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Versão Oficial – CHICO SCIENCE F68 E S T Ú D I O F - programa número 68

Á U D I O T E X T O

Música-tema entra e fica em BG;

Locutor - A Rádio Nacional apresenta ESTUDIO F, Momentos Musicais da Funarte

Apresentação de Paulo César Soares

Paulo César : - Alô, amigos! No programa de hoje, um meteoro que passou pela MPB nos anos 90, lançando a semente do que ficou nacionalmente conhecido como Movimento Manguebeat. Misturando ritmos pernambucanos a elementos do Hip Hop e da cultura pop, esse cara criativo e inteligente balançou as estruturas e até hoje faz a cabeça de muita gente.

Entra trecho de “Maracatu Atômico” fica brevemente e cai em BG.

Paulo César: - Diretamente do mangue, o caranguejo com cérebro sintoniza o Estúdio F. Chico Science está no ar!

Sobe som e rola inteira

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Paulo César: - A Black Music fazia a cabeça de Franciso de Assis França, quando ele – ainda menino – na sua natal, gostava de ouvir o som de James Brow, , Kurtis Blow e outros papas do americano. Seu gosto musical o levou ao break, dança cujos passos difundidos por Michael Jackson tomavam o mundo de assalto em 1984. Foi nesse ano que Francisco entrou para a “Legião Hip Hop”, uma das principais gangues de dança de rua de . Três anos depois, resolveu investir pra valer na carreira de músico. Formou sua primeira banda: a “Orla Orbe”, que serviu de aquecimento para um projeto mais ousado: o “Loustal”, banda cujo nome era inspirado no famoso quadrinista francês Jacques de Loustal. A idéia desse grupo era misturar soul, funk e hip hop com rock dos anos 60. Àquela altura, graças às suas alquimias sonoras, o inventivo Francisco já havia sido propriamente rebatizado de Chico Science que, da lama ao caos, alcançou antes a fama.

Entra “Da Lama ao Caos” e rola inteira.

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Paulo César: - Em 1991, por intermédio do percussionista Gilmar Bolla 8, Chico conheceu o bloco afro “Lamento Negro” que trabalhava com educação popular no centro comunitário “Daruê Malungo”, na periferia do Recife. A explosão contagiante do trabalho de percussão do bloco impressionou Chico a tal ponto que, a partir daquele momento, mudou todo seu referencial sonoro, passando a trilhar um rumo distinto. Se até então o que ele se propunha era misturar todas as suas influências sonoras importadas com alguma pitada de brasilidade, as regras do jogo se inverteram. O maracatu, o côco de roda, o caboclinho, a ciranda, o samba e a embolada começaram a predominar, dividindo espaço com guitarras pesadas, numa mistura pra lá de psicodélica que invadiu a cidade.

Entra “A Cidade” e rola inteira.

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Paulo César: - Essa mistura de sons foi mostrada pela primeira vez no Espaço Oásis, em Olinda, em junho de 1991. A essa altura, a banda já era chamada de “Chico Science e Nação Zumbi”. O público pernambucano foi ao delírio e, por um bom tempo, teve a exclusividade de conferir este novo estilo sonoro que acabou se disseminando entre várias bandas do estado. A partir daí, várias outras apresentações aconteceram, junto com outros grupos do Recife como o “Mundo Livre S/A”. A platéia reunia os tipos mais diversos: músicos, jornalistas, artistas plásticos, punks. O elo entre todos era o gosto por música, fosse qual fosse o tipo ou a origem. Os jornais locais começaram a abrir espaço para a nova cena musical que fervilhava no Recife. A matéria na qual a palavra mangue apareceu pela primeira vez para designar o novo estilo musical foi publicada em primeiro de junho de 1991 no Jornal do Comércio. No texto, Chico Science dá a seguinte explicação sobre o novo gênero: “O ritmo se chama mangue, uma mistura de samba-reggae, rap, raggamuffin e embolada. O nome homenageia o “Daruê Malungo”, que é um núcleo de apoio à criança e à comunidade carente de Chão de Estrelas”. Explicações à parte, o fato é que o novo som foi como um maracatu de tiro certeiro, que atingiu em cheio a cabeça de toda uma geração.

Entra “Maracatu de Tiro de Certeiro” e rola inteira.

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Paulo César: - Em 1992, uma coletânea começou a ser elaborada com músicas de “Chico Science e Nação Zumbi” e “Mundo livre s/a”, batizada de “Caranguejos com Cérebro”, mesmo nome de um manifesto escrito por integrantes do manguebeat. Dividido em três partes, o manifesto aborda o conceito, a cidade e a cena em torno do movimento. Define os mangueboys e as manguegirls como indivíduos interessados em hip- hop, colapso da modernidade, caos, ataques de predadores marítimos (principalmente tubarões), moda, Jackson do Pandeiro, Josué de Castro, rádio, sexo não-virtual, sabotagem, música de rua, conflitos étnicos, midiotia, Malcom Maclaren, Os Simpsons e todos os avanços da química aplicados no terreno da alteração e expansão da consciência. Por fim são enfáticos ao fazerem a seguinte afirmação: “Bastaram poucos anos para os produtos da fábrica mangue invadirem o Recife e começarem a se espalhar pelos quatro cantos do mundo. A descarga inicial de energia gerou uma cena musical com mais de cem bandas. No rastro dela, surgiram programas de rádio, desfiles de moda, vídeo clipes, filmes e muito mais. Pouco a pouco, as artérias vão sendo desbloqueadas e o sangue volta a circular pelas veias da Manguetown” .

Entra “Manguetown” e rola inteira.

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Paulo César: - No próximo bloco, Chico Science lança primeiro CD, vira fashion e cria frases de efeito.

Locutor: - Estamos apresentando Estúdio F, Momentos Musicais da Funarte.

I N T E R V A L O

• Insert Chamada Funarte

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BLOCO 2 Locutor: - Continuamos com Estúdio F

Entra “A Cidade”, rapidamente cai em BG (bem baixinho mesmo) e permanece brevemente durante a fala de Paulo César.

Paulo César: - Em 1993, após passarem por São Paulo e Belo Horizonte, Chico Science & Nação Zumbi foram descobertos no resto do país. A imprensa especializada não poupou rasgados elogios ao som do grupo, o que lhe valeu um contrato assinado com a . Pelo selo Caos, lançaram o disco “Da Lama ao Caos”. Produzido por Liminha e gravado no estúdio Nas Nuvens, no Rio, o disco atendeu a todas as expectativas daqueles que já haviam assistido o grupo ao vivo. O álbum era o que faltava para o Brasil inteiro perceber que o “manguebeat” era algo mais sério do que um modismo passageiro. A faixa "A Cidade" logo estourou nas rádios e "A Praieira" foi parar na trilha sonora da novela "Tropicaliente" e na boca do povo, graças ao refrão "Uma cerveja antes do almoço é muito bom/Pra ficar pensando melhor".

Entra “A Praieira” e rola inteira.

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Paulo César: - Com o reconhecimento obtido por meio do álbum “Da Lama ao Caos”, Chico Science e Nação Zumbi foram parar no cinema. Ao lado de Mestre Ambrósio e Mundo Livre S/A – outros expoentes do MangueBeat – a banda brilhou na trilha sonora do filme “Baile Perfumado”. Lançado em 1995, o mangue movie dirigido por Lírio Ferreira e Paulo Caldas arrebatou prêmios país afora, projetando ainda mais o movimento musical que fervilhava em Recife. Science e Nação participam das faixas “Salustiano Song”, “Angicos” e também “Sangue de Bairro” que vamos ouvir na seqüência.

Entra “Sangue de Bairro” e rola inteira.

Paulo César: - De acordo com José Teles, autor do livro “Do frevo ao manguebeat”, o movimento liderado por Chico Science foi responsável por uma verdadeira revolução em sua terra de origem. Pela primeira vez, desde a década de 60, os pernambucanos mostraram uma auto-estima comparável à dos baianos. Até a moda, algo que nunca havia sido o forte da cidade, revelou estilistas que começaram a ser conhecidos nacionalmente. Sobre a mangue fashion, Chico Science declarou: “Recife tem a tradição dos mascates. A gente procura achar coisas interessantes nos camelôs e também reciclar roupas velhas. O barato é usar a criatividade e misturar as coisas. Pode botar um Bamba, com uma calça legal de tergal, um chapéu de palha ou de velho, camisas coloridas, óculos antigos ou de metalúrgico”. De fato, o visual de Chico Science tinha muito a ver com os caboclos de lança do maracatu rural, que calçam tênis e põem óculos escuros comprados em camelôs. O curioso é que, até hoje, nos festivais de rock da região, é possível ver garotos vestidos como o líder da Nação Zumbi, mangueboys antenados em busca de boa diversão.

Entra “Antene-se” e rola inteira.

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Paulo César: - Em suas primeiras entrevistas, Chico Science – ainda desacostumado a lidar com a imprensa – falava pouco e se atrapalhava na hora de articular as idéias. Mas, em questão de meses lidando com a mídia, conseguiu não só vencer a timidez, bem como criar frases de efeito de grande repercussão. Em entrevista ao jornalista Luís Cláudio Garrido do jornal A Tarde de Salvador, por exemplo, Chico disse sobre o maracatu em 1994: “Se a gente for tocar maracatu do jeito que ele é, a galera vai pegar no nosso pé. Então, a idéia básica do manguebeat é colocar uma parabólica na lama e entrar em contato com todos os elementos que têm para uma música universal. Isto fará com que as pessoas futuramente olhem para o ritmo como ele era antes” . Já sobre o frevo, Science, em entrevista ao jornalista José Telles no Jornal do Comércio de Recife, declarou: “Nos shows, quando a banda apresentava a música “Coco Dub”, tocava alguns acordes de “Vassourinhas”. A gente pretende dinamizar o frevo”.

Entra “Coco Dub” e rola inteira.

Paulo César: - No próximo bloco, o manguebeat ganha o mundo e Chico sai de cena precocemente.

Locutor: - Estamos apresentando Estúdio F, Momentos Musicais da Funarte.

I N T E R V A L O

• Insert Chamada Funarte

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BLOCO 3

Locutor: - Continuamos com Estúdio F

Entra “O Cidadão do Mundo”, cai em BG (bem baixinho mesmo) e permanece durante a fala de Paulo César.

Paulo César: - Sucesso no Brasil, Chico Science e Nação Zumbi começaram a excursionar e mostrar as histórias do mangue mundo afora. Participando de festivais nos Estados Unidos ou fazendo shows pela Europa, foram deixando sua marca por onde passavam, preparando o terreno para novas idéias - e para o novo disco. Durante uma dessas viagens, aconteceu uma história curiosa: ao saber que os pernambucanos estavam participando de um concerto no Central Park, que era o astro do espetáculo pediu que os organizadores colocassem a banda para se apresentar no mesmo dia que ele. Science e Nação então abriram o show de Gil e, depois, todos cantaram juntos. O público americano pode até ter estranhado a mistura, mas a crítica do New York Times adorou e publicou a seguinte observação: “Com cinco percussionistas suingando e um som funk minimalista bem pessoal, “Chico Science e Nação Zumbi” podem levar a cabo o que apenas um grupo seleto de músicos, incluindo Mr. Gil, podem conseguir. Ou seja, criar algo híbrido capaz de desenvolver um estilo que um dia será reprocessado por outra geração” .

Entra “Macô” e rola inteira.

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Paulo César: - A música “Macô” que acabamos de ouvir tem a participação de Gilberto Gil. Essa faixa é um dos destaques do segundo álbum de Chico Science e Nação Zumbi, intitulado “Afrociberdelia”. Em entrevista à revista virtual “Up to Date” Science deu a seguinte explicação para o título do álbum: “Afrociberdelia, de África, o ponto de fusão do maracatu, da cibernética, da psicodelia. Afrociberdelia é um comportamento, é um estado de espírito, é uma ficção, é a continuação de “Da Lama ao Caos”. Afrociberdelia é tudo isso”. Acima de qualquer definição, o fato é que o grupo voltou mais maduro aos estúdios para gravar esse segundo álbum em 1996. Deixaram o produtor de lado e assumiram o comando do disco, deixando que pitadas eletrônicas permeassem o trabalho que, além da participação especial de Mr. Gil, contou também com Fred 04 do Mundo Livre S/A e de Marcelo D2. Curiosamente, o carro-chefe desse álbum foi a faixa “Maracatu Atômico”, composição de Jorge Mautner e Nelson Jacobina que já havia sido sucesso na voz de Gilberto Gil.

Entra “Maracatu Atômico” e rola inteira.

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Paulo César: - O ano de 1996 foi particularmente produtivo para Chico Sciense que começava a se entrosar com o meio artístico do Rio de Janeiro. Além disso, havia mais uma turnê programada para a Europa e ainda uma possível parceria entre ele e Max Cavalera, do Sepultura. Seu segundo disco “Afrociberdelia” – considerado difícil – estava vendendo bem mais que “Da Lama ao Caos”, seu trabalho de estréia. Para completar a boa fase, o terceiro disco começava a ficar pronto em sua cabeça. A produção seria de Mario Caldato, um americano filho de brasileira, conhecido por seu trabalho com a banda “Beastie Boys”. Enfim, o futuro prometia ainda muitos rios, pontes e overdrives.

Entra “Rios, Pontes e Overdrives” e rola inteira.

Paulo César: - A boa fase de Chico Science e Nação Zumbi foi tragicamente interrompida no dia 2 de fevereiro de 1997, quando o bandleader morreu num acidente de carro na fronteira entre o Recife e Olinda . Novamente, o músico pernambucano foi destaque no New York Times. A notícia dizia: “Chico Science, altamente celebrado como o futuro da música brasileira, morreu domingo em um acidente automobilístico próximo à cidade nordestina do Recife, onde morava. Ele tinha 30 anos”. Naquela noite, Chico - feliz com a vida - enquanto guiava na reta que leva a Olinda, talvez tenha cantarolado os versos de “Criança de Domingo”: “Eu sábado vou rodar/ Criança de Domingo/ Sem saber guiar/ Amanhã tem mais/ Segunda é um dia lindo/ Faça chuva ou faça sol/ Amo meu domingo...”

Entra “Criança de Domingo” e rola inteira.

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Entra música-tema do Estúdio F e fica em BG;

Paulo César: - O programa de hoje foi roteirizado pelo jornalista Cláudio Felicio. O Estúdio F é apresentado toda semana pela Rádio Nacional do Rio de Janeiro e nas Rádios Nacional de Brasília e da Amazônia, emissoras EBC - Empresa Brasil de Comunicações. Os programas da série também são uma das atrações do Canal Funarte. Acessem a nossa rádio virtual. O endereço é www.funarte.gov.br/canalfunarte . Cultura ao alcance de um clique! Você também pode ouvir o programa pelo site da Radiobras: www.radiobras.gov.br . Quem quiser pode escrever para nós, o endereço é: Praça Mauá número 7 - 21 andar, Rio de janeiro - CEP/ 20081-240 Se quiser mandar um e-mail, anota aí: [email protected]

Paulo César: - Valeu Pessoal! Até a próxima!!!

ENCERRAMENTO/ FICHA TÉCNICA

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