2 MÓDULO USO E OCUPAÇÃO DO SOLO COM ÊNFASE NA VEGETAÇÃO NATIVA

2.1 INTRODUÇÃO

O processo de ocupação do território, determinado por condicionantes naturais e sociais, e as suas conseqüências sobre os sistemas ecológicos, produzem efeitos na paisagem e no ambiente que precisam ser compreendidos para que possam ser oferecidas alternativas para o futuro de nossas sociedades no rumo da sustentabilidade. O uso e a ocupação do solo são o reflexo de atividades econômicas, como a industrial e a agrícola entre outras, que são responsáveis por alterações na qualidade da água, do ar, do solo e de outros recursos naturais, que interferem diretamente na qualidade de vida da população. Em relação à vegetação nativa, as transformações econômicas e sociais que acompanham a industrialização e a urbanização, via de regra ocasionam sua eliminação ou fragmentação em pequenas áreas residuais, na maioria das vezes isoladas umas das outras. Normalmente permanecem nos locais mais íngremes, nos terrenos alagados ou nos topos de morro. No meio urbano os fragmentos constituem-se verdadeiras ilhas de vegetação nativa, camuflados por edificações. Neste sentido, é de grande importância a implementação de políticas públicas que estimulem a melhora da conectividade entre os fragmentos remanescentes, seja construindo novos corredores florestais ou melhorando os já existentes e que também incentivem a preservação ou recuperação de áreas de recargas de aqüíferos, topos de morros, encostas íngremes, entre outras.

2.2 DEFINIÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO

A área de estudo do projeto situa-se na porção centro-leste do Estado de entre as latitudes 22º30'00''S / 22º57'30''S e longitudes 47º22'30''W / 46º55'00''W Abrange total ou parcialmente os seguintes municípios , Hortolândia, Sumaré, , Paulínia, Americana, , Cosmópolis, Artur Nogueira, e Jaguariuna, como apresentado na Figura 2.1.

8 Figura 2.1 - Divisão político-administrativa. Municípios que compõem a área de estudo.

2.2.1 Delimitação da área de estudo

O critério utilizado inicialmente foi o círculo de 20 quilômetros de raio, a partir do centro da cidade de Paulínia. Em seguida foram traçados os limites de bacias hidrográficas, que se constituíram no principal parâmetro para a determinação da área do projeto. Nesta área foi feita a localização das indústrias consideradas prioritárias. Foram então promovidas reuniões com os grupos responsáveis pelo monitoramento da qualidade do ar, das águas superficiais e das águas subterrâneas para a discussão dos limites geográficos estabelecidos. O Rio foi seccionado no cruzamento com a Ponte da Estrada de Ferro. O Rio Camanducaia, no Ponto de Amostragem de qualidade de água da CETESB (CD 2500). O Rio Jaguari, na passagem da linha férrea, na área urbana de Jaguariuna. O Rio , no Posto Fluviométrico do DAEE na localidade de Desembargador Furtado. Cursos d'água secundários como o Ribeirão Pirapitingui e o Ribeirão do Pinhal, foram cortados no limite do círculo de 20 quilômetros de raio. A partir destes cortes foi traçado o perímetro da área do projeto, respeitados os limites das sub-bacias hidrográficas, de acordo com a Figura 2.2.

9 Figura 2.1 - Demarcação da área do projeto

2.2.2 Identificação de situações de uso e ocupação do solo

2.2.2.1 Elaboração da Carta de Uso e Ocupação do Solo

Os documentos utilizados foram os seguintes: Base Cartográfica Digital Escala 1:50.000, formato DXF (hidrografia, limites municipais e estradas) Inventário Florestal do Estado de São Paulo, anos 1988 e 2000, formato DXF (mata, capoeira, reflorestamento ,várzea e áreas urbanas 1978) Interpretação de imagem de satélite Landsat 7ETM, bandas 3, 4 e 5, cena 219/076, de 03.09.99, com correção geométrica efetuada a partir da base IBGE 1:50.000 digitalizada.

10 Tabela de coordenadas geográficas com a localização das indústrias prioritárias (baseado no Inventário de Fontes Poluidoras da CETESB). Os softwares empregados em diferentes momentos do trabalho foram: - SPRING/ IMPIMA/ SCARTA/ IPLOT, versão 3.5 - MGE, versão 07.01 - CORELDRAW, versão 8.

A confirmação de informações duvidosas foi feita através de levantamento em campo. O principal resultado desta atividade foi a elaboração da "Carta de Uso e Ocupação do Solo da Região de Paulínia", que constitui elemento essencial para o conhecimento dos condicionantes que interferem na qualidade ambiental de uma região. Neste sentido, a referida carta foi concebida de forma a retratar as atividades e as formas de ocupação características da área, mas também como base cartográfica para o mapeamento de dados relacionados à qualidade ambiental. Estas informações estão consolidadas na Carta de Uso e Ocupação do Solo apresentada no Anexo 1. A interpretação da imagem orbital (Landsat 7 ETM) permitiu identificar cinco categorias principais de uso do solo: área urbanizada; área de expansão urbana; condomínios residenciais ou de chácaras fora da área urbana; áreas não cultivadas ou sem utilização; áreas agrícolas ou de pastagens, acrescidas de outras quatro categorias obtidas do Inventário Florestal do Estado de São Paulo 2000 (mata; capoeira; reflorestamento; vegetação de várzea). As porcentagens da área ocupada por cada categoria são apresentadas na Figura 2.3.

2% 2% 1% 15%

1% URBANO 2% EXPANSÃO URBANA CHÁCARAS/CONDOMÍNIOS ÁREA SEM UTILIZAÇÃO AGRICULTURA/PASTAGEM 22% MATA 55% CAPOEIRA REFLORESTAMENTO

Figura 2.1 - Categorias de uso e ocupação do solo da Região de Paulínia (%)

11 Uso agrícola: A agricultura da região é extremamente tecnificada, vinculada à agroindústria, com grandes extensões ocupadas por cana-de-açúcar, além de cítricos, tomate e estufas de flores (na região de Holambra, Jaguariuna e Artur Nogueira). Também é significativo o cultivo do milho. As pastagens estão localizadas na região leste da área e também na porção sudoeste, nos arredores de e Americana. Na tabela 2.1 são apresentadas as áreas ocupadas com as principais culturas da região.

Tabela 2.1 - Área ocupada pelas principais culturas na região de Paulínia

Área Cultivada (ha)

Arroz Aveia Feijão Milho Soja Sorgo Cana - de - açúcar Laranja

107,7 133,9 1344,7 13.755,8 400,8 418,2 44.156,8 26.390,7

Fonte: Instituto de Economia Agrícola (IEA) 1995/1996 De acordo com o IEA, as pastagens ocupam 53.467,5 hectares e existem cerca de 7.500 hectares de área inaproveitada ou inaproveitável. Apenas a título de comparação, estima- se que a área total abrangida pelo projeto seja de 245.000 hectares. Uso Urbano: A atual ocupação urbana foi obtida através da interpretação manual da imagem LANDSAT 7(1999). O levantamento efetuado em 1978 (Instituto Florestal) quando cotejado com as informações agora levantadas, permitiu a elaboração do "Mapa de Evolução das Manchas Urbanas" apresentado no Anexo 2. Verifica-se na área classificada como uso urbano, um crescimento da ordem de 9,6 vezes no período de 1978 a 1999, acompanhado de um aumento populacional de cerca 2 vezes. Preferencialmente a expansão das áreas urbanas ocorrem ao longo das rodovias, particularmente a Via Anhangüera, com um eixo de conurbação que se estende da cidade de Campinas até a cidade de Americana, passando por Hortolândia, Sumaré e Nova Odessa. O mesmo fenômeno ocorre na rodovia Campinas-Paulínia e, em menor escala, na rodovia Campinas-Jaguariúna. Também em direção a Monte-Mor e pode-se perceber o processo de crescimento de bairros periféricos que se juntam uns aos outros ao longo da rodovia, tendendo à formação de uma mancha contínua. O crescimento urbano reflete basicamente o crescimento populacional. Tomando-se os dados do Censo correspondentes ao período dos mapeamentos, que abrange um intervalo de cerca de 20 anos, constata-se que o número de habitantes chega a quintuplicar em cidades como Monte-Mor e Artur Nogueira. E praticamente dobra para cidades como Campinas, Americana e Limeira., Além disso, o percentual de urbanização se eleva em todos os municípios, sendo que alguns deles como Artur Nogueira, Monte- Mor e Jaguariúna perdem sua característica eminentemente rural e passam a apresentar taxas de mais de 80% de urbanização, o que significa que boa parte da população passa a residir nas áreas urbanas neste período. Os dados do Censo para os municípios da área de estudo estão contidos na Tabela 2.2. O impacto deste ritmo de urbanização na degradação ambiental é imenso se forem consideradas questões como o abastecimento de água, a implantação do sistema de coleta e tratamento de esgoto, o aumento de poluição atmosférica devido ao transporte, a

12 implantação da coleta e disposição de lixo urbana, a impermeabilização do solo e a destruição de vegetação nativa. Além do crescimento urbano da cidade como espaço contínuo, o mapeamento do uso e ocupação do solo detectou a existência de um grande número de condomínios residenciais e de chácaras localizados fora das áreas urbanas. Todo o entorno do Reservatório do Salto Grande é ocupado por este tipo de propriedade. Na rodovia Campinas-Jaguariúna é significativo o número e a dimensão destes condomínios. E, finalmente, na região de Monte-Mor e Indaiatuba este tipo de ocupação é considerável.

Tabela 2.2 - Dados do Censo 1980-2000 Taxa de Taxa de População População População População Município Urbanização Urbanização Urbana Urbana Rural Rural 1980 1980 (%) 2000 (%) 1980 2000 2000 Americana 99,79 99,76 121.300 181.650 252 434 Artur Nogueira 43,78 91,99 6.918 30.437 8.884 2.652 Campinas 89,01 98,34 589.310 951.824 72.682 16.097 Cosmópolis 81,28 95,82 18.750 42.511 4.317 1.856 Holambra * - - - 3.958 - 3.273 Hortolândia* - - - 151.669 - - Indaiatuba 86,21 98,43 48.051 144.528 7.680 2.301 Jaguariúna 61,00 87,16 9.208 25.669 5.885 3.781 Limeira 91,53 95,71 137.122 237.959 12.676 10.673 Monte Mor 49,12 91,56 6.823 33.980 7.067 3.131 Nova Odessa 89,24 97,72 19.405 41.106 2.338 960 Paulínia 91,95 98,90 18.919 50.677 1.654 565 Sto. Antonio 65,50 80,87 7.090 14.673 3.735 3.472 de. Posse Sumaré 94,08 98,58 94.643 193.266 5.946 2.789

(*) Municípios emancipados em dezembro de 91. Hortolândia é desmembrada de Sumaré. Holambra de Jaguariuna, Santo Antonio de Posse, Artur Nogueira e Cosmópolis Fonte: Fundação SEADE – Sistema de Análise de Dados do Estado de São Paulo.

Remanescentes de Mata Nativa: Na região de estudo predomina a floresta estacional semidecídua, constituídas pelas matas mesófilas. Trata-se de uma floresta estratificada com caráter semicaducifólio. Distribui-se amplamente pelo interior do Estado, restringindo-se atualmente a fragmentos localizados principalmente em fundo de vales e encostas íngremes, que apresentam dificuldade a outros tipos de ocupação. As matas ciliares, situadas ao longo dos rios, assemelham-se estruturalmente às matas mesófilas. As variações no regime hídrico dos rios pode também condicionar o aparecimento de outras formações ciliares, de composição e estrutura significantemente diferentes.

13 Não menos importante, mas menos presente na região, são os cerrados e cerradões, que apesar do aspecto arbóreo, difere das demais tipologias florestais pela estrutura e, sobretudo, pela esclerofilia dos seus elementos florísticos. De uma forma geral, é possível perceber que esta região encontra-se sob forte pressão de expansão urbana e industrial. Observa-se ainda que existe expressiva atividade agrícola, pecuária e áreas ocupadas por reflorestamento. Em função do processo de ocupação do espaço por estas atividades, a vegetação nativa acaba sendo eliminada, fragmentada em pequenas áreas residuais, na maioria das vezes isoladas umas das outras. Via de regra, no meio rural, permanecem nos locais mais íngremes, nos terrenos alagados ou nos topos de morro. Já no meio urbano os fragmentos constituem-se em pequenas ilhas de vegetação nativa em meio às edificações. A situação dos remanescentes de vegetação nativa está contida no Anexo 3. Certamente, as causas estão associadas principalmente ao crescimento desordenado das cidades, à crescente pressão imobiliária, bem como à expansão das áreas agrícolas e industriais, não raras vezes contrariando a legislação existente para a proteção de vegetação. No mapeamento resultante da interpretação do uso e ocupação do solo, constata-se que em um intervalo de tempo de cerca de vinte anos, a área ocupada por mata diminuiu na proporção em que a área classificada como capoeira aumentou. Como a definição de capoeira é justamente a de mata que passou por um processo de degradação, pode-se concluir que quase metade das matas existentes na região em 1988 sofreu degradação ou foi simplesmente eliminada, conforme Figura 2.4.

60 50 40 1988 30 2000 20 10 0 MATA CAPOEIRA REFLORESTAMENTO

Figura 2.2 - Área ocupada por vegetação remanescente e reflorestamento (km 2) (1988-2000)

Os poucos remanescentes de vegetação nativa, detectados no mapeamento de uso e ocupação do solo, estão isolados na forma de pequenos fragmentos, cercados pelo uso agrícola, geralmente plantações de cana-de-açúcar. As concentrações mais significativas destes fragmentos estão descritas a seguir: Na região de Monte-Mor : fragmentos de capoeira em uma área de pequenas propriedades, nas cabeceiras do Córrego do Monjolinho, do Ribeirão do Pombal e do Córrego Água Choca, onde existe também uma mancha de mata natural de dimensão significativa; mata natural e capoeira estão presentes também nas margens do Ribeirão dos Toledos. Na região de Cosmópolis: às margens do Rio Jaguari, próximas ao Reservatório do Tatu, manchas de mata de dimensão significativa; manchas contínuas de capoeira ao longo de

14 afluentes do Jaguari (Ribeirão dos Pires; Córrego do Paredão; Ribeirão do Pinhal); um “continuum” de mata natural ao longo do Córrego Canguçu. Na região de Artur Nogueira e Holambra: Ribeirão Pirapitingui, que apresenta a mata ciliar quase que totalmente preservada, e os fragmentos de mata e capoeira presentes em seus afluentes (Córrego Santa Maria, Córrego do Laranjal, Córrego da Estiva e Córrego da Glória na margem esquerda; Córrego das Três Barras, Ribeirão Boa Vista, Córrego da Figueira e Córrego do Passo ou de Manoel Dias na margem direita); . Na região de Jaguariúna: manchas esparsas de mata e capoeira, algumas de dimensões consideráveis, às margens dos rios Camaducaia e Jaguari, próximo da área urbana de Jaguariuna. Na região Sudeste da área de estudo, nas proximidades de Sousas: em função do relevo mais acidentado, os fragmentos remanescentes de mata e capoeira são numerosos nesta área, onde predominam as pastagens e o reflorestamento com eucaliptus. Na região de Paulínia: nas nascentes do Córrego Meia Lua, afluente da margem esquerda do Rio Jaguari, há uma grande área de mata e capoeira; às margens do Rio Atibaia encontra-se o único remanescente significativo de vegetação de várzea da região. Além dos remanescentes de vegetação nativa citados existem, na área de estudo, três Unidades de Conservação: · Área de Relevante Interesse Ecológico Mata de Santa Genebra (251,77 hectares), Decreto n.º 91.885 de 05.11.85 · Área de Relevante Interesse Ecológico Matão de Cosmópolis (174 hectares), Decreto n.º 90.791 de 09.01.1985, com o objetivo de proteger a biota nativa (cerrado) que em grande parte pode ser considerada muito rara na região. · Parque Ecológico Monsenhor Emílio José Salim (285 hectares), Decreto Estadual 27.071/87 Uso e Ocupação interno ao perímetro das indústrias: Aproveitando o questionário enviado as indústrias no intuito de realização do inventário das fontes industriais, foram incluídas perguntas relativas à questão de ocupação do espaço interno nas indústrias, a fim de saber o grau de implantação de medidas mitigadoras, o tipo de atividades agrícolas desenvolvidas, bem como verificar a existência de fragmentos de vegetação nativa sob tutela das indústrias. Diante destes dados, foi possível verificar, de forma indireta, o grau de mitigação de impactos visuais e atmosféricos em função da implantação de cortina vegetal, bem como saber o risco a que os trabalhadores estão expostos, em função da produção agrícola potencialmente contaminada a que o trabalhador está sujeito de forma inadvertida. Ressalta-se que como nem todas as indústrias responderam o questionário ou as perguntas pertinentes a este tema, os resultados desta pesquisa estão expressos em porcentagem, conforme segue: · 34% das indústrias possuem cortina vegetal, fechando uma média de 66% do perímetro do empreendimento. · 10% das indústrias possuem árvores frutíferas dentro do perímetro do empreendimento. Ressalta-se que dependendo da atividade desenvolvida pela indústria, seus frutos podem representar risco, em função do consumo humano de alimento contaminado ou mesmo de disponibilizar contaminantes para a cadeia

15 alimentar. Portanto, cabe uma análise preliminar a fim de avaliar tais riscos e escolher espécies que não representem perigo desta natureza. Apenas 15 % das indústrias possuem remanescente de vegetação nativa em suas propriedades, que poderiam ser averbadas ou mantidas a título de compensação ambiental

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