UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ INSTITUTO DE CIÊNCIAS DO MAR PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS MARINHAS TROPICAIS

CARLA SUZY FREIRE DE BRITO

ECOLOGIA POPULACIONAL DO BIVALVE, Cyanocyclas brasiliana (Deshayes, 1854) NO ESTUÁRIO DO DELTA DO RIO PARNAÍBA, PIAUÍ, BRASIL

FORTALEZA

2016

CARLA SUZY FREIRE DE BRITO

ECOLOGIA POPULACIONAL DO BIVALVE, Cyanocyclas brasiliana (Deshayes, 1854) NO ESTUÁRIO DO DELTA RIO DO PARNAÍBA, PIAUÍ, BRASIL

Tese apresentada ao Curso de Doutorado em Ciências Marinhas Tropicais do Instituto de Ciências do Mar da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de Doutor em Ciências Marinhas Tropicais. Área de concentração: Utilização e Manejo de Ecossistemas Marinhos e Estuarinos.

Orientadora: Profa. Dra. Cristina Almeida Rocha-Barreira

Fortaleza

2016

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará Biblioteca Rui Simões de Menezes B875e Brito, Carla Suzy Freire de.

Ecologia populacional do bivalve, Cyanocyclas Brasiliana (DESHAYES, 1854) no estuário do delta do Rio Paranaíba, Piauí, Brasil / Carla Suzy Freire de Brito. – 2016. 118f.: il. color., enc.; 30 cm.

Tese (doutorado) – Universidade Federal do Ceará, Instituto de Ciências do Mar, Programa de Pós-Graduação em Ciências Marinhas Tropicais, Fortaleza, 2016. Área de Concentração: Utilização e Manejo de Ecossistemas Marinhos e Estuarinos. Orientação: Profª. Drª. Cristina Almeida Rocha-Barreira.

1. Bivalve. 2. Marisco – Delta do Parnaíba (PI) - Salinidade. I. Título.

CDD 594.4

DEDICATÓRIA

Ao meu pai, Antônio Nogueira de Brito, maior incentivador, inspirador, entusiasta e único responsável por hoje eu carregar este título.

Ao Sr. com muito amor, meu eterno “painho”.

“O importante não é quantos degraus se sobe na vida, e sim quantos degraus se desce para ajudar o próximo”. Centro Espírita À Caminhos da Luz.

AGRADECIMENTOS

À Deus, por tudo que tem me dado.

À minha amada mãe, Eliedira Brito, que muito me incentivou e acolheu nesta minha difícil jornada. A ela, que foi meu tudo e foi muito mais do que avó dos meus filhos, sem palavras para tanto agradecimento.

Aos meus filhos Luan Yuuki e Carolina Yumi que por muito tempo tiveram que se sacrificar com minhas ausências. Amo vocês.

Aos meus alunos Luciano Brito e Alberto Brito que me apresentaram ao Delta e em especial a espécie alvo desta tese.

À minha orientadora Profa. Dra. Cristina de Almeida Rocha-Barreira, pelo apoio incondicional e pelos aprendizados com suas sugestões e críticas e pela grande força desta guerreira que muito admiro.

À Profa. Dra. Maria Cristina Dreher Mansur, pela disponibilidade e paciência nos ensinamentos que foram essenciais ao início desta tese.

Ao Prof. e amigo Dr. Ivan Furtado Júnior que sempre se mostrou disponível nas análises e críticas dos dados.

Ao Prof. Dr. Ronaldo Gomes de Sousa pelos grandes aprendizados que tive em minha jornada no exterior.

À Profa. Dra. Helena Matthews Cascon, pelas críticas realizadas na melhoria desta pesquisa.

Ao Prof. Dr. Marcelo de Oliveira Soares, pelas críticas e inúmeras dúvidas sanadas contribuindo para melhoria desta tese.

Ao Prof. Dr. Diego Rial, pelos ensinamentos e trocas de experiências com novos programas.

Ao Prof. Dr. Antônio Adauto Fonteles Filho, pelo apoio e incentivo a mim concedido.

À Universidade Federal do Piauí, pelo incentivo recebido para o desenvolvimento desta tese.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela bolsa concedida pelo Programa de Doutorado Sanduiche (PDS).

À Universidade do Minho (Braga/Portugal) por ter se disposto a me receber pelo PDS.

Aos colegas Drs. Allan Souza e Martina Ilarri pela disposição e paciência, sempre solícitos.

Aos meus colegas de trabalho que me ajudaram em toda minha jornada se revezando nas minhas disciplinas, em especial Hamilton Araripe.

Aos bolsistas, Darlan Rodrigues, Robson Silva, Gabriela Carolina, Alessandra Vasconcelos e Rodrigo Lima pela essencial colaboração na coleta dos dados.

Às estagiárias, Tatiane Araújo e Kele Oliveira pela força e ajuda no desenvolvimento deste trabalho.

A todos os alunos do curso de engenharia de pesca que se dispuseram em ir à campo auxiliar nas coletas.

A todos(as) os(as) marisqueiros(as) que me guiaram e ajudaram no desenvolvimento desta pesquisa.

À minha irmã Haylley Brito pelos muitos momentos de ajuda nesta minha caminhada.

Aos meus irmãos, Vericia e Alex Brito, pelo enorme apoio e torcida a mim concedido.

Ao meu grande cunhado Paulo Henrique pelo apoio.

À Corcina, minha secretária, que por muitas vezes fez o papel de mãe dos meus filhos na minha ausência, sem a qual não teria sido possível a conquista deste título.

Às minhas grandes companheiras e amigas Rejane Brandim e Patrícia Soares pela paciência, companheirismo e apoio em nossa jornada no exterior.

Ao amigo Johnson Nogueira pela disposição e companheirismo sempre que solicitado.

A todos do Condomínio Barcelona pela ajuda inenarrável com meus filhos em minhas ausências em especial à José Carlos Vilanova, Glória Castro, Ana Maria Castro, Rafael Castro, Gê, Eriberto, Bia, Neta, D. Jandira Narciso, Fátima Brito (In Memoriam), Deuzimar, Franzé, Nilda, Adriana e Cícero Brito.

RESUMO

O bivalve Cyanocyclas brasiliana (Deshayes, 1854), endêmico da parte leste da América do sul, é uma espécie comestível, conhecido como “marisco” que vem sendo bastante explorado pelos moradores da região do Delta do Parnaíba-PI, no povoado dos Tatus. Com o objetivo de estudar a população deste bivalve no que diz respeito aos aspectos da sua ocorrência, tolerância à salinidade e estrutura populacional foram coletados dados de amostras no período de 2011 e 2012. Os locais de coleta concentraram-se na parte sul do Delta do rio do Parnaíba, localizados em quatro pontos: Ponto 1: 2º 4’ 8,0”S/41º 50’ 17,1”W; Ponto 2: 2º 49’ 23,4”S/41º 50’ 23,8”W; Ponto 3: 2º 48’ 49,1”S/41º 50’ 12,7”W e Ponto 4: 2º 48’ 49,6”S/41º 50’ 13,2”W. Para registrar a ocorrência da espécie foi necessário localizar o material tipo no Museu de História Natural do Reino Unido (NHMUK) para identificação da espécie. Para determinar o limite de tolerância de C. brasiliana à salinidade, foi realizado um experimento com um gradiente de salinidade variando de 0 a 6. Foi determinada a concentração letal (CL50) e tempo letal (TL50) utilizando o pacote estatístico GraphPad Prism 6. O efeito da concentração salina sobre o tempo foi testado utilizando o test t de Student. Para analisar o tempo letal nas concentrações salinas, utilizou-se o teste One-Way ANOVA com post-hoc de Tukey, ambos com nível de significância de α = 0,05. À partir das 72 horas, em salinidades maiores do que 2, os efeitos foram negativos, levando os animais à morte. A salinidade média limitante observada para esta espécie foi de 3.2. Os parâmetros da dinâmica populacional foram estimados com a utilização dos programas computacioanis FISAT II, BioEstat 5.0 e STATISTICA 6.0. Foram coletados indivíduos com comprimento total da concha variando de 2,25 mm a 30,45 mm. A maior densidade em 2011 ocorreu no mês de julho com 5.992 ind./m2 e em 2012 no mês de maio com 4.531 ind./m2. A maior biomassa média ocorreu durante o mês de julho com 1,233g para o ano de 2011e 2,222g no mês de setembro em 2012. O recrutamento de C. brasiliana ocorre principalmente entre os meses de janeiro e fevereiro. Os parâmetros médios de crescimento obtidos foram L∞ = 31,67 e k = 1,21. A longevidade estimada (A0,95) com o t0 obtido de 0,13 anos, foi de 2,6 anos, ou seja, os indivíduos vivem aproximadamente 3 anos. Embora explorada comercialmente, a mariscagem realizada de forma selectiva parece ser sustentável na região estudada, pois a taxa de exploração, E = 0,250, ficou abaixo da taxa de exploração máxima sustentável da população.

Palavras-chave: Bivalve. Salinidade. Endêmica.

ABSTRACT

The bivalve Cyanocyclas brasiliana (Deshayes, 1854), endemic from the eastern part of South America, is an edible species, known as "seafood" that has been widely exploited by the residents of the Parnaíba river delta region, in the village of Tatus. In order to study the population of this bivalve about its occurrence aspects, tolerance to salinity and populational structure were collected data samples in the period of 2011 to 2012. The collection sites focus in the southern part of the Parnaíba river delta, located on four points: point 1: 2º 4 '8.0 "S / 41º 50' 17.1" W; Point 2: 2º 49 '23.4 "S / 41º 50' 23.8" W; Point 3: 2º 48 '49.1 "S / 41º 50' 12.7" W and point 4: 2º 48 '49.6 "S / 41º 50' 13.2" W. To record the occurrence of the species was necessary to locate the material type at the Natural History Museum UK (NHMUK) for species identification. To determine the limit of tolerance of the increasing salinity variation, an experiment was conducted with a gradient ranging from 0 to 6. It was verified the lethal concentration (LC50) and lethal time (LT50) using the statistical package GraphPad Prism 6. The effect of salt concentration concerning the time was tested using Student's t test. To analyze the lethal time in salt concentrations, it was used the one-way ANOVA with post-hoc Tukey, both with α = 0.05 significance level. From 72 hours in salinities higher than 2, the effects were negative, causing the death. The limiting medium salinity observed for this species was 3.2. The parameters of populational dynamics were estimated the using the computational programs FISAT II, BioEstat 5.0 and STATISTICA 6.0. Individuals were collected with the total length of the shell ranging from 2.25 mm to 30.45 mm. The highest density in 2011 occurred on July with 5,992 ind./m2 and on May, 2012 with 4,531 ind./m2. The highest average biomass occurred during the month of July with 1,233g for the year 2011 and 2,222g on September, 2012. The recruitment of C. brasiliana occurs mainly between the months of January and February. The average growth parameters obtained were L∞ = 31.67 and k = 1.21. The estimated longevity (A=0,95) with t0 obtained of 0.13 years was 2.6 years, ie, individuals live approximately 3 years. Although commercially exploited, the shellfish performed selectively in the region appears to be sustainable in the studied area because the exploitation rate, E = 0.250, was below the maximum exploitation rate of the population.

Keywords: Bivalve. Salinity. Endemic.

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Mapa da cidade de Ilha Grande, Piauí, Brasil, local de estudo (BRITO et al., 2015)...... 21

Figura 2 - Vista aérea das áreas de coletas localizadas em duas ilhas, as margens dos efluentes do rio Parnaíba (quadrado vermelho). Os pontos amarelos localizam os quatro pontos (Pt) de coleta (BRITO et al., 2015)...... 22

Figura 3 - Exemplares de Cyanocyclas brasiliana (Deshayes, 1854)...... 23

Figura 4 – (A) Material utilizado na coleta dos mariscos (quadrado de PVC, pá e landuá); (B) Landuá adaptado para coleta...... 38

Figura 5 - Exemplares de Cyanocyclas brasiliana (Deshayes, 1854) coletados na parte límnica do estuário do Delta do rio Parnaíba (PI)...... 42

Figura 6 - Vista externa (A) e interna (B) da concha de Cyanocyclas brasiliana (Deshayes, 1854) do Delta do rio Parnaíba, Piauí, Brasil (MCNZ 40.516A). Legenda: a – anterior; b – bico; ct – dentes cardeais; d – dorso; li – ligamento; ima – impressão do músculo adutor; lt – dentes laterais; h- charneira; imp – impressão do músculo posterior; cun – ondulações comarginais; p – posterior; pl – linha palial; os – seio palial; u – umbo; v – ventral...... 42

Figura 7 - Experimento de tolerância do bivalve Cyanocyclas brasiliana ao gradiente crescente de salinidade, em condições de laboratório...... 52

Figura 8 - Concentração letal medida da salinidade (CL50) nos intervalos de tempo de 72 e 84 horas no experimento de tolerância do bivalve Cyanocyclas brasiliana ao gradiente crescente de salinidade, em condições de laboratório...... 55

Figura 9 - Tempo médio letal para 50% dos animais (TL50(h)) observado no experimento de tolerância do bivalve Cyanocyclas brasiliana, considerando as salinidades de 2 a 6, em condições de laboratório...... 57

Figura 10 - Estudos realizados por vários autores com uma espécie de bivalve de água doce para determinar a salinidade ideal em vários estágios...... 60

Figura 11 - Pontos de coleta no estuário (A) e (B) lançamento dos quadrados...... 70

Figura 12 - (A) Material utilizado na coleta de Cyanocyclas brasiliana (quadrado de PVC, pá e landuá); (B) Coleta e lavagem dos organismos; (C) Landuá adaptado para coleta e (D) Landuá convencional utilizado pelos marisqueiros...... 71

Figura 13 -. Representação esquemática das medições da concha de Cyanocyclas brasiliana considerando o comprimento total (Lt), altura total (Ht) e largura (Lg)...... 72

Figura 14 - Relação peso total/comprimento total dos espécimes de C. brasiliana coletados no Delta do rio Parnaíba...... 81

Figura 15 - Relação altura total/comprimento total do bivalve Cyanocyclas brasiliana coletado no Delta do rio Parnaíba...... 82

Figura 16 - Relação largura total/comprimento total do bivalve Cyanocyclas. brasiliana coletado no Delta do rio Parnaíba...... 83

Figura 17 - Densidade mensal (unid/m2) de Cyanocyclas brasiliana nos anos de 2011 e 2012 no Delta do rio Parnaíba...... 85

Figura 18 - Histogramas mensais da frequência de tamanho (mm) dos indivíduos de Cyanocyclas brasiliana no Delta do rio Parnaíba, no período de 2011...... 86

Figura 19 - Histogramas mensais da frequência de tamanho (mm) dos indivíduos de Cyanocyclas brasiliana no Delta do rio Parnaíba, no período de 2012...... 87

Figura 20 - Biomassa média (g) de Cyanocyclas brasiliana nos anos de 2011 e 2012 no Delta do rio Parnaíba...... 88

Figura 21 - Precipitação acumulada para os anos de 2011 e 2012 para o Delta do rio Parnaíba/PI...... 89

Figura 22 - Estimativas preliminares do comprimento assintótico ou infinito (L∞) e relação taxa de mortalidade (Z)/taxa de crescimento (k) para os espécimes de C. brasiliana coletados no Delta do Parnaíba...... 90

Figura 23 - Delimitação visual das variações de (L∞) e da constante de crescimento (k) obtidas por meio da sub-rotina “k-Scan” do método de Shepherd para os espécimes de C. brasiliana coletados no Delta do Parnaíba...... 91

Figura 24 - Curvas de crescimento ajustadas em coortes para C. brasiliana, obtidas por meio da sub-rotina “k-Scan” do método de Shepherd (pacote computacional FISAT), coletados no Delta do rio Parnaíba...... 92

Figura 25 - Estimativa da mortalidade total pelo método de Length-Converted Catch Curve para C. brasiliana coletados no Delta do rio Parnaíba...... 93

Figura 26 - Estimativa da mortalidade total pelo método de Jones & van Zaling para C. brasiliana coletados no Delta do rio Parnaíba...... 94

Figura 27 - Curvas da taxa de exploração (E), rendimento por recruta Y/R e biomassa por recruta B/R para C. brasiliana coletados no Delta do rio Parnaíba...... 95

LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Medidas de comprimento. largura e altura e razão entre comprimento/altura das conchas de sintipos NHMUK (1845.8.29.7-10) e amostras de Cyanocyclas brasiliana (Deshayes 1854) coletadas no Delta do rio Parnaíba, Piauí, Brasil (MCNZ 40.516)...... 41

Tabela 2. Número de indivíduos mortos no experimento de tolerância do bivalve Cyanocyclas brasiliana ao gradiente crescente de salinidade, em condições de laboratório...... 54

Tabela 3. Teste t para comparação das concentrações de salinidade nos tempos 72 e 84 horas, no experimento de tolerância do bivalve Cyanocyclas brasiliana, em condições de laboratório...... 56

Tabela 4. Análises de variância (One-way ANOVA) para determinação do tempo letal de Cyanocyclas brasiliana no experimento de tolerância ao gradiente crescente de salinidade, em condições de laboratório...... 57

Tabela 5. Número de indivíduos contados, densidade (ind./m2) e peso médio (g) de Cyanocyclas brasiliana nos anos de 2011 e 2012 no Delta do rio Parnaíba...... 84

Tabela 6. Valores estimados para os parâmetros de crescimento para C. brasiliana coletados no Delta do Parnaíba...... 92

Tabela 7. Valores das taxas de exploração (E), rendimento por recruta Y/R e biomassa por recruta B/R para C. brasiliana coletados no Delta do rio Parnaíba...... 96

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO GERAL ...... 17

1.1. Importância econômica dos bivalves estuarinos ...... 17

1.2. Estuário e manguezal ...... 19

1.3. Descrição geral da área de estudo ...... 20

1.4. Moluscos bivalves ...... 22

1.5. A espécie Cyanocyclas brasiliana (Deshayes, 1854) ...... 23

1.5.1. Taxonomia, distribuição e habitat ...... 23

1.5.2. Morfologia ...... 25

1.5.3. Reprodução ...... 25

1.5.4. Desenvolvimento larval ...... 26

1.6. Pesca e comercialização ...... 26

2. OBJETIVO GERAL ...... 27

2.1. Objetivos específicos ...... 27

REFERÊNCIAS...... 28

CAPÍTULO 1. Cyanocyclas brasiliana (: ) REENCONTRADA NA PARTE LÍMNICA DO DELTA DO RIO PARNAÍBA/PI, BRASIL ...... 35

1. INTRODUÇÃO ...... 36

2. MATERIAL E MÉTODOS ...... 38

2.1. Área de estudo ...... 38

2.2. Coleta e preparo do material ...... 38

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO ...... 40

3.1. Breve histórico taxonômico da espécie ...... 40

3.2. Características diagnósticas de Cyanocyclas brasiliana...... 40

3.3. Aspectos ecológicos da espécie redescoberta no Delta do rio Parnaíba ...... 43

4. CONCLUSÃO ...... 44

REFERÊNCIAS...... 45

CAPÍTULO 2. TOLERÂNCIA DA ESPÉCIE Cyanocyclas brasiliana (Deshayes, 1854) A VARIAÇÃO DE SALINIDADE EM CONDIÇÕES DE LABORATÓRIO ...... 48

1. INTRODUÇÃO ...... 49

2. MATERIAL E MÉTODOS ...... 51

2.1. Área de estudo ...... 51

2.2. Preparação do experimento ...... 51

2.3. Análise dos dados ...... 53

3. RESULTADOS ...... 53

4. DISCUSSÃO ...... 58

5. CONCLUSÃO ...... 61

REFERÊNCIAS...... 62

CAPÍTULO 3. DINÂMICA POPULACIONAL DO BIVALVE Cyanociclas brasiliana (Deshayes, 1854) NO ECOSSISTEMA MANGUEZAL DO DELTA DO RIO PARNAÍBA/PI ...... 65

1. INTRODUÇÃO ...... 66

2. OBJETIVO GERAL ...... 69

2.1. Objetivos específicos ...... 69

3. MATERIAL E MÉTODOS ...... 69

3.1. Área de estudo ...... 69

3.2. Coleta dos dados ...... 69

3.3. Procedimentos de laboratório ...... 71

3.4. Análise dos dados ...... 72

3.4.1. Relações morfométricas ...... 72

3.4.2. Parâmetros da Dinâmica Populacional ...... 74

3.4.2.1. Densidade e biomassa ...... 74

3.4.2.2. Parâmetros de crescimento ...... 74

3.4.2.3. Mortalidade ...... 77

3.4.2.4. Modelo de Rendimento por Recruta ...... 78

4. RESULTADOS ...... 80

4.1. Relações morfométricas ...... 80

4.2. Dinâmica Populacional ...... 83

4.3. Mortalidade...... 93

4.4. Modelo de Rendimento por Recruta ...... 95

5. DISCUSSÃO ...... 97

6. CONCLUSÃO ...... 102

REFERÊNCIAS...... 103

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...... 1111

ANEXOS...... 1133

17

1. INTRODUÇÃO GERAL

O bivalve Cyanocyclas brasiliana (Deshayes, 1854) é uma espécie comestível conhecida como “marisco” que vem sendo bastante explorada pelos moradores da região do Delta do rio Parnaíba-PI, no povoado dos Tatus. Os “catadores de mariscos”, geralmente mulheres e homens conhecidos como “marisqueiros”, vão ao manguezal diariamente para “catar” esses animais, que são utilizados como alimento e, principalmente, como fonte de renda.

O marisco é considerado uma das principais fontes de renda para os moradores da cidade de Ilha-Grande-PI, tendo em vista que são encontrados em grandes quantidades, durante todo o ano, nos bancos de areia na porção superior do Delta do rio Parnaíba. Desta forma, é um dos principais recursos extrativistas visado pela atividade marisqueira naquela localidade. Além disso, durante os meses chuvosos (julho a dezembro), quando em função da piracema, a maioria dos pescadores não pode realizar a atividade pesqueira, as atividades das marisqueiras não são interrompidas contribuindo ainda mais na sustentabilidade econômica dos moradores da região.

Não existem estudos sobre a ecologia e estrutura populacional dos bivalves da espécie Cyanocyclas brasiliana no Piauí. Em virtude deste contexto, surge a necessidade de aumentar a informação sobre os parâmetros populacionais e pesqueiros desses organismos que venham a contribuir para a preservação deste recurso e para sustentabilidade da atividade, evitando assim a diminuição e/ou o desaparecimento dos estoques.

1.1. Importância econômica dos bivalves estuarinos

A exploração artesanal de organismos bentônicos apresenta uma elevada importância socioeconômica para os países da América Latina, constituindo uma expressiva fonte de renda e subsistência para as comunidades tradicionais da zona costeira (CASTILLA & DEFEO, 2001). Os recursos pesqueiros marinhos e estuarinos do Nordeste brasileiro não são exceção e também são considerados de vital importância para a promoção do desenvolvimento integrado da região, principalmente como meio de subsistência e fonte alimentar para as populações ribeirinhas servindo de matéria-prima para indústrias de pesca (CASTRO, 1997). Recursos provenientes do ambiente são de fundamental importância para a sobrevivência de muitas comunidades pesqueiras espalhadas pelo litoral brasileiro (SCHAEFFER-NOVELLI, 18

1989; NISHIDA (2006), SOUTO (2004), MARTINS & SOUTO, 2006). Em muitos casos, em especial para algumas mulheres, a atividade de catar mariscos torna-se um meio de subsistência único ou socialmente viável. Por este motivo, este recurso vem se tornando uma atividade cotidiana de muitas comunidades ribeirinhas (BANDEIRA, 2014). A prática da extração de moluscos bivalves remonta a períodos pré-históricos, quando as primeiras civilizações costumavam utilizá-los como moedas de troca e posteriormente como uma importante iguaria. Com o passar do tempo a atividade perdurou, porém seu foco de interesse mudou e passou a ser vista sob a óptica empresarial, indo muito além de simples complemento na renda familiar de pescadores artesanais (MUEDAS & MOREIRA, 2011). No litoral brasileiro, diversas espécies de moluscos bivalves de regiões estuarinas são exploradas, algumas de forma bastante rudimentar, pelas comunidades tradicionais sem utilizar medidas de manejo que garantam o uso sustentável dos recursos (ARAÚJO, 2001).

O fato dos moluscos ocorrerem em áreas costeiras rasas e estuarinas facilita a sua exploração comercial. Contudo, o intenso extrativismo pode prejudicar o crescimento populacional desses organismos ou até mesmo levar as suas reservas naturais à extinção (POGGIO, 2001). Muitas espécies de bivalves exploradas artesanalmente estão presentes em áreas intermarés e são amplamente distribuídas ao longo da costa brasileira, principalmente em enseadas, baías e estuários (BOEHS et al., 2008). Em virtude disso, estudos sobre a biologia e ecologia destes organismos são importantes para o estabelecimento de programas de manejo, visando favorecer a manutenção de estoques naturais, e assim, contribuir para o desenvolvimento de atividades extrativistas (MOREIRA, 2007).

Além da necessidade de estimar a abundância do recurso é igualmente importante determinar o tamanho em que certas espécies são capturadas. Esta informação serve como indicador do estágio de desenvolvimento reprodutivo das mesmas indicando a necessidade de conservação deste recurso pesqueiro (MOREIRA, 2007). Outro aspecto importante que precisa ser analisado é a relação da comunidade marisqueira com o ambiente natural, seu conhecimento acerca da classificação, história, comportamento, biologia e utilização dos recursos naturais da região onde vivem (BEGOSSI et al., 2006 & DIEGUES, 2000).

19

1.2. Estuário e manguezal

A palavra estuário é derivada do adjetivo latino “asetuarium”, cujo significado é maré ou onda abrupta de grande altura, fazendo referência a um ambiente altamente dinâmico, com mudanças constantes em resposta às forças naturais. Esse termo é utilizado genericamente para indicar o encontro do rio com o mar, caracterizando uma foz litorânea. Os estuários podem ser considerados zonas de transição ou ecótonos, entre os habitats de água doce e marinho (MIRANDA et al., 2002).

O ecossistema de manguezal ocorre em estuários, diretamente expostos à linha da costa ou junto à foz dos rios, baias e outros locais protegidos da ação das ondas do mar. Ocupam uma fração significativa do litoral brasileiro, cerca de 92% da linha de costa (± 6.800 km) entre o extremo norte no Oiapoque, no estado do Amapá (Lat. 4o30’ N), até seu limite sul na Praia do Sonho em Santa Catarina (Lat. 28o53’ S) (IVO & GESTEIRA, 1999).

No litoral do estado do Maranhão encontram-se as maiores áreas contínuas dos manguezais brasileiros, com aproximadamente 5.000 km² de mangue. Maranhão, Amapá e Pará juntos correspondem a 85% dos manguezais do País. O arco litorâneo que se estende do Piauí a Pernambuco apresentam uma extensão de manguezais estimada de aproximadamente 600 km², 174 no Ceará, 160 em Pernambuco, 130 no Rio Grande do Norte, 96 na Paraíba e 40 no Piauí (VANNUCCI, 1999).

O rio Parnaíba nasce na chapada das Mangabeiras, a uma altitude de 709 metros. Após receber a afluência do riacho Corriola, passa a ser chamado propriamente de Parnaíba. Tem uma extensão de 1.485 Km e serve de divisa entre os estados do Piauí e Maranhão até desaguar no oceano Atlântico. Nessa desembocadura chega ao oceano da forma deltaica com cinco barras. De Leste para Oeste: Igaraçu, no Piauí; Canárias, entre o Piauí e o Maranhão; Caju, Melancieiras e Tutóia, no Maranhão. Segundo Moreira e Mavignier (2007) é considerado um rio de planície caudal, pois, no período de maior precipitação pluviométrica, dezembro a maio, ultrapassa muito o leito natural, por isso sendo denominado Nilo Piauiense. Recebe sete afluentes no lado do Piauí (Uruçuí Vermelho, Uruçuí Preto, Gurguéia, Itaueira, Canindé, Poti e Longá) e um do lado do Maranhão (Balsas). Constitui a quarta maior bacia hidrográfica brasileira e é o maior rio do Nordeste ocidental ou Meio Norte. É dividido, geograficamente, em Alto Parnaíba, das nascentes à afluência do rio Gurguéia, Médio Parnaíba, até a foz do rio Poti e Baixo Parnaíba até a formação do delta junto ao oceano Atlântico (LIMA, 2012). 20

O Delta do rio Parnaíba é o único em mar aberto do continente americano, possui dezenas de ilhas e igarapés, cobrindo uma área de 2.700 km2, com cinco rios afluentes, além de ser um ecossistema portador de notáveis espécies de plantas e animais, tanto aquáticas como terrestres (ARAÚJO, 2002, apud CAVALVANTE-FILHO et al., 2009). Estes ambientes estão entre os mais produtivos e complexos ecossistemas do planeta. Um grande número de espécies aquáticas, pertencentes a diferentes grupos taxonômicos, habitam áreas estuarinas durante diferentes períodos do seu ciclo de vida. Algumas espécies são residentes, permanecendo dentro do estuário durante todo o seu ciclo de vida enquanto outros são migratórias ou transitórias, usando o estuário durante períodos mais curtos de tempo como zonas de desova.

1.3. Descrição geral da área de estudo

O presente estudo foi realizado no estuário superior do rio Parnaíba, localizado na Área de Proteção Ambiental do Delta do Parnaíba próximo a Ilha Grande, no município de Parnaíba, Piauí (02°49’S; 41°50’W) (Figura 1). As condições climáticas do local, que está a 10m acima do nível do mar, apresentam temperaturas mínimas de 25°C e máximas de 35°C, com clima quente tropical (IBAMA, 1998).

21

Figura 1 - Mapa da cidade de Ilha Grande, Piauí, Brasil, local de estudo (BRITO et al., 2015).

Os locais de coleta situavam-se em duas pequenas Ilhas, da área conhecida popularmente como Gambôa do Mangue, localizada na parte sul do Delta do Parnaíba, formada por dois dos diversos efluentes do rio Parnaíba, que compõem o Delta. Esta área apresenta uma planície flúvio-marinha e dunas na margem oposta com influência de maré (IBAMA, 1998).

Por ser um local de fácil acesso e conhecido pela presença de bivalves, fonte de extração pelas “marisqueiras” da região (mulheres que capturam mariscos e vivem da comercialização dos mesmos) foram escolhidos quatro pontos de coleta: Ponto 1: 2º 4’ 8,0”S/41º 50’ 17,1”W; Ponto 2: 2º 49’ 23,4”S/41º 50’ 23,8”W; Ponto 3: 2º 48’ 49,1”S/41º 50’ 12,7”W e Ponto 4: 2º 48’ 49,6”S/41º 50’ 13,2”W (Figura 2).

22

Figura 2 - Vista aérea das áreas de coletas localizadas em duas ilhas, as margens dos efluentes do rio Parnaíba (quadrado vermelho). Os pontos amarelos localizam os quatro pontos (Pt) de coleta (BRITO et al., 2015).

1.4. Moluscos bivalves

As estimativas do número de espécies de moluscos são muito variáveis podendo chegar até 200.000 espécies (STRONG et al., 2008). O número de espécies de bivalves de água doce conhecidas em todo o mundo é de aproximadamente 1.209 espécies (GRAF, 2013). No Brasil, estão descritas 127 espécies de bivalves de água doce (SIMONE, 2006). Apesar do grande número de espécies de moluscos já descrito em todo mundo, o conhecimento de moluscos de água doce no Brasil está longe de ser satisfatório (BRITO et al., 2015).

Os bivalves de água doce não são um grupo monofilético (os organismos reunidos compartilham um ou mais caracteres derivados –sinapomorfias - e descendem do mesmo ancestral comum) e são representados por pelo menos 21 famílias, entre estas estão inclusas também aquelas de origem marinha e que habitam ambientes oligohalinos (BOGAN, 2008; GRAF, 2013). A maioria destas famílias está representada por poucos gêneros e espécies. As três radiações adaptativas mais importantes de bivalves em ambientes de água doce estão representadas por oito famílias, que são Unionidae, Margaritiferidae, Hyriidae, Etheriidae, Mycetopodidae e Iridinidae (todas Unionoida), bem como Sphaeriidae e Cyrenidae (= Corbiculidae), ambas Veneroida (GRAF, 2013). 23

Os moluscos da classe Bivalvia são caracteristicamente comprimidos lateralmente e as partes moles do corpo encontram-se completa ou parcialmente encerradas num exoesqueleto sob a forma de uma concha, composta por duas valvas calcárias. As valvas são unidas por ligamentos e músculos adutores e articulam-se numa charneira, que possui, usualmente, dentes (cardinais e/ou laterais). O bivalve fecha a concha através da contração dos músculos adutores. A geometria e distribuição das cicatrizes dos músculos adutores no interior da valva é um critério importante na classificação dos bivalves (OLIVEIRA, 2012).

Os moluscos bivalves possuem grande importância para a cadeia alimentar, onde ocupam uma posição intermediária, se alimentando de algas e microrganismos, tendo-os como sua fonte primária de recurso alimentar. Além disso, são predados por peixes e aves, sendo responsáveis, portanto, pela manutenção dessas comunidades (CASTILLO, 2007).

1.5. A espécie Cyanocyclas brasiliana (Deshayes, 1854)

1.5.1. Taxonomia, distribuição e habitat

De acordo com o Base (GOFAS, 2015) e Simone (2006), a espécie Cyanocyclas brasiliana apresenta a seguinte classificação taxonômica (Figura 3):

Figura 3 - Exemplares de Cyanocyclas brasiliana (Deshayes, 1854).

24

Reino: Animalia

Filo: Mollusca

Classe: Bivalvia

Subclasse:

Infraclasse: Euheterodonta

Ordem: Veneroidea (ADAMS & ADAMS, 1858)

Superfamilia: Cyrenoidea (GRAY, 1840)

Familia: Cyrenidae (GRAY, 1840)

Gênero: Cyanocyclas (BLAINVILLE, 1818)

Espécie: Cyanocyclas brasiliana (DESHAYES, 1854)

A ordem Veneroida inclui as famílias Cyrenidae (=Corbiculidae), Sphaeriidae e Dreissenidae. Os gêneros nativos Cyrenidae são representados por Cyanocyclas e Polymesoda Rafinesque, 1828, que diferem do gênero por apresentar sinus palial (PEREIRA et al., 2014). Os Cyrenidae, anteriormente denominada Corbiculidae (BIELER et al., 2010), diferem primariamente de outras famílias de bivalves de água doce por apresentar gêneros que habitam ambientes marinhos/salobros, tais como Polymesoda Rafinesque, 1820, Batissa Gray, 1853 e Villorita Griffith & Pidgeon, 1833. Devido a este fato, os cirenídeos apresentam um potencial como modelo taxonômico para estudos sobre a radiação adaptativa dos bivalves em ambientes aquáticos continentais.

A espécie Cyanocyclas brasiliana, conhecida popularmente como “marisco”, é endêmica da América do Sul, mais especificamente Norte do Brasil com ocorrência nos estados do Pará (DESHAYES, 1854), Amazonas (PRIME, 1870) e recentemente, no Piauí (BRITO et al., 2015). Encontra-se em maior abundância em substrato lamoso, podendo também ocorrer em substrato com areia fina, enterrando-se a uma profundidade de aproximadamente 10 cm da superfície. Esta espécie é considerada estenoalina e sua ocorrência é dependente principalmente da salinidade que não pode exceder 3. Sua intolerância a pequenas variações de salinidade faz com que a menor variação nesta ocasione uma mortandade muito elevada (BRITO et al., 2015). 25

1.5.2. Morfologia

Concha trigonal, subtransversa, delicada, inequilateral, com listras transversais finas, perióstraco esverdeado; umbo pequeno e proeminente, prosogirata; região anterior curta, levemente inclinada, região posterior curta e truncada; charneira tridentada e estreita, dentes divergentes pequenos e lateral alongado e estreito; sinus palial levemente triangular, ápice agudo (tradução livre de PRIME, 1865)

1.5.3. Reprodução

Não existem estudos sobre a biologia das espécies do gênero Cyanocyclas. Assim, assume-se que suas estratégias reprodutivas acompanhem o padrão já conhecido para a maioria das espécies de Corbicula. Scarabino e Mansur (2007) citam que Cyanocyclas é hermafrodita simultâneo, entretanto, reforçam a falta de conhecimentos sobre o grupo.

Segundo Pigneur et al. (2012), o gênero Corbicula inclui espécies dióicas e hermafroditas. As espécies hermafroditas são consecutivas protogênicas, onde os gametas femininos são produzidos primeiro que os masculinos. Nas populações da América do Norte, os ovócitos são produzidos durante todo o ano e os espermatozoides parecem ser produzidos em resposta a mudanças sazonais de temperatura e/ou quantidade de recursos disponíveis. A fertilização é cruzada entre indivíduos hermafroditas e ocorre a produção de filamentos mucosos contendo espermatozoides que são conectados aos sifões (KRAEMER et al., 1986). A autofertilização também foi sugerida para Corbicula, nestes indivíduos os embriões foram encontrados dentro dos folículos gonadais, ao passo que na maioria dos hermafroditas, os embriões são geralmente incubados nas brânquias (IKEMATSU & YAMANE, 1977; KRAEMER et al., 1986).

Recentemente, Houki et al. (2011) encontraram uma população japonesa de Corbicula leana que contém machos e indivíduos hermafroditas. Os resultados citológicos e genéticos sugerem a androgênia, com os machos androgênicos fertilizando os ovos de hermafroditas. 26

1.5.4. Desenvolvimento larval

De acordo com Mackie e Claudi (2010), nos bivalves cirenídeos, a fertilização ocorre no interior da cavidade paleal e a incubação dos embriões ocorre por entre os filamentos branquiais; as larvas passam pelos estágios trocophora, véliger e pedivéliger, sendo liberadas em forma de D. Após a libertação, os juvenis passam um curto período (um máximo de quatro dias) na coluna d’água e assentam no sedimento utilizando um filamento bissal mucilaginoso (MACKIE & CLAUDI, 2010). No gênero Cyanocyclas, a incubação das larvas é completa e ocorre no interior do marsúpio braquial. O número de embriões é pequeno, de 25 a 45 por brânquia, e a libertação não é sincronizada (PEREIRA et al., 2014). Apenas as espécies Corbicula fluminea e Corbicula largillierti têm seus ciclos de vida larval conhecidos (MANSUR, 2012; MANSUR et al., 2012a, b).

1.6. Pesca e comercialização

Até o momento, não existem registros na literatura do uso de bivalves cirenídeos brasileiros como alimento. No entanto, espécies de Corbicula, em áreas onde são nativas, são comumente exploradas comercialmente. No Japão, C. japonica é uma das mais importantes espécies exploradas em ambientes continentais e representa 99% do total de capturas de bivalves do gênero Corbicula (MITO et al., 2014). C. fluminea é um dos bivalves mais comuns e mais importantes comercialmente dentre as espécies aquáticas na China, devido ao seu alto valor nutricional e atividade farmacológica (LIAO et al., 2013), sendo também consumida na forma de sopa, popularmente considerada boa para proteger o fígado em muitos países do sudeste asiático (KE et al., 2011).

Cyanocyclas brasiliana é bastante abundante no Delta do rio Parnaíba e comercializada pela comunidade local. De acordo com os catadores, são capturados em torno de 500 kg por dia de pesca. A considerar esta informação não oficial, estima-se que sejam capturados aproximadamente 6.000 kg de mariscos ao mês. A comercialização é quase que exclusivamente repassada para o atravessador a preços extremamente baixos, o qual comercializa o produto exportando para São Luis/MA e São Paulo/SP. Apenas alguns quilos são comercializados diretamente para comunidade local. Não há nenhum tratamento dado as conchas dos mariscos, sendo simplesmente utilizadas na pavimentação de estradas, estacionamentos ou quintais das próprias residências locais (BRITO et al., 2015). 27

2. OBJETIVO GERAL

O presente trabalho tem como objetivo estudar a população do bivalve Cyanocyclas brasiliana encontrada no Delta do rio Parnaíba no estado do Piauí considerando a sua ocorrência, tolerância à salinidade e estrutura populacional.

2.1. Objetivos específicos

- Caracterizar a espécie de bivalve explorada comercialmente no Delta do rio Parnaíba/PI;

- Verificar o limite de tolerância e a sobrevivência do bivalve C. brasiliana submetidos a um gradiente crescente de salinidade em condições de laboratório;

- Verificar parâmetros da dinâmica populacional de C. brasiliana relacionando com a sazonalidade; - Identificar os períodos de recrutamento dessa espécie; - Estimar os parâmetros de crescimento bem como mortalidade;

Desta forma, este trabalho está dividido em 3 capítulos:

1. “Cyanocyclas brasiliana (Bivalvia: Cyrenidae) reencontrada na parte límnica do delta do rio Parnaíba/PI, Brasil”;

2. “Tolerância a variação de salinidade para a espécie Cyanocyclas brasiliana (Deshayes, 1854) em condições de laboratório”;

3. “Dinâmica populacional do bivalve Cyanocyclas brasiliana (Deshayes, 1854) no ecossistema manguezal do Delta do rio Parnaíba/PI”.

28

REFERÊNCIAS

ARAÚJO, C. M. Biologia reprodutiva do berbigão Anomalocardia brasiliana (Mollusca: Bivalvia, Veneridae) na Reserva Extrativista Marinha do Pirajubaé (REMAPI), Estado de Santa Catarina. 203 p. Tese (Doutorado em Aquicultura) – Universidade de São Paulo, Florianópolis, 2001.

ARAÚJO-JÚNIOR, E. S.; CASTRO, A. C. L. & JÚNIOR, M. G. S. Dinâmica populacional do bagre guribu Hexanematichithys herzbergii (Teleostei: Ariidae) do estuário do Rio Anil (Maranhão-Brasil). Bol. do Lab. de Hidrobiologia, 19: 41-50, 2006.

ASSIS, R. C. F. Maturação sexual de Lucina pectinata (Gmelin, 1791) (Molusca Bivalvia). Universitas. Ciência. Salvador, 34: 77-92, 1985.

AVELAR, W. E. P. Classe Bivalvia: 65-68. In: MIGOTTO, A & TIAGO, C.G. (Eds.). Biodiversidade do Estado de São Paulo, Brasil: síntese do conhecimento ao final do século XX, 4: Invertebrados de Água Doce. São Paulo, SP: FAPESP, XXII, 176 p. 1999.

BANDEIRA, F. O. Análise de parâmetros populacionais de Anomalocardia flexuosa (GMELIN, 1791) no estuário do rio Paraíba-PB. Monografia apresentada ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba, p. 25, 2014.

BEGOSSI, A.; HANAZAKI, N.; PERONI, N. & SILVANO, R. A. M. Estudos de ecologia humana e etnobiologia: uma revisão sobre usos e conservação. In: ROCHA, C. F. D.; BERGALLO, H. G; ALVES, M. A. S. & VAN SLUYS, M. (Ed.). Biologia da Conservação: Essências (pp. 320-331). Rio de Janeiro: Editora da UERJ. 20(4): 717-725, 2006. 29

BLANKENSTEYN, A. & MOURA R. S. Lista preliminar das espécies da macrofauna de fundos inconsolidados da Baía de Guaratuba, Paraná, Brasil. Revista Brasileira de Zoologia. 19 (3): 715-721, 2002.

BOEHS, G.; ABSHER, T.M. & CRUZ-KALED, A. C. Ecologia populacional de Anomalocardia brasiliana (Gmelin, 1791) (Bivalvia: Veneridae) na Baía de Paranaguá, Paraná, Brasil. Inst. Bras. Pesca, São Paulo, 34 (2): 259-270, 2008.

BOGAN, A. E. Global diversity of freshwater mussels (Mollusca, Bivalvia) in freshwater. Hydrobiologia 595:139-147, 2008.

BOTELHO, E. R. O. & SANTOS, M. C. F. A cata de crustáceos e moluscos no manguezal do rio Camaragibe - Estado de Alagoas: Boletim Técnico Científico do Cepene. Tamandaré, PE. v. 13, n. 2, p. 77-96, 2005.

BRITO, C. S. F.; MANSUR, M. C. D. & ROCHA-BARREIRA, C. A. Cyanocyclas brasiliana (Bivalvia: Cyrenidae) rediscovered in the limnic part of Parnaíba River delta, Northeast Brazil. Check List, v. 11, n. 4, p. 1685, 2015.

BRUSCA, R. C. & BRUSCA, G. J. Invertebrados. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan. 968 p. 2007.

CASTILLA, J. C. & DEFEO, O. Latin American benthic shellfisheries: emphasis on co- management and experimental practices. Rev. Fish Biol. Fish, 11: 1-30, 2001.

CASTRO, A. C. L. Aspectos ecológicos da Ictiofauna da Ilha de São Luís - MA. 72 p. Tese de Professor Titular - Universidade Federal do Maranhão, 1997. 30

CASTRO, J. Geografia da fome, Edições Antares, 10ª edição, 117 p., Rio de Janeiro, 1984.

CAVALCANTE-FILHO, W. G. & BRITO, L. S. Potencial da pesca, beneficiamento e comercialização do marisco (Iphigenia brasiliana) no Delta do rio Parnaíba, PI, Brasil. XVI Congresso Brasileiro de Engenharia de Pesca. p-4. Natal/RN/Brasil. 2009.

CRISPIM, M. C. & WATANABE, T. Heterogeneidade no ecossistema lacustre, baseado na comunidade zooplanctônica. Anais do V Simpósio Brasileiro de Ecossistemas, Vitória, Brasil, p. 431-441, 2000.

DAME, R. F. Organismic level processes. In: Ecology of marine bivalves: an ecosystem approach. c. 3, p. 35-74. New York: CRC Press, 1996.

DIAS, G. F. Educação Ambiental: princípios e práticas. 8. ed. São Paulo: Gaia, p. 551. 2003.

DIEGUES, A. C. (Org.) Etnoconservação: Novos rumos para a proteção da natureza nos trópicos. HUCITEC/NUPAUB, São Paulo, Brasil, p. 1-46. 2000.

GOFAS, S. (2015). Cyanocyclas. In: MolluscaBase (2015). Accessed through: World Register of Marine Species at http://www.marinespecies.org/aphia.php?p=taxdetails&id=531820 on 2015-11-22

IVO, C. T. C. & GESTEIRA, T. C. V. Sinopse das observações sobre a bioecologia e pesca do caranguejo-uçá, Ucides cordatus (Linnaeus, 1763), capturado em estuários de sua área de ocorrência no Brasil. Bol. Téc. Cient. CEPENE. Tamandaré, Brasil., v. 7, n. 1, p. 9-52. 1999. 31

KE, L.; ZHOU, J.; LU, W.; GAO, G. & RAO, P. (2011). The power of soups: Super-hero or team-work? Trends in Food Science & Technology, 22(9), 492-497.

KRAEMER, L. R.; SWANSON, C.; GALLOWAY, M. & KRAEMER, R. (1986). Biological basis of behaviour in Corbicula fluminea. II. Functional morphology of reproduction and development and review of evidence for self-fertilization. Proc Second Int Malacol Bull Special Ed 2: 193–202.

LACERDA, L. D. Os manguezais do Brasil. In: VANNUCCI, Marta. Os Manguezais e Nós: uma síntese de percepções. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo – EDUSP, 1999.

LANA, P. C. & BREMEC, C. Sabellariidae (Annelida, Polychaeta) from South America. In: J-C Dauvin, L Laubier & DJ Reish (eds), Actes de la 4ème Conférence internationale des Polychètes, Mémoires Muséum National d´Histoire Naturelle, Paris, 162: 211-222, 1994.

LIAO, N.; CHEN, S.; YE, X.; ZHONG, J.; WU, N.; DONG, S.; YANG, B. & LIU, D. (2013). Antioxidant and anti-tumor activity of a polysaccharide from freshwater clam, Corbicula fluminea. Food & function, 4(4), 539-548.

LIMA, E. F. Ictiofauna do Delta do rio Parnaíba, litoral Piauiense. In: GUZZI, A. (Org). Biodiversidade do Delta do Parnaíba: litoral piauiense. Parnaíba: EDUFPI, 2012. 466p.

MANSUR, M. C. D.; SHULTZ, C. & GARCES, L. M. M.P. Moluscos Bivalves de água doce: Identificação dos gêneros do Sul e Leste do Brasil. Acta Biológica Leopoldensia, Ano 9. n. 2, p. 181-202, 1987.

32

MIRANDA, L. B.; CASTRO, B. M. & KJERFVE, B. Princípios de Oceanografia Física de Estuários. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2002.

MITO, T.; TANAKA, T. & ARANISHI, F. (2014). Genetic Variability and Reproduction Structure of Corbicula japonica in Major Fishing Brackish Lakes in Japan. Open Journal of Marine Science, 2014.

MONTEIRO, L. H. U.; SOUZA, G. M.; MAIA, L. P.; SILVA, L. F. F. & LACERDA, L. D. Evolução das áreas de manguezal do litoral nordeste brasileiro entre 1978 e 2004. Instituto de Ciências do Mar, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, CE. p. 1. 2004.

MOREIRA, A. M. & MAVIGNIER, D. S. Conhecendo História e Geografia do Piauí. Gráfica Ferraz. Parnaíba, PI. 2007. 184p.

MOREIRA, I. C. N. Impactos do extrativismo de Anomalocardia brasiliana (Gmelin, 1791) nos estuários dos Rios Paciência e Cururuca, São Paulo, Maranhão: Uma visão etnoconservacionista, p. 60, 2007.

MUEDAS, W. & MOREIRA, I. C. N. (2000). Sururu no Maranhão: Cultivos experimentais de “sururu” (Mytella falcata, Orbigny, 1842) em Alcântara/MA. Acessado em 7 de dezembro de 2011 em: http://Web.uvic.ca/bmlp/patnews38pdf.

ODUM, E. P. O papel dos pântanos das marés na produção estuarina. A conservacionista (New York State Conservation Dept., Albany) 15(6): 12-15, 35, 1961.

PEREIRA, A. L. C. Estrutura populacional do caranguejo-uçá, Ucides cordatus, (Linnaeus, 1763) (Crustacea, Brachyura, Ocypodidae) e sustentabilidade do 33

extrativismo na reserva extrativista do Mandira, Cananéia, São Paulo, Brasil. São Carlos. Tese (Doutorado) – Universidade Federal de São Carlos. 2010.

PI, J.; WANG, G. P.; LV, Z. J.; LI, D. L.; ZHANG, T. & XIAO, T. Y. (2013). Analysis and Evaluation of the Nutritional Components in the Soft Part of Corbicula fluminea in Datong Lake. p. 15.

PIGNEUR, L. M.; HEDTKE, S. M.; ETOUNDI, E. & VAN DONINCK, K. (2012). Androgenesis: a review through the study of the selfish shellfish Corbicula spp. Heredity, 108(6), 581-591.

POGGIO, C. A. Biologia quantitativa de Lucina pectinata (Gmelin, 1791) (bivalvia, lucinidae) no ecossistema de manguezal de Garapuá. Monografia apresentada ao Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia, p. 91, 2001.

SANTOS, S. B.; THIENGO, S. C.; FERNANDEZ, M. A.; MIYAHIRA, I. C.; GONÇALVES, I. C. B.; XIMENES, R. F.; MANSUR, M.C. D. & PEREIRA, D. (2012). Espécies de moluscos límnicos invasores no Brasil. In: Mansur, M.C.D. Moluscos límnicos invasores no Brasil: biologia, prevenção controle. Redes Editora, 2012. p. 25-49.

SCHMIED-KOWARZIK, W. O futuro ecológico como tarefa da filosofia: São Paulo: IPF, (Cadernos de Ecopedagogia, v. 4). 1999.

SÉRGIO, C.; LEITE, E.; PITTERI, H.; MARTUSCELLI, J. & MACHADO, P. Caracterização morfofisiológica do manguezal de Cananéia – SP; Environmental and Health World Congress; July 16 - 19, Santos, BRAZIL, 2006.

34

SIMONE, L. R. L. Land and freshwater molluscs of Brazil. São Paulo. FAPESP. 390pp. 2006.

SOARES-GOMES, A. & PIRES-VANIN, A. M. S. Padrões de abundância, riqueza e diversidade de moluscos bivalves na plataforma continental ao largo de Ubatuba, São Paulo, Brasil: uma comparação metodológica. Rev Bras de Zool., 2003.

SOUTO, F. J. B. & MARTINS, V. S. Conhecimentos etnoecológicos na mariscagem de moluscos bivalves no manguezal do distrito de Acupe, Santo Amaro – BA. Revista Biotemas, p. 12, 2009.

SOUTO, F. J. B. & MARTINS, V. S. Conhecimentos etnoecológicos na mariscagem de moluscos bivalves no manguezal do distrito de Acupe, Santo Amaro – BA. Revista Biotemas, p. 12, 2009.

SOUTO, F. J. B. A ciência que veio da lama. Uma abordagem etnoecológica abrangente das relações ser humano-manguezal na comunidade pesqueira de Acupe, Santo Amaro – BA. Tese de Doutorado, Universidade Federal de São Carlos, Brasil, 322p. 2004.

35

CAPÍTULO 1

Cyanocyclas brasiliana (BIVALVIA: CYRENIDAE) REENCONTRADA NA PARTE LÍMNICA DO DELTA DO RIO PARNAÍBA/PI, BRASIL

36

1. INTRODUÇÃO

Na América do Sul encontramos quatro ordens de Bivalvia com representantes na água doce: Mytiloida, Unionoida, Veneroida e Myoida (MANSUR, 2008). Apesar do grande número de espécies de moluscos já descritos no mundo inteiro, o conhecimento a respeito dos moluscos continentais brasileiros está longe de ser considerado satisfatório. Simone (1999) estimou que apenas metade dos gastrópodes de água doce do país é conhecida e Avelar (1999) que aproximadamente 35 espécies de bivalves de água doce estejam para serem descritas para o Brasil. Certamente, a região amazônica é uma das áreas mais carentes de levantamentos e de um melhor entendimento de suas espécies, incluindo suas adaptações ambientais e questões ecológicas (PIMPÃO, 2007).

Pereira et al. (2012) publicaram uma chave dicotômica para a identificação dos bivalves nativos e invasores introduzidos no Brasil e relataram que faltam estudos morfológicos comparativos, catálogos e revisões taxonômicas tanto dos Unionoida como dos bivalves menores Cyrenidae (= Corbiculidae) nativos e especialmente dos Sphaeriidae, que estão muito mal representados nas coleções científicas. Os mesmos autores também citam que ainda existem áreas carentes de inventários como o Norte, Nordeste e Centro-Oeste do Brasil, onde as bacias hidrográficas apresentam-se relativamente pouco alteradas.

Considerando os representantes nativos de Cyrenidae (= Corbiculidae), Parodiz & Hennings (1965) realizaram um estudo de revisão das inúmeras espécies descritas sob o gênero Neocorbicula (Fischer, 1887), atualmente Cyanocyclas (Blainville, 1818) para as regiões central e sul da América do Sul, quando reduziram o número de 30 espécies nominais, consideradas apenas sinônimos ou simples variações dos dois tipos fundamentais: Cyanocyclas limosa e C. paranensis. As espécies descritas para a Amazônia, Cyanocyclas amazonica (Prime, 1870) e C. brasiliana (Deshayes, 1854) e norte da América do Sul: N. bavayi (Ancey, 1880), N. cuneata (Jonas, 1844), N. rotunda (Prime, 1860) e N. surinamica (Clessin, 1879) carecem de revisão (MANSUR, 2008; PARODIZ & HENNINGS, 1965; MANSUR & CALLIL et al., 2004).

Para a região Norte do Brasil, as descrições originais para as duas espécies (C. brasiliana e C. amazonica) não citam dados de localidade precisos. Há apenas indícios muito 37

vagos nas descrições originais: a primeira para o estado do Pará no Brasil (Deshayes, 1854) e a segunda para o rio Amazonas, Brasil, encontrados no estômago de um peixe (Prime, 1870).

Simone (2006) catalogou os cirenídeos nativos e invasores do Brasil fornecendo ilustrações (visão externa e interna de ambas as valvas) e o comprimento de um síntipo de C. amazonica e um de C. brasiliana. Não há registros anteriores de cirenídeos sul-americanos nativos na região nordeste do Brasil.

No entanto, a ocorrência de cirenídeos que vivem em altas densidades foi observada na porção líminica do Delta do rio Parnaíba, Piauí. Apesar de intensamente exploradas pela população local a várias gerações, esta população de cirenídeo não havia sido identificada até agora.

Este capítulo registra a redescoberta de Cyanocyclas brasiliana em uma bacia hidrográfica além da Amazônica e a primeira ocorrência de uma espécie nativa da família Cyrenidae na região nordeste do Brasil.

Devido a escassez de dados sobre os cirenídeos de bacias hidrográficas da região norte e nordeste do Brasil e América do Sul e considerando a ausência de amostras em coleções científicas brasileiras, pretende-se que este estudo contribua com trabalhos taxonômicos, morfológicos e ecológicos sobre C. brasiliana visando também o fortalecimento da malacologia na América do Sul.

38

2. MATERIAL E MÉTODOS

2.1. Área de estudo

A descrição geral da área de estudo está inserida na Introdução Geral, item 1.3.

2.2. Coleta e preparo do material

Os bivalves destinados à identificação foram coletados no ano de 2011 em marés baixas de sizígia, no estuário superior do rio Parnaíba, no município de Parnaíba, Piauí. O local de coleta situa-se em uma pequena Ilha, localizada na parte sul do Delta do Parnaíba, formada por dois dos diversos efluentes do rio Parnaíba, que compõem o Delta. Por ser um local conhecido pela presença maciça de bivalves, foi escolhido o Ponto 4 (2º 48’ 49,6”S/41º 50’ 13,2”W) para a coleta do material (Figura 2).

A captura foi realizada manualmente com o auxílio de pequenas pás para retirada do substrato. Em um “landuá” adaptado (arte local de pesca que funciona como uma espécie de puçá) com abertura de malha de 1mm – menor que as malhas utilizadas nos landuás convencionais com abertura de malha de 12 mm – fez-se a lavagem para separação dos mariscos do substrato (Figura 4).

Figura 4 – (A) Material utilizado na coleta dos mariscos (quadrado de PVC, pá e landuá); (B) Landuá adaptado para coleta.

39

Após capturados, os animais foram colocados em recipiente plástico com água do local e transportados para o Laboratório de Limnologia da Universidade Federal do Piauí (UFPI) em Parnaíba, Piauí. No laboratório, foram identificados, medidos e fotografados, sendo em seguida, preservados em álcool etílico 70% glicerinado.

Lotes destes organismos foram depositados na Coleção Malacológica “Prof. Henry Ramos Matthews” do Instituto de Ciências do Mar da Universidade Federal do Ceará (CMPHRM 4779A), Fortaleza, Ceará e no Museu de Ciências Naturais da Fundação Zoobotânica, Porto Alegre, Rio Grande do Sul (MCNZ 40.516).

Jonathan Ablett, o curador da coleção de moluscos do Museu de História Natural do Reino Unido (NHMUK), localizou o material tipo e enviou fotografias com medições e escalas de Cyanocyclas brasiliana para a realização de comparações com os exemplares coletados.

40

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1. Breve histórico taxonômico da espécie

A descrição original de Cyanocyclas brasiliana realizada por Deshayes (1854) é muito sumária e sem ilustração. O autor Deshayes (1854) sinalizou que o material pertencia a coleção do Museu Britânico, através da sigla BM, hoje NHMUK. Mais tarde, Prime (1965) redescreveu a C brasiliana, igualmente de forma sumária com as mesmas palavras do autor da espécie e confirma a mesma pertencer à coleção do Museu Britânico, porém confessa não ter examinado nenhum dos exemplares da espécie. Mais tarde, Prime (PRIME 1870), descreveu uma nova espécie, C. amazonica, igualmente de forma sumária e sem ilustrações. Johnson (1959) listou os tipos da coleção de Prime com a numeração do holótipo no Museu de Zoologia Comparada (MCZ – Harward) e ofereceu uma figura da vista externa da concha. Nada mais foi revisado e publicado desde então, sobre os cirenídeos desta região e nem de regiões vizinhas.

3.2. Características diagnósticas de Cyanocyclas brasiliana

As comparações morfológicas revelaram que os espécimes coletados no Delta do rio Parnaíba pertencem ao gênero Cyanocyclas, pela presença na parte superior de dentes lamelais serrilhados e, especialmente, pela presença de um pequeno seio palial triangular (Figura 5) na linha palial logo abaixo do músculo posterior adutor. A presença do seio palial é fundamental para distinguir o gênero Cyanocyclas do invasor Corbicula (MEGERLE von MÜHLFELD, 1811), cujas espécies apresentam uma linha palial completa, portanto, sem a formação de um seio (SANTOS et al., 2012; PEREIRA et al., 2012).

A comparação entre o material tipo de Cyanocyclas brasiliana com as amostras de Delta do Parnaíba revelaram que, embora um pouco maiores, estas últimas apresentam medições proporcionalmente semelhantes no comprimento, altura, largura e proporção de comprimento/altura (Tabela 1). Além disso, alguns aspectos da concha são importantes para identificar melhor as espécies como a superfície externa brilhante com ondulações comarginais estreitas e evidentes (aproximadamente três por mm), cor que varia de marrom claro e verde palha, umbos pequenos e pouco inflados, quase passando por cima da linha de articulação; superfície interna opaca no centro e brilhante perto das laterais, cor variando de branco, rosa a 41

violeta escuro, placa articulada e dentes laterais relativamente estreitos, seio palial pequeno assemelhando-se a C. Limosa, mas um pouco mais profundo do que em C. paranensis (Figuras 5 e 6):

Tabela 1 - Medidas de comprimento, largura e altura e razão entre comprimento/altura das conchas de sintipos NHMUK (1845.8.29.7-10) e amostras de Cyanocyclas brasiliana (Deshayes 1854) coletadas no Delta do rio Parnaíba, Piauí, Brasil (MCNZ 40.516).

Amostras Comprimento (mm) Altura (mm) Largura (mm) Comp./Altura NHMUK 1845.8.29.7-10 (Sintypes) A 19,0 17,5 10,8 1,2 B 10,7 10,0 6,8 1,1 C 12,0 10,7 7,5 1,1 D 13,3 12,4 8,0 1,0 Média 13,3 12,4 8,3 1,1 Desvio Padrão 3,3 3,0 1,5 0,1 MCNZ 40.516 A (Fig. 4b) 23,8 22,1 15,0 1,1 C 27,2 23,2 15,3 1,2 B 26,2 23,2 14,0 1,1 D 25,9 23,0 14,9 1,1 E 26,0 22,8 14,1 1,1 F 25,6 22,5 14,2 1,1 G 24,7 21,7 14,6 1,1 Média 25,6 22,6 14,6 1,1 Desvio Padrão 1,0 0,5 0,5 0,0

42

Figura 5 - Exemplares de Cyanocyclas brasiliana (Deshayes, 1854) coletados na parte límnica do estuário do Delta do rio Parnaíba (PI).

1 cm

Figura 6 - Vista externa (A) e interna (B) da concha de Cyanocyclas brasiliana (Deshayes, 1854) do Delta do rio Parnaíba, Piauí, Brasil (MCNZ 40.516A). Legenda: a – anterior; b – bico; ct – dentes cardeais; d – dorso; li – ligamento; ima – impressão do músculo adutor; lt – dentes laterais; h- charneira; imp – impressão do músculo posterior; cun – ondulações comarginais; p – posterior; pl – linha palial; os – seio palial; u – umbo; v – ventral. 43

Em um trabalho posterior, será necessário redescrever a espécie revelando detalhes da morfologia interna. Cyanocyclas amazonica é provavelmente sinônimo de C. brasiliana, considerando que Prime (1870) relatou não ter visto o material de C. brasiliana descrito anteriormente por Deshayes (1854). Além disso, ambas espécies vêm da mesma bacia hidrográfica, e através da ilustração feita por Johnson (1959), de C. amazonica, fornecida por Simone (2006), é possível ver semelhanças fortes. No entanto, estudos futuros de taxonomia vão exigir um exame mais detalhado de ambas espécies.

3.3. Aspectos ecológicos da espécie redescoberta no Delta do rio Parnaíba

Sua limitação territorial é dependente principalmente pelo grau de salinidade, não superior aos 3, tratando-se desta forma de uma espécie estenoalina. Sua intolerância a pequenas variações de salinidade faz com que a menor variação nesta ocasione uma mortandade muito elevada. Este acontecimento é mais notório quando há uma maior influência do mar sobre o rio aumentando a salinidade. Este fato é popularmente conhecido pelos pescadores locais como “maré grande”.

Fatores que determinam a presença e distribuição desta espécie é a profundidade da água que depende da maré e o tipo de substrato. São encontradas em profundidades que vão até os 3m aproximadamente em substrato lamoso.

No Delta do rio Parnaíba observou-se que a C. brasiliana migra de acordo com as características do solo, pois em lugares de fundo lamoso observa-se a presença constante dos mariscos, entretanto a medida que mudanças ambientais ocorrem como a descarga/vazão transformando o fundo do rio de lamoso para arenoso, verificou-se que a espécie desaparecia do local reaparecendo em locais próximos onde a lama prevalecia.

44

4. CONCLUSÃO

Em 2011, no XXII Encontro Brasileiro de Malacologia, foi apresentado um artigo intitulado “Primeiro registro de ocorrência da espécie exótica Corbicula largillierti (Bivalvia: Corbiculidae) no Delta do Parnaíba – PI” o qual fazia referência a espécie aqui estudada (BRITO & ROCHA-BARREIRA, 2001). No presente estudo, foi verificado que a espécie explorada comercialmente no Delta do Parnaíba é Cyanocyclas brasiliana, uma espécie endêmica da América do Sul e que, até agora, não havia sido registrada para o nordeste brasileiro, em especial para o Delta do rio Parnaíba, Piauí.

45

REFERÊNCIAS

AVELAR, W. E. P. 1999. Classe Bivalvia: 65-68. In: MIGOTTO, A. & TIAGO, C. G. (Eds.). Biodiversidade do Estado de São Paulo, Brasil: síntese do conhecimento ao final do século XX, 4: Invertebrados de Água Doce. São Paulo, SP: FAPESP, XXII, 176 p.

BRITO, C. S. F.; BRITO, L. S.; BRITO, J. A. O. & ROCHA-BARREIRA, C. A.; Primeiro registro de ocorrência da espécie exótica Corbicula largillierti (Bivalvia: Corbiculidae) no Delta do Parnaíba-PI. In: XXII EBRAM – Encontro Brasileiro de Malacologia, 2011, Fortaleza.

IBAMA, 1998. Plano de gestão e diagnóstico geoambiental e sócio-econômico da APA do Delta do Parnaíba. IBAMA, Ministério do Meio Ambiente, Recursos Hídricos e da Amazônia Legal. Fortaleza: Instituto de Estudos e Pesquisas Sociais da UECE, 101p.

DESHAYES, G. P. 1854. Description of new shells from the collection of H. Cuming. Proc. Zool. Soc. London, London 22: 325-32.

JOHNSON, R. I. 1959. The types of Corbiculidae and Sphaeriidae (Mollusca: Pelecypoda) in the Museum of Comparative Zoology, and a biobibliographic sketch of Temple Prime, an early specialist of the group. Bulletin of the Museum of Comparative Zoology 120:431- 479.

MANSUR, M. C. D. 2008. Estado Atual e Perspectivas das Pesquisas em Bivalves Límnicos no Brasil. Informativo SBMa, Rio de Janeiro, 165, 30 set. p. 6-8.

MANSUR, M. C. D.; CALLIL, C. T.; CARDOSO, F. R. & IBARRA, J. A. A. 2004. Uma retrospectiva e mapeamento da invasão de espécies de Corbicula (Mollusca, Bivalvia, Veneroida, Corbiculidae) oriundas do sudeste asiático, na América do Sul, p. 39-58. In: J. S. V. 46

SANTOS, S. B.; THIENGO, S. C.; FERNANDEZ, M. A.; MIYAHIRA, I. C.; GONÇALVES, I. C. B.; XIMENES, R. F.; MANSUR, M. C. D. & D. PEREIRA. 2012. Espécies de moluscos invasores no Brasil. Cap 2 p. 25-49. In: MANSUR, M. C. D.; SANTOS, C. P., PEREIRA, D.; PAZ, I. C. P.; ZURITA, M. L. L.; RODRIGUEZ, M. T. R.; NEHRKE, M. V. & BERGONCI, P. E. A. Moluscos límnicos invasores no Brasil: biologia, prevenção e controle. Porto Alegre: Editora Redes, 412pp.

PEREIRA, D.; MANSUR, M. C. D. & PIMPÃO, D. M. 2012. Identificação e diferenciação dos bivalves límnicos invasores dos demais bivalves nativos do Brasil. Cap 5 p. 75-94. In: MANSUR, M. C. D.; SANTOS, C. P.; PEREIRA, D.; PAZ, I. C. P.; ZURITA, M. L. L.; RODRIGUEZ, M. T. R.; NEHRKE, M. V. & BERGONCI, P. E. A. Moluscos límnicos invasores no Brasil: biologia, prevenção e controle. Porto Alegre: Editora Redes, 412pp.

PARODIZ, J. J. & HENNINGS, L. 1965. The Neocorbicula (Mollusca, Pelecypoda) of the Paraná-Uruguay Basin. Annals Carnegie Museum 38 (3): 69-96. 1965.

PARODIZ, J. J. 1996. The taxa of fossil mollusca introduced by Hermann von Ihering. Annals Carnegie Museum 65(3): 183-296.

PEREIRA, D.; MANSUR, M. C. D. & PIMPÃO, D. M. 2012. Identificação e diferenciação dos bivalves límnicos invasores dos demais bivalves nativos do Brasil. Cap.5, p 75-94. In: MANSUR, M.C.D., et al. Moluscos límnicos invasores no Brasil: biologia, prevenção e controle. Porto Alegre: Editora Redes, Cap. 5, p. 412.

PIMPÃO, D. M. 2007. Moluscos de água doce da Amazônia: adaptações à região e importância ecológica. Livro de Resumos do XX EBRAM, Rio de Janeiro, 05 – 10 Agosto, p. 105-107.

47

PRIME, T. 1865. Monograph of American Corbiculidae (Recent and fossil). Washington, Smithsonnian Institution. 75p. (Smithosonian Miscellaneous Collections, 145).

PRIME, T. (1870), XIX. Notes on Species of the Family Corbiculidae, with Figures. Annals of The Lyceum of Natural History of New York, 9: 298–301. doi: 10.1111/j.1749- 6632.1870.tb00193.x

SIMONE, L. R. L. 1999. Filo Mollusca, Classe Gastropoda, pp. 69-72 In: Migotto, A and C.G. Tiago (Eds.). Biodiversidade do Estado de São Paulo, Brasil: síntese do conhecimento ao final do século XX, 4: Invertebrados de água doce. São Paulo, SP: FAPESP, I - XXII, 176 p.

48

CAPÍTULO 2

TOLERÂNCIA DA ESPÉCIE Cyanocyclas brasiliana (Deshayes, 1854) A VARIAÇÃO DE SALINIDADE EM CONDIÇÕES DE LABORATÓRIO

49

1. INTRODUÇÃO

O ecossistema manguezal ocorre em estuários diretamente expostos à linha da costa ou junto à foz dos rios, baias e outros locais protegidos da ação das ondas do mar (IVO & GESTEIRA, 1999). O estuário pode ser definido como um ecossistema aquático em que as águas de um rio se misturam com águas marinhas, produzindo gradientes mensuráveis de salinidade (TUNDISI, 2008).

O efeito das marés e salinidade variável são fatores que tornam a dinâmica dos estuários bastante complexa, tendo efeitos na estrutura das comunidades biológicas que colonizam estes ecossistemas. Na verdade, a salinidade é um fator abiótico chave nos estuários, alterando-se diariamente, sazonalmente e anualmente, em que a relação precipitação/evaporação/maré se modifica (TUNDISI, 2008). A ação das variações de marés provoca alterações nas zonas entremareais, onde se alternam períodos de total cobertura do meio pelas águas e de exposição do substrato, consequentemente, dos organismos que ali vivem (LIMA et al., 2010).

Os organismos estuarinos estão sempre susceptíveis às variações de salinidade, sendo característica fundamental que os organismos que vivem neste habitat apresentem adaptações fisiológicas de forma a terem grandes tolerâncias a esta condição ambiental (ODUM, 1961). Diante da variação de salinidade, os animais possuem duas estratégias fisiológicas: a osmoconformação e osmorregulacão. Animais osmoconformadores alteram a concentração osmótica de seus fluídos corporais de acordo com a variação do meio externo. Animais osmorreguladores apresentam capacidade de regular a concentração osmótica de seus fluidos, ou seja, mesmo diante da variação do ambiente são capazes de manter um gradiente osmótico entre o meio extracelular e o meio externo (KLÔH, 2011). No entanto, esta osmorregulação acarreta geralmente grandes gastos energéticos.

Em ambientes estuarinos os animais podem ser expostos a oscilações nos valores de salinidade, temperatura, pH, oxigênio, entre outros. Mesmo frente a esse dinamismo ambiental, estes organismos devem manter estáveis seus fluidos corpóreos. Tanto animais osmoconformadores como osmorreguladores devem manter estáveis as concentrações osmóticas de seus líquidos extracelulares, pois alterações deste meio trazem variações no volume celular podendo, em casos extremos, causar a perda da função celular e em caso mais 50

extremos a morte. Para se ajustar a eventos com variações de salinidade, as células tentam manter o volume celular dentro de conformações adequadas ao seu funcionamento (VEIGA, 2013).

O gênero Cyanocyclas é endêmico da parte mais leste da América do Sul possuindo apenas representantes dulcícolas (PARODIZ, 1996). A espécie Cyanocyclas brasiliana ocorre no norte do Brasil, nos estados do Amazonas (Prime, 1870), Pará (Deshayes, 1854) e Piauí (BRITO et al., 2015).

Conhecida popularmente na região do Delta do rio Parnaíba como marisco, esta espécie serve de alimento e fonte de renda para a comunidade local que a comercializa principalmente para os estados de São Luis (MA) e São Paulo (SP). Apesar de ocorrer em grande densidade na porção límnica do Delta do Parnaíba, estado do Piauí, não há nenhum tipo de informação a respeito da tolerância a salinidade desta espécie. Desta forma, o objetivo deste estudo foi verificar o limite de tolerância e a sobrevivência do bivalve Cyanocyclas brasiliana submetida a um gradiente crescente de salinidade em condições de laboratório.

51

2. MATERIAL E MÉTODOS

2.1. Área de estudo

A descrição geral da área de estudo está inserida na Introdução Geral, item 1.3.

2.2. Preparação do experimento

Exemplares de Cyanocyclas brasiliana foram coletados em julho de 2015, no Ponto 4 (2º48’49,6”S/041º50’13,2”W), o ponto central dos locais de coleta empregadas neste estudo (ver Introdução Geral, página 23), no Delta do rio Parnaíba no estado do Piauí.

Os exemplares foram coletados em baldes plásticos de 20 litros, sendo a água do local de coleta acondicionada em garrafas pet de 2 litros.

O experimento foi realizado no Laboratório de Limnologia da Universidade Federal do Piauí (UFPI), Campus de Parnaíba. Os exemplares foram mantidos em recipientes plásticos com 2 litros de água com aeração constante. Em seguida, a uma densidade máxima de 2,5 animais por litro, os organismos foram aclimatados por 24 horas em recipientes com água do próprio local de coleta, registrando-se a temperatura e salinidade da água (American Public Health Association – A.P.H.A., 1989).

Os animais foram sujeitos a 7 tratamentos diferentes tendo cada tratamento 5 réplicas, sendo estes referentes às salinidades de 0, 1, 2, 3, 4, 5, e 6. Cada réplica continha 5 animais de tamanhos semelhantes, variando de 19,49 a 26,47 mm, perfazendo um total de 35 parcelas experimentais (Figura 7). 52

Figura 7 - Experimento de tolerância do bivalve Cyanocyclas brasiliana ao gradiente crescente de salinidade, em condições de laboratório.

O experimento teve início com o registro da salinidade inicial em cada um dos recipientes. A cada 12 horas, a salinidade era verificada com auxílio de um refratômetro manual e a temperatura da água com termômetro digital. As elevações da salinidade da água utilizada nos recipientes foram realizadas utilizando-se mistura de água marinha com água proveniente do próprio Delta até que a salinidade fosse aumentada em 1. Devido a troca diária da água oriunda do delta, não era fornecido nenhum tipo de alimentação, considerando que, por tratar- se de animais filtradores a própria água fornecia o alimento necessário. Este processo foi repetido até o final do experimento, determinado pela mortalidade total dos animais a cada 12 horas até um total de 144 horas. A condição de morte dos animais foi atestada pela abertura parcial ou total das valvas. Em todos os tratamentos, o procedimento foi o mesmo, diferenciando-se que nos aquários-controle, com salinidade 0, a água renovada mantinha a mesma salinidade da inicialmente registrada.

53

2.3. Análise dos dados

O número de organismos mortos foi registrado e tabulado em planilhas do programa ® ® Microsoft Excel . Para determinar a concentração letal (CL50) e o tempo letal (TL50), que garante a morte de 50% dos animais, utilizou-se o pacote estatístico GraphPad Prism 6. Para testar o efeito da concentração salina sobre o tempo foi utilizado o test t de Student. Para analisar o tempo letal nas concentrações salinas utilizou-se One-Way ANOVA com post-hoc de Tukey, ambos com nível de significância de α = 0,05.

3. RESULTADOS

Nas primeiras 36 horas não houve morte de nenhum indivíduo nas salinidades testadas. No entanto, nas salinidades de 0 e 1 verificou-se que os animais apresentaram nestes gradientes sua zona ótima de adaptação, uma vez que até ao final do experimento, compreendido entre 0 e 144 horas, não houve a morte de nenhum . A partir das 48 horas de experimento, os animais começaram a sentir os efeitos das salinidades 3, 4, 5 e 6. No intervalo de tempo correspondente entre 72 e 96 horas, nas salinidades 2 a 6 os efeitos foram significativos para a grande maioria dos exemplares. Entre 120 e 144 horas, nas salinidades 2 e 3, ocorreu a morte dos últimos exemplares (Tabela 2).

54

Tabela 2 - Número de indivíduos mortos no experimento de tolerância do bivalve Cyanocyclas brasiliana ao gradiente crescente de salinidade, em condições de laboratório.

SALINIDADE Hora 0 1 2 3 4 5 6 Fa Faa Fr(%) Fra(%) Fa Faa Fr(%) Fra(%) Fa Faa Fr(%) Fra(%) Fa Faa Fr(%) Fra(%) Fa Faa Fr(%) Fra(%) Fa Faa Fr(%) Fra(%) Fa Faa Fr(%) Fra(%) 24 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 36 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 48 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2 2 8 8 2 2 8 8 6 6 24 24 4 4 16 16 60 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2 0 8 0 2 0 8 1 7 4 28 2 6 8 24 72 0 0 0 0 0 0 0 0 9 9 36 36 8 10 32 40 8 10 32 40 16 23 64 92 15 21 60 84 84 0 0 0 0 0 0 0 0 0 9 0 36 0 10 0 40 1 11 4 44 0 23 0 92 0 21 0 84 96 0 0 0 0 0 0 0 0 15 24 60 96 12 22 48 88 14 25 56 100 2 25 8 100 4 25 16 100 108 0 0 0 0 0 0 0 0 0 24 0 96 0 22 0 88 0 25 0 100 0 25 0 100 0 25 0 100 120 0 0 0 0 0 0 0 0 0 24 0 96 3 25 12 100 0 25 0 100 0 25 0 100 0 25 0 100 132 0 0 0 0 0 0 0 0 0 24 0 96 0 25 0 100 0 25 0 100 0 25 0 100 0 25 0 100 144 0 0 0 0 0 0 0 0 1 25 4 100 0 25 0 100 0 25 0 100 0 25 0 100 0 25 0 100 TOTAL 0 0 0 0 25 100 25 100 25 100 25 100 25 100

Fa – Frequência absoluta Faa – Frequência absoluta acumulada Fr – Frequência relativa Fra – Frequência relativa acumulada 55

Analisando-se as frequências relativas acumuladas da tabela 1, verifica-se que a partir das 96 horas há a mortalidade de mais de 50% dos animais. No tempo entre 24 e 60 horas, as frequências relativas acumuladas mostram que houve morte de menos de 50% destes. Entre os intervalos de 72 e 84 horas, observa-se tanto a mortalidade de menos de 50% dos indivíduos como mais de 50%, demonstrando que nestes intervalos de tempo o efeito da salinidade nos animais é afetado de forma diferenciada. Para os intervalos de tempo superiores a 96 horas verifica-se mortalidade muito perto dos 100%. Desta forma, apenas para os intervalos de tempo 72 e 84 horas foi possível analisar possíveis diferenças. Ao aplicar o teste t para definir se há diferença significativa entre 72 e 84 horas, verificou-se que não há diferença estatística entre elas. Isto evidencia que os animais suportam certa variação na salinidade antes das 72 horas, à partir das 84 horas os organismos são afetados significativamente (Figura 8 e Tabela 3). De acordo com os dados da tabela 2, verifica-se que a média das concentrações letais das salinidades (CL50) para 72 horas foi de 3.1 e para 84 horas 3.3. Desta forma pode-se definir que a salinidade média de 3,2 seria limitante para sobrevivência da espécie, assim limites salinos acima deste valor influenciam na mortalidade dos indivíduos.

Figura 8 - Concentração letal medida da salinidade (CL50) nos intervalos de tempo de 72 e 84 horas no experimento de tolerância do bivalve Cyanocyclas brasiliana ao gradiente crescente de salinidade, em condições de laboratório.

56

Tabela 3 - Teste t para comparação das concentrações de salinidade nos tempos 72 e 84 horas, no experimento de tolerância do bivalve Cyanocyclas brasiliana, em condições de laboratório.

Hora N N* Média de Desv.Médio Erro Mínimo Q1 Mediano Salinidade Desv. de da salinidade salinidade

72 5 0 3,111 0,349 0,781 2,161 2,598 3,300

84 5 0 3,333 0,350 0,782 2,161 2,598 3,411

A análise do tempo letal em relação às salinidades indicou que o tempo não afetou os animais nas salinidades 0 e 1. A partir da salinidade 2, o tempo teve influência na sobrevivência dos animais. Desta forma, o teste One-way ANOVA foi aplicado nas salinidade de 2 a 6 para verificar se havia diferença estatística no tempo letal de Cyanocyclas brasiliana. O tempo letal variou significativamente entre as salinidades de 2 a 6 e o teste post-doc mostrou que as salinidades 2, 3 e 4 foram semelhantes e diferiram das salinidades 5 e 6, as quais não apresentaram diferença entre si (Figura 9 e Tabela 4). Assim, as salinidades 2, 3 e 4 apresentaram tempo de morte letal (TL50) 81,8, 82,3 e 78,5 horas respectivamente. Já as salinidades 5 e 6 tiveram seu tempo de morte letal em 61,1 e 63,5 horas.

57

Figura 9 - Tempo médio letal para 50% dos animais (TL50(h)) observado no experimento de tolerância do bivalve Cyanocyclas brasiliana, considerando as salinidades de 2 a 6, em condições de laboratório.

Tabela 4 - Análises de variância (One-way ANOVA) para determinação do tempo letal de Cyanocyclas brasiliana no experimento de tolerância ao gradiente crescente de salinidade, em condições de laboratório.

Fonte de GL SQ QM F P variação Salinidade 4 2142,8 535,7 8,85 0,000 Erro 20 1210,6 60,6 Total 24 3353,4 S = 7,780 R-Sg = 63,90% R-Sg (adj) = 56,68% Média baseada no desvio dos erros Salinidade N Média Desv. Erro 2 5 81,788 5,576 3 5 82,354 13,129 4 5 78,488 6,169 5 5 61,006 3,705 6 5 63,474 6,885

58

4. DISCUSSÃO

Os fatores que limitam e controlam a distribuição de organismos em sistemas estuarinos são a salinidade, o tipo de sedimento, a temperatura, o suprimento de alimento, a capacidade de colonização e as interações bióticas como competição, predação, parasitismo e facilitação, entre outras (SOUSA et al., 2006, 2008).

De acordo com Kinne (1964), os limites de tolerância à variação de salinidade são geralmente maiores nos animais existentes em águas salobras, hipersalinas ou salmouras, do que naqueles organismos que vivem em água doce ou marinha. Estudos de tolerância à variação da salinidade realizados por Castagna e Chanley (1973) com 29 espécies de bivalves, corroboram com a afirmativa de Kinne, quanto às espécies estuarinas e marinhas analisadas (LEONEL & SILVA, 1988).

A variação da salinidade afeta o balanço osmótico de moluscos, acarretando em gasto energético para reajustar sua concentração osmótica (KLOH, 2011). As respostas fisiológicas dos organismos estuarinos variam não só durante uma mesma fase do ciclo de vida, mas durante vários períodos do ciclo de vida. Por exemplo, fases larvais de organismos bentônicos podem ser mais tolerantes do que os adultos (TUNDISI, 2008).

Farani (2013), em seu estudo com tolerância a salinidade do molusco Melanoides tuberculatus, apresentou valores próximos tanto para indivíduos considerados adultos (CL50 =

22,82) quanto para os juvenis (CL50 = 21,56). O mesmo foi observado por Bolaji et al. (2011), que mesmo não tendo separado os indivíduos por classe etária, obtiveram valores relativamente próximos à Farani com (CL50 = 24,42).

Mackie e Kilgour (1992) relataram uma CL50/96h de 7,6 para adultos não aclimatados de mexilhão zebra Dreissena polymorpha, a 19°C. Ao longo de um período de 42 dias, D. polymorpha que tinham sido aclimatados lentamente tinha apenas 15% de mortalidade em 8.0 de salinidade a 4 ou 10°C. Barber (1992), no entanto, relatou 100% de mortalidade dentro de 52 dias de adultos D. polymorpha a partir de 0 para 2,7, a 15 °C (Quadro 1) (BAKER et al., 1993).

Para fazer a desambiguação de uma espécie de bivalve exótica invasora no rio São Francisco, em Maceió, seguindo a orientação de Morton (1982), citado por Mansur et al. (2004), que informa que Corbicula fluminea, por ser uma espécie de água doce, suporta salinidade de 59

até 13 e Corbicula fluminalis suporta salinidade entre 15 e 50, Calazans (2014), testou uma amostra de 300 exemplares de C. fluminea em água salina a 20 e todos os indivíduos morreram em menos de 24 horas (CALAZANS, 2014).

Experimentos de tolerância à salinidade e à temperatura relacionados a fecundidade também foram realizados. Fong (1995), ao estudar o efeito da salinidade e temperatura na fertilização de Dreissena polymorpha, demonstrou que, embora a exposição aguda dos mexilhões ou seus gametas a condições salinas mais elevadas seja prejudicial para a desova e fertilização, a aclimatação destes a elevados níveis de salinidade ao longo de um período de dias resulta em melhorias significativas da função reprodutiva. A melhoria na função reprodutiva com aclimatação foi particularmente notável em 3,5, nível intermediário de salinidade testada. Mexilhões não aclimatados podem gerar gametas em salinidades de 1,75 a 3,5, mas apenas raramente em 7. Embora gametas obtidos nestas condições possam ser fertilizados a 1,75, fertilização em 3,5, sem aclimatação prévia, é praticamente nula.

Após o resultado desta pesquisa surgiu o questionamento de como no estuário do Delta encontra-se a espécie C. brasiliana, uma vez que o experimento demonstrou que esta espécie não suporta grandes variações de salinidade sendo tipicamente uma espécie de água doce. No local de estudo, embora a apenas 8 km a montante da desembocadura do rio Parnaíba, a entrada da água marinha rio acima em função das marés pode ser relativamente baixa devido ao caudal do próprio rio ou à própria geologia da embocadura do estuário. Desta forma, o local de estudo situa-se no limite onde a salinidade permite a presença desta espécie sendo que à jusante a salinidade é demasiado alta e à montante é possível que a espécie continue a ocorrer (fato que necessita ser averiguado em trabalhos futuros). Por outro lado, embora menos provável, a presença de dunas imediatamente a jusante do local de estudo pode agir como uma fonte adicional de água doce através da percolação e dasague naquela região do rio, o que contribuiria para uma redução da salinidade. 60

Figura 10 - Estudos realizados por vários autores com uma espécie de bivalve de água doce para determinar a salinidade ideal em vários estágios.

Espécie Nome vulgar Dias de experimento CL50 (g/L) TL50(h) Estágio Referência

Dreissena polymorpha Mexilhao Zebra 7,6 96 Adultos (não aclimatados) Mackie & Kilgour (1992)

Dreissena polymorpha Mexilhao Zebra 42 (15% de mortalidade) 8 Adultos (aclimatados) Mackie & Kilgour (1992)

Dreissena polymorpha Mexilhao Zebra 52 (100% mortalidade) 0-2,7 Adultos Barber, 1992

Dreissena polymorpha Mexilhao Zebra 0-12ppt* Sobrevivência de adultos Baker et al., 1993

Dreissena polymorpha Mexilhao Zebra 0-0,6ppt** Crescimento de adultos Baker et al., 1993

Dreissena polymorpha Mexilhao Zebra 0ppt-?* Crescimento de larvas Baker et al., 1993

Dreissena polymorpha Mexilhao Zebra 1,75- Fertilização Fong et al., 1995 3,5ppt** * Valor de referência ** intervalo ótimo

61

5. CONCLUSÃO

Neste trabalho verificou-se que a espécie de bivalve Cyanocyclas brasiliana não suporta grandes variações de salinidade, uma vez que sua zona de conforto encontra-se nas salinidades entre 0 e 1. À partir das 72 horas (TL50%) e com salinidades maiores do que 2 os efeitos já começam a ser negativos, levando os animais à morte. No entanto, a salinidade média limitante (CL50%) para esta espécie fica em 3,2. Desta forma evidencia-se que a salinidade é um fator determinante e limitante na distribuição desta espécie. Assim, fica definido que a espécie C. brasiliana trata-se de uma espécie de água doce estenoalina.

62

REFERÊNCIAS

ABREU, F. H. T.; SILVA, F. V.; MOREIRA, A. K. A. & MATTHEWS-CASCON, H. Regulação osmótica em Anomalocardia brasiliana (Mollusca, Bivalvia) do Estuário do Rio Pacoti, Ceará. In: Livro de Resumos do XXI Encontro Brasileiro de Malacololgia. Rio de Janeiro, 2009.

AMERICAN PUBLIC HEALTH ASSOCIATION. Toxicity test procedures using mollusks. Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater. Clesceri, L.S.; Greenberg, A.E. and Trussel, R.R. (ed.), 17a. ed., Port City Press, Baltimore, p. 8.73-8.80, (1989).

BARBER, B. J. 1992. Preliminary investigation of the salinity tolerance of zebra mussels, Dreissena polymorpha implications for Chesapeake Bay. (Abstract) J. Shellfish Res. 11:218.

BRITO, C. S. F.; MANSUR, M. C. D. & ROCHA-BARREIRA, C. A. 2015. Cyanocyclas brasiliana (Bivalvia: Cyrenidae) rediscovered in the limnic part of Parnaíba River delta, Northeast Brazil. Check List 11(4): 1685.

CASTAGNA, M. & CHANLEY, P. 1973. Salinity tolerance of some marine bivalves from inshore and estuarine environments in Virginia waters on the western mid-Atlantic coast. Malacologia, Ann. Arbor. 12 (1): 47-96.

CALAZANZ, D. R. 2014. Ocorrência e aspectos socioambientais de uma espécie de molusco exótica invasora no baixo São Franciso e sua utilização como bioindicador de qualidade da água. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Maceió.

63

FARANI, G. L. 2013. Tolerância do gastrópode bioinvasor Melanoides tuberculatus (Muller, 1774) à salinidade. Monografia. Universidade Federal da Bahia, Salvador, Bahia, Brasil, 35p.

FONG, P. P.; KEIICHIRO, K.; DUNCAN, J.; RYNKOWSKI, S.; MEKASHA, D. & RAN, J. L. 1995. The Effect of Salinity and Temperature on Spawning and Fertilization in the Zebra Mussel Dreissena polymorpha (Pallas) from North American. Biology Bulletim, 189, pp. 320-329.

IVO, C. T. C. & GESTEIRA, T. C. V. 1999. Sinopse das observações sobre a bioecologia e pesca do caranguejo-uçá Ucides cordatus cordatus (Linnaeus, 176) capturados em estuários de sua área de ocorrência no Brasil. Boletim Técnico Científico do CEPENE, Tamandaré, 7(2): 9-52.

KINNE, O. 1964. The effects of temperature and salinity on marine and brackish water animals. II – Salinity an temperature. Salinity combinations. Oceanogra. Mar. Bio. Ann. Ver. 2: 281-339.

KLÔH, A. S. 2011. Tolerância fisiológica do bivalve Mytella charruana, dos cirripédios Amphibalanus reticulatus, Fistulobalanus citerosum e Megabalanus coccopoma e potencial invasor. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba.

LEONEL, R. M. V. & SILVA, I. N. 1988. Estudo da sobrevivência e da capacidade de isolamento de Mytella guyanensis (Mollusca-Bivalvia) em diferentes salinidades. Revta. Nordest. Biol., 6(1): 35-41.

LIMA, M. A.; SOARES, M. O.; PAIVA, A. C. C.; OSÓRIO, F. M.; PORFÍRIO, A. F. & MATTEWS-CASCON, H. Osmorregulação em moluscos: o caso do bivalve estuarino tropical Anomalocardia brasiliana (Mollusca: Bivalvia). Conexões, Ciência e Tecnologia, v.3 (1), 2010.

64

MACKIE, G. L. & KILGOUR, B. W. 1992. Effects of salinity on growth and survival of zebra mussels Dreissena polymorpha). (Abstract). J. Shellfish Res 11:230.

ODUM, E. P. O papel dos pântanos das marés na produção estuarina. A conservacionista (New York State Conservation Dept., Albany) 15(6): 12-15, 35, 1961.

PARODIZ, J. J. 1996. The taxa of fossil mollusca introduced by Hermann von Ihering. Annals Carnegie Museum 65(3): 183-296.

RIAL, D.; BEIRAS, R.; VÁZQUEZ, J. A. & MURADO, M. A. 2010. Acute toxicity of a shoreline cleaner, Cytosol, mixed with oil and ecological risk assessment of its use on the galician coast. Arch. Environ. Contam. Toxicol., 59 pp. 407-416.

SOUSA, R.; DIAS, S. & ANTUNES, C. 2006. Spatial subtidal macrobenthic distribution in relation to abiotic conditions in the Lima estuary, NW of Portugal. Hydrobiologia 559, 135 - 148.

SOUSA, R.; DIAS, S.; FREITAS, V. & ANTUNES, C. 2008. Subtidal macrozoobenthic assemblages along the River Minho estuarine gradient (north-west Iberian Peninsula). Aquatic Conservation: Marine and Freshwater Ecosystems 18, 1063 - 1077.

TUNDISI, J. G. & TUNDISI, T. M. Limnologia. São Pulo: Oficina de Textos, 2008.

VEIGA, M. P. T. 2013. Fisiologia osmorregulatória em Mollusca: Perna perna, Crassotrea gigas e Stramonita brasiliensis. Tese de Doutorado, Universidade Federal do Paraná (UFPA), Curitiba.

65

CAPÍTULO 3

DINÂMICA POPULACIONAL DO BIVALVE Cyanocyclas brasiliana (Deshayes, 1854) NO ECOSSISTEMA MANGUEZAL DO DELTA DO RIO PARNAÍBA/PI

66

1. INTRODUÇÃO

Uma população biológica é um conjunto de indivíduos que apresentam características semelhantes e se reproduzem entre si, mas ao qual os fatores ambientais e genéticos emprestam um caráter de grande variabilidade. Desse modo, seu tamanho e estrutura variam constantemente, através das relações inter e intraespecíficas que a mantêm em equilíbrio estável na comunidade a que pertence no ecossistema (FONTELES-FILHO, 2011).

O termo população é utilizado para definir um grupo de indivíduos de uma mesma espécie que coexiste numa mesma área e tempo. Cada população apresenta uma organização (ou estrutura) própria, que é resultado de características intrínsecas da espécie, de fatores físicos do ambiente onde ela se encontra, e de interações intraespecíficas e interespecíficas. Alguns aspectos importantes da estrutura populacional são: densidade de organismos, espaçamento entre eles, migrações, proporção de indivíduos em diferentes classes etárias, sistema de acasalamento, estrutura genética e disposição em áreas de habitat propício (RICKLEFS & MILLER, 2000).

O termo dinâmica de populaçõesse aplica ao estudo das variações no número de indivíduos da população e dos fatores que influenciam essas variações. Por outro lado, a dinâmica de populações trata das influências ambientais sobre as populações (SOLOMON, 1980).

A exploração comercial e os impactos ambientais podem reduzir a densidade populacional dos moluscos ou até mesmo levar as suas reservas naturais à extinção (MALIAO et al., 2004; DEFEO & CASTILLA, 2005 apud BELEM et al., 2009). Para gerenciar um estoque e desenvolver uma pesca sustentável, é preciso conhecer o “status” deste estoque. Assim, os valores de abundância, recrutamento e exploração são importantes para o desenvolvimento e avaliação de estratégias de gestão (MENDES, 2012).

O estudo do crescimento assume dois aspectos fundamentais: por um lado, a caracterização morfológica da espécie, e por outro, a determinação da relação entre um determinado parâmetro morfométrico (geralmente o comprimento da concha ou o peso do animal) e a idade. A caracterização morfológica baseia-se fundamentalmente na relação entre as três medidas lineares (comprimento, altura e espessura) e na relação entre o comprimento e o peso (GASPAR, 2002). 67

Segundo Caetano (2003), métodos indiretos, baseados na estrutura de comprimento da população, permitem determinar a idade dos indivíduos a partir da análise das distribuições de frequências de comprimento e da progressão das diferentes classes modais ao longo do tempo. A determinação da curva de crescimento é de fundamental importância para o estudo de uma população, permitindo determinar a relação entre o tamanho e a idade dos indivíduos. A partir dos dados de idade e tamanho dos indivíduos estimam-se os parâmetros de crescimento, os quais são considerados fundamentos básicos em biologia pesqueira, uma vez que são usados em modelos mais complexos que descrevem a dinâmica de populações e avaliação dos estoques (SPARRE; VENEMA, 1997).

Alee et al. (1949) reconheceram os atributos populacionais ou de grupo em duas categorias: (1) características demográficas, associadas a estrutura da população e sua manutenção, isto é, abundancia, estrutura etária, taxas de recrutamento, crescimento e mortalidade; e (2) propriedades genéticas, tais como adaptabilidade, ajuste reprodutivo e persistência (ODUM, 1971). Segundo Cerrato (1980), os atributos populacionais refletem a ecologia de uma espécie e podem gerar informações relevantes ao estudo da extensão espacial e temporal do estresse ambiental.

O conhecimento de características demográficas populacionais tais como abundância, estrutura etária, períodos de recrutamento, crescimento e distribuição espaço- temporal, são fundamentais na interpretação da estrutura e da função de um ecossistema (MARGALEF, 1980; VASCONCELOS, 2011). Um bom entendimento da biologia populacional de espécies-alvo é necessário para entender como elas podem ser afetadas pelo ambiente e pela pesca, e assim, predizer níveis sustentáveis de captura, sem comprometer futuras pescarias (RONDINELLI & BARROS, 2010).

Na análise da dinâmica populacional, o recrutamento representa o ganho instantâneo de biomassa pelo estoque capturável (acrescido do ganho gradual pelo crescimento), que deverá ser reduzido devido a causas naturais e à captura dos seus indivíduos (FONTELES-FILHO, 2011).

O crescente incremento na quantidade de conhecimentos sobre dinâmica populacional e biologia reprodutiva de diversas espécies animais, fundamenta-se na utilidade destas informações para o estabelecimento de estratégias de manejo e preservação de estoques populacionais na natureza (TEIXEIRA, 2010). 68

A exploração de moluscos comestíveis é de extrema relevância, especialmente no Nordeste brasileiro, onde há uma concentração considerável de espécies que servem para alimentação humana. No entanto a exploração comercial pode reduzir a densidade populacional desses organismos ou até mesmo levar as suas reservas naturais à extinção. Desta forma, é de fundamental importância a compreensão de ecologia destas espécies de moluscos (SILVA et al., 2014).

É importante destacar que os estudos ecológicos e de manejo pesqueiro de moluscos de importância econômica do Brasil ainda são escassos, dificultando assim os trabalhos de levantamento básico necessários para orientar a sua exploração racional (SILVA et al., 2014).

O molusco bivalve Cyanocyclas brasiliana é endêmico da América do Sul, mais especificamente do norte do Brasil com ocorrência nos estados do Pará (Deshayes, 1854), Amazonas (Prime, 1870) e, recentemente, no Piauí (BRITO et al., 2015).

Popularmente conhecido como marisco, o bivalve C. brasiliana é largamente explorado pela pesca extrativista na comunidade dos Tatus em Parnaíba/PI, por parte das marisqueiras, devido a sua grande abundância. Sua captura, além de servir como fonte de alimento para a comunidade local, serve principalmente como fonte de renda, onde as partes moles deste produto é exportada principalmente para São Luis (MA) e São Paulo (SP).

O Piauí inclui o município da Ilha Grande no Delta do rio Parnaíba, onde se localiza o Porto dos Tatus, o segundo maior porto do estado, participando com 35% da produção total e tendo o privilégio de contar com uma riqueza relativamente elevada de moluscos (FARIAS, 2015).

Apesar de sua importância econômica para a região, não se tem registro de estudos realizados sobre a estrutura populacional da espécie C. brasiliana no Piauí. Em virtude deste contexto, surge a necessidade de informações sobre parâmetros populacionais pesqueiros desses organismos que venham a contribuir para a sua preservação e para sustentabilidade da atividade extrativista, evitando assim a diminuição e/ou o desaparecimento dos estoques.

69

2. OBJETIVO GERAL

Avaliar os parâmetros da dinâmica populacional do bivalve Cyanocyclas brasiliana do Delta do rio Parnaíba/PI.

2.1. Objetivos específicos

- Verificar os parâmetros da dinâmica populacional de Cyanocyclas brasiliana em relação a sazonalidade das estações do ano no período seco e chuvoso;

- Estimar as relações morfométricas das relações peso total/comprimento total, altura total/comprimento total e largura total/comprimento total, e tipo de crescimento;

- Identificar os períodos de recrutamento dessa espécie;

- Estimar os parâmetros de crescimento (k e L∞), mortalidade natural (M), mortalidade por pesca (F) e taxa de exploração (E).

3. MATERIAL E MÉTODOS

3.1. Área de estudo

A descrição da área de estudo está inserida na Introdução Geral, ítem 1.3.

3.2. Coleta dos dados

Os bivalves foram coletados mensalmente no período de janeiro de 2011 a dezembro de 2012, com todas as coletas realizadas em maré baixa de sizígia para facilitar na captura dos organismos.

As coletas foram realizadas na Gambôa do Mangue localizada na parte sul do Delta. Por se tratarem de organismos bentônicos de pouco movimento, o método de amostragem utilizado foi o método dos quadrados (SANTOS, 1978), o qual consiste na contagem do número de indivíduos delimitados por sub-regiões, os quais são geralmente dispostos ao acaso. 70

A Gamboa do Mangue é uma área onde ocorre uma intensa exploração do bivalve C. brasiliana pelas marisqueiras da região. Esta área foi selecionada, por ser um local de extração utilizado pelas marisqueiras e pela facilidade de acesso.

Foram selecionados 4 pontos distintos (Figura 11), sendo que em cada ponto foram colocados 10 quadrados (0,50x0,50m) dispostos paralelamente à linha d’água.

Figura 11 - Pontos de coleta no estuário (A) e (B) lançamento dos quadrados.

As capturas foram efetuadas manualmente utilizando pequenas pás para retirada do substrato (areia e/ou lama). Em seguida, o sedimento era colocado em um landuá (espécie de puçá) de malha com tamanho de 1mm - menor que as malhas utilizadas nos landuás convencionais (Figura 12) utilizados pelos pescadores o qual possuem malha de 12 mm - para posterior lavagem, separando dos mariscos. Após a lavagem, foi realizada a contagem dos organismos ainda no local de coleta, devolvendo-os logo em seguida ao ambiente natural.

Para as análises biométricas, nas áreas com pouca abundância de organismos (número de indivíduos por ponto menor ou igual a 100) foram considerados 100% dos indivíduos coletados. Em áreas mais abundantes e/ou nos meses de maior abundância foram considerados apenas 10% do total de indivíduos para cada ponto de coleta. Os indivíduos ainda vivos eram embalados em sacos plásticos, identificados e transportados para o Laboratório de Limnologia da Universidade Federal do Piauí (UFPI). 71

Os dados de precipitação acumulada na área de estudo durante os meses de coleta foram obtidos junto a EMBRAPA Meio-Norte/UEP-Parnaíba (2012).

Figura 12 - (A) Material utilizado na coleta de Cyanocyclas brasiliana (quadrado de PVC, pá e landuá); (B) Coleta e lavagem dos organismos; (C) Landuá adaptado para coleta e (D) Landuá convencional utilizado pelos marisqueiros.

3.3. Procedimentos de laboratório

Em laboratório, foram realizadas medições do comprimento, altura e largura da concha e peso total dos indivíduos, realizando-se a tabulação e análise dos dados utilizando-se o software Microsoft Excel 2010.

Para determinação do comprimento total (Lt), altura total (Ht) e largura (Lg) das conchas, foram realizadas medições em milímetros (mm), utilizando paquímetro digital com precisão de 0,01 mm. Como comprimento total considera-se as medidas correspondentes entre 72

a maior distância entre o lado anterior e posterior da concha, em linha paralela ao umbo. Para altura total considerou-se a maior distância entre as margens dorsal e ventral e largura a maior distância entre duas valvas da superfície externa da concha (Figura 13).

Para a determinação do peso total (Wt) em gramas, os indivíduos, considerando concha e partes moles, foram pesados com o auxílio de balança analítica digital, com precisão de 0,00001 g.

Figura 13 - Representação esquemática das medições da concha de Cyanocyclas brasiliana considerando o comprimento total (Lt), altura total (Ht) e largura (Lg).

3.4. Análise dos dados

3.4.1. Relações morfométricas

Para as análises das relações morfométricas, comprimento total/altura total e comprimento total/largura total, foram realizadas regressões lineares considerando a variável independente o comprimento total e variáveis dependentes a altura total e a largura total:

퐻 = 푎 + 푏퐿푡

퐿푔 = 푎 + 푏퐿푡

Sendo: H - altura total (mm); Lg - largura total (mm); Lt - comprimento total (mm); a - coeficiente linear e b - coeficiente angular. 73

Com a transformação logarítmica, dos dados de peso e comprimento, um modelo linear foi ajustado, calculando-se os parâmetros da regressão pelo método dos mínimos quadrados de acordo com o seguinte modelo potencial:

푏 푊푡 = 퐴퐿푡

Sendo: Wt - peso total (g); A - exponencial do coeficiente linear (a); Lt - comprimento total (mm) e b - coeficiente angular.

O coeficiente alométrico (b) assumirá o valor 1 quando as medidas forem lineares (comprimento x largura) e assumirá o valor 3 quando for em relação ao volume (comprimento x peso). Assim foi determinado o tipo de crescimento para a espécie estudada, que pode ser isométrico quando o incremento em peso (b = 3) e em largura e altura (b = 1) acompanham o crescimento em comprimento; alométrico positivo quando o incremento em peso (b > 3) e em largura e altura (b > 1) é maior do que em comprimento ou alométrico negativo quando o incremento em peso (b < 3) e em largura e altura (b < 1) é menor do que em comprimento.

O teste t foi aplicado para verificar se os valores de (b) foram diferentes do crescimento isométrico, (tcalculado> ± 1,96) utilizando a equação de King (1995):

3 − 푏 푡 = 2 √푠푏

2 Sendo: t - valor estatístico; b - coeficiente angular; Sb - variância do coeficiente angular.

Onde: H0: b = 3 e b = 1 (crescimento isométrico) e H1: b ≠ 3 e b ≠ 1 (crescimento alométrico) (α = 0,05) (ZAR, 1996).

O fator de condição, em geral, determina o grau de bem estar do animal, revelando informações sobre o estado fisiológico. Assim, para relacionar as condições alimentares recentes e/ou os gastos das reservas em atividades cíclicas dos animais com as condições ambientais foi calculado o grau de higidez ou fator de condição (K), para os períodos seco e chuvoso, utilizando a equação de Vazzoler (1996):

Wt K = b Lt 74

Sendo: K - fator de condição; Wt - peso total (g); L - comprimento total (mm) e b - coeficiente angular da relação peso/comprimento.

Foi aplicado o teste t para verificar se os valores de Kperíodo seco e Kperíodo chuvoso foram diferentes, onde H0: Kperíodo seco = Kperíodo chuvoso e H1: Kperíodo seco ≠ Kperíodo chuvoso (α = 0,05) (ZAR, 1996).

Os dados foram analisados utilizando-se o programa BioEstat 5.0.

3.4.2. Parâmetros da dinâmica populacional

3.4.2.1. Densidade e biomassa

A densidade de organismos por mês de coleta foi calculada a partir da abundância total das amostras coletadas, expressa em número de indivíduos/m2 A biomassa calculada por mês foi realizada a partir do cálculo da média dos pesos expressa em gramas. Análises de correlação não-paramétrica de Spearman foram também utilizadas para relacionar os parâmetros ambientais com densidade e biomassa. Os dados biológicos foram comparados e correlacionados com os parâmetros ambientais obtidos, sendo analisados utilizando-se o pacote computacional do Programa Microsoft® Excel® 2016.

3.4.2.2. Parâmetros de crescimento

Foram confeccionados histogramas de frequência de tamanho (considerando o comprimento do animal) com vários intervalos de classes. O número de classes foi determinado segundo a fórmula de Sturges: Vi = A/K, onde: Vi = Intervalo de classes, A = Amplitude da variável (Lt) (Max –Min), K = número de classes calculado pela fórmula: 1 + 3,32 log n, onde “n” é o número total de indivíduos. Este cálculo resultou em intervalo de classe de tamanho estimado em 0,6mm.

Estes histogramas foram interpretados e analisados para a determinação de parâmetros populacionais como crescimento, recrutamento e mortalidade. Para tanto, foi utilizado o software FISAT II (Versão 1.2.2), produzido pela FAO (Food and Agriculture 75

Organization) e pelo ICLARM (International Center for Living Aquatic Resources Management) (GAYANILO; PAULY, 1997).

O crescimento foi descrito através do método indireto da análise de frequência de comprimento, ou seja, monitoramento da progressão das modas do comprimento através do tempo, utilizando como modelo de crescimento a equação de von Bertalanffy

(BERTALANFFY, 1938), que estabelece a função entre o comprimento total (Lt) e a idade (t), de acordo com a equação:

−푘(푡−푡0) 퐿푡 = 퐿∞[1 − 푒 ]

Sendo: Lt = comprimento em mm para uma dada idade t; L∞ = comprimento máximo teórico que uma espécie pode atingir ou comprimento assintótico; k = constante de crescimento (velocidade em que o indivíduo alcança L∞); t = idade e t0 = idade no comprimento

Lt = 0. Nesta análise, uma vez que “t0” não é um parâmetro biológico, mas sim apenas um mecanismo matemático utilizado para ajustar melhor a curva de crescimento (MOREAU, 1987), foi considerado igual a zero.

Para a obtenção dos parâmetros de crescimento da equação de von Bertalanffy (1934) foi utilizado o pacote computacional FISAT II (FAO/ICLARM Stock Assessment Tools) (GAYANILO et al., 1994). Neste pacote, estão disponíveis diferentes metodologias para calcular os parâmetros de crescimento, de forma que se possam comparar os resultados e obter as melhores estimativas possíveis.

Inicialmente, as medidas individuais de comprimento total de Cyanocyclas brasiliana foram distribuídas em intervalos de classes de comprimento de 0,6 mm, empregando-se a fórmula de Sturges conformes descrito no item anterior.

Antes da entrada de dados no programa FISAT II, foi utilizada a fórmula de Taylor (1962) para estimar L∞ (comprimento assintótico):

퐿푚á푥푖푚표 푒푛푐표푛푡푟푎푑표 푒푚 푐푎푚푝표 퐿 = ∞ 0,95

Foram utilizadas em sequência as seguintes rotinas do programa Fisat II:

76

Powell-Wetherall

Foram realizadas estimativas preliminares da largura assintótica ou infinita (L∞) e relação taxa de mortalidade (Z)/taxa de crescimento (k). O gráfico originado revela uma curva de captura; a escolha de um ponto da curva permite ao programa o cálculo de uma equação de regressão e as primeiras estimativas dos parâmetros L∞ e relação Z/k foram originadas.

Shepherd’s Method

Nesta rotina foram utilizadas duas sub-rotinas, o “Response Surface” e o “k-Scan”, ambas, serviram para delimitar visualmente as variações de L∞ e da constante de crescimento k.

Estimativa definitiva dos parâmetros populacionais ELEFAN I:

Esta rotina estima os parâmetros L∞ e k, onde várias amostras de distribuição de frequência de comprimento são dispostas sequencialmente e as progressões das modas servem para inferir sobre o crescimento.

Na rotina ELEFAN I, há três sub-rotinas: “Automaticsearch”, “Response surface” e “k-Scan”, sendo que para uma dada série de distribuições de frequências são estimados os parâmetros L∞, k, C, WP, SL (“StartingLenght”) e o SS (“StartingSample”) que são valores (pontos) estabelecidos arbitrariamente por onde a curva deve passar.

Usando a sub-rotina “k-Scan”, vários experimentos foram conduzidos a fim de obter melhores ajustes (aderência) das curvas de crescimento combinando os valores resultantes de k, L∞ e o número de coortes que passarem através dos picos modais (ANGELINI & GOMES, 2008).

77

3.4.2.3. Mortalidade

Os parâmetros mais importantes no estudo da mortalidade são as “taxas de mortalidade” Z (taxa instantânea de mortalidade total), M (taxa instantânea de mortalidade natural) e F (taxa instantânea de mortalidade por pesca).

Para o cálculo do coeficiente instantâneo de mortalidade total (Z) foram utilizados os métodos de curva de captura de Ricker (1975) e o método de Jones & van Zaling (1981).

A curva de captura de Ricker (1975) é uma representação gráfica do logaritmo do número de sobreviventes de uma classe etária (ou de um comprimento) contra a idade. Neste método, os comprimentos são convertidos em dados de idade através da equação inversa de von Bertalanffy:

1 L t(L) = t0 ( /k) x ln(1-( /L∞))

Onde: t(L) é a idade em determinado comprimento L; k e L∞ são os parâmetros da equação de von Bertalanffy.

A curva de captura possui geralmente forma de sino assimétrico, na qual as primeiras classes de idade formam a parte ascendente da curva que corresponde aos indivíduos que ainda não estão completamente capturáveis e, devido a isto, são excluídas da análise. Assim como as últimas classes que correspondem a um pequeno número de indivíduos mais velhos que apresentam taxa de crescimento menor e que se aproximam de L∞ onde a relação entre a idade e o comprimento torna-se muito incerta. Escolhidos os pontos a serem incluídos na análise de regressão, assume-se que o conjunto de amostras obtidas representam a estrutura de uma população em equilíbrio, com distribuição de idade estável. Estes pontos que correspondem a curva de captura fornecerão informações sobre a taxa de mortalidade total da população, segundo as equações abaixo.

Considerando que a curva exponencial de sobrevivência é dada por:

lnNti = lnN0 - Zti

Esta equação tem a forma da equação da reta (y = a - bx), onde “Nti“ é o número de indivíduos na classe de idade “t”; “ti” é a idade média relativa da classe de comprimento “i“ e

“N0“ é o número inicial. Substituindo os parâmetros a serem obtidos pelos da equação da reta teremos que: a = N0 e b = - Z. 78

Por meio desta rotina, além de se estimar “Z” (mortalidade total), estimou-se também “F” (mortalidade por pesca) e “E” (taxa de exploração). A mortalidade natural “M” foi estimada a partir da relação empírica desenvolvida por Pauly (1980):

log (M) = - 0,0066 - 0,279 log (L∞ ) + 0,6543 log (K) + 0,4634 log (T)

Aplicando-se os valores de L∞, K e T (média da temperatura do habitat natural da espécie).

A mortalidade por pesca (F) foi determinada através da relação da mortalidade total e natural, de acordo com a seguinte expressão matemática:

F = Z - M

A taxa de exploração E foi obtida pela fórmula: E = F/Z.

3.4.2.4. Modelo de Rendimento por Recruta

O modelo de rendimento por recruta, baseado no modelo de Beverton e Holt (1956; 1957), foi utilizado para a identificação do padrão atual de exploração dos estoques de C. brasiliana. Este modelo estima a captura potencial do estoque em função da mortalidade por pesca e do tamanho de primeira captura, usando como entrada de dados os parâmetros de crescimento e uma estimativa da mortalidade natural. Esta avaliação foi realizada admitindo-se a seleção de fio de navalha.

Para a seleção de fio de navalha é necessário conhecer as razões dos parâmetros:

Lc/L∞ e M/K, para serem utilizados na seguinte fórmula:

m/k Y/R = EU {1 – 3U + 3U2 – U3}

(1+ m) (1+2m) (1+3m)

79

Onde:

Y/R = Rendimento relativo por recruta,

U = 1 – (Lc/L∞), fração do crescimento para ser completa pelo marisco após entrar na fase de exploração,

M = (1-E)/(M/K) = (K/Z)

E = F/Z

K = constante de crescimento

Como resultado deste modelo, obtém-se as referências biológicas E , E e E . 10 50 max E é definido como a taxa de exploração que corresponde ao ponto na curva de rendimento por 10 recruta onde a inclinação é de 10%. E é taxa na qual a biomassa desovante estaria a 50% da 50 biomassa virgem. Finalmente, E é o valor da taxa de exploração obtida quando o rendimento max é máximo. Estas referências biológicas serão comparadas com a taxa de exploração atual (E) e servirão para determinar o estado atual de exploração do estoque sob estudo.

O padrão de recrutamento anual é expresso através de um histograma cujas oscilações refletem a sazonalidade do recrutamento da população em questão ao serem fornecidos os parâmetros L∞, K, C e WP.

A observação da distribuição de frequências de comprimento pode sugerir o momento de maior recrutamento no ano, especialmente se menores comprimentos tiverem sido computados no período amostrado.

A longevidade (A0,95), definida como a idade máxima em que 95% da coorte morreria por meios naturais, somente foi estimada a partir da fórmula proposta por Taylor

(1958) A0.95 = t0 + 2,996/k (Sparre; Venema, 1997), onde t0 = idade teórica em comprimento zero e k = taxa de crescimento. O valor de t zero foi estimado utilizando-se a fórmula de Pauly (1979):

log(-t0) = - 0,3922 – 0,2753 x logL∞ - 1,038 x logk 80

4. RESULTADOS

4.1. Relações morfométricas

A caracterização morfométrica baseia-se fundamentalmente nas relações entre as medidas lineares altura total e largura total, e a medida volumétrica peso total com o comprimento total do indivíduo, o que permite a comparação de espécies em diferentes áreas geográficas, determinando subespécies e variações numa mesma espécie. Na presente pesquisa, foram avaliadas as relações morfométricas do bivalve Cyanoclyclas brasiliana.

A equação obtida através da relação entre o comprimento total, Lt (mm) e o peso

2,7522 total Wt (g) foi W = 0,0006L (Figura 14). O valor do coeficiente de determinação (R²) indica que a equação apresentou um bom ajuste aos dados, sendo que 89,52% da variação do peso total pode ser explicada pela variação do comprimento total.

A signficância estatística da correlação entre as duas variáveis foi avaliada através das seguintes técnicas: (1) correlação pelo coeficiente de Pearson (r = 0,9841; p < 0,0001); (2) Análise de Variância do coeficiente angular, b (F = 289.991,5; p < 0,00001) e (3) valor de t do coeficiente angular, b (t = 538,51; p < 0,00001).

O coeficiente angular da regressão peso total (g)/comprimento total (mm) de C. brasiliana apresentou valor de b = 2,7522, com erro padrão Sb= 0,00556, de modo que o intervalo de confiança de b para 95% ocorre na faixa de 2,741 - 2,763. A existência de alometria nessa relação morfométrica foi submetida ao teste t, para se avaliar a aceitação ou rejeição da hipótese de nulidade, H0 = 3 – b, com o seguinte resultado: t = (3 – b)/Sb = 44,57; p< 0,001). Portanto, ao se rejeitar a hipóste de nulidade, conclui-se que existe alometria negativa na regressão entre peso total e comprimento total, signficiando que o peso do indivíduo aumenta com uma taxa menor do que o comprimento ao longo do seu ciclo de vida.

81

10,000 y = 0,0006x2,7522 R2 = 0,8952 9,000

8,000

7,000

6,000

5,000

4,000 PESO TOTAL (g)

3,000

2,000

1,000

0,000 0,00 5,00 10,00 15,00 20,00 25,00 30,00 35,00 40,00 COMPRIMENTO TOTAL (mm)

Figura 14 - Relação peso total/comprimento total dos espécimes de C. brasiliana coletados no Delta do rio Parnaíba.

A relação entre altura total (mm) e comprimento total (mm) da concha forneceu através de um gráfico de dispersão uma reta potencial com elevada aderência entre as variáveis, comprovada pela elevada significância do coeficiente da regressão, com valor de b = 1,009 (F

= 132.443,2; p < 0,00001; t = 363,93; p < 0,00001) e erro padrão Sb = 0,00277. O uso da fórmula de t para caracterização da alometria indica a rejeição da hipótese de nulidade, H0 = (1 – b), por meio da equação t = (1 – b)/Sb = 3,249; p < 0,05, de modo que se pode concluir pela existência de alometria positiva na regressão entre altura total e comprimento total, significando que a altura do indivíduo aumenta com uma taxa maior do que o comprimento ao longo do seu ciclo de vida (Figura 15).

82

25,00

20,00 y = 0,5215x1,0091 R2 = 0,9334

15,00

10,00 ALTURA TOTAL (mm)

5,00

0,00 0,00 5,00 10,00 15,00 20,00 25,00 30,00 35,00 40,00 COMPRIMENTO TOTAL (mm)

Figura 15 - Relação altura total/comprimento total do bivalve Cyanocyclas brasiliana coletado no Delta do rio Parnaíba.

A relação entre largura total (mm) e comprimento total (mm) da concha forneceu através de um gráfico de dispersão uma reta potencial com elevada aderência entre as variáveis, comprovada pela elevada significância do coeficiente da regressão, com valor de b = 0,9991 (F

= 627.506,7; p < 0,00001; t = 792,15; p < 0,00001) e erro padrão Sb = 0,00126. O uso da fórmula de t para caracterização da alometria indica a aceitação da hipótese de nulidade, H0 = (1 – b), por meio da equação t = (1 – b)/Sb = 0,714; p < 0,05, de modo que se pode concluir pela existência de isometria na regressão entre largura total e comprimento total, significando que o a largura do indivíduo aumenta com uma taxa semelhante à do comprimento ao longo do seu ciclo de vida (Figura 16).

A relação entre largura total (mm) e comprimento total (mm) da concha forneceu através de um gráfico de dispersão uma reta potencial, com valor de b = 0,999 (F = 627.506,7; p < 0,00001; t = 792,15; p < 0,0001) e erro padrão de b, Sb = 0,00126. O uso da fórmula de t para caracterização da alometria indica aceitação da hipótese de nulidade, H0 = (1 – b), por meio da equação t = (1 – b)/Sb = 0,714; p > 0,05, de modo que se pode concluir pela existência de isometria na regressão entre largura total e comprimento total, significando que a largura do 83

indivíduo aumenta com uma taxa semelhante à do comprimento ao longo do seu ciclo de vida (Figura 16).

35,00

30,00

y = 0,8871x0,9991 25,00 R2 = 0,9852

20,00

15,00 LARGURA TOTAL LARGURA (mm) 10,00

5,00

0,00 0,00 5,00 10,00 15,00 20,00 25,00 30,00 35,00 40,00 COMPRIMENTO TOTAL (mm)

Figura 16 - Relação largura total/comprimento total do bivalve Cyanocyclas. brasiliana coletado no Delta do rio Parnaíba.

O resultado do teste t confirma que existe diferença significativa (95%) entre os fatores de condição Kperíodo seco (julho a dezembro) e Kperíodo chuvoso (janeiro a junho) (t = 5,4254; p < 0,01). No período seco, o fator de condição foi maior, o que indica que neste período ocorre um ganho de massa pelo animal. Já o menor fator de condição no período chuvoso, pode estar relacionado a entrada de individuos menores (recrutamento), mortalidade natural e redução do peso dos indivíduos adultos após a liberação de gametas.

4.2. Dinâmica Populacional

Ao longo do estudo, foram contados 714.009 exemplares de Cyanocyclas brasiliana, sendo 363.226 em 2011 e 350.783 em 2012. A densidade anual da população variou de 693 ind./m2 durante o mês de janeiro de 2011 a 5.992 ind./m2 em julho do mesmo ano. Para o ano de 2012, a menor densidade ocorreu no mês de novembro com 1.562 ind./m2 e a maior durante o mês de maio com 4.531 ind./m2 (Tabela 5; Figura 17). 84

Tabela 5. Número de indivíduos contados, densidade (ind./m2) e peso médio (g) de Cyanocyclas brasiliana nos anos de 2011 e 2012 no Delta do rio Parnaíba.

2011 2012 Peso Médio (g)

N ind/m2 N ind/m2 2011 2012

Jan 6.925 693 26.991 2.699 0,873 1,128

Fev 8.282 828 25.291 2.529 0,267 1,371

Mar 11.275 1.128 40.017 4.002 0,162 1,081

Abr 22.937 2.294 35.893 3.589 0,174 1,747

Mai 39.145 3.915 45.311 4.531 0,584 1,821

Jun 40.692 4.069 32.301 3.230 1,085 1,973

Jul 59.921 5.992 33.165 3.317 1,233 0,898

Ago 45.539 4.554 34.029 3.403 0,824 1,164

Set 29.545 2.955 24.486 2.449 1,074 2,222

Out 30.352 3.035 22.043 2.204 0,999 1,181

Nov 33.084 3.308 15.619 1.562 0,819 0,885

Dez 35.529 3.553 15.637 1.564 0,794 1,156

Total 363.226 - 350.783 - - -

85

7.000

6.000

5.000

2 4.000

3.000 unid/m

2.000

1.000

0 Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez

2011 2012

Figura 17 - Densidade mensal (unid/m2) de Cyanocyclas brasiliana nos anos de 2011 e 2012 no Delta do rio Parnaíba.

Do total de indivíduos contados, 5.736 exemplares de Cyanocyclas brasiliana, foram medidos, tendo sido observado um comprimento total da concha variando de 2,25 mm a 30,45 mm. O menor indivíduo capturado ocorreu no mês de janeiro de 2011 e o maior em julho de 2012.

Histogramas de frequência de ocorrência por tamanho foram elaborados utilizando- se o intervalo de classe de 0,6 mm. As figuras 18 e 19 apresentam a progressão modal dos tamanhos dos indivíduos observados nos anos de 2011 e 2012. Foi possível observar que, a população do bivalve não apresentou o mesmo padrão de distribuição de classes de tamanho nos dois anos. Em 2011, foi observado no início do ano um incremento modal constituído por indivíduos jovens e a baixa ocorrência de indivíduos de classes de tamanho maiores. No ano de 2012, não foi observado a entrada de indivíduos menores na população, sendo somente observado uma moda de bivalves adultos durante todo o ano.

A biomassa média mensal dos indivíduos variou de 0,162g no mês de março em 2011 a 2,222g no mês de setembro de 2012. A menor biomassa média em 2011 ocorreu durante o mês de março com 0,162g e a maior no mês de julho com 1,233g. Em 2012, a menor biomassa média foi de 0,885g para o mês de novembro e a maior 2,222g para o mês de setembro (Figura 20). 86

janeiro/2011 n = 199 fevereiro/2011 n = 239 80 80 60 60 40 40 20 20

0 0

5.4 5.4 0.6 3.0 7.8 0.6 3.0 7.8

22.2 22.2 10.2 12.6 15.0 17.4 19.8 24.6 27.0 29.4 31.8 34.2 36.6 10.2 12.6 15.0 17.4 19.8 24.6 27.0 29.4 31.8 34.2 36.6 março/2011 n = 240 abril/2011 n = 180 40 30 25 30 20 20 15 10 10 5

0 0

3.0 3.0 0.6 5.4 7.8 0.6 5.4 7.8

19.8 27.0 19.8 27.0 10.2 12.6 15.0 17.4 22.2 24.6 29.4 31.8 34.2 36.6 10.2 12.6 15.0 17.4 22.2 24.6 29.4 31.8 34.2 36.6 maio/2011 n = 230 junho/2011 n = 239 30 30 25 25 20 20 15 15 10 10 5 5

0 0

3.0 3.0 0.6 5.4 7.8 0.6 5.4 7.8

19.8 27.0 19.8 27.0 10.2 12.6 15.0 17.4 22.2 24.6 29.4 31.8 34.2 36.6 10.2 12.6 15.0 17.4 22.2 24.6 29.4 31.8 34.2 36.6

julho/2011 n = 240 agosto/2011 n = 180 40 30 25 30 20 20 15 10 10 5

0 0

3.0 3.0 0.6 5.4 7.8 0.6 5.4 7.8

19.8 27.0 19.8 27.0 10.2 12.6 15.0 17.4 22.2 24.6 29.4 31.8 34.2 36.6 10.2 12.6 15.0 17.4 22.2 24.6 29.4 31.8 34.2 36.6 setembro/2011 n = 180 outubro/2011 n = 180 20 20 15 15 10 10 5 5

0 0

0.6 7.8 0.6 7.8 3.0 5.4 3.0 5.4

24.6 24.6 10.2 12.6 15.0 17.4 19.8 22.2 27.0 29.4 31.8 34.2 36.6 10.2 12.6 15.0 17.4 19.8 22.2 27.0 29.4 31.8 34.2 36.6 novembro/2011 n = 180 dezembro/2011 n = 142 40 40 30 30 20 20 10 10

0 0

0.6 7.8 0.6 7.8 3.0 5.4 3.0 5.4

24.6 24.6 10.2 12.6 15.0 17.4 19.8 22.2 27.0 29.4 31.8 34.2 36.6 10.2 12.6 15.0 17.4 19.8 22.2 27.0 29.4 31.8 34.2 36.6 Figura 18 - Histogramas mensais da frequência de tamanho (mm) dos indivíduos de Cyanocyclas brasiliana no Delta do rio Parnaíba, no período de 2011. 87

janeiro/2012 n = 131 fevereiro/2012 n = 159 30 20 25 15 20 15 10 10 5 5

0 0

0.6 7.8 0.6 7.8 3.0 5.4 3.0 5.4

24.6 24.6 10.2 12.6 15.0 17.4 19.8 22.2 27.0 29.4 31.8 34.2 36.6 10.2 12.6 15.0 17.4 19.8 22.2 27.0 29.4 31.8 34.2 36.6 março/2012 n = 180 abril/2012 n = 188 40 40 30 30 20 20 10 10

0 0

5.4 5.4 0.6 3.0 7.8 0.6 3.0 7.8

12.6 22.2 29.4 12.6 22.2 29.4 10.2 15.0 17.4 19.8 24.6 27.0 31.8 34.2 36.6 10.2 15.0 17.4 19.8 24.6 27.0 31.8 34.2 36.6 maio/2012 n = 304 junho/2012 n = 301 60 40 50 30 40 30 20 20 10 10

0 0

5.4 5.4 0.6 3.0 7.8 0.6 3.0 7.8

12.6 22.2 29.4 12.6 22.2 29.4 15.0 17.4 19.8 24.6 27.0 31.8 34.2 36.6 10.2 15.0 17.4 19.8 24.6 27.0 31.8 34.2 36.6 10.2

julho/2012 n = 302 agosto/2012 n = 300 50 40 40 30 30 20 20 10 10

0 0

5.4 5.4 0.6 3.0 7.8 0.6 3.0 7.8

12.6 22.2 29.4 12.6 22.2 29.4 10.2 15.0 17.4 19.8 24.6 27.0 31.8 34.2 36.6 10.2 15.0 17.4 19.8 24.6 27.0 31.8 34.2 36.6 setembro/2012 n = 363 outubro/2012 n = 360 60 60 50 50 40 40 30 30 20 20 10 10

0 0

0.6 3.0 5.4 7.8 0.6 3.0 5.4 7.8

10.2 27.0 10.2 27.0 12.6 15.0 17.4 19.8 22.2 24.6 29.4 31.8 34.2 36.6 12.6 15.0 17.4 19.8 22.2 24.6 29.4 31.8 34.2 36.6 novembro/2012 n = 360 dezembro/2012 n = 360 80 50 60 40 30 40 20 20 10

0 0

0.6 3.0 5.4 7.8 0.6 3.0 5.4 7.8

10.2 27.0 10.2 27.0 15.0 17.4 19.8 22.2 24.6 29.4 31.8 34.2 36.6 12.6 15.0 17.4 19.8 22.2 24.6 29.4 31.8 34.2 36.6 12.6

Figura 19 - Histogramas mensais da frequência de tamanho (mm) dos indivíduos de Cyanocyclas brasiliana no Delta do rio Parnaíba, no período de 2012. 88

2,500

2,000

1,500 Peso (g)Peso 1,000

0,500

0,000 Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez

2011 2012

Figura 20 - Biomassa média (g) de Cyanocyclas brasiliana nos anos de 2011 e 2012 no Delta do rio Parnaíba.

Segundo a EMBRAPA Meio-Norte/UEP-Parnaíba, as chuvas se concentraram na primeira metade do ano, sobretudo entre os meses de fevereiro e abril para o ano de 2011 e fevereiro e março para o ano de 2012 (EMBRAPA, 2012). Assim, foram consideradas para este estudo dois períodos climáticos: período chuvoso (janeiro a junho) e período seco (julho a dezembro). A precipitação acumulada variou de 0 mm para os períodos secos a uma máxima de 347,2 mm nos períodos chuvosos. A precipitação máxima em 2011 ocorreu no mês de abril com 347,2 mm e em 2012 no mês de março com 215,3 (Figura 21). 89

Figura 21 - Precipitação acumulada para os anos de 2011 e 2012 para o Delta do rio Parnaíba/PI.

A temperatura média do ar, medida no momento da coleta, foi de 27,6ºC em 2011 e 28,4ºC em 2012. Considerando-se que a região de estudo está inserida na zona tropical e tem um clima tropical megatérmico, segundo a classificação de Koppen (ALVARES et al., 2013), quente o ano inteiro, não há grande variação na temperatura.

A salinidade variou de 0 a 3, sendo a máxima de 3 observada no mês de setembro de 2012.

Ao determinar a correlação das variáveis ambientais com a densidade e aplicando- se o teste t Student para cada ano, verificou-se que nenhum dos seguintes parâmetros, pluviosidade (t = 1,7958; p > 0,05), temperatura (t = 1,7958; p > 0,05) e salinidade (t = 1,7958; p > 0,05), para um nível de significância de 5%, parece influenciar isoladamente a abundância de C. brasiliana.

Os parâmetros de crescimento foram calculados através da progressão modal das distribuições de frequências dos comprimentos da C. brasiliana desconsiderando os sexos. 90

O valor estimado de L∞ pela fórmula de Taylor (1962) foi 32,05 mm. Já os valores estimados de L∞ e Z/k pelo método de Powell-Wetherall foram respectivamente 31,73 mm e 2,579, sendo obtida a função y = 8,87 – 0,279x, com r = - 0,993 (Figura 22).

Figura 22 - Estimativas preliminares do comprimento assintótico ou infinito (L∞) e relação taxa de mortalidade (Z)/taxa de crescimento (k) para os espécimes de C. brasiliana coletados no Delta do Parnaíba.

Através do método de Shepherd “Response Surface”, foram obtidos os resultados das estimativas dos parâmetros L∞ = 31,02 mm e k = 1,10. Com o Shepherd “k-Scan” foram obtidas as estimativas dos parâmetros L∞ = 31,82 mm e k = 1,31 (Figura 23). 91

Figura 23 - Delimitação visual das variações de (L∞) e da constante de crescimento (k) obtidas por meio da sub-rotina “k-Scan” do método de Shepherd para os espécimes de C. brasiliana coletados no Delta do Parnaíba.

As curvas de crescimento das coortes obtidas usando os dados de frequência comprimento para C. brasiliana estimados pelo método Shepherd “k-Scan” podem ser observadas na figura 24, o qual foram identificadas uma coorte com a entrada de espécimes jovens ocorrendo principalmente entre os meses de janeiro e fevereiro. 92

Figura 24 - Curvas de crescimento ajustadas em coortes para C. brasiliana, obtidas por meio da sub-rotina “k-Scan” do método de Shepherd (pacote computacional FISAT), coletados no Delta do rio Parnaíba.

Os resultados dos parâmetros de crescimento dos diversos métodos utilizados, estão sumarizados na Tabela 6.

Tabela 6 - Valores estimados para os parâmetros de crescimento para C. brasiliana coletados no Delta do Parnaíba.

Método L∞ (mm) k

Taylor 32,05

Powell-Wetherall 31,73 Shepherd “Response Surface” 31,02 1,10

Shepherd “k-Scan” 31,82 1,31 Média 31,74 1,21

93

4.3. Mortalidade

A taxa de mortalidade total de uma população pode ser expressa numericamente de duas formas: taxa de expectativa de morte do indivíduo, ou taxa real de mortalidade (A), expressa em porcentagem, representando a fração do total de indivíduos que existiam no início do ano e que realmente morre depois de um ano e se o número de indivíduos mortos em um pequeno intervalo de tempo é sempre proporcional ao número de indivíduos presentes neste intervalo.

Com base nos valores médios de L∞ e k, a mortalidade total Z de Cyanocyclas brasiliana foi estimada pelo método de “Length-Converted Catch Curve” como 2,62 com intervalo de confiança de 95% variando entre 2,36 e 2,97 (Figura 25).

Figura 25 - Estimativa da mortalidade total pelo método de Length-Converted Catch Curve para C. brasiliana coletados no Delta do rio Parnaíba.

94

Pelo método de “Jones & van Zaling”, e também considerando os valores médios de L∞ e k, a mortalidade total Z foi estimada como 2,58 com intervalo de confiança de 95% variando entre 2,48 e 2,68 (Figura 26).

Figura 26 - Estimativa da mortalidade total pelo método de Jones & van Zaling para C. brasiliana coletados no Delta do rio Parnaíba.

A mortalidade total “Z” média obtida pelos métodos de Jones & van Zaling (Z = 2,58) foi utilizada no cálculo da mortalidade por pesca “F” e na taxa de exploração “E”. Assim, a mortalidade por pesca estimada foi F = 0,65 e a taxa de exploração “E” foi 0,250, o que indica uma reduzida taxa de exploração dos estoques dessa espécie.

Com base nos valores médios de L∞, k e da temperatura média do habitat, medida em campo a cada coleta, (26,9ºC±1,4612), a mortalidade natural “M” foi estimada pelo método de “Pauly” como 1,95.

95

4.4. Modelo de Rendimento por Recruta

A fim de avaliar a explaração do bivalve Cyanocyclas brasiliana na Comunidade dos Tatus (PI), foi calculado o rendimento por recruta. Para tanto, o tamanho da malha rígida da arte de pesca comumente usada pelas marisqueiras (Lc= 12 mm), o valor da relação Lc/L∞ = 0,38 e o valor de M/k = 1,62 foram utilizados como dados de entrada no modelo de rendimento por recruta (Figura 27).

Figura 27 - Curvas da taxa de exploração (E), rendimento por recruta Y/R e biomassa por recruta B/R para C. brasiliana coletados no Delta do rio Parnaíba.

Os resultados obtidos pelo modelo foram Emáx = 0,591; E0,10 = 0,507 e E0,50 = 0,327. Com esses resultados é possível verificar que a taxa de exploração E = 0,250 estava abaixo da taxa de exploração máxima sustentável. Os valores obtidos pelo modelo indicam que o aumento da taxa de exploração de E0,30 para E0,50 proporcionaria uma elevação no rendimento por recruta (Y/R) próximo de 30%, contudo causaria uma redução no rendimento da biomassa por recruta (B/R) de 44,49% (Tabela 7).

96

Tabela 7 - Valores das taxas de exploração (E), rendimento por recruta Y/R e biomassa por recruta B/R para C. brasiliana coletados no Delta do rio Parnaíba.

E(%) Y/R(g/indiv.) B/R(g/indiv.)

0,01 0,012 0,832 0,20 0,022 0,677 0,30 0,030 0,535 0,40 0,035 0,409 0,50 0,039 0,297 0,60 0,040 0,203 0,70 0,038 0,126 0,80 0,035 0,068 0,90 0,031 0,026 0,99 0,026 0,002

A longevidade estimada (A0,95) com o t0 obtido de 0,13 anos, foi de 2,6 anos, ou seja, os indivíduos passam aproximadamente 3 anos para alcançar 95% do comprimento assintótico.

97

5. DISCUSSÃO

Ao longo do período de estudo, a população de Cyanocyclas brasiliana apresentou variações quanto a sua densidade populacional e tamanho dos indivíduos, sendo observado em 2011 uma maior densidade e uma maior ocorrência de jovens. Apesar de ocorrerem variações, os valores de densidade observados neste estudo estiveram sempre acima de 600 ind./m2, alcançando um máximo de 5.992 ind./m2. Na família Cyrenidae, espécies do gênero Corbicula tem sido observadas em altas densidades tanto em populações nativas (TAKADA et al., 2001; NAMBU et al, 2005; 2008) quanto invasoras (MANSUR & GARCES, 1988; MOUTHON, 2001; VIANNA, 2002; AVELAR, 2003, SOUZA et al., 2008; DENTON et al., 2012). A grande produtividade deste grupo está relacionada às características como a estratégia de vida. Os cirenídeos alimentam-se por filtração da água, porém podem também capturar partículas do sedimento (DENTO et al. 2012) o que garante um suprimento extra de energia ou regulação da taxa de alimentação quando há uma diminuição da disponibilidade de alimento na coluna d’água (NEVES, 2010). As estratégias reprodutivas e de dispersão do grupo também contribuem para a ocorrência de elevadas densidades populacionais. Os cirenídeos são hermafroditas, em sua maioria, ou dióicos (NAMBU et al., 2008; RYBALKINA et al., 2013) e, dependendo da espécie, podem ter fecundação externa (NAMBU et al., 2008), cruzada ou autofecundação, produzindo uma grande quantidade de larvas que podem ser incubadas nos filamentos branquiais ou liberadas na coluna d’água (NEVES, 2010). As larvas são muito ativas e resistentes, mas não são livre-natantes, o que as protege de serem deslocadas pela corrente (Mansur & GARCES, 1988) e sofrem decantação, enterrando-se no sedimento, onde se desenvolvem (MORTON, 1978). Assim, apesar de não terem sido avaliados aspectos da biologia reprodutiva de C. brasiliana, a população estudada apresentou o mesmo padrão de estrutura populacional já observados para outras espécies da família Cyrenidae.

Variações interanuais na estrutura populacional de bivalves estuarinos podem estar relacionadas com flutuações de temperatura, salinidade e disponibilidade de alimento. No presente estudo, a população de C. brasiliana apresentou uma maior densidade e biomassa em 2011. Quando este resultado foi correlacionado com a temperatura do ar e a salinidade, medidas no momento da coleta, não foram observadas correlações significativas, o mesmo também ocorrendo com a precipitação pluviométrica acumulada. Vários estudos realizados com populações nativas de Corbicula no Japão também não observaram correlações entre a 98

abundância, temperatura e salinidade. Para Foe & Knight (1986), o tamanho das populações destes bivalves provavelmente é determinado pela disponibilidade de alimento. Mouthon (2001) observou que reduções na produção fitoplanctônica na porção superior do rio Saone (Lyon, França) nos anos de 1997 a 1999, evidenciado pelas baixas concentrações de clorofila a, causaram uma diminuição no crescimento e no recrutamento de Corbicula. No presente estudo, apesar de não ter sido avaliada as concentrações de partículas orgânicas em suspensão e, especialmente, do fitoplâncton, é provável que flutuações na disponibilidade de alimento podem ter influenciado na menor densidade de organismos em 2012, principalmente no período chuvoso. Sendo assim, a sua densidade é dependente da disponibilidade de alimento no ambiente, tal como Foe & Foe & Knight (1985) postularam.

A biomassa individual média de C. brasiliana, apresentou variações ao longo dos anos de estudo. Em 2011, devido a ocorrência bem marcada do recrutamento no período chuvoso, a biomassa individual foi menor, elevando-se no decorrer dos meses e acompanhando a progressão modal do tamanho dos indivíduos. Neste ano, portanto, o predomínio de recrutas foi observado em relação a biomassa, bem como, em relação a densidade populacional. Em 2012, todavia, a biomassa individual média foi maior, principalmente no período chuvoso, o que demonstra a maior abundância de indivíduos adultos e a ausência de um pico de recrutamento, reduzindo levemente seus valores no período chuvoso.

As relações biomorfométricas dos bivalves fornecem informações importantes que podem ser aplicadas na exploração comercial das espécies (SUJA e MUTHIAH, 2008). No presente estudo, o crescimento de C. brasiliana foi caracterizado como alométrico negativo nas relações entre o comprimento da concha e o peso, comprimento e altura da concha e comprimento e largura da concha, indicando que o crescimento em comprimento é maior que a largura e a altura, conferindo aspecto triangular à concha. O tipo de crescimento observado nesta espécie pode estar relacionado com o período reprodutivo, visto que a diminuição do peso pode ter relação com a fase de liberação das larvas.

Vazzoler (1996) comenta que o fator de condição é um importante indicador do grau de higidez de um indivíduo e seu valor reflete as condições nutricionais recentes e/ou gasto das reservas em atividades cíclicas, sendo possível relacioná-lo às condições ambientais e aos aspectos comportamentais das espécies. Este parâmetro é uma ferramenta importante e eficiente para evidenciar mudanças na condição dos organismos ao longo do ano, podendo ser usado para indicar o período reprodutivo, períodos de alterações alimentares e de acúmulo de gordura 99

(GOMIERO & BRAGA 2005), assim como mudanças sazonais nas condições do ambiente (BRAGA et al. 1985). No presente estudo, o fator de condição de C. brasiliana foi maior no período seco, o que indica que neste período ocorre um ganho de massa do animal, provavelmente pelo crescimento da coorte surgida em janeiro e fevereiro e pelo amadurecimento gonadal dos adultos. Já o menor fator de condição no período chuvoso, pode estar relacionado a entrada de indivíduos menores (recrutamento), o que reduz a biomassa individual média no período, a mortalidade natural, redução do peso dos indivíduos adultos após a encubação e liberação de larvas. Sousa et al. (2008c), em estudo com o bivalve Pisidium aminicum no rio Minho em Portugal, verificou claros padrões de abundância sazonal e variação da biomassa onde a máxima abundância e biomassa foram observadas na primavera e verão, acompanhando também os eventos do ciclo reprodutivo dessa espécie.

No ano de 2011, nos meses em que o recrutamento foi mais significativo (período chuvoso), foi constatada a ausência de indivíduos adultos no banco amostrado. Foi observado, na zona mais próxima a água, fora da área de amostragem deste estudo, uma faixa de ocorrência de adultos (observação pessoal). Este fenômeno, pode ser atribuído provavelmente à uma migração dos indivíduos adultos para as partes um pouco mais aprofundadas do rio dando lugar a população jovem sobre o banco. Rodrigues et al (2013) observaram comportamento semelhante para o bivalve Anomalocardia brasiliana nas praias do litoral do Rio Grande do Norte, onde em períodos de alta produção de indivíduos juvenis ocorre o desaparecimento dos indivíduos mais velhos. Sousa et al (2008c) também observaram este deslocamento para P. aminicum no rio Minho em Portugal. Nanbu et al. (2005; 2008) indicaram a existência de mudanças ontogenéticas de habitat em Corbicula onde o local em que ocorre o assentamento larval é diferente daquele do estoque adulto. Segundo estes autores, ainda não está claro quais são os mecanismos pelos quais ocorre esta mudança de habitat. Nanbu et al. (2005) hipotetizaram que este deslocamento pode ser gerado pela migração dos indivíduos em função das marés, período do dia, sazonalidade e desenvolvimento ontogenético. Saito et al. (2002) registraram este comportamento em Corbicula japonica devido a sua a sensibilidade à elevação de salinidade durante a ontogenia. É provável que na área estudada, o deslocamento dos adultos para áreas mais profundas também ocorra a fim de previnir a competição por espaço e disponibilidade de alimento com os recrutas.

A distribuição de frequências de tamanho de C. brasiliana reconheceu 2 coortes ao longo dos 2 anos de estudo, um L∞ = 31,74mm e k = 1,21. Sousa et al (2008) observaram 5 coortes e L∞ = 49,8mm e k = 0,68 para uma população invasora de Corbicula fluminea no 100

estuário do rio Minho, Portugal. Dubois & Tourenq (1995) observaram 2 coortes em populações do sudeste da França e Moulthon (2001) registrou uma distribuição bimodal de Corbicula grávidas no estuário do rio Saone (Lyon, Franca), coincidindo com os períodos reprodutivos dos anos 1998 e 1999.

De acordo com diversos autores (MOULTHON, 2001), a maioria das populações de Corbicula fluminea da Asia (nativas) e da América do Norte (invasoras) tem 2 períodos reprodutivos durante o ano, um durante a primavera e outro no final do outono, separados por uma total ou marcada redução do nascimento de juvenis. Em ambas as regiões mencionadas por este autor, as condições climáticas apresentam uma sazonalidade na temperatura e esta provavelmente atua como fator controlador do processo reprodutivo das populações. Byrneet al. (2000) observaram uma reprodução unimodal para Corbicula australis em populações nativas da Austrália. Ituarte (1984) constatou dois picos anuais de reprodução para Cyanocyclas limosa na região do rio la Plata, Argentina, com maior liberação de jovens em novembro/dezembro e em maio. Tal observação coincide com os resultados obtidos por Focht & Veitenheimer-Mendes (2001) para esta mesma espécie no rio Guaíba, Rio Grande do Sul, onde foi verificado dois picos anuais de reprodução, um no verão (janeiro), mais significativo e outro no inverno (agosto).

Byrne et al. (2000) observaram uma reprodução unimodal para Corbicula australis em populações nativas da Austrália, sendo esta sincronizada pela sazonalidade da temperatura. Populações nativas de Corbicula japonica no estuário do rio Kievka, Japão, também foi observado a presença de um único pico de reprodução, sendo a temperatura o fator controlador.

Em regiões tropicais, as amplitudes de variação da temperatura são muito pequenas, outros fatores ambientais, e até mesmo fatores endógenos, podem influenciar de forma mais significativa a reprodução dos organismos e, consequentemente o sucesso no recrutamento populacional. Quando são considerados organismos que vivem em regiões estuarinas de baixa salinidade (estuário superior), as variações de salinidade, em função da precipitação pluviométrica, podem influenciar estes processos. Maia et al (2012) observaram que em populações do gastrópode elobiídeo Melampus coffeus o recrutamento ocorre no periodo chuvoso, provavelmente para garantir a sobrevivencia dos juvenis que são mais sensíveis a níveis mais elevados de salinidade. Assim, é provável que o recrutamento de C. brasiliana, observado em janeiro e fevereiro, tenha sido influenciado pelas mudanças das condições ambientais em função do início do período chuvoso e que, não somente a diminuição da 101

salinidade, uma vez que não foi observada uma forte correlação com a densidade de organismos, mas outras variáveis possam atuar sinergicamente na dinâmica da população. A realização de estudos sobre o ciclo reprodutivo desta população de C. brasiliana é imprescíndível para a confirmação das observações realizadas, neste estudo, quando à dinâmica populacional.

Segundo Sousa (2008e), a longevidade dos organismos é dependente de fatores como latitude, temperatura e disponibilidade de alimento. A expectativa de vida de C. brasiliana, determinada neste estudo, foi de 2,6 anos. Sousa (2008c) estimou o tempo de vida para Pisidium aminicum no rio Minho em Portugal em 24 meses. Vários autores tem registrado expectativa de vida de populações de Corbicula variando entre 1,5 a aproximadamente 3 anos (MOULTHON, 2001, SOUSA, 2008e). Um estudo realizado por Moulthon (2001a; 2001b), registrou uma expectativa de vida de 5 anos para Corbicula fluminea do estuário do rio Saone e em um reservatório no alto rio Rhone, ambos na França, e destacou que nestas populações o crescimento é lento e o recrutamento baixo. O crescimento lento pode estar relacionado com baixos teores de minerais e oligotrofia no ambiente, que são desfavoráveis ao desenvolvimento dos bivalves. Na população de C. brasiliana estudada, a expectativa de vida é semelhante aquelas observadas para outras espécies de cirenídeos e coincide também com as características de espécies r-estrategistas, cujo ciclo de vida é curto com pouco investimento no crescimento somático.

Os valores de mortalidade instantânea Z e natural M para C. brasiliana, indicam um equilíbrio entre a entrada e saída de indivíduos da população estudada. Considerando que este bivalve é explorado pelas marisqueiras da Comunidade dos Tatus (PI) e que o rendimento por recruta calculado também foi abaixo da taxa de exploração máxima sustentável, o estoque populacional ainda sustenta esta exploração caso a mesma se mantenha com o mesmo esforço observado.

102

6. CONCLUSÃO

A contribuição desta pesquisa para o conhecimento de espécies nativas de água doce é de extrema importância uma vez que são escassos os estudos de dinâmica populacional em bivalves nativos no Brasil.

A população de Cyanocyclas brasiliana estudada demonstrou o mesmo padrão de estrutura populacional já observados para outras espécies da família Cyrenidae, apresentando altas densidades e ciclo de vida curto.

Cyanocyclas brasiliana apresenta mudanças ontogenéticas de habitat, onde o deslocamento dos adultos para áreas mais profundas ocorre a fim de prevenir a competição por espaço e disponibilidade de alimento com os recrutas. O recrutamento de C. brasiliana, observado em janeiro e fevereiro, provavelmente foi influenciado pelas mudanças das condições ambientais em função do início do período chuvoso e que, não somente a diminuição da salinidade, uma vez que não foi observada uma forte correlação com a densidade de organismos, mas outras variáveis possam atuar sinergicamente na dinâmica da população. A expectativa de vida foi semelhante aquelas observadas para outras espécies de cirenídeos e coincide também com as características de espécies r-estrategistas, cujo ciclo de vida é curto com pouco investimento no crescimento somático.

Considerando que este bivalve é explorado pelas marisqueiras da Comunidade dos Tatus (PI) e que o rendimento por recruta calculado também foi abaixo da taxa de exploração máxima sustentável, o estoque populacional ainda sustenta esta exploração caso a mesma se mantenha com o mesmo esforço observado.

103

REFERÊNCIAS

ALLEE, W. C.; EMERSON, A. E.; PARK, D. & THOMAS. K. P. 1949 Principles of animal ecology. W. B. Saunders, Philadelphia, 253p.

ALAVARES, C. A., STAPE, J. L., SENTELHAS, P. C., DE MORAES, G., LEONARDO, J., & SPAROVEK, G. (2013). Köppen's climate classification map for Brazil. Meteorologische Zeitschrift, 22(6), 711-728.

BERTALANFFY, L. von. A quantitative theory of organic growth (inquires on growth laws). Human Biol., v. 10, n. 2, p.181-213, 1938.

BEVERTON, R. J. H. & HOLT, S. J. On the dynamics of exploited fish population. Fishery Investigation Ministry Agriculture Fishery Food G.B., 19., 533 p. 1957.

BEVERTON, R. J. H & HOLT, S. J. A review of methods for estimating mortality rates in exploited fish populations, with special reference to sources of bias in catch sampling. Rapp. P. - V Reunion CIEM, 140. p. 67-83. 1956.

BRAGA, F. M. S., BRAGA, M. A. S. & GOITEIN, R. 1985. Fator de condição e alimentação de Paralonchurus brasiliensis (Osteichthyes, Sciaenidae) na região da ilha Anchieta (lat. 23° 33’S - long. 45° 05’W) Ubatuba, Estado de São Paulo. Naturalia 10:1-11.

BRITO, C. S. F.; MANSUR, M. C. D. & ROCHA-BARREIRA, C. A. 2015. Cyanocyclas brasiliana (Bivalvia: Cyrenidae) rediscovered in the limnic part of Parnaíba River delta, Northeast Brazil. Check List 11(4): 1685.

104

BYRNE, M.; PHELPS, H.; CHURCH, T.; ADAIR, V.; SELVAKUMARASWAMY, P. & POTTS, J. (2000). Reproduction and development of the freshwater clam Corbicula australis in southeast Australia. Hydrobiologia, 418(1), 185-197.

CAETANO, C. H. S.; VELOSO, V. G. & CARDOSO, R. S. (2003). Population biology and secondary production of Olivancillaria vesicavesica (Gmelin, 1791) (Gastropoda: Olividae) on a sandy beach in southeastern Brazil. Journal of Molluscan Studies, 69(1), 67-73.

CERRATO, R. M. 1980 Demographic analysis of bivalve populations. In: RHOADS, D. C. & LUTZ, R. A. (eds.), Skeletal growth of aquatic organisms. Biological environmental change. Plenum Press, New York, p. 417-465.

DEFEO, O. & CASTILLA, J. C. More than one bag for the world fishery crisis and keys for co-management successes in selected artisanal Latin American shellfisheries. Reviews in Fish Biology and Fisheries, 15: 265–283, 2005

DENTON, M. E.; CHANDRA, S.; WITTMANN, M. E.; REUTER, J. & BAGULEY, J. G. (2012). Reproduction and population structure of Corbicula fluminea in an oligotrophic subalpine lake. Journal of Shellfish Research, 31(1), 145-152.

DIAS, I. C. C. M. 2008. Biologia populacional de Mellita quinquiesperforata Leske (1778)(ECHINODERMATA: CLYPEASTEROIDA: MELLITIDAE) na praia da Taíba, Ceará, Brasil. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Ceará (UFC), Fortaleza.

DUBOIS, C. & TOURENQ, J. N. 1995. Etude préliminaire de dynamique des populations de Corbicula fluminea (Bivalvia: Corbiculidae) dans la zone profonde d’un canal de la régiontoulousaine (France). Hydroécologie Appliquée 7: 19–28. 105

GAYANILO, F. C. JR.; PAULY, D. (Eds.). The FAO-ICLARM Stock Assessment Tools (FiSAT) Reference Manual. FAO Computerized Information Series (Fisheries). No. 8. Rome, FAO, 1997. 262 p.

FOCHT, T. & VEITENHEIMER-MENDES, I. L. (2001). Distribuição sazonal e reprodução de Neocorbicula limosa (Maton)(Bivalvia, Corbiculidae) no lago Guaíba, Rio Grande do Sul, Brasil. Revta bras. Zool. 18 (1): 35 - 43,2001

FOE, C. & KNIGHT, A. 1985. The effect of phytoplankton and suspended sediment on the Growth of Corbicula fluminea (Bivalvia). Hydrobiologia 127: 105–115.

FOE, C. & KNIGHT, A. 1986. Growth of Corbicula fluminea (Bivalvia) fed artificial and algal diets. Hydrobiologia 133: 155–164.

FONTELES-FILHO, A. A. 2011. Oceanografia, biologia e dinâmica populacional de recursos pesqueiros. Expressão Gráfica e Editora, 464p.

GAYANILO, JR. F. C., SPARRE, P. & PAULY, D. The FAO-ICLARM Stock assessment tools (FISAT) User’s guide. FAO Computerized Information. Series (Fisheries) N. 8, Rome. FAO, 124 p. 1994.

GASPAR, M. B.; SANTOS, M. N.; VASCONCELOS, P.& MONTEIRO, C. C. Shell orphometric relationships of the most common bivalve species (Mollusca: Bivalvia) of the Algarve coast (southern Portugal). Hydrobiologia 477, 73-80. 2002.

106

GOMIERO, L. M. & BRAGA, F. M. S. 2005. The condition factor of fishes from two river basins in São Paulo State, Southeast of Brazil. Acta Sci. 27(1):73-78.

GOMIERO, L. M. & BRAGA, F. M. S. 2006. Relação peso-comprimento e fator de condição de Brycon opalinus (Pisces, Characiformes) no Parque Estadual da Serra do Mar - Núcleo Santa Virgínia, Mata Atlântica, Estado de São Paulo, Brasil. Acta Sci. 28 (2):135-141.

ITUARTE, C. F. 1984. Aspectos biologicos de las populaciones de Corbicula largillierti (Philippi, 1844) (Mollusca Pelycipoda) en el Rio de La Plata. Rev. Del Museu de la Plata (nueva serie), 13 (143): 231-247.

JONES, R. & VAN ZALINGE, N.P. (1981). Estimations of mortality rate and population size for shrimp in Kuwait waters. Kawait Bill. Mar. Sec., 2, 273-288.

MAIA, R. C.; ROCHA-BARREIRA, C. A. & COUTINHO, R. (2012). Reproductive cycle and embryonic development of the gastropod Melampus coffeus (Linnaeus, 1758) (Ellobiidae) in the Brazilian Northeast. Brazilian Journal of Biology, 72(4), 935-943.

MALIAO, R. J.; WEBB, E. L.; JENSEN, K. R. A survey of stock of the donkey’s ear abalone, Haliotis asinina L. in the Sagay Marine Reserve, Philippines: evaluating the effectiveness of marine protected area enforcement. Fisheries Research, 66, p. 343-353, 2004.

MANSUR, M. C. D., & GARCES, L. M. M. P. (1988). Ocorrência e densidade de Corbicula fluminea (Müller, 1774) e Neocorbicula limosa (Maton, 1811) na Estação Ecológica do Taim e áreas adjacentes, Rio Grande do Sul, Brasil. Iheringia, Série Zoologia, 68, 99-115.

MARGALEF, R. 1980 Ecologia. Omega ed., Barcelona, 951p.

107

MENDES, R. A. S. 2012. Dinâmica populacional do siri Callinectes danae (CRUSTACEA: PORTUNIDAE) no canal de Santa Cruz/PE. Tese (Doutorado) em Biologia Animal, Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Recife.

MOREAU, J. (1987). Mathematical and biological expression of growth in fishes: recent trends and further developments. Age and growth of fish, 81-113.

MOUTHON, J. (2001). Life cycle and population dynamics of the Asian clam Corbicula fluminea (Bivalvia: Corbiculidae) in the Saone River at Lyon (France). Hydrobiologia, 452(1- 3), 109-119.

NANBU, R.; MIZUNO, T. & SEKIGUCHI, H. (2008). Post‐settlement growth and mortality of brackishwater clam Corbicula japonica in the Kiso estuaries, central Japan. Fisheries Science, 74(6), 1254-1268.

NANBU, R.; YOKOYAMA, E.; MIZUNO, T. & SEKIGUCHI, H. (2005). Spatio-temporal variations in density of different life stages of a brackish water clam Corbicula japonica in the Kiso estuaries, central Japan. Journal of Shellfish Research, 24(4), 1067-1078.

NEVES, F. F. 2010. Avaliação da influência de sedimentos em suspensão em populações de Corbicula fluminea (MULLER, 1774) (Mollusca, Bivalvia, Corbiculidade): análise comparativa em duas microbacias hidrográficas do Estado de São Paulo, Brasil. Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto.

ODUM, E. P. 1971. Fundamentos de Ecologia. Lisboa. Fundação Calouste Gulbenkian.

108

PAULY, D. (1979). Theory and management of tropical multispecies stocks: A review with mphasis on the Southeast Asian demersal fisheries. ICLARM Studies Review, 1, 35.

RICKER, W. E. Computation end interpretation of biological statistics of fish populations. Bulletin Fishery Research Board Canvass, (191): 382 p. 1975.

RICKLEFS, R. E.; MILLER, G. L. Ecology. Macmillan ed., 2000, 822 pages.

RONDINELLI, S. F. & BARROS, F. (2010). Evaluating shellfish gathering (Lucina pectinata) in a tropical mangrove system. Journal of Sea Research, 64(3), 401-407.

RYBALKINA, S. M.; MAIOROVA, M. A.; ANISIMOV, A. P. & KRAVCHENKO, D. N. (2013). The gametogenesis and sexual cycle of the bivalve Corbicula japonica Prime (1864) in the mouth of the Kievka River (Sea of Japan). Russian Journal of Marine Biology, 39(4), 253-264.

SANTOS, E. P. 1978. Dinâmica de populações aplicada à pesca e piscicultura. Hucitec. EDUSP: São Paulo, 129p.

SILVA, M. C. N. 2006. Dinâmica populacional do camarão cascudo Macrobrachium amazonicum (HELLER, 1862) da ilha de Combú – Belém – Pará. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), Belém.

SPARE, P. & VENEMA, S. Introduction to tropical fish stock assessment. Parte 1 – manual. FAO Fish. Paper (306/1): 376 p. 1997.

109

SOUSA, R., NOGUEIRA, A. J., ANTUNES, C., & GUILHERMINO, L. (2008). Growth and production of Pisidium amnicum in the freshwater tidal area of the River Minho estuary. Estuarine, Coastal and Shelf Science, 79(3), 467-474.

SOUSA, R.; NOGUEIRA, A. J.; GASPAR, M. B.; ANTUNES, C. & GUILHERMINO, L. (2008). Growth and extremely high production of the non-indigenous invasive species Corbicula fluminea (Müller, 1774): possible implications for ecosystem functioning. Estuarine, Coastal and Shelf Science, 80(2), 289-295.

SUJA, N. & MUTHIAH, P. Allometric relationships of the clam Marciaopima (Gmelin, 1791), collected from two longitudinally separated areas. Indian Journal Fish, 55(3): 281-283, 2008.

TAKADA, Y.; SONODA, T.; NAKAMURA, M. & NAKAO, S. (2001). Growth and settlement of the bivalve, Corbicula japonica population in Lake Shinji [Japan]. Bulletin of the Japanese Society of Scientific Fisheries (Japan).

TAYLOR, C. C. Growth equations with metabolic parameters. J. Cons. Int. Explor. Mer., v. 23, p.366-370, 1962.

TEIXEIRA, G. M. 2010. Dinâmica populacional de caranguejos marinhos (Crustacea, Decapoda, Brachyura) do sudeste do Brasil. Tese de Doutorado, Universidade Estadual Paulista (UNESP), Botucatu.

VAZZOLER, A. E. A. M. 1996. Biologia da reprodução de peixes teleósteos: teoria e prática. Nupélia, Maringá, 169 p.

110

VASCONCELOS, S. J. R. 2011. Dinâmica populacional dos quítons (MOLLUSCA: POLYPLACOPHORA) da praia do Pacheco, Caucaia, Ceará, Nordeste do Brasil. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza.

VIANNA, M. P. & AVELAR, W. E. P. (2002). Ocorrência da espécie invasora Corbicula fluminea (Bivalvia, Corbiculidae) no rio Sapucaí (São Paulo, Brasil). Biotemas, 23(3), 59-66.

ZAR, J. H. Biostatistical Analysis. 3º ed. Estados Unidos.1996.

111

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Estudos sobre bivalves nativos de água doce no Brasil ainda são bastante escassos, principalmente para região nordeste. Trabalhos de características morfológicas que sirvam de base para identificação das espécies são raros. Assim, esta tese vem a contribuir com o conhecimento da espécie nativa Cyanocyclas brasiliana e ampliar o seu registro de ocorrência para o nordeste brasileiro, em especial para o Delta do rio Parnaíba, Piauí.

A espécie C. brasiliana tem no Delta do rio Parnaíba uma área de perfeito habitat com suas estratégias evolutivas bem adaptadas a esta região. Este estudo ao analisar o efeito da salinidade sobre estes bivalves, incrementa o conhecimento sobre sua fisiologia e evidencia-se a característica de espécie de água doce estenoalina, sendo a salinidade um fator determinante e limitante na distribuição desta espécie na região.

Considerando que este bivalve é explorado pelas marisqueiras da Comunidade dos Tatus (PI) e que o rendimento por recruta calculado também foi abaixo da taxa de exploração máxima sustentável, o estoque populacional ainda sustentará esta exploração caso a espécie se mantenha com o mesmo esforço observado. Aparentemente, as técnicas de captura empregadas parecem serem eficientes até o momento para garantir a manutenção da espécie, sendo um recurso abundante e explorado há várias gerações. A intensificação da mariscagem, com o aumento no número de marisqueiros e a expansão da área de captura, poderia provocar um desequilíbrio deste recurso. O planos de gerenciamento e ordenamento desta atividade devem considerar sobremaneira estas questões.

A atividade de mariscagem desempenha um papel fundamental na renda familiar dos catadores de mariscos do Delta do rio Parnaíba, sendo a atividade principal para a maioria das mulheres marisqueiras. Entretanto, para uma melhor otimização deste recurso seriam necessários investimentos no setor de beneficiamento e estocagem do produto, o que garantiria um produto de melhor qualidade e maior valor agregado a este recurso.

Associado a isto, os bivalves de água doce são os primeiros animais a sentirem os efeitos de desequilíbrios ambientais, devido seu hábito bentônico cavador superficial e sua alimentação por filtração. Assim, qualquer alteração no ambiental pode causar uma mortalidade quase que imediata destes organismos, o que alteraria significativamente as características 112

populacionais da espécie. Desta forma, a Cyanocyclas brasiliana pode ser um bom bioindicador da qualidade ambiental no Delta do rio Parnaíba e/ou adjacências.

113

ANEXOS

114

115

116

117

118