UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE CIÊNCIAS EXATAS E NATURAIS DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA CIÊNCIAS BIOLÓGICAS BACHARELADO

ICTIODIVERSIDADE EM TRIBUTÁRIOS DOS RIOS CORRENTES, PIQUIRI E SÃO LOURENÇO NA BACIA DO ALTO PARAGUAI, MATO GROSSO

Alecsandra Pazza Martarello

Rondonópolis, MT 2020

ICTIODIVERSIDADE EM TRIBUTÁRIOS DOS RIOS CORRENTES, PIQUIRI E SÃO LOURENÇO NA BACIA DO ALTO PARAGUAI, MATO GROSSO

Alecsandra Pazza Martarello

Monografia apresentada à Universidade Federal de Mato Grosso como parte dos requisitos do Curso de Graduação em Biologia para obtenção do título de Bacharel em Biologia.

Orientador: Profª. Dra. Simoni Maria Loverde Oliveira

Rondonópolis, Mato Grosso – Brasil 2020

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE CIÊNCIAS EXATAS E NATUNAIS DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA CIÊNCIAS BIOLÓGICAS BACHARELADO

A comissão examinadora abaixo assinada aprova o trabalho de curso

ICTIODIVERSIDADE EM TRIBUTÁRIOS DOS RIOS CORRENTES, PIQUIRI E SÃO LOURENÇO NA BACIA DO ALTO PARAGUAI, MATO GROSSO

Trabalho de conclusão de curso elaborado por Alecsandra Pazza Martarello como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Biologia

Comissão Examinadora

______Prof. Drª. Simoni Maria Loverde Oliveira UFMT – Universidade Federal de Mato Grosso

______Dr. Hugmar Pains da Silva UFMT - Universidade Federal de Mato Grosso

______Prof. Dr. Ricardo Alexandre Kawashita Ribeiro UFMT – Universidade Federal de Mato Grosso

______Prof. Drª. Gisele Catian UFMT – Universidade Federal de Mato Grosso

Rondonópolis, 18 de fevereiro de 2020.

AGRADECIMENTOS

Primeiramente agradeço a Deus por todas as coisas. Deus é bom o tempo todo! Agradeço por todas as oportunidades que tive na UFMT e por tudo que me foi proporcionado tanto pelos meus professores como por colaborares do Departamento de Biologia do campus de Rondonópolis, em especial a Secretaria Simone que sempre fez e faz de tudo para ajudar a todos. Ao CNPq pela bolsa de iniciação cientifica e espero que no futuro alguém possa ter essa oportunidade de ter uma jornada parecida a minha. A Agência Nacional de Águas e Embrapa pelo apoio financeiro, sem isso este trabalho não poderia ser realizado. Agradeço a família Loverde, minha querida orientadora Profª Simoni Loverde Oliveira por ter aceitado me orientar e me iniciar na vida cientifica, obrigada por esses quatro anos de companheirismo e paciência, agradeço ao seu marido Valdeci Antônio de Oliveira por ajudar nas coletas e descrição das espécies aqui contidas e ao seu filho Rafael Loverde pela amizade e por me ajudar com os dados dos mapas temáticos. Agradeço a minha família, minha mãe Vanderlene Pazza e meu pai Vitor Martarello, por nunca deixar com que eu desista e me sustentado até aqui. Agradeço ao meu irmão João Vitor, minha cunhada Paula Fernanda e meu sobrinho Luís Gustavo que mesmo com todos obstáculos sempre acreditaram no meu potencial e me apoiaram. Obrigada! Agradeço a Danielly Machado & Emanuelle Machado que graças a vocês duas consegui me matricular na UFMT. Sou eternamente grata a vocês! Ao Santana pela ajuda nas coletas, amizade e companheirismo. Agradeço as minhas colegas e principalmente amigas do LAHEA, Viviane Marques, Renata Felício e Kathrynn Mendonça e Shayanna por me ajudar, apoiar e incentivar sempre, gradeço por todo companheirismo. Aos amigos que a faculdade me deu Adriano, Marcos e Thi, Brendda, Indianara e a Claudia Coutinho e por todos esses anos de amizade e companheirismo, por me aguentarem nos bons e maus dias, meus sinceros obrigado! Aos amigos in memoriam Caio Patrick, Leandro Silveira e Henrique Rosa. Agradeço a família Pazza, que não estiveram presentes fisicamente, mas sempre presentes de coração.

Obrigada!

EPÍGRAFE

"Un peu de science éloigne de Dieu, beaucoup de science y ramène." Louis Pasteur Tradução: "Um pouco de ciência nos afasta de Deus. Muita, nos aproxima Dele." Louis Pasteur

ICTIODIVERSIDADE EM TRIBUTÁRIOS DOS RIOS CORRENTES, PIQUIRI E SÃO LOURENÇO NA BACIA DO ALTO PARAGUAI, MATO GROSSO

RESUMO O conhecimento dos parâmetros ecológicos básicos da ictiofauna é fundamental para o manejo adequado das populações de peixes. Assim, o estudo teve como objetivo caracterizar a distribuição espacial das assembleias de peixes em sub-bacias do entorno do Pantanal através do levantamento da composição e da variação espacial da riqueza, abundância e diversidade dos peixes nas sub-bacias dos rios Correntes, Piquiri e São Lourenço, pertencentes a Bacia do alto rio Paraguai. Foram delimitados sete pontos amostrais localizados na interfase do planalto com a planície do Pantanal Norte nos estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, Brasil. As coletas ocorreram de novembro de 2017 a março de 2018 de forma padronizada utilizando-se diferentes aparelhos de pesca (redes de espera, espinhéis e anzóis). No total foram capturados 329 indivíduos de peixes divididos em quatro ordens (, Siluriformes, Cichliformes e Gymnotiformes), 14 famílias, compostas por 43 espécies. Houve maior representatividade dos Characiformes seguidos por Siluriformes. As famílias mais ricas em espécies foram com sete espécies, Characinae, Loricariidae e Heptapteridae com cinco espécies cada, seguidas por menores contribuições das demais. O rio Piquiri teve a maior riqueza (25 spp.) e diversidade especifica (2,80), porém menor abundância (77 ind.), enquanto o rio Comprido apresentou a menor riqueza (10 spp.) e maior abundância de indivíduos (116 ind). A menor diversidade e equitabilidade ocorreram no rio Anhumas (0,8953 e 0,6458, respectivamente) e a distribuição mais uniforme foi registrada no rio Correntes (0,8787). No inventario foi registrado uma espécie exótica (Oreochromis niloticus - Tilápia), uma listada entre as espécies quase ameaçadas de extinção (Piaractus mesopotamicus) e uma espécie ainda não descrita do gênero Serrasalmus sp. Foram registradas no rio Piquiri seis espécies de interesse comercial (espécies-alvo), distribuídas em duas ordens e cinco famílias, com maior abundância de borellii (piau-três- pintas). A ictiodiversidade esteve composta por espécies comuns na região neotropical e houve ampla variação espacial dos parâmetros analisados na comunidade, cuja ocorrência de um novo registro de espécie para a região e o aparecimento de espécie exótica reforça a necessidade de levantamentos contínuos nos rios que drenam o planalto adjacente ao Pantanal Norte.

Palavras-Chave: ictiofauna; peixes; áreas úmidas.

Abstract Knowledge of the basic ecological parameters of ichthyofauna is essential for the proper management of fish populations. Thus, the study aimed to characterize the spatial distribution of fish assemblages in sub-basins surrounding the Pantanal by surveying the composition and spatial variation of the richness, abundance and diversity of fish in the sub- basins of the Correntes, Piquiri and São Lourenço, belonging to the Upper Paraguay River Basin. Seven sampling points located at the plateau interface with the Pantanal Norte plain in the states of Mato Grosso and Mato Grosso do Sul, Brazil were delimited. The collections took place from November 2017 to March 2018 in a standardized way using different fishing devices (waiting nets, longlines and hooks). In total, 329 fish individuals were captured, divided into four orders (Characiformes, Siluriformes, Cichliformes and Gymnotiformes), 14 families, composed of 43 species. There was a greater representation of Characiformes followed by Siluriformes. The species richest families were Anostomidae with seven species, Characinae, Loricariidae and Heptapteridae with five species each, followed by smaller contributions from the others. The Piquiri River had the highest wealth (25 spp.) And specific diversity (2.80), but the lowest abundance (77 ind.), While the Comprido River had the lowest wealth (10 spp.) But the highest abundance of individuals (116 ind). The lowest diversity and evenness occurred in the Anhumas river (0.8953 and 0.6458, respectively) and the most uniform distribution was recorded in the Correntes river (0.8787). An exotic species (Oreochromis niloticus - Tilápia) was registered in the inventory, one listed among the species almost threatened with extinction (Piaractus mesopotamicus) and a species not yet described in the Serrasalmus sp. Six species of commercial interest (target species) were registered in the Piquiri River, distributed in two orders and five families, with greater abundance of Schizodon borellii (Piau-três-pintas) Ichiodiversity was composed of common species in the neotropical region and there was wide spatial variation in the parameters analyzed in the community, whose occurrence of a new species record for the region and the appearance of exotic species reinforces the need for continuous surveys in the rivers that drain the plateau. adjacent to the North Pantanal.

Key words: ichthyofauna; fish; humid areas.

LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Relação das bacias hidrográficas dos pontos de amostragem e suas respectivas coordenadas geográficas, municípios nos estados de mato grosso e mato grosso do sul, brasil...... 15 tabela 2. Lista taxonômica, nome popular e local de ocorrência dos peixes nos pontos de amostragem nos tributários dos rios correntes, piquiri e são lourenço, entorno do pantanal norte, no período de novembro de 2017 a março de 2018. Sendo, piqu: piquiri; comp: comprido; corr: correntes; ibo: ibo; prat: prata; anhu: anhumas; e pp: ponte de pedras. ... 20 tabela 3. Lista taxonômica de espécies-alvo no rio piquiri, no período de novembro de 2017 a março 2018...... 22 tabela 4. Índices de riqueza, abundância, diversidade de shannon-wiener (h’) e equitabilidade (j), por ponto de coleta nos tributários do rio correntes, piquiri e são lourenço entorno do pantanal norte, no período de novembro de 2017 a março de 2018. Sendo, piqu: piquiri; comp: comprido; corr: correntes; ibo: ibo; prat: prata; anhu: anhumas; e pp: ponte de pedras ...... 27

LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Mapa de localização dos sete pontos de coleta (rios piquiri, comprido, correntes, ibo, prata, anhumas e ponte de pedra) na bacia hidrográfica do alto rio paraguai, responsável técnico gustavo b. Medeiros (2019), laboratório de análises hídricas e ecologia aplicada (lahea)...... 15 Figura 2. Vista geral dos pontos de amostragem no rio piquiri (a) no mato grosso do sul e no mato grosso: rios (b) comprido, (c) correntes, (d) ibo, (e) prata (f) anhumas, (g) ponte de pedras...... 16 Figura 3. Metodologia de coleta de ictiofauna, sendo (a) coleta de peixes com rede de espera; (b) identificação de peixes em campo; (c) realização de procedimentos de acondicionamento e fixação para armazenamento dos espécimes; (d) identificação no laboratório de zoologia do departamento de biologia/ufmt...... 18 Figura 4. Número de famílias por ordens de peixes nos tributários do rio correntes, piquiri e são lourenço entorno do pantanal norte, no período de novembro de 2017 a março de 2018 ...... 19 Figura 5. Riqueza de espécies por amostra nos meses de novembro de 2017 a março de 2018. Sendo, piqu: piquiri; comp: comprido; corr: correntes; ibo: ibo; prat: prata; anhu: anhumas; e pp: ponte de pedras...... 23 Figura 6. Abundância de peixes por ponto de amostragem nos meses de novembro de 2017 a março de 2018. Sendo, piqu: piquiri; comp: comprido; corr: correntes; ibo: ibo; prat: prata; anhu: anhumas; e pp: ponte de pedras...... 24 Figura 7. Dendrograma euclidiana representando as sequências de similaridade entre os sete pontos amostrais, obtidas pelo método de índice de similaridade de cluster analysis com base na riqueza e abundância de piqu: piquiri; comp: comprido; corr: correntes; ibo: ibo; prat: prata; anhu: anhumas; e pp: ponte de pedras...... 25 Figura 8. Valores do índice de diversidade de shannon (h´) e equitabilidade de jaccard (j’) nos 7 pontos amostrais dos tributários do rio correntes, piquiri e são lourenço entorno do pantanal norte, no período de novembro de 2017 a março de 2018. Piqu: piquiri; comp: comprido; corr: correntes; ibo: ibo; prat: prata; anhu: anhumas; e pp: ponte de pedras. ... 26 Figura 9. Serrasalmus sp. N. “2n58. Espécie nova a ser descrita encontrada no rio piquiri...... 28

Sumário 1. INTRODUÇÃO...... 11 2. OBJETIVO GERAL ...... 13 2.1. Objetivo especifico ...... 13 3. METODOLOGIA ...... 14 3.1. Área de Estudo ...... 14 3.2. Amostragem ...... 17 3.3. Análise dos dados ...... 17 4. RESULTADOS E DISCUSSÃO ...... 19 4.1.Captura total ...... 19 4.2.Riqueza e Abundância ...... 23 4.3.Diversidade ...... 26 5. CONCLUSÕES ...... 28 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...... 29

11

1. INTRODUÇÃO

Os peixes vem de uma linhagem antiga, tendo sua proliferação no final do periodo devoniano. Um dos grupos mais antigos de peixes são os Osteichthyes, seus primeiros fosseis se deram no final do periodo Siluriano, dentro dos Osteicthyes se encontram duas grandes linhagem, os (actinos = espinhos ou raios) e os Sarcopterygii (sarcos = carnosas; pterygium = nadadeira) (TRAJANO, 2014). O grupo dos Actinopterygii é conhecido como os vertebrados mais diversificados, com 32.900 espécies descritas no mundo todo (TEIXEIRA, 2015; POLAZ; RIBEIRO, 2017), sendo maior parte desta riqueza encontrada na região neotropical (ALBERT; REIS, 2011). Estima-sea o corrência de aproximadamente 28.000 espécies em águas doces (FROEHLICH et al., 2017), portanto, tem sido apresentada como a mais diversa e rica do mundo (HONÓRIO et al., 2017; SANTOS et al., 2015). Parte desta fauna foi registrada na América do Sul (REIS et al., 2016), com estimativa de 5.000 espécies, podendo chegar a 8.000 (AGOSTINHO et al., 2007). Em um levantamento da ictiofauna da água doce do Brasil, registrou-se 2.585 espécies, 9 ordens, 39 famílias e 517 gêneros (Buckup et al. 2007). Essa diversificada riqueza reflete numa ampla variedade de formas, padrões comportamentais (AGOSTINHO et al., 2007) e complexidade (AQUINO, 2009). Miranda (2012) estimou que 2.500 espécies validas estejam vivendo em riachos. Essa alta diversidade deve-se a presença de diversos sistemas hidrográficos, uma vez que abriga a extensão total ou grande parte de algumas das principais bacias hidrográficas sul- americanas, como as bacias dos rios Amazonas, Paraná-Paraguai e São Francisco (REIS et al., 2003). No entanto, sabe-se que de 30 a 40% da ictiofauna de águas interiores ainda não foi descrita (AGOSTINHO; GOMES, 2005). Esta alta diversidade é reflexo do Cerrado, um domínio fitogeográfico (BATALHA, 2011), que ocupa um quarto (1/4) do território brasileiro e contém em média 2 milhões de hectares já desmatado (DUARTE; LEITE, 2020; FERNANDES; PESSÔA, 2011). O Cerrado é considerado uma área de alta riqueza de espécies e níveis de endemismo (NOBRE; MARENGO, 2017), tendo como principais ameaças a biodiversidade local a expansão da agricultura, a pecuária, mineração e criação de reservatórios, que reflete como maiores ameaças à biodiversidade de água doce do Brasil (CUNHA et al., 2008), consequentemente um dos principais impactos gerados por essas atividades é a alteração na qualidade e no regime hidrológico dos cursos de água (FERNANDES; PESSÔA, 2011), 12 impactando diretamente as comunidades de peixes (SOARES, 2016). Estes impactos são amplamente descritos para o território onde este estudo foi realizado, confirmando a necessidade e importância do conhecimento sobre a biodiversidade aquática. Dentro da região do Cerrado encontra-se o Pantanal Mato-grossense (396.800 km²), sendo 207.249 km² no Estado do Mato Grosso do Sul e 189.551 km² no Mato Grosso (MOREIRA et al., 2007). O Pantanal é drenado pelo rio Paraguai (seu principal rio) e seus principais tributários como os rios Cuiabá, São Lourenço Taquari, Miranda e Apa (GEF; OEA, 2003). Segundo a WWF-Brasil (2016) as áreas de agricultura predominam na parte nordeste da Bacia do Alto Paraguai (BAP) e atualmente, a construção de barragens, e a consequente formação dos reservatórios, também pode ser considerada uma das principais causas da diminuição populacional de peixes em diversas partes do mundo (ANDRADE; ARAUJO, 2011). A região hidrográfica da BAP é protegida por lei pelo período de defesa da pesca, também conhecida como piracema (Lei Estadual MT nº 6.672/95 e Federal nº 11.959), a favor de minimizar os impactos antrópicos ambientais gerados pelos múltiplos usos dos recursos hídricos nos peixes migratórios durante o período de reprodução da ictiofauna. O período da piracema é considerado o período de subida dos peixes, onde os peixes migratórios buscam locais apropriados para reprodução, desova e alimentação, esse período coincide com o período de chuva, os rios enchem, contém alta taxa de detritos e assim uma abundante alimentação, favorecendo a subida dos peixes (Giachetto, 2014). A ictiofauna no entorno do Pantanal nas últimas duas décadas foi documentada principalmente a região do rio Cuiabá (FERREIRA et al., 2017; SILVA; SOUZA; CORRÊA, 2014; TONDATO et al., 2013). Pains et al. (2014) registraram no rio Bento Gomes (MT) 1.789 indivíduos distribuído em quatro ordens, especialmente Characiformes e Siluriformes, 16 famílias e 53 espécies. Em estudos semelhantes, Vizzotto; de Castro (2015) e Zanini et al. (2017) descrevem que a ictiofauna da região do platô da BAP varia entre 30 e 60 táxons, pertencentes a quatro a oito ordens, cujos padrões neotropicais são fortemente compostos pela predominância das ordens Characiformes e Siluriformes, e pelas principais famílias e Loricariidae. No levantamento da ictiofauna em riachos tributários dos rios Vermelho/São Lourenço (BAP) foi registrado 56 espécies, cinco ordens, 21 famílias e 44 gêneros (OLIVEIRA et al., 2015). Dentre os táxons inventariados na região de central da BAP, algumas espécies são consideradas alvo e outras exóticas (introduzidas), sendo que as espécies alvo são aquelas 13 com alto valor comercial, como por exemplo o Pintado (Pseudoplatystoma corruscans), Cachara (Pseudoplatystoma fasciatum) e Pacu (Piaractus mesopotamicus), que correspondem a 57% de todo desembarque pesqueiro na BAP (CATELLA, 2003). No checklist da ictiofauna do Estado de Mato Grosso do Sul realizado por Froehlich et al. (2017) foram registradas 358 espécies com a predominância de Characiformes e Siluriformes. Ferreira et al. (2017) relataram em seu trabalho que nas últimas décadas diversos estudos foram realizados, porém comparando com as bacias hidrográficas brasileiras, os principais cursos de cabeceira do Pantanal são pouco estudados e a fauna ictia é pouco descrita. O que é preocupante, pois ocorrem espécies que estão na Lista Nacional de Espécies Quase Ameaçadas. Dentre os táxons inventariadas na região de central da BAP, algumas espécies são consideradas alvo e outras exóticas (introduzidas), sendo que as espécies alvo são aquelas com alto valor comercial, como por exemplo o Pintado (Pseudoplatystoma corruscans), Cachara (Pseudoplatystoma fasciatum) e Pacu (Piaractus mesopotamicus), que corresponde por 57% de todo desembarque pesqueiro na BAP (CATELLA, 2003). Ainda que estudos sobre a ictiofauna do Cerrado tenham sido efetuados nos últimos anos (PAIVA, 2010; POSSAMAI, 2012; SARMENTO-SOARES et al., 2017; ARRUDA et al., 2018), a região da interface entre o Cerrado e Pantanal é pouco descrita, conforme relataram Ferreira et al. (2017), carecendo de estudos específicos sobre a ictiodiversidade. Nesse sentido, este trabalho considerou os parâmetros ecológicos básicos da ictiofauna em três sub-bacias da bacia do Alto Paraguai, a bacia do Correntes, Piquiri e São Lourenço, visando contribuir para o conhecimento e manejo adequado das populações de peixes de rios formadores da rede hídrica que drena em direção a planície de inundação do Pantanal Norte.

2. Objetivo Geral

Este estudo teve por objetivo caracterizar a distribuição espacial das assembleias de peixes em sub-bacias (rio Correntes, Piquiri e São Lourenço) do entorno do Pantanal.

2.1. Objetivo especifico

1- Realizar o levantamento da composição de espécies de peixes; 2- Analisar a variação espacial da riqueza, abundância e diversidade das espécies.

14

3. Metodologia 3.1. Área de Estudo

O estudo foi desenvolvido em rios tributários da Bacia do Alto rio Paraguai (BAP) que é um dos principais afluentes da bacia do Prata, descrita como a segunda maior bacia da América do Sul (ANA, 2018). A BAP contém 600 mil quilômetros quadrados e se divide em Planalto, Pantanal e o Chaco, abrangendo cerca de 4,3% do território nacional, que engloba o Mato Grosso (48%) e Mato Grosso do Sul (52%) (LUCIANER, 2011; JUNK et al. 2006; FERREIRA et al. 2017). Segundo ANA/GEF/PNUMA/OEA (2003), os principais rios que descem do Planalto para o Pantanal Norte seguindo para o Sul são rios Cuiabá, São Lourenço, Piquiri, Taquari, Miranda e Negro, todos pela margem esquerda. A pesquisa foi realizada em sete pontos de amostragem na região nordeste da BAP, sendo: rio Piquiri (Bacia do Piquiri), rio Comprido e Correntes (Bacia do Correntes), rio Ibo, rio Prata, rio Anhumas e rio Ponte de Pedra na bacia do São Lourenço/Vermelho (Figura 1 e Tabela 1). Os pontos estão inseridos em uma região com intensa atividade agropecuária, que desencadeia alterações diretas ou indiretas nesses corpos d’água. É possível observar trechos assoreados, resultante do desmatamento acentuado para uso do solo. Assim a vegetação ciliar existente nestes pontos não tem sido eficiente para reduzir a grande quantidade de sedimento carreado por enxurradas durante as chuvas. Estes aspectos são mais evidentes nas regiões dos rios Piquiri, Comprido, Correntes e Ponte de Pedra, onde há trechos com diminuição da profundidade e qualidade geral da água sendo comprometida. Nas regiões dos rios Ibo e Prata onde há áreas exploradas para o lazer, é destacado a grande quantidade de cachoeiras, com rios de substrato rochoso e de 15

corredeiras, condições que determinam uma composição singular da ictiofauna (Relatório da ANA 2018). .

Figura 1. Mapa de localização dos sete pontos de coleta (rios Piquiri, Comprido, Correntes, Ibo, Prata, Anhumas e Ponte de Pedra) na Bacia Hidrográfica do Alto Rio Paraguai, responsável técnico Gustavo B. Medeiros (2019), Laboratório de Análises Hídricas e Ecologia Aplicada (LAHEA).

. Tabela 1. Relação das bacias hidrográficas dos pontos de amostragem e suas respectivas coordenadas geográficas, municípios nos estados de Mato Grosso e Mato grosso do Sul, Brasil.

Bacia Sigla Ponto Latitude Longitude Município Piquiri PIQU Piquiri 17°54'17.53"S 54°39'45.66"O Sonora (MS) Correntes COMP Comprido 17°25'11.92"S 54°19'5.94" O Itiquira (MT) Correntes CORR Correntes 17°37'41.10"S 54°23'4.04"O Itiquira (MT) São Lourenço/ IBO Ibo 16°18'37.53"S 55° 4'28.25"O Juscimeira (MT) Vermelho São Lourenço/ PRAT Prata 16° 5'51.60"S 55° 7'30.97"O Juscimeira (MT) Vermelho São Lourenço/ ANHU Anhumas 16°51'3.00"S 54°43'24.61"O Rondonópolis (MT) Vermelho São Lourenço/ Ponte de PPD 16°59'28.52"S 54°49'25.33"O Rondonópolis (MT) Vermelho Pedra

16

Figura 2. Vista geral dos pontos de amostragem no rio Piquiri (A) no Mato Grosso do Sul e no Mato Grosso: rios (B) Comprido, (C) Correntes, (D) Ibo, (E) Prata (F) Anhumas, (G) Ponte de Pedras.

17

3.2. Amostragem

As coletas foram realizadas mensalmente entre novembro de 2017 a março de 2018 (cinco campanhas), sempre na primeira quinzena de cada mês. Para despesca foram utilizadas redes de espera, de diferentes malhas em todas as estações, composta por uma bateria de 11 redes de dez metros com malhas: 12; 15, 20, 25, 30, 35, 40, 50, 60, 70, 80 mm, entre nós não adjacentes. Estas ficaram expostas por 16 horas, armadas sempre às 16 horas com revistas a noite (22h) e ao amanhecer (8h). Após cada revista os peixes foram acondicionados em sacos contendo etiquetas dos pontos, anotações das malhagens, período de captura, e a data da coleta. Para armazenamento, os peixes foram fixados em Formol (10%) e posteriormente substituído pelo Álcool 90%. O processamento das amostras ocorreu no Laboratório de Zoologia do Departamento de Biologia/UFMT Campus de Rondonópolis (Figura 3). Os espécimes foram coletados com autorização da SEMA do Estado de Mato Grosso (Licença 787/2018) e tombados na Coleção Ictiológica da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).

3.3. Análise dos dados

A identificação das espécies de peixes foi feita de acordo com Britski et al. (2007) e o nome das espécies seguiram Eschmeyer (1998) e Famílias são apresentadas conforme Reis et al. (2003). A análise de composição foi descrita conforme a presença/ausência das espécies; a riqueza de espécies (táxons/amostra) foi avaliada considerando o número total de espécies em cada amostragem, e a abundância pelo número de indivíduos presentes na amostra; a alfa diversidade (α) foi calculada para cada ponto amostral como o número total de espécies nas cinco campanhas. A diversidade foi também estimada de acordo com os índices de riqueza de espécies (taxons/amostra). O índice de diversidade de Shannon (H´) foi gerado em função das da diversidade de riqueza em cada ponto de coleta; e a equitabilidade pelo índice de Jaccard (J’), este valor varia entre 0 e 1, quanto maior o valor obtido, maior a uniformidade entre as amostras. Para determinar a similaridade entre os riachos foi utilizado o índice de similaridade de Cluster Analysis com base na abundância e riqueza de cada ponto através do SigmaPlot 12.0. As espécies alvo foram consideradas aquelas espécies de peixes migratórios, ou seja, que sobem o rio para reprodução e com alto valor econômico para região. 18

A B

C D

Figura 3. Metodologia de coleta de ictiofauna, sendo (A) Coleta de peixes com rede de espera; (B) identificação de peixes em campo; (C) Realização de procedimentos de acondicionamento e fixação para armazenamento dos espécimes; (D) Identificação no Laboratório de Zoologia do Departamento de Biologia/UFMT.

19

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1. Captura total No total foram capturados 329 indivíduos, sendo, 43 espécies, 14 famílias e quatro ordens (Tabela 2). Considerando a composição espacial das ordens e famílias, destacou- se com maior representatividade a ordem Characiformes com um total de oito famílias e 24 espécies, seguido por Siluriformes com cinco famílias e 16 espécies. Com menores contribuições ocorreram as ordens Cichliformes com uma família e duas espécies e Gymnotiformes com uma família e uma espécie (Figura 4).

10

8

6

Familias 4

2

0 Characiformes Siluriformes Cichliformes Gymnitiformes

Ordens Figura 4. Número de famílias por ordens de peixes nos tributários do rio Correntes, Piquiri e São Lourenço entorno do Pantanal Norte, no período de novembro de 2017 a março de 2018.

Em geral, considerando a composição de ordens e famílias inventariadas, os resultados se tornam compatíveis aos dados de dominância da ictiofauna neotropical quando comparado com os dados publicados por Pains et al. (2014), Crampton et al., (2017) e Froehlich et al. (2016), e para a região de Platô do Pantanal Norte, quando comparados com os resultados de Zanini et al. (2016), Oliveira et al. (2015), Vizzotto e Castro (2015), Reis et al. (2016) e Ferreira et al. (2017).

20

Tabela 2. Lista taxonômica, nome popular e local de ocorrência dos peixes nos pontos de amostragem nos tributários dos rios Correntes, Piquiri e São Lourenço, entorno do Pantanal Norte, no período de novembro de 2017 a março de 2018. Sendo, PIQU: Piquiri; COMP: Comprido; CORR: Correntes; IBO: IBO; PRAT: Prata; ANHU: Anhumas; e PP: Ponte de Pedras.

Táxons Nome popular rios de ocorrência CHARACIFORMES ANOSTOMIDAE hypselonotus (Günther, 1868) Abramites PIQU; PP; Megaleporinus obstusidens (Valenciennes, 1837) Piava PRAT; Megaleporinus macrocephalus (Garavello & Britski, 1988) Piavuçu PIQU; Leporinus friderici (Bloch, 1794) Piau, Piau-Três-Pintas PIQU; COMP; CORR; PP; Leporinus striatus (Kner, 1858) Piava COMP; ANHU; PP; Leporinus sp. Piau COMP; Schizodon borellii (Boulenger, 1900) Piava PIQU; Megaleporinus obtusidens (Valenciennes, 1837) Piapara PIQUI; BRICONIDAE Brycon hilarii (Valenciennes, 1850) Piraputanga PIQUI; CHARACIDAE COMP; CORR; IBO; ANHU; Astyanax sp. Lambari PP; Cynopotamus kincaidi (Schultz, 1950) Saicanga PIQU; Galeocharax humeralis (Valenciennes, 1834) Saicanga PIQU; Markiana nigripinnis (Perugia, 1891) Lambari-Do-Campo PIQU; Roeboides prognathus (Günther, 1868) Saicanga PIQU; COMP; CYNODONTIDAE Rhandia bleeker Nhandia COMP; ANHU; PP; Rhaphiodon vulpinus Spix & Agassiz, 1829 Peixe-cachorro, Dourada-Cadela PIQU; CURIMATIDAE Cyphocharax gillii (Eigenmann & Kennedy, 1903) Curimbatazinho PIQU; Potamorhina squamoralevis (Braga & Azpelicueta, 1983) Sairu-Liso PIQU; ERYTHRINIDAE 21

Hoplerythrinus unitaeniatus (Spix & Agassiz, 1829) Jeju IBO; PRAT; Hoplias cf. malabaricus (Bloch, 1794) Traíra 3 PP; Hoplias mbigua (Azpelicueta, Benítez, Aichino & Mendez, 2015) Traírão 4 PP; SERRASALMIDAE Serrasalmus sp. Piranha 5 PIQU; Piaractus mesopotamicus (Holmberg, 1887) Pacu, Pacu-Caranha, Caranha PIQU; TRIPORTHEIDAE Triportheus nematurus (Kner, 1858) Sardinha PIQU; SILURIFORMES AUCHENIPTERIDAE Ageneiosus militaris Valenciennes, 1835 Palmito PIQU; Auchenipterus nigripinnis (Boulenger, 1895) Palmitinho PIQU; Parauchenipteus striatus Jau PP; CALLICHTHYIDAE Callichthys callichthys (Linnaeus 1758) Tambuatá IBO; Hoplosternum littorale (Hancock, 1828) Tamboatá, Caboja, Caborja IBO; PP; HEPTAPTERIDAE Pimelodella maculattus PIQU; Pimelodella gracilis (Valenciennes, 1835) Bagrinho, Mandi-Chorão, Chum-Chum PIQU; CORR; Pimelodella taenioptera Ribeiro, 1914 Bagrinho, Mandi-Chorão, Chum-Chum PIQU; COMP; Pimelodella sp. Bagrinho IBO; LORICARIIDAE Hypostomus cochliodon (Kner, 1854) Cascudo PIQU; COMP; CORR; PP; Hypostomus sp. Cascudo IBO; PP; Pyxiloricaria menezesi (Isbrücker & Nijssen, 1984) Rapa-Canoa, Cari, Acari PIQU; Sturisoma barbatum (Kner 1853) Cascudo COMP; PIMELODIDAE Pimelodus sp. Mandi IBO; Hemisorubim platyrhynchos (Valenciennes, 1840) Jurupoca, Jerepoca, Jiripoca PIQU; 22

Pseudoplatystoma reticulatum Eigenmann & Eigenmann, 1889 Cachara, Surubim-Cachara PIQU; CICHLIFORMES CICHLIDAE Crenicichla lepidota (Heckel, 1840) Joana-Guensa IBO; Oreochromis niloticus (Linnaeus, 1758) Tilápia, Tilápia-Do-Nilo 14 PRAT; GYMNOTIFORMES Gymnotidae Gymnotus inaequilabiatus (Valenciennes, 1839) Tuvira, Tuvirão PIQU;

Entre as espécies capturadas, foram inventariados seis espécies-alvo, distribuídas em duas ordens e cinco famílias. Todas as espécies foram registradas no ponto do rio Piquiri, a espécie com maior abundância foi Schizodon borellii com 15 indivíduos, seguido por Pseudoplatystoma fasciatum com 4 indivíduos e as outras espécies com apenas um indivíduo cada (Tabela 3). Tabela 3. Lista taxonômica de espécies-alvo no rio Piquiri, no período de novembro de 2017 a março 2018. Espécies Alvo Abundância CHARACIFORMES Anostomidae Schizodon borellii 15 Megaleporinus obtusidens 1 Briconidae Brycon hilarii 1 Serrasalmidae Piaractus mesopotamicus 1 SILURIFORMES Auchenipteridae Ageneiosus valenciennesi 1 Pimelodidae Hemisorubim platyrhynchos 1 Pseudoplatystoma fasciatum 4 23

O período de chuva no Mato Grosso e Mato Grosso do Sul é estabelecido pelo CONSEMA, e varia entre os meses de novembro a fevereiro e alguns anos chegando a março. Assim como Giachetto (2014) relata sobre a importância da piracema, a proibição de pesca nesse período reflete na reprodução dos peixes e consequentemente no equilíbrio e desequilíbrio da fauna ictia. A piracema proibi a pesca local e limita a pesca amadora, diminuindo a caça predatória de peixes-alvo que em sua maioria é considerado as espécies migradoras.

4.2. Riqueza e Abundância De maneira geral, a riqueza de espécies foi maior no rio Piquiri (25 táxons) e Ponte de Pedras (12), seguido pelo rio Comprido (11), Ibo (8), Correntes (5), Anhumas e Prata (4 táxons cada) (Figura 5). Enquanto nos rios Comprido e Piquiri foram registradas as maiores abundâncias de peixes (116 e 77 indivíduos, respectivamente), seguido pelos rios Ibo (51), Ponte de Pedras (50), Anhumas (14), Correntes (11) e Prata (10) (Figura 6).

30

25

20

15

Riqueza

10

5

0 PIQU COMP CORR IBO PRAT ANHU PP

Pontos de amostragem Figura 6. Riqueza de espécies por amostra nos meses de novembro de 2017 a março de 2018. Sendo, PIQU: Piquiri; COMP: Comprido; CORR: Correntes; IBO: IBO; PRAT: Prata; ANHU: Anhumas; e PP: Ponte de Pedras.

24

140

120

100

80

60

Abundância

40

20

0 PIQU COMP CORR IBO PRAT ANHU PP

Pontos de amostragem Figura 7. Abundância de peixes por ponto de amostragem nos meses de novembro de 2017 a março de 2018. Sendo, PIQU: Piquiri; COMP: Comprido; CORR: Correntes; IBO: IBO; PRAT: Prata; ANHU: Anhumas; e PP: Ponte de Pedras.

Considerando as variações por estações de amostragem, no rio Piquiri foram capturadas 25 espécies, totalizando 77 indivíduos, a espécie mais abundante foi Schizodon borellii com 15 indivíduos. Na estação do rio Comprido foram capturadas 11 espécies, totalizando em 116 indivíduos, as espécies mais abundantes foram L. frederici (58 indivíduos) e Astyanax sp. (17). Na estação do Correntes foram capturadas cinco espécies, totalizando 11 indivíduos, sendo a espécie mais abundante Hypostomus cochliodon com cinco indivíduos. Na estação rio Ibo foram capturadas sete espécies, totalizando 51 indivíduos, sendo as espécies mais abundantes Astyanax sp. (22 indivíduos) e Hypostomus sp. (12 indivíduos). Na estação rio Prata foram capturadas três espécies, totalizando dez indivíduos, sendo a espécie mais abundante Hoplerythrinus unitaeniatus com seis indivíduos. Na estação rio Anhumas foram capturadas quatro espécies, totalizando 14 indivíduos, sendo a espécie com mais indivíduos Astyanax sp. com dez indivíduos. Na estação rio Ponte de Pedra foram capturadas 12 espécies, totalizando 50 indivíduos, sendo as mais abundantes Astyanax sp. (13 indivíduos) e Hoplias malabaricus com oito indivíduos. 25

Nas análises espaciais de riqueza e abundância (Figura 4), o dendrograma de similaridade demonstrou que existem 4 agrupamentos, tanto de riqueza como de abundância. O dendrograma de similaridade de riqueza distinguiu os pontos com maior e menor riqueza de espécies, assim o rio Piquiri teve a maior riqueza entre os rios, seguido pelo segundo agrupamento com o rio Ponte de Pedras e Comprido que foram similares, o terceiro agrupamento com o rio Ibo isolado, e por fim o rio Correntes e Anhumas e por último o rio Prata que teve a menor riqueza. No dendrograma de abundância (Figura 7) foi possível distinguir o ponto com maior abundância no primeiro agrupamento do rio Comprido, seguido pelo rio Piquiri (agrupamento dois), já o terceiro agrupamento demonstrou que os rios Ponte de Pedra e Ibo são mais similares e por último o quarto agrupamento contendo os pontos menos abundantes que foram o rio Anhumas, Correntes e Prata com maior similaridade.

Figura 8. Dendrograma Euclidiana representando as sequências de similaridade entre os sete pontos amostrais, obtidas pelo método de índice de similaridade de Cluster Analysis com base na riqueza e abundância de PIQU: Piquiri; COMP: Comprido; CORR: Correntes; IBO: IBO; PRAT: Prata; ANHU: Anhumas; e PP: Ponte de Pedras.

26

4.3. Diversidade O índice de diversidade de Shannon (H´) apresentou entre os sete pontos variação de 0,8 e 2,8. A maior diversidade ocorreu no rio Piquiri (2,80), seguido pelo rio Ponte de Pedra (1,969), Comprido (1,708) e Ibo (1,589), já as menores diversidade ocorreram nos rios Corrente (1,414), Prata (0,8979) e Anhumas (0,8953) (Tabela 4). A relação a equitabilidade de Jaccard (J’) mostrou que a distribuição foi mais uniforme no rio Correntes (0,8787), rio Piquiri (0,8664) e rio Prata (0,8173), seguido pelos rios Ponte de Pedra (0,7924), Ibo (0,7644) e Comprido (0,7124), e com menor valor de equitabilidade o rio Anhumas (0,6458) (figura 8 e Tabela 4). O rio Piquiri demonstrou uma alta diversidade (H´) por apresentar a maior riqueza (25 táxons), porém, sua composição não foi tão uniforme resultando em uma menor equitabilidade (J’). Já o rio Correntes teve menor índice de diversidade (H´), porém, a maior equitabilidade (J’), sendo que a distribuição de indivíduos em cada espécie foi mais uniforme. O rio Anhumas teve menor diversidade (H´) e equitabilidade quando comparado aos demais rios amostrados.

3,0

2,5

2,0

1,5 H' J'

1,0

0,5

0,0 PIQU COMP CORR IBO PRAT ANHU PP

Figura 9. Valores do índice de diversidade de Shannon (H´) e Equitabilidade de Jaccard (J’) nos 7 pontos amostrais dos tributários do rio Correntes, Piquiri e São Lourenço entorno do Pantanal Norte, no período de novembro de 2017 a março de 2018. PIQU: Piquiri; COMP: Comprido; CORR: Correntes; IBO: IBO; PRAT: Prata; ANHU: Anhumas; e PP: Ponte de Pedras.

Analisando os dados de riqueza, diversidade e equitabilidade (Tabela 4), podemos observar que a variação espacial entre os pontos de amostragem mesmo com baixos valores de riqueza e abundância, o rio Correntes e Prata se destacam 27 com variação de diversidade e o alto valor de equitabilidade, já o rio Comprido com o segundo maior número de riqueza, sua diversidade e equitabilidade são relativamente baixas. Para Peroni (2011), os valores de ocorrer, pois valores de riqueza e abundância nem sempre quer dizer uma alta taxa de diversidade, o que condiz com os resultados encontrados.

Tabela 4. Índices de Riqueza, abundância, diversidade de Shannon-Wiener (H’) e equitabilidade (J), por ponto de coleta nos tributários do rio Correntes, Piquiri e São Lourenço entorno do Pantanal Norte, no período de novembro de 2017 a março de 2018. Sendo, PIQU: Piquiri; COMP: Comprido; CORR: Correntes; IBO: IBO; PRAT: Prata; ANHU: Anhumas; e PP: Ponte de Pedras Pontos Abundância Riqueza H' J' PIQU 77 25 2,823 0,8664 COMP 116 11 1,708 0,7124 CORR 11 5 1,414 0,8787 IBO 51 7 1,589 0,7644 PRAT 10 4 0,8979 0,8173 ANHU 14 4 0,8953 0,6458 PP 50 12 1,969 0,7924

Dentre as espécies amostradas três chamaram atenção, Piaractus mesopotamicus, pois a mesma se encontra na Lista Nacional de Espécies Quase Ameaçadas de extinção do ICMBIO desde 2014, o que torna uma preocupação a mais sobre seu status de conservação por ser pouco estudada. Vale ressaltar a Tilápia (Oreochromis niloticus) que segundo Froehlich et al. (2017), é uma espécie exótica, ciclídeo africano trazida da África para o Brasil na década de 1970 (CATELLA, 2003; Alho,2005; Alho; Sabino, 2011; LATINI et al., 2016). As espécies exóticas são consideradas espécies introduzidas que começam a se reproduzir e proliferar, causando alterações no ambiente e podendo ocorrer competição entre espécies (LATINI, 2016; Alho, 2005, Alho; Sabino, 2011). Nascimento et al. (2001) relata que a introdução de peixes vindo principalmente dos Estados Unidos, Europa e África mostra a necessidade de um controle tanto para a aquicultura como para povoamento. As espécies exóticas são a terceira maior ameaça a biodiversidade, competindo com as espécies locais afetando e desequilibrando o habitat e colocando sob pressão espécies de interesse econômico (espécie alvo). Isso é preocupante, mesmo que ela ainda não esteja estabelecida nesta região. Por outro lado, sabe-se 28 que ambientes prístinos, lóticos, dificultam o estabelecimento dessas espécies. Segundo o levantamento da Associação Brasileira de Piscicultura (2018) o Mato Grosso do Sul produz cerca de 25.500 toneladas de Tilápia, sendo responsável por 70% de produção de peixes adultos. No ano de 2017 Mato grosso alcançou 62 mil toneladas, sendo sua grande maioria da região Centro Sul de Mato Grosso (PeixesBR, 2018). Foi evidenciada uma espécie provavelmente ainda não descrita do gênero Serrasalmus sp. (Figura 9), o que pode ressaltar a necessidade de novos estudos sobre a diversidade ictiofaunística na região de planalto como citado por Froehlich et al. (2017) e Ferreira et al. (2017).

Figura 10. Serrasalmus sp. espécie nova a ser descrita encontrada no rio Piquiri.

5. CONCLUSÕES

Podemos concluir que a composição de espécies dos rios localizados no nordeste da BAP é característica da região neotropical. Entre as variações espaciais de distribuição da ictiofauna nos sete pontos, podemos considerar que o rio Piquiri é estratégico para realização de novos estudos, pois além de ser o mais rico e diverso, apresenta uma espécie quase ameaçada de extinção e há possibilidade da existência de novas espécies para ciência. Estes fatos nos levam a repensar sobre o grau de preservação ambiental deste rio. O registro de Tilápia (Oreochromis niloticus) no rio Prata, uma espécie exótica, sugere um desequilíbrio no hábitat causado pela introdução de espécies, que podem levar a competição entre as mesmas e acabar em deficiência e baixa demanda de riqueza. 29

Nos demais rios amostrados, podemos considerar que não possuem uma regra geral de distribuição e composição, ocorrendo apenas uma variação considerável na abundância e riqueza. A baixa diversidade em mais da metade dos pontos amostrais pode ser respondida pela alta taxa de degradação devido a exploração dos solos e dos rios do Cerrado, principalmente nos corpos d’água decorrentes da construção de hidrelétricas, entre outros usos, que vem crescendo a cada ano, sendo uma ameaça a sua alta diversidade local.

6. Referências Bibliográficas

AGOSTINHO, Ângelo Antônio, et al. Ecologia e manejo de recursos pesqueiros em reservatórios do Brasil. 2007.

AGOSTINHO, Ângelo A.; THOMAZ, SIDINEI M.; GOMES, LUIZ C. Conservação da biodiversidade em águas continentais do Brasil. Megadiversidade, 2005, 1.1: 70-78.

ALBERT, James S.; REIS, Roberto (ed.). Historical biogeography of Neotropical freshwater fishes. Univ of California Press, 2011.

ALHO, C. J. R.; SABINO, J. A conservation agenda for the Pantanal's biodiversity. Brazilian Journal of Biology, 2011, 71.1: 327-335

ALHO, Cleber José Rodrigues, et al. Bat-species richness in the Pantanal floodplain and its surrounding uplands. Brazilian Journal of Biology, 2011, 71.1: 311-320.

ANA (2018). Boletim De Monitoramento Da Bacia Do Alto Paraguai v. 12, n. 08, p. 1- 22, ago. 2018.

ANA/GEF/PNUMA/OEA (2004) Programa de Ações Estratégicas para o Gerenciamento Integrado do Pantanal e Bacia do Alto Paraguai: Relatório Final/Agência Nacional de Águas – Brasília 2004.

ANA/GEF/PNUMA/OEA. (2003). Diagnóstico Analítico do Pantanal e Bacia do Alto Paraguai – DAB. Projeto GEF Pantanal/Alto Paraguai (ANA/GEF/PNUMA/OEA). Brasília, 2003.

Andrade, E. S.; Araujo, J. C. (2011). Medidas mitigadoras dos impactos ambientais causados por usinas hidrelétricas sobre peixes REDVET. Revista electrónica de Veterinária 1695-7504 2011 V. 12 N 3.

AQUINO, Pedro De Podestà Uchôa de, et al. Ictiofauna dos córregos do Parque Nacional de Brasília, bacia do Alto Rio Paraná, Distrito Federal, Brasil Central. Biota Neotropica, 2009, 9.1: 0-0.

ARRUDA, Joari Costa de, et al. Conhecimento ecológico tradicional da ictiofauna pelos quilombolas no Alto Guaporé, Mato Grosso, Amazônia meridional, Brasil. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, 2018, 13.2: 315-329. 30

BATALHA, Marco Antônio. O cerrado não é um bioma. Biota Neotropica, 2011, 11.1: 21-24.

BRITSKI, H. A.; SILIMON, KZ de S. de; LOPES, BS Peixes do Pantanal: manual de identificação. Brasília: EMBRAPA–SP, 2007.

BUCKUP, Paulo Andreas; MENEZES, Naércio Aquino; GHAZZI, Miriam Sant'Anna. Catálogo das espécies de peixes de água doce do Brasil. Rio de Janeiro: Museu Nacional, 2007.

CATELLA, Agostinho Carlos. A pesca no Pantanal Sul: situação atual e perspectivas. Embrapa Pantanal-Documentos (INFOTECA-E), 2003. .

CRAMPTON, W. G. R. et al. Probabilidade e Estatísticas. Neotropical Ichthyology, v. 107, n. 3, p. 1–10, 2017

DUARTE, Taise Ernestina Prestes Nogueira; LEITE, Leandro Bernardo. Cidades médias no cerrado brasileiro: desafios para a conservação da biodiversidade. Terra Plural, 2020, 14.1: 1-7.

FERNANDES, Paula Arruda; PESSÔA, Vera Lúcia Salazar. O cerrado e suas atividades impactantes: uma leitura sobre o garimpo, a mineração e a agricultura mecanizada/Cerrado and it's impacting activities: a reading about a mine, mining and mechanized farming. 2018.

FERREIRA, Fabiane Silva, et al. Survey of fish species from plateau streams of the Miranda River Basin in the Upper Paraguay River Region, Brazil. Biota Neotropica, 2017, 17.3. . FROEHLICH, Otávio, et al. Checklist da ictiofauna do estado de Mato Grosso do Sul, Brasil. Iheringia, Série Zoologia, 2017, 107.supl.

GEF, A. N. A.; OEA, P. Integrado De Bacia Hidrográfica Para O Pantanal E Bacia Do Alto Paraguai Diagnóstico Analítico Relatório Final. 2003.

GIACHETTO, Diego. Piracema período defeso da pesca em águas doce, 2014.

HONÓRIO, H. et al. Ecológica De Fechos Região De Cabeceira Da Bacia Do Rio Das Velhas ,. p. 2015–2018, 2017.

LATINI, Anderson Oliveira, et al. Espécies exóticas invasoras de águas continentais no Brasil. Brasília: MMA, 2016, 791.

MIRANDA, Jean Carlos. Ameaças aos peixes de riachos da Mata Atlântica. Natureza on line, 2012, 10.3: 136-139.

MOREIRA, Marlene M., et al. Caracterização Limnológica dos rios Correntes e Piquiri (MT) em área de planalto e aporte de nutrientes e sólidos suspensos para o Pantanal. In: CONGRESSO DE ECOLOGIA DO BRASIL, 8. Caxambu: SEB, 2007.

31

NASCIMENTO, F. L.; CATELLA, A. C.; MORAES, A. S. Distribuicao espacial do tucunare, Cichla sp (Pisces, cichlidae), peixe amazonico introduzido no Pantanal, Brasil. Embrapa Pantanal. Boletim de Pesquisa e Desenvolvimento, 2001.

NOBRE, Carlos A.; MARENGO, José A. Mudanças climáticas em rede: um olhar interdisciplinar. São Paulo: Canal6 Editora, 2017.

OLIVEIRA, Valdeci, et al. Fish from urban tributaries to the Vermelho River, upper Paraguay River Basin, Mato Grosso, Brazil. Check List, 2014, 11: 1.

PAINS-SILVA, H.; SOUZA, F.; CORRÊA, F. Icththyofauna of the Bento Gomes River in the Pantanal Matogrossense, Brazil. Panamjas, 2014, 9.1: 48-53. . PAIVA, Paula Pereira de et al. Avaliação da intoxicação aguda induzida por atrazina em espécie da ictiofauna do pantanal mato-grossense, pacu (Piaractus mesopotamicus), com o emprego de biomarcadores morfológicos. 2010.

PERONI, Nivaldo; HERNÁNDEZ, Malva Isabel Medina. Ecologia de populações e comunidades. Universidade Aberta do Brasil, 2011.

POLAZ, Carla Natacha Marcolino; RIBEIRO, Katia Torres. Conservação de peixes continentais e manejo de unidades de conservação. Biodiversidade Brasileira, 2017, 7.1: 1-3.

POSSAMAI, Bianca. Hábito alimentar em fases ontogenéticas de Mycteroperca acutirostris (Actinopterygii: Epinephelidae) do litoral do Paraná e de Santa Catarina, Brasil, 2012.

REIS, Roberto E., et al. Fish biodiversity and conservation in South America. Journal of fish biology, 2016, 89.1: 12-47.

REIS, Roberto E.; KULLANDER, Sven O.; FERRARIS, Carl J. Check list of the freshwater fishes of South and Central America. Edipucrs, 2003

SANTOS, J. A. P. et al. Composição e variação temporal da assembleia de peixes do alto sistema estuarino de santos, São Paulo, Brasil. Boletim do Instituto de Pesca, v. 41, n. 4, p. 945–959, 2015

SARMENTO-SOARES, Luisa Maria, et al. Ictiofauna das ecorregiões de água doce e marinhas do nordeste brasileiro. Boletim Sociedade Brasileira de Ictiologia, 2017, 122: 16-35.

SOARES, Romildo Ribeiro. Composição e estrutura da ictiofauna do único reservatório da bacia do rio Parnaíba, Brasil. 2016.

TEIXEIRA, Francisco Keilo. Ictiofauna da bacia do Rio Mundaú: dieta e morfologia do trato digestório de cinco espécies da família Characidae. 2015.

TONDATO, Karina K., et al. Spatial distribution of fish assemblages along environmental gradients in the temporary ponds of Northern Pantanal, Brazil. Journal of Limnology, 2013, 72.1: e8.

32

TRAJANO, E. 1.Origem, evolução e filogenia de Chordata e Craniata; 2. Agnatha atuais e Chondrichthyes; 3. Osteichthyes; 4. Sarcopterygii; 5. Os Amniota.. In: S.G.B.C. Lopes; M.A. Visconti. (Org.). Diversidade e evolução de fungos e animais. 1ed.São Paulo: EDUSP, 2014, v. 1, p. 259-414

VIZZOTTO, P. C.; DE CASTRO, R. J. Ichthyofauna of tributaries of the Vermelho river, upper Paraguay River basin, region of Rondonópolis, state of Mato Grosso, Brazil. Check List, v. 11, n. 5, 2015

ZANINI, Talitha S., et al. Diversidade da ictiofauna de riachos de cabeceira em paisagens antropizadas na bacia do Alto Paraguai. Iheringia. Série Zoologia, 2017, 107.