Acompanhamento De Saúde Da Criança: Concepções Das Famílias Do Município De Cambira, Paraná
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ACOMPANHAMENTO DE SAÚDE DA CRIANÇA: CONCEPÇÕES DAS FAMÍLIAS DO MUNICÍPIO DE CAMBIRA, PARANÁ Simone Gestal de Castilho * Luciana Olga Bercini ** RESUMO O presente trabalho trata de um estudo qualitativo desenvolvido com o objetivo de identificar as concepções das famílias pertencentes à área de atuação da Equipe Amarela do Programa Saúde da Família, do município de Cambira, PR, sobre o acompanhamento de saúde da criança no primeiro ano de vida. Para tanto, foram realizadas entrevistas semidiretivas, seguindo um roteiro básico, com 19 famílias integrantes da área de abrangência dessa equipe. As entrevistas foram gravadas, e posteriormente transcritas e submetidas à análise temática. A análise dos depoimentos apresentados pelas mães possibilitou a identificação de temas e revelou que a partir de suas vivências, o grupo investigado percebe e valoriza a importância do acompanhamento de saúde da criança, mesmo que seja de forma simplificada, como fazendo parte do conjunto de cuidados que a criança necessita no primeiro ano de vida. Palavras-chave: Saúde da família. Saúde infantil. Cuidado da criança. INTRODUÇÃO sua estreita dependência de fatores ambientais, A infância é uma das fases da vida em que tais como alimentação, ocorrência de doenças, ocorrem as maiores modificações físicas e cuidados gerais e de higiene, condições de psicológicas. Essas mudanças caracterizam o habitação, saneamento básico e acesso aos crescimento e o desenvolvimento infantil. O serviços de saúde, refletindo, assim, as acompanhamento do crescimento e do condições de vida das crianças no passado e no desenvolvimento visa à promoção e à presente. Nesse contexto, o crescimento e o manutenção da saúde, bem como à atuação desenvolvimento são eixos referenciais para sobre fatores capazes de comprometer a saúde todas as atividades de atenção à criança sob os da criança (PAIXÃO, 2003). aspectos biológicos, afetivos, psíquicos e O desenvolvimento pode ser definido sociais (BRASIL, 2002). como “o aumento da capacidade do indivíduo A promoção da saúde infantil compreende na realização de funções cada vez mais todas as ações diretas e indiretas que complexas” (BRASIL, 2002, p. 75). Cada ser favorecem a criança a atingir seu potencial de humano se desenvolve a partir de suas crescimento e desenvolvimento. No que diz possibilidades e do meio em que está inserido. respeito às ações diretas, destaca-se o A criança deve sempre ser vista como um todo acompanhamento do crescimento e e em relação com seu ambiente e família desenvolvimento, contemplando a avaliação (BRASIL, 2002). desse processo e a educação em saúde, a qual De modo geral, considera-se o crescimento consiste em atuar junto aos pais e cuidadores como o aumento do tamanho corporal. Pode-se infantis, bem como junto às próprias crianças, dizer, também, que o crescimento do ser mantendo ou promovendo a aquisição de humano é um processo dinâmico e contínuo competências para atender às necessidades da que ocorre desde a concepção até o final da criança (VERÍSSIMO, 2001). vida, considerando-se os fenômenos de Essas ações de promoção da saúde infantil substituição e regeneração de tecidos e órgãos. estão embasadas no conceito de puericultura. É considerado como um dos melhores Segundo Paixão (2004), a puericultura teve indicadores de saúde da criança, em razão de origem na França, no final do século XVIII, e * Enfermeira da Secretaria de Saúde de Cambira – PR. Especialista em Saúde da Família. ** Professora Doutora do Departamento de Enfermagem, UEM Ciência, Cuidado e Saúde Maringá, v. 4, n. 2, p. 129-138, maio/ago. 2005 130 CASTILHO, S.G.; BERCINI, L.O. era definida como um conjunto de regras e desses gastos para melhor utilização dos noções acerca da arte de criar fisiológica e recursos com assistência às patologias mais higienicamente as crianças. Atualmente, a graves (BRASIL, 2003). essência continua a mesma e, com base nessas Diante dessa situação, a adoção de premissas, têm-se estabelecido os programas estratégias que levem a um maior acesso aos de assistência à criança, os quais consistem: cuidados básicos de saúde pode ser apontada como alternativa para a reversão dessse no acompanhamento do crescimento e quadro. Essas estratégias incluem, desenvolvimento da criança em seus primeiros anos de vida, embasando-se em prioritariamente, a focalização da atenção nas um corpo conceitual traduzido por populações de maior risco e a revitalização do normas e regras a serem preceituadas às nível primário de atenção, tornando-o mais mães.Trata-se de uma assistência resolutivo e capaz de prestar atendimento de individualizada, cuja prioridade é o bem qualidade às patologias de maior prevalência estar da criança em função das condições de vida de sua família e sociedade onde na população infantil (BRASIL, 2000). está inserida (PAIXÃO, 2004, p. 1). Ações concretas têm sido encaminhadas pelo Ministério da Saúde como, por exemplo, a De acordo com Blank (2003, p.14), o incorporação na política de saúde dos governos acompanhamento profissional da saúde da federal, estaduais e municipais, do Programa criança, definido como puericultura, pode ser de Saúde da Família (PSF) e do Programa de entendido como uma “ciência que reúne todas Agentes Comunitários de Saúde (PACS), as noções (psicologia, higiene, sociologia) como mecanismos de reorientação do modelo suscetíveis de favorecer o desenvolvimento assistencial a partir da atenção básica físico e psíquico das crianças desde o período (BRASIL, 2000). da gestação até a puberdade”. O PSF foi concebido pelo Ministério da O Ministério da Saúde vem intensificando Saúde, no ano de 1994, e de acordo com sua atenção na promoção da saúde da Chiesa; Fracolli; Sousa (2002, p. 53), sua população menor de cinco anos, criando implantação teve o objetivo de proceder programas que desenvolvam atividades de à reorganização da prática assistencial em prevenção e tratamento das patologias mais novas bases e critérios, em substituição freqüentes nesse grupo etário. O Programa de ao modelo tradicional de assistência, Assistência Integral à Saúde da Criança orientado para a cura de doenças e (PAISC), criado em 1984, instituiu a promoção centrado no hospital. No PSF a atenção do aleitamento materno e orientação alimentar está centrada na família, entendida e percebida a partir do seu ambiente físico para o desmame; assistência e controle das e social, o que vem possibilitando às infecções respiratórias agudas; imunização; equipes, uma compreensão ampla do controle das doenças diarréicas e processo saúde-doença e a necessidade de acompanhamento e desenvolvimento da intervenções que vão além das práticas criança (BRASIL, 1984). curativas. Apesar dos avanços conseguidos, o atual Partindo da premissa de que as Equipes de perfil da saúde infantil no Brasil representa, Saúde da Família (ESF) devem oferecer o ainda, um grande desafio para o Sistema Único cuidado integral e contínuo a todos os de Saúde (SUS). No ano de 1997, foram membros das famílias da população adscrita hospitalizadas pelo SUS mais de 1.600.000 em cada uma das fases de seu ciclo de vida, crianças menores de cinco anos, com um custo faz-se necessário a sistematização do processo de mais de 400 milhões de reais. Destaca-se o de educação permanente, na qual não se aceita fato de que cerca de 60% das causas que uma atuação restrita aos problemas de saúde levaram essas crianças à hospitalização foram biologicamente estabelecidos, mas sim o decorrentes de problemas respiratórios e de compromisso de realizar ações ainda enquanto doenças infecciosas e parasitárias. Internações os indivíduos estiverem saudáveis (BRASIL, estas passíveis de serem reduzidas por meio de 2000). medidas de prevenção e assistência em nível A atenção à saúde da criança sob a primário, visando contribuir com a diminuição estratégia do PSF parte da concepção de uma Ciência, Cuidado e Saúde Maringá, v. 4, n. 2, p. 129-138, maio/ago. 2005 Acompanhamento de saúde da criança 131 visão integral sobre o desenvolvimento Martin e Angelo (1998), por exemplo, em humano, apontando para um conjunto de ações pesquisa desenvolvida com famílias de e intervenções direcionadas não só à criança, crianças atendidas em um centro comunitário mas aos seus responsáveis e a todo o seu meio do município de São Paulo com o objetivo de (BRASIL, 2000). compreender valores, crenças e práticas em Para isso, de acordo com o Ministério da relação à saúde, concluíram que esse estudo Saúde (BRASIL, 2000, p. 21), a equipe de revelou não apenas características relativas a saúde deve incorporar as seguintes premissas conhecimentos, valores e comportamentos básicas ao atendimento da criança: culturalmente relevantes para a família no que Os conceitos de crescimento e tange ao conceito de saúde, mas também desenvolvimento vistos de forma integral possibilitou a compreensão de aspectos da e pluridimensional, envolvendo os fatores organização familiar tidos como significativos biológicos, psicológicos e sociais; no cuidado à saúde de seus membros e o papel A interação existente entre os aspectos central desempenhado pela mãe nesse cuidado. psicológicos, sociais e a nutrição, com Além disso, a pesquisa permitiu também que vistas ao desenvolvimento saudável da as autoras percebessem o quanto as definições criança; dos profissionais de saúde estão incompletas se A participação ativa da criança na não procurarem alcançar o que as famílias tem construção de suas características e de a dizer sobre saúde. sua personalidade, interagindo, Oliveira e Alvarenga (1993), em estudo permanentemente, com o meio em que vive, cujo desenvolvimento pode ser realizado na grande São Paulo com mães considerado ideal, quando está em usuárias de serviços públicos de saúde a cerca equilíbrio com o seu meio, seus das representações sociais sobre o processo de costumes, seus valores e seus crescimento e desenvolvimento infantil, conhecimentos; verificaram que, para essas mães, esse Não perder de vista os diversos setores processo é também entendido e representado que interagem com a criança: saúde, como um campo de domínio próprio, no qual educação, agricultura, recreação, esporte, cultura e outros. as mães se vêem como sujeitos, indicando, portanto, que seu conhecimento deve ser No entanto, para que, de fato, ocorra a reconhecido.