42º ENCONTRO NACIONAL DA ANPOCS

GT 20: OS DIREITOS DOS POVOS INDÍGENAS E DE OUTRAS POPULAÇÕES TRADICIONAIS E AS POLÍTICAS DO ESTADO: EIXOS DE DESENVOLVIMENTO E RESISTÊNCIAS SOCIAIS NA AMÉRICA LATINA

TITULO: AVANÇOS E DESAFIOS NA SERRA DO PAPAGAIO, SUL DE : O CONSÓRCIO DE ECODESENVOLVIMENTO REGIONAL E A PROPOSTA DE REDELIMITAÇÃO

Mariana Gravina Prates Junqueira – PUC-SP1

RESUMO Esse artigo é parte da pesquisa de doutorado sobre o processo histórico de criação da unidade de conservação Parque Estadual da Serra do Papagaio (PESP) e os conflitos socioambientais com a população do entorno. A região situa-se no sul de Minas Gerais, nos municípios de Alagoa, Aiuruoca, Baependi, Itamonte e , com peculiares características culturais e grande preservação do ambiente natural. Os distintos atores sociais que vivem na região compõe uma amálgama de realidades, características culturais, valores e modo de vida. No entanto estão todos, inexoravelmente em contato com os conflitos socioambientais que perduram na região, em face da criação de unidades de conservação que não contemple as comunidades humanas e são criadas de forma autoritária e autárquica. Muitos bairros rurais foram inseridos no traçado, inviabilizando a manutenção das atividades econômicas desenvolvidas até então. Nessa realidade houve uma aproximação política de atores sociais da região com lideres do governo estadual, possibilitando a implementação de um Consórcio de ecodesenvolvimento regional, que pretendia melhorar a gestão do território do entorno a partir da melhoria de infraestrutura e participação social. Posteriormente foi aprovado um projeto de redelimitação da unidade, no qual houve a consulta da população e criação de uma nova proposta de limites. Projeto de Lei que está tramitando desde 2012 na Assembleia Legislativa de Minas Gerais e que de fato tem gerado muitos novos conflitos e avivado antigas rivalidades regionais. Enfim, a incerteza dos limites do Parque, mais uma vez, se torna vetor de conflitos sociais no qual as comunidades rurais são as mais prejudicadas no processo.

1 Possui graduação em ciências sociais pela Universidade Estadual de Campinas-UNICAMP. Mestre em Ciências Sociais- Antropologia pelo Programa de Estudos Pós graduados em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo- PUC-SP. Doutora pelo Programa de Programa de Estudos Pós graduados em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo- PUC-SP e. Atua nos estudos de populações e comunidades tradicionais, cultura, patrimônio, unidades de conservação e conflitos socioambientais.

INTRODUÇÃO O Parque Estadual da Serra do Papagaio, é uma unidade de conservação criada em 1998 na região da Serra da Mantiqueira, sul de Minas Gerais. Região que envolve cinco municípios: Alagoa, Aiuruoca, Baependi, Itamonte e Pouso Alto e que também está inserido na Área de Preservação Ambiental da Mantiqueira- APA- Mantiqueira. Anteriormente houve a criação de uma outra unidade chamada Estação Ecológica do Papagaio e o processo de recategorização envolveu muitas incertezas relacionadas aos limites da unidade. Processo estudado em minha tese de doutorado sobre o contexto histórico de criação da unidade, as características demográficas da região, os atores sociais envolvidos, suas atividades econômicas e culturais, assim como os conflitos socioambientais gerados pela criação dessas unidades de conservação de proteção integral. No qual esse artigo se insere e aqui me proponho comentar o processo de constituição do Consórcio de Ecodesenvolvimento regional da Serra do Papagaio, a proposta de redelimitação do parque e a atuação política de agentes do governo estatal, do Instituto estadual de Floresta(IEF) e de organizações não governamentais. Longe de pretender percorrer todo o processo histórico da criação dessas unidades, mas com intuito de contextualizar o leitor para facilitar a compreensão desse processo posterior de redelimitação. A criação do Parque Estadual partiu dos limites propostos pela Estação Ecológica, embora não haja estudos disponíveis de como a proposta de traçado foi feita, motivos, e nem consulta ou informe à população. Isso porque não houve manutenção das linhas da Estação, mas modificações aparentemente inexplicáveis. Fato que foi explicitado na elaboração do plano de manejo, quando a equipe técnica deixa como proposta dois traçados que poderão ser solucionados após regularização fundiária da unidade, o que ainda não ocorreu. Nesse trâmite, bairros inteiros foram inseridos na unidade, inviabilizando suas atividades econômicas e seu modelo de vida e gerando um ambiente de conflito social, insatisfação e êxodo rural. Nesse contexto de conflitos foi pensada a proposta de redelimitação, no qual se propunha a retirada de áreas antropizadas e ocupadas com atividades econômicas e inclusão de biomas relevantes para a preservação ambiental. Após elaborado o desenho da unidade, projeto foi enviado para a Assembleia legislativa de Minas Gerais, aonde continua tramitando. A metodologia utilizada na pesquisa constituiu-se de observação participante associada a entrevistas a diversos atores do processo, nos anos de 2013, 2014, 2015 e 2016. 1 A criação do Consórcio de Ecodesenvolvimento Regional da Serra do Papagaio e o Instituto Estadual de Floresta(IEF) inseridos em peculiar contexto político Com o intuito de minimizar conflitos e de atender à população, no ano de 2012 teve início uma ação de redefinição das fronteiras do Parque Estadual da Serra do Papagaio, sob a gerência do Instituto Estadual de Florestas. Neste artigo procurarei compreender os desafios democráticos desse processo de redelimitação e as soluções alcançadas. Também me aterei aos conflitos regionais existentes, apresentando e analisando quais deles o projeto obteve êxito em solucionar. Para tanto, procurarei analisar a conjuntura na qual se tornou possível esse processo. Partirei da realidade do IEF, observando os vínculos políticos existentes entre os dirigentes estatais e a região; bem como os projetos que foram implementados. Dentre eles, apresentarei o Projeto Comunidades, que teve papel central na criação do Consórcio de Ecodesenvolvimento Regional (CER); o próprio processo de criação do consórcio; e, posteriormente, o projeto de redelimitação do PESP. Na segunda seção do artigo, discorrerei sobre o arcabouço teórico utilizado para a discussão dos conflitos socioambientais, assim como tratarei da ecologia política, disciplina capaz de abarcar a interdisciplinariedade pretendida nessa pesquisa. Enfim, serão analisadas alternativas e projetos que visam à solução dos conflitos. Os projetos mencionados acima foram implementados após mudança de gestão do IEF; ocorrida logo depois da instituição passar por cinco diretores interinos, sob grande onda de escândalos e corrupção, e grande desorganização e instabilidade institucional. A diretoria foi ocupada por um sociólogo, Marcos Affonso Ortiz Gomes2, que tinha pela frente grandes desafios, em decorrência da crise institucional e de credibilidade do Instituto, o qual passava por um momento de reestruturação organizacional.

2 Marcos Affonso Ortiz Gomes foi indicado pelo então governador de Minas Gerais, Antônio Anastasia, por indicação do Secretário de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Adriano Magalhães, em maio de 2011 e permaneceu no Instituto até fevereiro de 2013. Segundo o entrevistado, esse contato aconteceu em decorrência do vínculo que este tinha com a região de Aiuruoca e os projetos já realizados junto à Fundação Matutu, sediada no município do secretário. Em meio a essa situação, o novo diretor executivo do IEF procurou focar na conservação ambiental e na preservação da biodiversidade, mantendo a agenda das unidades de conservação do Estado sob uma perspectiva humana e ponderada. Procurou elaborar uma gestão integrada dos diversos atores afetados, com uma proposta de planejamento mais participativo dentro do órgão e de implementação da gestão participativa das unidades de conservação com as comunidades do entorno. As práticas que buscassem diminuir os conflitos ambientais no Estado passaram, nessa conjuntura, a ser consideradas prioritárias, como: o fortalecimento dos conselhos das unidades de conservação, a renovação daqueles que estavam inativos, a recategorização de unidades, a redelimitação, enfim, a abertura de um diálogo com a sociedade mineira, fato inédito dentro desse órgão institucional, que sempre teve uma atuação autoritária na esfera de poder, tendo sido as unidades de conservação decretadas e implementadas unilateralmente, sem consulta prévia, acarretando profundos conflitos socioambientais. A ideia de que só seria possível lidar com os conflitos com transparência e diálogo insere-se em um debate no próprio campo das ciências sociais dos conflitos socioambientais. Podem ser assim considerados quando partem de embates entre grupos sociais com diferentes modos de relacionamento ecológico, nos quais o cerne do conflito está no campo das interações ecológicas, remetendo à presença de múltiplos grupos sociais em interação entre si e com o ambiente (LITTLE, 2004). Tarefa árdua é implementar gestão participativa, uma vez que o aparelho do Estado tem tido como referência o domínio do território e não o bem-estar da população. Inseridos em um sistema capitalista globalizado neoliberal, governos e empresas estão comprometidos com a degradação ambiental e constróem uma perspectiva ecológica que busque garantir seus privilégios e hegemonia sobre as formas de produção e reprodução material. Assim sendo, a introdução do Sistema Nacional de Unidades de Conservação - SNUC, num contexto paradoxal do Estado, vivencia inúmeras dificuldades, uma vez que esses territórios correspondem a distintos interesses, os quais, por serem contraditórios, engendram conflitos. Muitos deles representam interesses particulares e até de um único empreendedor. (PEREIRA, 2005). Além disso, a abordagem ambientalista conservacionista do território das unidades distancia-se dos anseios sociais. Dessa forma, configura-se como um esforço infinito encontrar um ponto de equilíbrio entre a norma técnica e a justiça social. De um lado, encontra-se a população local, que sofre a imposição de restrições ao uso dos recursos naturais e à permanência no território a ser preservado; do outro, o Estado onipresente e centralizador, que, ao atrelar as normas e leis restritivas ao uso do território, opera como a acumulação primitiva do capital. Essa abordagem dos conflitos socioambientais começou a se inserir no campo da ecologia política. Um dos aspectos relevantes da ecologia política é a necessidade de lidar simultaneamente com as perspectivas sociais e biofísicas. Daí a junção das dimensões das ciências sociais e naturais. Trata-se de um esforço mútuo de integrar dinâmicas no mundo biológico e dos ciclos naturais, levando em conta o mundo humano e suas estruturas políticas e socioeconômicas, em que as relações constituem o foco da análise, partindo de múltiplas esferas de interação (LITTLE, 2004). Podemos considerar que os conflitos em debate nesta pesquisa constituem o campo da ecologia política, uma vez que englobam diversos atores distintos, inseridos em uma relação humano-ambiental. Os indivíduos estão localizados de forma diversa, trazendo diferentes demandas e histórias para o biológico, mas são essencialmente relacionais. O importante aqui é examinar as suas articulações e contradições mútuas, isto é, as maneiras pelas quais competem para a apropriação do controle social e biológico. Essa percepção contraditória e multidisciplinar da ecologia política pode ser observada no campo das políticas públicas do Estado de Minas Gerais gestado pelo IEF naquele momento. Um diretor, sociólogo, nomeou um Diretoria de Áreas Protegidas (DIAP), administrador de empresas, especialista em questões socioambientais, Leonardo Ivo 3 , para tentar solucionar os conflitos. No início da gestão percebendo-os muito numerosos nas unidades de conservação no Estado entre outros problemas internos da instituição, empreenderam uma mudança de diretrizes de gestão. Entre elas, um planejamento de ações prioritárias do Instituto e para empreendê-la elaboraram um diagnóstico, que contou com a participação dos gestores das unidades de conservação do Estado, funcionários do IEF. Após grande déficit de funcionários, conseguiram contratar rapidamente 550 novos funcionários do entorno das unidades de conservação para dar andamento as ações pretendidas. Foram terceirizados, contratados por uma empresa para prestar serviço de

3 Leonardo Ivo é administrador de empresas e gestor ambiental, especialista em conflitos ambientais. Informações baseadas em entrevista concedida em dezembro de 2013. vigilância e de monitoria, algumas unidades só solicitaram pessoas do entorno para trabalhar na gestão. O resultado foi positivo, uma vez que houve significativa diminuição de incêndios e incorporação da população do entorno na gestão de unidades. Essa medida gerou emprego no entorno e ao mesmo tempo visava valorizar o conhecimento territorial da população local para auxiliar na gestão. O Parque Estadual da Serra do Papagaio contratou: zeladores, monitores operacionais, vigias, servidores gerais e brigadistas das comunidades do entorno, tendo o cuidado de encontrar funcionários em todas elas, significando uma medida eficiente para aproximação das comunidades locais com o parque. O diagnóstico elaborado com os gestores detectou 25 problemas relevantes e foram definidas prioridades, como necessidade de recategorização, redelimitação, regularização fundiária, plano de manejo, infraestrutura e serviços, em blocos de população indígena, quilombola e agricultura familiar. A partir daí, definiu-se quais seriam as unidades de conservação contempladas. Foram escolhidas dez unidades de conservação 4 com grande incidência de conflito e enviadas as propostas para a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG); contudo apenas o Parque Estadual da Serra do Papagaio foi contemplado com um processo de redelimitação e um projeto de lei, que será tratado a seguir. Os conflitos no PESP eram marcantes, expressos principalmente por grandes incêndios e descontentamento das comunidades do entorno. Alguns projetos já vinham sendo executados na região pela Fundação Matutu, entre eles o zoneamento da bacia do Água Preta e de Comunidades da Serra do Papagaio, que, somados aos contatos políticos dos dirigentes da Fundação com órgãos governamentais, abriram um campo fértil para a execução do projeto de redelimitação. Houve também a criação do Consórcio de Ecodesenvolvimento, que deveria promover a integração entre as prefeituras do entorno, com foco no desenvolvimento sustentável da região. O Projeto Comunidades da Serra do Papagaio: gestão integrada do Parque Estadual da Serra do Papagaio e seu entorno5 ocorreu entre 2007 e 2011, com o objetivo

4 As unidades de conservação elencadas eram: Parques Estaduais, da Serra Negra, Serra do Papagaio, Mata Seca, Verde Grande, Pau Furado, Rio Corrente, Serra da Condonga, Sete Salões, Biribiri, Sumidouro, Serra do Rola Moça e Estação Ecológica do Cercadinho 5 O Projeto Comunidades foi realizado pela Fundação Matutu, com financiamento do Subprograma Projetos Demonstrativos - PDA, do Ministério do Meio Ambiente (MMA), por Luiz Fernando de Mello Midéa, Karla Oddone Ribeiro, Manno de Andrade França, Paulo Maciel, Reynaldo Guedes, Marcos Affonso Ortiz Gomes, entre outros, e amplo apoio institucional. de contribuir para a sustentabilidade, por meio da promoção de uma gestão integrada e participativa da região da Serra do Papagaio; tendo como ponto de partida as comunidades rurais do entorno e suas realidades, as percepções do seu território, promovendo a articulação comunitária capaz de planejar um futuro sustentável e de criar um espaço de participação social e de interlocução com os gestores públicos, visando ao ecodesenvolvimento, e à garantia dos direitos sociais6. O projeto foi o início de diversas ações que ocorreram na região posteriormente. Pretendia-se realizar um diagnóstico das comunidades, levando em consideração aspectos históricos e culturais da região, para, então, encontrar e fortalecer uma identidade da Serra, tarefa para lá de audaciosa, sob o ponto de vista antropológico. Foram observadas as transformações culturais, as trocas, os fluxos migratórios e os aspectos folclóricos, tais como as histórias de assombração, as trocas de sementes e a intensa interação entre as comunidades, através dos casamentos e das festas compartilhadas. Buscou-se encontrar essa identidade comunitária e, posteriormente, foi realizada a mobilização e a capacitação comunitária. Houve um grande destaque para as ações de cartografia, intituladas pelo projeto como social, ou seja, a produção de imagens a partir do conhecimento local e com intuito de gerar um novo olhar para com a região, que abrangesse distintos aspectos geográficos da Serra do Papagaio e as características socioculturais da população local. Durante os trabalhos de campo nas comunidades, muitos jovens desenvolveram atividades de construção de mapas e se capacitaram para inserir as informações no Sistema de Informações Geográficas - SIG7. O ponto de partida da mobilização ocorreu em parceria com os agentes de saúde do Programa Saúde da Família, que auxiliaram na seleção dos jovens das comunidades, que se tornariam cartógrafos sociais8. A formação e capacitação desses jovens permitiu a realização de um zoneamento detalhado do entorno do parque, o que ocorreu mediante oficinas de capacitação. A participação social foi estimulada por meio de fóruns, quando os jovens recebiam informações para levar às comunidades. A partir do trabalho com a

Informações baseadas em entrevistas com Karla Oddone Ribeiro e Luiz Fernando de Mello Midéa, em março de 2014. 6 Projeto Comunidades mantém um site: http://www.serradopapagaio.org.br. Acesso 10/11/2017 7 Os Sistemas de Informações Geográficas (SIG) são equipamentos e meios tecnológicos para se estudar o espaço terrestre e resultam da combinação entre três tipos de tecnologias distintos: o sensoriamento remoto, o GPS e o geoprocessamento. Disponível em: http://brasilescola.uol.com.br/geografia/sig.htm 8 Houve o curso “Cartografia: ferramenta de gestão do território ao alcance das comunidades”, atividade- chave do projeto Comunidades. cartografia social, produziram um mapa cartográfico muito detalhado, elaborado a partir do conhecimento local, que foi inserido no SIG da região. Houve também a realização de fóruns de comunidades, com o intuito de criar uma base social para a implementação da participação. Para promover a integração regional, para além de atividades turísticas sustentáveis, o que havia sido idealizado a princípio, criou-se um marco jurídico entre os municípios, que lidaria com questões comuns ligadas ao desenvolvimento sustentável local e que fosse capaz de capacitar agentes públicos para desenvolver projetos e captar recursos. Esse marco legal denominou-se Consórcio de Ecodesenvolvimento Regional da Serra do Papagaio - CER, e foi criado, segundo os entrevistados, por sugestão do então governador de Minas Gerais9. O Projeto Comunidades atuou em ações de construção coletiva dos objetivos do Consórcio, criando espaços de debates entre sociedade civil e governos sobre as suas possíveis áreas de ação. Propôs uma experiência de construção participativa de uma política pública de atuação local e realizou uma parceria com o SEBRAE-MG, viabilizando a contratação de um consultor jurídico para normatizar o Consórcio. A tarefa de colocar em contato comunidades rurais e Estado, por meio das prefeituras, visava a facilitar o acesso a recursos. Os coordenadores pensaram que o projeto pudesse efetivar grandes mudanças na vida dos jovens e na própria vida comunitária, servindo como um grande projeto guarda-chuva, onde se pendurariam um projeto socioeconômico; um projeto de educação ambiental; um outro de agroecologia; e o de artesanato. Projetavam criar uma agenda aos municípios do entorno para lidar com o turismo, com o parque e com a geração de renda, transformando o PESP em uma oportunidade ao invés de uma ameaça. Para tanto, tinham como meta fazer três oficinas com as prefeituras, para levar as demandas das comunidades e estabelecer esse canal de interação e participação. A formação de um grupo de trabalho interinstitucional contava com representantes do poder público executivo e legislativo dos cinco municípios do entorno do Parque, das comunidades rurais, do CONPESP, da EMATER e do SEBRAE, sob coordenação da Fundação Matutu. Nesse momento, houve a elaboração do Protocolo de

9 O governador nesse momento era Antônio Anastasia. Intenções do Consórcio10, envolvendo os cinco prefeitos dos municípios do entorno, em dezembro de 2009. O projeto conseguiu, também, através da parceria com o Sebrae, apoiar a elaboração dos estatutos necessários para a regulamentação final do consórcio e realizar a cerimônia de ratificação da lei do CER pelos prefeitos, com participação do governador do Estado, que, na ocasião, firmou o compromisso de financiar o Núcleo de Apoio ao Consórcio, proposto pela Fundação com o objetivo de alavancar o ecodesenvolvimento regional. A Ata de Fundação foi elaborada em maio de 2011. A publicação da constituição do CER no Diário Oficial do Estado de Minas Gerais aconteceu em 21 de junho de 2011, pouco tempo depois da cerimônia de criação, ocorrida em Pouso Alto no dia 11 de junho do mesmo ano, quando foi eleito o primeiro presidente e foram aprovados os seus estatutos11. O grande desafio do Projeto Comunidades seria implementar o Consórcio, conseguindo manter o cunho participativo e de inclusão social; o que, de fato, não ocorreu, em decorrência da mudança de gestão da Fundação Matutu, que deu preferência para um processo mais burocrático e institucional, ao invés de comunitário e participativo12. A ideia original seria a criação de um conselho participativo soberano, pelo qual passaria toda e qualquer deliberação. No último fórum do Projeto Comunidades, foram escolhidos guardiões das comunidades, que seriam os responsáveis em estabelecer um diálogo com o CER. Levariam as informações para a comunidade, até a formalização do conselho; e manteriam os fóruns de comunidades como um espaço público aberto no qual qualquer pessoa pudesse participar, trazendo as demandas comunitárias e também as informações coletadas pelos cartógrafos sociais, que realizariam a atualização constante do banco de dados, contribuindo, dessa maneira, para o funcionamento do Consórcio.

10 O Consórcio de Ecodenvolvimento mantém um site: http://cerserradopapagaio.eco.br/cer/; onde está disponível o Protocolo de Intenções: http://cerserradopapagaio.eco.br/site/wp- content/uploads/2013/03/protocolo_consorcio022.pdf. Acesso 09/06/2016 11 A Ata de Fundação está disponível em: http://cerserradopapagaio.eco.br/site/wp- content/uploads/2013/02/000ATA-assembleia-_CER0013.pdf; e também a publicação de sua constituição no Diário Oficial do Estado de Minas. http://cerserradopapagaio.eco.br/site/wp- content/uploads/2013/03/publica%C3%A7%C3%A3o_CER001.pdf. Acesso em 09/06/2016 12 A proposta de um consórcio de desenvolvimento rural vinculado às comunidades que participaram do projeto Comunidades, e que teriam voz e participariam ativamente por meio de fóruns e conselhos, foi substituída pela valorização da esfera pública, devido ao direcionamento e às questões internas da própria gestora dos projetos, a Fundação Matutu, havendo o abandono da linha da real de participação. Essa cisão interna da Fundação potencializou ainda mais os conflitos em que estão envolvidos. O próprio CER perdeu sua força geradora, mesmo antes de ser implementado. O CER foi criado baseado na Lei Federal de Consórcios Públicos 11.107/2005, segundo a qual seria instituído como associação pública com natureza autárquica e personalidade jurídica de direito público (BRASIL, 2005), com a finalidade de exercer a cooperação federativa, atuando regionalmente na gestão ambiental integrada e no fomento de atividades econômicas compatíveis com a conservação ambiental, principalmente nas áreas do entorno do PESP. Sua sede e foro foram estabelecidos no município de Baependi, como uma exigência do município para participar do consórcio, o que, entretanto, foi posteriormente alterado (MINAS GERAIS, 2011). Apesar de distintos consórcios públicos já existirem no Brasil, não havia nenhum de ecodesenvolvimento instalado. Assim, o próprio consórcio se proclamou algo inovador e inédito, principalmente por prever um conselho participativo em seu quadro organizacional. A partir do Protocolo de Intenções, os prefeitos começaram a se reunir e a perceber que a captação de recursos e projetos para municípios pequenos é mais difícil; e que, caso houvesse uma gestão regional capaz de os unir, seria mais fácil de conseguir implementar políticas públicas e atrair investimentos estaduais e federais. A partir de então, os prefeitos apoiaram a criação do consórcio e pressionaram as câmaras de vereadores a aprovarem o projeto, e sua criação ocorreu em 2011. A mobilizadora desse processo foi a Fundação Matutu, sob nova coordenação13, que passou a fazer esforços na articulação com o poder público local para estabelecer um diálogo com as comunidades. Para a implantação do consórcio, foi realizado um convênio envolvendo o IEF, a SEMAD14 e a Fundação Matutu, quando foi criado o Núcleo de Apoio ao Consórcio de Ecodesenvolvimento Regional da Serra do Papagaio - NACER. Foram estabelecidas parcerias com diversas outras instituições, como a gerência do PESP/IEF, o SEBRAE e a EMATER; assim como com os representantes técnicos das cinco prefeituras. O Núcleo constituía-se como uma instância temporária, que poderia ser incorporada ao CER, caso a

13 Maria Dorotéa Naddeo assumiu a diretoria executiva da Fundação Matutu em 2011 e passou a conduzir o processo de criação do consórcio e, depois, de mobilização para o plano de redelimitação do PESP. Permaneceu na instituição até início de 2014. Informações baseadas na entrevista concedida em dezembro de 2013. 14 O Secretário de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Adriano Magalhães, e o Diretor Geral do Instituto Estadual de Florestas - IEF, Marcos Ortiz, assinaram um convênio com a Fundação Matutu, em Baependi, para implantação do Núcleo de Apoio ao Consórcio de Ecodesenvolvimento Regional da Serra do Papagaio - CER - Serra do Papagaio, no dia 23 de dezembro de 2011. O gerente do convênio, diretor do DIAP - IEF, era Leonardo Ivo (Fonte: http://cerserradopapagaio.eco.br/site/wp-content/uploads/2013/02/001AGO-I2.pdf). Assembleia Geral assim decidisse. Com a constituição do Núcleo, os representantes da prefeitura e parceiros passaram a realizar reuniões para discutir a organização do consórcio. Houve a criação do Conselho Participativo (CP), a estruturação da sede, a capacitação de gestores e a elaboração de um plano de implantação. Contudo, o modelo participativo proposto pelo Projeto Comunidades, de fóruns, foi abandonado, com a promessa da criação de um conselho participativo. Deveria ser esse o espaço de interlocução com as populações para discutir políticas públicas. No entanto, a posição do conselho participativo no quadro decisório da organização acabou por ser anulada por seu estatuto, uma vez que a participação na Assembleia Geral, órgão soberano do CER, limitou-se ao presidente do Conselho, que apenas teria direito a voz e não a voto. Assim sendo, o foco principal passou a ser a capacitação dos gestores públicos para implantar o consórcio. Com o apoio dos consultores para organização e implementação, além do estímulo do governador e participação dos prefeitos, houve avanço no processo. A prefeitura de Baependi cedeu um servidor para trabalhar pelo CER e, ainda, arcava com o aluguel da sede. Havia, ainda, a contribuição mensal de todas as prefeituras, por meio do Contrato de Rateio, que foi o instrumento legal para garantir a arrecadação de R$ 2.200,00 por prefeitura, para cobrir despesas de manutenção e estrutura de funcionamento do consórcio: salários, insumos, equipamentos permanentes, entre outros. Algumas ações em 2013 aumentaram o otimismo dos agentes públicos, como um curso de capacitação para operadores de máquinas, para melhoramento e recuperação de estradas rurais do grupo de trabalho de técnicos das prefeituras do CER (GT - Estradas). Apesar de ser considerada uma ferramenta importante para os municípios, muito pouco se conseguiu efetivar dos objetivos do consórcio. Muitas críticas são feitas ao CER, entre elas a falta de engajamento dos prefeitos, para conseguir a consolidação do consórcio; a necessidade de maior capacitação do Diretor Executivo para conduzi-lo; e o enfraquecimento da real participação da comunidade. A criação do CER como um instrumento que possibilitasse a participação das comunidades, organizadas no Projeto Comunidades, não aconteceu. A proposta de um consórcio no qual a direção e os conselheiros são os políticos da prefeitura significa a restrição da participação da sociedade civil e seu total funcionamento atrelado à esfera política e às oscilações dos poderes municipais. Além disso, a forma como o seu processo de constituição foi conduzido na região gerou inúmeros conflitos. Nesse contexto, rumos antagônicos permearam a constituição do CER. Aos municípios foi proposta uma perspectiva do ecodesenvolvimento. Seus idealizadores o viam como um processo de fortalecimento das comunidades rurais do entorno do parque, que promovesse a participação social e a melhoria da gestão pública. Contudo, foi criado articulando apenas o setor público e agentes urbanos. Assim, sem ideais em consonância, foi muito difícil operar o consórcio e conseguir eficiência. Alguns outros projetos foram realizados, como a capacitação para o Plano Municipal da Mata Atlântica; o apoio à realização dos planos municipais de saneamento básico e o apoio ao processo de redelimitação do PESP15, processo que ensejou conflitos entre grupos municipais e comprometeu o futuro do CER. Além disso, o servidor que havia sido cedido pela prefeitura de Baependi, acabou sendo solicitado para trabalhar na Secretaria de Meio Ambiente do município. O afastamento da Fundação Matutu e de seus trabalhos de mobilização significaram praticamente a paralisação do consórcio. Antigos conflitos políticos vieram à tona com a criação do CER e, posteriormente, com o início da redelimitação do PESP, uma vez que foram processos que tiveram como instituição articuladora a Fundação Matutu, em parceria com o governo do Estado de Minas Gerais, trazendo algumas incertezas sobre a origem de alguns processos institucionais, como trataremos a seguir. A partir do processo desenvolvido pelo Núcleo de Apoio, com uma proposta de implantar uma cultura de planejamento na gestão pública, estabeleceu-se um espaço de diálogo, no qual se acordou que o principal ponto de conflito do entorno do PESP seriam os limites da unidade e que deveria haver prioridade em sua solução. A situação de desinformação das comunidades rurais sobre os limites da unidade e o descontentamento geral sobre essa questão territorial foram apontados como as principais causas de incêndios na região. De fato, para as populações rurais, o Estado e o parque eram vistos como inimigos, gerando insegurança em relação ao uso do território (em virtude da aplicação de multas), e à reprodução da vida social, já que bairros inteiros estão inseridos no traçado. Para efetivar a proposta de gestão integrada, seria prioritário solucionar essa

15 Informações concedidas em entrevista pelo então diretor executivo do CER, Marcos Tridon, em abril de 2014. Marcos Tridon, ex-prefeito de Itamonte, foi o primeiro presidente do Consórcio, em 2011. Em 2013, assumiu a diretoria executiva, até 31 de maio de 2016, quando pediu sua exoneração do cargo. questão e promover um espaço mais democrático16. Com a mudança organizacional do IEF, apresentada anteriormente, e suas novas propostas de gestão; somadas ao vínculo do diretor do Instituto e do secretário do meio ambiente com o PESP, com Aiuruoca e com a Fundação Matutu; e à indicação de redelimitação do Parque no Plano de Manejo, constituído como uma das unidades elencadas no diagnóstico realizado pelo IEF para a revisão dos limites, há a configuração da conjuntura perfeita para que ela ocorresse. A discussão dentro do consórcio pautou-se em avaliar os impactos dos limites do parque na vida das comunidades afetadas, em conjunto com o IEF, em que se procurou estabelecer uma metodologia “Vamos chamar pra conversar quem é dono de terra, porque, enquanto o governo do Estado não fizer regularização fundiária e não pagar, o Estado não é dono.” (Maria Dorotéa Naddeo, 2013). Com o intuito de ampliar um diálogo com o produtor rural, levou-se às comunidades as informações básicas de onde passam as linhas do parque e sobre quais seriam as expectativas das comunidades a respeito do traçado, bem como quais seriam as áreas importantes para elas e quais não17. Nesse processo de negociação, apesar dos ambientalistas terem temido que o parque fosse reduzido, o que houve foi uma ampliação dos limites por meio da negociação social, coisa que os conservacionistas achavam que nunca seria possível; isso porque muitas comunidades não veem o parque como positivo em suas vidas. Uma vez que nasceram e viveram naquela terra, que tem a tradição de toda a sua ancestralidade e sua história de vida, veem-se ameaçadas de ter que deixá-la. Nesse sentido, a negociação social significa um grande passo para o direito social e a democracia18. Procurou-se estabelecer uma gestão compartilhada, na qual o gestor da unidade, o IEF, propôs o processo de revisão dos limites. A responsabilidade pela mobilização ficou com o CER e a Fundação Matutu. Dentro do CER havia a ação das prefeituras, fazendo a identificação dos proprietários, convidando para as reuniões junto à nova gerente do PESP e ao IEF. O plano de trabalho realizado pelo convênio já continha o apoio para a

16 Informações sobre o Núcleo fornecidas pela Diretora Executiva da Fundação Matutu, Maria Dorotéa Naddeo, que passou a conduzir o processo de criação do consórcio e, depois, de mobilização para o plano de redelimitação do PESP. Informações baseadas na entrevista concedida em dezembro de 2013. 17 Sobre esse tema, aqui está exposta principalmente a visão institucional do projeto e dos dirigentes. Aprofundo a visão da comunidade sobre o processo no capítulo 4. 18 Informações concedidas pelo então diretor executivo do Instituto Estadual de Florestas - IEF no momento da redelimitação do PESP. mobilização para a revisão dos limites, contudo o IEF solicitou que fosse a primeira ação a ser realizada pelo convênio, já que considerou de grande urgência a solução de conflitos. Essa primeira ação do consórcio foi um grande desafio que se pensou que pudesse contribuir para a consolidação do mesmo, uma vez que foi criado para integrar a região. Mas o que, de fato, ocorreu, foi a sua desmobilização, pois, antes mesmo de haver a efetivação do seu funcionamento, já se havia incumbido em realizar uma ação que exigiria muita articulação e diálogo para minimizar os conflitos de grupos políticos regionais, na qual não se obteve sucesso. A mobilização começou a ser feita em 2012, a partir da convocação dos proprietários para a identificação de suas áreas. Nesse momento, o IEF apresentou a proposta do redesenho e abriu o diálogo para que se pudesse opinar, por exemplo, a respeito das áreas que poderiam entrar para o parque ou que se gostaria de reservar para o curral. As reuniões começavam com a explicação do que era o CER, o convênio e o IEF. Nesse momento, ocorreu, também, o começo da mobilização para a constituição do Conselho Participativo do consórcio. A metodologia utilizada para a redelimitação partiu de imagens das propriedades do entorno, georeferenciadas. Foi realizado um sobrevoo plugado em GPS para tirar fotos, com o intuito de definir todas as propriedades de borda, já que as de dentro não iriam sofrer alterações. Convocou-se uma reunião coletiva, enfatizando os critérios de redelimitação, momento no qual os proprietários poderiam solicitar alterações em seus territórios, comparando a propriedade da pessoa em relação ao antigo traçado e à nova proposta de limites. Aqueles que tiveram dúvidas dirigiram-se à prefeitura em busca do técnico para solucioná-las, ligaram para a sede do IEF em e, muitas vezes, iam refazendo o traçado, quando havia algum erro. O que impressionou os consultores foi o depoimento das comunidades, que nunca pensaram que poderiam ter uma relação com o gestor da unidade de conservação com um espaço de diálogo. Pessoas que já tinham desistido da participação por causa dos conflitos, voltaram a aparecer: O trabalho de campo foi realizado nos cinco municípios que integram o PESP, de acordo com a metodologia de cartografia social, que busca utilizar recursos simples de cartografia para facilitar o entendimento de imagens de satélites e mapas. O mapeamento dos cartógrafos sociais foi utilizado no processo. A mobilização foi feita por meio de rádio, faixa e autofalante, pelo CER. Uma das grandes reclamações é a de que muitas comunidades ficaram sem aviso, o que é previsível, com as formas de comunicação utilizadas, uma vez que as comunidades rurais afastadas não têm acesso a essas vias de informação. Os princípios que orientaram o projeto foram: a retirada dos limites do PESP de propriedades com casas, com atividades agrárias (pastos e lavouras da comunidade rural) ou sem relevância ambiental; e, em contrapartida, a inclusão de áreas de grande relevância ambiental que estavam fora do traçado e, por conseguinte, sem qualquer proteção ambiental legal. Outro aspecto relevante considerado foi a tentativa de minimização de conflitos com as comunidades do entorno e a otimização dos recursos de implantação da unidade, ao priorizar a inclusão de terras sem benfeitorias. A metodologia cartográfica realizada, segundo o coordenador do projeto, Manno França, partiu de uma classificação de imagens de satélites Rapideye e classificação orientada de objetos, com o software Ecognition, da Trimble. A escala utilizada para o trabalho foi de 1:25.000, que revelou as áreas com vegetação mais conservadas (florestas, campos, áreas em recuperação). Esse mapa foi combinado com outros, contendo mapa fundiário, RPPNs, atrações turísticas, comunidades rurais e estradas, a fim de gerar uma carta comparativa da região, com áreas prioritárias para a conservação, também na escala 1:25.000; mas, desta vez, em ArcGIS19, programa da ESRI. A partir daí, houve uma comparação com o polígono do PESP, para ver áreas de baixa relevância que estavam fora e, também, áreas onde existiam conflitos antigos. Em seguida, foi elaborado um novo mapa e, para confirmação dos dados, foi realizado um sobrevoo detalhado20. Os dados do mapa foram passados para o programa Google Earth, com o intuito de facilitar a compreensão dos proprietários nas reuniões municipais, já que possui boa resolução e visão 3D. As reuniões ocorreram em todos os municípios do entorno e, à medida que cada proprietário foi entendendo o polígono de sua propriedade, foram sendo desenhadas, pela

19 O ArcGIS usa modelos de dados de SIG para representar a geografia e provê todas as ferramentas necessárias para criar e trabalhar com o dados geográficos. Isso inclui ferramentas para todas as tarefas de SIG: editando e automatizando dados, mapeando cartograficamente tarefas, administrando dados, realizando análise geográfica, administrando dados avançados e desenvolvendo dados e aplicações na Internet. http://www.ctec.ufal.br/professor/rsr/apostila-arcgis/Capitulo1_OQueEOArcGis.pdf 20 Todos os mapas foram elaborados pela Gerência de Monitoramento e Geoprocessamento da Diretoria de Pesquisa e Proteção à Biodiversidade do Instituto Estadual de Florestas - DPBio/IEF e pelo Núcleo de Geoprocessamento e Inteligência Espacial da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável - SEMAD de Minas Gerais, em conjunto com a gerência do parque, sob coordenação de Manno França, conforme entrevista concedida pelo mesmo. equipe técnica, novas linhas de propostas para os limites do PESP. Essas linhas buscaram atingir um consenso com cada proprietário. Portanto, podemos considerar, segundo os coordenadores do projeto, que o trabalho foi participativo e também um modelo inédito no processo de revisão de limites de unidades de conservação, já que a ideia geradora do processo era conseguir construir um limite de consenso para o parque, a partir da visão das comunidades rurais e dos proprietários de terras do entorno. Após a realização desse mapa21, houve a apresentação do Projeto de Lei de nº 3.697/13, com o intuito de alterar os limites do PESP, para, de acordo com o relator do projeto, deputado Dalmo Ribeiro Silva, corrigir erros do projeto original, com base em novas pesquisas técnicas do IEF. Mapa 1 - Proposta de redelimitação do PESP

Fonte: elaborado pela autora com dados extraídos da Proposta de Redefinição de Limites do PESP, IEF, 2012. A proposta seria acrescentar 4.993,62 hectares e, por outro lado, retirar 2.837,47 hectares, o que acarretaria em uma área total de 26.116,86 hectares, ao invés dos 22.917 hectares anteriores (MINAS GERAIS, 2013). Segundo o coordenador do projeto, essas áreas retiradas seriam áreas que foram indevidamente inseridas no traçado anterior e deveriam ser corrigidas para minimizar os conflitos. Isso havia acontecido por falta de tecnologia disponível no momento de demarcação: “Queremos melhorar esse desenho a partir da tecnologia atual. Consideramos, para o projeto, o que está lá dentro que tem

21 Mapa 14, da redelimitação dos limites em sobreposição com o limite atual. relevância ambiental, mas que gera conflitos, e o que está do lado de fora e que pode ser acrescentado. Pretendemos diminuir esses conflitos” (Manno França, 2013)22. Essa gestão participativa é um grande passo democrático nas delimitações de unidades de conservação no Brasil e poderia servir de exemplo para futuras demarcações em todo o país. Entretanto, não se pode considerar que a coordenação do projeto tenha realmente alcançado um consenso entre os municípios e os atores envolvidos. Com as mudanças administrativas municipais em 2013, teve início um grande impasse em relação ao desenho proposto, apesar das discussões terem sido encerradas em julho de 2013 na Assembleia Legislativa de Minas Gerais e do desenho ter sido aprovado na primeira fase plenária. Contudo, na segunda fase plenária, em decorrência de interesses políticos e da atuação de mineradores obscuros23, houve a inclusão de um substitutivo número 1, com a proposta de alteração dos limites da Estação Ecológica de Arêdes, na região de , região central do Estado, o que foi aprovado em dezembro de 2014, tirando da pauta o Parque Estadual da Serra do Papagaio, tema que não foi votado. Em abril de 2017, essa lei que alterou os limites da Estação foi considerada inconstitucional pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais24. Alguns grupos políticos do município de Baependi, durante a tramitação do Projeto de Lei, reivindicaram a realização de Audiências Públicas, que ocorreram em 2013, onde pediam esclarecimento sobre alguns temas, dentre eles sobre o processo de mobilização social e execução do projeto de redelimitação. Alegaram que o projeto seria muito necessário, já que era um dos direcionamentos do Plano de Manejo do PESP. Contudo, não aprovaram a participação da Fundação Matutu no processo de mobilização,

22 Manno Andrade França era o coordenador de geoprocessamento e inteligência espacial da SEMAD e responsável pela elaboração dos mapas. Disponível: http://www.almg.gov.br/acompanhe/noticias/arquivos/2013/06/25_audiencia_publica_comissao_meio_am biente_serra_papagaio.html. Acesso: 26/10/2017 23 O secretário estadual de meio ambiente e desenvolvimento sustentável do governo na época, Adriano Magalhães, passou a ser investigado pelo Ministério Público de Minas Gerais por ligação com um esquema de corrupção que envolve a mineradora MMX Sudeste Mineração, de Eike Batista, beneficiando-a por meio da facilitação de licenças ambientais e impedindo a interrupção das atividades da empresa; além da ocultação de autos de fiscalização e infração emitidos contra a empresa. 24 O Tribunal de Justiça de Minas Gerais considerou inconstitucional o processo. O pedido foi feito pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), por meio da Procuradoria Geral de Justiça (PGJ), que propôs Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), pois detectaram vícios formais e materiais da lei. A justificativa foi que as emendas do legislativo deveriam ter ligação direta com o projeto de lei do executivo, infringindo o princípio de separação de poderes, além da ordem constitucional que disciplina o processo legislativo. Disponível: https://www.mpmg.mp.br/comunicacao/noticias/justica-declara- inconstitucional-lei-que-alterou-limites-da-estacao-ecologica-estadual-de-aredes.htm#.WfMioWLWwy4. Acesso: 27/10/2017 pois consideraram inapropriado o envolvimento de partes interessadas da região para a execução do projeto25. Apontam erros burocráticos, como a não publicação de um edital no Diário Oficial da União (DOU) nomeando a instituição que realizaria a mobilização e divulgação; denunciando, ainda, não terem recebido cópias do mapa do Instituto Estadual de Florestas com a nova definição de limites. Nesse sentido, é possível depreender que houve desinformação de inúmeras pessoas da comunidade rural de Baependi, uma vez que a divulgação em áreas mais longínquas não ocorreu. Além disso, um dado relevante que contribuiu para as reações em relação ao novo traçado refere-se ao aumento das terras baependianas dentro dos limites do parque, já que o município já era o detentor das maiores porções de seu território dentro do PESP, em comparação com o município vizinho de Aiuruoca. Há, também, discordância em relação aos critérios técnicos adotados no projeto. Foi alegado que o plano diretor das bacias hidrográficas, o Plano de Manejo da unidade e a ecologia de paisagem não foram levados em consideração nessa proposta de redelimitação. Aponta-se, ainda, a ausência de consulta às unidades vizinhas, como a APA - Mantiqueira e o Parque Nacional do Itatiaia, conforme exigência do SNUC. Reivindica-se maior transparência no processo, como acesso a relatórios técnicos que contenham o zoneamento ambiental e econômico e a regularização fundiária da unidade; bem como a discriminação das áreas que estariam entrando e das que sairiam, de seus proprietários, de suas vocações ambientais e as estratégias de preservação, no caso de RPPNs, além de documentação comprobatória de consultas públicas. A ausência do acesso aos documentos reivindicados deu origem a muitas incertezas em relação ao projeto. Na redefinição dos limites, portanto, afloraram muitos conflitos regionais, de grupos políticos, comunidades rurais e tradicionais. Enquanto o município de Baependi procurou frear o projeto, buscando a revisão e a adequação às suas expectativas ambientais para a região, a comunidade rural de Itamonte se mostrou extremamente irritada com a demanda de Baependi. Itamonte detém grande parte das propriedades que estão sendo retiradas e é alvo de grande crítica por parte de Baependi, visto que, segundo os baependianos, seriam áreas de trutários, que não deveriam ser aprovadas em rios de

25 Manno França é filho do presidente da Fundação Matutu, situada em Aiuruoca e com extensas áreas no entorno do PESP; e, inclusive, já foi seu presidente. Além disso, foi coordenador do projeto e assessor especial do governo do Estado de Minas Gerais. classe especial. Contudo, há que se considerar, de fato, a existência de erros do projeto original na elaboração do parque, na comunidade rural de Itamonte, que, segundo esta, deveriam ter sido corrigidos há muitas décadas. A situação das comunidades de Alagoa e Itamonte é desastrosa, uma vez que bairros inteiros estão inseridos no traçado de 98 e a população sofre constantes penalizações pela polícia militar ambiental. Muitos já foram multados e seus empreendimentos embargados. Os moradores, entretanto, desrespeitam o embargo, apelando para o Ministério Público. Contudo, não conseguem fazer a regularização ambiental, por estarem dentro do PESP. O governo, por sua vez, não desapropria. E assim segue o conflito26. Baependi, portanto, sente-se no direito de realizar as reivindicações acima mencionadas, já que tem a maior área dentro do parque. Por outro lado, a falta de transparência no processo e a autoria do projeto estão no âmago dos conflitos27. Os baependianos consideraram desastrosa a maneira pela qual se conduziu o processo, denunciando a falta de diálogo; a não disponibilização das informações pertinentes ao projeto; o descumprimento da legislação de revisão de limites; e o atendimento a interesses privados territoriais para desafetar áreas. Outra incorreção levantada foi a não apresentação e discussão da revisão de limites no Conselho Consultivo do PESP. De fato, não há uma ata de reunião com essa importante pauta. Alguns dos proprietários de Baependi julgam, também, que, no município, não houve a possibilidade de formação de RPPN, como ocorreu em Aiuruoca, no vale do Matutu, significando o favorecimento político de um grupo em detrimento de outros. Há grande tensão em torno de denúncias de retiradas de áreas do parque do município de Aiuruoca para especulação imobiliária. O Projeto de Lei original foi de autoria do governador em exercício, Antônio Anastasia, com amplo apoio do então Secretario do Meio Ambiente do Estado, de Aiuruoca. Não aprovado, foi reapresentado em julho de 2014, com o nº 5.364 e, posteriormente, arquivado, com o fim da legislatura. Apesar da reivindicação de

26 Informações sobre Itamonte baseadas em entrevista realizada com a secretária de turismo e meio ambiente de Itamonte, Catarina Romanelli; e em Audiência Pública ocorrida em Itamonte, em 2013. 27 Informações baseadas em entrevistas realizadas com Filipe Condé, secretário de turismo e meio ambiente de Baependi; Paulo Maciel, ex-presidente da FEAM e proponente da Estação Ecológica do Papagaio; além de notas taquigráficas de audiências públicas. Baependi28 junto ao IEF de que o projeto fosse revisto e reapresentado pelo próprio Instituto, isso não aconteceu. No dia 20 de maio de 2015, houve o desarquivamento do projeto, sob o nº 1.658, apresentado pelo deputado Carlos Arantes, em tramitação nas comissões em 1º turno da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Mas, ao que tudo indica, os conflitos regionais impedem o avanço do projeto na ALMG, sem que o gestor do parque ou o IEF consigam mediá-los para chegar à aprovação do Projeto de Lei. Os distintos apoios políticos e lobbys feitos impedem o andamento do processo e me parece que o projeto descrito anteriormente está fadado ao fracasso, caso os diferentes atores não procurem enxergar além de seus próprios esforços e interesses. Enfim, o esforço de participação social tem se mostrado presente, com grande dificuldade de coordenação dos direitos democráticos dos cidadãos, das instituições governamentais, dos grupos políticos e das comunidades rurais. O conflito entre todos esses grupos se polariza entre regiões e elites políticas, que conseguem fazer valer suas verdades e influências. Não podemos definir o curso do processo, mas uma certeza é clara: são as comunidades rurais do entorno as mais afetadas pelo jogo de forças em questão. 1.2 A ecologia política e os conflitos socioambientais A ecologia política passou a ser configurada nos últimos vinte anos como um novo campo de pesquisa que procurou combinar a ecologia humana, nas relações que as sociedades humanas estabelecem com seus ambientes biofísicos; com conceitos de economia política, que analisa as relações estruturais de poder. Alguns elementos contribuíram para sua emergência, tais como as novas realidades políticas e ambientais da época, relacionadas à vertiginosa aceleração do processo de globalização do sistema capitalista neoliberal e à crescente gravidade da crise ambiental no palco mundial, com a emergência de temáticas globais, como a desertificação, inundações, esgotamento dos recursos naturais, contaminação do ar, água e solo, modificação climática e perda da biodiversidade (LITTLE, 2006). Como tanto essas questões da natureza como as de ordem social e epistemológicas permaneceram sem resolução na sociedade moderna, percebeu-se grande inabilidade dos povos modernos em lidar com a natureza sem destruí-la, além das respostas dadas pelas ciências sociais e naturais terem sido insuficientes. Daí a

28 Reivindicação apresentada por Filipe Condé na 34ª reunião ordinária do Conselho Consultivo do Parque Estadual da Serra do Papagaio. necessidade de levantar a questão da natureza de um novo modo, em uma perspectiva que incluísse natureza e cultura, mas também sociedade, política e economia, umas das premissas da ecologia política. As premissas, na definição de natureza, também passaram a ser discutidas amplamente e, segundo Escobar (2005), a crise ambiental, que poderia ser considerada crise da natureza, também pode ser considerada uma crise da identidade da natureza, uma vez que o próprio significado da natureza modificou-se no processo histórico, em decorrência de fatores culturais, socioeconômicos e políticos. Uma perspectiva apontada é a construção da natureza pelos processos discursivos, de significação e daquilo que percebemos como natural, cultural e social. Portanto, deparamo-nos com novas perspectivas epistemológicas e ontológicas da relação entre natureza e cultura e há, nesse contexto, o declínio da ideologia naturalista e da visão da natureza intocada e independente, em detrimento daquela que a vê como artificialmente produzida; deixando para a arena do debate interdisciplinar quais seriam as novas combinações de natureza e cultura (ESCOBAR, 2005-b). Partindo dessa realidade complexa, a ecologia política foi a campo a reclamar para si o mérito de clarear as questões da natureza. O campo se constituiu a partir de um diálogo entre a ecologia cultural e humana; incluindo, posteriormente, a geografia, a economia ecológica, a antropologia, a história, a sociologia, a economia política e a arqueologia histórica, criando um espaço interdisciplinar. Com a introdução da economia política ao paradigma ecológico, colocou-se em pauta o choque dos sistemas produtivos, das mudanças econômicas e da crise ambiental (ESCOBAR, 2005-b). Ficaram claras também as dificuldades nessa articulação entre as ciências naturais e humanas; e os grandes desafios em criar uma nova racionalidade ambiental; que não só formule novos raciocínios, mas que permita ao mundo a convivência com a diversidade, construindo novas formas de vida e rearticulando o elo entre cultura e natureza, de forma a modificar o sentido e o significado das coisas (LEFF, 2006). Numa concepção antiessencialista da natureza, Escobar reconhece sua pluralidade, capitalista e não capitalista, moderna e não-moderna, na qual, apesar do social e do biológico terem papéis centrais, não seriam essenciais. Daí parte sua definição: “a ecologia política pode ser definida como o estudo das múltiplas articulações de história e biologia e as mediações culturais por meio das quais tais articulações são necessariamente estabelecidas” (ESCOBAR, 2005-b, p. 24). O autor distancia-se, assim, dos conceitos de natureza e de cultura, por considerá-los categorias modernas, e não compreensíveis para contextos não modernos. Ao valorizar a articulação entre a biologia e a história, considera que a ecologia política analisa as múltiplas práticas do meio biofísico implicado no histórico. Como sua tarefa, diz que “a ecologia política se ocupa em encontrar novos caminhos de tecer conjuntamente o biofísico, o cultural e o tecnoeconômico, para a produção de outros tipos de natureza social” (ESCOBAR, 2005-b, p. 25). A ecologia política, portanto, possui diversas abordagens e aspectos que a levam a uma perspectiva transdisciplinar e antiessencialista, na qual se parte de que a natureza é experienciada de formas diversas pelos distintos grupos em períodos históricos diversos; e de que a análise tem que partir de novos conceitos de natureza, sociedade e cultura, enfrentando imensos desafios em colocar em contato os modelos locais em relação aos modelos modernos de natureza e economia. Tem como objetivo, segundo Escobar (2005- b), compreender e participar no conjunto de forças, unindo mudança social, meio ambiente e desenvolvimento; sugerindo, ainda, novas questões. Temos então a emergência, segundo Leff (2003), de um campo do conhecimento que envolve o pensamento crítico e a ação política, que tecem uma crítica radical dos fundamentos ontológicos e metafísicos da epistemologia moderna e criam uma política da diferença e da diferenciação do sentido; preconizando uma revolução de ordem simbólica, que pretende reforçar uma nova ética política, para renovar o sentido da vida e fundar um novo pensamento e um novo ethos, ambos libertários, que consigam dissolver o poder de uma minoria privilegiada em subjugar a maioria excluída. A perspectiva antropológica contribuiu na análise das distintas culturas e modos de adaptação ecológica dos grupos sociais, de seus sistemas produtivos, de sua utilização dos recursos naturais, suas ideologias e reivindicações territoriais, além da interação dinâmica e conflituosa provocada pelo choque entre os modos de adaptação ao ambiente natural e suas relações de poder. A ecologia política constrói seus sujeitos baseada nos conflitos derivados da distribuição desigual e nas estratégias de apropriação dos recursos ecológicos, dos bens naturais e dos serviços ambientais, estabelecendo um espaço de luta pela reapropriação da natureza. Esses conflitos, denominados socioambientais, originam- se de formas diversas, e muitas vezes antagônicas, do significado de natureza. Nesse contexto, as pesquisas em ecologia política poderão tratar de problemas ambientais, territoriais e de saúde com três princípios paradigmáticos centrais: primeiro, as relações sociais, naturais ou socioambientais; segundo, análises contextualistas, que colocam as relações nos marcos históricos e ambientais; e terceiro, a utilização de metodologias processuais, nas quais o paradigma da complexidade não pode ser deixado de lado em uma rede de elementos complexos, como, por exemplo, os conflitos socioambientais. Como conflitos socioambientais, Little (2006) os entende como um conjunto de embates entre os diversos grupos sociais em decorrência de distintas formas de apropriação e interrelacionamento social, cultural e ecológico. Numa perspectiva antropológica, poderiam se incorporar, também, além dos embates políticos e econômicos, elementos cosmológicos, rituais, identitários e morais. Esses distintos grupos sociais estão imersos em desiguais relações de poder, nas quais um segmento dominante compartilha de significados a respeito do território, do espaço e do ambiente, permitindo a consolidação de noções e categorias que legitimam ações sociais e políticas; e silenciam visões e perspectivas concorrenciais dos grupos não hegemônicos (ZHOURI, 2005). Para Bourdieu, essa seria uma expressão do poder simbólico, que se configura como um poder de construção de uma realidade pela classe dominante. Além do poder simbólico, conceitos caros para a sociologia do conflito são as definições de campo e habitus. O campo é o lugar de conflito onde os sujeitos sociais se reconhecem e se identificam; e disputam a legitimidade de certas concepções partindo de um capital. Já o habitus, refere-se a um conjunto de disposições socialmente adquiridas e inscritas na subjetividade dos indivíduos dentro de um campo, por meio de um conhecimento adquirido, visto como princípio gerador e produtor das representações sociais e percebidas como uma estrutura que estabelece redes de ligação entre a exterioridade e interioridade (BOURDIEU, [1989] 2011). Aqui queremos nos referir ao campo ambiental, que se constitui como um espaço de confronto e de oposição de ideias, valores e representações sobre o ambiente; que disputam reconhecimento e legitimidade. Contudo, é relevante mencionar, conforme Zhouri (2001), a não existência de campos isolados, os quais, apesar de possuírem dinâmicas próprias, relacionam-se com as dinâmicas sociais mais amplas. Nesse campo ambiental estudado, inserem-se os grupos sociais, comunidades tradicionais, entidades ambientalistas, políticos, Assembleia Legislativa de Minas Gerais, unidades de conservação, IEF e os conflitos socioambientais. O campo ambiental, ao se constituir e se institucionalizar, na década de 90, sob a égide da globalização econômica, preconizou a consolidação de determinadas categorias, noções e significados. Entre elas, a caracterização do sujeito ecológico, da ecologia política e da democratização dos direitos. Ou seja, o sujeito ecológico da década de 80, visto como um agente político transgressor, crítico do modo de vida industrial e do modelo de desenvolvimento, acabou sendo substituído por um ambientalista técnico, especialista e gestor dos recursos naturais, impregnado de uma visão tecnicista do ambiente e da própria sociedade, capaz de produzir soluções técnicas a partir do conhecimento racional, ou seja, a perfeita encarnação do paradigma da adequação ambiental. Nesse sentido, o movimento da ecologia política é substituído por essa visão tecnicista, com amplo apoio dos tais ambientalistas, dos empresários e até das políticas públicas, ocasionando o surgimento de inúmeros movimentos sociais reivindicatórios por acesso a direitos, tais como, aos recursos naturais, ao espaço e ao território, que recebem um tratamento cada vez mais econômico do que político (ZHOURI, 2005). Sem dúvida, o campo do conflito é bastante diversificado e não se fecha no campo ambiental, mas em todo o espaço de interlocução em busca de direitos democráticos e de cidadania na sociedade; sempre com grande dificuldade na construção do campo democrático, uma vez que vivemos em uma sociedade polarizada entre carências e privilégios, onde o imaginário coletivo nunca foi permeado pela ideia de igualdade e de direitos (TELLES, 2006). Nesse contexto, alguns termos vão se consolidando no campo ambiental, como parceria, participação, negociação e sociedade civil, sem que isso signifique uma democratização da participação, uma vez que os sujeitos sociais chamados à participação são aqueles que possuem uma qualificação legitimada pelo campo (tais como o conhecimento técnico e a capacidade de organização e ação), em detrimento dos não reconhecidamente organizados ou legitimados, que se tornam excluídos políticos, sociais e ambientais (ZHOURI, 2005). Em consequência, há, dentro do campo ambiental, uma visão objetiva que exclui as relações sociais e pretende tratar os conflitos ambientais a partir de uma perspectiva técnica, resultando numa desigual distribuição de acesso a espaço, isto é, a segregação socioespacial e a injustiça ambiental. Os danos e riscos causados pelo desenvolvimento atingem desproporcionalmente agricultores familiares, comunidades tradicionais, quilombolas, índios, negros e trabalhadores, no Brasil e em outros países. Apesar de serem as vítimas do desenvolvimento ou da modernização conservadora, são responsabilizados pela degradação ambiental. Portanto, a luta pelo fim da degradação ambiental traz consigo um projeto de melhoria da qualidade de vida e de desenvolvimento. Esses aspectos conflituosos do campo ambiental, tratado como questão ambiental, “surgem de distintas práticas de apropriação técnica, social e cultural do mundo material” (ZHOURI & LASCHEFSKY, 2010, p. 17). Nesse sentido, questões territoriais e espaciais constituem importante elemento dos conflitos ambientais. Partindo da tipologia dos conflitos, eles podem ser divididos em conflitos ambientais distributivos, espaciais e territoriais; e serão analisados a seguir. 1.2.1 Conflitos ambientais distributivos Os conflitos ambientais distributivos são conflitos que implicam em diversas desigualdades sociais relacionadas ao acesso aos recursos naturais. Essa temática é abordada nas agendas internacionais, tais como o Relatório Brundtland e a Agenda 21, expressando a desigualdade em termos mundiais. Essa questão da crescente polarização entre o norte e o sul, ou de países centrais e periféricos, é considerada um problema fundamental do espaço e tempo mundial, segundo a classificação de Sousa Santos (1995); juntamente com a degradação ambiental, a explosão demográfica e a globalização da economia. Segundo Zhouri e Laschefski (2010), há distintas soluções propostas a partir desses conflitos e, primeiramente, aponta-se a possibilidade de uma mudança tecnológica envolvendo a modernização ecológica, isto é, uma reestruturação da sociedade urbano- industrial em direção à sustentabilidade e à revolução da eficiência, a fim de se poupar recursos naturais e energia, sem, contudo, questionar o modelo capitalista industrial ou o modelo desigual de desenvolvimento. Outra vertente detecta como o sistema capitalista e suas contradições são responsáveis pela desigualdade da distribuição ou pela troca ecológica desigual, considerando pertinente a superação do capitalismo para o sistema ecossocialista. Finalmente, algumas propostas defendem a revolução da suficiência, na qual o conceito de crescimento econômico e consumo ilimitado são revisitados através de um paradigma de qualidade de vida, baseado em estilos solidários, calcados em princípios do bem-viver, ao invés do possuir. Emergem do debate oriundo de conflitos ambientais distributivos os problemas da sociedade moderna e do capitalismo neoliberal globalizado, no qual o modo de vida consumista e individualista é visto como elemento causador da crise ecológica. Mais ainda, esse tipo de conflito aponta para a crise do próprio modelo, já que os países do norte não têm se mostrado dispostos a abandonar seus hábitos poluidores e, muito menos, a contribuir para a mudança de hábitos do sul, agravando ainda mais o equilíbrio ecológico e os conflitos sociais no sul. Outro campo de estudo que se dedica aos conflitos ecológicos distributivos é a ecologia política. A distribuição ecológica é definida por Martínez-Alier (2012, p. 113) como “padrões sociais, espaciais e temporais de acesso aos benefícios obtidos dos recursos naturais e aos serviços proporcionados pelo ambiente como um sistema de suporte da vida. “ Os determinantes da distribuição ecológica são, ao mesmo tempo, naturais (como o clima, os padrões pluviométricos, a topografia, a qualidade do solo, entre outros), sociais, culturais, econômicos, políticos e tecnológicos, constituindo o campo complexo da ecologia política, como mencionado anteriormente (MARTÍNEZ ALIER, 2012).

1.2.2 Conflitos ambientais espaciais Já os conflitos ambientais espaciais, transpassam territórios específicos de grupos sociais, como emissões gasosas, poluição das águas, chuva ácida, acidentes nucleares, efeitos das mudanças climáticas, entre outros exemplos de impactos ambientais que provocaram conflitos em nível internacional. Esses conflitos tiveram grande apelo mundial e contribuíram para a formação dos sujeitos sociais ambientais e movimentos ambientalistas, que, à primeira vista, pareciam ser precursores de uma força transformadora da sociedade urbano-industrial. Embora não exclusivamente ligado aos conflitos espaciais, o movimento pela Justiça Ambiental buscou elaborar agendas comuns, para problemas como o tratamento de esgoto, a poluição industrial, o lixo tóxico, os incineradores e as condições insalubres de trabalho, nas quais os envolvidos sentem-se privados de seus direitos. Como as atividades causadoras de impactos ambientais estão localizadas em áreas ocupadas por populações vulnerabilizadas e marginalizadas da cidadania e por camadas sociais de baixa renda, o movimento tem pautado suas ações na denúncia e na luta pela justiça ambiental e pela igualdade ambiental (ZHOURI& LASCHEFSKI, 2010). O movimento de justiça ambiental se originou na década de 80, nos Estados Unidos, e espalhou-se para muitos países, como África do Sul e Brasil, centrando sua luta contra o racismo ambiental, isto é, analisando e denunciando, inicialmente, a distribuição desproporcional de resíduos tóxicos junto às comunidades latinas, afrodescendentes ou indígenas nos Estados Unidos; e, posteriormente, esse mesmo tipo de problemática junto a atingidos por barragens, lixos tóxicos ou mineração, dentre outros, pelo mundo afora. A justiça ambiental é uma noção que tem proximidade com a sociologia ambiental e com o estudo das relações étnicas, sob a perspectiva ambiental e da saúde, sem discriminar raça, nível de renda, cultura ou classe social (MARTÍNEZ ALIER, 2012). A construção da noção da justiça ambiental no Brasil esteve vinculada ao processo de ressignificação da questão ambiental, na qual a temática do ambiente é apropriada por dinâmicas sociopolíticas envolvidas com a construção da justiça social, atrelada a questões sociais de emprego e renda. Apesar da razão utilitária ter se constituído uma estratégia da modernização ecológica e da ecoeficiência, é na razão cultural que repousa o início da ação contra a distribuição desigual dos benefícios e danos ambientais, que considera comuns as origens da injustiça social e da degradação ambiental. Assim, o movimento pela justiça ambiental defende a demanda de se alterar o modo de distribuição de poder sobre os recursos ambientais e de se impedir que haja transferência dos custos ambientais do desenvolvimento, pelos grupos dominantes, para os mais pobres. Daí a existência de uma desigual exposição aos riscos entre os grupos sociais: os mais ricos conseguiriam deles escapar, enquanto os mais pobres circulariam no interior de um círculo de riscos. Em consequência, a justiça ambiental visa a combater a desigualdade ambiental e a dar proteção aos grupos sociais e étnicos (ASCELRAD, 2010). Podemos também aproximar aqui o caso dos conflitos caracterizados pelo embate das comunidades com as unidades de conservação estudadas nesta pesquisa. Está claro que não podemos igualá-lo aos casos limítrofes a grandes empreendimentos. Contudo, temos também aqui uma luta com a segregação socioterritorial, na qual as elites dominantes determinam áreas ambientais relevantes (para compensar o avanço capitalista e a destruição do ambiente em outros territórios), que são sempre habitadas por populações que não têm voz no sistema capitalista de mercado. Nesse contexto, os atores sociais que se baseiam na noção de justiça ambiental procuram fazer do espaço ambiental uma possibilidade de construção de justiça e não apenas lugar da razão utilitária do mercado. Trata-se, portanto, de um grande desafio para a própria governança ambiental no Brasil, conforme Zhouri (2008), uma vez que há avanços nos arranjos institucionais, normas e leis do país, na esfera das questões ambientais, e atraso para sua implementação, em grande parte pelas políticas de desenvolvimento aplicadas no país, centradas no crescimento econômico. Assim, ocorre a perpetuação da injustiça ambiental, o desrespeito à diversidade cultural e a crise da democracia. 1.2.3 Conflitos ambientais territoriais Os conflitos ambientais territoriais envolvem reivindicações de diversos segmentos sociais que possuem identidades, lógicas culturais e modos de produção em territórios distintos. As formas de apropriação da natureza e seus recortes espaciais estão no cerne do conflito entre esses grupos sociais. Muitos conflitos territoriais estão relacionados com as diferenças existentes entre os grupos hegemônicos da sociedade urbano-industrial e as comunidades tradicionais. Para as comunidades, o território representa um lugar de reprodução de seus modos de vida, com forte identidade com o espaço onde se vive. Em contrapartida, a sociedade de massa é marcada por grande divisão do trabalho e pela individualização dos sujeitos sociais, que são mediados pelo mercado e totalmente distanciados dos territórios físicos. Embora possa haver algum tipo de identidade territorial nos domínios políticos e econômicos, ou socioculturais, a organização e o planejamento territorial são transferidos para o Estado e instâncias públicas (ZHOURI, 2010). A globalização econômica confere força ao setor empresarial, que cria suas próprias espacialidades e territorialidades dentro do país e transforma os espaços em unidades de produção privada reduzidas a mercadoria. Há, nesse contexto, a aliança do Estado com os segmentos do capital, contra as territorialidades de grupos sociais, tais como: comunidades tradicionais, indígenas e quilombolas, que se encontram em uma disputa desigual de força política pela posse do território (ZHOURI, 2010). Em decorrência dessa disputa territorial, surgem os conflitos ambientais territoriais. De um lado, grupos hegemônicos representantes do modelo de desenvolvimento capitalista e, do outro, grupos cujos territórios estão vinculados ao processo de socialização e aos princípios de reciprocidade e de coletividade; para os quais sua desterritorialização acarretaria grandes impactos culturais e simbólicos. Inserido nesse debate, também está o questionamento ao modelo de desenvolvimento hegemônico, que estimula a produção de conhecimento acadêmico, ao mesmo tempo em que dificulta a solução dos conflitos, já que estamos tratando de distintas formas de pensamento, cuja voz decisória está com os cientistas, empresários e técnicos que operam o sistema capitalista. Nessa perspectiva de conflito, a solução é inexoravelmente complexa e difícil, uma vez que os grupos antagônicos possuem distintas racionalidades ou perspectivas mitológicas, como abordado anteriormente, dificultando o diálogo e a solução do conflito anunciado. Nessa polarização de visões de mundo, aos grupos afetados raramente é dada a chance de decidir, enquanto as verdades dos grupos hegemônicos urbanos são consideradas universais. Os conflitos em torno das unidades de conservação se encaixam nessa tipologia, tal como no Parque Estadual da Serra do Papagaio, estudado nesta tese. Há a desterritorialização da comunidade tradicional caipira e a tentativa de substituição de suas práticas econômicas tradicionais por outras, consideradas pelos técnicos como menos impactantes ao ambiente e às características ecológicas da região. Isso leva à tentativa de substituir o modo de vida tradicional por um outro, pautado em práticas gestadas pelos valores da sociedade urbano-industrial. Poderíamos também apontar, conforme Bourdieu (2011), essas práticas como instrumentos estruturados e estruturantes de comunicação e conhecimento, que constituem-se em sistemas simbólicos que cumprem a função política de legitimação da dominação de um grupo sobre outro, isto é, a violência simbólica. Assim, a comunidade tradicional caipira é pressionada a abandonar seus sistemas simbólicos e suas práticas culturais, para adotar uma outra, a que é hegemônica e defendida pelo sistema capitalista. Inserem-se nesse conflito outros grupos de pressão que também reivindicam o território, tais como grupos religiosos do Santo Daime, ambientalistas, empresários e grupos políticos regionais. Os grupos políticos anseiam por maior participação nas decisões da unidade e que o PESP consiga ser um vetor de desenvolvimento do turismo regional, uma vez que parte de seus territórios são convertidos à gerência estadual e estão sob a soberania do seu gestor. Os empresários do ramo imobiliário almejam chacrear e vender terras no entorno; pressionando para que suas terras sejam retiradas do traçado antigo, para que possam fazê-lo. Os grupos religiosos anseiam poder utilizar o território para suas práticas culturais e ritualísticas. Além de grupos do Santo Daime, a igreja católica realiza missas rurais em áreas que hoje estão dentro do traçado. Há também grupos esotéricos e xamânicos, que realizam travessias pela área. Já os ambientalistas, pretendem acabar com algumas das atividades econômicas instaladas, como os trutários e a pecuária leiteira, transformando a unidade em algo que possa lembrar o mítico, e já mencionado, “Paraíso na Terra”. Essas múltiplas práticas simbólicas se chocam com os interesses hegemônicos do Estado, gestor do parque e da ideologia dominante conservacionista. Mesmo com a legislação, que prevê conselhos participativos e consultivos nas unidades de conservação, além da audiência pública para a criação das mesmas, o que percebemos é a dificuldade em inserir a participação nesse modelo imposto. Ela não funciona. Apesar de haver audiências públicas e reuniões dos conselhos, esses espaços aparecem para constar na legislação e se anunciar que houve participação. Nesse contexto, apesar dos poucos incluídos no processo terem espaço para se manifestar, suas reivindicações não são levadas em consideração. Se, de fato, essa fosse a realidade, os conflitos desapareceriam, o que não ocorre. No Conselho Consultivo do Parque do Papagaio, sempre que havia um embate, a então gestora lembrava aos conselheiros do caráter consultivo do CONPESP. As diversas audiências públicas de que participei para a nova delimitação também não conseguiram resolver os conflitos. Ou seja, é inegável afirmar que, nas mais variadas esferas, existe grande incapacidade em lidar com eles e estabelecer um espaço realmente democrático nos diversos âmbitos da sociedade brasileira. A região do Parque Estadual da Serra do Papagaio representa apenas um dos pontos de conflito. Essa realidade se reproduz em muitas outras regiões no Brasil e no mundo. Assim, partindo dessa etnografia do conflito do PESP, podemos analisar questões que se espalham pelo mundo, que, apesar de possuir particularidades e distintos atores, sempre esbarram num aspecto em comum, as questões de poder. Trata-se do poder de grupos dominantes face a grupos com menores articulações econômicas e políticas, que não conseguem se fazer ouvir em um contexto autoritário e nem fazer valer seus direitos sobre o território, os recursos naturais e, acima de tudo, sobre suas vidas. Além disso, há dificuldade em se instalar práticas verdadeiramente democráticas, isto é, instâncias que respeitem o cidadão e que promovam um diálogo efetivo, a partir do qual realmente implementem-se mudanças, caminhando para mais além da prática desgastada de fazer reuniões para constar em atas e registros de que o tal processo teria sido participativo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS A região do entorno do Parque Estadual da Serra do Papagaio tem vivenciado distintos conflitos decorrentes da criação de unidades de conservação e da atitude autoritária dos órgãos públicos e da legislação ambiental. Mesmo os projetos que se diziam participativos e pretendiam mitiga-los acabaram por acarretar novos problemas e desentendimentos dos atores sociais. Está claro que a tentativa de construção participação social, imersa em uma realidade autoritária e de autarquias autoritária, tem pouca chance de sucesso, uma vez que mesmo com a égide de participação, acabam por privilegiar grupos específicos, ao invés de promover a democracia e a justiça ambiental e social. Além disso, o campo do conflito é bastante diversificado e permeia todo espaço de interlocução em busca de direitos democráticos e cidadania na sociedade. Sempre com grande dificuldade na construção democrática, uma vez que vivemos em uma sociedade polarizada entre carências e privilégios e aonde o imaginário coletivo nunca foi permeado pela ideia de igualdade e de direitos. Nesse sentido, os esforços para promoção de participação social, democracia e cidadania tem que ser ainda maiores e devem vir acompanhados pelo diálogo e pela tentativa de reorganização institucional e maior força política da sociedade civil, procurando transformar essa cultura autoritária que permeia nossa sociedade.

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