IHU da Constituição A gênesegolpista Romano Roberto Revista doInstituto Humanitas E MAIS Nº 428-AnoXIII30/09/2013ISSN 1981-8769 idolatria” verdade como “última de noslibertamosda Vattimo eanecessidade Thomas Guarino: 25 anosdaConstituição:

avanços elimites liberação davida não esgotouseupotencialde A Constituiçãode1988ainda Adriano Pilatti

sobre nosso tempo sobre nósmesmos e Para exercitaracrítica Karla SchuckSaraiva: ON-LINE

como Estadonacional A formulaçãodoBrasil Schwartzman Simon projeto de democracia fragilidades elimites do Manifestações expõem Dossiê:

25 anos da Constituição: avanços e limites

Editorial a celebração dos 25 anos José Murilo de Carvalho, mem- Dois pesquisadores abordam a de nossa Constituição Fe- bro da Academia Brasileira de Ciências questão dos direitos dos povos origi- deral, a revista IHU On- e da Academia Brasileira de Letras, nários. José Otávio Catafesto de Sou- NLine levanta a discussão sustenta que a aplicação dos direitos za, professor na Universidade Federal sobre o republicanismo, a democracia previstos constitucionalmente depen- do — Ufrgs, e Jana- e a cidadania brasileira - valores que de do aumento do nível de escolari- ína Campos Lobo, doutoranda em an- ainda hoje permanecem em constan- dade e de organização dos cidadãos. tropologia social pela mesma univer- te construção. Passar da letra da lei O cientista político Simon sidade, analisam, respectivamente, as para a efetividade da vida social exige Schwartzman faz uma abordagem problemáticas dos povos indígenas e forte pressão e mobilização política da mais ampla da formação do Brasil quilombolas. sociedade, processo no qual ainda es- como Estado e como tal racionalidade Thomas Guarino, autor do livro tamos imersos, buscando formas para contribui na construção social do país, Vattimo and Theology (London: T & concretizar os direitos que a Constitui- impactando diretamente na formula- T Clark International, 2009) e Karla ção reconhece e assegura. ção das leis constitucionais. Schuck Saraiva, professora da Univer- Roberto Romano, professor da André Luiz Olivier da Silva, pro- sidade Luterana do Brasil — Ulbra, são Universidade Estadual de Campinas fessor na Unisinos, analisa a Consti- mais duas entrevistas que debatem — Unicamp, considera que a convo- tuição tendo como ponto de partida temas da contemporaneidade. cação e a condução da Assembleia a questão da igualdade, que, para ele, Complementam esta edição o de- Constituinte foi marcada por práticas torna-se o valor incondicional da Car- poimentos de manifestantes que parti- tipicamente ditatoriais, algumas das ta Magna. ciparam das grandes mobilizações em quais resistem mesmo após a promul- José Carlos Moreira Filho, pro- junho, que ficaram conhecidas como gação da lei. fessor na Faculdade de Direito da Pon- o Outono Quente brasileiro. O assun- Para Adriano Pilatti, professor tifícia Universidade Católica do Rio to foi abordado com profundidade nas de Direito da Pontifícia Universidade Grande do Sul — PUCRS, contrapõe a Notícias do Dia, publicadas diariamen- Católica do Rio de Janeiro — PUC-Rio, ideia de que o povo brasileiro é aco- te na página do IHU, assim como nos a Constituição de 1988 tem um po- modado e considera que muitos dos Cadernos IHU Ideias 191, intitulado tencial de liberação da vida e de pro- avanços políticos no país se devem à #VEMpraRUA: Outono Brasileiro?. moção da igualdade que ainda não foi mobilização social. A todas e a todos uma boa leitura esgotado. e uma excelente semana!.

Instituto Humanitas REDAÇÃO Colaboração: César Sanson, Unisinos André Langer e Darli Sampaio, IHU Diretor de redação: Inácio do Centro de Pesquisa e Apoio Neutzling ([email protected]). IHU On-Line é a revista aos Trabalhadores – CEPAT, de Endereço: Av. Redação: Inácio Neutzling, semanal do Instituto Curitiba-PR. Unisinos, 950, Andriolli Costa Mtb 896/MS Humanitas Unisinos – IHU Projeto gráfico: Agência São Leopoldo/RS. ([email protected]), ISSN 1981-8769. Experimental de Comunicação CEP: 93022-000 Luciano Gallas Mtb 9660 IHU On-Line pode ser ([email protected]), da Unisinos – Agexcom. Telefone: 51 3591 1122 – ramal 4128. acessada às segundas-feiras, Márcia Junges Mtb 9447 Editoração: Rafael Tarcísio E-mail: [email protected]. no sítio www.ihu.unisinos.br. ([email protected]), Patrícia Forneck Sua versão impressa circula às Fachin Mtb 13.062 Atualização diária do sítio: terças-feiras, a partir das 8h, ([email protected]) e Inácio Neutzling, Patrícia Fachin, Diretor: Prof. Dr. Inácio Neutzling. www.ihu.unisinos.br na Unisinos. Ricardo Machado Mtb 15.598 Fernando Dupont, Mariana Gerente Administrativo: Jacinto ([email protected]). Staudt, Wagner Altes Morais da Schneider ([email protected]). Revisão: Carla Bigliardi Silva e Suélen Farias

2 Índice LEIA NESTA EDIÇÃO

TEMA DE CAPA | Entrevistas 5 Constituição 25 Anos:República, Democracia e Cidadania – programação 6 Roberto Romano: A gênese golpista da Constituição 14 Adriano Pilatti: “A Constituição de 1988 ainda não esgotou seu potencial de liberação da vida e de promoção da igualdade” 18 Simon Schwartzman: A formulação do Brasil como Estado nacional 24 André Luiz Olivier da Silva: A igualdade emergente da Constituição de 1988 28 José Murilo de Carvalho: Os desafios à construção da cidadania brasileira 30 José Carlos Moreira Filho: A memória política brasileira à luz da Constituição 38 José Otávio Catafesto: Povos originários e os entraves na efetivação de seus direitos constitucionais 46 Janaina Campos Lobo: O direito dos Quilombolas na Constituição

DESTAQUES DA SEMANA 51 Dossiê: Manifestações expõem fragilidades e limites do projeto constitucional- republicano de democracia 60 Estante: Thomas Guarino: Vattimo e a necessidade de nos libertamos da verdade como “última idolatria” 66 Destaques On-Line 68 Entrevista: Karla Schuck Saraiva: Para exercitar a crítica sobre nós mesmos e sobre nosso tempo

IHU EM REVISTA 72 Agenda de Eventos 72 Retrovisor www.ihu.unisinos.br 73 Publicação em Destaque: Ética e Intersubjetividade: a filosofia do agir humano segundo Lima Vaz 75 Sala de Leitura

twitter.com/ihu

http://bit.ly/ihuon

www.ihu.unisinos.br

3 Tema de Capa

Destaques da Semana

IHU em Revista www.ihu.unisinos.br

4 SÃO LEOPOLDO, 00 DE XXX DE 0000 | EDIÇÃO 000 T Constituição 25 Anos: República, ema de Capa Democracia e Cidadania

Instituto Humanitas Unisinos – IHU ção do Estado absoluto para o Estado liberal, realiza, entre os dias 2 de outubro e será discutido por pensadores de diversas O 19 de novembro de 2013, diversos áreas. Mais informações no link http://bit. debates sobre os 25 anos da Constituição ly/1bMX8eT. no Brasil. O documento, que marca a transi-

Programação Data: 02-10-2013 Data: 28-10-2013 Evento: A Constituição no Supremo Tribunal Federal: a Evento: Reconhecimento de culturas, direito à terra e a (des)construção da democracia brasileira Constituição Federal de 88. Palestrante: Prof. Dr. Adriano Pilatti – Instituto de Direito/ Mesa redonda com Prof. Dr. José Otávio Catafesto de Sou- PUC-Rio za – LAE/UFRGS e Profa. MS Janaina Campos Lobo – INCRA Horário: 17h30min às 19h – UFRGS. Local: Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU Horário: 20h às 22h Local: Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU Evento: Vivências e Reflexões sobre o Processo Consti- tuinte: o período pré e pós-Constituição Data: 31-10-2013 Palestrante: Prof. Dr. Adriano Pilatti – Instituto de Evento: A evolução processual, participação, represen- Direito/PUC-Rio tação e democracia progressiva a partir da Constituição Horário: 20h às 22h Federal de 1988 Local: Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU Palestrante: Prof. Dr. Luiz Werneck Vianna – PUC-Rio Horário: em definição Data: 03-10-2013 Local: Sala Ignácio Ellacuría e Companheiros, no IHU Evento: Constituição e Constituinte: limites, avanços, golpes e resistências Data: 06-11-2013 Palestrante: Prof. Dr. Dalmo de Abreu Dallari – USP Evento: Ética, Política e Constituição no Brasil: 25 anos Horário: 20h às 22h de avanços Local: Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU Palestrante: Prof. Dr. Roberto Romano – Unicamp Horário: 20h às 22h Data: 15-10-2013 Local: Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU Evento: Cidadania e Republicanismo no Brasil: um olhar a partir da Constituição Federal de 88 Data: 12-11-2013 Palestrante: Prof. Dr. José Geraldo de Sousa Júnior – UNB Evento: O direito e a memória no Brasil a partir da CF 88 Horário: 20h às 22h Palestrante: Prof. Dr. José Carlos Moreira da Silva Filho www.ihu.unisinos.br Local: Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU – PUCRS Horário: 20h às 22h Data: 21-10-2013 Local: Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU Evento: Impactos econômicos do Marco Constitucional no Brasil Data: 18 e 19-11-2013 Palestrante: Profa. Dra. Tania Bacelar de Araújo – UFPE Evento: III Seminário: Observatórios, Metodologias e Horário: 17h às 19h Impactos nas Políticas Públicas: Estado, Sociedade, De- Local: Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU mocracia e Transparência Programação completa no link http://bit.ly/1bMX8eT Data: 22-10-2013 Evento: A questão ambiental no Brasil e a Constituição Data: 19-11-2013 Federal hoje. Avanços e retrocessos Evento: CF, os Direitos Sociais e a cidadania Palestrante: Prof. MS André Lima – IPAM Palestrante: Profa. Dra. Maria da Gloria Gohn – Unicamp Horário: 20h às 22h Horário: 20h às 22h Local: Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU Local: Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 5 A gênese golpista da Constituição Para o professor Roberto Romano a convocação e a condução da Assembleia Constituinte foram marcadas por práticas tipicamente ditatoriais

Por Ricardo Machado ema de Capa T ulgo ser importante definir a gênese quando se tem em conta o tratamento dado dessa Constituição e a forma pela aos políticos. “Em uma república só existem Jqual ela foi elaborada. Ela não re- homens comuns”, dispara. “O cidadão é obri- “sultou de um movimento que expressasse a gado a respeitar um político corrupto que se soberania popular. No meu entender (muito chama de excelência e quem é honesto é des- pessoal) ela resultou de um verdadeiro golpe respeitado 24 horas por dia. Se a pessoa for de Estado dado pelo Congresso Nacional que de cor negra, mais desrespeitada ainda, se for se autoinstituiu com a condição da consti- pobre, mais ainda”, complementa. Para Roma- tuinte e autoconcedeu essa função, reunindo no, a perda de credibilidade dos poderes deri- parlamentares que passaram todo o regime va da falta de clareza das atribuições específi- ditatorial servindo ao governo autoritário”, cas dos operadores do Estado e, também, de sustenta o professor Roberto Romano, em uma postura mais crítica e autônoma. “Essa entrevista por telefone à IHU On-Line. De po- perda de credibilidade é uma questão central sições firmes e críticas, Romano estabelece quando não se tem a definição determinada um diálogo ao longo da entrevista trazendo dos poderes. É bom lembrar que no Nazismo, exemplos históricos desses últimos 25 anos por exemplo, todas as leis radicais, como a ra- de como a essa gênese golpista se transfor- cial, foram aceitas pelos tribunais alemães. E mou em realidade e de como essa marca da quando se tem juízes que se curvam à razão Constituição Federal aparece na nossa vida de Estado de quem está no poder, não existe cotidiana. Muitos dos problemas relativos à mais democracia, não existe mais república, Carta Magna surgem na própria concepção nem liberdade”, avalia. dela, como afirma o professor: “A Constitui- Roberto Romano cursou doutorado na ção como está, torna tudo muito confuso. É École des Hautes Études en Sciences Sociales urgente: todas as pessoas que se consideram — EHESS, França, e é professor de filosofia na republicanas e democráticas devem lutar Universidade Estadual de Campinas — Uni- pela convocação de uma assembleia nacional camp. Escreveu, entre outros, os livros Igreja constituinte da qual surja um documento que contra Estado. Crítica ao populismo católico respeite a soberania popular”. (São Paulo: Kairós, 1979), Conservadorismo O professor aponta como um dos princi- romântico (São Paulo: Ed. UNESP, 1997) e pais desafios à nossa democracia, justamen- Moral e Ciência. A monstruosidade no século te, a falta de republicanismo, onde as pes- XVIII (São Paulo: SENAC, 2002). soas são vistas de forma distinta, sobretudo Confira a entrevista.

IHU On-Line – Antes de entrar- oligarcas dominavam o Estado e a pequena reforma agrária — embora mos propriamente no tema da Cons- formulação das leis, controlavam as se discuta se foi mesmo uma reforma tituição, gostaria de contextualizar o magistraturas. Com isso tínhamos agrária ou não —, retirando dos gran- conceito grego de política? uma apropriação muito desigual da ri- 1 www.ihu.unisinos.br Quando queza e da justiça. Sólon iniciou uma Roberto Romano – um dos sete sábios da Grécia antiga, foi examinamos a história da Grécia, ve- compositor das elegias morais-filosóficas. mos que no início havia uma cultura Em sua obra, discutiu assuntos como o não igualitária. Os aristocratas e os 1 Sólon (638 a.C – 558 a.C): Legislador, declínio político, moral e econômico da jurista e poeta ateniense. Considerado Grécia antiga. (Nota da IHU On-Line)

6 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 des proprietários e nobres o direito grega uma fonte de inspiração, mas grande admirador dos dois, segue T de impor taxas de juro e outros privi- não idealizá-la excessivamente. essa linha. Então o que se tem é a ema de Capa légios. A reforma permitiu aos peque- consolidação da liberdade, a ideia do nos proprietários se espalharem pelo IHU On-Line – De que maneira contrato entre o povo e o governante. território. Isso possibilitou uma base o Iluminismo acabou influenciando a Assim, se o rei não é fiel ao contrato econômica muito forte à democracia democracia que temos hoje? ele pode perder o cargo e, inclusive, grega. Esses pequenos proprietários, Roberto Romano – O Iluminis- a vida. O grande texto que voltou à não mais aniquilados pelas dívidas, mo3 é bastante diverso. No movimen- questão da accountability é de John tinham o direito de prosperar e de to das luzes há uma forma na Ingla- Milton7, poeta republicano que, no exercer a cidadania. Com isso eles se terra, outra na França, outra na Itália texto sobre a manutenção dos cargos dirigiram a Atenas e aí, muitas vezes e outra ainda na Alemanha. Existem do rei e dos magistrados (The Tenure fizeram residência. Essa presença em tendências que são democratizantes e of King’s and Magistrates), diz que, se Atenas, por sua vez, transformou-se republicanas e outras conservadoras e o rei ou os ocupantes de cargo público em um instrumento de controle das monárquicas. O programa de governo não prestam contas, perdem o cargo. atividades do Estado. das luzes mais conhecido é o francês, Essa ideia percorre o pensamento do uma tradução para o pensamento do Diderot, mas não o de Voltaire8, Im- Eclésia continente europeu das ideias elabo- manuel Kant 9e outros. Há uma forte A assembleia — Eclésia — resul- radas na Revolução Inglesa do século ta da modificação econômica e jurí- XVII e, depois, pelo pensamento de escritor francês. A primeira peça impor- dica na Grécia. A ideia de igualdade, John Locke4 e Newton5. Diderot6, um tante da sua carreira literária é Lettres na democracia grega, resulta de uma sur les aveugles à l’usage de ceux qui voient, em que resume a evolução do seu ação de estadistas que definiram os 3 Iluminismo [Aufklärung]: Em portu- pensamento desde o deísmo até ao cep- novos rumos para a vida política. É guês, Esclarecimento, ou ainda, mais ticismo e o materialismo ateu, o que o bom não idealizar aquela democracia, corretamente, Iluminismo — movimento leva à prisão. Mas a obra da sua vida é a intelectual surgido na segunda metade edição da Encyclopédie (1750-1772), que pois sempre se disse, entre comen- do século XVIII (o chamado “século das leva a cabo com empenho e entusiasmo tadores e analistas, tratar-se de um luzes”) que enfatizava a razão e a ciên- apesar de alguma oposição da Igreja Ca- clube de cidadãos homens, excluindo cia como formas de explicar o universo. tólica e dos poderes estabelecidos. (Nota Foi um dos movimentos impulsionadores da IHU On-Line) uma quantidade imensa de escravos do capitalismo e da sociedade moderna. 7 John Milton (1608-1674): Escritor in- e mulheres. Então é preciso caute- Foi um movimento que obteve grande glês representante do classicismo. É au- la, pois muitas vezes as críticas feitas dinâmica nos países protestantes e len- tor do poema épico O Paraíso Perdido ta, porém gradual influência nos países (São Paulo: Martin Claret, 2002). 2 por Platão à democracia têm sólido católicos. O nome se explica porque os 8 Voltaire (1694-1778): pseudônimo de fundamento. Ocorreram muitos atos filósofos da época acreditavam estar ilu- François-Marie Arouet, poeta, ensaísta, tirânicos por parte da assembleia minando as mentes das pessoas. É, de dramaturgo, filósofo e historiador ilumi- certo modo, um pensamento herdeiro da nista francês. Uma de suas obras mais co- dos cidadãos iguais. Mas, apesar de tradição do Renascimento e do Humanis- nhecidas é o Dicionário Filosófico, escrito tudo, a democracia grega tem muito mo por defender a valorização do Homem em 1764. (Nota da IHU On-Line) a nos oferecer até hoje, sobretudo e da Razão. Os iluministas acreditavam 9 Immanuel Kant (1724-1804): Filósofo que a Razão seria a explicação para todas prussiano, considerado como o último em termos do princípio da responsa- as coisas no universo, e se contrapunham grande filósofo dos princípios da era mo- bilização. Um elemento importante à fé. (Nota da IHU On-Line) derna, representante do Iluminismo, in- é que para todo cargo público existia 4 John Locke (1632-1704): Filósofo in- discutivelmente um dos seus pensadores glês, predecessor do Iluminismo, que mais influentes da Filosofia. Kant teve um um exame anterior para saber se as tinha como noção de governo o consen- grande impacto no Romantismo alemão pessoas tinham competência e condi- timento dos governados diante da autori- e nas filosofias idealistas do século XIX, ções, inclusive éticas, para o exercer. dade constituída, e o respeito ao direito tendo esta faceta idealista sido um ponto natural do homem, de vida, liberdade e de partida para Hegel. Kant estabeleceu Quando a pessoa deixava o cargo ela propriedade. Com David Hume e Geor- uma distinção entre os fenômenos e a coi- também tinha que prestar contas. É ge Berkeley era considerado empirista. sa-em-si (que chamou noumenon), isto é, preciso, realmente, ter na democracia (Nota da IHU On-Line) entre o que nos aparece e o que existiria www.ihu.unisinos.br 5 Isaac Newton (1642-1727): Físico, as- em si mesmo. A coisa-em-si não poderia, trônomo e matemático inglês. Revelou segundo Kant, ser objeto de conhecimen- como o universo se mantém unido através to científico, como até então pretendera 2 Platão (427-347 a. C.): filósofo ate- da sua teoria da gravitação, descobriu os a metafísica clássica. A ciência se restrin- niense. Criador de sistemas filosóficos segredos da luz e das cores e criou um giria, assim, ao mundo dos fenômenos, e influentes até hoje, como a Teoria das ramo da matemática, o cálculo infinitesi- seria constituída pelas formas a priori Ideias e a Dialética. Discípulo de Sócra- mal. Essas descobertas foram realizadas da sensibilidade (espaço e tempo) e pe- tes, Platão foi mestre de Aristóteles. por Newton em um intervalo de apenas las categorias do entendimento. A IHU Entre suas obras, destacam-se A Repúbli- 18 meses, entre os anos de 1665 e 1667. On-Line nº 93, de 22-03-2004, dedicou ca (São Paulo: Editora Edipro, 2012) e o É considerado um dos maiores nomes sua matéria de capa à vida e à obra do Fédon (São Paulo: Martin Claret, 2002). na história do pensamento humano, por pensador com o título Kant: razão, liber- Sobre Platão, confira e entrevista As im- causa da sua grande contribuição à ma- dade e ética, disponível para download plicações éticas da cosmologia de Platão, temática, à física e à astronomia. O IHU em http://bit.ly/bXKKRR. Também sobre concedida pelo filósofo Prof. Dr. Marcelo promoveu, de 3 de agosto a 16-11-2005, Kant foi publicado este ano o Cadernos Perine à edição 194 da revista IHU On-Li- o Ciclo de Estudos Desafios da Física para IHU em Formação nº 2, intitulado Em- ne, de 04-09-2006,disponível em http:// o século XXI: uma aventura de Copérnico manuel Kant – Razão, liberdade, lógica e bit.ly/pteX8f. Leia, também, a edição a Einstein. Sobre Newton, em específico, ética, que pode ser acessado em http:// 294 da Revista IHU On-Line, de 25-05- o Prof. Dr. Ney Lemke proferiu palestra bit.ly/1ax2jPI. Confira, ainda, a edição 2009, intitulada Platão. A totalidade em em 21-09-2005, intitulada A cosmologia 417 da revista IHU On-Line, de 06-05- movimento, disponível em http://bit.ly/ de Newton. (Nota da IHU On-Line) 2013, intitulada A autonomia do sujeito, xdSEVn. (Nota da IHU On-Line) 6 Denis Diderot (1713-1784): Filósofo e hoje. Imperativos e desafios, disponível

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 7 corrente republicana nas Luzes, mas lamentarista — ideia geral das forças exerça seu múnus de maneira objeti- há também uma atitude mais cautelo- progressistas — e, no entanto, acabou va e inquestionável. Tanto é verdade, sa, conservadora, no movimento. misturando presidencialismo com que existe no plano eleitoral uma in- parlamentarismo, o que torna as pre- tromissão da Justiça em atribuições IHU On-Line – Tendo como base sidências da república praticamente que não são dela. No Maranhão a po- os 25 anos da Constituição brasileira, incapazes de governar, pois elas não pulação elegeu um governador, hou- que avanços podemos perceber na têm previsão de controle. Há um mis- ve uma acusação de fraude (alguns democracia nessas duas décadas e to de regimes porque com os plebis- eleitores teriam vendido o voto) e a meia? citos — se o país queria monarquia Justiça anula a eleição e coloca como Roberto Romano – Julgo impor- ou república e parlamentarismo ou governadora a senhora Roseane Sar- tante definir a gênese dessa Cons- presidencialismo — venceram a re- ney, segunda colocada, em vez de ou- tituição e a forma pela qual ela foi pública e o presidencialismo. Como vir o povo soberano do Maranhão. A elaborada. Ela não resultou de um se trata de uma república oligárquica, justiça tutela o eleitor e não respeita movimento que expressasse a sobera- temos no Congresso Nacional grupos a vontade popular. Por uma questão

ema de Capa nia popular. No meu entender (muito dirigentes que pressionam o poder de forma ela abole a soberania popu-

T pessoal) ela resultou de um golpe de Executivo. Existe uma força no Con- lar no Maranhão. Existem problemas Estado dado pelo Congresso Nacional gresso altamente explosiva em rela- como este pipocando pelo Brasil in- que se autoinstituiu como constituin- ção à presidência da República. Como teiro. A Constituição como está, torna te, reunindo parlamentares que pas- as prerrogativas quase imperiais do tudo muito confuso. Urge que todas saram o período ditatorial servindo presidente foram mantidas, o diálogo as pessoas que se consideram repu- ao governo autoritário. Portanto, par- entre Executivo e Legislativo se- tor blicanas e democráticas comecem a lamentares acostumados à servidão, na uma guerrilha perene. Quando se lutar pela convocação de uma assem- mas que foram escolhidos precipua- analisam as emendas constitucionais bleia nacional constituinte que redija mente para redigir a Constituição. A uma após a outra, percebe-se que são um documento que respeite a sobe- Carta, portanto, desde o início tem tentativas de impor as prerrogativas rania popular. uma história pouco edificante do pon- ou do presidente ou do Congresso. to de vista republicano e da soberania Uma das mais nocivas foi a emenda IHU On-Line – Quais são os limi- popular. da reeleição, que permitiu a Fernando tes de nossa atual Constituição? O Na constituinte havia oligarcas Henrique Cardoso10 mais um mandato que dela temos de efetivo em termos que serviram muito fortemente ao re- e que faz, agora, com que nossos pre- de soberania do povo? gime militar. Quando há essa reunião, sidentes da República, quando ainda Roberto Romano – Em grandes surgem duas tendências distintas em não terminaram seu primeiro manda- linhas existem princípios importantes, termos doutrinários. A que procurava to, estejam preocupados com o pa- sobretudo os que vieram da visão do definir os artigos da constituição em lanque e a demagogia para o segundo Estado Democrático de Direito. Lem- torno da noção de Estado de Direito mandato. Isso retira da presidência bro a ideia de autonomia, que per- e a do Estado Democrático de Direito. e do Congresso o tempo necessário meia muitos aspectos da Constituição São duas formas opostas de pensar. para se dedicar ao que é precípuo às moderna, sobretudo se pensarmos na A primeira tende a valorizar a pro- suas funções, ou seja, governar. vertente trazida por Immanuel Kant. priedade antes do ser humano. Na Isso significa autonomia do cidadão, segunda, são valorizados os direitos IHU On-Line – Que tensões se dos municípios, dos poderes entre das pessoas humanas antes e acima estabelecem entre os poderes Execu- si e da autonomia, por exemplo, do da propriedade. Ao longo da Cons- tivo, Legislativo e Judiciário no senti- Ministério Público — MP, que trouxe tituição há parágrafos que tendem a do de garantir um Estado democráti- tanto bem para o nosso Brasil e que valorizar a democracia e a soberania co de fato e não discursivo? Podemos foi ameaçado pelo Projeto de Emen- popular; e outros que tendem a defi- pensar em hierarquias dentro de tais da Constitucional — PEC 3711. A auto- nir o poder e a decisão, inclusive da esferas? nomia do MP vem reforçar a tese da Justiça, em favor dos proprietários. Do Roberto Romano – Quando a soberania popular porque coloca na ponto de vista social e programático, Constituição é uma colcha de retalhos mão do povo um instrumento de con- isso faz da Constituição um documen- de emendas, cuja origem política vem trole dos poderes. to heteróclito, sem unidade doutriná- de um golpe de Estado, cria-se para o ria interna. Judiciário um verdadeiro palimpsesto, Universidade um puzzle. Caso mantenha-se a Cons- A ideia de autonomia da univer- Parlamentarismo e tituição como está, a cada dia haverá sidade só está escrita no texto consti- presidencialismo mais dificuldade para que o Judiciário Outro elemento complicado na 11 PEC 37 [Proposta de Emenda Consti- história da Constituição é que ela tucional 37/2011]: Projeto do legislati- 10 Fernando Henrique Cardoso (1931): vo brasileiro de autoria de Lourival Men- www.ihu.unisinos.br surge tendo em vista um regime par- Sociólogo e político brasileiro. Foi des (PT do B) que, se aprovado, limitaria presidente do Brasil por dois mandatos, o poder de investigação criminal às po- entre 1995 e 2002. FHC é cofundador lícias federal e civil, retirando-o, entre em http://bit.ly/10v60Ch. (Nota da IHU do PSDB (Partido da Social Democracia outros, do Ministério Público. (Nota da On-Line) Brasileira). (Nota da IHU On-Line) IHU On-Line)

8 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 tucional, mas não foi implementada. documento que expressa o direito sas do Direito e as práticas dos -par T Boa parte da culpa não é apenas dos e o governado deve aceitar a norma lamentares e executivos brasileiros. ema de Capa governos ou dos parlamentares, mas elaborada e promulgada pelo Legis- Ainda levará tempo para amadurecer das próprias universidades federais. lativo e sancionada pelo Executivo; entre os operadores do Estado essas Os reitores não deixam de praticar a norma define o direito interpreta- novas concepções do Direito. É fun- atos ilegais, como assinar listas públi- do pelo tribunal constitucional. Essa damental que os nossos legisladores cas de apoio a candidatos à presidên- ideia permeia boa parte do trabalho não operem segundo parâmetros do cia da República. Em duas ocasiões jurídico. Há outra tendência trazida passado, mas assumam perspectivas eles fizeram essa façanha de desobe- por Carl Schmitt13 de que a Constitui- inovadoras. decer à lei de maneira evidente. Isso é ção expressa a vontade popular e não uma prática usual, em vez de brigarem se pode colocá-la sob o controle do IHU On-Line – Qual poder, no para garantir a autonomia universitá- tribunal constitucional, mas daquele caso brasileiro, pode ser apontado ria que lhes garanta direitos, mas im- que expressa a vontade soberana do como o guardião dos direitos consti- põe deveres, preferem uma audiência povo, o chefe do Estado. Essas duas tucionais? É possível pensar em um com o ministro da Educação para tro- perspectivas dominaram o século XX, ente estatal que seja o defensor da ca recíproca de favores políticos. Há inclusive no Brasil. Há vários fatos bra- Carta Magna? um atraso na normatização da Cons- sileiros orientados conforme essa ló- Roberto Romano – Se olharmos tituição, do ponto de vista da autono- gica. Francisco Campos14, que ajudou para todos os poderes brasileiros, mia universitária, que se deve tanto a elaborar todos os atos institucionais perceberemos falhas gritantes na ta- aos que exercem os cargos oficiais, do regime ditatorial, segue tal lógica. refa de ser o guardião da Constitui- quanto aos que exercem os cargos Essa forma de pensar, que define uma ção. Todo mundo conhece a história na própria universidade. Um número relação de vontade sobre a norma, do artesão prussiano que entrou em expressivo de universidades federais parece-me presente no Brasil. Há a querela com o rei Frederico, apelan- surgiu de pactos oligárquicos entre o necessidade de encontrar algo que do ao tribunal, e os juízes deram ga- poder central e poderosos regionais, não esteja tão comprometido, como nho de causa a ele. Foi daí que surgiu uma grande parte dos que comandam as duas perspectivas apresentadas. a interessante frase: “Ainda há juízes estão ligados umbilicalmente às oli- Nós já temos trabalhos elaborados em Berlim”. Nós, como cidadãos, sen- garquias regionais. com alternativas às duas perspectivas, timos a falta de proteção dos pode- tanto no plano internacional quanto res em relação aos nossos direitos. A Plebiscito nacional. Trabalhos como de Ronald Constituição de 1934 proibia o privilé- Existem possibilidades dentro da Dworkin15 abrem perspectivas inova- gio de foro e os tribunais de exceção. Constituição que podem ajudar mui- doras, mas ainda não chegaram aos O tribunal de segurança nacional, que to o exercício da democracia direta. A parlamentos, tanto regionais quanto causou malefícios até 1968 (o AI-5), hipótese do plebiscito, aventada pela nacional, e existe uma distância entre por introduzir na política interna do presidente da república, é um ponto o formulado nos cursos e nas pesqui- país uma ideia de segurança acima importantíssimo. Existem mecanis- dos direitos, foi declarado constitu- mos que podem ser acionados, porém cional pelo Supremo Tribunal Federal. se esses mecanismos integrarem uma a Teoria do Direito, principalmente, mas Isso teve consequências gravíssimas. Constituição mais coerente, que- sur também filosofia do direito, dogmática Quando Otávio Mangabeira16 foi pro- jurídica, especialmente quanto ao direi- ja da vontade da população por meio to constitucional e direito internacional, cessado por esse tribunal de segu- de uma assembleia nacional consti- além de obras propriamente políticas, fi- rança houve empate entre os juízes tuinte, parece-me que teremos mais losofia da justiça e sociologia. De sua au- e o presidente da corte votou contra toria citamos Teoria pura do Direito (São possibilidade de exercitar a soberania Paulo, Martins Fontes, 2000); A ilusão da o réu, escândalo inédito na história popular doravante. justiça (São Paulo: Martins Fontes, 2000); do direito. Veja como a cidadania fi- O que é justiça? (São Paulo: Martins Fon- cou vulnerável, sem a proteção do www.ihu.unisinos.br tes, 2001). (Nota da IHU On-Line) IHU On-Line – Em um artigo pu- 13 Carl Schmitt (1888-1985): Jurista e STF. Quando houve o golpe militar de blicado em junho, no Jornal O Esta- cientista político alemão. A IHU On-Line 1964, Hermes Lima17 e Evandro Lins nº 139, de 02-05-2005, publicou o artigo e Silva18, advogados e juízes íntegros, do de São Paulo, o senhor comenta O pensamento jurídico-político de Hei- que a Constituição está em farrapos. degger e Carl Schmitt. A fascinação por Do que exatamente o senhor está noções fundadoras do nazismo. (Nota da IHU On-Line) 16 Otávio Mangabeira [Octavio Man- falando? 14 Francisco Campos [Francisco Luís da gabeira] (1886-1960): Engenheiro, pro- Roberto Romano – Na vida ju- Silva Campos] (1891-1968): Advogado, fessor e político brasileiro. Atou como rídica moderna, existem pelo menos professor, jurista e político brasileiro. governador da Bahia e é membro da Aca- duas grandes tendências para expli- Responsável pela redação da Constitui- demia Brasileira de Letras. (Nota da IHU ção Brasileira de 1937 do Ato Institucio- On-Line) car a Constituição. A primeira é a de nal nº 1, do Golpe de 1964, e dos códigos 17 Hermes Lima (1902-1978): Político, Hans Kelsen12, para quem ela é um penal e processual brasileiro. (Nota da jurista, jornalista, professor e ensaísta IHU On-Line) brasileiro. Foi presidente do Supremo 15 Ronald Dworkin (1931): Filósofo do Tribunal Federal (STF) e membro da Aca- 12 Hans Kelsen: Jurista austríaco, autor Direito norte-americano, atualmente é demia Brasileira de Letras. (Nota da IHU da teoria pura do direito. De origem ju- professor na University College London On-Line) dia, foi perseguido pelo nazismo e fugiu e na New York University School of Law. 18 Evandro Cavalcanti Lins e Silva para os Estados Unidos. Sua obra abrange (Nota da IHU On-Line) (1912- 2002): Jurista, jornalista, escri-

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 9 foram cassados e o STF tudo aceitou, to de vista republicano. A Corte disse de todo o balcão tem um cartaz dizen- não houve contestação dessa ingerên- que, se não houvesse multa, o consu- do o seguinte: “desrespeito ao funcio- cia do poder Executivo ditatorial em midor brasileiro não economizaria e nário, tantos anos de cadeia”. Mas não relação ao Supremo. Houve aí uma si- não colaboraria com o governo. A cul- tem ao lado um cartaz do mesmo ta- tuação de fato em que a Constituição pa do apagão não foi do povo, porque manho dizendo “desrespeito ao cida- foi rasgada pelo poder ditatorial. o povo paga os impostos. A culpa foi dão, tantos anos de cadeia”. Isso mos- da falta de investimento no setor elé- tra bem a estrutura não republicana e Economia trico que exigia inversão de recursos, não democrática do Estado brasileiro. Os sucessivos planos econômi- novas tecnologias e tudo o mais que O cidadão é obrigado a respeitar um cos — plano Cruzado, plano Collor não foi feito. Em vez de culpabilizar político corrupto que se chama de ex- —, foram atos tirânicos (na definição quem era o culpado, o STF se voltou celência, e quem é honesto é desres- de Jean Bodin19, tirano é o que usa os contra a cidadania. É muito difícil ou- peitado 24 horas por dia. Se a pessoa bens dos outros como seus), não teve vir que o STF é o protetor da Consti- for de cor negra, mais desrespeitada nenhuma resposta do STF até agora. tuição, porque protegê-la significa ainda, se for pobre, mais ainda. Há

ema de Capa Os sucessivos planos econômicos, no proteger o autor dela, que é o povo. costumes que são feitos em nome 21 T meu entender, foram sucessivos gol- Isso é a decisão que Hobbes , no Le- da segurança, por exemplo, que são pes de Estado, pois feitos no segredo, viatã (São Paulo: Rideel, 2005), defi- verdadeiros atentados ao princípio anunciados de madrugada quando os ne de maneira magnífica — para que republicano. Não é possível entrar em jornais e a população não poderiam exista comunidade política é o povo muitos prédios sem tirar fotografia mais reagir, a Justiça não atendeu no que é o autor da lei. Os governantes e mostrar o RG. Isso é um atentado tempo certo, gerando atos absoluta- e os juízes são apenas os atores da ao direito de ir e vir. Não são somen- mente lesivos à sociedade sem ne- lei e, portanto, para agir precisam ser te prédios particulares, mas prédios nhuma proteção. autorizados pelo povo soberano. Essa públicos, e quando você questiona o O poder Executivo ainda guarda é uma visão que no Brasil está total- porquê do procedimento, justifica-se muitas prerrogativas do imperador, mente invertida. Quando se vê um que é em nome da segurança, o que tem-se a ideia de que ele é intangível. deputado ou um vereador que exige significa dizer que para aqueles- ser O ex-ministro Sepúlveda Pertence20 que um cidadão lhe chame de exce- vidores o cidadão é um bandido. São tem um trabalho sobre o impeach- lência, temos a inversão absoluta do medidas absolutamente antiéticas em ment. Ele mostra a dificuldade que princípio republicano. Essa inversão, termos republicanos. existe para impedir um presidente no que ocorre nos cargos mais baixos de Brasil. No caso do Collor, por exemplo, uma república, se repete de maneira IHU On-Line – Que conflitos éti- foi importante que ele não tivesse a fantástica na presidência do país. A cos se estabelecem na relação desar- famosa base de apoio parlamentar. presidência age como um imperador moniosa entre os poderes, embora Temos uma situação que na vida co- que controla um exército vencedor a Constituição sustente uma equi- tidiana e nos grandes atos do poder a que dita as regras para todos os Esta- dade entre Executivo, Legislativo e população fica desprotegida. dos brasileiros, de onde surge outra Judiciário? ficção, que são nossas federações. Roberto Romano – A indefinição Apagão Não somos federações, somos o im- da extensão e dos limites dos poderes Quando houve o apagão, du- pério do poder central. gera permanentes tentativas de pe- rante o governo Fernando Henrique quenos golpes de Estado e há a des- Cardoso, foi instituída uma multa ao Poderes confiança no exercício dos poderes. O consumidor e arguida a constituciona- Sempre que comento com es- mensalão toca problemas éticos gra- lidade junto ao STF, que por sua vez tudantes sobre a soberania popular, víssimos, pois trata-se de partido que deu uma sentença inaceitável do pon- sugiro que eles entrem em qualquer é bastante sufragado pelo eleitor, sen- repartição pública brasileira e olhem do que, durante boa parte do proces- atrás do balcão do funcionário. Atrás so até o julgamento, a sigla apregoou tor e político brasileiro. Foi procurador que se tratava de um golpe. Tal postu- geral da República, ministro do Supremo ra foi assumida inclusive pelo ex-presi- Tribunal Federal (STF) e membro da Aca- 21 Thomas Hobbes (1588-1679): Filósofo 22 demia Brasileira de Letras. (Nota da IHU inglês. Sua obra mais famosa, O Leviatã dente Luiz Inácio Lula da Silva , quan- On-Line) (1651), trata de teoria política. Neste 19 Jean Bodin (1530-1596): jurista fran- livro, Hobbes nega que o homem seja cês, membro do Parlamento de Paris e um ser naturalmente social. Afirma, ao 22 Luiz Inácio Lula da Silva (1945): professor de Direito em Toulouse. É con- contrário, que os homens são impulsio- Trigésimo quinto presidente da República siderado por muitos o pai da Ciência Polí- nados apenas por considerações egoístas. Federativa do Brasil, cargo que exerce tica devido a sua teoria sobre soberania. Também escreveu sobre física e psicolo- desde o dia 1º de janeiro de 2003. É Baseou-se nesta mesma teoria para afir- gia. Hobbes estudou na Universidade de cofundador e presidente de honra do mar a legitimação do poder do homem Oxford e foi secretário de Sir Francis Ba- Partido dos Trabalhadores (PT). Em 1990, sobre a mulher e da monarquia sobre a con. A respeito desse filósofo, confira a foi um dos fundadores e organizadores do gerontocracia. (Nota da IHU On-Line) entrevista O conflito é o motor da vida Foro de São Paulo, que congrega parte www.ihu.unisinos.br 20 Sepúlveda Pertence [José Paulo política, concedida pela Profa. Dra. Ma- dos movimentos políticos de esquerda da Sepúlveda Pertence] (1937): Professor ria Isabel Limongi à edição 276 da revista América Latina e do Caribe. Foi candidato e jurista brasileiro. Foi presidente do IHU On-Line, de 06-10-2008. O material a presidente cinco vezes: em 1989 Supremo Tribunal Federal entre 1989 e está disponível em http://bit.ly/gg- (perdeu para Fernando Collor de Mello), 2007. (Nota da IHU On-Line) mghe. (Nota da IHU On-Line) em 1994 (perdeu para Fernando Henrique

10 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 do afirmou que o mensalão seria uma profundamente os ímprobos, e eles T farsa. Quando se diz que um processo “Todo ser anunciaram que iriam diminuir ao má- ema de Capa judicial que está na mais alta Corte é ximo as determinações desta lei. Ha- uma farsa, assume-se que se trata de humano, toda via vontade de atenuar a lei da ficha um golpe. É desta falta de confiança limpa, que estava começando a pro- que surge a desarmonia, pois se o STF criança esteve duzir resultados, e os políticos chega- tivesse a confiança irrestrita da cida- ram a um ponto tal de arrogância que dania, essa acusação não teria senti- ligado à sua levantaram os ânimos da população. do, cairia por si mesma. A dificuldade A questão das manifestações é justa- em terminar esse julgamento mostra mãe, da qual mente o resultado do abuso do poder a desconfiança que paira sobre toda nos três setores do Estado. a instituição judiciária. Desconfiança foi separado, que também paira sobre o Congresso Poder Nacional, que está no ponto mínimo gerando queixas, Parece que toda essa celeuma de confiança da população, e também poderia ser melhorada, desde o pon- paira, agora, sobre o poder Executivo. sentimento de to de vista do popular ao do exercício Se não há a confiabilidade da palavra do poder, se houvesse uma lei de- dos operadores do poder nos três se- ser vítima, de mocratizando os partidos políticos. tores, não há a fé pública, e sem isso Nossos partidos políticos não são não há vida social garantida. ressentimento” democráticos, porque têm dirigentes que estão no poder há décadas, al- Collor guns há 40 anos. Seria urgentíssimo Voltemos ao caso do golpe de mas temos sinais muito importantes que houvesse uma lei que impedis- Collor. Se não há confiança de que a nas manifestações que ocorreram no se a direção partidária por mais de pessoa depositará o salário no banco e mês de junho. dois anos. Com o tempo, os dirigen- que vai recolhê-lo no mês que vem, se tes de partidos fazem relações, têm ninguém vai prestar contas do dinhei- o controle do fundo partidário, das IHU On-Line – As manifestações ro subtraído, se não há garantia, não doações, das candidaturas, dos pro- que tomaram as ruas do país em ju- há confiança no poder. Em um pro- gramas de governo — que são na nho reacenderam a centelha de uma cesso de inflação, por exemplo, muito verdade apenas cartas de intenção reforma política, o que ensejou um bem trabalhado por Elias Canetti23 em para enganar a Justiça —, têm con- discurso da presidente Dilma sobre (São Paulo: Companhia trole das alianças e dos cargos, ou Massa e poder uma possível reforma constituinte — das Letras, 2005)¸quando a moeda seja, são verdadeiros proprietários que depois ela recuou. Que recado a não vale aquilo que ela anuncia, há de partidos. Existem partidos que crise de representação manifesta nas a perda não apenas de credibilidade não escutam as lideranças de bases, ruas dá aos poderes instituídos? dos operadores econômicos de Esta- não existe assembleia de fato, não Roberto Romano – Está che- do, mas uma depreciação que a pes- gando ao limite da concessão a esses têm as eleições primárias, que ocor- soa sente no próprio corpo. É um fe- operadores ineptos do Estado brasi- rem nos Estados Unidos e na Europa, nômeno de massa tremendo a perda leiro, no sentido de que eles revertam que permite recolher as intenções de confiança no exercício do poder. O essa situação e saiam do regime tirâ- dos militantes. Veja o exemplo clás- 24 poder te engana sob a forma do papel nico. Quando se observam os dados sico da Hilary Clinton , que era a moeda. Essa perda de credibilidade é de corrupção no Brasil, a quantidade candidata clássica da oligarquia dos 25 central quando não se tem a defini- de licitações fraudulentas e a inversão Democratas , e nas primárias saiu o ção determinada dos poderes. É bom Barack Obama26. Não digo que isso

de recursos nas reeleições do prefeito www.ihu.unisinos.br lembrar que no nazismo todas as leis ao presidente da República, percebe- radicais, como a racial, foram aceitas mos que o regime político brasileiro 24 Hilary Clinton [Hillary Diane Rodham pelos tribunais alemães. E quando se é aquele em que o governante usa o Clinton] (1947): Secretária de Estado dos tem juízes curvados à razão de Esta- Estados Unidos entre 2009 e 2013. Espo- bem dos governados como se fossem sa do ex-presidente norte-americano Bill do de quem está no poder, não existe os seus. A população está começan- Clinton, foi senadora de New York entre mais democracia, república e liberda- do a dar um basta à tirania. Os sinais 2001 e 2009 e uma das principais candi- de. Não chegamos ao descalabro do datas à presidência durante as prévias do foram muito evidentes, quando os partido democrata na eleição de 2008. desaparecimento total da fé pública, deputados e senadores começaram (Nota da IHU On-Line) 25 Partido Democrata (Estados Unidos): a falar abertamente que queriam im- Fundado em 1836 após um cisma do Par- Cardoso) e em 1998 (novamente perdeu por a PEC-37 para colocar um freio ao tido Democrata-Republicano, é um parti- para Fernando Henrique Cardoso), e MP, que queriam modificar a lei de do de tendência esquerda liberal. Atual- ganhou as eleições de 2002 (derrotando mente está em poder nos Estados Unidos José Serra) e de 2006 (derrotando improbidade administrativa. A lei de com o presidente Barack Obama. (Nota Geraldo Alckmin). (Nota da IHU On-Line) improbidade administrativa existe há da IHU On-Line) 23 Elias Canetti (1905-1994): Romancista 20 anos e conseguiu condenar cerca 26 Barack Obama [Barack Hussein Oba- e ensaísta búlgaro. Vencedor do prêmio ma II] (1961): advogado e político esta- Nobel de Literatura (1981). (Nota da IHU de 40% dos ímprobos. Isso no Brasil dunidense. É o 44º presidente dos Esta- On-Line) é um feito extraordinário, que irritou dos Unidos, desde 2009. Sua candidatura

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 11 seja fantástico, eu tenho a mesma pessoas tinham que decidir se o re- cautela quando penso na democra- “Quando se tem curso ia para tal ou tal investimento, cia na Grécia. Mas, pelo menos, há fazendo com que elas aprendessem um controle maior da militância em juízes que se a viver em democracia e ao mesmo relação ao movimento partidário. O tempo fiscalizassem a realização do que significa dizer que há uma maior curvam à razão orçamento. O OP era pedagógico em atração da população à vida política. todos os sentidos. As pessoas que agora estão gritando de Estado de fora dos partidos ou “fora os - par Realismo político tidos”, estariam movimentando os quem está no Quando o PT chegou ao gover- partidos na base exigindo reformas no federal, o OP foi praticamente e mudanças. Sem esse controle das poder, não existe desativado. No Brasil inteiro, nesses bases, os donos dos partidos operam dez anos de governo, se o OP fos- como príncipes, fazendo concessões mais democracia, se instituído de Norte a Sul, muitos ema de Capa uns aos outros. problemas já teriam sido minimi-

T não existe mais zados. A chegada do PT ao poder Reforma política nacional fez surgir uma hierarquia O princípio fundamental de república, nem muito rígida, dá as cartas quem qualquer reforma política seria, na tem acesso direto ao poder. Antiga- sequência da lei da ficha limpa, uma liberdade” mente o partido se abria muito aos lei de democratização dos partidos movimentos sociais e, atualmente, políticos, mas isso não se vê ninguém o próprio Lula admite, é preciso re- falar. O Partido dos Trabalhadores – sociais são muito mais dinâmicos tomar esse diálogo. É essa estrutu- PT, até que o Lula chegasse à presi- que o movimento do Estado, porque ra do Estado brasileiro que chamo dência da República, praticava um eles têm que se renovar mais rapi- de absolutista, em que as pessoas, certo tipo de democracia interna, damente conforme os desafios vivi- ao chegarem ao poder, consideram ouvia os integrantes em convenções, dos pela sociedade. O outro perigo que o poder lhes pertence, e não ao as discussões eram acirradas, as ten- é que mesmo os movimentos sociais povo. Gosto de citar um artigo de 27 dências internas e externas eram de- podem se tornar burocratizados. Eu Norberto Bobbio , intitulado A pra- batidas. A partir do momento em que tive experiência em Porto Alegre, foi conquistado o poder federal, o PT observando o Orçamento Partici- 27 Norberto Bobbio (1910-2004): filósofo se tornou um partido de dirigentes, pativo – OP, e me interessei muito e senador vitalício italiano. Considerado onde candidatos saem do bolso do um dos grandes intelectuais italianos, por essa experiência e segui a lite- Bobbio era doutor em Filosofia e Direito Lula ou de um grupo pequeno. À se- ratura a respeito. Um dia estava no pela Universidade de Turim, fez parte melhança do que ocorre no partido ginásio de esportes, onde ocorria do grupo antifascista Giustizia e Liberta dos Tucanos, PSDB, que chegaram a (Justiça e Liberdade). Adepto do socia- a reunião, e entrou um grupo que lismo liberal, Bobbio foi preso durante definir o nome do candidato à presi- ostentava uma faixa (vou mudar o uma semana, em 1935, pelo regime fas- dência em um jantar. Esse defeito de nome para preservar a identidade cista de Benito Mussolini. Em 1994, Bo- nossos partidos é mortal para eles, bbio assumiu publicamente uma posição do envolvido) “A comunidade de contra as políticas defendidas por Silvio para a democracia e lesivo à sobera- Pedro Leopoldo saúda os partici- Berlusconi, que representava o centro- nia popular. É por isso que parte dos pantes”. Perguntei à pessoa que me -direita nas eleições gerais. Nesta altu- manifestantes tem verdadeira ojeriza ra, escreveu um dos seus ensaios mais ciceroneava: “onde é Pedro Leopol- conhecidos, Direita e Esquerda, no qual aos partidos. do?”. “Onde, não, professor” foi a se pronunciou contra a “nova direita”. Além desta obra, Bobbio assinou e rea- resposta. “Quem é Pedro Leopoldo. lizou mais de 1.300 livros, ensaios, arti- IHU On-Line – Tendo em vista Ele é uma espécie de dono da co- gos, conferências e entrevistas. Norberto o descrédito da população com as munidade”. Muitos dos integrantes Bobbio recebeu o doutoramento Honoris instituições políticas de modo geral, Causa pelas Universidades de Paris, Bue- que iam falar ao microfone se sen- nos Aires, Madrid, Bolonha e Chambéry uma reforma política seria compatí- tiam donos do movimento. Nessa (France). Autor de livros de impacto, vel com uma abertura maior à par- época, a prefeitura de Porto Alegre como Direita e Esquerda (São Paulo: ticipação nas eleições de candidatos Unesp, 2001), tinha como principais ma- criou um mecanismo de distribuição trizes de sua obra a discussão da guerra e sem partidos políticos? de fichas aos pais para que eles não da paz, os direitos humanos e a democra- Roberto Romano – É perfeita- precisassem ficar na fila para matri- cia. Alguns dos livros mais recentes são mente possível ter uma democra- cular os filhos nas escolas, mas os lí- Teoria Geral da Política (Rio de Janeiro: cia partidária e, ao mesmo tempo, Campus, 1999); Diálogo em Torno da Re- deres comunitários exigiam que tais pública (Rio de Janeiro: Campus, 2001); aberta para os movimentos sociais. fichas fossem entregues a eles. Essa Entre Duas Repúblicas (Brasília: Ed. UnB, O problema é que os movimentos 2001); Elogio da Serenidade (São Paulo: prática autoritária e, infelizmente, Ed. Unesp, 2002); O Filósofo e a Política www.ihu.unisinos.br popular, começou a ser relativizada (Rio de Janeiro: Contraponto, 2003). Na e diminuída no mesmo período por- 89ª edição da Revista IHU On-Line, de foi formalizada pela Convenção do Par- 12-01-2004, na editoria Memória, além tido Democrata, em 2008. (Nota da IHU que houve uma prática republicana, de um artigo de Ricupero, um de Janine On-Line) mais democrática e dialogante. As Ribeiro, foi publicada a biografia de Nor-

12 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 T ça e o palácio, onde ele argumenta que podem enviar solicitações ao que enquanto as pessoas estão na “O cidadão Congresso. Cabe 50% aos operadores ema de Capa praça consideram o palácio corrup- do Estado e 50% aos cidadãos, que to e autoritário, mas quando se vai é obrigado a não devem se cobrir sob o manto da para o palácio, pensa-se que a praça apoliticidade, pois quando se assu- é demagógica, irrealista. A conclu- respeitar um me que não se tem nada a ver com a são de Bobbio, entretanto, é que é política, permite-se o ato político aos perfeita, ou seja, sem a praça e sem político corrupto ímprobos, aos autoritários e àqueles o palácio não se consegue exerci- que não têm respeito pela soberania tar o poder democrático. Isso é o que se chama popular. que me parece ter acontecido com os partidos de esquerda, tanto os de excelência, e Tucanos quanto os Petistas, no mo- mento em que chegaram ao poder, quem é honesto é pois se curvaram ao realismo políti- Leia mais... co, que supõe manter o poder dos desrespeitado 24 nossos oligarcas. Ambos os partidos • “Somos absolutistas anacrônicos. passaram o regime ditatorial inteiro horas por dia” Vivemos sempre sob o regime do atacando José Sarney28, que era um funcionário dos ditadores muito di- favor, dos privilégios, da não repú- ligente, e de repente este homem, blica”. Entrevista com o professor em pleno regime democrático, vira Roberto Romano à IHU On-Line, o grande condestável da república, pios. Em uma federação todos sabem a ponto de o Lula dizer que ele “não que os gastos maiores e mais impor- edição 398, disponível em http:// pode ser criticado, porque não é um tantes são feitos pelos municípios. bit.ly/1dDYNEv; homem comum”. Ora, em uma repú- Temos uma situação injustificável de blica só existem homens comuns. centralização. O terceiro ponto é a fa- • Filosofia não é, necessariamente, mosa reforma política, mas que não sistema. Entrevista com o professor IHU On-Line – Passados 25 anos comece pelo fim e sim pelo princípio, Roberto Romano à IHU On-Line, da promulgação da Constituição, que é a redemocratização dos parti- que desafios estão postos à socieda- dos políticos. Finalmente, é preciso edição 379, disponível em http:// de brasileira para avançar na nossa fazer uma espécie de reinstauração bit.ly/v0ujxe; cidadania e, particularmente, que mínima da fé pública para o Brasil. desafios estão postos ao Congresso Enquanto não estiver afastado o fan- • Niilismo e mercadejo ético brasilei- Nacional? tasma da reeleição, haverá sempre a ro. Entrevista com o professor Ro- Roberto Romano – O primeiro propaganda funcionando, em vez de desafio é do pleno respeito à sobe- funcionarem o ato administrativo e o berto Romano à IHU On-Line, edi- rania popular. Por enquanto, não te- ato político. É lamentável que o Bra- ção 354, disponível em http://bit.ly/ mos essa soberania plenamente aca- sil tenha mergulhado na ditadura do e6WHhp; tada pelos operadores do Estado. O marketing político. O último ponto é segundo desafio é promover a fede- o fim do privilégio da prerrogativa de • De ditadores a imperadores com pés ração no Brasil, dando efetiva auto- foro. Trata-se de uma falta de repu- de barro. Entrevista com o profes- nomia, como preconiza a Carta, aos blicanismo absoluto. Não sei como o Estados e aos Municípios, inclusive sor Roberto Romano à IHU On-Line,

STF, quando se arroga o título de pro- www.ihu.unisinos.br do ponto de vista fiscal e financeiro. tetor da Constituição, aceita a exis- edição 269, disponível em http:// É absolutamente indecente ter uma tência de cidadãos de duas classes, federação na qual, a cada período, aqueles que têm privilégio de foro bit.ly/19tKNtU; prefeitos se dirigem a Brasília para e os que não têm. Isso significa que • O governo do Brasil retoma a ética mendigar um pequeno aumento no não existe república. Esses são os de- conservadora e contrária à demo- fundo de participação dos municí- safios mais imediatos. Os outros não derivam da von- cracia, o que exige da Igreja o papel berto Bobbio, em virtude de seu faleci- tade popular e não dependem dos mento aos 94 anos, no dia 09-01-2004. O vicário. Entrevista com o professor download está disponível em http://bit. operadores do Estado. A população ly/16U1m3s. (Nota da IHU On-Line) está mostrando que aprendeu a to- Roberto Romano publicada nas 28 José Sarney [José Sarney de Araújo mar a cidadania nas suas mãos, e Notícias do Dia, de 14-01-2008, no Costa] (1930): Político brasileiro, 31º me parece que todos os movimentos presidente do Brasil (1985-1990). Atuou sítio do Instituto Humanitas Unisi- como governador do Maranhão e foi pre- que conseguirem apresentar reivin- sidente do Senado Federal por quatro ve- dicações podem avançar nas deman- nos – IHU, disponível em http://bit. zes. Em seu último mandato foi sucedido das, inclusive passou para 500 mil o em 2012 pelo senador Renan Calheiros. ly/1furl4Y. (Nota da IHU On-Line). número de assinaturas de pessoas

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 13 “A Constituição de 1988 ainda não esgotou seu potencial de liberação da vida e de promoção da igualdade”

ema de Capa Adriano Pilatti, que foi assessor parlamentar durante a Assembleia Constituinte, T aborda os impactos da Constituição e como foi seu processo de elaboração

Por Ricardo Machado

ssessor parlamentar durante a Assem- Sedento por um mandato de cinco anos, o bleia Constituinte, Adriano Pilatti, pro- presidente Sarney acabou por fazer ‘dobradi- Afessor de Direito da Pontifícia Univer- nha’ com o conservadorismo, o que não lhe sidade Católica do Rio de Janeiro — PUC-Rio, foi difícil, pois era um de seus representantes. comenta os desafios na articulação do diálogo Além disso, naquele momento de transição, entre mais de 500 parlamentares, juntamente havia a pretensão tutelar dos ministros mili- com a sociedade civil. A elaboração do Regi- tares: naquela época não havia um Ministé- mento Interno foi determinante para garantir rio da Defesa, cada força armada tinha o seu a dinâmica de trabalho. “A tônica da discus- ministro, além dos ministros-chefes do Estado são do Regimento, que tomou mais de dois Maior das Forças Armadas, do Gabinete Mili- meses, foi justamente a garantia dessa parti- tar e do famigerado Serviço Nacional de Infor- cipação. O modo encontrado foi o sistema de mações (SNI), ainda existente”, avalia. 24 subcomissões temáticas, agrupadas três a Adriano Pilatti é graduado pela Faculdade três em oito comissões temáticas, cujos ante- de Direito da Universidade Federal do Rio de projetos seriam unificados pela Comissão de Janeiro – UFRJ, mestre em Ciências Jurídicas Sistematização no Projeto de Constituição a pela PUC-Rio e doutor em Ciência Política ser votado por todo o Plenário. Com isto, cada pelo Instituto Universitário de Pesquisas do parlamentar teve participação efetiva como Rio de Janeiro – Iuperj, com Pós-Doutorado titular em uma subcomissão e na respectiva em Direito Público Romano pela Universi- comissão”, explica Pilatti, em entrevista con- dade de Roma I – La Sapienza. Foi assessor cedida por e-mail à IHU On-Line. “Tal solução parlamentar da Câmara dos Deputados junto favoreceu, de saída, a agenda progressista, à Assembleia Nacional Constituinte de 1988. pois predefiniu os conteúdos que deveriam Traduziu o livro Poder Constituinte – Ensaio necessariamente constar do novo texto — re- sobre as Alternativas da Modernidade, de forma agrária, terras indígenas, comunicação Antonio Negri (Rio de Janeiro: DP&A, 2002). social, etc. —, beneficiando a concepção pro- É autor do livro A Constituinte de 1987-1988 gressista de uma Constituição ‘analítica’ ou – Progressistas, Conservadores, Ordem Eco- ‘dirigente’, ao contrário do que desejavam os nômica e Regras do Jogo (Rio de Janeiro: Lu- conservadores na defesa de uma Constituição men Juris, 2008). O professor proferirá a con- ‘sintética’, que não tratasse de temas sociais, ferência A Constituição no Supremo Tribunal minorias”, complementa. Federal: a (des) construção da democracia Apesar da reabertura política garantida brasileira, no dia 02-10-2013, no Seminário pela Constituição, o período de transição foi Constituição 25 Anos: República, Democra- lento e gradual, sendo que, nos primeiros cia e Cidadania, promovido pelo Instituto governos, segundo o professor, o país seguiu Humanitas Unisinos – IHU em parceria com

www.ihu.unisinos.br mais alinhado a uma perspectiva conserva- o Programa de Pós-Graduação em Direito – dora. “Politicamente, o confronto entre pro- Unisinos e Programa de Pós-Graduação em gressistas e conservadores, a que se sobrepôs História – Unisinos. o conflito entre governistas e oposicionistas. Confira a entrevista.

14 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 T IHU On-Line – Que reflexos da a divulgar, através de outdoors nas última Constituinte ainda podem ser “Naquele praças e ruas das capitais e principais ema de Capa percebidos hoje em dia e que benefí- cidades de cada estado, os votos dos cios trazem à sociedade? momento de parlamentares nas questões sociais. Adriano Pilatti – Em primeiro Outros movimentos também ajuda- lugar, claro, a própria Constituição Ci- transição, havia a ram a dar publicidade aos votos dos dadã. Ela foi assim denominada pelo parlamentares por diversos meios bravo e inesquecível presidente da pretensão tutelar e, como haveria eleições em 1988 e Assembleia, Ulysses Guimarães, jus- nenhum parlamentar é “suicida”, elei- tamente pela consistência liberadora dos ministros toralmente falando, tudo isto ajudou da Carta de Direitos e pela amplitude a balança a pender para as posições reformista das diretrizes relativas às militares.” mais progressistas. políticas públicas de caráter social e econômico. Ela tem sido um marco IHU On-Line – Como foi enfren- precioso nas sofridas lutas por direi- cionais. Em segundo lugar, porque os tado o desafio de ouvir e garantir a tos levadas avante pelo bom povo deputados e senadores seriam eleitos participação efetiva dos 559 consti- brasileiro, especialmente pela maioria segundo as regras eleitorais ainda tuintes no processo decisório? trabalhadora e despossuída, e pelas ditatoriais em grande parte, que cer- Adriano Pilatti – Através das re- chamadas “minorias”, discriminadas ceavam os debates e apresentavam gras do Regimento Interno, aprovado e marginalizadas. Um belo exemplo é distorções na proporcionalidade entre pelo Plenário que os reunia. A tônica o uso que tem sido feito do artigo 3º, número de deputados por estado e as da discussão do Regimento, que to- que define os chamados “objetivos respectivas populações, favorecendo mou mais de dois meses, foi justa- fundamentais da República”, nas lu- os estados em que o conservadoris- mente a garantia dessa participação. tas por igualdade, seja por parte dos mo era então mais forte. Em terceiro O modo encontrado foi o sistema de movimentos sociais, seja por parte do lugar, porque permitiria a participa- 24 subcomissões temáticas, agru- próprio STF, como nos casos das leis ção dos senadores eleitos em 1982, padas três a três em oito comissões de cotas e das uniões homoafetivas. conservadores na maioria. Tudo isto temáticas, cujos anteprojetos seriam Mas os efeitos positivos são sensíveis aconteceu, mas não bastou, pois o unificados pela Comissão de Sistema- também do ponto de vista procedi- processo constituinte acabou por for- tização no Projeto de Constituição a mental, como no caso das audiências talecer o peso da minoria parlamen- ser votado por todo o Plenário. Com públicas com representantes da cha- tar progressista e abriu-se para a par- isto, cada parlamentar teve partici- mada “sociedade civil”, intensamente ticipação dos movimentos sociais. pação efetiva como titular em uma utilizadas durante a Constituinte, e subcomissão e na respectiva comis- hoje incorporadas aos processos deci- são. Tal solução favoreceu, de saída, IHU On-Line: Que importância sórios dos Legislativos federal, estadu- a agenda progressista, pois predefiniu esses movimentos sociais tiveram ais e municipais. os conteúdos que deveriam necessa- para a elaboração da Constituição? riamente constar do novo texto — re- Adriano Pilatti Uma– grande im- IHU On-Line – Em outro momen- portância, pois o regimento da Consti- forma agrária, terras indígenas, comu- to o senhor comentou que a “criatu- tuinte permitiu não só a participação nicação social, etc. —, beneficiando a ra” (a Constituinte) escapou ao “cria- dos movimentos nos debates formais, concepção progressista de uma cons- dor” (o Governo e o Congresso). Do através das audiências públicas, mas tituição “analítica” ou “dirigente”, ao que se trata? Quais foram os impac- também a apresentação das emendas contrário do que desejavam os con- tos disso? populares. Mais de uma centena de servadores na defesa de uma consti- Adriano Pilatti – O formato con- tuição “sintética”, que não tratasse de

emendas populares atingiram o nú- www.ihu.unisinos.br gressual, proposto pelo governo Sar- mero de assinaturas exigido, 30 mil, temas sociais, minorias, etc. ney e afinal adotado pelo Congresso e, destas, mais de 80 foram incorpora- na emenda que convocou a consti- das ao texto. Além do mais, permitiu- Tensões tuinte, buscava favorecer os setores -se que os representantes dos signa- Por outro lado, a excessiva du- conservadores e reacionários. O Con- tários as defendessem na tribuna da ração dos trabalhos da Comissão de gresso Constituinte, a ser eleito simul- constituinte. Tudo isto permitiu que Sistematização, que reunia menos de taneamente com os governadores em se quebrasse o monopólio parlamen- um sexto dos constituintes, desper- 1986, tendia a favorecer a formação tar na proposição e na discussão das tou a insatisfação do chamado “baixo de uma maioria conservadora por vá- matérias. clero”, insatisfação esta que acabou rias razões. Em primeiro lugar, porque Além disso, a pressão direta, pela manipulada pelos líderes conserva- a simultaneidade reduzia o espaço do presença nas galerias e nas visitas aos dores na criação do chamado “Cen- debate propriamente constituinte du- gabinetes para abordagem dos parla- trão”, que alterou o Regimento para rante a campanha, que tendia a fazer mentares, teve um peso ponderável permitir que o Plenário apreciasse com que a disputa pelos Executivos nas votações, que eram abertas. Em outro projeto que não o nascido dos estaduais mobilizasse mais as aten- um tempo em que ainda não havia trabalhos das subcomissões e comis- ções do que as discussões constitu- internet, a CUT, por exemplo, passou sões temáticas, consolidados pela Co-

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 15 missão de Sistematização num texto temático e a inspiração liberadora e mais progressista do que conservador. “Os conservadores progressista, as cartas autoritárias Com isto os conservadores pre- serviram como signos daquilo que de- tendiam anular a vantagem progres- pretendiam via ser evitado. sista que nasceu da pressão popular, mas também de uma circunstância anular a vantagem IHU On-Line – Que tensões sur- inesperada: o partido majoritário, gem entre o que está expresso na PMDB, era então uma ampla frente, progressista que Constituição e as interpretações do cuja bancada elegeu o progressista Supremo Tribunal Federal? As práti- Mario Covas como líder. E Covas, em nasceu da pressão cas da Corte têm ajudado ou prejudi- um acordo de lideranças, conseguiu cado a democracia? Por quê? indicar relatores progressistas para as popular” Adriano Pilatti – Nos últimos 25 subcomissões e comissões. Estes rela- anos, o STF tem adotado decisões tores propuseram anteprojetos pro- para todos os gostos, mais conser- ema de Capa gressistas e participaram da Comissão ma Agrária. Houve também lobbies vadoras nos primeiros anos, quando T de Sistematização, reduzindo o peso lamentavelmente muito influentes, ainda era composto por ministros in- decisório da maioria conservadora. como o dos policiais militares, o dos dicados pelos generais-presidentes ou Mesmo com a alteração do Regimen- magistrados superiores, o chamado pelos seus sucedâneos, genéricos e si- to, porém, o Centrão não conseguiu “lobby da toga”, que impediram maio- milares civis, Sarney e Collor. Depois impor totalmente suas ideias, não res avanços democráticos nas respec- começou a se “arejar”, por assim dizer, teve votos suficientes para isso,- em tivas matérias. aproximando-se de uma posição mais bora fosse maioria. O resultado foi um afeiçoada aos novos tempos. Mas amplo processo de negociação duran- tem cultivado uma pretensão tutelar IHU On-Line – Considerando a te as votações pelo Plenário, que per- sobre a vida política e as decisões le- época em que a Constituição foi con- mitiu preservar grande parte dos con- gislativas que, no meu entender, não cebida, o texto aprovado se apresen- teúdos progressistas ao novo texto. serve bem à vida democrática. Isto, tou como conservador ou progressis- porém, não nos impede de reconhe- ta? Por quê? cer que a Corte tomou belas decisões IHU On-Line – Durante o Proces- Adriano Pilatti – Se considerar- so Constituinte o senhor foi assessor mos progressista a orientação em prol em favor dos direitos, como nos casos parlamentar. Tendo em vista esta ex- do alargamento dos direitos coletivos já citados das cotas, das uniões homo- periência, quais foram as principais e sociais e da adoção de políticas pú- afetivas e também no da anencefalia. tensões vividas no trabalho de elabo- blicas reformistas e conservadora a Penso que uma das grandes derrotas ração da Carta Magna e que grupos orientação oposta, o texto resultou progressistas da Constituinte foi não estavam na disputa do poder? mais progressista do que a maioria ter criado uma corte constitucional Adriano Pilatti Do– ponto de vis- conservadora inicialmente pretendia com membros eleitos para mandato ta pessoal, o ritmo frenético de traba- e mais conservador do que os progres- de duração prefixada, uma pena. lho e os prazos estreitos para exame sistas desejavam. Comparativamente dos anteprojetos e elaboração das falando, é a Constituição mais pro- IHU On-Line – A Constituição de emendas. Politicamente, o confronto gressista que já tivemos, certamente. 1988 inaugurou o período mais lon- entre progressistas e conservadores, go de democracia representativa no a que se sobrepôs o conflito entre IHU On-Line – Que aspectos da país, o que vivemos atualmente. En- governistas e oposicionistas. Sedento conjuntura permitiram um ambiente tretanto, os protestos ocorridos em por um mandato de cinco anos, o pre- favorável à realização da constituin- junho revelaram certa crise de repre- sidente Sarney acabou por fazer “do- te e de que maneira as Constituições sentação, e a hipótese de uma nova bradinha” com o conservadorismo, predecessoras acabaram impactando constituinte foi aventada pela pre- o que não lhe foi difícil, pois era um o novo texto? sidente Dilma. É possível pensar em de seus representantes. Além disso, Adriano Pilatti – O processo de uma democracia direta incluindo a naquele momento de transição, ha- lutas pela democratização do Estado participação de movimentos sociais, via a pretensão tutelar dos ministros autoritário e pela redução das desi- por exemplo, nas eleições? militares: naquela época não havia gualdades que ele ajudou a elevar Adriano Pilatti – Com todo o res- um Ministério da Defesa, cada força durante a ditadura militar-empresa- peito à presidente, em quem votei e armada tinha o seu ministro, além dos rial chegara ao seu ápice justamente em quem pretendo votar novamente, ministros-chefes do Estado Maior das no processo constituinte, por isso a se ela permitir, a ideia de uma nova Forças Armadas, do Gabinete Militar orientação pelas mudanças era muito constituinte foi uma bobagem, inspira- e do famigerado Serviço Nacional de forte, como tantas vezes sublinhou o da talvez pelo pânico, que é sempre um Informações (SNI), ainda existente. presidente Ulysses. Isto favoreceu os péssimo conselheiro. Por isto mesmo, www.ihu.unisinos.br Na chamada “sociedade civil” havia avanços democratizantes e igualitá- foi rapidamente abandonada assim também polarizações fortíssimas, a rios, o sentido progressista do novo que se recobrou o fôlego. A represen- mais forte delas entre trabalhadores texto. As constituições democráticas tação está em crise em todo o mundo e patronato rural em torno da Refor- anteriores forneceram o repertório democrático porque o modelo burguês

16 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 de representação foi concebido contra decisão direta, melhor, quanto mais T a democracia — basta ler Sieyès1 para “As constituições participação direta, menos corrupção. ema de Capa confirmar — e só aos poucos se demo- cratizou com o voto secreto, o sufrágio democráticas IHU On-Line – Deseja acrescen- universal e o sistema proporcional. tar algo? Mas conserva o seu vício de origem, o anteriores Adriano Pilatti – A Constitui- mandato livre de longa duração, que é ção de 1988 ainda não esgotou seu sempre uma promessa de traição do forneceram potencial de liberação da vida e de eleitor pelo eleito. promoção da igualdade. É mais favo- Onde quer que alguém exerça o repertório rável do que contrária às lutas pelos poder em nosso nome, o princípio da direitos, mas o fundamental é que corrupção está instalado. É preciso temático e essas lutas prossigam. Só a cidada- democratizar ainda mais a represen- nia poderá alargar suas liberdades tação, começando pela redução da a inspiração e reduzir as desigualdades sociais duração dos mandatos legislativos, e que, mesmo com os avanços recen- ampliar a decisão popular direta por liberadora e tes, ainda estão num patamar por- plebiscitos, referendos e facilitação nográfico em nosso país. Ampliar a quantitativa da iniciativa popular le- progressista” ação direta dos trabalhadores, dos gislativa. Nós, o povo, pudemos apre- pobres e dos setores marginaliza- sentar emendas populares ao Projeto dos, descriminalizar os movimentos de Constituição com 30 mil assinatu- sociais e suas lutas, esta é a priori- ras, mas o Centrão reacionário nos dade de um constitucionalismo ver- obrigou a reunir quase um milhão e modelo norte-americano. Lá os depu- dadeiramente democrático. meio de assinaturas para propor um tados têm mandatos de dois anos, e mero projeto de lei. os senadores, de seis. Isto aumenta mais a possibilidade de controle dos Mandatos eleitos pelos eleitores. Em cada elei- Leia mais... Quanto à duração dos manda- ção, os eleitores dos Estados Unidos, tos e à decisão direta, encanta-me o além de escolher seus representan- • Quem tem medo do poder consti- tes, decidem diretamente dezenas de tuinte? Artigo de Adriano Pilatti e 1 Emmanuel Joseph Sieyès (1748 – 1836): Político, escritor e eclesiástico questões relativas à adoção de políti- Giuseppe Cocco nas Notícias do francês. Foi um dos líderes teóricos da cas públicas, à realização de obras pú- Revolução Francesa e exerceu papel fun- Dia, de 15-04-2013, no sítio do Ins- damental no consulado francês durante blicas, à descriminalização de condu- o Primeiro Império. Entre suas principais tas. É isto que deve nos inspirar, e não tituto Humanitas Unisinos – IHU, obras destaca-se O que é o Terceiro Esta- ilusões perigosas, como o recall e o do? que tornou-se o manifesto da revolu- disponível em http://bit.ly/12qlght. ção. (Nota da IHU On-Line). chamado “voto distrital”. Quanto mais

LEIA OS CADERNOS IHU www.ihu.unisinos.br

NO SITE DO IHU

WWW.IHU.UNISINOS.BR

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 17 A formulação do Brasil como Estado nacional Para o cientista político Simon Schwartzman, apesar do esforço para construir uma identidade nacional, nosso país nunca foi um Estado-nação

Por Andriolli Costa e Ricardo Machado ema de Capa T

Brasil é o resultado de um pro- A ideia de patrimonialismo, conceito tam- cesso colonial em que Portugal bém discutido pelo professor na entrevista, “O destruiu boa parte da popu- revela-se, segundo ele, nas práticas políticas lação originária. Então o Brasil certamente de nossa sociedade. “Penso que o conceito de é um Estado, no sentido de que consegue patrimonialismo é importante também, por- criar um sistema político de organização e que está associado à ideia de que a política controle do território, e um monopólio bas- é basicamente uma maneira de apropriação tante completo da violência — que é outra de bens públicos por determinados públicos. definição do Estado, aquele que é detentor Isso é diferente de uma noção de um estado do monopólio da coerção física. Porém, do democrático moderno, de base contratual, ponto de vista de nação, nós não temos es- em que no setor público, os funcionários tem sas características. Não temos uma unidade um mandato, tem uma obrigação definida por cultural, uma unidade linguística”, considera lei e devem cumprir aquilo que é interesse co- o professor e pesquisador Simon Schwartz- letivo, e não simplesmente defender interes- man, em entrevista concedida por telefone ses individuais”, explica. à IHU On-Line. Simon Schwartzman é pesquisador do Insti- Ele lembra que nossa identidade nacio- tuto de Estudos do Trabalho e Sociedade no Rio nal surgiu da invenção de mitos históricos e de Janeiro. Foi, entre 1994 e 1998, Presidente da construção de determinados “heróis”, que do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística resultou em uma história que nunca existiu. — IBGE e, entre 1999 e 2002, diretor para o Bra- “Há certa homogeneidade linguística no país, sil do American Institutes for Research. mas ao mesmo tempo ele continua muito di- Estudou Sociologia, Ciência Política e Ad- verso do ponto de vista social, com essa mar- ministração Pública na Universidade Federal ca brasileira que é uma desigualdade muito de Minas Gerais, tem mestrado em Sociologia profunda, quer dizer, uma sociedade muito pela Faculdade Latino-americana de Ciências estratificada do ponto de vista econômico e Sociais – Flacso. social”, explica. É dentro deste contexto que o Santiago do Chile, e doutorado em Ciên- entrevistado situa a racionalidade que marca cia Política pela Universidade da Califórnia, nossa Constituição Federal, que, em alguma Berkeley. Foi professor da Universidade Fede- medida, buscou atenuar tais diferenças. “Ela ral de Minas Gerais — UFMG, tendo sido afas- (a Constituição) atende a todas as demandas tado pelo golpe militar de 1964 e reintegra- da sociedade, mas também cria uma situação do em 2000, quando se aposentou. É autor, que, ao mesmo tempo, é complicada. Isso entre outros livros, de Brasil: A Nova Agenda porque você não tem os recursos públicos ne- Social (Rio de Janeiro: LTC, 2011) e Bases do cessários para colocar em prática tudo aquilo Autoritarismo Brasileiro (Rio de Janeiro: Edi- que foi escrito na Constituição como direito tora Campus, 1982). das pessoas”, argumenta. Confira a entrevista. www.ihu.unisinos.br

18 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 T IHU On-Line – Embora seja co- é uma ideia mais moderna nesse sen- dos conseguem controlar, até certo mum ouvir falar em Estado-nação tido. Eu diria que é a única compatível ponto, é a imigração, que é controlar ema de Capa e sociedade, como tais construtos com os Estados modernos, no sentido as fronteiras, mas mesmo assim mui- surgiram? Que diferenças há entre de que você pode ter uma sociedade tos países não conseguem controlar Estado, nação e sociedade? Como se que funciona bem, instituições sociais direito. Então você tem um fluxo de relacionam? que funcionam bem, e ela pode ter comunicação, de ideias, de informa- Simon Schwartzman – O con- uma diversidade cultural linguística e ção, de dinheiro, de investimentos, ceito de Estado-nação, que data da étnica muito grande. que em boa parte escapam ao con- Revolução Francesa1, é uma ideia de trole dos estados nacionais. Por outro que você teria uma unidade cultural, IHU On-Line – Na nossa expe- lado, não há instâncias supranacionais linguística, unificada por um regime riência brasileira, podemos pensar o suficientemente fortes para compen- político e ocupando certo território. Brasil como Estado-nação? sar isso. As instâncias supranacionais É um Estado que, ao mesmo tempo, Simon Schwartzman – O Brasil é que nós temos — as Nações Unidas2, o tem estrutura de Estado e o conteú- o resultado de um processo colonial Mercado Comum3 — são normalmen- do cultural é o sistema de nação. Essa em que Portugal destruiu boa parte te estruturas relativamente débeis, definição na verdade não se aplica a da população originária. O que nós te- que conseguem funcionar no máximo todos os Estados que vão se consti- mos hoje são apenas resquícios, coisas quando há consenso. Isso cria uma tuindo, pois existem muitos Estados muito pequenas. O Brasil foi o maior situação de que os Estados, apesar com sistemas políticos e sociedades importador de escravos do século XIX, de não terem o controle tão grande muito diversificadas. O caso da África uma população gigantesca que tam- quanto no passado, ou quanto pode- talvez seja o mais extremo, em que bém viveu essa situação de dominação riam ter no passado, são a instância os impérios coloniais foram divididos e teve a sua cultura praticamente des- mais importante de desenvolvimento em pedaços. Cada pedaço virou um truída por este processo. Então o Brasil de políticas públicas, de garantia da Estado sem nenhuma correspondên- certamente é um Estado, no sentido de segurança, das liberdades individuais cia com nações, no sentido de que que consegue criar um sistema político e de uma série de valores das socie- dentro desses estados se tem uma de organização e controle do território, dades modernas que têm que ser variedade de culturas, ou sociedades, e um monopólio bastante completo da exercidos pelos estados, porque você violência — que é outra definição do colocadas em estados distintos. Essa não tem outra instância para fazer Estado, aquele que é detentor do mo- correspondência não se mantém na isso. Isto cria para os estados uma di- nopólio da coerção física. Mas do pon- maioria dos casos. O conceito de so- ficuldade, pois eles têm que poder se to de vista de nação, nós não temos ciedade está mais associado à ideia integrar e de alguma forma participar essas características. Não temos uma de que as pessoas não formam ne- deste mundo aberto, de comunica- unidade cultural, uma unidade linguís- cessariamente uma unidade cultural, ções e de fluxos, pessoas e dinheiro, e tica. O que o Brasil avançou foi no sen- linguística ou ética, mas que convivem ao mesmo tempo trabalhar com uma tido de tentar constituir uma socieda- segundo certas regras de convivência, população muito diferenciada e muito de igualitária em que estes elementos, dentro de um estado, se associando complexa também. Então digamos, a essas diferenças de origem passassem em função de seus interesses, com a contar menos do que os direitos de liberdade individual de pensamento, 2 Organização das Nações Unidas (ONU): cidadania, os direitos individuais. Eu de mobilidade e de propriedade. Essa Fundada em 1945, após a Segunda Guer- entendo o Brasil muito mais nesse sen- ra Mundial, para substituir a Liga das tido, e por isso nós não tivemos os con- Nações. Organização internacional cujo 1 Revolução Francesa: nome dado ao objetivo é o de facilitar a cooperação conjunto de acontecimentos que, entre flitos nacionais, éticos e culturais que entre os países membros, em assuntos 5 de maio de 1789 e 9 de novembro de marcaram tanto no passado como hoje relacionados aos direitos humanos, se- 1799, alteraram o quadro político e social gurança internacional, desenvolvimento

em dia a situação de muitos países. www.ihu.unisinos.br da França. Começa com a convocação dos econômico e social. Atualmente a orga- Estados Gerais e a Queda da Bastilha e se nização conta com 193 países membros. encerra com o golpe de estado do 18 Bru- IHU On-Line – No contexto de (Nota da IHU On-Line) mário, de Napoleão Bonaparte. Em causa 3 Comunidade Econômica Europeia estavam o Antigo Regime (Ancien Régi- globalização, como pensar os concei- (CEE) ou Mercado Comum Europeu: For- me) e a autoridade do clero e da nobre- tos de Estado nacional e de socieda- mado em 1957 com o Tratado de Roma, za. Foi influenciada pelos ideais do Ilu- de? Que tensões se estabelecem na foi o embrião da futura União Europeia. minismo e da Independência Americana Tinha como objetivo permitir a livre cir- (1776). Está entre as maiores revoluções formação sociocultural? culação de pessoas, mercadorias e ser- da história da humanidade. A Revolução Simon Schwartzman – O que viços entre os países membros, o que Francesa é considerada o acontecimento temos hoje é que o controle que os levou, com o tempo, à criação de uma que deu início à Idade Contemporânea. moeda única: o Euro. A CEE foi formada Aboliu a servidão e os direitos feudais Estados têm sobre seu território não inicialmente por 12 países: Alemanha, e proclamou os princípios universais de é absoluto, é cada dia mais limitado. França, Espanha, Itália, Bélgica, Portu- “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” Há uma série de coisas que escapam, gal, Grécia, Luxemburgo, Países Baixos, (Liberté, Egalité, Fraternité), frase de Reino Unido, Irlanda e Dinamarca. Em autoria de Jean-Jacques Rousseau. (Nota desde fluxo de informações, de capi- 1995, entraram também Áustria, Finlân- da IHU On-Line) tais, de comunicação. O que os esta- dia e Suécia. (Nota da IHU On-Line)

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 19 tarefa de um estado nacional é difí- a política e a aplicação das leis em cil, mas nós não temos um substituto “As instâncias nosso país? para ela. Não se pode dizer “vamos Simon Schwartzman – O que eu acabar com o estado nacional”. supranacionais entendo é que o sentido que ele leva não é o que normalmente usamos IHU On-Line – Como o Brasil se que nós temos para a cordialidade. É mais no sentido constituiu historicamente em Estado- de evitar conflitos, de acomodar-se, nação no período pré-Constituição são normalmente de evitar ter clareza na definição das de 1988 e que marcas desta constru- coisas. Este é um problema brasilei- ção são perceptíveis na atual Carta estruturas ro. Vivemos frequentemente dilemas Magna? complicados, e a tendência o tanto Simon Schwartzman – Houve relativamente quanto possível é evitar qualquer uma tentativa, como aponta José Mu- decisão que possa afetar interesses. rilo de Carvalho4 e alguns outros, de débeis, que Nós temos uma discussão nesse mo- ema de Capa se tentar deliberadamente montar mento de redistribuição de recursos, T símbolos nacionais. Para construir conseguem reforma tributária, que não se faz. uma identidade nacional foram inven- Porque você não consegue ter uma tados certos mitos históricos, certos funcionar no maioria capaz de dizer “o que o País heróis. Tudo muito fabricado para precisa é isso, e vai ter gente que vai tentar inventar uma história que na máximo quando ganhar e vai ter gente que vai perder”. verdade nunca existiu, pelo menos Então como você não consegue to- não desta forma. Mas isso foi só até há consenso” mar essas decisões, ela acaba sendo certo ponto, quer dizer, você tem cer- postergada, e os custos, a distribuição ta homogeneidade linguística no país, de benefícios, quem sai ganhando e mas ao mesmo tempo ele continua quem sai perdendo, ficam ocultos. É muito diverso do ponto de vista so- difícil identificar exatamente o que cial, e com essa marca brasileira que retamente —, a nova Constituição é está acontecendo porque não há uma é uma desigualdade muito profunda, muito generosa. Ela atende a todas consciência da sociedade sobre quais ou seja, uma sociedade muito estra- as demandas da sociedade, mas tam- são as opções, o que interessa, o que tificada do ponto de vista econômico bém cria uma situação que, ao mes- vai ser cortado, etc. Essas decisões no e social. Uma das coisas fundamentais mo tempo, é complicada. Isso porque geral não vão ser tomadas porque não do estado moderno seria uma igual- você não tem os recursos públicos ne- se criam situações de confrontação dade de oportunidades efetiva para direta. a população, e nós não chegamos lá cessários para colocar em prática tudo ainda. aquilo que foi escrito na Constituição como direito das pessoas. Patrimonialismo Penso que o conceito de patri- IHU On-Line – Nem mesmo de- monialismo é importante também, IHU On-Line – Em que medida pois da nova Constituição? porque está associado à ideia de que os conceitos de patrimonialismo e Simon Schwartzman – A nova a política é basicamente uma maneira Constituição foi resultado de um mo- homem cordial, de Sérgio Buarque de apropriação de bens públicos por mento em que o sistema de poder 5 de Holanda , continuam categorias determinados públicos. O conceito de anterior seria desfeito e o poder civil importantes para compreendermos patrimonialismo burocrático é que o ainda não estava muito bem estrutu- poder público é apropriado por deter- rado. Era um período de descontrole 5 Sérgio Buarque de Holanda (1902- minados grupos e exerce o poder em financeiro, descontrole econômico, e 1982): historiador brasileiro, também crítico literário e jornalista. Entre ou- benefício próprio. Isso é diferente de foi uma ocasião em que todo mun- tros, escreveu Raízes do Brasil, de 1936. uma noção de um estado democráti- do conseguia colocar na Constituição Obteve notoriedade através do conceito co moderno, de base contratual, em aquilo que queria. Como ninguém se de “homem cordial”, examinado nessa obra. A professora Dra. Eliane Fleck, do que no setor público, os funcionários, opunha, e não havia restrição de di- PPG em História da Unisinos, apresentou, tem um mandato, tem uma obrigação nheiro — porque naquele momento no evento IHU Ideias, de 22-08-2002, o definida por lei e tem que cumprir não estava envolvendo dinheiro di- tema O homem cordial: Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda, e no dia aquilo que é interesse coletivo, e não 08-05-2003, a professora apresentou essa simplesmente defender interesses in- 4 José Murilo de Carvalho (1939): Cien- mesma obra no Ciclo de Estudos sobre o tista político e historiador brasileiro, Brasil, concedendo, nessa oportunidade, dividuais. Creio que a política brasilei- membro da Academia Brasileira de Le- uma entrevista a IHU On-Line, publicada ra se faz em grande parte com a noção tras. É autor, entre outras obras, de A na edição nº 58, de 05-05-2003, disponí- formação das almas: o imaginário da Re- vel em http://bit.ly/152MP1v. Sobre Sér- de que as pessoas estão ali para de-

www.ihu.unisinos.br pública no Brasil (São Paulo: Companhia gio Buarque de Holanda, confira, ainda, fender seus interesses privados, e isso das Letras, 1990) e Cidadania no Brasil a edição 205 da IHU On-Line, de 20-11- cria uma situação de grande desmo- – o longo caminho (Rio de Janeiro: Civi- 2006, intitulada Raízes do Brasil, dispo- lização Brasileira, 2001). (Nota da IHU nível para download em http://bit.ly/ ralização e descrédito da política em On-Line) SMypxY. (Nota da IHU On-Line) relação à população como um todo.

20 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 T IHU On-Line – Como a ideia de IHU On-Line – Qual a importân- “patrimonialismo”, um traço marcan- “Este é um cia do Estado-nação no contexto con- ema de Capa te da sociedade brasileira, constitui- temporâneo e quais são os desafios -se como uma espécie de ethos das problema postos? relações entre Estado, sociedade e Simon Schwartzman – Não va- mercado no Brasil? Como o auto- brasileiro. Vivemos mos falar em Estado-nação, vamos ritarismo brasileiro se revela neste falar em Estado nacional, que fre- espaço? frequentemente quentemente tem dentro de si uma Simon Schwartzman – Esse é variedade às vezes cultural e ética o tema da minha tese de doutorado dilemas muito diferente. Penso que ele tem e do meu livro Bases do autoritaris- que administrar um pacto social ali mo brasileiro (Rio de Janeiro: Editora complicados, e a dentro, as pessoas precisam ter ga- Campus, 1982). Eu me apoiei muito rantias fundamentais de liberdade em um trabalho pioneiro de Raymun- tendência, tanto individual, liberdade de expressão, do Faoro6, que é um trabalho clássico liberdade de propriedade, liberdade sobre o patrimonialismo brasileiro. A quanto possível, de comércio. E também que tenham diferença que eu vejo em relação ao um controle sobre sua moeda. Nós que tentei fazer, é que Faoro dá essa é evitar qualquer conhecemos a experiência do Mer- tradição patrimonialista como uma cado Comum Europeu, que está com coisa inevitável. Algo que está em decisão que possa problemas muito sérios porque abriu tudo, que não tem jeito, que é uma mão do controle da moeda e não criou coisa da cultura e não tem como me- afetar interesses” instituições suficientemente fortes xer. Eu tentei mostrar que não é assim, em nível supranacional para controlar e que à medida que uma sociedade a parte financeira. Ou seja, os Estados vai se tornando mais complexa, vai se têm que ter uma moeda, têm que ter desenvolvendo, cria-se necessidade, um banco central. Eles têm políticas demanda e pressão para outro tipo fica com suas dinâmicas de mercado de investimento, coletam impostos e de organização social. Então eu pen- põe em xeque conceitos básicos de precisam usar bem os impostos. Há sei que isso poderia ser um contraba- Estado nacional? Por quê? O que isso uma série de funções do Estado na- lanço a esta tendência, a esta carga significa em termos de soberania? cional que são fundamentais e não se histórica do patrimonialismo. Inclu- Simon Schwartzman – A sobera- pode abrir mão delas. sive, mais recentemente, vários eco- nia é um conceito limitado, quer dizer, nomistas têm trabalhado a diferença o papel do governo é administrar a Funções do Estado entre as origens da pobreza ou da ri- participação do país na comunidade O Estado tem uma responsabi- queza, o que na verdade retoma uma internacional e no mercado inter- lidade muito grande por regular, por discussão que para os economistas é nacional. Eu não vejo essa oposição garantir direitos, e não mais para co- novidade, mas para a área da ciência entre Estado e nação. Penso que as mandar a economia e tomar decisões, política não: a ideia de que a história tentativas de criar estados nacionais porque, na verdade, cada vez mais e o passado, da forma como o sistema fechados para o mercado redundam isso fica a cargo dos indivíduos em um político foi organizado, explica muito em fracasso absoluto e em coisas mercado que é internacional e aber- do presente. No entanto, penso que piores. Creio que hoje em dia todos to. Uma função muito importante dos não a ponto do extremo que chegou entendem que a economia do mundo Estados nacionais é capacitar e educar Faoro, que enxergava isso como uma funciona em mercados, mas que ago- as pessoas para você poder participar espécie de defeito de nascimento que ra os mercados podem ser regulados. desse circuito mundial de formação, www.ihu.unisinos.br não tinha solução. Os Estados têm recursos legais e re- de conhecimento, e estar associado cursos internos para poder regular o a um fluxo de bens e compras, de co- IHU On-Line – O senhor conside- mau uso do mercado, e não são com- mércio internacional. Essa é a função ra que nossa sociedade tecnocientí- pletamente desarmados em relação a dos sistemas educativos, onde parte é isso. Agora, os estados que funcionam feita de maneira privada, como o mer- 6 Raymundo Faoro ou Raimundo Faoro (1925-2003): Jurista, sociólogo, historia- bem, os países que estão bem, são cado da educação, mas que também dor e cientista político brasileiro. Suas aqueles que conseguem se integrar tem uma função muito importante do obras se propõem a fazer uma análise da bem aos mercados internacionais e sistema público. Então a agenda do sociedade, da política e do Estado brasi- leiro. Em seu livro mais clássico, Os Donos criar um mercado interno que funcio- setor público é uma agenda importan- do Poder (Porto Alegre: Editora Globo, ne segundo regras claras e manobras te e continua sendo. 1958), abordou conceitos de patrimonia- jurídicas adequadas, e isso não é uma lismo brasileiro, onde o contextualizava a partir da colonização portuguesa. Ray- coisa que eu vejo em contradição à IHU On-Line – No que se refere mundo foi membro da Academia Brasilei- soberania. Na verdade é um fator à democracia, o senhor considera, ra de Letras e Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). (Nota da IHU muito importante para as sociedades levando em conta o período de rede- On-Line) modernas. mocratização recente, que ultrapas-

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 21 samos a democracia formal para uma tico representativo que funciona mal, democracia mais profunda? “Eu não no qual, se for perguntar para alguém Simon Schwartzman – Democra- em quem votou para deputado, nin- cia profunda? Quando se fala em de- acredito em guém lembra, e se perguntar o que o mocracia, é formal. Democracia tem a político está fazendo, ninguém tem a ver com regras, com leis e com obe- democracia não menor ideia. Então, digamos, o siste- diência às leis. Tem a ver com o siste- ma representativo está muito corrom- ma eleitoral. Então você pode discutir representativa. pido por dentro e o sistema partidá- se o nosso sistema formal funciona rio é um sistema em que as pessoas bem enquanto sistema formal. A mi- Democracia também não se sentem muito identi- nha resposta é que não funciona mui- ficadas. Creio que isso contribui para to bem, no sentido em que temos um direta talvez esta sensação generalizada de que o Judiciário que é lento e moroso; um sistema político não deveria existir. O Parlamento que funciona de maneira tenha existido em que eu acredito não é que ele deveria

ema de Capa precária, muito sujeito à corrupção; deixar de existir, mas deveria funcio-

T um Executivo que não consegue se Atenas, se é que nar bem. Eu não acredito em demo- organizar de maneira muito eficiente. cracia não representativa. Democra- Basicamente, temos uma legislação existiu. Mas isso cia direta talvez tenha existido em muito confusa, inclusive do ponto de Atenas, se é que existiu. Mas isso, nas vista de regulação do mercado. Nós nas sociedades sociedades modernas, é impensável. temos muito que avançar na organiza- Outra coisa que esses movimentos ção dos aspectos formais que são os modernas é também refletem é uma situação que que definem os direitos das pessoas, o deriva da estagnação econômica. Ou espaço das pessoas, etc. Depois você impensável” seja, nós tivemos um período longo tem outros aspectos das sociedades em que o governo usou suas energias modernas que têm a ver com os direi- para melhorar um pouco a situação tos sociais, como o direito à educação, cracia representativa por um tipo de de pobreza da população em situa- à saúde, a uma proteção da velhice. democracia direta. Que o povo nas ção mais extrema, como Bolsa Escola, Em relação a isso avançamos alguma ruas poderia substituir os sistemas Bolsa Família, muito voltados para a coisa, mas estamos longe do que gos- institucionais de partidos, Câmara população rural, a região Nordeste, taríamos. Às vezes as pessoas colo- dos Deputados, etc. Eu penso que etc. Então a classe média urbana fi- cam isso em contraponto, uma ideia isso é um equívoco muito sério, pois, cou meio achatada nesse processo. E, de que o que importa são os direitos se levado ao extremo, isso cria uma com os custos de serviço aumentando sociais e não a organização política, e situação de caos que pode ser apro- continuamente, as condições de vida penso que isso é um equívoco grave. veitada por alguns grupos oportunis- nas cidades foram se deteriorando, o Claro que alguns países socialistas, tas que acabam tomando o poder em problema de violência que na verdade como a antiga União Soviética e Cuba, benefício próprio. Esse é um aspecto não se consegue controlar, o sistema que avançaram bastante na educação, muito negativo dessas manifestações. de saúde pública precário, etc., creio mas esses países todos criaram socie- Outro aspecto é a ideia de que cabe que isso começa a afetar as pessoas e dades autoritárias que finalmente se ao governo atender a tudo o que as levam à situação de protestos. Se con- arruinaram, por que não consegui- pessoas querem: transporte “zero”, seguirmos aproveitar, identificando ram criar uma sociedade moderna, meia entrada para todo mundo no ci- essas insatisfações, e isso resultar em dinâmica e contemporânea. Nós não nema, tarifa “zero”, etc. Também é um melhores serviços públicos, melhor podemos olhar os aspectos sociais da tipo de demanda muito ingênuo por- transparência dos gastos públicos, um democracia como contraponto aos as- que não leva em consideração que as sistema político reorganizado para se pectos formais. coisas têm custo. O que se gasta aqui, tornar mais representativo e mais au- não se gasta lá. O governo pode segu- têntico, eu penso que vai ter um ga- IHU On-Line – Os protestos ocor- rar as tarifas e daqui a pouco vai es- nho importante. ridos em junho deste ano revelaram tourar lá na frente em déficit, inflação, certa crise de representação com os etc. É uma sensação muito imediata IHU On-Line – Em que medida o legislativos, em suas diferentes - ins que as pessoas têm, que se traduz senhor considera necessária uma re- tâncias. Tais manifestações são sinto- logo em um movimento, mas quando forma política consistente em nosso mas de uma democracia mais partici- você pensa um pouco mais a longo país? pativa? O que elas significam? prazo, você vai ter uma liderança que Simon Schwartzman – Eu creio Simon Schwartzman – Signifi- não reage só em função das emoções que é necessária. Temos um debate cam muita coisa, pois tinha muita do momento. sobre o voto distrital e eu participo www.ihu.unisinos.br gente com cabeças muito diferentes. daqueles que acreditam que seria um Havia certamente, pelo menos em Lado positivo das manifestações avanço para o nosso sistema de repre- certos grupos, a ideia de que você O lado positivo é que isso reflete sentação proporcional, que é pouco deveria substituir o sistema de demo- o fato de que temos um sistema polí- transparente. O atual sistema é uma

22 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 concepção que ninguém entende di- desse jeito. Por outro lado não se sional de capacitação para o mercado T reito, que dá margem para muita cor- pode deixar assim, em que o dinheiro de trabalho. E isso, no Brasil, foi en- ema de Capa rupção. Na verdade, ele tira o direito de campanha na verdade são lobbys tendido principalmente por muitos in- de representação das populações dos que financiam deputados para defen- fluentes da área da educação como se estados maiores. Você precisa de mui- der seus interesses. Então essa é uma você estivesse dividindo a sociedade, to menos gente para eleger um de- questão difícil que precisa chegar a que você está dando educação de se- putado ou senador em um pequeno um meio termo. gunda classe, dando educação para o estado do que em São Paulo. É uma mercado de trabalho que é uma coisa discriminação com os grandes centros IHU On-Line – Qual o papel da muito ruim. Isso leva a situação que urbanos do país. Então creio que isso educação na construção/reconstru- nós temos hoje, em que o governo fe- deve ser alterado, e a ideia do voto ção da cidadania na sociedade brasi- deral lançou um programa de ensino distrital é uma parte importante em leira? Que atenção deve ser dada aos técnico onde você precisa primeiro relação a isso. diferentes níveis — básica, técnica e passar no ENEM7 para depois poder, superior? conforme a sua classificação, escolher Proliferação dos partidos Simon Schwartzman – Essa é Também creio que temos um uma questão fundamental, porque se vai fazer um ensino técnico. Isso problema em relação à proliferação o que caracteriza uma sociedade vira essa formação de cabeça para de partidos, que eu considero nocivo. moderna é uma cidadania educada, baixo. O Brasil é o único país do mun- Muitos desses partidos não passam de que possa entender as questões da do que exige um currículo acadêmico legendas de aluguel. Muitas pessoas sociedade e que tenha competência completo, que o Enem representa, dizem que é preciso defender a liber- inclusive profissional para gerar rique- como condição para o ensino técnico. dade de as pessoas se organizarem. za para si e para a sociedade. Então E as pessoas que conseguem passar Penso que ninguém nunca propôs im- penso que a educação é fundamen- no Enem não vão querer fazer o ensi- pedir que as pessoas se organizassem, tal. Nós temos no Brasil um sistema no técnico, vão querer fazer uma uni- mas sim que, ao se constituir um par- educacional público muito ruim, que versidade. Vai ter muita gente que não tido, observar que existem critérios não consegue andar para frente. Há consegue fazer o Enem e nem está in- presentes na legislação e que devem varias razões para isso, nós sabemos. teressada nesse currículo acadêmico ser cumpridos. Então nós precisamos Em parte tem a ver com precariedade que leva para o Enem. Nós acabamos de um sistema partidário mais simpli- de recursos, mas não é só isso e nem não desenvolvendo este espaço de ficado, não permitindo esse tipo de é principalmente isso. Nós temos um formação de nível médio um pouco partido de aluguel, no qual o eleitor problema sério de uma burocracia por uma questão de preconceito, por possa ser mais claramente em quem educacional onde as pessoas não es- não querer colocar claramente que está votando e o eleito tenha um tão ensinando o que elas deveriam. algumas pessoas vão para um lado e Temos um problema complicado aí. E público específico ao qual ele tenha outras vão para o outro. que atender e dar satisfações. Tem o Brasil não desenvolveu o ensino téc- uma questão complicada do financia- nico. Desenvolveu muito pouco e isso 7 Exame Nacional do Ensino Médio mento de campanhas, e aí eu penso tem a ver com aquela famosa questão (Enem): Criado em 1998, é uma prova que é complicado porque você corre do homem cordial, talvez. Nos países realizada pelo Ministério da Educação do Brasil para avaliar a qualidade do ensino o risco de ter o governo financiando que desenvolveram o ensino técnico, médio no país. Desde 2009 a prova tam- toda a campanha dos partidos majo- as pessoas quando chegam aos 15 bém é utilizada como exame vestibular ritários, o que perpetua uma situação anos de idade fazem opções; alguns unificado para acesso às universidades federais brasileiras através do SiSU (Sis- de monopólio desses partidos. Então vão mais para um curso acadêmico tema de Seleção Unificada). (Nota daIHU penso que é importante não fechar e outros vão para a formação profis- On-LIne) www.ihu.unisinos.br

LEIA OS CADERNOS TEOLOGIA PÚBLICA

NO SITE DO IHU

WWW.IHU.UNISINOS.BR

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 23 A igualdade emergente da Constituição de 1988 André Olivier, um dos coordenadores do curso de Direito da Unisinos, considera a igualdade um valor incondicional de nossa Carta Magna

Por Ricardo Machado ema de Capa T

Constituição de 1988 toma a igual- propriedade privada atenderá a sua função dade como um valor incondicio- social com o intento justamente de diminuir “A nal, que deve se aplicar a todas desigualdades sociais”, sustenta Olivier. O as pessoas sem exceções”, avalia André Luiz professor ressalta, entretanto, que a Consti- Olivier da Silva, em entrevista por e-mail à tuição permitiu mecanismos de interferência IHU On-Line, ao passo que descreve o con- entre um poder e outro. “A relação entre os ceito de igualdade: “No fundo, quando fala- poderes Executivo, Legislativo e Judiciário é mos em igualdade, falamos ao mesmo tempo movida por motivações políticas, motivações em diferenciações que devem ser ressaltadas que são, muitas vezes, pessoais e eleitoreiras, justamente para garantir a igualdade. Pare- deixando de lado os interesses públicos. Isso ce antagônico falar em igualdade ao mesmo não se deve apenas à Constituição de 1988, tempo em que se diferencia, mas, no fundo, que criou mecanismos de interferência de um é justamente esse o legado da nossa Consti- poder no outro, que nem sempre são usados tuição”. Ele destaca que o texto constitucional da maneira correta. As medidas provisórias, o restabeleceu os direitos individuais como “o impeachment e a última palavra do Supremo pensamento, a liberdade de opinião, de im- são exemplos de poderes fortes outorgados prensa, isto é, as liberdades que competem a a cada um dos Poderes, poderes capazes de todo indivíduo e que o Estado não pode re- interferir ativamente nos outros e que nem primir, liberdades que cabem ao indivíduo no sempre se justificam no seu uso hodierno”, sentido de poder se expressar do modo que destaca. bem entender, sem sofrer, em contrapartida, André Luiz Olivier da Silva é graduado em qualquer tipo de censura e repressão”. Direito e em Filosofia pela Unisinos. É mestre O professor destaca a importância dos e doutor em Filosofia por essa mesma insti- programas sociais garantidos pela Consti- tuição, com a tese Direitos Humanos e Exi- tuição e que puderam dar corpo às políticas gências Morais por Direitos. Leciona no curso públicas que visam diminuir a desigualdade de Direito e de Relações Internacionais da social. “A Carta Magna fortalece os direitos Unisinos. coletivos e diz, dentre outros tópicos, que a Confira a entrevista.

IHU On-Line – Como podemos o texto constitucional, seja no que proporcionalidade entre duas partes considerar o conceito de justiça antes tange aos direitos individuais, seja aos que não só se relacionam entre si, e depois da Constituição Federal de direitos sociais e coletivos. Se, por um como visam também a uma relação 1988? Houve mudanças nesse senti- lado, temos uma justiça comutativa, paritária e equânime. Essas partes se do? Quais? que reduz o cidadão à vítima, repa- constituem a partir de pessoas físicas André Luiz Olivier da Silva – O rando e indenizando o dano sofrido, e jurídicas, e em especial a partir do Preâmbulo da Constituição Federal por outro, a justiça é também tomada Estado. de 1988 aponta a igualdade e a justi- fortemente como igualdade distribu- www.ihu.unisinos.br ça como valores supremos do Estado tiva. No fundo, a Constituição segue Igualdade Democrático de Direito e, nesse sen- a tradição ocidental e aristotélica, no A Constituição de 1988 toma a tido, podemos identificar duas moda- sentido de que a justiça é uma ques- igualdade como um valor incondicio- lidades de igualdade que perpassam tão de igualdade; é uma questão de nal, que deve se aplicar a todas as

24 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 T pessoas sem exceções. Mas dizer que por certo, aponta para a excessiva ju- ambiente. Em razão disso, não pode- a justiça é sinônimo de igualdade não dicialização de demandas. mos negar os avanços trazidos por ela. ema de Capa facilita a sua leitura, nem torna mais Acho, ainda, que um direito muito simples a prestação jurisdicional e IHU On-Line – Do ponto de vista importante assegurado pela Constitui- a efetividade de seus dispositivos. É do Direito e em termos de democra- ção é a gratuidade da justiça, pois, além justamente aí que os problemas cos- cia, que mudanças significativas hou- de arrolar direitos individuais e coleti- tumam aparecer e se agravar, visto ve com a nova Carta Magna e onde o vos, a Constituição de 1988 concedeu que a igualdade não pode ser tomada texto deixou de avançar? o direito de se reivindicar judicialmen- apenas como uma igualdade rasa, que André Luiz Olivier da Silva – A te por outros direitos. Para viabilizar o trata a todos como absolutamente Constituição Federal de 1988 repre- acesso ao poder Judiciário, a Constitui- iguais, quando todos os cidadãos são senta, ao menos formalmente, o rom- ção trouxe novos atores para o cenário tratados como iguais sem nenhum pimento com a arquitetura dos Atos brasileiro, criando novos personagens tipo de distinção. No fundo, quando Institucionais 4 e 5, de 1967 e 1969, e, ou fortalecendo aqueles já existentes. falamos em igualdade, falamos ao com isso, apresenta mudanças signifi- Agentes da sociedade civil organizada, mesmo tempo em diferenciações que cativas na estruturação de um estado assistentes sociais, membros do Minis- devem ser ressaltadas justamente democrático de direito. Ela também tério Público e da Defensoria Pública, para garantir a igualdade. Parece an- almeja o estado de bem-estar social, bem como os ministros do Supremo, tagônico falar em igualdade ao mes- tanto por meio de direitos individuais, dentre outros personagens, foram mo tempo em que se diferencia, mas, quanto em razão da distribuição da chamados a participar ativamente das no fundo, é justamente esse o legado prestação estatal a partir dos direitos demandas sociais e jurídicas. Tanto é da nossa Constituição. Pensemos, por coletivos. verdade que hoje em dia se discute o exemplo, no tratamento diferenciado Trata-se de um texto marcado poder dos juízes e desembargadores, dado a negros e indígenas que preten- por liberdades e garantias individuais, ou dos ministros do Supremo ou, ain- dem entrar na universidade. Seria um que, ao contrário do texto oriundo da, dos representantes do Ministério equívoco pensar que negros e índios da ditadura militar, limita o Poder So- Público – poder este, talvez, a mais do estão em patamar de igualdade nu- berano, como quando, por exemplo, que os membros dos outros Poderes mérica com brancos em um país que aponta para o banimento da tortura, do Estado. viveu por muitos séculos sob a força ou como no caso da menção ao habe- da chibata. Indígenas e negros não es- as corpus e ao habeas data. A nossa IHU On-Line – A Constituição tão em posição paritária com brancos Carta Magna restabelece direitos indi- Federal deu conta de diminuir a de- para concorrerem, por exemplo, em viduais, como a livre manifestação do sigualdade no tratamento jurídico um concurso vestibular. Por causa dis- pensamento, a liberdade de opinião, entre pessoas pobres e abastadas? so, almejamos um tratamento diferen- de imprensa, isto é, as liberdades que Quais os avanços? ciado, por meio de cotas afirmativas, competem a todo indivíduo e que o André Luiz Olivier da Silva – Não que visam colocar o afrodescendente Estado não pode reprimir, liberdades podemos negar que o Brasil avançou e o indígena em posição semelhante que cabem ao indivíduo no sentido muito desde 1988 no que tange à ao branco para disputar uma vaga na de poder se expressar do modo que implementação de políticas públicas universidade. Nesse sentido, pode- bem entender, sem sofrer, em contra- para garantir a efetivação dos direitos mos pensar a relação da justiça e da partida, qualquer tipo de censura e coletivos e a redução das desigualda- igualdade a partir de uma concepção repressão. Nesse sentido, a Constitui- des sociais. Isso se deve a uma série distributiva, segundo a qual o Estado ção de 1988 restabelece a democracia de programas sociais que se intensi- intervém na sociedade para garantir a no Brasil, institui eleições majoritárias ficaram nos governos Lula e Dilma1. efetividade de direitos coletivos a par- e faculta o voto para cidadãos entre Tais programas sociais dão corpo a tir da distribuição diferenciada de seus 16 e 17 anos. Além disso, apresenta políticas públicas que combatem as www.ihu.unisinos.br bens, como, por exemplo, vagas para avanços significativos no campo dos desigualdades sociais, mas elas só se negros e índios em universidades pú- direitos sociais. Ela afirma a função tornaram viáveis por causa da Cons- blicas a partir de um sistema de cotas social da propriedade privada e come- tituição de 1988, que aponta como afirmativas. Por outro lado, verifica- ça a desenhar o SUS, o Sistema Úni- objetivo fundamental da República a -se no Brasil também uma concepção co de Saúde. Restabelece o direito à erradicação da pobreza e a redução comutativa ou reparadora da justiça, greve, além de outros direitos traba- das desigualdades sociais e regionais. que afirma liberdades individuais ao lhistas, que envolvem a redução da A Carta Magna fortalece os direitos levar às últimas consequências o exer- jornada de trabalho e a ampliação da coletivos e diz, dentre outros tópicos, cício de direitos civis. Nesse caso, a licença maternidade – temas que pro- justiça visa à correção de relações de- vocam atualmente sérias discussões que a propriedade privada atenderá a siguais, quando, por exemplo, na pior polêmicas. Outros temas inovadores 1 Dilma Roussef: economista e política das hipóteses, o Judiciário é chamado da Constituição envolvem os direitos brasileira, filiada ao Partido dos Traba- para reparar direitos que foram vio- difusos, isto é, direitos que pertencem lhadores (PT). Atualmente é ministra- lados ora por outros indivíduos, ora à sociedade como um todo, como o chefe da Casa Civil e a candidata apoia- da pelo atual governo para as eleições à pelo próprio Estado. Esta concepção compromisso com a demarcação de Presidência da República, em 2010 (Nota resume-se em perdas e danos, o que, terras indígenas e a proteção do meio da IHU On-Line).

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 25 sua função social com o intento jus- deriam ser resolvidos por leis comple- tamente de diminuir desigualdades “A Constituição mentares e ordinárias. Mesmo sendo sociais. Ela afirma e reafirma a educa- extensa e emendada, a Constituição ção e a saúde como direito de todos. de 1988 toma de 1988 aposta na regulamentação Faz, inclusive, referência explícita aos dos direitos que ali foram mencio- índios, às crianças e aos adolescentes, a igualdade nados, pois muitos dos direitos que aos idosos, aos analfabetos, como estão prescritos na Carta Magna ca- sujeitos de direitos, intensificando o como um valor recem de regulação em lei infracons- respeito aos seus direitos básicos e titucional. Como consequência, en- incluindo-os nos processos de parti- incondicional, que tramos em um círculo vicioso a partir cipação popular. Por causa disso, não do qual não regulamentamos nossos creio que o principal problema para deve se aplicar a direitos constitucionais por causa das diminuir a desigualdade social seja a práticas institucionais de nossos ho- nossa Constituição. Os problemas re- todas as pessoas mens públicos, em especial os elei- ema de Capa sidem na ausência de regulação dos tos do poder Legislativo. Quando os

T direitos prometidos na Carta Magna e sem exceções” direitos são efetivados em lei, outros no modus operandi de nossas práticas homens públicos, agora do poder Exe- institucionais, práticas que impossibi- cutivo, deixam de cumprir a lei e não litam a chegada da prestação estatal coletivamente a sociedade e mais prestam a devida e legal prestação do para os mais pobres. consumidores ou clientes do Estado. Estado. Para agravar o problema, o cidadão que percebe a ineficácia dos Direitos IHU On-Line – Onde o texto dei- seus direitos constitucionais recorre É fato que a nossa Constituição xou de avançar? Quais os limites? ao poder Judiciário com o objetivo outorgou muito mais direitos do que André Luiz Olivier da Silva – A de buscar uma decisão que resolva o qualquer texto constitucional aos ci- Constituição de 1988 avança no exer- seu problema individual. A partir daí, dadãos brasileiros. Ela garante, como cício de direitos individuais e coleti- se estabelece uma promíscua relação disse antes, a gratuidade do acesso à vos, bem como amplia o reconheci- entre os três Poderes. justiça, o que, por certo, provocou o mento de novos sujeitos de direito aumento da judicialização de conflitos e de novos atores institucionais. Ela IHU On-Line – Considerando as- do direito privado, a partir do qual se aponta claramente para um estado pectos éticos, como se dá a relação aperfeiçoam as liberdades individuais, do bem-estar social. Com efeito, para entre os poderes Executivo, Legisla- como, por exemplo, o direito do con- delimitarmos onde retrocedemos, te- tivo e Judiciário após a promulgação sumidor. Neste movimento, o cida- ríamos que distinguir alguns tópicos da Constituição de 1988? Que ten- dão torna-se uma vítima habilitada a determinantes. O primeiro deles é a sões se estabelecem? receber uma indenização e isso até falta de regulamentação em legisla- André Luiz Olivier da Silva – A costuma funcionar bem no que tange ção infraconstitucional para os mui- relação entre os poderes Executivo, Le- ao direito privado. O problema ocor- tos direitos mencionados na Carta de gislativo e Judiciário é movida por mo- re quando práticas institucionais nos 1988; o segundo diz respeito às prá- tivações políticas, motivações que são, conduzem a judicializar demandas in- ticas institucionais, o que não cons- muitas vezes, pessoais e eleitoreiras, dividuais para reivindicar direitos que titui propriamente um problema da deixando de lado os interesses públi- são coletivos, direitos para os quais o Constituição nem do desenho de suas cos. Isso não se deve apenas à Consti- Estado não ofereceu a sua prestação instituições; o terceiro diz respeito às tuição de 1988, que criou mecanismos e, em razão disso, o cidadão passou a emendas que foram costuradas ao de interferência de um poder no outro, exigi-los a partir do poder Judiciário. texto de 1988. Se a Constituição dei- que nem sempre são usados da manei- No fundo, a igualdade distributiva, xou de avançar em algum ponto, eu ra correta. As medidas provisórias, o quando violada, vem a ser cumprida e diria que perdemos a oportunidade impeachment e a última palavra do Su- respeitada somente a partir da repa- de escrever um texto mais principio- premo são exemplos de poderes fortes ração na esfera cível, como, por exem- lógico, contendo apenas princípios outorgados a cada um dos Poderes, po- plo, os casos de doentes terminais e cláusulas pétreas, e não, como a deres capazes de interferir ativamente que procuram, por meio do Judiciário, Constituição que temos, um texto nos outros e que nem sempre se justi- a intervenção estatal para custear as repleto de dispositivos semelhantes ficam no seu uso hodierno. Em razão despesas do seu oneroso tratamento à legislação infraconstitucional. Se o de práticas institucionais corrompidas, médico. Reparem que, por meio do Poder Constituinte tivesse sido mais esses mecanismos, dentre tantos ou- Judiciário, apenas o seu problema, econômico e elaborado um texto mais tros, são usados não com o intento de como indivíduo, é resolvido, mas não enxuto do que o nosso texto atual, uma intervenção legítima e habilitada o da sua comunidade. Parece que talvez isso tivesse inibido a produção a movimentar a mecânica dos freios www.ihu.unisinos.br pensamos a distribuição das riquezas excessiva de Emendas à Constituição, e contrapesos. Constituem-se, muitas do Estado por meio da lógica da jus- que, nos últimos 25 anos, fez da nossa vezes, na contramão da Constituição tiça retributiva e, com isso, nos torna- Carta Magna uma colcha de retalhos, e em barganha de troca política. O po- mos menos cidadãos que constroem um texto tocando em pontos que po- der Executivo, por meio das emendas

26 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 parlamentares, distribui benesses aos um veredito final. O Judiciário, inclu- T parlamentares em troca da aprovação “Um direito sive, se posicionou favorável às cotas ema de Capa de seus projetos legislativos. O Legisla- afirmativas, dentre outras questões tivo, por sua vez, garante a governabili- muito importante sobre as quais o legislador e o Executi- dade do chefe do Executivo, seja ele o vo querem distância. prefeito, o governador ou o presidente assegurado pela da República. Do contrário, o derruba Transparência no dia seguinte. O Judiciário, por seu Constituição é Embora tenha crescido muito, o turno, vem ganhando um papel mais Judiciário ainda é muito pouco trans- protagonista no Brasil, um poder cada a gratuidade da parente, menos transparente do que vez mais provocado pelo cidadão a ofe- os outros Poderes, principalmente por- recer uma resposta diante de conflitos justiça” que o Executivo e o Legislativo estão de interesses. O Judiciário vem sendo mais expostos e muito mais na vitrina chamado, inclusive, para decidir con- do que o Judiciário. Deputados e sena- flitos político-institucionais dos outros solução imediata de conflitos do que dores, assim como o próprio presiden- dois Poderes, quando membros ora do um estimulador de demandas judi- te da República, são instigados a dar Executivo, ora do Legislativo, não saem ciais. Esse é, por certo, mais um pro- mais explicações para o povo do que do dissenso e são instigados a judiciali- blema de prática institucional do que juízes, desembargadores e ministros. zar a sua demanda. um efeito colateral gerado pela Cons- A própria mídia coloca o microfone na tituição. Se não recorrêssemos ao cara de um parlamentar com muito IHU On-Line – Em que medida a Judiciário, iríamos recorrer a quem? mais facilidade do que na de um ma- promulgação da Constituição Federal Sem o Judiciário e outras instituições gistrado, que, por sua vez, se preser- gerou uma prática jurídica que resul- democráticas, só nos restaria o estado va mais e, digamos assim, se esconde tou na sobrecarga do poder judiciá- de natureza hobbesiana2 e a guerra de atrás da capa preta. É bem verdade rio? O problema está na redação do todos contra todos. que os eleitos do nosso povo vêm à mí- texto, na interpretação ou trata-se de dia para justificar o injustificável e, em um efeito colateral? Obstáculo muitos casos, não apresentam a míni- André Luiz Olivier da Silva – Den- Se focarmos a discussão na prá- ma vergonha em darem explicações tre os três Poderes, o Judiciário foi, tica do Judiciário, veremos, então, poucos plausíveis sobre a destinação talvez, o que mais tenha crescido, de muitos problemas e que, não raras da coisa pública. Mas acho que o Judi- modo que verificamos, cada vez mais, vezes, o Judiciário se configura mais ciário precisa expor com mais clareza o protagonismo desempenhado por como um obstáculo à nossa República para a população como é a sua estru- nossos tribunais, em especial o prota- do que como um incentivador dela. É tura organizacional, quanto ganham gonismo do Supremo no que tange ao bem verdade que o Judiciário já pro- e como trabalham os seus servidores julgamento de decisões políticas. Por feriu e vem proferindo uma série de e funcionários públicos, bem como o um lado, podemos dizer que a nossa decisões progressistas que aceleram modo segundo o qual as decisões são Constituição radicalizou a defesa de nossa caminhada rumo à democra- proferidas. Além disso, o poder Judiciá- direitos e liberdades individuais, tor- cia. Exemplos não faltam, mesmo que rio precisa ser menos seletivo quanto nando-nos cada vez menos cidadãos esses exemplos demonstrem mais a àqueles que se beneficiam ou são con- e mais consumidores. Nesse sentido, falência dos outros dois Poderes do denados por suas decisões. podemos identificar que nossos ma- que o mérito do Judiciário. Por exem- gistrados, em especial os das primei- plo, o legislador se nega a enfrentar ras instâncias, estão sobrecarregados questões polêmicas, como a união ho- não apenas porque a população bate Leia mais...

moafetiva, e é neste momento que o www.ihu.unisinos.br às suas portas cada vez mais e com Judiciário é chamado à tona para dar muito mais facilidade do que há duas • “O poder Judiciário é exemplar décadas, mas também porque po- quando o criminoso é pobre”. En- deria estar mais bem estruturado e 2 Thomas Hobbes (1588 – 1679): filósofo trevista com professor André Luiz aparelhado para resolver problemas inglês. Sua obra mais famosa, O Leviatã corriqueiros, que são simples e do (1651), trata de teoria política. Neste Olivier da Silva para a IHU On-Line, livro, Hobbes nega que o homem seja dia-a-dia, mas que, por não conse- um ser naturalmente social. Afirma, ao edição 383, disponível em http:// guirmos prestar uma resposta jurisdi- contrário, que os homens são impulsio- bit.ly/vsQbH0; cional mais célere e eficaz, entopem e nados apenas por considerações egoístas. Também escreveu sobre física e psicolo- massificam as demandas desse poder. gia. Hobbes estudou na Universidade de • Os limites da razão e um ceticismo Basta pensarmos em problemas co- Oxford e foi secretário de Sir Francis Ba- mitigado. Entrevista com professor tidianos como o pagamento de uma con. A respeito desse filósofo, confira a entrevista O conflito é o motor da vida André Luiz Olivier da Silva para a dívida. São problemas que surgem e política, concedida pela Profa. Dra. Ma- ressurgem o tempo inteiro na socie- ria Isabel Limongi à edição 276 da revista IHU On-Line, edição 369, disponível dade e para os quais os Estado pode- IHU On-Line, de 06-10-2008. O material está disponível em http://bit.ly/gg- em http://bit.ly/omMPLa; ria servir mais como um mediador na mghe. (Nota da IHU On-Line)

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 27 Os desafios à construção da cidadania brasileira José Murilo de Carvalho avalia os lentos, mas não menos importantes, avanços de nosso republicanismo

Por Ricardo Machado ema de Capa

T s vésperas de o Brasil celebrar os 25 anos pacto. Há ainda muito embargo infringente, mui- da atual Constituição Federal, discussões ta chicana jurídica que podem reduzir sua signi- Àsobre cidadania e republicanismo emer- ficação. De todos os graúdos processados, creio gem à medida que colocamos em perspectiva que só o juiz Nicolau foi preso, embora em do- nossa jovem Carta Magna. Professor doutor e micílio. Em breves passadas pelas cadeias, todos membro da Academia Brasileira de Ciências — eles têm direito a prisão especial, outra escanda- ABC e da Academia Brasileira de Letras — ABL, losa violação da igualdade de direitos. Tudo isso José Murilo de Carvalho contribui ao debate pro- tem a ver com direitos civis cuja falta de garantia posto pela IHU On-Line. Ainda que o novo do- para toda a população ainda me parece ser um cumento tenha permitido avanços à cidadania, sério obstáculo à construção de uma república nosso republicanismo caminha a passos lentos, democrática”, sustenta José Murilo de Carvalho. como avalia o professor, em entrevista por e- O professor ainda faz um paralelo entre o que -mail. “À medida que aumenta o nível de esco- foi a Constituinte de 1889 e as manifestações laridade e de organização dos cidadãos, esses ocorridas em junho deste ano. “Como disse a um dispositivos começam a ter aplicação. Tudo tem jornal do Rio, em novembro de 1889 o povo as- sido muito lento, e é com essa lentidão que se sistiu bestificado à proclamação da República por constrói nosso Estado-nação-sociedade. Ele co- políticos e militares; em junho de 2013, políticos meçou como Estado no século XIX injetou-se na- e militares assistiram bestificados à invasão da ção no século XX, mas a parte da sociedade ativa República pelo povo nas ruas. A elite política bra- ainda engatinha. Não estamos condenados pelo sileira, inclusive a que governa o país há 10 anos, passado, mas há, sem dúvida, longa duração em precisa ser corrigida e educada pelos cidadãos e certos valores e estruturas sociais”, explica. Parte contribuintes”, dispara. dessa característica o professor atribui aos “lega- José Murilo de Carvalho é graduado em dos do patrimonialismo, da escravidão, da falta Sociologia e Política pela Universidade Federal de educação popular que até hoje pesam sobre de Minas Gerais, fez mestrado e doutorado em nossa sociedade”, os quais acabam por compro- Ciência Política na Stanford University. Seu pós- var, no entendimento de José Murilo de Carva- -doutorado em História da América Latina foi lho, “a corrupção generalizada, as desigualdades realizado na University of London. Atualmente de cor, os baixos níveis de escolaridade e índices é professor emérito da Universidade Federal do de qualidade da educação”. Rio de Janeiro — UFRJ, pesquisador emérito do Os reflexos dessa cidadania que segue em CNPq, membro da Academia Brasileira de Ciên- construção comportam certos avanços ao mes- cias e da Academia Brasileira de Letras. Publi- mo tempo em que revelam profundos desafios. cou dez livros, um traduzido para o francês, dois “O julgamento do mensalão representou, até para o espanhol, um para o inglês, organizou 13 agora, avanço no combate à impunidade gene- outros e publicou, ainda, mais de 120 capítulos ralizada do andar de cima, mas será necessário de livros e artigos em revistas especializadas. aguardar seu final para avaliar o verdadeiro im- Confira a entrevista.

IHU On-Line – O que significa José Murilo de Carvalho – O direitos civis já constitucionalizados falar em cidadania no Brasil após a grande problema da cidadania no em 1824, como a igualdade perante a www.ihu.unisinos.br Constituição de 1988? Na prática, o Brasil não é sua consagração legal. lei, continua letra morta para boa par- que de cidadania resta à sociedade A Constituição de 1824 já era muito te da população. Nosso bacharelismo para além da formalidade dos direi- avançada para a época. O problema acha que, feita a lei, resolve-se o pro- tos sociais, políticos e civis? é a implementação. Grande parte dos blema. Curiosamente, certos direitos

28 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 T novos, como a preservação do meio ção, aos direitos difusos e coletivos, à José Murilo de Carvalho – O jul- ambiente, têm implementação mais ação popular, à ação civil pública, à gamento do mensalão representou ema de Capa rápida, talvez exatamente por se ori- ação direta de inconstitucionalidade, até agora avanço no combate à im- ginarem a partir de demandas sociais etc. Outros dispositivos permanecem punidade generalizada do andar de concretas. letra morta, como o controle externo cima, mas será necessário aguardar da atividade policial pelo Ministério seu final para avaliar o verdadeiro IHU On-Line – A Constituição de Público — MP, a introdução da justi- impacto. Há ainda muito embargo in- 1988 avançou em relação às prede- ça de paz eleita, a entrância especial fringente, muita chicana jurídica que cessoras, garantindo maior amplitu- para questões agrárias. À medida que podem reduzir sua significação. De de dos direitos sociais, políticos e ci- aumenta o nível de escolaridade e de todos os graúdos processados, creio vis. Entretanto, como explicar nossa organização dos cidadãos, esses dis- que só o juiz Nicolau foi preso, embo- cidadania deficitária? positivos começam a ter aplicação. ra em domicílio. Em breves passadas José Murilo de Carvalho – Des- Tudo tem sido muito lento, e é com pelas cadeias, todos eles têm direito de a Independência, tivemos uma essa lentidão que se constrói nosso a prisão especial, outra escandalosa elite letrada atenta ao que se passa- Estado-nação-sociedade. Ele come- violação da igualdade de direitos. As va no mundo ocidental e desejosa de çou como Estado no século XIX, inje- próprias instituições que compõem os importar seus padrões de civilidade, tou-se nação no século XX, mas a par- sistemas policial e judiciário parecem mesmo que não condissessem com te da sociedade ativa ainda engatinha. mais preocupadas com interesses a realidade. O exemplo mais gritante corporativos do que com o exercício disso ainda continua sendo o da exclu- IHU On-Line – Que marcas da de seus deveres. Tudo isso tem a ver são da escravidão, uma violação explí- colonização portuguesa podemos com direitos civis cuja falta de garan- cita de direitos civis, do texto de 1824. perceber no republicanismo brasilei- tia para toda a população ainda me Pensadores conservadores, de Vis- ro atual? parece ser um sério obstáculo à cons- conde do Uruguai 1a Oliveira Viana2, e José Murilo de Carvalho – Não trução de uma república democrática. mesmo Guerreiro Ramos3, chamaram estamos condenados pelo passado, a atenção para este fato. Reformismo mas há, sem dúvida, longa duração IHU On-Line – Que recado as de cima para baixo ou não tem efeito, em certos valores e estruturas so- manifestações ocorridas em junho ou tem efeitos distorcidos. Só quando ciais. Os legados do patrimonialismo, de 2013 dão no sentido de “desvirar a demanda de direitos (por exemplo, da escravidão, da falta de educação a pirâmide dos direitos” construída o direito moderno a bons serviços pú- popular até hoje pesam sobre nossa historicamente invertida no Brasil? blicos) vem das ruas é que melhora a sociedade. Estão aí para comprová-lo José Murilo de Carvalho – Como probabilidade de implementação. a corrupção generalizada, as desigual- disse a um jornal do Rio, em novem- dades de cor, os baixos níveis de es- bro de 1889 o povo assistiu bestifica- IHU On-Line – Após a Consti- colaridade e índices de qualidade da do à proclamação da República por tuinte, como a Carta Magna ajudou a educação. políticos e militares; em junho de construir um Estado-nação? 2013, políticos e militares assistiram José Murilo de Carvalho – A IHU On-Line – Como o patrimo- bestificados à invasão da República Constituição de 1988, como as de nialismo atrapalha a garantia dos di- pelo povo nas ruas. Embora nem to- 1934 e 1946, incluiu vários direitos e reitos constitucionais? das as camadas do povo estivessem instrumentos de reivindicação de di- José Murilo de Carvalho – Defi- presentes, parte substantiva estava, e reitos novos. Refiro-me, por exemplo, nido como a falta de distinção entre o seu grau de descontentamento ficou ao habeas data, ao mandado de injun- público e o privado, o patrimonialismo claro para todos. Quebrou-se o estado continua vivo entre nós. A introdução hipnótico em que vivia o país. Esse é o de critérios personalistas na gestão caminho: de baixo para cima. A elite 1 Paulino José Soares de Sousa [Vis- de bens públicos, aí incluídos os que política brasileira, inclusive a que go- www.ihu.unisinos.br conde do Uruguai] (1807-1866): Político brasileiro nascido na França, considera- estão a cargo dos três poderes, inclu- verna o país há 10 anos, precisa ser do um dos grande juristas do País. Foi sive a justiça, é a própria negação da corrigida e educada pelos cidadãos e desembargador da relação da Corte e igualdade perante a lei, base de qual- contribuintes. aposentou-se como ministro do Supremo Tribunal de Justiça (1857). Entre suas quer Estado de direito e sustentáculo maiores conquistas destaca-se o trabalho de qualquer república digna do nome. nas negociações para o fim do tráfico de escravos para o País. (Nota da IHU On- -Line). IHU On-Line – Como podemos Leia mais... 2 Oliveira Viana [Francisco José de Oli- pensar a cidadania garantida na veira Viana] (1933-1951): Professor, ju- rista, historiador e sociólogo brasileiro. Constituição, considerando o recente • Independência do Brasil: Um mo- Grande defensor da eugenia, era contrá- episódio do julgamento do mensa- vimento socialmente conservador. rio a vinda de imigrantes japoneses para lão, em que nenhum dos condenados Entrevista com professor José Muri- o Brasil. Também foi membro da Acade- mia Brasileira de Letras. (Nota da IHU foi preso, em contraste à lotação dos lo de Carvalho para a IHU On-Line, On-Line) presídios com apenados pertencen- edição 234, disponível em http:// 3 Guerreiro Ramos [Alberto Guerreiro tes a outras camadas sociais? Que Ramos] (1915-1982): Sociólogo e político bit.ly/1gT7I4F. brasileiro. (Nota do IHU On-Line). desafios estão postos à justiça social?

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 29 A memória política brasileira à luz da Constituição Professor José Carlos Moreira Filho recupera história política jurisdicional do Brasil e traça suas perspectivas com a Carta Magna

Por Ricardo Machado ema de Capa T que o Brasil hoje é em termos uma legalidade autoritária que até hoje se políticos e institucionais, bem mantém entre nós. (...) Trazer à tona a memó- “Ocomo as suas possibilidades para ria política desse longo e dolorido episódio é o futuro, deve-se obviamente à sua história e decisivo para trazer à reflexão democrática ao seu passado de lutas, conflitos, conquistas toda a nossa história política”, argumenta. e vilanias”, sustenta o professor José Carlos O entrevistado considera que há um nú- Moreira Filho, em entrevista concedida por cleo na identidade de nossa Constituição que e-mail à IHU On-Line, ao contrapor a ideia se refere ao reconhecimento e repúdio das de que o povo brasileiro é acomodado em práticas de violência correspondente aos pe- relação às questões políticas. Em seu resgate ríodos repressivos. Nesse sentido, aponta o da história brasileira o professor aponta para trabalho do Projeto Brasil Nunca Mais1 como pistas de como o regime de exceção acabou uma experiência positiva, que permite man- deixando marcas em nossa Constituição e ter viva a história política do país. de como a violência se mantém nas relações José Carlos Moreira Filho é mestre em sociais. “É evidente, assim, que a violência Teoria e Filosofia do Direito pela Universida- brasileira, espalhada nas relações sociais e de Federal de Santa Catarina – UFSC, doutor fortemente atuante no modus operandi das em Direito das Relações Sociais pela Univer- forças repressoras do Estado, não é algo que sidade Federal do Paraná – UFPR. Atualmente tenha se originado na ditadura civil-militar é professor da Faculdade de Direito da Pon- instaurada em 1964, ela vem de muito antes. tifícia Universidade Católica do Rio Grande Por outro lado, a última ditadura contribuiu do Sul – PUCRS, Conselheiro da Comissão de significativamente para introjetar capilarmen- Anistia do Ministério da Justiça; Membro- te na cultura e no funcionamento das nossas Fundador do Grupo de Estudos sobre Interna- instituições práticas sistemáticas de tortura, cionalização do Direito e Justiça de Transição assassinato e desaparecimentos forçados e – IDEJUST. influenciou fortemente a consolidação de Confira a entrevista.

1IHU On-Line – Por que é impor- ria política do Brasil e como a Consti- uma história muito pouco conhecida tante manter viva e resgatar a memó- tuição garante esse direito? de resistência, de lutas, de mobiliza- José Carlos Moreira Filho – O ções pela emancipação política e pela 1 Projeto Brasil Nunca Mais: Projeto que o Brasil hoje é em termos políti- conquista de direitos e de acesso à realizado clandestinamente entre 1979 cos e institucionais, bem como as suas satisfação de necessidades funda- e 1985, cujo objetivo foi o de revelar a extensão da repressão política no Brasil possibilidades para o futuro, deve-se mentais, sejam materiais ou culturais. durante a ditadura militar. Idealizado por obviamente à sua história e ao seu A resistência dos povos indígenas à Dom , rabino Henry passado de lutas, conflitos, conquis- Sobel, pastor presbiteriano Jaime Wright aculturação; o Quilombo dos Palma- e equipe. Graças a este trabalho foram tas e vilanias. Resgatar a memória res governado por Ganga Zumba 2e sistematizadas informações de mais de 1 política é importante por dois grandes Zumbi3; a Confederação do Equador milhão de páginas em 707 processos do motivos: o primeiro é que ajuda a des- Superior Tribunal Militar (STM). Durante www.ihu.unisinos.br os quase seis anos foram levantados dados construir o mito de que o povo brasi- 2 Ganga Zumba (1630-1678): Primeiro fundamentais para a identificação e de- leiro é mole, passivo e aceita todas as líder do Quilombo dos Palmares (1670- núnica de torturadores e para desvendar 1678) e antecessor de seu sobrinho Zumbi desaparecimentos, perseguições e assassi- injustiças que contra ele são pratica- dos Palmares. (Nota da IHU On-Line) natos realizados durante este período. das pelas suas tradicionais elites. Há 3 Zumbi dos Palmares (1655-1695): últi-

30 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 de Frei Caneca4; a Cabanada5, a Caba- a Revolta da Chibata12, as lutas dos Guerrilha do Araguaia15, entre tantos T nagem6, a Revolta dos Malês7, a Sabi- trabalhadores, o combate ao fascismo outros movimentos populares que ema de Capa nada8, a Balaiada9, a Revolta dos Mu- pelos comunistas brasileiros, Trombas compuseram uma admirável história ckers10 em São Leopoldo, Canudos11, e Formoso13, as Ligas Camponesas, as de luta e resistência no país. Os mo- organizações de resistência à ditadura, vimentos sociais de hoje, mesmo sem figuras como Carlos Marighella14, que se darem conta disso, se alimentam mo líder do Quilombo dos Palmares. Foi capturado e entregue a um missionário liderou a luta contra duas ditaduras, a da memória, por vezes subterrânea e português quando tinha aproximadamen- acumulada das lutas do passado. te seis anos. Aos 15 anos de idade, fugiu A segunda razão pela qual é im- e retornou a seu local de origem. (Nota por Antônio Conselheiro, que durou de da IHU On-Line) 1896 a 1897, na então comunidade de portante resgatar e re-conhecer a me- 4 Frei Caneca [Joaquim da Silva Rabelo] Canudos, no interior do estado da Bahia, mória política brasileira é pela conti- (1779-1825): Religioso e político brasilei- no nordeste do Brasil. A região, histori- nuidade no seio das suas instituições ro. Envolveu-se com a Revolução Pernam- camente caracterizada por latifúndios bucana e na Confederação do Equador. improdutivos, secas cíclicas e desempre- públicas e civis de práticas e culturas (Nota da IHU On-Line) go crônico, passava por uma grave crise autoritárias, violentas e escravistas, 5 Cabanada ou Guerra dos Cabanos: Mo- econômica e social. Milhares de sertane- que enxergam na organização políti- vimento de origem restauradora, tinha jos e ex-escravos partiram para Canudos, como objetivo a volta de Dom Pedro I ao cidadela liderada pelo peregrino Antônio ca e na ocupação do espaço público, trono do Brasil. O movimento cabanagem Conselheiro, unidos na crença de uma sal- simbolizado plenamente pela “rua”, teve atividade em Pernambuco, Alagoas vação milagrosa que pouparia os humil- nada mais do que baderna e pertur- e Pará, com características distintas (na- des habitantes do sertão dos flagelos do cionalistas, antiescravagistas), e feneceu clima e da exclusão econômica e social. bação da ordem com fortes tendên- com a morte do Imperador em Portugal, Os grandes fazendeiros da região, unin- cias subversivas. É desde a escravi- em 1834. (Nota da IHU On-Line) do-se à Igreja, iniciaram um forte grupo dão legalizada de índios e negros que 6 Cabanagem: Revolta social ocorrida no de pressão junto à República recém-ins- atual estado do Pará durante o período taurada, pedindo que fossem tomadas as autoridades e elites brasileiras regencial, entre 1835 e 1840. Recebeu o providências contra Antônio Conselheiro cultivam um único método para lidar nome porque grande parte dos revoltosos e seus seguidores. Criaram-se rumores com as supostas ameaças à ordem: a era formada por pessoas pobres que mo- de que Canudos se armava para atacar ravam em cabanas, nas beiras dos rios da cidades vizinhas e partir em direção à ca- força bruta. região. Índios e mestiços se uniram aos pital para depor o governo republicano e integrantes da elite local contra o go- reinstalar a Monarquia. Apesar de não ha- Violência brasileira verno regencial, que havia negligenciado ver nenhuma prova para estes rumores, fortemente a região. Estimativas apon- o Exército foi mandado para Canudos. É evidente, assim, que a violên- tam que cerca de 30 mil pessoas foram Três expedições militares contra Canudos cia brasileira, espalhada nas relações mortas durante os cinco anos de comba- saíram derrotadas, o que apavorou a opi- sociais e fortemente atuante no te. (Nota da IHU On-Line) nião pública, que acabou exigindo a des- mo- 7 Revolta dos Malês: Mobilização de es- truição do arraial, dando legitimidade ao dus operandi das forças repressoras cravos africanos de religião muçulmana massacre de até 20 mil sertanejos. Além do Estado, não é algo que tenha se em Salvador, ocorrida em 1835, liderada disso, estima-se que cinco mil militares originado na ditadura civil-militar ins- por Pacífico Licutã, Manuel Calafate e tenham morrido. A guerra terminou com Luis Sanim. A Revolta foi controlada com a destruição total de Canudos, a degola taurada em 1964, ela vem de muito rapidez, mas espalhou o receio de novas de muitos prisioneiros de guerra, e o in- antes. Por outro lado, a última ditadu- rebeliões de escravos. Malê é o termo cêndio de todas as casas do arraial. Antô- ra contribuiu significativamente para utilizado para se referir aos escravos mu- nio Vicente Mendes Maciel, apelidado de çulmanos. (Nota da IHU On-Line) “Antônio Conselheiro”, foi considerado o introjetar capilarmente na cultura e 8 Sabinada: Revolta autonomista ocorri- líder do movimento. Ele chegou a Canu- no funcionamento das nossas institui- da durante o império do Brasil entre 1837 dos em 1893, tornando-se líder do arraial ções práticas sistemáticas de tortura, e 1838. Recebeu este nome devido ao seu e atraindo milhares de pessoas. (Nota da líder, Francisco Sabino Vieira. Os revolto- IHU On-Line) assassinato e desaparecimentos for- sos apoiavam a proclamação da Repúbli- 12 Revolta da Chibata: Eclodiu em 1910 çados e influenciou fortemente a con- ca Baiana, rompendo com o Governo Im- na Baía de Guanabara. Na ocasião, dois solidação de uma legalidade autoritá- perial e destituíndo o Governo Provincial. mil marinheiros da Marinha se rebelaram (Nota da IHU On-Line) contra a aplicação dos castigos físicos a ria que até hoje se mantém entre nós. 9 Balaiada: Revolução ocorrida no Ma- eles impostos como punição. (Nota da Quando falo em legalidade autoritária ranhão entre 1838 e 1840 envolvendo IHU On-Line) menciono o hábito de se distrair nas www.ihu.unisinos.br os pobres da região, escravos, fugitivos 13 Revolta de Trombas e Formoso: Re- e prisioneiros. Recebeu este nome por- volta ocorrida na região do norte de Goi- tecnicalidades rasteiras que são o dia que Balaio era o apelido de um dos seus ás entre 1950 e 1957. A luta tinha de um a dia da cultura bacharelesca, a ponto principais líderes, Manuel Francisco dos lado camponeses sem terra e, do outro, de se legalizar o ilegalizável, de se per- Anjos Ferreira (Manuel Balaio). (Nota da grileiros. Foi uma das poucas revoltas vi- IHU On-Line) toriosas do Brasil republicano. (Nota da der de vista a conexão das regras mais 10 Revolta dos Muckers: Conflito regio- IHU On-Line) prosaicas com o arcabouço de princí- nal em São Leopoldo/RS (atualmente na 14 Carlos Marighella (1911-1969): Políti- pios e valores que demarcam a identi- região de Sapiranga). Os muckers eram co e guerrilheiro brasileiro, um dos prin- um grupo de imigrantes alemães envolvi- cipais organizadores da luta armada para dade jurídica de uma sociedade com- dos em um movimento messiânico lidera- a implantação do Comunismo no Brasil e prometida com a democracia e com a do por Jacobina Mentz Maurer. Cada vez contra o regime militar a partir de 1964. mais crentes no carácter messiânico de Preso no Presídio Especial de São Paulo, Jacobina, passaram a atacar aqueles que Marighella foi torturado pela polícia de 15 Guerrilha do Araguaia: Movimento se opunham ao movimento, gerando rea- Filinto Müller. Na noite de 04-11-1969 Ma- guerrilheiro formado ao longo do rio Ara- ções contrárias das forças policiais (Nota righella foi surpreendido por uma embos- guaia, na região Amazônica. A Guerrilha da IHU On-Line). cada na alameda Casa Branca, na capital estendeu-se entre 1967 e 1974 e preten- 11 Guerra de Canudos ou Campanha de paulista. Foi morto a tiros por agentes do dia derrubar o governo militar, fomentan- Canudos: Confronto entre o Exército Bra- DOPS, em uma ação coordenada pelo de- do o levante da população rural e urbana sileiro e os integrantes de um movimento legado Sérgio Paranhos Fleury. (Nota da para, por fim, instalar um governo comu- popular de fundo sócio-religioso liderado IHU On-Line) nista no Brasil. (Nota da IHU On-Line)

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 31 proteção dos direitos humanos. É, em cana de 1988. Na verdade, nenhuma Enfoque transicional verdade, um problema de princípios. Constituição pode ser vista como uma Ruti Teitel17 argumenta que o en- Isto explica, por exemplo, as bizarras espécie de marco zero jurídico e polí- foque transicional brinda o fenômeno construções dos atos institucionais tico. No caso brasileiro, assim como a do constitucionalismo com um olhar criados na ditadura, a revalidação em própria transição democrática, a ela- mais adequado do que aquele propor- pleno século XXI da lei de anistia de boração da Constituição e a sua inter- cionado pelos modelos teóricos her- 1979, no aspecto em que bloqueia a pretação desde então tem sido palco dados da Ilustração, visto que, nestes, investigação e a responsabilização dos da disputa de diferentes sentidos. Ora prioriza-se a Constituição como uma crimes de lesa humanidade praticados sinalizando para a continuidade da espécie de marco zero que projeta pelos agentes da ditadura, bem como ordem jurídica/política anterior, ora suas luzes para a frente, insistindo os famigerados autos de resistência. sinalizando a ruptura para com ela. em um imaginário fundacional que se Tal característica não é, obviamente, concentra em reproduzir uma identi- Heranças da ditadura exclusiva do caso brasileiro. Ao longo dade mesmificada e idealizada atra- Entre outras heranças da última do século XX, os processos transicio- vés do tempo. Por outro lado, os mo- ema de Capa ditadura, não se pode deixar de men- nais de regimes autoritários para re- delos constitucionais mais realistas, T cionar a construção de um poder mi- gimes mais abertos ou democráticos que veem na Constituição um mero diático que visivelmente atrapalha e têm evidenciado, ao mesmo tempo, reflexo do jogo de forças do momen- impede o necessário aprofundamen- algumas continuidades e algumas to, também deixam escapar o caráter to democrático brasileiro. Recente- transformações em relação à ordem transformador inerente às Constitui- mente o Jornal O Globo publicou um anterior. Nenhuma identidade cons- ções democráticas que emergem de editorial declarando ter sido um erro titucional se forma do nada e nenhu- períodos autoritários, embasadora, o apoio ao golpe de 1964 e à ditadu- ma se consolida a um só tempo e em em muitos contextos, de fatos impre- ra que se seguiu, mas em suas razões definitivo. Há sempre uma dinâmica visíveis e surpreendentes. simplesmente reforçou os falsos pre- que envolve a ordem anterior e a que O enfoque transicional torna textos que até hoje são replicados a sucedeu. indispensável o olhar histórico e po- para o golpe e não disse uma palavra liticamente situado. Não é possível nem sobre os crimes contra a huma- Identidade conceber a Constituição como uma nidade perpetrados pelo sistema que Partindo do enfoque desenvol- fundação abstrata e descontextualiza- 16 apoiou, nem sobre os escancarados vido por Michel Rosenfeld acerca da da ordem jurídica. Por outro lado, favorecimentos que recebeu durante do conceito de identidade constitu- evidencia que na Constituição serão esses 21 anos de ditadura, que trans- cional, é possível ver na Constituição, encontrados resquícios da ordem an- formaram a Rede Globo em um impé- tanto em sua formulação quanto em terior, bem como elementos de rup- rio que faz larga sombra a qualquer sua interpretação e reformulação, um tura. Há, porém, um núcleo da iden- outra organização de mídia do país. espaço de tensões e confluências em tidade democrática da Constituição É importante resgatar a memó- relação às sucessivas ordens jurídico- que nunca se perde de vista, embora ria política especialmente a partir do -políticas e em relação às dimensões possa ser mais ou menos obscurecido ocorrido na última ditadura, dada a de uma sociedade plural e multicul- a depender dos próprios processos sua proximidade histórica e o fato de tural. Por este viés, a Constituição é de transição e do correlato grau de que muitos dos agentes perpetradores espaço de contínuas construções e aprofundamento democrático. Este e protagonistas do golpe e do regime, reconstruções da sua própria iden- núcleo é o reconhecimento e o re- bem como os que resistiram e sofre- tidade, característica que só tende púdio das violências praticadas nos ram severas punições e perdas, ainda a aumentar quanto mais o aspecto períodos repressivos. E veja, a partir estão vivos. É puxando o fio da meada democrático das sociedades polí- daí, como é dramático o nosso caso, da ditadura civil-militar e que tremula ticas que as têm se aprofunde ese já que justamente este aspecto nucle- bem à nossa frente que temos condi- prolongue. ar da nova identidade constitucional ções mais efetivas de promover um Contudo, pelo ângulo da justiça que começou a se formar após a dita- necessário exercício de memória para de transição, existe nas Constituições dura continua sendo bloqueado pelo as instituições pervertidas pela gene- que emergiram de transições políticas mimetismo da brutalidade ao qual eu ralização da violência, dos desmandos um núcleo fundamental e inegociável, me referia no início desta resposta. e da legalidade rasteira e superficial. ainda que ele mesmo seja diverso em Trazer à tona a memória política des- suas manifestações e intensidades. Sentido da Constituição se longo e dolorido episódio é decisi- Trata-se de reconhecer e evitar a re- Para finalizar, volto ao tema da vo para trazer à reflexão democrática petição das injustiças e violências pra- disputa pelo sentido da Constituição. toda a nossa história política. ticadas pela ordem autoritária. Como destaca de modo perspicaz Cris- tiano Paixão18, a partir das eleições de Ditadura e Constituição

www.ihu.unisinos.br Outra boa razão para concentrar 17 TEITEL, Ruti G. Transitional justice. o foco do direito à memória na dita- 16 ROSENFELD, Michel. A identidade New York: Oxford University Express, dura instaurada em 1964 é a sua forte do sujeito constitucional. Belo Hori- 2000. (Nota do entrevistado) ligação com a Constituição republi- zonte: Mandamentos, 2003. (Nota do 18 PAIXÃO, Cristiano. A constituição em entrevistado) disputa: transição ou ruptura? In: SEELA-

32 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 1986 e mais intensamente com a ins- que em abril de 2010 analisou a vali- do contexto ainda delicado do pro- T talação da constituinte tornou-se níti- dade da lei de anistia de 1979 como cesso de redemocratização26, os mo- ema de Capa da a disputa em torno do significado impeditivo para a investigação e a res- vimentos sociais que atuaram no pro- da Constituição, seja no conflito em ponsabilização dos crimes praticados cesso constituinte, bem como outras torno dos procedimentos adotados pela ditadura, assim continua. forças políticas de repúdio à ditadura, pelos constituintes para elaborarem A constituinte que elaborou a e até mesmo os setores organizados o texto, seja nos esforços de defini-la atual Constituição trouxe de fato uma em torno dos que foram perseguidos como o resultado de uma ruptura ou rica mobilização de setores populares politicamente, não investiram nesses de uma continuidade com o regime e de grupos organizados da sociedade temas, em especial no relativo à es- de força. civil que surpreenderam o forte con- trutura repressiva e militarizada dos Alguns, como os juristas Mano- trole do processo de transição política órgãos de segurança pública e da ma- el Gonçalves Ferreira Filho19 e José praticado pelos militares e demais se- nutenção das forças armadas como Carlos Moreira Alves20, declararam à tores de apoio à ditadura. uma espécie de poder moderador. época que a Constituição consagraria os ideais revolucionários de março de Movimentos sociais Forças armadas 1964, já outros, como Ulysses Guima- A mobilização e os procedimen- O artigo 142 da Constituição rães 21e Mário Covas22, fizeram ques- tos adotados ao longo do processo estatui que as forças armadas “desti- tão de assinalar a Constituição como constituinte permitiram que os movi- nam-se à defesa da pátria, à garantia um marco de repúdio e ruptura à di- mentos sociais e amplos setores popu- dos poderes constitucionais e, por ini- tadura que se encerrava. O sentido da lares verdadeiramente participassem ciativa de qualquer destes, da lei e da Constituição, especialmente no que e interferissem no resultado final. Foi ordem”. Ainda que este artigo tenha se refere aos seus marcos principio- o que se viu, por exemplo, na questão mencionado que a garantia da lei e da lógicos e identitários, já começou em indígena24, nos direitos dos trabalha- ordem se dá por iniciativa dos poderes franca disputa, e como se viu recente- dores (especialmente no tocante à constitucionais, fica no ar saber-se o mente no julgamento da ADPF 15323, sindicalização e ao direito de greve), que satisfaz a condição deste aciona- na questão ambiental, na ampliação mento. A Lei Complementar nº 69 de do rol de direitos fundamentais e na 1991 definiu que cabe ao Executivo o ENDER, Airton (Org.) História do Direito e construção do Estado. São Paulo: Quar- sua blindagem via cláusulas pétre- direito de pedir a intervenção interna. tier Latin, 2012 (no prelo). (Nota do en- as, na explícita abertura ao direito Outra pergunta que pode ser feita: o trevistado) internacional dos direitos humanos, que representa a violação da ordem? 19 Manoel Gonçalves Ferreira Filho (1934): Advogado, jurista, político e pro- na questão urbana (de modo ainda Quais pessoas definirão isto? De todo fessor brasileiro. (Nota da IHU On-Line) tímido), na abolição da desigualdade modo, não creio que o art. 142 esteja 20 Moreira Alves [José Carlos Moreira no tratamento dado aos filhos e às a legitimar a possibilidade de um Gol- Alves] (1933): Político brasileiro, foi pre- sidente do Supremo Tribunal Federal de entidades familiares, no novo papel pe de Estado, ainda que sempre seja 1975 até 2003. (Nota da IHU On-Line) atribuído ao Ministério Público — MP, possível encontrar malabaristas do di- 21 Ulysses Guimarães (1916-1992): Po- nos princípios que regem a Adminis- reito autoritário dispostos a endossar lítico e advogado brasileiro. Foi um dos grandes apoiadores da redemocratização tração Pública, entre outros. interpretações deste calibre quando do Brasil, cuja campanha ficou conhecida lhes é conveniente. Porém, o art. 142, como Diretas Já. (Nota da IHU On-Line) Questões-chave em conjunto com os demais disposi- 22 Mário Covas Júnior (1930-2001): En- genheiro e político brasileiro, foi o 30º Por outro lado, algumas ques- tivos constitucionais que tratam do governador do estado de São Paulo. (Nota tões-chave permaneceram intocadas tema, não demarca um estatuto sufi- da IHU On-Line) ou abordadas de maneira muito tími- cientemente subordinado das forças 23 Arguição de descumprimento de preceito fundamental 153 [ADPF 153]: da ou insuficiente, como ocorreu no militares ao poder civil e à democra- Sobre esta decisão do STF e especial- caso da reforma agrária, da segurança cia. Mantém-se ainda uma forte mili- mente sobre as fracas e preocupantes pública e das forças armadas25. Diante www.ihu.unisinos.br fundamentações apresentadas pelos Mi- nistros e Ministras que participaram do julgamento, remeto o leitor a três fon- sua análise da Constituição de 1988, es- tes: SILVA FILHO, José Carlos Moreira da. sabilização – elementos para uma justiça crita logo após a sua promulgação, que: O Julgamento da ADPF 153 pelo Supremo de transição no Brasil. Belo Horizonte: “Desde a Proclamação da República, o Tribunal Federal e a Inacabada Transição Arraes, 2012. (Nota do entrevistado) papel institucional dos militares é tema Democrática Brasileira. In: Wilson Ramos 24 Ver o belíssimo trabalho de Rosane de tratamento constitucional e gran- Filho. (Org.). Trabalho e Regulação – as Freire Lacerda sobre a inédita história des debates. A nova Constituição man- lutas sociais e as condições materiais da de mobilização dos indígenas brasileiros tém este papel, em suas linhas gerais. democracia. Belo Horizonte-MG: Fórum, ao longo do processo constituinte, suas Apresenta pequeno avanço em relação 2012, v. 1, p. 129-177; VENTURA, Deisy. vitórias e também os discursos que con- a situações anteriores” (COELHO, João A Interpretação judicial da Lei de Anis- tra eles se insurgiram: LACERDA, Rosane Gilberto Lucas; OLIVEIRA, Antonio Carlos tia brasileira e o Direito internacional. Freire. Diferença não é incapacidade – o Nantes de. A nova Constituição – avalia- In: PAYNE, Leigh; ABRAO, Paulo; TORELLY, mito da tutela indígena. São Paulo: Ba- ção do texto e perfil dos constituintes. Marcelo (orgs.). A Anistia na era da res- raúna, 2009 (ver sobretudo o terceiro ca- Rio de Janeiro: Revan, 1989. p.45). (Nota ponsabilização: o Brasil em perspectiva pítulo, intitulado “A subida da rampa do do entrevistado) internacional e comparada. Brasília: Mi- Congresso Nacional: o protagonismo dos 26 Importante não esquecer a forte re- nistério da Justiça, Comissão de Anistia; povos indígenas no processo constituinte pressão praticada pelos militares durante Oxford: Oxford University, Latin Ameri- – 1985/1988)”. (Nota do entrevistado) a campanha das Diretas e especialmente can Centre, 2011. p. 308-343; e MEYER, 25 Afirmam João Gilberto Lucas Coelho na votação da Emenda Dante de Oliveira Emilio Peluso Neder. Ditadura e Respon- e Antonio Carlos Nantes de Oliveira, em em 1984. (Nota do entrevistado)

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 33 tarização das forças de segurança no IHU On-Line – Como se dá a rela- o Brasil depositou sua carta de adesão país, aplicando ao policiamento inter- ção entre a Constituição Federal e os à Convenção Americana de Direitos no, do qual participa ostensivamente Direitos Humanitários Internacionais? Humanos (Pacto de San José da Costa a polícia militar, o mesmo caráter de José Carlos Moreira Filho – Pri- Rica). Posteriormente, em 10 de de- combate ao inimigo que predominou meiramente, é importante fazer um zembro de 1998 o Brasil reconheceu a ao longo da ditadura. Mantém-se, ajuste técnico dos termos. O Direito competência da Corte Interamericana igualmente, a justiça militar. A legis- Internacional Humanitário remete à de Direitos Humanos, a ela se subme- lação que regula a vida militar, como secular construção, bem consignada tendo soberanamente. Este fato ge- o Código Penal Militar, por exemplo, nas Convenções de Genebra, de um rou uma discussão acerca da estatura vem dos anos ditatoriais, aliás como Direito da Guerra, ou seja, na neces- hierárquica das normas garantidoras muitas outras leis estruturantes. sidade de que mesmo em uma guerra de direitos humanos presentes na De todo modo, é sintomático que haja limites. Por exemplo, pratica um Convenção, mas não explicitadas no na primeira versão apresentada do crime de guerra aquele comandante texto constitucional. art. 142, quando não se atribuía aos que ordena a tortura e o assassinato De 5 de outubro de 1988 até a ema de Capa militares o papel de garantidores da de soldados do exército inimigo que Emenda Constitucional nº 45, promul- T lei e da ordem, o ministro do Exército estão aprisionados e indefesos. Con- gada em 30 de dezembro de 2004, o tudo, ao longo do século XX, os pio- à época, General Leônidas Pires Gon- art. 5º da Constituição de 1988 trazia res crimes praticados pelos Estados, çalves27, tenha ameaçado zerar todo apenas dois parágrafos após a enu- tanto em quantidade como em quali- o processo de redação constitucional meração dos incisos definidores de dade, não foram esses e sim aqueles direitos e garantias fundamentais. O e o então Presidente da Comissão de praticados contra os seus próprios § 1º estabeleceu a aplicabilidade ime- Organização Eleitoral Partidária e Ga- cidadãos ou contra populações desar- diata e o § 2º estabeleceu o princípio rantia das Instituições (que era encar- madas. E tais crimes foram denomina- da abertura do catálogo de direitos regada dos capítulos ligados às forças dos de crimes contra a humanidade. fundamentais, demarcando que os armadas e à segurança pública), sena- Não são crimes de guerra, pois não “direitos e garantias expressos nesta dor Jarbas Passarinho28, o mesmo que se pode vislumbrar qualquer nível de Constituição não excluem outros de- endossou o AI-5 mandando às favas proporcionalidade entre todo o apa- correntes do regime e dos princípios os escrúpulos, tenha dito que a es- rato repressivo e burocrático do Es- por ela adotados, ou dos tratados querda queria se vingar dos militares tado de um lado, e grupos de civis e internacionais em que a República e deles retirar a responsabilidade pela cidadãos de outro, que deveriam ser Federativa do Brasil seja parte”. A pre- 29 ordem interna . Diante da pressão, os protegidos pelo Estado que os acossa. sença solitária desses parágrafos, ain- constituintes voltaram atrás e fizeram Ao conjunto de normas, conceitos e da sem o acréscimo do 3º e 4º30, que o texto citado acima. Não há no Brasil, princípios que visam à proteção do in- viriam somente com a emenda consti- portanto, até os dias atuais, uma cla- divíduo diante do poderio e da violên- tucional nº 45, criou dúvida a respeito ra separação entre a polícia, que por cia dos Estados, denominou-se Direito da estatura hierárquica dos direitos vocação deveria cuidar da segurança Internacional dos Direitos Humanos. e garantias expressos nos tratados interna, e as forças armadas, vocacio- Nossa Constituição, em seu art. internacionais de direitos humanos nadas para os conflitos externos. 4, inciso II, diz que a “República Fe- aos quais o Brasil havia aderido após derativa do Brasil rege-se nas suas a promulgação da Constituição, isto 27 Leônidas Pires Gonçalves (1921): relações internacionais”, entre outros porque até então a jurisprudência General-de-exército brasileiro. (Nota da princípios, pelo da “prevalência dos IHU On-Line) consolidada do STF era de que os tra- 28 Jarbas Passarinho [Jarbas Gonçalves direitos humanos”. Ainda, em seu art. tados de direitos humanos teriam o Passarinho] (1920): Militar e político bra- 5, § 2º, estabeleceu o princípio do ca- status de lei ordinária. sileiro. Em 15 de junho de 1964 foi em- tálogo aberto de direitos fundamen- possado governador do Pará em lugar do deposto Aurélio do Carmo cuja presença tais, ou seja, a possibilidade de que 30 O parágrafo 3º do art. 5º, criado pela à frente do executivo foi dispensada pelo outros direitos assumidos em trata- EC Nº 45/2004, estabelece que “os tra- novo regime. Jarbas Passarinho filiou- tados e convenções internacionais sobre -se à ARENA e após deixar o governo, foi dos de direitos humanos pudessem direitos humanos que forem aprovados, eleito senador em 1966, mas em seguida fazer parte do rol constitucional de em cada casa do Congresso Nacional, em foi nomeado ministro do Trabalho e Pre- direitos fundamentais. dois turnos, por três quintos dos votos vidência Social no governo Costa e Silva, dos respectivos membros, serão equiva- sendo mantido no cargo pela Junta Mili- lentes às emendas constitucionais”. Com tar de 1969 que assumiu o poder após o Direito internacional isto, firmou-se o entendimento de que, afastamento do presidente da República Sobre este tema, é ilustrativo para que um direito ou garantia expresso até que o presidente Emílio Garrastazu em um tratado ou convenção internacio- Médici o nomeou ministro da Educação. visitar a discussão feita no Supremo nal de direitos humanos, firmado pelo (Nota da IHU On-Line) Tribunal Federal — STF a respeito do país após a entrada em vigor da EC nº 45, 29 Em seu artigo, Jorge Zaverucha escla- status da Convenção Americana de possa gozar do status constitucional, ele rece esses detalhes. Ver: ZAVERUCHA, deve passar pelo mesmo processo legisla- Jorge. Relações civil-militares: o legado Direitos Humanos e, por tabela, de tivo pelo qual passa uma Emenda Cons- www.ihu.unisinos.br autoritário da Constituição brasileira de qualquer tratado internacional de titucional. Já o parágrafo 4º estabelece 1988. In: SAFATLE, Vladimir; TELES, Ed- direitos humanos firmado pelo país que “o Brasil se submete à jurisdição de son [Orgs.]. O que resta da ditadura – a Tribunal Penal Internacional a cuja cria- exceção brasileira. São Paulo: Boitempo, antes da Emenda Constitucional nº ção tenha manifestado adesão”. (Nota do 2010. (Nota do entrevistado) 45/2004. Em 25 de setembro de 1992 entrevistado)

34 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 T Prisão por dívida eficácia. Desse modo, ao mesmo tem- “O que o Brasil ema de Capa Foi em 3 de dezembro de 2008, po em que o STF afirmou que a Cons- com a decisão do leading case que dis- hoje é em tituição vale mais que o tratado, asse- cutiu a prisão civil do depositário infiel gurou que o tratado valesse mais do (HC 87.585/TO31 e RE 466.343/SP) que que qualquer lei ordinária e que, no o posicionamento do STF atingiu um termos políticos caso de norma mais favorável, impe- novo patamar sobre o tema do status disse a regulamentação de dispositivo dos tratados de direitos humanos. A e institucionais constitucional restritivo, prevalecen- Constituição de 1988 previu, em seu do inclusive sobre norma constitucio- art. 5º, LXVII, que “não haverá prisão (...) deve-se nal originária. civil por dívida, salvo a do responsá- Tal posicionamento causa espé- vel pelo inadimplemento voluntário e obviamente à cie quando se vislumbra a decisão do inescusável de obrigação alimentícia STF sobre o status da lei de anistia de e a do depositário infiel”. Por outro sua história e ao 1979. A suprema corte brasileira, em- lado, a Convenção Americana de Di- bora não o declare explicitamente na reitos Humanos estabeleceu, em seu seu passado de decisão da ADPF nº 153, conferiu pre- art. 7º, que “ninguém deve ser detido valência à Lei nº 6.683/1979, especial- por dívidas”, excepcionando apenas o lutas, conflitos, mente em seu art. 1º, §1º, dispositivo caso do devedor alimentar. que trata dos “crimes conexos” e que, conquistas e em interpretação predominante até Solução aqui, anistia agentes da ditadura que A solução encontrada pelo STF vilanias” praticaram crimes de lesa humanida- para dirimir a antinomia clara entre de, tanto sobre a Constituição de 1988 a Convenção e a própria Constituição como sobre a Convenção Americana e a jurisprudência da Corte Interame- brasileira tanto nos casos citados aci- humanos, mesmo no caso de trata- ricana sobre ela. E corre o risco de ma como em outros que se seguiram32 dos incorporados antes da emenda fazê-lo também em relação à decisão foi estabelecer duas importantes ino- constitucional nº 45 e, portanto, sem tomada pela Corte Interamericana vações. A primeira delas significou a a utilização do rito que passou a ser de Direitos Humanos no Caso Gomes mudança da jurisprudência que deli- previsto no art. 5º, §3º. Muito embo- Lund33 mitava a estatura de mera lei ordiná- ra sejam mais aceitáveis sob o ponto , a depender da apreciação dos ria aos tratados de direitos humanos. de vista da coerência na busca de uma Embargos Declaratórios interpostos Vingou na opinião majoritária de cin- ordem jurídica cada vez mais forte pela OAB na ADPF nº 153, e que até o dia em que concedo esta entrevista co ministros a tese da supralegalida- na promoção e proteção dos direitos seguiam pendentes de decisão. de dos tratados de direitos humanos, humanos tanto a tese do status cons- isto é, são superiores às leis ordinárias titucional quanto a da supraconstitu- Constituição republicana mas inferiores à Constituição, ainda cionalidade (os tratados de direitos Tratando primeiramente da que façam parte de um bloco de cons- humanos valem mais do que a própria Constituição republicana de 1988, titucionalidade por especificarem Constituição), o STF optou pela via da deve ser repudiada qualquer tentativa direitos fundamentais referidos no supralegalidade. Ao menos avançou de vincular a soberania da constituin- texto constitucional. Registre-se que em relação à jurisprudência anterior. te a uma norma construída na ordem os outros quatro votos demarcavam jurídica anterior, de perfil autoritário e a teoria do status constitucional dos Supralegalidade dos direitos tratados internacionais de direitos humanos 33 Caso Gomes Lund: O caso versa sobre www.ihu.unisinos.br De todo modo, a adoção da su- o desaparecimento forçado, a tortura e 31 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. pralegalidade dos tratados de direi- a execução sumária de pessoas durante Habeas Corpus nº 87.585/TO. Paciente: tos humanos não impediu no caso o episódio conhecido como “Guerrilha do Alberto de Ribamar Ramos Costa. Coator: Araguaia”, ocorrido entre 1972 e 1974. Superior Tribunal de Justiça. Relator Mi- da prisão do depositário infiel que se Foi iniciado perante o Sistema Intera- nistro Marco Aurélio Mello. Brasília/DF: desse preferência à Convenção Ame- mericano de Direitos Humanos por orga- 03 de dezembro de 2008. Disponível em: ricana de Direitos Humanos em rela- nizações não-governamentais de defesa http://bit.ly/1fuK5Bs. Acesso em 25 ago. dos direitos humanos e familiares das 2013; BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ção à Constituição brasileira. E esta é vítimas. Em sua defesa perante a Corte Habeas Corpus Nº 466.343/SP. Recor- a segunda inovação. O fundamento Interamericana de Direitos Humanos, o rente: Banco Bradesco S/A. Recorrido: adotado para tanto foi o princípio da Estado brasileiro apresentou informa- Luciano Cardoso Santos. Relator Minis- ções sobre medidas implementadas, nos tro Cézar Peluso. Brasília/DF: 03 de de- aplicação da norma mais favorável planos legal e político, que implicaram o zembro de 2008. Disponível em: http:// em direitos humanos, ainda que em reconhecimento da responsabilidade do bit.ly/iKWQfU. Acesso em 25 ago. 2013. Estado pela morte e pelo desaparecimen- (Nota do entrevistado) um engenho de argumentação se te- to de pessoas durante o regime militar; o 32 O posicionamento adotado acabou por nha estabelecido que tal predomínio pagamento de indenizações a familiares gerar a Súmula 25, a qual prevê que “é não necessariamente revoga a norma das vítimas; e o julgamento, pelo Supre- ilícita a prisão civil do depositário infiel, mo Tribunal Federal, da Ação de Descum- qualquer que seja a modalidade de depó- constitucional restritiva, mas impede primento de Preceito Fundamental sobre sito”. (Nota do entrevistado) que norma infraconstitucional lhe dê a Lei da Anistia. (Nota do IHU On-Line)

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 35 ditatorial, mesmo que tenha sido uma mente, no Ato das Disposições Cons- cometidos contra os direitos huma- norma que serviu para iniciar o pro- titucionais Transitórias em seu art. 8º, nos no período militar? cesso constituinte como o foi a emen- menciona que “é concedida anistia José Carlos Moreira Filho – Como da constitucional nº 26/1985. Além da aos que, no período de 18 de setem- creio já ter ficado claro nas respostas Lei nº 6.683/1979, a referida Emenda, bro de 1946 até a data da promulga- anteriores, o problema maior não é a em seu art. 4, §1º, também estabele- ção da Constituição, foram atingidos, Constituição em si, mas a disputa pelo ceu a anistia aos crimes conexos34. É em decorrência de motivação exclusi- seu sentido. Caso houvesse um con- preciso ter claro, contudo, que esta vamente política, por atos de exceção, senso político maior sobre a necessi- última norma emendou a Constitui- institucionais ou complementares”, dade de se responsabilizar os crimes ção anterior, a de 1969, instituída de ou seja, nenhuma palavra em toda cometidos pelos agentes da ditadura, modo autoritário em plena ditadura, a longa extensão do texto constitu- a Constituição poderia servir tranqui- pertencendo, portanto, à ordem ju- cional sobre anistia a crimes conexos lamente de base para isto. Importa, rídica instaurada de modo ilegítimo ou de qualquer natureza. Veja-se que contudo, perceber que a decisão do STF na ADPF 153 não fechou ainda pelo golpe de 1964. Ao contrário do quando se fala em anistia na Consti- ema de Capa a questão. Há uma condenação da que defenderam os ministros Eros tuição de 1988 ela é direcionada para T 35 36 Corte Interamericana de Direitos Hu- Grau e Gilmar Mendes em seus os que foram perseguidos políticos e manos pendente sobre o Brasil e que respectivos votos na ADPF 153, quais- não para os que realizaram esta perse- determina a responsabilização dos quer condições impostas pela ordem guição, sem falar que é explicitamente constitucional anterior não podem ser crimes de desaparecimento forçado vedada no caso de crimes de tortura. tomadas como efetivas e limitadoras ocorridos na Guerrilha do Araguaia, É verdade que esta última previsão se do poder constituinte originário, es- e recomenda a persecução criminal volta aos casos posteriores a 1988, pecialmente quando essa ordem an- dos demais crimes praticados pela di- mas indica de todo modo o repúdio terior é autoritária. tadura. O Ministério Público Federal da nova ordem a atos de anistia volta- Assim, as disposições sobre anis- — MPF, por meio de entendimento dos para este tipo de crime. tia que constam na emenda constitu- institucional firmado pela 2ª Câmara Quanto à prevalência dos direi- cional nº 26/1985, bem como as que Criminal, compreendeu muito bem o estão na Lei nº 6.683/79, só devem tos humanos na ordem internacio- recado e já vem dando início a diver- vincular a nova ordem naquilo que nal, prevista no art. 4º, inciso II da sas ações penais pelos crimes de se- não sejam com ela incompatíveis. Ao Constituição, depreende-se daí que a questro ou de ocultação de cadáver, contrário, a Constituição de 1988 dei- orientação a ser tomada deveria ser visto que ainda não está tipificado no xou bem claros os seus pressupostos a mesma adotada no caso da veda- Direito Penal brasileiro o crime de de- axiológicos e principiológicos quan- ção da prisão do depositário infiel, ou saparecimento forçado. Nesses casos, to ao tema. Em seu art. 1º, inciso III, seja, a de que os tratados de direitos a prescrição nem se apresenta como estabelece a dignidade da pessoa humanos prevaleçam sobre qualquer um possível obstáculo, visto que, humana como fundamento da Repú- norma da ordem jurídica interna que como os corpos não foram encontra- blica; em seu art. 4º, inciso II, estabe- restrinjam os direitos e garantias ali dos até hoje, o crime continua sendo lece que a República rege-se nas suas previstos, ainda mais quando a norma praticado, não dando início, assim, ao relações internacionais pelo princípio colidente seja uma lei ordinária edita- prazo prescricional. É o que se cha- da prevalência dos direitos humanos; da na ordem constitucional anterior. ma de crime permanente. Em termos em seu art. 5º, inciso XLIII, prevê que institucionais, portanto, já é possível a tortura é crime inafiançável e insus- IHU On-Line – A constituição colher um claro descompasso entre o Poder Judiciário e o MPF. Caso o STF cetível de graça ou anistia37; e, final- inaugurou o mais longo período de continue insistindo em sua tese sobre democracia representativa. No en- a anistia, tais ações estarão fadadas ao 34 Importante salientar que na EC nº tanto, em que medida ela contribuiu insucesso, ao menos em suas preten- 26/1985 não foi reproduzida a enigmáti- para a responsabilização de crimes ca definição do que seriam crimes cone- sões judiciais. Caso o STF venha a se xos e que consta no art. 1º, §1º da Lei nº 6683/1979, a saber: “Consideram-se co- luta armada contra a ditadura possam ser posicionar deste modo, inclusive, es- nexos, para efeito deste artigo, os crimes aí enquadrados, é preciso reconhecer dois tará claramente desobedecendo uma de qualquer natureza relacionados com fatos: que não há até os dias atuais qual- sentença condenatória voltada para crimes políticos ou praticados por moti- quer tipificação do crime de terrorismo, vação política”. (Nota do entrevistado) seja na ordem jurídica interna, seja na o Estado brasileiro (e portanto, para 35 Eros Grau [Eros Roberto Grau]: Ju- ordem internacional, e que aqueles que todos os poderes que o compõem), rista brasileiro, ministro aposentado do pegaram em armas contra a ditadura não prolatada por um Tribunal ao qual so- Supremo Tribunal Federal. (Nota da IHU praticaram terrorismo, mas sim exerce- On-Line) ram o seu legítimo direito de resistência, beranamente se submeteu, por ação 36 Gilmar Mendes (1955): Ex-advogado, colocado em prática exatamente para tanto de sua representação diplomá- professor, magistrado e jurista brasileiro. combater o terrorismo de Estado (sobre tica quanto de seu poder Legislativo. Atualmente exerce o cargo de ministro isto ver: SILVA FILHO, José Carlos Moreira do Supremo Tribunal Federal (STF) desde da. O terrorismo de Estado e a ditadura www.ihu.unisinos.br 2002. (Nota da IHU On-Line) civil-militar no Brasil: direito de resistên- IHU On-Line – Podemos pensar 37 É verdade que o crime de terrorismo cia não é terrorismo. Revista Anistia Polí- que entre os Poderes Constitucio- também é mencionado no mesmo dispo- tica e Justiça de Transição, Ministério da sitivo, mas antes que alguma análise mais Justiça, n.5, jan/jul 2011, Brasília, p.50- nais, o Judiciário é o menos democrá- apressada sugira que os participantes da 74). (Nota do entrevistado) tico, já que não tem eleições diretas?

36 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 T Como se estruturou o Estado demo- sileiro foi altamente conivente com as chos fundamentales y proteger a quie- crático de Direito dentro deste con- políticas criminosas de perseguição, nes fueron víctimas del abuso estatal”. ema de Capa texto? Como resolver isso? tortura e extermínio implementadas “(...) nuestra judicatura incurrió José Carlos Moreira Filho – Pri- pela ditadura que se iniciou em 1964. en acciones y omisiones impropias de meiramente, não tenho convicção de Desde o encampamento explícito da su función, al haberse negado, salvo que estabelecer eleições para juízes Doutrina de Segurança Nacional e da aisladas pero valiosas excepciones possa resolver o problema do Judiciá- paranoia anticomunista até o des- que nos honran, a prestar protección rio. Mas penso sim que temos sérios prezo pelas inúmeras denúncias de a quienes reclamaron una y otra vez problemas nas formas de seleção dos tortura que eram feitas pelos presos su intervención. La inadmisibilidad o candidatos à carreira. Para começar, o políticos. Basta ler algumas decisões el rechazo por parte de nuestros tribu- concurso público para a magistratura judiciais da época para se ver isto. É nales de miles de recursos de amparo, cobra eminentemente conteúdos téc- também muito instrutivo o exame muchos de los cuales fueron fundada- nicos e dogmáticos, e de um modo que dos documentos judiciais organizados mente interpuestos en nombre de com- exige praticamente uma única grande pelo Projeto Brasil Nunca Mais, hoje patriotas de cuya suerte nunca más se habilidade do candidato: decoreba. disponíveis em ambiente virtual em supo, la negativa sistemática a investi- Não há nada de errado em se cobrar sua integralidade, graças à recente gar las acciones criminales perpetradas um conhecimento técnico-jurídico, digitalização que foi feita em projeto por agentes del Estado y la renuencia a aliás, isto é necessário, sem dúvida. O apoiado pela Comissão de Anistia. constituirse personalmente en centros problema é não aferir nas provas graus Foram muitos juízes civis, não de detención y tortura, sin duda algu- de “inteligência ética” (vamos chamar só militares, que assim procederam. na, contribuyeron al doloroso balance assim) e habilidades concretas na re- Uma verdadeira aliança entre o judi- que en materia de derechos humanos solução de conflitos, na sensibilidade ciário e a ditadura. Não tivemos aqui, quedó tras ese gris período”. diante dos casos concretos e dos dife- e tudo indica que estamos muito lon- rentes perfis de cidadãos que passarão ge de ter, um mea culpa como feito pelos seus julgamentos e análises caso recentemente pelo judiciário chileno Leia mais... aprovado. É que existe uma imagem no marco dos 40 anos do violento traiçoeira de que o juiz não deve se golpe desferido por Pinochet39 e seus envolver com nada, ficando encaste- sequazes. • O poder menos transparente da Re- lado no seu conhecimento teórico do A Associação Nacional dos Ma- pública. Entrevista com professor Direito e na sua suposta superioridade gistrados chilenos, que reúne cerca José Carlos Moreira Filho para a IHU moral. É claro que o juiz tem de culti- de 70% dos juízes do país, divulgou var a imparcialidade, mas isto não quer uma declaração pública na qual pede On-Line, edição 383, disponível em dizer que ele tenha que ser neutro, até perdão pelas atuações e omissões http://bit.ly/rzuol1; porque isto é impossível. Eu sou da praticadas pelo judiciário do Chile. • A anistia não é esquecimento ou opinião que um juiz tem o direito de Dentre tais atitudes menciona-se o assumir uma posição política na socie- pouco caso que faziam das denúncias amnésia. Entrevista com professor dade. Claro que para isto não precisa de torturas e abusos que eram feitas José Carlos Moreira Filho para a IHU se filiar a algum partido político. A polí- pelos prisioneiros políticos. Para fina- On-Line, edição 358, disponível em tica é, antes de tudo, a ação no espaço lizar esta entrevista, nada melhor que público, a disposição de dialogar, discu- conferir alguns trechos valiosos desta http://bit.ly/gCnbNL; tir e buscar o bem comum. declaração, e que cabem como uma • Políticas de memória: um dever so- Creio que deveríamos também luva para o judiciário brasileiro. cial. Entrevista com professor José repensar seriamente o tema do con- trole externo da magistratura. O CNJ “Estimamos que no es posible Carlos Moreira Filho para a IHU On- não é suficientemente externo, vamos eludir la responsabilidad histórica de Line, edição 343, disponível em ht- www.ihu.unisinos.br dizer assim. Aliás, este é um debate nuestra judicatura en relación a la vul- tp://bit.ly/9vpQIt; que vem se arrastando, sem solução, neración de los derechos básicos de la desde a constituinte. persona humana producidos durante • Um direito mais amplo e interdisci- el régimen dictatorial. Hay que decirlo plinar. Entrevista com professor Jo- Memória política y reconocerlo con claridad y entereza: sé Carlos Moreira Filho para a IHU Por fim, articulando esta respos- el Poder Judicial y, en especial, la Corte ta com o tema da primeira pergunta, Suprema de la época, claudicaron en On-Line, edição 305, disponível em precisamos cada vez mais resgatar a su labor esencial de tutelar los dere- http://bit.ly/dw9VXn; memória política do judiciário brasi- • Caravana da anistia revela a obs- leiro. Como bem ilustra a pesquisa de do entrevistado) Anthony W. Pereira38, o judiciário bra- 39 Augusto José Ramón Pinochet Ugarte curidade de 1964. Entrevista com (1915-2006): General do exército chile- no. Foi presidente do Chile entre 1973 e professor José Carlos Moreira Filho 38 PEREIRA, Anthony W. Ditadura e re- 1990, depois de liderar um golpe militar para a IHU On-Line, edição 277, dis- pressão: o autoritarismo e o estado de que derrubou o governo do presidente so- direito no Brasil, no Chile e na Argenti- cialista, Salvador Allende. (Nota da IHU ponível em http://bit.ly/18QdBAA; na. São Paulo: Paz e Terra, 2010. (Nota On-Line)

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 37 Povos originários e os entraves na efetivação de seus direitos constitucionais Pesquisador José Otávio Catafesto admite que, do ponto de vista formal, a Constituição gerou efeitos positivos aos direitos dos indígenas, mas é preciso

ema de Capa avançar na implementação de seus direitos T Por Ricardo Machado

ara o professor José Otávio Catafesto, histórico e o vagar de órgãos estatais nas de- a Constituição Federal de 1988 garan- mandas indígenas. “A Constituição Federal de Ptiu um novo marco teórico e formal 1988 é um avanço, mas a jurisprudência que na condução da causa indígena, gerando um a efetiva é muito lenta e se embate com os novo projeto de Brasil, mas que precisa avan- interesses privados arraigados nas agências çar na sua implantação. “Se esse marco for do Estado e que permitiram a alienação his- implantado na íntegra, isso vai transformar tórica do patrimônio indígena, da exploração futuramente o Brasil numa Confederação dos corpos indígenas (pelo sexo e pelo traba- Internacional de coletivos ameríndios, qui- lho forçado) e de outras formas de subordina- lombolas, negros e de outras ascendências ção”, critica. étnicas integrados neste vasto território ge- José Otávio Catafesto de Souza é etnoar- renciado pelos poderes do nosso Estado, re- queólogo, pesquisador e professor interessa- conhecendo o direito de autodeterminação do por temas relacionados às questões dos desses grupos, confrontando o controle ide- povos originários do Mercosul. É formado ológico das igrejas e a hegemonia da lógica em História pela Universidade Federal do Rio do mercado”, sustenta José Otávio Catafesto, Grande do Sul — Ufrgs, onde também reali- em entrevista por e-mail à IHU On-Line. “Não zou mestrado e doutorado em Antropologia foi clarividência ou lucidez intelectual dos po- Social. Atua como professor adjunto na mes- líticos brasileiros que reconheceram direitos ma universidade, onde coordena o LAE — especiais dos ameríndios aos seus territó- Laboratório de Arqueologa e Etnologia, que rios tradicionais, à preservação de seus usos desenvolve projetos de pesquisa sobre Terri- e costumes e à sua autodeterminação. Isso torialidade Mbyá-Guarani, Etnoarqueologia resulta da pressão direta exercida por eles Ameríndia e Quilombola e Avaliação dos Im- enquanto sujeitos coletivos, protagonistas de pactos de Projetos de Desenvolvimento sobre seus destinos desde muito tempo, embora os coletivos rurais. O professor realizará a confe- civilizados não tivessem capacidade mental e rência Reconhecimento de culturas, direito à visual desse reconhecimento”, argumenta o terra e à Constituição Federal hoje: avanços professor. e retrocessos no dia 28-10-2013, das 20h às O pesquisador é muito cauteloso em suas 22h, na Sala Ignacio Ellacuría e Companhei- análises e mesmo quando aponta aspectos ros, no IHU. positivos não deixa de resgatar o contexto Confira a entrevista.

IHU On-Line – Em termos socio- José Otávio Catafesto – Represen- um novo projeto de nação enquan-

www.ihu.unisinos.br culturais, o que significa a definição ta um novo marco formal e teórico de to inter-nações relacionadas. Se esse Constitucional de 1988 de que a so- relação a ser implantado entre os po- marco for implantado na íntegra, isso ciedade brasileira é definida como deres do Estado Brasileiro e os grupos vai transformar futuramente o Brasil pluriética e multicultural? formadores da comunhão nacional, numa Confederação Internacional de

38 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 coletivos ameríndios, quilombolas, ne- na intolerância completa ante as dife- dade, ainda mais acompanhando a T gros e de outras ascendências étnicas renças culturais e religiosas. A Europa mobilização contrária de ruralistas, ema de Capa integrados neste vasto território geren- apropriou-se de grandes realizações de agentes do agronegócio e de pe- ciado pelos poderes do nosso Estado, científicas e tecnológicas das culturas quenos agricultores. Caberá ao futuro reconhecendo o direito de autodeter- árabes (álgebra, universidades, biblio- mostrar se efetivamente os direitos minação desses grupos, confrontando tecas, arquitetura, etc.) para depois diferenciados e de soberania serão o controle ideológico das Igrejas e a perseguir e exterminar esses “mou- plenamente reconhecidos aos ame- hegemonia da lógica do mercado. ros” pelas Cruzadas1 e guerras justas ríndios dentro do Brasil, confrontan- A escolha correta de conceitos é contra hereges. do os interesses privados e utilitaris- fundamental para entender e situar a tas instituídos com a conivência dos conjuntura nacional e internacional Nativos agentes do Estado brasileiro. da legislação que reconhece e dá di- Os nativos americanos também reitos especiais a grupos específicos foram completamente reduzidos à IHU On-Line – Considerando o antes marginalizados, outrora supri- condição de animalidade e apenas déficit histórico-social do Brasil com midos e silenciados na formação dos tratados pelo dispositivo lógico da di- seus povos originários, que avanços Estados e das nações modernos. Os ferença negativa (os índios são a falta à cidadania ou à autonomia destas intelectuais latino-americanos prefe- daquilo que nos constitui como hu- populações a Constituição de 1988 rem falar atualmente de interétnico e manos, eles são “sem fé, sem rei, sem promoveu? intercultural em lugar do pluriétnico lei”). Assim, justificou-se a conquista José Otávio Catafesto – O maior ou multicultural, pois não se trata de militar e a conquista espiritual pela avanço foi consolidar, de vez, a plena opções de comportamento ou mis- catequização, pelo extermínio cultu- cidadania a todos os ameríndios ha- tura heterogênea de traços culturais ral (etnocídio) em nome dos valores bitantes do território nacional. Antes, isolados, mas sim de constantes em- nobres e intolerantes da civilização. os índios eram tratados como semica- bates de entendimento e de negocia- No final do século XIX, os militares pazes (como o são os órfãos menores ção que se fazem nas fronteiras entre adotaram os princípios do positivismo de idade). Hoje, a diferença não pode grupos e agentes que rivalizam por e taxaram os ameríndios enquanto ser ainda pensada como uma questão interesses divergentes dentro de um mentalmente limitados por sua con- de inferioridade racial ou de suposto mesmo espaço geopolítico. dição “selvagem”, justificando a tutela limite mental dos índios como antes dos índios como se fossem crianças a eram tratados oficialmente, pois a le- Multiculturalismo serem guiadas pela ordem e pelo pro- gislação brasileira incorporou as con- norte-americano gresso da nação, reduzidos à condição tribuições conceituais da antropolo- O multiculturalismo norte-ame- de trabalhadores desqualificados e gia, ao tratar das diferenças culturais ricano dilui o reconhecimento dos apenas parte do exército capitalista pela perspectiva dos processos de conflitos existentes em nome de um de reserva. identificação étnica. universal suposto como redentor das Portanto, a Constituição Fede- O conceito de “cidadania” teve diversidades e unificador da multi- ral de 1988 começou a reverter um que se alargar ao ponto de corromper plicidade. A racionalidade utilitarista processo multissecular de exclusão seu sentido original, daquele sentido é erroneamente apresentada como social e de violência física e cultural urbanocêntrico instituído pela polis algo aquém e além da cultura, supos- perpetrados sobre os povos originá- grega e pela urbe romana que servem tamente capaz de neutralizar os parâ- rios existentes no território em que ainda de modelo à nossa civilização metros culturais e étnicos em nome se inventou e construiu o Brasil desde brasileira (como analisou Sérgio Buar- do progresso tecnológico tido como 1500. Vinte e cinco anos é um tempo que de Holanda2 em Raízes do Brasil). suposto fim último para todos os po- ainda curto para dizer se os avanços vos e civilizações. pretendidos estão ocorrendo de fato na própria estrutura de nossa socie- 2 Sérgio Buarque de Holanda (1902- www.ihu.unisinos.br No Brasil, o multicultural tem sua 1982): historiador brasileiro, também equivalência na teoria da miscigenação, crítico literário e jornalista. Entre ou- na fábula das três raças, em que índios tros, escreveu Raízes do Brasil, de 1936. 1 Cruzadas (séculos XI a XIII): foram mo- Obteve notoriedade através do conceito e negros aparecem como personagens vimentos militares de inspiração cristã de “homem cordial”, examinado nessa apenas do passado e que estariam re- que partiram da Europa Ocidental em obra. A professora Dra. Eliane Fleck, do presentados hoje apenas por alguns direção à Terra Santa (nome pelo qual PPG em História da Unisinos, apresentou, os cristãos denominavam a Palestina) no evento IHU Ideias, de 22-08-2002, o traços na fisionomia, na culinária ou nas e à cidade de Jerusalém com o intuito tema O homem cordial: Raízes do Brasil, crenças populares. O interétnico restitui de conquistá-las, ocupá-las e mantê-las de Sérgio Buarque de Holanda, e no dia o reconhecimento de grupos amerín- sob o domínio cristão. Estes movimentos 08-05-2003 a professora apresentou essa estenderam-se entre os séculos XI e XIII, mesma obra no Ciclo de Estudos sobre o dios e quilombolas enquanto sujeitos época em que a Palestina estava sob con- Brasil, concedendo, nessa oportunidade, coletivos atuais, enquanto protagonis- trole dos turcos muçulmanos. No médio uma entrevista a IHU On-Line, publicada tas de seu destino futuro e enquanto oriente, as cruzadas foram chamadas de na edição nº 58, de 05-05-2003, disponí- “invasões francas”, já que os povos locais vel em http://bit.ly/152MP1v. Sobre Sér- grupos diferenciados na “comunhão” viam estes movimentos armados como in- gio Buarque de Holanda, confira, ainda, da sociedade global. vasões e por que a maioria dos cruzados a edição 205 da IHU On-Line, de 20-11- A civilização ocidental, de que o vinha dos territórios do antigo Império 2006, intitulada Raízes do Brasil, dispo- Carolíngio e se autodenominavam fran- nível para download em http://bit.ly/ Brasil faz parte, surgiu fundamentada cos. (Nota da IHU On-Line) SMypxY. (Nota da IHU On-Line)

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 39 O modelo original de democracia foi transformados em camponeses e de- os Pancararus8 e tantos outros grupos criado sobre a escravidão, e a cidade pois emancipados como citadinos. do Nordeste brasileiro. Elas abala- tornou-se tentáculo de controle e de Nada se mostrou mais falacioso, até ram nossa ideologia política de que a submissão entre as classes sociais, ex- mesmo para os antropólogos que história é um processo inexorável de cluindo os trabalhadores pobres des- também publicavam veredictos pes- perda da tradição e de uniformização sa situação cidadã. Hoje, mesmo os simistas quanto ao destino dos povos cultural. índios arredios e isolados que ainda ameríndios. Entretanto, foram supe- estão nos confins da selva amazônica, rados os picos de mortalidade infantil Protagonismo desconhecidos mesmo dos antropó- para muitas etnias indígenas brasilei- Com isso, quero enfatizar mais logos, podem permanecer assim, sem ras desde a década de 1950 e muitas o protagonismo ameríndio e a for- contato com as agências de estado, chegam hoje a dezenas de milhares ça de mobilização étnica dos grupos de igrejas e do mercado e esse é um de representantes (como os Ticuna4, originários como fator fundamental direito inalienável de sua cidadania. Kaingang5, Guarani6, etc.). a condicionar o processo constituin- Antes, os representantes do Estado te na década de 1980 e culminar com

ema de Capa viam-se na missão de salvar os índios Crítica pós-colonial a inclusão dos artigos 231 e 232 da

T de suposta animalidade e da condi- Em verdade, os coletivos ame- CF de 1988. Não foi clarividência ou ção primitiva trazendo-os à civilidade. ríndios sobreviveram ao ultimato de lucidez intelectual dos políticos bra- Hoje, se eles fogem constantemente sua extinção formal e permanece- sileiros que reconheceram direitos de qualquer contato, se eles conti- ram existindo mesmo que o Estado especiais dos ameríndios aos seus nuam escapando de exploradores, brasileiro não tivesse capacidade de territórios tradicionais, à preservação comerciantes, militares e religiosos, reconhecer sua existência ou mobili- de seus usos e costumes e à sua au- o Estado Brasileiro tem o dever de zasse esforços para resguardar seus todeterminação. Isso resulta da pres- resguardar essa forma de manter sua direitos diferenciados. Foi preciso são direta exercida por eles enquanto autodeterminação. que a antropologia da África e das sujeitos coletivos, protagonistas de Citei um caso extremo oposto Américas formulasse os princípios da seus destinos desde muito tempo, para mostrar que, hoje, ser selvagem crítica pós-colonial, para que fosse embora os civilizados não tivessem (habitante da selva) é uma das formas rompido o véu da crença que justifi- capacidade mental e visual desse de exercer a cidadania brasileira, mes- cava o extermínio da diversidade pela reconhecimento. mo que os selvagens nunca tenham utopia de construção de uma socie- Hoje, os índios estão escolari- conhecido qualquer cidade ou saibam dade homogênea, massificada e -glo zados e suas lideranças representam o que seja Brasil. Mas a quase totali- balizada. As minorias passaram a sair suas coletividades, onde alguns já são dade dos indígenas brasileiros con- da penumbra e do silêncio, grupos diplomados em cursos superiores, vive com as cidades desde antes do considerados extintos ressurgiram atuam como profissionais nas aldeias nascimento. Em verdade, quase todas das cinzas. Trata-se de uma verdadei- ou nos centros urbanos ou exercem as cidades do litoral brasileiro foram ra “viagem de volta” (como avalia o cargos legislativos ou executivos. Eles criadas sobre antigas aldeias amerín- antropólogo João Pacheco de Olivei- já não precisam de mediadores bran- dias (Salvador, Rio de Janeiro, São Vi- ra), como acontece com os Pataxós7, cos que determinem seu destino de cente, Santos, Porto Alegre, etc.), e os forma unilateral ou apliquem critérios índios construíram cidades (como no arbitrários de políticas públicas. 4 Ticunas: povo ameríndio que habita, caso das Missões jesuíticas) e estão na atualmente, a fronteira entre o Peru e o A Constituição Federal de 1988 é origem da história delas e dos cami- Brasil e o Trapézio Amazônico, na Colôm- um avanço, mas a jurisprudência que nhos que as unem. bia, somando aproximadamente 30 mil a efetiva é muito lenta e se embate indivíduos. (Nota da IHU On-Line) 5 Kaingang: etnia indígena que se desen- com os interesses privados arraigados Fim dos índios volveu a sombra dos pinheirais. Há pelo nas agências do Estado e que permi- Assim, a condição urbana não é menos dois séculos, sua extensão ter- tiram a alienação histórica do patri- ritorial compreende a zona entre o Rio contraditória com a permanência do Tietê (São Paulo) e o Rio Ijuí (norte do mônio indígena, da exploração dos indianato ou da indianidade, ao con- Rio Grande do Sul). No século XIX, seus corpos indígenas (pelo sexo e pelo trário do que apregoavam os militares domínios se estendiam para oeste, até trabalho forçado) e de outras formas San Pedro, na província argentina de Mi- e intelectuais positivistas. Na década siones. (Nota da IHU On-Line) de subordinação. O reconhecimento de 1980, o ministro Rangel Reis3, in- 6 Guaranis: etnia indígena das Améri- da cidadania dos ameríndios exige e o tegrado à ditadura militar, apregoava cas, tendo, como territórios tradicio- Estado brasileiro empenhe-se na con- nais, uma ampla região da América do que até o ano 2000 não existiriam Sul que abrange os territórios nacionais dução de políticas e projetos especiais mais índios no Brasil, inicialmente da Bolívia, Paraguai, Argentina, Uruguai nas áreas de serviços básicos como a porção centro-meridional do território são a garantia à terra, ao direito de re- brasileiro. (Nota da IHU On-Line) 3 Maurício Rangel Reis (1922-1986): 7 Pataxós: etnia indígena que, em 2010, político brasileiro que exerceu os cargos totalizavam 11.833 pessoas, segundo da- de secretário-geral do Ministério da dos da Funasa. Vivem em sua maioria na tares. (Nota da IHU On-Line) www.ihu.unisinos.br Agricultura durante a gestão do ministro Terra Indígena Barra Velha do Monte Pas- 8 Pancararus: etnia indígena que habita Ney Braga (1965-1966) e ministro do coal, ao sul do município de Porto Segu- as proximidades do médio rio São Fran- Interior no governo Ernesto Geisel, de 15 ro. A região onde habitam é reconhecida cisco, nos limites dos municípios de Ta- de março de 1974 a 15 de março de 1979. por eles como suas terras tradicionais, as caratu e Petrolândia, ambos no estado de (Nota da IHU On-Line) quais abrangem uma área de 20 mil hec- Pernambuco. (Nota da IHU On-Line)

40 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 T produzir suas formas tradicionais de foco do eurocentrismo atribuindo Emancipação ema de Capa sustento mesmo dentro de projetos mais valor aos indígenas na constru- Por outro lado, a ruptura trazi- de desenvolvimento, de terem aten- ção do Estado-nação brasileiro? Em da pela Constituição de 1988 é ainda dimento de saúde em harmonia com que medida? mais radical do que apenas dar mais seus sistemas tradicionais de cura, José Otávio Catafesto – A Cons- importância aos indígenas. O que de terapia e de profilaxia. Da mesma tituição Federal de 1988 não é um ocorreu foi a emancipação dos índios forma, os programas de saneamento marco de derrocada do eurocentris- e das coletividades indígenas que pas- e de habitação em terras indígenas mo ou do norte-americanismo (seu saram a ser reconhecidos enquanto devem se adaptar aos usos e costu- equivalente mais recente) que ainda sujeitos de pleno direito, a começar mes nativos. Há ainda a demanda de conduzem o ideário da elite política pelo direito fundamental de autode- construção de escolas diferenciadas nacional, talvez apenas uma recicla- terminação e de protagonismo na de- dentro das comunidades indígenas, gem ideológica desse mesmo etno- finição de seus destinos específicos. com ensino bilíngue. centrismo frente à pressão social ge- Agora os índios devem ser respeita- Em todas essas áreas, os avanços rada pelas minorias oprimidas dentro dos em suas vontades e segundo suas são muito lentos, pois esbarram em ro- do Brasil, sejam indígenas ou de ou- tradições específicas, mas isso ainda é tinas coloniais entranhadas nos depar- tras origens. Trata-se de uma flexibi- mais abstrato do que concreto na me- tamentos e agências do Brasil. A mu- lização ideológica que reconhece a dida em que o avanço no reconheci- dança necessária é ainda mais difícil, a diversidade social e cultural existente mento dos direitos indígenas esbarra começar pela necessária mudança de dentro de território brasileiro, mas o constantemente, atingindo interesses mentalidade dos prestadores de servi- ideal positivista continua estampa- contrários de quem hoje está sobre ço em relação à posição social inferior do em nossa bandeira e a civilização a terra reivindicada, dos que contro- dos índios, sempre ávidos em reiterar urbanocêntrica continua a prosperar lam o sistema biomédico industrial, posturas paternalistas ou assistencia- hegemônica sobre campos e florestas, dos que produzem pelo sistema do listas frente ao suposto incapaz. tornando as zonas rurais em áreas de agronegócio, dos que administram as Tudo isso ainda sem referir a di- extração de recursos e de produção escolas apenas enquanto agências de mensão do déficit tratada na pergun- de energias em prol do progresso ur- sequestro, como nos ensinou Michel ta, que eu prefiro referir como “dívi- bano industrial. Foucault9. da histórica”. Mas, se a aplicação de O eurocentrismo é intrínseco à políticas especiais já é uma grande construção nacional, mas mesmo os dificuldade no Brasil, o que ocorrerá ideais políticos dos direitos huma- 9 Michel Foucault (1926-1984): filósofo francês. Suas obras, desde a História da no processo se ainda contabilizarmos nos foram gerados pelo Iluminismo, Loucura até a História da sexualidade (a todos os prejuízos que os índios so- a partir do conhecimento que os in- qual não pôde completar devido a sua frem no Brasil desde sua existência? telectuais europeus tiveram sobre morte) situam-se dentro de uma filosofia do conhecimento. Suas teorias sobre o O montante seria tão absurdo e o in- a igualdade social e sobre a liberda- saber, o poder e o sujeito romperam com vestimento tão volumoso que impli- de canibal dos indígenas brasileiros. as concepções modernas destes termos, caria numa guerra civil se essa dívida Afonso Arinos já defendeu a tese de motivo pelo qual é considerado por cer- tos autores, contrariando a sua própria fosse reclamada em sua plenitude. que os europeus encontraram en- opinião de si mesmo, um pós-moderno. Os índios não conseguem reconhe- tre os ameríndios do litoral brasilei- Seus primeiros trabalhos (História da cer pequenas áreas em seu direito, o ro exemplos reais de suas utopias Loucura, O Nascimento da Clínica, As Palavras e as Coisas, A Arqueologia do que seria se eles reivindicassem seus políticas, demonstrando possível a Saber) seguem uma linha estruturalista, antigos territórios de amplitude con- existência de uma sociedade justa e o que não impede que seja considerado tinental. São Miguel das Missões, São igualitária. Os ideólogos brasileiros geralmente como um pós-estruturalista devido a obras posteriores como Vigiar e Borja, São e Porto Alegre só assumiram o reconhecimento da Punir e A História da Sexualidade. Fou- deveriam ser devolvidas aos Guarani, especificidade dos direitos indígenas cault trata principalmente do tema do por exemplo. por pressão internacional, pois os in- poder, rompendo com as concepções clás- www.ihu.unisinos.br sicas deste termo. Para ele, o poder não Penso que a discussão sobre os telectuais brasileiros sempre se mo- pode ser localizado em uma instituição direitos originários deveria ser pauta- vem por aquilo que os intelectuais do ou no Estado, o que tornaria impossível a da pela consciência de que os índios “Primeiro Mundo” dizem deles. Santo “tomada de poder” proposta pelos mar- xistas. O poder não é considerado como estão reclamando migalhas daquilo de casa não faz milagre, diz o ditado algo que o indivíduo cede a um soberano que uma justiça histórica justifica- popular. Assim, a assimilação de ele- (concepção contratual jurídico-política), ria reivindicar de forma integral. Os mentos da perspectiva cultural -ame mas sim como uma relação de forças. Ao ser relação, o poder está em todas as índios não querem o Brasil inteiro, ríndia pelos políticos nacionais não partes, uma pessoa está atravessada por embora tenham direito de reclamá- se faz de maneira direta, mas apenas relações de poder, não pode ser conside- -lo exigindo que os descendentes dos porque os europeus ou norte-ame- rada independente delas. Para Foucault, o poder não somente reprime, mas tam- europeus voltem para a Europa (as- ricanos aprenderam com os nativos bém produz efeitos de verdade e saber, sim argumentam algumas lideranças americanos (princípios de tolerância constituindo verdades, práticas e subje- indígenas). e de inconformidade com as injustiças tividades. Em três edições a IHU On-Line dedicou matéria de capa a Foucault: edi- sociais) e depois nos ensinaram tais ção 119, de 18-10-2004, disponível para IHU On-Line – É possível consi- saberes autóctones ameríndios incor- download em http://migre.me/vMiS, porados à nossa civilidade brasileira. edição 203, de 06-11-2006, disponível derar que a Carta Magna retirou o em http://migre.me/vMj7, e edição 364,

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 41 Eurocentrismo merecem atenção diferenciada nas nicos ameríndios, e é essa dimensão O eurocentrismo dos políticos políticas públicas, em respeito aos pa- sociológica que devemos colocar no e ideólogos brasileiros é evidente no râmetros de suas tradições sociais e foco de nossa análise. A antropologia próprio texto da Constituição Federal culturais. A Carta Magna é condizente ensina que o direito formal sempre foi de 1988. A antropóloga Alcida Rita Ra- com o limite daquilo que é aceitável um palco de contendas entre interes- mos 10já detalhou o horror dos políti- na conjuntura atual, e não sabemos ses divergentes e os princípios norma- cos ao longo da história nacional em como o rearranjo das forças políticas, tivos são apenas abstrações manipu- relação à possibilidade de a autono- sociais e econômicas vão transformar láveis em ambas as direções. mia indígena virar soberania política, a questão indígena nas próximas dé- gerando a criação de “estado dentro cadas no Brasil. Esperamos que sem- HU On-Line – A história mostrou do Estado”. Este temor ainda é muito pre avançando. que a economia — lógica dos coloni- recorrente, e no texto de 1988 não zadores — “triunfou” sobre a cosmo- se encontra, em nenhum momento, IHU On-Line – A partir de 1988 ecologia dos indígenas. O senhor qualquer referência a “povo” ou “na- houve mudanças na relação histórica pode explicar como funcionam estas ema de Capa ção” indígenas. Os índios são tratados de desrespeito à soberania dos povos duas ideias e em que medida a filoso- T enquanto “comunidades”, conceito indígenas? Em que casos a Constitui- fia indígena poderia ajudar no resga- jurídico que não sustenta qualquer ção funciona apenas como uma mera te de valores mais humanos? reivindicação de soberania política carta normativa, mas sem efeito José Otávio Catafesto – Em pri- pelos indígenas. prático? meiro lugar, é preciso romper com a José Otávio Catafesto – O prin- falsa ideia de que nós fazemos parte Direitos cipal desrespeito à autodetermina- de uma sociedade e de um momento Mesmo considerando todos ção dos povos indígenas (sem entrar histórico em que foram superados os os limites, o saldo é muito positivo no melindre da soberania enquanto limites da crença, da magia e da reli- em favor dos direitos originários e a criação de estados dentro do Estado) gião. Os outros povos são tidos como Constituição de 1988 deve ser enten- é a recente suspensão dos processos míticos e religiosos, enquanto nós — dida como uma poderosa ferramenta demarcatórios em diversos estados ocidentais — somos científicos e fi- jurídica em favor da luta pelo reco- do Brasil, em função da pressão rura- losóficos. Não há nada mais falso do nhecimento da existência diferencia- lista e do agronegócio na formulação que isso. Todo ser humano é crente, da das centenas de etnias dentro do do Projeto de Emenda Constitucional mesmo que essa crença seja a ciência. território nacional. A Carta Magna – PEC 21511. Antes, a ação indigenista No fundo de nossa filosofia e de nossa normatiza que os direitos originários oficial já era muito morosa em função ciência ocidental também existe um da pressão política gerada pelos ocu- substrato mítico e cosmológico que as pantes atingidos. A Constituição esta- fundamentam, tão metafísico quanto de 06-06-2011, disponível em http://bit. ly/k3Fcp3. Além disso, o IHU organizou, beleceu o prazo de cinco anos para a o dos povos fetichistas, ou mesmo durante o ano de 2004, o evento Ciclo completa demarcação das Terras Indí- ainda mais. Por outro lado, há profun- de Estudos sobre Michel Foucault, que genas no Brasil. Hoje, 25 anos depois, da filosofia e verdadeira ciência en- também foi tema da edição número 13 dos Cadernos IHU em Formação, disponí- apenas uma parte já foi regularizada tre os coletivos ameríndios, algo que vel para download em http://migre.me/ e mesmo essa parte torna-se questio- é preciso cada vez mais reconhecer. vMjd sob o título Michel Foucault. Sua nada, imobilizando as ações adminis- Como propõe Marshall Sahlins12 em contribuição para a educação, a política e a ética. Confira, também, a entrevista trativas em curso. seu livro “Cultura na Prática” (Rio de com o filósofo José Ternes, concedida à É da essência de uma Carta Mag- Janeiro: Editora da UFRJ, 2007), é pre- IHU On-Line 325, sob o título Foucault, na ser formal e genérica. Nela estão ciso desvelar a cosmologia nativa oci- a sociedade panóptica e o sujeito his- tórico, disponível em http://migre.me/ contidos os princípios que defendem dental em seus princípios e em seus zASO. De 13 a 16 de setembro de 2010 os direitos originários, mas nela tam- desdobramentos na ciência atual. A aconteceu o XI Simpósio Internacional bém estão presentes os princípios da IHU: O (des)governo biopolítico da vida humana. Para mais informações, acesse propriedade privada e do direito de http://bit.ly/1bewIVK. Confira a edição exploração econômica que se opõem 12 Marshall David Sahlins (1930): antro- 343 da IHU On-Line, intitulada O (des) ao pleno reconhecimento dos direitos pólogo dos Estados Unidos. Recebeu os governo biopolítico da vida humana, títulos de bacharel e de mestre pela Uni- publicada em 13-09-2010, disponível em indígenas. A Constituição esconde a versidade de Michigan, onde estudou com http://bit.ly/bi5U9l, e a edição 344, formulação de princípios contraditó- Leslie White, e obteve Ph.D na Univer- intitulada Biopolitica, estado de exce- rios, manipuláveis pelo jogo de forças sidade de Colúmbia em 1954, onde suas ção e vida nua. Um debate, disponível principais influências intelectuais foram em http://bit.ly/9SQCgl. A edição 364, contrárias e em favor dos direitos ét- Karl Polanyi e Julian Steward. Lecionou de 06-06-2011, é intitulada ‘História da na Universidade de Michigan, onde nos loucura’ e o discurso racional em debate, anos 1960 iniciou sua atividade política, inspirada na obra História da loucura, e 11 PEC 215: Inclui dentre as competên- que incluiu o movimento contra a Guer- está disponível em http://bit.ly/lXBq1m. cias exclusivas do Congresso Nacional ra do Vietnã. No final da década de 1960 (Nota da IHU On-Line) a aprovação de demarcação das terras esteve dois anos em Paris, onde sofreu 10 Alcida Rita Ramos: antropóloga bra- tradicionalmente ocupadas pelos índios a influência da vida intelectual francesa www.ihu.unisinos.br sileira, professora emérita da Universi- e a ratificação das demarcações já ho- (particularmente de Claude Lévi-Strauss) dade de Brasília, dedicada à luta, por mologadas; estabelecendo que os cri- e participou dos protestos estudantis de mais de duas décadas, à demarcação térios e procedimentos de demarcação maio de 1968. Em 1973 transferiu-se para das terras dos índios Yanomami. (Nota serão regulamentados por lei. (Nota da a Universidade de Chicago, hoje é profes- da IHU On-Line) IHU On-Line) sor emérito. (Nota da IHU On-Line)

42 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 T cosmologia ocidental contemporânea José Otávio Catafesto – Por in- é herdeira e é extensão da cosmologia “A Constituição crível que pareça, o dispositivo legal ema de Capa judaico-cristã gerada no ambiente ári- que reconhece as terras indígenas do dos desertos do Oriente Próximo13, Federal de enquanto patrimônio da União não onde se deve ser precavido e se deve resultou em maior autonomia dos labutar para sobreviver. Realidades 1988 começou povos originários, da mesma manei- muito diferentes daquelas vivencia- ra que também não produziu maior das pelos nativos do ambiente tropi- a reverter controle estatal desses territórios. cal úmido americano. um processo Isso porque a questão da autonomia é pouco dependente das definições Cosmologia ocidental multissecular de formais da legislação e muito mais da A cosmologia ocidental desquali- confluência de forças econômicas e fica a vida terrena e a torna uma agru- exclusão social históricas que atingem os territórios ra, uma jornada cheia de espinhos e indígenas desde antes da construção de sofrimentos gerados por nossa e de violência do Brasil. condição natural enquanto pecado- Por um lado, o assistencialismo res. O postulado da falta intrínseca física e cultural tutelar legitimou que militares e ad- à nossa condição humana acoplou- ministradores leigos tomassem con- -se ao materialismo dos gregos e sua perpetrados ta da gestão do patrimônio indígena crença na Olímpia habitada por deu- (terras e seus recursos naturais) ao ses antropomorfos. Desde então, o longo de toda a república, fazendo pensamento ocidental moveu-se pelo sobre os povos os índios se submeterem à civiliza- dualismo que contrapõe nossa condi- ção, impondo o regime disciplinar, ção corporal à nossa condição de se- originários” aplicando a pedagogia do trabalho res pensantes, gerando a hegemonia e explorando os recursos em provei- da razão prática e o do utilitarismo. to particular. No sul e centro-oeste Isso promoveu o desencantamen- nos prazeres mundanos. Esse fundo do Brasil, as terras indígenas fizeram to crescente do mundo, ao ponto religioso está presente implícito, em prosperar os municípios onde elas es- de permitir o amplo desabrochar da muitas ideologias desenvolvimentis- tão situadas, gerando divisas diversas economia utilitarista do capitalismo, tas, mesmo as da esquerda brasileira em que a natureza foi transformada ao longo da história; desde o ciclo de contemporânea. extração da erva-mate, passando pela em mera fonte de recursos e ao apro- O referido “triunfo” da lógi- veitamento de nossas cosmologias exploração madeireira, de criação de ca econômica ocidental é apenas a gado nos campos que substituíram as antropocêntricas. aparência ideológica de um sistema florestas e, finalmente, submetendo marcado por profundas contradições, as terras tradicionais dentro do ciclo Economia e religião sendo abalado em todo momento por de produção agrícola de monocultura Com o aparecimento da ciência sucessivas crises que o desestabilizam de exportação e pelo uso intensivo de econômica, desde o final do século e que ameaçam sua continuidade no insumos químicos e industriais. XVIII, postulados religiosos tornaram- futuro a mais largo prazo. É preciso -se verdades científicas e moldaram romper radicalmente, não apenas Exploração econômica políticas e projetos que movem a pro- com o utilitarismo econômico que tem É assim que se explica a origem dução, a circulação e o consumo de gerado o consumismo exacerbado e a bens e serviços em nossa sociedade. degradação das condições naturais do dos arrendamentos das terras indíge- O princípio formalista da economia nas para particulares no sul do Bra-

planeta em prol do desenvolvimento www.ihu.unisinos.br – meios limitados para satisfazer ne- humano, mas também e mais subs- sil, prática estimulada pelos próprios cessidades ilimitadas – esconde sua tancialmente é preciso relativizar a agentes do Estado responsáveis pela matriz religiosa. Seríamos seres eter- cosmologia ocidental que acredita ser administração desses bens da União. namente descontentes que aplacam apenas o homem filho eleito de Deus, Depois que os arrendamentos foram a insatisfação da alma no consumo e todo o resto do mundo ser reduzido coibidos pelos poderes públicos a contínuo de recursos e nos peque- apenas a objetos para sua utilização e partir da década de 1990, agora eles completo deleite. estão camuflados pelo financiamento 13 Oriente Próximo ou Próximo Orien- de lavouras indígenas por particula- te: região geográfica que abrange dife- res em contratos escusos. Tudo isso é rentes países para arqueólogos e histo- IHU On-Line – Recuperando a riadores, de um lado, e para cientistas questão indígena à luz da Consti- contrário à autonomia dos povos indí- políticos, economistas e jornalistas, de tuição, a transformação do territó- genas, ainda que uma pequena elite outro. O termo foi aplicado originalmen- indígena conivente com a exploração te para os Estados dos Bálcãs no Leste rio indígena em área inalienável da Europeu, mas hoje em dia normalmente União resultou em maior liberdade/ de seus patrícios étnicos seja econo- descreve os países do Sudoeste Asiático autonomia aos povos originários ou micamente beneficiada, produzindo a entre o Mar Mediterrâneo e o Irã, espe- cialmente em contextos históricos. (Nota em maior controle estatal desses criação de classes sociais dentro das da IHU On-Line) territórios? terras indígenas.

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 43 Por outro lado, isso demonstra do Xingu); e, no Rio Grande do Sul, mia indígena ameaça são os podres que o controle estatal não promoveu expoentes que deixaram seu nome poderes estabelecidos subjacentes ao a proteção, mas capitaneou a explo- na história do reconhecimento das discurso ufanista da soberania. Nunca ração econômica e a degradação am- terras Indígenas, como foi Torres Gon- o território nacional foi tão alienado biental das terras indígenas, servindo çalves16 na Gestão das Terras Públicas por empresas multinacionais quanto de fonte privilegiada para enrique- do Estado nas primeiras décadas do no período da ditadura militar, isso cimento de particulares ou próprios século XX. camuflado pelo ufanismo nacionalista sobre um patrimônio que deveria ser dos intelectuais do exército. protegido em prol de todos os cida- Autonomia É preciso divulgar que os índios dãos dentro da União Nacional. Mes- Portanto, a autonomia dos índios são brasileiros por opção, e não sei mo a soberania nacional, baluarte é uma questão ainda independente da de nenhuma liderança ou de qual- dos ufanistas e defensores da nação definição formal das terras indígenas quer coletivo ameríndio que esteja brasileira, é anulada dentro de muitas enquanto patrimônio nacional, mas defendendo emancipação política do terras indígenas na Amazônia, onde ela tem consequências que se podem Brasil. Os índios possuem orgulho de ema de Capa os índios falam o inglês, e não o por- desdobrar fundamentais ao presente fazerem parte do Brasil e dizem serem T tuguês, pelo convívio que possuem e ao futuro dos coletivos ameríndios. os primeiros e verdadeiros brasileiros. com estrangeiros que se infiltraram Disse que “ainda não”, exatamente Do ponto de vista conceitual, nas aldeias e se tornaram agentes de porque antes se devem reverter as for- retorno à inexistência de qualquer empresas multinacionais encravadas mas mais radicais de dominação regio- referência constitucional dos índios em território nacional. Terras Indí- nal estabelecidas sobre as populações enquanto sujeitos coletivos para além genas onde até o exército não entra, indígenas, como exemplificam as situa- de identidade comunitária. O uso ape- em respeito à reivindicação de fatias ções dramáticas vividas pelos índios nas de “comunidades indígenas” foi do território em proveito exclusivo de Kaiová no Mato Grosso e dos Guarani intencional pelos constituintes, exa- empresas estrangeiras. e Kaingang nos estados do sul do Brasil. tamente porque no direito internacio- De qualquer maneira, seja para nal dizer povo ou nação pressupõe o os exploradores locais, seja para os IHU On-Line – De que forma dia- reconhecimento de soberania inclusi- agentes oficiais do Estado ou para os logam a Constituição de 1988, a Con- ve territorial para um grupo politica- empreendedores capitalistas interna- venção 169 da OIT, que reconhece a mente organizado em sua autonomia. cionais, do ponto de vista dos índios obrigação dos países de recompen- eles sempre estão perdendo. Sabem sarem o prejuízo histórico aos povos Embate silencioso apenas que são todos “brancos”, in- indígenas, e a Declaração da ONU em É esse embate silencioso que se dependente da religião, da nacionali- prol dos direitos indígenas, garan- trava nos bastidores da política brasi- dade ou da ideologia. tindo autodeterminação, autonomia leira e isso explica porque o Congresso Não quero, entretanto, ser in- e autogoverno? Como isso pode se Nacional demorou e demora na acei- justo e não reconhecer que muitos efetivar na prática? tação e assinatura dos instrumentos indigenistas, militares e particulares José Otávio Catafesto – Será jurídicos internacionais que declaram ajudaram a construir um quadro di- preciso que o terror sentido pela in- abertamente os ameríndios enquanto verso em certas situações pontuais, teligência brasileira ante a criação de “Povos”, com direito de autogoverno abnegados que conseguiram refrear “estados dentro do Estado” seja ultra- e autodeterminação. A aceitação na- o perfil etnocida do Estado brasileiro, passado e substituído por parâmetros cional dos princípios internacionais obtendo conquistas. Isso é exempli- políticos mais lúcidos e flexíveis, com fará romper, definitivamente, com as ficado pelo trabalho do próprio pró- o reconhecimento pleno da autode- rotinas coloniais que perduram den- prio Marechal Rondon14, dos irmãos terminação dos povos indígenas sem tro das instituições públicas, sobre e Villas-Boas15(na criação do Parque que isso seja entendido como ameaça dentro das terras indígenas. No en- à soberania nacional. O que a autono- tanto, o agronegócio, ruralistas, pe- 14 Cândido Rondon (1865-1958): Cân- quenos agricultores e empreendedo- dido Mariano da Silva Rondon, conheci- res imobiliários estão mobilizados na do como Marechal Cândido Rondon, foi tantes sertanistas brasileiros, participando um militar brasileiro. Desbravador do intensamente das negociações que pleitea- alteração do texto constitucional, no interior do país, criou em 1910 o Servi- ram a criação do Parque Nacional do Xingu. sentido de desmontar as conquistas ço de Proteção ao Índio (SPI). Teve seu A criação desse parque visava a preservar a primeiro encontro com os índios (alguns fauna e a flora ainda intocadas da região, territoriais, ainda que parciais, obti- hostis, outros escravos de fazendeiros) assim como resguardar as culturas indíge- das pelos coletivos ameríndios. quando construía as linhas telegráficas nas da área. (Nota da IHU On-Line) que ligaram Goiás a Mato Grosso. Obteve 16 Carlos Torres Gonçalves (1875-1974): a demarcação de terras de vários povos, engenheiro brasileiro nomeado diretor de Utopia política entre eles os Bororo, Terena e Ofayé. Em Terras e Colonização do governo do Rio Assim, a efetivação prática de 1939 foi nomeado presidente do Conselho Grande do Sul, entre 1903 e 1928. A obra políticas compensatórias, o reconhe- Nacional de Proteção ao Índio. Recebeu que mais exigiu esforços e representa a do Congresso Nacional, em 1955, através consolidação de suas idéias e lutas para co- cimento pleno dos direitos sobre as www.ihu.unisinos.br de lei especial, o posto de marechal do locá-las em prática foi a elaboração e pos- terras tradicionais, de autogestão e de Exército. (Nota da IHU On-Line) terior aprovação de um novo regulamento autogoverno aos coletivos ameríndios 15 Irmãos Villas-Bôas – Orlando (1914- de terras e colonização em 10 de agosto de 2002), Cláudio (1916-1998) e Leonardo 1922, substituindo o já desatualizado, de são princípios da utopia política con- Villas-Bôas (1918-1961): foram impor- 4 de julho de 1900. (Nota da IHU On-Line) temporânea internacional, formaliza-

44 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 dos como demanda pelos organismos profissionais e gestores públicos ca- eles se adaptem ao confinamento em T multilaterais que exercem pressão pazes de concretizar os princípios do espaços cada vez mais exíguos (pois ema de Capa para que os diversos países a adotem. respeito e do reconhecimento da di- as terras são cada vez menores) e pas- Por outro lado, a inteligência política versidade social e cultural. sem a utilizar equipamentos como ba- nacional balança na direção de neu- nheiros, lixeiras, etc. tralizar a ruptura com as formas de Avanços No caso da sustentabilidade, é dominação e de “simetrização” (busca Na área de educação esse pro- preciso neutralizar o afã de aplicar na igualdade de direitos enaltecendo cesso já tem importantes avanços, projetos de desenvolvimento em ter- as diferenças) pretendida pelas mino- como exemplifica a obrigatoriedade ras indígenas a fim de apenas “gerar rias indígenas. do ensino, desde 2008, de conteúdos renda” e promover a integração eco- De qualquer forma, mesmo a não de história e de cultura ameríndias em nômica das comunidades nelas exis- efetivação das obrigações formuladas todas as escolas de ensino fundamen- tentes. Assim, em muitas áreas, os pela OIT ou pela ONU não representa tal e médio do país. Há grande esforço índios estão plantando vegetais trans- fracasso no Brasil, apenas demonstra de implantação de escolas de ensino gênicos e aplicando defensivos quími- o quão arraigadas são as estruturas bilíngue nas comunidades indígenas, cos de forma massiva. eurocêntricas e etnocidas que acha- na elaboração de material didático es- Não adianta dar vaca leiteira tam os coletivos indígenas no país até pecífico e na realização de cursos de para índios que ainda não aprende- a atualidade. Os regramentos interna- capacitação aos docentes que atuam ram a tomar leite, como aconteceu cionais são fundamentais, porque eles com público indígena, estimulando a certa vez através do Programa RS Ru- podem e estão sendo apropriados pe- criação de magistérios indígenas. As- ral17. Hoje existem experiências com los grupos indígenas como canal de sim, a área da educação tanto serve resultados promissores na Amazônia pressão internacional para refrear as para difundir o espírito de tolerância e em outros pontos do Brasil. No Rio formas locais e regionais de domina- racial e étnica, quanto para criar inte- Grande do Sul, a Emater realiza proje- ção que se abatem sobre os coletivos lectuais indígenas que se tornem pro- tos interessantes de sustentabilidade, ameríndios. fissionais atuantes no sistema nacio- valorizando o banco genético nativo e nal em proveito de suas comunidades incentivando as práticas tradicionais IHU On-Line – Que desafios es- de origem. de produção agrícola e de artesanato. tão postos à elaboração e efetivação Mas há muito ainda por fazer. de políticas públicas voltadas aos po- Prejuízo histórico vos originários? Como a antropologia Tratando de perdas, são muito SUS indígena pode ajudar neste processo? sumárias ainda as iniciativas que exe- Há, por fim, a necessidade de se José Otávio Catafesto – São desa- cutem programas compensatórios pe- firmarem projetos de políticas espe- fios hercúleos, usando uma expressão los prejuízos históricos sofridos pelos ciais na área do atendimento à saúde que faz reverberar as origens gregas da coletivos ameríndios. São tantas mor- indígena. Talvez a saúde indígena seja civilização brasileira. Em cada área, em tes, estupros, violências físicas e sim- a área onde existem maiores investi- cada instituição surgem sucessivos de- bólicas, formas radicais de exploração mentos, através da adequação do SUS safios a serem vencidos e transpostos. e de alienação dos corpos, recursos e Indígena com a criação de postos de Alguns já o foram; outros, mais vulto- territórios indígenas. Em primeiro, os saúde nas áreas indígenas, na criação sos, precisam ainda acontecer. Mas representantes do Estado brasileiro de equipes volantes e na incorpora- não se pode fantasiar que a implemen- precisam formalizar pedido de descul- ção de agentes indígenas de saúde a tação de políticas especiais seja eficaz pas por tudo isso, algo que ainda não fim de promover a aceitação das te- em curto prazo, pois existem precon- aconteceu. Talvez a reserva de vagas rapias biomédicas em paralelo ao re- ceitos impregnados na mentalidade e de cotas para estudantes indígenas conhecimento da eficácia das terapias dos gestores do país, mesmo com toda nas universidades brasileiras e a dis- tradicionais. Mas todos os avanços www.ihu.unisinos.br a boa intenção e boa vontade. tribuição de cestas básicas para índios ainda são muito sumários, porque o Assim, é preciso interferir di- em situação de vulnerabilidade sejam eurocentrismo domina de maneira retamente na formação dessa nova os únicos exemplos de medidas com- mais marcante aliado ao biopoder, e mentalidade de tolerância entre os pensatórias dirigidas aos coletivos ori- é difícil convencer os profissionais de grupos étnicos e o investimento deve ginários no Brasil. saúde que as formas tradicionais de ser pesado na área da educação infan- cura podem ser tão eficientes quanto til e juvenil. Não adianta a CF de 1988 Demandas os medicamentos químicos e os equi- reconhecer os direitos originários, e Há, ainda, demandas urgentes os juízes que decidem os processos que precisam avançar nos campos de pamentos industriais que movem o indígenas serem intelectualmente li- sustentabilidade, saneamento e de mercado rentável da saúde. mitados por esquemas eurocêntricos atendimento de saúde. Em cada uma 17 Programa RS Rural: desenvolvido e por teorias ultrapassadas que re- dessas áreas é preciso romper com o pelo Governo do Rio Grande do Sul, tinha duziam os índios ao patamar de uma eurocentrismo e o preconceito étnico. como objetivo promover o desenvolvi- semianimalidade. É preciso que as Os índios possuem padrões distintos mento rural através de ações direciona- das às comunidades rurais mais pobres. O novas gerações cresçam em ambiente dos ocidentais no trato dos resíduos programa teve início em 1997 e encerrou de maior tolerância, para que sejam e dejetos e é preciso tempo para que em 2005.

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 45 O direito dos Quilombolas na Constituição A antropóloga Janaina Campos Lobo explica como se deu o processo de reconhecimento do povo quilombola, um dos povos originários brasileiros, na elaboração da Constituição

Por Ricardo Machado ema de Capa T

ara Janaina Campos Lobo, a Consti- simbólico e geográfico, que as relações de tuição Federal de 1988 inaugura uma pertencimento e identitárias se conformam Pnova ordem no que diz respeito aos como expressões deste ser e estar no mun- direitos dos povos originários brasileiros, es- do”, explica. pecialmente os Quilombolas, grupo que se or- Apesar dos avanços, Janaina lembra que ganiza coletivamente e o qual ela se dedica a o momento atual é de instabilidade devido à estudar. “Antes da Constituição de 1988, vigo- pressão de parlamentares que, em nome do rava uma normativa que privilegiava, sobre- agronegócio, ameaçam a pequena autono- maneira, o indivíduo e a propriedade privada mia desses povos que há pouquíssimo tempo em detrimento de outros modos de apropria- foram reconhecidos como povos originários. ção coletivos. Ou seja, a partir de 1988 o Esta- “Não há dúvidas que o momento é de insta- do brasileiro reconhece que há outras formas bilidade, porque o número expressivo de par- de propriedade que são guiadas por interes- lamentares que compõe a chamada bancada ses coletivos não estatais”, esclarece Janaina ruralista, somado à capacidade desse grupo em entrevista por e-mail à IHU On-Line. “Po- de mobilização e pressão sobre o governo, demos dizer que a Constituição de 1988 as- tem prejudicado as comunidades quilombo- segura direitos que, até então, estavam des- las. Essa supremacia do agronegócio e de um pojados da normativa, justamente porque os modelo abusivo de desenvolvimento tem in- dispositivos legais refletiam uma sociedade citado uma recusa de direitos constitucional- que reiterava uma narrativa unilateral, branca mente garantidos, o que gera uma afronta aos e excludente”, complementa. direitos humanos das comunidades quilom- Ela reconhece que a promulgação da Car- bolas”, critica. “Ou seja, a morosidade e a fra- ta Magna permitiu a abertura de diversas gilidade da política de regularização de terri- possibilidades ao reconhecimento de terri- tórios quilombolas têm recrudescido as ações tórios específicos para grupos étnicos que de terror sobre as comunidades”, considera. foram historicamente marginalizados. Isso Janaina Campos Lobo é graduada em permitiu um avanço nas discussões sobre Ciências Sociais pela Universidade Federal o reconhecimento do outro na sociedade, do Maranhão — UFMA e mestre em Antro- sobretudo no aspecto jurídico. “Trata-se de pologia Social pela Universidade Federal do grupos étnicos alçados a uma condição de Rio Grande do Sul — Ufrgs. Atualmente é sujeitos de direito, porque o Estado final- doutoranda em Antropologia Social na Ufrgs mente reconhece que historicamente faltou e desenvolve pesquisa sobre agenciamentos com uma política da alteridade”, diz. Além territoriais entre afrodescendentes, na pro- disso, ressalta que o reconhecimento de ter- víncia de Esmeraldas, Equador. Pesquisadora ritórios para esses grupos garante o direito do Núcleo de Antropologia e Cidadania — de eles manterem suas tradições e organi- Naci — Ufrgs. Janaína também é analista em

www.ihu.unisinos.br zação social. “O território — erigido autono- Reforma e Desenvolvimento Agrário junto ao mamente — é vital para manutenção des- INCRA/RS. ses grupos negros, porque é nesse espaço, Confira a entrevista.

46 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 T IHU On-Line – Quem são os hoje Constituição de 1988 vigorava uma denominados remanescentes de qui- “Antes da normativa que privilegiava, sobre- ema de Capa lombos e qual a importância históri- maneira, o indivíduo e a propriedade ca deles na construção do Brasil? Constituição de privada em detrimento de outros mo- Janaina Lobo – É importante dos de apropriação coletivos. Ou seja, contextualizar que o termo “quilom- 1988, vigorava a partir de 1988 o Estado brasileiro bo” assumiu uma semântica diversa reconhece que há outras formas de com o artigo 68 constante no Ato das uma normativa propriedade que são guiadas por inte- Disposições Constitucionais Transitó- resses coletivos não estatais. Esse foi rias – ADCT da Constituição Federal que privilegiava, um avanço considerável, porque – no de 1988. Retomo a genealogia desta caso das terras quilombolas – a norma “ressemantização”, que já foi ampla- sobremaneira, jurídica incorpora esses usos tradicio- mente discutida pela antropologia: nais do território, o qual passa a ser em termos historiográficos, levando o indivíduo e compreendido como imprescindível em conta diversos autores – alguns para a “reprodução física, social, eco- até mais contemporâneos, como Cló- a propriedade nômica e cultural”, conforme consta vis Moura1 –, se convencionou enten- no texto do Decreto nº 4.887. Esse der quilombo como um local, supos- privada em avanço de impressão pluriétnica não tamente ermo, onde negros evadidos se resume ao artigo 68, mas também se refugiavam. Esse entendimento foi detrimento de refere o comprometimento do Estado, bastante corrente e, de certa forma, declarado nos artigos 215 e 216 da se manteve vigente até emergirem Constituição, com os diferentes gru- essas identidades coletivas que extra- outros modos pos formadores da sociedade brasilei- polavam tal definição. Os movimentos ra, o que concorre em assegurar que sociais negros, principalmente a partir de apropriação “suas formas de expressão” e “modos da década de 1970, os quais pressio- de criar, fazer e viver” serão salva- nam e dão visibilidade a essas formas coletivo” guardados. Então, podemos dizer que organizativas, nas quais o fator étnico a Constituição de 1988 assegura direi- é posto em relevo, rediscutem essas tos que, até então, estavam despoja- experiências negras como forma de tente que reexamina problemas que dos da normativa, justamente porque tencionar as medidas jurídico-opera- foram legados do período colonial, ou os dispositivos legais refletiam uma cionais, pré-1988, que legislavam (ou seja, de uma dívida inquestionável do sociedade que reiterava uma narrati- nesse caso, não legislavam) sobre o Estado brasileiro com os afrodescen- va unilateral, branca e excludente. direito à terra dos descendentes da- dentes. De fato, como referi, os hoje queles que foram escravizados. Ou constitucionalmente denominados IHU On-Line – O que tais direitos seja, as discussões pré e pós-1988 se “remanescentes de quilombos” são significam em termos de construção dão no sentido de romper com a no- aqueles que, nesse percurso histórico da cidadania desses povos? ção pretérita do quilombo, de modo excludente e opressor, foram alvos de Janaina Lobo – Como disse, es- a assumir um conceito que agregue a uma alteridade calcada em elementos távamos, antes da Carta Constitucio- variabilidade dessas experiências ne- específicos de segregação. nal de 1988, sob uma normativa que gras. O decreto nº 4.887/2003, que desconsiderava a questão dos direitos regulamentou o artigo 68, já aduz que IHU On-Line – Que garantias a diferenciados. O que isso sinaliza? os hoje nomeados “remanescentes Constituição Federal de 1988 deu aos Que esses grupos negros estavam in- de quilombos” são grupos étnico- quilombolas? visibilizados pela lei, mas não silen- -raciais, de acordo com critérios de Janaina Lobo – Primeiramen- ciados. Com a Constituição de 1988 www.ihu.unisinos.br autoadscrição, os quais possuem uma te, é importante enfatizar, portanto, se abrem novas possibilidades para o trajetória histórica própria, associa- que apenas com a promulgação da reconhecimento de territorialidades da a uma ancestralidade negra que Constituição Federal de 1988 o Brasil específicas, especialmente apoiadas não é dissociada de uma subjugação menciona o direito dos denominados em critérios étnicos. Então, estamos histórica, cuja experiência reverbera “remanescentes das comunidades falando de uma concepção, agora na constituição do território. Mas, o dos quilombos” à propriedade defini- presente em um dispositivo jurídico, que quero ressaltar, é que o termo tiva dos seus territórios; e ainda não o que assume e considera a diferença, quilombo volta à cena, especialmen- faz no corpo da Constituição, mas no o outro. Trata-se de grupos étnicos al- te pré-1988, como uma categoria po- ADCT. Porém, temos que reconhecer çados a uma condição de sujeitos de que essa carta constitucional inaugu- direito, porque o Estado finalmente ra uma nova ordem que ampara os reconhece que historicamente faltou 1 Clóvis Moura [Clóvis Steiger de Assis direitos étnicos de grupos sociais que com uma política da alteridade. Que- Moura] (1925-2003): Sociólogo, jornalis- costumeiramente eram invisibilizados ta e historiador brasileiro. Foi militante ro enfatizar que o texto constitucional do Partido Comunista Brasileiro e um dos por uma grande narrativa miscigena- recobre esses grupos que, anterior- pioneiros da defesa do movimento negro dora. Ainda, devo dizer que antes da mente, não eram reconhecidos pelo brasileiro. (Nota da IHU On-Line)

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 47 Estado como cidadãos. E não apenas por exemplo, depois de publicado nos destaco o direito consolidado dos “Trata-se de Diários Oficiais o Relatório Técnico de quilombolas sobre o território, mas a Delimitação e Identificação – RTID de garantia constitucional de salvaguar- grupos étnicos uma dada comunidade quilombola, da do patrimônio imaterial e de sua etapa que anuncia à sociedade sobre a sustentabilidade, o que confere ci- alçados a uma existência de um quilombo em deter- dadania àqueles que descendem dos minado território e, logo, se abre pra- africanos escravizados. condição de zo para ampla defesa dos que contes- tam tal condição, com frequência tais IHU On-Line – Qual a importân- sujeitos de contendas saem da esfera administra- cia de garantir legalmente o direito à tiva para a resolução junto ao Poder propriedade dos povos quilombolas direito, porque o Judiciário, o que protela – demasiada- em seus territórios históricos? Qual mente – o andamento dos processos. a natureza do título de proprieda- Estado finalmente Obviamente toda essa morosidade ema de Capa de coletiva e o que isso representa fragiliza as comunidades e as expõem T em termos de cidadania para tais reconhece que ao conflito. Adiciono a esse quadro comunidades? estático da política quilombola a falta Janaina Lobo – É inegável que historicamente de orçamento adequado para o INCRA o território agrega vínculos impres- proceder às desinstruções, outra eta- cindíveis à “reprodução física, social, faltou com pa crucial para a titulação. Além dis- econômica e cultural” das comunida- so, essa Autarquia não dispõe de uma des quilombolas. Ou seja, o território estrutura apropriada para atender à – erigido autonomamente – é vital uma política da demanda das comunidades quilom- para manutenção desses grupos ne- bolas. O que quero enfatizar é que os gros, porque é nesse espaço, simbó- alteridade” dispositivos jurídicos e procedimentos lico e geográfico, que as relações de administrativos que atendem o artigo pertencimento e identitárias se -con 68 parecem contrariar o próprio direi- formam como expressões deste ser bém reclama atenção para educação, to constitucional, na medida em que e estar no mundo. Além disso, com saúde, saneamento básico, moradia obstaculizam a titulação. a Constituição de 1988, as terras qui- digna. Em suma, esse é o princípio da Igualmente cabe aqui, inegavel- lombolas se afastam de um princípio titulação coletiva. Claro que não po- mente, uma análise desse momento de tutela, para uma condição de pro- demos perder de vista que a norma político em que as estratégias de seto- priedade definitiva, autonomizando a jurídica homogeneíza a variabilidade res contrários aos quilombolas – e me relação das comunidades quilombolas de situações e experiências das comu- refiro especialmente à bancada rura- com seus territórios. Nesse sentido, é nidades quilombolas, por isso a ne- lista – parecem reter qualquer ação importante ressaltar que hoje o título cessidade do diálogo, nesse percurso que vise ao cumprimento desse direi- emitido, ao final dos procedimentos burocrático, entre diversos campos de to previsto no texto constitucional. administrativos da regularização de saberes. quilombos, é de natureza coletiva, na IHU On-Line – Considera que há qual a figura de uma pessoa jurídica, IHU On-Line – Que aspectos riscos às conquistas desses povos, no caso uma associação quilombola, ainda imprimem dificuldades a es- considerando algumas manobras po- é a detentora legal desse território. ses povos no sentido de garantirem líticas no Congresso Nacional? O título, então, é imprescritível, ina- o direito constitucional da titulação Janaina Lobo – Certamente. Não lienável, impenhorável e pró-indiviso. definitiva de seus territórios? há dúvidas de que o momento é de Tais medidas são significativas porque Janaina Lobo – Bom, acho que a instabilidade, porque o número ex- visam evitar esbulhos, usurpações e pergunta poderia ser por que, afinal, pressivo de parlamentares que com- mais perdas territoriais, dimensões depois de mais de 25 anos do artigo põem a chamada bancada ruralista, que sempre ameaçaram a perma- 68, há um número ínfimo, em todo o somado à capacidade desse grupo nência dos quilombolas em seus ter- Brasil, de comunidades quilombolas de mobilização e pressão sobre o go- ritórios. Então, a regularização dos tituladas. Creio que há diversos fato- verno, tem prejudicado as comunida- territórios, além de concretamente res que atuam como atravancadores des quilombolas. Essa supremacia do assegurar a proteção desses grupos dessa política. As normativas que hoje agronegócio e de um modelo abusivo negros, os quais comumente garan- regulamentam o artigo 68, somadas de desenvolvimento tem incitado uma tiram a sustentabilidade e o controle aos procedimentos administrativos da recusa de direitos constitucionalmen- eficaz dos recursos naturais desses es- regularização de quilombos, atestam te garantidos, o que gera uma afronta paços que ancestralmente ocupam, é uma burocracia desmedida, o que aos direitos humanos das comunida-

www.ihu.unisinos.br a concretude da conquista de direitos. avoluma o tempo para a resolução des quilombolas. A Ação Direta de In- Obviamente, a reivindicação da titu- desses processos. Ou seja, o tempo constitucionalidade – ADIn 3239, que lação do território é apenas uma das que um processo tramita na esfera ad- o antigo PFL (hoje DEM) impetrou, faces dessa luta quilombola, que tam- ministrativa é ilógico. E muitas vezes, requer que o Decreto nº 4.887 seja

48 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 T nulificado. O STF suspendeu o julga- cumpridos, mas há um descompasso mento, que iniciou em abril de 2012, “a fragilidade inaceitável entre a normativa e sua ema de Capa com o pedido de vistas da ministra aplicação. Então, o desafio é assegu- Rosa Weber e, no momento, não há da política de rar que as ações dessa política qui- informações sobre a continuidade lombola sejam sistemáticas, capazes desse julgamento, que já recebeu um regularização de fazer valer os direitos das comu- voto, do ministro César Peluso, a favor nidades sobre seus territórios ances- da inconstitucionalidade. Além disso, de territórios trais, e não violá-los. tem a Proposta de Emenda à Consti- tuição – PEC 215/2000, que insensata- quilombolas têm IHU On-Line – Deseja acrescen- mente visa transferir para o Congresso recrudescido tar algo? Nacional a demarcação e homologa- Janaina Lobo – Não pretendo ção de terras indígenas, quilombolas e passar uma imagem absolutamente áreas de conservação ambiental que, as ações de derrotista desse processo. Ainda que de acordo com a Constituição Federal, o cenário atual seja preocupante e são atribuições do poder Executivo. terror sobre as delicado, acredito na força de mobi- Ou seja, o governo está refém dessas lização das comunidades quilombolas forças que se opõem ao direito dos comunidades” e dos movimentos sociais na reivindi- quilombolas e, também, indígenas. Se cação de suas demandas. O próprio tais propostas são aprovadas, pode- artigo 68 foi incluído na Carta - Cons mos dizer que fracassou esse projeto Isso é realmente preocupante, porque titucional após o impulso e a pressão de um Estado pluriétnico, porque con- os conflitos estão cada vez mais acir- desses setores que há muito lutavam cretamente a regularização de territó- rados. Há casos dramáticos em todo por uma política étnica, por um re- rios quilombolas (e as demarcações o Brasil. Dia 19 de agosto deste ano, conhecimento jurídico desses modos de terras indígenas) ficará à mercê de mais uma liderança quilombola, no tradicionais de ocupação territorial. jogos de interesses, como esses que Pará, foi assassinada. Ou seja, a mo- Então, creio que os embates, desen- hoje detêm a maioria no Congresso rosidade e a fragilidade da política de cadeados por essa série de coalizões Nacional. regularização de territórios quilom- opositoras à política quilombola, re- bolas têm recrudescido as ações de sultarão em mobilizações capazes IHU On-Line – Que desafios es- terror sobre as comunidades. Então, impulsionar mundos possíveis, assim tão postos à efetivação dos direitos quais foram, afinal, as transformações como aconteceu com a Constituição constitucionais aos povos quilombo- concretas do artigo 68? Infelizmente, de 1988. A capacidade de lutar, agir, las? Onde e como é preciso avançar? parece que até hoje o Estado brasilei- pressionar, “resistir” e, sobretudo, de Janaina Lobo – Como disse, há ro ainda não conseguiu reverter sua transformar, é fabulosa. E isso motiva diversos antagonismos que têm refre- história colonialista e racista. Os dis- as comunidades quilombolas e os mo- ado o avanço da política quilombola. positivos jurídicos estão aí para serem vimentos sociais.

LEIA OS CADERNOS IHU IDEIAS www.ihu.unisinos.br

NO SITE DO IHU

WWW.IHU.UNISINOS.BR

EDIÇÃO 428 | SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 49 Tema de Capa

Destaques da Semana

IHU em Revista www.ihu.unisinos.br

50 SÃO LEOPOLDO, 00 DE XXX DE 0000 | EDIÇÃO 000 Destaques da Semana www.ihu.unisinos.br 51

- - -

eixeira, eixeira, T Chegando próximo à UFMG, vi à UFMG, próximo Chegando uma filainterminável viaturasde da polícia. Fiquei algum tempo sentindo pessoas Muitas o clima do ambiente. - instrumen tocavam riam e cantavam, mas a qualquer barulho mais tos, O cheiro recomeçava. a correria alto forte ainda era lacrimogêneo de gás Algumas pessoas derrubavam no ar. centro da cidade. Tive notícias, por fa- por notícias, Tive cidade. da centro - já esta de que os confrontos miliares, e que a polícia tentava ocorrendo vam os manifestantes. dispersar - ecnológica de Minas Gerais de ecnológica Eis os textos. das principais ferramentas utilizadas nasdas con principais ferramentas Daniel os protestos. para vocações mestrando no Departamento de Antropolo no Departamento mestrando deu também gia do Museu Nacional – UFRJ, depoimentos, destes à coleta contribuição sugerindo nomes de pessoas que participa solidariamente, que, e das manifestações ram suas colaborações. enviaram - Estive nas ruas nos três jogos da , uma Facebook - diferen bastante foi porém, nas ruas, do que imaginei. te realizados Copa das Confederações che- No primeiro em Belo Horizonte. um ônibus di me e Peguei guei tarde. rigi à região da onde Pampulha, fica o - fui ten No caminho, Mineirão. estádio tando ligar para amigos e ter notícias Nenhum ocorrendo. do que estava passado se cerca Já havia atendeu. me desde que a marcha horas de quatro no de Setembro, Sete da Praça partira

de Engenharia e estudante de Belo Horizonte é morador inco participantes das manifestações que inco dasparticipantes manifestações os meses entre o Brasil surpreenderam - suas experiên de junho e julho narram

Os depoimentos foram realizados a partir C cias, impressões e avaliações dos protestos. São dos protestos. e avaliações cias, impressões - profis de adultos, e jovens mulheres, e homens que estive distintas, sões culturais e formações ram presentes em atos organizados nas cidades organizados em atos presentes ram Rio de Janeiro. e Brasília de Belo Horizonte, por meio do feito de convite -MG.

No último mês de junho,fomos

todos surpreendidos por várias ma- por várias surpreendidos todos se marchas As país afora. nifestações há décadas como grandes tornaram não se via, embora seus objetivos e (e ainda são) pouco anseios fossem definidos. Como váriosoutros fui às ruas por curiosidade. sileiros, bra- o início de uma que fosse Esperava já há a qual sonhava com mudança um à esquerda, uma virada tempos, assumindo o povo popular, levante O que vi seu papel de líder da nação. Confira o depoimento Confira aumentar a sensação de que algo estava errado” estava de que algo a sensação aumentar Gabriel Machado viraram apoiadores das manifestações, o que ajudou a o que das manifestações, apoiadores viraram T de Educação Federal Centro do de Computação “Do dia pra noite todas as grandes TVs, rádios e jornais rádios TVs, as grandes todas noite “Do dia pra – CEFET

RO DE 2013 30 DE SETEMBRO LEOPOLDO, 428 | SÃO EDIÇÃO republicano de democracia de republicano e limites do projeto constitucional- do projeto e limites Manifestações expõem fragilidades fragilidades expõem Manifestações Dossiê 52 www.ihu.unisinos.br Destaques da Semana a polícia simplesmentea polícia ignorou ains que mostrando corpo, no direto tiros arremessou algoe todos levaram os comdeles reagiunenhum apolícia, ou conhecidosestava emenfrentamento Nenhum destes policial. pelo pe dado chão e caindoem seguidacom ogol que mostradeo elaselevantandodo a fez levar váriospontos um ví- – há um golpe de cassetete na cabeça que levou Uma amiga borracha. de tiros neralizado.Vários conhecidoslevaram borracha, cassetetes e desespero ge- de tiros pessoas, as sobre avançando manifestantescorrendodesesperados, cavalaria o alto, para atiradas do horror quepassaram. Bombas relatosde amigos me contaramque meira manifestaçãorecolhendofui houve nenhuma boanotícia. reprimindopoliciais fortemente. Não quebrandobancos egrandese lojas centro dacidade, com manifestantes que terminouem bruta pancadaria no pela Poso desenrolarTV protesto, do seguinte.dia Jáemcasa acompanhei no trabalhar que tinha – embora fui chegouda Pampulha.vindo Depois um grandede manifestantes grupo Passadoo dia. liando algum tempo, e outras apenasconversandoe ava - soas, várias segurando ainda cartazes se encontravam cerca detrêspes- mil chorro-quenteNesse lugar, eapolícia. de rua, além decarrocinhasde ca - grupos de surdos-mudos,moradores jovens deperiferia e de classemédia, fechados quarteirões baresos frequentadorese os dos o dia e, à noite, tomam conta dacena passam milhares depessoasdurante savam lentamente. Pela praça Sete pas- veículos continuava os e fechado trânsitoO primeiro. o passar atéhora deuma mais andar que tive porém manifestações. ções que seriamfeitas naspróximas da eram apenasrascunhospicha das prefeitopelo governador.e pelo Ain- implementadas públicas políticas às chações em protesto àCopa,Fifa e praça Setecaminho evino várias pi restante manifestantesdos devolta à tavacaminhando Fui chão. no com o grades eacercauniversidade da es- Nos dias seguintesNos dias aessapri- Desci procurandoum ônibus, : hippies , punks, - - - - pela vegetaçãopela junto à cerca cam do - forçada 50 homens ocultos nacional, estavamde Choque lhão menos pelo foivimos assustador. do Ao lado que O clima. o ver,parasentir e ouvir José deAlencar. campus,do lado em frente ao viaduto avenidaAntônio AbrahãoCaram, ao havialícia montadouma barreira na inéditoaté durante aditadura.A po mos dentrocampus do da UFMG,fato Nacional de Segurança, estes dois últi estavam nasruasoExército e a Força primeiroAlém dia.daPolíciaMilitar, lá, ocenárioeraque no do pior ainda 200 mil em algumas fontes. Chegando a chegou flutuante, tão sempre tiva manifestantes,quantidade de estima- centrodo saindo soas A dacidade. pes- havia ainda que de notícias tive cerca denove quilômetrosdepois, tava nasruas.Aochegarmos àUFMG, impressionado es- que pessoas de quantidade a com fiquei e estádio ao mente bem). racha (elesfuncionaram maravilhosa bor de bala de tiros eventuais de ger prote - nos de objetivo o com grosso, feitosescudos, de cartolina e papelão se ver. Fomos“armados” de cartazes/ bandeiras emcomum.Algo raro de maciço para seproteger e levantar digladiando, se uniram em um grupo que em outras situações estariam se partidos, Vários unido. ver imaginei via um bloco de esquerda quenunca ha- tipo, do coisas e Dilma” “Fora de era diferente. Além de vários cartazes à praça Sete e vimos queocenário festação maispreparados.Chegamos nossa realidade. de distante muito é algo ainda lítica clara demonstração dequeaação po ção” ou“valorização dasaúde”, numa dizeres vagos como “abaixo acorrup- governantes. Muitos cartazes traziam sem noçãoque exigir do denossos Grande parte das pessoasiaàsruas unificado. grupo um éramos não dos, foram de que, alémdedesprepara- amigos meus com compartilhei que dessa primeira marcha, asimpressões de borracha. trução dericochetear chãoasbalas no Fomospara perto dabarreira, a marchaIniciamos em direção No segundo jogo,No segundo fomos àmani depois tive que conversas Nas Bata ------SÃO LEOPOLDO, 30DE SETEMB RO DE2013 |EDIÇÃO 428 protestos em semelhante àanterior. a manifestação,acabou que de forma PosTV pela acompanhando continuei casa detáxicom umcasalde amigos e e bombas aespalharogás.pra Fui e os helicópteros auxiliavam alançar cha, a cavalaria avançava em massa e deborrabombas balas habituais - sobrejá além das policial: aviolência foram recebemos que notícias as das gás, que se espalhava pelobairro. T os helicópteros e sentindo o cheiro do ouvindo ficamos e 22h das atédepois acontecer. Nosescondemostodos lá algoque de muito estavaruim para de sensação a tinham e desnorteados sentiam se Todos unânime. era rota manifestação e a sensação deder Ficamos láfazendouma avaliação da bairroEram vizinho. cerca de17h. efomos para acasa deumaamiga em um o bastante visto tínhamos sação desufocamento eardência. vinagreparapano num a sen- aliviar durante as manifestações. Passamos váriasonde caíram morreram edois correram para cimadoviaduto, de devolverMuitas as bombas. pessoas para a frente e começaram a chutar e mos correndo.Alguns poucos foram Saí fechando. garganta minha senti e vomitar de vontade senti horrível, A sensaçãoescudos. sos gásdo foi ficamos felizes por estarmos com nos ram emdireçõesnossas e, nessa hora, campus.Várias de borrachabalas vie- barreirada e dedentrochoque do do bas degás e de efeito moral voaram agir.visível, sinal Semnenhum bom e rojões. Eentãoresolveu apolícia re- arremessavam,soas detrás,lá pedras assistir. pes- poucas de Algumas além Pra cimadeles!”. vosoe bravejante, “avancem! Vamos! camisa e nacasa dos40, gritava, ner sa chance!”.Outro homem, essesem “vamos pra cimadeles!Vamos, é nos tura quegritava para osmanifestantes regata ecommetros dois quase de al- homem, já pra lá dos50, de camisa crimogêneo. Entre elasestava um la- gás de bombas algumas atirava já os manifestantes sobre que a polícia, várias Vimos pus. incitando pessoas Entre o primeiro e o segundo resolvemosdisso Depois quejá Os manifestantes nada faziam Belo Horizonte, a mídia o------Destaques da Semana www.ihu.unisinos.br 53 ------elo Belo Ho- Desde então, o movimento de o movimento Desde então, - gra a real que fui é entender protesto a Andei sozinho vidade da situação. de ôni a parada entre pé no trecho do ao lado do Palácio bus localizada cen- Eram os ministérios. e Planalto da polícia, de tropas de metros tenas rizonte. Ainda assim, continuam acon continuam assim, Ainda rizonte. assembleias nas quais várias tecendo a metodolo reverter pessoas tentam gia para algo realmente democrático - forma grupos se Vários horizontal. e e os feitos foram contatos vários ram, grupos que já existiam se fortalece - sig que alguma mudança Espero ram. nificativaocorra e que tudo isso não que essa Espero sido vão. em tenha tenha do povo na inércia balançada um efeito positivo e que as pessoas mais de seus representantes. cobrem não dê movimento que esse Espero prin Espero, uma guinada à direita. de forma que uma nova cipalmente, representatividade surja para quete- diária na po voz nhamos realmente lítica e não apenas de dois em dois anos. Venceremos! rua esfriou visivelmente em visivelmente rua esfriou Câmara Câmara de Vereadores. Depois uma semana de de atividades, decidiu -se por desocupar a câmara e realizar de uma tarde cultural uma ocupação no centro da cidade. Ao final de todo a dimi conquistou-se processo, este ônibus de 15 em da passagem nuição o mais impor Entretanto, centavos. das a abertura questão, dessa tante de das empresas planilhas de custo ônibus, não aconteceu. - - - e a e Facebook udo aconteceu em clima em udo aconteceu T elo Belo Ho- de no centro ereza, Por volta das 17h, no meu es- volta Por Não sei de onde surgiu a ideia da de ondeNão sei surgiu A manifestação ocorreu com com ocorreu A manifestação via, talvez, desde 1992. Nunca me es- me Nunca 1992. desde talvez, via, naquele dia. do que ocorreu quecerei já era do Senado, na biblioteca tágio mas só no ar, a inquietação notória ao em direção ao sair do expediente Assembleia Popular Horizontal, mas a Horizontal, Popular Assembleia pelo feita foi convocação do Viadu debaixo plenária aconteceu to Santa T Santa to de cerca havia primeira, Nesta rizonte. mil pessoas. de paz e alguns atos foram marcados. marcados. foram alguns de paz e atos integrantes vários havia Naturalmente de partidos, de movimentos sociais e - não governamen de organizações au- muitos havia mas também tais, não vinculados a nenhuma tônomos, instituição, além de policiais- disfarça e assembleias ocorreram dos. Outras um sábado de para um ato marcou-se - Vere dos Câmara à frente em manhã, sido marcada dia,havia Nesse adores. votar para uma sessão extraordinária pelo prefeito enviada uma proposta diminuir o preço para Lacerda Márcio de ônibus. proposta A da passagem de um imposto isenção uma previa abai a passagem que municipal para 10 centavos. xasse de gás atirou que polícia, da confronto uma com terminou e a esmo, pimenta ocupação da câmara que durou uma por um lado, ocupação, semana. Esta o pre com reunião uma conseguiu mas, o governador, com e outra feito a assembleia, desmobilizou por outro, pois passou marcada a mesma a ser da própria dentro e cima da hora em - - - rasília, estuda biblioteconomia na Universidade de na Universidade biblioteconomia estuda de Brasília, é morador eixeira

A violência na repressão policial violência A na repressão No jogo seguinte, cheguei na seguinte, No jogo

- do dia 13/06 desenca aos protestos chegou que insatisfação uma em deou Nacional. do Congresso as portas até viu seu ter 20/06 que Brasília em Foi ceiro e maior protesto, como não se como protesto, maior e ceiro Confira o depoimento Confira absolutas” T Mozart no Senado Federal. estágio - UNB e faz Brasília ironias vagas, desconfianças tenebrosas e certezas e certezas tenebrosas desconfianças vagas, ironias “O Facebook era uma miríade de opiniões humildes, era Facebook “O praça Sete com certo atraso. A massa atraso. certo com Sete praça de centenas saído e poucas já havia - despreten a rua pessoas ocupavam por lá e Fiquei um tempo siosamente. notícias As coisas. outras de fui cuidar assustado depois foram que recebi - comple nacional mudou o discurso falava se antes Enquanto tamente. de baderneiros e vândalos, agora se - acorda que havia gigante do falava grandes as todas noite do. Do dia pra grandes jornais e viraram rádios TVs, que o das manifestações, apoiadores que de a sensação ajudou a aumentar desse sen- Apesar errado. estava algo timento ruim, via-se que todos esta- eu: o quanto desorientados tão vam - a mídia, a polícia e o restan governo, Nas conversas dos manifestantes. te que tive depois da segunda marcha, essa de que toda cheguei à conclusão violência desnecessária da polícia, os agentes infiltradosprovocando van- dalismo (o que foi flagrado em vídeo na a reviravolta e mais de uma vez) de um parte opinião da mídia faziam deslegitimar as marchas. plano para ras: um grupo de manifestantes mais de manifestantes um grupo ras: várias além de quebrar organizado, de concessio lojas, queimou carros na e rojões foguetes nárias, soltou em a Pampulha polícia e transformou um cenário digno de filme de ação. A à altura. polícia respondeu RO DE 2013 30 DE SETEMBRO LEOPOLDO, 428 | SÃO EDIÇÃO 54 www.ihu.unisinos.br Destaques da Semana e educação!”, “Brasil,vamos acordar! abromão! Quero dinheiro pra saúde essa quadrilha!”, doMundo,“Copa eu de família,pai “policial, não defenda tipo do efeito, de frases e ordem de mos àquele coro colossalde palavras ao gramado Nos dirigimos uni e nos bandeiraestado do Gerais.de Minas (UnB) e nos encontramos embaixo da garam daUniversidadede Brasília estavam porvir. bém umprelúdioproblemas dos que bonitomomento,naquele mastam- aparentemente interminável.Muito protestoo chamava atenção, porser rodoviáriapara Museu Nacional e do da vindas pessoas de fluxo o raty.Ali, palmentePaláciodo lado no Itama - gressoEixo eno Monumental, princi perambulandopelo gramado Con do distribuindo santinho. Enfim... eleições.nas a poucoDaqui estão até Basta pensarem como ascoisassão bandeiraspunhar nesses protestos. de partidos para usar camisetas e em zarem. De pessoas receberem cachês mercantili se protestos dos receio o satisfeito,fiquei Eu mo. porque tenho ideológica, querendo tentar o mes de orientação tipo todo de partidos, T tamente desacreditadoe expulso. manifestação.em da nome Foi pron polícia a com falar tentou partido um de a camiseta com vestido militante antes damanifestação20, dia um do -feira damesma semana, três dias partido qualquer em seapossar.sonharia Na segunda ali, daquilo que, em golpe. teorias daconspiração, em fascismo, preocupadas.falavamAlgumas em pessoas muitas deixa Isso multidão. na partidos de bandeiras encontrar mente constateieranão que possível Rapida festivo. leve, era clima o to, genteNesse vida.momen- naminha e, Nacional realmente, nunca vitanta ao gramadão em frente ao Congresso protesto. taram, nada. Calmamente, cheguei ao mexeupolicial comigo. Não me revis- que medeixouo tenso.Mas nenhum enho certezaenho dequehavia outros Anoiteceu. Algunsamigos che- Cheguei sozinho, horaspassei percebido tinha eu dias Havia Por volta de18h20min,cheguei ------ficilmente passa sem ter alguma maçã fogoUm porisso.cesto tão grande di também não voumão no pôrminha Mas surpreso. pouco um nem ficarei gum agente de segurança pública, não al- de partiu isso que descobrir eu dia Itamaraty!”.pro“vamos tou algum Se gri- alguém Então pânico. em pouco portável, confessoaté que entrei um insu ficou situação a momento dado pedaços delixo pegavam fogo. Em o quantoonda lado,Ao nosso pôde. a segurou d’água.multidão espelho A Congresso,do entre asbandeiras eo metros a poucos quantidade grande tempo, esóagora vieram àtona. estãoque profundezasnas muito há descontentamento de motivos tantos menos apropriada deprotestar contra posição dejulgara forma qual ou mais fez, mas perceboestou quenão em queimadas, discordosido dequem o tempo.Lamento asbandeiras terem foiacho queisso uma grande perda de Agora,uma delas. em retrospecto, garotasduas queimar quequeriam com berros aos discutindo peguei me mesmo,Eu juntocom amigos,alguns foramdos roubadas queimadas. ou notar. realmenteE ruidosos. mais fizeramse acabam, emalgum momento, sendo belicosos os elementos mas cifismo, pareciamaioria tender aumcerto pa- de gás as bombas lacrimogêneo. A você deviacorrernão ou chegaremao ou até agredir, se nãoapolícia; ou patrimônioo não ou público; insultar, (tentar) invadir oCongresso; depredar frequência:sobre sedeviamnão ou com si discordavam entre que tipo, nifestação.Lá havia de todo pessoas foiali o caráter cosmopolita dama- dos emuníssono. vés dediscursos elaborados,declama- milharesse expressa depessoas atra - que nenhuma multidão de dezenas de que se grita nas ruas.Não entendem são aspautasquais comentando o tentamEles demais. plos determinar se pautam em conceitos vagos e am- mar!”. Ney dizemAlguns protestosque os o que mais vale professor Um O gás foiem se acumulando Metade das bandeiras dosesta- E aíocaos deuascaras. marcante mais característica A - - - SÃO LEOPOLDO, 30DE SETEMB RO DE2013 |EDIÇÃO 428 mentos de simpatia e antipatia com e antipatia simpatia de mentos oscilava entremultidão mo- mento.A vinagre coma todo quempedia mo- compartilhavam Pessoas comida. e pra vender água, refrigerante, cerveja ambulantesAlguns sou. aproveitavam concentrada gramadãono se disper almente mais calmas.A massaantes tava pegando fogo dentro dopalácio. Concórdia,de Pedro Américo, quees- eramenos não Mas pelo atela Paz e caçamba deentulhocheia delixo. chamas queatearampelas em uma Ministériosdos foiEsplanada atingida desses eventosalgum e circo”“pão da de fora,barraca uma sobrou que de traremRespirei ali. lado Do aliviado. rança parade en- as pessoas impedir segu- pela usada tática a desconheço externa. Acheiestranho, mas também guiram fazer uma pichação naárea pra todoOuvi dizer lado. que conse- vidro extenso, pouco e raso d’água Já viram aquelelugar? Um espelho estranho. Achei falhou. Itamaray do borracha? de gás lacrimogêneo e umas balasde bombinhas umas de realsignificado o coladoali, nel com Copacabana, qual tú- em tiroteio vivenciou já que cara um Para tiro? de barulho de medo o bra? Seráestão quenão perdendo ao quebra-que- habituados ficando longo dosanos, será quenãoestão Capital (PCC), arrastões eao milícias Vermelho, oPrimeiroda Comando tanose cariocas, com oComando commos coisaspaulis Os demais. esse o problema, acostumarde nos comhabituar nos ogás lacrimogêneo. De repentemundo. até começamos a do fim o era não mas ali, aquilo zona tos para percebermos que era uma quer outra coisa. Levouminu alguns qual de que do multidão da re-corre Kombi,para proteger nos cor do mais racha.Nos abrigamos atrás deuma bor de tiro de barulhos caindo, bas ver noqueiadar. çãode invadir. a genteE foiatrás, pra pessoas pareciam ter mesmo inten- gás.ItamaratyAlgumas do ao fugindo em direção subiu multidão A podre. As coisas foram ficando gradu ficando foram coisas As o Palácio invadir de tentativa A Às vezes me pergunto se não é Houve corre-corre. Muitas bom------Destaques da Semana www.ihu.unisinos.br 55 - - - - front Pra mim é clara a relação com com a relação mim é clara Pra próximo à avenida Nilo Peçanha, mas Nilo Peçanha, à avenida próximo avistar de modo sem algum conseguir passa- que fervorosa carreata da fim o va. Até que soubemos que o fim não seria mais na Cinelândia, que o a Alerj. queria ir até da manifestação Mas a sirene... que é aí que toca Claro de não dispersar era meu intento em pois quando é estamos cedo, tão grupos pequenos que os policiais mi- Mes- força. ganham e atacam litares meu namorado mo assim, andei com a passos bem menos ansiosos que uma boa dis deixando meus amigos, tância dessa galera que queria muito ir à Alerj. blemáticos de Collor e (impeachment po dos agentes mensalão) muitos e líticos da primeiraépoca são os que - impe aí hoje. Collor O sofreu estão pela execrado foi 1992, em achment mas hoje está mídia opinião e pública, no Senado. A política brasileira às- ve du o capeta que até rumos toma zes ao que era depois voltar vida, só pra - hímen com um grande como antes, nunca. que não cede placente não foi que na ano um eu, qualquer e não foi ainda me ainda sabia nem ler, época de maluca daquela situação lembro inflação e insegurança total relativa tudo aos rumos do país. E de como momen- do partir a bem estar parecia - Fernan presidente o então que em to do Collor de Mello tinha sido botado correr. pra o mensalão (esquema de corrupção a parlamen- pagamentos envolvendo Duas décadas uma decepção. e tares) em esses dois momentos separam - - - - - rabalha também na Galeria de também rabalha urquia, aonde há urquia, Nos ambientes que frequentei, que frequentei, Nos ambientes Cheguei então em casa e abri o e casa em Cheguei então dadão de expressão desaparece. - Esti desde o iní em ambas as passeatas ve o encontro combinando sempre cio, de 17h. por volta Filosofia de Instituto do arredores nos em havia Ciênciase Sociais, da UFRJ, Contudo, tensão. suspenso uma certa apesar do para preparo qualquer tipo vina incluindo máscaras, de situação, ninguém plane- de chuva, capas gre, - dire e específica mais reação uma jou Na mais agressiva. uma retaliação ta, a percorremos manifestação, primeira alar grandes sem Rio Branco avenida um pouco a descansar des. Chegamos tos e textos, vídeos vídeos e vídeos e vídeos. e textos, tos Com tudo que surgiu na rede relativo dez primeiros naqueles assunto a esse dias, um sério sujeito e pode analítico até talvez tempo, por muito ocupar se não do ano. Esses protestos o resto os da T são como - Re turco, (o primeiro-ministro dogan em fale quem Há Erdogan). Tayyip cep isso um . Eu interpreto impeachment aquele de 1992; um eco como pouco Disseram também que acharam linda linda que acharam também Disseram an- da segunda-feira a manifestação um dia 20, do a que, enquanto terior, total. fracasso não Vi que as informações Facebook. uma miríade Era de chegar. paravam vagas, de opiniões humildes, ironias desconfianças tenebrosas certezas e e tex Discussões, textos absolutas. um alvo pontual para a insatisfação popular. A presidente Dilma Rousseff em a aprovação com pode estar até um Er de ser queda, mas passa longe -

Participei de duas manifestações A multidãoficou em vai-e- um

io de Janeiro, ambas durante o ambas durante Janeiro, no Rio de cru- em um momento de junho, mês a de reivindicações: cial do processo seu des- que teve do dia 17 de junho, Rio do Legislativa Assembleia na fecho e a de 20 de junho, (Alerj), de Janeiro - res É preciso que seguiu à Prefeitura. em grande que,apesar de estar saltar no confiança minha depositava grupo, - já que com senso do meu namorado, partilhamos a decisão de não irmos até o fim – no sentido de não nos en- da passeata naquele ponto volvermos violação entre a linha que tênue em ci- humanos o exercício e de direitos Confira o depoimento Confira Camila Falconi é moradora do Rio de Janeiro, graduanda em Produção Cultural na Cultural em Produção graduanda do Rio de Janeiro, moradora é Camila Falconi T – UFF onde estagia. Fluminense Federal Universidade Costa. Patrícia Arte ambiente próprio às nossas reivindicações” próprio ambiente “Transitamos por toda a passeata sem realmente achar um sem realmente a passeata toda por “Transitamos os PMs, que, inclusive, levaram uma levaram inclusive, que, os PMs, de apoio à mani palavras com faixa dispersar até do gás, porcausa volta - daque mental confusão Na de vez. me todo, babilônico le espetáculo celular, meu cair descuidei deixei e de tantos bateria sem que já estava que iam e mensagens e telefonemas saída, Na momento. vinham a todo de alguns restos catar pra paramos uma bala de bomba e encontramos ficou como ver pra Paramos borracha. o Itamaraty no fim da manifestação. dois PMs com conversando Acabamos que explicaram cordiais, muito que, reivindicações as com concordavam seus entendiam dos manifestantes, motivos compartilhavame gerais. das suas opiniões e interesses muitas festação – um de meus amigos entrou entrou amigos – um de meus festação no espelho d’água pra ajudar a segu- multidão a para mostrá-la, e faixa a rar polícia momentos em própria a para e alternados. RO DE 2013 30 DE SETEMBRO LEOPOLDO, 428 | SÃO EDIÇÃO 56 www.ihu.unisinos.br Destaques da Semana Confira odepoimento Universidade Estácio deSá-Unesa. pela Universidade Federal doRiodeJaneiro –UFRJegraduanda emDireito pela Helena Ribeiro émoradora doRiodeJaneiro, graduada emestranda emFilosofia contribuir para elamelhorar” uma sensação: acoisa está demaisetalvez eupossa pessoasdetodas asidadesquetinhamem comum “Vi dia 20/06, quandosoube que ogo- mesmo! tomei umporre...manifestanteE sou limpa; nunca fumei maconhae nunca a passeata, por toda aavenida Presi- toda por Transitamos sós. sentíamos dez cabeças,menos, masnos ou mais entãoTínhamos núcleo, onosso com A galera era completamente outra. manifesto pareciam semanas, meses. três queasepararamdias do primeiro na estação. de borrachabala entrava carregado comum menino depois ferimentos de certa, cercapois decinco minutos Percebemosma. na horasaímos que mos ometrô para escaparproble do acalmarou osquepassavam. Pega- mas conseguimosdesviar ruas pelas direção, nossa em desesperada tidão momentos corremos por vir uma mul que era para irembora. Emalguns Olhei tiros. para omeunamoradoe entendemos alguns ouvimos e fogo tamos quenãohavia maisjeito: vimos mais perto deamigos,nossos mas no Alerj, o primeiro molotov . Chegamos primeiroestouro era ainvasãoda em casaesse que soube dia naquele todos,e aderiram cheguei –quando Sentamosgritandochão no “calma” a acarretarpoderia incidentes diversos. pânico o pois susto, primeiro desse mos manter a calma dagalera apesar muitos se desesperaram.- Consegui Entrei nasmanifestações apóso ficha branca; heterossexual; Sou Na segunda manifestação, os Ouvi oprimeiro estouro, e logo - - - democrático de direito e a Consti- tuição Federal. T direito de democrático bandeiras sãoadefesa doEstado tamente asmanifestacões. Minhas violen- reprimir ao Federal tituição verno doRiodesrespeitara aCons- JuventudeP do Che Guevara e com umbroche da Um amigo meu, com umacamisa do nista mesmodeser ou homossexual. comu ser de partido, um ter de sinal aqueles perseguiamque com pessoas algum havia Ainda partidos. tivos respec- dos discurso o ouvir fizessem povo,do paraalto-falantesque seus tricos, tentando abafargrito qualquer bém muitoscarros elétricos, trios elé- para ataques repressores.tam Tinha - justamente por serem um grande alvo segura ali muito senti me Não ordem. de e palavras vestimenta sua a toda combate abertocom por apolícia, anarquistas, muito preparados ao cilmente entrar emdesespero. prosas tro doRiodeJaneiro. Estavam muito de pessoas,preenchendotodo o cen- de umamanifestação deummilhão participavam já e passeata uma em tes queprovavelmente nunca foram muitoapreensiva. Jovens - adolescen nas muito jovens, o queme deixava eram compostose meni- de meninos nalistas,ufanistas, ou sejacomofor, dicações.nacio mais grupos Alguns um ambiente próprioreivinàs nossas dente Vargas, sem realmente achar esse grupo quando já havíamos esse quando grupo saído, Outropresente grupo era odos no começo, no fa maspoderiam - T , foiencurralado por ambém fuiàs ruas - - - SÃO LEOPOLDO, 30DE SETEMB RO DE2013 |EDIÇÃO 428 nistério Público, rejeitada pelople- penais, limitando aatuação doMi- infraçõesinvestigação sobre a Civil e tornavaprivativa polícias Federal das – que 37/2011 (PEC) Constitucional pela queda daProposta deEmenda drugada adentro. ma- confinamento de horas algumas te todos chegaram bem em casa, após prendendopor vandalismo. Felizmen - parando transeuntequalquer eo boatosos estavampoliciais os deque presos nafaculdade, ameaçadoscom tidão. Diversos amigos nossosficaram de Janeiro, que dispersoutoda a mul Políciapela e planejado Militar Rio do prometido sido tinha como caos, um mente a poucos minutos devirartudo paraseguimos casa.Chegamos exata- poucoqueada de entrarmos)depois e estação de metrô aberta (elafoi blo um estouro.pegarConseguimos a saíam correndo assimqueouviam lavras decalmajovens aos logo que pa- entoávamos sempre pânico, em casosaídas umgrande grupoentrasse por tododos o trajeto e sem muitas metrô.Foi sufoco.um Muito exprimi muito próximoao de nós,seguimos de gásbomba lacrimogêneo, ejogada transportes.vimos asegunda Quando de escapevias nemmuitoacesso a porqueregião aquela tem não muitas em tornoPrefeitura,da emespecial comsos depressão apanela formada receo ficamos passeata, na lerantes outros. conseguindoescapar com de aajuda Com apresença desetores into - - - - - Destaques da Semana www.ihu.unisinos.br 57 - - - - programados para para programados Requisitava informações a ami- informações Requisitava De outra parte, vi muitos fun vi muitos parte, outra De lei de a terceira Lembrando gos sobre a passeata que se desen- a passeata sobre gos de metros a algumas centenas rolava dali, posicionando-se fisicamente na avenida Presidente Vargas e - politica R$ 0,20 de o aumento contra mente no município do Rio de das passagens do dia era 10 manifestação A Janeiro. quatro do que ocorrera o seguimento dias antes, quando, em parte - incenti em São Paulo pelas passeatas vados Mo- já famoso peloagora convocadas de (MPL), cerca Livre Passe vimento - pacifica manifestaram se ativistas 100 no mesmo no mesmo espaço, mente, Como a mesma pauta. e com horário não por conhecidos, informado fora pau de sua inspiração diferente muito ça está apenas começando a se fazer a se fazer apenas começando está ça sentir. Newton, podemos dizer que a toda que a toda podemos dizer Newton, e oposta uma reação há sempre ação os sentido, Nesse intensidade. igual de for a pois aguardem, nos que políticos mocrático de direito. Ainda que alguns alguns que Ainda direito. de mocrático isso que era o conceito, não conheçam intuitivamente. faziam os policiais, “lo cionários públicos, a menor noção sem botomizados”, alteridade... de cidadania, respeito, homens-máquinas pessoas que não ofereciam combater à ordem. o menor perigo - - - - OS AIS do nosso Estado de- AIS do nosso Estado Quanto aos ditos “vândalos”, não aos ditos “vândalos”, Quanto Se eu tivesse que resumir em se são sinais precursores de um abalo se são sinais precursores por vir. ainda maior que estaria sísmico o - façamos Mas não nos adiantemos a qualquer manual voltado que exige escritores iniciantes, insistindoem re- pelo iní comece do básico: lembrá-los cio. Às 18h do referido dia, participava participava dia, referido do 18h Às cio. da editorial mais um encontro eu de da no parte, qual Instituto faço revista de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ cen- São Francisco, de no Largo (IFCS), já Com a reunião do Rio de Janeiro. tro seu para insossamente alongando se fim, arroguei-me direito o de, entre celular meu puxar e outra, uma fala uma mensagem rapidamente teclar e de enviando-a texto, a dois - destinatá o ato?”. rios: “Como está T FUNDAMEN em comum uma sensação: a coisa coisa a sensação: uma comum em - eu possa contri demais e talvez está em Pessoas melhorar. ela buir para Palavrões... xingando. e cantando coro eu até palavrões... cantavam como um ritual O que me pareceu cantei! catártico. concordo com suas atitudes. Conside ro que eram um tipo“cobrador” a la in gente era ou então Rubem Fonseca quefiltrada queria tirar a legitimidade do ato democrático. De qualquerfor ma, não os vi nas manifestações. eu diria as manifestações, uma frase os DIREIT defender que vi o povo - - -

Perdido. Sim, perdido, devo con devo Sim, perdido, Perdido. - pro o trajeto fazia Eu sempre

fessar, por mais dolorido que o seja fessar, poderia des- palavra – nenhuma outra com crever comomelhor me exatidão naquele singular dia 10. encontrava Era minha primeira participação di reta nas múltiplas manifestações que no mês de junho e o Brasil assolaram que persistiram nas semanas seguin al- força com ainda chacoalhando tes gumas cidades. mesmo os mais Nem altos catedráticos ousamafirmar com e sisudez segurança sua completa que ainda atos habitual se os poucos a capturando em prosseguir teimam - os co seriam dos telejornais atenção se- tremores temidos muns não e tão ou terremotos cundários após grandes

Confira o depoimento Confira

Falharam em grande medida” em grande Falharam em Ciências Sociais pelo graduando – RJ, do Rio de Janeiro é morador Caio Lobato do Rio de Janeiro Federal de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Instituto em da Graduação Habitus - revista da Revista Editorial do Comitê e membro IFCS-UFRJ Ciências Sociais da UFRJ. direcionar, líderes, objetivos e pautas das manifestações. das manifestações. e pautas objetivos líderes, direcionar, procuravam desesperadamente identificar, e por vezes até vezes e por identificar, desesperadamente procuravam “Os partidos, a academia, a polícia e os jornalistas a polícia e os jornalistas partidos, a academia, “Os gramado nas manifestações e, se não se e, nas manifestações gramado eu ia posterior, nenhum ato houvesse parada, pé, em ficar não para embora, Vi - pes lobo” chegar... “seu esperando soas de todas as idades que tinham nário nário da Câmara dos Deputados no da chamada pela queda –, dia 25/06 gay” – o de “cura Le- Projeto Decreto gislativo 234/2011), o qual alterava de Federal do Conselho resolução aos psicólogos que veta Psicologia participarvoltadasà - deterapias alte pacien- do sexual identidade da ração a homossexualidade ou que tratem te como doença, retirado da pauta da Câmara dos Deputados no dia 03/07 a homofobia. – e contra RO DE 2013 30 DE SETEMBRO LEOPOLDO, 428 | SÃO EDIÇÃO 58 www.ihu.unisinos.br Destaques da Semana Presidente Vargas.trabalhadoMais à cheguei e avançando continuei lina, aterrorizados.Controlando a adrena - fechadascomerciantes,pelos muitos nas lojas, queeram apressadamente tavam desesperadamente se abrigar dores recém-saídostrabalhodo ten - vamcamelódromo. pelo nuvenspoliciais, degás se espalha corriam perseguidosváriaspor motos ativistasjovens lado, o todo por diam cenários deguerra.explo Bombas que parecia dereportagens saída de te Vargas, deparei-me com umacena já referido IFCS e a avenidaPresiden centrono entre posicionado Rio do o Saara, espaço de comércio popular rado para oquetestemunharia. em açãohaviadisso –nada me prepa- gandomesmo aver a tropa de choque tado e participado de ocupações, che- de dezenascipado de passeatas, visi parti- havia já organização, nenhuma a filiado me tendo nunca e militante dio, mesmo me não considerando um mé ensino o desde ativismo de anos pidamente àmanifestação.Em meus reuniãoque jásearrastava e rumei ra- à fim dei ocorria, que parao versioso em praiasnão nossas An- tupiniquins. em outros hemisférios, além oceanos, manifestações sobre artigos e textos vídeos, de partir a anticapitalista luta de tática esta observar possível era aténacionais, momento aquele só notícias de canal em reportagens de grande circulação e é tema especial estampack bloc” capasde revistas de rentementeagora, do em que o“bla do”; “Blackbloc”. cederam rapidamente: “Paucomen - reunião.respostasDuas curtas sesu disfarçadamente durante areferida comestes tentava que mecomunicar par dopróximoamigos. aalguns Era partici- em aquiesci e entusiasmaram me relatos os RJ, no político ativismo flâneur há anos participante um tanto quanto estudanteComo e Sociais deCiências da PolíciaMilitar de Janeiro.Rio do neo disparadas pelatropade choque de efeitobas moral e gás lacrimogê- 6 foramdia recepcionadospor bom lista,cariocas os protestaram que no Cruzandoas apertadas do ruas A última me deixou atônito. Dife de alguns círculosde alguns variados de T rabalha ------uo o rnio e uto its da pistas quatro de trânsito o nutos mi- poralguns bloquearíamos ainda Unidos, ativistas. mais de crescente centenacom depessoas achegada uma até multiplicar-se-ia integramos, caminhados.Este grupo, nos ao qual en- ali para detidos alguns a riedade Adolescente,e do prestandosolida frente àDelegacia Estadualda Criança poucas dezenas seaglomeravam em a Presidenteseguindo Vargas.Umas se dispersado, mas osreencontramos tinham manifestantes Os outro. quer estaria cheiofosse umdiacomo qual esmo pelo agora deserto Saara, que que fazendovarreduras a eprisões ação doBatalhão degrupos de Cho a e ativistas pelos feitos danos os do Passamos aandar juntos, observan- rias edeumprédiodo vidraças agências dealgumas bancá- por manifestantesseguido quebrando a o confronto,iniciar polícia o quefoi visto tinha que explicar me a çou passeatas, estava assustado.Come- tei queele, também acostumado a mente. Encontramo-nose me espan amigo,um quemeatendeupronta - tado em meioàconfusão, paraliguei conflito. testranseuntes aos presosdo meio no sers indiscriminadamente e indiferen- de borracha,balas do cassetetes e muitoempregan superior de policiais - e perseguidossados por umgrupo calçadasda Presidente Vargas, acos - velocidaderiam aplena pelas largas negra, cor cor a vestidos com poucos abaixomaioria de vinte alguns anos, dezenasalgumas Em sua depessoas. instantecontavam não que do mais passavamque os mim naquele por seguintes emmanifestaçõesRio, no mente preto semanas vestidos de nas caracteristica- ativistas de centenas que veríamosdos chegar aalgumas Muitodiferente organizagrupos dos - tendidoinicialmente pela passeata. ao pre- inverso sentido no seguindo frente,à minha passando bloc black os referidos como identifiquei que o prosseguia. da, enquanto das bombas obarulho PM fechandoda de homens a aveni - res confusos, muita correria, dezenas Sem saber o que fazer,que Sem sabero desorien- Subitamente, deparei-me com Banco Central. ta ------SÃO LEOPOLDO, 30DE SETEMB RO DE2013 |EDIÇÃO 428 Veria deparalisaçãoum dia geral protestarde jogo em dia seleção.da Maracanãao indo milharesaos para “Nãovaipulmões plenos ter copa”e futebol,do país querido cantandoa de brasileiros,em nosso nascidos pitais.Assombrar-me-ia com milhares toquesdo de recolher e atacando hos arbitrárias,impon praticando prisões atacandoa polícia indefesas,pessoas pontos deetc.ônibus, T estabelecimentosônibus, comerciais, de rede detevê, agências bancárias, destruiçãomanifestantespor decarro de universidades federais.Observaria uma centena deoutrosjovens dentro a junto polícia pela sitiado Ficaria si. vezes até mesmocontraditórios entre diversosmais e pautas,grupos muitas esquerdistas, os direitistas e jovens, e velhos artísticos, coletivos cionalistas, independentes, nacionalistas, interna- manifestantes LGBTT, ativistas catos, sindi sociais, movimentos tidários, quistas, comunistas, militantes par de milhares agremiandopunks, anar dos manifestantes. e escudos tinta, de bombas artifício, de fogos pedras, estilingues, barricadas, e policiais, de cassetes, etasersescudos parte por borrachae também letais, bombas, a envolver munições blindados, de nívelo debatalhas campaischegando tos comalcançando alguns apolícia, readores.Presenciaria enfrentamen - Ve- dos Câmara na breve, muito que do governadorsidência e uma, ainda três ocupaçõesem -duasfrente àre os rumosdomovimento.Ocorreriam tal, sem representantes, novosatos e horizone democrática forma de rar perfis e ideias em tentativas de delibe- diferentes de participantes de lhares mi- envolvendo plenárias de ticiparia Par acontecimentos. múltiplos pelos amplamente pelas semanasseguintes mentos se queainda reproduziriam senti- preocupação, e animação to, imerso Estava mistonum desurpresa, encantamen- dia. daquele fim ao cerrar anoite. parte da tropaantesde choque deen- por tiros e bombas mais de alvo mos Presidente Vargas, ato seria- pelo qual Haveria passeatas com centenas Perdido, foicomo me encontrei molotovsparte por estemunharia ------Destaques da Semana www.ihu.unisinos.br 59 ------líder; contendo em seu núcleo o líder; contendo Enquanto grandes mudanças mudanças grandes Enquanto É como se a sociedade, entendi É como ralidade – tem de mais interessante a mais interessante de – tem ralidade um laboratório, de trata se nos dizer: romper e transpor para de convites for outras experimentar para limites, de de- de organização, mas de ação, mocracia, de política e de sociedade. no século agora declara se O Brasil e em XXI. Cabe a nós decidirmos como se desdobrará. isto que direção mensuráveis não aparecerem como como não aparecerem mensuráveis se é que das movimentações, fruto seja isto talvez mudanças, tais haverá - movi – ou estes movimento que esse a sério sua plu se levarmos mentos, da da forma mais ampla possível, não mais ampla possível, da da forma como aos manifestantes aparecesse aos transcendente inexorável, algo e melhor da única cidadãos e dotada - aque de organização, possível forma la que só poderia ser modificada por certos meios institucionais já- institu de pes- massa que esta ídos. Parece a ser recusando-se à rua, soas que vai objeto de sentidos rótulose fáceis, a socieda- categoricamente: declara ações de nossas próprias de é fruto intervenções a grandes aberta está e imaginativas. Não àtoa, no centro do - os acontecimen todos de estopim Livre. Passe o Movimento estava tos Esse avessoanti-herói a se posicionar como mais ativojovens, de for anos; operando recém-ingressos nos seus vinte ma abertamente apartidária; se- orga destaque com internamente nizando à autono e à horizontalidade radical decisões por a tomar mia, o queo leva consenso dos participantes; e dotado zero, ousada, a tarifa de uma proposta políticos dos programas fora colocada cotidianos apregoadae por políticos dos mais diversos partidoscomo im- propu decolou: Não a esmo possível. se para arranjos e métodos nha novos ques- e problemas velhos combater o e público o transporte como tões, - pro de democrático desenvolvimento a cidade. para jetos te para além de 68. A barricada não barricada A de 68. além para te no original como caminho”, “o abre no plural, “caminhos”, mas francês, sugerindo o que parece figurarcomo possibilidades. diversas ou inconscientemente, talvez se pos se talvez ou inconscientemente, - oulon. Em meio às barri- urquia”, os palhaços com com palhaços os urquia”, T encontrar vagas correspon vagas encontrar ropa de Nhoque”, as palavras de as palavras Nhoque”, de ropa ao T Por enquanto, só vislumbro uma só vislumbro enquanto, Por se traduz em formas de organização de organização formas em traduz se - caracterís a desenvolver que tendem ticascomo ênfase na horizontalidade e no caráter assembleístico, divisão de e tomadas grupos de trabalho em decisão por consenso. Afinal, como uma cha- desenvolver e compreender deste de dar conta de análise capaz ve - novo que de multifaceta surge forma de ligação o ponto da? Onde estaria sétimo de missas blocs, black os entre manequins, a mídia Ninja, os dia para isso aqui o amor, “acabou de cantos a T virar vai sua “ ordem contra Eike Batista, as Marcha e os enigmá- zero a tarifa das Vadias, ticos manifestantes que apareceram ao pelas ruas trajando aos milhares nacional e a bandeira mesmo tempo - inglês ca do revolucionário a máscara tólico Guy Fawkes popularizada pela V de Vingança? HQ anarquista e discursos estes conciliar de forma práticasfora docomum, que seguem à e se contrapondo espaço ganhando doxa as crises acobertadas dências com que vivemos em nosso cotidiano. O a e 1968 retorna deu voltas tempo “A sua exigência: com nos interpelar No dia 17 de ao poder”. imaginação julho, continuando a onda de- protes no bairro ocorreu anterior, do mês tos mais sul do Rio, do Leblon, na zona Sérgio o governador contra um ato atos de muitos diferente Não Cabral. en- houve anteriores, nas semanas a e manifestantes entre frentamento lojas e de bancos polícia e depredação - largamen ficou foi que o – comerciais dissemi- pela profusa conhecido te nos jornais do saque ocorrido nação na loja da cadas cadas erguidas durante os dois manifestantes cios do confronto, - interstí prontamente uma faixa, estendiam fotografada e filmada por vários dos “A que ali encontravam. se repórteres novos a rua mas abre fecha barricada escrita Ali, naquela frase caminhos”. em garranchos de tinta preta emte- mais do que uma havia cido branco, simples paráfrase dos grafites que se naquele maio de por Paris espalharam sabe-se lá se consciente 68. O autor, ------odos es- T Perdidos. Sim, perdidos, assim Sim, perdidos, Perdidos. aqui apenas algumas das Indico dos sindicatos com uma passeata de passeata uma com dos sindicatos Acompanharia milhares. de dezenas a transmissão madrugadas durante moda sua nova dos Ninjas e ao vivo deveriam se confessar os partidos, os políticos, osanalistas na academia, a em polícia nas ruas, os governantes suas em seus palácios e os jornalistas - à onda de manifesta frente redações desesperadamente Procuravam ções. identificar, e por vezes até tentavam apontar e direcionar, líderes, - objeti Falharam grupos, rumos, pautas. vos, - fa medida. Assim como em grande os grupos que observei todos lharam direcionar mão tentando primeira em univocamente a multidão num- senti ou em passeatas seja em do desejado, em que há uma raiz plenárias. Creio tão agentes de os erros para comum efervescência tal lidar com diversos: coletiva tentando explicá-la somente categorias e de concepções através pensar para empregadas usualmente sociais e manifestações; movimentos usuais não apli se concepções estas o con para singularidades, incomuns lidade de mídia alternativa,cobrindo melhor (nenhuma indubitavelmente do que os se aplicaria) palavra outra de televisão. canais maiores uma dimi apenas integram fatos tes - viven do que consegui listagem nuta ciar, de forma relativamente direta, cidade. em minha própria ebu- de forma à nova facilmente cam social. lição que se apresentam: brasileiro, texto articulação emrede pulverizada,com - ferra como uso da internet grande das profusão mobilização; de menta ao reinvindicações mais inúmeras ações no mesmo lugar; mesmo tempo na rua realizadas no âmbito de uma diversidade de táticas incluindo de- e uso direta sobediência civil, ação de humor e frivolidade na crítica de uniãoespa- no mesmo autoridades; posiciona pessoas de grupos e de ço um variados; mais os políticos mentos tradicionais pelas formas desprezo de política e mobilização,compreen didas aqui como partidos, eleição de formais lideranças e representantes com rituais de investidura. Isso tudo RO DE 2013 30 DE SETEMBRO LEOPOLDO, 428 | SÃO EDIÇÃO 60 www.ihu.unisinos.br Destaques da Semana Por Márcia Junges/Tradução: Luís Marcos Sander historicidade eprovisoriedade É preciso surgir algo novo considerando aênfase filosófica contemporânea na religiosa, observa ThomasGuarinorefletindo sobre aobra dofilósofo turinense. Depois deNietzsche eHeidegger, nãopodemossimplesmente àfé “retornar” “última idolatria” libertarmos daverdade como Vattimo eanecessidadedenos International, 2009) Vattimo andTheology Estante “A ser aplaudida. Nessesentido, aplaudida. ser de pode-se fato Vattimo pluralismo no e na tolerância deveria riedade”. Ecompleta: “Penso queaênfase de contemporânea na historicidade e na proviso ênfasea filosóficanovodevealgosurgir dada cência cultural.contrário,Ele acha, pelo que arriscar-se-ádicional, aafundarnuma senes- tra ortodoxia - na insistir religiosafé a se que, religiosaortodoxa. Naverdade, eleacredita afé em “recuperar um interesse vattimiana abertos por Heidegger e Nietzsche”. Nãohána obra sido tivessem não olhos nossos se como religiosa, fé à ‘retornar’ simplesmente turinense sustentasador podemos que“não On-Line. -mail, àIHU Guarino, naentrevista queconcedeu, por e logo e reverendo norte-americano Thomas teó - do Deus’”. é afirmação nosso A como de verda- da ‘adoração a idolatria, última nossa de libertar nos devemos que diz Vattimo nos verdade, Na pluralidade. da tolerância na caridadee na baseado contemporâneo etos formaconstruir quesepossa um ta devem ser enfraquecidas, de pretensõess deverdadeabsolu Por outro lado, o pen- (London:T&Clark - - - demic, 2013). Doctrine Christian e gy outros, entre de, autor é e TeologiaFilosofia entre e Suas pesquisasseconcentram nafronteira Unidos. Estados nos Jersey, New Orange, th de T America. Éprofessor of University Catholic Teologia pelaem Sistemática doutor e Roma ca pela Pontifícia Universidade Gregoriana de TeologiaSistemátiem mestre- Unidos, tados pela objetivas –éemancipação”. e verdades fixas estruturas as todas de fim o mo, unicamente– entendidoniilismo o como Vatti- Para humana. liberdade da inimiga to, portan- e, restritiva, e opressiva é objetiva e estávelfixa, verdade na ênfase qualquer que degenera em niilismo, ou seja, a afirmação de análise, última em ela, que é posição sua de acolhera secularização. Entretanto, perigo o Vincent of Lerins and the Development of Development the and Lerins of Vincent (London: T & T Clark International, 2005) International, Clark T & T (London: Confira aentrevista. Thomas Guarinoé graduado emT eologia naSeton Hall University , em- Sou Seton Hall University, Foundations of Systematic Theolo- Systematic of Foundations SÃO LEOPOLDO, 30DE SETEMB RO DE2013 |EDIÇÃO 428 (Grand Rapids:Baker Aca- em New Jersey, Es- eologia Destaques da Semana www.ihu.unisinos.br 61 ------(London: T & T , por um lado, e do fun e lado, por um , IHU On-Line – Em que medida as medida Em que – On-Line IHU – A Guarino Thomas filosofia de Desse modo, Vattimo- estabele tos princípios são verdadeiros. O que princípios são verdadeiros. tos isso? Como já men- com dizer quero cionei, uma das ideias características da filosofia deVattimo é a do pensa- ou pensiero fraco mento debole. Por que dizer quer ele termo meio desse de uma reconstruída ser deve a razão - ou pós-moderna,seja, preci forma samos evitar afirmações o verdadeiro”, agressivas o “certamente sobre ab- “objetividade a e real” “realmente que sustenta “prova” Vattimo soluta”. concei ser de deixam não “garantia” e - pronta estão não e problemáticos tos toda resolver para disponíveis mente contrário, Pelo qualquere questão. de que o mundo não é lembra-nos um a nós como “dado” simplesmente uma realidade como mundo puro, Em consequência, não interpretada. ele desafia todosa – teólogos tãos, cientistas ou os cris- novosateus – a funda suas pressuposições examinar o mundo está que todo será mentais: de suas assim da verdade certo tão respectivas premissas? Ou será que a mediada através é somente verdade de pressuposições de uma variedade Em certo e históricas? socioculturais sentido, Vattimo busca alertar nos a sustentadas de concepções respeito dogmaticamente que podembeirar ideias de Vattimo apresentam novos cristão? o pensamento para desafios o cristianismo questionar visa Vattimo qualquer e forma toda na verdade, e, que cer que sustente de pensamento gia. A meu ver, deve-se admirar este este admirar deve-se gia. A meu ver, entre um caminho porbuscar autor as opções do iluminismo Aufklärung típico da por outro. religioso, damentalismo questões permanecem obstante, Não significativas e ainda não resolvidas a respeito da adequação da filosofia de Vattimopara cristianismo o contem porâneo, questões que levanto em andVattimo Theology 2009). Clark International, de direito natural tradicionalmente tradicionalmente natural de direito católico; no ensino moral empregada que a “secularização” e 5) sustentou da caridade natural é a consequência cristã. ceu criativamente relações entre filosofia a contemporânea a teolo e - - - - - (o IHU (Das Amor, Amor, A - violên A ) IHU On-Li , de 21-05- (O Bode ex- The God delu- Des Choses Ca- O novo ateísmo ateísmo novo O (1949): jornalis Uma fé para além IHU On-Line La Violence et le Sacré le et Violence La (Ediouro: 2006. 370p.), IHU On-Line disponível para download (1923): filósofo e antro- ) para criticar noção a 4 disponível em http://bit.ly/ O bode expiatório, o desejo e Le Bouc Émissaire e outros); 2) reinterpretou reinterpretou 2) e outros); 3 ) ) ), 1982. Todos ), esses 1982. Todos livros foram Confira o debate sobre diversas de René Girard René 2012, sobre o pensamento de Girard, intitulada a violência, KsXK8Q. Leia, ainda, a entrevista com o Ja- escritor e sacerdote católico, teólogo mes Alison, intitulada do ressentimento, na edição 393, de 21- 05-2012, disponível em JmHmZu. (Nota da http://bit.ly/ , de 22-06-2009, disponível em http:// em disponível 22-06-2009, de ne, bit.ly/doOmak. Leia, também, a edição especial 393 da piatório publicados pela Editora Bernard Grasset de Ganhou Paris. o Grande de Prêmio Fi- losofia da Academia Francesa, em 1996, e o Médicis, Prêmio em 1990. O seu livro mais conhecido em português é cia e o sagrado (São Paulo: Perspectiva, 1973). Sobre o tema desejo e violência, revista da 298 edição a confira chées depuis la Fondation du Monde du Fondation la depuis chées coisas escondidas desde a fundação mundo), do que reúne 34 artigos de sua autoria com críticas à Madre de Teresa Calcutá, fala sobre o 11 de setembro e a Guerra do Ira- que, é uma das suas obras. (Nota da IHU On-Line 4 pólogo francês. Partiu para suas De francês. de aulas os dar para Unidos Estados obras, destacamos violência e o sagrado), (A ta, escritor e crítico literário britânico. Durante Iraque, do tornou-se um a guerra George de decisão da apoiante combativo conhecido, muito tornou o que o Bush, W. entre uma esquerda que ele impopular, acusou de trair os próprios ideais. Guerra e Pobreza On-Line 3 Christopher Hitchens e apareceu em vários programas de tele sion. On-Line, IHU da 245 edição na ideias suas de 26-11-2007, intitulada em discussão, em http://bit.ly/13NLugg. (Nota da visão e rádio para falar de temas religião. como criacionismo, evolutiva, biologia sua intransigente defesa à teoria de Por Darwin, recebeu o apelido de “rottwei ler de Darwin”, em alusão ao apelido de Thomas H. que Huxley, era chamado de “buldogue de Darwin” dog). (Darwin’s bull - Recentemente está grande polêmica por conta das ideias envolto em contidas em sua obra Deus, um delírio Cia das Letras, 2007), publi (São Paulo: cada em 2006 sob o título kenosis de clássica cristã a noção - na de Deus encarna esvaziamento ideia a de uma desenvolver para ção) por autoridade ao podere à renúncia o conceito Deus; 3) de entendeu parte - (amor ou carida de caritas tradicional de) com o sentido primordial to- de lerância para com toda posição - inte as posições (excluindo lectual moral e do 4) usou a compreensão violentas); por (desenvolvida natural” “sagrado Girard René Hitchens

, . ------2 IHU Me- , na . A . A pri- (Barcelo- (Barcelo- . Desde en no dia 18 Diálogo con , escrita por estabelece estabelece IHU On-Line) O gene egoís 1 IHU On-Line Livro da Semana O fim da- modernida (1936): filósofo italiano, filósofo (1936): IHU On-Line disponível em http://bit. Morte Morte de Deus e fim da me- O nazismo e o “erro” filosófico “erro” o e nazismo O (1941): zoólogo, etólogo, evo- O fenótipo estendido fenótipo O nº 187, de 03-07-2006, com a Introdução a Heidegger (Lisboa: Liberdade. Uma herança do cristia do herança Uma Liberdade. , publicada na edição número 287, The future of religion IHU On-Line – Em que aspectos aspectos que – Em On-Line IHU Thomas Guarino – Gianni Vat Guarino Thomas [Clinton Dawkins Richard Richard Gianni Vattimo internacionalmente conhecido pelo con- ceito de “pensamento fraco”. Concedeu à entrevistas diversas meira delas foi publicada na 88ª edição, de 15-12-2003, disponível bit.ly/1dDeP1r em http:// 1 tamorfoses da cultura contemporânea Esse material está disponível em http:// contribuiu na Também bit.ly/PiJSq5. On-Line entrevista de Heidegger, de outubro daquele ano, às vésperas de proferir sua conferência no evento entre as também, Concedeu, ly/qDgXkC. vistas nismo de 30-03-2009, disponível em http://bit. ly/nILnQR e tafísica: a luta contra os , na absolutos em disponível 20-12-2010, de 354, edição http://bit.ly/dLMzXU. Dele também pu- blicamos uma entrevista na 121ª edição, de 1º-11-2004, disponível em http://bit. ly/16TEEs1, um artigo na edição 53, de 31-03-2003, disponível em ly/jhjSlK, e outro no http://bit. número 80, de 20- 10-2003, disponível em lTzC18. A editoria http://bit.ly/ na: Paidós, 1995); de: niilismo e hermenêutica na cultura Martins Fontes, pós-moderna (São Paulo: 1996); Instituto Piaget, 1998) Nietzsche: e Ensayos 1961-2000 lucionista e escritor britânico, nascido no Quênia. Catedrático da Universidade de Oxford, é conhecido principalmente pela sua visão evolucionista centrada no gene, exposta em seu livro edição 149, de 1º-08-2005, obra abordou a Vattimo, Richard Rorty e Santiago Zaba http://bit.ly/1dq6HEG. em disponível la, De sua produção intelectual, destacamos Más allá de la interpretación da (Nota 2002). Paidós, na: 2 Dawkins] ta, publicado em 1976. O livro também introduz o termo “meme”, o que ajudou na criação da memética. Em 1982, reali- zou uma grande contribuição à ciência da evolução com a teoria, apresentada em livro seu tão escreveu outros livros sobre evolução sobre livros outros escreveu tão a obra a de obra Gianni Vattimo timo é um pensador dado maior dos tem anos, ao longo criativo que, Esta teológicas. a questões atenção dado se diferentes de tem atenção - sua ideia ca aplicou 1) ele formas: racterística, a do “pensamento fraco” (pensiero as ideo debole), a todas logias, questionando, desseo modo, tipo a re de para espaço que não encontra racionalismo agressivo cha- o é, (isto ligião na vida pública de Dawkins ateísmo” mado “novo nexos entre teologia e filosofia? teologia entre nexos RO DE 2013 30 DE SETEMBRO LEOPOLDO, 428 | SÃO EDIÇÃO 62 www.ihu.unisinos.br Destaques da Semana camente à fé cristã. Por exemplo, Orí- especifi opõem se que aqueles com mais diversospontos devista, mesmo um longo histórico dediálogo com os veríamos lembrara teologia que tem teologiacristã. Em primeiro lugar, de- temchiano umacontribuição adarà devoção de Vattimo ao niilismo nietzs - em geral.ligioso Porém, creioa que a teologia, oupara opensamento re um parceiro dediálogo valioso para Nietzsche teologia contemporânea? chiano possibilita umdiálogo com a nietzs- oniilismo sobre Vattimo de outras pessoas. te, de ausência de caridade para com uma espécie de totalitarismo arrogan- de Louvain, de Catholique Université na Brito, docente Emilio cubano com ojesuíta 10-04-2006, pela lizada exclusivarea- conferir aentrevista ainda alemão, filósofo o Sobre bit.ly/Hl7xwP. http:// em download para disponível lo, crepúscu do e martelo do filósofo che: intitulado 13-12-2004, -Line, de da IHU número 127On- da edição capa de tema o dedicado foi Nietzsche A te. mor sua de o dia até o abandonou nunca que nervoso colapso um por acometido foi quando 1888, até Escreveu 2004). ro, Centau Paulo: São ed. (5. moral da gia e A1916) Guimarães, (Lisboa: genealo - 1998), Brasileira, Civilização Rio deJaneiro: Zaratustra (9.ed. falou fi obras suas guram como as maisimportantes Entre retorno. eterno e poder de vontade niilismo, valores, dos transvaloração além-do-homem, ceitos con- seus por conhecido alemão, lósofo 5 bit.ly/nqUxGO http:// em download para disponível e Prof.pelo concedida Dr. daexistência, Oswaldo Giacoia totalidade da afirmação ta On-Line humana. vida da biopolítico (des)governo O IHU: -evento — Pré- diferença da Filosofias Estudos de do Ciclo integrante parte biopolítica, da questão a e Nietzsche de biologismo ao Heidegger de crítica A conferência sua ser minimizado, biologismo radical de Nietzsche não pode intitulada http://bit.ly/162F4rH, em disponível 10-05-2010, de IHU On-Line, revista da 328 edição à Stein Ernildo por concedida entrevista a também, Confira, http://bit.ly/HdcqOB. em acessada ser Nietzsche, Friedrich de mento intitulada formação é em IHU dos 15 bit.ly/dyA7sR. Aedição lo”, disponível para download em http:// Friedrich Nietzsche Friedrich itsh, pnaet táio a e trágico pensamento o Nietzsche, Thomas Guarino deregra,– Via IHU On-Line – Por que a análise - entrevis a leia 24-05-2010, de , a dço 3 d Revista da 330 edição Na 5 do não tem não consideradosido IHU On-Line intitulada “Nietzsche e Pau e “Nietzsche intitulada XI Simpósio Internacional Internacional Simpósio XI . na qual discute ideias de ideias discute na qual 14-90: fi- (1844-1900): edição 175, de 175, edição O anticristo O Cadernos pensa O e pode Nietzs Assim IHU O ------

lacionadas ao serviço deDeus. lacionadas aoserviço re- finalidades para “despojos” esses usaram(12,35-36). E egípcios” dos Israel tomaram de “despojos filhos os co queseencontralivro no Êxodo: do sear (simbolicamente) no relato bíbli de todosdosa os pensadores aoseba- cuida assimilação esta justifica ele) a 46]. Orígenes (e teólogos posteriores , Celso VII, [Contraque sejamsólidas” afirmações derrubar de forma uma eles, tampouco para encontrarmos rarmos ocasiãopara umadisputa com forasituados dafé, nem para procu tos, mesmo que seus autores estejam jeções- ensinamen bons aquaisquer paracuidadosos nãolevantarmos ob inimigo resoluto dafé cristã: “Somos bre o escritor antigo Celso, que era um viveu no séculoIII, disse oseguinte so- genes “Em certo sentido, caridade para com Vattimo busca nos que podembeirar On-Line da (Nota grega. filosofia da minância o cul- a como no qual apresentava se cristianismo filosófico-teológico sistema um Criador de de SãoClemente. cípulo na catequista mestre dis- e Alexandria 6 (Nota da em disponível Bilate, sentido,comDanilo do tirania a leia 09-04-2012, entrevista de 388, edição Na alertar arespeito dogmaticamente outras pessoas” (aproximadamente 185-254): 185-254): (aproximadamente Orígenes uma espéciede de concepções arrogante, de 6 totalitarismo , um cristão deAlexandria que sustentadas ausência de ) IHU On-Line ao ft cm rsot à resposta como fati amor O . http://bit.ly/HzaJpJ ) IHU - - - - SÃO LEOPOLDO, 30DE SETEMB RO DE2013 |EDIÇÃO 428 Plato sed magis amica veritas (Platão reverter o axioma tradicional: Deus”. queelegostariaÉ porisso de a “adoraçãoverdade da comonosso idolatria, última nossa de libertar nos que devemos diz nos Vattimo dade, ver Na pluralidade. da tolerância na e caridade na baseado temporâneo que seconstruirpossa umetos con devem serenfraquecidas,de forma As pretensões deverdade absoluta pensamento deboleou fraco. siero comlacionado noção sua depen- É claro está queisso diretamente re povos. os todos entre tolerância de desejo de desenvolver uma cultura tos fortes da filosofia de Vattimo éseu cultura datolerância noséculoXXI? contribuem para pensarmos em uma como as ideias do pensador italiano literalismo oufundamentalismo. portância de se evitar uma espécie de complexidade daverdade e pela im- certamente pode ter respeito pela verdade.há nenhuma Mas ateologia Nietzsche dequeaverdade é que não pode concordar,não comde aopinião verdade.A teologia concorda,não e quantodadosa àcomplexidade da as formas depensamento –aser cui todas fato, de e, – teologia a desafia seguinte:é o nietzschiano o niilismo somente interpretações! ria dizer disse:Não há fatos, quando precisamente queNietzscheisso que- extraordináriade interpretações. É uma variedade respostas, de infinito perguntasreceberemos número um mos algumacoisa sobre ele? Aessas Existehumanidade? Sabe- umDeus? que éQual a vidaboa? natureza da uma série de perguntas àinternet: O fazer Podemos se referem. Vattimo a quetantodaquilo Nietzsche quanto internet ofereceexemplo um atual A problemáticos. não conceitos são apoiam a que provas ou garantias as objetivi- dade, perguntando à se a“verdade” e relação em agressivas e fortes pretensões contesta Vattimo verdade.acima, mencionei Como Vatti- de lembranos mo) complexidade da da a como (assim Nietzsche 7 (427-347 a. C.): filósofo ate filósofo C.): a. (427-347 Platão Thomas Guarinopon – Umdos lado, outro Por – On-Line IHU O aspectoqueroque destacar lugar,Em segundo aobra de Amicus - - - - - 7 -

Destaques da Semana www.ihu.unisinos.br 63 - - - O – - Pré que pode ) Cadernos IHU Em Cadernos Martin Heidegger. Ser e tempo. A des- na qual discute ideias de IHU On-Line XI Simpósio Internacional IHU: Internacional Simpósio XI Entretanto, Entretanto, Vattimo e a pós-mo- Lembrando-nos desse esclare Lembrando-nos (Nota da em http://bit.ly/bp5jvr, e 187, de 03- 07-2006, intitulada construção da metafísica, que pode ser acessado em http://bit.ly/qDgXkC. Con- fira, ainda, o nº 12 do , intitulado Formação desconstrução da metafísica, A ser acessado em http://bit.ly/1dbct9y. Confira, também, a entrevista concedida por Ernildo Stein à edição 328 da revista On-Line, IHU de 10-05-2010, disponível em http://bit.ly/162F4rH, intitulada biologismo radical de Nietzsche não pode não Nietzsche de radical biologismo minimizado, ser sua conferência A crítica de Heidegger ao biologismo de Nietzsche e a questão da biopolítica, parte integrante do Ciclo de Estudos Filosofias da diferença do -evento huma- vida da biopolítico (des)governo O na. dernidade sustentam dernidade que sustentam essa atitude moderno imperiosa do pensamento como desmascarada entrementes foi sendo profundamente deficiente. às vezes, tem, modernidade própria A in- e forte pensamento um fornecido a verdade desvaloriza que tolerante, e tradição pela artes, mediada pelas Essas pela religião. assim como cultura, deficiências daracionalidade iluminis- ta têm sido fortemente criticadas em nossa era contemporânea, o reconhecer se para a porta isso, com abrindo, valor legítimo dateologia e da crença em que na medida A religião, religiosa. do outras entre interpretação uma é Racionalidade iluminista cura que é, ao mesmo tempo, uma uma tempo, ao mesmo é, que cura O aspecto uma alteração. e torção podemos não o seguinte: é central qualquer rejeitar simplesmente nos precedido; tenha que época repensá-la e “recebê-la” precisamos termos. próprios em nossos cimento, cimento, podemos falar de Vattimo como filósofo pós-moderno. a pós-modernidade oferece fato, E, de - re o pensamento oportunidades para ligioso. Como issoverdade? pode ser da modernida fracos Um dos pontos ao racionalismo sua tendência de foi agressivo, a tentativa do iluminismo cânones aos racionalidade a limitar de do empirismo e do positivismo,redu- à metodologia assim, a verdade zindo, associada com a - investigação científi da vida pú afastada foi A religião ca. - de que ela fomen sob a alegação blica a e dogmatismo o necessariamente ta intolerância.

- - - - O ser e O século , disponível Que é Metafísi- e indica uma uma e indica 8 Cartas sobre o humanismo “Como “Como Introdução à metafísica (1953). reconheceu reconheceu atraídos pela atraídos permanecem permanecem têm corações corações têm Agostinho, os os Agostinho, e mentes que e mentes IHU On-Line – é Qual a contribui - Thomas Guarino – Inicialmen seres humanos humanos seres Martin Heidegger (1889-1976): filóso transcendência” incessantemente incessantemente o tempo (1927). A problemática heideg fo alemão. Sua obra máxima é geriana é ampliada em ca? (1929), (1947), a Sobre IHU Heidegger, On-Line publicou na edição 139, de 02-05-2005, o artigo O pensamento jurídico-político de Heideg- ger e Carl Schmitt. A fascinação por no- ções fundadoras do nazismo 8 para download em Sobre LW. http://bit.ly/TJcn- Heidegger, confira as edições 185, de 19-06-2006, intitulada de Heidegger, disponível para download pensiero debole? Ou seria aderindo, mais vigorosa, vez cada de maneira as pessoas são de que todas à crença de Gêne ensina o livro criadas, como sis, à imagem e semelhança de Deus? e semelhança sis, à imagem ção da análise de paraVattimo com- desafios os e niilismo o preendermos à colocados que são e oportunidades na pós-modernidade? religião não se Vattimo que dizer devo te, com à vontade inteiramente sente pois este “pós-moderno”, o termo — e ele que de pode dar a impressão a filosofia contemporânea de modo - conquis as — não reconhece geral - insis Vattimo da modernidade. tas não podemos simplesmente que te mo - (Überwindung) a época superar Ele prefere que nos precedeu. derna , uma palavra Verwindung o termo no pensamento suas raízes tem que Martin Heidegger de ------) As im- As A Repúbli- A IHU On-Li IHU , de 25-05- IHU On-Line Platão. A Platão. A totalidade em IHU On-Line (São Paulo: Martin Claret, 2002). (São Paulo: Em termos de suas contribui Em termos Como um exemplo da ênfase da ênfase Como um exemplo (São Paulo: Editora Edipro, 2012) Editora Edipro, e o (São Paulo: ne, de 04-09-2006,disponível em http:// bit.ly/pteX8f. Leia, também, a 294 edição da Revista 2009, intitulada movimento, disponível em plicações éticas da cosmologia de Platão, de cosmologia da éticas plicações concedida pelo filósofo Marcelo Prof. Dr. revista da 194 edição à Perine ca Fédon Sobre Platão, confira e entrevista niense. Criador de sistemas influentes até filosóficos hoje, como a TeoriaIdeias das e a Dialética. Discípulo de Sócra- tes, Platão foi Entre suas obras, destacam-se mestre de Aristóteles. ções, ções, Vattimo destaca com razão que o homem e a mulher dos paroxismos cansados neos estão - contemporâ de violência decorrentes de - identida A agressivas. religiosas e des étnicas sociedades criar humanidade busca - não pro pela verdade paixão onde a duza intolerância, e sim onde reine pela dignidade respeito um profundo que humana. É claro pela liberdade e - ga como é esta: duradoura a questão rantimos o desejo de contemporâneo humana? É pelo dignidade e liberdade Imagem e semelhança Imagem - mais ami é mas a verdade amigo, é é a verdade que em medida Na ga). e dissolvida epifânica, em efêmera in - da verda lugar (em na caridade atual a papas dos visitas as cita Vattimo de), do mun cidades ao redor diferentes - compre é policêntricas, terpretações ensível que Vattimo preferisse dizer: Amica veritas sed magis amicus Plato mais é mas Platão amiga, é (A verdade amigo). comuni de os meios exemplo, do. Por Francisco que o Papa relataram cação ao Rio de visita recente sua concluiu Janeiro com uma missa onde - estive de enorme um número presentes ram Vat pessoas. de milhões 3 talvez fiéis, timo diz que não deveríamos nos en- ganar com essas grandes multidões. - os inte que todos Ninguém acredita grantes da multidão de pessoas o pon com concordem boa vontade de tífice respeitoa de questões morais e para, lá estão multidões As doutrinais. aplaudir a concla primordialmente, universal, à amizade do Papa mação os entre comum a um entendimento os todos com para e à caridade povos o mais De novo, homens e mulheres. . , e não a veritas é a caritas importante RO DE 2013 30 DE SETEMBRO LEOPOLDO, 428 | SÃO EDIÇÃO 64 www.ihu.unisinos.br Destaques da Semana no pensamento religioso deVattimo. posição uma XII, ocupa proeminente século do esotérico e profético sador por que Joaquim deFioreque Joaquim por na provisoriedade. Essaé uma razão fica contemporânea na historicidade e novodeve ênfasesurgira dada filosó ral.contrário,Ele acha, pelo algo que a afundar senescência cultu numa na ortodoxia tradicional,arriscar-se-á insistir religiosa fé a se que, acredita fé religiosa ortodoxa. Na verdade, ele estánão interessadoem recuperar a todos osaspectos davidahumana. satura envolve e contingente que e rio guem compreender ocaráter provisó- conse- não afirmações Tais agressivo. forte, pensamento do representativas definitivo”, são, de modo preeminente, com sua insistência na“certeza” e “caráter dogmáticas, religiosas mações afir as contrário, Pelo tradicional. de pode acarretar adoutrinaemoralida- não religiosa fé da contemporânea ta consequência, qualquerredescober intrinse - – camente ligada àtemporalidade. Em epifânica como sim mas ser entendida como sólidae imutável, história. Portanto, averdade nãopode fundamente emaranhada dentro da mostraram que a“verdade” nos está pro- filósofos dois Esses Nietzsche. e por Heidegger abertos sido tivessem religiosa, como senossosolhosnão demos simplesmente àfé “retornar” turinense nopensamento fraco. vemos lembrar aênfasepensador do religião.Exatamente é aqui onde de- a o pode tampouco Vattimo, diz tão, pretensões para com averdade, en- suas em autoconfiante ser mais pode racionalistaSe amodernidade não mo arespeito dapós-modernidade? Vatti- de visão na permitido é ligiosa re- fé de tipo que essencial: pergunta ender porfé pós-moderna? compre- poderíamos que o análise, e darsentido àvida. ciência. Asduastentam compreender a interpretação domundofeita pela mundo, nãotem menosvalor doque (Nota da italiano. místico filósofo e cisterciense 9 (1132-1202): abade (1132-1202): Joachimde Fiore óvo prat, u Vattimo que portanto, óbvio, É nãopo- que sustenta Vattimo Thomas Guarino – Ah, esta é a dessa partir A – On-Line IHU IHU On-Line ) 9 , umpen- - - - - filosofia contemporânea. da parte por objetividade e verdade está àrenúncia unido a pretensões de divinamentedoutrinais sancionadas) normas morais(e das divina ridade e auto- da fim O divina. transcendência rábolaque serefere à dissolução da da o no entanto, Vattimo, Para homem em prol dasalvação humana. de Deus eternoque oFilho se torna kenosis respeito deDeus. a objetiva verdade a ter se de tensão sagem religiosa, prequalquer e não - tolerância a todoponto equalquer devista. Éa mo,“pensamento do fraco”aplicado vastopluralis um de tolerânciacomo a “caridade” é melhor compreendia VattimoEntretanto,crentes.para dos derramadocoraçõespor Deusnos designa oamorsobrenaturalcional, vra reinterpretado.Por exemplo, apala discursoé, agora, profundamente ne odiscurso religioso, este mesmo Emborasancio após-modernidade recuperação dacrença tradicional. de queaféé uma não pós-moderna “objetiva”. ou última interpretação a como não terpretaçãoentremundo do outras, mesma comosimplesmente uma “fracas”, isto é, deveria propora si pretensões para com averdade são moderna deve reconhecer quesuas pós- fé religiosa a Vattimo, de vista pós-moderna? cia dopensamento fraco anteessa fé complexidade da kenosis caritasdiscurso, no cristão tradi nos lembra da Outroexemplo: paracristãos, os De novo, precisamoslembrar nos Thomas Guarino – Doponto de IHU On-Line – Qual é a pertinên a deVattimo) (assim como serefere àencarnação, em “A obra de Nietzsche verdade” o que constitui a nova men- é simplesmente uma pa - evento in ------

SÃO LEOPOLDO, 30DE SETEMB RO DE2013 |EDIÇÃO 428 direção aX”. desenraizada, “rolando docentro em que a humanidade está inteiramente de Janeiro: Contraponto, 2008), de potência de zsche, em Vontade Niet de afirmação a citar de gosta Vattimo que isso por É prometeica. e ameaçador daliberdade humana ral se tornao oponente irremediável de doutrinareligiosa ouverdade mo- tipo qualquer em insistência uma to, objetivas — objetivas verdades e fixas estruturas as todas de fim o como entendido — niilismo Parahumana. Vattimo, unicamente o tiva, e, portanto, inimiga da liberdade estável e objetiva é opressiva e restri- ênfasequalquer que verdadena fixa, de afirmação a seja, ou niilismo, em degenera análise, última em ela, que Entretanto, operigo desuaposição é -se defato acolher asecularização. pode- sentido, Nesse aplaudida. ser no pluralismo e na tolerância deveria to eabrangente pluralismo. dade eàcerteza emfavor de umvas- objetivi- à renúncia uma Há vista. de abre virtualmente atodos ospontos soas, sendoque a sociedade agora se amor cristão para com asoutras pes- do ou caridade da dinâmica quência ça). Assim, asecularização éaconse- tando suacrença (ouafalta decren- todos napraça pública, nãoimpor para espaço há que significa rância) caridade (entendida aquicomo tole- noção cristã decaritas. Quer dizer, a é odesdobramento, nahistória, da pensador deT fé cristã. Por quê? De acordo com o mas reconhecê-la como otriunfo da deveriam seoporàsecularização, pensa que aspessoasreligiosas não leva alémdosecularismo? sobre ocaminho que and theology” “Vattimo em detecta você que rigos de Nazaré. Jesus em braram Israel e antigo de no da história dasalvação que se desdo- acontecimentoshistóricos concretos percepção de Deus,semqualquer dos a uma mera fábula sobre a “fraqueza” cristianismo o reduzir parece ele que vez Vattimo, uma de concepções irão provavelmente rejeitar várias das Penso que a ênfase de Vattimo de ênfase a que Penso Thomas Guarino–Vattimo IHU On-Line – Quais são os pe- os cristãos análise, última Em é emancipação. Portan- urim, asecularização (Rio - - Destaques da Semana www.ihu.unisinos.br 65

------14 IHU tor- ), (1770- , disponível , de 09-06- IHU On-LineIHU , Fenomenologia da religião pela pela da religião 13 , em comemoração aos IHU On-Line ” ti para (tu e nos fizeste ) (Petrópolis: Vozes, 2008 Vozes, (Petrópolis: ) Carlos Roberto Velho Cirne-Lima. (1807-2007)

A despeito destas importantes importantes destas despeito A Confissões“fecisti, nos ad et te Aurélio Agostinho (354-430): Conhe Georg Wilhelm FriedrichHegel 2008, Um novo modo de ler Hegel em http://bit.ly/1g0xNhE. (Nota da On-Line 14 cido Agostinho como de Hipona ou Santo Agostinho, bispo católico, teólogo e filó sofo. É considerado santo pelos católicos e doutor da doutrina da Igreja. (Nota da IHU On-Line 13 1831): filósofo alemãoten Aquino, de idealista.Tomás Santo e Aristóteles Como tou desenvolver um sistema filosófico no qual estivessem integradas todas as con- tribuições de seus principais predecesso- res. Sua primeira obra, A fenomenologia espírito do 200 anos de lançamento dessa obra. material O está disponível em http://bit. ly/1eEonKO. Sobre Hegel, leia, ainda, a edição 261 da nou-se a favorita dos hegelianos da Euro da hegelianos dos favorita a nou-se pa continental no século XX. Sobre Hegel, Sobre XX. século no continental pa confira a edição nº 217 da de 30-04-2007, intitulada do espírito, de Georg Wilhelm Friedrich Hegel nas inquietum est cor nostrum donec re quiescat in te inquieto permanecerá nosso coração até que repouse em ti). Comoreco- nheceu Agostinho, os seres humanos que perma e mentes corações têm pela atraídos incessantemente necem transcendência. mita qualquer compromisso “forte” “forte” qualquer compromisso mita de um Criador. real a existência com Em última análise, creio que percebe famo- do algo Vattimo de obra na mos so comentário de Santo Agostinho restrições restrições em relação à filosofiaVattimo, de quiçá possamosnossas observando reflexões que, em concluir há uma profunda seu pensamento, de bíblica pela mensagem atração que amoroso e um Deus vulnerável da encarnação na história se revela — mesmo que o turinense não se per sófica maiselevada. Nesse sentido, Vattimo é muito mais “moderno” do que ele mesmo admite. filosofia, através da qual as dimensões as qual da através filosofia, são anuladas religiosa da fé concretas e apagadas por uma consciência filo mo de Vattimo é altamente não- orto abertamente). admite ele (como doxa Em última análise, ele dilui e dissolve da da história reais os acontecimentos so- sem parábolas em meras salvação coisa outra não é Isso histórica. lidez (Au- suprassunção clássica do que a fhebung) hegeliana ------via esclarecida” em nome de em nome uma suposta uma suposta de uma razão de uma razão racionalidade racionalidade ser valorizado ser valorizado Não obstante, eu advertiria quan advertiria eu obstante, Não O pensamento de Vattimo é al- vida por parte vida por parte a colonização da a colonização por desmascarar por desmascarar turinense deveria deveria turinense secular imperiosa secular imperiosa “O pensamento do pensamento “O (meio termo) humanitária en- humanitária media (meio termo) rígido eum umaobjetivismo anar tre quia caótica. de ele se basear profunda ao fato to mente nas filosofias Nietzschede e Para Heidegger. Vattimo, assim como para Heidegger, a verdade é epifâni e e não constante e evanescente, ca por assim “presos”, Estamos durável. historicidade. da radical fluxo no dizer, cristianis do noção a conseguinte, Por tamente criativo etamente merece um estudo continuado. Trata-se de um filósofo contemporâneo significativo que está buscando legitimamente alguma Atração pela transcendência Atração tando desesperadamente reduzir a reduzir desesperadamente tando - rea fundamental e mais abrangente - e cog privada lidade a uma questão nitivamentevazia. O pensamentodo por valorizado ser turinense deveria vida da colonização a desmascarar secular impe- de uma razão por parte racio uma suposta nome de riosa em nalidade esclarecida. Os autores que Os autores nalidade esclarecida. claramente menciona mostram você - por um re que alguns ainda esperam da modernidade que crudescimento os aspectos de todos a religião exclua da vida pública. ------, dis- , Não ) , Hi Traité Traité 10 Introdu (1942): fi- , de 26-11- IHU On-Line ) (São Paulo: Loyola, (São Paulo: ? , na conhecida alocu , na conhecida 11 IHU On-Line 12 ) IHU On-Line IHU On-Line em 13-07-2009 Conjuntura da Semana. Bento XVI. ento XVI Bento Thomas Guarino – Eu diria Thomas Guarino que A obra de Vattimo útilé porque IHU On-Line – Em que sentido Joseph Ratzinger: Joseph teólogo alemão Daniel Clement Dennett IHU On-Line filósofo francês, doutor francês, filósofo Michel Onfray: ção ao cristianismo 2006). Renunciou em fevereiro de 2013 ao pontificado. Sobre esse fatoo seguinte material publicado pelas No- confira tícias do Dia do sítio do IHU, em 03-03- 2013: As primeiras avaliações de um pontifica- do, disponível em http://bit.ly/XkPinw. (Nota da 12 chamado Joseph sob o a 2013 assumiu o trono de Pedro Ratzinger, de chama é hoje e XVI Bento Papa de nome 2005 do de Papa Emérito. Autor de uma vasta e importante obra teológica, tem como um dos seus livros fundamentais Tratado d’Athéologie (Tratado de entrevista a Confira 2005). Grasset, Paris: Ateologia. exclusiva concedida por Onfray à edição 245 da Revista 2007, intitulada As existirão ficções enquanto religiosas disponível para download em http://bit. houver humanos, ly/1eoUmA6. (Nota da nett à em Filosofia, é autor do livro 10 11 lósofo norte-americano cujas pesquisas estão direcionadas à filosofia da mente e da biologia. Sobre ele, confira a matéria As 6 questões que mobilizam as grandes mentes, publicada pelo sítio do IHU, www.unisinos.br/ihu, em Confira a entrevista 08-01-2007. concedida por Den fomos criados à à fomos criados semelhança de Deus: ele semelhança nossa à criado foi que é ponível em (Nota http://bit.ly/RPTTMY. da do, descobriu os limites do raciona os limites descobriu do, lismo científico. A modernidade tem muitas realizações, porém a tentativa de impor o positivismo em todos os humana experiência da quadrantes uma Há horroroso. um fracasso foi na vida dimensão religiosa profunda O inegável. e humana universal que é Papa a Europa, junto com o resto do mun o resto com junto a Europa, oferece oferece uma crítica sólida da moder ção que proferiu em Regensburg, em Regensburg, em que proferiu ção que a religião razão com indicou 2006, mas a razão, sem não podeproceder sem pode proceder tampouco a razão Na ausência da con a fé. considerar as pa- e da religião, da razão junção da sociedade se multiplicam. tologias do racionalista nidade ingenuamente iluminismo que, em nome da “razão”, ten- público, espaço do religião a tirou se pode falar num retorno da religião religião da retorno num falar se pode sur e tensionamentos que na Europa gem daí frente ao fundamentalismo fundamentalismo ao frente daí gem ateísta de Dawkins, Dennet tchens e Onfray tchens RO DE 2013 30 DE SETEMBRO LEOPOLDO, 428 | SÃO EDIÇÃO 66 www.ihu.unisinos.br Destaques da Semana trilhão emeiodedólares” Leilão deLibra: “Brasil perderá um do sítioIHU(www.ihu.unisinos.br) Entrevistas especiaisfeitas pelaIHU On-Line Destaques On-Line competência dapresidente Dilma”. os leilões, porque eles sãoúnica eexclusivamente de qual dizque lava asmãos,quenadatem aver com de negociação com aprópria direção daempresa, a plano estratégico. (...)Eutenho debatido namesa menos fazer caixa, fazer frente realmente noseu vendendo ativos, porque, segundaela, tem que pelo um lucro líquido de21bilhões dereais econtinua para entender como, noprimeiro semestre, elatem Petrobras diante daexploração dopré-sal. “Não dá de contrato adotado para esseleilãoeapostura da Na entrevista, JoséMariatambém questiona omodelo que essediscurso para serviu apresidente sereleita”. enfim. Mas oque se vê agora é o contrário, demodo submetido aqualquer tipodeapreço, leilão, entrega, seu oponente, Dilmadissequeopré-sal nãoseria época dacampanha presidencial, “em diálogo com dos Estados Unidos, oeconomista lembra que, à Petrobras pela Agência deSegurança Nacional –NSA o leilãodeLibra depoisdasespionagens feitas à Críticoinsistência à do governo brasileiro em realizar por ela, aqualestá, emparte, emplenaprodução”. Petrobras irá colocar aleilãoumaárea descoberta On-Line. Segundoele, essa “é aprimeira vez quea e daAgência Nacional de Petróleo –ANP”, dizàIHU Dilma, doministro deMinase Energia, Edison Lobão, Libra “depende única e exclusivamente dapresidente Janeiro –Sindipetro-RJ. Ocancelamento doleilão de membro doSindicato dosPetroleiros doRiode e externas?”, questiona o economista José Maria, caixa, jáque ogoverno está com dívidasinternas com oqueestá aprovado emlei;seriapara fazer ao leilãodeLibra: seriaumafalta decompromisso comportamento dogoverno brasileiro em relação “ Acesse olinkhttp://bit.ly/dia190913 Confira nasnotíciasdodia19-09-2013 dos Petroleiros doRiodeJaneiro –Sindipetro-RJ. de Janeiro. Atualmente émembro doSindicato graduado pelaUniversidade GamaFilho, doRio Entrevista especialcom JoséMaria,economista T enho algumashipóteses para compreender o no período de no período19-09-2013 a 26-09-2013, disponíveis nasEntrevistas do Dia

rede” Brasil navanguarda daregulação da Marco CivildaInternet: “PLcoloca o Acesse olinkhttp://bit.ly/dia200913 Confira nasnotíciasdodia20-09-2013 Instituto de Tecnologia eSociedade. Estadual doRiodeJaneiro –UERJediretor do Souza, doutor emDireito CivilpelaUniversidade Entrevista especial com Carlos Affonso Pereira de censura”. expedita doconteúdo quepodemimplicar verdadeira judicial criariaumdesestímulo amecanismos de retirada ele apenaspoderserresponsabilizado apósumadecisão conteúdo antes deumaordem judicial,masofato de Isso nãoquerdizer que oprovedor nãopoderiatirar o a umasimplesnotificação para retirada de conteúdo. não seriaresponsabilizado caso nãodesseseguimento para a retirada desse conteúdo. Sendo assim, o provedor seu usuário, salvo sedescumprirumaordem judicial não seriaresponsabilizado peloconteúdo postado por Marco Civiloptou pelaregra segundoaqualoprovedor retirada de conteúdo da internet”. De acordo com ele, “o uma “disputa teórica epolítica sobre osmecanismos de online”. Naentrevista, Souza enfatiza quenoPLaindahá a discriminação dosdados quesãotrafegados deforma contas, aneutralidade darede éumaproibição contra base emseudestino, origem ou conteúdo. Nofinaldas trafegam osdadosnarede discriminaressetráfego com dado àsoperadoras quefornecem oacessoàinternet e rede como conhecemos. Segundoesseprincípio, nãoé fundamental para quese mantenha anatureza aberta da preservação doprincípiodaneutralidade darede “é concedida àIHUOn-Linepore-mail.Segundoele,a dos dadospessoaisdebrasileiros”, avalia em entrevista debate: (i)aneutralidade darede; e(ii)aprivacidade entre osparlamentares eosatores envolvidos no dois pontos polêmicos, que“ainda geram discussão Projeto de Lei—PLdoMarco CivildaInternet possui em regime deurgência naCâmara dosDeputados, o Carlos Affonso Pereira deSouza. Aguardando votação localização forçada dedadospessoais”, dizoadvogado da neutralidade darede oumesmosobre aquestão de Molon, semmodificações adicionaissobre oprincípio com orelatório preparado peloDeputado Alessandro “Seria importante aprovar oMarco Civildeacordo SÃO LEOPOLDO, 30DE SETEMB RO DE2013 |EDIÇÃO 428

Destaques da Semana www.ihu.unisinos.br 67

udo em nome da questão da segurança da segurança da questão nome udo em

rack, mestre em mestre Brack, Paulo especial com Entrevista e em Ecologia e doutor pela UFRGS Botânica de Federal pela Universidade Naturais Recursos São Carlos. nas notícias do dia 26-09-2013 Confira Acesse o link: http://bit.ly/dia260913 previstos os barramentos todos construídos “Se fossem o rio Pelotas-Uruguai governo, pelo e elétrico setor pelo sustentável?”, desenvolvimento é Isto desapareceria. como deferir” tinha “Não Brack. Paulo o biólogo pergunta Querê de Pai da hidrelétrica prévia de licença o pedido à montante contígua era área “a porque no rio Pelotas, em Grande, Barra de hidrelétrica pela perdida daquela em um estudo base com suas licenças teve que 2005, 10 de há cerca passar, que o Ibama deixou fraudulento, do Ibama o parecer ele, Segundo diz à IHU On-Line. anos”, os que sejam suspensos todos “recomenda também aproveitamento de concessão inventário, de processos hidrelétricas, de outras ambiental licenciamento e - PCHs na Hidrelétricas Centrais incluindo as Pequenas Grande”. da UHE Barra a montante bacia do rio Pelotas, a para destinada que a área explica Brack entrevista, Na é “insubstituível”, Querê de Pai da hidrelétrica construção para Prioritárias no mapa das Áreas inserida pois “está de do Ministério da Biodiversidade” a Conservação de “extrema incluída na categoria Ambiente, Meio da Zona parte “faz a área disso, Além importância”. gravada Atlântica, da Mata Biosfera da da Reserva Núcleo espécies de dezenas Apresenta mundial (Unesco). como Os rios e endêmicas. raras fauna ameaçadas, e da da flora ciliares, as matas como associados, seus ecossistemas e águas paradas com lagos, em transformados sendo estão poluídas”. e questiona Heitor Costa em entrevista à IHU On-Line. à IHU entrevista em Costa Heitor questiona Fukushima por responsáveis as empresas ele, Segundo os “resolver não conseguiram japonês o governo e de março 11 de de desastre pelo acarretados problemas sendo “está o qual o acordo, do físico, avaliação Na 2011”. nuclear à indústria uma ajuda na prática, seria, esboçado, país, seu próprio em das pernas’ ‘mal anda que japonesa, a outros venderia mercado, o não perder para que, e país”. seu próprio em vender não consegue o que países Dilma ao da presidente da viagem Após o adiamento as usinas nucleares no Japão contra movimentos “os país, na linha governo o questionado têm e se adiantaram nuclear a tecnologia exportar o Japão pode como de problemas seus próprios resolver quando não consegue comenta Costa entrevista, Na esclarece. Fukushima”, em – PDE, 2013-2022 de Energia ainda o Plano Decenal nos de mais usinas térmicas a instalação o qual prevê as federal, governo anos. “Como planejado pelo próximos elétrico do sistema mais na base operar deverão térmicas vão elas são mais caras, térmicas nacional. Como essas T a tarifa. onerar pontua. o país”, para estratégica energética Deferimento da hidrelétrica de Pai de Pai da hidrelétrica Deferimento indefensável era Querê III,

Université de Toulouse-Le- Université Université d’Aix-Marseille Université , da França, e professor na Universidade na Universidade e professor , da França, Ainda não estão claras as possíveis negociações para para negociações as possíveis claras Ainda não estão Mas após o o Brasil. o Japão e nuclear entre um acordo tecnologia?”, nesta confiar “como de Fukushima, acidente Entrevista especial com Heitor Costa, Doutor Doutor Costa, Heitor especial com Entrevista pela em Energia Acesse o link http://bit.ly/dia240913 “Os movimentos sociais organizados avaliaram que o avaliaram sociais organizados movimentos “Os de junho e das mobilizações que saiu mais forte tema não quis Como o Congresso Política. a Reforma julho foi exclusiva, nem a assembleia constituinte o plebiscito da sociedade entidades sociais e outras movimentos de e se puseram agosto no início de civil se reuniram popular, as ruas um plebiscito para levar para acordo a dívida sobre nos moldes daqueles que já ocorreram o esclarece a Vale”, sobre a ALCA, sobre externa, entre “Não há contradição Lesbaupin. Ivo sociólogo a da iniciativa Política, de Reforma as duas propostas ambas têm porque popular, popular e a do plebiscito político, do sistema radical reforma uma objetivo como uma verdadeira para de condições da criação na direção dos ele. Apesar de a Plataforma avalia democracia”, Político do Sistema Sociais pela Reforma Movimentos há mais de dez reforma da acerca no debate insistir de junho manifestações a partir das somente anos, foi consenso um necessidade de organizar que “sentiu-se contextualiza comum”, de uma proposta em torno as Lesbaupin explica Na entrevista, o sociólogo. que a e enfatiza Política, de Reforma duas propostas desde a influenciar começar popular pretende “iniciativa as mudanças valer fazer tentar para já o Congresso, até votada não for ou, se eleição, a próxima já para os parlamentares”. sobre servir de pressão para outubro, popular de um plebiscito frisa, a proposta isso, Enquanto pretendido o alcance com que uma reforma “considera de uma assembleia através só poderia ser realizada Congresso”. não por este exclusiva, constituinte Federal do Rio de Janeiro – UFRJ. – UFRJ. do Rio de Janeiro Federal do dia 24-09-2013 nas notícias Confira Entrevista especial com Ivo Lesbaupin, doutor doutor Lesbaupin, Ivo com especial Entrevista pela em Sociologia Mirail Acesse o link http://bit.ly/dia250913 Confira nas notícias do dia 25-09-2013 Confira França. e coordenador dos projetos da ONG dos projetos e coordenador França. bem Naper Solar, e Projetos de Estudos Centro de Energias do Núcleo de Apoio a Projetos como de Federal - NAPER da Universidade Renováveis – UFPE. Pernambuco Acordo nuclear entre Brasil e Japão: Brasil nuclear entre Acordo econômica uma questão Reforma política: democracia brasileira brasileira democracia política: Reforma a soberania e não garante é limitada popular. RO DE 2013 30 DE SETEMBRO LEOPOLDO, 428 | SÃO EDIÇÃO 68 www.ihu.unisinos.br Destaques da Semana Por Luciano Gallas resultado desualivre decisão, ignorando oalcance dosinstrumentos decontrole. cada vez maissutis. Isso faz com queosindivíduosassumamsuas condutas como Na sociedadetecnológica, ocaráter coercitivo do exercício dopoderassume formas mesmos esobre nossotempo Para exercitar acrítica sobre nós Entrevista formulou? que o o sujeito com fidelidade tem que odiscursoem construído não vazio, do sociedade uma atualmente discurso. do Isso implica dizer em que vivemos partir a construído é porâneos entendemque osujeito enquanto ospensadorescontem essência, a próprio si em buscava to modernos consideravam queosujei- IHU On-Line – Os pensadoresOs IHU On-Line– complementa aprofessora. -se assimacondição para oassujeitamento”, mização dosmovimentos. Aliberdade torna- de, entendendo-se liberdade como amaxi- mecanismos de controle produzem liberda - tros deixados pelosmovimentos. Assim,os à Saraiva ementrevista concedida pore-mail Schuck Karla a engenheira afirma ciplinar”, dis- poder do contrário ao vigilância, a legia não privi- controle pelo utilizado sibilidade paradoxo acontece porque oregime de vi- dade tecnológica” atuale que“o podertorna- socie- na sutis mais vez cada formas assume sentido, argumenta que “o exercício do poder estamosa sociedadenaqual Neste inseridos. sobretempo”, nosso a compreender demodo e mesmos nós sobre crítica a “exercitar ciso “N IHU On-Line.“O controle se vale dosras- A docenteA preparteobjetivo é do que de para ocontrole. Este aparente dade demover-se écondição tecnológica,a sociedade a liber - discursostornam-se camposde luta Os governam. e constituem nos hoje que práticas as discutir importância te. Assim, torna-se de fundamental contingen- é somos que aquilo que E práticas. dessas depende somos que a atenção parafato o aquilo de que discursivas, entendochama que isso por meio de práticas discursivas e não sujeitos como constituímos nos que Karla SchuckSaraiva –Aodizer - - les relacionados àsquestões tecnológicas. aque- principalmente contemporânea, dade culação entre temas da educação e da socie- arti- à dedicando-se universidade, mesma da e Pós-modernidade Currículo quisa – GCPOS dePes- do Grupo ainda Participa Educação. Programae no nologia dePós-Graduação em de graduaçãodisciplinas cursos dos de tec em leciona qual na instituição Ulbra, – Brasil te é professoraUniversidade da Luteranado em Educação, também pela Ufrgs. Atualmen ralGrande doRio – UFRGS doSul e doutora em EngenhariaUniversidadepela Civil Fede cesso, saúde,beleza”, afirma ela. apontariam o caminhopara que tenham su- por meiodeverdades e de informações que condutas suas governando beneficia, os que o interessea noção indivíduos, dos daquilo produz poder de exercício de tipo “Esse for. -se tanto mais eficiente quanto menos visível” Confira aentrevista. KarlaSaraiva Schuck égraduadae mestre SÃO LEOPOLDO, 30DE SETEMB RO DE2013 |EDIÇÃO 428 que Marcha dasVadias de narrar-se deoutrosPensomodos. desvantagem reivindicam o poder de situação em identidades com pos gru- mais vez Cada perspectiva. nesta vítimas dos casos de abuso sexual que es- tar vestir-se como evi- deveriam mulheres as que de local um policial de afirmação à protesto em em abril de 2011 em Toronto, no Canadá, Marcha das 1 Vadias para não serem não vadias para : movimento iniciado 1 - - - sejaumbom Destaques da Semana www.ihu.unisinos.br 69 ------udo isso é perigoso, mas udo isso é perigoso, T - de co On-Line – Gostaria IHU – Gostaria, Saraiva Schuck Karla Karla Schuck Saraiva – Na so- Saraiva Schuck Karla IHU On-Line – Neste sentido, mentar algo que não foi citado nas citado foi que não algo mentar anteriores? questões para definalizar, destacar que aquilo - aqui não é uma condena que expus mas seu uso, e ao às tecnologias ção um alerta. que o regime de visibilidade utilizado pelo controle não privilegia a vigilân do poder disciplinar. contrário ao cia, multipli as vigiava disciplinar poder O de modo a cidades, mas as arranjava indivíduo. Para cada poder localizar para os movimentos restringia-se isso, potencializar a vigilância. A vigilância visava garantir o assujeitamento dos - prescri indivíduos aos regulamentos vigiar não pretende o controle Já tos. informações um, mas recolher cada de bancos gigantescos em organizadas estratégias criar dados que permitem individuali de condutas de condução zadas de acordo com o perfil do indi muito não importa víduo. Ao controle mas sim saber quem é esse indivíduo, saber como se constituem seus hábi seus dese- e seu comportamento tos, dos se vale o controle jos. Portanto, pelos movimentos. deixados rastros de controle os mecanismos Assim, entendendo-se liberdade, produzem dos a maximização como liberdade as- torna-se A liberdade movimentos. o assujeitamento. para sim a condição ciedade tecnológica, a liberdade de a liberdade ciedade tecnológica, o controle. para condição é mover-se por acontece paradoxo aparente Este mas de controle e vigilância? mas de controle como se dá na sociedade tecnológica sociedade tecnológica na se dá como e for liberdade entre a relação atual to, fazendo-os minguar. Cabe saber se saber Cabe minguar. fazendo-os to, efetivamente desejamos nos afastar ou se de controle dos mecanismos - su de alegre uma condição vivemos qual da escapar. não desejamos jeição não necessariamente ruim, como di como ruim, não necessariamente as A ideia é apresentar ria Foucault. - da sociedade tecno acerca questões lógica a partir de uma outra- perspec tiva, parafazer com que leito- meus res questionem o que estão fazendo que os deles mesmos e dos outros a Ou seja, a ideia é exercitar cercam. nos sobre e mesmos nós sobre crítica so tempo. ------fou - caracte de que a principal IHU On-Line – Do conceito conceito – Do On-Line IHU IHU On-Line – É deste raciocínio iní – No Saraiva Schuck Karla - – O exercí Schuck Saraiva Karla - das re mediação a com -se sujeito experiências queessas des sociais e a capaci potencializar podem tanto também de si, como dade de criação obliterar. caultiano das de condução As estratégias vel. que hoje estão dos outros condutas apelam principalmen- movimento em fazendo do desejo, a produção para te mais vez que os indivíduos cada com de determinadas assumam que agem decisão. livre e sua própria por formas produz poder de exercício de tipo Esse dos indivíduos, a noção o interesse daquilo que os beneficia,governando por meio de verdades suas condutas o que apontariam e de informações sucesso, que tenham para caminho saúde, beleza... da que escapar que se pode concluir tecnológi sociedade na comunicação do poder? é escapar atual ca dizia Deleuze de 1990, cio da década vacúolos criar necessário que seria do escapar para de não comunicação que ele esteja E me parece controle. certo. O imperativo da comunicação, online, sempre a necessidade de estar inse localizável, e disponível sempre de visibilidade um campo em re-nos infinito e permite que se criem infor nós que nenhum dossiê sobre mações poderia das sociedades disciplinares romper a co- Nesse sentido, imaginar. de dos mecanismos subtrair é nexão a possiblidade de recolher controle sem alimen- É deixá-los informação. encontrar algumas pessoas, entre algumas pessoas, entre encontrar sociais que usam redes as elas jovens, opiniões acerca debater para também de temáticasrelevantes, ou para- pro mover o ativismo político. Creio que modos de tornar diferentes existam e não produtivo ser é poder do rística repressivo, podemos afirmar que a é um es- atual sociedade tecnológica do poder? pelho desse exercício vez cada cio do poder assume formas O tecnológica. sociedade na sutis mais vez cada é poder do coercitivo caráter - seu ca destacando-se menos visível, tan- torna-se poder O produtivo. ráter to mais eficiente, quanto menos visí ------) IHU On-Line Karla Schuck Saraiva – Como Schuck Saraiva Karla IHU On-Line – A sociedade con sociedade On-Line – A IHU que – Creio Schuck Saraiva Karla de On-Line – Que modelos IHU do eu” nas redes sociais, em sociais, redes nas eu” do “show diu-se para diversos países do mundo em repúdio à violência contra as mulheres e aos atos cotidianos de machismo, entre eles a afirmação preconceituosa de que mulheres vítimas de estupro provocam a comportamen seu de conta por violência to. (Nota da tavam ocorrendo na Universidade - de To ronto. Desde então o movimento expan apontei, este é um campo que ainda é um campo este apontei, Cla mais consistentes. estudos exige exemplo. Algumas mulheres querem querem mulheres Algumas exemplo. mudar as quediscursivas práticas nos discur outros e promover constituem o “show do eu” esteja efetivamente ao relacionadas vinculado a questões que penso também Porém, consumo. - possa pro ser fenômeno este talvez complexo. mais modo de blematizado esteja de corpos Ainda quea exibição - marca e normativos modelos a ligada pelo signo do con vezes dos muitas subjetivaçãoresultam do uso dasre- des sociais? sos sobre o feminino. sos sobre busca pela é marcada temporânea do indivíduo por novas experiências. O referência ao grau de exposição e à experimentação pelo indivíduo de novas formas de constituir-se, cor responde ao mesmo fenômeno con de e consumo de oferta temporâneo experiências? novas sumo, seria possível questionar se os aí do consigo ser de relação processos são um blo movimento em colocados pe- sempre pautado homogêneo, co Ainda que eu não los valores. mesmos tenha realizado investigações que um estudo creio aprofundadas, mais poderia nos mostrar mais detalhado so- de si nas redes experiências outras analisar que possíveis ciais. Considero os com e rupturas contracondutas modelos privilegiados de subjetivida de si possa ser de nessas exposições de pesquisa campo um interessante hoje. que se abre que na maioria que se pode dizer ro do ser-consigo as relações das vezes sociais nas redes que se desdobram pelo hedonismo, marcadas estariam pelo individualismo e por uma certa superficialidade. Porém, é possível RO DE 2013 30 DE SETEMBRO LEOPOLDO, 428 | SÃO EDIÇÃO Tema de Capa

Destaques da Semana

IHU em Revista www.ihu.unisinos.br

70 SÃO LEOPOLDO, 00 DE XXX DE 0000 | EDIÇÃO 000 IHU em Revista www.ihu.unisinos.br 71 - - - A) Prof. Dr. José Antônio Zamora e Prof. Dr. Jor Dr. Prof. e Zamora José Antônio Dr. Prof. Universidad de Bue- de (Universidad Costa Flavia Dra. Profa. Prof. Dr. Jose Antonio Zamora Zaragoza (CSIC) Zaragoza Zamora Jose Antonio Dr. Prof. lasco (CSIC/Madri – Blasco Maisco Jordi Dr. Prof. 19h30min às 22h 17h30 às 19 horas 19h30 às 22h10min 19h30min às 22h 14h30 às 17 horas Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU e Companheiros, Sala Ignacio Ellacuría no IHU e Companheiros, Sala Ignacio Ellacuría no IHU Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, Data: 10-10-2013 Data: Data: 10-10-2013 Data: 10-10-2013 Data: Data: 09-10-2013 Data: 09-10-2013 Data: tão do tempo em G. Agamben do tempo tão Evento: Messianismo e política: Paulo e a ques a e Paulo política: e Messianismo Evento: Palestrantes: Horário: Local: tradução. sem espanhol, em ministrada será palestra Esta http://bit.ly/WdV0ca Mais informações: - sinté Biologia Projeto Mesa-redonda: Evento: e humanidades tica Palestrantes: huma e sintética Biologia Conferência: Evento: nidades – IHU Ideias Palestrante: Espanha) Horário: Local: http://bit.ly/18dwutg Mais informações: Local: Local: http://bit.ly/12OpIXL Mais informações: cristãs: religiosas As tradições Palestra Evento: e Catolicismo Luteranismo Flávio Cleide e Pastor Pastora Ministrantes: Horário: Local: http://bit.ly/18t7x0d Mais informações: Evento: Estado de exceção: entre a e a máquina antropológica governamental máquina Palestrantes: nos Aires - UB Horário: Local: tradução. sem espanhol, em ministrada será palestra Esta http://bit.ly/WdV0ca Mais informações: – Espanha) (CSIC/Madri Blasco di Maisco Horário: Local: http://bit.ly/WdV0ca Mais informações: - Confira os eventos desta semana realizados pelo IHU. semana realizados desta eventos Confira os conferida pode ser eventos dos completa A programação do IHU (www.ihu.unisinos.br). no site Eventos Prof. Dr. Francisco Javier Guerrero Ortega Ortega Guerrero Javier Francisco Dr. Prof. Prof. Dr. Adriano PilattiDr. Prof. (Instituto Direito/ de Prof. Dr. Adriano PilattiDr. (InstitutoProf. Direito/ de Agenda de de Agenda 16h30min às 19h 17h às 19h 20h às 22h 19h30 às 22h10min 20h às 22h 17h30 às 19h Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, 1C108, na Unisinos Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU e Companheiros, Sala Ignacio Ellacuría Data: 08-10-2013 Data: Data: 03-10-2013 Data: Data: 02-10-2013 Data: Data: 02-10-2013 Data: Data: 02-10-2013 Data: Data: 02-10-2013 Data: Evento: Neurociências, saúde e sociedade Neurociências, Evento: Palestrante: (UERJ) Horário: Prof. Dr. Dalmo de Abreu Dallari (USP) Dalmo de Abreu Dr. Prof. Palestrante: Horário: http://bit.ly/1bMX8eT Mais informações: Evento: Palestra Constituição e Constituinte: li e Constituinte: Constituição Palestra Evento: Local: Mais informações: http://bit.ly/18t7x0d Mais informações: Evento: Palestra Tradições Religiosas Indígenas Religiosas Tradições Palestra Evento: Cledes Markus/COMIN Professora Ministrante: Horário: Local: mites, avanços, golpes e resistências golpes avanços, mites, Horário: Horário: Evento: Exibição Evento: do filme Inteligência Artificial 2001, 146 min). Spielberg, EUA, (Steven Local: http://bit.ly/17rKtiT Mais informações: Palestrante: Palestrante: http://bit.ly/1bMX8eT Mais informações: Evento: Evento: Palestra Vivências e Reflexões sobre o Processo Constituinte: o período préConstituição e pós PUC-RIO) Horário: Local: Mais informações: http://bit.ly/1bMX8eT Mais informações: Palestrante: Palestrante: PUC-RIO) Horário: Local: Evento: Evento: Palestra A Constituição no Tribunal Federal: Supremo A (des)construção da demo- brasileira cracia RO DE 2013 30 DE SETEMBRO LEOPOLDO, 428 | SÃO EDIÇÃO 72 www.ihu.unisinos.br IHU em Revista Veja algumasdasedições jápublicadas da Retrovisor gue eMarioNovello. Pulcini, Roberto Mancini, Marc Jongen, Marcello Buiatti, Claudio Tugnoli, Rèmi Bra- edição daIHU On-Line . Contribuem para este número: RobertoElena Manchesini, volvendoa transcendência levantadasdiscussões as são humanismo do estapor Disponível em:http://bit.ly/lgSa3O Edição 200,AnoVI,16-10-2006 O Pós-Humano O alcancepoder humano, do a hibridização come en- amáquinaosdilemas

cqueline Pitanguy deRomani. Daron,ElzaFernando Campos, Lefevre,Maria Télia Negrão, Rosângela Ja- Angeline Pulga Laodete Vanderléia Santos, dos Batista Sueli Alves Teófilo, Martins Marcella mercadode trabalho representaçãoe sua Discutem social. tema:o Gilberto Kac, as instâncias da sociedade. Desde os avanços constitucionais, ao papel feminino no On-Line Disponível emhttp://bit.ly/HaeWiN Edição 387,AnoXII,26-03-2012 em debate brasileira uma conquista asmulheres: para públicas Políticas e RaúlAntelo. Antonio da discussão cipam EduardoLink, Negri, Daniel Galeano, MarkT Parti- espanhol. e alemão em originalmente publicados Agamben sobre artigos de tradução da exclusivafilósofo,entrevistas além do contoucompesquisadores com nua, a IHUOn-Line vida a e No entanto, porocasiãolançamentodo de seulivro Disponível emhttp://bit.ly/cH3OMb Edição 81,AnoIII,27-10-2003 O Estado deexceção eavidanua:leipolítica moderna Revista IHUOn-Line Em uma edição voltada para discutir os direitos adquiridos das mulheres, a No ano de 2003,No anopoucose falavaainda italianopensador do Giorgio Agamben. convidouespecialistas dediversas áreasavaliam que os ganhos emtodas preparouesta edição especialsobre o autor. A edição

SÃO LEOPOLDO, 30DE SETEMB RO DE2013 |EDIÇÃO 428 Homo Sacer. O poder soberano erkessidis IHU IHU em Revista www.ihu.unisinos.br 73

------Cadernos IHU Cadernos Antropologia Antropologia filo

Escritos Escritos de filosofia VII Raízes – A edição nº 42 dos da Silva Alves Marcos Antonio fo brasileiro Henrique Cláudio Henrique Cláudio de Lima brasileiro fo baseia-se teórica cuja produção Vaz, pela antropolo uma tríade formada em - Antro as obras escreveu gia (Lima Vaz pologia filosófica I e de também autor (é ética pela II), sófica Escritos de filosofia IV e de Escritos de filosofia V) e pela metafísica (publicou ainda da Modernidade). O roteiro dialético per de Lima Vaz no discurso concebido corre a universalidade, a particularida Este ordem. de e a singularidade, nesta de monografia pela percorrido é roteiro sua abor que constrói Marcos, Antonio apresenta apresenta o movimento dialético de análise do agir éticointersubjetivo do ser humano no pensamento do filóso Ética e Intersubjetivida e Ética o texto publica segundo humano agir do filosofia a de: , Lima Vaz do filósofoAntonio Marcos do - Gru co-coordenador da Silva, Alves - da Fa – Gevaz, Vazianos po de Estudos – FCF. de Fortaleza culdade Católica Ética Intersubjetividade:e a fi- losofia do agir humano segundo Lima Vaz

– saber como instrumento para se alcançar a per se alcançar para instrumento – saber como   

 



      

 

       

Razão Razão prática  ()(! !

 

      !  "#$" %$&'   



  Esta e outras edições dos Cadernos IHU podem ser obtidas diretamente no Instituto Humanitas Unisinos – IHU ou – IHU Unisinos Humanitas Instituto no diretamente obtidas ser podem IHU Cadernos dos edições outras e Esta

dagem dagem analítica a partir do conceito aristotélico de Publicação em destaque Publicação solicitadas pelo endereço [email protected]. O solicitadas arquivo pelo da endereço edição [email protected]. nº 42 também está disponível em PDF no link http://bit.ly/16izSQC. feição moral. Assim, feição são pelo demonstrados autor doa Vazsistemática pensamento de eestrutura Lima oscontextos histórico e filosófico em que o mesmo produzido.é Em sua Vaz obra, Lima alerta para a necessidade de se pensar as relações éticasentre os seres humanos, de seconceber o outrocomo sujeito e nãocomo para objeto, que se supere o estágio atual da sociedade marcada contemporânea, por um individualismo e um porrelativismoexagerados, uma fragmentação da noção de ser humano, pelo predomínio da objetividade, pela precariedade dereconhecimento do e por uma ampla crise de valores. outro RO DE 2013 30 DE SETEMBRO LEOPOLDO, 428 | SÃO EDIÇÃO Acesse as redes sociais do

Instituto Humanitas Unisinos - IHU

facebook

blog twitter

74 SÃO LEOPOLDO, 30 DE SETEMBRO DE 2013 | EDIÇÃO 428 IHU em Revista www.ihu.unisinos.br 75 - - - - . Sterling: The Golden Fleece, Manipula História História da matemática: uma visão críti- ♦ ♦ ♦ ♦ ♦ ♦ ♦ ♦ ♦ ♦ ♦ ♦ ♦ Este é o primeiro livro de História da Matemática (HM) da Matemática História de livro o primeiro é Este ROQUE, Tatiana. ROQUE, Tatiana. 2012. Zahar, Janeiro: de Rio lendas. e mitos desfazendo ca, - de pesquisas e experiên resultado brasileiro, propriamente cias em sala a de aula, pela realizadas Efetivamente autora. autora cumpre o que anuncia no título: desconstrói vários de HM. tradicionais nos livros lendas e divulgados mitos o desenvol reconstruir não é a ideia da autora Entretanto, - com um saber unitário como dessa ciência, “vista vimento (p. 18), mas recontar que iriam se encaixando” de resultados pela acumulação posto essa história a partir dos modoscomo elafoi escrita. Emcada capítulo, há um relato fatores em conta mais ampla, levando seguido uma contextualização de tradicional culturais ou filosóficos que explicitam relaçõesentre aspráticas matemáticas e seu passado, do matemática a ver de modo novo um disponibilizar é intuito Seu contexto. Trata-se de Trata-se uma obra coletiva, quecompila artigos de DONINI, Antonio (Editor). tion and Independence in Humanitarian Action Kumarian Press, 2012 Press, Kumarian - do humanita do tema torno em autores renomados vários rismo e das suas relações com a política. A obra trata, em atores que diferentes em contextos suma, dos diferentes a par vantagem de uma posição buscam aparentemente tir da assistência humanitária prestada para seus satisfazer

da ação humanitária. Assim, a obra mostra, por vezes, os nobres efeitos do humanitarismo, e, em outros mo- em outros e, do humanitarismo, efeitos os nobres por vezes, mostra, Assim, a obra humanitária. da ação

Gabriela Mezzanotti coordenadoraé dos cursos deGraduação Pós-Graduação e em RelaçõesInternacionais da

Maria Cecilia Bueno Fischer é professora e gerente dos cursos de Licenciatura da Unisinos de Licenciatura dos cursos e gerente Maria Cecilia Bueno Fischer é professora Sala de Leitura de Sala Unisinos e cocoordenadora da Cátedra Sérgio Vieira de Mello Acnur/Unisinos Vieira Sérgio da Cátedra Unisinos e cocoordenadora manitárias, entre as quais a assistência em alimentos, saúde e educação, as medidas educação, saúde e alimentos, em as quais a assistência entre manitárias, Unidas, a fundos e das Nações programas e de ONGs a atuação e terrorismo contra humanitária. da assistência os modos de “instrumentalização” por explorar acaba obra os princípios da entre tensão a clara demonstram Esses modos de instrumentalização imparcialidade, independência neutralidade, e humanidade, de um e, lado, a de realidade políticaoutro, e a econômica, realpolitik mentos, a para servirassistência prestada mais a quem a do provê que àqueles a quem se Recomendodestina.o livro a todos que queiram entender melhor as atuais crises mundiais, como o conflito na Síria, a partir de um olhar mais crítico atualidade. o poder na que definem os instrumentos sobre próprios próprios objetivos. Ao analisarcasos Sudão específicosocorridos(re- noAfeganistão, hu de assistências diferentes formas bem como gião de Darfur), Somália e Paquistão, RO DE 2013 30 DE SETEMBRO LEOPOLDO, 428 | SÃO EDIÇÃO “desfazendo a imagem eromantizada heroica que“desfazendo a e envolve tem sidoreproduzida pela mitificação de suahistória” (p. 19). Creio que é uma obra necessária para professores de matemática e uma sugestão de leitura aos interessados em dessa ciência. melhor a história compreender - Consejo Conse - Csic) , , que ocorrerá de 21 a 24 de outubro de http://bit.ly/ihuon 10-10-2012 Conferência: Biologia sintética e humanidades – IHU ideias ( Blasco Maiso Jordi Dr. Prof. Palestrante: jo Superior de Investigaciones Científicas Horário: das 17h30 às 19h Local: Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU 24-10-2013 A filosofia da tecnologia de Simondon: a centra- lidade da mecanologia Ivan Domingues (UFMG) Dr. Prof. Palestrante: Horário: das 19h30 às 22h Local: Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU - - II Seminário em preparação ao XIV Simpósio Internacional IHU – - Csic/Madri- Espanha), e o Prof. Dr. Ivan Domingues (UFMG). Dr. - Csic/Madri- Espanha), e o Prof. Consejo Superior de Inves Csic) twitter.com/ihu Biologia sintética em debate no debate em sintética Biologia Instituto Humanitas Unisinos - IHU Unisinos Humanitas Instituto

O II Seminário, em 2013/2, é promovido pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU em parceria com os com parceria em IHU - Unisinos Humanitas Instituto pelo promovido é 2013/2, em Seminário, II O Em continuidade aos debates do Em continuidade

revo-luções tecnocientíficas, culturas, indivíduos e sociedades II Seminário tigaciones Científicas - Confira a programação: 08-10-2013 Neurociências, saúde e sociedade Or Guerrero Javier Francisco Dr. Prof. Palestrante: tega (UERJ) Horário: das 17h às 19h Local: Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU 10-10-2013 Mesa-redonda: Projeto Biologia sintética e - huma nidades José Palestrante: Prof. Antônio Dr. Zamora e Prof. ( Blasco Maiso Jordi Dr. Horário: das 14h30 às 17h no IHU Local: Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, Programas de Pós-Graduação em Ciências Sociais, Direito, Educação, Filosofia e Saúde Coletiva e com e Coletiva Saúde e Filosofia Educação, Direito, Sociais, Ciências em Pós-Graduação de Programas as graduações em Filosofia e Jogos Digitais, além das Escolas de Direito, Gestão e Negócios, Huma- nidades, Indústria Criativa: Comunicação, Design e Linguagens, Saúde e Politécnica. Em sua segunda edição, o Seminário está sendo organizado pela Universidade do do Vale Rio dos Sinos (Unisinos), se- diado no Campus de São Leopoldo, RS. 2014, o Ins-tituto Humanitas Unisinos – IHU apresenta cinco eventos cujo eixo de discussão orbita em Francisco Dr. Prof. palestrantes: seguintes os presentes Estarão sintética. Biologia da questão da torno Javier Guerrero Ortega (UERJ), Prof. José Dr. Antônio Zamora e Prof. Jordi Dr. Maiso Blasco ( Superior de Investigaciones Científicas Contracapa IHU em Revista