Entre a poesia maldita e o satanismo: o diabo dos

Between Damn Poetry and Satanism: The Moonspell´s Devil

Entre la poesía maldita y el satanismo: el diablo de los Moonspell

Luís Carlos S. BRANCO1

RESUMO: Neste artigo, analiso a obra lírico-sonoro dos Moonspell, banda portuguesa de black metal, e do seu vocalista, também poeta e escritor, Fernando Ribeiro, na sua correlação intertextual com a literatura maldita e com o satanismo de sinal contemporâneo. Começarei por traçar uma breve cartografia da história e da poética do black metal, verificando depois as várias filosofias satanistas modernas com particular incidência nas postulações de Anton Szandor LaVey. As modulações literário-musicais da figura do diabo na obra da banda serão o principal foco deste artigo.

PALAVRAS-CHAVE: Moonspell. Satanismo. Poesia maldita. Anton Szandor LaVey.

ABSTRACT: This article, analyze the lyrical and musical work of Moonspell, a Portuguese black metal band, and its vocalist, also poet and writer, Fernando Ribeiro, in their intertextual correlation with damn literature and 111 contemporary Satanism. I will start by drawing a brief map of the history and poetics of black metal, and then look at the various modern Satanist philosophies, with particular emphasis on the postulations of Anton Szandor LaVey. The literary representations of the figure of the devil in the work of the band will be the main focus of this article

KEYWORDS: Moonspell, Satanism, Damn Poetry, Anton Szandor LaVey.

RESUMEN: En este artículo, analizo el trabajo lírico y sonoro de Moonspell, la banda portuguesa de black metal, y de su cantante, Fernando Ribeiro, que es también poeta y escritor, en su correlación intertextual con la literatura maldita y el satanismo contemporáneo. Comenzaré por una breve cartografía de la historia y la poética del black metal y de las diversas filosofías satánicas modernas, con un enfoque en las postulaciones de Anton Szandor LaVey. Las modulaciones literarias y musicales de la figura del diablo en el trabajo de Moonspell serán el foco principal de este artículo.

PALABRAS CLAVE: Moonspell. Satanismo. Literatura maldita. Anton Szandor LaVey.

Cartografia breve da poética lírico-sonora do black metal

O black metal surgiu, nos primórdios da década de 80 do século passado, como um subgénero do heavy metal. Note-se que já tinha sido usada antes uma imagética violenta, com referências ao ocultismo – lembre-se, a esse título, algumas das letras dos Black Sabath e Led Zeppelin. No entanto, esses músicos estavam longe de praticar aquilo que apregoavam nos seus

1 Universidade de Aveiro. Centro de Línguas, Literaturas e Culturas. Aveiro – Portugal. CEP: 3810-193. E-mail: [email protected]

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discos ou de se preocuparem efetivamente em estudar, com profundidade, as temáticas ocultistas que figuravam no seu universo lírico.2 No black metal passou-se precisamente o oposto disso e, desse modo, não deve ser confundido com outros géneros de música extrema:

O black metal é o mais extremo e controverso subgénero, e também subcultura, de todo o vasto universo musical. Desde o seu início, no dealbar dos anos 80, com bandas como os Venom, Mercyful Fate. Bathory, Hellhamer e Celtic Frost, e especialmente depois do seu renascimento nos anos 90, com o black metal escandinavo, com os Mayhem, Burzum, Darkthrone, Immortal, Gorgoroth, Marduk e Dark Funeral, o black metal tem demostrado, ao longo do tempo, a sua capacidade para ser consistentemente provocador, agressivo, depressivo, misantropo, obscuro e, sobretudo, o mais mal compreendido de todos os subgéneros do heavy metal. (SILVA, 2014, p. 215).

Os músicos deste grupo praticavam aquilo que professam nas suas letras, o que faz toda a diferença em relação aos outros géneros. Eles, em sua grande maioria, eram satanistas convictos: 3

Estas influências temáticas ganhavam referências ao mundo do ocultismo e do satanismo nas capas de discos, com tons mais escuros e violentos, além de uma sonoridade mais agressiva, metalizada, além de instrumentos muitas vezes desafinados e vozes gritantes. A obscenidade, a transgressão e os insultos do metal pesado ganhavam agora uma identidade própria vinculada à escuridão. (ESTEVO, 2018, p. 49).

Desse modo, apropriaram-se de muitos elementos caraterísticos do heavy-metal, como as guitarras abrasivas e o som de bateria galopante, e fundiram-nos com outras estéticas, por exemplo, com o gótico, usando teclados, instrumentos de orquestra, como violinos e 112 violoncelos, e densas vozes corais, que normalmente faziam contraponto ao canto gutural dos vocalistas. Será eventualmente difícil discernir a diferença entre o black metal e o death metal, já que em ambos se pratica uma sonoridade ruidosa e extremista, com inúmeras referências tanáticas. No entanto, o black metal diferencia-se pelo seu ativismo satanista. Mais importante do que a música é, sem dúvida, a filosofia que lhe subjaz. Havia, assim, um lado evangelizador na sua música, dado que esta servia para explicitar os princípios satanistas aos ouvintes, considerados como neófitos. Os letristas black metal escreviam de modo pessoalizado; não construíam simples paródias ao género fantástico e ocultista. O black metal foi um movimento musical e religioso que, em grande medida, caiu no descrédito das instituições oficiais da época e da queda das grandes narrativas. Por isso, alguns autores veem-no como um produto típico da era pós-moderna (SÁ, 2013). Havia, por essa altura, uma parte da juventude muito descontente, que não se identificava com o movimento yuppie, nem com o consumismo crescente e com a macdonaldização da sociedade, que então

2 A propósito, relembre-se o caricato episódio em que, no final dos anos 70 do Século XX, na Califórnia, um grupo de mulheres adeptas de bruxaria foi, entusiasmadas e atraídas por algumas letras e pelo próprio nome da banca, assistir a um concerto dos Black Sabath. Porém, fugiram assustadas quando os elementos do grupo entraram em palco, envergando simples cruzes cristãs ao peito, e não uma cruz invertida, como elas certamente esperariam. 3 Filipe Silva escreveu um artigo muito interessante, onde relaciona o universo lírico do black metal com Nietzsche e com a psicanálise, nomeadamente Jung e Freud, referindo conceitos e arquétipos, como o do “Pai Horrível” e da “Deusa-Mãe”, com ligação às letraspoemas deste subgénero musical (SILVA, 2014). Para ele a ligação do black metal ao satanismo fez-se, sobretudo, por via do black metal nórdico e da correspondente mitologia viking. Eu discordo um pouco desta posição. No meu entender, e dado o teor das letras das bandas pioneiras, como os Venom ou, um pouco depois, os Bathory, o black metal é, e continua a ser, essencialmente um subgénero de teor eminentemente satanista, como teremos oportunidade de confirmar ao longo deste artigo.

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se começava a fazer sentir. Muitos procuravam algo que preenchesse o vazio que sentiam, numa civilização onde se valorizavam, sobretudo, valores materialistas, que não davam respostas às suas ânsias. A denominada geração X – ou geração à rasca, em Portugal – encontrava na música uma alternativa ideológica e mundos imaginários capazes de corresponder aos seus anseios íntimos. Nessa época, surgiram multímodos géneros musicais alternativos e indie, firmados através de pequenas editoras independentes. Um deles foi o black metal. Os valores que pregavam iam contra a ainda religião dominante católica e impeliam os seus fãs a procurarem valores individuais, contrários às normas sociais vigentes. O termo black metal foi cunhado, em 1982, pelos Venom, no seu LP homónimo. Esta banda seminal era constituída por Cronos, vocalista e principal compositor, Mantas e Abbadon. O satanismo, inerente à música, foi assumido por eles em toda a linha. O primeiro single, lançado pela banda, era, quanto a isso, inequívoco. Intitulava-se “In league with Satan”:

I'm in league with Satan I was raised in hell I walk the streets of Salem Amongst the living dead I need no one to tell me What's wrong or right I drink the blood of children Stalk my prey at night […] (VENOM, 1981) 4

Os Venom eram ingleses. No entanto, a grande maioria das bandas importantes no auge do género – no que concerne à indústria musical – provinha de outras paragens mais periféricas, como os países nórdicos, Europa Central e a Europa Mediterrânica, usualmente mais distantes dos epicentros dos fenómenos artísticos da música rock. Um dos projetos musicais mais 113 relevantes foi o Bathory, constituído por apenas um elemento o multi-instrumentista Quorthon oriundo da Suécia e que, pela sua originalidade, teve uma ampla divulgação internacional, e foi muito influente nos Moonspell, aqui em apreço. A esta primeira vaga, liderada por Venom e Bathory, sucedeu uma segunda, a partir da segunda metade da década de 80 e se estendeu até ao início dos anos 90 do século XX, na qual podemos incluir, por exemplo, os Samael e King Diamond. Logo após, eclodiu uma terceira, da qual fizeram parte os ingleses Cradlle of Filth, os Paradise Lost do início, os italianos Lacuna Coil, os suíços Celtic Frost, os suecos Tiamat e os portugueses Moonspell, sendo os últimos responsáveis pela frescura sonora e lírica. As canções começaram a abrir espaço para a inclusão de beleza melódica, e incorporou-se alguma da solenidade harmónica advinda da música gótica; as teclas tornaram-se mais audíveis, os ritmos mais díspares e, por vezes, mais lentos, e o típico canto rasgado do black metal alternou com uma forma de cantar mais tradicional. 5 Dada a sonoridade mais radio-friendly praticada por esta terceira corrente, estes grupos puderam granjear um maior sucesso e atraíram muitos ouvintes fora dos quadrantes normais do black metal. Em termos de topoi literários, ao fundo satanista acrescentou-se um imaginário mais rico e complexo, ligado, por exemplo, ao vampirismo, a relatos de teor lupino e a mitologias

4 Ao longo deste artigo, todos os textos de índole ensaística serão traduzidos do inglês para português por mim. No entanto, textos literários, como letras e poemas, serão mantidos na sua versão original em inglês. 5 Por norma, considera-se que a segunda vaga diz respeito ao black metal originário da Noruega. Eu discordo. Existe uma diferença importante entre estes e a grande maioria das outras bandas black metal: a prática de crimes rituais, pelo que julgo que a corrente norueguesa deve ser, por isso, analisada à parte

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pouco conhecidas, como a mitologia lusitana propalada pelos Moonspell nos seus trabalhos. Até mesmo universos literários originários de autores cristãos, como foi o caso Tolkien, foram recriados, segundo o ideário satanista do black metal. Algumas bandas mesclaram conceitos da mitologia viking, com temas satânicos e anticristãos, e alusões intertextuais aos trabalhos de Tolkien (KUUSELA, 2015, p. 107). 6

O criminoso black metal viking e os seus sucedâneos

Nos anos 90, na Noruega, surgiu uma subcorrente dentro do black metal com resultados trágicos. Existiu um designado “inner circle”, constituído por elementos de várias bandas, entre eles, Mayhem, Emperor e Burzum, que levou tudo a um extremo inimaginável. De modo lapidar, Kuusela define-o assim: “O black circle começou como um pequeno grupo marginal de indivíduos antissociais, que partilhavam os mesmos gostos musicais, tinham uma visão misantropa do mundo e autodefiniam-se como satânicos” (KUUSELA, 2015, p. 92). A história deles é marcada pela prática de crimes hediondos. Queimaram igrejas e alguns deles foram condenados a cumprir pena na prisão. Um dos elementos da banda Mayem, conhecido pelo epíteto de Death, suicidou-se; e o outro colega do grupo, Euronymous, fotografou o cadáver do companheiro. Uma das imagens dessa cena foi usada na capa de um dos discos da banda. Por sua vez, em 1993, Euronymous foi brutalmente assassinado, por vários golpes de facadas, pelo líder da banda Borzum, Varg Vikernes. Após cumprir pena, este foi libertado em 2009 e retomou o seu projeto musical. A propósito deste período negro, gostaria de sublinhar algumas ideias chave. A corrente norueguesa, para além de satânica, era partidária do violento ideário pagão viking; há quem a 114 denomine por viking metal. No entanto, não podemos esquecer que foi no contexto mais amplo do black metal que ela surgiu. Estes grupos tiveram uma influência nefasta em muitos jovens que tentaram emular o seu comportamento no resto do continente europeu. Por exemplo, em Itália, membros envolvidos nos Beasts of Satan, uma banda de Milão, cometeram vários homicídios rituais; em Portugal ocorreu um parricídio, cujas circunstâncias nunca foram verdadeiramente esclarecidas, perpetrado pelo vocalista da banda Agonizing Terror. Hoje, alguns dos elementos ainda atuantes, oriundos dessa corrente vikinguista, como Hellhammer, Jan Axel Blomberg, dão continuidade a um legado vergonhoso, propalando valores nazis, e declarando-se contra a entrada de estrangeiros no seu país, a Noruega, em nome da preservação da suposta “raça viking”, o que é algo absolutamente condenável e intolerável. Em fevereiro de 2019, estreará um filme, Lords of Chaos, inspirado na história do black metal norueguês. 7

Os Moonspell e o underground

Os Moonspell surgiram enquadrados no contexto lato do black metal, advindos do underground. Este caracterizava-se por se constituir, enquanto campo, fora dos circuitos usuais da indústria musical e por crescer muito mais a partir das iniciativas dos próprios fãs do que por qualquer manobra de marketing engendrada pelas companhias discográficas.

6 Kuuesela refere-se aqui principalmente às bandas escandinavas. 7 Varg Vikernes, que entretanto saiu da cadeia em 2009, depois de cumprir 16 anos de pena pelo assassinato de Euronymus, no canal que mantem no youtube, já criticou o filme. No seu inqualificável estilo habitual, mostrou- se insatisfeito, dizendo que o ator que o representa é “judeu e gordo”.

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Foi nesta altura que as fanzines8 tiveram grande expansão. Um dos principais veículos de expressão de ideias dependia, assim, dos próprios fãs, que criavam revistas artesanais, depois policopiadas e vendidas. Os próprios músicos, conscientes da importância das iniciativas dos seus admiradores, raramente se furtavam a dar entrevistas a estas publicações amadoras. Na verdade, alguns estavam bem mais disponíveis para colaborar com as fanzines do que com as revistas corporativas, isto porque nas revistas criadas pelos jovens eram compreendidos e admirados, ao passo que nas publicações generalistas eram, muitas vezes, alvo de incompreensão. Fernando Ribeiro e João Pedro, elementos fundadores dos Moonspell, tinham uma fanzine, a Darkness Zine; além desta, Ribeiro, tinha uma outra dedicada à poesia (AMORIM, 2018, p. 49-68). Concomitantemente, gerou-se um amplo movimento de pal-friends, ou seja, jovens adeptos do black metal, de várias proveniências geográficas, que trocavam regularmente correspondência entre si. Para além das fanzines, ocorria a permuta de livros sobre o ocultismo e o sistema de troca de mix-tapes, o denominado tape trading, o que, numa época em que os discos eram pagos e pesavam no orçamento limitado dos adolescentes, era algo a ter em conta. Por exemplo, um fã português enviava uma dessas cassetes a um alemão, com canções de vários músicos portugueses, e recebia em troca, na volta do correio, uma gravação em fita com grupos alemães. Isto permitiu que, à margem das indústrias musicais tradicionais e sem que nada o fizesse prever, o movimento black metal florescesse e houvesse um léxico e uma semiótica comum transnacionais. J. A, guitarrista dos Decayed e um ativo membro do underground de então, testemunha assim: “Trocávamos cassetes com pessoas do Brasil, e de toda a América do Sul e de muitos outros sítios” (AMORIM, 2018, p. 45). Também os membros dos Moonspell se correspondiam com pessoas de vários países. Assinale-se que a importância da criação de uma rede de troca de cartas na difusão doutrinária remonta, pelo menos, a São Paulo de Tarso, 115 cuja criação de círculos de correspondentes foi fundamental para tornar o Deus de Jesus num Deus transnacional (WRIGHT, 2009, p. 395). A par disto, surgiram uma plêiade de editoras independentes em todo mundo, com particular incidência no continente europeu, como a alemã Century Media, a austríaca Napalm Records, as francesa Adipocere e Osmose Records, a inglesa Neat Records e a norueguesa Deathlike Silence Productions, entre outras. Todas tiveram um papel relevante na difusão de sonoridades extremas. Os Moonspeell começaram por ser fãs atuantes dentro do underground. Ares e Fernando Ribeiro, como já vimos, criaram uma fanzine, na qual continham entrevistas, feitas por eles, de alguns músicos proeminentes do black metal de então. Por exemplo, Quorthon, o mentor dos Bathory, fez uma viagem promocional a Portugal, em 1990, na qual se encontrou com fãs, deu entrevistas a rádios, etc. Duas das pessoas que estiveram com ele e que o entrevistaram foram precisamente Ares e Fernando Ribeiro. Este último recorda o encontro com o músico sueco como um momento de viragem para si: “Tirando o nascimento do meu filho e outros acontecimentos pessoais, considero esse como o dia mais feliz da minha vida, em termos do que me influenciou como vocalista dos Moonspell. Não foi ter discos de ouro ou estar no top, foi conhecer o Quorthon. Foi aí que se deu o clique” (RIBEIRO apud AMORIM, 2018, p. 47). Com o desejo de formarem uma banda própria, os Moonspell iniciaram sua atividade em 1989, tendo como nome de batismo Morbid God. O grupo tornou-se conhecido por meio da

8 São revistas da época que tratavam de temáticas musicais e literárias interrelacionadas do underground. Ressalta- se que, hoje em dia, as fanzines, na sua forma mais tradicional e no formato webzine, continuam a ser importante em grupos atuantes em cenas underground, como é o caso de muitos movimentos LGBT.

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canção Serpente Angel, via promo-tape9, que posteriormente, fez parte da compilação The Birth of Tragedy, editado pela MTM Records, em 1992. Findo este grupo, nasceu os Moonspell, que gravaram a promo-tape Anno Satanae, e deram o seu primeiro concerto oficial em 6 de novembro de 1993. As letras das músicas da incidiam sobre satanismo e ocultismo. Os Moonspell mantiveram, durante algum tempo, correspondência regular com alguns elementos do black metal escandinavo. Sobre os trágicos acontecimentos na Noruega, Fernando Ribeiro afirmou o seguinte:

Acho que a cena satânica dos Moonspell sempre foi muito diferente da nórdica. Nunca passámos da figuração ao ato e também nunca percebemos isso. […] Era uma coisa que estava a acontecer e que nunca esperámos. […] Correspondíamo-nos com diversas pessoas de lá. Por exemplo, o João Pedro correspondia-se com o Bard Faust dos Emperor, e eu com o Varg Vikernes dos Burzum. Houve uma rutura e começámo- nos a afastar de tudo o que se passava lá, pois as coisas tinham ido longe demais. (RIBEIRO apud AMORIM, 2018, p. 79).

Em Portugal, havia outras bandas alinhadas com a filosofia satanista. A certa altura, chegou a falar-se dum “Inner Circle” português, constituído por Moonspell, Decayed e Filii Negratum Inferna, denominado Circulum Obscenum, que se reuniam para tocarem, ouvirem música e praticarem alguns atos ritualistas, que envolviam blasfémias e derramamento de sangue, sem chegarem, no entanto, às práticas extremas dos seus congéneres noruegueses (AMORIM, 2018, p. 50-51). Um dos aspetos distintivos dos Moonspell em relação às outras bandas black metal foi a sua insistência em editarem o seu trabalho em companhias discográficas com projeção mundial. O mini LP, Under the moonspell, com algumas canções cantadas em latim, deu-os a conhecer no panorama internacional, e depois, pelas mãos do experiente produtor Waldemar 116 Sorychta, os seus álbuns , de 1995, e Irreligious, de 1996, tornaram-se verdadeiros marcos da terceira vaga de black metal. Hoje, mantem-se na linha da frente da música pesada a nível europeu, com um LP, totalmente cantado em Português, intitulado 1775.

História breve do satanismo moderno

Talvez valha a pena agora circunscrever aquilo que, grosso modo, poderemos designar por satanismo. Este é definido pela adoração e pelo culto a uma entidade demoníaca de origem bíblica, Satanás, Lúcifer Leviathan ou outra equivalente, por parte de um grupo de pessoas, cujas crenças são consubstanciadas numa série de rituais litúrgicos praticados, sobretudo, em conjunto, mas também individualmente (INTROVIGNE, 2017, p. 27). Nesse sentido, Vera e Pwyll afirmam que “O Satanismo não é apenas uma só religião, mas sim uma categoria mais ampla de pontos de vista e literatura variada, que têm em comum o facto de todos apregoarem uma interpretação e visão favorável da figura de Satanás”. (VERA; PWYLL, 2005, p. 1). Há diferenças assinaláveis entre as várias congregações de índole satanista, contudo, todas elas têm em comum o facto de se oporem, com grande veemência, às religiões maioritárias, designadamente o cristianismo, que consideram o seu grande opositor. São organização com hierarquias e práxis idiossincráticas, e não devem ser confundidas com

9 As promo-tapes eram cassetes, editadas em regime de autoedição, que serviam para promover a banda, sendo enviadas para rádios e editoras, no intuito de alcançarem uma maior visibilidade.

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quaisquer outros grupos religiosos com os quais têm laços de proximidade ideológica, como, por exemplo, os Wicca. Segundo Introvigne,

Crowley foi muito influente no renascer da antiga magia, ligada ao paganismo. Assim, o primeiro grupo Wicca foi fundado por Gerald B. Gardner (1884-1964). Os praticantes de Wicca não são satânicos. Tal como Crowley, acusam os satânicos de aceitarem a narrativa cristã acerca de Deus e do diabo, contra a qual estes novos pagãos se opõem. O objetivo dos Wiccas é regressarem a formas pré-cristãs e politeístas de religião. (INTROVIGNE, 2017, p. 62).

Embora exista um ou outro grupo, como a Great Church of Lucifer, criada por Michael Ford em 2015, no Texas, que postula que o satanismo e a Wicca pagã são a mesma coisa, pois, segundo eles, as bruxas, os druidas, etc., adoravam Satanás, ainda que sob outras formas, como por exemplo o deus Pã, não devemos confundi-los. O neopaganismo tem uma matriz ecológica que está longe do âmbito do moderno satanismo, que é essencialmente um fenómeno urbano. Harvey sublinha as diferenças entre ambos: “Alguns tipos de feitiçaria e magia pagãs não devem ser mais centrados na deidade do que o satanismo, mas suas fundações, objetivos e maneiras são muito diferentes”. (HARVEY, 2002, p. 12). Por seu turno, Anton Szandor LaVey, fundador do satanismo contemporâneo, critica a moral neopagã: “Não há nenhuma diferença entre magia “branca” e “negra”, exceto na hipocrisia pessoal, justiça baseada na culpa e autoilusão do mago “branco” em relação a si mesmo” (LAVEY, s/da, p. 147). Sobre algumas destas congregações, afirmou:

Tão longe quanto o Satanismo dissesse respeito, os sinais mais externos dele foram os ritos neopagãos conduzidos por MacGregor Mathers da Ordem Hermética da Golden Dawn e Aleister Crowley na posterior Ordem da Estrela de Prata e Ordem dos 117 Templários Orientais, que paranoicamente condenaram qualquer associação com o Satanismo, apesar de Crowley se autoimpor à imagem da revelação da besta. (LAVEY, s/da, p. 139-140)

Historicamente, algumas das práticas pagãs da idade média continham princípios muito próximos do satanismo. Se recuarmos até à civilização helénica, encontramos toda uma simbologia semioticamente similar à imagética satanista; basta reportamo-nos, por exemplo, ao culto de Dionísios. Mas a origem do satanismo hodierno deve ser localizada, antes de mais, em França, no reinado de Luís XIV, onde houve grupos organizados que oficiavam missas negras e conduziam cerimónias com intuitos destrutivos. A feiticeira Catherine La Voiser e o padre Etienne Guibourg foram acusados de prática satânicas. Sob a liderança de ambos, um grupo de pessoas procedia a rituais litúrgicos que invertiam as práticas católicas: adoravam uma imagem de Satanás num altar negro, onde estava deitada uma donzela nua, recitavam hinos de louvor à entidade infernal e pediam-lhe favores. Os valores de moderação e temperança do cristianismo eram aqui substituídos por toda a sorte de excessos. Este caso foi um verdadeiro escândalo. Um dos mais destacados elementos deste grupo era a famosa amante do rei, Françoise de Montespan, mãe de cinco filhos seus. A estas ocorrências, que tiveram lugar nos séculos XVII e XVIII, Maximo Introvigne denomina-as de Proto-satanismo Ao longo dos séculos seguintes, encontramos os mais variados relatos de práticas similares. As seitas de pendor satânico propagaram-se por todo o mundo ocidental, por exemplo, em Itália e nos Estados Unidos. Maximo Introvigne sugere a teoria pendular, que ajuda a entender a expansão e retração destes grupos ao longo da história: as seitas tornam-se visíveis perante a sociedade, geram imediatamente grandes antagonismo, o que as faz voltar a

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uma existência secretista, longe dos olhares públicos; entretanto, lentamente, com a desagregação dos que se opõem a elas, eclodem novamente. Esta movimentação pendular tem ocorrido ciclicamente. (INTROVIGNE, 2017, p. 5). A fenomenologia satanista só pode ser compreendida no quadro dos seus contextos da época. Os muitos casos, ocorridos em França, não estão certamente desligados da Revolução Francesa e das profundas transformações sociais e de mentalidade que a ela conduziram. Mais tarde, no século XIX e primórdios do XX, alguns movimentos paralelos ao satanismo, como a 10 Golden Dawn, iniciada sob a égide de Aleister Crowly, Ou o satanismo literário, advindo do romantismo inglês e do simbolismo francês, devem ser entendidos à luz da sua correlação com a Revolução Industrial e com algumas correntes filosóficas caraterísticas dessa época. O Zaratrusta, o übermench idealizado por Nietzsche, e o positivismo, postulado por August Comte, terão sido influentes. Aos grupos satânicos, formados no século XIX e início do século seguinte, Maximo Introvigne designa-os por Satanismo Clássico (INTROVIGNE, 2017, p. 15- 35). Ao longo da história, muitos dos mais importantes divulgadores dos princípios satânicos advieram do seio da própria Igreja Católica. Por exemplo, no século XVIII, o padre italiano Domenico Constantini fundou um grupo satânico, e, no século XIX, o padre Eugéne Vintras, era um abalizado colecionador de grimórios e antigas escrituras correlatas ao satanismo. Por sua vez, o padre Joseph Antoine Bolan fundou uma congregação com práticas semelhantes às de Aleister Crowly. Muitas mulheres, como Marjorie Cameron ou Diane Vera, têm tido um papel de liderança no satanismo, o que é incomum noutras religiões, mas que aqui faz todo o sentido. A mulher é vista como forte e a sua sexualidade desempenha um papel fundamental nas liturgias 118 satanistas; é difícil a existência de um grupo satânico sem mulheres. O seu corpo é utilizado como altar sagrado. Por outro lado, associa-se o satanismo a movimentos radicais de extrema direita. Na verdade, tal facto não é descabido, dado que algumas associações satânicas advogam princípios eugénicos, eivados de racismo e xenofobia. É o caso da Ordem do Caminho da Mão Esquerda, fundada na Nova Zelândia por Kerry Bolton, e da Joy of Satan, criada por Andrea Herrington, e pela da Ordem dos Nove Ângulos, formada pelo inglês neo-nazi David William Myatt. Repare-se na atroz frieza dos princípios que regem esta última:

O respeito, a piedade e a fraqueza são uma doença que transforma os fortes em fracos. Testa sempre a tua força, pois, é aí que reside a chave do teu sucesso. Procura a tua felicidade na vitória, mas nunca na paz. Nunca ames tanto alguém que não sejas capaz de a ver morrer. É preferível morreres do que te submeteres. Descarta o amor, pois, ele é um impostor. O sangue dos vivos é um excelente fertilizante para o Novo. Que o amor à vida seja importante para ti, mas que a grandeza seja o teu principal objetivo. (ROBURY, 2000, p. 3). 11

10 Alguns dos preceitos de Crowley são muito similares aos do moderno satanismo, como por exemplo: “Faz tudo o que quiseres, pois, tudo o que fizeres é lei”. Diane Vera inclui Crowley e a sua congregação entre os que tiveram práticas satânicas, mas Anton LaVey defende um ponto de vista oposto (LAVEY, s/da, p. 140). 11 Julga-se que Conrad Robury é um dos muitos pseudónimos com que David William Myatt, líder da Ordem dos Nove Ângulos, assina as suas obras. Os neófitos desta ordem passam duras provas, como, por exemplo, serem lançados sem alimentos nem armas no meio de bosques, onde têm de sobreviver durante meses sem ajudas externas. Recebem uma espécie de treino militar, entendido como caminho de autotransformação. Senholt

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Existem, assim, algumas correntes, mormente as nórdicas, como já assinalei em relação ao black metal norueguês, com uma forte base ideológica pagã e uma ligação nodal aos deuses nórdicos guerreiros, que tendem a propalar ideias fascistas. O nazismo, devido à forma como se estruturou hierarquicamente e aos crimes que praticou, que tinham um lado ritualista fortíssimo com base na mitologia germânica, poderá ser visto como uma forma extrema de satanismo. Muitos dos destacados ocultistas dessa época, como Julius Evola, caucionaram e apoiaram o nacional-socialismo. E uma das primeiras organizações modernas satânicas conhecidas foi fundada por alguém muito próximo de Evola: a aristocrata russa Maria de Naglowska, líder dos Cavaleiros da Seta Dourada, que operou em Paris nos anos trinta do século XX. No entanto, existem igualmente movimentos satânicos alinhados com a esquerda, como é o caso evidente dos Satanic Reds, fundados por Tani Jantsang, em 1997, em Nova Iorque, que postulam um satanismo comunista. Segundo Senholt, também existirá uma eventual ligação ao radicalismo islâmico em algumas ordens, que operam de modo mais subterrâneo como é o caso da já mencionada Ordem dos Nove Ângulos (SENHOLT, 2009, p. 49-52). Ressalto agora alguns pontos. Dadas as inconciliáveis diferenças pragmáticas e metafísicas entre as várias associações satânicas, não há somente um satanismo, mas, sim, vários:

Existem realmente pessoas no mundo, que se denominam satanistas. Algumas pertencem a organizações de vários tamanhos, outras não. Os satanistas possuem compreensões muito diferentes sobre o que o satanismo deveria ser, o que o satanismo deveria fazer para justificar sua autoidentidade, e também sobre quem eles acham que Satã é. Eles também variam em suas afirmações sobre as origens ou história antiga do satanismo. (HARVEY,2002, p. 2). 119 Por outro lado, o satanismo implica sempre uma prática ritual, e daí ser uma religião, portanto, não deverá nunca ser confundido com um satanismo meramente literário.12 Ambos partilham isotopias intertextuais várias e os mesmos universos de referência estética, mas não são, de todo, a mesma coisa. Afirmar, por exemplo, que Baudelaire era um satanista é, no meu entender, uma afirmação errónea. O correto será dizer que existe na sua obra um satanismo literário. Por vezes, estas duas correntes podem coincidir na mesma pessoa autoral, como é o caso dos Moonspell, aqui em análise, mas as diferenças entre uma e outra devem ser assinaladas de modo inequívoco.

escreveu um texto bastante sólido sobre esta ordem e outras similares, desvelando os seus fins políticos (SENHOLT, 2009) 12 A este propósito, analisem-se os rituais propostos pela Ordem dos Nove Ângulos (ROBURY, 2000), que é uma congregação de satanismo deísta, ou os propostos pela ateia simbolista Church of Satan (LAVEY, s/da). Note- se como em ambos, apesar das diferenças filosóficas, há elementos comuns: a tónica na nudez feminina, enquanto elemento ritual, a importância das vestes, o uso de velas e espadas, as recitações e petições a entidades satânicas, a existência de ritos de auto iniciação e cerimónias com vista a destruição de inimigos ou a procura de benesses, a energia sexual entendida como matéria capaz de transformar o real, etc (vd. LAVEY, s/db). Enfim, as diferenças mais assinaláveis entre ambas serão a importância do local e da hora, que são relevantes nos rituais da Ordem dos Nove Ângulos, mas não nos da Church of Satan.

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O ateísmo elevado à condição de religião na Church of Satan

Atualmente, existem duas correntes preponderantes no satanismo, uma racionalista e ateia e outra deísta e ocultista. Estes últimos, que têm em Diane Vera uma das suas mais destacadas ideólogas, 13 acreditam, de facto, em Satanás como entidade real e prestam-lhe culto e homenagens regulares, concebendo-o como um libertador do ser humano das regras restritivas e obscurantistas do catolicismo. Nesta filosofia, existem, no entanto, crenças diversas e multimodas formas de apropriação da figura do demo: 14

Há muitos tipos de satanismo teísta. A maioria não aceita as crenças cristão, a não ser a crença na existência de Satanás. As crenças dos satanistas teístas baseiam-se em muitas fontes não judaico-cristãs. Na verdade, alguns satanistas teístas remontam a figura de Satanás a eras anteriores ao cristianismo e identificam-no com o deus egípcio Set, com o titã grego Prometeus ou o deus sumério Enki. O Templo de Set é a organização mais conhecida desta subcorrente. Outras associações apoiam-se no antigo Gnosticismo ofídico, que venerava o mito da serpente do jardim do Éden. Os gnósticos ofídicos viam o deus do antigo testamento como o demiurgo, que criara o mundo material para aprisionar nele as almas dos homens, e a serpente como Sophia, a representante da sabedoria. Esta teogonia não é muito popular entre os satanistas atuais, dado que eles valorizam o mundo material e o seu próprio corpo carnal. Outras subcorrentes veem Satanás como o deus deste mundo duma forma panteísta, dando uma interpretação não cristã à passagem bíblica que o refere (contida em 2 Coríntios, 4:4). Alguns satanistas são politeístas e para eles Satanás e o deus judaico cristão Javé são apenas dois entre os muitos deuses existentes. Outros, por seu lado, julgam que Satanás é uma entidade extraterrestre muito avançada. (VERA; PWYLL, 2005, p. 1- 2). 120 A corrente que se opõe à deísta, é ferozmente ateia. LaVey, por exemplo, postula que: “[…] foi o homem e não deus que estabeleceu todas as religiões espirituais e quem escreveu todas as bíblias sagradas” (LAVEY, s/da, p. 46). Para os satanistas racionalistas, Satanás simboliza o ser humano enquanto ser autorrealizado e o único deus em que creem é o próprio Homem. Assim, o satânico acredita na existência real do diabo e, por inerência, em Deus, e o

13 Diane Vera, líder da Church of Azazel, mantém um sítio na web, para além de um blogue e atividades várias nas redes sociais, com um vasto manancial de informação coligido, incluindo vários artigos académicos, de grande utilidade, intitulado “Theistic satanismo: the new satanismo of the era of the internet” (VERA, 2006b). Claro que há aqui uma contradição inerente, pois, como poderá o satanismo deísta ser o satanismo da era da internet, se, segundo as suas próprias postulações, é um satanismo eminentemente tradicionalista? De todo o modo, é de assinalar o crescimento exponencial da Church of Azazel, que, em poucos anos, se tornou muito relevante dentro do satanismo, entendido de um modo mais lato. Para tal terá certamente contribuído a sua abertura inclusiva ante os movimentos neopagãos. Note-se que se, por exemplo, Introvigne relata a história do satanismo somente a partir do século XVII e XVIII, Vera, por seu lado, remonta muito mais atrás, filiando-se em manifestações ocorridos desde, pelo menos, a época egípcia. Sítio de Diane Vera disponível em: http://theisticsatanism.com/index.html 14 Dentre estes, podemos destacar: o The Temple of Set, baseado no pensamento de Michael Aquino, um dissidente da Church of Satan, que se filia na mitologia egípcia e venera o deus Set, considerado como a deidade satânica por excelência; a vertente panteísta, que entende Satanás como um ente incorpóreo espalhado por toda a natureza, na qual se inclui a First Church of Satan; o satanismo politeísta, que adora vários deuses de sinal pagão, Pã, Loki, Set, Azazel ,etc., identificados com Satanás, no qual se inclui a Church of Azazel, de Diane Vera. Esta última acrescenta ainda a estas categorias o luciferismo gnóstico, mas eu discordo desta posição, pois, a conceção gnóstica de Lucífer é diametralmente oposta à adoração satânica, que têm em comum todas as subcorrentes elencadas atrás. (VERA, 2006a)

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satanista, por seu turno, acredita somente no indivíduo, daí o ser enformada por uma assinalável componente de racionalismo e de darwinismo social.15 LaVey define o diabo do seguinte modo:

A maior parte dos Satanistas não aceita Satã como um ser antropomórfico com cascos fendidos, uma cauda barbada e chifres. Ele simplesmente representa a força da natureza – os poderes das trevas têm sido chamados dessa forma pois nenhuma religião tem encontrado essas forças fora da escuridão. Também a ciência não tem sido capaz de aplicar uma terminologia técnica para tal força. É um reservatório destampado que poucos podem usar pois lhes faltam a habilidade de usar uma ferramenta sem primeiramente ter subdividido e classificado todas as partes que a fazem funcionar. É a necessidade incessante de analisar, o que impede muitas pessoas de tirarem vantagem dessas multifacetadas chaves para o desconhecido – que os Satanistas escolheram chamar de Satã. (LAVEY, s/da, p. 82-83).

Nas nove declarações satanistas, que funcionam como princípios norteadores da Church of Satan, LaVey especifica os atributos satanianos:

I. Satã representa indulgência, em vez de abstinência! II. Satã representa existência vital, em vez de espirituais castelos de ilusões! III. Satã representa sabedoria pura, em vez de hipócrita autoilusão! IV. Satã representa bondade para aqueles que a merecem, em vez de amor desperdiçado aos ingratos! V. Satã representa vingança, em vez de virar a outra face! VI. Satã representa responsabilidade para o responsável, em vez de relacionamentos com vampiros psíquicos! VII. Satã representa o homem simplesmente como outro animal, às vezes melhor, mais frequentemente pior do que aqueles que caminham de quatro, porque em seu “espírito divino e desenvolvimento intelectual”, se tornou o animal mais cruel de todos! VIII. Satã representa todos os assim chamados pecados, pois eles levam a uma gratificação física, mental 121 e emocional! IX. Satã tem sido o melhor amigo que a Igreja já teve, pois ele sustentou seus negócios durante todos esses anos! (LAVEY, s/da, p. 31).

Existem outras congregações relevantes, como as Crianças Luciferinas de Satanás, fundadas em Itália, no ano de 1982, por Marco Dimitri, mas a mais consistente dentre a corrente ateia é a mencionada Church of Satan, fundada por Anton Szandor LaVey, em São Francisco, no ano 1966, e que teve um crescimento exponencial nos anos subsequentes. Embora esta organização não revele a identidade dos seus membros, muitos músicos célebres, como Marylin Manson, Marc Almond e King Diamond, e atores como Jayne Mansfield e Sammy David Jr. assumiram publicamente fazerem parte dela.

15 O darwinismo social, que teve em Richard Hofstadter um dos seus principais proponentes, aplicou a teoria da evolução das espécies e da seleção natural à teoria social. Segundo esta, os indivíduos mais fortes e capazes deveriam mandar nos outros. Estas ideias, que tiveram opositores de monta, como, por exemplo, Herbert Spencer, foram aproveitadas pelo nazismo e por outros movimentos eugénicos. Claro que, para além de condenavelmente desumana, é uma teoria ultrapassada. Por muito forte e capaz que seja o indivíduo, se ele não nascer num ambiente propício não realizará nunca o seu potencial. Introvigne classifica as ideias laveyistas como devedoras do darwinismo social, o que me parece fazer sentido, sobretudo se tivermos em consideração que Lavey chega a proclamar “Abençoados são os fortes, pois eles dominarão a Terra. — Malditos são os fracos, pois eles herdarão as ruínas” (LAVEY, s/da, p.43). De todo o modo, convém fazer a seguinte ressalva: o satanismo de LaVey acredita no poder autotransformador do Homem, ou seja, alguém fraco pode, através da adesão e prática satanistas tornar-se forte — e isto não parece coadunar-se completamente como o determinismo do darwinismo social. Ainda assim, LaVey faz o elogio dos fortes e dos que são capazes de praticar o mal sem grandes pruridos, como um fator importante na evolução da humanidade (LAVEY, s/dc, p. 4-9)

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As propostas de LaVey, autor da Bíblia Satânica, incidem sobre o ser humano, considerado na sua subjetividade individual, e posicionam-se contra os ideais judaico-cristãos. Com efeito, a culpa, o remorso, a confissão, a temperança, etc, são considerados altamente perniciosos para a autorrealização e para o autoconhecimento do ser humano. Este deve aceitar como naturais todos os seus desejos e procurar o prazer sem sentimentos culpabilizantes a impedirem-no de usufruir dele na plenitude. O que as religiões de sinal cristão consideram pecaminoso, como a gula, a luxúria e a vaidade, são consideradas virtuosas e desejáveis. A criança é tida como modelo, pois, atua sem filtros e procura a satisfação de todos os seus desejos e caprichos. O materialismo e a egolatria são incentivados e vistos como valores positivos. É por esta concepção contrária dos valores vigentes que o satanismo se define como uma Via da Mão Esquerda. Advoga-se também uma grande liberdade e permissividade quanto às opções sexuais de cada um, e faz-se o encómio das práticas fetichistas. A homossexualidade, a transsexualidade, as práticas sadomasoquistas, a poligamia, etc., são encaradas com a maior das naturalidades. A vingança é vista com normalidade; o perdão, por seu lado, é tido como algo desprezível. LaVey incentiva a destruição dos inimigos: “Faça de você um terror para seu adversário” (LAVEY, s/da, p. 31). Ou seja, se alguém nos fizer mal, deveremos fazer o mesmo a essa pessoa. Deve-se tratar bem quem nos trata bem e mal quem nos trata mal:

7. Odeie seus inimigos com todo o seu coração e, se um homem lhe bater em uma das faces, ESMURRE- O na outra! Acerte-o com força e sem piedade, pois a auto-preservação é a maior das leis! 8. Aquele que oferece a outra face é um cão covarde! 9. Devolva um tapa com um tapa, escárnio com escárnio, destruição com destruição, acrescido de juros! Olho por olho, dente por dente, quatro vezes pior, cem vezes pior! (LAVEY, s/da, p. 41). 122 Sendo uma filosofia arraigadamente ateísta, não se reza a deus, pois, ele não existe. Só existe o ser humano e este é que deve pugnar pela sua própria felicidade, sem esperar benesses de nenhuma entidade superior:

O Satanista sabe que o Homem e as ações e reações do universo é que são responsáveis por tudo o que acontece, e não perde tempo imaginando que alguém se importa. O Satanista não fica parado e aceita o “destino” sem fazer nada a respeito porque está escrito em algum lugar que é assim que tem que ser. O Satanista sabe que rezar não faz nenhuma diferença — que, na verdade, rezar até diminui a chance de se obter sucesso, pois os devotos religiosos muitas vezes deixam de lado o que estão fazendo e rezam para que uma situação se resolva, e se eles, ao invés disso, deixassem a reza de lado para por si próprios tentarem resolver essa situação, o resultado chegaria muito mais rápido. Ser Satanista é desprezar termos como “esperança” e “prece”, pois eles indicam apreensão. (…) Pensamento positivo e ações positivas é que geram resultados reais. (LAVEY, s/da, p. 49).

O dia mais sagrado para os laveyanos é o dia de aniversário de cada um, pois, a sua filosofia visa a autoglorificação:

Um individualista deve sempre viver num mundo criado segundo os seus próprios padrões, e não por outros. (…) Um verdadeiro satanista deve ser responsável por reação e mudança. (…) Um satanista não permite que os outros programem as suas ações. Ele deve lutar contra isso com todas as suas forças, pois, isso representa o maior dos perigos à sua liberdade de espírito, e é a própria negação da vida, que lhe foi concedida como uma magnífica experiência única e não para imitar a vida dos outros. (LAVEY, s/dc, p. 21).

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O satanismo de LaVey é um ateísmo elevado à condição de religião; é uma autotelia radical. Deste modo, a Church of Satan distancia-se dos satânicos deístas – na verdade, considera-os cristãos mal resolvidos, insatisfeitos, que não têm a presença de espírito suficiente para se livrarem da narrativa cristológica. Condena, por isso, algumas das suas práticas, como é o caso do uso de animais para sacrifícios rituais. O fundador do Satanismo é muito claro quanto a este ponto: os satanistas não sacrificam nem animais nem crianças. Parece também condenar o sacrifício humano, contudo, não é totalmente assertivo em relação a este ponto, pois, se por um lado o condena, por outro, incentiva a destruição simbólica, através de maldições, dos inimigos, e parece mesmo abrir uma exceção para o efetivo sacrifício humano (LAVEY, s/da, p.117-122). Há um ponto fulcral que distingue os satanistas de outros ateus. Satanás é para os satanistas um símbolo do próprio ser humano, que se atreve a viver livre de condicionamentos, mas é simultaneamente a representação do lado esconso e sombrio do ser humano. Se alguém concordar com todas as suas ideias racionalistas e ateias, mas não se identificar com a imagem de Satanás, não pode, de modo nenhum, ser considerado satanista:

é possível que existam companheiros de viagem – ateus, misantropos, humanistas. […] O Satanismo pode atrair estes indivíduos, de alguma forma, mas, em última análise, não é para eles. Se fosse apenas uma filosofia, seriam bem-vindos, mas é mais. O Satanismo move-se nos caminhos religiosos ao ter uma componente estética, um sistema simbólico, metáforas, e um ritual no qual Satanás é acolhido, não como um diabo para ser venerado, mas como uma projeção externa simbólica de alto valor para cada indivíduo satanista. A identificação que o satanista tem com Satanás é uma barreira intencional contra aqueles que não sentem empatia com este arquétipo sinistro. (GILMORE, 2010, p, 27-28). 123 É preciso, portanto, haver disponibilidade para se explorar o que Jung denominou por Sombra.16 É neste contexto que se situam os rituais satanistas laveyistas, que, na verdade, têm muitas similitudes com os praticados pelos satânicos deístas: as velas, a invocação de entidades demoníacas, etc (LAVEY, s/db). A diferença reside em que, para Lavey, estes rituais servem apenas para desencadear os poderes ocultos de cada um. Por isso, ao local onde são realizados, Lavey designa-os por “Câmara de Descompressão intelectual”. Estes atos litúrgicos propõem- se a desencadear atos benéficos ou maléficos, consoante a vontade do oficiante. São psicodramas que permitem ao indivíduo entrar em contacto com o lado sombra de si mesmo e, assim, autorrealizar-se:

A essência dos rituais satânicos é entrar, de modo o mais objetivo possível, num estado subjetivo. Devemos, contudo, ter em consideração que o comportamento humano é, na sua grande maioria, totalmente motivado por um impulso subjetivo. (…) O satanismo moderno tem noção da necessidade que o ser humano tem do “outro lado”, e, por isso, tem aceitado, de modo pragmático, essa dualidade – pelo menos, dentro do espaço da câmara de rituais. Assim, a câmara satânica pode ser uma câmara de meditação ou um palácio de perversidade. (…) Os rituais satanistas são uma mistura de elementos cabalistas, maçónicos e gnósticos, que contêm nomenclatura e palavras vibratórias de poder de vários mitos. (LAVEY, s/da, p. 5-8).

16 Para Jung a Sombra, enquanto arquétipo, refere-se ao lado mais animalesco do ser humano, aquele que foi herdado dos antepassados, que viveram em eras imemoriais em que imperava somente a lei da sobrevivência (vd. Carl Gustav Jung, Aion: Estudo Sobre o Simbolismo do Si-Mesmo. Rio de janeiro: Editora Vozes). De algum modo, talvez faça algum sentido, dentro do satanismo laveyista, pensar este conceito em correlação com o darwinismo social.

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Embora LaVey tenha postulações muito positivas, como a assunção plena da sexualidade de cada um e um grande respeito pelas opções individuais de toda a ordem, o seu satanismo suscita-me, no entanto, várias questões. Será, na verdade, desejável que o Homem seja a medida de todas as coisas? E o modelo de ser humano, escolhido por LaVey será o mais adequado? Estou em crer que não, bem como me parece que a realização de todos os desejos humanos, sem freio nenhum, não é algo que se deva ter como objetivo. Se todos agíssemos assim, a vida em sociedade tornar-se-ia completamente intolerável. Não considero que a instauração da culpa internalizada e do remorso, pela qual a Igreja propugna, seja desejável, mas o seu oposto, tal como LaVey o propõe, parece-me algo bastante negativo. O racionalismo laveyista vê a vida como uma mera luta permanente, desligada de afetos e relações pessoais, o que me parece bastante irrealista, tornando-se uma hipertelia, um racionalismo que vai muito para além do que se propõe.

O diabo dos Moonspell entre o satanismo e a literatura maldita

As figurações do diabo na obra dos Moonspell mostram-no ora como um Lúcifer, de sinal romântico, miltoniano, ora enquanto o Satanás, percecionado como símbolo por excelência do individualismo, proposto pela Church of Satan. Fernando Ribeiro, o autor das letraspoemas, explicita assim o seu conceito pessoal de Satanás:

Satã é apenas um grande símbolo para o Homem. Mas eu não esqueço também que ele foi criado pelo homem. Simplesmente isso. É uma questão de representação. E 124 Satã tem características que podem e devem ser ligadas ao homem como nós realmente somos. Se eu quisesse ser específico, diria que escrevo muito mais sobre Luciferianismo e os mitos de Fausto/Prometheus ao invés de Satã. Para mim eles são coisas diferentes. Eu acredito nos Homens, na nossa capacidade para a beleza e o horror. (RIBEIRO apud ALMEIDA, 2007).

Um dos aspetos distintivos dos Moonspell, relativamente à grande maioria das suas congéneres europeias, é a relação de contiguidade da banda portuguesa com a literatura. Recentemente, participaram na Feira Internacional do Livro, em Guadalajara, no México, com assinalável sucesso. O vocalista manifestou o seu agrado por este convite do Estado português, dizendo: “Esta feira do livro define-nos como banda que sempre teve uma inspiração e uma atividade literária, inclusivamente pela importância que damos às letras, que são para nós tão importantes como as músicas.” (RIBEIRO apud COUTINHO, 2018). Após uma atuação ao vivo, em 2003, os Moonspell foram elogiados pelo prémio Nobel José Saramago da literatura português (Cf. AMORIM, 2018, p. 252). O escritor e a banda revelam nas suas obras uma mundivisão herética. Por exemplo, a conceção de Javé como um deus castigador e injusto é um traço isotópico comum. A este título, atente-se no diálogo travado, numa barca, entre Jesus e Satanás, no Evangelho segundo Jesus Cristo, de Saramago, onde o anjo caído questiona a justeza de várias ocorrências históricas trágicas onde um incontável número de pessoas morreu devido à sua fé cristã (SARAMAGO, 1995, p. 363-400), e repare-se na similitude com pensamento veiculado nas letraspoemas de Fernando Ribeiro. Por exemplo: “A fé não serve de nada. / Que é feito do Deus que nos amava? / Sossega-te, é o fim! / E fica quieto porque Deus assim quis?” (MOONSPELL, 2017).

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A banda congeminou com o escritor José Luís Peixoto, vencedor do Prémio José Saramago em 2001, um projeto conjunto intermedial. O jovem autor literário acompanhou o processo de criação do disco Antidote do grupo, indo para o estúdio, e escrevendo contos à medida que a banda compunha canções. Posteriormente, foi lançado um livro de contos com base nessa obra discográfica e na sua estadia com o grupo. Antes disso, os Moonspell já tinham manifestado o seu apreço pela obra do escritor, nomeadamente o romance Uma casa na escuridão. O no mesmo sentido, o escritor declarou:

Uma casa na escuridão é um romance cuja banda sonora é toda black metal. É um livro que tem muito desse género, não só a nível sonoro, pois é um livro que considero muito percussivo, mas também tem alguns temas muito violentos. Não é para toda a gente, e há quem rejeite esse livro, tal como rejeita o black metal. […] Aquilo que vejo em muitas bandas de metal, nomeadamente nos Moonspell, é parente daquilo que eu escrevo, por exemplo, em Nenhum olhar. (AMORIM, 2018, p. 244).

O livro de Peixoto, baseado na sua estadia com a banda, intitulado Antídoto, e o disco homónimo foram dados a lume juntos, em cuidada edição especial, em 2003. Os títulos dos contos, como por exemplo, “Capricórnio a seus pés”, “Cristal”, “Ao adormecermos eternamente”, espelham intertextualmente as canções do grupo: “Capricorn at her feet”, “Crystal gazing”, “As we eternally sleep on it”. Inspirando-se nos ambientes opressivos e sombrios das letraspoemas de Fernando Ribeiro, o escritor procedeu a um verdadeiro exercício de recriação intermedial, transpondo este universo estético para o sul de Portugal, para o seu Alentejo natal. Algum exagerado derramamento sentimental que, por vezes, se torna excessivo na sua obra, aqui é mitigado por uma escrita que consegue ser desapiedada mesmo a narrar 17 factos de puro horror. O conto “Sul” é, a esse título, paradigmático. É fácil de perceber o jogo 125 de influências mútuas, que se estendeu para lá deste trabalho em conjunto, se fizermos um exercício textual comparativo. Atente-se no incipt de Antídoto, de José Luís Peixoto, onde ele se focaliza no ponto de vista coral de um conjunto de entidades demonológicas:

Somos o medo, conhecemos tantas histórias. […] Todos os afogados que, pela última vez, levantam a cabeça fora de água. Todos os homens que escondem segredos. E tu? Escondes algum segredo? Não precisas de responder. Conhecemos a tua história. Vimos-te mesmo quando não nos via. Vemos-te agora. Escondes algum segredo? (…) Sabemos aquilo que escondes até de ti próprio. (…) Nós esperámos por ti. Sorrimos ao ver-te. Depois das nuvens, somos o medo. Debaixo da pele, somos o medo. (PEIXOTO, 2003, p. 9-10).

Há, de facto, em alguns textos do autor, como o próprio assinalou, uma qualidade percussiva. Isso nota-se, na obra em apreço, nas frases muito curtas e ritmadas e no uso de palavras-chave que interligam os contos; por exemplo, o “medo”, que funciona como leitmotiv e fio condutor deste ciclo contístico, e que é também um dos topoi, trabalhados, de modo obsidiante, pelos Moonspell:

Em nome do medo, do medo sem fim Na ira dos deuses, caímos enfim A vida cruel, tormenta assim

17 Se calhar, tem-se dado uma exagerada atenção crítica aos romances de José Luís Peixoto que são muito desiguais, e pouca à sua arte contística, que, na verdade, me parece de grande originalidade e eficácia. Coletâneas de contos como o referido Antídoto e Cal merecem ser devidamente destacadas.

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O céu que nos esmaga n'ausência de ti Em nome do medo, do medo sem fim Sou sangue de teu sangue Sou luz que se expande Sou medo de teu medo Senhor do teu tempo Em nome do medo (MOONSPELL, 2017)

Fernando Ribeiro, o letrista do grupo, frequentou, durante algum tempo, o curso superior de filosofia, na Faculdade de Letras de Lisboa, encontramos, por isso, referências filosóficas no seu trabalho lírico. Por exemplo, o mote para a canção “Goat on Fire”,18 inclusa no álbum Under Satanae, é um aforismo de Nietzsche, que o cantor extraído do primeiro capítulo do livro O AntiCristo: “It is the Dawn of a new Morning of Silver and I would rather live in the ice than in the middle of the modern virtue and other Southern winds (MOONSPELL, 2007). Muitas das letraspoemas de Fernando Ribeiro têm como intertexto evidente obras chave do cânone da literatura maldita. Ele já chamou a atenção para a importância nodal das famosas “Litanias de Satã, de Charles Baudelaire, no seu crescimento artístico: “Há um poema chave para mim que são «As litanias de Satanás», do Baudelaire. É quase uma matriz para certas letras que eu escrevi, como a “Serpent Angel” (RIBEIRO apud AMORIM, p. 62, 2018). Vejamos alguns versos da obra baudelaireana:

Pai adotivo daqueles que na sua vingança Foram expulsos do paraíso por deus pai 126 Satã, tem piedade da minha longa miséria

Glória e louvor a ti, senhor, no mais lato dos céus Onde reinas, e na profundidade dos infernos onde, vencido, Cismas em silêncio. (BAUDELAIRE, 2003, p. 277).

Repare-se como, quer estruturalmente, quer isotopicamente, a letrapoema de Fernando Ribeiro glosa o poema anterior, recriando-o de motu proprio. Ele mantém a estrutura de petição, mas expande o tom de lamento e simultaneamente de glorificação a uma série de deidades, adstritas ao satanismo, o que confere à sua letrapoema uma vertente ritualista muito forte: 19

18 Esta letrapoema, cujo título remete para Baphomet, glorifica, a partir das ideias nietezschizianas, um novo tipo de deus e civilização, contrários ao cristianismo, e o nascimento duma religião satanista e ocultista, apoiada por legiões de jovens, avessos aos valores judaico-cristãos. Na tese de mestrado, produzida por Alysson Plínio Estevo, existe um capítulo dedicado a Baphomet e à problemática das suas origens, que alguns autores apontam para a antiga Ordem dos Templários, outros para o mundo árabe, e outros para o mundo oriental. A imagem de Baphomet, usada no black metal, parece ser originária dum livro da autoria de Eliphas Levi (ESTEVO, 2018, p. 49-60). 19 Sobre o processo de pesquisa e construção da referida letrapoema, Fernando Ribeiro explica como procedeu: “Habituei-me a fazer este tipo de listas e foi o que fiz com os demónios e a sua simbologia. Não está ali apenas Pazazuzu ou Baphomet, está também Nergal, Manitou ou Lebasy, que é um anagrama para a minha namorada da altura, Isabel. Na outra coluna da lista estavam os atributos desses demónios, importantes também para definirmos os nossos pseudónimos. Depois, construía a letra em formato de poesia, aí mesmo inspirado em Baudelaire” (RIBEIRO apud AMORIM, 2018, p. 79-80). Sobre esta técnica de cut-up e sobre os processos paródicos, amiúde usados pelo vocalista dos Moonspell, veja-se a obra teórica de Linda Hutcheon, nomeadamente a correlação que ela estabelece entre este tipo de técnicas e o pós-modernismo, por exemplo, na obra A poetics of Postmodernism: History, theory and fiction.

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Father Satan send the Serpent Poison me with your tongue Envolve me in a darkness shell Grant me all the powers of hell Lucy Feris, bringer of light Serpent God, Septentrion rise!

Unholy I felt, delirium of death With blood I enchaint, I'm the Angel Flesh! Grant me the powers oh! Diabolical trinity

Lucifer, Satan, Belial

Enlight me spectre of Leviathan Genesis of the true lord In the mass of damnation Grand duke of hell Amon Recite thy incantation

Occult I'm lord Immortal and My majestic wings dare enlight all Involeth, Daemoneth, Imoleth, Shehmah Forash Only I will bring Emeth

Rise my angels rise! (MOONSPELL, 2007).

Num processo semelhante ao referido supra, aparece interpolado, na letrapoema “Tenebrarum Oratorium”, que faz parte do alinhamento de Under Satanae, uma estrofe dum 127 poema iconoclasta do Marquês de Sade, uma variação do blasfemo poema “A verdade”:

Masturbar-me-ia sobre a tua divindade, Enrabar-te-ia se a tua fraca existência Oferecesse um cu à minha incontinência; Meu braço o coração te viria arrancar Para com o meu fundo horror melhor te penetrar (MOONSPELL, 2007).

O vocalista dos Moonspell acrescentou-lhe os versos seguintes da sua lavra:

Fly, serpent of pride, Mother of earth, our Mother Law of those who claim For the Homo Natura, for the flame, Fly erotic Pentagram And destroy, destroy those who love us. (MOONSPELL, 2007).

As obras marcantes da cultura europeia, de pendor satanista, foram alvo da atenção criativa da banda. Isso aconteceu, com grande preponderância, no LP Irreligious, de 1996, sobre o qual o vocalista afirmou:

Um disco que achávamos menos pagão, menos lusitano, ao qual queríamos muito conferir um registo europeu. Com ambientes mais góticos, mais clássicos, mais soturnos até, com requintes líricos que saíssem do universo puramente lupino e alma mater, para entrar numa espécie de castelo encantado, mais exatamente, nas masmorras desse castelo, onde viviam as criaturas, os pensadores, os fumadores de

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ópio, os poetas da lua cheia, o Homem-Espelho, garras de corvo, que se agitavam na minha mente à espera da banad sonora adequada para ganharem vida (RIBEIRO apud REAL, 2016, p. 217).

Assim, nesse trabalho conceptual, foi reinterpretado o mito de Fausto, para o qual a banda criou a sua própria versão, em “Mephisto”. Por seu turno, o romance O perfume, de Patrick Süskind, surge, enquanto intertexto, em “Her Spiegleman”. O corvo poeano é reinscrito numa perturbante história passional, em “Raven Claws”. O heterónimo pessoano Álvaro de Campos é a figura romanesca central da canção “Opium”, que lhes granjeou o seu primeiro sucesso transnacional, para o qual terá também contribuído o respetivo videoclip, onde surge uma figuração de Fernando de Pessoa. Desde sempre também, os Moospell prestaram uma grande atenção à cultura portuguesa, da qual relevaram o que lhes pareceu mais condizente com a sua pessoalíssima visão artística. No início da sua carreira, com base nos livros de José Leite de Vasconcelos, 20 articularam a história e os mitos dos primeiros povos a habitarem a Lusitânia nas suas canções, o que foi um fator diferenciador em relação a outras bandas europeias que se cingiam muito à mitologia nórdica e ao universo de Tolkien. Canções como “Trebaruna”, “Ataegina” e “Alma mater”, que se tornou numa espécie de hino nacional português em declinação black metal, do álbum Wolfheart atestam esse seu interesse. Mais tarde, alargaram essa sua matriz portuguesa a poetas portuguesas, de algum modo, revolucionários e subversivos. Para além do já referido Fernando Pessoa, um poema do subversivo poeta surrealista Mário de Cesariny Vasconcelos aparece inserido numa letrapoema de Fernando Ribeiro, “Than the Serpent in my arms” (MOONSPELL, 2001), declamado por Adolfo Luxúria Canibal, vocalista e poeta da banda bracarense Mão Morta: 128 Dorme, dorme meu menino dorme no mar dos sargaços que mais vale o mar a pino que as serpentes nos meus braços. (CESARINY, 2017).

Mas, sobretudo, realço o projeto paralelo de Fernando Ribeiro, Pedro Paixão (respetivamente, vocalista e teclista dos Moonspell) e Rui Sidónio (vocalista dos Bizarra Locomotiva), devotado à spoken word, intitulado Cada som como um grito: Orfeu rebelde, no qual são recitados guturalmente, sob um fundo sonoro industrial, poemas de Miguel Torga, de sinal luciferino. Neles o poeta transmontano questiona a autoridade divina:

Orfeu rebelde, canto como sou: Canto como um possesso Que na casca do tempo, a canivete, Gravasse a fúria de cada momento; (…)

Outros, felizes, sejam os rouxinóis... Eu ergo a voz assim, num desafio (…) Canto como quem usa Os versos em legítima defesa. Canto, sem perguntar à Musa Se o canto é de terror ou de beleza. (TORGA, 2014, p. 185).

20 José Leite de Vasconcelos foi um médico e antropólogo português, que estudou os modos de vivência e as religiões dos primeiros povos a habitarem o território que mais tarde, se tornaria Portugal. Muitas obras ficcionais portuguesas, como, por exemplo, A voz dos deuses, de João Aguiar, se inspiram nos seus trabalhos científicos.

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Os poemas torguianos musicados, e lançados em formato EP, foram os seguintes: “Letreiro”, “Prelúdio”, “Relâmpago” e “Orfeu rebelde”. Pedro Paixão mostrou-se muito entusiasmado com este trabalho: “Foi uma grande experiência poder trabalhar sobre a poesia do Miguel Torga” (PAIXÃO apud AMORIM, 2018, p. 343). Para além da evidente qualidade estética, este projeto lírico-musical tem o mérito de nos chamar a atenção para um aspeto da poesia de Torga trasmontano, nem sempre devidamente salientado: a sua inscrição no cânone maldito. Existe na sua poética evidentes traços prometaicos correlatos ao satanismo literário. Observe-se, por exemplo, essa extraordinária figura torguina, o corvo Vicente, que resolve, num ato de insurreição luciferina, abandonar a arca de Noé, e assim recusar a salvação, ousando desobedecer a Deus: “Escolhera a liberdade, e aceitara desde esse momento todas as consequências da opção. Olhava a barca, sim, mas para encarar de frente a degradação que recusara. Noé e o resto dos animais assistiam mudos àquele duelo entre Deus e Vicente.” (TORGA, 2008, p. 93). Temos, assim, um Lúcifer em escorço, no corvo Vicente. Este terrível ato de desobediência a Deus, que remete também para o mito de Prometeus, o ladrão do fogo sagrado, é igualmente assinalado em múltiplas letraspoemas dos Moonspell. Por exemplo, na canção, intitulada significativamente “Hymn to Lucifer”, temos o seguinte verso: “The Key of joy is disobedience”. (DAEMONARCH, 1998). As letraspoemas de Fernando Ribeiro são amiúde obras épicas em miniatura, que relembram muito a poesia de Blake e Milton, onde figuras de origem bíblica e mitológica travam batalhas e afirmam valores contrários à tradição judaico-cristã. Ele segue, assim, um figurino literário próximo dos românticos ingleses do século XIX. Nelas, aparece Lúcifer, figurado como o poeta rebelde, o artista original, que questiona a sociedade, desvelando a importância do egotismo e do eu. Isso é notório em canções como “Dreamless (Lucifer and 129 Lilith)” (MOONSPELL, 2008), ou em “The seventh Daemonarch”:

My Father awakes me with his calls Rotten, vile, human pride Knowing better than I With my arrival the Earth shall die

The legions scream, that was a day My swords fell on them a thousand times I was dealt with by fire And with fire I shall depart (…)

The blood of my world Awaits in your grace (…) A new Aeon Has begun You're the next to Rise, the Earth's Son. (DAEMONARCH, 1998).

Nos seus livros de poesia, Ribeiro afasta-se do rigor formal desse modelo e opta por uma poesia mais experimental. Recorre a neologismos e trocadilhos, por exemplo: “cruzAntena”, “infernet”, “Queres fazer terror comigo?”, “Horroris causa” (RIBEIRO, 2005, p.15-25-32-33). Usa maiúsculas em algumas palavras que quer salientar (Vergonha, Parasita, Maldição) e não segue uma métrica rigorosa. É uma poesia com aportes ao cânone maldito, mas usa recursos estilístico-formais mais inventivos, muitas vezes, jogando com o potencial gráfico da escrita. O facto de não estar restringido à métrica imposta pelas pautas música e o

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escrever na sua língua materna, o português, contribuem para esta maior liberdade literária. Contudo, as referências satanistas satânicas continuam a estar muito presentes, por vezes, de modo, biografemático:

Apetece-me o ácido, a corrosão. Apetece-me estrangular-te, Espalhar-te por toda a parte. Apetece-me o poeta. Apetece-me o esteta. Apetece-me o demonólogo. Seu filho antropólogo Apetece-me jogar No número da Besta E ganhar. (RIBEIRO, 2005, p. 46).

Fernando Ribeiro, a certa altura, voltou a usar o pseudónimo de origem demonológica Langsuyar, quando participou num trabalho, a par com o instrumentalista Euthymia, que visou homenagear Anton LaVey nos trinta anos decorridos sobre a sua morte. Este disco foi editado sob o patrocínio da Associação Portuguesa Satanista, e consiste na declamação gutural de um dos ritos de destruição contidos na Bíblia Satânica, sob um fundo composto de ruídos do quotidiano. Acerca do fundador da Church of Satan, Fernando Ribeiro afirmou que: “LaVey foi uma pessoa que sempre tive por referência. Uma referência crítica. Há coisas que gosto muito em LaVey e outras com que não me identifico tanto.” (RIBEIRO apud SOLIS, s/d, p.5). E, mais adiante, explicitou melhor o seu posicionamento:

Conheço efectivamente bem a Satanic Bible (…) O Satanismo de LaVey mantém-se 130 actual, filosoficamente, e o ritual é a escolha de cada pessoa. (…) Eu penso que sou próximo do Satanismo porque o Satanismo é próximo da minha maneira de pensar. É um bocado egoísta e prepotente dizer isto, mas é assim que me encaixo nas coisas. (…) Eu realmente sou um antropocentrista radical. Acredito que o Homem está mesmo no centro do Universo. É uma coisa muito LaVey e muito Satanista, mas há certas coisas, um certo folclore, que não me faz afirmar como um Satanista puro e duro, se isso existir. (SOLIS, s/d, p. 4-9).

Conclusão

Em suma, temos na obra dos Moonspell a fusão de Lucifer, ligado à literatura maldita, e Satanás, entendido enquanto reificação simbólica do individualismo, e a criação duma mitologia idiossincrática a partir destas premissas. Devemos, claro, questionar algumas das ideias propaladas nesta obra lírico-poética. Aliás, as críticas que faço são as mesmas que fiz, no ponto anterior, ao satanismo laveyano. De todo o modo, sublinhe-se que, partindo de todas as influências analisadas no artigo, os Moonspell criaram um universo estético muito próprio, eivado pelo racionalismo satanista, mas também por um onirismo e uma passionalidade, inscritos na antítese disso. O seu diabo é profundamente pessoal. E transmissível.

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Recebido em 31/01/2019 Aprovado em 05/05/2019 Publicado em 22/09/2019

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