Universidade De Lisboa Faculdade De Belas-Artes
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UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE BELAS-ARTES O VALOR DOS OBJETOS: UM ESTUDO DA CULTURA MATERIAL A PARTIR DE MOMENTOS DE RUTURA NA EVOLUÇÃO DO DESIGN Ricardo Afonso da Silva Meneses de Vasconcelos Mestrado em Design de Equipamento | Estudos de Design Dissertação orientada pela Professora Doutora Isabel Dâmaso 2012 Resumo Este estudo centra-se na dinâmica relacional que o homem criou e continua a criar com os objetos. Uma relação ao nível prático, segundo a convicção de que a funcionalidade é a causa fundamental para empreender o esforço de inventar algo que sirva para resolver os inúmeros problemas com que se vai deparando ao longo da sua evolução. A sociedade, tal como a conhecemos não seria possível sem objetos, e é exatamente essa interação entre o homem e o mundo, material, composto de artefactos, que é aqui analisada. Para além do valor funcional, do uso que serve a sua existência, o objeto também serve outros propósitos, outras funções. Torna-se na memória, na representação de algo, de um momento, de uma época. Quando isso acontece, passa igualmente a contribuir para o pensamento. Neste trabalho será pois analisada essa relação a partir da Revolução Industrial, momento escolhido para representar o início de um pensamento de projeto em relação ao design. Serão igualmente localizados e definidos momentos paradigmáticos em que essa relação não só é clara, como representa ruturas significativas em relação a discursos anteriores. Por outro lado, este trabalho inicia-se geograficamente em Inglaterra por ser considerado o local e o início cronológico que interessa desenvolver no objeto de estudo, expandindo posteriormente aos Estados Unidos da América e subsequentemente pelo resto do mundo, desde aquele período até à atualidade. A narrativa foca-se em momentos específicos que sirvam para ilustrar os instrumentos e os mecanismos que aí nascem e se desenvolvem para melhor promover o design e a cultura material. Dos círculos artísticos às publicações especializadas, passando pelos principais protagonistas que, à frente das várias instituições museológicas e de ensino, ou independentemente de circuitos organizados, mais contribuíram para a definição e evolução de uma cultura de design. Palavras-chave Design; Estudos de Design; Cultura Material; Relação Homem-Objeto; Atribuição de Valor 3 Abstract This study is centered in the relational dynamics that man creates with the objects around him. A practical relationship, in the conviction that functionality is the main reason to establish the effort of inventing something that resolves the endless problems that man will encounter along its own evolution. Society as we know it, wouldn’t be possible without objects, and it’s exactly that relationship between man and the material world, made of artifacts, that will be analyzed here. Besides the functional value, the use that serves its own existence, objects also serve other purposes, other functions. It becomes the memory, the representation of something, of a moment, of an era. When that happens, it becomes also the contribution to a way of thinking. This work will analyze this relation, starting in the Industrial Revolution, moment chosen to represent the beginning of a way of understanding the project, relating to design. Paradigmatic moments will be also located and defined, when this relation is not only clear, but also represents significant ruptures with any previous discourses. On the other hand, this work will begin in England, because this is the most interesting place and period to begin with, expanding after to the United States of America and subsequently to the rest of the world, from that time to the present moment. The narrative will focus in specific moments that will serve better to illustrate the instruments and mechanisms that were born and developed to better promote design and material culture. From the artistic circles to the publishing of specialized magazines, to the main protagonists that, heading museums or scholar institutions, or independently from any organized circuits, were pivotal in the definition and evolution of the culture of design. Keywords Design; Design Studies; Material Culture; Relation Man-Object; Value Attribution 5 Agradecimentos A Professora Doutora Isabel Dâmaso, Orientadora da presente dissertação, por toda a disponibilidade e interesse despendidos. Os Professores Doutores Paulo Parra e Inês Secca Ruivo por, um dia, há alguns anos atrás, me terem desafiado a empreender esta aventura. A minha Mãe, por tudo, sempre. O Nuno Morgado e a Joana Vasconcelos, por tudo, sempre, também. A Helena Amaral, pela paciência e ajuda. O meu colega e amigo Tiago Russo, pela paciência e ajuda. O meu cão Montana, que esteve sempre a olhar para e por mim, ao longo de todo este processo. 6 Dedicatória Dedico este trabalho à memória do meu Pai, Rodrigo Claro de Albuquerque Meneses de Vasconcelos 7 “Todas as verdades são fáceis de compreender quando são descobertas. O objetivo é descobri-las.” Galileu 9 Índice I. Introdução 14 II. Um novo paradigma de modernidade: O olhar sobre os objetos a partir da Revolução Industrial 20 II.I. Da sociedade rural à sociedade industrial 20 II.I.I. O caso Inglês 24 II.I.I.I. Os Pré-Rafaelitas e a invenção dos círculos literários e artísticos como forma organizada de criação e disseminação de pensamento 28 II.I.I.II. John Ruskin e a influência sobre William Morris na origem do movimento Arts and Crafts 29 II.I.I.II.I. O legado do movimento de William Morris 34 II.I.I.III. As instituições incontornáveis na sistematização e catalogação do conhecimento da cultura material 35 II.II. A aventura Norte-Americana 39 II.II.I. Adirondack, a versão selvagem do espírito Arts and Crafts 41 III. A chegada da sociedade de consumo, um percurso irregular 46 IV. A América na vanguarda da modernidade 50 IV.I. As vanguardas Europeias e a diferente realidade Americana 50 IV.II. Os refugiados Europeus e o papel de Harvard na transformação cultural dos Estados Unidos na vanguarda da modernidade 53 IV.II.I. Eliot Noyes, um aluno de Harvard 56 IV.III. O MoMA e a transformação da cultura material nos EUA 59 10 IV.IV. Eliot Noyes, o curador de duas exposições revolucionárias na valorização dos objetos 61 IV.IV.I. Objetos americanos por menos de dez dólares 61 IV.IV.II. Concurso e exposição do design orgânico 64 IV.V. A indústria ao serviço do museu que a legitima 68 V. Transição - do Pós-guerra à Atualidade 70 V.I. As diferentes geografias no reconstruir da cultura material: Escandinávia, Alemanha, Itália e Japão 70 V.II. A reconstrução e renovação de uma cultura do design: quando o funcionalismo já não chega 74 VI. Aspetos da construção do discurso sobre a cultura material na atualidade 77 VI.I. A revolução digital - o mundo global e os média 77 VI.II. Dessacralização dos museus - O franchising de museus e coleções, os museus marca 88 VII. Conclusões 102 Bibliografia 108 Fontes Iconográficas 110 11 12 Fig. 1: Pinturas rupestres com telemóvel 13 I. Introdução O mundo é construído através de uma teia de relações que se criam entre os seus principais intervenientes, a vários níveis, os responsáveis pela criação e manutenção daquilo que aqui chamaremos de cultura material, vista do ângulo do design. O presente trabalho tem como objetivos primordiais, que ao longo da introdução serão especificados: o estudo da relação que o homem ao longo da sua evolução foi forjando com os objetos; a análise das relações entre os vários agentes responsáveis pela construção, manutenção e divulgação da cultura material, vista do ângulo do design; a identificação de momentos de rutura e respetivos impactos na evolução do design; o contributo de vários instrumentos e métodos na construção de uma cultura de design. A metodologia utilizada recorre a um percurso cronológico de determinados acontecimentos e conjunturas, baseado numa revisão da literatura dos principais autores da história e da teoria do design, com relevância para a interpretação dos vários significados e valores do objeto, sejam eles de carácter cultural, conceptual ou apenas de uso quotidiano. Apoia-se igualmente, a partir de uma citação de Guy Julier, na multiplicidade de abordagens que assistem a este campo de estudo, não existindo, a meu ver, qualquer incompatibilidade no uso simultâneo das mesmas. “Devido ao alargado leque de disciplinas académicas dedicadas ao estudo do consumo, não é de estranhar que uma variedade de posições relativamente ao valor, sentido ou práticas, tenha sido adotada. Em termos gerais estas posições podem ser divididas em três campos: primeiro, temos os que defendem a posição que enquadra o consumo como uma atividade essencialmente dócil na qual os agentes produtores dominam (A escola de Frankfurt, J.K. Galbraith, Vance Packard, W.F. Haugh). Em segundo lugar, temos os que adotam, de tempos a tempos, a noção de que consumir pode ser igualmente emancipatório ou resistente (Dick Hebdige, Daniel Miller, Michel de Certau, John Fiske). Finalmente, temos os que não partilham nenhuma destas visões, mas acreditam que o consumo tem a sua lógica frequentemente espetacular e pós-moderna (Jean Baudrillard, Umberto Eco)”1. Desde tempos imemoriais, ainda na pré-história da cultura material, a partir do momento em que o Homem sustenta esse nome, a partir do momento em que guarda e transporta as memórias consigo, o Homem desenvolve uma relação com os objetos. 1 Tradução livre. JULIER, Guy – The culture of Design. London : Sage, 2000. pp. 72-73. 14 Objetos, que vão sendo criados de um modo empírico, ao sabor das necessidades, sem urgência ou consciência do que a falta deles provoca na história da sua própria evolução. Poucos desses objetos, de um período em que não havia uma língua falada, mas em que já se os representava, em pinturas rupestres, executadas nas paredes de grutas, surgindo homens em caçadas, munidos de instrumentos que os ajudavam, chegaram até nós.