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A educação nos assentamentos rurais da microrregião de

Francislene Andréia Berti Rossi

Karem Cristine Pirola Narimatsu

Patrícia Farias da Silva

Camila Regina Silva Baleroni Recco

10.37885/210404075 RESUMO

O objetivo do trabalho foi investigar a importância da educação nos Assentamentos Rurais da Microrregião de Andradina e analisar os programas oferecidos pelo governo e as dificuldades dos assentados ao seu acesso. Aplicou-se 20 questionários para famílias de 12 Assentamentos. O trabalho foi documentado por meio de tabela e gráficos. O ní- vel de escolaridade das mães é superior ao nível de escolaridade dos pais. As famílias são constituídas com pais na faixa etária de 40 – 50 anos e mães na faixa etária de 30 – 40 anos. A maioria das escolas dos Assentamentos oferecem apenas o Ensino Fundamental I. Dos 12 Assentamentos, 7 não oferecem transporte escolar. Há ofereci- mentos de cursos de capacitações da área do agronegócio, entretanto, é pouco o inte- resse por parte da comunidade assentada na participação dos mesmos. Grande parte dos responsáveis pelos lotes possuem ensino fundamental ou ensino médio incompleto e as escolas existentes nos Assentamentos não oferecem cursos como o EJA, que se constitui numa chance para os assentados que, por qualquer motivo, não concluíram o ensino na idade apropriada. Há cursos de capacitação da área de agronegócio ofere- cidos pelos órgãos dos governos, porém é pouco o interesse por parte dos assentados em participar dos mesmos.

Palavras-chave: Escola Rural, Movimentos Sociais, Práticas Pedagógicas.

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Extensão Rural: práticas e pesquisas para o fortalecimento da agricultura familiar - Volume 2 INTRODUÇÃO

A política de reforma agrária possibilitou o desenvolvimento do agronegócio no Brasil e fortaleceu a agricultura familiar. Os Projetos de Assentamentos surgiram após a implantação da política de reforma agrária no Brasil. A Microrregião de Andradina, onde a questão agrária se faz presente, é fortemente marcada pela presença de assentamentos rurais, ocorrendo a partir da década de 1980 a implantação de um razoável número de assentamentos rurais (OLIVEIRA, 2014). Localizada no Noroeste Paulista, a Microrregião de Andradina, pertence à Mesorregião de Araçatuba e é constituída por 11 municípios: Andradina, , Guaraçaí, , , Mirandópolis, , Nova Independência, , Sud Menucci e Suzanápolis (MORAES et al., 2013). De acordo com dados do INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) o número de assentamentos rurais nesses municípios são: Andradina (5), Castilho (10), Guaraçaí (5), Ilha Solteira (2), Itapura (3), Mirandópolis (3), Murutinga do Sul (3), Nova Independência (1), Pereira Barreto (5) e Suzanápolis (1). Conforme SANT’ANA e TARSITANO (2009) a grande maioria dos casos, a criação dos assentamentos significou uma melhoria das condições de vida das famílias (alimentação, moradia, auto-estima) e foi importante para os municípios onde estes se instalaram, mas há sérios problemas em termos de ação operacional do governo. Nesse contexto, melhoria das condições de educação da população deve também ser considerada parte fundamental do processo de desenvolvimento. De acordo com SCARPIM e SLOMSKI (2007) o progresso de um país ou município não pode ser mensurado só pelo dinheiro que as pessoas possuem, mas também pela sua saúde, a qualidade dos serviços médicos e a educação que devem ser consideradas não só pela disponibilidade, mas pela qualidade. A educação do campo é considerada aquela que atende as especificidades rurais e oferece uma educação de qualidade, adequada ao modo de viver, pensar e produzir das populações identificadas com o campo. Essa noção ganhou força a partir da instituição das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (Resolução CNE/ CEB nº 1, de 03/04/2002) pelo Conselho Nacional de Educação. Os dados de instituições federais de pesquisa apontam grande divergência entre os indicadores educacionais do campo e das cidades, com clara desvantagem para as primeiras. Assim é reconhecido que as pessoas que vivem no campo têm direito a uma educação diferenciada daquela oferecida nas cidades, extrapolando a noção de espaço geográfico e compreendendo tam- bém as necessidades culturais, os direitos sociais e a formação integral desses indivíduos (HENRIQUES et al., 2007). 18

Extensão Rural: práticas e pesquisas para o fortalecimento da agricultura familiar - Volume 2 A educação do campo foi pensada em contraponto à visão de camponês e de rural como se fossem sinônimo de arcaico e atrasado. Esta educação considera e valoriza os conhecimentos da prática social dos camponeses como sendo um lugar para construção de novas possibilidades de reprodução social, de desenvolvimento sustentável e ainda enfa- tiza o campo como lugar de trabalho, moradia, lazer, sociabilidade e identidade dos atores sociais (SOUZA, 2008). A educação rural está longe de ser adequada e eficiente para o contexto no qual se insere. Isso porque o rural e sua população ainda continuam sendo vistos como um mundo à parte, fora do comum, ou seja, fora dos parâmetros definidos pela representação urbana (OLIVEIRA e BASTOS, 2004). Quando se fala de qualidade educacional no meio rural os problemas são muito mais preocupantes do que no meio urbano, apesar de existirem iniciativas por parte de órgãos governamentais, no sentido de se criarem programas educacionais que beneficiem produto- res rurais dos assentamentos, não se verifica a participação de uma quantidade satisfatória. Na literatura há inúmeros trabalhos que relatam a situação econômica dos assentados da Microrregião de Andradina, entretanto pouquíssimos são os que apresentam informações referentes à educação. Nesse sentido, este projeto buscou investigar a importância da educação nos assenta- mentos rurais da Microrregião de Andradina, ampliando conhecimentos sobre este assunto, bem como analisar os programas oferecidos pelo governo e as dificuldades dos produtores rurais aos seus acessos. A pesquisa de campo foi utilizada para extrair dados e informações sobre a educação do campo diretamente da realidade da população dos assentamentos da Microrregião de Andradina por meio visitas e aplicação de questionários, no período de Maio a Agosto de 2017. A amostragem proposta para entrevista foi composta por um universo de 20 famílias assentadas determinada a partir do cadastro do Incra (Instituto de Colonização e Reforma Agrária) e Itesp (Instituto de Terras do Estado de ) da Regional de Andradina. O trabalho englobou 12 Assentamentos pertencentes à Microrregião de Andradina. A tabulação dos dados apresentou a percepção dos assentados sobre a educação e o trabalho foi documentado com por meio de gráficos e tabela. Nos gráficos foram demonstrados a idade e o nível de escolaridade dos responsáveis pelo lote, a existência ou não de escolas nos Assentamentos, o oferecimento de transporte através da Prefeitura Municipal do Assentamento para o Município e a participação dos responsáveis pelo lote em capacitações.

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Extensão Rural: práticas e pesquisas para o fortalecimento da agricultura familiar - Volume 2 REFERENCIAL TEÓRICO

Esta pesquisa contribuiu na construção de uma chave metodológica para interpretação do percurso e da situação atual da educação do campo dos assentados da Microrregião de Andradina, um fenômeno da realidade educacional brasileira, que tem os camponeses como principais protagonistas. O reconhecimento de que as pessoas que vivem no campo têm direito a uma educação diferenciada daquela oferecida a quem vive nas cidades é recente e inovador, e ganhou força a partir da instituição, pelo Conselho Nacional de Educação, das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (HENRIQUES et al., 2007). A educação do campo tem conquistado lugar na agenda política nas instâncias muni- cipal, estadual e federal nos últimos anos. Fruto das demandas dos movimentos e organiza- ções sociais dos trabalhadores rurais, a educação do campo expressa uma nova concepção quanto ao campo, o camponês ou o trabalhador rural, fortalecendo o caráter de classe nas lutas em torno da educação (SOUZA, 2008). Segundo KOLLING et al. (2002) o campo existe e é legítima a luta por políticas públi- cas específicas e por um projeto educativo próprio para quem vive nele: no campo estão milhões de pessoas desde a infância até a terceira idade; o povo do campo têm uma raiz própria, um jeito de viver e de trabalhar distinta do mundo urbano, bem como de viver e de organizar a família, a comunidade, o trabalho e a educação. Ainda de acordo com os autores, há graves problemas na educação no campo: faltam escolas para atender a população; infraestrutura, docentes qualificados; política de valoriza- ção do magistério e apoio às iniciativas de renovação pedagógica, além de elevado índice de analfabetismo. Deste modo, esta pesquisa permitiu levantar dados sobre a temática e a comunidade investigada, em que serão identificados alguns impasses e desafios principais da educa- ção do campo na atualidade nesta Microrregião, caracterizada pela presença de inúmeros assentamentos rurais, relacionando-os ao momento atual de crise mundial do capitalismo.

RESULTADOS

As visitas permitiram um levantamento de dados através do contato com a comu- nidade assentada. A realização das entrevistas resultou em um diagnóstico dos assentamentos que apontaram os principais desafios e oportunidades que permeiam a importância da educa- ção no meio rural. 20

Extensão Rural: práticas e pesquisas para o fortalecimento da agricultura familiar - Volume 2 A tabela 1 refere-se aos Assentamentos pertencentes à Microrregião de Andradina englobados na pesquisa.

Tabela 1. Assentamentos pertencentes à Microrregião de Andradina englobados na pesquisa.

Nome do Assentamento Cidade Arizona Andradina Esperança de Luz Castilho Frei Pedro Pereira Barreto Orlando Molina Murutinga do Sul Pendengo Castilho Pousada Alegre Nova Independência Santa Cristina Murutinga do Sul São José Guaraçaí Timboré Andradina Tremembé Castilho Três Barras Castilho

Foram aplicados 4 questionários no Assentamento Pendengo em Castilho; 3 questioná- rios nos Assentamentos Timboré em Andradina; 2 questionários nos Assentamentos Arizona em Andradina, Orlando Molina em Murutinga do Sul e Tremembé em Castilho; 1 questio- nário nos Assentamentos Esperança de Luz em Castilho, Estrela da Ilha em Ilha Solteira, Frei Pedro em Pereira Barreto, Pousada Alegre em Nova Independência, Três Barras em Castilho, Santa Cristina em Murutinga do Sul e São José em Guaraçai. A figura 1 refere-se ao nível de escolaridade dos responsáveis pelo lote.

Figura 1. Nível de escolaridade dos responsáveis pelo lote.

Fonte: Dados da pesquisa.

Observa-se que em relação aos pais ou padrastos, nenhum possui ensino fundamental completo, ensino técnico ou ensino superior completo; 1 é analfabeto; 2 possuem ensino médio incompleto e 3 possuem ensino médio completo. A maioria dos pais (12) possuem ensino fundamental incompleto. 20 21

Extensão Rural: práticas e pesquisas para o fortalecimento da agricultura familiar - Volume 2 Quanto às mães, nenhuma é analfabeta ou possui ensino superior completo; 1 possui ensino técnico; 3 possuem ensino fundamental completo; 4 possuem ensino fundamental in- completo e ensino médio incompleto. A maioria das mães (8) possuem ensino médio completo. O nível de escolaridade das mães é superior ao nível de escolaridade dos pais. A figura 2 refere-se à idade dos responsáveis pelo lote.

Figura 2. Nível de escolaridade dos responsáveis pelo lote.

Fonte: Dados da pesquisa.

A amostragem realizada nos Assentamentos da Microrregião de Andradina na pesquisa indicam que as famílias são constituídas com os pais na faixa etária de 40 – 50 anos e com as mães na faixa etária de 30 – 40 anos. Durante as aplicações dos questionários foi constatado que nas escolas Assentamentos não são oferecidos cursos de EJA (Educação de Jovens e Adultos). Observou-se que 1 pai possui ensino médio completo realizado por meio do EJA, em Nova Independência. A figura 3 refere-se à existência de escolas nos Assentamentos.

Figura 3. Existência de escolas nos Assentamentos.

Fonte: Dados da pesquisa. 22

Extensão Rural: práticas e pesquisas para o fortalecimento da agricultura familiar - Volume 2 Verifica-se que a maioria dos Assentamentos não possuem escolas. Apenas 1 Assentamento (Três Barras em Castilho) possui escola que oferece ensino fundamental II, os demais, apenas ensino fundamental I. Em nenhuma escola é oferecido o EJA. A figura 4 refere-se ao oferecimento de transporte através da Prefeitura Municipal do Assentamento para o Município.

Figura 4. Oferecimento de transporte através da Prefeitura Municipal do Assentamento para o Município.

Fonte: Dados da pesquisa.

Dos 12 Assentamentos, 7 não possuem meio de transporte da zona rural para a zona urbana, entretanto, durante a aplicação do questionário, foi possível observar que todas as famílias possuem meios de transportes próprios (carro ou moto). A figura 5 refere-se à participação dos responsáveis pelo lote nas capacitações ofe- recidas, principalmente pelo INCRA e SENAR (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural).

Figura 5. Participação dos responsáveis pelo lote em capacitações.

Fonte: Dados da pesquisa. 22 23

Extensão Rural: práticas e pesquisas para o fortalecimento da agricultura familiar - Volume 2 A maioria das capacitações são oferecidas pelo INCRA e SENAR. Dentre os cursos citados, estão o de panificação, artesanato, inseminação artificial, derivados do leite, doma racional, produção de humus, produção de sabão caseiro, apicultura, olericultura (produção orgânica de hortaliças), e floricultura (orquídeas). Durante a aplicação dos questionários constatou-se que a falta de interesse pela par- ticipação nos cursos de capacitações. Em todos os Assentamentos há algum tipo de instalação (galpão, barracão ou a pró- pria sede) para reuniões com membros dos órgãos de assistência técnica e extensão rural (INCRA e ITESP) e associações e realização de cursos. É interessante ressaltar que o INCRA desenvolvia um bom trabalho de assistência téc- nica nos Assentamentos da Microrregião de Andradina, por meio da COATER (Cooperativa de Trabalho e Assessoria Técnica e Extensão Rural), porém se encontra em período de transição entre uma chamada pública e outra, com previsão de retorno em 2018. A matriz dessa cooperativa situa-se em Paraguaçu Paulista e atuava, juntamente com o INCRA em Andradina, há 5 anos. Das famílias avaliadas, a maioria dos filhos já fizeram ou estão cursando o Curso Técnico em Agropecuária Integrado ao Ensino Médio, na Modalidade Alternância. Esse curso é específico para os filhos dos assentados ou pequenos produtores rurais, que permanecem uma semana na escola (sessão família) e uma semana no lote (semana do meio sócio pro- fissional). Nessa semana o aluno desenvolve as atividades que aprendeu na escola no lote. Porém, são raros os casos em que os filhos que cursaram o ensino técnico permane- ceram no lote, preferindo trabalhar em empresas da região. Em 4 famílias, os filhos cursam ensino superior em Zootecnia na Unesp de Ilha Solteira (1 no Assentamento Arizona em Andradina) e Agronomia na Fundação Educacional de Andradina (2 no Assentamento Pendengo em Andradina e 1 no Assentamento Santa Cristina em Murutinga do Sul). A faculdade privada de Andradina oferece bolsas de estudos para esses alunos, facilitando o acesso dos jovens ao ensino superior.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Grande parte dos responsáveis pelos lotes possuem ensino fundamental ou ensino médio incompleto e as escolas existentes nos Assentamentos não oferecem cursos como o EJA, que se constitui numa chance para os assentados que, por qualquer motivo, não concluíram o ensino fundamental e/ou o médio na idade apropriada, dando oportunidades educacionais adequadas em relação a seus interesses, condições de vida e de trabalho. Há cursos de capacitação da área de agronegócio oferecidos pelos órgãos dos gover- nos, porém é pouco o interesse por parte dos assentados em participar dos mesmos. 24

Extensão Rural: práticas e pesquisas para o fortalecimento da agricultura familiar - Volume 2 REFERÊNCIAS

1. HENRIQUES, R. et al. Educação do campo: diferenças mudando paradigmas. Cadernos Secad (Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade), Brasília, n.2, 81p, 2007.

2. KOLLING, E.J.; CERIOLI, P.R.; CALDART, R.S. Educação do campo: identidade e políticas públicas. Brasília, 92p., 2002 (Coleção por uma educação no campo, 4).

3. OLIVEIRA, T.; BASTOS, V.A. A proposta de educação do campo das escolas rurais de Ara- raquara –SP: destaque na construção da qualidade de vida. Retratos de Assentamentos, , n.9, p.147‐166, 2004.

4. OLIVEIRA, T.; BASTOS, V.A. A proposta de educação do campo das escolas rurais de Ara- raquara –SP: destaque na construção da qualidade de vida. Retratos de Assentamentos, Araraquara, n.9, p.147‐166, 2004.

5. MORAES, M.D. et al. Política nacional de assistência técnica e extensão rural e o caso da Microrregião de Andradina-SP. Retratos de Assentamentos, Araraquara, v.16, n.2, 2013.

6. SANT’ANA, A.L.; TARSITANO, M.A.A. Tipificação das famílias de oito assentamentos rurais da região de Andradina (SP), com base em diferentes estratégias de produção e comercialização. Revista Economia e Sociologia Rural, Brasília, v.47, n. 3, p.615-636, 2009.

7. SCARPIM, J.E.; SLOMSKI, V. Estudo dos fatores condicionantes do índice de desenvolvimento humano nos municípios do estado do Paraná: instrumento de controladoria para a tomada de decisões na gestão governamental. Revista de Administração Pública, , v.41, n.5, p.909-933, 2007.

8. SOUZA, M.A. Educação do campo: políticas, práticas pedagógicas e produção científica. Educação & Sociedade, , v.29, n.105, p.1089-1111, 2008.

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