PROPOSTA DE CRIAÇÃO DO PARQUE NACIONAL

ANÁLISE E CONSIDERAÇÕES

Cuiabá – MT, Janeiro de 2006

Apoio:

WWF-Brasil Programa de Áreas Protegidas e Apoio ao ARPA

Av. José Estevão Torquato, nº 999 Jd Vitória Cuiabá-MT CEP:78055-100 Av. Ariosto da Riva, nº 3473 Centro -MT CEP: 78580-000 Fone: (65) 3641-1550 (66) 3521-8555 www.icv.org.br [email protected]

Este documento apresenta informações básicas a respeito da proposta de criação do Parque Nacional Juruena, no norte de e sul do Amazonas.

Contém:

1. O processo de criação e a situação atual ...... 3 2. Justificativas para a criação da Unidade de Conservação...... 9 3. Breve histórico e contexto da região (municípios do norte de MT)...... 17 4. Considerações e propostas sobre a criação do Parque ...... 23

Índice de figuras, quadros e tabelas:

Figura 1 : Proposta preliminar do Parque Nacional Juruena ...... 4 Figura 2 : Proposta do Parque Nacional Juruena (mapa preliminar - ainda não oficializado)...... 5 Figura 3 : Áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade na Amazônia...... 9 Figura 4 : Área de transição entre florestas úmidas, florestas secas e cerrados ...... 10 Figura 5 : Projeto de Zoneamento Sócio-Econômico-Ecológico de Mato Grosso ...... 12 Figura 6 : Corredor de Conservação da Amazônia Meridional ...... 13

Quadro 1: Belezas cênicas do “Pontal de Apiacás” ...... 11 Quadro 2: Impactos antrópicos no “Pontal de Apiacás” ...... 15

Tabela 1: Superfície do Parque Nacional Juruena e dos municípios abrangidos...... 6 Tabela 2: Cálculo da Receita de ICMS Ecológico atual e com a criação do Parque...... 16 Tabela 3: IDH...... 19 Tabela 4: Indicadores sócio-econômicos ...... 19 Tabela 5: Produção extrativa vegetal (m³) ...... 20 Tabela 6: Dinâmica de desmatamento na região do Pontal de Apiacás ...... 21 Tabela 7: Áreas protegidas nos municípios...... 22

Documento elaborado com base num estudo sócio-econômico da área, realizado pelo ICV entre agosto e outubro/ 2005 pelo ICV em parceria com o WWF-Brasil/ Programa de Áreas Protegidas e Apoio ao ARPA, visando fornecer subsídios ao processo de criação da Unidade de Conservação proposta pelo Governo Federal. O estudo incluiu uma revisão bibliográfica e levantamento de dados sócio-econômicos relevantes; montagem da base cartográfica da área (Laboratório de SIG do ICV); realização de um sobrevôo, reconhecimento de campo via terrestre e contatos com partes interessadas.

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1. O processo de criação e a situação atual a) Etapas anteriores A região Norte de Mato Grosso e Sudeste do Amazonas se caracteriza por sua grande riqueza de biodiversidade, e foi considerada prioritária desde as primeiras propostas de conservação em larga escala para a Amazônia, em particular no projeto Parques e Reservas do Programa-Piloto para Proteção das Florestas Tropicais Brasileiras – PPG7 (1997). Pertence a um dos cinco corredores da Amazônia desenhados no projeto Corredores Ecológicos do Ministério do Meio Ambiente, com o nome de “Corredor dos Ecótones1 Sul Amazônicos”, que se estende desde o Estado de Rondônia até o Estado do Tocantins. Nesse contexto, a criação de um Parque Nacional abrangendo a área entre os rios Juruena e Teles Pires, no extremo norte de Mato Grosso, e a extremidade sudeste do Amazonas, vem sendo estudada desde o ano 2002, quando foi proposta pela primeira vez.

A proposta ficou em aberto até o final de 2004, quando o IBAMA oficializou a intenção de se criar o Parque Nacional do Juruena, com cerca de 3 milhões de hectares, abrangendo parte dos municípios de Apiacás, Aripuanã, Cotriguaçu e – MT, e Maués e Apuí – AM. Concomitantemente, o Governo do Amazonas decretou a criação do Mosaico de Unidades de Conservação do Sul do Amazonas, com um total de 9 Unidades de Conservação, sendo duas de Proteção Integral (2 Parques Estaduais) e sete de Uso Sustentável (4 Florestas Estaduais, 2 Reservas de Desenvolvimento Sustentável e 1 Reserva Extrativista), possui um total de 3,070 milhões de hectares2, ficando parcialmente sobrepostos com a proposta original do Parque Nacional (Figura 1).

Foi necessário ampliar o diálogo com a sociedade local e entre governo federal e governos estaduais, sendo realizadas algumas reuniões nesse sentido ao longo de 2005.

1 Ecótone ou ecótono é uma área de tensão ecológica, isto é, uma área de transição entre diferentes tipos de biomas ou ecorregiões, onde os mesmos se interpenetram, geralmente apresentando alta biodiversidade. 2 Na justificativa pela criação do mosaico, o órgão ambiental estadual do Amazonas coloca: “Foram criadas nove unidades de conservação estaduais no Sul do Amazonas, que juntas totalizam 3.070.058 hectares. Estas áreas formam um mosaico de unidades de conservação com diferentes propostas de manejo e tem por objetivo frear o desmatamento e a grilagem de terras que se expande, de forma agressiva, do Mato Grosso em direção ao Estado do Amazonas. (...) A criação deste mosaico de unidades de conservação no Sul do Estado é uma das ações de ordenamento territorial mais efetivas já tomadas durante os últimos anos para conter a expansão desenfreada e irracional da fronteira do desmatamento na Amazônia. O desafio para os próximos anos é orientar e apoiar a população rural na adoção de atividades econômicas mais vantajosas, baseadas no uso sustentável da floresta. Além disso, o mosaico permite resgatar o compromisso assumido pelo Brasil, junto à comunidade internacional, em ampliar a rede de áreas protegidas para conter a perda da diversidade biológica, criando uma importante barreira à expansão da frente de desmatamento e degradação ambiental.” (www.sds.am.gov.br) 3

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Fonte: Ibama, 2004 Figura 1 : Proposta preliminar do Parque Nacional Juruena

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b) Proposta atual A proposta atual ainda não foi oficializada, porém numa configuração provável, a área possui aproximadamente 1,85 milhão de hectares (18,5 mil km2): • A porção mato-grossense, com aproximadamente 1,27 milhão de hectares, engloba a área do “Pontal de Apiacás”, entre os rios Teles Pires e Juruena, incluindo a Reserva Ecológica Apiacás, e ainda o Parque Estadual Igarapés do Juruena, confrontando a leste com as Terras Indígenas Kayabi e Munduruku, e a oeste com o Mosaico do Sul do Amazonas. • A porção amazonense, com aproximadamente 0,6 milhão de hectares, corresponde à área da proposta inicial que não foi abrangida pelo Mosaico de UCs estaduais, situada na margem esquerda do rio Tapajós, ao sul da rodovia Transamazônica. Também pode ser incluída parte da Flona Jatuarana, emendando com o PE Sucunduri (Figura 2).

Fonte: ICV, 2005 Figura 2 : Proposta do Parque Nacional Juruena (mapa tentativo)

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A maior parte da área proposta está no município de Apiacás – MT, representando 53% da área total do Parque e 48% da área total do município (Tabela 1).

Município Área do Parque Área total (mil Porcentagem da Porcentagem da (mil hectares) hectares) área do município área do Parque Apiacás – MT 982 2.036 48% 53% Aripuanã – MT 99 2.768 3,6% 5% Cotriguaçú – MT 131 916 14% 7% Nova Bandeirantes – MT 59 960 6,1% 3% Apuí – AM 322 5.404 5,9% 17% Maués – AM 254 3.999 6,3% 14% Total 1.847 100% Fonte: ICV, 2005 – Análise dos dados do IBAMA e IBGE Tabela 1: Superfície do Parque Nacional Juruena e dos municípios abrangidos c) O Parque Nacional Juruena no atual contexto político Governo Federal A criação do Parque Nacional Juruena é uma prioridade declarada do Ministério do Meio Ambiente – MMA, e se inscreve nas metas do Programa Áreas Protegidas da Amazônia – ARPA, uma estratégia de criação e implantação de unidades de conservação de larga escala na Amazônia liderada pelo Governo Federal, em parceria com o Ibama e os órgãos ambientais estaduais, tendo apoio do WWF-Brasil, Banco Mundial/GEF, FfW/GTZ, Funbio, entre outros. O ARPA tem como objetivo “conservar uma amostra ecologicamente representativa da diversidade biológica do bioma amazônico, triplicando a área sob proteção legal e específica na Amazônia brasileiras, atingindo 12% da região protegida em parques e reservas”. Tem como metas principais, em 10 anos: • 28,5 milhões de hectares (285 mil km2)) de novas unidades de conservação de proteção integral; • 9 milhões de hectares (90 mil km2) de novas unidades de conservação de uso sustentável; • Consolidar mais 1,25 milhão de hectares (125 mil km2) de unidades de conservação de proteção integral preexistentes; • Estabelecer o Fundo de Áreas Fundiárias; • Estabelecer o sistema de monitoramento da conservação. Portanto, no caso do Parque Nacional Juruena como em outros recentes na Amazônia, não se trata apenas da criação de uma Unidade de Conservação “no papel”, pois existem recursos para apoiar os custos dos processos de implantação inicial, planejamento e consolidação das áreas criadas, bem como a sua manutenção em longo prazo, através do Fundo de Áreas Protegidas. Além disso, o programa também prevê o desenvolvimento das capacidades das equipes gestoras, dos conselhos de gestão, e o fortalecimento dos espaços de participação da sociedade local.

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Subsidiariamente, vale destacar que, em relação ao ARPA, os Governos devem fazer a sua parte: criação das UC’s, regularização fundiária (importante no caso do ParNa Juruena) e alocação de pessoal suficiente para sua gestão adequada. Estado de Mato Grosso A criação do Parque na área de Mato Grosso tem apoio do órgão ambiental estadual. Após a divulgação dos dados alarmantes do desmatamento em Mato Grosso em 2004 e a realização da Operação Curupira, deflagrada em junho/2005, que provocou a extinção da FEMA (antigo órgão ambiental estadual de Mato Grosso), hoje substituído pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente – SEMA, com equipe renovada, o Governo de Mato Grosso vem operando uma mudança importante na política ambiental do Estado. Uma das primeiras medidas, envolvendo o MMA e a SEMA, foi celebrar em 02/setembro/2005 um acordo de cooperação técnica envolvendo uma pauta extensa de temas a serem trabalhados em conjunto (14 pontos), incluindo a retomada da agenda de criação de unidades de conservação3. O Parque Nacional Juruena, em pauta nas negociações desde final de 2004, ao qual o MMA/Ibama atribui grande importância, e reconhecido como área prioritária para a conservação pelo Governo de Mato Grosso, figura naturalmente em primeiro lugar na lista de UC’s a serem criadas. Por outro lado, existem resistências à proposta do Ibama por parte de alguns setores políticos do Estado, mesmo se todos concordam com a importância e necessidade de conservação da área. A Prefeitura Municipal de Apiacás apresentou ao Ibama uma proposta alternativa, em abril/2005, reduzindo a área total a ser conservada e propondo que a maior porção fosse criada como UC de uso sustentável (para exploração florestal). Com essa base, e diante da perspectiva de efetivar a criação do Parque Nacional, a Assembléia Legislativa de MT está propondo a criação de uma Floresta Estadual (e/ou Parque Estadual). Estado do Amazonas A área abrangida no Estado do Amazonas, estando inserida na faixa de 100 km em torno de uma rodovia federal (no caso, a BR-230), é de domínio federal, deixando maior autonomia ao Governo Federal para decidir sobre a sua destinação. A UC proposta é bastante favorável ao Estado do Amazonas, pois virá consolidar o mosaico criado em final de 2004. As justificativas apresentadas pela Secretaria de Desenvolvimento Sustentável do Estado do Amazonas (órgão ambiental estadual) para criação do referido mosaico, demonstram a preocupação em assegurar a proteção dessa região: “Estas áreas formam um mosaico de unidades de conservação com diferentes propostas de manejo e tem por objetivo frear o desmatamento e a grilagem de terras que se expande, de forma agressiva, do Mato Grosso em direção ao Estado do Amazonas. (...) A criação deste

3 Além desse acordo guarda-chuva, também foi assinado na mesma data um termo de cooperação técnica específico para a gestão florestal compartilhada, que transfere ao Estado, a partir de janeiro/2006, a responsabilidade da gestão florestal – licenciamento, monitoramento e fiscalização do desmatamento e da exploração florestal (incluindo ATPF´s e Planos de Manejo Florestal). Um segundo passo importante dado pelo Governo de Mato Grosso foi a aprovação, em dezembro/2005, de dois textos de lei de grande importância, a reforma do Código Ambiental Estadual, e a Lei da Política Florestal. 7

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mosaico de unidades de conservação no Sul do Estado é uma das ações de ordenamento territorial mais efetivas já tomadas durante os últimos anos para conter a expansão desenfreada e irracional da fronteira do desmatamento na Amazônia. (...) Além disso, o mosaico permite resgatar o compromisso assumido pelo Brasil, junto à comunidade internacional, em ampliar a rede de áreas protegidas para conter a perda da diversidade biológica, criando uma importante barreira à expansão da frente de desmatamento e degradação ambiental.” (www.sds.am.gov.br) d) Consulta Pública O aviso de Consulta Pública visando à criação da unidade (sem informações específicas sobre a proposta) foi encaminhado pelo Ibama e publicado no Diário Oficial da União no dia 26/12/2005:

“AVISO DE CONSULTA PÚBLICA: O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, de acordo com o disposto no art. 22, § 2o- e 3o- , da Lei no- 9.985, de 18.07.2000, torna público que está estudando a criação de unidades de conservação de proteção integral abrangendo áreas nos Estados do Amazonas, Mato Grosso e Rondônia e que realizará reuniões de consulta pública para apresentar e discutir as propostas nas datas e locais seguintes: 1. Dia 17 de janeiro de 2006, na cidade de Apiacás - MT, para apresentar e discutir a proposta de criação do Parque Nacional do Juruena; 2. Dia 19 de janeiro de 2006, na cidade de Apuí - AM, para apresentar e discutir a proposta de criação do Parque Nacional do Juruena; 3. Dia 21 de janeiro de 2006, na cidade de Humaitá - AM, para apresentar e discutir a proposta de criação de unidade de conservação de proteção integral na região de campos e florestas entre o rio Machadinho e a rodovia Transamazônica. Valmir Ortega – Diretor de Ecossistemas”

As datas das Consultas Públicas foram remarcadas para os dias 15/02/06 em Apiacás - MT e 17/02/06 em Apui - AM.

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2. Justificativas para a criação da Unidade de Conservação

Entre os fatores que justificam a necessidade de criação dessa Unidade de Conservação, destacam-se a importância biológica e riqueza em belezas cênicas da área e o seu papel fundamental na consolidação do Corredor de Conservação da Biodiversidade da Amazônia Meridional, e, por outro lado, as ameaças que a cercam e os limitantes naturais a um eventual aproveitamento para fins agropecuários. Além disso, a sua criação irá gerar novas fontes de recursos diretos para os municípios mato- grossenses abrangidos pela proposta, por conta do mecanismo de ICMS Ecológico em vigor no Estado, além de representar uma oportunidade de desenvolvimento sustentável, através do ecoturismo. a) Importância para a conservação da biodiversidade Em função da alta biodiversidade e elevado risco de intensificação da pressão antrópica, essa área foi classificada como “de extrema importância para a conservação da biodiversidade” pelo PROBIO/ Seminário de Macapá (Figura 3).

Fonte: Consulta de Macapá - PROBIO/MMA, 1999 Figura 3 : Áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade na Amazônia

A paisagem da região não é composta por uma cobertura homogênea de floresta densa, mas por contatos entre cerrados, florestas secas e florestas úmidas (Figura 4). Essa característica contribui sobremaneira para a riqueza e diversidade biológica da área. Ao mesmo tempo, essa paisagem típica da área de transição entre os biomas Cerrado e Floresta Amazônica é

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precisamente aquela que está sendo posta sob maior pressão de desmatamento pelo avanço da fronteira agrícola, especialmente no norte do Estado de Mato Grosso.

Ecorregiões

Florestas úmidas

Florestas secas

Cerrado

Fonte: ICV, 2005, com base em informações do WWF (mapa das ecorregiões) Figura 4 : Área de transição entre florestas úmidas, florestas secas e cerrados

De acordo com informações divulgadas pelo Ibama na internet (ver consulta – dez/2004), a importância biológica da área é identificada como extrema para a proteção de mamíferos, devido à alta diversidade de espécies em geral e grande importância para primatas (17 espécies de macacos, pertencentes a 10 gêneros diferentes) e espécies ameaçadas, endêmicas e raras. Para aves, a importância é identificada como muito alta, enquanto para peixes e outros grupos da biota aquática é mapeada como de importância extrema, pois protege rios que drenam o planalto cristalino (Escudo Brasileiro) com corredeiras e cachoeiras, um dos tipos de ambientes- chave que abrigam espécies endêmicas e sustentam uma grande biomassa de peixes. Esta mesma importância biológica extrema é reconhecida para os répteis e anfíbios. b) Belezas cênicas A área do Pontal de Apiacás possui belezas cênicas ímpares, incluindo o percurso do próprio Rio Juruena, mas também trechos da Serra de Apiacás, áreas de cerrado e de floresta (Quadro 1).

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Quadro 1: Belezas cênicas do “Pontal de Apiacás”

Cachoeira Salto Augusto (Rio Juruena) Transição entre floresta e cerrado

Ilha no Rio Juruena Florestas de terra firme

Serra dos Apiacás (limite sul do Parque)

Fotografias: Gustavo V. Irgang/ ICV 11

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c) Indicação para criação de UC no ZSEE-MT A porção mato-grossense também é indicada para criação de Unidade de Conservação de Proteção Integral pelos estudos do Zoneamento Sócio-Econômico-Ecológico do Estado de Mato Grosso (ZSEE – MT) (Figura 5).

Fonte: SEPLAN – MT, 2005 Figura 5 : Projeto de Zoneamento Sócio-Econômico-Ecológico de Mato Grosso

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d) Localização no Corredor de Conservação da Biodiversidade da Amazônia Meridional Além de sua riqueza e importância própria, a área possui localização estratégica no Corredor de Conservação da Biodiversidade da Amazônia Meridional – um gigantesco mosaico de áreas protegidas que estende desde as margens do Rio Madeira no norte de Rondônia e sul do Amazonas até a bacia do Xingu no Mato Grosso e Pará (Figura 6). Esse corredor tem um papel fundamental na contenção do avanço do desmatamento, funcionando como uma barreira ao deslocamento da fronteira agrícola do norte de Mato Grosso para as áreas relativamente bem conservadas do sul do Pará e sudeste do Amazonas4. Nesse contexto, o Parque Juruena constitui uma peça-chave para impedir a entrada potencial do vetor de ocupação irregular de terras (grilagem) e desmatamento na ponta do extremo norte de Mato Grosso – uma ameaça muito concreta e atual.

Frentes de desmatamento

Fonte: ICV, 2005 – Elaborado a partir das bases oficiais do IBAMA, FUNAI, FEMA e SEPLAN Figura 6 : Corredor de Conservação da Amazônia Meridional

4 O corredor tem se tornado uma ferramenta privilegiada nas estratégias de mitigação da fragmentação de habitats e de conservação da biodiversidade; porém, o conceito de corredor ainda possui várias interpretações. Enquanto alguns estudos utilizam o termo “corredor” como faixas de vegetação ligando blocos maiores de habitats nativos, está usado neste caso o conceito de uma unidade de planejamento regional da conservação da biodiversidade, que compreende uma rede de áreas protegidas (os elementos mais importantes da estratégia de conservação) e um mosaico de múltiplos usos da terra com diferentes graus de utilização e ocupação humana. 13

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e) Ameaças concretas sobre a área Até o momento, a área destinada à criação do Parque encontra-se bem conservada, com índices mínimos de desmatamento, em função de sua dificuldade de acesso e do relativamente baixo potencial de aproveitamento agropecuário. Porém, existem sinais e ocorrências concretas de ocupação irregular, especialmente na porção norte de MT, gerando altos riscos de comprometimento irreversível da sua integridade ambiental no curto prazo. • Atualmente, o acesso à área ainda é limitado. O acesso pelo sul se faz por uma estrada de trafegabilidade reduzida e sazonal, tendo uma distância de aproximadamente 100 km do núcleo urbano de Apiacás; já o acesso à porção central do Pontal de Apiacás se faz somente de barco (pelo Rio São Tomé) ou de avião (uma pista de pouso). Além disso, a área sul do Pontal apresenta um relevo acidentado (ao longo da Serra dos Apiacás), assim como um potencial de aproveitamento agropecuário relativamente baixo, pelas características dos solos (bastante arenosos). • De fato, até mesmo entre os proprietários privados de áreas no Pontal de Apiacás, a maioria tem destinado as mesmas para servir de reserva, realizando muitas vezes a compensação de reserva legal com outras áreas na região norte de Mato Grosso. Além disso, registra-se também duas Reservas Particulares do Patrimônio Natural – RPPN’s totalizando 4 mil hectares. • Paralelamente, a extração madeireira e o desmatamento em larga escala, que ocorrem em toda a região norte de Mato Grosso, ainda não alcançaram essa área, onde se registra um índice de desmatamento acumulado de apenas 0,6% (6.800 hectares) na porção mato- grossense. Além disso, esse desmatamento está distribuído entre alguns pequenos focos isolados entre si. • Por outro lado, trata-se de vastas porções de terra desocupadas onde os proprietários – sejam eles públicos ou privados – não têm assegurado efetivamente as suas posses (com exceção da faixa sul do Pontal), deixando a área altamente suscetível à ocupação irregular especulativa (grilagem). A área central do Pontal, de muito difícil acesso até para os seus proprietários, já está sendo objeto de ocupação por posseiros, evidenciada pela abertura de picadões de divisa e focos de desmatamento isolados. Além disso, apesar do quase colapso da atividade garimpeira, ainda existem alguns focos localizados de garimpo, gerando significativos impactos ambientais (Quadro 2). • Portanto, é uma situação crítica que requer medidas imediatas por parte do Poder Público no sentido de assegurar a proteção da área. Nesse sentido, a criação de uma Unidade de Conservação constitui a alternativa preferencial de curto prazo, pelo fato de minorar imediatamente os interesses especulativos sobre a área.

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Quadro 2: Impactos antrópicos no “Pontal de Apiacás”

Área degradada pelo garimpo (próximo dos limites do Parque proposto, na margem direita do Rio Juruena)

Foco de desmatamento na margem do Rio São João, porção sul da área

Foco de desmatamento na margem do Garimpo de draga ativo, na confluência Rio São Tomé, na área central do Pontal dos Rios Teles Pires e Juruena

Fotografias: Gustavo V. Irgang/ ICV 15

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f) ICMS Ecológico Com o mecanismo de ICMS Ecológico em funcionamento no Estado de Mato Grosso, os municípios do extremo norte mato-grossense serão beneficiados com um aumento de R$ 110 mil mensais no repasse de ICMS5, sendo o município de Apiacás o principal beneficiário potencial. Em função da existência de unidades de conservação e terras indígenas em seu perímetro, o município de Apiacás já recebe mensalmente R$ 73 mil a título de ICMS Ecológico (correspondente a 32% do repasse total de ICMS pelo Estado). Quanto ao município de Cotriguaçú, recebe R$ 79 mil de ICMS Ecológico (também 32% do total do repasse). Já Nova Bandeirantes, não tendo áreas protegidas definidas, atualmente não tem repasse de ICMS Ecológico. Com a criação do Parque Nacional Juruena, a arrecadação de ICMS do município de Apiacás pode ter um incremento significativo, em torno de R$ 95 mil mensais, correspondendo a um aumento de 41% no repasse de ICMS total. Para o município de Nova Bandeirantes, o incremento está calculado em R$ 15 mil mensais (9% de aumento). Já os municípios de Cotriguaçú e Aripuanã não teriam incremento, pois a área abrangida pelo Parque já se encontra protegida atualmente (Tabela 2).

Apiacás N. Bandeirantes Cotriguaçú Área total (mil ha) 2.036 960 916 Áreas Protegidas (mil ha) Coef. Atual Novo Atual Novo Atual Novo RE Apiacás 1,0 109 TI Kayabi 0,7 467 467 TI Escondido 0,7 169 169 RPPN 0,20 16 PE Igarapés Juruena 0,7 129 PARNA Juruena 0,7 982 59 131 Total áreas protegidas (mil ha) 592 1.449 59 298 303 Áreas protegidas / área total (%) 29% 71% 0% 6% 32% 33% Área não UC ou TI (mil ha) 1.444 587 960 901 618 613 ICMS Ecológico (R$ mil/mês) 73 168 0 15 79 80 Repasse total ICMS (R$ mil/mês) 231 327 172 187 243 244 Incremento receita (R$ mil/mês) 95 15 1 Incremento receita de ICMS (%) 41% 9% 1% Fontes: Análise ICV, outubro/2005, dados da SEMA, SEFAZ e AMM Tabela 2: Cálculo da Receita de ICMS Ecológico atual e com a criação do Parque

5 O Estado de MT foi entre os primeiros estados a implantar um mecanismo de ICMS Ecológico, determinando que 5% do total de repasse de ICMS aos municípios seja função da proporção da área de Unidades de Conservação e Terras Indígenas, sendo aplicado a cada UC ou TI, para efeito de cálculo, um coeficiente de correção variando de acordo com o grau de proteção. 16

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3. Breve histórico e contexto da região (municípios do norte de MT) a) Processo de ocupação e formação territorial Povos indígenas A região dos rios Teles Pires e Juruena era tradicionalmente ocupada por povos indígenas Kayabi e Apiaká. Ambos os povos tiveram contatos com os seringueiros que foram chegando à região a partir do final do século XIX, foram dizimados no início do século XX, e têm conquistado progressivamente o reconhecimento dos seus territórios desde a década de 40. Os índios Kayabi, até aproximadamente a década de 1940 ocupavam uma extensa faixa de terra no médio Teles Pires. Resistiram à ocupação de suas terras pelas empresas seringalistas, na última década do século XIX. Contudo, aos poucos a área Kayabi foi sendo ocupada e os índios induzidos para o trabalho nos seringais. Na época da colonização, a Expedição Roncador-Xingu, comandada pelos irmãos Villas-Bôas, promoveu a integração passiva nos seringais e a transferência para o Parque Indígena do Xingu. Porém, parte deles resistiram e permaneceram na região. O povo Kayabi hoje residente na região, que conta com uma população de pouco mais de 200 pessoas, habita uma aldeia situada na margem direita do Rio Teles Pires, na Terra Indígena Kayabi, inicialmente declarada e homologada com superfície de 117 mil hectares em 1982. A partir de 1987, os Kayabi passaram a discutir a ampliação da área, que foi declarada pelo Ministério da justiça em 2002, aguardando homologação e demarcação. Existe um litígio judicial e um conflito de ocupação na porção mato-grossense, onde empreendimentos agropecuários e madeireiros têm intensificado os desmatamentos, totalizando 24 mil hectares em 2004. Os Apiaká vivem no norte do Estado de Mato Grosso. Eram um povo numeroso, constituindo uma aldeia de até 1.500 pessoas, além de outras também populosas (há informação de 2.700 Apiaká em meados do século XIX). Em 1912, a população em contato com os brancos foi reduzida a 32 pessoas, devido a um massacre e ao conseqüente afastamento de parte dos sobreviventes, os quais presumivelmente formaram um grupo arredio, cuja população é desconhecida. Atualmente, os Apiaká encontram-se dispersos ao longo dos grandes cursos fluviais Arinos, Juruena e Teles Pires, parte deles residindo em cidades como , Porto dos Gaúchos e Cuiabá. A maior parte de sua população encontra-se aldeada na Terra Indígena Apiaká-Kayabí, cortada pelo rio dos Peixes, porém outra parte (aproximadamente 70 pessoas) reside na TI Kayabi. Desde aproximadamente o ano 2000, reivindicaram o reconhecimento de uma terra indígena na área do Pontal. Tiveram diversos conflitos e incidentes com ocupantes da região, especialmente o proprietário de uma pousada situada na foz do rio São Tomé. Povos ribeirinhos As margens do rio Juruena são abundantes em seringais e castanhais nativos. O extrativismo vegetal propiciou, a partir do final do século XIX, a implantação espontânea de vários pequenos povoados nessa rota de comunicação com o Pará. Essa atividade foi sendo abandonada ao longo da segunda metade do século XX. Atualmente, permanece a vila denominada “Barra”, na

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confluência dos rios Teles Pires e Juruena, com aproximadamente 30 famílias, cuja maioria tem uma participação (recente) na atividade garimpeira. Colonização e formação dos municípios Os municípios de Apiacás, Nova Bandeirantes e Cotriguaçú foram oriundos de projetos de colonização privados, na década de 80, destinados a acolher colonos da região sul do país. A colonização de Apiacás deu-se através da INDECO, e a criação do município ocorreu em 06/07/88, pela Lei Estadual nº 5.322; já Nova Bandeirantes foi formada pela Colonizadora Bandeirantes, que iniciou na década de 80 a abertura da MT-208, sendo o município emancipado pela Lei nº 5.903, de 20/12/91; quanto a Cotriguaçu, foi colonizado pela Cotriguaçu Colonizadora do Aripuanã S/A, componente da Cooperativa dos Triticultores de São Miguel do Iguaçu, do Paraná, sendo que os trabalhos de infra-estrutura viária e de topografia tiveram início em 1984, e a criação do município se deu pela Lei Estadual nº5.912, de 20/12/91. Assentamentos e estrutura fundiária Os municípios mato-grossenses abrangidos pela UC proposta têm a grande maioria de suas terras sob domínio privado, e apresentam uma concentração muito elevada da posse da terra, especialmente Apiacás e Nova Bandeirantes. No Censo Agropecuário de 1996, os estabelecimentos rurais patronais representavam 17% do número e 82% das áreas registradas em Apiacás, 9% do número e 92% das áreas em Nova Bandeirantes e 6% do número e 48% das áreas em Cotriguaçú, com áreas médias de 2,4, 6,1 e 1,1 mil hectares respectivamente. Existem 6 projetos de Assentamentos da Reforma Agrária nesses municípios, quase todos posteriores a 1995, totalizando 3.360 famílias (na data de sua criação), sendo 237 em Apiacás, 1.531 em Nova Bandeirantes e 1.592 em Cotriguaçu. A distância entre esses assentamentos e o limite da Unidade de Conservação é superior a 50 km, com exceção do Assentamento Nova Cotriguaçú, cujo limite norte está a menos de 10 km no limite do Parque proposto (onde a área já é Parque Estadual). A região norte de MT tem sido palco de conflitos fundiários. No município de Apiacás em particular, grandes proprietários de fazendas não residem no local, trazendo pouco movimento à economia local. Em função da dificuldade de manter uma presença em áreas tão extensas e distantes, várias propriedades privadas já foram ocupadas, gerando diversos conflitos. População O conjunto dos três municípios conta atualmente com 26 mil habitantes, sendo aproximadamente 6,5 mil em Apiacás, 8,5 mil em Nova Bandeirantes e 11 mil em Cotriguaçu6. A população de Apiacás é majoritariamente urbana (67%) e está praticamente estável desde 1996, após uma queda ocorrida em conseqüência do colapso da atividade garimpeira em 1992 – ao contrário de Nova Bandeirantes e Cotriguaçu, que têm tido um crescimento demográfico significativo (5,3% e 6,6% ao ano entre 2000 e 2004, respectivamente) e ainda possuem uma população majoritariamente rural (73% e 56%, respectivamente).

6 Prefeitos da região contestam esses números, considerando-os subestimados, com base no número de eleitores do derradeiro pleito. 18

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b) Realidade sócio-econômica dos municípios do extremo norte mato-grossense Indicadores sócio-econômicos Os principais indicadores sócio-econômicos revelam essa região do extremo norte mato- grossense ainda está muito carente. Os municípios abrangidos pela proposta possuem um nível de desenvolvimento humano abaixo da média estadual (IDH entre 0,70 e 0,72 contra média estadual de 0,77). O componente renda puxa os municípios da região para baixo no ranking, enquanto a educação está acima da média estadual (Tabela 3).

IDH - MUNICIPAL IDH- Ranking Municípios Renda Longevidade Educação Médio Estadual Mato Grosso 0,718 0,740 0,741 0,773 Alta Floresta 0,704 0,753 0,879 0,779 24º Cotriguaçu 0,678 0,728 0,756 0,721 80º Apiacás 0,659 0,698 0,783 0,713 92º Nova Bandeirantes 0,606 0,704 0,796 0,702 102º Fonte: Fonte: PNUD/IPEA/FJP/IBGE, 2003 Tabela 3: IDH

O PIB/ habitante dos três municípios abrangidos pela proposta está entre R$ 2,7 e 3,0 mil, contra média estadual de R$ 4,9 mil. O município com índices sociais mais baixos é Apiacás, com 21% de analfabetismo e 0,5% dos domicílios com abastecimento de água (Tabela 4).

% Domicílios c/ PIB / % Município PIB (R$ 1000) abastecimento de habitante (R$) Analfabetismo água Alta Floresta 180.024 3.834 11,9 28,9 Apiacás 18.553 2.786 21,4 0,5 Nova Bandeirantes 20.742 3.021 15,2 23,6 Cotriguaçu 23.272 2.744 16,0 2,8 Mato Grosso 12.236.900 4.886 15,8 63,7 Fonte: SEPLAN/FIBGE/TRE/DATASUS/Atlas do Desenvolvimento Humano - 2000 Tabela 4: Indicadores sócio-econômicos

Atividades econômicas A economia dos municípios dessa região, atualmente, é baseada na extração e beneficiamento primário de madeira, pecuária extensiva de corte e agricultura familiar, com diferenças de importância dessas atividades entre os municípios. A atividade madeireira ocupa lugar de maior destaque em Apiacás, enquanto a pecuária e a agricultura familiar são dominantes em Nova Bandeirantes (neste município, especialmente com a produção de café), tendo-se em Cotriguaçú uma situação intermediária.

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A extração madeireira teve um forte crescimento em Apiacás nos últimos anos. Segundo dados do IBGE7, passou de 4,9 mil para 77 mil m3/ano entre 1996 e 2003. No mesmo período, a produção de Alta Floresta caiu de 80 para 11 mil m3/ano, mostrando claramente a dinâmica da frente madeireira rumo ao extremo norte mato-grossense8. Paralelamente, o rebanho bovino aumentou significativamente em todos os municípios da região no período recente, sendo que entre os municípios abrangidos pela proposta do Parque, Nova Bandeirantes está com o maior número de cabeças (170 mil) e Cotriguaçú teve o maior crescimento médio anual entre 1996 e 2003 (24% a.a.) – Tabela 5.

Madeira em tora (m³) Rebanho bovino (mil cabeças) Municípios Crescimento Crescimento 1996 2003 médio anual 1996 2003 médio anual

Alta Floresta 80.314 11.466 -24,3% 484 657 +4,5%

Apiacás 4.945 77.138 +48,1% 44 127 +16,4% Cotriguaçu 76.194 57.598 -3,9% 18 83 +23,8%

Nova Bandeirantes 3.315 25.203 +33,6% 55 169 +17,2%

Fonte: Adaptado de IBGE/SIDRA Tabela 5: Produção extrativa vegetal (m³)

A extração mineral (garimpo de ouro) já teve papel central na economia de vários municípios do extremo norte de Mato Grosso. O fluxo intenso de migrantes, majoritariamente oriundo do Nordeste, modificou radicalmente a estrutura social dos municípios em formação, sendo Apiacás um dos mais fortemente afetados pelo ciclo de crescimento acelerado e colapso da atividade garimpeira, no início da década de 90. Na época do auge do garimpo, a população (em boa parte sem domicílio fixo) chegou a contar com mais de 10 vezes o valor atual. Essa história acarretou conseqüências sobre a estrutura sócio-econômica e cultural da região que se fazem sentir até hoje. Em termos de impactos ambientais, há uma área extensa degradada pelo garimpo no perímetro do Parque, correspondente ao antigo Garimpo Salto Augusto, próximo à foz do Rio São João; além disso, há três áreas com degradação de grande escala próximo ao limite do Parque proposto, na porção sul da área do projeto Planalto Juruena (Garimpos Juruena, Novo Astro e Clareira). Esses garimpos não se encontram totalmente desativados, continuando parcialmente suas atividades. No encontro das águas entre o Rio Juruena e o Rio Teles Pires, encontram-se diversos flutuantes com garimpos de draga no rio.

7 Refletindo apenas uma parcela dos valores reais, porém reveladores de tendências 8 Existem hoje 20 indústrias madeireiras em Apiacás e 15 em Nova Bandeirantes; desse total, apenas 16 (46%) estavam em atividade em setembro/2005, o restante sendo paralisadas por conta dos desdobramentos da Operação Curupira (não liberação de ATPFs). 20

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Quanto ao turismo, já existem algumas iniciativas isoladas (pousadas com pista de pouso própria, no Salto Augusto, na Foz do Rio São Tomé e na Foz do Rio Santa Rosa), ligadas à existência de atrativos excepcionais, porém as mesmas não têm contribuído para movimentar significativamente a economia local. Atualmente, os municípios do Pontal, em particular Apiacás, não apresentam infra-estrutura suficiente para o desenvolvimento do turismo.

Esses dados demonstram que o crescimento econômico desses municípios está fortemente ligado ao desmatamento, caracterizando uma situação não sustentável em médio prazo, não somente do ponto de vista ambiental, como também social e econômico. c) Dinâmica de desmatamento O desmatamento na região tem tido uma dinâmica acelerada, especialmente nos anos 2003 e 2004. No espaço de 2 anos, o município de Nova Bandeirantes converteu 58,4 mil hectares (584 km²) de florestas em pastagens, correspondendo a 6,2% do seu território. No mesmo tempo, Apaicás e Cotriguaçu desmataram 54,6 e 45,3 mil hectares, respectivamente (Tabela 6). Verificou-se que um município como Alta Floresta, de formação e ocupação mais antigo, continua apresentando taxas altas de desmatamento (34,7 mil hectares, 3,9% do seu território no mesmo período), alcançando um desmatamento acumulado de 50% da sua superfície, demonstrando a importância de ações concretas de contenção nas áreas de fronteira.

Até 1997- 2000- 2001- 2002- 2003- Total

1997 2000 2001 02 03 04 acumulado Área (km²) 596 221 72 252 334 212 1.687 Apiacás % do território 2,9 1,1 0,4 1,2 1,6 1,0 8,3 Nova Área (km²) 993 359 76 184 226 358 2.196 Bandeirantes % do território 10,4 3,8 0,8 1,9 2,4 3,8 23,0 Área (km²) 329 247 93 127 256 197 1.250 Cotriguaçu % do território 3,5 2,6 1,0 1,3 2,7 2,1 13,2 Área (km²) 3.203 468 281 131 125 222 4.430 Alta Floresta % do território 35,8 5,2 3,1 1,5 1,4 2,5 49,5 Fonte: ICV, 2005 – Análise realizada com base nos dados do PRODES e DETER, fornecidos pelo INPE Tabela 6: Dinâmica de desmatamento na região do Pontal de Apiacás d) Impactos potenciais da criação do Parque As áreas protegidas existentes (Unidades de Conservação e Terras Indígenas), somando com a unidade proposta, ocupam uma porção significativa do município de Apiacás (71%), e porções menores dos municípios vizinhos, o que motivou a preocupação de que o Parque pudesse “inviabilizar” a economia daquele município.

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Densidade demográfica Observa-se que o município de Apiacás, mesmo com a criação do Parque, ainda permanece com uma área de 580 mil hectares (5.800 km²) não coberta por áreas protegidas, comparável com a média dos demais municípios da região9, e com densidade demográfica baixa (Tabela 7).

Área no Densidade Área total % Área do Município Nome da Área município demográfica (mil ha) município (mil Ha) remanescente10 TI Kayabi 474 23,2% RE Apiacás 109 5,3% Apiacás 2.036 RPPNs 4 0,2% 1,1 hab./ km² PN Juruena 982 48,2% Total11 1.454 71,4% Nova PN Juruena 59 6,1% 960 0,9 hab./ km² Bandeirantes Total 59 6,1% PE Igarapés J. 129 14,1% TI Escondido 169 18,4% Cotriguaçu 916 1,8 hab./ km² PN Juruena 131 14,3% Total12 300 32,7% Fonte: ICV, 2005 – Análise de dados do IBAMA e IBGE Tabela 7: Áreas protegidas nos municípios

Situação fundiária da área De acordo com dados do Instituto de Terra de Mato Grosso – Intermat, a área estaria composta essencialmente por propriedades privadas, tituladas pelo Intermat na década de 80. Caso essa informação for confirmada nos levantamentos detalhados que devem seguir a criação da unidade, o valor a ser desembolsado a título de indenização para a desapropriação das áreas privadas, necessária à implantação do Parque, poderia ficar muito significativo, especialmente considerando algumas grandes propriedades da faixa sul da área proposta, onde os proprietários privados têm posse efetiva da área. A regularização fundiária da UC poderia também ser realizada por meio do mecanismo de compensação de reserva legal, porém isso exigiria uma colaboração estreita entre governos federal e estadual para poder ser realizado. Portanto, a questão da estrutura fundiária e do mecanismo de indenização é um aspecto importante a ser tratado pelo Governo com prioridade.

9 Áreas não cobertas por UC’s ou TI’s em municípios vizinhos e da região (em mil há): Alta Floresta - 898; Paranaíta - 485; - 653; Nova Canaã - 599; Novo Mundo - 581; - 277. 10 População total do município / área não coberta por UC’s ou TI’s 11 A RE Apiacás e as RPPNs já estão incluídas nos 982 mil ha do Parque Nacional proposto 12 O PE Igarapés do Juruena está incluído na área do Parque proposto (não provoca incremento de áreas protegidas). 22

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4. Considerações e propostas sobre a criação do Parque

Considerações Propostas

O Parque não “inviabiliza” o município de Implantar ações de curto e médio prazo Apiacás, podendo inclusive representar uma visando apoiar a transformação do modelo de alternativa de desenvolvimento sustentável, desenvolvimento no entorno, podendo abordar porém a UC abrevia a reprodução do atual prioritariamente: modelo de “desenvolvimento”, baseado no uso - a questão fundiária urbana e rural predatório dos recursos naturais, e o (regularização de assentamentos) município está de fato precisando de políticas - o incentivo ao manejo florestal sustentável de desenvolvimento. - o apoio à agricultura familiar - o atendimento a necessidades básicas de infra-estrutura (estradas, comunicação, energia, entre outras), - o desenvolvimento do turismo.

A indicação de predominância de áreas Definir e comunicar o mecanismo de privadas indica a necessidade de averiguar a regularização fundiária/ indenização logo na validade da titulação das terras e definir o criação da unidade. mecanismo de indenização.

Existem ameaças concretas de avanço no Importância de efetivar rapidamente a criação. desmatamento e ocupação no curto prazo.

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