4 Dieta, Aspectos Reprodutivos E Crescimento De Doryteuthis Plei
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69 4 DIETA, ASPECTOS REPRODUTIVOS E CRESCIMENTO DE DORYTEUTHIS PLEI 4.1 Introdução Doryteuthis plei é uma lula costeira de nadadeiras longas, sendo a espécie dominante de cefalópode na plataforma continental sudeste–sul brasileira, responsável pelos maiores desembarques na região (22°-28°S) (PEREZ et al., 2005; RODRIGUES & GASALLA, 2008). Ela é uma espécie-chave nas teias tróficas do sudeste brasileiro, possuindo grande importância ecológica na região (GASALLA et al., 2010). JACKSON (2004) inclui D.plei dentro dos loliginídeos tropicais com curto ciclo de vida (menor que 200 dias), possuindo um rápido turn over populacional e com um único evento reprodutivo, porém estudos do sudeste-sul do Brasil apontam que a espécie vive mais, atingindo a maturidade com 200 dias e vivendo até 350 dias (PEREZ et al., 2006). Indivíduos de D.plei com estágios avançados de maturação são comumente encontrados em capturas comerciais durante o ano todo, sugerindo que o nascimento e a desova ocorrem durante todo o período, apesar de um maior evento reprodutivo ocorrer nos meses de verão na plataforma continental interna (20-40 metros de profundidade) e em águas rasas próximas de ilhas costeiras (MARTINS & PEREZ, 2007; PEREZ et al., 2001; RODRIGUES & GASALLA, 2008). Porém locais precisos de desova continuam desconhecidos no país (MARTINS et al., 2014). A plasticidade de padrões de história de vida, as variabilidades espaciais e temporais no crescimento, e nas condições de sobrevivência (alimentação e predação) no sudeste–sul brasileiro, associada à alta mobilidade de D.plei, contribuem para uma diversidade de ciclos de vida na região (ARKHIPKIN et al., 2015). Do ponto de vista trófico, as lulas precisam se alimentar vorazmente para manter seu rápido crescimento, suas altas taxas metabólicas e de maturidade (BOYLE & RODHOUSE, 2005). São predadoras oportunistas e versáteis se alimentando de uma grande diversidade de presas (RODHOUSE & NIGMATULLIN, 1996), sendo que lulas costeiras primeiramente se alimentam de peixes, em especial os demersais, e invertebrados como crustáceos e lulas (COLL et al., 2013). 70 Apesar da importância ecológica, estudos tróficos com cefalópodes, e lulas em particular, são escassos (NAVARRO et al., 2013). Para dieta de Doryteuthis plei, ao longo da costa brasileira não é diferente. A primeira descrição de sua alimentação foi de JUÁNICO (1979). Alguns estudos dos hábitos alimentares de D.plei ocorreram em Santa Catarina (MARTINS et al., 2006; MARTINS & PEREZ, 2007) e em São Paulo (RODRIGUES, 2007), ambos baseados em análise do conteúdo estomacal. Com dados de assinatura de isótopos estáveis, dois trabalhos foram realizados (CORBISIER et al., 2006; GASALLA et al., 2010). Estes estudos indicaram que D.plei é principalmente piscívora e provavelmente oportunista, com mudanças sazonais e ontogenéticas na dieta. Sobre os aspectos reprodutivos, as lulas são moluscos únicos, que possuem um alto nível de especialização reprodutiva. Podemos citar algumas características, como um elaborado comportamento de acasalamento, elaborados espermatóforos, e diversas estratégias de desova (ARNOLD & WILLIANS-ARNOLD,1977). As atuais definições das diferentes estratégias reprodutivas em cefalópodes, em geral são confusas. Além disto, o processo de maturação dos ovócitos no ovário é praticamente desconhecido para várias espécies de cefalópodes, o que dificulta as classificações (ROCHA et al., 2001). Entender a maturação sexual das lulas é de extrema importância para reconhecer populações desovantes e identificar os fatores que afetam a maturidade (SAUER & LIPINSKI,1990), sendo que o estudo reprodutivo das fêmeas possui maior relevância, pois elas que “carregam” a próxima geração. Segundo HOVING et al. (2014), a maturação sexual das fêmeas ocorre em três níveis, e acaba gerando três tipos de abordagem dos estudos: ovogênese (crescimento individual do ovócito), acessado através de estudos histológicos; o desenvolvimento gonadal, em especial em tamanho, analisado através de índices de maturidade e gonadossomáticos; e o último é a maturação fisiológica do sistema reprodutivo como um todo, estudada por escalas macroscópicas de maturidade. Estudos sobre a atividade reprodutiva de D.plei no Brasil descreveram padrões espaciais e temporais de maturidade utilizando índices gonadossomáticos (MORAES, 2013; PEREZ et al., 2002; RODRIGUES & GASALLA, 2008;). Mais recentemente, modelos aditivos generalizados (GAM’s), baseados em peso da gônada foram utilizados para entender a atividade reprodutiva da espécie (POSTUMA & GASALLA, 2014). Porém, não foi encontrado nenhum trabalho que 71 mostre a evolução do ovócito (ovogênese) para a espécie. O crescimento é definido como o ganho em tamanho de um organismo, resultado de uma série de processos fisiológicos (FORSYTHE & VANHEUKELEM, 1987; HUGUES, 1998). O crescimento individual, ocasionado pelo aumento do comprimento ou da biomassa é uma importante ferramenta ecológica, indicadora da disponibilidade de recursos do ambiente e das condições do indivíduo (MOLTSCHANIWSKYJ, 2004). O fato dos estoques de lulas estarem sob maior pressão, indica a urgência de se entender o modelo de crescimento destes organismos para fins de manejo (JACKSON et al., 2000). O crescimento dos cefalópodes é não-assintótico, onde se diferenciam duas fases, a primeira onde o crescimento ocorre de forma exponencial, que dura uma porção significativa do ciclo de vida, e a segunda descrita por uma função potencial que apresenta uma desaceleração do crescimento até o fim do ciclo de vida (FORSYTHE & VANHEUKELEN, 1987). Autores que estudaram o crescimento da subordem Myopsina, que inclui a família Loliginidae, capturada sobre a plataforma continental em águas tropicais e subtropicais, demonstraram que a maioria das espécies apresenta o mesmo tipo de modelo de crescimento (PECL, 2004a). As técnicas que permitem a determinação da idade em cefalópodes têm evoluído em duas direções principais nas ultimas décadas. Uma delas é o confinamento, onde os indivíduos são acompanhados através de todo seu ciclo de vida (JACKSON, 2004), e a outra é através da interpretação de marcas de crescimento em estruturas rígidas como o estatólito (JACKSON, 1994a; JACKSON et al., 1997; JACKSON, 2004) e o gladius (PEREZ et al., 1996; PEREZ et al., 2006), nas quais os incrementos contados determinam a idade e o crescimento individual (JACKSON, 2004). O gladius (pena) é a “concha interna” das lulas, composta de polissacarídeos de quitina associados com proteínas (HUNT & NIXON, 1981), sendo formada por três camadas: ostracum, hipostracum e periostracum (BIZIKOV, 1991; BIZIKOV, 1995; PEREZ et al., 1996). O crescimento longitudinal do ostracum, a camada predominante, ocorre a partir das nadadeiras em direção à cabeça. Assim, os incrementos observados nas porções mais próximas à borda anterior do gladius (cabeça) são aqueles depositados mais recentemente (BIZIKOV,1991). A compreensão do ciclo de vida das lulas, a estrutura e a diversidade populacional da espécie, os parâmetros de crescimento e a ação das variáveis 72 ambientais sobre o crescimento podem ser elucidadas através da interpretação de dados de idade e crescimento diário. Porém, devido às dificuldades metodológicas, poucos estudos de crescimento de D.plei foram realizados, utilizando tanto estatólitos (AGUIAR, 2002; AGUIAR et al., 2012; PEREZ et al., 2006), quanto os gladii (JACKSON & FORSYTHE, 2002; PEREZ et al., 2006). Este capítulo se propõe a aprofundar o conhecimento sobre Doryteuthis plei na Baía de Guanabara, discutindo sua relação trófica e o seu desenvolvimento reprodutivo e somático (crescimento), visto que nenhum destes aspectos foram estudados de forma mais detalhada para a espécie na costa do Rio de Janeiro. 4.2 Objetivos específicos . Analisar a composição da dieta da lula D. plei, verificando se existe variação sexual e de tamanho na dieta. Realizar o estudo histológico das gônadas de fêmeas de D. plei, caracterizando o desenvolvimento gonadal microscópico, para validar as escalas macroscópicas de maturidade e procurar estabelecer o CM50 (comprimento do manto em que 50 % da população está sexualmente matura). Determinar o crescimento individual através da análise do gladius (pena) de D.plei. 4.3 Hipóteses específicas A dieta de D.plei variará de acordo com o tamanho do indivíduo, da mesma forma que é retratado na literatura para lulas em geral. Grande parte da população de D. plei deve apresentar gônadas em estágio inicial de maturação, devido ao papel de berçário de ambientes estuarinos como a Baía de Guanabara. O crescimento de D.plei apresentará características compatíveis com outros loliginídeos que habitam águas tropicais. 73 4.4 Material e métodos 4.4.1 Coleta do material Os indivíduos de Doryteuthis plei analisados neste capítulo foram coletados durante as campanhas descritas no item 3.4.1. 4.4.2 Processamento das amostras 4.4.2.1 Alimentação Após a dissecação e processamento dos indivíduos de D.plei (vide item 3.4.2), os estômagos foram retirados, identificados e conservados em formol 10% até o momento da análise. O grau de repleção estomacal (GR), foi inferido em uma escala de 6 estágios (0= vazio, 1= 25% cheio, 2= 50% cheio, 3= 75% cheio, 4= 100% cheio, 5=distendido), segundo metodologia proposta por PIERCE et al.(1994b). Os estômagos foram pesados em balança de precisão (Shimadzu-AY220) com e sem conteúdo e, através da diferença entre as duas pesagens, foi obtido o peso do conteúdo estomacal (PC). O conteúdo (Fig.6) foi retirado e analisado sob microscópio estereoscópico para identificação das presas,