixote. Ape- menstrual”, escreveu na época o cien- acho mais estimulantes são ideias foram” que, recorrendo a ferramentas esta- nas uma, já que a dissecação desagra- tista. Ora a pílula não é mais do que com que não concordo”, diz. tísticas, percebeu tudo o que se ia da ao autor e pode comprometer o progesterona, a hormona produzida passar. Colocaram as conclusões no prazer da leitura (e a eficácia da per- pelo organismo da mulher depois da A favor do jornalismo site da universidade, mas ninguém as suasão, embora Gladwell garanta que ovulação, para impedir os ovários de Os temas de Gladwell, designada- leu. Os analistas encartados, por seu nunca tem esse objectivo). O texto de libertarem novos óvulos e, assim, fa- mente os dos artigos publicados na lado, não previram nada. “O Erro de John Rock” está dividido vorecer a gestação. revista “New Yorker” durante mais em cinco partes. A primeira é sobre A verdade é que, tomando a pílula, de dez anos e agora reunidos nesta A ordem no caos as convicções católicas de Rock, um as mulheres não precisariam de mens- colectânea, são muito diversos. Vão Gladwell usa a distinção entre “que- cientista nascido em 1890 que foi o truar todos os meses, mas apenas três desde o “ketchup” (por que razão bra-cabeças” e “mistérios”. Os primei- inventor da pílula contraceptiva. A ou quatro vezes por ano. Para simular nunca surgiu uma marca melhor do ros são como puzzles a que faltam segunda começa assim: “Em 1986, os ciclos “naturais”, porém, Rock que a Heinz?) até à importância da algumas peças. Os segundos são irre- uma jovem cientista chamada Bever- prescreveu a administração do com- cor dos cabelos na história da Améri- solúveis porque há informação a mais. ly Strassmann viajou para África para primido com interrupções mensais, ca e às semelhanças entre uma ma- O caso Watergate era um quebra-ca- viver com a tribo dogon do Mali”. O que provocam a menstruação. mografia e as fotografias aéreas dos beças. Hoje, a maioria dos problemas início da terceira: “Em 1980 e 1981, Acontece que investigações ulterio- militares. Mas têm em comum o facto são mistérios. A informação está toda Malcolm Pike, um especialista em es- res mostraram que os ciclos mensais de conterem revelações surpreenden- disponível. Difícil é seleccioná-la e tatística médica da Universidade do estão longe de ser naturais. É aí que tes sobre a nossa vida quotidiana. E relacioná-la. “Woodward e Bernstein Sul da Califórnia, passou seis meses entra o trabalho de Beverly Strass- fazem-no, na maior parte das vezes, nunca teriam desvendado a história no Japão a estudar na Comissão de mann, a cientista que viajou para o sem recorrer a investigação própria. da Enron”, conclui Gladwell. O papel Vítimas da Bomba Atómica”. As par- Mali. Numa entrevista a Gladwell, ex- Pelo menos segundo o conceito tra- dos jornalistas hoje é outro. A infor- tes 4 e 5 contêm as conclusões da te- plicou como as mulheres da tribo do- dicional de investigação. Mas isso es- mação surge do relacionamento entre se de Gladwell, e também o final da gon menstruam, durante toda a vida, tá a mudar. Um dos textos do livro é várias ideias ou factos já conheci- história de John Rock. Que são, em apenas 100 vezes, em média, enquan- precisamente sobre plágio. “Hoje, por dos. suma, o seguinte: o cientista, para to nas mulheres ocidentais isso acon- causa da Internet, é muito fácil ter “Eu procuro histórias para dar vida agradar à Igreja Católica, inventou tece entre 350 a 400 vezes. As dogon acesso às ideias das outras pessoas. É às ideias”, explica o jornalista. “Sim, uma pílula que reproduzisse os ciclos menstruam menos porque passam a fácil copiá-las, e isso é hoje um pro- considero-me um jornalista”, acres- menstruais “naturais” da mulher. maior parte do tempo grávidas ou a blema grave nas universidades. Mas centa. “Penso num tópico, e trago-o Sendo “natural”, poderia contar com amamentar. E era isso que acontecia o outro lado desta realidade é que para a discussão, que depois se desen- a aprovação do papa, à semelhança com todas as mulheres do mundo até permite brincar com as ideias dos ou- rola de formas que não tínhamos pre-

As aventuras intelectuais de Malcom Gladwell

Malcom Gladwell não descobre nada que já não se saiba. Mas a maneira como relaciona ideias, teorias, personagens e histórias produz revelações surpreendentes sobre a vida quotidiana, da pílula ao “ketchup”. Publicou-as na revista “New Yorker” e agora num livro, “O que o Cão Viu”, acabado de traduzir pela Dom Quixote. Paulo Moura

12 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon visto”. Os artigos incluem sempre histórias de pessoas, teorias científi- cas, “background” histórico, livros. “Sou um grande entusiasta do mundo académico”, explica Gladwell. “Tenho fascínio pelos professores, pelas pes- soas que investigam, que produzem ideias. Trato-os como personagens, como amigos. Parte do meu trabalho consiste em estar atento ao mundo académico e usá-lo para contar histó- rias. E talvez a sua especificidade es- teja aí: a combinação do ‘storytelling’ com o rigor académico”. Mas nem todos, quer na comuni- dade jornalística quer na comunidade científica dos EUA, concordam com isto. Há quem critique Gladwell pela falta de rigor científico, ou até pelos seus intuitos manipuladores. “O que eu faço não é ciência”, sublinha ele ao Ípsilon. “Não me sinto parte do meio académico. Fazer ciência social requer níveis de rigor, treino e disci- plina que eu não tenho. Vejo-me antes como uma porta para a ciência. O meu cenário ideal é que alguém, por ler um artigo meu, vá depois ver os estudos originais”. Alguns cientistas acham que é im- possível reduzir ideias complexas à simplicidade de um artigo de revista. Antes de escrever, Gladwell passa se- manas, ou meses, a ler sobre os assun- tos que vai tratar. Mas acredita que “para audiências mais vastas é preci- so fazer escolhas”: “A maior parte dos cientistas compreende isso. Eles sa- bem que o meu trabalho é diferente do deles. Eu posso brincar com as ideias, escolher o que me apetece es- crever, divertir-me. Não estou subme- tido à disciplina do mundo dos acadé- micos. O que eu peço aos cientistas é: dêem-nos teorias que possamos usar para dar sentido a isto ou àquilo”. Há um novo pensamento interdis- ciplinar, que está a contagiar todo o mundo do conhecimento. “Econo- mistas usam ferramentas da psicolo- gia e da sociologia, e estão a escrever sobre isso. Todo esse cruzamento é muito positivo”. Mas os jornalistas, pensa Gladwell, podem ir ainda mais longe. “O seu papel é produzir um discurso com sentido. Trazer ordem ao caos”.

Ver crítica de livros págs. 42 e segs. Livros

Gladwell não está propriamente interessado em tirar conclusões, o seu trabalho, diz, é levar os leitores a interessarem-se por ideias que à partida não lhes interessariam: “Sabe, algumas das ideias que acho mais estimulantes são ideias com que não concordo”

Ípsilon • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • 13 MIGUEL MANSOMIGUEL Livros

Quanto mais não seja pelo valor pe- cuniário, 600 mil euros, a atribuição “Este romance do prémio Planeta para romances originais é ano após ano, desde 1949, ensinou-me a um acontecimento incontornável do queixar-me menos. meio editorial em Espanha. À sua atribuição em meados de Ou- Cresci numa Europa tubro segue-se uma “tournée” de promoção, quase a volta à Espanha, que se foi fechando de meses. E é durante essas dezenas de apresentações e sessões de autó- e deprimindo a olhar grafos que os premiados medem a popularidade do que escreveram. para o umbigo” Ángeles Caso (Gijón, 1959), jorna- lista e escritora com quatro romances já publicados, foi quem levou para sas com eles, que lhes dêem atenção casa em 2009 esta taluda literária. A a troco apenas de dinheiro. Não que- autora não estava nada convencida remos ver que estas pessoas também do interesse dos leitores por “Contra podem ter problemas. Só falamos o vento”, a saga de uma família de delas quando há uma tragédia, quan- mulheres de Cabo Verde que se fazem do são retratadas nos jornais, no seu à vida na Europa e em particular em dia-a-dia de humilhação. Tenho ami- Espanha. Enganou-se. O romance gas que recusam qualquer proximi- vendeu 300 mil exemplares em nove dade, recusam saber da sua cultura, meses. das suas vidas. Pura e simplesmente Este ano a promoção do prémio não se interessam.” Planeta estendeu-se a Portugal, onde E a cor destas peles não ajuda. Ape- Ángeles pode sentir mais de perto “a sar de a globalização tudo ter acele- brisa dessa África que chega a Lis- rado, África não desembarcou em boa.” Madrid com a intensidade e a veloci- No início de “Contra o vento”, uma dade com que o fez nas ruas de Paris mulher deprimida vegeta no quarto ou Lisboa. “Os negros no meu país, do seu apartamento a contar os dias. ainda hoje, quase não têm voz. Um Até que se fixa no movimento e nos negro em Espanha era uma coisa ra- ruídos da empregada nova, chegada ra há dez ou 15 anos. Um dia telefo- há pouco de Cabo Verde, uma terra nou-me uma senhora que não quis de que nunca ouvira falar: “Escutava- alugar uma casa a uma negra porque a a movimentar-se pela casa, esfre- não conhecia nenhuma e não sabia gando os tachos e limpando energi- como lidar com ela. Tive de ser ava- camente a casa de banho, sacudindo lista dessa desgraçada.” os almofadões do sofá e ocupando-se de alguma caçarola onde borbulha- Janela escancarada vam os alimentos que, pouco a pou- Ángeles Caso escreveu este romance co, comecei de novo a comer. Gosta- não só pelo gosto da ficção, mas por- va de sentir que havia alguém em que quis deixar nas mãos dos largos minha casa, uma mulher alegre que milhares que compram um livro pre- Ángeles Caso não teve de inventar uma protagonista: pisava o meu chão, que tocava nos miado, sobretudo mulheres, um ins- São é uma cabo-verdiana verdadeira, e trabalhou em casa móveis, que abria as torneiras e que trumento que reflicta o incómodo e da escritora com o vigor e a alegria que o romance descreve acendia as luzes. Um corpo humano o paradoxo do mundo à nossa volta: pulsando e cheio de vida no espaço “Este romance ensinou-me a ter mais da minha agonia” (p. 186). consciência dos meus privilégios e a Esta burguesa anónima de Madrid queixar-me menos. Sou privilegiada, resse pelas outras culturas, ainda há teiras e nas árvores de fruto, arra- das amigas delas. O Google ajudou- não é, não foi, a própria Ángeles Ca- porque vivi sempre numa sociedade muito racismo latente. E temos de o sando tudo” (p. 56). me a conhecer a paisagem sem sair so, garante-nos a escritora. Mas a que respeita, apesar de tudo, os di- combater.” Daqui ainda se foge para a velha de casa. O essencial nunca esteve no cabo-verdiana São existe, trabalhou reitos da mulher: cresci numa Europa “Contra o vento” lê-se como quem Europa. Como o fez São, carregando que eu pudesse descrever indo lá. na sua casa com o vigor e a alegria que foi aprendendo a respeitar as vo- escancara uma janela que depois já filhos e amores errantes até fazer es- Queria trabalhar Cabo Verde como que o romance descreve: “Quis dar, zes das mulheres. Mas que se foi fe- não quer fechar. Entra o sol, mas cala em Madrid e viver hoje em Lis- matéria de sonhos, mas também de através da vida desta mulher, voz, chando e deprimindo a olhar para o também brilha a lua. Há um vento boa, onde assistiu orgulhosa ao lan- profunda tristeza que estas mulhe- visibilidade a este exército de formi- umbigo. Não quero ouvir mais histó- que nos traz o arquipélago do Atlân- çamento do livro onde a sua antiga res, árvores ambulantes de raízes gas, mulheres anónimas que não co- rias de mulheres cujo único drama tico, de Carvoeiros em São Vicente, patroa conta a sua história. profundas na busca de energia, nhecemos, e que muitas vezes nos na vida é terem de optar entre mudar a ilha onde nasceu São: “O harma- Ángeles Caso confessa-nos que não transportam consigo para onde quer recusamos a conhecer. Depositamos de sofá ou pintar a casa porque o di- tão, o vento que por vezes sopra vin- sentiu necessidade de viajar a Cabo que vão.” nas mãos destas mulheres as jóias da nheiro não chega para tudo. Quero do de África, cairia furibundo e ar- Verde para melhor o descrever: “Es- Energia que, pelo menos, curou a nossa família: os filhos e os pais ido- que aprendam a escutar os outros. dente sobre a aldeia e depositaria a tive lá através dos olhos e das palavras depressão de uma burguesa madri- sos. Exigimos-lhes que sejam carinho- Em Espanha, para além do desinte- sua carga letal de areia nas semen- da São, a que se juntaram as histórias lena.

Apesar da globalização, África não desembarcou em Madrid com a intensidade com que o fez em Paris ou Lisboa. Por isso Ángeles Caso quis contar as histórias por trás dos rostos das mulheres cabo-verdianas que trabalham em Espanha – é “Contra o vento”, Prémio Planeta 2009. Rui Lagartinho Cabo Verde em Madrid 14 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon AF_Anfibios Imp IPSILON 25.7x16.8.ai 1 7/15/10 2:41 PM

Mais um grande motivo Anfíbios. Interessantes por natureza. Venha ao Oceanário de Lisboa e descubra estes fascinantes para visitar e frágeis animais, cada vez mais ameaçados. o Oceanário. Um gigante da bater Jack DeJohnette é um dos últimos grandes ícones da bateria jazz, com um percurso que se confunde com a história do género (esteve no Standards Trio de Keith Jarrett, gravou “Bitches Brew” com Miles Davis). Antes do concerto desta noite em Lisboa, com John Surman, falou ao Ípsilon sobre este tempo e o outro, fulminante, em que o jazz era o futuro, agora. Rodrigo Amado

O que separa Jack DeJohnette, que hoje abre o Jazz em Agosto em Lisboa “O clima musical num duo com John Surman, de dois dos super-bateristas da nova geração é muito duro para do jazz norte-americano, Nasheet os músicos. Hoje tem Waits ou Eric Harland? Se pensarmos em termos de técnica instrumental, de se ser de alguma todos possuem um virtuosismo difícil de imaginar para o comum dos mor- forma empresário, tais. Em termos de versatilidade es- tilística, factor que é frequentemente promover a música, apontado como um dos pontos fortes colocá-la na Internet, de DeJohnette, poder-se-á dizer, tan- to de Waits como de Harland, que ter MySpace, estes já o ultrapassaram, em parte devido à necessidade que os músicos Facebook. hoje têm de se desdobrar em múlti- plos projectos para conseguirem so- As dificuldades guard, por forma a breviver. Criatividade e personalida- Joshua Re- definirem a sua personalidade musi- de? São músicos excepcionais, com das editoras e os dman... músicos que já não têm cal. E trata-se apenas disso – perso- um universo criativo totalmente pes- ‘downloads’ grátis 20 anos e tenderão a tornar-se nomes nalidade é o que falta no processo soal, e em permanente mutação. incontornáveis da história do jazz”. actual. O que não quer dizer que, O que faz, então, de DeJohnette tornaram mais difícil Tempos diferentes, continua: era com o tempo e com novas evoluções, uma lenda do jazz, cujo nome é re- uma época específica, em termos esta realidade não venha a produzir conhecido por uma imensa minoria a um músico sócio-económicos, e de relação entre resultados e músicos igualmente in- de pessoas em todo o mundo, en- a oferta e a procura. “O principal pro- teressantes. Apenas diferentes, tal- quanto Waits e Harland, apesar de sobreviver. Grande blema é que existem mais músicos vez.” reconhecidos pela crítica e pelo pú- do que lugares para tocar. Isso faz Enfrentando dificuldades comple- blico especializado como bateristas parte das vezes os com que haja milhares de músicos xas que não passam apenas pelo nú- Música de topo, permanecem ilustres desco- músicos têm de pagar tecnicamente bem treinados, mas mero de locais para tocar, o jazz ac- nhecidos, mesmo junto daqueles que que não têm a experiência de palco tual atravessa, paradoxalmente, um ouvem regularmente jazz? Haverá para editar. Isto era necessária. Tocar com público, apren- momento de particular dinâmica, espaço, ainda, para assistirmos ao der como enfrentá-lo, como trabalhá- dando origem a música de uma cria- aparecimento de músicos com o pe- impensável no meu lo, esse é um passo fundamental.” tividade e diversidade extremas que, so e o impacto de um Duke Ellington É uma análise consensual, que tan- observada de perto, constitui um pa- ou de um John Coltrane, ou terão es- tempo” to encontramos em DeJohnette como norama bem mais rico do que o dos ses tempos de disponibilidade para num movimentado “chat” sobre jazz: anos 60 e 70. Mas porquê, então, tan- a lenda acabado definitivamente? “Esta música é hoje ensinada em uni- tas dificuldades e a sensação de que Tempos difíceis versidades, até ao nível do mestrado, se perdeu alguma da “magia”? “Os tempos eram outros”, explica produzindo centenas de músicos tec- “O clima musical é agora muito DeJohnette em entrevista ao Ípsilon. nicamente competentes, prontos a complicado, é muito duro para os “Tempos mais lentos, tudo acontecia gravar para uma das dezenas de edi- músicos. Mesmo músicos conhecidos com outra intensidade. Agora tudo é toras jazz que se multiplicam por to- têm de fazer muitas coisas diferentes, mais rápido e difícil. Mas ainda exis- do o mundo. O que não existe agora não apenas tocar. Hoje tem de se ser tem ícones no jazz. Se lhes dermos é uma ‘universidade’ que os leve pa- de alguma forma empresário, pro- tempo, eles acabarão por aparecer. ra a rua, para tocarem ao vivo em mover a música, colocá-la na Inter- Tenho um saxofonista novo na minha bandas de outros músicos, ao longo net, ter MySpace, Facebook, utilizar banda, o Rudresh Mahanthappa, que de meses, ou mesmo anos, com es- ferramentas de marketing, fazer poderá vir a ser um deles. Mas há tadias prolongadas em clubes como ‘multi-tasking’ para conseguir ven- muitos mais: Christian McBride, eram o Five Spot ou o Village Van- cer”, argumenta DeJohnette. “As di-

16 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon ria no Jazz em Agosto

Miles Davis, Keith Jarrett, Charles Lloyd, Herbie Hancock, Ornette Coleman, Wadada Leo Smith: ele, Jack DeJohnette, gravou com todos

ficuldades das editoras, os nais em grupos como os de John Col- ‘downloads’ grátis e o fácil trane ou Jackie McLean, e ainda sob acesso a todo o tipo de músi- forte influência do pianista Ahmad ca tornaram hoje mais difícil a Jamal e do seu baterista, Vernell Four- um músico sobreviver. Grande nier, surgiu a oportunidade que iria parte das vezes os músicos têm mudar a sua vida ao integrar o quar- de pagar para editar. Isto era im- teto do saxofonista Charles Lloyd nu- pensável no meu tempo”, conti- ma formação que iria ficar para a nua. história do jazz e que integrava o ain- da jovem pianista Keith Jarrett e o Do piano à bateria contrabaixista Cecil McBee. O grupo, Jack DeJohnette é claramente um que actuaria em 1966 em dois con- músico que soube adaptar-se aos certos históricos no Clube Luisiana, ventos de mudança. E a primei- em Cascais, ficou conhecido por to- ra grande mudança que enfren- car para grandes audiências rock, ao tou, ainda jovem, foi quando lado de nomes como Jefferson Air- decidiu trocar o estudo do pia- plane, Cream ou Janis Joplin. no pela bateria: “Foi uma mu- Quando lhe perguntamos qual das dança natural. Eu tocava piano suas vindas a Portugal recorda me- num trio que ensaiava na cave lhor (já foram algumas, com diversos de minha casa. Como o bateris- grupos), DeJohnette regressa de ime- ta deixava frequentemente a diato ao Luisiana: “Lembro-me bem bateria na sala de ensaios, co- de uma noite, há muitos anos, com o mecei a experimentar e a tocar quarteto de Charles Lloyd. Foi um com discos. Algum tempo de- concerto incrível.” Numa crítica, pa- pois já tocava os dois instru- ra o “Diário Popular”, Luiz Villas- mentos. Foi o Eddie Harris Boas escreveria então: “O público, [saxofonista] que me aconse- céptico durante os primeiros trechos lhou a tocar apenas bateria. e surpreendido pelas suas incursões A experiência com o piano no free jazz e nos happenings musi- acabou por me dar uma pers- cais, acabou conquistado por Charles pectiva diferente da bateria, Lloyd e pelos seus três músicos.” Con- mais orquestral.” tinua DeJohnette: “Lembro-me tam- DeJohnette iniciou aí, nessa bém de um concerto especial com o sala de ensaios, um percurso Golden Quartet do Wadada Leo Smi- que iria afirmá-lo como um th e de alguns concertos com os meus baterista com um estilo único, próprios grupos, claro.” baseado no detalhe e num ex- O fulminante Miles cepcional rigor com o som de A estadia no quarteto de Charles cada peça da bateria, algo raro Lloyd, embora de grande rendimento, na altura, pelo menos para um acabaria por durar apenas dois anos músico de jazz. Com a bateria afi- e, por esta altura, já um outro músico nada como se de um outro instru- andava atento aos novos sons da ba- mento se tratasse, em intervalos teria de DeJohnette – Miles Davis. “Du- bem definidos, DeJohnette come- rante todo esse tempo toquei com çou a ouvir acordes em cada pra- muitos músicos, para além de Lloyd. to ou tambor, e a desenvolver O Miles ouviu-me tocar com o Jackie uma sonoridade própria, diferen- McLean e começou a aparecer nos te dos outros bateristas. Após um concertos. Um dia, o Tony Williams período de participações ocasio- não podia tocar e o Miles chamou-

Ípsilon • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • 17 Jack DeJohnette começou no piano: isso tornou a maneira como toca bateria mais orquestral, reconhece

me. Era uma banda em que esta- “Ultimamente ouço principalmente “Um dia, o Miles já a anunciar uma nova mudança no que dividiu opiniões entre os fãs de vam o Wayne Shorter, o Herbie Han- a minha própria música, por neces- som do baterista. Segue-se então uma Surman. Foram depois necessários cock e o Ron Carter, ainda antes do sidade. Estou a produzir o meu pró- chamou-me (...). fase de maturidade absoluta para De- mais 20 anos para que editassem de ‘Bitches Brew’. A estadia com o Miles ximo álbum e a tarefa de escolher as Johnette no conceituado Standards novo juntos “Invisible Nature” foi incrível: a forma como ele pensava músicas consome muito tempo. Exis- A estadia com ele foi Trio de Keith Jarrett, com o contrabai- (2002), registo atmosférico, gravado sobre música, o rigor e intensidade, a te tanta música nova a ser editada! xista Gary Peacock, projecto que con- ao vivo, com um equilibrio notável dedicação absoluta à música e aos Tenho a casa cheia de discos, discos incrível: a forma tinua a gravar até hoje, mais de 20 entre elementos acústicos e electró- músicos que tocavam com ele, a for- que me dão ou que pedem para eu anos depois, constituindo uma refe- nicos. Quando lhe perguntamos por- ma como nos respeitava.” ouvir. O meu dia não tem tempo su- como ele pensava rência absoluta para o trio de piano quê 20 anos sem gravar, uma vez que A América, recordou ele à revista ficiente para que consiga fazer tudo sobre música, o rigor jazz. Da sua discografia, avassaladora, têm colaborado frequentemente nes- “Modern Drummer”, estava prepa- isso e ainda tocar e praticar”. Esse, ficam para a história, além dos já ci- ta última década, a resposta de De- rada para o incrível Miles. “Tive mui- sublinha, é outro dos problemas de e a intensidade, a tados, clássicos como “Forest Flower” Johnette surpreende: “O John é casa- ta sorte em estar presente no período hoje: “As pessoas estão sempre a ou- (Lloyd), “Jack Johnson” e “Live Evil” do com a minha filha mais nova, daí de transição do ‘In a Silent Way’ para vir música, em todo o lado, todo o dedicação absoluta (Miles), “Demon’s Dance” (McLean), esta frequência das colaborações re- o som funk/acid jazz da banda de Mi- tipo de música, 24 horas por dia. Isso “Blow Up” (Hancock), “Power To The centes. Antes, estávamos ambos mui- les. As influências que recebíamos tira muito do impacto dos concertos. aos músicos que People” ( Joe Henderson), “Infinite to ocupados e nunca surgiu a oca- eram imensas, dos Beatles ao Jimi Antigamente, num concerto, havia Search” (Miroslav Vitous), “Timeless” sião.” O concerto desta noite, ante- Hendrix ou aos Cream. Fizemos al- toda aquela excitação do desconhe- tocavam com ele (...). (John Abercrombie), “Gnu High” e cipa, será o equilíbrio habitual entre guns espectáculos conjuntos com os cido, do que iria acontecer. Mesmo As pessoas eram “Double-Double You” (Kenny Whee- o material dos discos e a improvisa- Sly & Family Stone, o que foi bom que o grupo já tivesse discos grava- ler), “In Pas(s)ing” (Mick Goodrick), ção: “Vamos fazer o que habitual- para o Miles pois ele queria alcançar dos, ao vivo era provável já estarem literalmente “Song X” (Pat Metheny / Ornette Co- mente fazemos, improvisar. Alguns esse tipo de público. O público do noutra fase”. Os concertos de Miles leman), “Michael Brecker” (Brecker), dos sons serão próximos dos discos jazz continuava a pedir-lhe o ‘My Davis eram assim, fulminantes: “As fulminadas pela “Triplicate” (Dave Holland), “Ameri- anteriores, outros serão novos, sem- funny Valentine’ e os ‘standards’ an- pessoas eram literalmente fulmina- ca” (Wadada Leo Smith), e ainda “Bye, pre totalmente improvisados. tigos. Parecia-me na altura que a das pela música, por aquele som que música [dele], por Bye Blackbird” e “Tribute”, entre mui- Dividindo-se entre o trio que par- América estava pronta para algo mais nunca tinham ouvido na vida. A ve- tos dos álbuns gravados com o Stan- tilha com Danilo Perez e John Pati- livre e criativo. As editoras tomavam locidade com que as coisas eram da- aquele som que nunca dards Trio de Jarrett. tucci, as gravações a solo com músi- conta dos seus artistas e não lhes exi- das a conhecer era outra. Permitia tinham ouvido na ca para meditação e relaxamento giam ‘hits’ ao fim de seis semanas. entrar mais fundo na música de um Laços de família com as quais conquistou um Grammy Percebiam que um músico pode pre- determinado disco, ouvi-lo vezes sem vida” A lista de grandes músicos com que (“Peace Time”), e a produção do seu cisar de fazer três ou quatro discos conta. Hoje, já não interessam os ál- DeJohnette tocou ao longo da carrei- próximo álbum com digressão euro- antes de conseguir transmitir aquilo buns e alguns dos miúdos não ouvem ra nunca parou de crescer, propor- peia marcada para Maio do próximo que quer dizer.” o mesmo disco duas vezes.” cionando ainda o encontro com uma ano, num projecto que integra os mú- Perguntamos-lhe, a propósito de Depois de Miles, seguiu-se um pe- figura maior do jazz europeu, John sicos Rudresh Mahanthappa, Dave uma belíssima gravação em duo com ríodo em que DeJohnette actou sobre- Surman, músico com quem irá par- Fiuczinski, George Colligan e Jerome Bill Frisell, “The Elephant Sleeps But tudo como líder dos seus próprios tilhar o palco hoje, naquele que é um Harris, Jack DeJohnette procura tran- Still Remembers” (2006), com um grupos, encetando uma colaboração dos concertos mais aguardados do quilamente contrariar a velocidade som contemporâneo próximo de duradora com a editora germânica festival Jazz em Agosto. Conheceram- vertiginosa a que vive hoje a música uma sensibilidade rock alternativo, ECM. São dessa altura os obrigatórios se no final dos anos 60, tendo poste- no nosso planeta. se esse álbum ainda foi influenciado “Gateway”, “New Directions” (injus- riormente gravado em duo “The por esse período ou por coisas novas tamente subavaliado), “Special Edi- Amazing Adventures of Simon, Si- Ver agenda de concertos pág. 37 e se- que ande agora a ouvir. DeJohnette: tion” ou “, Album”, este último mon” (1981), álbum inclassificável gs.

18 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon + 8 COM O PòBLICOPOR APENAS D série MAIS Û1,95 V ípsilon II D UM MUNDO DE ESPECTÁCULOS A PENSAR EM SI!

(CADA) A pedido de vários amantes da sétima arte, apresentamos mais 8 fi lmes premiados. LEONARD Agora sim, a melhor colecção de fi lmes premiados está completa. COHEN WORLD TOUR 2010 10 SET | PAV. ATLÂNTICO

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6 OUTUBRO PAV. ATLÂNTICO 16 Julho Shattered Glass 23 Julho Verdade ou L.I.E. Sem Saída Mentira de Michael de Billy Ray Cuesta

18 NOVEMBRO PAV. ATLÂNTICO

30 Julho 6 Agosto A Outra Margem Os Sonhadores de Luís Filipe de Bernardo Rocha Bertolucci tente.

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FMM de Sines Há aqui um “público honesto”, que vem mesmo para ouvir música

A world music explica Um novo livro de iniciação à world music está prestes a sair. O Ípsilon foi ao Festival de Músicas é só uma etiqueta comercial: tem “mistérios e maravilhas” e mudou a música toda, rock incluído. U

20 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon Barbez Estão na lista dos melhores de sempre em Sines para António Pires, juntamente com os Moriarty (2008) e os Enfance Rouge (2009)

“No rock sinto que bém Giacometti, Woody Guthrie, os Pogues, os Ojos de Brujo, Peter Ga- estou a ouvir coisas briel ou as Zap Mamma. De Amália a Zúlia, da “Antology of American Folk do passado, mesmo Music” aos Zydepunks. “O livro inclui bandas de sucesso e outros incontor- em grupos de que náveis, mas eu contrabalanço com coisas praticamente desconhecidas gosto, como os como os Zydepunks. E, no eclectismo, Arcade Fire. Mesmo a escolha acaba por ser coerente”, diz o autor. a renovação do rock Apesar do volumoso número de nomes incluídos (e que darão para está a ser feita à custa pelo menos mais um volume), “Raízes e Antenas” “não é enciclopédico”: da world music” “Gostava que servisse de introdução para muita gente que não conhece [o António Pires género] e que fosse uma boa base de trabalho e de pesquisa.” Pires quer que o livro desperte curiosidades, ainda que se destine também a co- nhecedores: “Quem já domina a world music também tem nomes pa- ra descobrir, menos conhecidos”. Esta introdução à world music tem um lado “muito visual”, pois acom- panham cada entrada fotografias que António Pires considera “muito im- portantes”. O trabalho gráfico é do seu colega DJ Rodrigo Madeira. Os dois formam, nas horas vagas, o Clu- be Conguito, que anima festas preci- David Byrne escreveu em 1999 um de forma especial, e levaram-me a ir de nomes mais antigos e chamei-lhe samente com cruzamentos entre mú- artigo no “New York Times” que ficou à procura do resto”. E “o resto” levou- Cromos, Raízes e Antenas. Em 2 anos sicas tradicionais (das “Raízes” locais) famoso: “I hate world music” [“detes- o à procura de “raízes” musicais vá- já eram 200 nomes, incluindo ban- e influências exteriores, aquilo que to a world music”]. O ex-Talking He- rias. O Festival Intercéltico do Porto das, editoras, filmes, instrumentos, se apanha pelas “Antenas”. O DJ An- ads acusava o termo de ser “uma eti- foi das suas primeiras paragens. E, etc.” Entretanto surgiu a ideia de tónio Pires apresenta-se assim no seu queta para tudo que não é cantado depois disso, começou a acompanhar “transformar a coisa em livro”, graças MySpace: “António Pires, DJ de World em inglês ou não encaixa no universo outros festivais com outras músicas: a Vasco Sacramento, da Sons em Music - Músicas de raiz tradicional pop anglo-ocidental este ano”. Mas o Festival Músicas do Mundo em Si- Trânsito (responsável pelo festival de embora ‘contaminadas’ por novas será a designação “música do mundo” nes, pois claro, praticamente desde Aveiro com esse nome), à disponibi- linguagens musicais (o rock, a elec- apenas uma maneira de encaixar mú- o seu início, em 1999, mas também o lidade mostrada pela editora Media trónica, o ska, o funk...) e nelas ha- sicas no caixote do “exótico, engraça- Sons em Trânsito, o Andanças, o Et- XXI, de Manuel Fernandes Vicente, e vendo também lugar para músicas dinho, seguro”, como Byrne então nias ou o MED de Loulé. ao apoio de Carlos Seixas, director de ‘das margens’ como o kuduro ango- apontava? “Estar imerso na world music não produção do Festival Músicas do Mun- lano, o reggaeton, o baile funk brasi- António Pires, jornalista de música impede que goste de rock. Mas no ro- do de Sines, que apoia a edição. Esta- leiro ou o kwaito sul-africano, numa com larga experiência e DJ que põe o ck sinto que estou a ouvir coisas do vam lançados os dados. longa viagem musical com... raízes e “mundo” nos pratos, reconhece que passado, mesmo em grupos de que O livro fazia sentido, porque as “en- antenas.” a etiqueta world music foi inventada gosto, como os Arcade Fire”, sublinha tradas” compunham um “corpus só- para fins comerciais em meados dos António Pires. Saturou-se do rock, lido” e porque, argumenta Pires, fazia Sines, um amor absoluto anos 80, mas não pensa que o termo coisa que não acontece com o univer- sentido haver um livro assim, uma Em Sines, António Pires segue o Fes- seja tão pernicioso: “É verdade que o so “infindável” da “música do mun- espécie de “introdução à world mu- tival Músicas do Mundo com atenção. termo foi inventado para responder do”. “Mesmo a renovação do rock sic”. O critério para a escolha de no- Na apresentação do livro no Centro a uma dificuldade de encaixar os dis- está a ser feita à custa da world mu- mes foi sobretudo o gosto do autor, de Artes, fechou a sessão apelando cos nas lojas, mas acho que cumpre sic”, diz o autor de “Raízes e Ante- embora o livro inclua algumas bandas ao público presente: “Vão ver os con- a sua função”. Prefere não se deter nas”, a quem interessam as contami- que Pires actualmente não considera certos!” É um entusiasta, não um es- muito na discussão da “etiqueta” e nações que se fazem na world music. interessantes, mas que tiveram um pecialista, da música; anda sempre à ver antes a world como uma forma Também é disso que fala no livro que papel importante há alguns anos, co- procura de coisas novas. E, mais uma de viajar por muitas músicas diferen- lançou em Sines. mo os Clannad, por exemplo. António vez, quando voltámos a falar em Si- tes. Pires diz que “Raízes e Antenas” pode nes, ele estava na expectativa de “coi- Pires trabalhou 20 anos para o Uma porta de entrada “ser lido de várias maneiras”. A orga- sas fantásticas”. “Uma coisa lindíssi- “Blitz”, e escreveu também para o O livro “Raízes e Antenas (mistérios nização por ordem alfabética permi- ma que tem o festival é que sempre “Se7e”, o “Expresso”, “A Capital”, e e maravilhas da world music)” tenta te descobrir o que se quer, mas tam- me surpreendeu”, diz. revistas com a “Face”, entre outras. mostrar os cruzamentos que foram bém saltar. Não é necessariamente Dos concertos dos primeiros dias, Actualmente, colabora com a “Time acontecendo entre músicas aparen- um livro para se ler de uma ponta à elogiou especialmente a “voz fabulo- Out”, a “HD” e o “i”. “Andei 20 anos temente longínquas. António Pires outra, mas pode-se fazer através dele sa” de Yasmin Levy, enquanto nos a escrever sobre pop-rock e alguns explica-nos como surgiu a ideia, há um percurso, uma viagem, passando falava dos contágios que especialmen- desvios”, conta. A certa altura, um quatro anos, depois de ficar desem- por nomes tão diferentes como o mu- te o interessam - neste caso uma can- grupo que misturava punk e música pregado: “Decidi criar um blogue so- sicólogo Alan Lomax, o projecto Aduf tora israelita que procurou a tradição tradicional irlandesa levou-o para ou- bre world music. Além de falar da ou Ali Farka Touré, se quisermosos ficar sefarditasefardita dod canto em ladino tros caminhos: “Os Pogues ‘bateram’ actualidade, fui recuperar uma série só pela letra A. Mas encontramosos tamtam-- e o cruzoucruzou com o flamen- cada ao mundo, desde Sines Os Pogues levaram António Pires do s do Mundo de Sines conversar com o autor. Para ele, a world music não rock ao Intercéltico do Porto, e daí às músicas do mundo . Um mundo em visita guiada, com António Pires à frente. Pedro Boléo Música

Ípsilon • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • 21 Descoberta António Pires tem um amor absoluto pelo espírito de Sines: “Uma coisa lindíssima que o festival tem é que sempre me surpreendeu” MIGUEL MADEIRA MIGUEL

Yasmin Levy Uma israelita entre a tradição sefardita do canto em ladino e o flamenco co, “que associamos aos ciganos, mas que na verdade surge de um cru- zamento das culturas muçulmana, judaica e cigana”. Outro encontro “[Sines] é uma micro surpreendente do festival de Sines foi, para António Pires, o concerto dos enciclopédia mas N’Diale, que juntou um quarteto bre- tão com um trio do Mali. É curioso ao vivo. E mostra que que “músicas que aparentemente não têm nada a ver consigam cruzar-se de a crise da indústria uma forma orgânica, verdadeira, na- discográfica pode ser tural”, nota. Neste caso não se fun- dindo, “mas mantendo espaço para contrabalançada pelo as duas.” Dá-nos muitos exemplos dos cru- vigor da música zamentos inesperados que fazem o Festival de Sines, que fazem o seu li- ao vivo” vro. Passamos pelos Chieftains a tocar com orquestra de música clássica chi- António Pires nesa. Mais tarde, falamos do fadista Ricardo Ribeiro fundindo-se com o alaudista libanês Rabih Abou-Khalil, um exemplo que António Pires con- sidera feliz. O autor de Raízes e Antenas diz ter uma paixão e um amor absoluto pelo festival. Gosta de Sines também por causa dos amigos que lá tem. E considera que há no Festival Músicas do Mundo “um público honesto” que vem para ouvir música. O melhor de Sines, insiste, é a pro- gramação. “São dezenas e dezenas as na pobreza. “Isso é usar artistas como bandas que já cá vieram. É uma micro coisas descartáveis. E faz-se tanto enciclopédia mas ao vivo.” E refere com portugueses como com africanos alguns nomes que mais o marcaram, ou sul-americanos”. nos últimos anos: “Os Moriarty [2008] António Pires tem razões para não Os Enfance Rouge [2009], os Barbez gostar da palavra especialista. Ele pró- deste ano”. prio cruza várias actividades: fez rá- António Pires diz que o festival é dio, teatro, cinema, é jornalista, “blo- também um exemplo de vigor da mú- gger”, DJ, professor em escolas de sica ao vivo: “E mostra que a crise da artes, etc. E agora tem este livro pron- indústria discográfica pode ser con- to a sair, que é ele mesmo um guia trabalançada pelo vigor da música ao simples de iniciação à world music vivo.” A crise do disco sente-se tam- ou uma forma prática de fazer novas bém na world: “Está a alastrar para o descobertas. Numa perspectiva aber- circuito editorial da world. Vê-se nes- ta e divulgadora, “Raízes e Antenas” te fazer de colectâneas. Agora vão mostra, à sua maneira, a vitalidade remasterizar discos de vinil arranja- das chamadas “músicas do mun- dos em lojas de Kinshasa, Nairobi ou do”. Joanesburgo.” Nem tudo será colonialismo e en- gavetamento comercial na “world”, Gato por lebre como denunciava em 1999 David Byr- De qualquer maneira, para ele a world ne. A discussão continuará. Mas, en- continua, apesar de tudo, a refrescar tretanto, o termo banalizou-se. A po- a música popular. Mas também se lémica sobre a etiqueta “world” di- vende “gato por lebre”, que é para luiu-se. Os festivais multiplicaram-se, este jornalista “freelancer” o pior da e os discos também, apesar das crises “música do mundo”. O que ele mais discográficas. Houve outros achamen- detesta na world é “fingir que se é tos e cruzamentos, novas fusões, no- genuíno não sendo”. E reconhece que vas identidades, e muitas trocas mu- é preciso separar o trigo do joio. Há sicais. E há novas gavetas comerciais, quem vem buscar pessoas sem ver- mas também novas barreiras a que- dadeiro talento para os usar como brar, suspeitamos que por aí fora. Das objectos e depois os deixar de novo raízes locais às antenas globais.

22 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon As maiores gafes do Gaston o Lagaffe, anti-her—i da B.D. chegam ao Franco-Belga, Pœblico numa imperd’vel.colec‹o Divirta-se com umadaspersonagens trapalhonas,preguiosas ecriativasDivirta-se dabandadesenhadamundial mais 6¼ Volume, Quarta-feira, 11 de Agosto, por apenas mais Û6,40 com o Pœblico. que, mesmo sem fazer nada, faz o suficiente paralhep que, mesmo semfazernada,fazosuficiente As gafes do Gaston est‹o no Pœblico. rovoc ar boasgargalhadas.

19 Livros á PVP vol. 1: 2,50Û á PVP Restantes: 6,40Û á Preo total Portugal Continental: Û117,70 á Data In’cio: 7 de Julho á Data Fim: 10 de Novembro á Dia da semana: quarta-feira. Limitado ao stock existente. © Marsu 2010 by Franquin - www.gastonlagaffe.com. YOURI LENQUETTE YOURI A Orchestra Bao África em

É Junho e estamos em Loulé, nos bas- da Orchestra Baobab, banda histórica “Eu próprio não sou de Dacar, sou talizada na década de 70. Lafti Benje- Em 1987 tidores do palco principal do Festival do Senegal que foi nos anos 70 a mais de Saint-Louis, no norte do Senegal. loum: “Adorava Jimi Hendrix, os Cre- a Orchestra Med, montado sob o olhar da Igreja importante e popular do país (e, pro- E se investigarmos mais fundo, posso am ou os Beatles. Adorava Ray Char- Baobab Matriz. Os músicos fazem tempo en- vavelmente, da África Ocidental). Go- até dizer que não originário do Sene- les e Umm Kulthoum, uma cantora desapareceu, quanto não chega a hora do concerto. mis nasceu na província de Casaman- gal, porque os meus pais são marro- árebe [egípcia] fantástica. Mas ne- em 1989 Um baterista faz o aquecimento batu- sa, no sul do Senegal, mas a sua ascen- quinos”. É Lafti que fala ao Ípsilon, nhum deles era realmente eu. Tinha começou a cando as baquetas nas pernas. Um dência é guineense. Guiné-Bissau: pouco antes de a Orchestra Baobab a sensação de que, se alguma vez con- ressuscitar: saxofonista entrega-se a um último pouco depois, ouvimo-lo cantar no dar um magnífico concerto, o melhor seguíssemos conjugar todas as nossas “Era ensaio, assegurando que tudo está em concerto em crioulo português. Ve- de todo o festival Med. É ele que nos influências, as nossas raízes, teríamos importante condições. Perante o olhar dos jorna- mos também o saxofonista Issa Cis- guia pela história de uma banda que a nossa música, não a música deles para nós fazer listas que esperam uma entrevista, sokho, descendente de famílias griot nasceu como reunião dos melhores feita por nós.” música que dos promotores de imprensa e pesso- do Mali (os griot são os portadores da músicos que Dacar tinha para ofere- A questão da identidade é impor- sobrevivesse al da organização do festival, um outro tradição poética e musical, e também cer, representando uma identidade tantíssima em todo o discurso de Ben- à passagem apertará os braços sobre o corpo e, os comentadores musicais da actuali- pan-africana nascida sob a influência jeloum. Num determinado momento, do tempo. É no calor de uma noite de Verão algar- dade). E seguimos os movimentos de da Negritude de Léopold Senghor. explodirá: “Ouça, a África nunca foi por isso que via, lançará em inglês, com um sorri- Barthélemy Attiso, chefe de orquestra Hoje, 40 anos depois da fundação, a respeitada. A forma como as pessoas ainda estamos so: “Tanto frio, demasiado frio”. e guitarrista extraordinário, togolês Orchestra Baobab mantém a sua for- pensam África é completamente in- aqui, hoje” Aponta para o céu, como se a lua tão que na década de 60 viajou até Dacar, mação praticamente inalterada (“um fluenciada pelas imagens que vêem alva fosse prova do clima “gélido”: “No a capital senegalesa, para frequentar bom músico é sempre difícil de en- na televisão. Tentem vir a África. O meu país, nunca sinto este frio”. O o curso de Direito. Próximo dele, o contrar e não temos tempo para lutas que é uma pessoa pobre? Um pobre homem que aponta para o céu chama- homem que lhe serve de contraponto, e discussões”, dir-nos-á Lefti) e a sua é alguém a tentar viver exactamente se Rudy Gomis e é um dos vocalistas o guitarrista ritmo Lafti Benjeloum. música é ainda fiel à descoberta cris- da forma que os detentores do dinhei-

Nasceu quando os melhores músicos de Dacar se reuniram para tocar num clube selecto, m colonialismo europeu. Hoje, 40 anos depois, ainda é um tesouro africano.O Ípsilon falou com o g

24 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon aobab inventou em Dacar

Cabral (“Cabral”) ou o músico do com a Orchestra Baobab. Rudy “Ouça, a África Ibrahim Ferrer (“Hommage à Tonton Gomis iniciou uma carreira a solo, Ferrer”), mesmo a decisiva influência partilhada com a fundação de uma nunca foi respeitada. cubana era uma busca identitária: escola de línguas africanas para resi- A forma como as “Levaram os nossos ritmos [para as dentes estrangeiros – é formado em Caraíbas] e puseram-lhe harmonias Línguas. Os restantes mantiveram-se pessoas pensam clássicas espanholas por cima. Nós ligados à música. Lafty, o licenciado decidimos recuperar esses ritmos e em Filosofia que era suposto ter-se África é enquadrá-lo nas nossas linguagens tornado professor – “Tentei dois anos, clássicas”. mas não era a minha vocação estar completamente Ouvindo Lefty tocar nos Baobab, numa sala em frente aos alunos” -, foi onde o requebro caribenho ganha, tocando em hotéis com o vocalista influenciada pelas pela repetição, pela dinâmica ondu- Balla Sidibe e o baixista Charlie imagens que vêem na lante, traços de hipnose magrebina, N’Diaye. percebemos perfeitamente o que am- Até que, em 1989, a editora World televisão. Tentem vir bicionava. Circuit reeditou “Pirates Choice”, ál- bum de 1982, e a Orchestra Baobab a África. O que é uma Queda e renascimento começou a ser conhecida no Ociden- Tocando quase diariamente no Clube te. Em 1996, a World Circuit, tendo pessoa pobre? Um Baobab para um público selecto, tor- em conta a influência do “son” cuba- naram-se primeiro a banda mais fala- no na música da Orchestra Baobab, pobre é alguém da da capital. Depois, extravasaram. promoveu um encontro em Havana a tentar viver “Todos os três meses saíamos em di- entre africanos e caribenhos que, gressão durante 15 dias, parte de um frustrada essa primeira intenção, re- exactamente plano de cooperação entre o Senegal sultaria no célebre Buena Vista Social e vários países africanos que tinha por Club. da forma que objectivo levar a música moderna se- Em 2001, “Pirates Choice” foi ree- ro querem que viva. Se te mantiveres teriam de ser os melhores. Mais do negalesa a outras nações”. No final da ditado novamente, com canções ex- fiel ao que és, com consciência das que isso, teriam de representar o me- os detentores década de 70, esgotavam estádios em tra, e o sucesso foi tal que a banda, tuas raízes, não serás pobre. Serás lhor de África na sua diversidade. todo o continente e mantinham uma separada há década e meia, recebeu rico”. “Dacar é um grande porto, o ponto do dinheiro edição regular de álbuns – editaram um convite para actuar no Barbican, A Orchestra Baobab escavou até mais ocidental de África, e tem gente querem que viva” cerca de 20 entre 1970 e 1985. Em em Londres. Daí para cá, correram o encontrar a sua riqueza. O resultado vinda de todo o mundo. De certa for- 1979, o Clube Baobab encerrou, mas mundo em digressão e editaram dois foi tão brilhante que, até hoje, não ma, é o mundo num pequeno espa- Lafty Benjeloum a banda já continuara sem ele. Deixa- álbuns, “Specialist In All Styles” (de houve necessidade de mudar o que ço”, descreve Lafty Benjeloum. A ra de ser a banda residente dois anos 2002 e produzido, curiosamente, por quer que fosse. Orchestra Baobab foi a banda que en- antes porque ambicionava um melhor Youssou N’Dour), e “Made In Dakar” controu a forma perfeita de represen- “cachet” e porque, diziam os seus (2007). O mbalax é género que passou O mundo que é Dacar tar esse caldo cultural. As suas origens membros, frustrava-os que os seus e a Orchestra Baobab mantém-se fir- O baobab (baobá ou embondeiro, em remontam a outra banda histórica, a amigos tivessem entrada barrada no me, tão ricamente lúdica, fascinante português), árvore de grande porte Star Band – era a mais importante da selecto estabelecimento. e elegante como sempre. que pode atingir 25 metros de altura cidade e dela saíram vários músicos Em 1987, porém, separaram-se. Ti- Rudy Gomis, recordando os primei- e dez de diâmetro e cuja longevidade para formar a Baobab. nham sido ultrapassados pelos acon- ros tempos da Orchestra Baobab, dis- chega a ultrapassar um milénio, é o Lafty fala-nos de uma banda forma- tecimentos. A Star Band, que estivera se certa vez: “Tocávamos para ter símbolo do Senegal. Em 1970, quan- da por jovens músicos que encontra- na génese da sua formação, fora re- alguns francos nos nossos bolsos. Não do um conjunto de jovens políticos e ram o cenário perfeito para que as generada e os seus membros mais éramos casados. Não tínhamos res- empresários do Senegal, independen- suas ideias frutificassem. Um grupo jovens, incluindo a futura estrela ponsabilidades. A vida era bonita”. te da França há dez anos, decidiu procurando afirmar uma identidade. Youssou N’Dour, saíram para fundar Lafty Benjeloum sorri quando cita- abrir um clube moderno e sofisticado Contextualiza, recorrendo à sua pró- um novo grupo, os Etoile de Dakar, e mos o companheiro de banda. “Não que reflectisse o novo rumo do país, pria experiência: “Vens de Marrocos um novo estilo, o mbalax, mais agres- queríamos tocar música só por tocar, chamou-lhe Baobab. Clube Baobab. e os teus pais falam árabe, mas os teus sivamente ritmado e que rapidamen- ou só para ganhar dinheiro. Era im- No primeiro andar, a sala de refei- amigos são senegaleses e falam wolof te se transformou no preferido da portante para nós fazer música que ções. Abaixo, o clube propriamente [a língua franca do país]. Depois, vais juventude senegalesa. De repente, a durasse, que sobrevivesse à passagem dito, com música tocada ao vivo todas para a escola, onde falas francês e Orchestra Baobab parecia velha e ana- do tempo. É por isso que ainda esta- as noites, um bar de dimensões con- aprendes inglês”. crónica. Os seus músicos, porém, re- mos aqui, hoje”. sideráveis construído, precisamente, Na banda, que reunia malianos, cusaram forçar uma modernização. Vendo o concerto da Orchestra, em forma de embondeiro. O seu pro- senegaleses, togoleses, filhos de mar- “Decidimos não seguir a moda”, ex- aquelas duas horas de concerto, aque- prietário principal era Adrien Sen- roquinos ou guineenses, o resultado plicou Barthélemy Attisso ao “Guar- las canções que se prolongam admi-

ghor, ministro da Agricultura e irmão foi música que cruzava várias línguas Música dian”, em 2007. “Isso significou o ravelmente, aqueles ritmos cubanos mais novo do primeiro Presidente do e que fundia harmoniosamente o hi- nosso declínio gradual, mas aceitámo- que já não o são, aquele fluxo contí- Senegal independente, Léopold Sédar ghlife ganês e nigeriano, as melodias lo para proteger a nossa originalida- nuo de línguas e expressões musicais Senghor, intelectual africano e teóri- wolof e as baladas da Guiné, os ritmos de, a nossa identidade”. fundidas com mestria, não duvida- co da Negritude. Adrien, que fundara luxuriantes, incessantes, da região Attiso regressou ao Togo e à advo- mos. um clube onde receberia políticos, de Casamansa, e, ingrediente funda- cacia, actividade que mantém até ho- Os cavalheiros sábios, os músicos artistas e homens de negócios dos mental, o “son” cubano que era à je – metade do tempo é advogado no de talento ímpar da Orchestra Bao- países africanos circundantes e do época a grande sensação em Dacar. seu país de nascença, no restante é bab, são uma lição de história e de Ocidente, ambicionava a excelência. Na banda, que homenageou em can- um inesperado “guitar-hero” de ócu- vida. São exactamente a música que Por isso, os músicos que ali tocariam ção o herói revolucionário Amílcar los e fato formal percorrendo o mun- nos oferecem.

, mas transformou-se numa banda pan-africana, símbolo de um continente a libertar-se do o guitarrista Lafti Benjeloum quando da sua passagem pelo Festival Med. Mário Lopes

Ípsilon • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • 25 The Books Ouvir mesmo sem p

Os The books são Nick Zammuto, ex-artista plástico radicado no Vermont, e Paul de Jong, violoncelista residente em Nova Iorque

Há quem coleccione selos, mapas ou relógios. A dupla americana The Books colecciona cassetes com sessões de meditação ou de terapia por hipnose e faz disso folk electrónica no novo “The Way Out”. Vítor Belanciano Música

26 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon prescrição médica

Livros para encontrar a felicidade. De “São as margens Nos discos anteriores, os pequenos Em geral, a música totalmente de não é um filme com música, mas tam- auto-motivação. Para combater a an- excertos de diálogos haviam sido re- vanguarda subsiste no isolamento bém não é propriamente um concer- siedade. Para aprender a andar de da cultura e da tirados essencialmente de discos de académico, dependendo de subsídios to. É uma espécie de experiência si- bicicleta. Ou para não ter aversão a vinil. Desta feita, recuaram até à épo- e de apoios institucionais. Habita o nestésica, em que som e imagem co- queijo. Não existe quase nenhum pro- sociedade, os restos, ca das cassetes – de auto-ajuda, de mundo das galerias de arte, dos mu- existem no mesmo plano.” blema no mundo para o qual não exis- meditação ou de filosofia amadorís- seus, dos seminários ou dos simpó- No fim de contas, são contadores ta hoje um livro de auto-ajuda. Todos aquilo a que já tica – entretanto substituídas pela In- sios para especialistas. Os Books tam- de histórias. E isso ao vivo é ainda querem prescrições. Formas simples ternet. bém se movem nesses meandros, mas mais perceptível. “Limitamo-nos a de aceder ao complexo. Discos é mais damos pouca Há quem coleccione selos, mapas, a sua ambição é outra. “O que nos tentar ordenar o que está desordena- difícil. Mas também os há. “The Way atenção, que nos relógios ou cromos de futebol. Eles excita verdadeiramente é poder apli- do, como a música actual. Nunca exis- Out” é um deles. coleccionam sons e imagens. Foi essa car ideias arrojadas em contextos po- tiu tanta e tantas formas de ela se Nele existem canções com gurus de interessam paixão que os juntou, em 1999, quan- pulares” afirmam. A sua música é fazer ouvir, mas ao mesmo tempo auto-ajuda que nos pedem para dor- do De Jong convidou Zammuto a jan- tanto mais desfrutável quanto mais passamos cada vez mais ao lado do mirmos em cima de um líquido cor- e motivam” tar em sua casa e acabaram a falar de impura e inclassificável. seu significado”, afirmam. de-laranja, incitando ao relaxamento, sons – de casamentos, de avalanches, Ritmos e texturas embatendo em É verdade. Os últimos anos signifi- ou crianças que reflectem sobre ame- Um novo começo de piqueniques, de crianças a brincar, ideias clássicas de composição. Ma- caram para a pop um tempo tão tu- aças de morte. Às vezes é divertido, Os Books tinham lançado até agora de portas a bater ou do vento. Deci- nipulação digital, supostamente im- multuoso quanto brilhante. A frag- mas também bizarro. Há alturas em três álbuns, “” diram criar um projecto em conjun- pessoal, lutando contra padrões ca- mentação de géneros e de formas de que gera um ambiente meditativo, (2002), “” (2003) to. nónicos de beleza. Impulsos de expe- fazer, consumir e distribuir música mas também consegue ser festivo. e “” (2005). Neste último As suas influências incluem Nirva- rimentalismo sónico diluídos pela põe cada vez mais à prova a capaci- É assim o novo, e quarto, álbum da pareciam uma mini-orquestra de câ- na, David Bowie, Roxy Music, Aphex procura do prazer imediato. “Alimen- dade dos melómanos para estarem dupla americana The Books, uma co- mara, difundido microrganismos di- Twin, pós-punk ou música clássica, tamo-nos desse tipo de tensões que atentos a tanta informação em curtos lagem incessante de diálogos insólitos gitais que integram o erro e o aleatório. mas procurá-las na sua música é pra- nunca se resolvem”, concluem. períodos de tempo. Mas depois exis- e sons invulgares, por entre camadas São obras herdeiras da música concre- ticamente impossível. Na maior parte Ao vivo são apenas os dois. Como tem projectos como os Books, que de ruído digital e harmonias clássicas ta, dos processamentos digitais e das dos casos, partem de excertos de di- não existe um líder, o vídeo acaba por funcionam como arqueólogos, selec- conduzidas pelo violoncelo, numa técnicas de utilização do “sampler”. álogos retirados de cassetes adquiri- funcionar como o elemento mais des- cionando, condensando, criando no- espécie de folk electrónica. Propõem quase sempre um dialogo das em lojas obscuras de todo o mun- tacado, costumam ironizar: “Pode- vas narrativas, devolvendo-nos um Nas mãos de outros, os “samples” improvável entre épocas, técnicas e do. De vez em quando também se mos sentar-nos em palco e tocar os pouco da sua e da nossa história. de meditação ou de terapia por hip- tipologias, assimilando o digital e o fazem ouvir as vocalizações de Zam- nossos instrumentos enquanto o ví- nose seriam apenas engraçados. Ma- analógico e indo das electrónicas mais muto, às quais é adicionada instru- deo faz o seu trabalho. O resultado Ver crítica de discos págs. 34 e segs. nipulados pela dupla americana, ad- abstractas à folk ou aos blues. mentação, que tanto pode ser à base quirem integridade. Descobrimos por Já não lançavam um disco há cinco de melodias folk, de guitarra e violon- trás deles qualquer coisa de estranho, anos, daí que o novo registo tenha celo, ou das electrónicas. mas ao mesmo tempo familiar. Ou qualquer coisa de recomeço. Começa seja, as excentricidades da cultura aliás com uma frase significativa: Os restos americana acabam por ser instru- “Hello, greetings, and welcome. We- Os vídeos da dupla fazem pensar mentos de prazer e de descoberta da lcome to a new beginning, for this no trabalho de artistas contemporâ- realidade. tape will serve you as a new begin- neos para quem a apropriação e a Um dos Books, Nick Zammuto, ex- ning. That’s right, a new beginning, colagem é importante, de Martha Ros- artista plástico, canta e toca guitarra. as we’re about ready to begin.” ler a Mike Kelley, ou em realizadores Na actualidade, habita com a família Os dois trabalham juntos há cerca de cinema como Harmony Korine. no campo, no Vermont. “Há quatro de dez anos. Mas nos últimos quatro Mas os próprios preferem dizer que estações no Vermont – quase Inverno, algo mudou. Constituíram família. a inspiração provém do material que Inverno, ainda Inverno e a chamada Mudaram-se para domicílios diferen- coleccionam. “São as margens da cul- fase de construção. Agora estamos tes, onde construíram estúdios casei- tura e da sociedade, os restos, aquilo nesse período. É a etapa em que faço ros. Mas a ideia de recomeço não tem a que já damos pouca atenção, que trabalhos no campo e de carpintaria apenas a ver com essas alterações. No nos interessam e motivam. Gostamos e em que armazenamos para o resto seu intimo está sempre presente a de coisas que exponham um olhar do ano”, explicava ele recentemente ideia de metamorfose quando iniciam intimo ou então que transmitam a à revista “Artinfo”. o projecto de composição de um no- imagem que um colectivo de pessoas O outro, Paul de Jong, teve forma- vo álbum. possui sobre um aspecto qualquer do ção em música clássica e toca violon- No caso dos Books, é quase inevi- viver em sociedade.” celo, residindo presentemente em tável que assim aconteça. Ambos são Não é fácil definir a música dos Nova Iorque. Raramente se vêem, a coleccionadores de sons. É através Books. Como os Matmos, por exem- não ser quando andam em digressão. deles que percebem qual a direcção plo, movem-se com à vontade tanto Nos períodos de maior intensidade a seguir. Possuem uma biblioteca com no campo da cultura pop como da criativa, trocam ideias pela Internet sons das mais diversas origens, resga- erudita. “Qualquer fenómeno cultural durante horas. Juntamente com Mat- tados de discos, cassetes, gravações que tem realmente impacto no pre- mos, Herbert ou Akufen, são um dos caseiras de origem desconhecida. sente deve ser invariavelmente uma projectos mais estimulantes da era Uma babilónia classificada das mais mistura de qualquer coisa de emer- moderna, quando se pensa em músi- diversas formas – consoante a origem, gente com qualquer coisa de tradicio- ca feita a partir de colagens insólitas o tipo de sonoridade, o ambiente a nal e residual. É aí que nos movemos”, de sons. que induz e outras configurações. dizem eles.

Ípsilon • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • 27 América Latina Revoluções que ainda pulsam Armas e fl ores. Ditaduras e recordações. Duas casas, uma encantada, outra assombrada por Pinochet. A memória dos desaparecidos, a repressão do passado e a do presente – crise, imigração, prisões. A América Latina em oito documentários no Centro Cultural de Belém, até ao fi m do mês. Ana Dias Cordeiro

sistema prisional mexicano nita”, de Juan Manuel Sepúlveda, graçãoe “Presunto ilegal Culpable”, e do de Roberto Hernández “La Frontera Infi as catástrofes da emi Cinema ith, retratam e Geoff rey Sm México

Se uma história de vida se confunde vais de documentário –, “Calle Santa operárias de classes nascidas da crise com a história de uma revolução – ou Fé” desenterra a palavra “revolução”, económica. “Uma históriahi ó i de um país –, então a história do Chi- devolve-lhe um significado real, con- le pode ser a de Carmen Castillo. Não creto. E confirma uma notória ten- Filhos das ditaduras é universal quando é caso único e, também por isso, o dência do documentário latino-ame- A outra tendência visível no novo ci- trata a fundo seu filme “Calle Santa Fé” (2007), que ricano, ao assumir-se como um filme nema argentino, continua Charlotte é apresentado hoje no Centro Cultural contra o esquecimento. Gleghorn, é o olhar de uma nova ge- problemas de vida, de Belém (CCB), Lisboa, no segundo Há esse lado universal nos docu- ração – os filhos de desaparecidos da de quatro fins-de-semana dedicados mentários que integram este ciclo. ditadura – que tenta pensar diferentes de morte, de amor e ao documentário da América Latina Universal no sentido que Carmen Cas- “formas de representar” as experiên- pelo Festival Fora de Si, “é para toda tillo dá à palavra: “Uma história é uni- cias traumáticas do passado. É um de combate. Quando a gente”. versal quando trata a fundo proble- gesto que também vemos nos filmes vamos para ela com O que verdadeiramente quer dizer mas de vida, de morte, de amor e de do Chile: a recusa de apagar o passado a cineasta chilena ao Ípsilon, a partir combate. Quando vamos para ela com atravessa, além de “Calle Santa Fé”, o máximo de verdade do Sul de França, país que a acolheu o máximo de verdade possível, somos também “La Quemadura”, o filme em como exilada política há mais de 30 capazes de atingir uma história uni- que René Ballesteros tenta traçar, com possível” cionou retratam histórias de vida e de anos, é que o filme encerra uma ques- versal.” a irmã, o percurso da mãe desapare- pessoas excepcionais ou em situação- tão de vida ou morte. Ou antes de Os argentinos “Corazón de Fábrica” cida (“La Quemadura” passa domin- Carmen Castillo limite. Por quase todos eles passa esse sentido da vida, de uma luta. A histó- (2008), de Ernesto Ardito e Virna Mo- go, dia 8). espírito revolucionário. Em “La Fron- ria dela “pode acontecer em qualquer lina, e “Las Mujeres de Brukman” Cada um desses filmes parece res- tera Infinita” (15 de Agosto), o mexi- país”, diz, “quando se sofre uma di- (2007) de Isaac Isitan, já apresentados ponder a uma necessidade de recu- cano Juan Manuel Sepúlveda acom- tadura”. “Calle Santa Fé”, que conta no passado fim-de-semana, retratam perar o tempo, exorcizar a perda, panha a perigosa viagem dos jovens essa história, coloca “uma questão como os trabalhadores, em risco de verbalizar o exílio. Em “Calle Santa que partem da América Central em universal”: “Valeu a pena lutar, ape- despedimento perante o fecho imi- Fé”, cada história pessoal de exílio é busca de uma vida melhor, para serem sar de termos sido vencidos?” nente de uma fábrica, no pico da cri- única e, ao mesmo tempo, colectiva, apanhados no México e expulsos, an- Entre os vencidos (esmagados pela se económica e dos protestos sociais diz a protagonista e realizadora. Em tes de chegarem ao muro que os se- ditadura de Pinochet) de que fala Cas- na Argentina dos anos 90, tomam o “La Quemadura”, o exílio é tratado para dos EUA. tillo estão grupos revolucionários co- rumo dos acontecimentos. Ambos como o desaparecimento de uma par- Por ano, será meio milhão de pes- mo o marxista-leninista MIR (Movi- foram premiados – o primeiro foi o te do corpo. soas a tentar esse salto, de comboio miento de Izquierda Revolucionaria) Melhor Documentário (2009) em fes- Em contraste com Carmen Castillo, ou a pé para escapar à repressão das de que era líder o seu companheiro tivais no México, o segundo recebeu que viveu como adulta a ditadura e a autoridades. Muitos são rapazes com de vida e de luta, Miguel Enríquez, o Prémio Investigações DocLisboa revolução, Ballesteros faz parte de menos de 18 anos, quase crianças, executado na noite de 5 de Outubro 2008. uma nova geração que viveu essas ex- que querem voltar para casa – “mas de 1974. O filme é um regresso de Cas- Tanto “Corazón de Fábrica” como periências em segundo grau, e que, como?” – e, ao mesmo tempo, seguir tillo à casa onde vivia uma vida feliz “Las Mujeres de Brukman” são “cine através do cinema, questiona as ra- em frente. Nunca se dão por vencidos. antes do ataque dos elementos da DI- piquetero”, explica Charlotte Gle- zões (das perdas dos pais e das suas Também há mulheres e homens mais NA, a polícia secreta pinochetista, ghorn, doutorada em Cinema Latino- próprias perdas). “No caso argentino, velhos. Se mais uma vez forem presos nessa noite em que também ela, então Americano e investigadora na Royal esse conceito de geração é muito for- pelos serviços da imigração, dizem grávida, ficou ferida, vindo a perder Holloway, da Universidade de Lon- te porque há muitos desaparecidos da de olho focado na câmara, mais uma o bebé mais tarde. dres. “É um cinema de raízes políti- ditadura e a nova geração tem o sen- vez tentarão essa “viagem que nunca Como outros filmes da Argentina, cas, muito directo, com filmagens nas timento colectivo de ser uma geração termina”. O mais velho ganhou expe- do México e do Brasil – e entre eles os ruas”, diz ao Ípsilon. de órfãos”, frisa Charlotte Gleghorn. riência e uma convicção, que usa co- que serão também mostrados, até ao Ambos confirmam uma das tendên- mo uma arma: “Nunca ninguém con- fim do mês, neste CCB Fora de Si, ven- cias do cinema argentino da última Fuga e detenção seguirá parar totalmente a imigração cedores de vários prémios em festi- década, que desvenda as novas lutas Os documentários que o CCB selec- ilegal”. “Por que não se preocupam

28 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon ingo, dia 8 hile en Castillo, passa C ), de Carm ené Ballesteros, passa dom “Calle Santa Fé”adura”, (na foto de R hoje, “La Quem

é importante porque, conta a realiza- dos, e sobreviveu porque um vizinho dora, pouco existe no Chile que recor- chamou uma ambulância. Mas isso só de e homenageie desaparecidos, re- fica a saber quando regressa à sua rua, volucionários e todos os anónimos a calle Santa Fé, e reencontra Manuel, que, nos bairros populares ou nas al- para ela “o verdadeiro herói no filme”, deias indígenas, contribuíram para a por ter tido a coragem de a fazer che- re luta. E para o filme. Todos eles, e tam- gar ao hospital. ado, “Ent o reform bém muitas mulheres, mães e irmãs Manuel reconstitui cada minuto mordom randiru s de um os em Ca de desaparecidos, foram convidados dessa noite e Carmen fica a saber que, sil atravé rs” detid ra o Bra is “rappe s, olha pa és de do para a estreia. E essa noite transfor- num primeiro momento, Miguel En- ira Salle ê-o atrav ão More maqui, v mou-se num “enorme reconhecimen- ríquez volta para trás. Se tivesse fugi- go”, de Jo na Burla “Santia , de Lucia to dos mortos e dos vivos”. do, talvez tivesse sobrevivido – é o que Sombra” a Luz e a l Já no fim do seu mandato, a Presi- parece dizer Carmen em silêncio. “Ele Brasi dente Michelle Bachelet (2006-2010) não a abandonou”, insiste Manuel. inaugurou o Museu da Memória, onde Mas depois foi apanhado e executa- os Estados Unidos emm versover sistema prisional bra- sil mas noutro registo, é uma das são lembrados os crimes cometidos do. prender os verdadeiros ter-er- sileiro,silei formam a dupla de obras do economista de formação durante a ditadura, reconhece Car- roristas, como Bin Laden,en, e rap 5509-E0 (o nome da cela que João Moreira Salles, tardiamente che- men Castillo. Antes disso, já alguns “A heróica viúva” deixar os inocentes emm paz?paz?”,” partilham)partilham) e conhecem a actriz So- gado ao documentário mas já confir- torcionários tinham sido presos, em- Graças a uma campanha popular pa- questiona indignado. phia Bisilliat, que renunciou a uma mado como uma referência do géne- bora estejam em prisões douradas. ra a libertação da “heróica viúva”, Todos os anos, também no México, carreira para levar o teatro aos presos, ro no Brasil. O filme (29 de Agosto) Porém, os corpos dos mortos conti- como ficou conhecida, o regime de jovens inocentes que podiam ser “o com o projecto “Talentos Aprisiona- conta a história do mordomo argen- nuam desaparecidos e não há nomes Pinochet não a prendeu, forçou-a ao futuro do México” são atirados para dos”. Desse encontro nasce uma his- tino da casa de Gávea, onde cresceu nem praças com o nome de Salvador exílio. França. Nas ruas de Paris, Car- a prisão. É o que mostra “Presunto tória de amor e a luta da actriz para o realizador, nascido na ilustre família Allende, como em Paris. “O reconhe- men leva tempo a reencontrar-se. De- Culpable” (2009) (“Presumível Cul- que o primeiro disco de Dexter e Afro- de banqueiros Moreira Salles. Santia- cimento da resistência, dos que se pois demora a reconciliar-se com o pado”), de Roberto Hernández e Ge- X seja editado e para que a dupla pos- go era “o senhor dos salões”, a pessoa opuseram com armas à ditadura, não seu país. Chega a pensar que isso nun- offrey Smith. O filme, que passa dia sa dar o seu primeiro concerto fora que lhes dava vida nos dias de grandes existe”, nota. ca acontecerá. Acontece por via deste 13, é um retrato impiedoso de um sis- da prisão. jantares na luxuosa mansão. O pai, A questão repete-se. Valeu a pena? filme, graças a ele, e a pessoas como tema judicial mais do que imperfeito, O filme recebeu o Prémio Ibero- banqueiro e depois embaixador, re- Quando regressa à casa onde sofreu Manuel e outros vizinhos, os médicos com recorrentes enganos judiciários, Americano de Guadalajara (no Méxi- cebia distintíssimas figuras como os o ataque dos agentes da DINA, Car- e enfermeiros que a salvaram. Pesso- tema recorrente também na cinema- co), em 2010, e foi o Melhor Documen- Rockefellers e Cristina Onassis, e vá- men parece pronta a responder “não”. as que despertaram nela a vontade de tografia recente do Brasil e de que é tário eleito pelo público e Menção rios chefes de Estado da América La- O seu olhar é de quem perdeu tudo. fazer este documentário. exemplo “Entre a Luz e a Sombra”, Especial do Júri no 17º Festival de Ci- tina. No filme com o seu nome, San- “A felicidade” das coisas simples da Na procura de um sentido, apesar de Luciana Burlamaqui (27 de Agos- nemas e Culturas da América Latina tiago descreve “os arranjos de flores” vida, como o amor por um homem, o do luto, Carmen manda a filha ainda to). São documentários que trazem à de Biarritz, em 2008, além de ter me- e “a alegria” dos dias de festa, nesses filho (deste) que transportava ainda pequena para Cuba, onde esta cresce luz “a ilegitimidade de certos aspectos recido um acolhimento entusiástico tempos em que “a vida era outra coi- no ventre e que viria a perder mais em segurança, e dedica-se à luta. Só da justiça”, sintetiza a especialista da crítica. O Doc Blogue do jornal “O sa”. tarde, a esperança e o riso, uma ideia isso lhe traz paz de espírito. “Não po- Charlotte Gleghorn. Globo” comentou que o olhar da rea- de família (a filha dela, Camila, e a filha dia deixar que Miguel e os outros ti- lizadora “vai além de quase tudo o que Aos vivos, aos mortos dele, da mesma idade, sob o mesmo vessem morrido para nada”, confessa Dedicação e rap já se fez em matéria de crise social “Calle Santa Fé” (que teve o apoio fi- tecto, como duas verdadeiras irmãs), no filme. Além disso, a luta fazia todo No filme de Burlamaqui, Dexter e brasileira”. “Sete anos a fazer um filme nanceiro do escritor José Saramago e os ideais de uma revolução, da luta o sentido, mesmo se “o inimigo era Afro-X vêm do mesmo bairro da pe- e a sensação de séculos de violência da mulher, Pilar del Rio) estreou em pela justiça social. mais forte”, diz ao Ípsilon. Por isso, à riferia de São Paulo e acabam por ir finalmente compreendidos”, escreveu 2007 “na maior sala de Santiago, a Nessa noite, quando a casa foi as- pergunta “valeu a pena?”, diz Carmen parar à mesma prisão, Carandirú. o “Jornal da Tarde”. mais central e mais bela” da capital, saltada com granadas, Carmen ficou Castillo, a resposta só pode ser Nessa cadeia, que simboliza o contro- “Santiago” (2007), também do Bra- recorda Carmen Castillo. O pormenor gravemente ferida, perdeu os senti- “sim”.

Ípsilon • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • 29 O nova-iorquino Roman Paska é uma gar onde ficam,, como são levadas da “Um actor, no fim autoridade no que respeita às mario- sua casa para os palcos... netas. Foi director do Instituto Inter- Ao longo dos anos tem insistido da representação, nacional da Marioneta, em Charlevil- que a técnica, as “habilidades” le-Mézières, França, e tem percorrido dos marionetistas, não são o vai para casa, sob os mais prestigiados festivais de teatro mais importante... do mundo. Em Portugal esteve por Sim, é verdade. Há muitas peças que o seu próprio nome. cinco vezes: em 1990, na Bienal de se sustentam na técnica ou na tecno- Marionetas de Évora (“Ucelli, as Dro- logia da própria marioneta. E há uma A marioneta, por sua gas do Amor”), em 1993, 1994 e 1998 tradição secular de cabaré de mario- vez, não existe se não no Festival Internacional de Marione- netas, ou de feira, que coloca o foco tas do Porto (“O Fim do Mundo”, “Mo- no virtuosismo do marionetista, que para aquela by Dick in Porto” e “Dieu! God Mother eu acho um embuste. Sim, é verdade Radio”, respectivamente), e já este que há uma primazia da técnica, mas personagem, não tem ano no Festival Internacional de Ma- eu não acredito numa marioneta ao rionetas e Formas Animadas, em Lis- serviço da técnica, nem numa mario- uma outra vida. boa (“Schoolboy Play”). As suas peças neta ultrapassada pelos seus meca- – nos últimos anos divididas nos ciclos nismos artificiais. Não uso marionetas Ou, se a tiver, talvez “Theatre for Birds” e “Dead Puppet” por estar interessado no seu potencial seja a misteriosa vida – caracterizam-se por uma forte di- técnico. Acredito, realmente, que se- mensão visual, com a convergência ja uma forma de arte, tal como a pin- de um objecto” de diferentes meios a resultar em es- tura, ou a dança ou qualquer outra pectáculos que resgatam a marioneta disciplina. Uso as marionetas porque do servilismo e da ritualização que me permitem, através do seu poten- são contrarios ao seu potencial dra- cial expressivo, falar de um tema que matúrgico. Amplamente devedor dos me interesse, e para o qual não con- ensinamentos recolhidos nos anos sigo encontrar nenhum outro meio passados no Oriente, Paska foi cons- paralelo. cípio importante. Primeiro porque truindo uma reflexão em torno da É assim que interpreta o seu não há acção sem a presença de in- marioneta que, não rejeitando embo- papel enquanto artista? térprete. E é isso que me perturba ra a sua dimensão sagrada, a ultrapas- Eu acho que, mais do que se nascer quando vejo espectáculos que apli- sa para comunicar. Em conversa com marionetista, se é atraído para este cam mal a técnica. Nunca me consigo o Ípsilon, fala-nos do universo parti- universo porque se encontra aqui esquecer que as marionetas não exis- cular onde a marioneta reside, onde uma forma natural de expressão. Mes- tem sozinhas. Não são autómatos. Não residimos todos. mo que eu quisesse fazer uma outra se pode dizer “a marioneta faz isto, o O discurso comum sobre coisa com as marionetas, por exem- actor faz aquilo”, porque a marione- marionetas tende a enfatizar plo uma instalação, acho que seria ta não existe sem o marionetista e um lado ritualista que, no seu sempre trazido de volta a esta lingua- este tem de ser um actor, um bailari- entender, é contraproducente gem que, para mim, é como a poesia. no, um performer. É através do que para uma reflexão mais séria Gosto de pensar nas peças como uma ele faz com a marioneta que ela surge sobre a importância desta forma de teatro poético que tem o seu em todo o seu esplendor. No teatro disciplina... próprio vocabulário, e parte disso é, de marionetas de tradição asiática, A utilização do termo ritual não é in- de certa forma, intrínseco às mario- por exemplo, o actor está muito mais correcta, mas não deve servir para netas. Cada linguagem tem as suas visível e perto da marioneta, seja na caricaturar o que se faz. É verdade regras, e até mesmo as suas limita- ópera, nas máscaras do Bali, ou no que eu prefiro pensar nas marionetas ções... Enfim, no caso das marionetas, teatro kabuki. Isso reforça a ideia de como objectos sagrados, e nós tende- elas não andam sozinhas... [risos] que as marionetas não expressam na- mos a tratá-las como objectos sagra- Quando diz que utiliza as da, nem sequer estados psicológicos, dos, uma vez que são construídas com marionetas porque com sozinhas. Embora haja peças que eu muito cuidado e são extremamente elas pode dizer o que não preferiria que fossem feitas por ma- frágeis. Elas impõem as suas próprias consegue através de outros rionetas do que por actores em regis- regras. É como se estivéssemos a tra- meios, nomeadamente com to naturalista... balhar com cascas de ovo. É preciso actores, está a referir-se ao Isso muda quando as marionetas um treino particular para se lidar com poder metafórico subjacente à passam a representar figuras elas. A analogia mais comum é que marioneta? concretas? Em “Schoolboy elas são como os instrumentos musi- Sou menos ambicioso quanto à ideia Play”, o espectáculo que trouxe cais. de metáfora, porque gosto de acredi- a Lisboa, em Maio, as marionetas Porque cada uma produz um tar que a marioneta não está a repre- representavam Hitler e som diferente? sentar outra coisa que não ela mesma. Wittgenstein, figuras com uma Também por isso, mas porque é pre- Nós sabemos que um actor, no fim da biografia. ciso, por exemplo, ter um cuidado representação, vai para casa, sob o Belíssima pergunta. O ponto de par- extremo quando se toca uma passa- seu próprio nome. A personagem, tida de “Schoolboy Play” é um even- gem muito dramática num violino, de nessa altura, torna-se completamen- tual encontro histórico entre duas modo a que não se rompa uma corda. te abstracta e é activada, por exem- figuras icónicas do século XX. Quan- Esse cuidado com que se manipulam plo, somente quando veste as roupas do estávamos a criar as marionetas, as marionetas, essa precisão, obriga que lhe pertencem. A marioneta, por tivemos o cuidado de lhes dar outros a que seja tudo muito coreografado. sua vez, pode representar uma per- nomes, como “Hitch” e “Witch”, por- Isto não varia muito de país para país, sonagem, mas é também um objecto que era desconfortável estarmos a independentemente da técnica usa- com um universo próprio. Ela não dizer que essas duas figuras históricas da. Há países com tradições particu- existe se não para aquela persona- eram marionetas. Criámos, por isso, lares, como é o caso da Indonésia, gem, não tem uma outra vida. Ou, se uma distancia em relação à História, onde as marionetas são, de facto, tra- a tiver, talvez seja a misteriosa vida da qual a peça parte, sem que se feche tadas como objectos sagrados e, ale- de um objecto. – e com ela o poder simbólico das ma- Roman Paska não nasceu gadamente, encarnam deuses. Há As marionetas são rionetas – nela. marionetista: foi atraído imensa superstição no que respeita à complementares dos actores na Porque o impacto dramatúrgico para esse universo, onde relação entre a marioneta e o mani- pesquisa teatral? podia ser distorcido se a encontrou a sua forma pulador. Preocupamo-nos com o lu- Sim, é bem verdade. E esse é um prin- identificação fosse feita sem natural de expressão Roman Paska e a vida interior das marionetas É uma das fi guras mais carismáticas do teatro de marionetas, que conhece em todos os seus estados, da rigorosa tradição oriental ao cabaré. Não andam sozinhas, admite, mas são criaturas prodigiosas, talvez até sobre-humanas. Tiago Bartolomeu Costa

30 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon A Cinderela do Teatro de Marionetas do Porto encontra os anões da Branca de Neve e o lobo Elas andam aí do Capuchinho Vermelho O Verão é das marionetas: nas próximas semanas, elas vão andar por todo o país, de Castro Daire a Lisboa, e em Setembro há festival no Porto.

Os 17 anos da Tarumba numa exposição em Lisboa

filtragem? Bom, as peças devem sempre ser auto-suficientes. Passa-se o mesmo quando vemos Shakespeare represen- tado hoje. Aquelas personagens exis- tem autonomamente e esperamos que o mundo que constroem seja ba- seado em premissas estimulantes e até mesmo provocadoras. No caso de “Schoolboy Play”, o único aspecto histórico que utilizamos é absoluta- mente académico: a hipótese de um encontro entre Hitler e Wittgenstein

num colégio austríaco quando teriam ROCHA DANIEL 14 anos. Claro que, pelo que sabemos São várias as propostas de Agosto e Setembro das suas vidas, esse encontro, a ter teatro de marionetas que, nas acontecido, terá sido explosivo. Mas próximas semanas, vão chegar são dois excelentes nenhuma das personagens é a prota- a diferentes locais do país, não gonista da história. A protagonista é apenas alargando a própria meses para uma marioneta à qual damos o nome defi nição de marioneta como de Everyboy e a peça é, de facto, so- provando a transversalidade radiografar o estado bre a interacção dessa terceira perso- dramatúrgica e a inventividade nagem com as outras duas figuras. O expressiva dos mais actual do teatro convite que fazemos é para uma iden- importantes criadores nacionais de marionetas tificação no sentido clássico do termo, da área. Agosto e Setembro são, através do drama dessa terceira per- por isso, dois excelentes meses em Portugal sonagem. para radiografar o estado actual Será por isso que, nos seus da disciplina no nosso país. espectáculos, as marionetas não Em Lisboa, continua aberta são o elemento principal? no Museu da Marioneta, até Sim, mesmo que as marionetas este- 10 de Outubro, uma exposição jam no centro do palco. Elas são a comemorativa dos 17 anos paisagem da peça. O propósito é criar da companhia A Tarumba, um diálogo, ou uma interacção, entre responsável pelo Festival as marionetas e o seu subconsciente. Internacional de Marionetas Quando elas estão em cena, estão vi- de Lisboa. Oportunidade para síveis, mas aquilo de que falam é in- revisitar as marionetas de peças visível. E é nesse sentido, para regres- criadas entre 1994 e 2010 (“Dr. sarmos à ideia de religioso e sagrado, Faustus”, de Marlowe, “Amor que é importante que percebamos de Don Perlimpimpim com que o que elas fazem é verbalizar es- Belisa em seu Jardim”, de García se invisível. Há algo de ritualista nisso, Lorca, “A Tempestade”, de admito. Shakespeare, “Ascensão e queda Quando vemos um manipulador a da Cidade de Mahagonny”, de trabalhar com um objecto, há algo Brecht) e ainda os objectos que nesse acto que gera um fascínio. E is- fi zeram “Mironescópio” e as so passa para o público. Acredito que sombras de “O Guarda da Noite”, a marioneta desperta, ou estimula, no ambas criações originais do espectador um conjunto de emoções grupo. Trânsito”, criação de Patrick que não são nem transmissíveis nem Já este fi m-de-semana, Murys que junta marionetas, definíveis. É algo que existe num pla- também em Lisboa, chega objectos e teatro físico para uma no psicológico, como quando vemos ao Centro Cultural de Belém refl exão sobre o exílio, a solidão Hamlet a segurar na caveira, ou a falar (CCB) “King Pai” (dias 7 e 8), e a viagem. para o espelho. Vêem-se outros aspec- espectáculo para crianças e E dia 27, de novo no CCB, o tos da natureza humana. adultos da Companhia Caótica Teatro de Ferro apresenta a sua dirigida por Caroline Bergeron “Ópera dos 5€” que, a partir de “Schoolboy Play”, que Paska trouxe em e João Calixto. Um “monstro de um libreto de Regina Guimarães, Maio a Lisboa, é o encontro imaginário ternura” incompreendido que combina a intervenção de Hitler com Wittgenstein espera por espectadores que social com festa e bandas de queiram ser abraçados. garagem, num manifesto sobre Dia 15 é a vez de o Teatro de a imigração e o nomadismo na Marionetas do Porto, uma das Europa. mais respeitadas companhias O Verão não termina sem nacionais, levar ao Festival que se abram, a partir de 17 de Altitudes, em Campo Benfeito, Setembro e até 26, as portas concelho de Castro Daire, a ao Festival Internacional de sua “reescrita anacrónica” de Marionetas do Porto, que,

Teatro “Cinderela”, em que os sete depois do desaparecimento anões são chamados a salvá-la há um ano de Isabel Alves de uma bruxa-má que não gosta Costa, impulsionadora desde a de fi nais felizes e de um lobo primeira hora das marionetas mau que patrulha as estradas. em Portugal, é agora dirigido A 20, a Circolando mostra por Igor Gandra, do Teatro de na Guarda “Paisagens em Ferro. T.B.C

Ípsilon • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • 31 Há duas semanas, quando o Ípsilon tal onde as personagens se ampliam visitou Francisco Camacho, o coreó- e não tanto de uma paisagem onde grafo ainda não tinha nome para a elas possam andar”. DANIEL ROCHA DANIEL nova criação que vai antestrear, do- As personagens de Camacho mar- mingo, no Citemor, em Montemor-o- caram sempre territórios, criando Velho (anteontem, a quatro dias da espaços, mesmo que artificiais, onde antestreia, também não), mas já tinha tanto se protegiam como se expu- o que dizer acerca dela. “No meu tra- nham. Ainda assim, chamarmos-lhe balho, procurei sempre perceber que personagens é uma distorção. O co- imagens é que poderiam ter um im- reógrafo diz que “personagens” nun- pacto fora do palco, e como é que a ca o foram por completo. Foram sem- recepção dessas imagens podia alte- pre sombras, ideias ou até mesmo fios Um corpo rar a nossa percepção do mundo e as de histórias. Chama-lhes “figuras on- nossas relações”, começa. O nome de se podem projectar ideias, mas tem tempo: a versão final da peça se- não figuras fechadas no sentido em rá vista apenas a 3 e 4 de Novembro que se lhes pode atribuir um perfil no Centro Cultural de Belém, no âm- psicológico ou uma biografia”. Não à procura bito do Festival Temps d’Images. sendo figuras que recusem, ignorem O corpo proposto pelo coreógrafo, ou se escusem ao corpo que as está a nascido em Lisboa em 1967, nunca apresentar, Camacho trabalhou sem- Francisco Camacho está de regresso operou numa plataforma de distan- pre a partir do que os corpos propu- ciação em relação ao simbólico. Re- nham. Foi assim com Leonor Keil em com uma peça que ainda não tem nome mas já tem conhecendo o potencial metafórico, “Primeiro nome: Le” (1994), e Carlo- e também retórico, da imagem expos- ta Lagido, sua musa, dupla ou, tam- um programa: voltar a olhar para o corpo, como ta em palco, os seus espectáculos, se bém ela, sombra, em várias criações, não trabalham no sentido de uma ou até nas peças de grupo como se fosse a primeira vez. Antestreia este domingo, mensagem, também nunca se escu- “Gust” (1997) e “Evil Live/Live Evil” saram a uma reflexão sobre o destino (2005), onde o corpo estava já dor- no Citemor. Tiago Bartolomeu Costa daquelas imagens. Foram – mesmo mente e desaparecia numa massa quando trabalhado por outros, como que, consciente do perigo do anoni- no caso de “Blessed” (2006), de Meg mato, tentava, ainda assim, perceber Stuart –, corpos visceralmente cons- como podia deixar uma marca. A ideia de um corpo imperfeito, que se constrói em cena, cientes da sua condição de objectos reporta à história pessoal de Camacho, que foi recusado de ficção, e portanto na dependência Contra o que é perfeito pelo entretanto extinto Ballet Gulbenkian do espectador. A ideia de um corpo que se constrói Ao longo do tempo, as peças de em cena, nessa exposição, é um as- Francisco Camacho foram reflectindo pecto que reporta à própria história sobre o impacto das imagens produ- pessoal de Camacho, ele que foi re- zidas quer por um corpo presente em cusado no agora extinto Ballet Gul- cena, quer por um corpo virtual. Os benkian por não ter o perfil estereo- quatro corpos desta nova viagem – tipado de bailarino que a companhia Camacho, Rafael Alvarez, Tiago Ca- procurava. dete e Mariana Tengner Barros –, que É a partir desse corpo humano re- as imagens do cineasta Bruno Almei- al, verdadeiro e, de certa forma, im- da prolongam, vivem numa zona ári- perfeito que o coreógrafo vai cons- da e limpa, sem pontos de identifica- truir um percurso feito de peças que, ção. “Exploro esse impacto não ape- numa primeira fase, se inscrevem nu- nas através da configuração do gesto ma necessidade de territorialização ou do corpo, mas também através de do próprio corpo numa geografia na- imagens projectadas”, diz-nos Cama- cional e disciplinar, como “O rei no cho, explicando que começaram por Exílio” (1991), “Nossa Senhora das fixar-se nos olhos de cada um, para Flores” (1992), “Primeiro Nome: Le” depois abrirem para outras ideias, ou “Dom São Sebastião” (1996), con- menos próximas daqueles corpos, e temporâneas da afirmação da própria mais cúmplices de um “espaço men- dança contemporânea portuguesa. Camacho romperá com o corpo mar- tirizado da História nacional, mesmo se, tal como Prometeu, as vísceras o voltem a tolher e, a cada dia, uma ave as coma dolentemente. Numa segunda fase, de maior po- tencial mediático e tardiamente pop, Camacho procurará ampliar essas figuras quase para a caricatura. As personagens criadas em “Superman” (2002), “My name is Wilde... Oscar Wilde” (2001) ou “Hitch” (2003) per- Dança seguem já um outro objectivo, com o humor a ganhar vantagem sobre uma reflexão pessimista. Contudo, o humor que o coreógra- fo imprimiu a estas peças – entretan- to deixado de lado –, nunca pôde ser entendido se não como um comen- tário ao próprio assunto tratado. Era um humor derrisório, distante, e mui- to pouco meigo. Um humor especu- lativo, diríamos. “Um humor que “No meu trabalho, observa”, contrapõe. “O tempo faz procurei sempre toda a diferença”, diz agora. E o hu- mor regressa para olhar para corpos perceber que imagens que partem das memórias reais dos corpos que os interpretam e que bus- é que poderiam ter cam na acumulação de sentidos uma ordem, um comando, uma “lógica de um impacto fora funcionamento”. Corpos que, no es- sencial, “obedecem apenas a si pró- do palco, e como é prios”. que a recepção dessas As hierarquias desaparecem, mas a ética e a moral são questões que imagens podia alterar continuam presentes, como desde sempre, porque, afinal, o corpo pro- a nossa percepção posto por Francisco Camacho nunca quis ser outra coisa a não ser um cor- do mundo e as nossas po em busca de uma definição.

relações” Ver agenda de espectáculos pág. 43

32 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon CLAUDIO PAPI/ REUTERS PAPI/ CLAUDIO

Mike Leigh Leigholândia, Michael Chabon Ellen Allien Cabeça de Evan Parker O incrível anos 90, em DVDDVD.. Pág.Pág. 47 AventuraAventura nnoo séséculoculo XX.. Pág.Pág. 4343 cacartazrtaz emem VianaViana do Castelo.Castelo. Pág.Pág. 37 sasaxofonexofone vvemem à GGulbenkian.ulbenkian. Pág.Pág. 37

R.E.M. Quando eles eram tremendos – reedição de “Murmur”, “Reckoning” e “Fables of the Reconstruction”. Pág. 34

Muxima Tiago Bettencourt DJ até às 03H00 12-ago & Mantha m/18 19-ago

Programa sujeito a alterações

Reservas: www.casino-estoril.pt [email protected] | +351 919 938 114 aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

Pop podiam ter duas ou três faixas a Impressionavam os truques, como o ainda mais viral. Usando menos, mas o que vinha antes era uso da polifonia no refrão de “Moral “Harborcoat” como exemplo, nota- quase sempre deslumbrante, em Kiosk” conjugada com os timbalões. se de imediato que as mudanças são Era uma vez particular o início, quando este E impressionava a voz de Michael menos bruscas, o baixo menos quarteto inventou o indie-rock Stipe, com um distanciamento sem proeminente – ou seja, americano (na altura chamavam-lhe ironias, um véu misterioso a aproximavam-se mais do formato uma banda college rock), ou, pelo menos, encobrir a “gravitas” de cada nota, a canção tradicional, mas estavam legitimou-o enquanto género camuflar emoções. Quer dizer, com a pontaria mais afinada. O a sério autónomo do pós-punk. A primeira alguém se lembra de um disco da ludismo das guitarras do refrão de obra-prima chega ao primeiro disco, época que comece com uma “7 chinese brothers” é inapelável, “Murmur”, reeditado em 2009 em sequência como “Radio Free “Southern central rain (I’m Sorry)” Antes de serem edição dupla, com disco extra ao Europe”, “Pilgrimage”, “Laughing” tem um apelo clássico que ecoa o tremendamente vivo, e agora distribuído em e “Talk about the passion” (ainda melhor dos Byrds (notória influência aborrecidos, os R.E.M. Portugal, tal como “Reckoning” inebriante até ao mais retorcido nó em todo o disco). E em “Pretty (reeditado em 2009) e “Fables of the nos intestinos)? No disco 2, ao vivo, persuasion” fica clara a capacidade foram tremendos. Reconstruction” (reeditado em nota-se uma banda ainda propensa a de Stipe de expandir a voz e encher João Bonifácio 2010). “Murmur” (1983) era um erros, mas a debitar energia como uma canção. Segunda obra-prima, disco cheio de ecos, percussões um moinho de água em dia de com uma diferença clara de som R.E.M. estranhas, e o assobio de um vento cheias. E há a habitual versão (coisa face à estreia, como é perceptível em nocturno em fundo. Era um disco de que eles apreciavam muito no início, “Time after time”, a canção de Murmur guitarras, mas não um disco de ao ponto de haver por aí um “Reckoning” (1984) que mais lembra mmmmm demonstração de talento à guitarra. belíssimo disco pirata que recolhe as “Murmur”. Discos Impressionava a facilidade com que “covers” que foram fazendo), neste Quando a “Fables of the esta desenhava uma simples figura caso de “There she goes again”, dos Reconstruction” (1985), tem um e, mais do que tudo, como o baixo Velvet. simples problema: apesar da Reckoning interagia com ela, colocando notas Com “Murmur” começava a surgir tentativa de voltar a soar tão erradas, criando ritmos a brigada da “jangley” pop, pop de “estranho” quanto “Murmur”, mmmmm cambaleantes. Impressionavam os guitarras gingonas, como a dos Rain faltam ganchos e inocência, o que saltos bruscos nas canções, não só Parade ou dos Miracle Legion do não quer dizer que não haja no que toca ao tempo, mas também grande Mike Mulcahy. grandes canções (basta ouvir na estrutura, com se cada mudança “Reckoning” afina o ginganço: “Good advices”). E mais correspondesse a uma brusca logo à primeira canção, haveria, porque no ano perturbação de humor. “Harborcoat”, os R.E.M. seguinte, com “Life’s Rich Fables of the Impressionavam os arrancavam uma tremenda e Pageant”, o quarteto de Reconstruction refrões, que orelhuda pérola. A típica Athens, Geórgia, voltaria aos passavam das guitarra ritmo saltitante de discos perfeitos. mmmmn sombras para uma “Murmur” estava mais espécie de precisa, a típica figura exaltação com melódica de guitarra tremenda facilidade.

IRS; distri. EMI Antes de 2001, ano em que se tornaram num perigoso soporífero burguês capaz de provocar impotência e frigidez, os R.E.M. tinham uma folha de serviço quase intacta. Certo, metade de “Monster” (1994) é uma falhada tentativa de mostrar que ainda sabiam rockar, “New Adventures In Hi-Fi” (1996) e o sub- valorizado “Up” (1998)

O quarteto que inventou o indie-rock americano (na altura chamavam-lhe college rock)

34 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon O Vimeo - plataforma que sabe fazer vídeos tipo YouTube, mas polémicos (ou pelo com menos lixo e mais menos contratar quem PrémiosP “arte” - está a organizar os faz) e os cineastas o seu primeiro David Lynch, Roman festival de sempre e já Coppola, Doug Pray e anunciou a composição Morgan Spurlock. O do júri (e é bastante festival vai ter lugar impressionante): a 8 e 9 de Outubro em M.I.A., uma rapariga Nova Iorque.

“The Way Out” é o disco de dois Coleccio- músicos que digerem e sintetizam uma pilha de informação, como quem leva a sua colecção de discos nismo para uma ilha deserta e depois começa a tentar arquitectar Os Books mais canções a partir dos mil e um esquizofrénicos do que fragmentos dessas fontes sonoras. nunca, num álbum que digere uma assinalável pilha Uma de informação. Vítor Belanciano interessante

The Books geografi a The Way Out Temporary Residence; distri. musical Popstock mmmmn Uma excelente porta de entrada no chamado kraut Ao quarto álbum, os nova-iorquinos rock. Mário Lopes The Books Vários continuam a fazer Berlin 61/89 – Wall Of Sound Encontramos aqui aqueles que, canções com Le Son Du Maquis; distri. Massala desenvolvimentos na década de 70, cruzaram rock psicadélico diferentes daqueles com que mmmnn com electrónica futurista, como os Neu! estamos familiarizados, movidas apesar de todas as diferenças entre arma sensorial (os óptimos Electric actriz tornada cantora (o que só lhe por instrumentação acústica, O título indica um as planagens electrónicas dos Sandwich) surgem lado a lado com a fica bem), e Tom Smith, vocalista desenvolvimentos digitais e lugar e um arco Harmonia, na década de 70, e a crua sofisticação dos Palaus dos Editors, essa linha de montagem colagens de diálogos. Na aparência temporal que a dança robotizada, qual funk Schaumburg de “Telephon” industrial de negrumes Joy Division dir-se-ia que não mudaram muito dupla compilação industrial, dos Die Krupps, já nos (magnífica representação de (o que é sempre desnecessário). desde o magnífico álbum “Lost And não abrange. Em anos 80, toda esta música parece neurose pós-punk). Aqui, a gélida e O resultado são dez canções em Found”, de 2005. Os elementos são “Berlin 61/89” não atravessada pelo mesmo espírito, espectral Nico canta uma folk que o banjo, o mandolin de Buck e o os mesmos, mas estes acabam por se ouvem apenas bandas berlinenses por uma qualquer marca genética. O assombrada (“Reich der träume”) violino ocasional não passam de ser apresentados de forma mais (alguns, como os suíços Young Gods, título da compilação pretende enquanto Nina Hagen faz da new maquilhagem. A voz de Lightbody, esquizofrénica. Apesar de grande nem alemães são), nem se ouve acentuar isso, apontando a Berlim wave jogo exibicionista. com as quedas em falsete no final parte das canções ter uma estrutura música gravada entre 1961 e 1989 – a do Muro e da Guerra Fria como Começamos com o passado dos versos, com o seu semelhante, com elementos vocais, canção mais antiga foi registada em presença incontornável, como causa transfigurado de “Salomon song”, sentimentalismo de trovador sem orquestrações e microrganismos 1972. Mas a compilação, de qualquer desta música onde o Kurt Weill de terminamos a viagem olhando em trova (ouvir versos como “girl you digitais, existem sempre elementos forma, não é convencional: pretende “Salomon song” é transfigurado em frente (“Future days”, dos Can). Para were beautiful before / but in the sónicos deslocados, garantindo revelar um certo estado de espírito, pesadelo industrial (são os Young os não iniciados à música alemã do cyclone I love you more”, logo a momentos de surpresa. Na maior uma predisposição criativa que Gods), onde o psicadelismo se período, estas 30 canções serão uma abrir o álbum, não é das vezes trata-se de reenquadrar tornou a música popular alemã transforma em ritual negríssimo, óptima revelação. particularmente inspirador), não monólogos de fontes desconhecidas absolutamente distinta das demais. qual blues assombrando esqueletos serve a música que pretende e fazê-los coincidir num novo corpo Aliando as inevitáveis referências fabris (os Can de “Thief”). homenagear. E as canções elas sonoro, misto de “samples” anglo-saxónicas a um interesse pelas “Berlin 61/89”, curiosamente Sem country à vista mesmas, saídas da pena de Gary excêntricos, violinos que impõem vanguardas, e manifestando óbvio organizado pelos franceses da Le Lightbody, não mostram nada de um espaço de calor, marcas de folk desejo pela definição de uma Son Du Maquis, é um fluxo musical Tired Pony novo: sempre aquela melancolia que e electrónicas sem trajecto definido. personalidade, pela inscrição de um (as canções são sequenciadas sem se prolonga, que prenuncia a cada The Place We Ran From Às vezes as canções ganham uma lugar (o seu) na música que criavam, pausas) onde os tempos se V2; distri. Nuevos Medios momento a explosão de pirotecnia qualidade meditativa (“We bought os alemães da kozmische da década misturam. Não interessa aos autores que há-de chegar, inevitavelmente. the flood”, “Group autogenics I”), de 70 ou do pós-punk convulsivo da a evolução cronológica, antes a mmnnn Não há country à vista, apenas os outras revelam-se mais década seguinte constituíram um revelação de uma personalidade instrumentos que normalmente imprevisíveis ritmicamente (“I am centro criativo fervilhante. musical. Dividido em “West Side” e Os Tired Pony são ouvimos no género, aplicados à who i am”, “A cold freezin’ night”). E, apesar da passagem do tempo, “East Side” – há um certo pendor a super banda que fórmula estafada dos Snow Patrol. escapista, psicadélico no primeiro; Gary Lightbody, “The Place We Ran From” é algo de mais neurótico e virulento vocalista dos realmente um capricho e Gary no segundo –, “Berlin 61/89” acaba Snow Patrol, Lightbody estará feliz da vida. Haja por ser, acima de tudo, uma montou para alguém. M.L. excelente porta de entrada no saciar um chamado kraut rock. Um “melting- capricho. O líder da banda que pot” de arrojo musical e desejo de segue na peugada dos Coldplay intervenção. Encontramos aqueles no capítulo pop épico- que, na década de 70, cruzaram rock grandiloquente achava psicadélico com electrónica futurista que tinha um disco (os Can e os Neu!, os Harmonia e os country dentro dele e, Cluster), e encontramos verdadeiros para o concretizar, terroristas sónicos usando o estúdio reuniu à sua volta um como plataforma para agitação (os conjunto de músicos inevitáveis Einstürzende Neubauten; interessantes como M o humor corrosivo e a música Ward, Peter Buck, dos dilacerante dos Faust; os exercícios R.E.M., ou Richard The Books: um disco de dois músicos que digerem dadaístas dos Die Tödliche Doris). Colburn, baterista dos Belle uma pilha de informação, como quem leva Sonhadores que transformavam & Sebastian. Também Tired Pony: Gary Lightbody a sua colecção de discos para uma ilha deserta ecos de Jimi Hendrix em poderosa trouxe Zooey Deschanel, a com Peter Buck, entre outros

Ípsilon • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • 35 aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente Discos

Roky Erickson mesma forma que há uma ou outra surgem habitualmente ocultadas por canção mais inspirada, mas grosso outros instrumentos ou gravações True Love Cast Out All Evil Chemichal Underground; distri. modo é tudo tão emocionante como menos conseguidas. Popstock uma canção média dos Overkill Numa acústica perfeita, sem River, banda que acompanha demasiado eco e com os mmnnn Erickson neste regresso e cujo líder, instrumentos captados em Will Sheff, assina todos os arranjos – proximidade, este registo coloca-nos Roky Erickson é o que têm a rebeldia de um fato de no centro do universo bem pessoal protótipo de mito comunhão de um puto de dez anos. de Evans e Shah, um mundo feito de do rock: chegou, O que faz pensar que isto não é o um lirismo contido onde a criou um buraco regresso de Erickson à composição: exuberância melódica de Keith negro, sugou a é um empréstimo do que resta da Jarrett encontra a orgânica dos electricidade à sua voz a gente que certamente o graves de Gerry Mulligan, com subtis sua volta e depois admira e quer ajudar. Mas a um evocações de Don Cherry, Archie implodiu. Em três simples discos homem desta cepa, um dos poucos Shepp ou Thelonious Monk, tocados com os 13th Floor Elevators, que de facto foi um pirómano com a pela intensidade expressiva do que Erickson criou, entre 1967 e 1969, guitarra, talvez fosse melhor darem- poderia ser a banda sonora de um um corpo de rock psicadélico capaz lhe dinheiro para cigarros e whisky film-noir. Interpretando de induzir delírios de freira em vez de canções bem feitinhas. composições de Evans, os dois encarcerada na mais profunda ateia. J.B. músicos lançam-se numa sequência Depois, à conta de um simples de diálogos improvisados, marcados charro, foi preso e para não ir de High Places pelo espaço e pela contenção, onde cana aceitou ser “tratado”. No caso, melodias e harmonias bem definidas High Places vs Mankind Erickson foi uma espécie de cobaia e Thrill Jockey; distri. Popstock são subtilmente “perturbadas” por de exemplo usado contra o deboche pequenos micro-tonalismos ou do rock’n’roll – quando saiu do mmnnn passagens abstractas de grande instituto mental estava de tal modo expressividade. Uma boa referência perturbado e doente que acabou a Há dois anos, os para esta música pode encontrar-se viver nas ruas. Não quer dizer que High Places na figura de Charles Ives, um dos não tenha gravado ou tocado ao vivo lançaram um High Places: o sentido de propósito do álbum de estreia esfumou-se grandes compositores norte- pontualmente, mas só agora se pode disco de estreia primeiro álbum, algo como os High saxofone barítono e Neil Shah no americanos do século XX e uma das falar de um regresso “tout court” – e prodigioso, um Places a reciclarem-se para uma piano, possui uma rara qualidade de principais influências de Evans - da mesmo assim temos dúvidas. O tratado de pop plateia mais convencional. Este clareza e transparência que nos faz sua música diz-se possuir “uma disco começa com uma faixa minimal, ao segundo álbum tem, portanto, o “observar” de perto todos os detalhes capacidade inigualável para invocar gravada durante o tratamento mesmo tempo frágil, exótico e mérito de arriscar, ou ser bem mais e subtilezas do sax barítono, os sons e sensações da vida dos psiquiátrico, uma faixa com mau onírico. Fizeram o mais difícil, que é do que um duplo do precedente. instrumento cujas frequências graves americanos.” som, espécie de folk disfuncional criar um som único e encantatório, Mas nem por isso deixa de ser uma religiosa à qual foi adicionado capaz de marcar uma época. Agora o manta de retalhos, parte dos quais posteriormente um arranjo de duo – que trocou Brooklyn por Los melhor seria amadurecerem antes cordas – é uma canção Angeles - enfrenta o problema mais de verem a luz do dia. Não será uma extraordinária, muito frágil e difícil a seguir, que consiste em não completa desilusão, mas o sentido delicada e próxima do universo de repetir a fórmula durante os de propósito do álbum de estreia uns Sparklehorse. A mesma técnica próximos 30 anos. O tema de esfumou-se, sem que se perceba é usada para fechar o disco e no abertura com Mary Pearson num muito bem para onde caminham os meio estão as novas canções, que registo de sereia ondulante sobre o High Places. Luís Maio partem de uma base folk. funk aquático e as melodias- Erickson canta como um velho brinquedo de Rob Barber é bardo sabido (ou um velho acabado avassalador, mas poderia estar no Jazz e bebido, é difícil disco de estreia. distinguir) e há As novidades vêm depois com pianos e aproximações à pista de dança, Leveza e acordeões e flirtagens com o rock progressivo e o uma outra ambientalismo praticado como jogo gravidade guitarra mais de espelhos, à maneira de Harold suja, da Budd. Tudo isso está muito bem, mas pelo meio há um par de baladas Um surpreendente duo de que soam como pouco mais que saxofone barítono e piano, vulgarizações gravado ao vivo numa igreja do da Pensilvânia. Rodrigo Amado

Charles Evans/Neil Shah Live at St Stephens Hot Cup Erickson canta como um velho bardo sabido mmmmn (ou um velho acabado e bebido, é difícil distinguir) Lançado ainda no final do ano passado, este “Live at St Stephens” é um dos registos que me tem acompanhado nos últimos meses. Reunindo dois jovens músicos norte-americanos, Charles Evans no “Observar” de perto todos os detalhes e subtilezas do sax barítono

36 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

VirgemVirgem SutaSut , Nouvelle de 25 a 28 de Agosto Vague, Orelha Negra, naquela vila histórica UB40 e o projecto do Alto Alentejo. Os Festival Amália Hoje são preços dos bilhetes alguns dos nomes que diários oscilam entre constam do cartaz da os cinco e os dez euros; 26ª edição do Festival o passe para os quatro do Crato, que se realiza dias custa 18 euros.

tornou-se rápidamente uma celebridade. Uma cara bonita, um talento instrumental fora do comum para a sua idade, uma energia que a todos contagia e o convite para participar em projectos de grandes nomes como Joe Lovano lançaram- na para a linha da frente do jazz internacional. No próximo domingo, dia 8, Esperanza estará no Porto, nos Jardins do Palácio de Cristal, para um concerto integrado no habitual ciclo de verão Porto Blue Jazz em que se apresentará em trio com dois excelentes instrumentistas, Aguardados com particular o pianista Leo Genovese e o baterista expectativa na Gulbenkian: Evan Parker Francisco Mela, músicos que podem e o Electro-Acoustic Ensemble ser habitualmente ouvidos ao lado de gente como Lovano, George Garzone ou Chris Cheek. Apesar de algumas naturais limitações que se tornaram óbvias em actuações recentes de Spalding, o facto é que a sua música é sinónimo de um jazz aberto, ligado às raízes do soul e do rhythm & blues. Uma festa! R.A.

Pop Jazz proporcionando encontros Moholo, o trompetista Bobby históricos, o festival tem participado Bradford ou o baterista Paal Nilssen- activamente no desenvolvimento da Love. A electrónica Jazz em festa uma vertente criativa no jazz Importante, ainda, o regresso de nacional, crescendo com ela e projectos nacionais, ausentes da toda em afirmando-se como um evento edição do ano passado, e desta vez Jack DeJohnette, John cultural único e obrigatório. Como representados pelos Red Trio de Viana do Surman, Evan Parker e grande destaque desta edição surge, Rodrigo Pinheiro, Hernâni Faustino logo a abrir, o encontro histórico e Gabriel Ferrandini (dia 14, 18h30), Louis Sclavis brilham num entre duas figuras míticas do jazz, o uma formação notável que pratica Castelo programa apontado às saxofonista John Surman e o uma improvisação livre com franjas mais criativas do jazz. baterista Jack DeJohnette (dia 6, múltiplas referências à estética do Ellen Allien e Vitalic a 21h30), duo que surgiu já jazz, e o vibrante Open Speech Trio Rodrigo Amado documentado em dois registos (dia 8, 15h30), projecto do flautista abrir o Neo Pop Festival. Mário Lopes Jazz em Agosto 2010 obrigatórios, “The Amazing Carlos Bechegas, pioneiro da música

Concertos Adventures of Simon, Simon” e improvisada no nosso país e adepto Dia 6 “Invisible Nature”. Deles se espera de uma livre improvisação não- Neo Pop Festival John Surman + Jack DeJohnette um diálogo iluminado, idiomática, desta vez acompanhado Lisboa. Fundação e Museu Calouste Gulbenkian - absolutamente universal, marcado por Ulrich Mitzlaff e Miguel Feraso Dia 12 Anfiteatro ao Ar Livre. Avenida de Berna, 45A, às 21h30. Tel.: 217823700. 20€. pela utilização que ambos fazem da Cabral. Vitalic + Ellen Allien + 2000 and electrónica. Outro dos concertos Completam a programação, o trio One + Miguel Rendeiro + Stereo Dia 7 aguardados com particular Steamboat Switzerland, o projecto Addiction + Tiago Magalhães. Steamboat Switzerland Com Dominik Blum (órgão), Marino expectativa é o do Electro-Acoustic Sol 6, liderado pelo baixista Luc Ex e Dia 13 Pliakas (baixo eléctrico), Lucas Ensemble do saxofonista Evan pelo pianista Veryan Weston, o duo Parker (dia 8, 21h30), uma do pianista Guus Janssen com o John Digweed + Ben Klock + Niggli (bateria e percussão). Cobblestone Jazz + Freshkitos + extraordinária formação alargada (18 baterista Han Bennink, e o trio Lisboa. Fundação e Museu Calouste Gulbenkian - Rui Estevão + Magazino & José Anfiteatro ao Ar Livre. Avenida de Berna, 45A, às músicos) que inclui notáveis como formado por Pat Thomas (piano), Belo Peter Evans, Ned Rothenberg, Barry Raymond Strid (bateria) e Clayton 21h30. Tel.: 217823700. 17,5€. Dia 14 Dia 8 Guy, Paul Lytton ou Ikue Mori. Jazz Thomas (contrabaixo). impressionista, abstracto, que se Adam Beyer + Open Speech Trio constrói através de uma Anja Lisboa. Fundação e Museu Calouste Gulbenkian - comunicação vital entre os músicos. Esperanza! Schneider + Auditório 2. Avenida de Berna, 45A, às 15h30. Tel.: Pär Grindvik + 217823700. 10€. Para o segundo fim de semana, Expander + estão ainda reservadas duas ocasiões Guus Janssen + Han Bennink Esperanza Nuno di Rosso a não perder; o quinteto do Viana do Castelo. Castelo de Lisboa. Fundação e Museu Calouste Gulbenkian - Spalding ELM clarinetista francês Louis Sclavis (dia Santiago da Barra. Campo Auditório 2. Avenida de Berna, 45A, às 18h30. Tel.: Trio do Castelo, às 22h. Tel.: 217823700. 10€. 13, 21h30), formação que gravou o Com Esperanza seu mais recente registo, “Lost on 935456805. 20€ (dia) a 40€ Evan Parker Electro-Acoustic Spalding (voz e (passe). Ensemble The Way”, e que integra quatro dos contrabaixo), mais inspirados jovens músicos Já se chamou AntiPop Lisboa. Fundação e Museu Calouste Gulbenkian - Leo Genovese Anfiteatro ao Ar Livre. Avenida de Berna, 45A, às gauleses, e ainda o ensemble free (piano) e Francisco e agora é Neo Pop, 21h30. Tel.: 217823700. 20€. Circulasione Totale Orchestra (dia Mela (bateria). mas o espírito 15, 21h30), projecto do saxofonista e mantém-se. Porto. Jardins do Palácio de Cristal - Concha Arranca hoje a 27ª edição do Jazz em clarinetista Frode Gjerstad dedicado Acústica. R. D. Manuel II, às 22h. Entrada Ou seja, ser Agosto, festival dedicado à à intensidade libertária (diria mais gratuita. palco daquilo divulgação do que de mais criativo incendiária) do free jazz - uma Esperanza Spalding que de mais se vai fazendo no universo do jazz formação multinacional que integra Esperanza Spalding, jovem no Porto: um talento relevante se actual. Assumindo riscos, grandes improvisadores como o contrabaixista e cantora fora do comum vai fazendo na provocando o debate e histórico baterista sul africano Louis com apenas 26 anos, música

Ípsilon • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • 37 aMauMaaumMedíocreMMeeddííoocremmRazoávelRazoávelmmmBomBommmmmMuito BommmmmmExcelente

Jamiroquai,Jamiroqua Colbie Caillat e Massive Attack a Sudoeste (e( tambétambémm em Loulé, no caso de Caillat) Concertos

Carmen Souza nas Caldas da Rainha

Agenda

Tel.: 919851927. 30€ (dia) a 50€ (passe). 213612400. Entrada gratuita. Vila Nova de Cerveira. Auditório Municipal. Praça do Tavira. Praça da República, às 22h. Tel.: Sexta 6 Vagos Open Air 2010. Município, às 22h. Tel.: 251708020. 7€. 281320500. Entrada gratuita. Orchestra Popolare Italiana Cerveira ao Piano. Jamiroquai + Colbie Caillat Mão Morta Vila Real de Santo António. Praia da Manta Rota, às Quarta 11 + James Morrison + Expensive Vila Nova de Gaia. Mosteiro da Serra do Pilar. Largo 22h. Tel.: 214408565. Entrada gratuita. Domingo 8 Soul + Orelha Negra + Lykke Ki de Avis, às 22h. Entrada gratuita. Festival Sete Sóis Sete Luas 2010. Ronnie Scott Legacy Band + DJ Shadow + Zion Train Festival Rock às Sextas. Carcass + Kamelot + Amorphis + Massive Attack + Air + Mike Lagos. Centro Cultural de Lagos. R. Lançarote de Zambujeira do Mar. Herdade da Casa Branca, às Patton’s Mondo Cane + Martina Freitas, 7, às 22h. Tel.: 282770450. 10€. 19h45. 40€ (dia) a 80€ (passe). Carminho + Viviane Ghost Brigade + Oblique Rain Topley-Bird + Carminho + Beirut Lagos Jazz 2010. Festival Sudoeste. Lagoa. Senhora da Rocha, às 22h. 6€. Vagos. Lagoa de Calvão, às 17h. Tel.: 919851927. 30€ (dia) a 50€ (passe). Zambujeira do Mar. Herdade da Casa Branca, às Toques do Caramulo + Uxu Cristina Branco Vagos Open Air 2010. 19h05. 40€ (dia) a 80€ (passe). Quinta 12 Estoril. FIARTIL. Pç. José Teodoro dos Santos, às Festival Sudoeste. Kalhus + Charanga + Moxi Wadi 21h30. Tel.: 214661743. 2,5€. Deolinda Sei Miguel Tatu + Grupo Fuá + Pé na Terra Portimão. Zona Ribeirinha, às 22h. Tel.: 282470785. Maria do Ceo Lisboa. Centro Cultural de Belém - Cafetaria Carvalhais, às 21h30. Tel.: 266732504. 25€ (dia) a 3,5€. Lisboa. Praça do Município, às 22h. Tel.: 210312700. Quadrante. Praça do Império, às 22h. Tel.: 150€ (passe). Sábado 7 Entrada gratuita. 213612400. Entrada gratuita. Andanças. Tito Paris + Kumpania Algazarra Mika + Sugababes + Brett Dennen Roda de Choro de Lisboa + João Só e Abandonados + Diabo Lagoa. Senhora da Rocha, às 22h. 6€. Muxima Orchestra Popolare Italiana Lisboa. Castelo de São Jorge. Castelo, às 11h30. Tel.: Estoril. Casino Estoril. Pç. José Teodoro dos Santos, Barcarena. Fábrica da Pólvora. Estrada das 218800620. Entrada gratuita. na Cruz Ena Pá 2000 às 23h. Tel.: 214667700. Entrada gratuita. Fontaínhas, às 22h. Tel.: 214387460. Entrada Zambujeira do Mar. Herdade da Casa Branca, às Lisboa. Maxime. Praça da Alegria, 58, às 23h30. Tel.: gratuita. 18h45. 40€ (dia) a 80€ (passe). 213467090. 10€. Deolinda JP Simões Setúbal. Manteigadas, às 22h. Tel.: 265541500. Festival Sete Sóis Sete Luas 2010. Festival Sudoeste. Lisboa. MNAC - Museu do Chiado. Rua Serpa Pinto, Entrada gratuita. Mazgani 4, às 19h30. Tel.: 213432148. Entrada gratuita. OrangoTango Carmen Souza Setúbal. Manteigadas, às 22h. Tel.: 265541500. Lisboa. Centro Cultural de Belém - Praça do Museu. Caldas da Rainha. Centro Cultural e Congressos - Entrada gratuita. Segunda 9 Nouvelle Vague Praça do Império, às 22h. Tel.: 213612400. Entrada Grande Auditório. Rua Doutor Leonel Sotto Mayor, Vilamoura. Oceânico Victoria Golf Course, às 22h. gratuita. às 22h. Tel.: 262889650. 12,5€ a 15€. Adufeiras e Bombas + Pé na Terra Hélder Moutinho Tel.: 289818582. 25€. + Kazachok + Mosca Tosca Lisboa. Praça do Município, às 22h. Tel.: 210312700. Phil Mendrix Ivan Lins Carvalhais, às 21h30. Tel.: 266732504. 25€ a 150€. Entrada gratuita. Mundo Secreto Lisboa. Maxime. Praça da Alegria, 58, às 23h30. Vila Real. Teatro de Vila Real - Auditório Exterior. Andanças . Espinho. Alameda 8, às 22h. Tel.: 227335800. Tel.: 213467090. 8€. Alameda de Grasse, às 22h30. Tel.: 259320000. Entrada gratuita. Entrada gratuita. Terça 10 Meshuggah + My Dying Bride Adriano Jordão Óbidos. Casa da Música. R. Direita, às 21h. Tel.: Special Quartet plus Perico + Ensiferum Colbie Caillat 262955500. 15€ (concerto) a 100€ (passe). Maria Anadon + Orquestra de Sambeat Loulé. Lg. Duarte Pacheco, às 22h. Tel.: 289400600. Vagos. Lagoa de XV Semana Internacional de Piano de Jazz de Lagos Lagos. Centro Cultural de Lagos. R. Lançarote de Calvão, às 17h. 30€. Lagos. Centro Cultural de Lagos. R. Lançarote de Óbidos. Freitas, 7, às 22h. Tel.: 282770450. 8€. Freitas, 7, às 22h. Tel.: 282770450. 8€. Lagos Jazz 2010. Sierra Maestra Lagos Jazz 2010. Lisboa. Centro Cultural de Belém. Mário Laginha, Pedro Burmester Praça do Império, às 22h. Tel.: e Bernardo Sassetti Galandum Galundaina

ainda 2000 and One, Bock Surf Fest, surf, cerveja e Freddy Locks, que lançou há alguns projecto do veterano reggae. O próximo começa na meses “Seek Your Truth”. A intrusa, holandês Dylan próxima quinta-feira, dia 12, na Praia claro, é Vanessa de Mata – mas Hermellin, os Stereo do Tonel, em Sagres, e tem como só em parte, que a cantora Addiction, Miguel destaques Anthony B, Patrice, de “Boa sorte Rendeiro e Tiago Alborosie, Vanessa da Mata e David Good Magalhães. Fonseca. Luck” conta Ellen Alien, fi gura de destaque Sexta e sábado, o Neo- Quinta, Anthony B, músico de no currículo da electrónica desta década Pop apresenta como longa carreira e presença habitual com álbuns no Neo Pop Festival destaques em cartaz o britânico em Portugal, encerra a noite depois gravados na Jamaica e John Digweed, o sueco Pär da actuação de Alborosie, o italiano canções produzidas pela electrónica Grindvik, Anja Schneider, outra devoto de Jah que decidiu trocar a mítica dupla Sly & Robbie. contemporânea. No representante do tecno berlinense, Sicília pela Jamaica e é hoje Jah rules, portanto. M.L. Forte de São Julião ou os Cobblestone Jazz, trio que se considerado um dos grandes nomes da Barra, em entrega à descoberta, improvisando do reggae contemporâneo - o autor Viana do em tempo real. de “Soul Pirate”, porta aberta para o Castelo, de 12 sucesso em 2008, já colaborou a 14 de Agosto, com Manu Chao e já produziu haverá techo e Surf, cerveja e reggae Shakira. Antes dele, David house e electro, minimal e maximal, Fonseca fará uma pausa no ver-se-á gente dedicada a fazer bem Super Bock Surf Fest 2010 reggae com uma mão cheia de ao corpo de quem dança (tudo pop. O cantor de “Someone that lúdico) e gente a pedir audição Dia 12 cannot love” subirá a palco depois atenta a todos os pormenores (tudo Anthony B + Alborosie + David dos americanos SOJA, banda que cerebral). Fonseca + SOJA + Mikkel Solnado largou o fascínio por rock e hip-hop No Neo Pop Festival, Ellen Allien, + DJ Patife + Sierra Sam. quando ouviu o chamamento da figura de destaque da electrónica Dia 13 lenda Marley e da semi-lenda Peter desta década, vem de Berlim para Tosh e, desde então, mantém-se fiel oferecer ao público o seu tecno com Patrice + Vanessa da Matta + ao roots reggae, como se prova pelo Freddy Locks + João Maria + as doses recomendadas de Nuno di Rosso + Miguel Neto título do álbum que apresenta em experimentalismo, e Vitalic, francês Sagres: “Born in Babylon”. A abrir o Anthony B encerra a noite Sagres. Praia do Tonel, às 19h. Tel.: 210105700. 25€ de quinta-feira no que editou em 2009 “Flashmob” - (dia) a 40€ (passe). palco principal estará Mikkel álbum em que a euforia de “Ok Solnado e, noite fora, haverá festa Super Bock Surf Fest Cowboy”, o disco anterior, surge Os surfistas dedicam-se ao desporto tropicalista com DJ Patife. cruzada com um renovado interesse durante todo o ano, mas é o Verão O festival encerra no dia seguinte, por elementos disco - apresentará o que melhor representa a iconografia com uma armada reggae global e seu novo formato concerto, o da coisa. E no Verão, de há uns anos uma feliz intrusa. Ou seja, um V-Mirror Live, que se anuncia como para cá, tudo se mistura. Os festivais alemão, Patrice, uma banda de festim de cor e luz para entontecer “de música” tornam-se também “de angolanos e portugueses, os os sentidos, o que casará bem com a surf” e, já que desde há décadas os Mercado Negro de Messias, ex- música sempre em crescendo do surfistas não ouvem Beach Boys, a Kussondulola, e um lisboeta produtor. No primeiro dia, actuam conjugação resulta assim: Super inspirado na tradição jamaicana,

38 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

“Sagrada Família”, de Viseu. Com encenação Jacinto Lucas Pires, da Catarina Requeijo, Nova é a peça que abre a “Sagrada Família” tempo- nova temporada de é a história de dois rada teatro da Culturgest, desempregados, Pedro a 16 de Setembro, e Maria, que fundam numa coprodução com uma nova religião... o Teatro Viriato, de PEDRO CUNHA CUNHA PEDRO

Dança “Simulacro”, de Susana Vidal, é uma das peças aproveita para criar algo para a a ver em Lisboa, gratuitamente, neste número zero comunidade e para o Sou”, o espaço doFestival AoGosto na Rua Maria, nos Anjos, em Lisboa, Pequenos que acolhe de 9 a 14 de Agosto vários espectáculos. “C’est Mon fils Marcel Duchamp”, de Miguel Moreira com crimes entre Sandra Rosado e Duarte Moreira; “Simulacro”, de Susana Vidal e com amigos Carla Ribeiro e Maria João Garcia, já apresentado no 32º Citemor; a bossa nova de Ana Freitas e Miguel Mendes Um festival “a custo zero” com “Anita no Brasil”; “Somos estreia-se em Lisboa: Luzysonido”, de Félix Lozano e damça, performance, teatro, Sérgio Martin; “Sócrates no sofá”, do fotografia, vídeo e música bailarino Sócrates Napoleão Lima, e a lista continua. O Ao Gosto percorre numa sopa da pedra. toda uma agenda de nomes das artes Joana Amaral Cardoso performativas, de Marlon Fortes a Ricardo Santanna, passando por Festival Ao Gosto Romeu Runa, Gustavo Sumpta ou Nuno Zúniga. Lisboa. Sou - Movimento e Arte. R. Maria, 73. De São mais de 20 propostas, todas a 9/08 a 14/08. 2ª a Sáb. às 20h30. Tel.: 211547790. partir das 20h30 no Sou, em espírito Entrada gratuita. do mais comunitário que há – mais, Esteve para se chamar Ao Gosto do só mesmo nas redes, não das que se Freguês, mas encurtou-se para Ao penduram nas árvores nestes dias Gosto, brincadeira com o mês em estivais de festivais, mas daquelas que se estreia nesta edição zero, já a em que nos penduramos para criar partir de segunda-feira, e também movimento. com a ideia de que é o público que Aqui, em vez de uma figura de decide, afinal e no final, o que gosta programador, há uma figura de “não no programa, o que quer ver. “Não é programador”. Félix Lozano um festival temático, deixamos que começou a falar com os amigos as pessoas nos escolham”, explica ao espontaneamente para juntar toda Ípsilon Félix Lozano, bailarino, esta gente: “Não programo, convido”. coreógrafo, actor e agitador em “Propostas imediatas e não geral. premeditadas”, fruto de encontros E é também um “festival a custo na rua, “desafios no momento, zero”, diz ainda Félix Lozano, aceitas ou não”, conta-nos. O Festival porque é uma edição zero, em que a Ao Gosto é isto, um reencontro de entrada é livre para o público (em amigos artistas com propostas para tempo de crise...) e em que os uma semana de Agosto, alguns artistas participam sem honorários. pessoalmente, outros via vídeo em Ao Gosto é um festival ou uma sopa diferido, mas todos com a ideia de da pedra, como se lê no seu que o mundo é uma rede que, nas programa, porque junta os próximas edições, se quer expandir. ingredientes que há à mão – os “Tipo Facebook: agora é um festival amigos. Que dançam, fazem com os amigos, talvez cresça para performance, teatro, fotografia, chamar os amigos dos amigos e se vídeo ou música. “O festival nasce da crie um festival” com mais artistas e vontade de agir, de criar um grupo público ainda. Ou então “desactiva-se de amigos que, mesmo sem meios, a conta”, ri-se. Agenda

Sargento, Emanuel Arada, João Citemor - 32º Festival de Montemor- Teatro Continuam Carracedo, Manuela Cassola. o-Velho. O Sossego que ali Havia Lisboa. Teatro-Estúdio Mário Viegas/Companhia Estreiam Teatral do Chiado. Lg. Picadeiro, 40. Até 07/08. 6ª às Danças no Cubo - Danças Assemelhava-se ao da 22h. Tel.: 707302627. 25€. Tradicionais da América Latina El Lugar y La Palabra. Eternidade Lisboa. Centro Cultural de Belém. Praça do Conversation Interferida. Beirut De Jaime Salazar Sampaio. Encenação Dança Império. Dia 07/08. Sáb. às 16h. Tel.: 213612400. + Impromptus + Tiempos Como de São José Lapa, Inês Lapa Lopes, Entrada gratuita. CCB Fora de Si. Espacios Rui Pedro Cardoso. De Fernando Renjifo. Com Ziad Azóia. Espaço das Aguncheiras. Rua das Estreiam Chakaroun, Alberto Núñez Registos, Aguncheiras. Até 22/08. 6ª a Dom. às 18h30. Tel.: Continuam Abbas Beydoun, Ziad Chakaroun, 212682430. Nova Criação 2010 Chafa Ghaddar, Christian Ghazi, De Francisco Camacho, Bruno de La mujer Ibrahim, Raif Karam, Siham Nasser, Porque na Noite Terrena Sou Almeida (filme). Com Mariana de la Walid Sadek, Renato Linhares, Marta Tengner Barros, Rafael Alvarez, Tiago Mais Fiel que Um Cão lágrima Azparren. De Joana Craveiro. Encenação de Cadete, Francisco Camacho. Montemor-o- Montemor-o-Velho. Teatro Esther de Carvalho. R. Dr. De Elena Velho. Sala B. Joana Craveiro. Com Inês Rosado, José Galvão, 101. Dia 08/08. Dom. às 22h30. Tel.: Córdoba. R. Cadeia Teatro/Dança Rosinda Costa, Tânia Guerreiro. 239680836. 7,5€ a 10€. Com Velha. De Sintra. Casa de Teatro. R. Veiga da Cunha, 20. Até Citemor - 32º Festival de Montemor-o- Sylvia 06/08 a 07/08. 10/10. Sáb. às 21h30. Tel.: 219233719. Velho. Calle, 6ª e Sáb. às Festival Trans_Sintra. 22h30. 7,5€ a Ver na pág. 32. Elena 10€. Amor com Amor se Paga Córdoba. Citemor Todo lo que se mueve está vivo Montemor-o-Velho. Teatro Esther de Carvalho. R. - 32º A partir de Tchékhov, Strindberg, Dr. José Galvão, 101. Até 06/08. 5ª às 22h30. Ibsen, Karl Valentin. Pela Companhia + Expulsadas del paraíso Tel.: 239680836. 7,5€ a 10€. Festival de De Elena Córdoba. Montemor- Teatral do Chiado. Encenação de Montemor-o-Velho. Espaço Mota-Engil/Real Estate. Citemor - 32º Festival de Montemor- o-Velho. Juvenal Garcês. Com Alexandra De 12/08 a 13/08. 5ª e 6ª às 22h30. 7,5€ a 10€. o-Velho.

Ípsilon • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • 39 aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuitouiitt BommmmmmExcelente

O artista catalão para o Museu do Douro, Hompesch, Fernando Antoni Tapiès na Régua, uma exposição Santiago, Rafael Trelles (Barcelona, 1923) é o com cerca de 30 obras, e Silvestre Pestana. Em Gravuraa homenageado da V que terá inauguração no anos anteriores, foram Bienal Internacional próximo dia 20, às 17h30, homenageados Vieira da de Gravura do e fi cará aberta até 31 de Silva, Octave Landuyt, Douro, que arranca Outubro. Além de Tapiès, Gil Teixeira Lopes, Nadir na próxima estarão representados Afonso e Paula Rego. terça-feira, dia 10. este ano na Bienal Tapiès preparou artistas como Daniel

analogias, poderíamos chamar de Electricidade “eléctrico”; vale a pena recordar que Agenda este é um desenho que nasce depois do vídeo e da performance, e de Pintura. sobre papel todo um conjunto de inovações Inauguram artísticas que dissolveram fronteiras Sem Limites - Nadir Afonso 25 Anos De Re-Inícios - Lisboa. MNAC - Museu do Chiado. R. Serpa Pinto, 4. O desenho de Jorge Queiroz e abalaram categorias. Daí, também, Constrastes, Pontes e Uniões Tel.: 213432148. Até 03/10. 3ª a Dom. das 10h às 18h. é um lugar fantástico a sua natureza transitória e fluente, De Carolina Quirino. Pintura. a sua instabilidade, a sua capacidade Tavira. Casa das Artes. R. João Vaz Corte Real, 96. Tel.: 213463426. De 07/08 a 11/09. 2ª a Dom. das Tudo O Que é Sólido Dissolve-Se a que a imaginação e o para oferecer ao espectador um 21h30 às 00h30. no Ar: O Social na Colecção conhecimento, embora mundo “em movimento”. Pintura. Berardo receosos, não resistem. Nem por isso o reconhecimento Lisboa. Museu Colecção Berardo. Pç. do Império - de estratégias temporalmente mais Desassossego CCB. Tel.: 213612878. Até 12/09. Sáb. das 10h às 22h. José Marmeleira distantes deixa de estar presente. 2ª a 6ª e Dom. das 10h às 19h. Pintura, Outros. Donnerstag e Outros Desenhos Atente-se nas falsas colagens que Mais Que a Vida De Jorge Queiroz. aparecem aqui e ali, nos recortes que não são recortes, nas áreas De Vasco Araújo, Javier Téllez. Lisboa. Chiado 8 - Arte Contemporânea. Largo do cobertas de pintura. Por vezes, o Lisboa. Fundação e Museu Calouste Gulbenkian. Chiado, 8 - Edifício Sede da Mundial Confiança. Tel.: Av. de Berna, 45A. Tel.: 217823700. Até 06/09. 3ª a 213237335. Até 17/09. 2ª a 6ª das 12h às 20h. delírio (de quem vê) faz pensar em Dom. das 10h às 18h.

Expos Desenho. Outros. papel sobre papel (nos desenhos Vídeo, Fotografia, Instalação, mais pequenos), em impressões ou Outros. mmmmm até em imagens geradas por Zao Wou-Ki tecnologias mais modernas (o Pode parecer um lugar-comum, computador). mas, sempre que olhamos de novo Certas referências ou heranças para um desenho de Jorge Queiroz também se pressentem: a da pintura (Lisboa 1966), encontramos japonesa ou as evocativas dos elementos, perspectivas e realidades caminhos que se seguiram ao De Lorenzo Degl’ Innocenti. que da primeira vez tinham passado surrealismo, na direcção da Porto. Casa da Animação. R. Júlio Dinis, Ed. Les Palaces - 208-210. Tel.: 225432770. De 07/08 a 16/10. despercebidas. É como se as cores, abstracção (Ashley Gorky, Roberto 2ª a 6ª das 10h às 18h. Sáb. das 14h às 18h. os contornos e as manchas Matta). Mas o desenho de Jorge Animação, Outros. mudassem a cada olhar, mais ou Queiroz é, sobretudo, devedor de menos atento, num repetido jogo de outros métodos: a performatividade Continuam enganos. Será um rosto? Ou será e o carácter processual do fazer. WARHOL TV uma rocha? Um corpo? Onde acaba Repetem-se composições, formas, De Andy Warhol. um e começa o outro? motivos, desenhos, e voltamos a ver Lisboa. Museu Colecção Berardo. Pç. do Império - Lisboa. Fundação Arpad Szenes - Vieira da Silva. Em “Donnerstag e outros órgãos, ecrãs, superfícies, buracos. CCB. Tel.: 213612878. Até 17/10. Sáb. das 10h às 22h. Pç. das Amoreiras, 56/58. Tel.: 213880044. De 2ª a 6ª e Dom. das 10h às 19h. desenhos”, na Chiado 8, a descrição Neste contexto, aflora a hipótese de 24/06 a 26/09. 2ª, 4ª, 5ª, 6ª, Sáb. e Dom. das 10h é tarefa inútil. Os motivos erram uma narrativa, embora por pouco Fotografia, Pintura, Vídeo, Som, às 18h. Outros. sobre o papel, as escalas aumentam tempo. Acaba fragmentada num Pintura. e diminuem, há figuras dentro de universo dominado por uma Grazia Toderi A Secreta Vida das Palavras figuras, paisagens que engolem confusão e uma espontaneidade Porto. Museu de Serralves. R. Dom João de Castro, 210. Tel.: 226156500. Até 31/10. 3ª a 6ª das 10h às De Pedro Cabrita Reis, Pedro pgpgqpersonagens, personagens que irresistíveis. 17h. Sáb., Dom. e Feriados das 10h às 20h. Calapez, Rui Chafes, Ilda David, iinterrompemnterrompem paisagens.paisagens. Um frémitofrémito O uso dosdos materiais é imaginativo Desenho, Fotografia, Vídeo. entre outros. visualvisual que, levandolevando llongeonge e, com exceexcepçãop de uma série de 15 Sines. CC Emmerico Nunes. Lg. do Muro da Praia, 1. Tel.: 914827713. Até 25/09. 2ª a Sáb. das 14h30 às certascertas ddesenhos,esenhos, nuncan predetermina as Menina Limpa, Menina Suja De Ana Vidigal. 18h30. situasituaçõesções pictóricas.pic Finalmente, há Lisboa. Centro de Arte Moderna - José de Azeredo Pintura, Escultura, Fotografia, Em “Donnerstag...”, há fi guras trabalhost que, Perdigão. R. Dr. Nicolau Bettencourt. Tel.: Vídeo, Instalação, Outros. dentro de fi guras, paisagens aparentemente, 217823474. Até 26/09. 3ª a Dom. das 10h às 18h. Summer @ My Place que engolem personagens, sossegams o espectador. Pintura. Instalação. Outros. personagens que interrompem De Nuno Gueifão, Rosário Rebello de UmU representa o que Quando os Convidados se Andrade, Sofia Aguiar, Teresa paisagens: um frémito parecep ser o lugar de uma Tornam Anfi trião Gonçalves Lobo, entre outros. visual eléctrico exexposição, outro uma Lisboa. Alecrim 50. R. do Alecrim, 48-50. Tel.: eestranhast e longínqua 213465258. Até 22/09. 2ª a 6ª das 11h às 19h. Sáb. das 11h às 18h. papaisagem.i Menos Pintura, Desenho, Escultura. exexuberantesu do que os antanteriores,e aproximam-se, Regresso a Casa pela economia do traços e De Ana Jotta, Gordon Matta-Clark, dos materiaism (grafite, guache Paulo Nozolino, Pedro Cabrita Reis, Richard Tuttle, entre outros. e pastelpast de óleo), do desenho Porto. Museu de Serralves - Casa. hhomónimoomón que, num dos R. Dom João de Castro, 210. Tel.: 226156500. Até ccantosantos da primeira sala, espera De WochenKlausur, Supersudaca, 26/09. 3ª a 6ª das 10h às 17h. Sáb., Dom. e Feriados das 10h às 19h. a 1 dodo espectadore (e que Freee. Pintura, Fotografia, Escultura, também pode ser adquirido Porto. Culturgest. Av. dos Aliados, 104 - Ed. da CGD. também Tel.: 222098116. Até 15/10. 2ª a Sáb. das 10h às 18h. Vídeo, Instalação. aatravéstravés dda compra do caderno da Instalação, Outros. eexposição).xposiçã Mas têm, como os Summer Calling anterioreanteriores, a mesma energia: uma POVOpeople De Daniel Lipp, Deborah Engel, Filipa Burgo, entre outros. energia ccomo o poder de renovar e De Paula Rego, Fernando Lemos, Vieira da Silva, José Malhoa, Paulo Lisboa. 3 + 1 Arte Contemporânea. R. António Maria mmultiplicarultiplicar o olhar sobre a prática Catrica, entre outros. Cardoso, 31. Tel.: 210170765. Até 18/09. 3ª a 6ª e Sáb. das 14h às 20h. do desenhdesenho.o Lisboa. Museu da Electricidade. Av. Brasília - Ed. ConcluíConcluímos:m Jorge Queiroz é um Central Tejo. Tel.: 210028120. Até 19/09. Sáb. das Pintura, Fotografia, Vídeo, ddosos memelhoreslhore artistas portugueses 10h às 20h. 2ª a 6ª e Dom. das 10h às 18h. Instalação, Escultura. Documental, Pintura, Fotografia, vivos, e “Donnerstag“Do e Outros Vídeo, Outros. O Caçador de Borboletas Desenhos”, que marca o seu De Eduardo Matos. rregresso,egresso, a títulot individual, ao Marlene Dumas: Contra o Muro Lisboa. Galeria Zé dos Bois. R. da Barroca, 59 - Bairro Alto. Tel.: 213430205. Até 18/09. 4ª a Sáb. contexto exexpositivop português, uma Porto. Museu de Serralves. R. Dom João de Castro, 210. Tel.: 226156500. Até 10/10. 2ª a 6ª das 10h às das 18h às 23h. ddasas memelhoreslhore exposições do ano. 17h. Sáb., Dom. e Feriados das 10h às 20h. Fotografia, Outros. PPodemodem vê-lavê-la até 17 de Setembro.

40 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon /// EXPOSIÇÃO #07 ARQUITE(X)TURAS

OBRAS DA COLECÇÃO BESart

/// DE 24 DE JUNHO A 9 DE SETEMBRO

LEE FRIEDLANDER // PAULO NOZOLINO // JOSÉ MAÇÃS DE CARVALHO // DOUG AITKEN // ABELARDO MORELL // DANIEL BLAUFUKS // NUNO CERA //

JOÃO PAULO FELICIANO // THOMAS RUFF // RICARDA ROGGAN // ANA VIEIRA // 7l$8hWi‡b_W":eYWZ[7bY~djWhWDehj[ rJ[b$0(')+.+(&&r;#cW_b0_d\e6\eh_[dj[$fjrmmm$cki[kZeeh_[dj[$fj BILL HENSON // CANDIDA HÖFER // VITO ACCONCI // HIROSHI SUGIMOTO // THOMAS STRUTH // PAULO CATRICA // PEDRO TUDELA // LESLIE HEWITT // SABINE HORNIG // ROLAND FISCHER // STAN DOUGLAS // DAN GRAHAM // FRANÇOISE SCHEIN //

               

)    (     + (, ,+ -      " /  // MORADA // HORÁRIO Praça Marquês de Pombal Segunda a Sexta   nº3, 1250-161 Lisboa das 9h às 21h    !" // TELEFONE // EMAIL #$ %&' ( &(%&' 21 359 73 58 [email protected] www.fch.ucp.pt aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

Jornalismo O prazer de pensar REUTERS/RICHARD CARSON

Os artigos de Malcom Gladwell são o jornalismo do futuro: não dão informações, apenas relacionam as coisas de forma surpreendente. Paulo Moura

O que o Cão Viu Malcom Gladwell (Trad. Isabel Veríssimo)

Livros Dom Quixote mmmmm

A “New Yorker” não é uma revista normal. Seria a melhor revista do mundo se não estivesse... um pouco fora do mundo. Em que outra publicação um jornalista poderia voltar-se para o director e dizer: “Quero fazer um artigo de mais de dez páginas sobre o ‘ketchup’ e o facto de não haver nenhuma marca melhor do que a Heinz”? Ou: “Gostaria de escrever uma reportagem sobre a diferença entre as pessoas que bloqueiam e as que entram em pânico”. Ou ainda: “O tema da minha peça, que tem cerca de 40 mil caracteres, é a semelhança entre uma mamografia e uma fotografia de satélite militar”. E em que outra revista estas propostas seriam aceites? Durante mais de uma década, Malcolm Gladwell escreveu sobre estes temas e outros ainda mais extravagantes na “New Yorker”. Agora reuniu uma selecção desses textos e publicou-os em livro, sob o Num artigo sobre a falência da Enron, Gladwell analisa título “O que o Cão Viu”, que é o a incapacidade actual para processar toda a informação disponível: nome de um dos artigos. A Dom o colapso da empresa foi previsto por dois estudantes que se Quixote traduziu e publicou a obra limitaram a fazer as contas, mas não pelos analistas encartados em Portugal. o que é o jornalismo de Gladwell. E, intelectual da mesma forma que previsto por dois estudantes que, Para quem não está familiarizado em consequência, sobre no que o existe propriedade material. As num trabalho escolar, se limitaram a com a “New Yorker” e pensa que jornalismo se vai tornar no futuro. O coisas do espírito não pertencem a fazer as contas. Mas nenhum jornalismo são notícias, este livro é artigo “Uma Coisa Emprestada”, por ninguém, porque, ao contrário do analista sério chegou lá. O atentado um objecto estranho. Não é fácil exemplo, é sobre plágio. Conta a que acontece com as coisas contra as Torres Gémeas não foi explicar qual é o seu género ou o seu história de uma dramaturga que, materiais, o facto de serem roubadas prevenido porque a CIA e o FBI tema. Uma coisa é certa: não é para a sua peça que fez êxito na não expropria o seu dono. O roubo andavam entretidos a rivalizarem ficção. Também não é divulgação Broadway, copiou a vida de uma de ideias multiplica-as, e faz nascer um com o outro. A não partilha de sociológica ou económica. Nem cientista real e entrevistas novas e melhores ideias. Ou seja, informações entre os vários investigação, científica ou policial. publicadas pelo próprio Gladwell. elas pertencem a todos. organismos foi também a razão de Não é um livro de humor, nem de Usou descaradamente frases Outra pista: em dois artigos, um não se ter previsto Pearl Harbour ou ensaio, crónica, futurologia ou auto- inteiras, sem atribuir autoria. sobre a falência da empresa Enron, e o fiasco da Baía dos Porcos. O ajuda. Malcolm Gladwell não é “Sim, ela tinha copiado o meu outro sobre o fracasso dos serviços primeiro artigo intitula-se “Segredos cientista, ensaísta, polícia ou trabalho”, escreve Gladwell. “Mas secretos em prever os actos Conhecidos de Todos” e o segundo comediante. Ele é, e dizer isto não ninguém perguntava porque é que terroristas, Gladwell fala da “Unir os Pontos”. tem nada de inocente, jornalista. ela tinha copiado, nem o que tinha quantidade de informação que está É esse o campo de trabalho de Para quem souber ler nas copiado, nem se a sua cópia servia disponível para todos e da Malcolm Gladwell: revelar os entrelinhas, os textos publicados em um objectivo maior”. Para concluir incapacidade que temos para a segredos conhecidos de todos e unir “O que o Cão Vê” dizem muito sobre que não existe propriedade processar. O colapso da Enron foi os pontos do que está disperso.

42 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon Quando o conhecemos era Townsend, a escritora sublinhou. Ainda não um “nerd” (mas sem o QI) britânica que lhe deu há novo volume da saga Saga com óculos e acne; vida e o alimentou ao (apenas uma edição de agora, com décadas longo de todos estes anos, bolso de “The Prostrate em cima do corpo e numa saga felizmente Years”), mas Adrian Mole da próstata, até se interminável, admitiu já tem uma opinião sobre tornou “atraente”. numa entrevista ao o novo Governo britânico: Sim, “Guardian” que se “Ele estava desencantado continuamos apaixonou por ele e que com o New Labour. E meu a falar de só o matará quando deus, como este Governo Adrian ela própria morrer: está a conseguir fazer Mole. Sue “Adrian Mole, c’est moi”, coisas depressa”.

Hoje, a informação está ao alcance uma perspectiva mais histórica e em A Morte do Ouvidor das pessoas. O segredo é saber jeito de brincadeira séria, ele não Germano Almeida procurar e, acima de tudo, deixa de se (nos) interrogar sobre Caminho relacionar. Num mesmo artigo, aspectos religiosos, como este: Gladwell põe em relação histórias de “Tinha sentido sempre um paradoxo mmmmn pessoas, teorias científicas, factos no crime de blasfémia, pois parecia- históricos. E chega a conclusões lhe que um Deus que pudesse Ponto de partida: surpreendentes. perturbar-se pelas palavras dos seres as desrazões da Há quem diga que ele abusa. Que humanos era por definição indigno prisão de António descura o rigor científico, que de reverência”. de Barros Bezerra manipula. Que tem uma agenda Michael Chabon tem, de facto, de Oliveira, pessoal conservadora, de direita, e um talento e um gosto especiais acusado de que é um impostor. Outros dizem para parodiar e reinventar autoria moral do que ele é o pensador mais influente “géneros”, como aliás já o tinha assassinato de do mundo. Que descobriu uma nova provado em “A Liga da Chave João Vieira de forma de pensar e de escrever. Dourada” (com os heróis da banda Andrade, ouvidor- Todos os seus livros – “A Chave do desenhada) e em “O Sindicato dos geral das ilhas de Cabo Verde. Sucesso”, “Blink” e “Outliers” – Polícias Iídiches” (com o hard- Bezerra de Oliveira e nove cúmplices foram “bestsellers”, e tudo indica Depois da banda-desenhada e do “hard-boiled”, boiled americano dos anos 30 e 40). foram presos em Santiago, trazidos que este vai seguir o mesmo Michael Chabon parodia o romance de aventuras O que mais se seguirá? para Lisboa, julgados e condenados caminho. Há portanto uma receita, cinema, livros infantis, banda em duas cortinas douradas de cada à morte. Depois de enforcados, as algo que fascina os leitores e os leva desenhada, contos, histórias em lado da face alongada”; tem por uso suas cabeças foram cortadas e a ler Gladwell não para serem fascículos, e a edição de números fumar um charuto de barro cozido Ouvir além levadas para Santiago, espetadas em informados, não para se cultivarem, avulsos da “McSweeney’s” (a revista cujo fornilho ele enche com uma chuços erguidos e exibidas ao povo não para estarem a par dos grandes de culto criada por outro talento das pasta de cânhamo e de mel e como na vila da Praia, “para mostrar a problemas do nosso tempo, mas por letras americanas, Dave Eggers) e da arma usa apenas uma lanceta da conta todos o que tinha sobrado”. Estamos puro prazer. O prazer de pensar. “Best American Short Stories”. comprida e fina capaz de servir em 1764, sob o iluminismo do “Cavalheiros da Estrada” (que “para assar um par de aves numa Estórias do tempo Marquês de Pombal. durante parte da fase de escrita, fogueira”, pois as leis dos francos História, portanto. Germano Ficção confessa Michael Chabon no proibiam um judeu de usar armas, iluminista, com o português Almeida (n. 1945) prefere chamar- posfácio, teve o título “Judeus com mesmo em sua própria defesa, e o crioulo bem calibrados. lhe narrativa histórica, assim se Espadas”, que o autor abandonou ainda que “um bando armado de Passaram 250 anos, mas defendendo dos historiadores Judeus com por algumas pessoas o acharem brutos lhe arrastasse a mãe e a irmã ortodoxos. Diz o autor, logo a abrir, risível) começou por ser uma da cozinha e lhes fizessem as mais continuam actuais. que “A Morte do Ouvidor” não foi espadas história publicada em capítulos (são cruas violências na rua”; Zelikman, Eduardo Pitta escrito para ser um romance, 15), semanalmente, na “New York que tem o dom da ironia, diz: “Eu Times Magazine”. O romance é uma não salvo vidas. Limito-me a Uma divertida e animada animada sucessão de aventuras prolongar a sua futilidade”. paródia dos romances de “quixotescas” repletas de espadas, O outro protagonista é Amran, o aventuras, escrita por um lâminas a cortarem o ar, cavalos, gigante africano da Abissínia, que cargas de elefantes, prisões, diz de si próprio ser judeu, “filho da dos mais talentosos autores fogueiras de bosta de camelo, linhagem da rainha do Sabá, do da “nova” literatura norte- bordéis e caravansarais, pilhagens, tempo em que ela se deitara, entre americana. fugas inesperadas e raptos bandos de ibexes e leopardos, com José Riço Direitinho espectaculares, que por vezes nos Salomão, filho de David”; tem por trazem reminiscências de Alexandre uso ter sempre pendurado atrás das Cavalheiros da Estrada Dumas, de Kipling e de muitos costas um enorme machado Michael Chabon outros; tudo narrado com uma viquingue cujo nome, talhado em (Trad. Fernando Villas-Boas) escrita exuberante que nos faz runas ao longo do cabo de freixo, se Casa das Letras assomar à memória parágrafos de poderia “traduzir vagamente por O Lovecraft ou de Michael Moorcock (a Violador da Tua Mãe”; durante mmmmn quem, aliás, o livro é dedicado). muitos anos, servira o exército de O corrupio de aventuras, que tem Bizâncio. Enquanto se lugar no século X, num desvio da No caravansarai, os dois prepara a Rota da Seda, começa num conhecem o imberbe mancebo adaptação caravansarai manhoso perdido Filaq, pretenso descendente do cinematográfica algures no reino de Arran, nas senhor a quem foi usurpado o reino do anterior faldas orientais do Cáucaso, nos de Khazaria (mais ou menos na área romance do limites do império bizantino. Os geográfica onde se localiza hoje a americano de protagonistas são dois judeus, um Ucrânia) – “o reino fabuloso dos origem judaica louro pequeno e um gigante judeus arruivados e selvagens na Michael Chabon africano (uma espécie de David e margem oriental do mar Cáspio”, (n. 1963), o Golias bíblicos), “soldados da que se diziam descendentes de Noé. magnífico “O Sindicato dos Polícias fortuna”, matadores de homens por Numa tentativa de serem Iídiches” (Casa das Letras, 2009), encomenda, vigaristas recompensados pela família do pelos irmãos Joel e Ethan Coen, a experimentados, ladrões que se mancebo, decidem levá-lo até à sua editora portuguesa decidiu publicar deixam contratar quando a cidade, a capital do império khasar, o divertido “Cavalheiros da Estrada”, oportunidade se apresenta. O mais Atil, nas margens do delta do rio uma paródia com arremedos pós- baixo, Zelikman, é um físico Volga. Mas para lá chegarem, por modernos dos populares “romances originário da cidade de entre a poeira das montanhas e os de aventuras” do século XIX. Este é Regensburgo (actualmente na olhares esperançosos dos pássaros o quinto romance de Chabon – que Francónia alemã), de uma família limpadores de ossos, têm de se em 2001 recebeu um Pulitzer por de rabinos-cirurgiões, um “solitário envolver em sucessivas batalhas com “The Amazing Adventures of de nascença” com gosto por vários tipos de guerreiros, qual deles Kavalier & Clay”, em português “A chapéus de estranhas formas, “um mais bruto e mais cínico. O mais notável escritor cabo-verdiano compõe Liga da Chave Dourada” (Gradiva, tipo franzino, de pernis magros e Em mais uma tentativa de Chabon um fresco idiossincrático dos costumes 2010) –, autor ecléctico cujo trabalho aspecto sombrio, branco que nem para aclarar ideias sobre a do arquipélago no século XVIII, evitando se tem dividido entre guiões para uma vela de sebo, o cabelo caído “identidade judaica”, mas agora de as ortodoxias do romance histórico

Ípsilon • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • 43 aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente Livros

“ainda que tenha esperança de Toyota, ou pelo menos um carro de até ao 12º ano, vive em estado recomendam) teriam a sua carreira que seja lido como se o fosse.” fazer inveja...” Ensaio crítico há vários anos. O retrato tem seriamente comprometida – e é Germano Almeida é o mais O despotismo esclarecido de sido feito em diversas ocasiões e óbvio que não têm. Só quem não notável escritor cabo-verdiano, juízo Pombal e o engodo da agravou-se desde 2002, quando conheça a história dos programas consensual desde 1989, ano em que multiculturalidade de Vieira Espatifar a estalou a polémica à volta dos emanados do Ministério para o publicou “O Testamento do Sr. “explicam” a Companhia do Grão novos programas em que a ensino do português no 3º ciclo Napumoceno da Silva Araújo”. Os Pará e Maranhão, à qual é língua literatura perdeu peso. Em boa poderá imaginar que a conjuntura que não ficaram logo convencidos “concedido em exclusivo o privilégio parte, o texto de Maria do Carmo actual é culpa das escolas ou dos renderam-se em 2001, com a trama de resgatar escravos nas costas de Vieira é uma peça dessa polémica, e professores a funcionar em roda desbocada daquele que continuo a África, introduzi-los nas capitanias O drama da língua nas uma peça interessada na defesa de livre. Pelo contrário, e considerar o mais conseguido dos que dão nome à empresa, e vendê- escolas portuguesas, num um dos modelos pedagógicos em precisamente aí é que os limites da seus romances, “As Memórias de um los pelos preços que forem ensaio estóico mas com combate – neste caso, o modelo que retórica estóica de Maria do Carmo Espírito”. Isto para dizer aos neófitos ajustados...” Nenhuma novidade em quer recuperar a centralidade Vieira se tornam mais visíveis. que o autor não cabe na prateleira associar o padre António Vieira ao algumas limitações. perdida dos textos literários. Com efeito, a imagem totalmente do romance histórico, por muito que tráfico de escravos, mas é sempre Gustavo Rubim Um lugar-comum previsível dirá negativa que essa retórica constrói “A Morte do Ouvidor” cumpra vários bom lembrar. que a instituição escolar deveria esquece-se de que há professores dos seus protocolos, a começar pelo Bezerra de Oliveira, executado aos O Ensino do Português estar ao abrigo destes conflitos, em de português que praticamente não crédito das fontes canónicas. 38 anos, coronel de Infantaria, Maria do Carmo Vieira nome da missão de ensinar. Não usam o manual escolar ou só o Facto é que, sob o pano de fundo cavaleiro da Ordem de Cristo, Fundação Francisco Manuel passa de facto de um lugar-comum, usam com extremas cautelas da história social e política de Cabo governador de armas, juiz da dos Santos porque a escola foi e será sempre críticas. Deixa de fora os que se Verde no século XVIII, Germano Câmara da Ribeira Grande, etc., era palco favorito de conflitos, dada a habituaram a contornar e superar, Almeida compõe um fresco “apelidado Príncipe de Cabo Verde e mmmnn impossibilidade de fixar uma visão em muito, nas aulas, as instruções idiossincrático dos costumes das também rei da ilha de Santiago.” única quer dos fins, quer das oficiais, em todos os planos do ilhas. O “caso” Bezerra de Oliveira Não custa admitir que tenha estado Primeiro da metodologias do ensino. Em ensino da língua: da gramática à foi um pretexto, sob a forma de na origem da conjura que levou à coleção “Ensaios Portugal, o mito da neutralidade literatura. Tal esquecimento tem homenagem a alguém que “não morte de João Vieira de Andrade, o da Fundação”, o estável corporizou-se numa uma razão de ser: é que esses merece ser humilhado pelo poder ouvidor-geral, ou seja, o auditor da livrinho da Profª idealização da escola salazarista, professores não reproduzem o dos homens”. Tanto assim é que o Coroa. O que terá reportado de tão Maria do Carmo que na verdade só funcionava discurso humanista preocupado, autor não se inibe (e bem) de grave o desembargador? Traição à Vieira sobre o oleadamente (com os seus como Maria do Carmo Vieira, com adulterar a realidade histórica, a Coroa? Afronta à Igreja? Corrupção? ensino do medíocres resultados) por estar a reverente transmissão do cânone benefício da arquitectura ficcional. Desvios aos costumes? Um pouco de português não é, sujeita ao mesmo regime literário nacional (Gil Vicente, Quem leu “Viagem pela História das tudo? Dependendo do ponto de propriamente autoritário que a restante Camões, Vieira, Garrett, Eça, Ilhas” (2003) sabe do que falo. vista, herói ou vilão. Seja como for, falando, um sociedade. “O Ensino do Pessoa, etc.) segundo os moldes Como de regra, português e os poderes fácticos de Cabo Verde ensaio. O opúsculo obedece aos Português” sintetiza o discurso igualmente canónicos da sua crioulo bem calibrados, no estilo sentiram a extensão do braço de objetivos sociológicos da Fundação estóico sobre a natureza do ensino, interpretação, fora dos quais se pessoalíssimo de quem gosta de Pombal. Francisco Manuel dos Santos (saiba- um dos que têm ocupado a cena diria que a queda no vício é, para a discretear sobre si e os outros, Germano Almeida não esconde a se mais em www.ffms.pt) e à pública desde que o Estado Novo autora, uma sinistra fatalidade. O deitando mão de todos os recursos simpatia pela figura de António de preocupação de “conhecer ruiu sem deixar herança viável para capítulo III, sobre o ensino narrativos (mesmo o de convocar Barros Bezerra de Oliveira. Assim, Portugal” que norteia António o seu modelo de escola. secundário, é neste ponto personagens de outros livros, casos quando lhe chegou às mãos uma Barreto como presidente do A palavra-chave da pedagogia emblemático: a lucidez com que de Eva e Luís Henriques), da separata da sentença de condenação respetivo conselho de estóica é “exigência” e o seu inimigo desmonta a demagogia responsável desenvoltura coloquial à subtileza do homem que terá estado por trás administração. Mas, talvez por isso, é a “facilidade” e o “lúdico”. Há pela “nova ordem pedagógica” vem do “insert” para iniciados. Do fim do da execução do ouvidor-geral (cargo tem pouco espírito ensaístico. Nem uma superioridade evidente no acompanhada do impulso tempo, nítida como se fora hoje, que ele próprio ocupou até ser assim, no entanto, se pode estoicismo pedagógico sobre o seu incontrolado para apontar a surge a Cidade Velha, actual Ribeira preso), fez o que era esperado que menosprezar o drama que nesta adversário: o poder crítico, direção em que, por exemplo, a Grande de Santiago. O narrador fizesse: pôs tudo em registo quase centena de páginas vem praticamente nulo nos defensores poesia de Cesário Verde deve ser falando a partir do tempo presente: ficcional, de forma a alargar o documentado. da escola “fácil”. Com base nessa ensinada – e a verdade é que para “Numa terra onde qualquer gato- âmbito da “estória” ao patamar da É do conhecimento geral que o superioridade, Maria do Carmo aprender aquela vulgata histórico- pingado tem um História. Ainda bem. ensino da língua materna nas Vieira consegue produzir uma literária (p. 58) os alunos não Prado, um Touareg, escolas portuguesas, do 1º ciclo imagem do que se faz (ou se espera precisam de professor, basta-lhes que se faça) hoje em muitas aulas de um manual. português, que é verdadeiramente Porque o estoicismo pedagógico aterradora. O capítulo IV, dedicado começa a estalar na ideia de língua ao 3º ciclo do ensino básico, basta, que o sustenta, ou seja, na ideia de nas suas 15 páginas, para alarmar que a língua ensinada com base na qualquer um a quem a língua literatura “é uma forma materna não seja indiferente. Entre insubstituível de valorizar (...) a testemunhos da experiência da nossa própria identidade cultural” autora, exemplos do que se (p. 60). Em rigor, isto implica que encontra nos manuais escolares, Madonna, Lou Reed, Jacques Brel, remissão para as directivas Dante, Leopardi, Kant ou programáticas e a alusão a Baudelaire fazem parte doutras estatísticas conhecidas e práticas identidades culturais que não “a correntes, sai dali a ideia clara de nossa própria”. que o Ministério da Educação é uma Não será a exaustão desta máquina guiada por um único fim: retórica da “identidade cultural” espatifar de vez a língua igualmente responsável pelo êxito portuguesa. dos embustes pseudo-pedagógicos Essa ideia, infelizmente, está que infectam a escola portuguesa? certa. Estaria errada se fosse Que resistência, na era da proibido adoptar aqueles manuais globalização, está essa retórica nas escolas – e não só não é como ainda capaz de constituir? eles existem porque muitas escolas Pergunto se Séneca, o autor os adoptam. Se a ideia estivesse mais citado por Maria do Carmo errada, os professores que Vieira, será a melhor inspiração Maria do Carmo Vieira defende uma transmissão reverente escreveram esses manuais (e, para responder a tais perguntas. do cânone literário tradicional, de Gil Vicente a Pessoa, portanto, põem em prática nas Até porque não é fácil tomar para que resulta anacrónica, e até autista, na era da globalização aulas os exercícios cretinos que modelo o educador de Nero.

44 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon Jorge Luís M. Mário Vasco As estrelas do público Mourinha Oliveira J. Torres Câmara O Barão Vermelho mnnnn nnnnn nnnnn nnnnn O Caso Farewell mmmnn nnnnn nnnnn nnnnn Escritor-Fantasma mmmmn mmmnn mmmmm nnnnn Canino mmmnn mmmnn mnnnn nnnnn Contraluz nnnnn A mnnnn nnnnn É Muito Rock, Meu! mmnnn nnnnn mmnnn nnnnn O Inimigo sem Rosto mnnnn nnnnn nnnnn nnnnn Origem mmmmn mnnnn mmmnn nnnnn Toy Story 3 mmmmm nnnnn mmmmn nnnnn Vão me buscar alecrim mnnnn mmmmn mmnnn mmmmm

Kusturica como actor nos exactos antípodas da 11h45, 13h45, 15h30, 17h15, 19h, 21h40; sua imagem de marca truculenta, compondo um ofi cial dos serviços secretos soviéticos No papel, a primeira longa de José surpreendentemente sóbrio Farinha, inspirada pelo livro homónimo de Maria José Morgado e José Vegar, tem ambições de “thriller” sobre os “crimes de colarinho branco”. Mas o que está no écrã é uma colecção de banalidades anonimamente apresentadas, toda rodada em planos médios de pequeno écrã e cheia de cabeças falantes como se o seu destino fosse a televisão. “O Inimigo sem Rosto” é prova cabal de que a ficção nacional para cinema está contaminada pela lógica criativa e formal da televisão, desde a música metida a martelo a toda e qualquer altura para carregar a traço grosso o que não necessita de ser sublinhado, até aos actores tão acima do material que lhes coube em sorte que o seu empenho nestas personagens esquemáticas é completamente desperdiçado (São José Correia, Maria João Bastos ou Suzana Borges vêm à cabeça). Um filme absolutamente anónimo que

Cinema Estreiam imagem de marca truculenta, numa não justifica uma estreia em sala prestação sóbria e com três anos de atraso. J. M. surpreendentemente justa. Mas o Regresso à que interessa a Christian Carion, ficcionando sobre um caso verídico Continuam Guerra Fria ocorrido na Moscovo dos anos 80 em que o informador russo passava sobretudo, sobre o lendário “Barão Toy Story 3 + Dia e Noite documentos através de um Vermelho”, Manfred von Richthofen. De Lee Unkrich, O teatro da espionagem engenheiro francês apanhado na O gesto é, ainda por cima, com Tom Hanks (Voz), Tim Allen como jogo à volta de coisas engrenagem, é encenar o teatro da sustentado por uma primeira parte (Voz), Michael Keaton (Voz). M/6 espionagem não enquanto combate que apanha bem o espírito “blasé” sérias, num fi lme sólido e de ideologias mas como uma espécie dos jovens aristocratas que partiram MMMMn bem interpretado (Kusturica de jogo lúdico à volta de coisas para a I Guerra como quem parte incluído). Jorge Mourinha sérias, jogado por pais de família para um safari africano, e pelo modo Lisboa: Atlântida-Cine: Sala 2: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª apanhados numa situação que os como “O Barão Vermelho” desenha 15h45, 21h45 (V.Port.) Sábado Domingo 15h45, 18h30, 21h45 (V.Port.); Castello Lopes - Cascais Villa: O Caso Farewell transcende e sem verdadeira noção a perda desse entusiasmo à medida Sala 5: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h40, 18h, 21h10 (V.Port.) 6ª 15h40, 18h, 21h10, 23h40 (V.Port.) Sábado 12h50, L’Affaire Farewell do que estão a fazer, pretendendo que a Prússia imperial descobre a apenas garantir uma vida melhor seriedade da guerra. Só o que o 15h40, 18h, 21h10, 23h40 (V.Port.) Domingo 12h50, De Christian Carion, 15h40, 18h, 21h10 (V.Port.); Castello Lopes - Londres: com Emir Kusturica, Guillaume para os seus filhos. Carion não deixa gesto não chega — nem o gesto, nem Sala 1: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, 16h30, 19h, 21h45 (V.Port./3D) 6ª Sábado 14h, 16h30, 19h, Canet, Alexandra Maria Lara. M/12 de sublinhar a traço grosso a opção o profissionalismo da produção — entre pequenas vítimas e poderosos para salvar “O Barão Vermelho” do 21h45, 24h (V.Port./3D); Castello Lopes - Loures Shopping: Sala 5: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª MMMnn imunes, num final simultaneamente europudim telefílmico, com um 4ª 13h20, 16h10, 18h50, 21h25, 23h50 (V.Port./3D); previsível e desconcertante. Mas isso elenco maioritariamente alemão a CinemaCity Alegro Alfragide: Sala 4: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 15h35, 17h50 (V.Port./3D); Lisboa: UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 10: 5ª 6ª não afecta minimamente o prazer de representar personagens alemãs que CinemaCity Alegro Alfragide: Cinemax: 5ª 6ª 2ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h10, 16h45, 19h20, 22h, 00h30 ver um filme sólido, bem contado e falam todas em inglês, com uma 3ª 4ª 13h55, 16h15, 18h30, 21h30, 23h45 (V. Domingo 11h30, 14h10, 16h45, 19h20, 22h, 00h30 interpretado, com um assinalável progressão narrativa chapa-quatro Port./3D) Sábado Domingo 11h35, 13h55, 16h15, Porto: Arrábida 20: Sala 18: 5ª 6ª Sábado 18h30, 21h30, 23h45 (V.Port./3D); CinemaCity Domingo 2ª 3ª 4ª 13h55, 16h30, 19h05, 21h45, domínio do ritmo e da narrativa. quase pensada em função dos Beloura Shopping: Sala 2: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 13h55, 00h30 intervalos todos os 25 minutos. E, 16h10, 18h30, 21h30 Sábado Domingo 11h30, 13h55, 16h10, 18h30, 21h30; CinemaCity Campo Pequeno O Barão Vermelho sobretudo, com batalhas aéreas A primeira singularidade de “O Caso competentes mas sem chama, quase Praça de Touros: Sala 4: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª Der Rote Baron 13h45, 16h, 18h15, 21h30, 23h55 (V.Port./3D) Farewell” é a aparência de filme de De Nikolai Müllerschön, inteiramente criadas em Domingo 11h30, 13h45, 16h, 18h15, 21h30, 23h55 (V.Port./3D); Medeia Fonte Nova: Sala 3: 5ª 6ª espionagem tradicional, com Matthias Schweighöfer, Lena computador, que não conseguem documentos trocados para a frente e transmitir a paixão de que Von Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h10, 16h30, 19h, Headey, Joseph Fiennes. M/12 21h30 (V.Port.); Medeia Monumental: Sala 4 - Cine para trás em plena Guerra Fria, Richthofen fala a certa altura. Teatro: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, conflito de super-potências por Mnnnn Quando um filme sobre aviadores 16h40, 19h, 21h30, 24h (3D); UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 12: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h15, procuração. É algo de tão não é capaz de fazer passar esse 16h35, 19h (V.Orig./3D), 21h15, 23h40 (V.Port./3D) série ípsilon II radicalmente “fora de moda” que Lisboa: ZON Lusomundo Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado deslumbre primordial dos primeiros Domingo 11h30, 14h15, 16h35, 19h (V.Orig./3D), chega a ser radicalmente novo voltar Domingo 2ª 3ª 4ª 14h10, 17h10, 21h15, 00h15; ZON pilotos, estamos mal. J. M. 21h15, 23h40 (V.Port./3D); UCI Cinemas - El Corte Lusomundo Colombo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª Inglés: Sala 9: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h15, atrás numa paisagem 3ª 4ª 12h40, 15h30, 18h20, 21h10, 00h05; ZON 16h35, 19h, 21h40, 00h05 (3D) Domingo 11h30, Sexta-feira, Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª Sábado cinematográfica que determinou O Inimigo Sem Rosto 14h15, 16h35, 19h, 21h40, 00h05 (3D); UCI Dolce dia 13 de Agosto,to, unilateralmente que já ninguém Domingo 2ª 3ª 4ª 12h45, 15h40, 18h35, 21h30, Vita Tejo: Sala 8: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 14h15, 00h25 De José Farinha, o DVD “Zatoichi”,hi”, 16h45, 19h15, 21h45 6ª Sábado 14h15, 16h45, 19h15, quer saber destas coisas. A segunda 21h45, 00h15; UCI Dolce Vita Tejo: Sala 2: 5ª 2ª 3ª Porto: ZON Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª com José Wallenstein, São José de Takeshi Kitanoano 4ª 13h45, 16h10, 18h35, 21h15 (V.Port./3D) 6ª é encontrar como actor, no papel Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h40, 18h20, Correia, Maria João Bastos. M/12 Sábado 13h45, 16h10, 18h35, 21h15, 23h40 (V. principal de um oficial dos serviços 21h10, 00h15 Port./3D) Domingo 11h30, 13h45, 16h10, 18h35, 21h15 secretos soviéticos que decide Mnnnn (V.Port./3D); ZON Lusomundo Alvaláxia: 5ª 6ª 2ª +8 DVD começar a passar informações para Admitamos que há qualquer coisa 4ª 13h30, 16h, 18h30, 21h20, 23h45 (V.Port./3D) Todas as sextas,t o Ocidente, Emir Kusturica. O de simpático, mesmo de quixotesco, Lisboa: CinemaCity Classic Alvalade: Sala 1: 5ª 2ª Sábado Domingo 11h, 13h30, 16h, 18h30, 21h20, 3ª 4ª 13h45, 15h30, 17h15, 19h, 21h40 6ª 13h45, 23h45 (V.Port./3D) 3ª 13h30, 16h, 18h30, 23h45 (V. grande sacerdote do caos balcânico em fazer hoje um filme sobre os ases Port./3D); ZON Lusomundo Amoreiras: 5ª 6ª por + €1,95. 20anos 15h30, 17h15, 19h, 21h40, 00h05 Sábado 11h45, surge nos exactos antípodas da sua da aviação da I Guerra Mundial e, 13h45, 15h30, 17h15, 19h, 21h40, 00h05 Domingo Sábado 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h10, 18h50, 21h40,

Ípsilon • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • 45 aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente Cinema

Como divertimento de Verão, já vimos muito pior do que “É Muito Rock, Meu!”

00h10 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h40, 16h10, Leonardo DiCaprio, Marion Cotillard, Cineclubes para mais 18h50, 21h40, 00h10 (V.Port./3D); ZON Lusomundo CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h10, Ellen Page, Tom Berenger. M/12 informações consultar www.fpcc.pt 16h, 18h45, 21h30, 00h15 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h10, 16h, 18h45, 21h30, 00h15 (V.Port./3D); MMMnn Porto: Arrábida 20: Sala 15: 5ª 6ª Sábado Parque S. Lourenço Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 16h20, 18h50, 21h20, 24h Lisboa: Atlântida-Cine: Sala 1: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª Abrantes (V.Port./3D); Arrábida 20: Sala 20: 5ª 6ª Sábado 15h30, 21h30 Sábado Domingo 15h30, 18h15, 21h30; Mostra de Cinema ao Livre Domingo 2ª 3ª 4ª 14h15, 16h40, 19h10, 21h35, Castello Lopes - Cascais Villa: Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª 00h10 (V.Port./3D); Nun`Álvares: Sala 1: 5ª 6ª 15h20, 18h20, 21h20 6ª 15h20, 18h20, 21h20, 00h20 Ver www.espalhafitas.org Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 16h30, 19h, Sábado 12h20, 15h20, 18h20, 21h20, 00h20 21h30 (V.Port./3D); Domingo 12h20, 15h20, 18h20, 21h20; Castello Lopes Parque Catarina - Londres: Sala 2: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 13h15, 16h, Só mesmo a Pixar para provar que é 18h45, 21h30 6ª Sábado 13h15, 16h, 18h45, 21h30, Eufémia perfeitamente possível chegar ao 00h15; Castello Lopes - Loures Shopping: Sala 4: 5ª Barreiro terceiro filme de uma série sem dar 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h40, 15h25, 18h20, Imperdoável 21h15, 00h15; CinemaCity Alegro Alfragide: Sala 7: cabo do capital adquirido. Não que o De Clint Eastwood, 1992, M/16 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h30, 19h25, 23h; CinemaCity Alegro Alfragide: Sala 8: 5ª 06/08, 21h30 terceiro episódio das aventuras dos brinquedos de Andy seja a obra- 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 15h, 17h55, 21h30, 00h20; CinemaCity Alegro Alfragide: Sala 3: 5ª 6ª Praça do Sertório prima do estúdio – não precisaria de Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 23h55; CinemaCity Évora o ser (bastaria manter o nível médio Beloura Shopping: Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo Alice No País Das Maravilhas do estúdio de animação para já valer 2ª 3ª 4ª 18h35; CinemaCity Beloura Shopping: Sala Nada de novo em “A Origem”, mas ainda assim há aqui um cinema 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 21h35, 00h25; capaz de se servir dos efeitos, em vez de estar ao serviço deles mais do que 90 por cento da CinemaCity Campo Pequeno Praça de Touros: Sala concorrência), mas fica lá tão perto 3: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 00h10; redutora, apostando sobretudo no que o filme adopta conscientemente, que damos por nós a perguntar CinemaCity Campo Pequeno Praça de Touros: Sala modo como vai chegando aos seus provoca uma adesão despretensiosa 6: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h20, como é que a Pixar continua a ser 22h05; CinemaCity Campo Pequeno Praça de objectivos: o prazer de contar em ao disparate e ao grotesco das capaz de fazer filmes mais Touros: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª espiral, trazendo para a ficção situações. Existe, pelo menos, uma inteligentes, mais adultos e mais 14h20, 17h10, 21h35; CinemaCity Classic Alvalade: infindáveis pormenores, como num grande vantagem: o filme Sala 3: 5ª 2ª 3ª 4ª 14h20, 17h10, 21h30 6ª 14h20, extraordinários do que 99 por cento 17h10, 21h30, 00h20 Sábado 11h30, 14h20, 17h10, gigantesco “puzzle”. Estamos desconstrói o seu próprio esquema da produção mundial 21h30, 00h20 Domingo 11h30, 14h20, 17h10, 21h30; perdidos no tempo e no espaço narrativo e procura o insólito. Como contemporânea em imagem real. Medeia Monumental: Sala 1: 5ª 6ª Sábado como o protagonista (excelente divertimento de Verão para Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h20, 19h10, 22h; De Tim Burton, 2010, M/12 Por trás de uma comédia de Medeia Saldanha Residence: Sala 8: 5ª 6ª Sábado prestação de Leonardo Di Caprio) consumir e esquecer, já vimos muito 10/08, 22h aventuras que cita todos os grandes Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 16h, 18h50, 21h40, que pirateia ideias alheias. Nolan pior. M.J.T. sub-géneros da Hollywood clássica 00h30; UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 11: 5ª 6ª não inventa nada, mas compraz-se Fábrica da Cerveja Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h15, 17h15, 21h; UCI Faro esconde-se uma meditação Cinemas - El Corte Inglés: Sala 5: 5ª 6ª Sábado 2ª num cinema em que os efeitos estão Canino 3ª 4ª 15h15, 18h30, 21h30, 00h25 Domingo 11h30, Mostra de Cinema ao Ar Livre comovente sobre a mortalidade, o ao serviço de um processo de Kynodontas fim da inocência, a passagem à idade 15h15, 18h30, 21h30, 00h25; UCI Dolce Vita Tejo: recontar o reconhecível. De 30/07 08/08, 22h Sala 9: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 15h, 18h15, 21h20 6ª De Yorgos Lanthimos, Ver www.cineclubefaro.blogspot.com/ adulta, o poder da imaginação – em Sábado 15h, 18h15, 21h20, 00h25; ZON Lusomundo Interessante e divertido. com Christos Stergioglou, Michelle Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª suma, tudo aquilo que faz de nós Mário Jorge Torres Valley, Aggeliki Papoulia, Christos humanos, transposto para 13h20, 16h50, 21h, 00h10; ZON Lusomundo Largo da Oliveira Amoreiras: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, Passalis, Mary Tsoni, Anna Guimarães brinquedos que só são inanimados 17h30, 21h20, 00h20; ZON Lusomundo É Muito Rock, Meu! Kalaitzidou. M/18 CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª Maldito United para quem nunca brincou. Não é o Get Him to the Greek De Tom Hooper, 2009, M/12 melhor Pixar de sempre, mas isso é 12h40, 16h30, 21h10, 00h20; ZON Lusomundo Colombo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45, De Nicholas Stoller, Mnnnn 10/08, 21h45 só botar defeito num dos melhores 17h30, 21h, 00h10; ZON Lusomundo Dolce Vita com Jonah Hill, Russell Brand. M/16 Tudo Pode Dar Certo filmes do ano – bastaria a última Miraflores: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 15h, Lisboa: Medeia King: Sala 1: 5ª Domingo 3ª 4ª De Woody Allen, 2009, M/12 meia hora para “Toy Story 3” entrar 18h30, 21h50; ZON Lusomundo Odivelas Parque: 5ª 13h45, 15h45, 17h45, 19h45, 21h45 6ª Sábado 2ª Domingo 2ª 3ª 4ª 13h20, 17h, 21h 6ª Sábado MMnnn 13h45, 15h45, 17h45, 19h45, 21h45, 00h15 11/08, 21h45 de peito feito no cânone. J. M. 13h20, 17h, 21h, 00h10; Lisboa: UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 7: 5ª 6ª Porto: Arrábida 20: Sala 12: 5ª 6ª Sábado Claustros do Sábado 2ª 3ª 4ª 14h20, 16h50, 21h45, 00h15 “Canino” não deixa grandes Domingo 2ª 3ª 4ª 14h10, 17h25, 21h05, 00h10; A Domingo 11h30, 14h20, 16h50, 21h45, 00h15; ZON hipóteses ao espectador Arrábida 20: Sala 13: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª Convento Do Carmo Lusomundo Alvaláxia: 5ª 2ª 3ª 4ª 14h, 16h40, Tavira Origem 3ª 4ª 15h, 18h20, 21h35, 00h40; Vivacine - Maia: desprevenido: ou se ama, entrando 19h05, 21h45 6ª Sábado Domingo 14h, 16h40, Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 6ª MOSTRA CINEMA NÃO Inception 19h05, 21h45, 00h15; ZON Lusomundo na pretensão de fazer artístico, ou se 17h20, 21h, 00h10; ZON Lusomundo Dolce Vita De CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª odeia, porque nada faz sentido, EUROPEU (Ar livre e cópias em Porto: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, 13h, 15h30, 18h50, 21h20, 23h45; ZON Lusomundo 35mm) Christopher 17h10, 21h, 00h10; ZON Lusomundo GaiaShopping: porque a alegoria da Colombo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h45, 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h40, 15h45, De 6 a 16 Agosto, 21h30 Nolan, 18h15, 00h20; ZON Lusomundo Almada Fórum: 5ª desestruturação familiar nos surge 18h40, 21h40, 00h35; ZON Lusomundo Mais info.: www.cineclube- com 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h10, 18h50, metida pelos olhos dentro com a MaiaShopping: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 17h, tavira.com 21h30, 00h10 21h10 6ª Sábado 13h40, 17h, 21h10, 00h30; ZON subtileza de um elefante em loja de Reservas: 281 Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª Sábado Domingo Porto: Arrábida 20: Sala 4: 5ª 6ª Sábado Domingo porcelanas, embora a querer 320 594 | 96 2ª 3ª 4ª 14h, 17h30, 21h20, 00h20; ZON 2ª 3ª 4ª 13h45, 16h30, 19h15, 22h, 00h45; ZON parecer sofisticado. Procurámos 520 91 98 | 93 Lusomundo NorteShopping: 5ª 6ª Sábado Lusomundo GaiaShopping: 5ª 6ª Sábado 473 43 30 ou Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 17h10, 20h45, 24h; ZON Domingo 2ª 3ª 4ª 21h50, 00h20; ZON Lusomundo desafiar o maniqueísmo que o filme por e-mail: Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª Sábado MaiaShopping: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, propõe; procurámos, mas não cinetavira@ Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, 17h20, 21h30, 00h25; 15h50, 18h30, 21h30 6ª Sábado 13h10, 15h50, conseguimos. Tudo é tão moralista, gmail.com Castello Lopes - 8ª Avenida: Sala 4: 5ª Domingo 2ª 18h30, 21h30, 00h20; ZON Lusomundo 3ª 4ª 12h40, 15h30, 18h20, 21h10 6ª Sábado 12h40, NorteShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª em última análise, tão a armar ao 15h30, 18h20, 21h10, 24h 21h10, 00h05 4ª 00h05; ZON Lusomundo Parque pingarelho do estranho e do Nascente: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 22h30 original, que em vez de resultar na Não se espere de “A Origem” nem a diferença descamba no estrutura perfeita e artificiosa de Torna-se muito fácil odiar “Get Him programático, só que disfarçado de “Memento” (2000), nem o lado to the Greek” (o título português é produto reciclado para Cinema Não é o melhor Pixar de sempre, sonâmbulo e prospectivo de pateta), se nos limitarmos a lê-lo consumidores inteligentes de Verde mas é um dos melhores fi lmes do ano: “Insónia” (2002), embora se como uma comédia estúpida, festival. M.J.T. Viana mais adulto e mais extraordinário reconheça, sempre a Christopher histérica e previsível: o modo de Praça 1º de Maio, Centro do que 99 por cento da fi cção em imagem real Nolan um impecável contornar a escatologia primária Comercial - Viana do Castelo profissionalismo e uma capacidade passa por sublinhar o politicamente O Segredo Dos para organizar o plano e para dirigir incorrecto, por ver nas entrelinhas Seus Olhos actores. Um pouco como acontecia (mesmo quando não identificamos De Juan José em “O Cavaleiro das Trevas” (2008), todas as piscadelas de olho ao Campanella, 2009, o realizador parece limitar-se (e não mundo do “pop-rock”) das M/16 é pouco) a gerir um entretenimento desventuras de um agente de uma “Canino”, um elefante 12/08, 21h45 bem construído. E, no entanto, estrela decadente. Não estamos a em loja de porcelanas reconhecemos o gosto pela narrativa afirmar que se trata de um grande labiríntica, pelo jogo de peripécias filme, muito longe disso, mas até o que resiste a qualquer sinopse lado de reportagem semi-televisiva,

46 • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • Ípsilon VINCENZO PINTO/ AFP VINCENZO PINTO/

Mike Leigh: um dos universos mais coerentes do actual cinema europeu

DVD Desespero, palavra-chave neste olhar lúcido mas desencantado: “A Vida é Doce”, “Nu”, “Raparigas de sucesso” Cinema Os desordeiros eram os actores pelo meio de todo o breu, um filme David Thewlis e Ewen Bremner, o de um humor hilariante, negro e senhor cinquentão era Leigh, não quase desesperado. Contraluz Leigholândia, havia câmara a filmar — tratava-se de Desespero, aliás, é palavra-chave Backlight uma improvisação preliminar das para perceber o olhar lúcido mas De Fernando Fragata, anos 90 personagens que ambos os actores desencantado que Leigh lança com Joaquim de Almeida, Scott viriam a interpretar em “Nu”. repetidamente sobre as novas Bailey, Evelina Pereira. M/12 A cena surge realmente no filme e classes trabalhadoras; muito visível Três fi lmes para começar a o episódio é exemplar do modo em “Nu”, ele surge mascarado em a como Leigh constrói o seu trabalho. “A Vida É Doce” (1990) pela reconstruir o percurso de Começa por trabalhar aparente alegria e boa disposição e Lisboa: CinemaCity Alegro Alfragide: Sala 4: 5ª 6ª um dos grandes cineastas individualmente com os actores na optimismo que esconde a luta 2ª 3ª 4ª 13h30, 20h05, 22h10, 00h15 Sábado Domingo 11h30, 13h30, 20h05, 22h10, 00h15; ingleses contemporâneos. construção de personagens que em diária por uma vida melhor de uma CinemaCity Beloura Shopping: Sala 2: 5ª 6ª Jorge Mourinha seguida coloca em situações família suburbana. Imediatamente Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 23h45; ZON Lusomundo improvisadas, a partir das quais anterior a “Nu”, é dos três o único Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, 16h30, 19h20, 22h, 00h20; ZON Lusomundo A Vida é Doce estrutura o guião definitivo que é que nunca viu estreia em Portugal e Amoreiras: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª depois filmado o mais próximo está mais próximo da imagem que 13h10, 15h50, 18h30, 21h30, 24h; ZON Lusomundo Life Is Sweet CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª de Mike Leigh, com possível das improvisações temos do Leigh centrado na família, 13h20, 15h50, 18h30, 21h, 23h40; ZON Lusomundo Alison Steadman, originais. São criações colectivas — que filmes posteriores como Colombo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, como o confirma uma “companhia” “Segredos e Mentiras” e “Tudo ou 15h30, 17h50, 21h05, 23h30; ZON Lusomundo Dolce Jim Broadbent, Vita Miraflores: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 15h30, Timothy Spall regular de actores ao longo dos Nada” cristalizaram. Aqui, ele 18h30, 21h30 6ª Sábado 15h30, 18h30, 21h30, anos, alguns dos quais encontramos começa por aplicar as regras 00h30; ZON Lusomundo Odivelas Parque: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 15h30, 21h50; ZON mmmnn repetidos nestes três filmes — que formais da televisão para Lusomundo Oeiras Parque: 5ª 6ª Sábado vêm não apenas da intensa lentamente as forçar, em termos de Domingo 2ª 3ª 4ª 13h20,16h, 18h40, 21h20, 23h55; Sem Extras ZON Lusomundo Vasco da Gama: 5ª 6ª Sábado consciência de classe do cineasta de ritmo e construção, para lá dos seus Domingo 2ª 3ª 4ª 12h55, 15h30, 18h10, 21h40, Nu Manchester (forte activista político limites, construindo um filme que 00h05; ZON Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª respira como cinema sem esquecer Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h20, 18h10, Naked de esquerda), mas também da sua 21h20, 23h45 de Mike Leigh, com experiência como dramaturgo e a dívida do cineasta ao pequeno Porto: ZON Lusomundo Dolce Vita Porto: 5ª 6ª David Thewlis, encenador. O resultado são filmes écrã (a que os constrangimentos de Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h20, 17h30, Lesley Sharp, que erguem o estandarte do financiamento o forçaram durante 19h45, 22h, 00h20; ZON Lusomundo GaiaShopping: realismo social britânico mas que os anos 1980). 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h05, 15h30, Katrin Cartlidge 18h20, 21h10, 24h; ZON Lusomundo NorteShopping: não o fazem do modo habitual. Já “Raparigas de Sucesso” (1997) 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h, mmmmn A começar pela sensação que um é um Leigh menor, em parte porque 18h50, 21h20, 23h50; ZON Lusomundo Parque filme de Leigh não tem nunca uma veio a seguir a dois clássicos (“Nu” e Nascente: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, Sem Extras 16h, 18h10, 22h20, 00h35 progressão narrativa convencional a obra-prima “Segredos e Raparigas – por muito que haja um princípio e Mentiras”), em parte pela modéstia Há uma fronteira entre o de sucesso um fim, nunca há uma resolução das suas ambições. A história de amadorismo e a indigência. Career Girls tradicional. Nada de finais felizes e duas antigas colegas de faculdade “Contraluz” parte de um projecto muitas vezes nem um final preciso, que se reencontram para um fim- (meio perverso, meio ingénuo) de mmnnn porque a vida continua e nunca de-semana após seis anos sem se relação com o público português. respeita as unidades de tempo verem oscila entre um presente Sem Extras Visto que este público não se aristotélicas nem a compressão rodado de modo sóbrio e um identifica com o que normalmente Todos Midas necessária para hora e meia. É por passado feito de flashbacks lhe mostram os filmes portugueses, Filmes isto que, no seu melhor, os filmes frenéticos rodados em câmara à pretende dar-lhe aquilo que ele de Leigh sugerem um período de mão, mas a inteligência do realmente reconhece: a paisagem Imagine o leitor que está a passar tempo passado a viver com as suas tratamento e das interpretações americana e a língua inglesa com por uma rua de Londres quando dá personagens, sem distanciamento não evita a sensação de um esforço pronúncia americana. Dá-lhe isso, por duas pessoas a gritarem uma nem olhar clínico: são filmes que que ficou a meio caminho. de facto, mas depois não tem meios com a outra com ar de quem vai observam sem julgar, que vêem Equivalentes às edições inglesas nem estaleca para o passo seguinte: desatar à porrada (ou coisa pior), e pelos olhos daqueles que seguem. do Channel 4 de 2008, nenhum dos emular os códigos do filme médio que a coisa cresce de tal modo que Os três filmes agora distribuídos DVDs traz extras e as transcrições e americano de factura industrial, os vizinhos começam a meter-se ao em DVD equivalem a três pontos legendagens sao tecnicamente nem os narrativos, nem as suas barulho e chamam a polícia, até que precisos de uma carreira, e ao correctas, embora se sintam na convenções de realismo, nem coisa surge um cinquentão de barba e mesmo tempo que são exemplares tradução falhas pontuais que uma nenhuma. Mas justificar a pobreza cabelos brancos e acaba com tudo do método Leigh, revelam a revisão atenta não teria deixado de “Contraluz” com um num instante com meia dúzia de inteligência de um cineasta que, passar. São, de qualquer maneira, voluntarismo a que faltam apenas os palavras mágicas. Pode estar em oriundo da televisão e do teatro, põe edições importantes para descobrir meios é ignorar o fundo da questão: Londres, mas está na verdade na o seu estilo ao serviço da história. um dos universos mais coerentes do sim, com mais dinheiro Fragata teria Leigholândia, o universo que o “Nu” (1993) é um filme nocturno actual cinema europeu e um dos actores melhores, se calhar um realizador, encenador e dramaturgo de interiores cinzentos e exteriores mais estimulantes realizadores argumento decente, um inglês Mike Leigh construiu surreais. Contando a via sacra de britânicos contemporâneos, envolvimento técnico (do som à pacientemente ao longo dos anos. um niilista de Manchester que vem esperando que os restantes filmes montagem) mais convincente. A cena aconteceu realmente. Foi a Londres fugir de si mesmo para desta fase do cineasta (entre os Mudaria isso o essencial do que aqui contada há meses num artigo do perceber que não consegue, é quais “Segredos e Mentiras” e o se propõe como “mundo” e como jornal inglês “The Guardian” e teve escuro, negro, apocalíptico, brutal, grande “Topsy-Turvy”) venham “cinema”? Luís Miguel Oliveira lugar numa rua de Londres em 1992. confrontacional, desconfortável e, também a ser lançados.

Ípsilon • Sexta-feira 6 Agosto 2010 • 47