Definição Litostratigráfica Da Sucessão Calco-Dolomítica Do Jurássico Inferior Da Região De Coimbra-Penela (Bacia Lusitânica, Portugal)
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Versão online: http://www.lneg.pt/iedt/unidades/16/paginas/26/30/209 Comunicações Geológicas (2016) 103, 1, 77-96 ISSN: 0873-948X; e-ISSN: 1647-581X Definição litostratigráfica da sucessão calco-dolomítica do Jurássico Inferior da região de Coimbra-Penela (Bacia Lusitânica, Portugal) Lithostratigraphic definition of the Lower Jurassic dolomitic- limestone succession from the Coimbra-Penela region (Lusitanian Basin, Portugal) L. A. Dimuccio1*, L. V. Duarte2, L. Cunha1 Recebido em 12/09/2016 / Aceite em 20/12/2016 Artigo original Disponível online em fevereiro de 2017 / Publicado em dezembro de 2017 Original article © 2016 LNEG – Laboratório Nacional de Energia Geologia IP Resumo: Propõe-se um quadro litostratigráfico formal para a sucessão Lusitânica (Palain, 1976; Guéry et al., 1986; Soares et al., 1993, calco-dolomítica do Jurássico Inferior da Bacia Lusitânica, aflorante na 2012; Azerêdo et al., 2003, 2014; Kullberg et al., 2013, 2014a, região de Coimbra-Penela (Portugal centro-ocidental). Neste domínio b), enquadrado no contexto da primeira etapa de abertura (E-W) proximal da bacia, definem-se e caracterizam-se, de acordo com as do proto oceano Atlântico (1ª Fase/Episódio de rifting - Wilson, normas impostas pelo Guia Internacional de Nomenclatura Estratigráfica, a Formação de Coimbra (Sinemuriano Inferior a Superior) e a Formação 1989; Wilson et al., 1989; Soares et al., 1993; Pinheiro et al., de S. Miguel (Sinemuriano Superior a base do Pliensbaquiano). Por sua 1996; Rasmussen et al., 1998; Alves et al., 2002, 2003; Tucholke vez, a Formação de Coimbra é subdividida em dois membros: o Membro e Sibuet, 2007; Kullberg et al., 2013), corresponde a um conjunto de Vila Seca, na base, e o Membro de Casa do Sal, no topo. As unidades de unidades calco-dolomíticas do Jurássico Inferior (o corpo propostas localmente atingem uma espessura total combinada a rondar os lítico investigado), temporalmente atribuído ao Sinemuriano 110 m. As referências biostratigráficas de amonoides e da fauna Inferior-base do Pliensbaquiano. Com aparente monotonia bentónica disponíveis, por comparação com os perfis do domínio distal litológica e estratonómica, este corpo lítico acaba por evidenciar (S. Pedro de Moel e Peniche), permitem a interpretação de um quadro um padrão bastante complexo (em afloramento), sugerindo uma correlativo regional inédito. sucessão carbonatada, margino-marinha a marinha aberta de Palavras-chave: Formação de Coimbra, Formação de S. Miguel, águas rasas, em que existe grande variabilidade de litostratigrafia, Sinemuriano-Pliensbaquiano basal, Bacia Lusitânica. fácies/microfácies devido à alternância (por vezes com organização cíclica) entre ambientes/subambientes de Abstract: A formal lithostratigraphic framework is proposed for the sedimentação supra/inter/submareais - em contexto mais geral de Lower Jurassic dolomitic-limestone succession of Lusitanian Basin, sistema deposicional que vai desde uma planície de maré cropping out in the Coimbra-Penela region (western-central Portugal). In semiárida e evaporítica essencialmente restrita (dolomítica) a this proximal domain of the basin, the Coimbra Formation (Early to Late oriente (vide Dimuccio et al., 2014; Dimuccio, 2014), localmente Sinemurian) and the S. Miguel Formation (Late Sinemurian to Early Pliensbachian) were defined and characterized according with the mais aberta às influências marinhas a ocidente (e.g., Duarte et al., normative imposed by the International Stratigraphic Guide. In turn, the 2008, 2014b; Azerêdo et al., 2010), até à parte interna, muito Coimbra Formation is subdivided into two members: the Vila Seca pouco profunda e de baixo gradiente, de um sistema de rampa Member, at the base, and the Casa do Sal Member, at the top. The carbonatada homoclinal inclinada genericamente para os proposed units locally reach a combined total thickness of ca. 110 m. The quadrantes ocidentais (Duarte et al., 2010, 2012; Azerêdo et al., available biostratigraphic references of ammonites and of benthic fauna, 2014; e referências neles incluídas). by comparison with the profiles from the distal domain (S. Pedro de Moel Entre os vários afloramentos do Jurássico Inferior repartidos and Peniche), allow the interpretation of an original regional correlative pelo território continental português (em que se incluem as framework. unidades calco-dolomíticas da base - essencialmente do Keywords: Coimbra Formation, S. Miguel Formation, lithostratigraphy, Sinemuriano - e margo-calcárias da porção média e superior - do Sinemurian-Early Pliensbachian, Lusitanian Basin. Pliensbaquiano e Toarciano), destacam-se as exposições mais representativas a norte do Rio Tejo (Fig. 1), em particular na 1 CEGOT - Centro de Estudos de Geografia e Ordenamento do Território, região de Coimbra-Penela (a área de estudo), em domínio Universidade de Coimbra, Colégio de S. Jerónimo, 3004-530 Coimbra, proximal, onde o corpo lítico investigado patenteia importante e Portugal. 2 MARE - Centro de Ciências do Mar e do Ambiente e Departamento de contínua expressão cartográfica. Nesta região, a banda Ciências da Terra, Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade de carbonatada meridiana do Jurássico Inferior estende-se ainda para Coimbra, Rua Sílvio Lima, 3030-790 Coimbra, Portugal. norte de Coimbra (até à latitude do Luso/Anadia) e para sul de *Autor correspondente/Corresponding author: [email protected] Penela, até à cidade de Tomar, com atitude condicionada por acidentes tectónicos que, frequentemente, interrompem a 1. Introdução continuidade vertical das séries sedimentares e, desta forma, Na Orla Meso-Cenozoica Ocidental de Portugal, o registo complicam a sua leitura, pelo menos em termos de organização sedimentar da fase inicial de enchimento carbonatado da Bacia estratigráfica. Manchas mais ou menos descontínuas localizam-se 78 Dimuccio et al. / Comunicações Geológicas (2016) 103, 1, 77-96 também perto das povoações de Cantanhede, Montemor-o-Velho, 2. Corpo lítico investigado Quiaios (a norte de Figueira da Foz), Soure, Leiria (Maceira), Porto de Mós e Serra d’El Rei (logo a leste de Peniche). No 2.1. Designações informais equivalentes âmbito dos setores norte e central da Bacia Lusitânica (sensu Soares e Rocha, 1984), outros afloramentos do Jurássico Inferior Nos trabalhos publicados até à data têm sido utilizadas diferentes (Fig. 1), de limitada extensão espacial mas com exposição denominações para as unidades calco-dolomíticas da base do vertical importante, com que é possível estabelecer correlações à Jurássico Inferior em Portugal (o termo “formação” com a escala regional, aparecem nas regiões de S. Pedro de Moel e de primeira letra em minúscula indica tratar-se de unidade Peniche - em domínio distal (Duarte e Soares, 2002; Duarte et informal): Camadas de Coimbra + Camadas com Gryphaea al., 2008, 2010; 2014b; Azerêdo et al., 2010; entre outros). obliqua em Choffat (1880); Fácies de Coimbra em Choffat (1903/04); Complexo carbonatado (dolomitos e calcários dolomíticos) + Calcários e calcários margosos com Asteroceras, Terebratula ribeiroi e Echioceras + Calcários em bancos espessos com Deroceratídeos em Mouterde et al. (1971); Dolomias e calcários dolomíticos (“Camadas de Coimbra”) + Calcários e margo-calcários (Camadas com Gryphaea obliqua) em Mouterde et al. (1981); Camadas de Coimbra = Camadas de Coimbra s.s. + Camadas de S. Miguel em Soares et al. (1985); Camadas de Coimbra (parte) em Barbosa et al. (1988); formação de Coimbra = Camadas de Coimbra s.s. + Camadas de S. Miguel em Rocha et al. (1990); Dolomitos de Sesimbra em Manuppella e Azerêdo (1996); Dolomitos em plaquetas em Manuppella et al. (2000); formação de Coimbra = Camadas de Coimbra s.s. + Camadas de S. Miguel (na generalidade da Bacia Lusitânica) e Camadas de Coimbra s.s. + Formação de Água de Madeiros (em S. Pedro de Moel e Peniche) em Duarte e Soares (2002); formação de Coimbra = membro dolomítico + membro calcário em Azerêdo et al. (2003); Grupo de Coimbra = Camadas de 1 Coimbra = formação de Coimbra (J Co - “Camadas de Coimbra 1 s.s.” + J Co’ - “Camadas de S. Miguel”) em Soares et al. (2007); Grupo de Coimbra = formação de Coimbra + formação de S. Miguel em Soares (2002/2004), Kullberg et al. (2013) e em Dimuccio (2014). 2.2. Trabalhos anteriores O corpo lítico investigado foi objeto de numerosos estudos anteriores, sobretudo no campo da macropaleontologia, onde se destacam os trabalhos pioneiros, em Portugal, de Sharpe (1850) e Figura 1. Enquadramento geológico regional e localização da área de estudo de Choffat (1880, 1903/04, 1905, 1908), seguidos, bastante mais (retângulo). Base cartográfica de acordo com a Carta Geológica de Portugal, na escala tarde, por outros com uma revisão paleontológica e melhor 1:500 000, publicada em 1992 pelos Serviços Geológicos de Portugal (Oliveira et al., 1992). Nos principais afloramentos do Jurássico Inferior inclui-se o corpo lítico zonamento estratigráfico (biostratigráfico) (e.g., Mouterde, 1955, investigado constituído pelas unidades calco-dolomíticas da sua base (essencialmente 1967; Mouterde et al., 1965, 1971, 1978, 1980, 1981; Antunes et do Sinemuriano). al., 1981; Dommergues e Mouterde, 1987). A estes trabalhos Figure 1. Regional geological setting and location of the study area (rectangle). temos que acrescentar outro com importante interesse Cartographic base-map according to the Geological Map of Portugal, at 1: 500 000, published in 1992 by the Geological Survey of Portugal (Oliveira et al., 1992). In the cartográfico – “Cartas e cortes geológicos nos distritos de main Lower Jurassic